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A

PREPARAÇÃO
DE „
SERMÕES

AS TE
SÃO PAVLO
Aquele que é chamado por Deus

para proclamar o F.vangelho... poderá

no púlpito fazer muito do seu melhor

trabalho para o Tempo é para a Eter-

nidade.

Que devemos entender por precação?


Significa a Verdade Divina apresentada
de tal modo que vá ao encontro das
necessidades humanas... Aquele que
sobe ao púlpito considera-se chamado
de Deus para aplicar essa Verdade.

Talvez não concordes com Karl Barth

noutros assuntos, mas tens de aceitar,

com certeza, aquilo que diz a respeito

da pregação. O teólogo suiço insiste

em que Deus se faz conhecer de três

maneiras: de forma suprema em Cristo,

de modo geral pela Bíblia, e também

por intermédio da pregação da Igreja,

hoje.

Êstc livro parece-me a coisa mais

importante que escrevi.

A. W. Bíac/ctuood
ANDREW WATTERSON BLACKVVOOD

if LÍBER
ASSOCIAÇÃO DE SEMINÁRIOS TEOLÓGICOS EVANGÉLICOS
CONSELHO DELIBERATIVO
Júlio A. Ferreira
Presidente

Joaquim Beato, Thurmon Bryant, Roberto Grant, Wilson Guedelha,


V. James Mannoia, David Mein, Harding Meyer, A. Ben Oliver, Otto
Gustavo Otto, Paulo Pierson, Arnaldo Schmidt. Henrique Todt Jr.

Aharon Sapsezirn
Secretário Geral A
Edições da A S T E
DE
A VENDA

V O C A B U L Á R I O B Í B L I C O , de Jean-Jacques von Allmen


ERMÕES
O P R O T E S T A N T I S M O BRASILEIRO, de Emile G. Leonard
O C A T O L I C I S M O R O M A N O — um simpósio protestante
O P E N S A M E N T O D A REFORMA, de Henri Strohl
PEDRO — D I S C Í P U L O . A P Ó S T O L O E MÁRTIR, de Oscar Cullmann
A I N T E G R I D A D E D A P R E G A Ç Ã O , de John Knox Tradução de
A P S I C O L O G I A D A R E L I G I Ã O , de Paul Pierson
A P E S S O A DE CRISTO, de G. C. Berkouwer D. Macedo
D E U S E S T A V A EM CRISTO, de Donald M. Baillie

NO PRELO

O E N S I N O DE JESUS, de T. W. Manson
FÉ B Í B L I C A E ÉTICA SOCIAL, de E. C. Gardner
A IGREJA N O N ô V O T E S T A M E N T O , de G. Kittel
O N Ô V O T E S T A M E N T O — L Í N G U A , T E X T O E C Â N O N , de B. P.
Bittencourt
A FÉ CRISA, de G. Aulén

EM PREPARAÇÃO

T E O L O G I A D O NÔVO T E S T A M E N T O , A. Richardson
E P Í S T O L A A O S R O M A N O S , de F. J. Leenhardt
A R E L E V Â N C I A DOS PROFETAS, de R. B. Y . Scott
D O C U M E N T O S D A IGREJA CRISTA, de H. Bettenson
JEREMIAS, de C. A. Skinner
A N A T U R E Z A M I S S I O N A R I A D A IGREJA, de J. Blauw
HISTÓRIA D A IGREJA CRISTA, de W. Walker
A T L A S BÍBLICO, de H. H. Rowley A S T E
A D O U T R I N A B Í B L I C A D O H O M E M N A SOCIEDADE, de G. E. SÃO PAVLO
Wright
Titulo do original inglês:

THE PREPARATION OF SERMONS

Abingdon Press, Nova York e Nashville


1948

Seminário Concórdia
Biblioteca
SÍSÍ. aagfli^g
Dedicado
a
Data M Todos Aqueles Que Orientam
os
Ministros de Amanhã
na
Arte de Pregar

Edição em língua portuguesa, com a colaboração do


F U N D O DE E D U C A Ç Ã O TEOLÓGICA
pela
A S S O C I A Ç Ã O DE S E M I N Á R I O S TEOLÓGICOS E V A N G É L I C O S

1965
São Paulo
ÍNDICE

Pág.
PREFÁCIO 11
I. A OBRA DO PREGADOR 15
II. O SENSO DAS NECESSIDADES HUMANAS .... 24
III. OS PRIMÓRDIOS DE UM SERMÃO 39
IV. O COSTUME DE USAR UM TEXTO 48
V. O VALOR DOS SERMÕES TEXTUAIS 60
VI. A NECESSIDADE DA OBRA EXPOSITIVA 70
VIL A BUSCA DE OUTROS MATERIAIS 84
VIII. A ESCOLHA DE TÓPICOS PARA SERMÕES . . . 97
IX. EM FAVOR DE SERMÕES TÓPICOS 109
X. A ARTE DA INTRODUÇÃO 118
XI. A PREOCUPAÇÃO PELA ESTRUTURA 135
XII. VARIEDADE DE ESBOÇOS 146
XIII. O USO DE ILUSTRAÇÕES 163
XIV. O PODER DA CONCLUSÃO 147
XV. O HÁBITO DE ESCREVER SERMÕES 186
XVI. AS CARACTERÍSTICAS DO ESTILO EFICIENTE 195
XVII. A PREPARAÇÃO PARA ENUNCIAR 205
XVIII. A ENUNCIAÇÃO DO PÚLPITO 219
XIX. A UTILIDADE DO RÁDIO 234
XX. O PROBLEMA DA DURAÇÃO DO SERMÃO ... 242
XXI A MENSAGEM PARA CRIANÇAS 251
XXII. ÉTICA DAS CITAÇÕES 260
XXIII. O SERMÃO COMO ATO DE CULTO 269
XXV. O CALENDÁRIO CRISTÃO 276
ÍNDICE DAS PASSAGENS BÍBLICAS 233
PREFÁCIO

Este livro parece-me a coisa mais importante que escrevi. Êle


mostra o que aprendi pelo estudo da pregação e como mudou meu
pensamento sobre o assunto. Por mais de dez anos encarei a ho-
milética como ciência; em aproximadamente outra década inves-
tiguei a pregação como arte; por mais ou menos dez anos estive
engajado no estudo de sermões. Agora vejo que este último está
mais perto do ideal, porque combina as vantagens das outras duas
tentativas e evita a maior parte de suas fraquezas. Fixa a atenção
na preparação para o púlpito e não na teoria da pregação ou na
personalidade do pregador.
Por causa do tamanho do campo e os limites de espaço, discuto
menos a pregação em si, do que o modo de pregar. Em nosso se-
minário, como em tôãa parte, outros professores tratam do conteú-
do da pregação, mas no departamento prático tentamos aprender
como pregar. Isto nos parece muito mais difícil, pelo menos po-
demos encontrar pouca orientação em livros. Se alguém questio-
nar a dificuldade, tente mostrar ou dizer a um grupo de estudan-
tes ao ministério como preparar e enunciar um sermão. Aqui, en-
tão, devemos considerar "a palavra esquecida pelos pregadores —
"como".
A guisa do motivo para este livro, posso fazer eco a um pro-
fessor da Universidade de Colúmbia: "Comecei a escrever como
meio de alcançar o maior auditório possível, ou, se preferir, como
meio de trazer o público à minha sala de aulas. Ouso dizer que
nunca escrevi com outro propósito."' O único "público," que
desejo alcançar, consiste do melhor povo que conheço: estudantes

l John Erskino, The Memory of Certain. Persons, Filadélfia, J. B. Lippincott


Co., 1947, p. 182.
12 PREFÁCIO PKEFÁCIO 13

artista, o pregador aprende melhor fazendo, pressuposto que sem-


para o ministério, pastores no campo e missionários além dos sete
pre prega o melhor possível. Assim o nosso amigo precisa observar
mares. Depois de Deus, o futuro da Igreja e a esperança do Reino
seu progresso, especialmente quando se aproxima da meia idade.
estão nas mãos destes amigos, pois eles levam o Evangelho aos
A menos que tome cuidado, pode decair e pregar sermões mais
homens.
fracos aos quarenta do que aos trinta anos. O pregador pode não
Em primeiro lugar vêm os estudantes de Teologia. Na Repú- perceber que começou a regredir, mas os leigos percebem. Se dis-
blica de Platão, eles precisam aprender que "a direção, em que um cutir com um diácono ou ecónomo, "não polido demais para dizer
homem fôr colocado pela educação, determinará a obra de sua a verdade, o pregador poderá começar a corrigir seus caminhos.
vida". No seminário, quem quer que deva tornar-se ministro, pode Descobrirá que a falta está no estudo, ou na falta de estudo e de
aprender a pregar. Com o professor e com os livros êle pode apren- método de trabalho.
der a manejar os instrumentos, em espírito de oração êle pode Em meio a suas leituras e seu estudo, o ministro deve prepa-
formar hábitos de trabalho, na classe e no estudo pode fixar ideais rar e enunciar os seus sermões de maneira toda própria e não como
que nunca precisará mudar, embora possa considerá-los muito ele- qualquer gigante do púlpito, contemporâneo ou passado. Em nos-
vados. Em resumo, cada pregador jovem deve efetuar a sua própria sos dias poucos ministros podem esperar tornar-se oradores do púl-
salvação. pito, mas cada pregador pode aprender a preparar-se para seu pró-
prio púlpito e descobrirá na preparação muitas das mais santas
Em seguida vêm os pastores no campo, inclusive os missioná- alegrias terrenas.
rios distantes, tanto homens como mulheres. Ano após ano, um
Se qualquer pastor ouscar primeiro o reino ãe Deus, amar todo
liãer paroquial sábio lê um ou- dois livros sobre pregação, para tes-
tipo ãe pessoas, estudar a obra da pregação e preparar-se para a
tar seu trabalho de púlpito e planejar sermões ainda melhores. Se
eficiência no púlpito, ãe acordo com os ideais deste livro, pode
algum pastor, na sua pátria ou no estrangeiro, desejar seguir o
crescer ano após ano como pregador. Por que, então, qualquer arau-
caminho achado neste livro, poderá- ajudar a promover um reavi-
to ãe Deus deverá pensar em atravessar a meta final antes ãa mor-
vamento da pregação — reavivamento que já parece ter começado.
te? Quem resolverá preparar sermões, semana após semana, ãe ma-
Jovem ou maduro, o estudante ãa pregação tratará de casos
neira a promover um reavivamento ãa pregação, como a mais no-
na forma de sermões dos mestres. De acordo com John Dewey
bre tarefa na terra? "O Deus Todo-poãeroso tinha somente um
"não pode haver descoberta de um método sem casos a serem es-
Filho e Êle tornou-se Pregador."
tildados. O método é derivado âa observação do que realmente
acontece, com vistas a que aconteça melhor na próxima vez." * O Desejo agradecer às seguintes pessoas, que me ajudaram neste
valor de tal trabalho depende muito do cuidado na seleção dos casos. livro: a sra. Blackwood e nossos filhos do ministério; bibliotecários
Para isto preparei um volume de sermões representativos dos mais e professores, aqui e em tôãa parte; pastores e estudantes ãe semi-
conhecidos pregadores de ontem e de hoje. ! nário. Estes dois ajudaram na leitura das provas: John P. Amstut
e Harolã E. Davenport. Inúmeros outros me fizeram gentilezas
O estudante ãa pregação poderá aprender ainda mais prepa-
que nunca poderei sequer começar a retribuir.
rando e enunciando seus próprios sermões. Como qualquer oíííro

Andrew Watterson Blackwood


2 Educalíon and DemocTiicy, Nova York, The MacmUlan Co., 1920, p. 197.
Ver The Protes2<mt Pulpi!, Nova York e Nashville. Abíngdon-Cokesbury Press,
1947.
CAPÍTULO I

A OBRA DO PREGADOR

A PREGAÇÃO DEVIA SER considerada a mais nobre ta-


refa que existe na terra. Aquele que é chamado por
Deus para proclamar o Evangelho deveria destacar-
se como o homem mais importante na sua comunidade, e tudo
quanto fizesse para Cristo e para a Igreja deveria manifestar-se na
sua pregação. No púlpito êle poderá fazer muito do seu melhor
trabalho para o tempo e para a Eternidade. Em geral devemos
empregar nossos superlativos parcimoniosamente, mas não quando
falamos da obra do pregador.
Que devemos entender por pregação? Significa verdade divina
através da personalidade ou a verdade de Deus apresentada por
uma personalidade escolhida, para ir ao encontro das necessida-
des humanas. A verdade divina vem principalmente das Escritu-
ras, mas também existe em outras fontes. As necessidades do
homem são especialmente resultado do pecado, mas têm a sua
origem, também, em outras causas. Aquele que sobe ao púlpito,
considera-se chamado de Deus para aplicar essas verdades, para
satisfazer essas necessidades uma após outra. Esta forma de pen-
sar foi a de Phillips Brooks. Na melhor série das Conferências de
Lyman Beecher neste sentido \ êle descreve a pregação como a
"apresentação da verdade através da personalidade", e como "a
comunicação da verdade aos homens mediante o homem". Em
todas as conferências dessa série, e nos seus dez volumes de sermões,
o famoso pastor de Boston demonstrou que queria ajudar os ami-
gos que enchiam os bancos da Igreja da Trindade.

Lecítires on Preaching, Nova York, E. P. Dutton & Co., 1898, Cap. I.


16 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A OBRA DO PREGADOR 17

Por outro lado, a pregação requer a interpretação da vida ho- As necessidades humanas. Faze eloquentes os seus lábios
dierna a partir da luz que hoje vem de Deus, principalmente atra- Para o direito cingir e todo o mal quebrar!
vés das Escrituras. Esta maneira de encarar o assunto está de
acordo com os ideais de João Bunyan, que nos ensinou a conside- Um estudo de pregação no Novo Testamento começa com
rar o ministro como habitante na "casa do intérprete". Ali êle João Batissa, arauto evangelista que só foi superado pelo Senhor. A
aprende a usar as verdades de Deus para ir ao encontro das neces- lista dos pregadores inclui Pedro, Paulo e o autor da Epístola aos He-
sidades do homem. Tanto no púlpito como na sua paróquia, es- breus. Na verdade, o Novo Testamento é constituído, na sua maior
força-se por interpretar a vontade de Deus para aqueles que o pro- parte, de pregação apostólica guardada pela Igreja Primitiva. 2

curam em busca de orientação. Estes homens figuram na História principalmente como pregado-
Por que consideramos tal intérprete o homem mais importante res do Evangelho. Antes de iniciarem a sua tarefa, os futuros após-
em qualquer comunidade, e a sua pregação como a parte mais im- tolos viveram com o Mestre Supremo e aprenderam a pregar com
portante da obra de toda sua vida? Analisemos a História da Êle. Nosso Senhor, nos dias da sua carne, gastou muito do Seu
Igreja para achar uma resposta. Infelizmente podemos apenas ministério ativo na "preparação dos doze". Por quê? Sem dúvida,
3

dar um relance sobre alguns dos arautos de Deus em cada época, porque Êle queria que a Igreja desde os seus primórdios exaltasse
mas podemos ver o suficiente para esclarecer o nosso argumento. a obra do pregador.
Se alguém deseja tornar-se mestre na pregação, tem que estudar a A História da Igreja Primitiva nos ensina a mesma lição, tanto
História da Igreja, com uma ênfase especial em sermões represen- positiva como negativamente. Nesses primeiros dias, quando a
tativos. maré da vida e do poder espiritual atingia as alturas, a pregação
ocupava o primeiro lugar no pensamento dos líderes. Considere-
A HISTÓRIA DA PREGAÇÃO mos, por exemplo, Crisóstomo, Agostinho e Ambrósio. Estes ho-
mens destacavam-se em outros predicados, mas, acima de tudo, co-
No Velho Testamento, os profetas destacavam-se dos outros mo pregadores. Todos eles sobrevivem na História principalmente
homens. Quando Sargent pintou seu friso dos profetas na Biblio- por sua pregação. Por outro lado, sempre que qualquer outra coisa
teca Pública de Boston, apresentou um grupo de homens inigua- usurpava o lugar do púlpito na Igreja Primitiva, a espiritualidade
láveis na força da .sua personalidade e no poder da sua palavra. do povo de Deus sofria um declínio. 4

Pensemos em Isaías e Amós, Oséias e Miquéias, Jeremias e Ezequiel, Em toda a Idade Média, dois homens, mais do que todos, tor-
e outros profetas menos conhecidos hoje. Estes homens falaram naram-se caros ao povo de Deus. Não foram contemporâneos, mas
em épocas diversas, mas todos estão inter-relacionados, pois que de- viveram suficientemente próximos para marcar o período áureo da
monstram o significado da "verdade através da personalidade". Idade Média. Tal como os Apóstolos e os Pais da Igreja Primitiva,
Cada um deles se considerava, acima de tudo, intérprete da ver- Bernardo de Clairvaux e Francisco de Assis sobressaíram-se noutros
dade de Deus, para ir ao encontro das necessidades do homem no campos, mas tanto um como outro se considerava, acima de tudo,
seu tempo. Por isso cantamos quando um novo ministro é
ordenado:
2 C. H. Dodd, The Apostolic Preaching and its Developments. Londres, Hodder
& Stcughton, 1936.
Ó Deus dos Profetas, abençoa os filhos dos Profetas! a
Com o mesmo título ver a obra de A. B. Bruce, Nova York, Geo. H. Doran
Dá-lhes a unção de Profetas! A Palavra divina Tua, Co., 1908.
Ver Kenneth S Latourette, A Hislory of the Expansion of Chrislianity,
Atendam os seus ouvidos; seus corações desperta para
4

Nova York, Harper & Bros., 1937, vol. I.


18 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A OBRA DO PREGADOR 19

pregador. Interpretaram, por meio da pena e da voz, a vontade de - Quanto às outras Igrejas, na Inglaterra, os limites deste tra-
Deus segundo as necessidades do seu tempo. É essa uma das prin- balho não permitem sequer um rápido esboço. Mas uma análise
cipais razões por que vivem ainda no coração dos que amam a pre- dos fatos mostraria que, onde quer que a Igreja tem progredido
gação da Palavra.
espiritualmente, tem-se dado ênfase à pregação. Por exemplo, du-
Durante a Reforma, a obra do pregador salientou-se ainda rante a última parte da época vitoriana, um apreciador da prega-
mais. Se se perguntasse a Martinho Lutero o que considerava mais ção via-se embaraçado com a riqueza de oradores, sempre que fosse
importante na sua vida e obra, certamente responderia em termos a Londres ou a Edimburgo. Qual dos príncipes de púlpito escolhe-
de pregação. E do mesmo modo, João Calvino, João Knox e todos ria, ou quais deixaria de ouvir? Se a Inglaterra, na época da rai-
os outros líderes da Reforma, com muito poucas exceções. Todos nha Elizabete se assemelhava a um ninho de aves canoras, ambas
estes homens .serviram a Deus e à Igreja por várias outras capaci- as cidades indicadas, duzentos anos mais tarde, tornavam-se lares
dade.?. Lutero, por exemplo, traduziu a Bíblia para o alemão, a de mestres na oratória sacra.
qual continua ainda a encantar o coração de muitos cristãos. Rea-
Nos Estados Unidos, o bem-estar espiritual da Igreja tem sido
lizou uma obra imensa para o início da Igreja Protestante, no que
variável, de acordo com a ênfase dada ao ministério da pregação.
respeita a hinos de grande valor literário e musical, na linguagem
Várias vezes, no passado, cidades como Brooklyn e Boston poderiam
do povo. Calvino foi um excelente comentador e teólogo. Mas,
ter adotado a divisa de uma cidade escocesa de tempos antigos:
acima de tudo, estes homens distinguiram-se como pregadores.
"Que Glasgow floresça pela Pregação da Palavra". Quanto aos prín-
Na Contra-Reforma a Igreja Romana começou, de novo, a cipes da oratória sacra, que têm trazido brilho ã Igreja na América,
exaltar a obra do pregador. Em parte, por causa daquilo que foi muitos dos seus nomes aparecerão nas páginas que se seguem.
realizado pelos reformadores, os dirigentes da "Igreja Mãe" ini- Entretanto, todos os jovens pregadores deveriam alegrar-se, por-
ciaram um movimento que produziu os Pregadores Católicos fran- que são sucessores de homens poderosos, que falaram em nome de
ceses do séc. XVII. Desde o tempo de Crisóstomo, nunca a Igreja Deus com paixão e com poder.
Cristã ouviu oratória sagrada com tanto valor como a de Bossuet
e Bourdaloue, Massillon e Fénelon. Hoje preferimos outro tipo de
pregação, mas quando pensamos na oratória sagrada, em seu apo-
O DECLÍNIO DO PÚLPITO
geu, temos que dar a palma a esses franceses, que demonstraram o
brilho da palavra pregada.
O púlpito parece ter perdido, recentemente, muito do seu pres-
Pouco depois, na Inglaterra, João Wesley e George Whitefield tígio. Na Escócia os homens de negócio encurtaram a divisa para:
foram os mentores de um avivamento na Igreja Cristã. De acordo "Que Glasgow floresça"! No outro lado do Atlântico, há poucos
com Lecky e outros historiadores, o movimento wesleyano influiu ministros do Evangelho que sejam capazes de influenciar a vida
grandemente para evitar, na Inglaterra, uma revolução nos mol- e a ação cívicas por meio dos seus sermões. Muitos pastores dei-
des da francesa. Embora Wesley possuísse muitos outros dons, xaram que outros aspectos do trabalho se tornassem mais impor-
considerava-se, acima de tudo, pregador e promovedor do Reino, tantes do que a pregação, ainda que os homens e as mulheres que
por intermédio de outros pregadores. Igualmente Whitefieid se vão às Igrejas acreditem na primazia do púlpito. Todos os bispos e
sobressaiu como arauto do Evangelho. Desde então, onde quer que comissões encarregadas do púlpito confirmarão que, quando um
o movimento wesleyano se espalhou no mundo, o seu êxito é devido pastorado se encontra vago, os líderes da igreja local pedem um
sobretudo à pregação. ministro que saiba pregar.
20 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A OBRA DO PREGADOR 21

As causas do declínio incluem fatôres vários, tais como o au- OS TRÊS MÉTODOS DE ESTUDO
mento do secularismo, o predomínio da imoralidade e o espírito
de distração. O ambiente dos nossos dias não é encorajador para Quem quiser aprender a pregar, deve encarar o assunto de
um jovem que deseje escrever bela poesia ou pregar sermões espi- uma das três maneiras englobadas na seguinte definição: "A Ho-
rituais. A maioria dos membros das igrejas vivem nervosamente, miiética é a ciência cuja arte é a pregação e cujo resultado é o
e a sua propensão para se encontrarem ocupados e preocupados sermão".
com inúmeras coisas, pode contagiar o próprio pastor. Começará Os três métodos estão relacionados, respectivamente, com a
logo a agir como diretor de carrossel ou ator principal de circo, e ciência da Homiiética. a arte da pregação e o estudo de sermões.
não como um Embaixador do Rei dos Reis. Contudo, no fundo do Estas divisões naturalmente se sobrepõem, pois os fatos não cabem
coração, o bom homem gostaria de saber dar prioridade às coisas
dentro de sistemas. Apesar disso podemos considerar estes três
mais importantes.
métodos como bom, melhor e o melhor. Em qualquer deles há pe-
A falta de instrução adequada também contribui para a si- rigos, mas nada neste mundo deixa de tê-los. Neste livro daremos
tuação infeliz de muitos pregadores atuais. Há muitos ministros certa atenção à ciência da homiiética, um pouco mais à arte da
que nunca aprenderam a pregar, ou então esqueceram tudo quanto pregação e mais ainda à preparação de sermões.
sabiam, É possível que no seminário um aluno "passe" em deter- A ciência da Homiiética salienta o que o ministro deve conhe-
minados cursos, sem nunca dominar realmente a homiiética e a cer acerca da pregação. O método leva-nos a uma definição de ter-
oratória, e, quando estiver na sua Igreja, poderá continuar sendo mos e a uma classificação de tipos. Em certos livros antigos o sis-
medíocre pregador. Se assim acontece, êle deveria estudar a vida tema tornou-se tão complicado como um livro de texto para Ana-
de Henry Ward Beecher ou de Thomas Chalmers, que lutaram mui- tomia. Esta forma de encarar a obra do pregador não apelava
tos anos antes de aprender a pregar. Enquanto isto, que acontece muito à sua imaginação. Por vezes a tarefa de preparação para o
ao rebanho? Como disse Milton: "As ovelhas famintas buscam púlpito ameaçava tornar-se pouco mais do que juntar ossos, em
alimento, mas não o encontram".
número suficiente para demonstrar o esqueleto de uma verdade
Casos destes requerem um tratamento adequado. Aos vinte morta há muitos anos. Se esta crítica parecer severa demais, per-
e quatro anos Paderewski sabia apenas "tocar piano", e foi então gunte-se a um ministro de idade o que aproveitou do estudo da Ho-
que começou a dorninar a arte a que dedicou o resto da sua vida. miiética. Em mãos erradas, o ensino da Homiiética, como ciência,
O mesmo se passou com o jovem Beecher, que teve de aprender a contribuiu bastante para o baixo nível do púlpito. Muitos dos que
realizar sua principal tarefa pela forma mais difícil, no meio dos tentaram dominar a terminologia desta ciência, fizeram aparecer
seus deveres pastorais. Quando mais tarde falou aos estudantes um conjunto de moldes ou fórmulas em que vazavam material para
para o ministério, parecia ecoar suas primeiras experiências em In- sermões. Sem terem culpa, estes jovens consideravam a "elabora-
dianópolis: ção de sermões" em termos de regras e não de vida. Nunca apren-
"Não iniciastes ainda a vossa educação. Estais apenas vos preparando para deram a saborear o labor do estudo ou da apresentação dos sermões.
estudar, ao começardes a pregar. Se pregardes durante cinco anos e veri-
Quando aprenderão os professores de Homiiética a apresentar "o
ficardes que o vosso labor é lento c obscuro na sua maior parte e não produz
o resultado desejado, não fiqueis desencorajados. A obra é tão grande que
romance da pregação"? 8

não precisais ficar envergonhados, depois de labutardes durante anos, se A arte ãa pregação ajuda muito a remediar estes defeitos. No
chegardes ã conclusão de que sois ainda aprendizes em vez de mestres".3 estudo de uma arte, qualquer jovem tenta apreciar a beleza, além
5
Yale Leetiires on Preaching, Nova York, J. B. Ford Co, 1872, pp. ei-62. s Ver o livro com este titulo de C. S. Home, Nova York, F. H. Revell Co , 1914.
A OBRA DO PRECADOR 23
22 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

considerar acima de tudo o sermão. Convinha que se consideras-


de aprender a verdade. Um escultor tem que conhecer a anatomia sem a si mesmos, não como cientistas com muitos conhecimentos,
do corpo, antes de poder fazer a estátua de um homem; mas no ou como artistas com o dom de apreciação, mas como pregadores
meio de todo esse conhecimento o jovem artista passa por uma com habilidade para preparar toda e qualquer espécie de sermões.
sensação de vida e de movimento, com bastante calor e brilho. No A fim de estarem sempre capacitados a fazê-lo, deviam estudar ser-
estudo da pregação como arte o futuro ministro aprende a usar a mões de outros homens e, em seguida, formar hábitos particulares.
imaginação. Com o correr dos tempos, começa a ver porque Horace
Daqui em diante vamos considerar o sermão, tanto nas suas
Bushnell escreveu que o Evangelho é "um Dom para a Imagi-
partes componentes, como no seu todo. Presumimos que a obra
nação". 5

de pregação concede a mais interessante oportunidade de sermos


Esta maneira de considerar a pregação como arte não encontra
úteis no mundo atual e que o sermão constitui o principal produto
aprovação unânime. Alguns ministros evangélicos gostam de ci-
dos labores do ministro, semana após semana. Presumimos, igual-
tar Phillips Brooks: "Um sermão é um bocado de pão para ser
mente, que êle busca e segue a direção do Espírito Santo, em res-
comido e não uma obra de arte para ser apreciada". Pergunta-se
como é possível pensar em arte ao ouvir Amós ou João Batista, posta à sua oração.
Charles H. Spurgeon ou Dwight L. Moody. Certamente Isaías e o LEITURAS SUGERIDAS
Apóstolo Paulo, ou Crisóstomo e Francisco de Assis, nunca pensa-
Broadus, John A., On the Preparation and Delivery of Sermons, 1870, revista
ram em fazer obras de arte ao pregarem seus sermões! por J. B. Weatherspoon, Nova York, Harper & Bros., 1942. A obra está
Ainda que não concordemos inteiramente com estes críticos, publicada em português: O Preparo e Entrega de Sermões, trad. de Waldemar
percebemos os perigos existentes no estudo da pregação como arte. W. Wey, Cíisa Publfeadora Batista, Rio de Janeiro, 1S60 (N. T )
A menos que um ministro se mantenha perto de Deus, é possível Btooks. PhiUips. Lecfures on Preaching, Nova York, E. P. Dutton & Co., 1877,

que deixe os seus sermões se tornarem um fim em si e não um Dargan, Edwin C , The History of PreachiTio. Nova York, Hoddcr &. Stoughton,
1905. Dois volumes.
meio de graça. Porém, isso acontece em qualquer outra arte, como
Garvie, Alfred E., The Christian Preacher, Nova York, Charles Scribner's Sens,
a música ou a poesia. Quanto mais alto o ser humano adeja, maio-
res são as possibilidades de não alcançar o seu ideal. Por outro 1921.
lado, quando nos sentamos, arrebatados, enquanto o pregador nos Jefferson, Charles E., The Building of the Church, Nova York, The Macmillan

guia ao cume da montanha, é difícil para muitos de nós pensar Co., 1910.
num sermão como um "pedaço de pão a ser comido". Para que Luccoek, Halford E., In the Minister^ WorJcshop, Nova York e Nashville, Abingdon-
Cokesbury Press, 1944.
havemos, então, de discutir sobre classificações? Não será possí- Pattison, T. Harwood, The Mafctng of the Sermon. 1898, Revista 1946, Filadélfia,
Judson Press,
vel encontrar um terceiro método que combine a força da Homilé-
tica com a doçura do estudo artístico, acrescentando algo de muito
particular?
O estudo de sermões oferece-nos um terceiro método. Este
método por vezes acompanha os outros dois, mas é por pouco tempo.
O ideal seria que todos os ministros soubessem algo acerca da Homi-
lética e mais ainda acerca da arte de pregação. Mas deveriam

T Horace Bushnell, "Building Eras in Religion", Charles Scribner's Sons, 1909,


cap. vm.
O SENSO DAS NECESSIDADES HUMANAS 25

dade mundial ou com a paz mundial, mas só até ao ponto em que


essa verdade está relacionada com aqueles que temos em vista.
CAPÍTULO II
Como, pois, o ministro determinará qual a necessidade humana
a ser enfrentada no domingo próximo? Será que precisa dar uma
vista de olhos por todo o campo, sempre que tem de resolver o que
vai pregar? Não! Se quiser aproveitar ao máximo o tempo que
passa no seu gabinete, resolverá todos estes assuntos antecipada-
O SENSO DAS NECESSIDADES HUMANAS mente, ainda que mantenha as janelas de sua alma abertas para
qualquer nova luz. É possível que o principiante pense, de começo,
que tudo isto parece mecânico, mas em breve verificará que o senso
nosso gabinete de trabalho, de-
COMO É POSSÍVEL, NO da necessidade humana fará arder o seu coração.
terminar o que vamos pregar? O pastor deve orar
como se tudo dependesse de Deus, e trabalhar como
se tudo dependesse do pregador. Se tiver a mente de um professor,
pode considerar o sermão a ser pregado no domingo seguinte como OS TRÊS ASPECTOS DO ASSUNTO
integrado no trabalho anual do púlpito. Faz bem pensar em ter-
1

mos do Calendário Cristão com o seu movimento progressivo, mas Há três fatôres. todos eles no nível humano, que devem ser
nunca deve estar longe do Sol central. Um outro pastor, seu amigo, considerados. O primeiro está relacionado com o mundo de hoje;
talvez se considere como um médico das almas, e trate cada ser- o segundo, com a comunidade local; o terceiro, com o próprio pre-
mão como um caso a ser estudado mais ou menos por si. O que gador. Consciente ou inconscientemente este permite que tais fatô-
dissemos acima simplifica demais os fatos, pois muitos pregadores res influenciem todas as decisões sobre o conteúdo e a forma de
não seguem nenhum plano. Qualquer que seja o seu método, o um sermão. E aqui reside grande parte do encanto e da dificul-
homem prudente começará com alguma necessidade humana e
dade da pregação hoje em dia.
tentará ir ao encontro dela com a verdade divina.
1. A condição da época influencia a substância e o colorido
Falamos, por vezes, em tratar das necessidades humanas, como
de todo e qualquer sermão. "Hoje não é ontem". O intérprete da
se tivéssemos descoberto a oitava maravilha do mundo. Podemos
verdade de Deus deve estar pronto a proclamar aquilo que os seus
usar nomes novos, alguns até vistosas, mas quando nos aproxima-
ouvintes mais necessitem ouvir. Deste modo deve mudar a ênfase
mos de Isaías e Oséias, ou de Pedro e Paulo, verificamos que fize-
de quando em vez, ainda que nunca omita as verdades básicas.
ram precisamente aquilo que nós agora tentamos. Quem já ouviu
falar de mensagem profética ou apostólica apresentada ao acaso Consideremos, por exemplo, o livro de Isaías e verifiquemos como o
ou num vácuo? O mesmo princípio tem governado a pregação em colorido dos capítulos 1 a 12 é diferente do dos capítulos 40 a 55.
toda a História da Igreja. Sempre que um discurso verbal mereceu Em cada caso o profeta estava falando da condição daqueles a quem
ser chamado sermão, satisfez as necessidades dos ouvintes. A ver- se dirigia. No nosso próprio país, os sermões pregados em dias de
dade tratada talvez esteja relacionada com missões, com fraterni- prosperidade são diferentes dos que são apresentados, no mesmo
púlpito, nos tempos difíceis de depressão.
Que ninguém contudo apresente este argumento em defesa
Ver A. W. Biackwood. Planning a YearS Pulpit Work, Nova York e Nashville.
de estudos amplos, que abrangem tudo em geral, mas nada tocam
1

Abingdon-Cokesbury Press, 1942.


26 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 0 SENSO DAS NECESSIDADES HUMANAS 27

em particular. Só um estadista do Reino de Deus pode subir às da aplicação das verdades cristãs às necessidades locais, mas pouco
alturas em que vê o céu e a terra e tal homem só pode apresentar interesse nas doutrinas em si. Por isso, no primeiro campo, come-
poucos estudos em cada ano. Porém, cada pastor tem que compre- çou a salientar o que o apóstolo Paulo escrevera na última parte
ender o significado e a força da Weltanschauung e do Weltschmerz. das suas epístolas, ao passo que, no segundo campo, destacou as
Sempre que alguém sofre num forno de fogo ardente, "em todas as doutrinas apresentadas na primeira parte dessas cartas.
suas aflições é afligido". Como pode esperar, de outro modo, falar O novo treinador de um time de futebol age mais ou menos
em nome de Deus sobre toda a misericórdia e consolação? No san- da mesma maneira. Durante o inverno relaciona-se com os outros
tuário, o ponto de vista que o ministro tem do mundo em geral membros do pessoal, ganhando a sua amizade e consultando-os dia-
e a sua compreensão da angústia do coração, pode fazer-se sentir riamente a respeito de estratégia! Quando se iniciam os treinos da
mais na escolha que fizer de hinos e no espírito das suas orações, primavera, começa a avaliar o seu grupo, tanto no seu conjunto
do que nos tópicos e assuntos do sermão. Mas ai da congregação, como individualmente. Durante o verão faz planos para o seu tra-
cujo ministro não conheça o mundo de hoje, nem o espírito da sua balho de outono. Quando a estação começa, sabe o que deseja fa-
época. zer e dá importância a cada um dos movimentos! Num ano tem
que fortificar a defesa, no ano seguinte deve concentrar-se nos ata-
2. As necessidades da comunidade local são postas mais di-
cantes. Tudo isto se assemelha ao trabalho do ministro fora do
retamente em consideração. Qualquer congregação tem as suas
púlpito, mas essas outras atividades não nos concernem agora.
próprias necessidades e o pastor tem que senti-las para poder rea-
Podemos depreender que a tática do pregador, de semana para se-
lizar o seu melhor trabalho como intérprete local da verdade divina.
mana, depende da sua estratégia no que respeita à obra para o
Por exemplo: em 1869, quando Phillips Brooks foi para a Igreja
púlpito.
da Trindade, em Boston, nos Estados Unidos, com trinta e três
anos, conhecia muito bem as condições do seu país durante aquele 3. A personalidade do pregador tem, igualmente, influência
período de reconstrução. Mas antes de resolver a maneira como nas decisões sobre o que fará no púlpito. Dado que a pregação re-
desempenharia seu ministério de pregador e de pastor, fêz um es- quer "verdade por meio de personalidade", todos os ministros de-
tudo cuidadoso do campo e só então se preparou para mudar a sua viam conhecer o que podem e o que não podem fazer, pelo menos
tática. Em Filadélfia, durante 10 anos, "parecia quase um re- de momento. O jovem Davi não deve sair para a luta com a arma-
formador e um agitador, em virtude da sua atividade fora do púl-
dura do rei Saul. É possível que no seu primeiro ano de trabalho
pito". Mas em Boston, "dedicou-se inteiramente à sua congregação
o jovem ministro sinta que a situação requer uma série de sermões
e exclusivamente à tarefa de pregador" 2

acerca das doutrinas da nossa fé, ou acerca dos deveres cristãos.


Na guerra contra o pecado, a tática do púlpito, semana após Se o pregador só é capaz de preparar uma única mensagem de
semana, depende da estratégia pastoral e esta varia de acordo com determinado tipo, tendo que esperar durante um mês antes de ten-
as necessidades da congregação. Em certo campo o ministro veri- tar outra, que faça assim. Se ouvir de pregadores, nas grandes ci-
ficou que o povo estava interessado nas doutrinas do cristianismo, dades, que são famosos na preparação de séries de sermões espe-
mal se apercebendo, porém, da necessidade de aplicá-las à comuni- ciais, deve alegrar-se na liberdade que tem em servir a Deus à sua
dade. Na igreja que serviu em seguida, encontrou a preocupação própria maneira.
"Filho do homem, põe-te em pé, e falarei contigo". Em lin-
guagem dos nossos dias isto pode significar: "Jovem ministro em
2
A. V. G. Allen, Life ar.d Lettgrs of Phillips Brooks, Nova York, E. P. Dutton
& Co., 1907. II, 134-135. Cream Ridge, tem a coragem de seres tu mesmo! Prega o Evan-
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O SENSO DAS NECESSIDADES HUMANAS 29

gelho à tua maneira e não à de algum gigante! Talvez não con- Aqueles que ouvem muitos sermões de estudantes, acreditam
cordes com Karl Barth noutros assuntos, mas tens de aceitar, com nesses ministros de amanhã. Alguns de nós ouvimos oito, dez,
certeza, aquilo que diz a respeito da pregação. O teólogo suíço até mesmo doze, semana após semana. Só de quando em quando
insiste em que Deus se faz conhecer de três maneiras: de forma su- duvidamos que um ou outro deva pregar, mas desejaríamos, muitas
prema em Cristo, de modo geral pela Bíblia, mas também por in- vezes, poder transmitir-lhes uma compreensão profunda das necessi-
termédio da pregação de hoje. Deus quer falar em Cream Ridge
:i dades humanas atuais. Só Deus o pode fazer, e o faz amplamente
por intermédio daquele que escolheu para pastor. Sê pois, tu mes- depois de irem para a primeira congregação. Êle deseja, entretanto,
mo, jovem, o melhor que puderes. que todos os jovens pregadores usem a sua imaginação, ao se pre-
pararem para um campo hipotético.
Este princípio de trabalho ajuda o pregador a decidir sobre o
que fazer com os pedidos para tratar de assuntos difíceis. Talvez A pregação feita pelos estudantes durante as férias de verão,
se sinta lisonjeado quando amigos lhe peçam mensagens acerca do ajuda muito a remediar este defeito. Durante três ou quatro me-
pecado imperdoável ou sobre o vale dos ossos secos, mas verificará ses o jovem vive no meio de amigos, no seio de uma igreja local e
rapidamente quão sábio era Charles H. Spurgeon, dizendo a um em cada domingo tenta ir ao encontro das necessidades que desco-
jovem ministro, que lhe perguntou o que fazer com tais pedidos, briu existirem ali. Ou melhor ainda, depois de dois anos de semi-
que os recusasse delicadamente: nário pode sair para um campo. Trabalha ali, durante quinze me-
ses, sob a direção de um pastor experimentado, que saiba guiar o
"Como regra, nunca! Se tem que haver exceções, que sejam bem
jovem na sua preparação, tanto para o púlpito como para o tra-
poucas. Não estás em nenhuma loja onde os fregueses entram e pedem
o que desejam. Quando algum amigo sugerir um assunto, medita nele balho pastoral. Depois de semelhante experiência, o estudante vol-
com cuidado, considera se è próprio e vê se te atinge com poder. Recebe taria para a Faculdade de Teologia para completar o seu curso.
o pedido delicadamente, mas, a menos que o Senhor a Quem serves ilumine Desta maneira teria provado as alegrias do ministério, descoberto
o texto cem a sua luz. não pregues sobre êle, seja quem fôr que te procure
as limitações do seu equipamento e estaria resolvido a trabalhar
persuadir a fazê-lo".*
como nunca. Por que não se exige que mais jovens trabalhem
nestas condições?
Uma vista de olhos sobre as páginas anteriores, mostrará por-
que um estudante de seminário pode temer a dura prova de pregar O pastor experimentado também devia lembrar-se destes prin-
em aula. Especialmente no primeiro ano, como pode um jovem cípios de trabalho. Qual é o homem de meia idade que não neces-
sentir as necessidades de um mundo cheio de confusão, medir a sita cultivar visão mais vasta, conhecer bem a sua congregação
situação de uma comunidade que existe apenas em sonho e avaliar e labutar dentro dos seus limites pessoais? Mas se um ministro
recursos pessoais que parecem ilusórios? Considerando tais difi- deseja continuar a desenvolver-se como pregador, precisa alargar
culdades, quem pode admirar-se de alguns sermões de estudantes esses limites, semana após semana. Ao preparar-se para o púlpito,
parecerem irreais? De fato, alguns escritores no nosso campo deve recordar o conselho de William Carey: "Espera grandes coisas
concordam com Fénelon em que não devíamos fazer os estudantes de Deus e empreende grandes coisas para Deus". Qualquer que
passar por semelhantes provas. seja a situação mundial, local e as desvantagens do ministério,
nenhum intérprete da verdade divina devia dedicar-se a pregar
coisas sem valor. O trabalho do púlpito, nos dias que passam, re-
3 Ver Karl Barth, The Word of God and the Word of Man, Boston, The Pilgrim quer fé e coragem, com um espírito de aventura profética e otimis-
Press, 1928, Caps. I V e V I .
mo apostólico. Que preparará, então, tal homem para pregar?
4 Lectures To Mv Students, 1.» série, Londres, 1875, p. 101.
/
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 0 SENSO DAS NECESSIDADES HUMANAS $t

O SIGNIFICADO DE TÍTULOS DE SERMÕES Testamento usam a expressão "pregação", referem-se àquilo que
conhecemos pelo nome de evangelização. Também usam outras
G

Aquele que tem o senso das necessidades humanas, prepara formas de mensagem no púlpito, mas nunca com o nome de "pre-
diversos tipos de sermões. Daqui em diante vão aparecer vários gação". Felizmente, nos nossos dias, quase todos as ramos da
tipos de trabalho para o púlpito, com diferentes classificações. Igreja de Cristo dão ênfase à pregação evangelística. ainda que
Qual é o seu significado? Antes de considerarmos as respostas, por vezes usem um nome diferente.
ouçamos Brooks:
É difícil, para um pastor, manter o equilíbrio ne.ste campo,
" A s classificações comuns de sermões têm pouca importância Ouvimos porque pode pender para um de dois extremos. Por um lado,
falar de sermões expositivos, tópicos e práticos. Cada espécie de sermão talvez dê tanto realce à pregação evangelística, que se descuide
parece ficar numa classe ã parle. 6 como se esperpsse que o pregador daquilo que Horace Bushnell denominou "Nutrição Cristã". Re- 7

determinasse íódas as semanas, qual a espécie de sermão que a congregação centemente só um ou outro ministro do Evangelho chegou a este
deva aprccinr no domingo seguinte e se propusesse deiiberadmnente produ-
extremo, mas muitos pastores tratam de outros assuntos tão persis-
zi-lo. . . Para mim o sermão parece ser uma unidade e . . . nenhum sermão
me parece completo, a menos que inclua todos estes elementos... Todo
tentemente, que se esquecem de dizer aos que buscam, como en-
e qualquer sermão deve ter bases sólidas nas Escrituras, o significado apro- contrar o Salvador. Em certas congregações, que se dizem evangé-
priado que vem de um assunto claro, a convicção que pertence ao arguir.enio licas, alguém que busque a Deus pode assistir aos cultos durante
bem pensado e o calor que procede de um apelo vigoroso".^ um ano todo, sem descobrir como encontrá-lo. Noutras, um crente
pode assistir ao culto durante um ano inteiro, sem aprender como
Todo apreciador da pregação deve dizer amém a tudo iito. deve viver a vida cristã, no mundo de hoje. Que falta de equilíbrio,
Mas quando analisamos os dez volumes de sermões dc próprio e que necessidade de estratégia!
Brooks, encontramos toda a sorte de realces, pois um sermão difere
O sermão evangelístico leva o ouvinte face a face com Cristo,
dos outros, como uma estrela difere de todas as outras. Porém,
como Filho de Deus, e convence-o a aceitá-lo como Salvador e Se-
ao analisarmos mais de perto, verificamos que Brooks tinha a
nhor. Por muito estranho que isso pareça a quem nunca tenha
tendência de optar entre duas formas de pregação. Cerca de
pregado, esta espécie de trabalho para o púlpito agrada aos cren-
metade dos seus duzentos sermões publicados dírigem-se àquele
tes que já amam o Senhor há muitos anos. Mostra-lhes o abismo
que busca a Deus; na outra metade, àquele que já o encontrou.
de que foram arrancados e encoraja-os ao trabalho pessoal com
Spurgeon, nos seus .sessenta e três volumes de sermões, seguiu
seus amigos, sejam ou não membros de qualquer igreja. Segundo
mais ou menos o mesmo método. Em metade deles dirige-se essen-
a opinião de pastores, atualmente em atividade em todo o mundo,
cialmente aos perdidos e àqueles que não são membros de qualquer
há multidões de homens e mulheres à espera de apresentação ao
igreja, nos outros fala principalmente aos que amam ao Senhor.
Salvador. Fulton J. Sheen afirma que, só nos Estados Unidos, dez
Embora estes dois príncipes do púlpito divirjam entre si em muitos
milhões de adultos andam pelas ruas em busca de Deus. Em
aspectos, têm sensivelmente a mesma opinião sobre seu trabalho
quantas das nossas igrejas qualquer deles poderia ter a certeza
de púlpito como pastores evangelistas.
de encontrá-lo no domingo próximo, no culto da manhã ou da
O cunho evangelístico caracteriza a pregação do ministro que noite?
aceita os ideais do Novo Testamento. De acordo com C. H. Dodd,
da Universidade de Cambridge, sempre que os escritores do Novo
o C. H. Dodd — op. cit.. pp. 7-8.
* Chrisliom Ntirlure. 1847. Nova edição com introdução de L. A. Weigle,
Leclvres on Preaching, pp. 129-131. Novo Haven, Yale University Press, 1947.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O SENSO DAS NECESSIDADES HUMANAS 33
32

O apelo evangelístico surge, em certas épocas do ano, com Os jovens, hoje em dia, precisam ainda mais de sermões dou-
um poder muito especial. As boas novas de Deus não vão ao en- trinários do que na época de Brooks e precisam deles em forma
contro das aspirações de homens e mulheres, que buscam um de pensamentos para a sua própria época. Em centros universi-
modo de fugir do seu "eu" inferior, apenas no período do Advento tários, pastores verificam que a juventude de ambos os sexos tam-
e da Páscoa. De fato, o período entre o dia de Ação de Graças e bém tem dúvidas e é atraída por uma forma acertada de pregação
de Páscoa pode vir a ser, no Calendário Cristão, o tempo da ceifa. doutrinária. Em muitas capelas das universidades há estudantes
Muito especialmente no fim do inverno, quando o clima se torna que consideram Reinhold Niebuhr seu pregador favorito, porque
mais rigoroso, há mais doenças e a morte é mais frequente, o êle encoraja todos a trazerem os cérebros para a Igreja e a mantê-
Evangelho atrai à Igreja mais homens e mulheres do que em los em atividade enquanto ali permanecerem. Quando esses jovens
qualquer outra estação. Por isso, o homem prudente fará soar, de ambos os sexos regressam a suas casas, alguns deles admiram-se
constantemente, a nota evangelística, muitas vezes até no culto de que seus pastores não tratem de assuntos doutrinários como
da manhã. Também em outras épocas, êle deve apresentar o apelo "A Obra Atual da Providência de Deus", (Rm 8.28), e o "Evangelho
de Cristo à fidelidade de todos por quem êle morreu, e cujas vidas da Soberania" (SI 97.1).
êle anseia por governar. s
Por outro lado, jovens que pensam independentemente pro-
A ênfase doutrinária também caracteriza a pregação que au- testam contra a pregação doutrinária, que consiste na "nebulosa
xilia homens e mulheres dos nossos dias. A doutrina cristã, na discussão de problemas irreais, em linguagem ininteligível". Du-
verdade, forma o âmago de quase todos os sermões que apelam tanto rante a Primeira Guerra Mundial, quando Joseph Fort Newton
para a mente como para o coração. Por exemplo, em quase todos pregava em City Temple, certa noite foi a um teatro londrino para
os sermões evangelísticos dignos desse nome, alguma verdade cristã dirigir a discussão dos temas abordados pelo pregador. Como,
fornece a base para um apelo de aceitação a Cristo. O ministro 9 porém, não tivesse ouvido o sermão que os soldados ali reunidos
deve, porém, de vez em quando, preparar sermões diretamente desejavam discutir, começou a perguntar-lhes o que dissera o ora-
doutrinários. Esta espécie de sermões significa a interpretação de dor sobre o tema "A Graça de Deus". Um deles respondeu: "O
uma verdade cristã com fins práticos pelo ministro. No centro pregador disse-nos que a Graça de Deus é abundante, suficiente
de Boston, então fortemente unitariano, Brooks pregava frequente para todas as nossas necessidades e acessível. Mas não nos disse
e deliberadamente sobre a doutrina da Trindade. Outras vezes, o que é a Graça de Deus. Talvez o senhor possa esclarecer-nos
apresentava o ensino* cristão sobre a encarnação e a glória de Deus esse ponto". Newton ficou perplexo. Êle, que pregava há tantos
como Luz. Baseando-se nesta sua experiência, dizia a jovens mi- anos e muitas vezes tratara da Graça Divina, nunca tentara dizer
nistros aquilo que todos os pastores deviam saber de cor e repetir aos amigos leigos o que significa essa palavra. 11

muitas vezes: Num mundo cheio de guerras e rumores de guerras, homens


Nenhuma pregação jamais teve tão grande poder como a doutrinária... e mulheres, velhos e novos, sentem-se gratos por uma pregação
Pregai doutrina, pregai toda a doutrina que sabeis e aprendei sempre, cada adequada a respeito das "últimas Coisas", ainda que não com este
vi:-z mais; mas pregai-a sempre, não para que a creiam, mas para que título. No Credo Apostólico e no hinário, por exemplo, encontram
crendo sejam salvos".>o
muita coisa acerca da "comunhão dos santos", mas não sabem
o que significa essa verdade em termos do mundo hodierno. Certo
s Ver Ap 3 20, onde Cristo apela a um indivíduo, membro de uma igreja
domingo à tarde, na Igreja Presbiteriana da Quinta Avenida, em
munclanizada.
•> Ver A. W. Blackwood, Evangelism in the Home Church, Nova York e
Nathville, Abingdon-Cokesbury Press, 1942, Cap. II.
J. F. Newton, The New Preaching, NashviUe, Cokesbury Press, 1930, p. 120.
1" Leclwes on Preaching, p. 129.
\
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O SENSO DAS NECESSIDADES HUMANAS g 5

Nova York, a multidão ouvia avidamente John S. Bonnell expli- provenha de um amigo com o coração aberto e não de um crítico
cando o significado destas palavras místicas. Desde esse dia, a com a vara nas mãos.
maior parte daqueles ouvintes se tem regozijado de novo, com a De certo modo todas as mensagens provenientes do púlpito
certeza de que podem ter comunhão com os filhos de Deus em toda deveriam movimentar-se em atmosfera ética. Alguns ministros,
parte, tanto na terra como no céu. Especialmente na celebração porém, contentam-se com a atmosfera, em lugar do ensino ético
da Ceia do Senhor, os crentes deviam dar graças por poderem que torna claro o dever cristão. Podeis, certamente, saturar os
ter comunhão com aqueles cujos rostos não verão mais na terra. vossos sermões com o espírito do Novo Testamento, mas pregai, de
O culto da noite talvez se preste para pregação doutrinária. vez em quando, diretamente sobre "O que Jesus disse acerca do
Em três congregações de lugares diferentes e tão diversas quanto Casamento" ou "Como guardar o Domingo". O futuro bem-estar
é possível nos vários campos do nosso país, certo ministro pregava da nossa civilização não depende, em larga escala, sob a direção
muitas vezes, no culto da noite, diretamente sobre doutrina. Em de Deus, da manutenção do lar cristão e da observância do do-
cada uma das congregações ouvia os oficiais da igreja dizerem mingo?
que tinham perdido as esperanças de conseguir alguém que viesse O jovem ministro, porém, pode ter que esperar algum tempo
à igreja depois do anoitecer, mas êle próprio verificou que havia antes de poder preparar sermões essencialmente éticos, pois acha-
muitas pessoas ansiosas por aprender as verdades básicas do cris- rá mais fácil pregar qualquer outro género de sermões. Pouco
tianismo. Verificou, também, que, se quisesse falar à multidão depois de um jovem estudante, futuro professor de homilética,
dos que buscam a Verdade, tinha que estudar teologia para usar ter chegado ao seminário, teve de pregar perante a classe. Não
no púlpito, ao tentar ir ao encontro das necessidades humanas. sabendo nada melhor, escolheu um assunto ético: "A Declaração de
A ênfase ética assemelha-se à doutrinária, com exceção de Dependência de um Homem Forte". Começando com as palavras
estar relacionada com o dever, enquanto que a outra diz respeito do apóstolo a respeito de comer a carne oferecida aos ídolos (1
à verdade em si. A Bíblia abrange ambos os elementos e pouco Co 8.13), o sermão tratava de: (1) Coisas sempre boas — fazei-as,
mais: "As Escrituras ensinam, principalmente, o que o homem ainda que os céus caiam. (2) Coisas sempre más — não as façais,
deve crer acerca de Deus e do que Deus exige do homem". Portanto, ainda que os vizinhos zombem. (3) Coisas nem boas nem más
se algum pastor negligencia a interpretação doutrinária ou do — fazei-as ou não, segundo a consciência do irmão mais fraco,
dever para fins práticos no púlpito, como irá ao encontro das mas se houver dúvida não as façais. No fim do discurso, o professor
necessidades dos membros da sua congregação? Não necessitarão disse à classe: "Este jovem apresentou o tipo mais difícil do
eles conhecer a vontade de Deus sobre "O Perdão das Ofensas" e trabalho para o púlpito: um sermão sobre questão ética".
"A Solução Cristã para o Preconceito Racial"? O pastor experimentado talvez evite assuntos delicados, por
Os jovens, especialmente, deviam ouvir interpretações lumi- prudência, por saber que alguns oficiais da igreja e suas esposas
nosas sobre maneira de viver num mundo afligido por guerras e não gostam de sermões éticos. Querem ouvir a Palavra, querem
preparação para elas. Muitos deles sentem-se perplexos acerca que êle pregue o Evangelho e nada mais do que o Evangelho.
de problemas pessoais da vida e oprimidos por outros de âmbito E por Evangelho entendem as consolações e exortações referentes
maior. Desejam saber como lhes é possível manter um nível moral a salvação. Deus queira que nenhum dos seus mensageiros deixe
e "guardar-se da corrupção do mundo". Em muitos lugares os jo- de dar a devida importância ao que dizem estes amigos e despreze
vens reagem favoravelmente a sermões éticos, que apresentam o o seu anseio por sermões evangelísticos. Deus queira, também,
que a Bíblia ensina sobre os deveres cristãos e como aplicar este que nenhum temor impeça o pastor de declarar "todo o conselho
ensino à vida moderna. Desejam, porém, que tal ensino ético de Deus". Nos nossos dias, o ministro que evita a interpretação
S6 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
O SENSO DAS NECESSIDADES HUMANAS S7
do dever no púlpito, deve considerar-se um covarde, e até mesmo pregador de sermões úteis. Primava por fortalecer e encorajar
falso profeta. Por outro lado, o homem prudente baseia o seu aqueles homens e mulheres que começavam a sentir-se cansados,
ensino ético inteiramente na Bíblia: "Assim diz o Senhor". sem saber se a vida vale quanto custa. Eis as palavras de um
Muitos destes temores são infundados. Surgem geralmente amigo que o ouvia duas Y è z e s em cada domingo: "O nosso mi-
do gabinete de estudo e não do banco da igreja. Se o pastor se nistro sempre nos enche de coragem para a semana seguinte".
concentrar numa das parábolas de Jesus acerca do dinheiro e dis- Continuou, na verdade, a dar esperança e ânimo à s pessoas, mesmo
ser o que ela significa hoje, todos receberão o que êle dá direta- depois de haver partido para Deus.
mente do Livro. Verificará, pouco a pouco, que muita gente não
O sermão pastoral é aquele que fortifica e anima o crente
gosta de rótulos humanos, mas que o mesmo não acontece em
e m Cristo, em especial o que acha a vida insuportável. Esta es-
relação às mensagens dadas por Deus. O mesmo se passa com
pécie de trabalho no púlpito à s vezes chama-se "devocional" o u
pessoas que insistem em não querer ouvir sermões evangelísticos
"inspirador". Surgem por toda parte exemplos deste género
nem doutrinários. Pois bem! Deixemo-las apresentar a sua opi-
de pregação nos sermões publicados por George H. Morrison —
nião e continuemos a sorrir. Lembremo-nos de que estes títulos
como por exemplo "Marés" e "O Regresso dos Anjos" —, assim
são próprios dos gabinetes de trabalho e de nenhum outro lugar.
como nos livros de John Henry Jowett, por exemplo, "Otimismo
Nunca chamemos a atenção, no púlpito, para a forma como pre-
Apo$tóUc&' e "Riachos junto ao Caminho do Viandante". Certos
gamos, mas ponhamos toda a ênfase na razão por que pregamos.
críticos costumavam, por vezes, referir-se à s pregações de Jowett
Se nos prepararmos e falarmos como deve ser, a maioria das pes-
como "leves e débeis", mas grande número de pessoas inteligentes
soas reagirá favoravelmente.
apinhava-se para ouvir os seus sermões encorajadores, e saíam
E no caso de se revoltarem? Infelizmente, não aceitarão, por como que vindo d o cume da montanha. Muito de nós, hoje em
vezes, o ensino claro da Palavra de Deus, em geral por causa das dia, sentimos a necessidade de mais ministério de ensino, mas
exigências éticas. Não apedrejaram a William Booth principal- devemos, igualmente, ouvir o chamado para pensar os corações
mente por causa das suas expressões morais? E, antes dele, tam- partidos. "Consolai, consolai, o meu povo!" (Is 40.1).
bém a John Wesley? Pensemos em Savonarola e Crisóstomo, que
Outros títulos nos surgirão quando discutirmos este assunta
perderam a vida por dizerem ao povo qual era o seu dever para
mais adiante, alguns dos quais, como por exemplo "sermão para
com Deus. Que outra coisa o nosso Salvador avisou aos Seus
uma situação vital", poderão parecer novos e estranhos, assim
discípulos que esperassem, quando repreendessem ao povo pelo
como também a forma das mensagens. Mas, quando examinamos
seu pecado? "Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue,
as Escrituras, verificamos que o s profetas e o s apóstolos, assim
dia a dia tome a sua cruz e siga-me". (Lucas 9.23). Note-se, no
como o Senhor, frequentemente tratavam das situações d a vida
grego, o verbo forte "quer" — que exprime determinação. Estas
e de certo modo nunca fizeram outra coisa. Portanto, não fujamos
palavras expressam o que custa ser cristão e cada pregador da
d e nenhum título homilético s ó porque parece "novo".
verdade e do dever esteja pronto a pagar esse preço, pois tem
que falar num mundo em que o próprio Cristo caminhou para E o s títulos antigos? Com todas a s invenções e descobertas
a Cruz, e isto, em grande parte, por causa dos seus ensinos éticos. e m outros campos, porque terá o pregador que se preocupar com
o "sermão de tópico", o "textual" e a "mensagem expositiva"?
Felizmente um pastor não precisar estar sempre discutindo Mais ou menos pela mesma razão por que o amante de poesia usa
problemas delicados. Sermões com ênfase pastoral raramente ir- títulos antigos como poesia narrativa e poesia lírica, e o lavrador
ritam os membros das igrejas. Em Liverpool, John Waston (Ian se refere a vaca leiteira, gado d e corte e gado de raça. Por que
Maclaren) tornou-se conhecido como o melhor dos pastores e como haveríamos de eliminar categorias d e outras épocas? Por outro
S8 A PBEPARAÇAO DE SERMÕES

lado, ninguém precisa ajoelhar-se e adorá-las. Tal como acontece


com os nomes do gado leiteiro, devemos julgar cada caso de acordo
com os seus méritos. CAPÍTULO I I I
De certo modo um único título serve para todos os sermões
que qualquer ministro deve pregar: "mensagem de Deus para as
necessidades humanas". Portanto, forma o hábito de perguntar
a cada sermão em preparação: "Vais ao encontro de alguma ne-
cessidade humana?" Se determinado tipo de mensagem permitir OS PRIMÓRDIOS DE UM SERMÃO
que uma verdade divina vá ao encontro de necessidade atual do
teu povo, prepara-a. Se o trabalho para o púlpito não estiver
à altura deste critério, não permitas que usurpe o lugar da men- dizer como começa a pre-
N E N H U M MINISTRO PODE
sagem de Deus. Quanto aos títulos, se os usares corretamente parar um sermão. Este assunto pertence ao "mis-
podes evitar que a família se alimente com a mesma espécie de tério da pregação". O que o Senhor Jesus ensinou
comida semana após semana. Em resumo, emprega a verdade sobre o novo nascimento, pode aplicar-se aos primórdios de um
divina para ir ao encontro de necessidades humanas atuais — sermão: "O vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes
toda espécie de verdade para toda espécie de necessidade. donde vem, nem para onde vai; assim é iodo aquele que é nascido
do Espírito" (Jo 3.8). Como escreve o Apóstolo: "Onde está o
LEITURAS SUGERIDAS Espírito do Senhor aí há liberdade." (2 Co 3.17b).
Assim, todo e qualquer intérprete deve preparar mensagens
Baxter, Batsell B., The Heart of tfie Yale Lectures, Nova York, The Macmillan
de maneira inteiramente pessoal. O seu método deve variar, de
Co., 1947.
Beecher, Henry Ward, Yale Lectures on Preaching, séries I-in, 1872-1874.
vez em quando, de acordo com o seu objetivo e com o material
Buttrkk, George A., Jesus Carne Preaching. Nova York, Charles Scribner's Sons, à disposição. Mas deveria estabelecer uma regra sem exceções:
1832. "começa, prossegue e termina com oração". Antes de escrever,
Farmer, Herbert H-, The Servant of the Word, Nova York, Charles Scribner's Sons, o que quer que seja, é preciso olhar para Aquele que conhece
1942. todas as necessidades dos corações humanos e todos os recursos
Gossip, Arthur J., In Chrfcfs Slead, Nova York, Geo. H. Doran Co., 192S. da graça divina. No espírito deste olhar para o alto, o ministro
Jowett, John Henry, The Preacher, His Life and Work, Nova York, Geo. H. Doran pode pòr-se a trabalhar e formar o hábito de "esperar com atenção".
Co., 1912.
Mais cedo ou mais tarde começará a ver a maneira de começar a
Scherer, Paul E., For W e Have This Treasure, Nova York, Harper & Bros., 1844.
Stewart, James S., Herolds of God, Nova York, Charles Scribner's Sons, 1946.
mensagem para o povo.
Portanto, fora com ideias sobre um "sistema" de fazer ser-
mões! Não há ministro algum que possa aprender, de um pro-
fessor ou de um livro, a maneira como começar a preparação da
mensagem para determinada congregação. Quem é que, de fora,
pode dizer aquilo que o povo deve ouvir e a maneira como deve
agir no seu gabinete de trabalho? Tudo isto pertence ao pregador
e ao seu Senhor, ainda que algumas sugestões possam ajudar
um jovem a formar a sua própria maneira de proceder.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES OS PRIMÓRDIOS DE UM SERMÃO

