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FICHA TÉCNICA

Título : Textos ateístas, antirreligiosos e anticatólicos


Edição : 1ª. edição
Autor : Fernando Pessoa
Organização, prefácio, e anotações : Victor Correia
Editora : Colibri
Editor : Fernando Mão de ferro
Paginação : Paulo Guerreiro
Capa : Raquel Ferreira
Impressão : Colibri Artes Gráficas
Data : Maio de 2019
ISBN : 978-989-689-852-6
Depósito Legal : 454 399 / 19
SIGNIFICADO DOS SINAIS UTILIZADOS :

s/d. – Sem data


(__) – Espaço deixado em branco pelo autor
(…) – Há mais texto, antes ou depois do texto transcrito
BNP – Biblioteca Nacional de Portugal (espólio de Fernando Pessoa)
PREFÁCIO

A palavra ateísmo, originária da palavra grega theos (“deus”) e do prefixo de


negação “a”, significa a descrença em Deus, em quaisquer deuses, em algo de
sobrenatural, ou em coisas como a ressurreição dos mortos, e a imortalidade da alma.
Embora algumas religiões como o budismo e certas tradições do hinduísmo não
defendam a existência de Deus, mesmo que essas religiões defendam que o divino faz
parte do próprio Homem e não o encarem como uma entidade exterior ao ser humano,
o ateísmo também se refere essas religiões, dado que critica a sua crença no divino.
Portanto, o ateísmo é a posição filosófica que nega a existência de Deus e, de uma
forma geral, de qualquer entidade que possa considerar-se de natureza divina, que exista
dentro ou fora do Homem, e que vá para além da própria Natureza. Conforme se pode
confirmar no presente livro, Fernando Pessoa escreveu muitos textos que negam ou que
põem em dúvida a existência de Deus, de deuses, de uma entidade divina, e há até
mesmo alguns textos em que ele critica também o budismo.
Por seu turno, a palavra agnosticismo, originária da palavra grega gnosis
(“saber), e do prefixo de negação “a”, é a posição filosófica segundo a qual não é
possível ao ser humano saber se Deus existe ou não, nem aceder ao conhecimento da
sua essência, mesmo supondo que Deus possa existir. Sendo limitada a capacidade
humana ao mundo dos fenómenos, através do conhecimento natural e científico, a
metafísica (Deus, alma, imortalidade), é encarada como incognoscível. Portanto, o
agnosticismo defende a suspensão do juízo e da crença relativamente àquilo a que a
razão e os sentidos não têm acesso, negando o valor das demonstrações racionais da
existência de Deus. Alguns dos textos de Fernando Pessoa, incluídos neste livro, são
agnósticos (mas, de uma forma geral, aproximam-se mais do ateísmo).
Embora nem toda a crença em Deus leve a praticar uma religião, as religiões
gerem a crença em Deus, enquanto fenómeno social caracterizado por diversos ritos,
cultos, liturgias, por um conjunto de códigos morais, de dogmas, de textos sagrados, e
por uma organização eclesiástica e hierárquica, com os seus templos e os seus
santuários, onde os crentes se reúnem para orar. A irreligião pode associar-se ao
ateísmo, tratando-se da incredulidade religiosa, da ausência de crença e de prática
religiosa, da não aceitação e do não seguimento daquilo que é aceite e praticado nas
religiões, e da recusa de que a religião dê sentido à Vida. A irreligião não é exatamente
a mesma coisa que ser antirreligião, pois há pessoas que não têm religião (e algumas
acreditam mesmo em Deus) mas que não são antirreligiosas. Algumas pessoas são
irreligiosas porque não sentem necessidade das religiões para acreditar em Deus, ou
porque não consideram que as religiões deem sentido à vida. Mas há também pessoas
que são irreligiosas porque consideram que a religião, enquanto instituição organizada,
é algo negativo, devido aos seus dogmas, às sua hierarquias, etc. Quando a irreligião (a
ausência de religião) tem subjacente a crítica às religiões em geral, acusando-as por
exemplo de obscurantismo, superstição, fanatismo, hipocrisia, ou combatendo o seu
peso na sociedade, a irreligião pode levar à antirreligião, Portanto, a designação de
antirreligião inclui por um lado a ausência de religião na vida de um indivíduo ou de
uma comunidade, e por outro a postura contra as religiões, e dado que é mais
abrangente, escolhemos esta designação.
Da palavra antirreligião deriva a palavra antirreligioso, que caracteriza a atitude
de um indivíduo ou de um grupo, ou o conteúdo de determinadas mensagens, como por
exemplo de textos, que existem por exemplo em Fernando Pessoa, conforme se poderá
confirmar ao longo do presente livro. Na sua crítica às religiões, Fernando Pessoa deu
uma importância especial ao Cristianismo, enquanto doutrina e instituição, que ele
muito criticou (apesar de ter alguns textos em que mostra respeito por Cristo enquanto
figura histórica). Mas não se deve confundir Cristo com o Cristianismo, e sobre este
último Fernando Pessoa foi bastante crítico, como é visível ao longo deste livro, em
vários heterónimos, principalmente em dois heterónimos muito apostados em criticar
frequentemente o Cristianismo : Ricardo Reis, e António Mora. Destes dois
heterónimos, principalmente de António Mora, existem muitos textos contra o
Cristianismo, de que apresentamos neste livro uma amostra, bastante significativa.
As religiões têm geralmente os seus textos próprios, e assim como existem
textos religiosos (os chamados textos sagrados, os escritos dos padres do deserto, os
escritos de santos, etc.), ou de defesa filosófica da crença em Deus (em Santo
Agostinho, Santo Anselmo, São Tomás de Aquino, Blaise Pascal, Soren Kierkegaard,
Gabriel Marcel, etc.), existem também textos ateus e antirreligiosos. Esses textos
constituem uma tradição literária e filosófica de que fazem parte importantes autores,
como por exemplo Denis Diderot, Paul d’Holbach, David Hume, Auguste Comte,
Arthur Schopenhauer, Marquês de Condorcet, Ludwig Feuerbach, Friedrich Nietzsche,
Sigmund Freud, Bertrand Russell, Jean-Paul Sartre, etc., tradição à qual Fernando
Pessoa também pertence, do ponto de vista literário-filosófico, e pela qual se
influenciou, devido às leituras que fez, nomeadamente de Nietzsche.
Através desses e de outros textos podem-se encontrar diversos argumentos
contra a existência de Deus : o argumento da revelação inconsistente (as contradições
nas Escrituras Sagradas), o problema da existência do mal, o problema do destino dos
que não receberam a revelação divina, o argumento da descrença, o ónus da prova, o
paradoxo da omnipotência de Deus, o paradoxo da omnisciência de Deus, o problema
da existência do inferno, o contra-argumento ao argumento cosmológico, o problema da
existência de Deus omnisciente com livre arbítrio, a não necessidade de um ser
omnipotente criar o Universo, o facto de muitas religiões darem diferentes e confusos
relatos sobre Deus, o absurdo de alguns dogmas, o facto de Deus não ajudar quem lhe
reza a pedir ajuda, o argumento da incoerência entre a omnipotência e a omnisciência de
Deus, o argumento da evolução darwiniana, a inverificabilidade de Deus através de
testes científicos, etc., sendo portanto estes argumentos uns de carater filosófico, e
outros de caráter científico. Os argumentos contra as religiões, enquanto crença em
Deus, estão ligados ao ateísmo, e por vezes ao agnosticismo, mas existem também
críticas às religiões enquanto facto social, isto é, críticas à atuação das religiões na vida
dos povos, como por exemplo as atrocidades cometidas pelas religiões ao longo da
História (as Cruzadas, a Inquisição, etc.).
Fernando Pessoa não empregou argumentos científicos, mas filosóficos, tendo
mesmo empregue alguns dos argumentos ateístas atrás enunciados. Fernando Pessoa
criticou também, conforme se poderá constatar em alguns textos deste livro, as religiões
enquanto facto social, ao falar das injustiças e das atrocidades praticadas pelas religiões,
principalmente pela religião católica, como por exemplo a Inquisição. Fernando Pessoa
escreveu também alguns textos em que critica o Papa, e o clero em geral, e portanto
enquanto anticatólico era também anti clerical (há mesmo dois heterónimos de
Fernando Pessoa, o heterónimo Charles Robert Anon, e o heterónimo Joaquim Moura
Costa, cujos textos são predominantemente anticatólicos e anti clericais). Nos textos de
ensaio escritos por Fernando Pessoa, existem textos muito argumentativos, e alguns
deles incluem alguns dos argumentos ateístas atrás referidos. No entanto, na maioria
