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explicita-o-que-e-isso-e-como-trabalha-la

Publicado em NOVA ESCOLA 04 de Janeiro | 2017

Consciência fonológica

Alfabetização e
consciência fonológica:
como trabalhá-las?
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) defende o
trabalho com a consciência fonológica. Veja como aliá-lo
às práticas sociais de leitura e escrita

O que você vai aprender neste material do Guia?

Que a BNCC incentiva a aliar práticas sociais de leitura e escrita com


momentos de aprendizagem do sistema de escrita alfabética.
A intencionalidade da seleção dos gêneros textuais levando em
consideração a cultura infantil.
A refletir sobre a sonoridade das palavras para pensar em jogos
fonológicos, por exemplo.
Incentivar a reflexão sobre a correspondência entre o oral e o escrito.
Multiletramento: trabalhar textos multissemióticos e multimodais
pensando no uso pedagógico da tecnologia.

O desafio que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) traz para o professor
é o de aprender a articular as diferentes facetas da apropriação da língua
escrita. Isso significa aliar o trabalho com as práticas sociais de leitura e
escrita com momentos de aprendizagem do sistema de escrita alfabética.

Como fazer isto na prática? Há escolas que já seguem por este caminho. “O
texto é o ponto central e, com base nele, consigo definir meus conteúdos. Mas
não deixo de lado a letra ou a questão sonora, que são importantes também”,
conta Ana Lúcia Pinto Antunes, professora da EEI Padre Quinha, em Petrópolis
(RJ).

A centralidade do texto está indicada na Base. “É importante que fique claro


ao docente que texto não é pretexto para análise da língua, mas contexto,
pois pode favorecer a alfabetização, colaborando para a compreensão de
conteúdos linguísticos”, explica Liane Castro de Araujo, professora da
Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia. Sendo assim, é
preciso ter intencionalidade na escolha. Essas opções serão mais ricas
quanto maior o repertório do professor quanto aos diversos gêneros
textuais, especialmente a literatura infantil, mas não exclusivamente.

Para isso, o docente pode considerar as culturas infantis tradicionais e


contemporâneas, as brincadeiras da tradição oral e as situações lúdicas.
Ana Lúcia gosta de levar parlendas, cantigas e trava línguas para a turma.
“Com base nesses textos, cujas finalidades são brincar com a língua, os alunos
conseguem refletir sobre o que se diz e o que se escreve e, ao criarem
repertório, podem elaborar novos textos inspirados naqueles que
conheceram”, conta a professora.

Outra opção é utilizar jogos fonológicos. Um dos utilizados por Ana Lúcia é
um jogo de trincas, no qual são distribuídas várias imagens. A proposta é
reunir três em que as palavras que representam a imagem terminem com o
mesmo som, como gato, rato e mato. Primeiro, a professora divide a turma
em grupos para estimular a colaboração entre eles. Um dos critérios para
definir quem irá jogar com quem pode ser colocar uma criança que tenha
maior familiaridade com brincadeiras da tradição oral e, portanto, está mais
acostumada a prestar atenção na sonoridade das palavras, com outra que
não tenha tanta, indica Liane.

Durante a atividade, Ana Lúcia reserva um tempo para as crianças pensarem


em como irão agrupar as trincas. Ela, então, percorre a sala e faz intervenções
apenas quando um grupo está com dificuldade. Em geral, a primeira pergunta
é: Qual o critério que vocês utilizaram para escolher as trincas? Às vezes, os
alunos se concentram na imagem e separam todos os animais, por exemplo.
Aí ela relembra que a ideia do jogo é prestar atenção no som das palavras, em
como elas terminam. É muito comum também eles privilegiarem as palavras
que começam com a mesma letra. Neste caso, ela pontua: Ótimo, mas desta
vez quero que pensem no final da palavra. E pode exemplificar: Aqui temos
feijão e macarrão, o que é parecido no som delas? Qual outra imagem
também tem som semelhante?

Não há regras para as intervenções, mas o professor deve dosar para manter
um equilíbrio entre a questão pedagógica e o lúdico. “Já vi docente que
interrompe toda hora para sistematizar questões trazidas na brincadeira. Não
dá para interferir sempre, pois se corre o risco de perder a característica de
jogo. A função lúdica tem de ser garantida”, explica Liane.

Depois que as crianças brincaram, Ana Lúcia propõe momentos de reflexão


incluindo a escrita para ampliar a possibilidade de análise já presente no oral.
“Se fizer só o jogo, ficarei apenas no campo fonológico. Mas, em geral, quero
que eles façam a ligação entre fonema e grafema, que compreendam o que
cada som representa”, explica. Para sistematizar o aprendizado, as estratégias
podem variar conforme a turma, o tempo disponível e o propósito. No caso
do jogo de trincas, podem ser: pedir para as crianças indicarem quais trincas
elas agruparam, perguntar como se escreve cada palavra e anotar no quadro;
pegar o alfabeto móvel e pedir para os grupos montarem as palavras na mesa;
ter uma série de tirinhas, já prontas, com as palavras utilizadas no jogo,
convidar as crianças a apontar onde estão aquelas correspondentes às
imagens da trinca que ela formou e colocar cada tira junto da imagem que ela
representa, entre outras.