EMBRIÕES DAS PRÉDICAS todos os dias e algo de familiar sobre alguma coisa bem longe das
experiências cotidianas. Para poder captar o interesse destas
1. O pastor talvez receba a motivação para o sermão, fora pessoas, é necessário viver, saber ver, sentir e compartilhar.
do seu gabinete ãe trabalho. No decorrer das suas visitas pastorais É neste ponto que a obra do pregador se assemelha à do poeta.
ou numa visita ao hospital, o rrúnistro vê a necessidade de deter- Em 1911, com trinta e sete anos de idade, John Masefield começou
minada mensagem. Sem revelar o segredo daqueles que se abrem a escrever longos poemas narrativos. Certa noite de maio, quando
perante êle, quem tem o coração de pastor pode fazer com que a passeava no campo, disse para consigo ao atravessar uma sebe si-
verdade de Deus se ocupe com o sentido do medo, da preocupação tuada entre um bosque de faias e terras de lavoura: "Vou escre-
ou do desânimo. O ministro necessita saber como os homens ver um poema a respeito de um patife que se converte". Nessa
reagem perante a situação mundial, como um coração de pai es- noite fêz o primeiro rascunho de "A Eterna Misericórdia" e nele
tremece ao pensar naquilo que espera o seu filho, adolescente ainda, trabalhou durante as três semanas seguintes. Do mesmo modo,
nas próximas curvas da estrada e da vida. O ministro com os olhos durante uma pescaria no País de Gales, na qual nada pescou,
abertos pode, repetidas vezes, sentir-se chamado a pregar sobre pensou "mostrar como uma boa mulher se torna infeliz inocente-
a "Providência de Deus no momento atual". mente". Após outras três semanas de labor, a sua ideia se con-
O embrião da prédica pode surgir durante os contactos com cretizou em "A Viúva da Rua do Valado" . Até hoje estes dois
l

um leigo no seu emprego. Sempre que Thomas Chalmers viajava poemas de Masefield continuam a sugerir sermões.
numa diligência, gostava de sentar-se na boleia ao lado do cocheiro.
Sem se imiscuir na direção do veiculo, conseguiu aprender muita 2. Além disso, a motivação para o sermão pode surgir guando
coisa acerca de cavalos e homens. Certo dia, numa curva da estamos trabalhando no escritório. Uma ideia pode apossar-se de
estrada, reparou que o cocheiro chicoteou de leve um dos animais. nós ao lermos um livro da Bíblia, talvez na língua original ou numa
Pouco depois, quando Chalmers lhe perguntou por que o fizera, tradução recente. Talvez saibamos de cor aquela passagem que
o cocheiro explicou que o cavalo se assustara com qualquer coisa James Denney, de Glasgow, classificou como o capítulo clássico
na beira da estrada e por isso precisava de algo para lhe desviar sobre a morte de Cristo no Novo Testamento. Certa manhã o mi-
a atenção daquilo. Deste incidente, após longa meditação, Chal- nistro descobre no meio da passagem algo de novo e de estranho:
mers produziu o mais. conhecido sermão pregado por um presbi- "o amor de Cristo nos constrange" (2 Co 5.14). O Apóstolo refe-
teriano: "O Poder Expulsivo de uma Nova Afeição". re-se aqui ao amor de Cristo por nós, o amor que O levou à Cruz.
Quando o seu amor controla o coração e a vida, a sua graça começa
Também Spurgeon formara o hábito de encontrar, em locais
a transformação. Que boa notícia tanto para aquele que se senta
imprevistos, o germe de mensagens futuras. Certo dia, ao passear
no banco da igreja, como para o mundo, hoje em dia! Onde po-
junto ao mar, contemplou vários navios de velas desfraldadas.
derá o membro da Igreja, ou o mundo, encontrar um poder que
Pensou logo no início de um sermão: "Aí vão os navios". O que
controla e transforma?
conseguiu, a partir daí, dependeu da maneira como trabalhou a
sua imaginação. Beecher costumava encontrar motivos para ser- Pode acontecer ainda que a ideia surja de uma passagem me-
mões, ao atravessar o rio numa barca de passageiros e ao passear nos conhecida. Tomemos, por exemplo, Ez. 47.1-12, que fala das
na sua chácara junto ao rio Hudson. Tal como acontece com águas purificadoras que manam do Templo. O ministro pensou
muitos pastores de igrejas citadinas, hoje em dia, Beecher verifi- na necessidade que o mundo tem de Deus, pois lera A History of
cou que os seus ouvintes gostavam de dois tipos de mensagens.
Gostavam de aprender algo estranho sobre alguma coisa que vissem i Ver Poems, Nova York, The Macmillan Co., 1936, pp, V1II-IX.
43: A PREPARAÇÃO DE SERMÕES OS PRIMÓRDIOS DE UM SERMÃO 43

the Expansion of Christianity, de Kenneth S. Latourette. Na visão deixar os sermões amadurecerem, demonstra o poder fecundo da
do profeta o pastor encontra o que precisa para a mensagem so- "incubação inconsciente".
bre a vontade de Deus para o mundo dos nossos dias. Tal como Todos estes métodos estão de acordo com a experiência de mes-
as águas purificadoras fluíam do Templo, transformando-se rapi- tres em outros campos em que a imaginação é necessária. Consi-.
damente num rio poderoso para purificar o Mar Morto, assim o deremos, por exemplo, a pintura. Ticiano costumava trabalhar, no
"abençoado rio da Salvação" flui através da Igreja, trazendo vida seu estúdio, simultaneamente em vários projetos, pois não pla-
a todas as partes do mundo que jaz na sombra da morte. A mesma nejava terminar um quadro logo que começasse. Do mesmo modo
verdade, ainda que em forma diferente, nos aparece em Ez 37.1-10, que poetas como Milton, êle deve ter aprendido que a concepção
acerca da vida que penetra num vale clieio de ossos secos. Ao artística vive nos corações dos homens, na medida do tempo que
tratar de qualquer destas duas passagens, aquele que vai pregar levou a amadurecer na alma do artista. Igualmente o valor de um
deve, em primeiro lugar, ser capaz de ver e sentir. sermão poderá depender do número de semanas, meses, ou mesmo
anos, que levou crescendo no coração do pregador.
Não há, porém, pastor algum que possa esperar um lampejo
iluminador, sempre que começa a preparar um sermão. O prega- 4. Muitas das ideias para sermões surgem do Calendário
dor de uma grande igreja, que incita o jovem ministro a começar Cristão. Durante as suas férias de verão, Oscar F. Blackwelder,
sempre com um problema que clama por solução, possivelmente de Washington, gastava parte da manhã a preparar os sermões
só tenha que preparar vinte e cinco ou trinta mensagens por ano. para o ano seguinte. Como luterano, tencionava seguir o curso do
O que aconteceria se servisse uma congregação onde tivesse que fa- Calendário Cristão, embora não servilmente. Quando recomeçava
lar às mesmas pessoas mais de cem vezes, de janeiro a dezembro? os muitos afazeres, já tinha sobre a mesa um plano geral para o
Como poderia encontrar ideias para tão grande número de ser- ano vindouro, com um programa mais detalhado para o período
mões? Poderia fazê-lo, talvez, reservando lugar para uma estufa culminante do Advento e Natal. Talvez não soubesse ainda exata-
homilética no seu gabinete de estudo. Por que razão para Brooks mente o que iria pregar três meses depois, mas já sabia em que
nunca se esgotou a fonte de sermões? Porque desejava, na verdade, campo iria trabalhar e teria algo crescendo nesse recanto do seu
poder pregar mais vezes? Porque formava o hábito de deixar jardim homilético. Numa congregação grande, o ministro pru-
crescer os sermões de pequenas plantas, mal saídas da sua se- dente nunca deixa de ter algo para pregar duas vezes cada do-
mente. O mesmo fizeram Spurgeon, Beecher e muitos outros, que mingo. Em igrejas não litúrgicas, os pastores poderão pregar,
2

pareciam falar de improviso. como veremos mais adiante, de acordo com um "Calendário Cris-
tão" por eles mesmos elaborado.
3. É possível que a ideia para o sermão surja do canteiro
particular do pastor. O método antigo requeria o uso contínuo
de rascunhos. Durante os três anos que esteve no Seminário, , A APRESENTAÇÃO DO OBJETIVO
Brooks passou a maior parte do seu tempo lendo, observando e pen-
sando. Escreveu nos seus rascunhos toda sorte de sugestões, que Qualquer que seja a génese do sermão, momento virá em que
mais tarde usou em sermões. Beecher, de maneira bem diferente, o ministro terá que decidir sobre o seu objetivo. "O homem sem
costumava armazenar ideias sobre as quais gostaria de pregar mais um fim em vista, raramente chega a alguma parte", disse Char-
tarde. As mensagens de Beecher tomavam rapidamente sua forma les E. Jefferson. "Frequentemente acontece que os ouvintes ficam
na fase final, mas a semente germinara e crescera durante meses
e até mesmo anos. Do ponto de vista psicológico, este sistema de a Ver A. W . Blackwood, Planning a Year's Pulpit Work.
OS PRIMÓRDIOS DE UM SERMÃO
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

perplexos no fim de um sermão, sem saber o que pensar nem o deveria resolver reparar a sua ofensa e conseguir uma reconcilia-
que fazer" . 3
ção. Depois que semelhante sentimento surge no coração, é possí-
vel que a ação abranja o ser inteiro do homem. O sermão que
Ao final do culto um diácono poderá segredar à sua mulher:
convence o ouvinte corretamente, leva-o a fazer a vontade de Deus
"Não sei aonde o pastor que chegar, tu sabes?".
com todas as suas forças.
E ela talvez responda: "Eu não sei e parece que êle mesmo
Logo que o ministro tenha escolhido o seu objetivo, pode usá-lo
não sabe".
para guiar e controlar tudo quanto fizer no sermão. Logo após o
Os membros da igreja acham que os pregadores falham aqui,
início do seu trabalho poderá escolher o texto, ou poderá começar
mais do que em nenhum outro ponto. Como garantia contra a com o texto, se este o tiver inspirado e conduzido ao encontro de
falta de objetivo, o pastor deveria escrevê-lo no seu escritório e determinada necessidade. Qualquer que seja a ordem da intenção
mantê-lo, assim, diante de si, durante toda a semana anterior ao e do texto, o objetivo deve governar tudo quanto se seguir. O ob-
dia em que pregará o sermão. jetivo guia na acumulação de material e na determinação daquilo
"Tal como um atirador aponta para o alvo, visando o ponto que se deve reter. Algum material será encontrado na própria
de mira e nada mais, também o pregador deve ter um ponto de- passagem, e o resto em diversos lugares. Dentre todas as fontes,
finido à sua frente, que precisa atingir." As seguintes palavras, deve usar-se o objetivo como espécie de ímã. Esta espécie de es-
de John Henry Newman, estão relacionadas com as necessidades tudo ajuda-nos muito a fugir do trabalho penoso e assegura horas
dos ouvintes: cheias de aventura. Antes, porém, devemos aprender a usar este
ímã.
" O pregador visa a glória divina, não de forma vaga e geral, mas de
forma definida, enunciando algum artigo ou princípio da palavra revelada. Nenhuma ilustração, por si só, pode apresentar toda a verdade
Além disso não a enuncia para instrução de todo o mundo, mas por amor a respeito da elaboração de um sermão, mas a construção de uma
às pessoas que se assentam diante d e l e . . . O ouvinte deve, pois, estar
ponte dá-nos boa comparação. Antes da Primeira Guerra Mundial,
incluído na própria ideia da pregação e não podemos determinar porme-
norizadamente como pregar, até sabermos a quem nos vamos dirigir".* os habitantes do lado norte de Pittsburgh costumavam caminhar
ao longo do rio, atravessar uma ponte e entrar na cidade. A fim
O objetivo visa mover a vontade do ouvinte à ação, o que talvez de encurtar esse trajeto, um engenheiro fêz os planos de uma ponte
aconteça apenas no íntimo do coração. É ali que o Espírito de que levasse em linha reta ao centro da cidade. Logo viu toda a
Deus faz aquilo que os Pais denominavam a Sua "obra de rotina", estrutura pronta, com uma única exceção: a nova ponte não tinha
não só para o tempo presente como também para a eternidade. 2 vias de acesso. E, durante meses, ali esteve a estrutura imensa,
possível que o pregador se dirija a quinhentos, ou mesmo a mil ho- cheia de beleza e força, mas inútil. Como isto se assemelha a um
mens e mulheres. Mesmo assim, êle os leva a Deus, um a um. sermão sem um objetivo relacionado com as necessidades huma-
Se pregar sobre o perdão dos pecados, desejará que a pessoa sen- nas atuais!
tada no banco da igreja trate da questão das suas próprias trans- Se um pregador pudesse planejar sermões da mesma forma que
gressões, aqui e agora. No fim da mensagem sobre o perdão de um engenheiro faz os planos para uma ponte e para suas vias de
ofensas, o ouvinte deveria resolver, pela graça de Deus, perdoar acesso, então os autores de livros sobre homiiética poderiam for-
àquele que o ofendeu. Se o próprio ouvinte tiver ofendido alguém, mular regras. Por exemplo: comece com a conclusão e termine
com a introdução. Isto evidentemente refere-se aos planos, mas
3 Ver Quiet Hints to Growing Preacliers, Nova York, T. Y. Crowell Co.,
não à redação, que deve partir do começo, prosseguir pelo meio e
1901, p. 87. assim até o final. Certa vez alguém perguntou a O. Henry qual o
1
The Idea of a University, parte n, Cap. VI.
46 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES OS PRIMÓRDIOS DE TJM SERMÃO

segredo para escrever um conto. "Ê simples", respondeu com um 6 — Deixar tudo incubando durante algum tempo.
sorriso, "basta pensar no fim e construir a história que conduza a 7 — Começar a pensar no tópico do sermão.
êle". Porém, quando um jovem pregador tenta pôr em execução 8 — Agrupar gradualmente o material de acordo com o
essa regra, verifica que não é nada simples; a sua mente não acom- objetivo.
panha o padrão que lhe foi apresentado. Mas o principiante pode 9 — Começar a pensar nas ilustrações.
estar certo de uma coisa: o objetivo deve controlar o desenvolvi- 10 — Decidir sobre a introdução ou exórdio.
mento de todo e qualquer sermão. Antes de um engenheiro poder 11 — Escrever o sermão todo de uma vez.
começar a fazer os planos para uma ponte, tem que conhecer o 12 — No dia seguinte rever o manuscrito com todo o cuidado.
objetivo dessa estrutura. Quando tiver terminado a obra, incluindo 13 — Preparar-se para proferir a mensagem de Deus.
as vias de acesso, as pessoas podem começar a utilizar a ponte. 14 — Esquecer a preparação no púlpito.
'r Daqui em diante, meditaremos sobre as várias fases do desen- 15 — Confiar em Deus para abençoar a pregação da sua
volvimento de um sermão, como é executado no gabinete de traba- (
' Palavra. (Is 55.10-11).
lho, e como soa no púlpito depois. Tomaremos como certo que o r
rninistro vive daqueles que assistem aos cultos e sabe do que ne- V LEITURAS SUGERIDAS

cessitam quando vão à igreja. Pensaremos nessa cidade ideal para Black, James, The Mystery of Preaching, Nova York, F. H. Revell Co., 1924.
onde deseja conduzi-los como grupo e individualmente e ficaremos Brastow, Lewis O., The Work of the Preacher, Boston, Pilgrim Press, 1914.
com os olhos abertos para obter a visão do Rei que eles irão en- Breed, Davis R., Preparing to Preach, Nova York, Geo. H. Doran Co., 1911.
Davis, Ozora S., The Principies of Preaching, Chicago, University of Chicago Press,
contrar no coração da cidade. Esperamos que o indivíduo no
1924.
gabinete de trabalho tenha quase tanta alegria na preparação do
Jowett, John Henry, Títe Preacher, His Life and Work, Nova York, Geo. H. Doran
sermão, como na sua própria apresentação. Caso isto aconteça, Co-, 1912.
compreenderá a razão por que George Matheson cantou: "Ó gozo
que me buscas através da dor".
O jovem ministro que ainda se sente confuso, talvez goste de
seguir um programa de trabalho, mas não deve considerar-se imu-
tável e final como as \eis dos medos e persas. Não deveria, tam-
pouco, considerar complicada e perturbadora a preparação de um
sermão. Quando tiver sua posição verificará que a maior dificul-
dade está em determinar o que pregar e resolver acerca do plano,
pois o hábito toma conta do resto. Porém, consciente ou incons-
cientemente, o ministro cuidadoso seguirá certas fases, como as
que se seguem, ainda que muitas vezes numa ordem diferente.

1 — Dar tempo bastante para o sermão crescer.


2 — Formular por escrito um alvo elevado.
3 — Escolher um texto de acordo com o objetivo.
4 — Englobar o objetivo numa conclusão.
>' 5 — Começar a reunir toda a sorte de material.
o COSTUME DE USAR UM TEXTO 49

2. Além disso, o uso adequado do texto encoraja o ministro a


estabelecer um objetivo para cada sermão. Se resolver falar acerca
CAPÍTULO IV do Espírito Santo, talvez tenha dificuldade em tornar o assunto
claro e luminoso para homens e mulheres, que pensam em termos
diferentes. Mas se escolher um texto de preferência curto, pode
centralizar a atenção num único aspecto da verdade acerca do Es-
pírito Santo. Por exemplo, poderá começar com estas palavras de
O COSTUME DE USAR UM TEXTO Nosso Senhor Jesus Cristo, referindo-se ao Espírito: "Êle vos guia-
rá em toda a verdade" (Jo 16.13a). Quando o ministro resolver
preparar um sermão sobre: "O Espírito Santo, nosso Instrutor",
ONDE O MINISTRO ENCONTRA a verdade de Deus, para não precisa ter receio de apresentar abertamente o assunto. Veri-
ir ao encontro das necessidades dos homens hoje ficará que aqueles que vêm à igreja, por muito pouco que saibam,
em dia? Em primeiro lugar na Bíblia. Quando gostam de aprender mais a respeito do Espírito de Deus. Podem,
começa a preparar um sermão escolhe uma passagem das Escritu- pelo menos, compreender o que significa que Êle ensine e que eles
ras. Se seguir o costume dos pregadores de outros tempos, usará aprendam hoje a Sua vontade.
um trecho para cada sermão e ao pronunciar a mensagem come-
çará lendo o trecho escolhido. Depois de ter falado, deseja que o 3. O uso de um texto para um sermão leva o pregador a orar
texto iluminado permaneça brilhando no coração dos ouvintes. no seu escritório, pois as Escrituras e a oração estão tão insepa-
Portanto, o pastor considera o texto como o manancial bíblico do ravelmente ligadas entre si, como a luz e o calor do sol. Quando
sermão, a nascente de que tira a mensagem central. Como seria começar a meditar num texto juntamente com o seu contexto,
bom se isto fosse tão fácil como parece! ora, procurando instintivamente a orientação do Senhor. Se con-
tinuar a pensar no Espírito Santo como Ensinador, o intérprete
poderá compreender imediatamente o significado e as circunstân-
VANTAGENS PARA O PREGADOR cias relacionadas com o seu texto. Quando o Espírito ilumina a
página aberta e faz surgir a verdade na face do Senhor Jesus, o pas-
As vantagens do pregador não são tão grandes como as do po- tor pode falar com base na sua própria experiência e não apenas
vo, mas, apesar disso, começaremos por êle trabalhando no seu sobre algo que aconteceu muito longe, há muitos séculos. Deve
escritório. Pressupomos que sabe escolher o texto e manejá-lo na ter sido tudo isto que Raymond Calkins tinha em mente quando
preparação do sermão. escreveu: The Eloquence of Christian Experience. 1

1. Esta maneira de pregar ajuda muito a garantir ao orador 4. Durante todo o tempo o ministro deve trabalhar. Quando
a mensagem ãe Deus, visto que encontra nas Escrituras a verdade ora, pedindo orientação, e ora sem cessar, descobre que a direção
que vem de Deus. Resolve, pois, descabrir essa verdade e depois re- vem do uso de todas as faculdades que Deus lhe deu. Por que que-
parti-la com os seus amigos. Deve falar com segurança no púlpito. reria alguém que o Senhor fizesse por êle o que êle pode fazer para
Como um advogado, ao defender a sua causa no Supremo Tribunal o Senhor? Se quiser compreender uma passagem no seu contexto,
baseia o seu argumento na Constituição, assim também o advogado tem que ler e pensar, além de orar. Embora comece pela Bíblia,
no foro da razão depende da Bíblia. Em qualquer caso é necessá-
rio usar o raciocínio pessoal e não fazer citações ao acaso. i Nova York, The Macmillan Co., 1927.
50 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 0 COSTUME DE USAR UM TEXTO 51

deve consultar outros livros, incluindo comentários, mas, sob a nada... poderia falar hoje acerca da tentação e sobre o mesmo .".ssunto
orientação de Deus, deve confiar em grande parte no seu próprio no dia seguinte e no outro dia ainda outra vez. Pois descobri que, se
me limitasse à minha passagem e tratasse da porção da verdade aí contida,
raciocínio. Terminado o sermão, talvez não tenha usado tudo
poderia tomar uma dúzia de textos... e tratar de cada um deles tirando
quanto aprendeu sobre a passagem e o assunto, mas pode sentir a coisas novas e interessantes. A o tentar abranger todo o assunto num só
satisfação do homem que fêz a obra para Cristo e para a igreja sermão, não estava senão tentando realizar o impossível, estragando o assunto
local, da melhor maneira possível. por meio de uma compreensão anormal... e arruinando os meus próprios
nervos. £
5. Dominando o texto e o contexto, semana após semana,
pode o pastor continuar a crescer em conhecimento e em poder. Este príncipe do púlpito expressa os sentimentos de muitos
Sempre que prepara um sermão, pode concentrar a atenção numa bons pregadores da Inglaterra. Insistem em que hoje, como no
verdade ou num dever fora de si mesmo, algo de grande e elevado. passado, a pregação requer o uso da Bíblia como âmago do sermão.
Nos onze meses que medeiam as férias de verão, pode apresentar Irritam, por vezes, os pregadores nos Estados Unidos, achando erros
várias porções da Bíblia de diversas maneiras. Se planejar sabia- nos seus sermões. Dizem que a sua pregação se tornaria mais inte-
mente, preparará um programa que lhe permita dominar os livros ressante e mais útil se cada jovem ministro se habituasse a traba-
da Bíblia, um após outro. Semana após semana, sozinho com lhar a partir de um texto escolhido por si, para ir ao encontro de
Deus no seu escritório, o ministro pode tirar uma espécie de curso uma necessidade humana atual. Estes críticos esquecem quão
complementar da Bíblia. Assim planeja trabalhar como abelha, pouco tempo um pastor tem para estudar no seu escritório, depois
que colhe néctar por toda parte, nos campos e nas flores, e não de fazer durante a semana tudo quanto é necessário. É de adrni-
como aranha, que tece uma teia com as suas próprias entranhas. rar-se que no púlpito o pobre e dispersivo homem, sobrecarregado
O jovem pastor que comece a encarar a pregação da Bíblia de compromissos, fique a "vaguear a esmo enquanto prega o Evan-
como uma dádiva de Deus, apreciará o que James Black, da Igreja gelho" e que muitos membros da congregação primem pela au-
Livre de S. Jorge, em Edimburgo, escreveu a respeito dos seus pri- sência aos cultos?
meiros anos no ministério:
Tive uma experiência terrível nos primeiros meses do meu ministério...
Como a maioria dos jovens, pouco sabia a respeito áe pregação... Dizia-me AS VANTAGENS PARA O POVO
a mim mesmo todas* as semanas: "Vamos! Escreve um sermão acerca
da tentação". Pus mãos à obra tratando do assunto â maneira livre de As vantagens dos ouvintes são mais importantes do que as do
if um jovem, tão completamente quanto possível. Escolhi depois um texto
ministro, porque a pregação existe mais por causa daqueles do
adequado e dei-lhe um título. E, em seguida, não tinha absolutamente
mais nada para dizer sobre Tentação. que deste.
"'• Na semana, seguinte disse: "Para a frente! escrevrás um sermão acerca 1. Quando vão à igreja esperam a mensagem de Deus, de
C da Providência". Fiz isto, esgotando o assunto novamente tanto quanto acordo com as necessidades atuais dos seus corações. Poucos se-
me foi possível. E depois disto, nada mais tinha a dizer sôbi* Providên-
riam capazes de expressar verbalmente uma teoria sobre a reve-
cia!... A o fim de três meses, pensei que tinha esgotado todas as verdades
existentes, e eu mesmo, certamente, me encontrava esgotado. Lembro-me
lação e a inspiração, mas o próprio ministro mal pode começar
de ter procurado saber se podia desaparecer sem dar na vista, ou se haveria a compreender o encanto que as Escrituras lançam sobre os espí-
uma denúncia pública perante o Presbitério! ritos de homens e mulheres. Os membros da congregação sentem-se
Foi então que fiz uma descoberta extraordinária,... se me contentasse
em pregar apenas sobre um dado texto ou sobre uma passagem determi- 2 The Mystery of Preaching, Nova York, F. H. Revell Co., 1924, pp. 152-153.
/

A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O COSTUME DE USAR UM TEXTO 5ff

na presença de um mistério que não podem entender. Podem dizer, Haynes Holmes, que não usam textos, e de pregadores mecânicos,
porém, quando é que o Cristo vivo, por intermédio do Seu servo, cujos ouvintes desejariam, às vezes, que nunca tivessem ouvido,
fala no púlpito. Ao regressarem à casa, dizem uns para os outros: falar de textos. Esta forma de pregar evidentemente não opera,,
"Porventura não nos ardia o coração quando... nos falava, quando como máquina, pois método algum seria eficiente nas mãos de um.
nos expunha as Escrituras?" (Lc 24.32). imbecil. Nem todos os ministros sabem escolher um texto, nem
como servir-se tíêle para preparar a mensagem. Infelizmente não
2. Esta espécie de trabalho para o púlpito vai ao encontro
há professor ou livro algum que possa mostrar ao jovem como deve
das necessidades do ouvinte. Considere-se como lição objetiva
escolher o texto — ou a esposa — pois em ambos os casos o jovem
Frederick William Robertson. Este jovem pastor pregava sobre
3

pastor descobrirá que foi êle o escolhido. Sempre que um texto


um texto, todos os domingos de manhã. No segundo culto do dia fizer arder o coração de um homem, pode usá-lo para incendiar ou-
tomava como assunto uma passagem mais longa. Qualquer que tros corações. Disse um velho marinheiro: "Pregar significa tirar
fosse a porção das Escrituras tratada, Robertson não se contentava do teu coração algo quente e transferi-lo para o meu coração".
em explicá-la. Pregava da Bíblia como um meio de graça, o me-
lhor desses meios, mas nunca como um fim em si. Foi principal-
mente por essa razão que tantos gostavam dele, pobres e ricos, desde A ESCOLHA DO TEXTO
humildes criados e operários até os amantes do inglês clássico e os
que buscavam misticamente a Deus. Que gama de interesses Eis algumas sugestões que podem ajudar o principiante:
humanos! 1. Começa com o teu objetivo. Se pensares que o medo nos-
3. A pregação de textos faz com que o povo cresça em enten- nossos dias é o "inimigo público número um", descobrirás no Livro
dimento e em graça. Após um ano, mais ou menos, em que o mi- inúmeros textos sobre a fé como vitória contra o medo.
nistro apresentou texto após outro e mostrou a sua relação com a 2. Observa as estações do Calendário Cristão. Nos meses que'
vida do ouvinte, o membro da Igreja gosta de relembrar os textos antecedem o Advento, medita sobre a maneira como Deus lidou.
nas quais bebera a água da vida. Na hora da tentação o crente com os homens, um a um, nos tempos do Antigo Testamento. Nai
encontra, nestes textos iluminados, a maneira de fugir ao pecado. história de Daniel na cova dos leões encontrarás a fé que sobrepuja
Em tempo de aflição encontra, do mesmo modo, "a paz de Deus o medo (Dn 6.16b). Antes do Natal ocupa-te dos receios atuais
que excede todo o entendimento". Num sanatório para tuberculo- das pessoas (Lc 2.10). Depois do Ano Novo, quando as pessoas se
sos certo estudante universitário jazia sem poder ler. Um dia ocupam mais com a vida terrena do Senhor, fala acerca da acal-
disse ao pastor da Igreja vizinha: "Posso repetir todos os textos mação das vagas e dos temores humanos (Mc 4.40). Depois do
sobre que pregou durante o ano passado e dizer a substância de Pentecostes, se os membros da igreja apreciara Paulo, mostra-lhes
cada um dos sermões. E agradeço a Deus por ter algo de bom em como êle venceu temores no meio de uma tempestade no mar
que meditar todas as noites". (At 27.24). Mas não queiras fazer tudo isso num só ano; busca
variedade.
Eis o ideal. Mas qual será o reverso da medalha? Todos nós
podemos lembrar nomes de pregadores populares, tais como John 3. Certifica-te de que o texto pertence à Bíblia. Em que
versão aparecem as palavras do teu texto? Se pregares um sermão
3 Sermons Preacheá at BHghton, I vol. ed., Nova York, Harper & Bros., s. d. missionário baseado em Mc 16.15, talvez te seja necessário respon-
Também James R. Blackwood, The Sowl oj Frederick W. Robertson, Nova York,
der a perguntas embaraçosas. O mesmo acontece com a narrativa
Harper & Bros., 1947.
-Si A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O COSTUME DE USAR UM TEXTO 55

da mulher apanhada em adultério (Jo 8.1-11), ou com as pala- que permanece firme na rocha do que sobre a casa que caiu por
vras do eunuco a Filipe (At 8.37). O pregador hábil pode usar ter sido edificada na areia. Aqui novamente, ainda que seja para
a passagem mencionada no quarto Evangelho como âmago da variar, a regra permite exceções. Mas se quisermos interpretar as
mensagem sobre "A Ternura de Jesus", "Jesus, o Cavalheiro" ou Escrituras, devemos mostrar de forma clara que elas acentuam
"Um Sermão no Pó". Mas sê sincero, caso tentes fazê-lo dize ao mais o "Eterno Sim" do que o "Eterno Não" de Carlyle. 5

povo que as palavras não aparecem nos manuscritos mais antigos


6. Dá preferência ao texto que apela à imaginação, apresen-
do Novo Testamento, que as usas por julgares que apresentam a
tando algo para ver, sentir e fazer. Estuda os duzentos sermões
verdade acerca do Senhor. Estuda sempre as versões modernas,
de Brooks e repara como, quase sempre, começava por um texto
melhor ainda, começa pelo grego ou pelo hebraico.
que mostrava alguém em ação ou uma figura visual. Lembra-te de
4. Escolhe um texto que faça sentido. Só um prestidigitador que o crente, hoje em dia, prefere ver a pensar. Quase todas as
poderia falar durante vinte e cinco minutos sobre "Isto é o que" pessoas que nasceram depois da Primeira Grande Guerra, têm sido
(At 2.16). No contexto, estas palavras do Apóstolo, no dia de instruídas a pensar mais imaginativa do que logicamente. Por
Pentecostes, nos chegam cheias de significado e de poder e por isto os que vão à Igreja querem que o pregador faça ver o que diz,
esta razão o texto do sermão devia conter a mensagem. Porém, que não apresente argumentos, mas que pinte cenas como as das
nem todas as passagens precisam ser claras à primeira vista. Por parábolas.
que não pregar sobre o provérbio: "Os pais comeram uvas verdes, e
os dentes dos filhos é que se embotaram" (Ez 18.2b) ? Este adágio 7. Geralmente convém escolher um texto curto. No sermão
fala-nos da obra da providência e da graça de Deus, operando o ministro pode repetir frequentemente um texto curto e o leigo
através do que conhecemos pelo nome de hereditariedade e meio pode recordá-lo facilmente. Num livro de sermões pregados no
ambiente, especialmente no lar. Rádio, Ralph W. Sockman usa uma grande variedade de textos,
8

todos curtos. Sockman concordaria com Beecher, que diz que o pre-
Da dor numa família surgiu o sermão mais conhecido da
gador deve usar um texto como uma cancela que dá para um cam-
nossa geração: "Mas que fazer, quando a vida desmoronar?" *
po e não deve perder tempo balançando nela. Vejamos estes textos
Quando A. J. Gossip pregou pela primeira vez depois da morte
no livro de Sockman: "Escolhe a vida"; "Não temerei mal algum,
da sua mulher, tomou um texto que deve ter causado perplexidade
pois Tu estás comigo"; "Este é o caminho, andai nele"; "Que devo
no auditório (Jr 12„5), pois esta passagem fala de peões e de ca-
fazer para me salvar?"; "Levanta-te e não temas"; "Somos salvos
valos e da cheia do Jordão. Porém, a mensagem justificou plena-
pela esperança".
mente a escolha do texto. Ao ler o sermão quem poderá jamais
esquecer o tópico ou o texto ou deixar de dar graças pela força e 8. Usa geralmente um só texto em cada sermão e íaze-o bri-
pela confiança que aquele coração sangrando tirou de palavras lhar. Pregadores maduros, como James S. Stewart, podem começar
tão pouco familiares? com mais de um texto, mas como jovem ministro, quando não
5. Em regra escolhe de preferência texto positivo e não ne- tens tempo suficiente para tornar claro e luminoso um só texto,
gativo. Sobre o Salmo primeiro fala mais da árvore frutífera do por que hás de dobrar a tua dificuldade? Talvez possas reparar no
que da moinha que o vento espalha. Melhor ainda, descreve as contraste entre as palavras de Jacó: "Todas estas coisas me so-
duas figuras opostas, como no próprio salmo, mas salienta mais a brevêm" (Gn 42.36c), e as do Apóstolo: "Sabemos que todas as
boa do que a má. No sermão do Monte prega mais sobre a casa
5 Ver Sartor Resortus, livro II, caps. 7, 9.
* A. W . Blackwood, The Protestant Pulpit, sermão n.° 24. o Now to live, Nova York e Nashville, Abingdon-Cokesbury Press, 1956.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O COSTUME DE USAR UM TEXTO 57

coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deixa que todos eles ah se mantenham até estarem prontos para o
Deus" (Rrri 8.28a). Ou considera o contraste entre dois outros uso. Depois de teres pregado um sermão, verificarás que o povo se
textos: "não sabia Moisés que resplandecia a pele do seu rosto" lembrará dele na proporção do tempo que levaste pensando na men-
(Ex 34.29b) e Sansão "não sabia ainda que já o Senhor se tinha sagem antes de apresentá-la. Mais ou menos pela mesma razão, a
retirado dele" (Jz 16.20c). Por que não preparar para cada caso, parte de uma planta ou árvore debaixo do solo pode ter o mesmo
dois sermões de contraste? Para que aumentar a confusão do mem- volume da que aparece à nossa vista. Por isso, se quiseres preparar
bro da Igreja, misturando o que o Livro separa? sermões que permaneçam, dá-lhes tempo para crescer.

9. Escolhe, semana após semana, uma variedade ãe textos. 2. Descobre o significado do texto para quem o escreveu. Vai
Sê mordomo do mestre, que tira do seu tesouro coisas novas e velhas. ao livro em que as palavras aparecem. Lembra-te de que um ver-
Apresenta as novas à luz antiga e familiar e as velhas com luz sículo no Evangelho de João é diferente de uma passagem em Juí-
nova e agradável. "Velho" e "Novo" significam aqui o que o leigo zes e que as palavras de Eclesiastes são diferentes das do livro de
sabe e o que não sabe. De todas estas sugestões sobre a maneira Ester. É aqui que está o valor de conhecer as Escrituras, tal como
de escolher textos, esta poderá ser a mais importante e a mais foram escritas, livro após livro. Se Spurgeon tivesse meditado so-
exigente. É possível que inconscientemente um pregador caia na bre o conteúdo e o colorido do livro de Juízes, não teria pregado
rotina. Como sentiu grande prazer na preparação para pregar um sermão sobre Sansão como lição objetiva de consagração. Por
sobre textos de determinada espécie, tenta outro do mesmo género outro lado, o ministro que conhecer o livro de Juízes pode achar
e ainda um terceiro. Em breve a sua obra se torna monótona. Que nele uma riqueza de temas para pregação. Em Sansão, o homem
o Senhor livre os seus intérpretes de tornarem insípidas as Escri- mais forte do mundo na Antiguidade, o intérprete pode ver a ne-
turas! "Oh! minha alma, vigia!" cessidade da religião para o corpo de um jovem atleta.

O texto em si requer exegese, que significa "tirar" o signifi-


cado das palavras, uma por uma e em conjunto. Começando com
A TAREFA DA INTERPRETAÇÃO
o hebraico ou o grego — se se conhecerem as línguas originais —
podemos descobrir o conteúdo intelectual e o espírito emocional do
Muito menos pode um livro ou professor estabelecer regras
texto. Este trabalho requer comentários exegéticos, muitos dos
sobre a interpretaçãd de textos. Isso depende de fatôres vários,
quais se baseiam nas línguas originais. Os volumes do Moffatt
incluindo o fundo e o colorido do texto, a personalidade e visão do
New Testament Commentary não exigem este conhecimento. Os
pregador, o conhecimento e os interesses dos ouvintes. Aquilo que
"comentários homiléticos", que apresentam planos de sermões já
o jovem vê deve depender daquilo que o escritor sagrado escreveu,
prontos, podem ser úteis para o pregador leigo, mas não devem
daquilo que o intérprete encontra e daquilo que pretende mostrar ter lugar na estante do indivíduo com preparo num seminário.
ao seu amigo no banco da igreja. Teoricamente é possível que tudo Um ministro instruído necessita de um ou dois comentários exegé-
isto pareça formidável, mas na prática é fascinante, Quando se ticos de cada um dos livros mais importantes da Bíblia, bem como
ama o Livro e o povo, há alegria em usar todos os poderes dados outros livros de valor que mostrem o significado das Sagradas
por Deus, para irmos ao encontro das suas necessidades. Quanto Escrituras. 7

à maneira de o fazer, aqui vão algumas sugestões:


1. Permite abundância de tempo. Tal como Beecher, deves
1
i Para uma lista ver A. W . Blackwood, Preaching Jrom lhe Bible, Nova York.
ter crescendo, no teu viveiro homilétíco, toda espécie de sermões. e Nashville, Abingdon-Cokesbury Press, 1941, pp. 237-239.
$g ./ A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O COSTUME DE USAR UM TEXTO 59

3. Formula gradualmente a mensagem prática em termos sobre o conceito do Homem do Minuto. Com vinte e quatro anos
da atualidade, de forma a pregá-la aqui e agora. Descobrirás que, apenas, completou a estátua que cem anos depois personificaria os
o que o teólogo escocês James Denney escreveu acerca dos Evan- ideais dos pais da Revolução e seus descendentes. A biografia nos
gelhos, é verdade para toda a Bíblia: conta como o jovem French usou tanto a vista como as mãos para
"Quando pregamos baseados nos Evangelhos e vemos o que Jesus era,
ajudar os outros a ver o que descobrira a respeito do significado
o que disse e fêz e como sofreu, lembramo-nos de fazer a aplicação no da história americana.
indicativo presente. Nunca pregues acerca de Jesus histórico; prega acerca
do Cristo vivo e soberano... Não é porque viveu, mas porque vive que "Os pregadores precisam conhecer a forma como os artistas
nós temos vida também; não é porque a imaginação histórica é muito vêem a verdade universal e só quando o púlpito atual estiver dis-
desenvolvida, de maneira que possamos tornar vívidas as paginas dos evan- posto a ter o trabalho de compreender como trabalham os poetas,
gelistas e nos sentirmos comovidos, como numa cena bela de uma peça pintores e músicos que a arte da pregação retomará o lugar que
teatral — não é por esta razão que somos salvos, mas porque confessamos
lhe compete." 10

com a nossa boca e cremos no nosso coração que Deus ressuscitou dos
mortos. A fé sempre tem, já aqui, o seu objeto e onde não houver fé,
não há religião. 8 LEITURAS SUGERIDAS

Brown, Charles R., The Ari of Preaching, Nova York, The Macmillan Co., 1922.
4. Chegará o momento em que será necessário decidir acerca Phelps, Austin, The Theory of Preaching, revista por F. D. Whitesell, Grand Ra-
da forma do sermão. Não precisamos aprofundar este tema aqui, pids, Eerdman's, 1947.
mas devemos notar uma coisa: a habilidade de usar um texto, Vinet, Alexandre, Homiíetics, Edimburgo, 1858.

para irmos ao encontro duma necessidade humana atual, depende


da compreensão não só do texto, como também da própria necessi-
dade. O indivíduo sábio, como já vimos, não começa por uma forma
de madeira para depois ir à Bíblia e a outras fontes, em busca de
material para encher o molde. Percebe a necessidade e então des-
cobre na Bíblia uma verdade que vá ao seu encontro. Só depois
de compreender, tanto a necessidade como a passagem, é que pode
começar a pensar aíaramente sobre a forma final do sermão.
Tudo isto pode parecer mecânico, mas o mesmo aconteceria
com a narração do trabalho preliminar de qualquer artista. Uma
biografia fala-nos acerca de um jovem escultor que desenhou e
0

esculpiu a estátua do Homem do Minuto, em Concórdia. Antes de


Daniel C. French entrar nesse concurso e ganhar o prémio nunca
fizera uma estátua, mas sendo natural de Concórdia, sabia a razão
por que o povo da cidade queria celebrar o centenário de 1776. De-
pois de passar em revista os acontecimentos, fêz a sua decisão

s Ver Síudies in Theology, Nova York, A. C. Armstrong & Son, 1837, p. 154.
9 Margaret French, Joumcy iiito Fame, The Li/e of Daniel Cftester French — io Williard L. Sperry, Reality In Worship, Nova York, The Macmillan Co.,
Cambridge, Harvard University Press, 1947, pp. 63-84. 1925, p. 248.
0 VALOR DOS SERMÕES TEXTUAIS 61

"Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará", tratava em pri-


CAPÍTULO V v: meiro lugar da "Verdade que Liberta" e em seguida da "Liberdade
dada pela Verdade". Veja The Sermons Preached at Brighton, onde
se encontram numerosos exemplos deste trabalho. Claro que ou-
tros homens empregam o método textual de formas muito
diferentes.
O VALOR DOS SERMÕES TEXTUAIS
VANTAGENS DO MÉTODO

QUANDO O JOVEM Daniel Frendi resolveu o que que-


1. Este género de trabalho para o púlpito faz fixar a atenção
ria fazer, ao esculpir uma estátua para o Par-
numa parte das Escrituras. Em vez de confundir o ouvinte, vol-
que de Concórdia, começou a fazer toda a es-
tejando aqui e acolá, o ministro resolve explicar algumas palavras
pécie de esboço no quadro-negro e de modelos de barro. Por
sobre as quais pode projetar alguma luz. Pode, por exemplo, con-
fim mostrou quatro desses modelos a membros da sua fa-
siderar o texto que George Adam Smith considerava como o mais
mília e verificou com grande prazer que todos preferiam aquele
nobre de todo o Antigo Testamento: "Que é o que o Senhor pede
de que êle próprio gostava mais. Foi este que usou para fazer a
de ti, senão que pratiques a justiça e ames a misericórdia, e andes
estátua do Homem do Minuto. Se o jovem French estivesse apren-
humildemente com o teu Deus?" (Mq 6.8). O pregador pode, a
dendo a pregar, é possível que tivesse elaborado vários planos para
partir deste texto, apresentar o assunto: "O significado da Reli-
tratar da verdade contida em detenninado texto. Poderia pensar,
gião Individual". A introdução pode tratar, portanto, do problema
entre outros planos, num sermão textual.
que surge nos versos precedentes. Tudo está relacionado com a
O sermão textual é aquele cuja estrutura corresponde à ordem questão: "Que pede o Senhor de ti?".
das partes no texto. Num sermão, tal como numa estátua, muita
A resposta sai das próprias partes do texto em si. Quaisquer
coisa depende da força e graça da estrutura. Quer a estrutura
que sejam as palavras usadas, devem estar relacionadas com jus-
atraia ou não a atenção sobre si mesma, está tão intimamente
tiça, beneficência e humildade, nesta ordem. O fundamento da
relacionada com a mensagem, quanto o esqueleto está com o corpo
vida do homem bom é a justiça, deve praticá-la sempre, dia após
humano. Se pensamos momentaneamente sobre a forma textual
dia. Mais importante ainda, deve amar a beneficência, nela deve
de tratar os resultados da exegese, lembremo-nos de que outros
viver e mover-se e ter o seu ser, do mesmo modo que vive no seu
métodos tiveram a aprovação dos príncipes do púlpito, de outrora
lar. Finalmente, e acima de tudo, deve andar humildemente com
e hodiernos; na verdade o método textual até certo ponto está fora
o seu Deus. Veja como no verso como um todo a ênfase cai em
de moda.
três subjuntivos. Não é, portanto, de admirar que este verso surja
Para exemplos de pregação textual, consideremos Frederick como o lema principal na Alcova da Religião da Biblioteca do Con-
Robertson. No culto da manhã, podia pregar sobre um texto com gresso, nos Estados Unidos. Como seria possível fazer sobressair
duas verdades opostas. Se falasse de Mt 5.48: "Sede, pois, perfei- esta tripla verdade, se não através de um sermão textual?
tos", apresentaria dois aspectos do assunto e só dois. Discutiria em
primeiro lugar "O objetivo Cristão — Perfeição". Em seguida, con- 2. Esta espécie de mensagem deve ser considerada fácil de
sideraria "O Motivo Cristão" — porque ser perfeito é justo e de preparar pelo principiante. É possível que não pense assim ao
acordo com a vontade de Deus". Quando começava com Jo 8.32: mergulhar no sentido da passagem, mas tem de fazê-lo de qualquer
62 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O VALOR DOS SERMÕES TEXTUAIS 63

maneira. Depois de descobrir o seu significado, no seu contexto, 4. Esta espécie de pregação leva o ouvinte mais perto do
deveria encontrar poucas dificuldades em auxiliar o crente a en- coração da Bíblia. Nem todos os sermões surgem de um texto real,
tender a forma do texto. Isto só se verifica, evidentemente, se mas apesar disso esta maneira de pregar continua a atrair a aten-
tiver escolhido a mensagem que faça sobressair os vários elemen- ção de muitos como estrela cintilante no céu. Quando alguém
tos. Por exemplo, num sermão sobre Is 40.31, William P. Merril ensina Shakespeare, gosta que o estudante se familiarize com as
usa o tópico "O Valor Prático da Religião". Em primeiro lugar
1
passagens mais extraordinárias. Todos os anos, em Harvard, G. L.
discute o problema, de acordo com o costume atual. É possível Kittredge exigia que os alunos da classe de Shakespeare soubessem
que outra introdução tratasse o texto era suas três partes, que de cor oitocentos dos melhores versos. O pastor não pode fazer tal
parecem surgir em ordem inversa. Por que não mudá-las de for- exigência no púlpito, mas pode encorajar os membros da sua igreja
ma a alcançar um ponto culminante? Consideremos o problema a ver a glória de Deus, tal como ela brilha em tantos textos áureos.
e depois sigamos a ordem do texto! Aquele que raramente prega textualmente, talvez evite passa-
Depois de abordar o tema, o sermão do Dr. Merril tem três gens famosas, com medo de que a sua consideração, de Jo 3.16 ou
partes: (1) "Sobem... como águias" — poder para defender ideais; de Rm 8.28, não alcance a altura do texto. Mas aqueles que ouvem
(2) "Correm e não se cansam" — poder para enfrentar crises; e os seus sermões não pensam da mesma maneira, não esperam que
(3) "Caminham e não se fatigam" — poder para a vida diária. ninguém viva nos cumes elevados do Quarto Evangelho ou da Epís-
Para outro intérprete menos exato, é possível que as três partes tola aos Romanos. Sentem-se felizes quando o pastor, numa pas-
sugerissem as visões da juventude, as realizações da meia-idade, sagem que amam, lhes mostra porque a amam. Pela mesma razão
e a serenidade da velhice. Ainda em outras mãos os fatos condu- os estudantes universitários preferem estudar as peças mais fa-
zem à mensagem com três partes: (1) as horas de visão — rara- mosas. E, no entanto, a Biblioteca de certo professor de seminário,
mente surgem e não permanecem; (2) os dias de progresso — sur- com milhares de sermões impressos, contém uma única mensagem
gem mais vezes e trazem grandes esperanças; e (3) os anos de verdadeira de Jo 3.16 e nenhuma de Rm 8.28. O sermão sobre o
trabalho penoso — preenchem a maior parte da nossa vida e tra- "texto áureo da Bíblia" mostra como a verdade predomina. Ao
zem-nos as provas mais difíceis. Para o homem, como para o pregar sobre "Amor em Quatro Dimensões", William M. Clow apre-
automóvel, a prova principal pode vir na primeira marcha. Que senta a largura "De tal maneira amou Deus o mundo", o com-
texto para um sermão de bacharelado!
t
primento — "que lhe deu o seu. filho unigénito", a profundidade
— "que todo aquele que nele crê não pereça" e a altura: — "Mas
3. Se o homem do púlpito conhece o seu mister, o ouvinte é tenha a vida eterna". 2

capaz de seguir o sermão textual com facilidade e satisfação. Pode


ver as várias fases à medida que a mensagem se vai desenvolvendo.
Ao seguir a pista em Mq 6.8, pode começar a examinar o seu OBJEÇÕES AO MÉTODO
próprio coração e a sua própria vida. Mais ainda, pode relembrar
o texto e a interpretação nos dias e nos anos futuros, principal- Dadas estas e muitas outras vantagens, por que passaram de
mente porque o texto apela à imaginação. Se decorar as vinte e moda os sermões textuais? Como veremos mais tarde, na história
cinco palavras, poderá ver nelas, de um relance, teoricamente a da pregação, quase todos os sermões que se tornaram famosos eram
sua própria carreira. Que texto iluminador! tópicos e não textuais. Há defensores exaltados de ambos os sis-
3

i Ver C. W. Ferguson, The Great Themes of the Christian Faith, Nova York, 2
Ver The Cross in Christian Experience, Nova York, Geo. H. Doran, Co., 1911,
R. R. Smith, 1930, pp. 107-115. pp. 52-64.
O VALOR DOS SERMÕES TEXTUAIS
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 6*5

temas. Alguns levam o leitor a pensar que deve pregar sempre da 1 — "Quem me dera" — Humildade cristã
2 — "Asas" — velocidade prudente
mesma maneira. Quais são as objeções ao método textual?
3 — "Como de pomba" — simplicidade inocente
Ninguém poderia opor-se à forma correta dos sermões textuais. 4 — "Voaria" — sublimidade devota
O que está errado é o conteúdo e não o nome. Com uma ou outra 5 — "Acharia pouso" — Segurança permanente *
exceção, aqueles que ouvem as mensagens do pastor pouco sabem,
e ainda menos se interessam, sobre termos técnicos. Mas começam 2. É possível que um texto contenha mais ideias do que as
a sentir-se inquietos, se as prédicas do pastor se assemelham umas que o ministro pode tornar claras e luminosas em vinte e cinco
às outras todas as semanas, cada uma delas menos convidativa do minutos. Tome-se como exemplo 1 Co 10.13, que começa assim:
que a anterior. Se o povo se ausentar do santuário, talvez o faça "Não vos sobreveio tentação que não fosse humana". Só um pre-
porque se cansou de ouvir constantemente a mesma coisa. É pos- gador com grande talento será capaz de conduzir uma congregação
sível, no entanto, que o seu pastor creia que está executando os por todas as sinuosidades de pensamento existentes neste único
conselhos do professor do seminário, que encorajou a pregação da verso. Porém, qualquer um, de olhos abertos para a mensagem que
Bíblia! Pensemos, portanto, no reverso da medalha. seja útil para os nossos dias, poderá mostrar aos ouvintes a verdade
sobre Deus, dando ao homem poder para vencer toda e qualquer
1. O método textual não se presta a todas as passagens das
tentação que lhe advenha.
quais se pode tirar um sermão. O pastor, amigo de sermões tex-
tuais, encontra aqui e ali certa dificuldade em dividir a sua passa- Pensemos no assunto como se fôssemos engenheiros. Quando
gem. Verifica que, tal como o vestido inconsútil do Mestre, é uma John Roebling e seu filho fizeram os planos para a Ponte de Broo-
peça só. Como seria possível, por exemplo, separar os elementos de klin, calcularam a tensão máxima que a estrutura teria que su-
Jo 19.5b: "Eis o homem!" ou de 1 Jo 4.16b: "Deus é amor"? É portar e depois construíram a ponte que a aguentasse e lá está
possível que queira pregar, no primeiro destes textos, acerca de eia há mais de sessenta anos. Onde é que aqueles engenheiros
"Cristo, o Homem Ideal", e no segundo, acerca de "A Melhor Coisa conseguiram a sabedoria e capacidade de planejar e construir aque-
a respeito de Deus". Se assim fôr, faça um sermão tópico ou qual- la ponte? Do Deus acerca de Quem o Apóstolo escreveu em 1 Co
quer outro, dando graças a Deus porque o valor do trabalho para o 10.13. Que introdução para um sermão, ainda que as palavras se
púlpito depende muito mais da mensagem do que do método. não prestem bem ao tratamento textual!

Um exemplo extremo mostrará como o método textual conduz 3. Este método muitas vezes conduz a sermões artificiais.
a sermões mecânicos. Um pastor antigo começou com a forma A menos que se estude o pano de fundo do texto e das palavras,
latina do SI 55.6. No seu contexto, estas palavras levariam a um podemos tirar lições que a passagem não ensina. Por exemplo,
. sermão sobre "O Repouso da Religião de um Homem". O anato- um orador sagrado falou certa vez sobre "O Investimento dos Anos".
mista, porém, dividiu este curto texto em cinco partes — três das Começou com um texto falando da passagem dos nossos dias na
quais sobram. Tal hábito de ler no texto aquilo que lá não está, terra: "Acabam-se os nossas anos como um breve pensamento"
tomou-se conhecido pelo nome de "eisegese". Neste caso o ser- (SI 90.9b) Extraiu o seu assunto da palavra "Acabam-se" que
mão borrou a pintura e transformou a poesia em prosa. em hebraico literalmente significa "Consumir" e não "Investir", e

3 Quando fiz uma coleção de SB sermões representativos do passado e do 4 Ver Marvin Vincent, The Expositor in the Pulpit, Nova York, Randolph
presente, escolhi-os por razões diversas. Quando íiz a lista completa para o livro Co., 1884, pp. S-10.
The Protesíarrt Pulpit verifiquei que incluíra poucos sermões textuais.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O VALOR DOS SERMÕES TEXTUAIS
67
nada tem a ver com dinheiro. Sem querer, o intérprete fêz o que 5. Finalmente, os sermões textuais podem não ser úteis. Em
chamamos eisegese, o que poderia ter evitado se tivesse consul- casos extremos, é possível que este tipo de pregação faça mais dano
tado outra versão boa ou, melhor ainda, se consultasse o original do que bem. Esforços como estes falsificam o Deus da Bíblia e
hebraico. repelem homens com senso comum. Os exemplos que se seguem
E, o que é ainda pior, a sua mensagem está partida ao meio. não são pregação textual digna deste nome, visto que mostram
O pregador tratou primeiro de "A Vida como Fortuna Para Ser a loucura que há na substituição da verdade bíblica pela esperteza
Gasta". Todos devem decidir-se a viver, como miseráveis, como humana. Também demonstram claramente como um texto sagra-
perdulários ou como capitalistas. Até aqui o tratamento, ainda do pode parecer burlesco, quando o que sobe ao púlpito não possui
que não fosse textual, era lógico. Mas, em seguida, o fotógrafo alto sentimento de reverência e senso de humor.
mudou a sua máquina. O pregador começou a considerar a "vida Certo ministro de outros tempos, na Inglaterra, usou o texto
como uma história para ser contada": todos devem escolher se os de SI 55.6 já citado, que trata do desejo que temos de asas:
seus dias na terra deverão ser um romance de amor, um romance "Davi não desejava asas como as de um gafanhoto para saltar de
policial ou uma história evangélica. Esta última parte do sermão flor em flor, como fazem essas almas apressadas que saltam para a
é, em grande escala, o resultado da análise do texto tal como se religião mas não correm com perseverança, nem como a avestruz
encontra na versão do Rei Tiago. Falta, porém, unidade ao sermão. que fica na terra apesar de ter asas, como os hipócritas que nunca
Segue dois tipos diferentes, qualquer dos quais teria dado excelente sobem em direção às coisas celestiais".
esboço para mensagem útil. Certo moralista da fronteira nos Estados Unidos dissertou
sobre Gn 5.24 — "Andou Enoque com Deus; e já não era porque
4. Ao contrário do que acontece com este exemplo, os ser-
Deus o tomou para si". O orador poderia ter considerado o signi-
mões textuais frequentemente não têm interesse humano. Até o
ficado da religião do indivíduo como "A Profunda Amizade cora
próprio Spurgeon não era capaz, por vezes, de demonstrar como é
Deus", que traz alegria e esplendor à vida presente e plenitude e
que a passagem usada se relacionava com as necessidades dos seus
glória na vida futura. O pregador, porém, preferiu seguir uma
ouvintes. Era realmente um mestre na pregação textual, mas uma
pista muito pessoal. Na forma textual referiu-se em primeiro lu-
vez usou Mc 10.45 mecanicamente. Se tivesse falado sobre "O
gar ao fato de Enoque andar com Deus e depois às palavras "e j á
Espírito do Serviço Cristão", poderia ter extraído as duas ideias
não era": "Enoque não era episcopal, porque andava, não dançava;
principais do texto, mas preferiu discutir cinco verdades, com
Enoque não era batlsta, porque andava, não nadava, não era pres-
tanta ligação entre si eomo as cinco ilhas de um arquipélago.
biteriano porque andava com Deus; era metodista, porque Deus o
Nenhuma das cinco verdades se aproximava do espírito do texto,
tomou para si".
no seu contexto, relacionado com as ambições dos estudantes para
o ministério no "Seminário dos Apóstolos".
A VEREDA DA SABEDORIA NO PRESENTE
1 — "O Filho do Homem" — humanidade
2 — "Veio" — existência anterior Considerando estes caprichos, onde jaz a vereda da sabedoria?
3 — "Não para ser servido" — vida vicária Esta discussão interessa ao jovem que começa a formar hábitos
4 — " M a s . . . para dar a sua vida em resgate" — morte para a tarefa de toda a sua vida.
vicária 1. Escolhe um texto para todos os sermões. Verificarás que
5 — "De muitos" — amplidão. nunca se prejudica uma mensagem relacionando-a corretamente
68 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
O VALOR DOS SERMÕES TEXTUAIS
69
com a passagem própria. Quando te levantares para pregar es-
pera pelo silêncio e depois começa pela leitura do texto. Fazendo forma de apresentação às verdades e normas antigas para
isto economizarás tempo e darás relevo ao que é melhor. Com que se prove a satisfação de lidar com textos, de 'acordo
exceção da bênção, não há nada, na última meia hora do culto, com a sua estrutura. Sem dúvida, não há geração alguma que
que ocupe lugar de tão grande importância como o texto. possa reclamar o monopólio das melhores maneiras de usar as ver-
Por ocasião das comemorações do segundo centenário do Se- dades divinas, para a solução das necessidades humanas.
minário de Princeton, o Arcebispo de Cantuária atravessou o
Atlântico para apresentar as saudações da Igreja Angelicana. Uma palavra ao jovem leitor: quer uses ou não o método tex-
Quando se levantou para pregar na capela do seminário, começou tual, importa que ao pregar deixes com o ouvinte sempre um texto
claramente explicado.
pronunciando o texto. Não fazia muito terminara a segunda Guer-
ra Mundial e as palavras do Apóstolo ecoaram em toda a sua elo-
quência. "A ardente expectativa da criação aguarda a revelação
dos filhos de Deus" (Rm 8.19). De que maneira mais extraordi-
nária poderia ter o Arcebispo começado? Que outras palavras,
senão as das Sagradas Escrituras, poderiam estar em harmonia
com semelhante momento ou com qualquer outro cm que todo
ouvinte esperasse uma palavra vinda do trono do Deus Altíssimo?