dos textos de Fernando Pessoa, nomeadamente na sua poesia, nos seus contos, e nos
seus textos autobiográficos, a sua posição ateísta, antirreligiosa, e anticatólica, não é de
carater argumentativo, pois é apresentada através de imagens literárias, e portanto é
mais sentimental do que racional, dado que são textos de poesia, contos, e confissões
pessoais (embora em Fernando Pessoa também existam contos filosóficos, com uma
argumentação sobre Deus). Entre os seus diversos recursos críticos, Fernando Pessoa
também recorre por vezes à ironia, principalmente através dos heterónimos Charles
Robert Anon, Pantaleão, e Joaquim Moura Costa, que escarnecem de Deus, das
religiões, e do clero, conforme se pode confirmar nos textos desses heterónimos
incluídos no presente livro.
Numa fase da sua vida, em alguns dos seus textos, Fernando Pessoa tem uma
faceta ocultista, pois também se interessou por astrologia, por espiritismo, por magia, e
feitiçaria, mas Fernando Pessoa entrou nesse mundo por necessidades económicas,
devido ao facto de nos anos 1915 e 1916, ao estar na moda o esoterismo, ter aceite
encomendas para traduzir livros esotéricos dos teósofos Annie Besant, Helena
Blavatsky, C.W.Leadbeater, e Mabel Collins, traduções essas que acabaram por
despertar o seu interesse pelo esoterismo. Ele próprio afirma numa carta a Mário de Sá
Carneiro : “Tive de traduzir livros teosóficos. Eu nada, absolutamente nada, conhecia do
assunto. Abalou-me a um ponto que eu julgaria hoje impossível, tratando-se de qualquer
sistema religioso”.1 Esta carta revela portanto que Fernando Pessoa não traduziu esses
livros de livre vontade, mas que teve que os traduzir. Revela também que ele nada
percebia desse assunto, e que o abalou nessa fase, mas que não o abalaria mais tarde,
quando estava a escrever a Mário de Sá Carneiro, e que se admirou de ter-se sentido
abalado, tratando-se de coisas religiosas.
Entre 1916 e 1917 Fernando Pessoa assistiu a sessões de espiritismo,
nomeadamente as chamadas “comunicações mediúnicas”, mas isso aconteceu num
período muito curto da sua vida, e portanto foi uma fase passageira, e mais tarde
criticará o espiritismo, em alguns dos seus textos, por exemplo quando afirma o
seguinte : “A mediunidade resulta de um desequilíbrio mental, análogo ao produzido
pelo alcoolismo, sendo muitas vezes o estado prodrómico da loucura declarada. (…)
Nada, até hoje, prova a presença de espíritos comunicantes, sendo, para isso se provar,
preciso demonstrar primeiro que nas faculdades, ainda mal estudadas, do subconsciente,
não cabe a de elaborar todos os fenómenos a que se chama de mediunidade”. 2
Num texto que escreveu no último ano da sua vida, disse ser “cristão gnóstico,” 3
mas não tanto pelo Cristianismo, no sentido habitual do termo, que ele muito criticou ao
longo da sua vida, conforme se pode confirmar nos textos incluídos neste livro, mas
1
Correspondência 1905-1922, Lisboa, Ed. Assírio & Alvim, 1988, pp. 182-183.
2
Prosa íntima e de autoconhecimento, Lisboa, Ed. Assírio & Alvim, 2007, pp. 295-296.
3
Escritos autobiográficos, Automáticos e de Reflexão Pessoal, Lisboa, Ed. Assírio & Alvim, 2003, p. 205.
pelo gnosticismo, pois o gnosticismo foi inicialmente definido no contexto cristão, e
não há textos gnósticos até hoje descobertos que sejam anteriores ao cristianismo. 4 Por
outro lado, o gnosticismo pode conciliar-se com o Cristianismo “na proporção em que
Cristo é, não um deus, ou um semideus judeu, mas o Logos abstrato dos Gnósticos,
ponto intelectual por onde passa a emanação divina – o cristianismo é legítimo, porque
é um completamento, um prolongamento, um aprofundamento do paganismo. Tanto é
um prolongamento do paganismo que não entra em conflito com ele. Pagãos eram os
filósofos neo-platónicos da escola de Alexandria.”5 E pode ser-se gnóstico sem acreditar
na divindade de Cristo, conforme Fernando Pessoa diz sobre Milton : “Era Milton um
cristão gnóstico, e, até, um descrente na doutrina exata da divindade do Cristo.”6
Fernando Pessoa escreveu alguns textos em prosa sobre ocultismo (alguns deles
foram prefácios às obras esotéricas que traduziu, e outros foram notas de leitura), e
apesar da sua atração pelo ocultismo, Fernando Pessoa também criticou o ocultismo,
como se pode confirmar em alguns dos seus textos, alguns deles incluídos no presente
livro, como por exemplo quando afirma o seguinte : “Se esses ensinamentos ocultos são
verdadeiros, ou apenas especulações abstrusas, é outro problema. Se os hierofantes do
oculto têm, na verdade, maior conhecimento da verdade pura do que nós profanos, que a
buscamos, se a buscamos, com a leitura, ou a meditação, ou a inteligência discursiva e
dialética – não o podemos nós saber. Tudo isso pode ser sinceramente crido pelos
iniciados, e ser falso. O oculto pode ter alucinações próprias, enganos seus”.7
Em 1930 o famoso mago e astrólogo Aleister Crowley (ou a Besta 666,
conforme se autointitulava), veio de propósito a Lisboa para conhecer Fernando Pessoa,
e encenou o seu suicídio na Boca do Inferno, numa praia de Cascais, e Fernando Pessoa
colaborou ativamente nessa encenação, combinando com o próprio Aleister Crowley e
com o suplemento semanal do jornal mais lido do país, o Diário de Notícias, a criação
desse facto, sendo portanto uma pura invenção. Conforme sublinha Fernando Cabral
Martins, Fernando Pessoa colaborou ativamente num “truque de suicídio por razões
mais ou menos fúteis, que é, em vez de um ritual religioso, uma espécie de número de
circo”, e “o próprio esoterismo de Fernando Pessoa se vê, neste particular, remetido a
um subtema da ficção policiária”. (…) Esta intrincada história, que mete no mesmo saco
4
J. M. Robinson, “Sethians and Johannine Thought : The Trimorphic Protennoia and the Prologue of the
Gospel of John”, in The Rediscovery of Gnosticism, vol. 2, Sethian Gnosticism, Ed. B. Lavton (Leiden : E. J.
Brill, 1981, p. 662.
5
Textos filosóficos, vol. I, Lisboa, Ed. Ática,1993, pp. 107-108.
6
BNP/E3, 92-3.
7
Ivette Centeno, Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética, Lisboa, Ed. Presença, 1985, p. 45.
magia, burla e poesia, não parece corresponder, afinal, a um grande e real
comprometimento de Pessoa com a esfera do esoterismo”.8
Fernando Pessoa interessou-se por astrologia, e fez horóscopos, mas acreditar na
influência dos astros (assim como das marés) nos acontecimentos da História, nos
fenómenos da Natureza, e no caráter dos indivíduos, não é incompatível com a
descrença em Deus, antes pelo contrário, pois é até mesmo uma das formas de
prescindir de uma entidade divina, a que se chama Deus. A astrologia e o ocultismo,
pelos quais Fernando Pessoa se interessou, são aliás compatíveis com o combate contra
Deus, pois existem ligações do ocultismo ao satanismo, cujo alvo principal é Deus.
Fernando Pessoa exprime mesmo simpatia pelo satanismo em alguns dos seus textos
9
(no texto “As Ordens Maiores, e sobretudo os graus mágicos”, no texto “Declaração
de diferença” do Livro do Desassossego, em textos do heterónimo Raphel Baldaya,
etc.). As ligações do ocultismo ao satanismo podem ser confirmadas por diversas
investigações e importantes estudos que sobre isso se têm realizado.10
Os horóscopos que Fernando Pessoa fez, acreditando nos astros, significam a
crença de que os astros influenciam os acontecimentos, os fenómenos da Natureza, e a
psicologia do ser humano, e portanto isso não é incompatível com o ateísmo. No caso
de Fernando Pessoa, pode ter ainda outros significados : no inicio, as suas necessidades
económicas, levando-o a fazer horóscopos, e progressivamente uma transliteração
heteronímica, uma espécie de psicologia, ou mesmo uma espécie de literatura. No
entanto, o que é importante salientar é que a astrologia, assim como o ocultismo, são
considerados uma atitude contrária a Deus. Na Bíblia Sagrada a astrologia, assim como
o espiritismo, a magia, feitiçaria, o tarot, e qualquer tentativa de adivinhar o futuro, e
tudo aquilo a que se chama ocultismo, é abominável aos olhos de Deus : “Não se ache
no meio de ti quem faça passar pelo fogo seu filho ou sua filha, nem quem se dê
`adivinhação, à astrologia, aos agouros, ao feiticismo, à magia, ao espiritismo, à
adivinhação ou à invocação dos mortos. Porque o Senhor, teu Deus, abomina aqueles