O importante é a conversa que ocorre durante esse processo. A professora


pode questionar: Vamos olhar essas três palavras que estão juntas, o que elas
têm de parecido? Essa começa com uma letra e essa com outra, mas o final é
sempre o mesmo? Que outras palavras vocês conhecem que também
terminam com essas letras? O objetivo é conduzir os alunos a refletir sobre a
correspondência entre o oral e o escrito e levá-los a reconhecer como
surgem as rimas, além de ampliar o vocabulário. “É um momento importante
também para eu avaliar o desenvolvimento da aprendizagem deles”, completa
Ana.

Para Liane, essa é uma ótima maneira de explorar a dimensão sonora da


língua e apresentar as letras aos alunos. “Os jogos incidem sobre os aspectos
fonológicos e notacionais da língua. Portanto, a reflexão linguística não vem
como aquisição mecânica, uma vez que o jogo por si só é uma prática cultural
e serve como contexto para a análise da língua. Adultos jogam palavra
cruzada, forca, entre outros”, conclui a especialista.

Como trabalhar no mundo digital


Outro ponto que ganhou ênfase com a BNCC é a questão dos
multiletramentos. “Quando os professores leem que é preciso trabalhar
textos multissemióticos e multimodais, nos modos sonoros, verbais, visuais
e a relação deles com as novas tecnologias, podem ficar preocupados. Na
verdade, isso pode ser feito ao trazer para a alfabetização os textos
comunicativos comuns do dia-a-dia. Uma conversa no Whatsapp, aplicativo
utilizado por muitas famílias, pode ser uma oportunidade de aprendizagem,
assim como áudios, vídeos e jogos, tão presentes entre os estudantes”,
exemplifica Isabel Cristina Frade, professora titular e pesquisadora do Centro
de Alfabetização e Escrita da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Ela sugere que, na hora de planejar as atividades, os docentes pensem em
algumas questões: “Se as crianças já conseguem navegar e localizar um vídeo,
como a escola pode se aproveitar desse conhecimento e colocar isso a favor
da alfabetização e do uso da Língua Portuguesa? Que alfabetização
audiovisual é importante o aluno adquirir para ter uma visão crítica sobre as
mídias que permeiam sua vida?”

Para muitos educadores, há um desafio anterior: buscar formações


específicas para suprir um conhecimento que não foi adquirido em suas
formações iniciais. Foi o que ocorreu na Escola de Educação Integral Padre
Quinha. “A inserção nesse mundo virou uma preocupação para todos aqui”,
conta Ana Lúcia. Para se preparar, ela fez várias oficinas com a professora
Cristiane Alves, do Sesi de Petrópolis, que há anos estuda como associar
tecnologia e educação. O objetivo era descobrir como fazer um uso
pedagógico da tecnologia. “Eu não queria apenas levar meus alunos para a
sala de informática e propor atividades isoladas”, explica Ana.

Em sala, Ana Lúcia desenvolveu várias propostas. Em uma delas, começou


com rodas de conversa, em que discutiu com os alunos a questão da
identidade. A ideia era leva-los a refletir sobre as diferenças e as semelhanças
entre eles. Depois, com um aplicativo, cada um criou um avatar com suas
características físicas: cor e formato do cabelo, cor dos olhos, da pele etc. Ana,
então, imprimiu esses desenhos em papel e pediu para as crianças
escreverem na folha as características utilizadas para montar o avatar. Ao lado
dessas, o convite foi para colocarem as características psicológicas: qualidades
e defeitos de cada um. Essa parte rendeu outro bate-papo sobre o fato de ser
normal as pessoas terem qualidades e defeitos. Para completar, foram
gravados vídeos em que cada criança se apresentava e falava, apoiadas no
que tinham escrito, suas características. Na edição, a professora acrescentou
os avatares de cada estudante e apresentou o resultado para as famílias.
“Consegui trabalhar oralidade, escrita e leitura, além de debater empatia e
diversidade”, finaliza Ana Lúcia.

Para as instituições que não têm laboratórios de informática, acesso à


internet, entre outras limitações relacionadas à infraestrutura digital, Isabel dá
opções: “Imagens, pinturas, livros com formas diversas de leitura, diagramas,
ilustrações sofisticadas e infográficos podem ser apresentados à turma. Isso
porque um texto pode ser multissemiótico sem ser multimídia”, explica. A
proposta, então, é levar todo esse material para a sala de aula, ler, discutir,
brincar e produzir textos, sem perder de vista a intencionalidade e a clareza
quanto aos objetivos do trabalho.

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