2. Sempre, ao escolher o texto, trata-o honestamente. De-


verás conhecer o seu significado e pregar o que êle diz. Não podes
tratá-lo mal, abusar dele, nem tampouco ignorá-lo. Sentir-te-ás
livre, dentro de certos limites, para apresentar a verdade e o dever
nele contido, como o Espírito te dirigir. Se as palavras do Livro
se prestarem a um tratamento textual, poderás optar por esse ca-
minho, caso contrário abrirás um caminho próprio. Aquele que
ama o Senhor e conhece o Livro, terá de começar cedo a revelar
"consciência exegética". Do contrário talvez comece a profanar
o que deveria considerar santo.

3. Compreende o valor ãe cada método. Nenhum dos siste-


mas pode servir a todos os ministros e adaptar-se a todas as oca-
siões. Os antigas abusavam dos sermões textuais, de tal maneira
que o púlpito perdeu a variedade e o interesse humano. Muitos
dos novos não usam suficientemente esse método, de modo que é
possível que falte aos seus sermões viveza e utilidade. Por que não
deviam antigos e novos encontrar-se a meio caminho? Então os
antigos tentariam meios mais novos para apresentar velhas ver-
dades e obrigações, e os novos experimentariam dar nova
A NECESSIDADE DA OBRA EXPOSITIVA
72

tulo ou um livro da Bíblia, encontrar-se-á toda a sorte de obstá-


CAPÍTULO VI culos. Considerando tantas dificuldades, atualmente há muitos
pastores que querem tornar-se hábeis nesta forma de pregação.
Visto que a Bíblia é composta de livros e os livros de parágrafos, 1

gostam de tratar a Bíblia consoante seu caráter e objetivo. Que


outra coisa se poderia esperar de homens "doutos nas Escrituras?"
,; A NECESSIDADE DA OBRA EXPOSITIVA Portanto, como deve começar um jovem pastor? Preparando
vez por outra mensagem expositiva, talvez uma por mês. Tal
plano de trabalho, bastante maleável, dá tempo para cuidadosa
POR TODA PARTE OS pastores estão se interessando
preparação e dá tempo ao povo para se acostumar a esta nova es-
pela pregação expositiva. No nosso caso, um
pécie de mensagem — nova pelo menos para eles. Depois de mais
sermão expositivo é o que surge de uma pas-
ou menos seis meses, o pregador pode começar a usar estes ser-
sagem bíblica com mais de dois ou três versículos. Teori-
mões com mais frequência e, depois de um ano ou dois, pode fazer
camente este tipo de sermão difere do textual, principalmente
um em cada domingo, caso tenha que dirigir mais de um culto neles.
pela extensão da passagem bíblica em que se baseia; na prática
Só alguém com talento excepcional para este método, como G.
ambos se sobrepõem. Podemos, por exemplo, expor o significado
Campbell Morgan, deveria limitar-se exclusivamente a este tipo de
e o valor espiritual de Mt 11.28-30. A mensagem daí extraída seria
pregação. Como afirma Henry Sloane Coffin, procura esforçar-te
de natureza expositiva cu textual? Talvez expositiva, ainda que
para que em cada culto da semana haja um tipo diferente de pre-
ambas as classificações fossem adequadas. Portanto, aparente-
gação. Portanto, cada vez que subires ao púlpito, irás ao encontro
mente um sermão expositivo implica no tratamento textual de
de uma espécie diferente de necessidade humana.
uma passagem bastante extensa, ao passo que um sermão textual
será o tratamento expositivo de uma passagem mais curta.
As duas maneiras de pregar diferem igualmente no tratamento ESCOLHA DA PASSAGEM
das passagens. Quanto menor fôr a unidade das Sagradas Escri-
turas, mais completamente poderemos usar o resultado da exegese;
É bom que o ministro, no começo de sua experiência com a
quanto maior fôr a porção, mais se torna necessário selecionar e
prédica expositiva, escolha passagens não muito difíceis, preferindo
omitir, ou pelo menos tratar mais rapidamente. De outra forma
parágrafos pequenos e não capítulos longos. Se conhecer bem a
não se pregará um sermão, mas apenas o catálogo dos fatos, com
história do Antigo Testamento, poderá começar com uma passagem
o mesmo objetivo unificador e a mesma luz íntima de uma página
de Génesis. Um apreciador de teatro encontrará cenas cheias de
de dicionário. Na pregação expositiva, pois, devemos acentuar a
vida, de movimento e de colorido na carreira de José. A ação leva
pregação e não a exposição. Devemos subir ao púlpito com o de-
ao conflito, cena após cena, o conflito gera o suspense, este a
sejo de ir ao encontro de uma necessidade humana e não simples-
tensão na qual por fim se alcança o ponto culminante. No entanto,
mente explicar uma passagem.
jamais o escritor sacro nos desaponta, nem nos despede de cena
O sermão expositivo ainda difere do textual por ser mais difí- alguma insatisfeitos.
cil de preparar. Depois de aprender a tratar o texto, como já vimos
talvez não consideremos difícil preparar um sermão textual, mas
i Com excecão dos Salmos, onde cada capitulo constitui uma unidade, e de
quando se trata de explicar e iluminar um parágrafo, um capí- grande parte dos Provérbios, onde cada verso é independente.
72 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A NECESSIDADE DA OBRA EXPOSITIVA 73

Os fatos sobre o jovem José nos dão muito menos trabalho do fazer com que esta verdade da Providência de Deus penetre mavio-
que outros relativos por exemplo a Jó, porque o relato a respeito samente na alma dos presentes, de modo que nenhum deles jamais
deste desce às profundezas da terra. Contudo, o jovem expositor se esqueça do Salmo do viajante a caminho do seu Deus.
não precisa hesitar no uso da sua imaginação, ao pregar sobre
alguma cena emocionante na vida de José. Se o pastor pretende
2
1 — O Deus dos Montes em Expectativa -— w 1-2
interessar os jovens e suas namoradas, bem como seus pais, poderá 2 — 0 Deus que Guarda Sem Tosquenejar — w 3-4
falar sobre "Como vencer a tentação". Os elementos para o sermão 3 — O Deus que é Sombra Amiga — w 5-6
vêm da passagem que encerra o texto: "Como, pois, faria eu este 4 — O Deus da Via Tortuosa — w 7-8.
mal tão grande e pecaria contra Deus?" Que sublime apelo à ima-
ginação de quem se interessa pela preservação da vida irrepreen- Num trabalho expositivo como este, a estrutura do sermão
sível! segue a da passagem. No púlpito se deverá apresentar sucessi-
vamente cada uma das partes do salmo, mostrando o que significa,
Outro pregador talvez ache mais fácil começar por um peque- em termos atuais e em relação ao salmo todo. Se a prédica for
no salmo, como o 121. No seu gabinete de trabalho deve aprender boa, o ouvinte achará fácil recordar a quádrupla verdade em co-
mais do que é necessário levar para o púlpito. Por exemplo, que nexão com o salmo de quatro partes e vice-versa. Se necessitar
dizem os eruditos a respeito desse "cântico dos degraus", ou melhor, de ilustração, encontrá-la-á o pregador na vida de David Livings-
"cântico da ascensão?" Tendo em consideração estas descobertas, tone, que ano após ano encontrou conforto e paz neste e noutros
poderá pensar em termos de um cântico usado pelos peregrinos Salmos. A irmã de Livingstone conta-nos como o jovem médico-
hebreus no caminho para Jerusalém, ao se aproximar uma das missionário partiu do lar da sua meninice, numa casa de campo
festas anuais. Fará surgir, pouco a pouco, ura sermão intitulado em Blantyre:
"Um Salmo para as Férias", ou, em outra comunidade, "Um Salmo
para o Ferroviário". Como centro da mensagem, poderá começar "Naquele dia 17 de novembro, levantamo-nos às cinco da manhã. Minha
com as palavras culminantes: "O Senhor guardará a tua saída e mãe fOz o café. David leu os Salmos 121 e 135 e orou. Meu pai foi com
éle a Glasgow para tomar o barco para Liverpool. Em Broomielaw (a an-
a tua entrada, desde agora e para sempre". O salmo em si canta tiga doca de Clyde) pai e filho se contemplaram pela última vez na vida.
a providência de Deus, não em termos escolásticos e sem vida, O ancião voltou lentamente a Blantyre, sem dúvida com o coração solitário,
mas em doutrina posta "em música. A ênfase se mantém em todo mas dando graças a Deus. O rosto de David agora se voltava para o Conti-
o salmo na expressão "guarda", que surge seis vezes. Mostrando nente Negro. 3

como o Senhor guarda o peregrino nos caminhos da vida, o sal-


mista pinta quatro jogos de palavras com abundante material para Por vezes, preparando um sermão sobre qualquer outro Salmo,
um sermão. Se o pregador pedir aos seus ouvintes para conserva- o 91 por exemplo, não se achará uma estrutura tão clara, visto que
rem as suas Bíblias abertas no Salmo, ou para usarem esta parte a efusão de um coração que transborda, nem sempre segue esboço
das "leituras responsivas" do hinário, pode chamar a atenção para cuidadoso. Talvez se comece a gostar do Salmo 91, depois de ler
as quatro partes, iguais em tamanho, e encaminhando-se para um o Diário de Daniel Defoe, onde este novelista realista usa o salmo
ponto culminante. Se o pregador tiver a alma de um poeta, pode como luz de um farol durante a praga de Londres em 1665. Hoje,
alguns séculos depois, quando a doença e a morte caminham ter-

2
Ver Thomas Mann, Joseph anã Hts Brother, Young Joseph, Joseph ín Egypt^e
Joseph the Provider, Nova York, Alfred A. Knopf, 1934-944. Em português: x W. Garden Blaikie, Tfie Personal life of David Livingstone, Nova York, F. H.
José e Seus Irmãos, José no Egito e José, edits. pela Livr. do Globo, Porto Alegre. Revell Co., 1917, p, 52.
74 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A NECESSIDADE DA OBRA EXPOSITIVA 75

ríveis pelas ruas da nossa cidade, preguemos mensagem de paz e que os fatos adquiram vida em termos atuais, o sermão resplan-
consolo baseada neste salmo: "Ajuda Divina na Enfermidade".* decerá com a luz que vem do altar e o coração de muitos ouvintes
É necessário extrair tanto quanto possível as ideias da própria arderá com viva determinação de tornar Deus supremo em toda
passagem e reuni-las num esboço elaborado pelo próprio pregador. a sua vida. Uma vez mais a estrutura surge diretamente da
No púlpito, começa com as palavras que Defoe pôs na boca de um passagem:
seleiro que atravessou a praga sem ser atingido e sempre ajudava
aqueles que se encontravam em aflição: "Não te assustarás do 1 — A visão que um jovem tem de Deus
terror noturno, nem da seta que voa de dia, nem da peste que se 2 — A visão que um jovem tem do pecado
propaga nas trevas, nem da mortandade que assola ao meio-dia" 3 — A visão que um jovem tem da purificação
(vv 5 e 6). 4 „ A visão que um jovem tem do serviço.

O expositor verificará que o processo se torna mais difícil quan- Um expositor com mais idade pode atrever-se a pregar sobre
do tenta interpretar uma passagem profética, mas depois de o jovem uma profecia difícil como é Is 52.13 — 53.12 — " A Cruz no Antigo
aprender a fazer este género de pregação, talvez tente falar sobre Testamento" ou "Os Sofrimentos do Nosso Salvador". Aqui o mi-
Is 6:1-8 — "Quando um Jovem vai à Igreja" ou "Um Jovem no nistro considera a passagem, não como um rabi judaico, mas à
Culto". É possível encontrar mensagem para estudantes univer- luz do Novo Testamento, seguindo o exemplo de Filipe, que co-
sitários nesta experiência do jovem Isaías. O estudo deste acon- meçou com estas palavras e pregou sobre Jesus (Atos 8.35). No
tecimento deve igualmente interessar aos que vão à igreja na poema de Isaías o expositor vê cinco partes ou estrofes, sendo que
nossa cidade, pois muitos gostam do jovem que começou a adorar em hebraico cada uma delas é um pouco mais longa do que a
a Deus no domingo e que agora pode dedicar sua vida ao serviço anterior. Destas cinco divisões pode fazer um sermão sobre Cristo
dos homens. Num sermão como este deve-se pregar positivamente, em termos de serviço, sofrimento, sacrifício, substituição e satis-
no espírito da passagem, sem lançar pedras à juventude dos nossos fação. Esta última refere-se à satisfação que resulta do sofrimento
dias. em prol de outros, de acordo com a vontade de Deus. Em virtude
da dificuldade em tornar claro todo esse material, por que não
Quando um jovem vai à igreja deve ter a visão de Deus num preparar cinco sermões das cinco estrofes, para uma série de
alto e sublime trono, «deve ter visão de si próprio e dos outros, sermões na Semana Santa?
tal como aparecem aos olhos de Deus. Nas palavras de confissão
que daí resultam, o jovem adorador o começa devidamente consigo Nos quatro Evangelhos quase todos os parágrafos contêm ma-
mesmo, mas logo deve incluir aqueles a quem ama. Recebe então terial para um sermão expositivo, que pode não ser difícil de
a certeza de perdão, purificação e paz, vindo tudo isto pelo fogo preparar. Especialmente as parábolas se prestam a isso, pois todas
e pelo sangue, pois a brasa viva do altar nos fala de paz por meio elas evidenciam a imaginação inspirada operando com os fatos
da dor. Finalmente, neste sermão vem o alistamento do jovem da vida. As parábolas no Primeiro Evangelho são diferentes das
para serviço. É possível que tal descrição dos fatos pareça sem do Terceiro, as de Mateus tratam especialmente do Reino dos Céus,
interesse, especialmente para um ministro que tenha lido a passa- as de Lucas estão mais relacionadas com a graça de Deus. Muitos
gem com frequência, mas se usar a imaginação para fazer com que amam as parábolas de Lucas, acham ainda mais fácil pregar
sobre as do Primeiro Evangelho. Da parábola sobre as quatro
qualidades do solo, quem não seria capaz de preparar um sermão
Para colorido Ioeal semelhante ver R.E. Prothero, The Psalms in Human
intitulado "O Evangelho da Chácara" (Mt 13:3-23)? Especial-
1

Life, Nova York, E P . Dutton Si Co., 1909.


A NECESSIDADE DA OBRA EXPOSITIVA 77
76 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
EXTENSÃO DA PASSAGEM
mente durante a primavera e no começo do verão, a côr local para
o sermão viria dos jardins ou chácaras vizinhas. Em quase todos os livros da Bíblia, cada parágrafo inicia uma
As narrativas do Livro de Atos oferecem oportunidades para unidade de pensamento e presta-se, facilmente, a sermão expositivo.
todo género de sermões expositivos, muitos dos quais não são Tais divisões em parágrafos aparecem de forma evidente na Edição
difíceis de preparar. Por exemplo, um pastor que queira encorajar Revista e Atualizada e noutras modernas traduções do Novo e
os leigos a ganhar almas, pode preparar um estudo sobre Filipe Antigo Testamentos. Todos os ministros deveriam ter à mão ver-
e o Eunuco (At 8.26-40): "Apresentando um Indivíduo a Cristo". sões recentes, usando-as para aprender a considerar o parágrafo
Se houver oportunidade para mensagem acerca da "Atitude Cristã como unidade de pensamento. Dever-se-ia formar gradualmente
em Relação ao Preconceito Racial", o sermão poderia ter como o hábito de buscar no parágrafo o material a ser incluído no texto
base os acontecimentos narrados no capítulo 10, em que o judeu do sermão. 5

Pedro é convidado à casa do romano Cornélio. O mesmo problema, De quando em vez um capítulo da Bíblia presta-se a mensagem
em forma muito diferente, surge no romance de Sholem Asch, expositiva. O Capítulo 13 de 1 Coríntios levou Henry Drummond
Bast River. Segundo este autor, houve tempo em que judeus, cató- a preparar o seu mais conhecido sermão deste género — "A Maior
licos e protestantes viviam juntos no bairro de Nova York, onde Coisa do Mundo". * Nesta mensagem fêz sobressair três divisões
hoje se ergue o edifício das Nações Unidas. de pensamento do capítulo e depois analisou cada uma de per si,
É possível que algumas partes ofereçam certa dificuldade ao mostrando como o amor era a melhor coisa na terra e no céu.
expositor. Ê possível que a primeira e a segunda cartas aos Corín- Este género de prédica requer o uso da imaginação, o que significa,
tios não sejam difíceis de explicar, mas algumas porções de Efésios em parte, capacidade de síntese. O expositor popular deve saber
e Colossenses, ou Romanos e Gálatas, se prestarão a um tratamento como agrupar os elementos de modo a formar um quadro único.
textual ou tópico com mais dificuldade do que expositivo. Mas Vez por outra o pastor deve apresentar um livro inteiro da
Reinhold Niebuhr, dirigindo-se a estudantes universitários, falou Bíblia, num estudo de relance. No período entre o Natal e a Páscoa,
certa vez de "A Batalha na Alma do Indivíduo", tirando o material poderá pregar todos os domingos de manhã sobre o Evangelho de
necessário da última parte do sétimo capítulo de Romanos, em Marcos. Neste caso o sermão seguinte ao dia de Natal poderia
que o Bem e o Mal se debatem pela supremacia na alma humana.
tratar de "O Evangelho para Pessoas Ocupadas" ou "O Evangelho
Num sermão expositivo sobre as Epístolas é bom começar com
em Filmes". Com este género de sermões tenta interessar de
uma passagem como esta, pois apela à imaginação. Porém, a
tal modo o ouvinte num livro, que este o lerá sempre de novo, pre-
menos que queira trabalhar com afinco, terá menos dificuldade
ferivelmente como um todo. Se o pregador apenas dissecar o livro
em várias outras narrativas das Sagradas Escrituras.
e mostrar o seu esqueleto, talvez frustre o seu próprio objetivo,
O mesmo se pode dizer do Apocalipse. As cartas às Sete Igre- pois ninguém gosta de contemplar um esqueleto, ainda que seja
jas, no segundo e terceiro capítulos, não apresentam grande difi- a estrutura óssea de um belo corpo. Também aqui o expositor deve
culdade, mas em outras partes do livro há passagens que o jovem empregar a imaginação para fazer o livro viver.
ministro achará demasiado difíceis de explicar atualmente. O
Certo verão, nos cultos vespertinos, um pastor apresentou uma
jovem expositor, tal como James Denney, de Glasgow, poderá con-
pequena série de sermões sobre livros da Bíblia. Na cidade uni-
siderar o "Apocalipse de João" como o mais cristão dos livros da
Bíblia, mas um indivíduo prudente aprende a caminhar por montes
í Como exemplo v e r A. W. Blackwood, The Protestam Pulpit, Berman n.° 11.
e vales, antes de tentar escalar os Alpes. Em suma, jovem amigo, 6 Addresses, Nova York, H. M. ColdweU Co., s. d. pp. B-44.
vai devagar!
78 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A NECESSIDADE DA OBRA EXPOSITIVA 79

versitária, onde vivia, queria falar a professores de nível secun- Planejava o esboço de modo a fazer sobressair, de forma clara,
dário e a quem mais viesse a assistir aos cursos de verão. Nesta algumas verdades. Na sua apresentação procurava clareza e in-
série falou a mais gente do que esperava, incluindo professores teresse humano. Em suma. usava a imaginação que é o sine qua
vindos de outras cidades e membros da sua igreja. Mas não reco- non do expositor e de todo o indivíduo que prega ao povo comum.
mendaria aquela série a nenhum principiante em trabalho expo-
sitivo. Foi ela:
VANTAGENS DO TRABALHO EXPOSITIVO
Jó — "For Que Deve Um Homem Justo Sofrer?"
Salmos — "Como Apreciar Estes Poemas." 1. Este método honra as Escrituras. Trata-as tal como foram
Provérbios — "Como Deve Um Jovem Viver" escritas, o livro como a grande unidade e o parágrafo como a
Eclesiastes — "Que É Melhor Na Vida Moderna?" menor. De qualquer modo, é possível que a passagem pareça grande
ou pequena, difícil ou fácil, mas o intérprete deve tentar sempre
Um pastor experimentado talvez chegue mesmo a tentar pregar fazer o mesmo, apresentar o significado dessa parte da Bíblia e
sobre a Bíblia como um todo. Por que reunimos os seus 66 livros a influência que deveria ter no dia de hoje. Nesta tarefa, se tra-
e lhes chamamos simplesmente "O Livro"? Considerá-los-emos co- balhar com espírito de oração, pode ter a certeza de que o Livro
mo "a biblioteca divina?" Assuntos como estes deixam perplexos fará a sua obra no coração dos filhos de Deus. Não por magia
muitos leigos sensatos e é necessário dar-lhes atenção no púlpito. ou qualquer artifício, mas, como as sementes que caem em terra
Num sermão como éste o pregador deve saber o que selecionar e
«preparada, as verdades da Escrituras dão o seu fruto na estação
o que omitir, de modo a fazer sobressair determinados elementos.
Poderá começar com Hebreus 1.1, que nos fala daquilo a que própria."
chamamos Antigo e Novo Testamento. Sob o título "A Nossa 2. O trabalho expositivo segue a mais nobre tradição da Igre-
Bíblia — Um Mundo Só", o pregador pode falar de dois hemisférios, ja Cristã. Nos dias apostólicos DS pregadores do Evangelho ten-
cada um deles com três grandes divisões. O Antigo Testamento tavam interpretar as escrituras hebraicas; sempre que um dos
mostra como Deus preparou a vinda do Redentor e o Novo existe apóstolos se defrontava com um grupo de pessoas que conhecesse
para torná-lo conhecido. o Antigo Testamento, baseava-se na sua Bíblia para pregar. Como
podemos verificar nos relatos dos seus sermões, Pedro e Paulo
8

Seja breve ou não a unidade das Escrituras escolhida, a men- consideravam-se intérpretes do Livro. No apogeu da Igreja Pri-
sagem expositiva deveria ser sempre um sermão e não mera expli- mitiva, Crisóstomo e Agostinho, Ambrósio e outros dirigentes ten-
cação de uma passagem. Nas mãos de um mestre como Robertson taram interpretar as Sagradas Escrituras. Em geral aqueles Pais
ou Alexander Maclaren, éste tipo de pregação parecia, muitas ve- da Igreja usaram métodos diferentes dos nossos, mas apesar disso
zes, com qualquer outra mensagem que fizesse pensar, sentir e um homem como Crisóstomo pode mostrar-nos, ainda hoje, como
agir. Num sermão expositivo Maclaren começava com um pequeno dar vida e brilho à Bíblia.
texto, que empregava como vestíbulo para a passagem, onde en-
contrava o apoio dos materiais para o sermão. Em seguida dava " H á duas qualidades em Crisóstomo que, combinadas, o tornam único —
é Homem da Palavra e Homem do M u n d o . . . O próprio Crisóstomo está
nome à mensagem, nome que o guiaria no acabamento da prepa-
ração e na apresentação do sermão. Ao reunir e agrupar esse
material não extraía da passagem mais do que lhe era necessário, i Em relação às prédicas, estude-se: Mt 13.23; Is 55.10-11.
a Ver R. B. Rackham, The Acta of the Apostles, Nova York, Edwin S. Gomam,
sentindo-se igualmente livre para usar os fatos da vida diária. 1901.
80 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A NECESSIDADE DA OBRA EXPOSITIVA 81
impregnado das Escrituras e resolvido a ensinar a seu auditório como basear
suas vidas nos princípios das Sagradas Escrituras... A s Homílias... de
4. Este tipo de trabalho para o púlpito faz com que o pastor
Crisóstomo não são a exposição de um conferencista, m a s . . . a exposição possa crescer ano após ano. Obriga-o a trabalhar e leva-o a orar.
de um pregador... Há muita força no atual apelo para mais pregação Visto ser o intérprete da Bíblia para a congregação, tem que des-
expositiva. O que importa é que seja pregação. Sala de aula é uma coisa, cobrir o que ela significa e isto requer o uso de todas as energias
o púlpito é outra".»
intelectuais, que se tornam fortes e flexíveis por meio de exercício
constante. Dia após dia, ao preparar-se para alimentar os outros,
Igualmente durante a Reforma os líderes religiosos se con- alimenta sua própria alma. Exceto no verão, não precisa se afastar
sideravam expositores. Sempre que Lutero ou Calvino subiam ao para assistir a assembleias ministeriais, para recarregar as baterias
púlpito para pregar, tentavam interpretar uma parte das Sagradas gastas. Por muitas razões, como as indicadas, quase todos os
Escrituras, um trecho em cada sermão. Lutero explicava e frisava ministros, que tenham tentado o método expositivo durante alguns
a lição do dia, enquanto Calvino falava de todo um livro da Bíblia, anos, acabam por acreditar nele de todo o coração. Esse método
dia após dia, passagem por passagem. Mas se hoje quisermos ser é eficaz! Tenta-o!
fiéis ao espírito dos reformadores, não precisamos seguir servil-
mente seus métodos. Tal como eles tentaram interpretar a Palavra
escrita em padrões de pensamento da sua própria época, também
OBJEÇÕES AO MÉTODO EXPOSITIVO
nós temos que apresentar a verdade de Deus em formas que apelem
ao povo dos nossos dias. Por que então desapareceu de tantos púlpitos, em tão larga
escala, este tipo de pregação? Em parte por causa de defeitos
3. O trabalho expositivo de boa qualidade alimenta o povo.
Os apóstolos, os pais da Igreja e os reformadores pregavam da metodológicos.
Bíblia como a maneira mais segura para ajudar o povo a crescer 1. Muitos pastores não sabem como preparar um sermão ex-
na imagem do seu Senhor. Do mesmo modo hoje, aquele que positivo. A falha talvez esteja no seminário, onde o professor não
sabe como escolher uma passagem e como usá-la na forma de foi capaz de ensinar os estudantes a escolher a passagem, saber
pensamento do seu tempo, pode empregá-la na promoção de qual- o que deixar fora do sermão, como tratar o material de modo a
quer causa para o Reino ou no tratamento de qualquer problema fazê-lo brilhar e como usá-lo de modo a ir ao encontro das neces-
moral na comunidade. Se trabalhar com inteligência e fé, pode sidades dos ouvintes de seus dias, como pregar um sermão que
alimentar o povo de tal maneira que este continuará espiritual- ajude, sem mostrar um esqueleto que assusta. Em alguns casos
mente forte e ativo e não sucumbirá às enfermidades da alma, os estudantes não escolheram um destes cursos. Em consequên-10

por muito que grassem ao seu redor. Os membros da Igreja, que cia de tudo isto, grande parte do trabalho expositivo pode ser
apreciam a maneira sadia de fazer análise bíblica semana após "trabalho", mas demonstra falta de imaginação. Que pena enviar
semana, gostam de trabalhar para Cristo e para o seu Reino, para o campo missionário indivíduos que não são capazes de apre-
gostam também da sua igreja e do seu pastor. Conhecemos uma sentar Deus e o seu Livro de forma correta!
igreja cujo pastor é um exemplo deste género, no seu púlpito, sendo
o povo pacientemente alimentado com a Bíblia, há já dez anos. 2. Certo tipo do chamado trabalho expositivo evidencia falta
de preparação. A "exposição" consiste em agrupar comentários

» C S. Horne, The Romance of Preaching, Nova York, Fleming. H. Revell Co.,


pp. 144-46. io Há seminários em que a homiiética se conta entre as disciplinas optativi
( N . do Tradutor).
82 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A NECESSIDADE DA OBRA EXPOSITIVA

sobre partes sucessivas de uma passagem, que parece longa e sem qualquer sermão expositivo que os meus ouvintes tenham neces-
ligação entre si. Nas mãos de um Spurgeon, quase um génio, essa sidade de ouvir".
leitura da Bíblia poderia ter sido muito útil, mas com outros indi-
LEITURAS SUGERIDAS
víduos tais comentários corridos nunca conseguiram nada mais
do que tédio. Em pregação expositiva, assim como em outros Blackwood, A. W „ Preaching }rom the Bible, Nova York e Nashville, Abingdon-
géneros de pregação, qualquer sermão possivelmente terá tanto -Cokesbury Press, 1941. Especialmente os capítulos V I I , XII.
valor quanto custou a preparação, em termo de tempo, atenção Knott, H. E., How to Prepare an Expository Sermon, Cincinnati, Standard P u -
blishing Co., 1930.
e oração.
Patton, Carl S., The Use of the Bible in Preaching, Chicago, Willett, Clarck &
Co., 1936.
3. A pregação expositiva mal preparada não interessa o ou- Taylor, W. M., The Ministr-y of the Word, Nova York, Randolph & Co., 1883.
vinte.11
Este sente ímpetos de exclamar: "Tudo isso teve lugar
há muito tempo e muito longe daqui! Que me interessa tudo
isso na vida prática, a mim, um homem de negócios?" Mesmo
que o não diga em palavras, deseja que o expositor interprete a
vida atual. Se os membros da igreja não comparecem aos cultos,
onde o ministro se orgulha de "explicar a Palavra", talvez não seja
porque se opõem ao tempero do alimento ministrado, mas porque
não gostam da forma em que foi cozido nem da maneira em que
é servido. Entendem que o pastor deve sempre pôr uma boa mesa
diante deles, todos os domingos.

4. Sermões pseudo-expositivos não são úteis. É possível que


estas quatro objeções pareçam muito semelhantes umas às outras,
visto que saem todas da mesma raiz: o futuro expositor nunca
aprendeu a preparar esse tipo de sermão. O seu erro está em
parte na ausência de objetivo, pois se partisse de uma necessidade
da congregação encontraria uma passagem que o ajudaria a ir
ao encontro dessa necessidade e assim poderia preparar a mensa-
gem que atingisse o objetivo. Isto é, poderia se soubesse como.
Felizmente é possível aprender a preparar sermões expositivos.
Que comece, pois, por apresentar esse objetivo: "Vou preparar-
me para pregar um sermão e não simplesmente explicar uma pas-
sagem. Se começar a tempo, se trabalhar com afinco e usar a
imaginação, sempre em espírito de oração, posso preparar todo e

" H. S. Cofíin, What to Preach, Nova York, Geo. H. Doran Co., 1926, pp.
33-38.
A BUSCA DE OUTROS MATERIAIS 85

As primeiras seis palavras podem dar o tópico para o sermão


CAPÍTULO VII e o restante enfatizar o contraste entre os que se acotovelaram
à sua volta por curiosidade e a mulher que o tocou cheia de fé.
Neste caso seguiríamos mais o texto que o hino, então viria o
ponto que explicaria como agora, aqueles que o tocam, podem
encontrar a salvação e a paz. "Se eu apenas lhe tocar as vestes,
ficarei curada" (Marcos 5.28).
A BUSCA DE OUTROS MATERIAIS
O sermão também poderá tratar de "Como Deus guia hoje".
A nossa mente volta-se imediatamente para o antigo hino de Welsh,
TEMOS PENSADO pregação como interpretação
NA "Guia-me, ó Grande Jeová". Ou poderemos pensar sobre as pala-
da vida, à luz que geralmente vem de Deus, pelas vras familiares do hino de Newman, "Dirige-me, Luz Benigna":
Escrituras, hoje em dia. Geralmente, mas não . . . Eu não peço para ver
sempre! Um sermão que consista só de materiais do Livro dos A cena distante — um passo é bastante para mim.
Livros, talvez não tenha interesse humano. Tal como em tudo
quanto diz respeito ao ministério em nossos dias, neste ponto é E logo a mente se espraia em busca de novas vistas da verdade
preciso manter o equilíbrio. Muitos rninistros jovens têm tentado e do dever. No sermão, que daí resulta, o pastor não necessita
usar materiais de quase todas as fontes, exceto da Bíblia, e alguns citar frequentemente os hinos ou qualquer outra fonte. Nos ser-
pastores mais idosos ignoram que Deus se revela nos nossos dias mões dos mestres não se encontram citações numerosas, contudo,
de outras maneiras. A senda da sabedoria encontra-se entre os se quiser iluminar o caminho citando algumas linhas de um hino
dois extremos. Por que não tirar a súmula do sermão das Sagradas muito conhecido, deve utilizar sem escrúpulos essa luz. Pode mes-
Escrituras, e sua forma da vida hodierna, inclusive a literatura? mo, de vez em quando, pregar um sermão baseado num hino
clássico, como "Ao Contemplar a Cruz Maravilhosa".
As obras de Arqueologia são fonte rica de material para ser-
LITERATURA ESPECIFICAMENTE RELIGIOSA mões. Talvez esteja pensando sobre "A Tranquilidade da Religião
Verdadeira" e a sua mente volta-se para 1 Rs 6.7b, que narra a
O jovem ministro deve adquirir toda espécie de livros rela- construção do Templo sem o som do martelo nem do machado.
cionados com a Bíblia. Entre eles deve apreciar acima de tudo o Pelo estudo da Arqueologia descobrem-se as pedreiras de Salomão,
hinário, em que encontra todo género de sugestões para sermões. que o pastor deve visitar se fôr à Terra Santa. De qualquer modo
Se estiver pensando em "O Evangelho no Arco-íris", a sua mente deve saber que se encontram situadas ao norte da Cidade Santa
volta-se para o hino de George Matheson, "Vejo o Arco-íris através e que antigamente tiveram pedra bastante para construir uma
da chuva". No hino " ó Amor que não me deixará" o pregador en- cidade com o dobro do tamanho de Jerusalém. Quando esta pedra
contrará sugestões para o seu próximo sermão. Se a mensagem fica exposta ao sol, ao vento e à chuva, é difícil de cortar. Por
tratar da cura da mulher que tocou a orla da roupa de Jesus, vêm isso costumavam trabalhá-la dentro da própria pedreira, onde a
ao pensamento as palavras de Whittier: pedra era macia e fácil de cortar. Todos estes fatos apelam aos
pedreiros e só eles sabem por quê.
A cura do Seu vestido inconsútil
Chega aos nossos leitos de dor
O pastor que lê e pensa, pode recolher bom material da His-
tória da Igreja. Ali pode descobrir como o Deus dos profetas e
86 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A BUSCA DE OUTROS MATERIAIS 87

dos apóstolos se revelou aos homens e mulheres de todos os tempos. em breve, que muitos membros da sua igreja começarão a ler
Descobre que as pessoas gostam de ouvir falar em fatos de outros a vida de missionários como Wilfred Grenfell e Albert Schweitzer.
tempos e de outras terras, se o pregador, no púlpito, fôr capaz de O interesse do pastor nas biografias de missionários poderá
tornar claros estes fatos e de mostrar como eles podem influenciar levar, depois da Páscoa, a uma série de sermões nos cultos vesper-
a vida dos nossos dias. O ministro de uma igreja, situada no tinos. Se o coração das pessoas se voltar frequentemente para o
centro de certa cidade, anunciou uma série de mensagens sobre Oceano Pacífico e para os obreiros que ali trabalham, apresentará
os reformadores protestantes, ainda que não se intitulasse assim. à sua Igreja alguns desses heróis, como por exemplo, John G.
Teria, digamos, o título geral de "A Crença de Nossos Pais". Essas Paton, das Novas Hébridas, James Chalmers, da Nova Guiné, John
conferências foram apresentadas durante o período anterior ao C. Patteson, da Melanésia, Robert Morrison, da China, e Guido
Advento e ajudaram a preparar os corações dos ouvintes para a Verbeck ou Toyohiko Kagawa, do Japão. Também a escolha do
verdade da Encarnação. Como o pastor sabia apresentar a His- ministro dependerá de muitos .atôres. Se conseguir penetrar no
tória da Igreja, todos os seus sermões tinham Cristo como tema espírito de cada um dos heróis, o sermão que daí resultar mostrará
central, como se tivesse começado por uma passagem dos Evan- claramente o poder transformador do Evangelho. 2

gelhos. Nos livros devocionais clássicos o pregador encontrará tam-


Nessa série, a primeira mensagem tratou de João Huss, "A bém material que parecerá novo e interessante mesmo àqueles
Estrela Matutina da Reforma". A segunda considerou João Wy- que vão à Igreja há anos. Por amor de seu próprio bem-estar
cliffe, "O Defensor do Povo Comum". A terceira estudou Martinho todos os pastores precisam conhecer e apreciar os devocionais clás-
Lutero, "O Criador de um Mundo Novo". A quarta apresentou sicos, desde as Confissões ou Cidade de Deus, de Agostinho, Stffl
João Calvino, "O Homem de Coração Ardente". A quinta mostrou Hour, de Austin Phelps, ou With Christ in the School of Prayer,
João Knox, "O Fundador da Igreja Presbiteriana". A série podia de Andrew Murray.
ter sido completada com uma sexta mensagem sobre João Wesley, Durante algum tempo o pastor poderá viver com os livros de
"O Homem que Impediu uma Revolução". É possível que um João Bunyan, especialmente Grace Abounding, O Peregrino, The
outro intérprete da História da Igreja tivesse selecionado outros Holy War e The Jerusalém Sinner Saveã. Com isto o pensamento
heróis e os tivesse apresentado de forma diversa. Teria, porém, e os sonhos dos intérpretes estarão relacionados com o Pântano
encontrado igual satisfação em conseguir material para sermões do Desânimo, O Monte das Dificuldades e a Cidade Celestial. De-
de uma fonte que a maioria dos pregadores ignoram. 1
pois se sentirão bem neste país montanhoso e poderão pregar uma
A obra missionária já se tem revelado útil manancial e de série de sermões sobre o "Evangelho" Segundo Bunyan".
pouco difícil manejo. Os fatos são acessíveis em biografias, que
todos os pastores deveriam ler, ao menos para manterem as se-
nhoras da Igreja informadas sobre as Missionárias. Poderá co- OBRAS NÃO ESPECIFICAMENTE RELIGIOSAS
meçar com heróis de sua própria denominação, passando depois
às outras. O pastor em poucos anos pode ficar conhecendo a vida Depois da Bíblia e do hinário, o pastor deve apreciar livros de
de obreiros em diversas regiões, como a China e a Índia. Logo poesia. Em Brighton, Robertson escreveu certa vez que a prefe-
descobrirá que não pode pregar nem orar, sem pensar naqueles rência de um ministro por um poeta servia como uma espécie de
que, nos confins da terra, foram salvos pelo Redentor. Verificará,
a Ver Henry P. Van Dusen, They Founã a Church There, Nova York,
A. W. Blackwood, Planning a Year's Pulpit Work, cap. IX. Scribner's Sons, 1945.
88 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A BUSCA DE OUTROS MATERIAIS 89

"nilômetro", para revelar a profundidade ou a superficialidade da O Manto Sagrado, de Lloyd Douglas; As Chaves do Reino, de Cronin,
sua alma. Um escolhe Robert Browning, com toda a sua obscuri- e The Bishop's Mantle, de Agnes Sligh Turnbull. Desse modo, o
dade — motivado em geral pela sua pouca lógica. Outros minis- leitor terá conhecido por vez um escritor judeu, um ministro con-
tros há que preferem Tennyson, Wordsworth, Milton ou Dante. gregacional, um médico católico e uma escritora episcopal, cada
Robertson preferia Dante e conhecia a sua obra quase toda de cor. um com mensagem para o tempo presente. Alguns de nós acrescen-
Entre os mais modernos o pregador receberá ajuda de Edwin Arling-
taríamos, a esta lista, alguns livros de aventuras de John Buchan,
ton Robinson, Emily Dickinson e John Masefield. As opiniões
especialmente Mountain Meadow. Esta leitura nos ajuda a inter-
divergem também aqui, mas todos estão de acordo quanto a Sha-
pretar a vida dos nossos dias e também influencia o nosso voca-
kespeare. Devemos, pois, dar-lhe o lugar de honra. Algumas de
bulário. "A minha natureza está sujeita àquilo para que trabalho,
suas peças devem ser relidas sempre que possível, como p. ex.,
tal como a mão do tintureiro".
Henrique IV, em duas partes, e Henrique V, Sonho de uma Noite
Muitos de nós também recebem auxílio de biografias. Todos
de Verão, Muito Barulho por Pouca Coisa, Mercador de Veneza,
Como quiseres, Noite de Reis, Conto de Inverno e A Tempestade, os ministros deveriam conhecer a vida dos seus pregadores favo-
Romeu e Julieta, Julio César, Hamlet, Otelo, Macbeth, Rei Lear ritos, como Chalmers, Robertson, Alexander Whyte, Bushnell, Bee-
Antônio e Cleópatra. cher e Brooks. Porém, para a coleta de material para sermões, o
pastor terá mais proveito lendo livros a respeito de homens e mu-
Ao lado dos poetas poderão estar as obras de ficção. Muitos lheres em outros campos.
intelectuais, com cursos universitários, educaram-se lendo os clás- Todos deviam ler Life of Johnson, de Boswell; Sir Walter Scott,
sicos e esperam que o pastor conheça o conteúdo dos livros que
de John G. Lockhart; Robert E. Lee, de Douglas S. Freeman, e
qualquer professor universitário considera os melhores do mundo.
Abraham Lincoln, de Carl Sandburg, e tanto Prairie Years como
Entre eles encontram-se em ficção, os seguintes: Vanity Fair, de
War Years, do mesmo autor, principalmente o último. Será esse
Thackeray; David Copperfield, de Dickens; Adam Bede, de George
um meio fácil de se familiarizarem com os secretos caminhos da
Eliott; The Return of the Native, de Thomas Hardy; Os Miseráveis,
História!
de Vítor Hugo, ou Os Irmãos Karamazov, de Dostoievsky.
Quanto a outras biografias, onde será possível colocar um
Tal como acontece com a poesia, é possível que o resultado
limite? Alguns de nós lêem tudo quanto obtêm no género. Por
dessas incursões não surja à superfície do trabalho pastoral de
exemplo, o filho de um médico gosta de conhecer a vida de médicos
púlpito, pois poucos ministros primam como "pregadores literá-
e cirurgiões, procurando livros como The Life of Sir William Osler,
rios". Em regra os mestres do púlpito não citam muito. Tanto
de Harvey Cushing; Harvey Cushing, de John F. Fulton; An Ame-
Robertson como Brooks leram muito da literatura mundial, mas
rican Doctofs Odyssey, de Victor G. Heiser, e as autobiografias
nenhum deles abusou deste material no púlpito. Indiretamente,
de E. L. Trudeau, John M. T. Finney e outros, da galeria da Escola
porém, qualquer destes intérpretes está constantemente tirando
de Medicina John Hopkins. Tal passatempo consegue manter o
frutos da melhor literatura mundial. Nas obras clássicas de ficção,
ministro fora da rotina, pois considerando os seres humanos atra-
como em poemas épicos e dramas, descobre interpretações emocio-
vés dos olhos de peritos em medicina, conhece a natureza humana
nantes do homem e da vida na terra.
tal como o Senhor, O Médico Amado, a deve ter conhecido.
Entre os livros modernos de ficção, ninguém é capaz de estar Não sobrará tempo para a incursão noutros campos como o
a par de todos os melhores publicados, mas logo que um romance da ciência, mesmo por alto. As opiniões divergem quanto ao tempo
tiver sobrevivido um ano ou dois, o pastor deveria conhecê-lo. Uma que um pastor deve dar à leitura de jornais e revistas, mas não
lista para leitura de férias, incluiria East River, de Sholem Asch; há dúvida que deve conhecer algo a respeito do que o povo lê.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A BUSCA DE OUTROS MATERIAIS 91

Felizmente pode escolher os melhores jornais, onde segue os acon- Aquele que desejar usar fatos tirados da vida, precisa saber
tecimentos mundiais. O mesmo acontece com revistas, porém ver. Ver o quê?
muitos de nós deveriam gastar menos tempo em leituras efémeras
e mais cm conhecer a fundo livros que nos abrem tesouros de valor Línguas nas árvores, livros nos rios que correra.

permanente. Há pastores que têm como regra nunca se sentarem Sermões em pedras e bem em tudo.

para ler o diário; há outros que nunca pegam nele senão quando
vão almoçar. Onde Oséias ou Paulo encontraram os fatos? Na vida! O
mesmo acontece, e em maior escala, nos relatos que temos da
FATOS TIRADOS DA OBSERVAÇÃO DIRETA pregação do Senhor. No Sermão do Monte, bem como nas parábolas,
Êle usou bastante a côr da natureza, como veio da mão de Deus.
Chegamos agora à mais importante fonte de material para Mas nosso Senhor nunca se referiu à natureza à parte das pessoas,
sermões fora da Bíblia. Tal como aconteceu com o profeta Amós humanas e divinas. Usou-a como fundo para linguagem figurada
e com o próprio Senhor, os príncipes do púlpito em todas as épocas sobre a maneira de Deus agir em relação aos seus filhos. Por
extraíram os seus fatos da vida mais do que dos livros. Se isso esta e outras razões é que certo professor de um Seminário fre-
parecer exagerado, façamos uma lista dos nossos livros de sermões quentemente ora em favor dos pregadores jovens: "Senhor, peço-
preferidos, tanto dos nossos dias como do passado, e estudemos te que lhes abras os olhos, para que vejam" (2 Rs 6.17).
um volume de cada autor. De onde colheram, exceção feita das O intérprete pode encontrar, na vida e no labor do campo
Escrituras, os fatos que relatam? Pensemos em Chalmers e Whyte, e do jardim, toda espécie de material para sermões. Talvez pregue
Robertson e H. P. Liddon, John Bunyan e Richard Baxter. Entre num púlpito citadino, mas mesmo na cidade há muitos que ane-
os atuais, consideremos J. S. Stewart, L. D. Weatherhead, H. E. lam pelos espaços vastos e abertos. Por isto todos os pastores
Fosdick, C. E. Macartney, R. W. Sockman ou Norman V. Peale. deveriam conhecer algo sobre a época de sementeiras e colheitas,
Estes homens leram muito, mas todos eles tiraram mais elementos o verão e inverno, o calor e frio, na medida em que afetam as
para a prédica do mundo em torno de si, do que de livros lidos vidas dos homens e mulheres dos nossos dias. Quando se dirige
no seu escritório. a indivíduos que viveram encarcerados durante toda a semana,
Os pregadores mais hábeis nos nossos dias, como aconteceu pode dedicar-se "ao tratamento de almas e ao ar livre", e ajudá-los
com os seus antecessores, primam no uso de fatos. "Três quartas a ver o que Henry Drummond denominou "a lei natural do mundo
partes da boa pregação consistem em indicar fatos definidos, bem espiritual".
escolhidos e com abundância. A outra quarta parte não tem im- Como exemplo de um pregador citadino que pregava com fre-
portância". Isto pode parecer exagerado, mas mesmo assim chama quência em termos de ar livre, consideremos um ou dois livros
a atenção para a diferença entre o trabalho atraente do púlpito de George H. Morrison, de Glasgow. Num deles Flood Tide, encon-
e a pregação repelente. Num só sermão pelo rádio, um pregador tramos os assuntos seguintes: "O terreno que não foi segado",
como J. S. Bonnell ou O. F. Blackwelder usa mais fatos do que "A Terra dos Montes e Vales", "O Poço Entupido", "A Mensagem
qualquer outro ministro emprega num mês inteiro. Parecerá, à do Arco-íris"; "O dia do Vento Oriental", e "O Pássaro Vagabun-
primeira vista, que aquele que fala está usando muitas ilustrações, do". De tais mensagens recebemos ânimo e não ensinamentos, essa
mas, analisando-se mais detalhadamente, os fatos surgem como espécie de coragem que recebemos quando vamos às montanhas,
elementos essenciais de construção, que acompanham o plano do onde a visibilidade aumenta com a altitude. No sermão sobre os
arquiteto. montes e vales, ouvimos falar da bondade divina ao conceder va-
A BUSCA DE OUTROS MATERIAIS 93
02 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

riados dons aos seus filhos. Vemos constantemente como o pre- céus. Pode pregar com frequência sobre religião e vida em termos
gador trata da Providência de Deus. Para fazer isto em termos de doença e saúde, dando graças a Deus pelo desaparecimento
3

do mundo exterior, é necessário ter-se o coração e a visão de um da febre tifóide, da varíola e suplicando que Deus faça desaparecer
poeta. o flagelo do câncer.
Um ministro que tenha tato e habilidade, pode também con- No começo do ano letivo, o ministro medita bastante sobre os
seguir material para os seus sermões no trabalho caseiro das mu- colégios e Universidades. Aprendeu a usar o método dos casos na
lheres. Nosso Senhor usava constantemente fatos assim. Falou Medicina e no Direito. Nos Evangelhos e noutros lugares do Livro
da mulher varrendo o quarto, do vizinho que foi pedir pão em- Sagrado achará mil e um casos. Por exemplo, na cura do paralítico
prestado, da dona da casa a receber um hóspede para jantar. Falou estudará um caso de perdão como cura da alma (Mc 2.10). Tam-
de crianças brincando, sobre a mulher amassando a farinha e bém nas experiências escolares de rapazes e moças descobrirá co-
outra de luto chorando pelo seu morto. Poderia dizer como Te- mo interpretar a vida hodierna, tal como aparece aos olhos de
rêncio: "Nada ignoro do que é humano". Ensinando e pregando, Deus.
falava às pessoas de coisas que podiam ver e fazer todos os dias. O ministro pode indiretamente encorajar os jovens, bem como
É por isso que ainda hoje, quando os sermões se tornam concretos seus pais, a apreciarem a arte. Mas precisa estar seguro dos fatos,
e reais como os do Mestre, começa o reavivamento da pregação. não tentando parecer "superficialmente onisciente". Pode ainda
Também das finanças se pode tirar material para sermões. promover o amor à música, vendo nela uma serva da religião.
Metade das parábolas estão relacionadas, direta ou indiretamente, Pode fazer sensivelmente o mesmo no que diz respeito a outras
com assuntos financeiros. A maioria destas alusões dizem respeito artes, em especial a pintura, escultura e arquitetura. Pode usar
a dinheiro, sem dúvida porque o Senhor queria ser ouvido pelos no púlpito fatos sobre Rafael e Miguel Angelo ou Christopher Wren
homens e os homens sempre pensam muito sobre dinheiro. Ensi- e Ralph Adams Cram. Que grande privilégio sentirmo-nos à von-
nou-os a usá-lo como elemento efetivo e não como empecilho; por tade no meio da "santidade do belo"!
isto se referiu ao dinheiro nos seus ensinos sobre o Reino de Deus. O pregador popular também usa fatos extraídos da vida espor-
George W. Truett, falava frequentemente, mais ou menos da mes- tiva. No basebol, futebol, ténis ou golfe, assim como noutros
ma maneira, aos vaqueiros do Texas, mostrando-lhes como usar esportes, aqueles que conheçam algo podem fazer o que Paulo fêz
o dinheiro segundo a vontade de Deus e não como um fim em si. em relação às corridas pedestres e jogos de boxe. Em termos espor-
Quando pregava sobre o que pensavam ser o summum bonum, leva- tivos o pastor pode fazer salientar a necessidade de autodisciplina,
va-os a buscar primeiro o Reino de Deus. o convite ao trabalho em equipe e o significado do sacrifício. Um
Também a ciência merece a atenção do púlpito. Aquele que tal intérprete apela tanto a homens e rapazes como a muitas
prega não sabe tudo quanto todos os sábios descobriram acerca mulheres. Pode também tornar bem claro que a "religião dos
da teoria quântica e da energia atómica. Se tentasse explicar o antigos" diz respeito a todos os pormenores, mesmo os recônditos
significado da relatividade, provavelmente seus ouvintes ficariam da vida de hoje e do mundo em que vivemos.
sabendo o mesmo que antes. Contudo pode tornar claro aquilo Será que tudo isto nos leva muito longe? Claro, pois o pre-
que não podemos esquecer, isto é, que as descobertas modernas gador pode ficar tão preocupado com o material para os sermões,
alteram superficialmente a nossa vida, mas não podem transformar que acabe por esquecer o seu objetivo; mas também não deve pre-
a alma humana nem libertar o homem do medo. Em vez do arado
e do jugo de que falou o Mestre, o intérprete poderá falar agora 3 W . M. Mackay, The Disease and Remedi/ o/ Sin, Nova York, Geo. H. Doran
da máquina debulhadora nos campos de cultura e do avião nos Co., 1919.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A BUSCA DE OUTROS MATERIAIS 95

tender atingir o seu objetivo sem usar fatos. Como fizeram Paulo mória assim, tal capacidade de escolher precisamente aquilo de
e outros pregadores dos tempos bíblicos, para tornar claras e lu- que necessita, não precisa ler as páginas que se seguem.
minosas as verdades acerca de Deus e do seu Reino? Um erudito O jovem pastor frequentemente se vê sem material. Acha
inglês demonstrou que o Apóstolo empregou o colorido local, espe- difícil discutir concretamente uma verdade ou um dever só porque
cialmente em relação com o atletismo e a arquitetura, a vida do não aprendeu a pensar sobre Deus e o homem em termos da vida
campo e a vida no exército — todas atividades masculinas. Hoje, 4
atual. Se preparar um celeiro próprio estará em ótima companhia.
porém, devemos pensar duas vezes antes de falar muito da guerra. Pensemos, por exemplo, no filósofo Hegel. Quando menino ainda,
Ainda que creiamos na justiça de algumas guerras defensivas do Hegel mostrava poucas evidências de ser um indivíduo brilhante,
passado, não apoiemos a guerra em si. Deveríamos defender o mas aprendeu a ver e a investigar. Quando tinha 17 anos, começou
ideal cristão, no espírito dos versos de Milton: a colecionar e a classificar toda espécie de fatos. Continuou a
fazê-lo pelos anos fora, guardando excertos do que lia nos clássicos
. . . A paz tem suas vitórias.
Não menos famosas que as da guerra.
e nos jornais e colecionava também o resultado da observação e
da meditação. Começou pouco e pouco a usar esta matéria-prima
Poderíamos considerar ainda outros campos, mas já escreve- em artigos e livros seus.
mos o suficiente para tornar clara a nossa ideia. Quem quiser O jovem Brooks seguiu sensivelmente o mesmo método, ainda
interpretar a vida dos nossos dias deve conhecer a Bíblia como se que variasse nos pormenores. Durante os 3 anos que passou no
planejasse não usar outra coisa e aprender tudo quanto possa seminário, não se dedicou ao que chamamos trabalho especiali-
sobre a vida, como ela nos surge noutras fontes, tanto nos livros zado, mas em grande escala à leitura de livros e à observação
como no mundo. Ainda que isto assuste um jovem pregador deve- da vida. Leu muito, especialmente os Pais da Igreja Primitiva,
mos ver que os mestres do púlpito antigo e moderno primam pelo observou muitas coisas e pensou muito. Anotou tudo em cadernos
uso de fatos, para a glória daquele a quem L. D. Weatherhead que usou toda a vida.
chama "O Deus dos pormenores".
Estes cadernos de apontamentos mostram que, ao ler, estava atento a
todos os pormenores, à acumulação de ideias, a frases concisas e epigramas
e principalmente a símiles e comparações. Escrevia-as em forma conden-
NECESSIDADE DE UM CELEIRO
sada, o mesmo fazendo com muito material para uso futuro. O estilo
rico e gracioso, a abundância e poder de sugestões literárias, as inúmeras
Logo o jovem ministro sentirá a necessidade de um celeiro metáforas — traços que caracterizaram seus escritos, são o resultado de
onde colocar o resultado da sua leitura e meditação, com o rela- esforço árduo durante anos de preparação. Possuía realmente um dom
tório do que vê e ouve no mundo. Para tudo isto um pastor oca- natural para isto, mas a maior parte de sua habilidade foi produto de
sionalmente pode confiar na sua memória, tal como o jovem Ro- cultivo. Há centenas de símiles aqui agrupados, que reaparecem mais
bertson em Brighton enchia a sua mente com Escritura, poesia tarde nos seus sermões".»

e fatos de muitas outras fontes. Foi enchendo esse seu celeiro


Temos outro exemplo num dos homens mais sábios do seu
mental durante toda a vida, de modo que sempre que se dedicasse
tempo, Louis D. Brandeis, antigo Juiz do Supremo Tribunal dos
a um assunto era capaz de tirar, do seu tesouro pessoal, verdades
Estados Unidos. Já idoso realizou uma grande obra, que parecia
bíblicas e recordações do que vira durante, por exemplo, uma ex-
o produto de acumulação.
cursão a pé pelos Alpes. Se algum dos meus leitores possui me-

i A . V. G. Allen, Li/e and Letters, I, p. 181, Copyright 1907 de E. P. Dutton


* Ver J. S. Howson, The MetaphoTs of St. Paul, Londres, 1862. & Co.
96 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

Administrou cientificamente sua vida e obra. Seus dias seguiam uma


rotina férrea. Todas as horas, e até mesmo minutos, seguia um plano
meticuloso. Graças ao planejamento disciplinado fazia a eficiência pessoal
CAPÍTULO VIII
duplicar ou triplicar. "Entre o que fazemos e o que somos capazes de
fazer, há cem por cento de diferença!" 6

Como disse certa vez Arnold Bennett, Brandeis aprendeu a


viver as vinte quatro horas do dia.
A autodisciplina começou cedo em sua vida. Antes de Bran- A ESCOLHA DE TÓPICOS PARA SERMÕES
deis ir para a Europa estudar, aos 16 anos de idade, comprara um
exemplar do Index Rerum, de John Todd, onde encontrara folhas
esses fatos precisarão de um nome.
ALGUM DIA TODOS
em branco para coligir e anotar observações: "Que um jovem,
No preparo do sermão o tópico surgirá mais cedo
ao começar a sua vida, se habitue a fazer uma relação de tudo
ou mais tarde. Logo que virmos o nosso alvo sabe-
quanto lê de valioso (e nada mais deveria ler) e quando tiver
remos dar título ao nosso sermão. Outras vezes talvez seja neces-
trinta e cinco ou quarenta anos terá algo de seu, que dinheiro sário reunir todo o material e começar a elaborá-lo antes de des-
algum poderia comprar." Foi mantendo-se fiel a estas palavras cobrir que nome lhe dar. Qualquer que seja a maneira como
do editor do Index, que o jovem estudante fêz a sua primeira trabalha a sua mente, o pregador deve ter o tópico bem à vista
anotação: "O valor da leitura de um livro vem da concentração antes de começar a escrever a mensagem. Do contrário talvez
durante a leitura e da meditação que se lhe segue". escreva dois ou três sermões em vez de um. Muitos pastores há
Tudo isto leva a uma única conclusão: jovem, organiza o teu que poderiam melhorar o seu púlpito se prestassem mais atenção
labor. Habitua-te a recordar o que lês, o que vês e o que pensas. aos tópicos dos seus sermões.
A menos que tenhas poderes iguais ao de um génio, lembrar-te-ás
O "tópico" refere-se ao título do sermão, ou seja, ao seu as-
de tudo mais clara e corretamente se escreveres e guardares as ano-
sunto. O "título" é o nome de um livro ou de série de sermões.
tações uma a uma; mas assegura-te de que o celeiro é simples. Po- 7