8
Fernando Cabral Martins, Introdução ao estudo de Fernando Pessoa, Lisboa, Ed. Assírio & Alvim, 2014,
pp. 199-200.
9
Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética - Fragmentos do espólio , Lisboa, Ed. Presença, 1985, p. 42.
10
Veja-se por exemplo os seguintes estudos associando o ocultismo ao satanismo: ; Jacky Cordonnier,
De l’astrologie au satanisme, 2001; J.L. Vazquez, Los nuevos movimentos religiosos. Nueva Era,
Ocultismo, Satanismo, Ed. San Pablo, 2004 Paul Roland, Le livre noir de l’occultisme, Paris, Ed. Encore,
2011; Jeff Harshbarger, Dancing with the devil : na honest look into the occult from former followers ,
New York, Ed. Charisma House, 2012; Aleister Crowley, The Writings of Aleister Crowley, 2019, London,
Ed. Anubis Books.
que se dão a essas práticas, e é por causa dessas abominações que o Senhor, teu Deus,
expulsa diante de ti essas nações” (Deuteronómio, 18, 9-13.).
Todas as religiões cristãs defendem que o ocultismo não vem de Deus, e
afirmam mesmo que o ocultismo é uma atitude contra Deus, e que é uma coisa
diabólica. Por exemplo a religião católica, afirma oficialmente o seguinte :“Todas as
formas de adivinhação hão de ser rejeitadas: recurso a Satanás ou aos demónios,
evocação dos mortos ou outras práticas que erroneamente se supõe “descobrir” o futuro.
A consulta aos horóscopos, a astrologia, a quiromancia, a interpretação de presságios e
da sorte, os fenómenos de visão, o recurso a médiuns escondem um desejo de ganhar
para si os poderes ocultos. Essas práticas contradizem a honra e o respeito que, unidos
ao amoroso temor, devemos exclusivamente a Deus” (Catecismo da Igreja Católica,
n.2116).
Os heterónimos Ricardo Reis, e António Mora foram pagãos, tinham uma
admiração pelos deuses da Grécia antiga, mas essa atitude é um contraponto da crítica
de Fernando Pessoa ao Cristianismo. Fernando Pessoa tinha uma grande admiração pela
Grécia e pela Roma antigas (a sua História, a sua arte, a sua mentalidade, etc.), e
lamentou essa civilização ter terminado, daí ter defendido essa civilização, em cuja
cultura se incluía também o paganismo. Mas será que Fernando Pessoa, ele próprio
enquanto indivíduo, e tão inteligente que era, acreditava na existência dos deuses gregos
e de outros seres de que falam as histórias da mitologia grega ? A titanomaquia é uma
das mais clássicas histórias da mitologia grega. Nela é narrada a famosa luta entre
deuses e titãs pelo domínio do mundo. Tudo começou com o nascimento dos Titãs,
filhos dos deuses primordiais Urano e Gaia. Um deles, Cronos, rebela-se contra o pai e
castra-o, tornando-se o rei de tudo, e engoliu os seus próprios filhos Será que Fernando
Pessoa acreditava realmente nisto ? Será que Fernando Pessoa tinha fé nos deuses
gregos, como por exemplo um católico tem fé em Deus, na Virgem Maria, e nos
santos ? certamente que não.
Segundo a mitologia grega, os males apareceram no mundo quando Pandora
abriu uma caixa onde Zeus, o deus dos deuses, tinha mandado guardar todos os males.
Será que Fernando Pessoa acreditava que a existência dos males no mundo se deve ao
facto de Pandora ter aberto uma caixa ? Segundo a mitologia, Afrodite, deusa do amor e
da beleza, nasceu das ondas do mar. Será que Fernando Pessoa acreditava que uma
deusa nasceu mesmo das ondas do mar, e que é devido a essa deusa que existe entre os
seres humanos o amor e a beleza ? Será que Fernando Pessoa acreditava que a sabedoria
existe devido à deusa da sabedoria Atena ? Será que Fernando Pessoa acreditava que
existiu Poseidon, o deus dos mares ? será que Fernando Pessoa acreditava que existia
Ares, o deus da guerra? será que Fernando Pessoa acreditava que existia Hermes, o deus
das viagens ? Será que Fernando Pessoa acreditava na existência de Sisífo, Teseu,
Édipo, Hércules, Midas, Medusa, Perséfone, Teseu, Jasão, ou de Narciso? Será que
Fernando Pessoa acreditava em ninfas, sereias, sátiros, elfos, gnomos, faunos, silenos,
centauros, e nereidas ? Certamente que não, pois isto são histórias, lendas, contos,
mitos, que existem também em alguns textos de Fernando Pessoa, mas do ponto de vista
literário, e portanto não como crente mas como escritor. Quando Zeus castrou seu pai
Cronos e arremessou seus testículos ao mar, libertou os irmãos que o Titã havia
devorado, criando a tríplice divisão : Zeus governava o Olimpo, Poseidon governava os
mares, e Hades governava o mundo dos mortos. Estas e outras histórias da mitologia
grega, pelas quais Fernando Pessoa se sentiu fascinado, enquanto figuras literárias ou
imagens simbólicas, fazem boa literatura, e foi essencialmente o que com elas Fernando
Pessoa fez. Assim como o Futurismo, o Paulismo, o Saudosismo, o Sensacionismo, e
outros ismos, o Paganismo é também uma estética, na qual os deuses da Grécia antiga
entram como figuras literárias, ou como símbolos. O fascínio de Fernando Pessoa por
exemplo pelo deus Apolo, não é por este ser um deus, mas sim pela sua beleza, e por
Apolo ser o símbolo da beleza, da perfeição, da luz, da harmonia, e do equilíbrio.
As figuras mitológica da Grécia antiga podem também ser interpretadas como
símbolos no sentido psicológico (por exemplo dos sonhos do ser humano), como fazem
Freud, e Jung, sobre o significado da mitologia. Assim, o próprio pagão António Mora,
que é o autor da maior parte dos textos pagãos de Fernando Pessoa, diz que não se deve
entender o paganismo no sentido religioso : “Quando, por isso, vos digo que esta obra é
a reconstrução do paganismo, e, lendo-a, não vedes lá deuses, não pasmeis, nem
duvideis de mim. Os deuses (volto à forma conveniente) são os atributos de substância
«pagã»; necessários à existência da substância como manifestada, mas não à da
substância como substância.”11
Também o heterónimo Ricardo Reis, apesar de ser pagão e “crente” nos deuses
da Grécia antiga, critica as religiões, afirmando o seguinte : “A religião é a redução a
ilegítima de uma coisa legítima – a especulação metafísica. A religião é uma metafísica
popular, coletiva. (…) Há só uma coisa capaz de eliminar a religião : a educação. E a

11
Obras de António Mora, Lisboa, Ed. Imprensa Nacional Casa da Moeda, 2002, p. 230
educação – pode porque ela própria é uma ciência (se bem que imperfeita ainda) – deve
ser científica.
A moral é uma coerção : quando a religião era respeitada, era porque podia
prender, enforcar e banir.
O povo dos campos não é por ser religioso que é relativamente bom, é porque o
prendem, e se é relativamente sossegado é porque vive no campo”.12
Há poemas em que Fernando Pessoa emprega o nome de Deus, mas como figura
literária, através de exclamações para reforçar a coloquialidade da frase e dar
expressividade aos versos, como por exemplo quando no poema Aniversário diz :“(…)
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus! / Hoje já não faço anos.”. Em alguns poemas
emprega também a expressão “Valha-me Deus”, ou “Graças a Deus !”, como faz por
exemplo Alberto Caeiro (que é um heterónimo que não acredita em Deus), que no seu
poema No entardecer dos dias de Verão, às vezes diz :“Graças a Deus que há imperfeição
no Mundo”. “Valha-me Deus !”, ou “Graças a Deus” são expressões típicas da língua
portuguesa, mas o seu emprego não deve ser encarado no sentido literal, isto é, não
significa que Fernando Pessoa esteja a pedir ajuda ou a agradecer a Deus.
Fernando Pessoa também emprega por vezes a palavra “alma”, mas o emprego
dessa palavra, em língua portuguesa, nem sempre significa a alma no sentido religioso.
Pode-se empregar a palavra “alma” com diferentes significados, como por exemplo
quando se diz que uma determinada pessoa tem “alma de artista”. Os diferentes usos
dessa palavra estão presentes também, por exemplo, na expressão “estados de alma”,
que tem a ver com o estado de espírito de um indivíduo, e tem portanto um significado
psicológico. Pode-se empregar a palavra “alma” com diferentes significados, assim
como Fernando Pessoa empregava, isto é, como sinónimo de “consciência”, “mente”,
“eu interior”, “eu profundo”, “princípio vital”, “força vital”, ”ânimo”, “disposição,
“essência”, mas isso não significa a alma de que falam as religiões (algo que quando
um indivíduo morre vai para o céu ou vai para o inferno). Há mesmo poetas, entre os
quais Fernando Pessoa, que por vezes empregam a palavra “alma” como sinónimo de
“coração” (a propósito de sentimentos amorosos), por exemplo quando Álvaro de
Campos, no poema A rapariga inglesa, diz o seguinte : “aquela rapariga foi uma
oportunidade da minha alma”, ou a alma como sendo mesmo algo de carnal, como por
exemplo quando no poema Saudação a Walt Whitman Fernando Pessoa ao beijar o
retrato deste diz sentir : “Uma ereção abstrata e indireta no fundo da minha alma”, ou
12
Obra completa de Ricardo Reis, Lisboa, Ed. Tinta da China, 2016, p. 302.
na Ode Marítima , quando falando do que sente em relação aos piratas afirma :
“Florescesse como uma ferida comichando na carne irreal da minha alma!”
Fernando Pessoa tem também poemas em que fala de forma elogiosa sobre
Cristo, como por exemplo o poema Liberdade, em que num verso diz o seguinte : “O
mais do que isto é Jesus Cristo/ Que não sabia nada de Finanças/ Nem consta que
tivesse bibliotecas”, mas este poema, como outros do mesmo estilo, tem a ver com a
admiração por Jesus Cristo apenas como figura histórica, e pela sua mensagem, não
enquanto mensagem religiosa mas sábia (assim como se pode admirar os ensinamentos
filosóficos de Confúcio, sem se ser confucionista). A admiração por Cristo não tem a
ver com a crença religiosa em Cristo como filho de Deus, e a quem Fernando Pessoa
rezasse (crença essa que aliás ele criticou, conforme se pode confirmar no presente
livro). Por outro lado, mesmo alguns versos elogiosos sobre Cristo não devem ser
encarados em sentido literal, conforme afirma o heterónimo Frederico Reis, ao referir-
se à “ideia puramente poética de Alberto Caeiro de que o Menino Jesus era o deus que
faltava”13 ( note-se : é uma ideia “puramente poética”, conforme ele afirma), até porque
Alberto Caeiro era ateu e materialista, e portanto não via Cristo como um Deus.
Fernando Pessoa interessou-se muito por diversos temas, e portanto interessou-
se também muito por religião, mas fê-lo como pensador da religião, para a analisar e
criticar, e não como homem crente. Houve muitos escritores e filósofos ao longo da
História que se interessaram muito pelas religiões, mas que não eram crentes, e que se
definiram antes como livres pensadores. Fernando Pessoa definia-se também a si
mesmo como livre pensador, descrente nas religiões e naquilo em que acreditavam os
crentes, conforme ele diz sobre si próprio, por exemplo na seguinte afirmação: “eu
mesmo, racionalista, livre pensador, não possuindo um átomo de crença no saco de
esmolas dos vossos dogmas”.14
Por entre a sua vastíssima obra, Fernando Pessoa escreveu também alguns
poemas místicos, pois enquanto poeta tinha uma sensibilidade contemplativa,
sonhadora, espiritual, mas isso não significa que ele acreditasse em Deus. Houve poetas
considerados místicos, que escreveram poemas contemplativos e de linguagem religiosa
sobre a Natureza, mas cujos poemas não falam em Deus, e alguns desses poetas não
acreditavam em Deus. Ter uma tendência espiritual, como era o caso de Fernando
Pessoa, não é a mesma coisa que acreditar em Deus. Num dos seus texto