O "tema" ou "proposição" é a frase-chave que resume a substância


derás então buscar nele todo e qualquer material para os teus ser-
do discurso. Estas expressões aparecem indiferentemente em al-
mões. Qualquer que s,eja o teu método, lembra-te de que a pregação
no nosso tempo requer o uso dos fatos. guns livros, mas neste cada uma delas tem significado próprio.
Quanto ao tópico, cada sermão deveria ter um nome próprio e
todos os tópicos deveriam conduzir a um sermão que brilhe. Que
LEITURAS SUGERIDAS
grande ideal!
Good Reading, Commitee on College Reading, Nova York, Penguin Press, 1947.
Luccock, Halford E., e Brentano, Frances, The Questing Spirit, Nova York, Coward-
-McCann, 1948. IMPORTÂNCIA DO TÓPICO
McCall, Oswald W . S., The Uses of Literature in the Pulpit, Nova York, Harper
& Bros., 1932.
Por que dar importância ao nome? Será que todas as men-
sagens de Deus deveriam ter um tópico que aparecesse nos jornais
6
Ver A. T. Mason, Brandíeis, A Free Man's Life, Nova York, Viking Press, no domingo? Absolutamente não! Nem o costume nem a pru-
1946, pp. 38 e 432.
dência o pedem. Numa Igreja que dê ênfase à liturgia é possível
7 Ver A . W . Blackwood, Planning a Year's Pulpit Work, pp. 225-231.
98 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A ESCOLHA DE TÓPICOS PARA SERMÕES 99

que o Ministro nunca anuncie o assunto dos sermões, ao passo sermão, é melhor associá-lo a um tópico. Por que não lhe dar um
que noutro lugar o pastor anuncie todos os tópicos. Este costume nome, para que se lembrem com facilidade?
tornou-se mais comum nos Estados Unidos do que na Inglaterra, Isto quanto à teoria, e os fatos? Examinemos os tópicos dos
mas em ambos os lados do Atlântico grandes pregadores preferem sermões publicados num jornal. Reparemos como os tópicos de
não anunciar os tópicos; Marcus Dodd, G. Campbell Morgan, Jo- determinado ministro podem ser favoravelmente comparados com
seph Fort Newton e George A. Buttrick, por exemplo, raramente os títulos de um New York Times, ao passo que outros assuntos
anunciam os seus assuntos. de sermão sofrem de monotonia, fraqueza, claudicação. Monotonia
O ministro sábio adapta-se à tradição da sua igreja. Se anun- por se repetirem cada semana; fraqueza, por lhes faltar poder de
ciar os tópicos, verificará que têm maior efeito para o culto da apelo; claudicação por ausência de espiritualidade. Não há nenhum
noite do que para o da manhã. O pastor que anuncia os tópicos membro de Igreja, que se respeite a si próprio, que atravesse a
dos sermões atrai grandes multidões ao culto vespertino. Neste rua só para ouvir aquilo que alguns tópicos proclamam. É possível
caso, a necessidade de enviar o tópico para os jornais com antece- que esses sermões consistam em verdadeira Bíblia, indo ao en-
dência transforma-se num estímulo para os que têm a tendência contro das necessidades dos nossos dias. Mas, nesse caso, por que
de adiar seus afazeres. Em geral alguns de nós preferem anunciar não dar um nome digno a essa mensagem? Por que desfigurar
os tópicos, especialmente os do culto da noite. Deus com um tópico que parece mostrá-lo sem interesse e sem
apelo? Se estes assuntos parecem sem fundamento, olhemos de
O verdadeiro problema diz respeito ao valor do tópico, no pre- novo para a tal lista de sermões!
paro e apresentação do sermão. Quando o nosso filho querido nas-
ce, recebe um nome e conserva esse nome durante toda a sua
'•Nutrição Cristã". Em Chicago, Frank W. Gunsaulus certa vez
CARACTERÍSTICAS DO BOM TÓPICO PARA SERMÃO
pregou sobre "Cristo aos pés dos discípulos" (Jo 13.15). Gunsaulus
estudara a narrativa sobre o lava-pés e achara no tópico um ponto
Quando estamos em nosso escritório, como podemos avaliar
central para conduzi-lo na preparação da mensagem. No púlpito
um tópico antes de vê-lo impresso? Fazendo estas seis perguntas:
usou o tópico para fazer com que todos os ouvintes vissem a ver-
dade central e compreendessem os pormenores. Até hoje este tópico 1. "Meu assunto é interessante sem ser sensacional? Interes-
tem ajudado muitos membros da Igreja a relembrar a mensagem sante para quem? Para aquele a quem pretendes alcançar. Em
e, por isso, a viver de acordo com a sua luz. geral apela ao homem e não à mulher, pois se o homem fôr à
Que fixam os ouvintes de um sermão? Muitas vezes apenas igreja a mulher não ficará em casa, e se os homens continuarem
o tópico! Na história da pregação muitas mensagens sobreviveram a aparecer trarão consigo outros homens. O homem vem ouvir-te
em parte por causa do nome que receberam. Se esta afirmação para encontrar auxílio para fazer a vontade de Deus diariamente.
parece exagerada, façamos uma lista dos sermões publicados, que Se continuarem a vir, e em proporção igual as mulheres, é porque
tenham sobrevivido mais de uma década, e uma lista de outras sabes preparar e pregar sermões com interesse e valor para o ho-
mensagens que relembramos com prazer um ano depois da sua mem.
pregação ou leitura. De que nos lembramos mais claramente em Por que não descobrir a espécie de tópicos que apelam aos
qualquer dos casos? Dos tópicos! Por isso o pregador sábio se homens que pretendes alcançar? Num estudo bíblico, com cem
aproveita da maneira como sua memória opera. Se quisermos homens, certo jovem pastor distribuiu uma lista com cinquenta
fazer com que os membros da Igreja se recordem do nosso próximo tópicos para sermões. Queria aumentar a assistência ao culto
100 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A ESCOLHA DE TÓPICOS PARA SERMÕES 101

da noite e por isto pedia aos amigos que escolhessem oito assuntos Endor". Um terceiro "pregou" sobre João Batista como "O Homem
sobre os quais gostariam de ouvir pregar. A maioria atendeu ao que Perdeu a Cabeça num Baile". Um quarto ainda fêz um troca-
pedido entregando as listas e vindo ouvir as mensagens depois. dilho sobre a sua cidade e ainda conseguiu fazer rir uma multidão
Antes não frequentavam os cultos, mas em breve começaram a
sobre "A Obesidade da Idade Madura". E ainda há quem se
trazer os seus amigos. Os homens que preencheram as listas aju-
admire de que tantos membros da igreja deixem de freqúentá-ia!
daram ainda mais o pregador, abrindo-lhe os olhos para a neces-
sidade de usar tópicos que pudessem compreender. A testa dos 2. O tópico é claro, mas não revelador? Vejamos os seguintes
oito da lista vinham: "Significado da Religião Individual", "Que exemplos de tópicos claros: "O Conforto do Messias de Haendel",
é a Fé" e "Que é a Vida Eterna"? "A Cruz em Termos de Cura" e "Como Pode o Cristão Resplan-
decer". Ou consideremos estes, de Gossip: "O que Cristo faz pela
Até àquela ocasião em geral confiara em assuntos que não Alma", "A Mensagem de Jesus, o Leigo" e "O Evangelho Segundo
continham apelo algum para os homens, como por exemplo "Os os Inimigos de Cristo". Estes tópicos mostram aos membros da
Subúrbios da Alma". Este tópico viera-lhe num sonho, mas, sem Igreja o que o ministro pretende, mas não dizem pormenorizada-
José ou Daniel para lhe explicar o significado, nunca pregou o mente o que podem esperar. Este género de assuntos serve tanto
sermão. Depois de ter descoberto que os membros da igreja não para sermão como para livro didático. Quando alguém deseja
se interessavam por abstrações ocas, começou a pregar doutrina ensinar, escreve um livro a respeito de como pregar com a Bíblia
e tentou fazer com que influenciassem a vida diária dos indivíduos. e não a respeito da necessidade de um tipo diferente de prédica
Noutra congregação possivelmente tal inquérito conduzisse a um para os nossos dias.
tipo diferente de trabalho de púlpito. O fato é que sempre que o
ministro anunciar um assunto, ou uma série, deve estar seguro O pregador deverá usar sempre tópicos claros como cristal?
de apelar para aqueles a quem quer alcançar. Em suma, sê interes- De forma alguma! Depois de aprender a usar a imaginação para
sante! a glória de Deus, de Quem ela vem, poderá pregar sobre "O Evan-
gelho na Neve" (Is 1.18), "O Sermão na Ceia" (I Co 11.26, no
Interessante, mas não sensacional! Um tópico sensacional grego) ou "Texto para o Ano Novo" (Mt 6.33). Gossip prega
chama a atenção para si próprio e não para Cristo e o seu Evan- muitas vezes usando tópicos como: "O Atributo que Coroa a
gelho. É possível que um assunto lúgubre atraia uma multidão Deus", "O que Cristo mais Odeia" e "Mensagem para Dias Cin-
de curiosos, mas que efeito produz na pessoa a quem o pregador zentos". Paul E. Scherer geralmente usa assuntos que sugerem
mais deseja alcançar? Por que afastá-lo com "espertezas"? muito mais do que dizem, como podemos ver nos livros O Lugar em
Ninguém pode testemunhar simultaneamente de Cristo e que Estás e Acontecimento na Eternidade.
de si mesmo. Felizmente o sensacionalismo hoje praticamen-
Estes exemplos sugerem duas regras opostas, com toda sorte
te desapareceu do púlpito, pois sermões e assuntos poderão
de exceções. Procurando ensinar imagina um tópico que todos
parecer áridos e sem interesse, mas raramente impróprios. É pos-
entendem, mas se a intenção é confortar ou inspirar, começa com
sível que, em virtude das guerras mundiais e seus efeitos, o espí-
algo mais poético. Ao apresentar uma doutrina ou apontar um
rito de humildade e reverência tenha guiado e constrangido quase
dever a ser cumprido, ou explicando uma passagem, verificarás
todos os que desejam pregar.
que um tópico claro é de grande valor. Para criar atmosfera que
Lembramo-nos, porém, dos seguintes exemplos. Certo jovem, anime o espírito ou abra a vista de alguém, confia tanto quanto
que depois abandonou o ministério, "pregou" sobre "A Vida Sexual possível no colorido. Assim poderás falar sobre oração em termos
de Sansão". Outro mais velho falou sobre "Noite com a Bruxa de de "altar dourado" ou "escada que conduz a Deus". Durante algum
102 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A ESCOLHA DE TÓPICOS PARA SERMÕES 103

tempo o jovem ministro fará bem em se especializar em assuntos Porém, o indivíduo com gosto e senso crítico pode deixar cie pa- -
claros, que, aliás, são muito mais fáceis de preparar. recer sentimental ou romântico mesmo no "Dia das Mães".
5. Mais importante ainda, o assunto é conciso sem ser pe-
3. Ainda mais, o tópico é curto sem ser abrupto? De acordo dante? Inclui tudo quanto o sermão tem e nada mais? Seu colo-
com os peritos em psicologia da atenção, uma linha de publicidade rido está de acordo com o espírito da mensagem? Em suma, o
nos jornais não deveria conter mais de quatro palavras fortes. chapéu está à medida da cabeça? É possível que esta prova seja
Descobriu-se, por meio de experiências de laboratório, que mais de a mais difícil de todas. Como exemplos de tópicos precisos con-
quatro palavras principais tendem a distrair a atenção. Como sideremos os seguintes, de Horace Busnell, e notemos como não
exemplo de um tópico de sermão com quatro palavras fortes ve- são escolásticos, ainda que apresentem os fatos: "A Vida de Cada
jamos o seguinte, sobre o Espírito Santo: "O Poder de Deus na Pessoa, um Plano de Deus", "Vivendo para Deus nas Coisas Pe-
Vida do Homem". Notemos as palavras fortes: Poder, Deus, Vida, quenas" e "Como ser Cristão no Comércio". Ou consideremos
Homem. Vejamos então como tornar tudo mais fraco, diluindo tÓDicos recentes, com variedade de colorido: "O Cristo com a Face
os termos: "O Supremo Poder do Cristo Vivo na Vida Diária Empedernida" (Is 50.7), "A Fé que Vence o Medo" (Mc 4.40) e
das Pessoas Comuns". Este tópico tende a dizer coisas demais, "Agradecendo a Deus numa Tempestade Marítima" (At 27.35).
dispersa em vez de concentrar e não leva o ouvinte a ver, sentir
e agir. Em vez de ampliá-lo, tentemos limitar o tópico: "O Espí- 6. Finalmente, o tópico é religioso sem ser transcendente?
rito Santo como Poder". Esta pergunta está relacionada com a que diz respeito à precisão.
Pois, se u m s e r m ã o consiste em religião no sentido cristão da
Só um especialista consegue pregar bem sobre uma única palavra, o nome deveria ser próprio! Um título não religioso, para
palavra. Um mestre do púlpito fê-lo com "Procrastinação", mas um sermão cristão, poderia assemelhar-se a um subterfúgio. Mes-
nesse vocábulo há mais do que uma só ideia. Demonstrou a mes- mo assim, muitas mensagens evangélicas possuem nomes que nada
ma habilidade ao intitular um livro de O Sentido da Fé. Se tivesse têm de religioso. Vejamos os seguintes exemplos escolhidos quase
dito "Significado" em vez de "Sentido" teria reduzido pela metade ao acaso: "Conquistadores de Montanhas", "Força Medida pela
a saída do livro. Outro pregador teria dito: "As Tremendas Im- Fraqueza", "Quando a Vida tem Significado" e "Derrota Tremen-
plicações da Confiança Plena no Onipotente Soberano da Ordem da". Uma vez que o sermão possui mensagem cristã, requer nome
Cósmica" e muitos de nós veríamos nessa pomposa verbosidade cristão.
uma prova de sabedoria! Quão maior habilidade usou Félix Men-
Esta questão h o j e parece ainda m a i s importante, por causa
delssohn, intitulando Canções sem Palavras, algumas das compo-
da tendência para o secularismo. É possível que o pastor insista
sições a que primeiro chamava "Melodias para Piano Forte"!
em afirmar que prega sempre religião e que depende de sua repu-
4. O tópico tem ritmo, mas não excessivo? Quando o coração tação. Quando começa a falar sobre "O teu Ego Desconhecido"
de um indivíduo se excita, as palavras surgem facilmente. A be- ou "A Vitória sobre o Medo", as pessoas sabem que quer dar
1

leza da prosa ritmada aparece nos títulos dos livros de John Bu- maior ênfase a Deus que à psicologia. Mas que efeito produzirá
nyan, todos eles ricos: O Peregrino, Graça Abundante para o sobre o pregador jovem ainda sem fama? Por que não encorajá-lo
Maior dos Pecadores, Vida e Morte do Sr. Badman e "O Pecador a pôr tanta religião nos tópicos como nos sermões?
de Jerusalém Salvo". Por outro lado, é possível que um tópico de Pode ser difícil manter o equilíbrio. Quando alguém fala so-
sermão vá longe demais na busca da beleza, como acontece na bre "Soberania de Deus", o tópico sugere um discurso transcen-
seguinte série de mensagens: "A Febre Caprichosa da Vida", "O
Sonho Transitório da Vida" e "As Areias Movediças do Tempo". i Ver A. W. Blackwcod. The Protestam Pulpit. sermões n." 18 e 28).
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A E S C O L H A DE TÓPICOS PARA SERMÕES 105

dente, enquanto que um bom título inclui tanto o divino como título que sugira um sermão cheio da graça divina para as neces-
o humano, em geral nesta ordem. Embora o poder venha de Deus, sidades humanas.
a ênfase está sobre o humano. Por exemplo, J. S. Stewart pregou Um pregador experimentado usará, de vez em quando, uma
sobre "Quando a Paz de Deus Guarda a Porta" (Fp 4.7). Seme- 2
sentença como tópico. Por exemplo: "Que a Igreja seja a Igreja!".
lhante tópico requer mensagem que conte sobre Deus junto de nós O título provoca uma pergunta na mente do ouvinte, que o obriga
e forte para nos salvar. Portanto, ao elaborar tópicos para sermões, a meditar: "Que quer dizer a Igreja ser Igreja?" Tanto melhor
nunca percamos de vista aquele que se senta no banco da igreja. se o pregador já tiver conquistado o seu estímulo pois do contrário
pode parecer tirano em vez de guia gentil. Durante os pri-
O jovem pregador deve considerar estas seis características meiros meses na Igreja, o jovem pastor deve contentar-se com
como guias práticos e não como restrições inflexíveis. Se alguém apelos ao coração e à cabeça. Vai aprendendo pouco a pouco a
as tiver em consideração durante um ano ou dois, começará a falar com autoridade sem parecer, no entanto, combativo ou dog-
aplicá-las inconscientemente. Felizmente a habilidade para formar mático. O problema está em que há certo tipo de mensagem que
tópicos cresce com o uso, mas mesmo assim a tarefa não será fácil. requer, por vezes, uma sentença como tópico, com verbo no impe-
De quando em vez até o pregador mais experimentado tem que rativo, como "Escolhei Hoje!".
labutar horas seguidas, antes de conseguir escrever o tópico que
Há ainda outra exceção à nossa regra: um sermão que focalize
lhe foge. Mas durante todo esse tempo poderá, sem temor, ocupar-
um problema, talvez necessite de tópico na forma de sentença. O
se com outras partes do sermão. Sabe, por experiência anterior,
problema poderá surgir como uma pergunta, por exemplo: "Como
que, se esperar vigilante, em espírito de oração, encontrará um
Vencer a Dúvida?" ou "Como Guardar o Domingo?". No primeiro
nome próprio para o sermão. Porém, algumas sugestões poderão
caso a resposta poderá ser dada pelo incidente do Senhor com
ajudar o principiante.
Tomé (Jo 20.24-29); no outro, com o que ensinou aos seus discí-
pulos (Mc 2.23-3.5). Na mensagem sobre a dúvida, o pregador leva
o ouvinte face a face com o Cristo vivo. O sermão sobre o domingo
FORMA DO TÓPICO DO SERMÃO poderá ter como centro três frases de Cristo: "O sábado foi feito
para o homem", "o Filho do Homem também é Senhor do Sábado"
1. Dê-se preferência a uma frase e não a uma sentença ou e "É lícito fazer o bem nos Sábados".
uma só palavra. Uma*frase sugere mais do que aquilo que diz, 2. Forme o título com palavras szias. Não te importes, de
enquanto que uma sentença poderá desvendar tudo. A frase deve' quando em vez, de usar um tópico de outro pregador, mas em geral
ser simples e não composta. Pregue-se sobre "A Crença dos Nossos deves apreciar a alegria de escreveres as tuas próprias frases. Acos-
Filhos", em vez de "A Fé e os Nossos Filhos", tópico este que tuma-te a interpretar o texto e não a citar apenas uma parte.
sugere falta de unidade. Fale-se sobre "Sê Cristão por Amor de Em vez de pregar sobre "De tal maneira amou Deus ao mundo",
teu Filho" e não sobre "Sê Cristão e Ama a teu Filho". Tal como fala sobre "O Texto Áureo da Bíblia" ou "A Melhor Coisa a res-
num quadro a óleo, focaliza a atenção num único ponto de interes- peito de Deus". Em vez de escolher o título: "Recebereis Poder",
se e não em dois independentes. Quando o divino e o humano prega sobre: "O Espírito Santo como Poder de Deus" ou "O Poder
são apresentados relaciona-os um com o outro, mas não faças de Deus para a Igreja dos Nossos Dias". Use o tópico para lançar
com que ambos sejam colocados no mesmo nível. Imagina um a luz sobre o texto, por exemplo: "O que Jesus Diz acerca do
Dinheiro", "Quando um Jovem Encontra a Deus", "Como o Senhor
nos Guia Hoje".
- Ver The Strong Name, Nova York, Charles Scribner's Sons, 1941, pp. 169-176.
106 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A E S C O L H A DE TÓPICOS IIPARA SERMÕES 107

Depois de ter aprendido a elaborar um tópico, poderá, de vez de partes dos textos usados, talvez nunca faças outra coisa. Usa
em quando, usar palavras do próprio texto. Brooks, nos seus ser- a tua imaginação! Então podes ser tu mesmo, embora sejas sempre
mões publicados, usa títulos seus em sessenta e sete por cento dos diferente.
sermões, mas nas mensagens restantes usa tópicos bíblicos. Eis Mas numa série os tópicos devem ter padrão bastante uniforme.
alguns exemplos de tópicos tirados de textos: "As consolações Como nos títulos de um livro, títulos paralelos indicam semelhança
de Deus", "Livres da corrupção do mundo", "A Candeia do Se- de conteúdo. Se o título geral indica "Crenças Importantes" ou
nhor", "O Pilar do Templo de Deus", "Subindo para Jerusalém" "Crenças Construtivas", os tópicos que se seguem mostrarão que
e "A Porta Formosa". Se todos quantos usam tópicos bíblicos o crenças predominam no dia de hoje e quais são construtivas. Se
fizessem com tanta habilidade e cuidado como Brooks, os membros aquele que está encarregado da "construção" sabe como construir
das Igrejas aprenderiam muito sobre a beleza da Bíblia. Mas por meio de palavras, conseguiu apresentar pensamentos semelhan-
ninguém deve seguir exclusivamente este ou qualquer outro mé- tes em formas semelhantes, sem, no entanto, deixá-los tornarem-se
todo. rígidos. Tal artista trabalha como poeta, que pode seguir uma
forma de sua própria escolha e apesar disso fazer com que a verdade
3. Por algum tempo, meu jovem, dá preferência a um assunto
brilhe por meio de palavras belas e encantadoras.
que ensine. Sê simples e claro. Escolhe algo que esteja dentro
dos limites de tua capacidade atual. Qualquer ministro, que pensa, Por muitas razões semelhantes, o neófito acha mais fácil pla-
pode intitular seu sermão, "O Sentido da Providência de Deus", nejar uma série de quatro ou cinco sermões, do que de oito ou dez.
"Os Perigos da Consciência Complacente" ou "O que Jesus Diz Tentará, depois de alguns anos, algo mais ambicioso, como uma
sobre as Preocupações". Mas se nos limitarmos sistematicamente série de sermões sobre ética: "Ensino da Bíblia sobre a Família".
a tal clareza, em breve teremos caído na rotina. Deveríamos gra- Sem parecer sensacional, um ministro cuja vida no lar é feliz,
dualmente aprender a formular tópicos com beleza e significado, pode elaborar uma série, com tópicos como estes:
desde que se possa coordená-los com mensagem cheias de graça A Primazia do Lar Cristão
e esperança. Por exemplo, depois de Brooks ter trabalhado como A Bênção das Criancinhas
operário, podia pregar sobre "O Arco-fris à volta do Trono" (Ap O Significado da Educação Cristã
4.3b). Com o correr do tempo qualquer ministro, com imaginação, A Edificação do Altar Familiar
poderá pregar sobre assuntos cheios de graça e encanto. A Importância de Nossa Juventude
4. Cada semana procura variedade. Deixa que a cada do- O Ideal Cristão do Namoro
mingo os tópicos sejam diferentes, tanto no conteúdo quanto na O Ensino da Bíblia sobre o Casamento
forma. Isto acontecerá se meditares para ti mesmo e depois o A Atitude do Senhor para com o Divórcio
considerares como prova da tua habilidade. Como podes exercitar A Beleza do Céu como Lar
melhor as tuas faculdades intelectuais, do que imaginando uma
série de tópicos originais, tão diferentes entre si como os próprios ESTUDO DE TÓPICOS DE SERMÕES
sermões? Como dizia Goethe: "A originalidade não consiste em
dizer algo de novo, mas em dizer algo antigo de forma nova". Em O estudo dos tópicos de sermões influencia tudo quanto se
outras palavras, cuidado com a monotonia. Se tens tendência para faz para o púlpito. Em Boston certo jovem pastor começou a preo-
tópicos claros pode ser que exageres, mas isto é bom; se gostas de cupar-se com o que pregava, assunto a que não dera grande im-
outro tipo de títulos, talvez te tornes confuso; se tirares tópicos portância durante a estada no seminário.
108 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

Não sabendo por onde começar, pòs-se a trabalhar sobre tó-


picos e dedicou a este assunto todo o seu tempo livre durante vá-
rias semanas. Estudou, em primeiro lugar, tópicos de príncipes CAPÍTULO IX
do púlpito como Bushnell e Newman e dedicou-se depois aos tópicos
dos seus próprios sermões. Ao escolher tópicos para cada uma das
mensagens, usou todo seu poder e capacidade e em breve começou
a encontrar alegria nova trabalhando no seu gabinete de estudo.
Reparou que as pessoas reagiam melhor aos seus sermões e que a EM FAVOR DE SERMÕES TÓPICOS
assistência à igreja começou a crescer.
Este jovem pastor contou tudo isto ao professor. Este, depois da pregação, o número de ser-
E M TODA A HISTÓRIA
de ouvir o que o jovem lhe contara, perguntou: "Atribui todas
mões de tópicos é maior do que quaisquer outros.
essas coisas ao estudo de tópicos?"
Entre as mensagens que se tornaram famosas, qua-
"Não Senhor", respondeu o jovem, "porque ao começar a con- se todas pertencem a esta categoria. Especialmente nos Estados
sertar a janela da frente verifiquei que precisava limpar toda a Unidos, durante este século, os sermões publicados raramente são
casa".
de outro tipo. Presentemente, a tendência parece ser para maior
Este jovem aprendera uma das lições sobre seu trabalho por- uso de métodos textuais e expositivos, mas quase ninguém pensa
que começou a considerar cada sermão como um todo. Não pen- em abandonar os sermões tópicos. Estes fatos querem dizer muito
sava no tópico como algo diferente em si, mas considerava-o como ou pouco? Deverão causar satisfação ou consternação? Tudo de-
meio de fortalecer todo o sermão. Também resolvera nunca usar pende do que vamos considerar abaixo.
um título brilhante num discurso sem interesse. É possível que,
se se tivesse interessado por qualquer outro aspecto da pregação,
tivesse chegado à mesma conclusão. Porém, o que acontece é que O SIGNIFICADO DO TÍTULO
o seu estudo de tópicos para sermões o levou a uma espécie de re-
generação homilética. Sermão tópico é aquele cuja forma resulta das palavras ou
Será que mais alguém quer fazer um estudo de tópicos para ideias contidas no assunto. Num sermão desses, o tópico domina
sermões? Caso afirmativo, comece com um ou dois volumes de tudo quanto se lhe segue, da mesma maneira que num sermão
sermões de seu pregador favorito, antigo ou atual — Bushnell, textual a passagem governa tudo quanto vem depois. Não é ne-
Clow, Stewart ou Gossip. Depois de ter aprendido o possível sobre cessário dizer que estes títulos nem sempre são muito bem postos.
os tópicos desses pregadores, comece a separá-los. Procure encon- Por vezes sobrepõem-se e provocam confusão. Ao escrever um ser-
trar um pregador fraco, que se preocupe em dar um nome adequado mão o estudante pode sentir-se perdido no que diz respeito à sua
a cada sermão. Então poderá concluir: "Pela graça de Deus identificação. É possível que deseje saber por que o sermão tópico
associar-me-ei aos mestres e não aos medíocres". requer um texto e porque a mensagem textual necessita de um
tópico. Se os nomes o deixam perplexo, deveria saber que os fatos
Ninguém pode esperar tornar-se um pregador apenas estu-
em si também não parecem nada simples. Mesmo assim, na prática,
dando tópicos, mas quem se dedica a esta espécie de disciplina,
podemos descrever a mensagem de tópico como o desenvolvimento
semana após semana, espera ansiosamente a época em que apre-
do assunto com que começa.
sentará o velho Evangelho com interesse e forças novas.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES EM FAVOR DE SERMÕES TÓPICOS '111
110

Como considerar o método do tópico? Os príncipes do púipito Como outro exemplo consideremos Thomas Chalmers e leiamos
em regra consideram-no favorável, mas alguns críticos põem o o famoso sermão: "O Poder Expulsivo de uma Nova Afeição". 1

jovem ministro de sobreaviso, para nunca pregar desta forma. Reparemos como seguiu o costume de anunciar um texto (I João
Muitos dos que ensinam esta matéria têm dado certa preferência 2.15) e como deduziu a mensagem do tópico. Os estudantes nas
ao sermão tópico, sem excluir outras formas. Verificamos, por aulas insistem em que êle poderia ter usado qualquer outro texto,
exemplo, que os sermões doutrinários muitas vezes tomam a forma como Rm 12.2; Rm 12.21; Cl 3.2 ou 1 Jo 4.18b. Depois de algum
do sermão tópico, o mesmo acontecendo com os éticos. Além disso, tempo concordam com o último texto, "o perfeito amor lança fora
somos da opinião de que o púlpito, no nosso tempo, iria ao encontro o medo", mas nem por isso deixam de admirar o sermão, tal como
das necessidades humanas de forma muito mais adequada se to- êle é com ou sem texto. Por que todos ficam cheios de admiração
dos os jovens pastores aprendessem a pregar de diferentes manei- perante esta mensagem? Principalmente porque é deduzida do
ras. Por que haveríamos de ter confiança apenas num único mé- tópico.
todo de apresentação da verdade divina?
Agora consideremos Horace Bushnell, que se tornou famoso
É possível que algum crítico pergunte: "Será possível tratar principalmente por causa de dois sermões, ambos tópicos: "A vida
verdades bíblicas por tópicos?" Como resposta voltemo-nos de de cada Pessoa, um Plano de Deus" e "Influência inconsciente". Am-
novo para alguns períodos da história da prédica. Entre todos os bos confirmam o nosso estudo, mas principalmente o segundo.
pregadores do Evangelho pensemos em Crisóstomo, que no seu Claro, o pregador começou com um texto, como todos faziam no
apogeu pregou sete mensagens sobre a morte de Lázaro. Numa seu tempo: "Então entrou também o outro discípulo, que chegara
delas, tratou do "Excessivo Pesar pela Morte de Amigos". Anun- primeiro ao sepulcro, e viu e creu" (Jo 20.8).- Como noutras
ciou como texto 1 Ts 4.13, mas o sermão, em si, resultou do tópico. mensagens, Bushnell usou seu texto alusivamente, mas extraiu
Depois da introdução relacionada com o texto, Crisóstomo apresen- do tópico o corpo do sermão. Em parte por isso, a mensagem so-
tou duas ideias principais, ambas de tópico: mostrou a loucura breviveu quase um século, influenciando muitos outros sermões.
do pesar execessivo e a maneira de acabar com êle. Como classifi- Mais recentemente, em Glasgow, William Clow pregava fre-
caríamos tal discurso, a não ser como bíblico em substância e quentemente usando o texto como ponto de partida. Porém, ao
tópico na forma? contrário de muitos pregadores nitidamente evangélicos, não evi-
tava os sermões tópicos. Na mensagem "A Cruz e a Memória do
Sendo o mais eloq*uente de todos os pregadores, Crisóstomo
Pecado" começou com um texto (1 Tm 1.13). Nos primeiros pa-
3

poderia ter estruturado todo um discurso textual naquilo que apre-


rágrafos concentrou a atenção no texto, primeiramente sobre "me-
sentava nos primeiros parágrafos. Ali apresentou a morte como
mória" e em seguida sobre "memória do pecado". No corpo do
sono e mostrou os limites cristãos do pesar. Tirou ambas as ideias
sermão lidou com três grandes verdades, todas derivadas do tópico,
diretamente do texto, na seguinte ordem: "Não queremos, porém,
com ênfase especial na Cruz: "Em primeiro lugar a Cruz tira o
irmãos, que sejais ignorantes com respeito aos que dormem, para
aguilhão da memória do pecado... Em segundo lugar a Cruz trans-
não vos entristecerdes, como os demais que não têm esperança". Po-
forma a memória do pecado num meio de graça... Em terceiro
rém, se Crisóstomo tivesse seguido este método em algum sermão,
lugar a Cruz fará desaparecer a memória do Pecado". Em seguida
possivelmente este não teria sobrevivido quinze séculos. Afinal de
contas, para que nos havemos de preocupar com a forma de men-
sagem que consiste de verdade divina apresentada por uma perso- 1
Ver A. W. Blackwood. The Protestant Pulpit, sermão n.° 6.
- Sermons for the New Life, Londres, 1892. pp. 118-132.
nalidade forte, para ir ao encontro de necessidades humanas? 3 Ver A. W . Blackwood, The Protestant Pulpit, sermão n.° 17.
112 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES EM FAVOR DE SERMÕES TÓPICOS •113

este pregador da verdade divina nos conduz às palavras finais: H. Spurgeon pregou sobre "O Deus dos Anciãos". Começou com 5

"Não há pecado algum que possa viver debaixo do poder da Cruz". um texto (Is 46.4) e a partir dele apresentou a constância do
amor de Deus. Depois tratou dos valores práticos desta doutrina.
No nossos dias, ninguém ultrapassa Harry Emerson Fosdick
Algumas das verdades tirou do texto, outras, do tópico. Do prin-
como mestre em sermões tópicos. Muitas vezes diverge teologica-
cípio ao fim, tentou ir ao encontro das necessidades dos seus ou-
mente de muitos que admiram a sua homilética. Na mensagem
vintes, velhos e novos, especialmente os de meia idade. Quem
"Perdão de Pecados" demonstrou como tratar indiretamente uma
4

pode opor^se a esta maneira de pregar sobre a verdade encerrada


passagem da Bíblia. Habitualmente começa com o tópico ou pro-
num tópico?
blema, sem anunciar nenhum texto. Mas logo trata das palavras
do nosso Senhor: "Qual é mais fácil dizer: Estão perdoados os 3. O uso deste método encoraja o indivíduo a procurar uni-
teus pecados, ou: Levanta-te e anda"? (Lc 5.23). O sermão então dade. Se elaborar um tópico com todo o cuidado, poderá usá-lo
apresenta três razões, pelas quais nosso Senhor acha difícil per- como prova da unidade. Tomemos o sermão mais conhecido de
doar pecados iguais aos do homem que hoje se senta nos bancos João Wesley. Em 1758, aos 55 anos, numa altura em que sabia que
da igreja. Aqui uma vez mais um mestre do púlpito mostrou como todos estavam interessados em audiências do tribunal, pensou em
concentrar a atenção sobre um tópico e como usá-lo para pregar apresentar o assunto: "O Grande Tribunal". De acordo com o
a verdade em nosso tempo. costume seguido em "Sermões Ocasionais", começou com a cir-
cunstância que sugeriria o discurso, chamando em seguida a aten-
ção para o texto (Rm 14.10c). Lançou-se logo na discussão do
VANTAGENS DO MÉTODO assunto. Quase cem anos mais tarde, um pregador de tipo comple-
tamente diferente mostrou como usar um tópico para conseguir
Nas mãos de um mestre, este género de trabalho para o púlpito unidade. Em Boston, William Ellery Channing começou com um
oferece um bom número de vantagens. texto — "Este é o meu Filho Amado, em quem me comprazo" (Mt
17.5) — e apresentou a mensagem que se tornou famosa, "O Ca-
1. Permite ao ministro discutir qualquer assunto que julgue
ráter de Cristo" 6

necessário. Talvez sinta que a condição do mundo e da sua pró-


pria Igreja requeira mensagem doutrinária sobre "O Significado Todos estes sermões tratavam de um único assunto, aquele
da Soberania de Deus" ou discurso ético sobre "O Perdão dos Ini- com o qual o pregador começara. No seu título o pregador tinha
migos da Nação". Em qualquer dos casos poderia começar com uma espécie de estrela polar que seguia até ao fim da sua jornada.
uma passagem bíblica, tratando em seguida o assunto pelo método Se esta questão de unidade parece pouco importante, leiamos certo
de tópico; ou então poderia começar com o tópico e discuti-lo mais número de sermões da nossa época e notemos como alguns não
ou menos biblicamente. possuem aquela unidade que deve acompanhar uma obra de arte.
Ficaremos espantados se os leigos acharem difícil acompanhar o
2. O método de sermões tópicos permite grande amplitude ministro que tenta pregar três ou quatro pequenos sermões, em
de desenvolvimento. Dentro dos limites de um assunto o pregador menos de meia hora? Quanto a uma impressão que perdure, como
sente-se com liberdade de espraiar^e para onde puder encontrar ihes será possível relembrar a mensagem central de um discurso
algo para as suas ovelhas. Quando tinha vinte e dois anos, Charles

Ver Sermons, segunda série, Nova York, Sheldon & Co., 1865, pp. 361-379.
* ibid., sermão n.° 23. « Ver A. W. Blackwood, The Protestam Pxdpit, sermão n ° 7.
IH A PREPARAÇÃO DE SERMÕES EM FAVOR DE SERMÕES TÓPICOS

que não possui um núcleo unificado? Se qualquer jovem ministro OBJEÇÕES AO SERMÃO TÓPICO
examinar o trabalho que realizou no púlpito, nos últimos seis
meses, talvez descubra a necessidade do uso de um tópico para Considerando todos estes fatos, por que é que alguns guias
conseguir unidade. evangélicos advertem os jovens ministros para que fujam de ser-
mões tópicos? Talvez porque o método não funciona como máqui-
4. O uso sábio de um tópico faz com que o pregador prossiga na. Nas mãos de um trapalhão pode revelar toda espécie de defeitos.
para o alvo do sermão. O tópico pode servir como bússola, para Se os mais famosos sermões da história do púlpito pertenceram a
manter o guia no caminho que o leva ao seu destino. Na mensagem este tipo, o mesmo aconteceu com os mais pobres e piores. Porém,
sobre "O Grande Tribunal" o pensamento e o sentimento foram quando alguém nos põe de sobreaviso contra os sermões tópicos,
subindo, de modo que Wesley, impressionado pela grandeza do seu tenhamos a certeza de que concordamos com o tipo de mensagem
que dizem não ter qualquer valor. Não nos esqueçamos, também,
assunto, atingiu emoção tal como raramente conseguira atingir.
de que este género de pregação abre as portas a muitos abusos,
Por isto terminou com as seguintes palavras, que falam do apare-
que talvez se tornem muito sérios.
cimento final do Nosso Senhor:
1. O sermão tópico tende a encorajar o secularismo. Um
"Oh, provai a sua misericórdia antes da sua justiça, o seu amor antes
discurso sobre tópico em vez de passagem, pode ter pouco ou nada
do trovão do seu poder. Êle não está longe de cada um de nós e virá,
não para condenar, mas para salvar o mundo. Êle está no meio de nós!
a ver com cristianismo. Os críticos protestam, e com razão, contra
Pecador, não bate êle agora, sim agora, à porta do teu coração? Oh! que a transformação do púlpito num centro de discussão de tudo me-
possas saber, pelo menos neste teu dia, aquilo que pertence à tua paz! Oh! nos "aquilo que o homem deve crer a respeito de Deus e o dever
que possas dar-te a ti mesmo a êle, que se deu a si mesmo por ti > com que Deus quer que o homem cumpra". Por exemplo, em algumas
fé humilde, em amor santo, ativo e paciente. E então te alegrarás com sinagogas judaicas a primeira parte do culto público é tirada do
grande alegria no seu dia, quando vier nas nuvens do c é u " . ' Antigo Testamento, mas a mensagem soa como artigo de fundo
num jornal político partidário. Infelizmente os nossos amigos ju-
5. Esta forma de pregar topicamente muitas vezes demons- deus não podem dizer que possuem o monopólio da pregação se-
tra os dons literários do pregador. Por vezes, como acontecia com cularizada. Aqueles que visitam os Estados Unidos, afirmam que
Frederick Robertson, pregador textual e expositivo, torna-se co- ouvem neste país um bom número de sermões destituídos de re-
nhecido por causa do domínio das palavras, ainda que geralmente ligião.
os pregadores tópicos são favoritos dos que apreciam estilo perfeito. Se assim acontece, o pregador e o seu material são culpados
Consideremos, por exemplo, os discursos publicados de Jeremias e não o método em si. Se discutir paz mundial, preconceitos ra-
Taylor e de John Fillotson. ou as obras em prosa de John Bunyan, ciais ou outro assunto palpitante do momento, pode apresentá-lo
três autores estudados na classe de literatura inglesa nas Univer- do ponto de vista de Deus e da Bíblia, ou então da sua própria
sidades. Como lição objetiva do método-tópico de Bunyan, estu- opinião e preconceitos. Nos lábios de um homem com talento, este
demos The Jerusalém Sinner Saved. Vejamos como o nome do género de trabalho de púlpito talvez pareça tão interessante como
tratado inclui tudo quando se segue e como o tópico conduz a uma o outro, mas a respeito dos frutos? Visto que os ouvintes vêm de
espécie de prosa que o mundo não deixará perecer. um meio ambiente em que têm de ouvir o ruído das máquinas re-
gistradoras ou tomar parte na luta do mercado, por que não hão
de ouvir na igreja algo de diferente do palavreado que ouvem per-
1 Ver Works, ed. de John Emory, 1856, I. pp. 126-135.
116 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
EM FAVOR DE SERMÕES TÓPICOS 117

manentemente nos seus afazeres? Só podemos, pois, dar má clas-


sua Verdade, se torne num repórter do fato transitório. Se mostrar
sificação à apresentação tópica de assuntos inteiramente seculares.
jeito e recursos, esse repórter do púlpito talvez interesse os ouvintes,
2. Nas mãos de outros, é possível que o sermão tópico não semana após semana. Em certos casos, este género de "pregação"
possua interesse humano, por surgir de análises rápidas e consistir requer habilidade em vez de trabalho e o engodo do fato contem-
de puras abstrações. Talvez o pregador apresente a soberania de porâneo fará com que o indivíduo deixe de pensar no Eterno.
Deus. Em vez de fazer com que todos entendam essa verdade, ten-
Que concluir? Reconheçamos os erros que surgem nos ser-
tando relacioná-la com as necessidades humanas, é possível que
mões tópicos indignos de tal nome e busquemos o remédio na Bí-
se espraie sobre a onisciência, onipotência e onipresença, ou então
blia e na Teologia. É possível, sem dúvida, que um método se
a respeito do sobrenatural, objetivo e totalmente-outro. Deve es-
transforme em substituto para a verdadeira mensagem. Por outro
tudar, no seu gabinete, sobre o numinoso de Rudolf Otto e as sub-
lado, sempre que sintamos desejo ardente de apresentar uma vi-
jetivações de Sõren Kirkergaard, mas no púlpito atualmente nem
são vinda de Deus, devemos sentir-nos livres para usar toda e qual-
o maior doutor deveria tratar de assunto muito acima da capaci-
quer forma de sermão que achemos necessário.
dade intelectual normal. Não seria mais prudente começar pelo
Salmo 139, em que a verdade acerca de Deus está relacionada com
8
Há muitos pastores que recorrem ao método tópico demasiada
um determinado homem parecido com aquele que se assenta nos e exclusivamente. Se às vezes incluírem sermões e mnsagens
bancos da igreja? Este tipo de pregação está relacionado com as expositivas, seu trabalho de púlpito pode apresentar-se mais inte-
necessidades humanas aqui na terra e nos nossos dias. ressante e proveitoso. Ninguém poderá ditar leis quanto à pro-
porção, mas eis uma sugestão prática. Para não cairmos em
3. A espécie errada de sermão tópico não alimenta o povo. ratoeiras da pregação tópica, façamos qualquer outro género de
Mas por que se há de condenar uma escola de artes domésticas, trabalho de púlpito uma vez por semana. Usemos então o método
só porque os seus métodos falham nas mãos de indivíduos incapa- tópico sempre que os fatos o requeiram.
zes? Sem dúvida que o valor alimentar de um sermão depende
menos de arranjo dos ingredientes do que da presença de proteínas Se o jovem ministro tiver que preparar uma única mensagem
e vitaminas. A pregação tópica não possui o monopólio destes por semana, a igreja será prejudicada por causa da falta de ali-
erros. Não obstante o método usado, o pregador mecânico necessa- mento variado vindo do púlpito, mas se o pastor seguir o conselho
riamente tem de preparar sermões mecânicos. Mas para que dis- de James Black, as ovelhas nunca deixarão de ser alimentadas:
cutir mais este ponto? Já consideramos exemplos de sermões tó-
" N o inicio do vosso ministério, não escolhais "assuntos", a não ser para
picos que alimentavam almas humanas com a abundância do ocasiões especiais. Tomai a passagem, o texto ou o incidente que esco-
maná dos céus. lhestes, e deduzi a conclusão e a mensagem das vossas premissas. Afinal
de contas é o caminho mais produtivo... Não tenteis apresentar vossos
4. Os críticos insistem em que este método requer pouco próprios pontos de vista mal digeridos sobre um grande tópico, sem ligação
esforço de estudo, pois o pregador pode obter o seu material nos com a pedra de toque da verdade bíblica. Se estiverdes tratando de um

jornais diários ou no último romance publicado. Talvez negligen- assunto, descobri as passagens adequadas onde fôr apresentado e construí
a vossa mensagem a partir delas".»
cie a Bíblia e outras obras que façam meditar e orar. Portanto, é
possível que aquele que foi chamado por Deus para interpretar a

8 Ver James Denney, The Way Everlasling, Londres. Hodder & Stoughton
1931. pp 1-12.
* The Mystery of Preaching, p. 153.
A ARTE DA INTRODUÇÃO 119

1. Abordando o assunto de forma interessante, mas sem exa-


gero? É possível que no decorrer do sermão faça outra coisa dife-
CAPÍTULO X
rente, mas de início precisa conseguir o direito de entrada na "ci-
dadela da alma humana". Algumas vezes por esta, outras por
aquela porta, o que importa é entrar, e deve fazê-lo tão cedo quan-
to possível, porque depois talvez não consiga entrar. Deve per-
guntar-se, pois, a si mesmo ao preparar a mensagem: "Como
chegar ao castelo da alma do meu ouvinte e entrar em contacto
A ARTE DA INTRODUÇÃO com êle?" Compreenderá que tem de ser despertando interesse.
Esta expressão "interesse" indica o que o orador e o ouvinte pos-
HOJE EM DIA HÁ muitos pregadores que dominam a suem em comum. Se o indivíduo que está no púlpito sabe como
arte do exórdio. Outrora muitos príncipes do púl- começar a pregar, o seu amigo no banco da igreja ouvirá, pelo
pito começavam lentamente e iam aumentando o menos por curiosidade.
poder à medida que se aproximavam do final, porque tinham a cer- Sê interessante, sem ser sensacional. Introdução cheia de
teza de que os ouvintes ouviriam pacientemente, durante todo o entusiasmo, talvez faça surgir esperança, que o resto do sermão
tempo em que eles falassem. Agora o ministro precisa atrair a não possa satisfazer. Por que então preparar o caminho para um
atenção desde o começo e mantê-la até o final. Deve considerar os antíclímax? O ministro, que conhece a alma do seu povo, aprende
primeiros dois parágrafos como decisivos e construir com o máximo a tornar interessante o começo da pregação, mas o fará com in-
cuidado a primeira e a segunda frase. Realmente não se pode exa- teligência. De acordo com Agostinho de Hipona, o exórdio de um
gerar a importância do bom início. sermão requer moderação, não só em espírito, mas também em
Por que abordar o sermão deste modo? De acordo com Cí- ritmo.
cero, mestre na arte de falar, redãere auditores attentos, benevoles, Por outro lado, diz-nos êle, não sejamos suaves demais. Se
dociles. "Chamar a atenção, assegurar a boa vontade e preparar há um ou outro pregador que precisa tomar cautela para não exage-
para dirigir". O pregador deve tentar fazer tudo isto logo nos rar o brilho do exórdio, a maioria peca pelo oposto. Se estivermos
primeiros minutos, talvez em apenas um ou dois. Se o conseguir, em dúvida até que ponto chegar em qualquer das direções, é me-
fixará a atenção de cada ouvinte na verdade ou no dever que está lhor errar do lado do interesse. Lembremo-nos do que William
apresentando. Ao mesmo tempo o orador torna claro o caminho Magee disse sobre os três tipos de pregadores: os que não podes
por onde deseja conduzir os ouvintes. Que responsabilidade, es- ouvir, os que podes ouvir e os que deves ouvir. Resolve, pela graça
pecialmente com o tempo disponível! Muitos pregadores quase de Deus, reunir-te ao mais pequeno destes grupos, o terceiro, "um
sempre começam com interesse e mantêm os seus ouvintes inte- grupo notável de poucos escolhidos, sobre quem desceu o Espírito".
ressados até o fim, fazendo satisfatoriamente o que pretendem.
2. A introdução é curta sem ser abrupta? Os sermões de
hoje não são tão longos como outrora e há tendência para formar
a introdução cada vez mais curta, precisamente pela mesma razão
CARACTERÍSTICAS DA BOA INTRODUÇÃO
por que a entrada da moradia não pode ter a mesma amplitude
que a do palácio. Se o ministro se adaptar ao que se usa agora e
Como é que o pastor, em seu escritório, pode medir o valor do mantiver a sua maneira de começar dentro de certos limites, é
exórdio do sermão que prepara? Que pode esperar de seu trabalho?
120 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A ARTE DA INTRODUÇÃO 121

possível que o ouvinte nem sequer pense no assunto. Mas se a in- 4. A introdução é cordial sem ser efusiva? O orador amável
trodução da mensagem fôr longa, logo começarão a murmurar: sabe como alcançar a confiança do povo. Não pede desculpas pelo
"For que é que o pregador não faz outra coisa?" que tem a dizer, nem toma o aspecto de Sr. Oráculo. Muito menos
lança mão de debates, o que poria o ouvinte na defensiva, sem
Porém, um começo abrupto talvez faça mais mal do que bem. oportunidade de replicar. O ministro pode ter a certeza de que o
Especialmete quando se dirige a estranhos, o homem sábio despende ouvinte veio à Igreja por desejar tornar-se um homem melhor e
algum tempo para conhecer as pessoas, pois é possível que tenha que recebe bem a introdução cordial:
de quebrar algum gelo. Por que se há de lançar a fundo na men-
sagem antes de seus ouvintes estarem preparados para ouvi-la? Considera o sermão essencialmente como conversa com os teus ouvintes
Henry Ward Beecher e William Jennings Bryan eram inimitáveis e fala com eles, em vez de lhes berrar ou choramingar. Acima de tudo
na arte de preparar o auditório. Qualquer deles acharia que o pre- deves ter boas maneiras de apresentação e de tom. Há uma forma de
pregar "curttte contra mundum", que dá a impressão de um jovem de pé
gador dos nossos dias começa abruptamente demais. Por que se
sozinho em defesa da verdade eterna, e desafiando, com risco da própria
há de começar a apresentação da mensagem antes de ter alcan- vida, todos os membros da congregação, na sua própria presença, mesmo
çado a boa vontade do ouvinte? Na igreja local o pastor talvez ao apresentar sentimentos sem réplica possível, t, mais sábio e eficiente...
não precise preocupar-se com isso, porque os ouvintes o amam ganhar a confiança da tua congregação e falar-lhe como a pessoas de quem
como líder e amigo. és amigo", i

3. A introdução é apropriada sem ser vulgar? Apropriada 5. A introdução é clara sem antecipar os fatos? Se alguém
para quê? À ocasião, ao orador e à mensagem. Quando o pastor deseja que seus amigos o acompanhem no caminho da verdade ou
apresenta meditação antes de ministrar a Ceia do Senhor, não do dever, deve deixá-los ter um vislumbre do propósito em mira.
pode começar da mesma maneira como quando prega acerca do Pode fazer isto lendo o texto e afirmando o tópico. Feito isto, pode
ensino do Senhor sobre o casamento. Ao preparar-se para qual- dizer o que conduzirá o ouvinte com mais segurança e rapidez à
quer destes sermões tem de colocar-se no espírito do momento e parte principal do sermão. Segundo Charles F. Jefferson, o magis-
tentar adivinhar o espírito dos ouvintes. Deve adquirir, portanto, tral pregador de Nova York, "a menos que o pregador seja capaz
o costume de planejar a introdução só depois de ter o corpo do de apresentar o objetivo do sermão com grande clareza, melhor
sermão claramente em .vista. De outra maneira, como poderia seria que fosse procurar fazer outra obra, para a qual o Senhor o
apreciar o valor intrínseco dos primeiros parágrafos? tenha dotado". Ou talvez tenha que aprender a preparar a intro-
2

dução dos seus sermões.


A menos que o ministro cuide desse problema de suas intro-
Sê claro, mas não demasiadamente claro! Se não fôr cuidadoso
duções "apropriadas", elas poderão parecer vulgares e êle passará
e capaz o pregador poderá dizer demais logo no começo. Só um
a ser conhecido como o "Dr. obviamente". Um pregador desse
artista poderá manter a atenção dos ouvintes depois de ter dito
tipo precisa cultivar aquilo que Spurgeon denominou "poder de
no exórdio tudo que pretende fazer no sermão. Spurgeon e Macla-
surpresa", isto é, dizer a coisa apropriada de forma inesperada.
ren, noutros tempos, começariam por um ou dois parágrafos que
Beecher costumava insistir na necessidade de que, ao levantar-se
conduzissem a uma declaração sobre o plano da mensagem que
para apresentar o seu texto, ninguém pudesse adivinhar o que se
seguiria e que, quando o sermão terminasse, todos soubessem o
que tinham ouvido. Esta maneira de planejar requer tempo e ha- 1 John Kelman, The War and Preaching, Nova Haven, Yale University Press,
3919, p. 122.
bilidade, além de imaginação. 2 The Building of The Church, Nova York, The Macmillan Co.. 1910, p. 87.
122 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A ARTE DA INTRODUÇÃO '123

se seguiria. É possível que num sermão educativo este género de randas iguais. Se um livro tiver vinte e cinco sermões, o leitor
introdução pareça necessário, mas em geral é melhor criar um pode encontrar doze espécies diferentes de introdução. É possível
clima de "suspense". De uma maneira ou doutra, o objetivo será que o pastor de uma igreja local, depois de ler alguns livros com
apresentado mostrando a estrada a seguir. O desejo de ser claro
sermões contemporâneos, diga com um suspiro: "Os outros pre-
não deve interferir como elemento de interesse e se ambos tiverem
gadores descobriram doze pórticos diferentes, ao passo que eu não
que existir, que seja o interesse o mais importante.
usei mais do que um!"
Por exemplo, um ministro visitante foi pregar na capela de
uma universidade. Não era conhecido e tinha a voz fraca. Tendo
sido avisado da maneira como os estudantes tratavam os visitantes LISTA DE PÓRTICOS PARA SERMÕES
que não eram bem-vindos, sabia que tinha de atrair a atenção logo
de início. Vejamos como resolveu o problema. Quando se levantou Consideremos doze pórticos, alguns dos quais talvez pareçam
para pregar manteve-se em silêncio até ter atraído a atenção de muito semelhantes. Começaremos com alguns dos mais antigos,
toda a assistência. Disse então, pausadamente, as palavras do para os quais usaremos nomes conhecidos.
texto: "Pois que é teu servo, este cão, para fazer tão grandes coi-
sas? (2 Re 8.13). Fêz novamente uma pausa, enquanto todos 1. A introdução textual. Esta velha maneira de começar um
ainda estavam surpresos com tão novo e estranho texto. Final- sermão está sendo usada de novo, porque em toda parte os mi-
mente o ministro disse compassadamente: "Fosse ou não um cão, nistros têm verificado que as pessoas gostam de ouvir sermões bí-
êle o fêz!" Tinha atraído a atenção de todos com menos de vinte blicos. Um inquérito feito na Igreja Metodista, nos Estados Unidos,
palavras, pois todos queriam agora saber como é que um homem demonstrou a preferência por este género de prédica, quando o
de outras eras agia como um vira-lata e o que é que os seus maus pastor sabe mostrar sua influência sobre a vida atual. Por que 3

atos tinham que ver com os presentes. Muitos pregadores, em de vez em quando não começar um sermão pelo texto e deixar os
seu lugar, teriam começado dissertando sobre cães! primeiros dois parágrafos chamar a atenção sobre êle?
É possível que alguém proteste: "O ministro deve começar
6. Finalmente, as introduções variam cada semana, ou pare- onde os ouvintes se encontram!" Muito bem, mas onde estão,
cem modelos de Ford-A? Variedade e interesse estão intimamente mentalmente, quando nos levantamos para pregar? Durante vinte
ligados. Se um ministro falar às mesmas pessoas, domingo após e cinco minutos seguiram o dirigente até ao alto de uma monta-
domingo, como poderá evitar de sempre começar mais ou nha, onde se encontraram na presença do Rei e contemplaram a
menos da mesma maneira? Examinando os seus sermões sua Glória. Pouco antes do sermão abriram os seus corações num
anteriores, buscando novos caminhos e estudando introduções de cântico de súplica, como "Senhor e Pai da humanidade inteira,
outros pregadores. Tome um volume do seu pregador contempo- perdoa nosso caminhar!" ou então "Espírito de Deus, vem sobre
râneo favorito, talvez Paul E. Sherer ou Ralph W. Sockman, Wal- mim!" Quando se sentam de novo, gostariam de ouvir uma pala-
ter A. Maier ou Clarence E. Macartney! Como é que cada um dê- vra do Rei.
les""atrai a atenção, concentrando-se na verdade que está apon- O pregador pode, pois, anunciar o texto sem qualquer preâm-
tando? bulo: "Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados,
e eu vos aliviarei" (Mt 11.28). Depois disto as primeiras palavras
Todos começam de maneira muito pessoal e de modo di-
ferente todas as semanas. Nenhum deles, como criador de ser-
3 Ver M. H. Leiffer, The Layman Looks at the Minister, Nova York e Nashvjlle,
mões, se especializou em casas pré-fabricadas, com todas as va-
Abingdon-Cokesbury Press, 1947.
A ARTE DA INTRODUÇÃO '125
12A A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

as palavras do texto. Este tipo de introdução presta-se ao sermão


poderão relacionar-se com a passagem: por que não falar primeiro
no qual o ministro tenha que dirigir-se a muitos estranhos, em-
sobre o descanso e depois sobre o jugo, que tem o sentido de sobre-
bora tenha que saber como salientar os fatos num drama. A nar-
carga? Como poderá o ministro começar com interesse mais hu-
ração de uma cena emocionante, sem dramatismo, falsearia os
mano do que mostrando que "o Maior sobrecarregado da nossa
fatos. O pregador citadino deve, por muitas razões, dominar a
raça" dá "alívio às vossas almas" mas não aos vossos corpos? No
arte de fazer o ouvinte ver a verdade logo no início do sermão.
púlpito, como num debate universitário, por que não seguir o
princípio do homem que treinava grupos campeões: "Coloque-se a 4. A introdução tópica. Este tipo de introdução tem várias
discussão, logo de início, em alto nível, mantendo-a aí depois!" formas, muitas delas populares. A maioria dos pregadores con-
Mas antes de fazer planos para começar assim, é melhor ter a cer- cordariam com James Stewart, que afirma que a introdução do
teza de que os ouvintes também estarão nesse nível! sermão deve dizer respeito aos interesses dos ouvintes aqui
2. Introdução contextual. Eis outra maneira antiga de co- e agora. 5

meçar um sermão, que tem voltado a ser novamente muito usada. Admitiria exceções, mas aconselha o jovem ministro a usar a
Se o intérprete quiser tornar claro e luminoso um texto, poderá apresentação atual, ao falar de uma verdade bíblica. Para come-
começar com os seus antecedentes. Ao pregar, por exemplo, so- çar desta maneira é necessário dar-se ênfase ao tópico. Por exem-
bre "Cristo numa Festa de Casamento" (Jo 2.1-11), depois de ci- plo, quando Harry Emerson Fosdick pregou um sermão de Natal
tar o texto, poderá falar um pouco sobre o casamento em Caná da sobre: "As Criancinhas Decisivas do Mundo", começou referindo-se
Galileia centralizando tudo no Senhor Jesus. O sermão poderá a um livro muito conhecido, Fifteen Decisive Battles of the World,
fazer com que todos o vejam agora como amigo do lar, crente de Sir Edward S. Creasy. Mas logo o sermão caminhou em direção
no casamento e doador da alegria. Este tipo de introdução está de à verdade central: quanto um bebé pode ser mais decisivo do que
acordo com o colorido do texto e do sermão. uma batalha! 6

Um exemplo diferente encontra-se em Robertson, num ser- Tal introdução, que pediria estudo mais pormenorizado do que
mão sobre "Obediência, o órgão do Conhecimento Espiritual". Lo- o que podemos fazer aqui, mostra como prender a atenção de pes-
go após o texto (Jo 7.17), o discurso começa com a sentença: "A soas que pensam muito a respeito de batalhas, levando-as a pensar
primeira coisa que temos a fazer, é conhecer a história destas pa- mais sobre bebés, especialmente o Bebé de Belém. De acordo com o
lavras"4
Homens como Robertson e Brooks podiam começar a método indutivo, o processo da prédica conduz, neste exemplo, ao
pregar desta maneira domingo após domingo, buscando variedade ponto pelo qual um pregador antigo começaria. Sob o ponto de
e adaptando o tratamento ao espírito do texto. Porém nenhum vista homilético este tipo de introdução aponta para uma das for-
deles usou sempre a introdução contextual. mas de apelo tópico. Fosdick, como sempre, aqui demonstra seu
domínio na arte da introdução.
3. A descrição dramática. Certa vez, num culto vespertino,
John Bonnell começou o sermão citando o texto: "Por que sois 5. A introdução pelo problema. Esta maneira de começar
assim tímidos? Como é que não tendes fé?" (Mc 4.40). O seu tó- ficou ligada ao nome de Fosdick. No Harper's Magazine, de julho
pico relacionava-se com a fé que hoje em dia triunfa sobre o medo. de 1948, publicou um artigo intitulado: "Que se Passa com a Pre-
Conduziu à mensagem descrevendo uma tempestade a que assistira
no mar da Galileia, junto do lugar onde Nosso Senhor pronunciara 5 Ver James S. Stewart, Heralds of God, pp. 124-130.
o Ver H. E. Fosdick, Living Under Tcnsion, Nova York, Harper & 5
1.941, pp. 222-232.
* Ver Sermons Preached at Brighton, pp. 300-307.
126 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A ARTE DA INTRODUÇÃO

gação?" Afirma êle que grande parte do trabalho atual para o Depois mostra claramente como todos os principais movimen-
púlpito não possui interesse humano, parece não ser de grande tos dos nossos dias trazem à luz a necessidade de disciplina, que
importância porque se trata de algo longínquo, no espaço e no deve vir do íntimo e não do exterior. Esta maneira de começar
tempo. Declara Fosdick: "Todo e qualquer sermão deve ter como um sermão oferece grandes possibilidades, embora não exclua as
objetivo primordial a solução de algum problema humano, de outras introduções. Considere a economia de tempo, quando as
um problema vital e importante, de consciências confusas, vidas primeiras palavras apresentam o tema do sermão!
perturbadas". É claro que este género de pregação requer uma
7. Uma citação notável. O ministro às vezes pode variar o
aproximação do problema como uma espécie de introdução tópica.
seu intróito com uma citação de palavras de alguém, que os seus
Para exemplos de tal aproximação, leiamos qualquer livro de Fos-
ouvintes admirem. Suponhamos que numa igreja metodista o mi-
dick.
nistro deseja falar sobre o perdão aos inimigos. Após ter citado
Esta maneira de começar o sermão oferece toda espécie de um texto de Nosso Senhor, poderá fazer uma breve pausa e dizer:
vantagens, especialmente no que diz respeito ao interesse humano. "Nunca esqueço um amigo, nem perdoo a um inimigo", foi o que
disse um oficial da marinha a John Wesley. Então este lhe repli-
Um pastor pode cair no erro de usar este método tão frequente-
cou: "Espero que nunca tenha pecado contra Deus!" Abriu-se
mente, que os ouvintes acabam tomando consciência só de pro-
a porta. Agora o pastor pode conduzir o ouvinte até à Verdade que
blemas. Mas muitos outros pregadores poriam maior ardor nos
se encontra no texto. As palavras de Wesley lançaram luz sobre
seus sermões, se ousassem enfrentar os problemas que preocupam
o que disse o Senhor.
os seus ouvintes, especialmente se dedicassem todo um sermão a
algum problema premente e concreto. Ninguém pode evitar Numa igreja de antecedentes escoceses, talvez o ministro de-
que as pessoas fiquem conscientes dos seus problemas, se seje pregar sobre determinado aspecto da Cruz. Depois de ter
der ênfase ao uso da Bíblia, na qual se encontram mais elemen- citado um texto de Paulo (2 Co 5.15), o pregador citará James
tos sobre a solução do que sobre as dificuldades. Por exemplo, no Denney, de Glasgow: "Cristo morreu pela diferença que existe en-
capítulo seis de Juízes, pode-se encontrar "Cura divina para um tre o certo e o errado". Também neste caso a sentença fornece o
complexo de inferioridade". Semelhante tópico no sermão requer tema do sermão. É possível, em teoria, usar este tipo de introdução
o estudo do problema. com frequência. Na prática qualquer ministro pode começar um
sermão desta maneira uma ou duas vezes por mês. Deve, no en-
6. Declaração âiteta do objetivo. Também aqui, quem sobe tanto, escolher citações que mereçam sobreviver e não começar
ao púlpito tem que se basear na sinceridade e não no engano. Não com vulgaridades sobre os "tempos que provam a alma humana"
se encontra num "castelo de covardes", pois representa o Rei que e "o desafio da crise moderna". É possível que tais frases, ao apa-
dá coragem. A declaração direta do objetivo oferece outra variante receram pela primeira vez, parecessem interessantes, mas perderam
ao problema da introdução e por isso Fosdick, uma vez mais, é o brilho pelo uso constante.
exemplo. Na mensagem sobre "Regresso à Disciplina" começa com
as seguintes palavras: "O nosso mundo hoje nos enfrenta pelo 8. A ilustração. Esta forma de começar é do gosto de mui-
menos com uma necessidade elementar; a necessidade da disci- tos jovens pastores. É boa quando fala a pessoas que não conhece,
plina". ' especialmente se elas não têm grande interesse pela mensagem.
Numa igreja citadina, no culto vespertino, quando metade dos pre-
sentes talvez nunca tenham estado antes na igreja, uma ilustra-
1 íbid., pp. 203-212,
ção ajuda o pregador experimentado a captar imediatamente a
128 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A ARTE DA INTRODUÇÃO '129

atenção Mas nem todos os ministros jovens têm esta oportuni-


8
ocasião, atrairá imediatamente a atenção. Se o calendário anual
dade. Sempre que alguém prega na própria igreja, com auditório incluir uns oito ou dez sermões especiais, é possível fazer as intro-
conhecido, poderá começar com algo de grande importância, como duções destes sermões diferentes de todas as outras, realçando
o texto e o tópico. A ilustração, por melhor que seja, serve um a característica principal da ocasião. Deve-se, porém, tomar todo
objetivo secundário pois lança luz sobre algo que é mais impor- o cuidado para não entrar na política, qual profeta falso.
tante que ela própria. Por que não colocar em primeiro lugar as
coisas mais importantes? De qualquer maneira, muitos jovens 11. A introdução psicológica. Este género de introdução as-
ministros conseguiriam variedade se não começassem muitos ser- sume várias formas, muitas delas valiosas. Por exemplo, quando
mões com ilustração. Natã estava perante o Rei Davi, para admoestá-lo por causa do
adultério e assassinato que cometera, começou com a parábola
9. As manchetes ou caricaturas dos jornais. Eis outra vez alusiva a um pobre pastor que tinha um cordeiro. De que outra
algo de novo e secundário, que talvez ajude o pregador citadino a maneira poderia o profeta atingir o coração do Rei Pastor? Quan-
chamar a atenção de pessoas com mente acostumada ao cinema. do o apóstolo Paulo falou em Atenas, começou com uma referência
O pastor de uma igreja de Nova York num domingo à noite antes à inscrição existente numa estátua que havia ali perto: "Ao Deus
do dia de Ano Novo, começou o seu sermão com uma referência à Desconhecido". De que outra maneira poderia chamar a atenção
caricatura que os seus ouvintes tinham visto, dias antes, no Herald daqueles curiosos sofisticados? Da mesma maneira hoje, quando
Tribune; esse ministro, porém, não aconselharia os seus colegas o ministro enfrenta situação invulgar, poderá recorrer à introdução
mais jovens a usar frequentemente introdução como esta. Alusão a
psicológica, isto é, se souber como fazê-lo, porque só um pregador
assuntos correntes, afirma Phillips Brooks, muitas vezes "traz con-
experimentado deveria começar desta maneira, como se diz em
sigo desapontamentos tão grandes como a construção de uma
termos futebolísticos, o jovem deve aprender a dominar e inter-
varanda com madeira ainda verde, que ganhou raízes e começou a
ceptar a bola antes de tentar ataques perigosos.
crescer. Em geral é bom começar com algo de suprema impor-
tância, ainda que se busque outra forma de atrair a atenção,
12. Fato da vida. Este género de introdução também pare-
quando necessário.
ce difícil demais para um ministro moço, nos primeiros anos do
10. Introdução para ocasiões especiais. Em ocasiões espe- seu pastorado. O sermão tirado da própria vida, numa das suas
ciais, o ministro tenciona começar o sermão com algo relacionado múltiplas formas, começa com um comentário que o ministro ou-
com elas. Caso a sua importância mereça mensagem especial, por viu na rua ou no bonde. O pastor pode ainda citar parte de uma
que não concentrar a atenção imediatamente na razão de ser da carta ou de uma entrevista, se tiver recebido autorização para
mensagem? Pensemos, por exemplo, num sermão de aniversário, isso. O intróito mediante a citação dum acontecimento da vida
na mensagem dedicada aos que regressam da guerra, na dedicação diária sugere um problema que, sem dúvida, interessa os ouvintes.
de uma igreja ou na celebração da Páscoa. Mensagens como es- Porém, numa igreja situada numa aldeia ou vila pequena, é pos-
tas em geral são difíceis de preparar, ainda que a introdução não sível que esta forma tão interessante de começar não promova a
cause grandes preocupações, a não ser nas palavras empregadas. harmonia de Sião. Se o jovem pastor de tal comunidade quiser
Se o orador começar com algo interessante e importante sobre a provocar uma crise, ganhe a fama de pregador que conta casos
ocorridos nas redondezas. Por muito que este método se adapte
à cidade grande, noutro lugar requer cuidado e tato, como os de
s
Ver W. K. Anderson, Making the Gospel Eíjective, Nashville, Commission
on Ministerial Training of the Methodist Church, 1945, cap. XVII. um médico que sabe tratar cada caso discretamente.
A ARTE DA INTRODUÇÃO
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

Este é um método que, nas mãos de um perito, presta-se a precede o texto e o outro vem depois. Só um indivíduo com gran-
muitas oportunidades, quase todas boas. Se não fosse assim, não des dons naturais pode conseguir unidade com duas introduções,
teria resistido até hoje. Talvez os rótulos tenham mudado, mas e mesmo este pode desperdiçar minutos preciosos. Podem-se pôr
a coisa em si é a mesma. Não usou nosso Senhor, nos dias da quantos começos quiser num sermão, mas não se precisa senão de
sua carne, constantemente situações tiradas da própria vida? T. um. Relê os manuscritos dos teus sermões e vê que esta adver-
R. Glover, num livro que todos os pastores deveriam conhecer tência não é absurda: repara quantas vezes, nos últimos seis me-
e estudar, mostra que as parábolas devem ter vindo em grande ses, complicaste tudo começando com duas introduções, portanto,
parte da experiência de Jesus na sua casa, em Nazaré, e da vida com uma a mais.
noutros lugares, ao se misturar com o povo. Desde então inú-
9

Consideramos catorze intróitos, doze dos quais bons e dois de


meros príncipes do púlpito têm usado este tipo de introdução do
pouco valor. Como é que um ministro irá resolver qual dos doze
sermão, embora não com este nome. Vejam-se, como exemplos, os
pórticos vai usar, para penetrar em determinada área? Com raras
ensaios sobre sermões da autoria de F. W. Boreham. Por que10

exceções, não terá certeza até haver examinado o campo no seu


não aprender a começar um sermão desta maneira, mesmo que
seja para variar? conjunto. É possível que, durante a preparação de um sermão,
pense em como irá começar, mas não deve fazer a sua decisão
13. .4 declaração geral. O melhor é manter este pórtico final antes de haver completado inteiramente o plano. Ao escre-
fechado a chave. Qualquer que seja o assunto a considerar, certo ver, e na própria prédica, deve-se começar com a sentença de
pastor começa sempre com três ou quatro parágrafos sobre gene- abertura, e prosseguir até o fim sem interrupção.
ralidades. Por exemplo, fala do caos mundial e da energia ató-
Considerando todas estas opções, o jovem pastor deveria apre-
mica. Talvez nada lhe custe começar assim, mas em nada o
ajuda. Se alguém quiser começar um discurso com uma série ciar uma sugestão prática: pensa em construir o pórtico com ma-
de verdades convencionais, que as escreva, palavra por palavra e teriais diferentes dos do resto da casa. Se o sermão em si fôr
no fim jogue tudo no cesto de papéis. Poderá depois preparar um expositivo, começa com outra coisa, mas se procede de outra fonte,
intróito específico e adequado com as suas próprias palavras, que começa com o texto. Lembra-te sempre de que a prática comum
apresente o motivo de tudo quanto se segue. Esta crítica não favorece o começo com algo presente e não longínquo e remoto.
visa o indivíduo com grande talento de filósofo cristão, nem um Se começares com algo acerca do texto, torna-o atual, fala dele
estadista do Reino de Deus. Nenhum homem, porém, por muito
11
aqui e agora. Não te sintas, porém, obrigado a seguir qualquer
talento que tenha, pode pregar em "grande estilo" duas ou três destas regras, exceto uma. Esta é verdadeira sempre e em toda
vezes por semana, a menos que vá de lugar em lugar, repetindo parte: começa cada um dos teus sermões com algo de interesse
os sermões. humano. Se o fizeres todos os domingos, conseguirás variedade
14. Introdução dupla. Conservemos um destes dois pórticos cada semana.
fechados a chave, aquele de que não necessitarmos. Para que ter
duas introduções para um mesmo sermão? Por vezes um deles O USO DA PROPOSIÇÃO

» Ver The Jesus o/ History, Nova York, Geo. H. Doran Co.. 1917, pp. 26. Agora que tanto pastores começaram a dedicar-se ao minis-
129-132.
W A. W. Blackwood, The Protcstant Pulpit, sermSo n.° 19.
tério didático, devemos meditar sobre o uso da proposição. Anti-
u H. H. Farmer, God and Men. Nova York e Nashville, Abingdon-Cokesbury gamente, este assunto recebia grande atenção no ensino da homi-
Press, 1948.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A ARTE DA INTRODUÇÃO

lética,'- mas recentemente a proposição quase desapareceu, não Pregando sobre "A Fome da Alma" (Lc 15.17), Bushnell con-
só dos livros de texto, como dos próprios sermões. No entanto, duziu ao seu tema: "Vida apartada de Deus é vida de fome terrível
muitos dos pregadores costumavam escrever uma proposição para e de morte espiritual". Tratando do assunto: "O Dever não é
quase cada sermão. Por exemplo, John Henry Jowett, costumava medido pela nossa própria capacidade" (Lc 9.13), realçou a pro-
atrair multidões, que duas vezes por domingo faziam transbordar posição: "Os homens são frequente e convenientemente colocados
a Igreja Presbiteriana da Primeira Avenida, na cidade de Nova debaixo da obrigação de fazer aquilo para que não têm, em si mes-
York. Falando a estudantes para o ministério, apresentou a razão mos, capacidade real." Nesses exemplos usou em parte a forma
14

por que era tão eficiente: "Nenhum sermão está pronto para negativa. Pregava geralmente com temas positivos. Sempre que
pregar, nem pronto para ser escrito, até que possamos exprimir o usava uma proposição, seguia-a como estrela polar. Por isso mes-
seu tema numa sentença curta e concisa, clara como cristal. Acho mo é que advogados, legisladores e tantos outros que amavam a
que chegar a essa sentença é o trabalho mais árduo, mais exigente Deus com suas mentes e corações, gostavam de ouvi-lo pregar.
e mais fecundo, do meu gabinete de trabalho." 13

Phillips Brooks não usava a proposição com tanta frequência,


A "proposição" é aquela oração afirmativa que contém a subs- nem com tanto cuidado, mas o ministro de Boston podia pregar
tância do discurso. Também pode denominar-se "tema". "O te- desta maneira sempre que o desejasse. Na mensagem intitulada
ma é o sermão em forma condensada, o sermão é o tema desen- "Subindo a Jerusalém" (Lc 18.31), este famoso pregador apre-
volvido". Na forma em que os termos são usados neste livro, tema sentou o seguinte ideal: "Toda a vida verdadeira tem a sua Je-
ou proposição diferem de tópico ou título. O tema apresenta a rusalém, à qual vai subindo". Com esta sentença iniciou o pri-
substância do sermão numa simples sentença, o tópico encerra meiro e o segundo parágrafos e terminou o sermão com a mesma
a mesma verdade numa só frase e o título refere-se ao nome de um ideia. Quase no fim pronunciou as seguintes palavras:
livro ou ao cabeçalho de uma série.
"Oh. não oreis por vidas fáceis. Orai para que possais ser homens
A proposição por vezes aparece como sentença de abertura. fortes. Não oreis por tarefas de acordo com o vosso poder. Orai por
Como já vimos, Fosdick frequentemente começa os sermões desta poder igual à vossa tarefa... Se Jerusalém fôr na verdade a vossa cidade
maneira. Em geral o tema surge no fim da introdução, precisa- santa, sem dúvida há nela uma cruz... É terrível sofrer, a menos que
mente antes do corpo principal do sermão. Como exemplos deste se sofra cumprindo o dever. Sofrer desta maneira é glorioso". 1 5

uso consideramos os três volumes de sermões de Horace Bushnell,


especialmente o intitulado The New Life. Dos vinte e dois discur- Estes exemplos de dois príncipes do púlpito lançam luz sobre
sos contidos nesse livro, onze encerram proposições formais. Nem o uso da proposição. Consiste, em sua forma ideal, numa senten-
mesmo Bushnell pregou sempre desta maneira, mas sempre que ça completa, simples, afirmativa, direta, não figurada e positiva.
queria fazer sobressair uma ideia num sermão didático, encerra- Mas na prática nem sempre se conforma com modelo tão rígido.
va-a numa proposição. Quando aprontava um livro de sermões, Qualquer que seja a configuração do tema, êle ocorre no sermão,
só punha itálicos em duas partes do discurso: no texto e na pro- como um eco, mesmo quando não aparece de forma direta. Por
posição. Queria, evidentemente, que estas duas partes sobressaís- meio desta repetição periódica, a nota dominante imprime-se na
sem de todo o resto do sermão didático. mente e no coração de quase todos os ouvintes. Este artifício é
duplamente útil à mensagem didática.
1 2
Ver Austin Phelps, The Theory of Preaching, revista por F. D. Whitesell,
Grand Rapids, Erdmans, 1947. A proposição ocupa quase toda a sétima parte Ú Ver estes dois exemplos em The New Life, Londres, 1892, pp. 32-43, 253-266
do livro, como na obra original (1881). e outros em The Protestant Pulpit, sermão n.° 8.
«» The Preacher, His Life and Work, Nova York, Geo. H. Doran, 1912, p. 133. is Ver Visions and Tasks, Nova York. E. P. Dutton & Co., 1910, pp. 316-33Z.
1S4 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

A proposição é um auxílio, tanto no preparo e na apresen-


tação do sermão, como na compreensão e a retenção da mensagem
CAPÍTULO XI
pelo ouvinte. Esta maneira de apresentar uma verdade ou um
dever auxilia os ouvintes a se defenderem contra aquilo a que
James Black chama "a estrada larga da pregação de um jovem".
De acordo com um grande mestre de outros tempos: "Os pro-
blemas essenciais do desenvolvimento do sermão resolvem-se den-
tro do âmbito de uma proposição". Este mestre concordaria 10 A PREOCUPAÇÃO PELA ESTRUTURA
com Horace Bushnell que afirma, num ensaio, que todos os mi-
nistros deveriam "ler, marcar, aprender e elaborar mentalmente".
A PREOCUPAÇÃO PELA estrutura tende a ter altos e
Por vezes tem-se capital bastante para pregar por atacado, mas a baixos. Sempre que a função didática do minis-
maneira especial de apresentar a varejo, tanto no comércio como na pre- tério é grande, a estrutura parece ser algo muito
gação, tem muito mais probabilidades de alcançar êxito. Por isto muitos importante, pois aquele que ensina precisa seguir um plano pró-
jovens vão se afundando em generalidades e assuntos grandes demais e
muitos outros, que pareciam sem grandes possibilidades, pondo-se a tra-
prio. Mas sempre que a inspiração, ou algo semelhante, coloca
balhar neste esperançoso caminho de economia, pregarão talvez ainda melhor o ensino em lugar secundário, a estrutura parece ser menos essen-
e com mais eficiência, do que se possuíssem grandes dons. Pelo menos cial, pois aquele que sabe como entusiasmar, não precisa de planos
não cairão na tolice de tentar fazer algo grande em geral, sem nada alcançar muito elaborados. Em alguns ramos da-Igreja atravessamos um
em particular, IT
período assim embora a tendência seja agora mais favorável a um
ministério didático popular. Isto requer maior preocupação quan-
Já dissemos o bastante para tornar bem clara a importância to à estrutura. O pregador sábio considera o sermão como algo
da introdução. Se algum ministro quiser ser pregador atraente pleno de vida e calor e não como o esqueleto de um morto.
e eficaz, aprenda a começar todos os seus sermões de acordo com A expressão "estrutura" aqui significa o esboço de um sermão,
o seu objetivo e totalidade. Encontrará exemplos de intróitos in- que vive e se move, de modo a atingir um determinado objetivo.
teressantes e úteis em quase todos os volumes de sermões ultima- É possível que nada disso seja evidente ao observador, pois a boa
mente publicados, principalmente os proferidos através do rádio. construção não chama muito a atenção sobre si mesma. Por que
Mas com o passar do tempo deverá fazer introduções no seu pró- havemos de olhar para os ossos de um cavalo, quando podemos
prio estilo. admirar o animal que reveste os ossos? Qualquer que seja a fi-
gura, toda a mensagem, que ensina uma verdade sobre Deus ou
LEITURAS SUGERIDAS
um dever para os homens, deveria ter como a base estrutura
S. Agostinho, De Doctrina Christiana, livro IV, ed. de Thérèse Sullivan. Pairistic sólida, coberta com beleza e encanto.
Studies, vol. X X I I I , Washington, Catholic University, 1930.
Smyth, J. Paterson, The Preacher and His Sermon, Nova York, Geo. H. Doran
Co., 1922, caps. III, IV.
IMPORTÂNCIA DA ESTRUTURA

W Ozora S. Davis, The Principies o/ Preaching, Chicago, University of Chicago A importância da estrutura surge por toda parte da Bíblia.
Press. 1924, p. 209.
írtr " V e r B u i , d i n
0 E r a s i n
Reiigion, cap. V I , pp. 197-198; também caps. V I I e Quase todos os sermões dos profetas e apóstolos mostram que
136 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREOCUPAÇÃO PELA ESTRUTURA 137

seguiam um plano, embora provavelmente nunca tivesse sido es- A importância da estrutura surge em quase todas as belas ar-
crito. No livro dos Atos, por exemplo, as mensagens têm a ten- tes, especialmente na arquitetura. Quase todos os mestres prefe-
dência de seguir um determinado padrão e fornecem a certo pro- riram um plano arquitetônico, na estrutura da pregação, fato este
fessor universitário modelos para mostrar aos jovens como se pre- que levou mais de um príncipe de oratória a escrever sobre sermões
para um discurso. 1
"construtivos". Quando Phillips Brooks ajudou a estabelecer os
Em toda a história da pregação nota-se a mesma preocupação. planos da Igreja da Trindade, tal como hoje se ergue em Boston,
Quase todos os sermões que têm sobrevivido, depois de haverem e quando Woodrow Wilson ajudou a planejar a casa que se pode
passado as condições que os produziram, revelam sólida estrutura. ver em Princeton, ambos usaram a imaginação do mesmo modo
Nem todos os príncipes do púlpito têm tratado da estrutura da que a usavam ao prepararem um discurso. Podemos chamar a esse
mesma forma. Há alguns que fazem com que ela surja de forma uso, à falta de melhor expressão, imaginação "construtiva" e no
nítida, enquanto com outros tal não acontece. Entre os primei- seu ponto mais sublime imaginação "criadora".
ros pensemos em F. W. Robertson e Alexander Maclaren. Sempre
O mesmo acontece em relação à pintura. Antes de o artista
que qualquer deles subia ao púlpito para ensinar, o ouvinte facil-
combinar as cores e as aplicar na tela, deve saber o que e como
mente via o plano do sermão.
deseja pintar. Quando Rafael pintou "A Transfiguração", seguiu
Parece que, pelo contrário, outros ministros igualmente efi- piano de sua própria criação, pois de outro modo não teria conse-
cientes e populares deram pouca importância à estrutura. Os guido unidade de duas cenas opostas, uma no alto da montanha
sermões de A. J. Gossip à primeira vista parecem não ter qualquer e a outra no sopé. Por que a ânsia de descer ao vale não diminuiu
plano. Consideremos, por exemplo, a mensagem: "Mas que fazer a glória do Senhor perto do céu? Porque o artista planejou que
quando a vida se desmoronar?" Por que ela se tornou mais fa- os olhos do rapazito, e a maioria das outras linhas na parte inferior
mosa do que muitos sermões do século XX? Em parte pela ocasião, do quadro, convergissem para o Cristo transfigurado. O quadro,
apresentação e estrutura, mas principalmente por causa da men- pois, leva aquele que o vê a ter a certeza de que o Senhor da
sagem de Deus a todas quantos sofrem. Como Gossip pregava péla glória descerá ao vale e tirará a dor daquele coração.
primeira vez, depois da morte da sua mulher, falava sobre a pro-
vação da alma humana em dias de aflição. 2
De igual modo, ao compor uma peça musical, o artista segue
plano próprio. Quer deseje compor a melodia de um hino ou uma
Depois de introdução comovente, o pregador faz somente duas
sinfonia, tem que ter um esboço que talvez exista apenas na sua
coisas no sermão propriamente dito: demonstra como se deve en-
mente ou no seu coração. De acordo com o diretor da Faculdade
frentar um período de provação e como o crente pode enfrentar
de Música da Universidade de Princeton, um compositor não
triunfantemente essa provação. Este pequeno esboço não faz jus-
tiça à mensagem que vive e se move, porque o homem no púlpito nos lança a sua obra desordenadamente. A abertura de Tannhãuser,
tem senso da necessidade humana e compreensão profunda da por exemplo, evidentemente é planejada com todo cuidado. Sua primeira
verdade divina. Estude-se o sermão sob vários pontos de vista, parto, o "Coro dos Peregrinos", é recorrente e cada vez que torna a ocorrer
encontramos nela algo de novo a nos interessar... O plano que Wagner
inclusive este, e procure-se simetria semelhante à da faia gigante.
tinha em mente era a parte importante do seu trabalho. Tornou sua Aber-
tura mais interessante, mais dramática, do que se tivesse sido diferente.
' Ver Chas. S. Baldwin, Th* English Bible as a Guide lo Writtnfl, Nova York. Wagner sabia o que queria fazer e como fazê-lo" 8
The Macmillan Co., 1917. Este autor não trata da mensagem espiritual dos sermões,
mas demonstra que a sua eficácia popular depende da estrutura.
2
Ver A. W. Blackwood. The Protestant Pulpit, sermão n.° 24, também o 3 Roy D. Welch, The Apprertation of Music, Nova York. Harper &
apêndice "Como estudar um sermão". 1334, p. 27.
138 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
A PREOCUPAÇÃO PELA ESTRUTURA

Ainda mais perto do espírito da pregação está a poesia. Aqui fama e fortuna — The Fool e The House Beautiful. Pollock co-
também, exceto em algumas formas de verso livre, tudo se con- meçou fazendo um estudo de duzentos dramas dos mestres. De-
forma a seu próprio padrão, desde o soneto até o poema épico. pois de haver analisado uma destas peças, dava-se o tempo de
Mesmo dentro dos limites de um soneto, Milton ou Woodsworth esquecer o enredo e então esboçava seu próprio com o mesmo mo-
podiam encontrar liberdade e prazer. Além disso um professor de tivo. Por causa destes estudos êle guardou em seu arquivo sete
Teologia na Inglaterra, John Oman, insistiu em que os ministros mil páginas de notas sobre dramas de outros.
jovens falhavam principalmente no seu conhecimento de literatura
inglesa, com sua beleza de palavras extraídas de "uma fonte de
4
Enquanto estudante de dramaturgia ficava acumulando ideias
inglês incorrupto". O professor sabia que o gosto por sonetos e para suas próprias peças. Durante um passeio ao ar livre ou
epopeias levaria ao senso de estrutura, porque um poema nunca é enquanto lia dentro de casa, anotava sementes de pensamento,
apenas espontâneo. •"• Nem um sermão digno do nome. que podiam algum dia brotar em dramas. Depois de alguns anos
tinha em seu "jardim" três mil mudas, a maioria das quais nunca
Em nenhum outro lugar da literatura agiganta-se tanto a desenvolveu em dramas, pois achou que devia selecionar as mudas
estrutura, quanto no drama, tanto clássico quanto moderno. Certa e nutrir as mais promissoras. Este homem aprendeu a escrever
vez, quando um dramaturgo incipiente pediu a Henrik Ibsen para peças, descobrindo como outros o haviam feito. O que êle diz a
ler o manuscrito de uma nova peça, o velho homem perguntou este respeito aplica-se também à pregação:
pelo roteiro. O jovem respondeu que não precisava nada seme-
lhante, porque seguia a inspiração aonde quer que ela o levasse. Tornar-se autor é como tornar-se mãe. Deve haver um período de
Irado, Ibsen apontou-lhe a porta e disse que uma pessoa que concepção, gestação, esforço e dores de parto, com eventual parto... A

dispensa o roteiro não conhece o significado do drama e não pode vitalidade de um trabalho pode depender do tempo em que fôr mantido
no consciente ou inconsciente. No caso de The Fool foi pouco menos de
escrever peça digna de ser encenada. Estes fatos sobre Ibsen vêm
dois anos.
do mais preeminente professor americano de dramaturgia, que
sempre enfatizou a importância da estrutura:
A importância da estrutura aparece também na ficção, como
Toda pessoa que não se força a elaborar todos os detalhes exigidos nas novelas de Eilen Glasgow sobre a vida na antiga Virgínia.
por um roteiro, está simplesmente se esquivando do inevitável. Ela evita Quarenta e seis anos depois de editar sua primeira novela, a srta.
algo que é penoso fazer como trabalho preliminar, antes que a peça toda
Giasgow escreveu uma autobiografia literária, que inclui este
esteja pronta... Inegavelmente um roteiro é o meio mais efetivo de
forçar-se a conhecer os caracteres e a história da peça, antes de começar conselho sobre técnica:
a escrevê-la em detalhe.«
Tal como a criança precisa aprender a andar e falar naturalmente,
também o escritor instintivo precisa adquirir os princípios básicos simples
Testemunho semelhante nos vem de um dramaturgo auto- de sua arte... O colecionamento de material, o arranjo das massas, podem
didata. Em sua autobiografia, Channing Pollock conta como
7
ter efeito maior que o próprio material. Como autora principiante, o que
aprendeu a escrever peças, inclusive as duas que lhe trouxeram me perturbou mais foi a falta de método adequado.

Técnica é sem v a l o r . . . enquanto vista como técnica apenas. Somente


4 Ver Concerning the Ministry, Nova York, Harper & Bros., 1937.
depois de havê-la aprendido, e esquecido sua aquisição, é que a fórmula
5 Para uma aparente exceção na história da poesia ver J. L. Lowes, The
Road to Xanadu, Boston, Houghton Miíflin, 1927. conduz à adaptação e torna-se auxílio incalculável ao novelista. Nao
a
Geo. P. Baker, Dramatic Technique, Boston, Houghton Mifflin, 1919, p. 463. obstante, é bom para todo aspirante a escritor o serviço num aprendizado
1 Ver Harvest of My Years, Indianápolis, Bobbs-Merrill, 1943, pp. 67, 163, 287. voluntário ou involuntário.
Q A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREOCUPAÇÃO PELA ESTRUTURA
1Jt
Ul

Aprenda a técnica de escrever e, tendo-a aprendido, procure esquecè-la. a atenção está fora de foco. Este exemplo também pode ilustrar
Estude os princípios de construção, o valor da continuidade,... o episódio outras fraquezas, como a falta de ordem, mas agora o esforço mos-
revelador, o manuseio cuidadoso de detalhes... O escrever real (é) o
tra a ignorância de começar a escrever sobre um assunto sem
mais difícil trabalho do mundo. 8
estabelecer antes o plano:
Milho é um vegetal muito útil. Não houvesse milho não haveria bolo

AS CARACTERÍSTICAS DA BOA ESTRUTURA de milho com manteiga e melado. Milho cresce em grandes campos, que
podem ser arados com cavalo. Havia um homem que tinha um campo e
não possuía cavalo, mas tinha uma grande e fiel mulher, que cuidava do
Pensa sobre outras belas artes por muitas razões, mas não campo acompanhada por um fiel cachorro, enquanto êle escrevia poesias
por último pelo que elas mostram sobre estrutura. Também num para os jornais. Devemos dar graças por ter uma boa mulher, que é multo
estudo formal de pregação distingue as qualidades de estrutura do melhor do que rondar os bares e gastar seu tempo com preguiça. Milho
estilo literário. Às vezes podes subestimar o assunto e considerar também é usado para alimentar porcos e pode ser transformado em ca-

separadas coisas que devem estar juntas, mas o mesmo é verdade chimbos de espigas de milho, que o deixarão doente se não estiver acostu-
mado. Resolvamos firmemente mudar e levar uma boa vida. io
no estudo de qualquer bela arte. Na história da pregação observa
que sermões fortes tendem a seguir certas leis de estrutura, as
mesmas quatro que governam os produtos da imaginação em seu Por isto, antes de tudo, ao fazer a estrutura busca a unidade.
maior alcance. Depois de teres o plano no papel diante de ti, olha o todo e prova
sua unidade. Lembra-te que pregar exige a omissão de muitas
1. A mais importante entre as quatro é a unidade e, portanto, coisas desnecessárias no momento, a fim de ressaltar a verdade
vem em primeiro lugar. Unidade num sermão significa que o focalizada:
ministro enuncia uma só mensagem de cada vez. De acordo com
Geralmente farás melhor tomando um pensamento importante, malhan-
Newmann, "nada é tão fatal para o efeito de um sermão quanto
do-o de todos os lados e determinando-te a colocar este único pensamento
o hábito de pregar, de uma só vez, sobre três ou quatro assuntos". na mente do povo... Faze cada sermão sobre um assunto, um pensamento,
Como exemplo de unidade examina qualquer sermão de primeira de modo que o possas escrever numa sentença — "Este é o pensamento que
ordem, tal como, de J. B. Mozley, "A Reversão do Julgamento Hu- eu desejo imprimir no povo; este é o meu objetivo claro; isto é exatamente
mano". Neste longo discurso nota como cada parte está relacio^ o que eu quero que sintam; ou, isto é exatamente o que eu quero que
façam"...
nada com o tópico,' que surge do texto: "muitos primeiros serão
últimos; e os últimos, primeiros" (Mt 19.30). Testa a unidade ven- Pergunta-te em cada sermão, "poderia o homem no auditório — ou
antes, nos nossos dias — poderia a mulher no auditório contar ao seu
do se o texto e o tópico incluem tudo que há no sermão e nada
marido, em duas sentenças, o pensamento central do meu sermão? Se não,
mais. Quanto ao tópico, observa como encobre toda a terra e por quê?" il
alcança o além, onde entraremos no "dia da reversão, o dia do
Senhor". 9

2. A segunda lei é relativa à ordem. A unidade refere-se ao


Em contraste, inteiramente ridículo, lê o ensaio de um escolar corpo como um todo, a ordem concerne às várias partes em relação
sobre o milho. Observa como se prende ao assunto, mesmo quando ao todo e a cada uma. A impressão de unidade vem com um

s A Certain Mensure, Nova York, Hartcourt, Brace & C o , 1943, pp. 8, 51. 53. 10 Lewis H. Chrisman, The Enoíish o/ the Pulpit, Nova York, Geo. D. Doran
191-193. Co., 1926, p. 70.
'' Ver Sermons Preachcd Be/ore the University of Oxford, 4." ed., Londres, 11 J. Paterson Smyth, The Preacher and His Sermon, Nova York, Geo. H.
1879. Doran Co., 1922, pp. 67, 108.
l£2 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREOCUPAÇÃO PELA ESTRUTURA

relance sobre o sermão todo, enquanto o sentido de ordem é conse- no fim do sermão. Só um génio pode deixar qualquer parte do
quência do estudo da mensagem em suas partes, uma após outra. sermão sujeita ao impulso do momento, pois outro indivíduo qual-
Não só as partes principais avançam como regimentos de uma quer talvez não faça mais do que preparar o caminho para um
brigada em marcha, mas dentro de cada parte principal as partes anticlímax.
menores também avançam como companhias num regimento. Tu-
O principiante aprende, com o correr do tempo, a planejar
do isto enquanto os regimentos e companhias cumprem a vontade
cada uma das várias divisões do sermão com o máximo cuidado,
do oficial em comando, que fêz um plano para assegurar tanto a
como se essa divisão fosse independente. Se necessário, na pri-
unidade quanto a ordem. 12

meira parte principal deve usar a lei da omissão e em tudo quanto


Como exemplo de falta de ordem estuda qualquer de teus ser- se seguir deve planejar com o mesmo cuidado e saber, portanto,
mões, em que teve lapso de memória no púlpito. Onde gaguejaste, conseguir um sermão tão simétrico quanto possível.
vacilaste ou omitiste uma parte, provavelmente acharás algo fora
do lugar. Num sermão pronto para a enunciação, cada parágrafo 4 — Podemos designar a quarta destas regras pela expressão
segue tudo que veio antes, tal como um vagão permanece em progresso, movimento ou clímax. Usamos aqui o termo "progres-
seu lugar no comboio. Se um ministro pretende ler o sermão so", incluindo tanto o movimento como o clímax. Por esta quarta
palavra por palavra, ou mesmo usar notas a cada mudança, pode lei entendemos que um sermão deve manter-se em movimento, em
prosseguir a despeito da falta de ordem. Mas se quisesse levantar-se direção ao objetivo, do mesmo modo que um rio corre para o oceano.
para falar, de coração para coração, olhos fitos nos seus ouvintes, É possível que, por vezes, o curso passe por uma região plana
tem que tomar em consideração uma linha de pensamento. ou então, que as águas se lancem em cascata. O sermão requer,
constantemente, movimento avante sem nunca parar. Caso o mo-
3. A terceira lei se relaciona com a simetria. Uma vez que vimento do trabalho pareça o de um círculo, o sermão no seu
esta qualidade parece ter menos importância do que as outras, não conjunto não conduzirá a um ponto de chegada. Pararemos fi-
deve ser colocada nem em primeiro, nem em último lugar. No nalmente e desceremos precisamente onde começamos. Tal jogo
entanto, a questão de simetria requer atenção, visto que a pro- poderá parecer inofensivo, mas para que chamar-lhe sermão? Ana-
porção entre as várias partes está relacionada, em grande escala, lisemo-lo em termos de progresso!
com a beleza da mensagem como um todo e com o efeito que
Consideremos os sermões de Robertson. Planejava com o co-
produz nos ouvintes. As várias divisões principais não precisam
ração de soldado cada uma das mensagens, de tal maneira que
ter exatamente o mesmo tamanho, embora Phillips Brooks tra-
as várias partes se movimentavam para a frente, em direção à meta.
balhasse de acordo com tal regra. A lei que estamos consideran-
Na mensagem sobre "As Três Cruzes do Calvário" analisou as 13

do requer apenas que cada uma das partes receba o tempo e a


três Cruzes, mas em que ordem? Robertson colocou em primeiro
ênfase que a sua importância necessita e nada mais. Devemos ter
lugar a cruz central, "A Hora da Morte da Dedicação", e à luz dessa
a certeza de que, ao planejar um sermão, tudo esteja no seu devido
verdade central considerou as outras duas. Mais uma vez em que
lugar e, então, que haja equilíbrio entre todas as partes.
ordem e por quê? Colocou em segundo lugar "A Hora da Morte
O principiante frequentemente ignora esta lei e dá tanto tem- da Impenitência". O orador deve ter colocado o segundo ladrão
po e atenção à primeira parte, a principal, que se vê obrigado a no fim, por se ter arrependido e consequentemente queria que cada
desleixar o resto da preparação. Talvez nem saiba o que dizer um dos ouvintes, um pecador, aceitasse o Salvador.

"Estrutura" refere-se a estratégia; "estilo literário", a tática. Ver The Human Race and Other Sermo-ns, Londres, 1890, pp. 152-162.
1UU A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREOCUPAÇÃO PELA ESTRUTURA /y^

Um outro pregador seguiria ordem diferente, por causa do lembrar-se de que todas estas leis vêm do estudo dos sermões dos
clímax. Consideraria em primeiro lugar uma das outras cruzes, mestres. Se alguém lhes tivesse perguntado, na sua idade madu-
talvez a do ladrão inconfesso, e finalmente o sermão chegaria ao ra, por que faziam isto ou aquilo, teriam respondido: "Não sei".
ponto culminante da cruz central. Mas como haveria de mostrar Porém, na sua mocidade, ao aprenderem a sua arte, com certeza
com clareza qual dos ladrões moribundos se arrependeria? Por pensaram sobre tudo isto. Todo príncipe do púlpito, na pleni-
exemplo, o pregador mais espetacular dos nossos tempos tomou tude das suas capacidades, seguiu hábitos e sistemas que adquiriu
este assunto, "As Três Cruzes", e do texto usado por Robertson, nos primeiros anos da sua aprendizagem, de forma que a facilidade
Lc 23.33, T. De-Witt Talmage, apreciador do clímax, apontou em na preparação dos sermões se transformou "no ato fácil do hábito
primeiro lugar para a "Cruz à Direita — Zombaria", em seguida de trabalho".
"A Cruz à Esquerda — Arrependimento e Fé", e finalmente "A
Sempre que algum jovem, no seu escritório, começar a sentir-se
Cruz no Centro — Sofrimento Vicário". Quando é que nós, mi-
cansado do trabalho penoso do preparo dos sermões, lembre-se
nistros, poremos as coisas mais importantes em primeiro lugar
de que outros que escrevem e falam em público atravessaram o
sem as relegar para segundo ou terceiro?
mesmo género de disciplina. A autobiografia de John Erskine
Será que o pregador terá que ordenar sempre as suas ideias conta-nos que nos seus primeiros anos aprendeu a escrever com
dessa tríplice maneira? Como veremos mais tarde, tal não acon- George R. Carpenter. O que êle conta, talvez faça com que alguns
tece; o ministro precisa de ter variedade de planos para sermões. dos leitores lamentem não terem estudado com professor da ca-
Deve conservar-se em geral afastado do antigo esboço com três tegoria de Carpenter:
partes. Porém, quando os fatos a considerar requerem esse ar- "Pediu-nos que trouxéssemos o esboço do ensaio, parágrafo por pará-
ranjo das partes, deverá seguir os fatos como eles são. É possível grafo, e que cada parágrafo fosse representado por um único período.
que um belo dia o pastor sinta necessidade de falar sobre Mt 6.10: Quando conseguíamos ter esse esboço, para sua e nossa satisfação, víamos
"Venha o teu reino, faça-se a tua vontade, assim na terra como que a única coisa a fazer era completar os parágrafos e alisar as asperezas

no céu". Se assim acontecer, deve chamar a atenção para as da moldura.


"Não usei até hoje nenhum outro método para preparar qualquer escrito,
três ideias existentes no texto, com a verdade mais importante
seja êle curto ou longo... Não me interessa começar um romance ou
em primeiro lugar, onde está o fundamento de tudo quanto se um artigo, antes de ter elaborado todo o seu esboço. É fácil escrever o
segue. Conseguif-se-á um clímax por meio de um impacto cada primeiro período se soubermos qual vai ser o último. Não posso calcular
vez maior sobre a vontade do ouvinte. Com o progredir do sermão, o tempo que teria perdido, se não tivesse feito aquele curso com George
o orador leva o ouvinte a seguir: Rice Carpenter! 14

1. O Reino de Deus começa com o divino.


2. O Reino de Deus inclui o humano.
3. O Reino de Deus leva à prática.

Temos considerado quatro leis que dizem respeito à estrutura:


unidade, ordem, simetria e progresso. Realmente deveríamos con-
siderar todas juntas, pois não nos é possível apreciar nenhuma
delas à parte das outras. Se algum dos leitores se sentir aborre-
cido com esta ênfase na mecânica da preparação de sermões, deveria The Memory of Certain Persons", p. 98.
VARIEDADE DE ESBOÇOS
H7

Abraão que saiu, pela fé, sem saber para onde ia (Hb 11.8). o
orador tratou de três aspectos dessa peregrinação, que requeria
CAPÍTULO XII coragem, perseverança e esperança. No entanto um mestre do
púlpito, como Thomas Chalmers, teria dispensado tais divisões e
insistido na ideia principal, primeiro de uma, depois de outra
maneira, com intensidade crescente. Teria levado, deste modo,
o ouvinte a partir também para essa peregrinação de fé. Desne-
VARIEDADE DE ESBOÇOS cessário é dizer que só um indivíduo com excepcional talento é
capaz de preparar sempre seus sermões segundo esse critério.
Todos os ministros deveriam aprender a falar desta maneira, ao
CONHECE-SE A DIFERENÇA entre o artista e o artífice menos quando o tempo de que dispuserem der só para breve men-
pela obra que realizam. Um projeta seu próprio sagem ou meditação antes da Ceia do Senhor.
plano segundo o fim em vista, o outro trabalha so-
bre o esboço de outrem. O pregador pode ter aprendido no Se- 2 — Duas verdades opostas. Este tipo de pregação relaciona-se
minário, ou nalgum livro, a "fabricar" estruturas como quem em geral com o nome de Robertson. Ao preparar sermão para
ergue choças numa vila operária, sem direção de arquiteto, a o culto da manhã, este pregador escolhia em geral um texto com
trouxe-mouxe. Como poderá então o intérprete da verdade divina duas verdades equivalentes. Conseguia variedade, semana após
conseguir variedade de planos para os seus sermões cada semana? semana, por meio de escolha de textos com toda espécie de
contrastes. Desde que iniciou o seu ministério, em Brighton, há
0 pregador jovem nos primeiros meses de seu ministério pode
cem anos, muitos dos seus sermões foram adaptados a outros púl-
seguir planos convencionais, embora não servilmente. Começará
pitos, por isto perdendo muito da sua originalidade. No entanto,
pouco a pouco a tentar fazer seus próprios esboços ou pelo menos
recompensam ainda um estudo cuidadoso, pelo menos para mostrar
modificar os que tomar emprestado. Cedo descobrirá que os es-
como conseguir força no esboço, sem perder a graça. Tomemos,
boços de sermões não se adaptam às descrições aprendidas, exa-
por exemplo, a sua mensagem a respeito de "O Passado Irrepará-
tamente pela mesma razão por que o médico da família quase
vel" (Mc 14.41-42), tema próprio para o Ano Novo. Na primeira
nunca encontra um "caso de acordo com o livro de texto". Mas,
parte, trata do "passado irreparável" e na segunda do "futuro
apesar disso, o médico aprendeu os fatos gerais acerca de casos
que pode ser nosso".
em livros de texto, do mesmo modo o ministro deve conhecer os
planos normais para sermões. Apresentamos, por conveniência, Este método merece vasto emprego, em parte por se prestar
uma lista deles, embora saibamos que não produzem automatica- à presente tendência para a brevidade e a concisão. Além disso,
mente sermões. esta forma de prédica ajuda o indivíduo a evitar demorar-se inde-
vidamente na negativa. Robertson, que por vezes mergulhava o
VARIEDADE QUANTO AO NÚMERO seu pincel nas cores mais escuras da sua paleta e nunca pensaria
em pintar uma cena sem sombras, esforçou-se por observar sempre
1 — O sermão com uma ideia. Toda mensagem apresentada o seu preceito: "Prega na forma positiva e nunca na negativa".
no púlpito deve conter, num certo sentido, uma só ideia, grande Tal género de trabalho de púlpito pode não parecer tão interessante
e luminosa. Por exemplo, o diretor de certa faculdade falou acer- como o recente costume de dizer, por exemplo, por que o homem
ca da "Vida como Aventura na Fé", baseando-se na história de do nosso tempo não acredita em Deus e o que o pregador não
U+8 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
VARIEDADE DE ESBOÇOS

quer dizer por pecado. Mas, afinal, que proveito trazem as nega-
C. E. Macartney prega frequentemente segundo esse plano e
ções, a não ser apresentarem a verdade eterna de Deus em con-
J. S. Stewart, na Escócia, também, embora com menos frequência.
traste? ' Este, como muitos outros, que querem fazer sobressair certas ver-
3 — o Tipo Convencional. Este é o da divisão em três partes, dades, por vezes emprega o paralelismo, a repetição e a aliteração.
o género que agradava a Alexander Maclaren, de quem se diz que O paralelismo está presente em toda parte nas Escrituras, em
"alimentava as ovelhas com um garfo de três dentes". Certa vez, especial nas passagens poéticas, que os jovens devem aprender
no City Temple, Joseph Parker disse a um amigo, a respeito dos de cor. A repetição, em mãos hábeis, é de grande efeito. A alite-
sermões de Maclaren publicados: "Bons, mas todos iguais". Par- ração é como a pimenta: "um pouco é bom, mas demais é pior
ker, sendo um orador sacro extraordinário, achava que os sermões do que nenhuma". Na mensagem intitulada "Por que ser Cris-
devem apresentar, semana após semana, variedade de estrutura tão?", Stewart usa esse recurso, mas evidentemente não prega
e estilo, mesmo admitindo que certos textos e assuntos se prestam assim muitas vezes. O leitor é levado a refletir logo que depara
à tríplice divisão convencional. Assim, por exemplo, mensagem com o esquema seguinte:
sobre o Espírito Santo baseada em 2 Co 13-13. No sentir de amável
1 — A vida Cristã é mais venturosa do que qualquer outra.
observador do púlpito norte-americano, grande parte dos ministros
2 — A vida Cristã é mais dura do que qualquer outra.
americanos mais velhos abusam deste método, ao passo que a 3 — A vida Cristã é mais santificada do que qualquer outra.
maioria dos mais novos o empregam de menos. Por que ambos 4 — A vida Cristã é mais esperançosa do que qualquer outra. 3
os grupos não variam um pouco, mudando de método?
5 — O sermão com cinco partes. Robert E. Speers gostava des-
4 — O esboço em quatro partes. Há muitos assuntos que se
ta maneira de pregar, especialmente quando a ocasião lhe permitia
prestam a esta forma de tratamento. Até o próprio Maclaren
tratar de um assunto vasto que êle analisava sob vários pontos
podia pregar desse modo. No seu livro The Secret of Power, treze
de vista. Este tipo de sermão requer tanta arte como a realização
dos vinte sermões pertencem a este tipo, só os sete restantes obe-
de um drama em cinco atos. William M. Clow proferiu um sermão
decem à norma dos três pontos. Na mensagem que dá o título
calcado nas palavras de nosso Senhor a Paulo, na estrada de Da-
ao livro, Maclaren começa com um texto que parece negativo,
masco (At 26.18), sob o título: "A última Mensagem de Cristo
mas põe toda ênfase na verdade e no dever positivos. "Por que
no Evangelho". O pregador de Glasgow assinalou "o aparecimento
motivo não pudemos nós expulsá-lo? E êle lhes respondeu: "Por
e o progresso da religião na alma do crente", concluindo que cada
causa da pequenez da vossa fé." (Mt 17.19-20). O sermão arti-
um de nós está dando um destes cinco passos na sua vida cristã.
cula-se em quatro divisões, três das quais positivas. Repare-se
O sermão que resultou teria ficado melhor, se aquele ministro
como o pregador vai edificando, pondo em primeiro lugar as ver-
tivesse usado títulos em lugar da citação de trechos do texto, para
dades teologicamente mais importantes e depois as de interesse
cada uma das cinco partes:
psicológico:
1 — Temos um poder que não varia. 1 — Jesus começa por "Abrir-lhes os olhos".
2 — A fé é a condição para o exercício deste poder. 2 — "Voltá-los das trevas para a luz".
3 — Nossa fé sofre permanente ameaça da descrença sutil. 3 — "Do poder de Satanás a Deus".
4 — A fé só pode ser mantida por constante devoção e rígida renúncia 4 — "Para que recebam o perdão dos pecados".
de si. 2 5 — "E a herança com os que foram santificados". *

' Ver James R. Blackwood, The Soul of Frederick W. Robertson, cap. IX.
8 Ver The Gates of New Life, Nova York, Scribner's Sons. 1940, pp. 21-31.
2 Ver The Secret of Power, Londres, Macmillan & Co., 1382, pp. 1-25.
4 Ver The Cross in Christian Experience, pp. 256-267.
VARIEDADE DE ESBOÇOS
ISO A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 151

6 — O sermão com seis pontos. Assim poderíamos ir além O USO DE NÚMEROS NO PÚLPITO
na escala. É possível encontrar número verdadeiramente astronó-
mico entre os antigos pregadores puritanos, mas paramos com o Estes exemplos, tratando de números, levam-nos a indagar
número seis. Consideremos H. E. Fosdick para um exemplo de como lidar com números no púlpito? Deve o pregador mencioná-
um sermão com seis pontos, ainda que não seja bíblico. Propõe-se los abertamente ou deixá-los como pilares cobertos de hera? A
discutir "Seis maneiras de diferenciar entre o Bem e o Mal", apren- resposta depende do objetivo que se tiver em vista. Se é ensinar,
sentando "seis regras para vida sã". O ministro dá a impressão far-se-á que os números sobressaiam, como faz Fosdick no tópico
de unidade com estes seis pontos, pois nunca perde o sentido de e nos títulos das divisões do discurso sobre "Seis Maneiras de
direção. Homilèticamente falando, é necessário estudar cuidado- Distinguir entre o Bem e o Mal". Clow faz o mesmo, ainda que
samente os seis títulos, pois evidenciam o valor do paralelismo e num tipo diferente de mensagem: "Amor em Quatro Dimensões".
da repetição, para dar ênfase. Cada um dos seis títulos até certo Tanto no tópico como nos subtítulos, chama a atenção para as
ponto segue o mesmo padrão quanto às palavras, na última palavra quatro partes do sermão, que estão relacionadas com a largura,
ou frase apresentando a prova a considerar. Repetindo por seis o comprimento, a profundidade e a altura do amor de Deus, como
vezes esta sentença chave, com uma única mudança, o orador aparece em Jo 3.16.
imprime-a na alma do ouvinte:
Porém, quando o pastor quiser inspirar ou confortar, não pre-
1 — Em primeiro lugar, se um indivíduo estiver sinceramente perplexo cisa usar números. Se tiver um plano em mente, que o conserve
quanto a algum problema do bem ou do mal, tem que se submeter à ali. Aquele que não tem o hábito de empregar esquemas numé-
prova do senso comum.
ricos, poderá ensinar melhor se usá-los de vez em quando! Em
2 — Em segundo lugar... do desportismo.
3 — Em terceiro lugar... do melhor possível.
qualquer sermão o homem sábio usará parcimoniosamente os nú-
4 — Em quarto lugar... de publicidade. meros; se os relaciona com os títulos principais deve omiti-los em
5 — Em quinto lugar... da personalidade que mais admira. outros lugares. De outro modo poderá torná-los tão confusos quan-
6 — Em sexto lugar... da previsão. 5
to muitos sinais de trânsito na mesma rodovia: "Rodovia Esta-
dual n.° 6" e "Rodovia Federal n.° 1". Para que apresentar nú-
Será que Fosdick prega muitas vezes desta maneira? De mo-
meros se não tornam o caminho claro e fácil de seguir? Na his-
do algum, nem niriguém deveria fazê-lo ao ponto de o leigo co-
tória da pregação notam-se quatro maneiras diferentes de usar
meçar a reparar na mecânica sermonológica. Outro pregador, no
os números.
que diz respeito ao conteúdo, poderia começar com o conselho dado
por Susana Wesley a seu filho: "Se tiveres que julgar entre a 1 — Uns usaram números antes e depois por todo o caminho.
legitimidade e a ilegitimidade de um prazer, observa esta regra: Noutros tempos, quando Spurgeon e Maclaren podiam pregar qua-
aquilo que prejudica a ternura da tua consciência, enfraquece a renta ou cinquenta minutos, costumavam apresentar a enumera-
tua razão, obscurece o teu sentido de Deus ou faz desaparecer o ção do que se propunham a dizer, no fim da introdução. No co-
gosto pelas coisas espirituais — tudo quanto fizer aumentar a meço de cada divisão chamavam de novo a atenção para ela,
autoridade do teu corpo sobre a mente — isto é, para ti, o pe- mencionando o seu número. Ao chegar ao fim do sermão resu-
cado". miam usando números. Este método, nas mãos de um mestre
que disponha de tempo, pode justificar-se, mas hoje poucos pas-
o Ver H. E. Fosdick, The hope of World, Nova York, Harper & Bros., 1933, tores o usam, não só pelo problema do tempo, como porque diminui
pp. 126-135.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES VARIEDADE DE ESBOÇOS 153

o "suspense". O homem sábio prefere viver no livro dos Atos do muitos deles, agora já amadurecidos, começaram a ver a neces-
que no livro de Números! sidade de mais ensino no púlpito. Evidentemente ninguém pode
tornar-se professor meramente pelo fato de usar números, mas se
2 — Um número de cada vez. Esta maneira de pregar tornou-
tivermos algo para dizer e desejarmos que os nossos ouvintes o
se muito comum. Se se deseja gravar uma verdade ou inculcar
ouçam, verificaremos que o uso de números, de quando em vez,
um dever, numerem-se os títulos principais e faça-se sobressair de
é vantagem e não desvantagem. Consideremos o testemunho de
alguma forma estes números. Trate-se, porém, de um só título
um dos mais interessantes escritores de homilética:
de cada vez. Certamente, chegando ao fim, poder-se-á fazer um
resumo, mas fora disso não se devem colocar os números todos Quando comecei a pregar, não costumava anunciar nem os títulos nem
juntos uns dos outros. Esta maneira de pregar requer muito mais as divisões do sermão. Parecia-me rígido e fora de moda. Como todos
jeito e labor do que a forma antiga de enumerar antes e depois, os jovens pregadores, tinha que ser original. Já mudei de opinião sobre
mas o resultado geralmente recompensa o ministro pelo seu cuidado este assunto. Não anuncio formalmente as divisões do sermão, mas tenho
todo o cuidado para que os meus ouvintes as reconheçam. O sermão pregado
em planejar para que o caminho seja claro e bem iluminado. Este
não é o mesmo que o publicado, no qual o leitor pode ver as divisões
método moderno encoraja a economia de tempo, permite o uso e os parágrafos e onde pode voltar ao começo da passagem, para desco-
do "suspense" e faz com que as grandes verdades sobressaiam de brir-lhe as ligações. Se não ajudarmos o auditório a descobrir a linha
forma evidente. de pensamento, em breve ficará cheio de confusão e perderemos a sua
atenção. Estou tão convencido disso que agora, depois de anunciar o texto
3 — Números na parte prática. Esta terceira maneira de começo dizendo: "O assunto de meu sermão hoje vai ser, etc." Em
pregar é uma variante do segundo plano. Empregando números seguida, ao chegar a cada uma das divisões do meu pensamento, a indico
claramente com uma pausa, ou então resumo numa sentença o pensamento
na segunda parte do sermão e em nenhum outro lugar, o ministro
anterior. Tento, de uma forma ou outra, colocar o auditório na posição
chama a atenção para aquilo que quer que o ouvinte lembre e
de um indivíduo que tem o sermão à sua frente, e
faça. Existe o risco de parecer que o pregador se demora demais
na introdução, mas o que na verdade ocorre é a preparação do
primeiro andar num só salão. Quando chega aos quartos supe-
NOVOS MÉTODOS
riores, onde vivem os vários membros da família, começa a usar
números. Fosdick prega frequentemente assim. Depois de algu-
1 — Método indutivo. Alguns ministros têm ultimamente ex-
mas palavras sobre o problema que está considerando, dedica qua-
perimentado o plano indutivo, em especial na pregação feita em
renta a cinquenta por cento do tempo, de que dispõe, ao princípio
faculdades e universidades. Para apresentação de ideias e méto-
que tem em vista e então começa a usar números. Esta maneira
dos, leia-se um livro de Joseph Fort Newton, The New Preaching,
de aprender uma verdade ou um dever oferece toda espécie
em que o autor afirma que os pregadores de outras eras se ba-
de variedade e eficácia. Enumerem-se apenas as partes práticas!
seavam apenas na dedução. Com a Bíblia ou a Igreja como fonte
4 — Nenhum número. O costume de dispensar os números de sabedoria, aquele que subia ao púlpito deduzia as descobertas,
começou a tornar-se comum em muitos círculos durante os últimos como o faria um advogado perante o Supremo Tribunal, baseando
anos. Por aversão ao imediatismo da era vitoriana, os jovens mi- a sua defesa diretamente na Constituição. Porém mais recente-
nistros tentaram descobrir de todas as maneiras e feitios como mente um pregador universitário poderá inverter esta ordem. Co-
pregar sem o uso de números. Quando o conseguiram fazer, seu meçará, trabalhando indutivamente com a experiência do homem.
trabalho de púlpito era digno de nota, em virtude do interesse
humano e do poder de inspiração que possuía. Mas presentemente « Paterson Smyth, The Preacher and His Sermon, pp. 115-116.
154 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES VARIEDADE DE ESBOÇOS 155