13
Obra completa de Ricardo Reis, Lisboa, Ed. Tinta da China, 2016, p. 374.
14
BNP, 55c-71
autobiográficos, Fernando Pessoa explica em que consistia a sua tendência espiritual :
“Mas desde que tenho consciência de mim, apercebi-me de uma tendência inata em
mim para a mistificação, a mentira artística. Acrescente-se a isto um grande amor pelo
espiritual, pelo misterioso, pelo obscuro, que, ao fim e ao cabo, não era senão uma
forma e uma variante daquela minha outra característica”.15
Fernando Pessoa escreveu alguns poemas em que faz intervir Deus como
personagem dos seus poemas, que devem ser vistos apenas como criação literária, dado
que, como ele próprio afirma, “o poeta é um fingidor”, e portanto isso não significa que
Fernando Pessoa, enquanto indivíduo, acreditasse na existência de Deus, da Virgem
Maria, dos anjos, dos santos, nos dogmas das religiões, e no catecismo de qualquer
Igreja .16 Há misticismo em alguns dos seus poemas, mas um estado de espírito místico,
ou um temperamento místico, não é a mesma coisa que acreditar na existência de Deus.
Assim, um dos seus heterónimos, o Barão de Teive, diz o seguinte : “”O meu estado de
alma é aquele em que assentam os grandes misticismos, as renúncias transcendentes;
eles, porém, assentam na fé, e eu não tenho fé” 17 O mesmo acontece com outro dos seus
heterónimo, Friar Maurice, sobre quem Fernando Pessoa diz o seguinte : “Era um
místico sem Deus, um cristão sem uma crença.”18
O facto de haver em Fernando Pessoa, conforme se nota em alguns textos, uma
certa aspiração pela transcendência, pelo absoluto, e pelo ilimitado, não significa
acreditar que Deus existisse. Uma coisa é Deus enquanto ideia filosófica, enquanto
conceito, sobre o qual Fernando Pessoa refletiu, e outra coisa é acreditar que Deus
existia. Há textos em que Fernando Pessoa fala de Deus como mistério, e apenas como
tal, e utiliza esse conceito para se referir a outras realidades, como por exemplo quando
diz : “(…) um mistério igual a Deus” 19. Uma coisa é falar de Deus enquanto conceito, e
outra coisa é acreditar na existência de Deus. Também o facto de sentir admiração pela
ideia de Deus, aspirar à existência de Deus, ou desejar que Deus exista (que é algo que
também está presente em alguns textos de Fernando Pessoa), não significa acreditar que
Deus exista. Há quem procure Deus, mas não o encontre, e o facto de o procurar e não o
encontrar, revela que não consegue ter fé em Deus. No caso de Fernando Pessoa, além
de existir essa atitude, existe também a atitude em sentido inverso : apesar de dizer que
15
Escritos autobiográficos, automáticos, e de reflexão pessoal”, Lisboa, Ed. Assírio & Alvim, 2003, p. 76.
16
Ver sobre isso o livro de Andrés Ordoñez, Fernando Pessoa, um místico sem fé, Rio de Janeiro, Ed.
Nova Fronteira, 1994.
17
A educação do estoico, Lisboa, Ed. Assírio & Alvim, 2001, p. 337.
18
Eu sou uma antologia, Lisboa, Ed. Tinta da China, 2014, p. 263.
19
Textos filosóficos, o. c., p. 237.
Deus não existe, procura-o, conforme se pode ver por exemplo no Livro do
Desassossego, quando pergunta: “Onde está Deus, mesmo que não exista ?” 20 Álvaro
de Campos também exprime essa ideia, quando diz : “Dá-nos a Tua Paz,/ Deus Cristão
falso, mas consolador/ Dá-nos a Tua Paz, ainda que não existisses nunca”.21
A consciência que o Homem tem da sua finitude, e a sua aspiração à infinitude,
não deixa de ser uma aspiração, e não significa acreditar na existência dessa infinitude
enquanto Substância e Ser supremo. A consciência que o Homem tem da sua
imperfeição, e aspirar à perfeição, não deixa de ser uma aspiração, e não significa
acreditar na existência dessa perfeição enquanto Substância e Ser supremo. Há em
Fernando Pessoa essa aspiração, a busca de um sentido para a Vida, a procura de um
significado profundo para a existência humana, e a consciência de que esta Vida não
nos basta, mas isso não é a mesma coisa que acreditar em Deus. A busca da razão
profunda da existência, a demanda do Absoluto, pensar na essência dos fenómenos, e a
própria metafísica, não significa acreditar em Deus, pois houve muitos filósofos ao
longo da História que também tinham essa atitude, mas eram ateus. Sempre houve e há
ateus que apesar de serem ateus, foram e são indivíduos com uma abertura ao espiritual,
dado que a espiritualidade, sendo entendida em sentido lato, é uma tendência do ser
humano para buscar significado para a Vida por meios que transcendem o imediato, e
significa um sentido de ligação a algo maior que si próprio, mas que não tem
necessariamente a ver com Deus nem com as religiões. Há mesmo autores que
defendem a existência de uma espiritualidade no ateísmo, uma espiritualidade sem
dogmas, sem Igreja, e sem religiões. Por exemplo, o filósofo André Comte-Sponville
fala de uma “espiritualidade sem Deus”, significando isso uma abertura para o ilimitado,
um reconhecimento de que somos seres relativos mas abertos para o Absoluto. Significa
o reconhecimento do caráter misterioso e ilimitado da existência, mas que não necessita
de passar por uma explicação religiosa, e por aderir e militar num credo religioso.22
Além de ter escrito textos ateístas e contra as religiões, Fernando Pessoa
escreveu também alguns textos que são especificamente contra a Igreja Católica e
contra o clero, e nesta atitude Fernando Pessoa estava particularmente marcado pela sua
época. O período de cerca de cinquenta anos que decorreu entre 1870 e 1920 foi o mais
fértil período de manifestações ateístas e anticlericais da História Portuguesa, período

20
Livro do Desassossego, Lisboa, Ed. Assírio & Alvim, 2011, texto 88, p. 120.
21
Obra completa de Álvaro de Campos, Lisboa, Ed. Tinta da China, 2014, p. 364.
22
André Comte-Sponville, L’esprit de l’athéisme : introduction à une spiritualité sans Dieu (“O espírito do
ateísmo : introdução a uma espiritualidade sem Deus”), Paris. Ed. Albin Michel, 2006.
esse em que Fernando Pessoa viveu, e que muito o influenciou. Conforme afirmam os
historiadores, “de entre os grupos não católicos, contudo, o contingente mais numeroso
era o que se afirmava sem religião e que coincidia, em grande parte, com o dos livres
pensadores. Já em 1900 quase 1500 pessoas se tinham oficialmente declarado “sem
religião”. (…) Números citados por fontes católicas para os primeiros tempos da
República apontavam para mais de 50 000 livre pensadores confessos só na cidade de
Lisboa, a que havia ainda de acrescentar muitos neutros e indiferentes.”23
No que diz respeito à literatura e aos escritores, para o período entre os finais do
século XIX e as primeiras duas décadas do século XX, o investigador Luís Machado de
Abreu organizou uma coletânea de algumas dessas manifestações no seu livro Ensaios
anticlericais, onde se pode encontrar uma lista de diversas manifestações culturais
(literatura e ensaios), que revelam o ateísmo e o anticlericalismo da época de Fernando
Pessoa e dos anos que o precederam, e que passamos a descrever:
Na poesia anticlerical : Óscar Mário, Os Padres (1875); Gomes Leal, O anti-
Cristo (1884); Guerra Junqueiro, A velhice do Padre Eterno (1885); Guilherme Braga,
O Bispo, Nova Heresia em Verso (1895); Heliodoro Salgado, Através das Idades.
Poemeto (1899); Forjaz de Sampaio, O sol do Jordão (1903); Alfredo Pimenta, Para a
minha filha (1905); etc. No romance : Francisco Barata, Os Jesuítas na Corte (1877);
Eça de Queiroz, O crime do Padre Amaro (1880); João Bonança, O Século e o Clero
(1900); Baptista Dinis, Os crimes dos conventos (s/d.); etc. No ensaio : O Portugal
jesuíta (1893); Miguel Bombarda, A Ciência e o Jesuitismo (1900); Heliodoro Salgado,
O culto da Imaculada ( 1905) e Mentiras religiosas (1906); Brito de Bettencourt,
Catecismo ateu (1906); José Caldas, A corja negra ( 1914); Albino Forjaz Sampaio,
Palavras Cínicas (1905).
Conforme diz o provérbio, “diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és”. A
mesma coisa se pode dizer sobre as leituras de um indivíduo : “diz-me o que lês, e dir-
te-ei quem és”. Ora, na biblioteca particular de Fernando Pessoa, entre os livros que ele
comprou e que leu, há muitos livros ateístas, livros céticos em relação a Deus, e livros
contra as religiões. Fernando Pessoa tinha vinte e três livros de John Mackinnon
Robertson, um autor britânico, nascido em 1856, e falecido em 1933, que era o autor
mais representado na sua biblioteca, e sobre quem escreveu um poema (“Este tal
Robertson, diz Jesus Cristo”). Enquanto indivíduo Robertson era ateu, e enquanto autor