Se se lhe perguntar por que o faz, responderá: "Devo começar ras, de Paulo por exemplo. O texto poderá vir das palavras do
onde os ouvintes se encontram". Apóstolo a respeito da batalha que se trava dentro da alma do
Este tipo de prédica dá grande importância ao interesse hu- indivíduo (Rm 7.23). Neste caso o sermão apresenta Deus do
mano. Por exemplo, o pregador pode querer falar aos estudantes princípio até o fim, mas nunca fora do seu interesse pelo homem
universitários acerca do "Dever de Sermos Nós Mesmos". Se a individualmente — homens como os que estão ouvindo o sermão.
mensagem se basear num texto, as palavras poderão vir de 1 Sm Parece, pois, que até mesmo nos círculos universitários, a objeção
17.39 onde o jovem Davi insiste em combater à sua maneira e à pregação dedutiva não vem daqueles que se sentam nos bancos
não com a armadura do Rei Saul. Porém, de acordo com o plano da igreja.
indutivo, o sermão começará com fatos da experiência aqui e agora. Qual é a dificuldade existente com a pregação indutiva? É
Logo nas primeiras sentenças, o ministro levantará este proble- possível que, inconscientemente, o pregador não apresente corre-
ma: como pode um jovem hoje ter a certeza de ser êle mesmo tamente os fatos acerca da religião e da vida. Num sermão ex-
e não a cópia de outrem? O sermão poderá acompanhá-lo ao lar traído do Antigo Testamento, Deus deve aparecer como o atoi
e à escola, ao serviço militar e ao clube onde pratica atletismo, principal, e no Novo Testamento, Cristo ou o Espírito Santo. Po-
à sua vida profissional e talvez até a outros aspectos da vida rém, em muitos sermões pregados em universidades ou escolas
moderna. O caminho conduzirá gradualmente a uma vista de de ensino superior nos Estados Unidos, Deus, Cristo e o Espírito
olhos sobre Cristo e a Cruz, na qual o Filho de Deus teve a coragem Santo só surgem quase no fim da peça em um ato. Noutros tem-
de ser Êle próprio. pos, Phillips Brooks e Horace Bushnell sabiam como colocar Deus
no primeiro plano da mensagem. Qualquer uma dessas sumida-
Se aquele que tem que subir ao púlpito souber o que tem des, fosse em Harvard ou em Yale, fazia com que os universitários
a fazer, pode conduzir o ouvinte pelos montes e vales da experiência sentissem que se encontravam na presença de um Deus que se
humana, com um relance ocasiona! para o Deus que se revela interessa pelo estudante como ser humano. Quem é capaz de ima-
nestes caminhos tortuosos. Nas mãos de um mestre como Charles ginar que seja possível manter Hamlet fora do palco, até ao fim
W. Gilkey, capelão da Universidade de Chicago, o método indutivo da representação do Hamlet? Portanto, jovem leitor meu, medita
abre o caminho a toda espécie de panoramas que fazem o ouvinte um pouco antes de começar a pregar indutivamente e depois tenta
sentir que Deus está perto. Este método poderá parecer aconse- dar a Deus o lugar que lhe pertence.
lhável para uso numa capela universitária, de vez em quando, mas
muitos de nós duvidamos que seja prudente o seu emprego normal 2 — O sermão extraído da vida. Esta forma de pregação
no púlpito de uma igreja. Sentimos, de forma ainda mais forte, merece muito mais atenção do que a que lhe podemos dar aqui. 7

que o jovem pastor não deveria escolher como seu modelo um Este método requer várias espécies de sermões, de acordo com a
perito na pregação para estudantes universitários. personalidade do ministro, e o caráter da situação vital. Ouvimos,
por exemplo, um negociante dizer a seu amigo: "João, a forma
Os próprios universitários reagem favoravelmente à pregação
como vivemos não vale o que custa". Como não conhecemos ne-
dedutiva, mas gostam que lhes seja apresentada em moldes do
nhum dos homens e como ouvimos a conversa num ônibus, pode-
nosso próprio tempo. Reinhold Niebuhr é considerado, tanto na
Universidade de Princeton como em muitas outras, um dos prega-
? Ver H. E. Luccock, ín the Minister's Workshop, Nova York e Nashville.
dores favoritos. Ouviram-no pregar toda sorte de sermões sobre Abingdon-Cokesbury Press, 1944, pp. 50-92; R. W . Sockman, The Highway of God,
Deus em Cristo, pois só costuma seguir as suas próprias regras Nova York, The Macmillan Co., 1942, pp. 118-126; A. W. Blackwood, Plarming
a Year's Pulpit Work. pp. 187-202; e H. W. Roupp, em The Pulpit, maio-junho,
homiléticas. Geralmente começa citando palavras das Escritu- 1941.
VARIEDADE DE ESBOÇOS 157
156 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

usar o homem a quem o Bom Médico libertou da paralisia. No


remos começar à vontade o sermão com estas palavras: "portanto
relato em Mc 2.1-12 o pregador nota a ênfase no poder de Cristo
discutiremos o tema: " A vida vale o que Custa?". Ou, mais dire-
para perdoar pecados. A luz desta verdade o sermão demonstra o
tamente: "Tua vida vale o que Custa?".
significado do pecado como doença da alma e do perdão de pecados
De acordo com o método de assuntos tirados da própria vida, como a cura dessa doença.
a mensagem deste género pode tomar toda e qualquer forma. É
Phillips Brooks empregou este método de maneira diferente.
possível que às mãos de um maquinista o produto resulte mecâ-
Embora não tratasse de "casos" em todos os seus sermões, recorreu
nico, e uma série de sermões deste tipo talvez torne o ouvinte cons-
a êies com tanta frequência ao demonstrar o valor dos casos hipo-
ciente de problemas. Porém, em mãos habilidosas o sermão ba-
téticos. Num sermão deste género, estabelecia um princípio ex-
seado na própria vida aproxima as pessoas do santuário! Quando
traído das Escrituras, depois mostrava como êle operava nas vidas
chegam a mensagem lhes faz bem, porque as ajuda a compreender
das pessoas em Boston, uma após outra, talvez cinco ou seis ao
a vida dos nossos dias através da luz que vem de Deus. Portanto,
todo. Não usava os exemplos apenas como ilustrações, os fatos
um jovem ministro deve aprender a pregai- desta maneira, ainda
pessoais eram como pedras na construção do edifício. Esse mé-
que tenha todo o cuidado em não revelar no púlpito aquilo que
todo de pregar deveria ser usado com mais frequência, porque
descobriu durante a cura das almas ou em conversação confiden-
permite ao pastor interpretar a vida do ouvinte à luz que jorra
cial com os membros da sua Igreja.
do Livro. É claro que sua eficiência depende da habilidade de
Se conhecermos a Bíblia, poderemos usar a introdução do escolher e apresentar casos hipotéticos, que se coadunem com a
assunto da própria vida com um texto áureo. Afinal de contas, vida dos nossos dias e da sua própria Igreja.
como pregava Robertson em Brighton, há um século? Se queria
Por exemplo, um ministro deseja considerar as "Obras como
discutir o problema do "desalento", usava um texto sobre Elias
Meio de Graça". Poderá começar com as palavras tão conhecidas
debaixo do zimbro. Se a situação da própria vida se relacionar
de Fp 2.12-13: "Desenvolvei a vossa salvação com o temor e tremor,
com a dúvida, a luz virá através de um estudo sobre Tomé. Em
porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar".
qualquer dos casos, o sermão relaciona-se principalmente com Deus
Como fêz Horace Bushnell, o pregador poderá formular uma pro-
ou Cristo e não com Elias ou Tomé. Quanto ao problema de saber
posição ou frase-chave: "Debaixo de Deus todos temos muito que
se a vida do homem vale mais do que o seu valor aparente, por
ver com a determinação do nosso próprio destino". O ministro
que não encontrar a "resposta no final do capítulo sobre a Ressur-
poderá então mostrar como este princípio opera na vida dos homens
reição? Em vez de fazer o apelo a um indivíduo, baseando-se nos
e das mulheres individualmente, com aqueles que se assentam nos
seus impulsos, leva-o a tornar-se firme na fé, inamovível em ca-
bancos da igreja, com o universitário na sala de aulas, o oficial
ráter, sempre abundante na obra do Senhor. Considerado sob o
do exército na instrução militar, o negociante com o seu dinheiro
prisma da Ressurreição de Cristo, a vida do crente passa a ter
e a dona de casa na sua vida rotineira. Se aquele que sobe ao
muito mais valor do que o que lhe custa (1 Co 15.58).
púlpito usar a sua imaginação, poderá tirar proveito deste tipo
de sermão, mas se não tiver habilidade o seu efeito será nulo.
3 — O método de casos. Tamoém este método pode ser usado
de várias maneiras. É usado pelos jovens tanto nos cursos de teo-
4 _ A mensagem temática. W. L. Stidger chamaria de "sin-
logia pastoral nos seminários, como no estudo de Medicina ou
fónica" a esta maneira de pregar, método que usa com uma ou
Direito. O ministro dos nossos dias também percebe que é efi-
duas linhas de um conhecido poema ou canção famosa. No período
ciente no púlpito. Suponhamos que deseje, uma vez, discorrer
do Ano Novo o pastor pode começar com as palavras de Tennyson:
sobre "O Evangelho em Termos de Saúde". Como material pode
158 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES VARIEDADE DE ESBOÇOS 159

"Lança fora o velho, acolhe o novo", motivo que pede um tópico Senhor, ou da mensagem de Saulo na estrada de Damasco. Que
como "A Música do Evangelho do Ano Novo". E as palavras de peça em um ato incluiria tanta ação dramática?
Tennyson ecoarão em todo o sermão. O pastor poderá também Neste género de sermões começa-se com uma pessoa ou com
começar com as palavras de um hino de Thomas Moore: "Não há um grupo de pessoas. Em seguida apresenta-se a ação de tal for-
na terra dor que o céu não possa mitigar", que está relacionado ma, que aquele que está sentado no banco da igreja possa ver
com a cura de uma alma aqui e agora. O hino em si, "Vinde, ó alguém a quem admire, a quem tema ou a quem deseje imitar.
Desconsolados", traz o bálsamo cicatrizante àquele que se senta, A ação conduz à luta, a luta provoca conflito e o conflito envolve
junto do zimbro e deseja morrer. "suspense". Finalmente surge o desenlace. Por que não mostrar
o drama da redenção, tal como nos surge nas Escrituras Sagradas?
William Sherman Skinner, de Pittsburgh, falou sobre o pro-
Se aprendermos a pregar sermões tão dramáticos como as cenas
vérbio: "Quando Deus apaga está se preparando para escrever".
que as Escrituras apresentam, nunca deixaremos de ter quem
A mensagem baseia-se nas palavras de Paulo sobre os crentes como
nos queira ouvir. Especialmente numa igreja central, à noite, o
epístolas de Cristo (2 Co 3.3). O estudo trata dos caminhos de
pregador tem que saber usar a imaginação como dramaturgo.
Deus em tempos de caos mundial e faz apelo para a reconstrução.
Ao chegarem a casa, e nos meses que se seguiram, os ouvintes 6 — o método hegeliano. Hegel, filósofo panteísta, não reco-
continuaram a dizer entre si: "Quando Deus apaga está se pre- nheceria sua influência num dos sermões classificados sob esta
parando para escrever". Descobriram que o sermão temático su- designação, que foi sugerida pelo método de pensamento empregado
gere muito mais do que diz. Em parte em virtude da repetição, por êle. Trata-se aqui da mensagem que consiste de três partes
as palavras continuam a soar nos seus ouvidos, fazendo com que correspondentes a três ênfases diferentes: tese, antítese e síntese.
muitos leigos tenham pregado um sermão sobre o que Deus quer Deste modo, as partes principais do sermão movem-se como as
escrever nos dias de hoje. partes sucessivas de uma sonata de Mozart. No sermão vem em
primeiro lugar a tese, apresentando uma verdade ou um ideal;
5 — A mensagem dramática. Esta maneira de pregar toma
segue-se a antítese, apresentando os fatos da vida como surgem
variadíssimas formas, todas difíceis de classificar ou descrever. Em
ho~je em dia, talvez na miséria da "Avenida"; finalmente, com
geral o sermão deste género assemelha-se a uma peça em um ato.
exceção da conclusão breve, vem a síntese ou resolução, em que
Qualquer observador do "pequeno teatro" sabe que a peça de um
se mostra como a verdade de Deus transforma a sordidez da vida
ato se desenrola de diversas maneiras. Os fatos são apresentados
s

na terra. É desnecessário dizer que este género de trabalho de


num livro de Percival Wilde, que dizem ter escrito mais peças
púlpito aparece em várias formas, algumas das quais exigem toda
em um ato do que qualquer outro dramaturgo dos Estados Unidos.
a capacidade do indivíduo.
Num tratado, intitulado Craftsman Ship of the One-Act Play, in- 0

siste em que a pessoa que parece boa pode tornar-se má, e uma que Pessoas de bom senso não empregarão quase nunca expressões
merece o nome de má pode tornar-se boa — e tudo dentro dos como tese, antítese e síntese, no púlpito. Mas o jovem ministro
limites da peça que dura apenas uma hora. Tudo isto nos faz no seu escritório pode usá-las ao examinar a sua maneira de pensa*'
pensar na mensagem sobre a avareza de Judas, que vendeu o seu sobre a religião e a vida. Por que não nos habituaremos, cada vez
mais, a considerar o ideal na forma em que se apresenta nas ver-
s
Não é necessário que o ministro aprove ou frequente o teatro moderno, dades divinas? Neste caso, verifiquem-se os fatos tais como sur-
para ser capaz de conhecê-lo. gem na nossa comunidade e em outros lugares atualmente. Ainda
9 Boston, Little Brown & Co., 1923. Ver também Fred Eastman, Chrisi in
the Drama, Nova York, The Macmillan Co., 1947.
160 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
VARIEDADE DE ESBOÇOS 161

melhor, veja-se como Deus quer transformar as coisas na terra. sem abrir um livro ou sem usar a cabeça. Quando alguém já
Apresente-se esta filosofia prática àqueles que vão à igreja perple- passou pela faculdade e pelo seminário, por que há de fazer aquilo
xos e indecisos por se terem perdido no meio da bruma. Sempre que faria no ginásio? É possível que considere, a certa altura, os
que nos dirigimos a homens e mulheres, que gastam as suas horas seguintes versos de Rudyard Kipling. Notem-se em especial as
de trabalho no meio do esterco e do lodo, peçamo-lhes que olhem palavras finais: "Dou a todos o repouso".
para o alto e contemplem o Deus que criou a beleza das estrelas.
Tenho seis servos honestos
Melhor ainda, conduzamo-los a colocarem suas afeições nas coisas (ensinaram-me tudo o que sei);
do alto, onde Cristo vive. Que mais significa ser cristão? Seus nomes: Que, Por que. Quando
Como, Onde e Quem.
O método hegeliano devia ser usado mais frequentemente. Por Envio-os sobre terra e mar,

exemplo, um sermão deste tipo poderia surgir da verdade que Mando-os para o Leste e Oeste;
E cumprido o seu trabalho
Charles Wesley apresentou no hino: "Cristo, cuja Glória Enche
Dou a todos o repouso. H
os Céus". No púlpito as primeiras palavras poderiam relacionar-se
com Charles Wesley, como autor das letras de mais de seis mil
Sete métodos foram considerados, seis dos quais são bons. Po-
hinos, a maioria dos quais sobre Cristo, mas a mensagem em si
deríamos prosseguir para verificar que os sermões dos príncipes
deveria tratar das verdades contidas nas três estrofes do hino.
do púlpito diferem como as estrelas do céu. Sem levar longe demais
Em primeiro lugar a tese: "A Maravilha de Nosso Senhor, Nossa
a figura, podemos perguntar por que não aprender com as estrelas
Luz", em segundo lugar a antítese: "A tristeza de um Mundo Sem
Cristo, e em terceiro lugar a síntese: "O Esplendor da Entrega a maravilha da variedade? Por que não saboreamos as alegrias
da Alma ao Redentor". Esta mensagem sobre o "Segredo Cristão de descobrir uma estrela que ainda ninguém viu? Sempre que
do Esplendor", deveria encher muitos corações com o desejo de alguém descobre nova forma de inculcar verdades ou deveres an-
cantar e orar. 10 tigos, poderá exclamar como o jovem Keats:
Então me senti como o observador dos céus
7 — O plano adverbial. Esta forma de preparar a pregação Quando novo planeta baila à sua vista.
vem aqui, porque não pertence a nenhum outro lugar. O método
adverbial tornou-se muito comum entre ministros evangélicos. Antes de poder escrever estas palavras, o poeta teve de domi-
Sempre que não há tempo para meditar num método próprio, nar a sua arte. Conseguiu-o principalmente de duas maneiras:
recorre-se ao hábito antigo de perguntar: "quem", "quando" e por meio do estudo cuidadoso de poemas de outros autores e da
"por que". Nas mãos de um mestre como Spurgeon, esta maneira composição dos seus próprios. Todos os jovens pregadores deve-
de pregar pode ter justificação, pelo menos de quando em vez, riam aprender a preparar sermões assim. Deste tipo de autodis-
mas, como dieta permanente, torna-se tão pouco agradável como ciplina poderia tomar de coração as palavras do conselho do prin-
um prato de carne igual todos os dias numa pensão. Na pregação, cipal expoente em peças de um ato — com atenção especial ao
como na preparação da comida, a variedade decorre do uso da que diz acerca da imaginação. Imaginação aqui significa capaci-
imaginação. Qualquer um pode fazer quatro ou cinco perguntas dade de síntese. Sem imaginação ninguém pode esperar poder

111
Como exemplo de sermão hegeliano, ver "Claustro e a Multidão" de W.
l i De "The Elephanfs Child", de Just So Stories, copyright, 1902,
M. Clow, em The Secret of lhe Lord, Nova York, Geo. H. Doran Co., s. d ,
PP. 216-228. Rudyard Kipling.
162 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

apresentar, semana após semana, variedade sadia de planos para


sermões.
Para escrever um drama é preciso o trabalho harmonioso de três grandes CAPÍTULO XIII
faculdades: observação, pensamento e arte. O material é colecionado com
a primeira, desenvolvido com a segunda e materializado com a terceira.
O resultado das três, é uma boa peça...
Nada disse sobre imaginação. Pouco há a dizer. Ou a possuímos ou
não. Se não a possuímos é verdadeira loucura pensar em escrever poesia,
drama ou ficção. Se a possuímos... não poderemos deixar de transpor O USO DE ILUSTRAÇÕES
alguma das suas ideias para o papel. Há estímulo por toda parte". H

DIVERGEM GRANDEMENTE AS opiniões no que toca ao


número de ilustrações que se deve usar num ser-
mão ou durante o trabalho anual de púlpito. É
possível que um pastor mais velho insista em que "Não deve haver
nenhuma ou o mínimo possível. Para que perder tempo?" Um
pastor jovem por seu turno dirá: "Aqueles que pregam para o
povo, desde os dias do Senhor até hoje, têm confiado amplamente
em ilustrações". Quem sairá vencedor da discussão? Ninguém!
É possível que o mais velho use poucas ilustrações, enquanto o mais
jovem use muitas. Os leigos pensam que o ministro mais idoso
necessita de mais janelas na sua mansão e a do jovem, de paredes
mais sólidas. Por que então usar ilustrações?

MOTIVOS PARA USAR ILUSTRAÇÕES

1 — Por causa do interesse humano. Quando um orador dis-


cute uma verdade ou dever, que parece não interessar aos ouvintes,
pode ligá-lo a algo de que gostam. Por que nosso Senhor falou
sobre providência em termos de aves e lírios, de coisas para comer
e para vestir? O Mestre dos mestres falou sobre Deus em relação
a pessoas e a coisas, e sobre pessoas ou coisas relacionadas com
Deus. Quando nosso Senhor falou sobre coisas do campo ou do
lar, queria levar as pessoas a se interessarem pelo Reino, que não
podiam ver com os olhos da carne. Dirigindo-se ao povo comum,
11 Percival Wilde, The Crerftsmanship of the One-Act Play, Boston, Little„
Brown & Co., 1923, pp. 16,25. nunca usou abstrações ou ilustrações sem sentido. Usava fatos pa-
164 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 0 USO DE ILUSTRAÇÕES

ra lançar luz sobre uma verdade ou um dever e para tornar atraen- 2 — Clareza. Talvez qualquer outra parte do sermão peca
tes as coisas do céu às pessoas na terra. material ilustrado, para tornar clara a verdade ou o dever de que
Dado que uma ilustração lança luz sobre algo fora de si, o trata a mensagem. A verdade poderá vir, por exemplo, de Rm
exemplo deve ocupar lugar secundário. Deve servir como meio 8.28 : "Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem da-
a

para um fim, e não como fim em si. Ao preparar-se para pregar queles que amam a Deus". Sobre essa passagem é provável que
a mente segue frequentemente esta regra: "Apresenta a ver- um pregador pedante discorra a respeito da harmonia preestabele-
dade e define os seus teoremas, depois discute o assunto e, se cida entre o humano e o divino, mas aquele que ama o povo simples
necessário, ilustra-o". Há outra regra que muitas vezes é eficiente: prefere falar em Deus como o Artista Divino. Sob seu olhar vigi-
"Tem algo à mão ou à vista antes de apresentar uma ilustração lante começa a surgir o ideal de vida de um homem bom: a trama
e verificarás que todos os parágrafos brilharão com a sua própria é cio alto, os resultados são terrenos. No texto, "todas as coisas",
luz". Nos nossos dias um grande edifício com escritórios talvez inclui fios fortes e obscuros com os quais nós, os seres humanos,
necessite de poucas janelas, porque sua iluminação em grande temos pouco mais a fazer do que aceitá-los e usá-los como vindos
parte é interna. de Deus, juntamente com outros, de variados matizes, com que
contribuímos para tecer a obra de Deus.
Ocasionalmente, entretanto, uma ilustração poderá vir no
Se o ministro tenta discutir ou provar o seu ponto, é possível
começo do sermão. H. P. Liddon, na Igreja de S. Paulo, em Lon-
que deixe confusas as ideias. Poderá então tomar José ou Paulo
dres, pregou sobre o que ocorre no momento após a morte. Co- 1

como ilustração. Como o texto vem do Apóstolo, toma-o como


meçou citando um texto que levanta uma questão. "Então conhe-
exemplo vivo do significado das palavras e da maneira como opera
cerei como também sou conhecido" (1 Co 13.12b). Depois do
a verdade. Deus influenciou a carreira de Paulo no seu todo,
texto veio a história de um oficial do exército que regressara ao
dia a dia. O Apóstolo podia, pois, escrever aos Romanos: "Sabe-
lar com setenta anos, vindo das guerras da índia. Sentado no
mos". Verificou a verdade na sua própria experiência e a viu
meio de um grupo de amigos, o guerreiro relatou toda espécie
operar na vida de outros. Aqui está "a eloquência da experiência
de "fugas emocionantes" e, finalmente, fêz uma pausa. Depois
cristã". Também os irmãos mais velhos de José planejaram ma-
de alguns momentos disse: "Espero ver algo de bem mais ex-
tá-lo, mas resolveram, afinal, vendê-lo como escravo. Durante tre-
traordinário do que tudo quanto tenho descrito". Vendo que os
ze anos o jovem serviu e tinha a aparência de vítima do destino.
ouvintes não tinham compreendido, prosseguiu em tom de voz
Mais tarde viu como Deus superou aqueles erros todos, que eram
baixo e cheio de intensidade: "Os primeiros cinco minutos depois
como "os pecados que crucificaram Jesus". "Vós, na verdade,
da morte!". Que grande assunto, se o soubermos apresentar con-
intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em bem, para
dignamente! E que grande ilustração! Ninguém, além de Lid-
fazer, como vedes agora, que se conserve muita gente em vida"
don, seria capaz de começar desta maneira na Catedral de S. Paulo
(Gn 50.20). Por isso não é de espantar que Philips Brooks insis-
e nenhum outro teria chegado ao fim do sermão sem criar um
tisse em que as melhores ilustrações da verdade do Novo Testa-
anticlímax. Quem se admira por este sermão ter sobrevivido des-
mento estão no Antigo. O seu próprio púlpito mostra como exem-
de 1879 até hoje? Ocasionalmente, portanto, poder-se-á, usar, no
plificar com clareza. 2

começo, uma ilustração para atrair o interesse e mantê-lo preso


à verdade que se pretende considerar. 3 — Beleza. Tudo o que concerne a Deus deve ser tratado
com clareza e elegância mas os nossos sermões muitas vezes o
1
Ver H. P. Liddon, Forty-Tioo Sermons, Londres, 1886, pp. 25-32. 2 Ver A. W. Blackwood. The Protestant Pulpit, sermão n.° 13.
166 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O USO DE ILUSTRAÇÕES 167

tornam lugar-comum e sem interesse. Mas como falar da beleza aquilo que ficou dito até este ponto. Pensa então em outra ilus-
da santidade divina, sem desfigurá-la? Em parte por meio de tração, não mais para despertar interesse, nem pretendendo a
exemplos que sejam como janelas quebrando a monotonia das clareza, nem com vistas à beleza, mas para completar a mensagem
paredes. Os vitrais no templo servem melhor aos interesses da tornando-a viva. Em sermão sobre "A verdadeira simplicidade",
beleza, do que da iluminação. Num sermão de Charles W. Gilkey, James S. Stewart leva-nos a ver e a desejar "a simplicidade que
sobre "Coincidências", a principal ilustração é tirada da experiên- há em Cristo" (2 Co 11.3). Quase no final deve ter sentido a
cia de George Matheson, que perdeu a vista na juventude. necessidade de um exemplo, pois mostra como o "Comandante
Em virtude da inexplicável cegueira, alcançou novo sentido Chefe" pode fortalecer corações cheios de medo.
de beleza e graça. Depois de mais de vinte anos de vitórias alcan-
" N o fim de uma reunião social, em Londres, dedicada a soldados em
çadas sobre a sua condição adversa, cantava: vésperas de partir para a frente de batalha, um jovem oficial levantou-se,
a pedido do comandante, para agradecer em nome dos soldados. Fê-lo
ó amor que não me deixarás partir,
com palavras geniais de encanto e graça. E subitamente, como que num
Em Ti descanso minha alma fatigada; arremede, acrescentou: "Em breve vamos partir para a França e para
Devolvo-Te a vida que sou devedor, as trincheiras e, quem sabe, para a morte. Quem nos poderá dizer como
Que sua torrente em Teu oceano morrer?" Seguiu-se um longo e tenso silêncio. Ninguém sabia o que dizer.
Mais rica e mais plena possa ser. Logo, porém, surgiu a resposta. Uma das cantoras, dirigindo-se para o
palco lentamente, começou a cantar a grande ária da cantata Elias, "Oh,
descansa no Senhor". A o fim da melodia quase não havia olhos enxutos
Um exemplo como este fala do que é familiar ao ouvinte, ou- no salão. *
tros, tratando de experiências menos familiares, poderão elevar
a níveis de esplendor. Assim o capítulo quarenta de Isaías ou o Depois desta ilustração o ministro proferiu apenas quarenta
capítulo quinze da Primeira Epístola aos Coríntios. Note-se que e seis palavras ainda, mas todo o discurso culminava nelas. Se
o profeta esquadrinha o céu e a terra à procura de imagens para lhe perguntassem por que tinha usado aquele exemplo, é possível
falar da glória de Deus e o Apóstolo faz o mesmo em relação às que tivesse ficado embaraçado, mas poderia ter explicado que veri-
maravilhas da Ressurreição. ficara a necessidade da iluminação que vem da música. Este tipo
Exemplo mais recente nos é dado nos dois últimos parágrafos de ilustrações requer olhar atento e o ouvido afinado do artista.
do sermão "O Poder Expulsivo de uma Nova Afeição", de Thomas
Chalmers. Exorta-nos primeiro "a imaginar um homem de pé
3

ao lado deste mundo verde", cheio de promessas e glórias. A este VARIEDADE DE FONTES
mundo deveria apegar-se, mas se "uma ilha abençoada surgisse
de repente impressionando-lhe os sentidos com a luz das suas ma- Quando o principiante pergunta: "Onde posso encontrar ilus-
ravilhosas glórias", deveria "morrer para o mundo presente e viver trações?", muitos dos pastores experimentados responderão: "Em
para o outro mais belo que se vê ao longe". Só a imaginação toda parte! Use seus olhos!" Se o jovem fizer isso, talvez
em seus elevados voos poderia criar ilustração com tal esplendor. olvide as necessidades do ouvinte. Num exemplar do "New York
Times" havia um anúncio de meia página mostrando um envelope
4 — Completação. No preparo do sermão, especialmente che-
com o endereço, "A Quem Interessar Possa". Acima do envelope
gando ao fim, o pregador sente necessidade de algo mais do que via-se um cabeçalho que dizia: "Podes, como técnico de publi-

Ibiã., sermão n.° 6. * The Gates of Nev: Life, Nova York, Charles Scribr.er's Sons, 1940, p. 219.
168 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O USO DE ILUSTRAÇÕES

cidade, dizer o que está errado nesta carta?". Por baixo do enve- que vivem e se movem. No entanto, se continuarmos a considerar
lope, sem linha no meio, a resposta: "Tens razão, não se dirige a necessidade de materiais e ilustrações, devemos recordar uma
a ninguém em particular. E isso é importante no que toca ao verdade que não se nota com frequência: um sermão em geral
interesse com que uma carta ou um anúncio são recebidos e lidos". consiste atualmente de fatos, fatos e mais fatos. Qualquer que
De acordo com as palavras citadas, "há um mundo de diferença" seja o conteúdo da mensagem, deve tratar de fatos. Um estudo
também para a maneira com que o ouvinte recebe a ilustração. Sê de sermões do nosso tempo mostrará que muitos mestres do púlpito
específico no teu objetivo e usa os fatos. Experimenta contar, na se baseiam amplamente em fatos colhidos aqui e ali, nem sempre
ilustração acima citada sobre os soldados, o número de palavras usados como ilustrações. Tendo em consideração todas estas trans-
e frases sobre fatos... Podem-se encontrar trinta e duas. formações, consideremos algumas regras práticas:

Portanto, ao procurar exemplos, usa a cabeça e a imaginação. 1 — Limite-se o número de ilustrações. Concentremo-nos na
Começa com a Bíblia, especialmente com a porção que está antes sua qualidade, e não na quantidade, mas sempre que no auditório
e depois do texto. Aprende a ver o que precisas. Na Universidade haja rapazes e moças, usemos exemplos com toda a liberdade. Lem-
de Princeton a maioria dos novos edifícios é construída com pedras bremo-nos de que uma ilustração ocupa lugar secundário, por-
de uma pedreira vizinha, mas nos edifícios mais antigos usaram-se tanto tenhamos o sentido de proporção. Descobriremos, porém,
pedras importadas de outros Estados. Se um visitante perguntar que certas partes da estrutura necessitam de janelas, pelo que te-
a qualquer estudante por que os primeiros edifícios têm melhor mos de aprender a preparar um exemplo, antes de o colocarmos
aspecto do que os mais antigos, este responderá: "Quando alguém no seu devido lugar. Construamos todas as ilustrações com cuida-
começou a usar a cabeça descobriu que aqui, junto de nós, havia do idêntico ao que demos a todas as outras partes da mensagem.
pedras melhores do que as que os primitivos construtores tinham Talvez pensemos no motivo por que havemos de dar tempo e aten-
trazido de longe". ção a coisas de interesse secundário, mas descobriremos, talvez com
algumas tristes experiências, que quando uma ilustração é incon-
Não há, porém, exemplo algum que seja capaz de contar a
veniente faz mais mal que bem.
história toda. Se o visitante observar os edifícios mais antigos
verificará que possuem, em toda a sua simplicidade o encanto, o
Como exemplo do cuidado que se deve dar ao uso das ilus-
melhor estilo arquitetônico colonial da Geórgia. Que devem con-
trações, leiamos os sermões de Spurgeon. Numa das suas primei-
cluir, então? Que ninguém pode limitar o número e variedade
ras mensagens referiu-se às dificuldades de um velho marinheiro
dos campos de que o pregador pode tirar exemplos e que os melhores
para compreender que lhe pertenciam as promessas de Deus. O 5

se encontram muitas vezes em locais familiares. Em vez de olhar


marinheiro lutava com todas as suas forças para acostar seu barco.
de novo para esses campos, volta ao capítulo sobre "A Busca de
Queria lançar um cabo em torno dum pilar, de modo a evitar que
Outros Materiais". Ali a discussão diz respeito à variedade de
o barco fosse arrastado para o alto mar. Mas antes que a figura
materiais usados na elaboração de sermões. Estamos consideran-
do velho marinhsiro surgisse no sermão, o pregador tinha destacado
do agora as mesmas fontes, mas de um ponto de vista diferente.
a necessidade de nos aproximarmos mais de Deus e nos ligarmos
Os materiais são como tijolos ou pedras, de que se levanta a es-
às suas promessas. Apresentando suas ideias mais de uma vez,
trutura; as ilustrações são as janelas do edifício.
e usando depois o exemplo, Spurgeon inculcou a verdade discutida
Infelizmente o preparo de sermões é muito mais complicado e não apenas a ilustração. "Bem sei que há promessas boas e for-
do que esta narrativa parece fazer crer. Exemplos extraídos de
arquitetura nunca podem apresentar a verdade sobre mensagens •"• A. W. Blackwood. The Protestant Pulpit. sermão n.° 12.
170 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O USO DE ILUSTRAÇÕES •171

tes (disse o marinheiro), mas não me é possível aproximar do de que a vida cristã procura o aspecto agradável do caminho, o
pontão o bastante para lançar o meu cabo". Então o pregador que significa aceitar a vida como a encontramos, vendo-a em
disse-lhe como, mas o parágrafo relacionava-se com as promessas termos dos valores mais elevados no seu todo, à luz que vem de
de Deus e não mais com o velho marinheiro. Deus.
Convém que haja certa variedade de ilustrações no corpo do
sermão. Evita permanentemente a monotonia. Clow, por exemplo, O OUTRO LADO DA QUESTÃO
pregou sobre "O Claustro e a Multidão", querendo referir-se à
adoração no cume do monte e ao serviço no vale (Mc 9.5). Na Até aqui tratamos da ilustração nas mãos dos príncipes do
primeira parte tratou da "bênção da hora claustral", recolhendo púlpito. Consideremos o mau uso e o abuso das ilustrações prati-
da Bíblia, principalmente do contexto, o seu material ilustrativo. cado por outros, cujos nomes silenciaremos. Há janelas que en-
Na parte central, em que falou da "maldição da vida claustral", fraquecem e desfiguram o quadro. Quando o leigo se refere ao
tornou a antítese clara, ilustrando com fatos da História da Igreja. "pregador-anedota", certamente fica perguntando por que foi que
Na parte final, sobre a manutenção do espírito do claustro no alguém no seminário não ensinou aquele jovem a fazer o uso
meio da multidão", chegou à síntese citando fatos da sua época. devido da ilustração. Infelizmente, não é possível impor bom gos-
Neste sermão Clow seguiu a ordem cronológica. É possível que, to, nem dar capacidade de ver a melhor forma de coordenar as
uma semana depois, obedecesse a um plano inteiramente diverso, coisas. Em nenhum outro ponto pode a pregação do estudante
recolhendo seu material noutras fontes, conseguindo assim a va- claudicar com mais facilidade. Os estudantes não têm ainda a
riedade desejável. necessária experiência da vida, nem puderam aprender a usar os
seus próprios olhos. Talvez alguns conselhos negativos possam
3. Como vimos, o pregador poderá começar por vezes com ajudá-los. Como se trata de regras óbvias, não há necessidade de
uma ilustração, deixando-a dominar tudo quanto se segue. Em
longos comentários.
tal caso nem precisará procurar outras ilustrações. Certa vez,
Joseph R. Sizoo pregou sobre o contentamento cristão: "Aprendi
1. Evita "alimentos enlatados". Não deixa, nas tuas estantes,
já a viver contente em toda e qualquer situação". (Fp 4.11). Co-
espaço para livros de ilustrações, mesmo que tenham sido extraídos
meçando com a experiência que tiveram dois passageiros numa
de Spurgeon ou qualquer outro grande pregador mais recente.
viagem de navio, os quais só viam defeitos em tudo e em todos,
Nenhum deles colocou nos seus sermões fatos de segunda-mão. Sê
menos em si próprios, o pregador referiu-se ao comentário de outro
passageiro a propósito dos dois descontentes: "Espero ser sempre tu mesmo!
capaz de ver o bom lado da estrada!". 2. Nunca uses o lugar-comum: "Conta-se...". Se o fato a
Esta expressão "o bom lado da estrada", forneceu a base para que se pretende referir merece ser citado, deve ser contado sem
o sermão que tratava de um fato vital. Na verdade um sermão qualquer prefácio. Para que esbanjar palavras? Para que preju-
baseado na vida, geralmente começa com uma ilustração. Quando dicar o exemplo, apresentando-o com chavão?
alguém escolhe um texto, como o acima indicado, pode ilustrar
com fatos da vida do próprio Apóstolo, autor da carta. De duas 3. Evita contar casos, especialmente os que parecem impossí-
fontes, as experiências de Paulo e a cena no convés, o pregador veis e até mesmo improváveis. Prefere a biografia, a ficção e os
consegue tirar a côr local de que necessita. Sizoo usou ainda fatos reais, que ocorrem sempre na estrada da vida. Afasta-te de
outras ilustrações, mas fêz com que tudo girasse em torno da ideia tudo o que respire irrealidade, insipidez e sentimentalismo.
J72 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O USO DE ILUSTRAÇÕES '173

4. Cuidado com as alusões pessoais! Os melhores exemplos ao problema com que começamos: "Quantas ilustrações são ne-
vêm das vidas de indivíduos famosos, mas também as piores ilus- cessárias para um sermão?". Quem poderá responder matemati-
trações vêm da experiência de pessoas que todos conhecemos muito camente? Certo professor de homilética afirma que ministro al-
bem. Só um príncipe do púlpito, e este mesmo raramente, pode gum jamais usou demais boas ilustrações. De acordo, desde que
7

referir-se ao exemplo de sua santa mãe, da sua esposa amada e do realmente sejam "boas" para tornar o sermão efetivo! Falando
seu filho primogénito. Nunca empregues ilustrações domésticas! em termos esportivos, nunca um bom zagueiro faz muitos passes
Sê mais objetivo. bons para os atacantes. Se êle sabe o que deve fazer, jogará de
tal modo que a linha dianteira esteja sempre de posse da bola.
5. Evita referências a ti mesmo, sobre a tua valentia e as tuas
proezas. Se alguém quiser dizer "eu", diga "eu", mas não se apre- A impressão que temos, no entanto, é que há muitos ministros
sente como o herói da história. Poderá aprender de Robertson ou jovens que usam ilustrações em demasia e alguns velhos que quase
Brooks a pregar ao mesmo tempo pessoal e impessoalmente. Qual- não as usam. Há que procurar e seguir, em todos estes assuntos,
quer deles aproveitou suas experiências pessoais, mas nunca refe- a direção do Espírito Santo. Em qualquer hinário metade dos
rindo-se a si próprio. Sê modesto! hinos, cujo tema é o Espírito, referem-se a Êle como luz. Quando
Êle guia e ajuda o planejamento do sermão, mostra ao pregador
6. Não apresentes exemplos em série. Por vezes um negativo como usar luz e sombra. Só então a ilustração glorificará o autor
e outro positivo apresentarão verdades opostas; porém, se um só da luz e abençoará a alma aflita.
exemplo fôr suficiente para lançar a luz necessária sobre o assunto,
para que desperdiçar a segunda ilustração? Sê económico como
LEITURAS SUGERIDAS
um escocês!
Bryan, Dawson C , The Art of Illustrating Sermons, Nova York e Nashville, Abing-
7. Cita poesia com sobriedade. Aqui e ali o pregador poderá don-Cokesbury Press, 1938.
fazer citações poéticas, com cautela para que, em face da beleza Jeíís, H., The Art of Sermon lllustration, Londres, s. d.
do poema, não se destaque a falta de beleza do sermão. É possível Sangster, W . E., The Art of Sermons lllustration, Londres, 1947.

que tal intérprete consiga fazer brilhar palavras de Browning, mas Spurgeon, Charles H., The A r t of lllustration, Londres, 1894.

muitas vezes o pastor é mais complacente consigo do que o membro


da Igreja. Tanto em poesias como em anedotas, muito ouvinte
. . . quer apenas um pouco menos.
Mas não quer pequeno demais.

8. Para verdades positivas não uses ilustrações negativas.


Também neste ponto às vezes são admissíveis algumas exceções,
mas prefira a luz às trevas; faze que o Evangelho soe como boa
nova. Se achas este conselho inútil, examina um livro de ilustra-
ções, e verifica quantas delas são negativas. O mesmo acontece com
alguns de nossos livros sobre a arte de pregar!
Acabemos já com as negações! Não há número suficiente de
regras que possibilitem o domínio neste campo. Voltemos, pois. t Ver H. S. Coffin, What to Preach, p. 184.
0 PODER DA CONCLUSÃO 175

tôres dos nossos dias sabem mais sobre o interesse humano do que
sobre o poder divino e mais a respeito de psicologia do que de Deus.
CAPÍTULO XIV
Felizmente, porém, a tendência atual dá-nos a esperança de que
os sermões no futuro venham a ter conclusões mais poderosas.

Examine-se, por outro lado, uma dúzia de sermões do tempo de


Bushnell, Brooks e Spurgeon. Será que estes homens souberam
despertar o interesse desde o começo? Não, naquele tempo o
O PODER DA CONCLUSÃO pregador tinha sempre garantido o interesse do público. Nem
sempre era suficientemente interessante no início do sermão, mas
antes de terminar punha o seu ouvinte face a face com Deus. De-
PENSEMOS AGORA NA conclusão como a parte mais
pois deste exame, por que não aprender com os pregadores con-
importante do sermão, exceção feita do texto. Em temporâneos como começar e com os príncipes do púlpito, de
qualquer obra literária, escrita ou de oratória, nada outras eras, como terminar?
há que tenha tanta importância como o princípio e o fim. Chama-
mos conclusão à parte final do sermão, que inclui o objetivo visado. Como, pois, terminar um sermão? Isso depende de vários fa-
Difere do começo em que este pretende atrair a atenção e concen- tóres e principalmente do objetivo. Antes de alguém iniciar uma
trá-la na verdade a considerar, de modo a prepará-la para o que viagem, tem que resolver qual será o seu destino. Quando o mi-
se vai seguir, ao passo que na conclusão o pregador conduz o ou- nistro prepara o sermão para o domingo, deve ter em mente um
vinte a fazer a vontade do Senhor. Idealmente se deveria começar objetivo, de modo a poder levar o ouvinte a determinado lugar.
com interesse e terminar com poder, que significa efetividade. Quando o guia e seus amigos chegarem ao seu destino a viagem
Embora pareça estranho, uma conclusão forte deve ser feita termina. Quem dera que a elaboração das conclusões fosse tão
serenamente. simples como o nosso comentário parece fazer crer! Infelizmente,
É possível que, ao preparar o sermão, o pastor dê menos aten- porém, os sermões nunca devem terminar da mesma maneira. Va-
ção do que é devido à sua parte final. Nestes últimos anos os mi- mos, por isso, examinar alguns tipos de peroração.
nistros têm-se aplicado à arte da introdução. O pregador criterioso
dedica tempo e cuidado ao início do seu sermão, de modo que todo
domingo tenha sempre novo apelo ao interesse humano. Atual- A VARIEDADE DE CONCLUSÕES
mente os pregadores demonstram dominar a introdução, especial-
mente os que falam pelo rádio, mas poucos conseguem compreen- 1. Apelo direto. Esta maneira antiga de perorar continua
der a importância da conclusão. O mesmo acontece com grande com prestígio entre os pregadores. O orador dirige-se individual-
número de sermões publicados. Ao pregar, tal como acontece no mente aos ouvintes. Quando Spurgeon pregava a 3.000 ou a 23.000
vôo de um avião, a prova principal surge no fim. pessoas, fazia com que cada qual sentisse Deus falando pessoal-
Se não parecerem justas estas comparações entre o que foi mente com êle. Hoje não é mais possível usar o sistema de Spur-
ontem e o que acontece hoje, basta examinar alguns sermões de geon, que achamos arcaico, mas todos podem aprender com o pre-
grandes pregadores dos nossos dias e ouvir os pregados pelo rádio. gador londrino a não temer os ouvintes. Na maioria das conclusões
Observa-se em quase todos a excelência da introdução; mas veja de seus sermões, Spurgeon ousava falar diretamente. L. D. Wea-
se levam à ação. Talvez cheguemos à conclusão de que os pas- therhead, da mesma maneira, faz apelos diretos em muitos de
176 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O PODER DA CONCLUSÃO 177

seus sermões. Eis o final de sua mensagem "A juventude contempla aplicação prática, consideremos o que nosso Senhor diz acerca do
a Cristo": homem que construiu a casa na rocha (Mt 7.24-27).
"Jovens! Não podeis deixar de amá-lo e se olhardes para êle verifi-
3. Resumo Final. A recapitulação é outra forma antiga de
careis que, daí em diante, não podeis sentir-vos felizes por muito tempo
sem êle. Já vistes coisas demais. Deixai-me chamar-vos para êle agora.
terminar um sermão. Quando não se sabe bem como concluir a
Se pecastes êle vos perdoará. Se continuardes querendo pecar êle vos mensagem, pode-se usar o resumo. Esta forma tornou-se muito
salvará... Ide a êle agora. Recebei-o agora. Recomeçai o caminho com comum, pelo menos em alguns círculos, talvez porque custe pouco
êle. Não deixeis de contemplá-lo e ouvi-lo. Cristianismo é Cristo. Se ao
a elaborar. Mas pouco consegue em ação. À mensagem pedagó-
menos pudesse fazer com que tivésseis um encontro vital com êle, êle
faria o resto! Onde êle toca há cura. A um simples aceno seu brilha a gica presta-se este sistema de parar quase no fim e rever o cami-
luz. Onde êle é o companheiro há paz", i nho progressivamente. No entanto, como levar o ouvinte a cami-
nhar para a frente, enquanto o pregador está olhando para trás?
2. A aplicação prática. Este tipo de peroração assemelha-se
1
A conclusão deve ser diferente de um sumário, pois este fala ao
ao anterior, mas difere quanto ao método. Ao fazer o apelo, o intelecto, ao passo que aquela deve apelar à vontade, isto é. à per-
pastor dirige-se aos ouvintes, por vezes individualmente, mas na sonalidade em ação. Portanto, se um sermão necessitar de recapi-
conclusão a que agora nos referimos o pregador pode aplicar a tulação façamo-la, mas seguida de algo que leve o ouvinte à ação.
verdade, sem se dirigir a nenhum ouvinte em particular. Em todo Nunca se deve terminar com um simples sumário recapitulativo.
caso a última parte do sermão tem que responder à pergunta que o
ouvinte fará no seu íntimo: "A luz desta mensagem, que quer o 4. A verdade em contraste. Se a parte principal do sermão
Senhor que eu faça?" Ao contrário do que acontece com um ensaio tiver conduzido o ouvinte através de sombras, a conclusão deve
ou uma conferência, o sermão deve conduzir à ação, mesmo que levá-lo para a região da luz. Se o pastor falar do "traço escuro na
seja só no próprio coração. face de Deus", poderá levar o ouvinte a contemplar a Cruz e nela
Vejamos um exemplo de aplicação prática. No sermão "A o amor que redime. "Se não houvesse sombra na face de Deus,
melhor coisa acerca da Igreja" (Efésios 5.25), o pastor apresentou não teria havido cruz". Se a mensagem falou da tragédia de Caim,
a Cristo como aquele que ama a Igreja, crê nela e a transforma. É e da sua maneira de ver a vida, cm termos da nossa própria época,
possível que tudo is.to pareça objetivo, mas a conclusão torna-se sub- a parte final pode mostrar o contraste entre o espírito de Caim e
jetiva, uma vez que se relaciona com o indivíduo assentado no banco a Cruz de Cristo.
da Igreja. Para o indivíduo, viver como cristão significa ser se-
O contraste, por vezes, conduz na direção oposta. No Salmo 1,
melhante a Cristo, leal para com a sua Igreja. O homem ou mu-
o autor fala da fertilidade de uma árvore em oposição à inuti-
lher, moço ou moça, que ama e segue a Cristo, honrará e servirá
lidade da moinha. Nosso Senhor fala da mesma maneira sobre a
a Igreja pela qual Êle morreu e na qual Êle hoje vive. É tudo isto
casa construída na rocha em contraste com outra, na areia. Nas
que o pregador pode apresentar à consciência e à vontade, embora
Escrituras em geral o positivo sobrepuja o negativo. Ao pregar
não fale diretamente ao ouvinte. Como exemplo ainda melhor da
sobre tais passagens, o intérprete poderá seguir o mesmo critério
e terminar igualmente com algo positivo. Segundo Schleiermacher,
1 The Signijicance of Silence, Nova York e Nashville, Abingdon — Cokesbury o maior pregador alemão desde Martinho Lutero, nenhuma mensa-
Press, 1946, pp. 29-40.
2 Prefiro dizer prática e não pessoal, porque uso este segundo termo em gem do púlpito deve terminar com observação judicial ou com ar
relação à conclusão que se dirige ou apela à pessoa. A prática dá ênfase à verdade, de severidade. Spurgeon e Robertson não concordariam, pois am-
nao à pessoa ou pessoas.
178 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O PODER DA CONCLUSÃO 179

bos terminavam algumas vezes com palavras de advertência. Este zassem bem, o leigo não protestaria. Se o pregador tiver o espírito
modo de terminar auxilia, por vezes, a conseguir variedade. 8
de poeta, poderá concluir com palavras de Emily Dickinson ou
5. Apêlo^ à imaginação. Esta forma de concluir o sermão faz Edwin Arlington Robinscn, Tennyson ou Browning. Neste caso o
com que seja necessário tornar a verdade "gloriosa à imaginação". pregador de bom senso será breve na citação e terá conclusões para
Teremos um exemplo na peroração da mensagem de Chalmers, já a maior parte de seus sermões. No final da mensagem vinda de
várias vezes referida, "O Poder Expulsivo de uma Nova Afeição". Deus nada deve atrair a atenção sobre si, desviando-a de Deus.
Em nível não tão elevado, tê-lo-emos no sermão de Brooks, "A Can- 7. Ilustração. Tornou-se comum esta forma de terminar o
deia do Senhor". No penúltimo parágrafo conta como outrora se sermão, especialmente entre os ministros mais jovens. Se o ser-
preparavam as velas para o culto ao Supremo Deus e termina com mão exige ilustração no fim, evidentemente o pregador deve en-
palavras que iluminam o coração: contrá-la e usá-la. Como regra, porém, deve terminar de outra
maneira. De quando em quando a ilustração no final terá muito
"Acima de todas ES figuras com que representar a vida, — seu signi-
ficado, suas possibilidades — sobressai esta imagem de um espírito humano
mais força, em razão da novidade. É preciso grande cuidado e ha-
a arder com. a luz do Deus a quem obedece e apresentando-o aos outros bilidade para que tal como acontece com a poesia, não venha a
homens. Oh, meus jovens amigos, este ancião vos afirma que as figuras ilustração a chamar a atenção sobre si própria ou sobre o prega-
mais baixas da vida e seus objetivos não passam de enganos e erros. Esta dor. Se isso acontecer, como poderá o pregador persuadir o ouvinte
elevada figura, porém, nunca engana a alma que tenta realizá-la. O homem
a voltar-se para Deus? Enfim, qualquer forma de concluir será
cuja vida é uma luta constante para obedecer, ao terminar a sua tarefa
boa, desde que faça o ouvinte agir corretamente.
nesta terra pode olhar mais além da fronteira desta vida e dizer humil-
demente ao terminar a história da sua carreira e como oração para a vida 8. Nenhuma conclusão. O pregador pode, por vezes, termi-
vindoura, as palavras de Jesus: "Glorifiquei-te na terra; agora glorifica-me
nar .sem conclusão formal. Reinhold Niebuhr ocasionalmente ò
tu, ó Pai, junto de ti mesmo, eternamente". *
faz, e é possível que este fato explique, pelo menos em parte, a
razão por que atrai estudantes e professores universitários. Evi-
Pouco pode faltar para que uma conclusão assim seja per-
dentemente êle pressupõe que tirarão suas próprias conclusões,
feita, mas só alguém com alma de poeta pode elevar-se em asas de
depois de terem ouvido o sermão com toda atenção. Muitos pre-
águia e penetrar os segredos das estrelas. Muitos outros concluirão
gadores poderiam aumentar o interesse pelo sermão, se ocasional-
seus sermões mais prosaicamente. Está bem, mas de qualquer
mente omitissem os parágrafos finais. Mas tal tipo de peroração
forma a conclusão não pode reduzir-se apenas a um lugar-comum.
semi-abrupto requer grande habilidade na preparação, do contrá-
Na busca de forma bela, não de autoria própria, o pregador por
rio a conclusão assemelhar-se-á à aterragem forçada de um avião.
vezes recorre a obras escritas de outros autores e talvez o que en-
Por isso, nos primeiros anos de ministério o pastor fará bem em
contre esteja em verso.
concluir os sermões de modo mais convencional.
6. Um poema. Num livro de sermões de Fosdick, em vinte e
9. Sentença Final. Qualquer que seja o conteúdo dos últi-
cinco deles três terminam com poesias; num livro de Weatherhead,
mos parágrafos, o sermão no seu conjunto tem que conduzir à
seis em vinte e dois; num de J. S. Stewart, nove em vinte e quatro.
sentença final, que deve sobressair mais clara e poderosamente do
Se todos os ministros citassem poesia que valesse a pena e a utili-
que toda e qualquer outra sentença no texto. Embora Alexander
Maclaren somente decorasse algumas frases, no entanto, sempre o
3 Para conclusão negativa ver "Songs in the Night", de Spurgeon, em The fazia com as últimas frases do sermão. Trabalhava a última com
Protestant Pulpit.
The Canale of the Lord, Nova York, E. P. Dulton & Co., 1881, p. 19. o mesmo cuidado com que o camponês empilha o feno. Por vezes
180 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 0 PODER DA CONCLUSÃO

o pregador termina com o texto, palavra por palavra. Fecha, assim, o feno, quando sua mulher prepara um bolo, quando seu filho faz
com a mesma nota com que começou e pode fazê-lo de maneira a planta de um prédio, sempre o toque final requer olhos e mãos
admirável. , de artista. Quanto maior cuidado é preciso consagrar à conclusão
Vejamos um exemplo de conclusão com o texto. Edgar D. de um sermão! De que outra maneira se poderá conseguir que
Jones pregava sobre "A luz na face do Senhor". Quase no final, cada um dos ouvintes se aliste no serviço de Cristo e do seu Reino?
citou uma estrofe de dois hinos: um de William Cowper: "Algumas
2. Simplicidade. Elabora conclusões simples para todos os
Vezes uma Luz Surpreende", e o outro de George Matheson: "Amor
teus sermões e alcança deste modo o objetivo em vista. Termina
que Não Me Deixarás Partir". Em seguida regressou ao texto:
antes de enfraquecer a impressão causada. Só em ocasiões muito
"Por que Deus, que disse que das trevas resplandecesse a luz, é
raras e especiais pode-se usar a conclusão dupla. Brooks pregou
quem resplandeceu em nossos corações, para iluminação do co-
no dia 4 de julho de 1880, em Londres, na Abadia de Westminster.
nhecimento da Sua glória, na face de Jesus Cristo". (2 Co 4.6).
Era o dia nacional dos Estados Unidos e o orador sabia que seu au-
Que texto sublime para começar e concluir um sermão! s

ditório britânico esperava que falasse do nascimento da República


No caso de não terminar com o texto, o pregador poderá fazê-lo Americana, um século antes. A mensagem versava sobre "A can-
com suas próprias palavras. Quem melhor do que êle será capaz de deia do Senhor". Brooks não se referiu à efeméride nem à sua
pôr em palavras exatamente o que pretende afirmar? Certa vez pátria. Mas ao terminar o sermão, acrescentou-lhe uma segunda
Brooks pregava sobre o descanso em Cristo, "Vinde após mim, conclusão. De forma simples, sem embaraço ou desculpas, pediu
todos vós que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei" aos seus ouvintes ingleses para orarem pelo seu país. Com que
(Mt 11.28). Nos parágrafos finais tratou do perdão de pecados, tato e maestria agiu! Normalmente, porém, basta uma conclusão
reiacionando-o com as necessidades dos ouvintes. Brooks quase para cada sermão!
sempre falara diretamente ao ouvinte: "Luta, pecador, contra o
teu pecado!... ó pecador, em teu pecado; ó infortunado, em tua 3. Sê breve. Tal como no caso da introdução, brevidade e
dor, há repouso para ti!" E o sermão conclui: precipitação são coisas diferentes. Se os últimos parágrafos re-
"Eis o repouso destinado ao seu povo! Eis o repouso que pertence a
querem mais tempo do que é costume, o bom pregador continuará
esses jovens corações e a Osses velhos corajosos, que entram no mundo a falar até haver chegado ao seu destino. Mas o orador frequente-
eterno. É repouse pleno de vigor e atividade, repouso semelhante ao mente obriga os ouvintes a descobrirem que chegou ao campo de
experimentado pelo próprio Cristo! Olha! Ei-lo diante de ti, o teu Amigo, aterragem, mas não sabe como descer. O pregador começa a andar
o leu Senhor, o teu Cristo dizendo-te: "Vem a mim. homem cansado e às voltas e o povo a inquietar-se, talvez com vontade de dizer o que
sobrecarregado, e eu te aliviarei". Que a sua voz de tal modo ecoe em
disse uma escocesa idosa, numa circunstância dessas: "O reve-
teu coração, que tu venhas a Êle! «
rendo acabou, mas não quer parar!" Como disse Charles R. Brown:
"Confia a teu povo, logo no começo, a alegre expectativa do fim!"
De outra forma o sermão parecerá longo, porquanto um só minuto
PLANO PARA A CONCLUSÃO
a mais na conclusão pode criar um sentimento de mal-estar. Por
que queres tornar-te maçante?
1. Torna a conclusão apropriada. Seu espírito e colorido devem
estar de acordo com o que a precede. Quando o fazendeiro empilha 4. Geralmente "acentua o positivo". O sermão, em si, poderá
tratar de algo negro e terrível, como, por exemplo, o salário do pe-
•"• Ver A. W. Blackwood. The Protestam Pulpit. sermão n.° 2fi. cado ou a tragédia do divórcio. Se assim fôr, que as palavras fi-
0 The Lato of Growth, Nova York, E. P. Dutlon, 1910, pp. 148-149.
182 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O PODER DA CONCLUSÃO 1S3

nais sejam cheias de esperança cristã. Despede os ouvintes do namorada, não age como quem conquista uma cidadela tempestuo-
santuário, com um sentimento de segurança e poder. Lembra-te, samente, mas diz o que deseja com serena intensidade, afirmando-
com John Wesley, de quão terrível é haver tanta congregação que lhe que a ama e a quer acima de tudo na terra. Da mesma forma,
só recebe prédicas desanimadoras. Por escuro que seja o caminho se o pastor pretende terminar o sermão com "tom amoroso", tem
até o fim, conduze o ouvinte à luz do sol Abre paisagem de espe- que apaixonar-se pela congregação. De outra maneira como po-
rança, mesmo para o mais baixo e revoltante dos homens, de modo derá levar alguns do meio dela a fazer a vontade daquele que é
que ninguém pense do santuário: "Perdei a esperança, todos vós Amor?
que ali entrais!"
Vejamos, por exemplo, o último parágrafo de um sermão de
5. Torna pessoal a peroração, mas não demais. O pastor que Clóvis G. Chappell. Leiamos toda a mensagem acerca do rico
sabe ser prudente jamais lisonjeia ninguém, embora nunca seja insensato (Lc 12.16-21), ou melhor, do inferno. Ao terminar, o
impessoal. Direta ou indiretamente, de uma forma hoje de outra pregador faz uma pausa, baixa a voz, falando com o "tom amoroso".
amanhã, apresenta verdades e deveres à consciência e vontade da-
"Viverás para sempre. Serás tu mesmo, eternamente. Terás a tua
queles que vão à igreja. Como fazem os advogados no Tribunal, o
própria companhia através de toda a eternidade. Recordarás para todo o
ministro pede um veredicto. Nem todas as mensagens precisam sempre o destino que tu mesmo trabalhaste enquanto vivias... Lembra-te
ser evangelísticas, mas qualquer que seja o seu objetivo final, o ainda de que, embora todos estejamos perdidos, ninguém precisa perder-se
pregador deve desejar que o ouvinte responda afirmativamente. O eternamente. Todos podem salvar-se, se quiserem. Agora mesmo tu podes
salvar-te, se tiveres a sabedoria bastante para fazeres a escolha devida.
final da mensagem de Robertson, "A solidão de Cristo", é exemplo
"Aquele que vier a mim, não o lançarei fora." Queres vir? Queres vir,
de conclusão desse tipo, dirigida diretamente ao ouvinte. Note-se, agora?". 8
entre outras coisas, como o autor apresenta a verdade ao coração
do ouvinte, usando frases curtas e pessoais:
Nesta conclusão, como em muitas outras, o pastor fala dire-
"O resultado e conclusão prática de tudo isto é simples, ainda que tamente àquele que se assenta no banco da igreja. É necessário
profunda: a mais profunda da existência. Que a vida seja vida de fé. ter coragem e tato para pregar dessa maneira, mas o mesmo acon-
Não andes timidamente a indagar o que os outros pensam, o que os outros
tece em toda a vida pública e particular do embaixador do Rei
crêem e o que os outros dizem. Parece ser a coisa mais simples e no
Jesus. Ouçamos um famoso professor de Teologia, que diz aos jo-
entanto nada há mais difícil na vida do que isto — crer em Deus. Temeroso
mortal, há um poder desconhecido dentro da tua alma, que despertará vens como se deve pregar:
quando lho ordenares. Chegará o dia em que tudo o que é humano, homens
"Não temas usar o pronome pessoal "tu". Será sem dúvida maçante
e mulheres, se separará de vós, tal como se passou com Êle. Que o seu
falar todo o tempo usando a segunda pessoa, será mesmo impossível se
poder seja teu. Liberta-te agora do mal. O Pai está contigo. Contempla-o
houver desenvolvimento de um tema, principalmente se fôr usada constante
e Êle te salvará"."
e erradamente, pode dar a impressão de estar "recriminando" ou "amea-
çando", e de o pregador estar se colocando num pedestal. No entanto
6. Faze percutir aquilo que John Henry Jowett chamou "o tenho certeza de que é necessário nunca omitir interpelação direta... Se
tom amoroso". Sê persuasivo, planeja terminar suavemente. Nas não houver ao menos um único ponto em que possas dizer " t u " não fizeste
últimas palavras da mensagem pregada no púlpito Deus fala à alma um sermão, mas em ensaio ou uma conferência".»