23
Joel Serrão, e António de Oliveira Marques, Nova História de Portugal – Portugal da Monarquia para a
República, vol. XI, Lisboa, Ed. Presença, 1991, p. 517.
nos seu livros também defendia que Deus não existe, e defendeu ainda, ao longo da sua
vida, a tese da inexistência do Cristo histórico, e foi ainda autor de vários estudos sobre
o livre pensamento. Havendo tantos livros deste autor ateu na sua biblioteca (vinte e
três), livros esses que Fernando Pessoa mandava vir de propósito de Inglaterra, 24 e que
portanto lhe ficaram caros financeiramente, e dado que Fernando Pessoa atravessou
dificuldades financeiras ao longo da sua vida, isto revela bem o seu interesse e o seu
gosto por esse autor. Na biblioteca de Fernando Pessoa, depois desse autor, o segundo
autor mais representado é o escritor racionalista e agnóstico H.G.Wells, outro autor
britânico, nascido em 186, e falecido em 1946, de quem Fernando Pessoa tinha também
uma boa quantidade de títulos : treze, e que também mandava vir de Inglaterra, ficando-
lhe portanto caros financeiramente (apesar das dificuldades financeiras de Fernando
Pessoa), o que também revela bem o seu interesse e o seu gosto por esse autor.
Além destes autores, há também a destacar na biblioteca de Fernando Pessoa os
seguintes autores ateus ou agnósticos : Félix Le Dantec, L’athèisme (“O ateísmo”), e La
lutte universelle (“A luta universal”); Ernst Haeckel, Les enigmes de l’Univers (“Os
enigmas do Universo”), e Origine de l’Homme (“Origens do Homem”); Binet Sanglet,
La folie de Jésus (“A loucura de Jesus”). Mas na biblioteca de Fernando Pessoa há
muitos mais autores ateístas e agnósticos, ou racionalistas, secularistas, e
antirreligiosos : Alfred William Benn, Samuel Laing, Ludwig Büchner, Edward Clodd,
Charles Darwin, G.H.Lewes, William Rathbone Greg, John Wilson, John Henry
Bridges, ThomasWhittaker, F.W.Newman, Frank Hill Perrycoste, Fred C. Conybeare,
Bertrand Russell, Gustav Spiller, Elystan Thomas, Edgar Roystone Pike, Chilperic
Edwards, George Seibel, Jocelyn Rhys, Aldous Huxley, e Herbert Spencer (de quem
tinha quase todas as obras).
Na biblioteca particular de Fernando Pessoa as obras sobre Cristo são bastante
críticas sobre este, destacando-se as obras de cariz crítico e histórico, em detrimento de
obras teológicas e místicas. Uma das obras de destaque sobre Cristo, é a de Binet
Sanglè, A loucura de Jesus, autor que Fernando Pessoa refere em alguns dos seus
escritos. Fernando Pessoa projetou mesmo um estudo crítico sobre esta obra, colocando
como seu autor o heterónimo Alexander Search (que não chegou a concretizar,
conforme sucedeu com muitos outros projetos). Fernando Pessoa leu e sublinhou essas
obras, ou a sua quase totalidade, conforme se pode confirmar através dos sublinhados e
24
No seu diário de 1915, Fernando Pessoa relata alguns factos para si importantes, no dia 9 de
Novembro. Um deles é o seguinte : “Chegaram alguns livros ingleses à Livraria Inglesa” ( Escritos
autobiográficos, automáticos e de reflexão pessoal, o. c., p. 159).
das anotações que fez, revelando portanto interesse pela descrença em relação a Deus, e
pela crítica às religiões.
Mas não é apenas a biblioteca particular de Fernando Pessoa que revela o seu
ateísmo, a sua antirreligiosidade, e o seu anticlericalismo. É visível em Fernando
Pessoa, desde muito novo, a sua rebelião contra Deus, contra a Igreja, e contra as
religiões em geral. Aos dezasseis anos de idade planeou escrever o conto The atheist
(“O ateísta”), planeado como a study of religion (“um estudo sobre a religião”), a
assinar pelo heterónimo David Merrick, embora não tivesse chegado a concretizar esse
projeto (como aliás aconteceu com muitos projetos de livros que não concretizou). Num
texto autobiográfico, sobre o trabalho literário que realizou logo após o seu regresso a
Lisboa (Fernando Pessoa tinha apenas dezoito anos), diz o seguinte : “Início do estilo
agressivo, antirreligioso”.25 Por volta dos vinte anos de idade Fernando Pessoa projetou
a publicação de O Phosphoro, que pretendia traduzir a aversão de Fernando Pessoa
contra a Monarquia e a Igreja Católica. 26, e O Iconoclasta , que Fernando Pessoa queria
que fosse “inimigo não só da Igreja, mas das religiões todas e da religião em si”. 27 Aos
vinte e dois anos de idade Fernando Pessoa inventou um heterónimo antirreligioso e
anticlerical : Charles Robert Anon, e através deste heterónimo Fernando Pessoa
escreveu alguns poemas, que estão incluídos no presente livro.
Ao longo de toda a sua vida Fernando Pessoa escreveu muitos textos ateístas,
antirreligiosos, e anti católicos, conforme se pode confirmar através da significativa
amostra desses muitos textos, que incluímos no presente livro, o que revela portanto que
isso não foi uma fase passageira, mas sim uma coisa que durou ao longo de toda a sua
vida. Por outro lado, a sua descrença em Deus e a sua crítica às religiões não é algo que
existe apenas num heterónimo, mas sim em praticamente todos os seus heterónimos. O
heterónimo Bernardo Soares, que é um dos mais representativos, com o qual Fernando
Pessoa muito se identificava, e que dizia que o Livro do Desassossego era uma
“biografia sem factos”, é um homem profundamente descrente em Deus, conforme se
pode confirmar nos diversos textos de Bernardo Soares aqui incluídos. Há quem tenda a
ver no ortónimo aquilo que mais pensava o próprio Fernando Pessoa. Ora, é
precisamente no ortónimo que há mais textos ateístas, antirreligiosos, e anticatólicos.

25
Escritos autobiográficos, automáticos e de reflexão pessoal, o. c., p. 25.
26
“Artigos no Phosphoro sobre a crise moral da sociedade portuguesa”, in Pessoa por conhecer, Lisboa,
Ed Estampa, 1990, p. 163.
27
Idem, p. 166.
Por outro lado, há que salientar que esses textos não são apenas textos literários,
mas também textos de ensaio, textos autobiográficos, e textos de reflexão pessoal,
conforme se pode constatar neste livro, o que revela que o ateísmo, a antirreligiosidade,
e o anticatolicismo são algo sentido do ponto de vista pessoal. Mas a atitude de
Fernando Pessoa sobre Deus e as religiões, não está apenas nos seus escritos, pois o
próprio Fernando Pessoa, enquanto indivíduo, além de não ter nenhuma religião, e de
não frequentar nenhuma Igreja, assumiu a sua forte crítica contra a Igreja católica, por
exemplo depois de ele e a sua editora terem sido alvo de críticas da Imprensa oficiosa
católica (o jornal A Época), e da então Associação de Estudantes Católicos, em
resultado da proibição dos livros dos seus amigos António Botto, e Raul Leal. Nos
últimos anos da sua vida revelou-se novamente a sua militância anticatólica, de que é
testemunho a sua defesa pública da Maçonaria, contra a lei de inspiração católica que
proibiu a Maçonaria e outras associações secretas.
Para concluir este prefácio, façamos alguns esclarecimentos sobre a organização
deste livro e sobre os seus critérios. Como é sabido, Fernando Pessoa não publicou
nenhum livro em vida (exceto a Mensagem), pois deixou tudo em manuscritos,
dispersos, e sem organização. Têm sido os investigadores quem tem reunido e
organizado esses textos, dando-lhes porém diferentes organizações. Na organização dos
textos de Fernando Pessoa, os textos têm aparecido pelo ortónimo, ou pelos
heterónimos, ou por poesia, e por prosa, e em alguns casos por temas. Com o presente
livro é a primeira vez que surge esta organização temática, e portanto é a primeira vez
que são reunidos e publicados os textos ateístas, antirreligiosos, e anticatólicos de
Fernando Pessoa, em resultado de uma investigação pormenorizada na sua vasta obra,
que foi publicada até hoje.
Esta nossa investigação está dividida entre Fernando Pessoa ortónimo, e os
heterónimos, e dentro destes, os heterónimos principais, e os outros heterónimos,
seguindo aqui os heterónimos uma ordem cronológica, isto é, aparecendo desde os mais
antigos até aos mais recentes. Dentro de cada um deles (ortónimo e heterónimos), a
sequência é por poesia, e depois por prosa, e dentro de cada conjunto de poemas e de
prosa, a sequência é cronológica (à exceção dos textos não datados, que colocámos no
final de cada um dos grupos mencionados).
Assim, temos neste livro o seguinte resultado : no ortónimo, sessenta e seis
poemas, dezoito contos e outros textos de ficção, vinte e sete textos de ensaio, dezasseis
textos autobiográficos e de reflexão pessoal, e oito projetos de textos. Nos heterónimos
principais, o resultado é o seguinte : em Alberto Caeiro, doze poemas, e um texto em
prosa; em Ricardo Reis, dez poemas, e nove textos em prosa; em Álvaro de Campos,
sete poemas, e seis textos em prosa; em Bernardo Soares, vinte e três textos em prosa.
Nos outros heterónimos, o resultado é o seguinte : em Charles Robert Anon, três
poemas, e três textos em prosa; em Horace James Faber, um poema; em Alexander
Search, onze poemas, e um texto em prosa; em Jean Séul de Méluret, um texto em
prosa; em Pantaleão, dois poemas, e um texto em prosa; em Joaquim Moura Costa, sete
poemas; Em Carlos Otto, um poema; em Vicente Guedes, um texto em prosa; no Barão
de Teive, um texto em prosa; em Raphael Baldaya, dois textos em prosa; em António
Mora, doze textos em prosa; em Friar Maurice, um texto em prosa; num heterónimo não
identificado, um texto em prosa.
Todos estes textos expressam ou ateísmo, ou agnosticismo, ou antirreligiosidade,
ou anticristianismo, ou anticatolicismo, e por vezes no mesmo texto essas atitudes estão
juntas (por exemplo a atitude ateísta e antirreligiosa). Existem mais textos que poderiam
ser incluídos neste livro, devido à subjetividade de muitos textos que Fernando Pessoa
escreveu, tratando-se sobretudo de textos literários, e dado que cada leitor tem a sua
própria maneira de interpretar os textos de Fernando Pessoa. No entanto, procurámos
fugir à subjetividade dos textos, por isso uns são de facto ateístas, outros são de facto
antirreligiosos, e outros são de facto anticatólicos. Alguns deles são especificamente
anticristãos, e portanto o anticristianismo inclui naturalmente o anticatolicismo, mas
para não alongarmos o título do presente livro, e para destacarmos o seu
anticatolicismo, que é aliás uma das razões do seu anticristianismo, optámos pela
designação de anticatolicismo. Incluímos também textos agnósticos, e textos que
expressam essas atitudes não tão diretamente, mas de modo associado, isto é, textos que
expressam ceticismo em relação a Deus, e textos que defendem o racionalismo como
via de conhecimento, tendo subjacente a crítica ao fenómeno religioso . Não incluímos
no título deste livro as designações de “textos agnósticos”, “textos céticos sobre Deus”,
e “textos racionalistas”, para o título não ficar demasiado extenso. No entanto, o
agnosticismo, o ceticismo religioso, e o racionalismo, estão relacionadas com o ateísmo
e a atitude contra as religiões, em Fernando Pessoa, por isso escolhemos as designações
mais abrangentes.
Os poemas aqui incluídos foram transcritos quase todos na sua totalidade,
havendo portanto poucas exceções, e quando não os incluímos na sua totalidade, isso
deve-se ao facto de a sua totalidade abordar outros temas que não os de Deus e das
religiões. Por exemplo, o extenso poema Rubayat, de Fernando Pessoa ortónimo, ou o
poema a Tabacaria, do heterónimo Álvaro de Campos, têm algumas partes em que se
expressa a descrença em Deus e a crítica às religiões, mas a totalidade desses poemas
não é sobre esse tema, e por essa razão transcrevemos apenas as partes respeitantes a
isso. No que diz respeito aos textos em prosa, em alguns deles também não
transcrevemos a sua totalidade, como por exemplo no conto O Banqueiro Anarquista,
assim como em outros textos, que assinalamos com o sinal (…), quando são textos
muito extensos, ou quando têm outros assuntos que não têm a ver com o assunto do
presente livro.
A sequência dos textos aqui apresentados, dado que é cronológica, não é uma
sequência conforme a designação deste livro (textos ateístas, textos antirreligiosos, e
textos anticatólicos), pois pode aparecer um texto ateísta, seguidamente um texto
antirreligioso, e de novo um texto ateísta; pode aparecer um texto anticatólico e depois
um texto ateísta; pode aparecer um texto antirreligioso, e depois um texto ateísta, etc.
Embora não sejam exatamente a mesma coisa, todas estas atitudes (ateísmo,
antirreligiões, e anticatolicismo) encontram-se em Fernando Pessoa, e confirmam-se,
reforçam-se e completam-se umas às outras : o seu anticatolicismo enquanto
consequência do seu ateísmo, o seu ateísmo enquanto consequência do seu
anticatolicismo, a sua antirreligiosidade enquanto consequência do seu ateísmo, o seu
ateísmo enquanto consequência da sua antirreligiosidade, etc., podendo existir portanto
individualmente ou em conjunto em cada um dos textos, mas inter-relacionando-se ao
longo deste livro.

Victor Correia
ÍNDICE
- Prefácio

ORTÓNIMO

POESIA

- Perante o Universo, mudo


- “Deus, soberba, infinito”
- Agnosticismo superior
- O mal e o crime
- Cantares
- Epitáfio – religião
- Beija-mão
- O raio de sol que irradia
- Ó sonho a quem primeiro eu chamei Deus
- Nova ilusão
- Tédio
- Últimas palavras
- Um Deus cansado de ser Deus em vão
- Paraíso
- Deus
- E, horror ! o braço
- Vivo entre cães
- Frei João
- Ah, quem nos dera a calma
- Buda
- Cansado dos deuses
- Epigrama
- Os lírios do país do sonho
- O louco sente-se Imperador ou Deus
- Os deuses, não os reis, são os tiranos
- Natal
- Ah, como o sono é a verdade
- Não são os reis e os povos rebeldes
- Sim, se Deus fora um, e fora justo
- Puseste a crença num Deus justo e bom
- Chorais em vão, no aspérrimo desterro
- Quais milagres de Lourdes, meu amigo !
- Sonhos, sistemas, mitos, ideais…
- Meus dias passam, minha fé também
- Que triste, à noite, no passar do vento
- Nunca soube querer
- Sim, sim, eu conheci-o
- Nas grandes horas em que a insónia avulta
- Na pior consequência de pensar
- Canto a Leopardi
- Se há arte ou ciência para ler a sina
- O cão que veio do abismo
- Solenemente
- Santo António
- S. João
- S. Pedro
- Sim, é o Estado Novo
- Poema de amor em estado novo
- Sobre as almas e a sua consciência
- Guerra Junqueiro
- A Cristo
- Há um método infalível
- A corveta andorinha
- E a alma, tendo sonhado os seus céus
- Oh miseráveis escravos
- Rubaiyat
- Fausto no seu laboratório
- Fausto ao espelho
- A vida é má e o pensamento é mau
- Já estão em mim exaustas
- Desejava querer fugir de mim
- Diálogo na noite
- Valendo mais ou menos entre si
- Morrer – esta palavra toda horror
- Ah que nunca a verdade definida
- Do eterno erro na eterna viagem