em expectativa, não "por meio do terremoto, do vento e do fogo",


mas através "da voz doce e calma". O rapaz, ao tentar declarar-se à
8 The Vil!<rge Tragedy, Nashville, Cokesbury Press, 1921, p. 105.
o Herbert H. Farmer, The Servant of the Word, Nova York, Charles Scribner's
1 A. W. Blackwood, The Protestant Pulpit, p. 106. Sons, 1942, pp. 63-64.
184 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 0 PODER DA CONCLUSÃO

COISAS A EVITAR gritos agudos como de sirene. Outro homem pode começar a bra-
1. Negativamente, nunca peças desculpa. "Uma desculpa rnir como se estivesse bombardeando uma cidade longínqua. Por
causa sempre má impressão e muito mais na prédica, principal- que nao prefere entrar na cidade no começo do sermão e explicar
mente no final. Alguns pregadores de outros tempos tinham esse os fatos àqueles a quem pretende alistar no serviço do Rei?
costume. Depois de Spurgeon ter levado os seus ouvintes a Deus
4. Nunca acrescenta nada de novo impulsivamente. No teu
na mensagem "Canções da Noite", terminou da seguinte maneira:
gabinete de trabalho labuta na preparação da mensagem horas
"Não consigo pregar com tanto ardor como desejaria". Num ser-
seguidas, dedica mais tempo e atenção à conclusão do que a qual-
mão pregado na capela de determinado seminário, o pregador vi-
quer outra parte do sermão, com exceção do texto. No púlpito, ao
sitante fêz tudo adrniràvelmente até chegar ao fim da sua exposição,
aproximar-se o fim do sermão, deverias concentrar todos os focos
quando, esquecido da sua sublime vocação, descuidou-se e, depois
de luz, de modo a incendiar e arder a alma dos ouvintes. Se o pre-
de certa pausa, disse, para terminar: "Não me importa o que pen-
gador se preparou em espírito de oração, deve seguir o plano que
sem de mim ou do meu sermão", o que equivale a dizer: "Esque-
elaborou. O ministro não é guiado e constrangido pelo Espírito
çam-se de tudo acerca de Deus e lembrem-se de mim!" Que egoís-
Santo ao orar e trabalhar no seu escritório? Embora pareça es-
mo visto do avesso!
tranho, o Espírito Santo prefere conduzir de acordo com um plano.
2. Evita anedotas. É possível que, ao começar um sermão em Procura nas Escrituras e verifica se não é assim.
igreja alheia, o pregador julgue necessário aliviar a tensão. Ou 5. Na parte final do sermão, nada faças que distraia o povo.
chegando ao meio do sermão sente que está difícil prosseguir e Para que pegar o hinário, olhar para o relógio ou fazer algo que
em ambos os casos recorre a anedotas. As opiniões divergem quanto chame a atenção para o fato de os minutos irem passando ou para
ao assunto; alguns acham possível falar sobre Deus e seus filhos, a tensão nervosa do pregador? Segue como lema as palavras do
durante vinte e cinco minutos, sem necessidades de intervalos ane- Apóstolo, "Uma coisa faço". Leva cada um dos teus ouvintes a fi-
dóticos, como os que Shakespeare introduziu em Hamlet, tragédia xar a sua atenção no alvo. Convence cada coração a fazer a von-
de três horas de duração. Mas ninguém consegue justificar o uso tade de Deus. Não distraias. Centraliza!
de uma observação frívola no final, quer se trate de tragédia ou de
sermão. O homem que se encontra no púlpito, neste momento não 6. Não uses a mesma espécie de conclusão todos os domingos.
deve nem divertir nem distrair. Como diz Reinhold Niebuhr na A falta de eficiência das palavras finais do orador pode ser provo-
mensagem intitulada "Humor e Fé", pode haver "risos no vestí- cada pela ausência de variedade. Se assim fôr, é porque caiu na
bulo do templo e o seu eco no próprio templo, mas no santo dos rotina. Tentou determinada forma de concluir os sermões e veri-
santos, só devem existir fé e oração, e nunca risos". 10 ficou que tivera êxito, por isso se limita a ela. Consequentemente
as conclusões de sermões sucessivos se assemelharão a peças de
3. Evita o que seja ruidoso. Não há ponto algum no sermão, metal modeladas na mesma máquina. Como o pastor pode evitar
em que o costume dos nossos dias levasse o pastor a gritar, vocife- a monotonia? Estudando conclusões, vendo os vários tipos e usando
rar ou arrancar os cabelos. Deve dominar o corpo, especialmente a imaginação. Que memorize e repita, com frequência, as palavras
quando se aproxima do fim. Mas infelizmente aquele que tem de Sonho de uma Noite de Verão.
mais cuidado com a sua mensagem, pode muito bem trair-se. .. .Tal como a imaginação corporifica
Entusiasmando-se cada vez mais, começa a levantar a voz, até soltar As formas de coisas desconhecidas, a pena do poeta
As transforma em moldes e dá ao nada etéreo
lo Ver Discerning the Signs of the Times, Nova York, Charles Scribner's Sons.
1946, p. 131. uma habitação e um nome.
O HABITO DE ESCREVER SERMÕES 187

cortando pedaços de pano de todos cs feitios e matizes e cozendo-os


nas horas vagas. Nas mãos de alguém de bom gosto esse trabalho
CAPÍTULO XV resultará em algo muito bonito. Não se dará o mesmo se o neto
tentar preparar um sermão da mesma maneira, com retalhos e
remendos. É por causa deste erro técnico que alguns ministros
não gostam de escrever sermões. Nós, que ensinamos homilética e
escrevemos sobre a arte da pregação, somos em parte culpados
O HÁBITO DE ESCREVER SERMÕES disso. Falamos muito a respeito das partes do sermão e quase
nada acerca da maneira de ligá-las umas às outras.
O verdadeiro pregador vê a mensagem como um todo e cheia
O JOVEM MINISTRO SÁBIO habitua-se a escrever um de vida. Antes mesmo de começar a escrever, poderia levantar-se
sermão cada semana. Considera a composição e e proferir o sermão do começo ao fim, como se pregasse a uma con-
revisão desta mensagem como a sua tarefa mais gregação invisível. Ao escrevê-lo, como que vê as faces dos ouvin-
importante. Reserva determinado tempo para escrevê-la — pode tes que terá diante de si no domingo de manhã. Sabe que olharão
ser a manhã de quinta-feira. Em breve verificará que pode traba- para êle porque traz a luz de Deus. Verificará que esta maneira
lhar melhor em determinado lugar e com os mesmos instrumentos. de ver o sermão, como um todo cheio de luz, tende a comunicar
É possível que se habitue, como Woodrow Wilson, a escrever à má- certo sentido de vida e movimento, com um espírito de calor e colo-
quina, mas geralmente o ministro prefere escrever à mão. Quais- rido. Por mais lentamente que o sermão tenha chegado à forma
quer que sejam os pormenores, logo os confiará ao que William final, a mensagem começa a viver e a mover-se. Antes de poder
James chama "custódio sem esforço da automatização". Que é, viver e mover-se dentro das almas dos ouvintes, tem que incendiar
pois, necessário para que o pastor escreva um sermão por semana? e incandescer o coração do próprio pregador.
Tudo isto com o tempo se tornará questão de hábito. O Presi-
dente Eliot costumava dizer, em Harvard, que a melhor educação
A IMPORTÂNCIA DO MÉTODO faz com que o indivíduo consiga os métodos mais convenientes para
o trabalho da sua vida, entre os quais se conta o hábito de realizar
Tenhamos como certo que o ministro sabe o que quer pregar determinada tarefa no momento preciso. Enquanto aguarda o
e por quê. Por mais que escreva, não compensará a ausência da impulso para começar a escrever, o ministro sentirá necessidade
mensagem nem o pensamento obscuro. Suponhamos que êle já de fazer algo agradável. É aqui que podemos aprender com outros
fêz o esboço do sermão e tenha a cópia à mão. Também deveria artistas como, por exemplo, W. Somerset Maugham. Este roman-
ter ao seu alcance todo o material para encher o esboço do sermão. cista às vezes trata de temas sórdidos, mas domina a sua arte como
Ao sentar-se para escrever, o que tomou forma na sua mente e no escritor. Numa autobiografia literária, descreve-nos como trabalha
seu coração, deve poder dizer sem jactância: "Tudo está pronto". a mente de um escritor. Thomas Mann concordaria com a sua
Então escreverá toda a mensagem, de preferência sem interrup- opinião, como também quase todos os grandes escritores dos nos-
ções. Depois de haver aprendido a fazê-lo, sentirá prazer nesta sos dias, os quais atribuem grande importância ao hábito e ao
maneira de proceder. método. Diz Maugham:
É possível que os principiantes trabalhem de maneira diferen- "Nenhum escritor pode escrever só quando estiver com disposição para
te, sem qualquer alegria. Viu sua avó fazer colchas de retalhos, fazê-lo. Se esperar até ter inspiração... esperará indefinidamente e acabará
188 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 0 HÁBITO DE ESCREVER SERMÕES 18!)

por produzir pouco ou nada. O escritor profissional cria a disposição... palavras que nada ajudam a ver, sentir ou agir, mesmo quando se
mas controla-a e subjuga-a à sua vontade, estabelecendo um horário de
referem a hinos cheios de vida e beleza:
trabalho regular. Escrever com o tempo se tornará hábito... Não será
possível escrever bem e muito (ouso afirmar que não se pode escrever "Este hinário foi publicado em outubro de 1895, com um Prefácio que
bom sem escrever muito) se não se formar o hábito", i apresentava os princípios que haviam norteado a sua preparação. Esta
edição em nada difere desses princípios e não modifica o caráter geral
do livro. Foi preparado com um duplo objetivo".
Se o indivíduo se dedicar ao trabalho com toda a sua alma,
tarde ou cedo as suas faculdades acordarão. Antes de desperta-
Este parágrafo não possui ritmo porque seu pensamento se
rem, é provável que escreva palavras e frases que terá de rejeitar
ou talvez reescrever. Mas entregue-se ao trabalho. E em breve, a apresenta destituído de emoção. Que maneira de apresentar um
menos que fique doente ou com os nervos arrasados, o coração co- livro cheio de hinos de louvor a Deus, que é Amor, e a Cristo, que
meçará a pulsar e as palavras começarão a surgir às catadupas. é graça! É pena, também, não pôr o coração na pregação do Evan-
O escritor aproveitá-las-á logo que surgirem, escrevendo-as antes gelho! Quando o pregador puser sentimento no sermão que escre-
que desapareçam. "Escreve depressa", dizia o velho Quintiliano, ve, este começa a adquirir colorido próprio. E, como acontece na
"pois do contrário nunca escreverás bem. Escreve bem e começa- Terceira ou na Sétima Sinfonia de Beethoven, o colorido passa de
rás a escrever rapidamente". uma para as outras partes.
No início da mensagem o pensamento pode sobrepujar o sen-
Escrever bem significa usar ritmo na prosa. Sempre que o timento. Mas logo que o coração começa a dominar, as palavras
coração do indivíduo se move, as palavras tendem a vir em tor- podem tornar-se como as de um poeta. Embora não sigam deter-
rentes; à medida que os pensamentos e sentimentos surgem na minada cadência, as sentenças podem surgir com ritmo muito
mente e no coração, os movimentos tendem a aparecer e desapa- próprio. Como exemplos deste estilo variado, leia em voz alta duas
recer. Às vezes as águas correm suavemente como no "Afton" de passagens de Buttrick. Num dos exemplos trata-se de uma confe-
que fala o poeta, outras vezes as correntes de pensamento e sen- rência sobre a arte do sermão, no outro, de um sermão sobre o
timento são como cataratas, velozes e violentas. Para ver toda mistério da Cruz. Notem-se as variações do colorido:
essa variedade de prosa rítmica, analisa a última parte do livro
de Isaías ou as parábolas de nosso Senhor. Se alguém disser que "O sermão deve ser escrito como sermão, não como ensaio, isto é,
contemplando os olhos da congregação (pensativa, faminta, triste ou ale-
estes escritos são quase poesia, o mesmo deverá dizer da melhor
gremente indiferente) postos no escritor. Haverá dias em que a pena se
qualidade de pregação. De qualquer forma, o escritor ou orador não moverá. Pregar é arte excelsa, análoga ã pintura. Todos os artistas
vê e sente o que pretende que o leitor ou o ouvinte veja e sinta. conhecem ocasiões em que o espírito está inerte e o labor mental parece
estéril. Essas horas mortas, que lutam em vão pela própria vida, podem
Quem quer escrever sermões deve alcançar um sentido de prosa doer mais do que dor física. São a cruz pela qual tão-sòmente, até pregando,
rítmica. Que leia em voz alta o capítulo quarenta de Isaías: "Con- se pode alcançar a ressurreição dos mortos". 2
solai, consolai o meu povo", e o capítulo quinze de Lucas, especial- "Nessa peça de teatro tão estranha, intitulada The Green Pastures,
mente a parábola do Filho Pródigo. Em contraste o estudante pode ouve-se uma voz fora do palco, como que falando em nome de toda a
humanidade reverente: "Que carga terrível para um só Homem levar!"
examinar uma porção de prosa que não flui por falta de senti-
Os pecados de todos! Os meus pecados! Curados não apenas os sintomas;
mento. Num livro velho pode encontrar esta forma defeituosa em curados até à raiz prolunda e amarga, por meio do sofrimento do amor
sofredor de D e u s ! . . . A Cruz não era de madeira: era de pecado. E o

1
The Summing Up, Nova York The Literary Guild of America, Inc., 1938.
PP- 181-182. - Jesus Carne Preaching. Nova York. Charles Scribner s Sons. 1931. pp. 156-
-
190 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O HÁBITO DE ESCREVER SERMÕES 191

pecado e a dúvida se uniram, em trevas imensas, para eclips;>.r a Deus: Esta discussão pretenderá dar preferência ao sentimento e
"Eli, Eli, lema sabactáni! Deus meus. Deus meu, por que me desamparas- desprezar o pensamento? Se a impressão causada fôr essa, exa-
te?". Que carga terrível para um só Homem l e v a r ! " . . . "Em quem ternos
redenção, pelo seu Sangue". 3
minemos os sermões de Horace Bushnell, que atraiu à Igreja do
Norte, em Hartford, intelectuais de toda a cidade e até de muito
longe. Vejamos como os seus pensamentos se revestiam com pala-
Ninguém mais poderia ter escrito estas palavras, pois "o estilo
vras de beleza que penetravam cantando na alma do homem.
é o homem". Mas todos quantos o Senhor chamar para pregarem
Leia-se, por exemplo, a mensagem "Influência Inconsciente", no-
o Evangelho, podem aprender a escrever e a falar com alguma be-
tando a beleza das palavras e a maneira como vão surgindo. Em
leza. Como em qualquer outro género de obra de arte, a beleza em
toda a passagem que se segue, pense-se do cristão em termos de
palavras vem ao encontro daquele que busca algo diferente. Quan-
"luz e não de relâmpago".
do o pastor se debruça sobre a mesa, para escrever um sermão,
tem na mente e no coração a mensagem que deseja apresentar "Atrás da mera aparência, do ruído exterior e do tumulto do mundo,
àqueles que só podem ver com os olhos da alma. Pensa neles e na a natureza sempre esconde a sua mão que domina e as leis por meio das

verdade de que necessitam. Põe em palavras, portanto, os pensa- quais governa. Quem jamais viu, com os seus próprios olhos, ou ouviu,
com os seus próprios ouvidos, o esforço dessa tremenda força astronómica,
mentos e sentimentos que deseja apresentar. Escreve com o ritmo
que a cada momento mantém a máquina do Universo físico? O relâmpago
que está de acordo com a ocasião. Se, pelo contrário, procura beleza é, na realidade, mera centelha sem importância, mas como brilha nas
por amor da beleza, talvez produza um "belo escrito" que chamará nuvens, soa tão terrível aos nossos ouvidos e fende a árvore ou a rocha
a atenção sobre si mesmo, tirando-a do Senhor. sobre a qual tomba. Muitos pensam que êle é agente muito mais poderoso
do que a força da gravidade". 5
Por que realçar a necessidade de beleza? Porque todos os ser-
mões se relacionam com Deus Pai, autor da beleza; com o mara- Todo este sermão impressiona o leitor no dia de hoje em vir-
vilhoso Senhor Jesus, dominador de toda a natureza; ou com o tude da sua beleza. O mesmo se passa com vários outros sermões
Espírito Santo, o doador da Luz. Quer nas Sagradas Escrituras, quer de Bushnell, como o intitulado "A Clemência de Deus": "A tua
no hinário, as palavras que encarnam a verdade sobre Deus não clemência me engrandeceu" (Salmo 18.35c). Esta forma de pre- 6

cessam de vencer o coração do homem, pois os seus autores escre- gar se coaduna com o ensaio do mesmo Bushnell: "O Evangelho,
veram palavras cheias de verdade e beleza. Onde, na Bíblia, no Dádiva para a Imaginação". Por imaginação o autor entende a
7

hinário ou em serrrjões pregados pelos mestres, se encontrará a capacidade de ver o que está oculto aos olhos e dizê-lo com pala-
linguagem imprópria que tantas vezes se usa ao falar de Deus? vras tais que os outros também o vejam". Bushnell, apreciador
A Bíblia e o hinário falam-nos do Senhor como Luz, Vida e Amor, da beleza vinda de Deus, condena escrever de forma fantasiosa, o
como Espírito e Pai, e, no entanto, há quem se ponha a falar acerca que classifica de "faculdade ornamental e própria de cortesãos,
"da objetivação do sobrenatural" e "do exclusivismo do nosso ín- que primam por enfeitar os assuntos com vestes metafóricas alta-
timo". Esses polissílabos mecanicistas nada sugerem sobre Deus, mente elaboradas... Imaginação nada tem a ver com ornamen-
a não ser aquela fealdade que êle abomina. Que semelhantes "pa- tação. É como a beleza que surge como o dia, porque o dia está
lavras" fiquem para as aulas e para os livros! 4

nela".

8 De The Great Themes o/ the Christian Faith. adaptado por Charles W. -"' Scrmons for lhe Neiv Life, Nova York Charles Scribner's & Co.,
PVrguson, Copyright 1930. Harper & Bros., p. 22. p. 139.
* Para tratamento do jargão ver A. T. Quiller-Couch, On the Art of Writing. « Chris: and His Salvalion, Londres, 1871, pp. 18-38.
Nova York, G. P. Putnam's Sons, 1916, pp. 101-105. ' Butlding Eras tn Rctigioii, p. 265.
192 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
O HÁBITO DE ESCREVER SERMÕES
194
O ELEMENTO DE FORÇA
se torna conhecida por meio de palavras? Há, porém, um fato
Toda e qualquer teoria correta da pregação também encoraja que todos podem perceber: o ministro fala uma ou duas vezes por
o homem a buscar viger. O vigor, que também se pode denominar semana em nome de Deus, mês após mês, ano após ano; o orador
energia e poder, está relacionado com a repercussão da mensagem profano, porém, espera que surja uma hora de crise que lhe exija
naquele que a ouve ou lê. Sempre que o ministro escrever pensa- uma obra de arte. É provável que os homens mais eloquentes de
mentos plenos de sentimento, guiado pela vontade que o Rei di- toda a História, como "Demóstenes, Cícero, Burke, Chatham,
rige, as suas palavras penetrarão na consciência e vontade do Webster, Calhoun, Sumner, não tenham pronunciado mais do que
ouvinte ou do leitor. Vida e movimento, calor e colorido, beleza vinte orações durante toda a sua vida. Seria, no entanto, absurdo
vinda da imaginação trabalhando entre as verdades de Deus, tudo imaginar que um ministro não pronunciasse mais de vinte ser-
isto contribui para fazer o ouvinte ou leitor sentir que se aproximou mões por ano". Muitos pastores têm que falar à mesma congrega-
do coração de Deus e recebeu mensagem do trono. Que ideal! ção mais de cem vezes num só ano.

O estilo do sermão difere do de um ensaio. O sermão pretende É possível que um exame da diferença de estilos ajude o jo-
levar a vontade do ouvinte à ação, ao passo que o ensaio ensina vem ministro a não fazer a tentativa de preparar o que Beecher
ou distrai, mas não visa transformar. Quando Thomas Carlyle denominou "sermões teatrais". Se o pastor fosse chamado a ser-
publicou Heroes and Hero Worship assumiu o papel de pregador, vir a Deus como orador político, talvez fizesse bem em tentar pre-
mas ai da Igreja cujo pastor se torne autor de ensaios. Por mais parar alguns grandes discursos, embora o maior dos oradores sacros
belas que as águas de um lago pareçam, aquecidas pelo esplendor da história americana advertisse os jovens ministros a não pen-
do céu, precisam de escoamento. O mesmo acontece com o mais sarem em termos de "grandes sermões". Decerto lamentaria a
belo sermão que já tenha saído de coração e de lábios humanos. tendência, que em nossos dias se manifesta, de dar importância
Consideremos, pois, a beleza como maneira de glorificar a Deus, à grandiosidade dos sermões e não ao seu valor profundo.
não como objetivo em si. Não foi sempre assim no ensino e prega-
"Grandes sermões, caros jovens, são sem valor em noventa e nove por
ção de nosso Senhor? cento dos casos. São como torres sem sinos, como algo que se ergue nas
Também a forma literária da mensagem do púlpito é diferente alturas, servindo como ornamento, atraindo a atenção, mas sem tocar nem

da de um discurso profano. Por que o ministro está atrás do Livro auxiliar ninguém... Grandes sermões virão naturalmente quando forem
dignos. Não os busqueis intencionalmente... Não creio que homem algum,
e o mantém aberto? Porque aquele que está atrás do Livro fala
que fêz um grande sermão, se tenha proposto a fazé-lo. 8
em nome de Deus: "Assim diz o Senhor". O intérprete da verdade
divina levanta-se com mensagem e poder que não são seus. O ideal
Por que, em vez de falar de grandes sermões, não lhes cha-
seria que não atraísse a atenção sobre si mesmo ou para suas pa-
mar bons, na medida em que a mensagem torna as pessoas boas,
lavras. Deseja, realmente, que todos contemplem o Rei e que cada
conduzindo a Cristo aqueles que O buscam e levando para junto
coração O receba agora. De quando em vez, em momentos que não
do Pai todos quantos anelam por conhecê-10 melhor e amá-lO mais?
pode prever, talvez voe com asas de águia até se aproximar das
Um bom sermão faz com que os homens e mulheres se sintam
estreias e contemplar visões que jamais havia visto na terra, mas
desejosos de fazer a vontade de Deus e diz-lhes como consegui-lo
quanto mais se aproxima das portas do céu, mais seu estilo difere
Consideremos Brooks como exemplo deste conceito de conteúdo e
do de um simples conferencista.
estilo. Nos seus sermões podemos encontrar toda sorte de mensa-
Quem poderá dizer onde está a dificuldade? Como poderá o
estudante de homilética penetrar o mistério da personalidade, que
As Yale Lectures on Preaching, primeira série, pp. 32 e 226.
jg£ A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

gens que encarnam as ideias do presente capítulo. Eis o que êle


aconselha aos jovens ministros:
CAPÍTULO XVI
"Nunca toleres no teu sermão aquela ideia de dignidade que faz com
que não digas o que tens a dizer ou que o teu povo deve o u v i r . . . Os
sermões de que ninguém fala, os sermões que vêm da mente e do coração
e vão para os corações e mentes dos ouvintes sem que se apercebam bem
que passaram pela língua e pelo ouvido, são esses os sermões que operam,
que tornam os homens melhores e penetram as suas afeições. São como AS CARACTERÍSTICAS DO ESTILO EFICIENTE
dias perfeitos quando... o homem fizer o melhor possível e sentir mais
abundantemente que grande bênção é a v i d a " . »

ESCREVER SERMÕES REQUER habilidade de artista no


LEITURAS SUGERIDAS
uso das palavras. Pode-se oferecer ao mesmo tempo
Donnelly F. P., The Art of Interesting, Nova York, J. P. Kennedy and Sons, 1920. vida e movimento, calor e colorido, beleza e força.
Hoyt, Arthur S., The Work of Preaching, Nova York, The Macmillan Co., 1917.
Tudo isto depende, depois de Deus, da personalidade do pregador,
Mather, Frank J., Concern-ing Beauty, Princeton, Princeton University Press, 1935.
e a personalidade é como o mercúrio, sempre nos escapa. Mas agora
Oman, John, Coneeming the Ministry, Londres, 1936.
Saintsbury, George, A History of English Prose Rhythm, Nova York, The Macmillan
consideraremos algo mais tangível. Nem todos os jovens ministros
Co., 1922. sabem preparar sermões com todas as qualidades, pelo menos não
uma ou duas vezes por semana. Porém, todos os pregadores prin-
cipiantes podem habituar-se a examinar a sua obra, tentando
melhorá-la cada semana. Que tomem como lema as palavras de
Paulo ao jovem Timóteo: "Procura apresentar-te a Deus aprovado,
como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem
a palavra da verdade". (2 Tm 2.15).
Como, pois, deve o pastor fazer a crítica de seu sermão escrito?
Coloquemos o problema em termos simples e francos. Submeta a
primeira redação de seu trabalho à mais simples e fácil prova, a
da clareza. Clareza é aquela qualidade que torna um escrito ou
discurso compreensível a qualquer leitor ou ouvinte. Quem co-
nhece bem o meio eclesiástico, sabe que muitos dos leigos mais
inteligentes não conseguem entender os sermões. Um pastor ouviu
esta referência a respeito de colega seu, que tinha fama de ser
muito competente: "A maior parte das vezes não sabemos aonde
quer chegar e até nos admiraríamos se êle próprio sabe!"
Joseph Fort Newton, na sua autobiografia, cita o reitor de
grande universidade:
"Foi este o primeiro sermão, num grande período de tempo, que con-
segui entender. Há os que aqui vêm argumentar acerca de Deus, tentando
•'> Lecíures on Preaching, p. 151.
AS CARACTERÍSTICAS DO ESTILO EFICIENTE 197
106 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

provar o que ninguém pretendeu negar, enquanto eles não tiveram a ideia de pensamento ultrapassar muito as cem palavras, a obra tornar-
de prová-lo. Como leigo, não sei muita teologia, mas você falou acerca -se-á pesada. Se o parágrafo tiver menos de cem palavras, o seu
da v i d a M efeito talvez se enfraqueça. Dentro deste limite o escritor e o orador
podem desenvolver uma única ideia. Se quiser dizer mais, pode
É possível que aqueles pregadores visitantes se esforçassem formar outro parágrafo. Isto pode dar a impressão de trabalho
por parecer doutos, mas não sabiam fazê-lo, limitando-se a remexer mecânico, mas a mesma coisa se passa no que concerne à extensão
o lodo. No mesmo livro Newton conta como teve a oportunidade das estrofes de um hino.
de observar, pela primeira vez, como é importante a clareza para o Cada um dos parágrafos deve principiar com uma proposição
homem e mulher normais. Verificou que essa virtude requer muito clara e vigorosa. O resto das cem palavras explica e reforça a ideia
mais talento e trabalho do que a sua ausência. contida na sentença inicial. Depois da última revisão, quando o
O observador pessimista diria que os que vão à Igreja apro- pregador passar os olhos pelo manuscrito antes de pregar, pode
veitam apenas dois por cento da pregação. Agora que os psicólo- julgá-lo olhando as proposições principais. Se costuma pregar
gos começam a estudar a reação do auditório nas igrejas, é possí- com esboço, pode anotar as primeiras palavras de cada parágrafo,
vel que aquela proporção suba, mas não muito. Aconselhariam e, se quiser ter à sua frente um esboço mais detalhado, tomará
o pastor a recolher-se ao seu gabinete de trabalho e examinar cui- nota do início e do final de cada unidade. Um bom parágrafo
dadosamente a sua obra. Como? Num de seus últimos livros, começa com clareza e termina com força. O que vem entre a pri-
embora nada tenha diretamente com a religião, Rudolf Flesch nos meira e a última frase garante a unidade. Leiamos em voz alta,
dá a resposta como especialista. O autor ignora a beleza das pa- como exemplo de semelhante parágrafo, o discurso de Lincoln em
lavras escritas e entra em cálculos matemáticos que não nos in- Gettysburg. Ou melhor ainda, dividamo-lo em duas partes, cada
teressam aqui. Fora disto os princípios que sugere poderão uma com pouco mais de cem palavras.
orientar qualquer pastor a testar seu estilo de pregação. 2

Dentro do parágrafo dá atenção às sentenças. São claras e


Se o pastor pretende que tudo fique claro no sermão, tem que, fáceis de seguir? O mesmo assunto é tratado nas várias sentenças,
em primeiro lugar, estar certo do seu objetivo e depois ter senso ou o pensamento salta de um lado para o outro, como bola de ténis
de direção. Tem que aprender a expor e explicar, descrever e num jogo de campeões? Mantém-se o tempo dos verbos ou cons-
discutir. Às vezes terá que repetir e talvez contar uma ilustração. trange-se a atenção dos ouvintes a passar do passado para o pre-
Como exemplo de elareza examine Macaulay, em cuja prosa a cla- sente e do futuro para o passado? Quantas vezes o orador espera
reza de redação é fruto da clareza de pensamento. Infelizmente, que os ouvintes mudem a marcha do câmbio mental? Naturalmente
porém, nem sempre a clareza de pensamento leva a escrever e tantas quantas forem necessárias para lhe acompanhar o pen-
falar claro. É por isso que o ministro precisa examinar com o má- samento, mas o orador sábio evitará mudar o rumo do pensa-
ximo cuidado a primeira redação do sermão. mento dentro do mesmo parágrafo. Naturalmente alguém que-
É possível que a revisão comece logo no primeiro parágrafo. rerá manejar estas sugestões sem habilidade, como maneja o mar-
Na prosa hodierna o escritor ou orador competente presta grande telo. Mas se o pregador trabalhar cuidadosamente como um ar-
atenção aos parágrafos, dando-lhes sensivelmente o mesmo trata- tista se afadiga na pintura de um quadro, antes de considerá-lo
mento que o compositor de um hino dá a cada estrofe. Os pará- pronto, os parágrafos e sentenças sairão cristalinos.
grafos devem ter mais ou menos cem palavras. Se cada unidade A última sentença de cada parágrafo deve preparar o cami-
nho para o parágrafo seguinte, cuja frase inicial deve relacionar-
» River of Years, Filadélfia, J. B. Lippincott Co., 1947, pp. 244-245. se com aquela. Então as partes sucessivas constituirão uma
2 Ver Rudolf Flesch, The Art of Plain Talk, Nova York, Harper & Bros., 1946.
AS CARACTERÍSTICAS DO ESTILO EFICIENTE 199
198 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

cadeia de pensamentos, que nunca se quebra do começo ao fim do palavras numa sentença, ao passo que Flesch recomenda não pas-
sermão. Para falar e escrever dessa maneira requer-se o uso de sar de dezessete. Atualmente se exigem sentenças mais curtas do
3

que outrora, mas também não picadas


toda espécie de conectivos, exceto os conspícuos. Como elementos
de ligação estas palavras e frases mostram a transição entre os 4. Dentro da sentença observa a sequência de ideias, manten-
parágrafos e às vezes entre as sentenças. Elementos de ligação do o alvo em mira. Não digas: "Quando o povo se reunia para o
serão mais frequentes nos sermões didáticos do que nos inspi- culto foi vista uma bela Cruz". A atenção deve ser atraída ou para
radores. o povo ou para a cruz. Usa o verbo ativo para expressar a ação:
"Quando o povo se reunia para o culto, contemplava uma bela
Nenhum pregador jovem deveria tentar pôr em prática todas Cruz". O hábito de mover a mente sempre na mesma direção con-
as sugestões abaixo numa só semana. Com o correr do tempo, tribui para evitar equívocos. Talvez tenha de corrigir no boletim
porém, o ministro encontrará nelas ajuda para assegurar a cla- da Igreja um item do secretário: "Na Sociedade de Senhoras,
reza de sua linguagem. quinta-feira última, a senhorita Minerva Brown falou sobre "De-
1. Nada de rodeios dentro de uma sentença. Conserva-te mónios Pessoais". Sessenta e cinco estavam presentes".
dentro do assunto e foge dos parênteses como o seguinte, usado por
alguém que talvez pensasse tornar a frase mais profunda: "Ao
escrever um tratado, o douto autor (sabendo que o leitor pode APELO AO INTERESSE
voltar atrás e ver onde deixou de compreender) pode — como um
dramaturgo em "apartes" — empregar parênteses como este, em- Poderíamos continuar pensando a respeito da clareza no uso
bora duas vezes mais longos e tortuosos". de palavras. Consideremos agora, porém, o interesse humano e
verificaremos que é bem mais importante, embora mais difícil de
2. Mantém o sujeito perto do predicado. Com a idade os mi- alcançar. Desnecessário é dizer que as duas expressões se sobre-
nistros têm a tendência de introduzir cláusulas explicativas, e põem, pois clareza e interesse estão relacionados com palavras,
assim tornar-se cada vez menos compreensíveis. Ao chegar ao sentenças, parágrafos e sermões inteiros. Mas às vezes as preten-
meio da sentença, que serpenteia por cima dos montes como linha sões da clareza e do interesse podem parecer em conflito. A cla-
de trem, já não sabe onde deve terminar. Se o leitor pensa que reza pode exigir sentenças curtas, mas uma série delas, muito
aprendeu a não divagar, adquira um gravador de som e grave seu semelhantes, podem tornar-se monótonas. Se o uso de sentenças
sermão e orações do domingo seguinte. Só pregadores excepcio- curtas começar a atrair a atenção, é porque o pregador as usou
nais conseguem dirigir o culto público durante uma hora, sem demais. Em suma, nada de exageros.
usar sentenças vacilantes ou fragmentadas.
Qualquer criança de dez anos pode fazer sentenças curtas, só-
3. A maioria das frases devem ser curtas. Para citar Flau- lidas e firmes como estacas numa cerca. Mas quem conhece sua
bert, mestre do conto: "Não emprega ponto e vírgula. Sempre Bíblia pode usar sentenças com o colorido do que deseja dizer. Algo
que fôr possível encurta a frase. E sempre é possível fazê-lo. com o equilíbrio do paralelismo hebraico, como Nosso Senhor fêz
Qual a melhor sentença? A mais curta!" No trabalho de um igno- ao falar sobre os tesouros da terra e os do céu. Robertson às ve-
rante sentenças curtas podem dar margem a disparates e barba- zes pregava assim, apenas por variedade. Como exemplo tomemos
ridades. Mas por que o ignorante haveria de tentar pregar? Mesmo a seguinte sentença a respeito da Grã-Bretanha: "O rei tem gló-
que o fizesse, não escreveria e revisaria cuidadosamente seus ser-
mões. Só o pregador sábio o faz. Gossip às vezes usa mais de cem 3 Ibid., pp. 31-39.
200 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES AS CARACTERÍSTICAS DO ESTILO EFICIENTE 201

ria sem muito poder, o primeiro ministro tem poder sem muita dução ou aquisição de riquezas é o objetivo desta vida, então a
glória". humanidade inevitavelmente tem de descer à escorregadia escala
Assim Robertson emoldurava muitas de suas sentenças, por- das mercadorias". Com mais concisão, diz a um principiante certo
que sua mente e coração permaneciam em verdades que contraba- concertista: "Se te sentires nervoso ao te levantares para cantar,
lançavam. Exemplo mais recente desse estilo é parte de um sermão inspira lenta e profundamente por três vezes". Também tu, jovem
de Henry Van Dyke. Falando na capela de uma universidade ministro, se queres aumentar a variedade e a força de tuas pala-
sobre o "Significado da Varonilidade", escolheu o texto: "Quanto vras, exercita-te no domínio dos períodos, ainda que seja apenas
mais vale um homem que uma ovelha?" (Mt 12.12). para alcançar variedade e suspense. 5

"Quanto mais vale um homem?", perguntará o observador curioso. O parágrafo final do sermão de Van Dyke, acima citado, ilus-
"Este homem" — dirá o administrador de uma empresa, "vale um milhão tra outra regra essencial: uma série de sentenças semelhantes às
de dólares, mas o que está ao seu lado não vale um tostão."...
vezes atinge maior eficiência do que número igual de frases di-
Que pode este homem fazer? Quanto fêz? Que posso fazer com o seu
ferentes. Note-se, no apelo a seguir, o uso do paralelismo, a se-
trabalho? Quanto é que aquele homem pagará pelo meu trabalho?...
Os meninos que brincam na rua nada são para mim nem para o mundo:
renidade do ritmo, a repetição da ênfase e o propósito de terminar
não têm valor. Essas ovelhas grandes e gordas que comem nos meus antes que a repetição canse. Observe-se também, nesse trecho de
pastos são o que de mais valioso possuo. Dar-me-ão grande lucro! São Van Dyke, como esse príncipe do púlpito falava ao coração dos
valiosíssimas. "Quanto mais vale um homem do que uma ovelha?". Que universitários:
pergunta tola! Às vezes o homem é melhor, outras vezes a ovelha. Tudo
Portanto, vem a Cristo, pois só Êle te pode salvar do pecado que desfibra
depende da procura e da oferta". 4
e destrói a hombridade. Portanto vem a Cristo, pois só Êle te pode fazer
bom e varonil, vivendo no poder da vida eterna. Portanto vem a Cristo,
O uso do paralelismo em toda obra literária requer capacidade para teres comunhão com Êle e saberes o que significa ser homem"
e prática. O domínio dos períodos é uma das melhores provas de
instrução e cultura. Nos nossos dias, porém, muitos saem da uni- "Que significa ser homem!" Que final excelente para uma
versidade sem ter ouvido falar no assunto. Quando o aluno do mensagem sobre o "Significado da Varonilidade!" A capacidade
seminário quiser saber o que isto significa, o professor poderá citar: de falar com clareza e interesse depende quase tanto do domínio
"Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver das palavras quanto do das sentenças. "Nenhum material com
amor, serei como q bronze que soa" (1 Co 13.1). Se o apóstolo que seres humanos trabalham tem tanta energia potencial como
tivesse parado aí, teria usado a estrutura periódica, mas a sentença as palavras". O ministro pode impor-se a disciplina de falar cor-
prossegue com outra oração que lhe acrescenta mais encanto: "ou retamente e com precisão, sem pedantismo, mediante o uso cons-
como o címbalo que retine". No verso como um todo note-se a tante do dicionário e a leitura de bons autores. Êle sabe que "pou-
aliteração e a assonância, o ritmo e a repetição enfática. co" está relacionado com número e "menos", com quantidade;
Lendo ou pronunciando um período, o pregador deve susten- que o fazendeiro "semeia" trigo e "planta" milho, mas nunca dá
tar a voz até que surja a palavra que completa o seu pensamento, "forragem" às ovelhas. No boletim da igreja, ou em qualquer ou-
no caso presente, bronze. Na prédica 4e Van Dyke o uso de sen- tro lugar, o pastor evita referir-se a "Reverendo Jones" em lugar
tenças combinadas às vezes leva à formação de períodos. Um de "O Reverendo John Henry Jones", "O Rev. Dr. Jones" ou oca-
exemplo: "Se a riqueza é realmente a medida de valor, se a pro- sionalmente "Rev. John H. Jones".

* W. H. Sallmon, ed., The Culture of Christian Manhood, Nova York, F. H. 8


Para discussão de sentenças ver Reed Smith, Leorning to Write in Coítese,
Revell C o , 1897. Boston, Little, Brown & Co., 1939, pp. 69-87 e 188-235.
202 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES AS CARACTERÍSTICAS DO ESTILO EFICIENTE 203

O interesse humano é ainda mais importante do que essa cou o que denominou "tradução elegante" da parábola que melhor
precisão de termos. Se o pregador quer atingir maior número de conhecemos e mais amamos. Notemos neste excerto a escassez de
pessoas, enriqueça o vocabulário. Enquanto o principiante usa a
palavras com vida e procuremos as "fátuas". Veja-se como os adje-
descolorida palavra "grande", para descrever tudo, desde sonetos
tivos enfraquecem o efeito nos pormenores e estropiam a figura
até ciclones, Bushnell e Gossip prefeririam o uso de palavras com
no seu conjunto:
vida, palavras de ação, palavras de fatos, palavras "com pés e
mãos". Usando palavras com vida, o orador pode mostrar ao ou- U m cavalheiro de boa família e muito rico tinha dois filhos. Certo
dia o mais novo aproximou-se do pai e pediu-lhe, em termos importunos
vinte uma série de figuras animadas. Para exemplos de palavras
e aveludados, para fazer a partilha dos seus bens, entre êle e seu irmão mais
com vida vamos aos ensinos do Senhor, especialmente à parábola
velho. O pai indulgente, vencido pelas lisonjas, dividiu imediatamente toda
dos dois construtores: "Todo aquele, pois, que ouve estas minhas sua fortuna entre ambos.
palavras e as pratica será comparado a um homem prudente que
edificou a sua casa sobre a rocha; e caiu a chuva, transbordaram Hoje em dia só um pedante recorreria a tal ostentação. En-
rios, sopraram ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, que tretanto, com jargão todo próprio de nossos dias, podemos tornar
não caiu, porque fora edificada sobre a rocha" (Mt 7.24-25). lugar-comum e irreal o filho pródigo e seu irmão mais velho. Mes-
Notemos, nestas poucas dezenas de palavras, o tríplice apelo mo quando nos referimos ao pai, que perdoou a seu filho mais mo-
à vista, ao sentido, à ação. Nelas um estudante achou quinze pa- ço podemos falar em termos de "reação", "caracterização", "reali-
lavras com vida, ou seja, uma em três. Apesar do número, nisto zação" e "implicações". Podemos esmerar "particularmente" —
ultrapassam muitas páginas de sermões em prosa. Observe-se uma palavra muito difícil de articular. Em outros contextos po-
ainda como o Mestre reforça o efeito do que diz repetindo as pala- demos nos referir a "este mundo convulsionado pela guerra", "a
vras, agora na forma negativa, sobre casa edificada na areia. Fi- distante frente de batalha" e "não necessita de apresentação".
guradamente fala sobre um construtor e não sobre oito ou dez, e Por que deveria um homem educado recorrer sempre a chavões?
sobre esse no trabalho, não descansando. O Mestre também acen- Um ministro sábio pode instituir, embora protestante, um Index
tua substantivos e verbos, especialmente verbos ativos. Com exce- Purgatorius, pelo menos pode seguir a determinação de Alexander
ção da expressão "homem prudente" e "homem insensato", cada Pope:
uma delas designa um único construtor e não emprega adjetivos
Em palavras, como em modas, mantenha a mesma regra
descritivos nem advérbios. Consegue, por meio desse emprego
Tanto no fantástico como no demasiado novo ou antigo:
artístico das palavras, alcançar beleza semelhante à de um arco-
Não seja o primeiro a tentar a novidade,
íris depois da tempestade:
Nem o último a abandonar a antiguidade.
Deus teceu teias de encantamento
De nuvens, tempestades e pássaros; Felizmente nenhum ministro necessita de todos estes conselhos.
Mas nada fêz tão belo e harmonioso Se o jovem formou seus hábitos certos no colégio e no seminário,
Como são as palavras. G a maioria destes problemas se resolvem por si mesmos. Em lugar
desta disciplina no passado, o pregador moço pode ter necessidade
Em contraste falemos agora como não usar palavras. Em de reexaminar seus modos de usar palavras, sentenças e pará-
1768, um "erudito" em Novo Testamento, Edward Harwood, publi- grafos. O homem, cuja alocução no púlpito tende a ser simples
e monótona, precisa descobrir modos de prender a atenção; en-
e Anna Hempstead Branch, The Shoes That Donced, Boston, Houghton Mifflin,
1005, p. 156. quanto aquele que sabe fascinar o ouvinte, apenas para deixá-lo
204 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

confuso, necessita lutar pela clareza. No púlpito o interesse hu-


mano importa muito mais que a simplicidade, mas mesmo assim
muito pregador interessante deveria estudar as palavras de nosso
CAPÍTULO XVII
Senhor: "Mas o que foi semeado em boa terra é o que ouve a pala-
vra e a compreende". (Mt 13.23).
Algum pastor deseja sentir prazer em escrever um sermão por
semana? Então tome a determinação de preparar cada mensagem
tão bem quanto sua habilidade permitir. No serviço de nosso Rei, A PREPARAÇÃO PARA ENUNCIAR
qualquer que faz bem as coisas começa a gostar de fazê-las e
qualquer que gosta de fazê-las tende a fazê-las bem. "Aprender
a escrever pode ser coisa séria, mas não precisa ser solene". Quanto A EFICÁCIA POPULAR DA obra de um homem no púl-
à habilidade de escrever facilmente, e às vezes com um toque de pito depende de sua eloquência. O valor espiritual,
distinção, tudo isto vem ao homem que vive rodeado de bons livros, depois de Deus, nasce principalmente no propósito
especialmente poesia, e escreve algo todo dia — mesmo que seja de orador e no conteúdo do sermão, mas aos olhos de muitos
uma oração. "Escreva muito se desejar escrever bem". leigos nem o propósito nem o conteúdo importam tanto quanto
.__ ^ u e
Transformar maçada em prazer! Mesmo que este
i d e a l !
a eloquência. Em outros tempos prevaleceu o mesmo modo de
ideal fuja ao alcance da pessoa, o esforço lhe trará satisfação. sentir. Por exemplo, de acordo com certo hábil editor metodista,
Como as biografias de incontáveis artistas tornam claro, todo que estudara a oratória no correr da história, George Whitefield
homem que quiser ter facilidade de expressão, precisa mourejar tornou-se mais popular do que poderoso como pregador, e John
na sua tarefa. Por exemplo, quando o ainda moço John Masefield, Wesley, mais poderoso do que popular. Whitefield sobressaiu-se
1

posteriormente poeta laureado, observou um veleiro navegando, na enunciação de sermões e John Wesley na maioria dos outros
cantou sobre o efeito na sua facilidade de expressão: aspectos da pregação. De que outro modo poderia Whitefield ter
Quando eu vi movido multidões às lágrimas, com um sermão falado, que agora,
Seus mastros soberanamente cruzando o rio, em forma impressa, parece lugar-comum?
Construído em meio a tanto caos ordenado, Estes dois homens ilustram a definição da pregação como
Aprendi a força de saber como formular, verdade por meio de personalidade: em Wesley salientou-se a ver-
De ajeitar o pensamento em linha perfeita; dade e em Whitefield a personalidade. No púlpito atual a verdade
Jurei tornar meu este poder de beleza. 7
ainda se faz ouvir somente de dois modos, tecnicamente conhecidos
como homilética e oratória. Dos dois, como Whitefield e outros
LEITURAS SUGERIDAS mostraram, a oratória tem mais relação com a eficácia popular.
Chrisman, Lewis H., The English of the Pulpit, Nova York, Geo. H. Doran Co., Se a maioria dos leigos tivesse que escolher agora entre um mi-
192*.
nistro que fala bem, mas que não brilha homilèticamente, e um
Hollingworth, H. L.. The Psychology of the Audience, Nova York, American Bock
Co., 1935.
que se sobressai na feitura do sermão, mas não como orador, eles
Smyth, J. Paterson, The Preacher and His Sermon, Nova York. Geo. H. Doran Co.,
prefeririam o primeiro. Por isto o ministro jovem deve dar graças
1922.

i Ver J. M. Buckley, Extemporaneous Oratory, Nova York, Methodist


7
Da versão original cie Danber.
Concern, s. d., p. 363. Ver também Ez 33.30-33.
206 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREPARAÇÃO PARA ENUNCIAR 207

por achar mais fácil sobressair-se como orador, do que como mestre de Deus em tempos antigos pregaram sem notas, deveria criar
na arte de preparar sermões. Naturalmente o ideal seria que a pressuposição em favor deste método atualmente. De que outra
ambos os tipos de trabalho estivessem tão unidos como marido maneira qualquer ministro pode falar mais naturalmente?
e mulher, que ninguém pode separar. A pregação sem notas assume várias formas. Aqui nos refe-
Observemos um pastor jovem no estudo de sexta-feira ou sá- rimos apenas a uma, que exige domínio do plano do sermão e
bado de manhã e vejamos como prepara a entrega da mensagem memorização de apenas algumas sentenças. Como Alexandre
para o culto seguinte. Como homem sábio êle divide equitativa- Maclaren, Charles R. Brown, antigo deão de Yale, confia à memória
mente seu tempo de estudo, pois pertence a Deus e ao povo. Pelo apenas as primeiras e últimas quatro sentenças do sermão. Sem
menos nos primeiros anos, enquanto aprende sua arte, o pregador dúvida também tem em mente alguns outros pontos de referência,
jovem deve dedicar quinze a vinte horas semanais à preparação que deseja salientar durante a enunciação. Por outro lado, planeja
do sermão. Fosdick relata que durante anos gastou, na preparação, proferir palavras que brotem do coração, quando começar a falar
uma hora para cada minuto de elocução e noutra parte refere-se em Deus. No estudo saturou tanto o coração como a mente com
a um sermão — não radiofónico — de trinta e cinco minutos. a verdade e o dever que deseja partilhar com seus amigos leigos
Nem todo ministro jovem pode dar tanto tempo à preparação do e no púlpito confia em Deus para suprir o restante em forma de
sermão, mas o exemplo sugere um ideal de trabalho: devotar sufi- palavras. Que modo natural de falar do púlpito e que modo
ciente tempo ao estudo para preparar qualquer mensagem. difícil de preparar-se no estudo!
Como se deveria distribuir estas horas entre homilética e ora- Este tipo de entrega exige habilidade e coragem. A habilidade
tória? Muitos que ensinam a primeira advogam mais tempo e aparece no estudo, não no púlpito, pois o homem sábio não chama
atenção à preparação da entrega. Não ousamos estabelecer regras a atenção para o modo pelo qual fala. No escritório êle planeja
como as dos medos e persas, mas desejamos que cada pastor jovem a rota e estuda cuidadosamente o caminho, de modo que poderá
comece com o hábito de devotar todos seus dons, dados por Deus, segui-lo facilmente se sua visão começar a turvar no começo do
à preparação para a entrega de cada sermão. Já no curso do sermão e não clarear até que termine, ou, no culto da noite, quando
seminário, quanto mais cedo melhor, o estudante deve decidir qual as luzes apagarem ao começar e só voltarem durante a bênção.
dos quatro métodos adotará. Em todo caso poderá encurtar o sermão, mas não porque tenha
perdido o caminho "em meio à escuridão reinante". Mesmo nos
melhores edifícios as luzes podem apagar-se sem aviso prévio, em
OS QUATRO MÉTODOS DE ENTREGA horas inconvenientes. Às vezes mesmo o mais circunspecto pre-
gador, que usa óculos, precisa começar a falar sem eles. Então
1. Pregação sem notas. Este modo de enunciar aparece entre êle agradece a Deus por ter-se preparado para pregar sem notas.
todos os profetas e apóstolos, para não mencionar nosso Senhor. A coragem aparece quando alguém vai ao púlpito sem qualquer
Quando Isaías ou Paulo leram a mensagem de um rolo ou a repe- papel e confia no Senhor para guiá-lo na entrega da mensagem
tiram de cor, ao invés de falar de coração para coração e olho que preparou. No santuário tal ministro esquece tudo sobre seu
para olho? O mesmo é verdadeiro para seus sucessores até tempos treino de homilética e oratória. Durante as primeiras partes do
relativamente modernos, pois só depois da Reforma que número culto público não necessita pensar no sermão. Na verdade nem
considerável de pregadores conscienciosos começou a adotar outras pode fazê-lo, se está unido com os outros filhos de Deus no culto
maneiras de elocução. Embora a tradição profética e apostólica corporativo. Quando afinal começa a pregar, seus joelhos podem
não tenha para nós força de lei, o fato de que os maiores arautos tremer e seu pulso bater mais forte, mas êle encara tudo isto
208 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREPARAÇÃO PARA ENUNCIAR 200

como teste de coragem. Por que deveria um homem de valor Igreja Católica da França, durante o século XVII, houve um grupo
furtar-se ao trabalho que considera pesado? de oradores sacros que se tornaram famosos em grande parte por-
Este modo de pregar, depois de preparação cuidadosa, apela que pronunciavam seus sermões memoriter. Também em púlpitos
à maioria das pessoas que atualmente vão à Igreja. Se um homem protestantes este género de oratória sacra foi mais comum do que
mais velho tem algo a dizer e sabe pôr o sermão no papel, alguns muita gente imagina.
de seus ouvintes não se opõem a que use notas, ou mesmo à sua Poucos ministros há, no entanto, que possam confiar em tal
leitura do manuscrito. Entretanto, a maioria dos leigos acha que poder. Beecher, por exemplo, sempre afirmou possuir fraca me-
o ministro tem toda a semana para se preparar e que deveria mória verbal. Na Catedral de Glasgow, Lauchlan Maclean Watt
falar como um advogado no tribunal, que pode argumentar du- afirma não poder confiar na sua memória para reproduzir em
rante uma hora sem nenhum manuscrito ou nota. Na linguagem público o mais simples dos hinos, por melhor que o saiba em sua
vernacular de um velho madeireiro de Virgínia, um caçador com casa. Se houvesse um tribunal eclesiástico que obrigasse os mi-
vista aguda e mão destra "atira sem parar". nistros a decorar os sermões, palavra por palavra, alguns dos mais
famosos pregadores teriam que sair da Igreja. Todos nós pode-
Neste julgamento sobre a entrega mais eficaz, os psicólogos
ríamos confiar mais na memória se a exercitássemos com mais
concordam com o povo comum. Estudiosos especializados em psi-
frequência, no entanto os psicólogos descobriram que a capacidade
cologia da atenção descobriram nos laboratórios, que a boa ora-
para memorizar e para reproduzir é diferente de indivíduo para
tória não interpõe barreiras entre o orador e o ouvinte. Se a lín-
indivíduo, de acordo com a sua maneira de ser. Como nos diz
gua e os olhos podem agir em conjunto para dar forma real à
o Apóstolo, nós ministros "temos este tesouro em vasos de barro"
verdade de Deus, por que permitir a intervenção de um pedaço de
(II Co 4.7), o que às vezes significa que Deus abençoa a pregação
papel? Lembre-se que a mente do ouvinte tende a seguir o olho
do indivíduo sem capacidade fenomenal para decorar. De qualquer
do orador. Por que então olhar para o papel em lugar do audi-
modo, por que não tentar falar sem notas?
tório? De acordo com um grande mestre de arte, pedaço de
papel na mão ou manuscrito no púlpito "põe um borrão no olho", 3. Pregar lendo um manuscrito. Na história da pregação,
em lugar de uma figura na alma. Entretanto, quando alguém desde a Reforma, vários príncipes do púlpito leram os seus sermões.
lê uma lição da Sagrada Escritura, deveria chamar a atenção para Alguns como Hooker, Taylor, South, Newman, Liddon, Farrar, Jo-
o que lê e não para si mesmo. nathan Edwards, Channing, Bushnell e George A. Gordon, entre
outros de nossos dias, chegaram a ler palavra por palavra. Alguns 2

2. Falando de memória. Que dizer do jovem que não tem


dos sermões que mais apreciamos de fato foram lidos de um manus-
habilidade suficiente para preparar e coragem suficiente para pre-
crito. Sempre que John Henry Jowett ou Henry Van Dyke subiam
gar sem notas? Então êle pode confiar o sermão à memória pa-
ao púlpito, liam os seus sermões. Ah, mas como liam! Em Har-
lavra por palavra, pelo menos imperfeitamente. Em certos casos
vard, o catedrático de oratória costumava mandar os alunos à
este método está de acordo com o funcionamento mental, que pode
capela ouvir Van Dyke como modelo de oratória. De quando em
ter poderes quase fotográficos. Neste caso o amigo durante o es-
vez, esse magistral orador olhava para o sermão escrito, talvez para
tudo poderá escrever sua mensagem, revisá-la com cuidado e então
verificar o começo de novo parágrafo, mas em geral encarava os
lê-la uma ou duas vezes, sabendo que no púlpito sua memória o
possibilitará a reproduzi-la toda verbalmente. Se tiver aprendido
a falar naturalmente, não como fonógrafo ou papagaio, é possível - Para uma lista de pregadores com diferentes métodos ver John M. English.
Por Pulpit and Platjorm, Nova York, The Macmillan Co., 1919, cap. V, especial-
que atinja alturas que outros pregadores raramente alcançam. Na mente pp. 77-78.
210 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREPARAÇÃO PARA ENUNCIAR 211.

ouvintes. Por isso podia muito bem ter falado de notas que conti- estudo e não envolve tanta tensão nervosa no púlpito. Notas bem
nham o princípio dos parágrafos. elaboradas não levantam barreiras intelectuais entre orador e ou-
~~" Porém, o pregador que normalmente lê os sermões no púlpito, vinte. Se souber fazê-las no escritório e usá-las no púlpito, ao
parece perder-se no manuscrito esquecendo os ouvintes. Pode pregar poderá olhar para elas de quando em vez, sem chamar a
apresentar em sua defesa que Chalmers lia sempre os sermões, atenção para o que está fazendo. Na prática, porém, poucos mi-
palavra por palavra, e que mesmo assim entusiasmava o coração nistros deixam de chamar a atenção dos ouvintes ao consultar
dos ouvintes. Se Chalmers pudesse regressar ao púlpito hoje, tal- as notas.
vez inflamasse o espírito das pessoas, mas aparentemente sua fama "Que conforto é termos a capacidade
como profeta de fogo não atingiu seus admiradores no ministério. De ver-nos, como outros vêem!"
Desde que era quase um génio, como serviria de modelo a um
Notas bem elaboradas para o púlpito dão, de relance, a visão
pastor com dois talentos ou mesmo cinco? O uso do manuscrito,
do manuscrito que ficou em cima da mesa de estudo, de modo
a não ser nas mãos de ministro com dons de oratória muito raros,
que o esboço da mensagem surge claramente nas duas páginas
constitui uma desvantagem. Claro que dizendo isto não critica-
de uma folha solta de rascunho. Esse rascunho contém, na devida
mos o pregador que prefere ler o sermão, por possuir qualidades ordem, os apontamentos de tudo quanto o ministro necessita du-
excelsas, ou aquele que de vez em quando lê o sermão em ocasião rante o culto. As páginas com as notas do sermão conterão pa-
muito especial. lavras-chaves, que, de relance, podem ser vistas e compreendidas,
O ministro que adotar este método, deve fazê-lo consciente- porquanto o "olheiro" as conhece bem. Ao regressar a casa, de-
mente. Se pensa levar o manuscrito para o púlpito, que o faça pois do culto, o pregador verificará que não precisou olhar as notas,
sem segredo nem ostentação, nem peça desculpas. Deve compre- para saber aonde ia. Percorrera o caminho mentalmente tantas
ender, porém, que vem com três pretensões. Como que ergue três vezes, que soube chegar ao destino. No entanto sentiu-se seguro
barreiras, que poucos indivíduos são capazes de transpor cada por causa dessas luzes de farol.
domingo. 1. "Minha mensagem é tão maravilhosa, que sou obrigado
O pastor, ao preparar-se para pregar usando notas, poderá
a apresentá-la como escrevi". Para um descrente no método, isto
conduzir o trabalho de várias maneiras, especialmente de duas
soa com pretensão de "inspiração verbal". 2. "Escrevi com tanta
completamente diferentes. No culto matutino poderá pregar a
arte, que tenho de chamar a atenção para a minha capacidade
mensagem que escreveu rapidamente e reviu com cuidado, de
literária". Talvez seja, sob certo ponto de vista, mas quem é capaz
modo que as notas são o resumo do manuscrito. No culto vesper-
de produzir uma obra de arte literária todas as semanas? 3. "Posso tino, e no da semana, baseado num esquema cuidadoso e extenso,
ler com tanta habilidade que ninguém sequer pensa que estou do qual as notas para o púlpito dão apenas os pontos salientes.
lsndo". Se verdadeira, esta pretensão é muito interessante e plau- Se o ministro seguir estes dois tipos de preparação cada semana,
sível. Mas só um ministro com capacidades excepcionais consegue receberá os benefícios provenientes de ambos os métodos de traba-
pregar desta maneira, sem chamar atenção sobre si mesmo e suas lho: dos que vêm do escrever por extenso com revisão cuidadosa
capacidades. e dos que vêm de preparação menos formal, mas com maior apelo
4. Pregar usando notas. A grande maioria dos pastores pre- ao coração. Mas de qualquer maneira o manuscrito cuidadosa-
fere este método. Consideram-no mais fácil para o ministro nor- mente revisto, e pronto para ser arquivado, deve servir de norma.
mal semana após semana e o melhor para os ouvintes num culto Com o correr dos anos o arquivo do pastor encher-se-á de tesouros,
comum, pois esta maneira de pregar requer menos preparação nó todos da sua lavra e mais preciosos que ouro.
212 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREPARAÇÃO PARA ENUNCIAR 213

Portanto, o jovem pastor pode escolher entre quatro métodos O indivíduo, que está chegando à idade madura, talvez precise
de preparar a apresentação do sermão. Pode responder à suges- outro género de conselhos. Neste caso, que leia a autobiografia
tão: "Vou usá-los todos ao mesmo tempo! Depois de escrever um do Bispo Edwin H. Hughes, que escreveu esse livro quando tinha
sermão, e revê-lo com todo o cuidado possível, decorá-lo-ei, mas setenta e seis anos. Falando a um amigo que lhe perguntou sobre
não palavra por palavra. Depois farei um extrato que possa levar o pecado mais frequente na vida ministerial, o bispo disse:
ao púlpito. Ao pregá-lo não tenciono usar apontamentos, mas se
Extemporaneidade!... Esta tentação surge quando chegamos á meia
vacilar eles ali estarão para me amparar". No que o jovem está idade... É "devastação que assola ao meio-dia"... O hábito de escrever
errado? Talvez em nada! Se esta maneira de preparar a apre- não é apenas mestre que dirige a indústria, é guarda contra o desleixo...
sentação lhe traz paz ao coração e lhe dá possibilidades de ir ao Tremo ao recordar que quase sucumbi à extemporaneidade... Se somos
encontro das necessidades humanas, que se regozije. Mas se falar desleixados na nossa preparação, não somos criaturas decentes. Extempo-
raneidade pode significar falta de caráter. Somos seguidores d'Aquele que
aos estudantes de um seminário sobre preparação de sermões, não
disse: "Devo trabalhar". 3
deveria recomendar semelhante método.