CONTOS E OUTROS TEXTOS DE FICÇÃO

- A hora do diabo
- Diálogo entre um católico e um cristão
- Marcos Alves
- Manuel Fontoura
- O banqueiro anarquista
- O padre Jesuíno
- O eremita da serra negra
- Doloroso
- Memórias de um ladrão
- Alegações finais
- O desconhecido
- Salomé
- Calvário
- Diálogo no jardim do palácio
- Diálogo sobre a tirania
- Diálogo filosófico
- Metafísica do Dr. Neibas
- Na Casa de Saúde de Cascais

TEXTOS DE ENSAIO

- Introdução ao estudo da metafísica


- Não será um defeito considerar o aspeto metafísico
- O Cristianismo historicamente considerado
- O facto capital da nossa civilização
- O fenómeno religioso é um elemento dissolvente das sociedades
- Civilização cristã
- O que a nós verdadeiramente nos caracteriza
- Os caminhos do misticismo e da magia
- O misticismo
- A mediunidade e o espiritismo
- Os argumentos relativos à demonstração da existência de Deus
- Teísmo
- No fundo, o Homem religioso é um hedonista
- A Religião
- A Filosofia grega
- É, porém, um facto religioso que a religião
- Libertemos o nacionalismo dos seus agregados espúrios
- Concebendo a verdade só como católica romana
- Há três forças realmente internacionais
- Marcha sobre Roma
- Fátima
- Paris, Londres, Roma
- Heróstrato
- A carência de uma fé religiosa
- Desde que no Homem desperta e vive o pensamento abstrato
- O Homem é essencialmente egoísta
- Na fórmula do Concílio
- O segundo elemento do martírio moral
- Combativo, o árabe

TEXTOS AUTOBIOGRÁFICOS E DE REFLEXÃO PESSOAL

- Páginas do Diário
- Depressa descobri que a minha constituição era assim
- Não amava eu Heraclito ternamente
- É agora necessário que eu diga que espécie de homem sou
- Ficarei o inferno de ser eu
- O homem bobo da sua aspiração
- O grande Shakespeare que é toda a gente
- Nunca realizamos o que queremos
- Para Orpheu
- Uma estranha náusea
- Há coisas em mim
- Felizes aqueles
- A minha imagem
- Aqueles que sofrem
- Explicação de um livro
- Carta ao prior dos Mártires

PROJETOS DE TEXTOS

- Plano literário d’“O Phosphoro”


- Artigos no “Phosphoro”
- O Iconoclasta. Quinzenal
- O Iconoclasta
- Um grande poeta materialista
- O livro da transformação, ou livro das tarefas
- Trilogia da noite
- David Merrick – livros a sair

HETERÓNIMOS PRINCIPAIS

ALBERTO CAEIRO

POESIA
- Há metafísica bastante em não pensar em nada
- Esta tarde a trovoada caiu
- Num meio dia de fim de Primavera
- Só a Natureza é divina, e ela não é divina…
- Se quiserem que eu tenha um misticismo
- Bendito seja o mesmo sol de outras eras
- Seja o que for que esteja no centro do mundo
- Ah querem uma luz melhor que a do sol !
- Tu, místico, vês uma significação em todas as coisas
- Gosto do céu porque não creio que ele seja infinito
- Ponham na minha sepultura
- Quem tem flores

PROSA

- Entrevista

RICARDO REIS

POESIA

- Não porque os deuses findaram


- Aqui, sem outro Apolo do que Apolo
- Meu gesto que destrói
- Nada me dizem vossos deuses mortos
- Não torna ao ramo a folha que o deixou
- Se em verdade não sabes
- Quero dos deuses só que me não lembrem
- Os deuses e os Messias que são deuses
- Se a cada coisa há um Deus que compete
- Amo o que vejo porque deixarei

PROSA
- Um dos mais perniciosos efeitos da religião
- Olhado com desprezo e aversão indiferente
- O Cristianismo está em liquidação
- Reconstruir o paganismo
- Ao contrário da sensibilidade cristã
- Maurras e os seus são os românticos da disciplina
- A religião é a redução de uma coisa legítima
- A Ciência não curará muitos vícios, mas também não provoca nenhum

ÁLVARO DE CAMPOS

POESIA

- Não há abismos !
- Tabacaria
- Carry Nation
- Esta velha angústia
- Barrow-on-Furness
- Dá-nos a tua paz
- Ultimatum

PROSA

- O meu mestre Caeiro


- Desde que se pensa a sério em qualquer coisa
- Deus é um conceito económico
- Mensagem ao diabo
- O que a nossa época sente
- Entrevista

BERNARDO SOARES
- Nasci em um tempo
- Quando, como uma noite de tempestade
- Choro sobre as minhas páginas imperfeitas
- A Metafísica pareceu-me sempre
- Onde está Deus, mesmo que não exista ?
- Quando nasceu a geração a que pertenço
- Somos morte
- Quantas coisas, que temos por certas ou justas
- Não se subordinar a nada
- Nenhum prémio certo tem a virtude
- Desde o meio do século dezoito
- Tão dado como sou ao tédio
- A História nega as coisas certas
- Adoramos a perfeição, porque a não podemos ter
- Pertenço a uma geração que herdou a descrença na fé cristã
- A loucura chamada afirmar, a doença chamada crer
- O campo é onde não estamos
- Quedar-nos-emos indiferentes
- Nunca tive alguém a quem pudesse chamar “Mestre”
- Atingir, no estado místico
- O mais alto grau do sonho
- Morreu pela pátria
- Sinfonia na noite inquieta

OUTROS HETERÓNIMOS

CHARLES ROBERT ANON

POESIA

- Seja feita a tua vontade


- Epitáfio de Deus
- Epitáfio da Igreja Católica

PROSA

- Excomunhão
- Um ódio às instituições
- Eu era um génio

HORACE JAMES FABER

- Plausibilidade de todas as Filosofias

ALEXANDER SEARCH

POESIA

- Trabalho
- Obra de Deus
- O Apóstolo
- Homens de Ciência
- A última das coisas
- O padre e o carrasco
- Epigramas
- Ninharias
- A mulher de negro
- A tristeza veio para chorar
- Epitáfio

PROSA

- Pacto para a vida de Alexander Search


JEAN SEUL DE MÉLURET

- O caráter mais repugnante dessas obras

PANTALEÃO

POESIA

- Abaixo a guerra, a tirania


- Há um método infalível

PROSA

- Carta

JOAQUIM MOURA COSTA

- Disse Deus a Moisés


- Este tal Robertson, diz Jesus Cristo
- Nada
- Ao poeta Gomes Leal
- A Igreja Católica
- O Diabo
- Origem metafísica do Padre Matos

CARLOS OTTO

- Epigrama

VICENTE GUEDES

- O asceta
BARÃO DE TEIVE

- Pertenço a uma geração

RAPHAEL BALDAYA

- Tratado da negação
- Os místicos, esotéricos e outra gente assim

ANTÓNIO MORA

- Como vimos
- Causas da religião
- A Igreja Católica é a inimiga de todo o nacionalismo
- A religião cristista
- Dizei-me porém se, ignorantes de todo o Cristianismo
- Teoria dos deuses
- O Cristianismo, pelas três origens que teve
- Com o assédio e a decadência da religião cristista
- Das virtudes a que o Cristianismo incita
- Uma demonstração, feita sobre uma lenda conhecida
- A que leva a moral excessiva ?
- Adentro do paganismo não há heresias

FRIAR MAURICE

- Porque sou tão infeliz ?

- HETERÓNIMO NÃO IDENTIFICADO

- Imoralidade do Catolicismo
- Bibliografia
- Índice

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