Muitos defendem a pregação sem notas, mas não pensamos


que este método se adapte igualmente a todos os ministros ou ao PREPARAÇÃO PARA ENUNCIAR
mesmo indivíduo sempre. Por exemplo, um determinado pastor
resolveu pregar todos os domingos sem notas, com exceção de um Fora do púlpito qualquer indivíduo, com miolos suficientes
único dia: aquele em que apresentasse o orçamento para o ano para pregar, pode aprender a falar correta e agradavelmente. Se
seguinte. Visto que os oficiais encarregados lhe pediram para pre- nunca quiser cometer disparates gramaticais ou deslizes de ora-
parar um sermão especial, escreveu o rascunho e lhos apresentou. tória no púlpito, deveria evitá-los ao conversar, pois maneira cor-
Na forma final incluiu todas as sugestões que lhe pareceram viá- reta ou incorreta de falar é questão de hábito. O mesmo é verda-
veis. No púlpito, antes de começar a ler o "sermão coletivo", ex- deiro quanto à pronúncia de palavras difíceis. Se o pastor deseja
plicou aos ouvintes o que fizera e por quê. Como não lera os ter o respeito de estudantes secundários, não deve deixar de seguir
sermões nem usara notas durante todo o ano, tomou essa a mais as regras gramaticais que estes aprendem com o bom professor de
extraordinária mensagem daqueles doze meses. Que boa maneira português. Deve ter cuidado especial com tudo quanto escreve
de salvaguardar o que fazemos e fazer com que um sermão especial no boletim e com a leitura do que escreveu, pois, como certo univer-
seja diferente! sitário disse a um colega, "Parece estranho ouvir um indivíduo
formado em colégio e seminário ler erros gramaticais da sua pró-
Uma palavra de aviso: pregar sem notas não é prova suprema. pria lavra. Por que não corrige o que escreveu? Talvez nem saiba
Como todos sabem, alguns dos piores pregadores tagarelam, papa- fazê-lo". *
gueiam, vagueiam e berram, sem notas e nada mais do que fôlego
e garganta. Mas eles não nos. devem preocupar agora, porquanto O ministro precisa enfrentar estes problemas muito mais obje-
um imbecil nunca lê livros sobre pregação, nem tenta melhorar tivamente no seu estudo. Depois de terminar um sermão, escrito
o que faz. Por outro lado, o indivíduo prudente estuda os fatos, e revisto, deveria tornar a lê-lo com todo o cuidado, para ter certeza
incluindo suas próprias capacidades e limitações e depois escolhe
o método a seguir. Escolhe conscientemente de uma vez para 3 1 Was Made a Minister, Nova York e Nashville, Abingdon-Cokesbury Press.
sempre. Esperemos que resolva pregar sem notas, pelo menos a 1943, pp. 311-314.
* Ver L. H. Chrisman. The English of the Pulpit. Infelizmente não dispomos
maior parte das vezes. de tal obra especializada em português. ( N . do T.)
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREPARAÇÃO PARA ENUNCIAR
2H

de que é capaz de pronunciar corretamente todas as palavras e nistro. Um inglês, apreciador da pregação, apresenta o problema
para resolver a que partes deve dar maior realce. Poderia subli-
5 sucintamente, ainda que talvez com excessiva simplicidade:
nhar no manuscrito as palavras ou frases a que deseja dar maior "Dá ênfase sempre à matéria nova e só à nova. U m pronome que tem
ênfase e fazer um traço vertical para indicar uma pausa, ou dois antecedente nunca pode ser matéria nova. Há duas únicas exceções. Não
sinais para uma pausa mais longa. Ainda que o ministro tencione acentues o negativo, mesmo sendo novo; e acentua o positivo, mesmo que
falar sem apontamentos e sem ter decorado mais do que quatro não seja", 7

ou cinco frases, deve preparar-se para dar o devido realce. Volta-


remos à maioria destas questões no capítulo seguinte, mas nunca Porém a maioria dos leigos perdoarão erros de ênfase, se pu-
será demais realçá-las. derem ouvir com facilidade e satisfação. Alguns deles já são
pouco surdos sem o saberem e, embora costumem sentar-se junto
Na apresentação, mais do que na composição, o efeito de um à porta da saída, continuam insistindo em ouvir todas as palavras
sermão depende em grande escala das ênfases dadas e estas de- tão distintamente quanto o sino da Igreja. Acham difícil apanhar
pendem em parte das pausas. Um orador hábil habitua-se a acen- as palavras do indivíduo que declama e berra, investindo sem
tuar a frase ou palavra chave em cada sentença. Se seguir os rumo certo, como ave fugindo a um incêndio na floresta. Podem
princípios apresentados até aqui neste livro, dependerá mais de seguir com maior dificuldade ainda, o orador que engole as pa-
substantivos e de verbos do que das outras partes da alocução, dan- lavras no fim das frases e resmunga outras no meio delas. E,
do ênfase aos substantivos porque dão poder e aos verbos porque estultamente, pedem ao pastor que fale mais alto, embora devam
8

apresentam o poder em ação. Porém, se alguém falar e escrever


6
orar para que êle articule melhor as palavras. Por isto assegura-te
de maneira a requerer substantivos anêmicos e verbos inativos "esculpindo cada palavra antes de a pronunciar!"
deverá acentuar outras partes do sermão.
Para lição objetiva acerca da "projeção de voz", leia sobre
Como em todas as regras humanas sobre a obra de Deus, tam- Whitefield, Spurgeon, William, J. Brian ou George W. Truett.
Quando criança, na Carolina do Norte, Truett gostava de conversar
bém esta tem exceções. Por exemplo, num capítulo áureo de Isaías
com o irmão, que não podia ouvir a conversação normal. Obri-
a sintaxe hebraica pede que se acentuem os pronomes: "Êle foi
gando-se a falar lentamente e a articular com clareza, o futuro
traspassado pelas nossas transgressões" (53.5a). Mas depois de
pastor da enorme Primeira Igreja Batista de Dallas preparava-se,
aparecer o pronome pela primeira vez, poder-se-á começar a mudar
sem saber, para a tarefa de sua vida. 9

a ênfase. O mesmo tipo de exceção surge nas palavras de nosso


Senhor: "Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarre- Em anos avançados, quando falava ao ar livre, quer dos de-
gados" (Mt 11.28a). Por outro lado, para que cortar o ritmo e graus do Capitólio em Washington, quer aos vaqueiros nas pla-
interpretar erroneamente o significado dando ênfase constante- nícies do Texas, podia fazer ouvir sua voz a qualquer distância,
mente a palavras secundárias, como no verso seguinte: "Buscai, sem esforço do orador nem do ouvinte. Por isso mesmo, podia
falar com segurança ao ar livre, como o Mestre fazia junto ao
pois, em primeiro lugar o seu reino e a sua justiça, e todas estas
mar da Galileia.
coisas vos serão acrescentadas" (Mt 6.33) ? Felizmente, este versí-
culo não tem adjetivos para serem martelados por qualquer mi-
f John Oman, Concerning the Ministry, Londres, 1936, p. 111.
8 Ver E. E. Calkins, Louder Please! Boston, Little, Brow & Co.; também
5 Para um tratamento cuidadoso ver R. W. Kirkpatrick, The Creative Delivery And Hearing Not, Nova York, Charles Scribner's Sons, 1946.
o} Sermons, Nova York, The Macmillan Co., 1944. » Ver P. W . James, George W. Truett, ed. rev., Nova York, The MacmiUan
Co., 1945.
6 Ver Rudolf Flesch, op. cif., cap. VIII.
216 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A PREPARAÇÃO PARA ENUNCIAR 217

Mesmo quando o orador se fizer ouvir facilmente, é possível Estas palavras de Macbeth fazem lembrar outras de Hamlet,
que a sucessão de palavras suaves convidem ao sono ou pelo menos também famosas:
dêem vontade de dormir. O Bispo Hughes, na sua autobiografia,
Não corta tanto o ar com tua mão, mas faze tudo gentilmente; pois na
protesta contra grande parte da pregação em nosso tempo, por ser própria torrente, tempestade e, posso dizer, no turbilhão passional, talvez
suave demais. Insiste em que a pregação ultimamente não possui alcances e engendres temperança que te dê suavidade. Ah, ofende-me ao
vida, movimento, calor, nem colorido. Porque crêem num estilo mais fundo da alma ouvir um cortesão rude despedaçar uma paixão era
de conversação — como todos os indivíduos inteligentes — alguns farrapos, romper os tímpanos da plateia, que geralmente não ouve mais
que peças cómicas e ruidosas... Faze com que a ação se adapte à palavra
pregadores adquiriram o hábito de monologar monotonamente, em-
e a palavra à ação, de modo que não ultrapasses a modéstia natural.
bora o espírito do Evangelho requeira algo de aventura e romance.
Semelhante sermão, apresentado como conversa absorvente com os
" A modéstia natural" faz com que conservemos o equilíbrio,
amigos assentados nos bancos da Igreja, parece-se mais com uma
sem que chamemos a atenção para a nossa maneira de falar. Se
viagem por montes e vales, junto ao Rio Susquehanna, do que com
o pastor herdou um temperamento nervoso como o de Pedro ou
uma viagem pelo deserto de Saara.
de Martinho Lutero, deve aprender a manter equilíbrio e domínio
A apresentação do sermão requer seriedade, o que deve carac- próprio. Se tiver a tendência para se tomar fleumático, deve trei-
terizar o pastor que crê no que diz e deseja que todos os presentes nar levantar-se e falar com ousadia de profeta. Em qualquer dos
creiam e ajam. O pastor deveria poder dizer, acerca do seu labor casos, o ministro deve subir para o púlpito com o corpo descansado
no estudo semanal "quando meditava, o fogo ardia". Sempre que e com reservas físicas. Desta maneira o peso da labuta de toda
um profeta de fogo sobe ao púlpito, as suas palavras penetram a semana desaparecerá antes de vir o Dia do Senhor.
noutros corações e os fazem arder. Se o coração do pregador arder Evite toda fadiga na sexta-feira à noite e no sábado, especial-
com o desejo profundo de ver homens e mulheres transformados mente à noite. Em suma, pense em estar no púlpito com a ple-
pela graça de Deus e labutando na obra do Reino, deve falar com nitude de sua varonilidade cristã.
entusiasmo, o que significa "Deus num homem escolhido". Nou- Consideremos de novo Spurgeon, como exemplo de pregação
tros tempos tal entusiasmo contagioso era chamado "unção" e, eficaz. Numa época em que o trabalho para o púlpito transpirava
em grau mais elevado, "paixão santa". 10
de tristeza, tornou-se conhecido pelo cognome de "o pregador feliz".
Ninguém deseja, por outro lado, o regresso à chamada ora- "Logo que começa a pregar, começa a representar, não como num
tória "barata". Por que o apóstolo da paz e alegria há de exci- teatro, mas como se conversasse na rua. Parece apertar a mão
tar-se tanto que comece a berrar e a gritar, fazendo com que os de toda a gente e faz com que todos se ponham à vontade". Sem- 11

ouvintes sensíveis venham a impacientar-se? O Embaixador do pre que falava em nome de Deus fazia-o com alegria, que ansiava
Rei Jesus deve saber comportar-se. "Não seja como uma corrente, comunicar a todos quantos se apinhavam no Tabernáculo de
faça uma pausa de vez em quando". Senão a alocução ardente Londres.
poderá parecer como Eis um lema para colocar na parede à frente do ministro,
quando se prepara para pregar cada sermão •
. . . fábula
"O Senhor Deus me deu língua de eruditos,
contada por idiota, cheia de barulho e fúria,
Para que eu saiba dizer boa
mas sem significado.
palavra ao cansado" (Isaías 50.4).

!0 Para "enunciado em conversação" ver Lc 24.13-35, especialmente v 32. l i W. Y . Fullerton, C. H. Spurgeon, A Biography, Londres, 1920. p. 97.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

LEITURAS SUGERIDAS

Brown, Charles R., The Art of Preaching, Nova York, The Macmillan Co., 1922.
Jeíferson, Charles E., The Minister as Prophet, Nova York, T. Y . Crowell Co„ CAPÍTULO XVIII
1905.
Speer, Robert E„ How to Speak Effectively Without Notes, Nova York, F. H.
ReveU Co., 1909.
Storrs, Richard S., Condiíiorw of Success in Preaching Without Notes, Nova York,
Dodd. Mead, 1875.

ENUNCIAÇÃO DO PÚLPITO

ACOMPANHEMOS U M JOVEM ministro ao púlpito, nc


seu primeiro pastorado, e observemos como se desin-
cumbe da mais importante tarefa da sua vida.
Presumamos que aceita as ideias apresentadas neste livro até agora
e que se prepara para pregar o sermão no culto da manhã. Não
podemos sequer observar como dirige as outras partes do culto.
De modo que fazemos três perguntas, todas elas relacionadas com
a sua maneira de falar e com os pormenores em geral. Em pri-
meiro lugar, como deve o pastor idealmente enunciar seu sermão?
Em segundo lugar, o que deve evitar praticamente na pregação?
Em terceiro lugar, como pode melhorar sinteticamente esta parte
do seu trabalho?
Que empreendimento para um só capítulo! Por que não um
livro inteiro escrito por perito? Infelizmente a grande maioria
dos livros sobre oratória sacra, foram escritos por indivíduos que
sabem mais de homilética do que de oratória e vice-versa.

MANEIRA DE PREGAR UM SERMÃO

Todos deveriam falar no púlpito numa forma toda pessoal e


esta deveria diferir em cada sermão. De que maneira diferente
poderia alguém apresentar as múltiplas verdades de Deus, por meio
de sua personalidade? Aqui reside grande parte da fascinação que
existe na pregação de sermões, com todos os tipos de verdades que
devem ir ao encontro de todo género de necessidade. Diante das
muitas divergências podemos acentuar a maneira como todos os
220 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES ENUNCIAÇÃO DO PÚLPITO 221

pregadores e sermões idealmente se conformam às mesmas regras uso livre da garganta. O mesmo com o resto do corpo, usa-o para
de enunciação. Se parecemos dogmáticos, isso resulta do desejo
1
a glória de Deus. "Acaso não sabeis que o vosso corpo é o san-
de apresentarmos as regras de forma compacta. tuário do Espírito Santo que está em vós, o qual tendes da parte
Antes de entrar no santuário pensa na tua aparência pessoal. de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados
Adapta-te ao costume da paróquia, no que se referea páramen"taçao. por preço, glorificai a Deus no vosso corpo". (1 Co 6.19-20).
Usa sapatos pretos, sempre muito bem engraxados. Se a camisa Adota atitude simpática para com o povo. Quando vieres do
e o colarinho aparecem, estejam mais alvos do que a neve. Que santõ^õTsantos com o Evangelho da redenção, presume que todos
toda tua roupa venha para o santuário "Imaculada do mundo". os presentes desejam conhecer a vontade de Deus, para se tornarem
Mostra, bem barbeado e penteado, que amas a santidade da beleza. melhores homens e mulheres. Imagina que teu amigo no banco
Cedo, na manhã do domingo, vai ao púlpito e prepara tudo da igreja murmura a súplica de Tennyson:
quanto seja necessário. Abre a Bíblia, verifica o hinário, coloca
"Ah!, que surja em mim um homem,
tudo no seu devido lugar e quanto menos coisas houver, melhor.
de modo que o homem que sou deixe de existir!"
Durante a semana cuida da ventilação do salão e verifica se as
luzes estão em perfeitas condições. Segue uma ordem de culto
Então mostra-lhe como sê-lo. Que a tua expressão durante
que faça com que toda a congregação se levante para cantar ime-
o sermão se coadune sempre com o que dizes. Em regra mostra-te
diatamente antes do sermão. Quando te ergueres para pregar
feliz- as pessoas já têm problemas bastantes para ainda partici-
espera um minuto silenciosamente, em espírito de oração, sem
parem dos teus. Em suma, mantém o aspecto, ação e atitude de
fechar os olhos. Olha para as pessoas amavelmente e quando
portador de boas novas.
nada mais ouvires do que o teu coração batendo, começa com
o texto ou com uma confissão de louvor, que não chame a atenção Tem principalmente o máximo cuidado em usar os olhos como
sobre ti mesmo, como por exemplo: "Em nomé do Pai, do Filho uma espécie de "segunda voz". Aprende a olhar os ouvintes bem
e do Espírito Santo, Amém". de frente, sem parecer que pretendes fazê-los baixar a vista. Nun-
ca deixa de olhar para eles durante o sermão, se quiseres que fiquem
O efeito do sermão dependerá em parte de tua atitude, espe- olhando para ti. Na sinagoga de Nazaré os olhos de todos os
cialmente logo no início. Visto que representas o Rei dos Reis, presentes estavam fixos no que falava. Olha cada um dos teus
apóia-te em ambos os pés e permanece ereto, com um pé à frexite_ ouvintes, mas nunca volta a cabeça para longe da congregação.
do outro, por ser mais confortável. De quando em vez, durante Ao falar num salão muito grande, mais largo do que comprido,
o sermão, muda de postura para repousar os músculos ou para não deixes de olhar para os que estão no meio da multidão, espe-
indicar transição de pensamento, mas move-te elegantemente e cialmente para os de trás. Os olhos do que está no púlpito falam
nunca enquanto disser algo de importante. A não ser na gesti- sempre, eficaz ou ineficazmente.
culação, conserva as mãos onde a natureza as colocou, junto ao
corpo, mantendo-as assim, mas sem parecer empertigado. No púl- Acima de tudo, tem todo o cuidado com as palavras iniciais.
pito todo e qualquer movimento ou ausência de movimento do cor- Pronuncia-as compassada e distintamente, com os tons naturais
po deve ter significado, bom ou mau. Acima de tudo, conserva mais baixos. Faze com que as palavras introdutórias variem em
a cabeça regularmente parada e bem erguida, para permitir o conteúdo e colorido em cada sermão, mas nunca deixa de pronun-
ciaressas primeiras palavras inteligivelmente, de modo agradável
ao ouvido. Fala com o equilíbrio e a segurança do homem que tem
1
Estas regras vieram em grande parte de especialistas no campo, notavelmente
aqui no Seminário de Princeton. a mensagem de Deus.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES ENUNCIAÇÃO DO PÚLPITO 223

O efeito das palavras iniciais, e de todo o sermão, depende Deve-se regular também o volume do som. A capacidade do
em grande escala do uso da tua voz. Agora que há um ou dois indivíduo se fazer ouvir depende muito mais da articulação do
rádios em quase todos os lares e quase todas as escolas dão lições que do volume. O murmúrio de um indivíduo, que saiba falar,
de música, a juventude e muitos adultos conhecem a "voz". Quer é mais claro do que a declamação de um que berra. Mesmo assim
se concorde ou não com o que Franklin D. Roosevelt dizia nas suas o pregador deve evitar parecer subnutrido ou anêmico. Se se co-
"conversas ao pé da lareira", todos gostavam de ouvir sua voz meçar com volume bastante para sugerir segurança e força, sem
pelo rádio. Quando o povo vai ao Santuário, deseja ouvir uma parecer exagerado, deve-se manter esse volume para fazer com que
voz clara como um sino, doce como uma harpa, forte como um o começo, o meio e o fim de cada sentença sejam ouvidos por
órgão e plena de tons elevados, como os de Canções sem Palavras, qualquer ancião de ouvido fraco. O pregador deve conservar
de Mendelssohn. De acordo com os conhecedores da História volume relativamente igual, principalmente quando fala ao micro-
Eclesiástica, nunca um ministro sem voz extraordinária conseguiu fone, com altos e baixos bastantes para se adaptar aos diferentes
salientar-se como pregador para o povo. tipos de pensamento e sentimento. Sempre que variar o volume
deve evitar a brusquidão, aumentando ou diminuindo gradualmen-
O homem com voz agradável aprende o segredo do domínio te. Tudo se tornará hábito com o andar dos tempos.
da respiração. Respira com a parte do corpo situada abaixo do Nenhuma das regras apresentadas até agora se pode comparar
diafragma e o faz vezes suficientes para manter o timbre da voz com a seguinte: toma o máximo cuidado com a articulação ou
apoiado por volume de ar, de modo que nenhum tom soe falso enunciação. A articulação, do ponto de vista técnico, está rela-
ou fraco. O homem sábio aprende sempre a relaxar-se e a seguir as cionada com a habilidade do orador e a enunciação com o efeito
leis da natureza, que o convidam a respirar profunda, silenciosa e nó ouvinte. A articulação está intimamente relacionada com a
frequentemente. Com o apoio permanente dos recursos internos, produção de sons claros e distintos, a enunciação permite aos outros
o orador limita-se a abrir a boca o bastante para deixar sair as ouvir com facilidade e prazer. Porém, na prática estes termos
palavras pela garganta, livres de esforço e tensão. muitas vezes aparecem trocados, porque se referem precisamente
aos mesmos processos físicos. O indivíduo que aprende a fazer
Durante toda a pregação deve-se procurar obter variedade de
as consoantes soarem de forma clara e precisa e as vogais pare-
tons. Como a voz e o sentimento tendem a aumentar com a cerem cheias de beleza, adquire capacidade para articular e enun-
continuação do sermão,.o melhor é começar com tons mais baixos, ciar. Talvez prolongue um pouco as vogais, como em "de gló-ria
que são agradáveis para os outros e fáceis para ti próprio. Sempre em gló-ria", mas nunca as consoantes, especialmente o r, como
que se mudar de tom no fim de um parágrafo ou de uma secção na abusada palavra "gr-r-ande". 2

mais longa, é conveniente baixar a voz, embora não sempre ao


mesmo nível. Ênfase requer mais tons baixos do que altos e mais Para articular e enunciar distintamente é preciso pensar cla-
nitidez do que volume. Como um gravador de som o demonstra, ramente. Os que ouvem sermões pregados por estudantes, quase
o orador competente percorre toda escala de tons agradáveis; quan- nunca ouvem murmurar e comer as palavras por aqueles que pen-
do pretendes fazer sobressair qualquer parte de tua mensagem, sam claramente e têm emoções corretas. Mas até um orador assim
acha mais fácil fazer-se ouvir bem quando usa, de preferência, pala-
diminui o tom, abranda o ritmo e aumenta a intensidade. Feliz-
vras e frases curtas. Por outro lado, o que pensa e fala com nitidez
mente o ministro pode aprender a fazer tudo isso naturalmente
e sem esforço. Semelhante disciplina requer esforço fora do púl-
2 Infelizmente no papel, como em caricaturas, tais distinções aparecem abrup-
pito. tas e às vezes irritam.
224 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES ENUNCIAÇÃO DO PÚLPITO

do ponto final, talvez passe por palavras e grupos de palavras,


talvez não saiba quase nada sobre beleza. Neste caso torna-se ne-
onde deveria parar e apreciar. Porém, se fizer todas as frases
cessário pôr sentimento nas vogais, como põe inteligência nas
curtas e do mesmo comprimento, é possível que o orador pareça
consoantes.
menino de primeiro ano soletrando.
Um orador experimentado, como Winston Churchill, usa a Saber formar frases é um grande passo para tornar clara e
pausa frequente e eficientemente. Onde um novato talvez ten- luminosa uma passagem. Como todo o resto, neste domínio esta
tasse acentuar o que diz, aumentando tom, volume e rapidez, capacidade vem, em parte, quando se ouvem oradores famosos como
aquele que sabe falar faz precisamente o contrário. Faz pausas Madame Chiang Kai-shek e mais ainda pelo desejo de interpretar
especialmente quando deseja dar maior ênfase a palavras ou fra- o espírito da sentença. Por isso, uma regra prática auxiliará o
ses. Talvez pare momentaneamente antes de pronunciar a pa- pregador sem experiência: quanto mais importante fôr o que ti-
lavra ou frase importante, em geral, porém, faz a pausa depois. veres a dizer, maior cuidado deves ter na construção da frase.
Às vezes antes e depois. Paradoxalmente é possível que as partes Basta manter juntos todos os membros do círculo familiar, dei-
mais impressivas de um sermão sejam aquelas em que o orador xando-os viver de per si, mas sem deixar de estar em contato com
se mantém calado, esperando que o Espírito imprima na mente os vizinhos. Como lição objetiva destas frases, ouve um locutor
e coração dos ouvintes uma ideia ou figura. "Aquietai-vos, e sabei de rádio que tenha ritmo, mas nunca cadência. Se examinares
que eu sou Deus" (Salmo 46.10). mais detidamente como fala, verificarás que há muito se apaixonou
O domínio da pausa permite ao pregador interpretar o texto, pelo paralelismo hebraico e pelo ritmo português. Quanto à ca-
repetindo-a no começo do sermão e uma vez ou outra depois, para dência, em geral é feita no fim da sentença e consiste em algo
dar ênfase. O pastor deve tentar em todos os sermões deixar um semelhante a uma débil canção de ninar, que satura rapidamente.
texto iluminado na alma do ouvinte. A capacidade de fazê-lo Ritmo ou compasso estão intimamente relacionados com a
depende muito da ênfase, que, por seu turno, depende em parte da formação de frases. Muitas destas coisas estão relacionadas entre
pausa. Naturalmente todo pregador deve citar o texto à sua pró- si, quase de forma inseparável. No púlpito deve-se falar devagar,
pria maneira e até às vezes de modo diverso, dependendo do seu com moderação ou depressa? Isto depende do teu temperamento
objetivo. Eis como alguém leria Mateus 11.28: "Vinde a mim e, mais ainda, da tua mensagem. Respondendo a pergunta seme-
(pausa), todos os que estais cansados (pequena pausa) e sobre- lhante, Francis L. Patton, antigo reitor da Universidade de Prin-
carregados (pausa), e eu vos (bem pequena pausa) aliviarei" (pa- ceton, revelou parte do seu segredo de orador genial: "Só um tolo
re). Pensemos ainda nas conhecidas palavras: "Deus é (pe- pregaria todo o sermão no mesmo ritmo. Comece pausadamente
quena pausa) amor". "Jesus (pequena pausa) chorou". Que e depois caminhe mais confiante. Quando chegares a algo que
prova para o indivíduo com capacidade de domínio próprio! pretendas fazer o ouvinte relembrar, dize-o lentamente". A maio-
ria dos especialistas na matéria estão de acordo com esta opinião,
Ao tratar com palavras para glória de Deus, o ministro precisa com uma exceção: é melhor andar devagar demais, do que depressa
saber formar frases. "Formar frases" num discurso significa con- demais. Não se precipite!
servar um grupo de palavras ligadas entre si, de modo a formar
unidade de pensamento e emoção. Quando um homem viaja nu- Busquemos exemplos desta forma de falar na históíria da
ma estrada onde há pouco para ver e admirar, suas frases são pregação. Em Genebra João Calvino tinha que falar lentamente
relativamente longas. Mas quando deseja fazer sobressair algo, por causa da asma, um espinho na carne pelo qual os ouvintes
3

deve preferir frases curtas. Em tudo isto prefere seguir o senti- deviam dar graças a Deus. De acordo com o estenógrafo de Spur-
mento às regras. Por outro lado, se nunca fizer uma pausa antes 8 Ver T. H. L. Parker, The Oracles of God, Londres, 1947, p. 40.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES ENUNCIAÇÃO DO PÚLPITO 227

geon, o grande orador de Londres pronunciava cento e quarenta


1 determinado ponto, iluminar outro e realçar um terceiro. Com
palavras por minuto, mas nunca falava com a mesma velocidade o decorrer do tempo, entusiasmando-te, "falavas" mais frequente-
nas partes mais importantes do sermão. Ao conduzir uma parelha mente com as mãos. Como não pensavas acerca de ti ou de teus
de cavalos numa longa viagem, é necessário variar a velocidade, gestos, os fazias tão natural e necessariamente como a respiração.
abrandando de vez em quando. Eis um bom conselho para o Por que perder esta espontaneidade e entusiasmo, no subir ao
pregador hodierno: púlpito para pregar? Mas lembra-te! Não exageres!

Nenhum locutor do rádio competente fala com o ritmo de metralhadora. Todas as considerações acima, inclusive as sobre gesticulação,
Sabe que cada pensamento expresso só pode atingir o alvo uma única vez. estão relacionadas com a necessidade de variedade! Na mensagem
Por isso, vai suficientemente devagar para permitir que seu primeiro tiro
cheia de vida e movimento o orador deve obter variedade em cada
atinja o alvo antes de disparar pela segunda vez. A velocidade de pregação
deveria basear-se no material a pregar e no estilo pessoal de falar. Em estágio, como numa viagem através de região maravilhosa. Como
média a velocidade de pregação pelo rádio varia entre cento e vinte e pode o pregador saber quando deve modificar a sua maneira de
cento e cinquenta palavras por minuto. O Presidente Roosevelt, considerado enunciação? Basta deixar que as diversas luzes e sombras do seu
como o orador mais eficaz que falou nas emissoras americanas, por vezes
pensamento e emoção o guiem na enunciação de cada parte su-
falava ã velocidade de cento e dez palavras por minuto c raramente ultra-
passava cento e trinta e cinco. Lowell Thomas pronuncia cento e quarenta
cessiva. Na maneira correta de pregação em forma de conversa,
C cinco palavras por minuto e Edward Murrow cento e vinte. 6 o colorido muda com a mesma frequência quanto a luz e a sombra
no campo, à tardinha, quando o céu tem nuvens esparsas. Aqui
Um assunto de muito menos importância, o da gesticulação, "colorido" significa a maneira como o orador coloca, na voz e na
pode causar perplexidade. Nos dias bíblicos parece que os oradores gesticulação, o espírito dos seus pensamentos e emoções, tal como
usavam livremente ambas as mãos. Rafael ao pintar o Apóstolo vêm e vão. Devemos pensar idealmente em toda esta matéria, por-
Paulo falando no Areópago, representou-o com os dois braços es- quanto só um artista consegue primar no uso do colorido.
tendidos. Hoje em dia nos países orientais e em certas partes de O colorido dos sermões deve variar ainda mais cada semana,
nosso país, há pregadores que usam gestos livremente, por vezes de acordo com o espírito das verdades que surgem por intermédio
em grande confusão. Em certas localidades, porém, especialmente da sua personalidade. Por exemplo, durante a quaresma poderá
onde os ministros usam toga e lêem os sermões, alguém pode passar conseguir material para os sermões principalmente nessa monta-
um ano sem fazer um gesto no púlpito. Por que não procuras nha que é o Quarto Evangelho. Poderá tirar do capítulo treze
o meio termo destes pontos de vista opostos? Usa alguns gestos mensagem sobre "Significado do Serviço Cristão", do capítulo qua-
mas não no início do sermão e nunca demais. Quando estiveres torze, "O Evangelho Cristão do Conforto", do capítulo quinze, "Ami-
em dúvida não os faças. zade profunda com Cristo". E assim por diante, até ao fim de
Atualmente a pregação requer "conversa animada" e por isto uma pequena série sobre Cristo. Para preparar qualquer destas
devem-se usar ambas as mãos. Já conversaste alguma vez veemente- mensagens, o pastor no escritório deve impregnar sua alma com
mente durante vinte e cinco minutos, sem gesticular com uma e o espírito da passagem, usando-a depois para ir ao encontro das
com outra mão, ou com ambas? Por quê? Porque querias frisar necessidades da congregação. Procura dar a cada passagem um
tom de colorido diferente, encarnando-o no sermão, de modo que
nenhuma das mensagens se assemelhe, tanto na forma literária
* Ver The Autobiography, 4 vols., compilado por sua esposa e seu secretário,
Nova York, F. H. Revell Co., 1898, IV, 76. como na apresentação.
5 Parker c outros. Religious Radio, Nova York, Harper & Bros., 1948, p. 203.
228 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES ENUNCIAÇÃO DO PÚLPITO 229

Quanto à conclusão, deveria eclipsar o restante do sermão, de sermões. Se assim acontecer, talvez necessite um método para
exceto o texto. No sermão de um príncipe do púlpito "o fim coroa verificar sua forma oratória. Nos primeiros tempos de sua per-
a obra". E aqui a apresentação requer o espírito de um artista manência em Londres, Spurgeon recebia semanalmente carta de
no emprego da voz. Quando chega ao fim da mensagem, este um crítico desconhecido, que lhe apontava os erros cometidos.
tipo de pregador confia na "nota suplicante", com seu "fecho cal- Anos depois de Spurgeon ter corrigido os defeitos, deu graças a
mo e comedido". Embora cada uma das conclusões seja diferente Deus por estas críticas anónimas e afirmava lamentar que não
de todo o resto, concordaria com J. S. Stewart em que cada men- podia agradecer ao crítico amigo. Ora, em vez de tais críticas
8

sagem de Deus para os homens requer um fim mais calmo do que


pormenorizadas, por que não usar uma lista de verificação, como
tempestuoso.
a que apresentamos abaixo? Os vinte pontos variam de impor-
Faça com que suas últimas palavras ce apelo contenham em si algo tância, mas é possível dar-lhes valor igual e calcular sua marca
do silêncio que surge quando Cristo mesmo se aproxima. Lembre-se de que, por alto, sendo setenta e cinco boa classificação.
mesmo quando nos superamos a nós mesmos, "profetizamos em parte" e
que "havendo línguas cessarão". Mas, quando as nossas pobres e gague- 1. Impressão só ore os outros. Pareces aborrecido e intole-
jantes palavras silenciarem, surgirá... a Palavra eterna de Deus e se o
rável? Falta-te compostura e autodomínio? Nervoso? Tímido?
homem puder ouvir, no meio desse silêncio, ainda que indistintamente...
o ritmo desafiador e salvador da voz divina, a obra foi feita c você não Empertigado? Desmazelado?
pregou em vão". 6
2. Atitude no púlpito. Descuidada? Rígida? Por vezes te
abaixas? Mãos nos bolsos? Mãos nas costas? Braços cruzados?
Depois do culto, logo que seja,possível, começa a relaxar-te.
Mãos nos quadris? Cabeça sempre em movimento? Desafiadora?
Na realidade, deverias começar a fazê-lo mais ou menos um diã
Posição arrogante? Sempre a balançar-se na ponta dos pés? Sem-
antes de pregar o sermão. Beecher, apesar do seu físico fortís-
pre a mexer-se? Impressão de instabilidade? "Um índio de ma-
simo, "tomava o máximo cuidado com seu corpo, pelo menos vinte
deira"?
e quatro horas antes" de pregar o sermão da manhã. Quando o
domingo se aproximava, "tinha o costume de comer menos e dor- 3. Atitude para com os ouvintes. Arrogante? Protetora?
mir mais". Theodore L. Cuyler, seu amigo e vizinho em Brooklyn, Beligerante? Efusiva? Neutra? Indiferente? Absorvido em si
fazia exatamente o mesmo antes do culto da manhã e logo em próprio? Perdido no sermão?
seguida começava a armazenar energia para o culto da noite, dor-
mindo durante algumas horas. Quando um homem como este
7 4. Expressão facial. Severa? Fixa? Franze as sobrance-
sobe ao púlpito, de manhã ou à noite, está pronto a provar as lhas com frequência? Fúnebre? Contorções faciais? Constante-
alegrias da pregação, em que a terra mais se aproxima do céu. mente carrancudo? "Cara de poucos amigos"?

5. Emprego dos olhos. Fixos no espaço? Frequentemente no


teto? No soalho? Olhando para a rua? Por cima das cabeças dos
COMO NÃO FALAR ouvintes? Expressão vazia?

Consideremos agora o reverso da medalha. Inconscientemen- 6. Palavras de abertura. Fortes? Em voz muito alta? Rá-
te, o pregador pode quebrar todas as regras que regem a pregação pidas? Indistintas? Insípidas? Inconsequentes? Irritantes?

« J. S. Stewart, Heralds of God, pp. 139-140.


7
J. M. Buckley, Eitemporaneo-us Oratory, pp. 265-268. « Ver The Aulobiography, 11, 227.
ENUNCIAÇÃO DO PÚLPITO 231
230 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

17. Inflexão. Tendência para inflexão ascendente? Supres-


7. Emprego da voz. Produzida apenas pelo tórax? Contraí-
da? Gutural? Precipitada? Nasal (por causa de obstrução ou são de incerteza? Fantasia? Falta de sensibilidade? Confusão?
preguiça) ? Metálica (por falta de domínio da respiração) ? Pouco Precisão mecânica?
variada? Penetrante? Grosseira? Sujeita a dores de garganta? 18. Gesticulação. Nenhuma? Demasiada? Cedo demais?
8. Domínio respiratório. Elaborado? Inspira lentamente? Monótona? Baixa? Parca? Aos arrancos? Mecânica e rígida?
Dedo indicador de mestre? Punho fechado de lutador? Indecisos?
Expira depressa? Respira raramente? Muitas palavras numa só
inalação? Às vezes parece sem fôlego? A voz quebra por vezes 19. Estilo de conversa. Monólogo? Meditação individual?
(falta de apoio do ar)? Exposição pessoal? Preleção impessoal? Animação desnecessária?
Articulação excitada? Emoção forçada? Insípido? Tedioso?
9. Volume. Insuficiente para a sala? Pouco no princípio?
Demais? Alto no final? Indistinto no final? Sempre inconsisten- 20. Imaginação. Sem vida? Movimento? Calor? Cór? Va-
te? Mudanças abruptas? Impróprio para o microfone? riedade? Harmonia com o conteúdo? Apropriada? Tendência para
exagero?
10. Tom. Começa alto demais? Não cuida dos tons mais
baixos? Tensão? Efeitos desagradáveis? Monótono? Soporífico? Pregadores sem classe exageram sempre. Usam adjetivos, gestes, ideias
e força demais. Dão socos no púlpito, o que invariavelmente afasta as
11. Cadência. Não sabe o que é ritmo? Rápido demais no pessoas. Não é possível forçar uma ideia na mente humana. Ideias são
início? Lento demais por vezes? Sem ligação com o conteúdo? como flores. É possível espalhar-lhes o perfume, mas isto não requer que

Pouco variado? O mesmo tipo, todas as semanas? se sopre... estilo só é perfeito quando não pode ser visto.»

12. Ritmo. Falta? Excesso? Tendência cadenciada? Boni- V. ''].,


tinho? Monotonia sonora? "Pomposo"? COMO MELHORAR A MANEIRA DE FALAR

13. Construção de frases. Frases longas demais? Curtas Quando um jovem começa a usar lista de controle como esta
demais? Mecânicas? Falta de variedade? Pausas indevidas? talvez fique desanimado, achando que mal sabe pregar um sermão
e menos ainda como corrigir seus erros. Se fizer tal descoberta
14. Pronúncias. Acentos corretos? Divisão silábica correta?
deve dar graças a Deus e encorajar-se. Quando fôr pregar deve
Consoantes pronunciadas distintamente? Vogais afônicas? Pe-
recordar todos estes vinte pontos e todas estas perguntas agudas
dantismo? Cretinice? Provincialismo? Descuido?
como espinhos de porco-espinho? De modo algum. Sempre que
15. Enunciação. Indistinta? Descaindo no fim das frases? entrar no santuário no domingo, deve esquecer toda esta técnica
Falta de naturalidade no meio das frases? Falta de cuidado? e acompanhar o povo no culto público. Ao pregar o sermão não
Precisão "escolar"? pensa na oratória, para não chamar a atenção sobre ti mesmo,
16. Ênfase. Ênfase demasiada nas preposições? Nos pro- distraindo os ouvintes da mensagem. "A melhor voz de discurso
nomes? Nas conjunções? Nos adjetivos? Nos advérbios? Pouco nunca é ouvida".
acento nos verbos? Nos substantivos? Tendência para martelar
"palavras chaves"? Ênfase em palavras demais? Em quase ne-
nhuma? Monotonia? • C. E. Jefferson. The Minister as Prophet. pp. 139-144.
232 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES ENUNCIAÇÃO DO PÚLPITO tss

Mas um dia ou dois mais tarde, depois de haver descansado, LEITURAS SUGERIDAS

pega na lista e torna a lê-la. Resolve então descobrir a verdade Curry, S. S-. Vocni and Literary Interpretativa of the Bible, Boston, Expression
Co., 1003.
sobre tua enunciação. O indivíduo prudente faz o mesmo com o
Fairbanks, Grant, Voice and. Articulation Driilbook, Nova York, Harper & Bros.,
corpo, vai ao médico uma vez por ano e pede a este para examiná-lo
1940.
cuidadosamente. Por que não fazer o mesmo com a nossa maneira
Monroe, Allen H., Principies and Types of Speeeh, Nova York. Scott, Foresman
de falar, especialmente com a voz? Sobre os conselhos contidos & Co., 1935.
em livros — incluindo este — diz um professor de arte: "Ninguém Phelps, Arthur, Speaking in Public, Nova York, Harper & Bros., 1930.

pode estabelecer regras sobre como algo deve soar". Além disso, Sarett, L. R. e Foster. W.. Basic Principies of Speeeh, Boston. Houghton Miffiin

se houver alguém que discorda, escreva para uma reunião de pas- Co., 1946.
Tarbell, Cobert, Psycholoay of Persuasive Speeeh, Nova York, Longmans, 1942.
tores trabalho sobre a maneira de dirigir a repetição da Oração
Woolbert, C. H., e Nelson. S. E., The A r i of Interpretative Speeeh, Nova York.
Dominical. F. S. Crofts & Co., 1946.

Infelizmente há poucos ministros que consultam especia-


listas de oratória. Num centro metropolitano, o professor mais
conhecido da arte declara que, nos últimos vinte anos, só um
pastor veio consultá-lo e quase desmaiou ao ouvir este pedido.
Quando o bom professor se recompôs do choque, começou o exame
usando um gravador de som. Como um Raio-X ou um fluoros-
cópio em mãos de perito, o gravador apresenta os fatos tais como
são, bons ou maus. Quando certo formando no seminário ouviu
a gravação do sermão de prova exclamou: "Até parece o Pato
Donald!"

— "Pois é", disse o professor, "assim foi seu sermão!"


Também o ministro experimentado, guiado por orientador há-
bil e diplomático, pode melhorar sua maneira de pregar. Se muitos
pastores dedicassem à sua maneira de falar tanto tempo, atenção
e dinheiro como dedicam a coisas desnecessárias, talvez conseguis-
sem atrair aqueles que dizem gostar deles em toda parte, menos
no púlpito.

O mesmo poderia dizer um homem de negócios sobre deter-


minada marca de papel mata-borrão: "Faz tudo, menos secar a
tinta!" Que o pregador, pois, seja orador! Para falar em termos
desportivos, aprende a não esmorecer, mas entra no espírito do
jogo. Em breve terás eficácia e poder renovados no púlpito.
A UTILIDADE DO RÁDIO 2S5

fiança em outros métodos. É possível que, por vezes, haja quem


se admire de não prepararmos indivíduos para pregarem no rádio
CAPÍTULO XIX
e de preferirmos concentrar-nos nos noventa e nove que mais
precisam do nosso auxílio. Qualquer estudante ou pregador expe-
riente pode, no entanto, aprender muito por intermédio do rádio.
Nenhum pastor isolado pode queixar-se de nunca poder ouvir mú-
sica, orações e sermões para fortalecer e elevar a sua alma. Que
A UTILIDADE DO RÁDIO deve, pois, o ministro aprender do rádio?

REGOZIJEMO-NOS OU NÃO com o fato, o rádio veio


A IMPORTÂNCIA DA PREPARAÇÃO
para ficar e com êle a televisão. Que influência
isto exerce sobre o trabalho do pregador? A res-
Peritos realizaram estudos sobre a arte do locutor nas grandes
posta varia muito. Um pastor considera o rádio como uma van-
estações de rádio americanas. Todos estão de acordo sobre a im-
tagem e também acolhe com satisfação o advento da televisão.
portância da preparação antes de o indivíduo falar pelo rádio. O
Exulta com a oportunidade de transmitir parte do culto, com men-
que afirmam, acerca da radiodifusão, ap!ica-se a sermões em toda
sagem para os nossos dias, pois aprendeu a falar através do "inter-
ruptor" conhecido pelo nome de microfone. É possível que o pas- parte. Do ponto de vista ideal, o locutor descobre "o que inte-
tor exagere o tamanho de seu vasto auditório radiofónico, mas ressa aos rádio-ouvintes. Descobre-o perguntando ao aluno da
mesmo assim pode conseguir muitos amigos a quem não vê e in- escola, ao soldado, ao negociante, ao operário, ao professor, ao
fluenciar muita gente desconhecida. Pode, deste modo, atingir motorista, à enfermeira e à dona de casa". Tal intérprete da vida
uma paróquia maior e aos poucos aumentar a assistência aos hoje em dia "lê, ouve e medita muito". Verifica o uso dos
1

cultos no santuário. fatos e o interesse dado a cada pessoa, uma por uma. Se quiseres
despertar interesse hoje em dia, usa fatos sobre pessoas!
Mas, e os noventa e nove ministros que quase nunca falam
no rádio? Em qualquer tentativa ocasional, o novato pode sair-se Depois de descobrir o que precisa saber sobre ouvintes, o locu-
mal, porque não aprendeu a fazê-lo. Alguns deles consideram o tor de rádio começa a analisar seus recursos. Que tem o ministro
rádio, falando ou não religiosamente, como algo prejudicial e talvez para oferecer presentemente, como intérprete da verdade divina?
até como perigosa ameaça. Insistem em que torna os leigos exi- Que pregue acerca do que sabe melhor e do que mais ama. Um
gentes em matéria de música, críticos das orações e dos sermões. professor de Literatura do Antigo Testamento, da Universidade
Afirmam também que a pregação pelo rádio tem prejudicado a de Boston, falou pelo rádio sobre a sarça ardente. Como seu co-
assistência aos cultos, principalmente quando chove ou neva. É ração ardia pôde aquecer outros corações, mesmo sem ver suas
certo que a assistência ao culto nalgumas igrejas começou a dimi- feições distantes. Infelizmente a televisão também não deixa que
nuir quando pregadores citadinos começaram a pregar sermões o pregador contemple a luz nos olhos dos ouvintes. Se os prega-
no rádio. Mas se ultimamente mais pessoas vêm às igrejas, é dores de rádio o pudessem fazer, talvez faiassem com mais fre-
porque começam a cansar-se do rádio.
Muitos de nós simpatizam com estes ministros que não têm
i V e r Makirtg Friends with the Microphone, Nova York, Columbia Broadcasting
acesso ao rádio. Nos seminários treinamos os jovens a ter con- Co., 1945.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A UTILIDADE DO RÁDIO 237

qúência a respeito de passagens conhecidas das Escrituras, como tor, por que escolher outras partes das Sagradas Escrituras? Per
o salmo vinte e três, como Sockman fêz com eficiência. que não pregar como ministro cristão e não como rabino judeu?
Um outro pregador falou sobre a parábola de nosso Senhor Estas sugestões aplicam-se também aos pastores que não po-
sobre boa vizinhança. Em vez de falar sobre o Bom Samaritano, dem pregar pelo rádio. Aquilo que interessa aos homens e mu-
o locutor referiu-se a um viajante e a dois membros da Igreja, lheres, vindo de um desconhecido que fala de longe, deve ter muito
um pastor e um diácono, ambos dos antigos tempos coloniais. Um maior apelo se vier do pastor no púlpito de sua igreja. Qualquer
após outro passaram de largo por um judeu, que jazia na estrada que seja a origem da mensagem e qualquer que seja a sua forma,
agonizando, vítima de salteadores. O viajante veio com o seu a pregação atualmente requer interpretação da vida aqui e agora,
Chevrolet, prestou-lhe os primeiros socorros e desviou-se do seu iluminada por Deus. Se o indivíduo no púlpito souber pregar,
caminho para ajudar o ferido a recuperar saúde e vigor. Deste nunca deve temer a concorrência do locutor, que é obrigado a
modo, usando os fatos relacionados com pessoas individualmente, manter-se invisível e a parecer impessoal.
o orador descreveu ação e luta, conflito e "suspense", com o ponto
culminante acertado. Este género de pregação requer o uso do
cérebro no estudo e da imaginação perante o microfone. IMPORTÂNCIA DA FORMA LITERÁRIA

Será que os sermões pelo rádio têm que ser sempre baseados Os estudantes do rádio acentuam também a importância da
na Bíblia? De acordo com alguns especialistas na matéria não, forma do sermão. Afirmam que o pregador deve começar com
mas ultimamente a tendência é de cada vez fazer maior uso das algo que capte e prenda a atenção com segurança. Fora com a
Escrituras. No entanto pregar da Bíblia talvez não seja um exem- introdução enfadonha antiga! Em outros tempos o pregador tinha
plo bom para pregadores mais jovens. Certa vez, no domingo duas a liberdade de usar alguns minutos para aquecer, mas o pregador
semanas antes da Páscoa, os hinos e a música transmitida por de rádio deve estar pronto antes de começar. A partir da pri-
uma rede radiofónica nacional relacionavam-se com o significado meira sentença não deve abrandar, mas tornar-se cada vez mais
e glória da Cruz. O mesmo acontecia com as orações e a leitura atraente. O sermão radiofónico requer, do começo ao fim, inte-
das Escrituras, mas o sermão baseava-se no salmo quarenta e resse humano, o que em parte depende da forma literária.
seis. Na semana seguinte, no domingo de Ramos, todos podiam
Nas primeiras sentenças, o pregador que fala pelo rádio talvez
esperar que um ministro evangélico falasse acerca da entrada
convença o ouvinte a fazer uma pergunta e, portanto, o sermão
triunfal ou da cruz, mas o culto cristocêntrico conduziu para a
deve estar relacionado com essa pergunta. Na mensagem em si
mensagem extraída do salmo cento e vinte e um. Consequente-
o pregador oferece ao amigo invisível algo em que meditar o resto
mente cada culto significava recuo no tempo e não ia ao encontro
do dia, se não toda a semana. Emissões religiosas consistem
das necessidades do momento.
frequentemente em ensino, às vezes bíblico, interessando por rela-
Qualquer destes salmos coadunar-se-ia com as necessidades cionar-se com o que o ouvinte deseja aprender. A arte do orador
de algum coração noutra época. No verão, quando faz calor e consiste em tornar o ensino atraente e para tal é necessário tra-
os ouvintes estão empenhados numa batalha com enfermidades da balhar no escritório.
alma, palavras dos salvos conduziriam curas em suas asas. Mas O pregador radiofónico usa habilmente a repetição, pois deseja
numa época em que as pessoas pensam, por toda parte, sobre fazer sobressair poucas verdades. Até mesmo num sermão de
a sombra profunda da Cruz e quando as demais partes do culto quinze minutos prefere dizer uma coisa de dez maneiras diferentes,
pelo rádio fazem os ouvintes esperar mensagem acerca do Reden- a tratar ligeiramente de dez coisas diferentes. Fosdick, como
288 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 23d
A UTILIDADE DO RÁDIO

pregador de rádio, devia muito de sua eficácia à habilidade e cui- deve muito à habilidade de usar sua bela voz de baixo, com todo
dado na repetição que queria que o ouvinte recordasse. Por exem- o tipo de notas baixas. Se o indivíduo fala normalmente com
plo, em mensagem acerca de "Coisas que o Dinheiro Não Pode voz de tenor, pode mantê-la na parte mais baixa da escala. Jowett
Comprar", nunca deixou o ouvinte afastar-se do pensamento cen- nunca falou pelo rádio, mas se o tivesse feito teria encantado a
tral. No sermão impresso, mais longo do que quando radiodifun- todos com a voz de tenor, clara e comovente como da flauta nas
dido, quase todos os vinte e cinco parágrafos terminam com uma mãos de um artista. Nem todos os pastores podem ter semelhante
alusão às "coisas que o dinheiro não pode comprar." instrumento, mas todos podem aprender a não erguer a voz quase
Os conhecedores da matéria insistem, também, em que o pre- até aos gritos e guinchos. Por outro lado quase não há pregador
gador radiofónico escreva o sermão integralmente, revendo cuida- que precise evitar o uso indevido dos sons mais baixos.
dosamente o manuscrito, sentença por sentença; em que deve usar
palavras, sentenças e parágrafos curtos; em que deve escrever Ouvindo rádio o indivíduo também vê a insensatez de se falar "
sobre pessoas, nunca permitindo que o ouvinte perca de vista al- com grande rapidez. Há muitos pregadores de rádio que dão
guma pessoa ou pessoas, de preferência em ação. Este género de exemplos dignos do falar pausado, outros não. O mesmo acontece
pregação requer fatos, fatos que vivam, se movimentem e progri- no domínio dos esportes. Quando ao domingo ouvimos o relato
dam em direção ao alvo. Em suma, prepare-se como para peça de um jogo de futebol pelo rádio, gostamos do locutor que descreve
de um ato. Por outro lado, evite o "jargão radiofónico", como claramente todos os pormenores do jôgc, mas logo nos cansamos
"eu cito" ou "fim de citação". Quando as pessoas vão à Igreja, do "intérprete" que se agita e se entusiasma para fazer-nos parti-
para que lembrá-las do rádio em casa? Pobre psicologia! cipar do seu entusiasmo. Que nos interessa o seu histerismo?
Queremos acompanhar o jogo! Depois de mudar de estação, por-
que o locutor se torna incoerente, e sintonizando outro que procura
IMPORTÂNCIA DA ENUNCIAÇÃO tornar tudo claro, o ministro pode perguntar-se a si mesmo: "Co-
mo é que prego? Corro como se fosse a um incêndio, que talvez
O pregador radiofónico competente prepara-se para enunciar se apague antes de eu lá chegar?"
sua mensagem como se estivesse conversando com seus amigos Um ministro ocasional fala devagar demais. Faz pausas lon-
junto à lareira. Como Franklin D. Roosevelt, o ministro fala com gas demais depois de cada período ou então parte as sentenças
animação, mas sem exagero. "Sempre que o ouço pelo rádio, tenho em bocados, que isolados nada significam. Como, pois, é possível
a impressão de ouvir um amigo". Que homenagem! Por que o saber se estamos falando depressa ou devagar demais? Ao ouvir
leigo não há de sentir isto sempre que vai à igreja e ouve um o rádio podemos verificar que os melhores locutores falam mais
sermão pregado pelo pastor? Ali o pregador não precisa usar compassadamente do que a maioria dos pastores que não pregam
manuscrito, como se estivesse na cabina de rádio. Dirigindo-se pelo rádio. Consideremos, por exemplo, Madame Chiang Kai-shek,
aos seus amigos, na sua igreja, o ministro pode falar de coração Winston Churchill ou Franklin D. Roosevelt, nenhum deles fala
para coração, de vista para vista. Se não o fizer, por que deveria com rapidez. Quando fazem pausas, fazem-nas impressionantes,
o leigo sair de casa, na chuva, se pode ouvir o mesmo género de por vezes até memoráveis. Quer o ouvinte concorde ou não com
pregação impessoal no rádio? o que dizem estas três grandes personalidades da I I Guerra Mun-
O jovem pregador, escutando os bons pregadores radiofónicos, dial, pode aprender imenso com estes mais hábeis oradores do seu
pode aprender a falar corretamente. Pode ver a sabedoria de man- tempo. Aqui novamente aventuramos uma regra de trabalho: "Fa-
ter a voz no lugar certo. Sockman, como pregador radiofónico, la de tal modo que ninguém repare como falas. Sê natural. Pro-
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A UTILIDADE DO RÁDIO

cura variedade. Mantém-te do lado certo; tende a falar pausada- pós-graduado de pregação do Evangelho, hoje em dia. Êle pode
mente". aprender a usar os sistemas de ampliação como meios de graça.
Em suma, que suplique a bênção de Deus sobre a pregação da
Estivemos pensando na maneira como os mestres falam pelo
rádio. O mesmo é verdadeiro quanto à pregação pelo rádio. Mas Palavra, com ou sem o rádio e o alto-falante.
se alguns dos melhores sermões foram irradiados, também alguns
LEITURAS SUGERIDAS
dos piores. Deste modo, o jovem que desejar melhorar a sua
pregação, deve saber que orador escolher como modelo. Alguns B a m o u w , Erik, Handbook oí Radio Writing, ed. rev.. Boston, Little, Brown & Co.,
preferem Fulton J. Sheen, outros Walter Maier, que, segundo di- 1947.
zem, domina o maior auditório radiofónico de todas as irradiações Cantril, Hadley, e Allport, Gordon W., The Psichology o/ Radio, Nova York, Peter
, religiosas na América. Também aqui ousamos apresentar uma Sm'ith, 1 9 4 1 .
regra de trabalho: "Estuda os métodos do pregador radiofónico Crews, Albert, Professional Radio Writing, Boston, Houghton Mifflin Co.. 1946.
Lovelèss Wendell P., Manual o/ Gospel Broadcasting, Chicago. Moody Press, 1 9 4 6 .
preferido pelos leigos e descobre os segredos da sua eficácia. Veri-
Parker E. C. e Outros, Religious Radio, Nova York, Harper & Bros., 1947.
ficarás que depende principalmente da naturalidade e boa von- Sayers,' Dorothy, The Man Bom to Be a King, Toronto, Ryerson Press, 1913.
tade". Muito antes do tempo da radiofonia, Chalmers inflamou Welch, J. W., The Church and Religious Broadcasting, um opúsculo. Londres, s. d.
incontáveis corações pela "severidade de temperamento".

Tudo isto se aplica em parte à pregação por meio de alto-fa-


lantes. Mais cedo ou mais tarde todos os pastores terão que pre-
gar num santuário onde exista qualquer tipo de transmissão, talvez
um simples alto-falante ou todo um sistema sonoro. O pregador
deve permanecer bem em frente ao núcrofone, sempre com o rosto
voltado nesta direção, mantendo tom uniforme, que não precisa
de ser forte. Se andar de um lado para outro no púlpito ou
deixar que a voz aumente ou diminua abruptamente de volume,
pode aborrecer os ouvintes. Pior ainda, se bater com a Bíblia ou
o hinário contra Q microfone, talvez isso soe como um touro de
Basã. E pior de tudo, se o pregador estiver preocupado com o
problema, é possível que fale como um fonógrafo. Diante destes
fatos, por que não procurar uma igreja com tal equipamento e
pedir a um dos diáconos para lhe dar uma ou duas lições sobre
a maneira de falar pelo microfone?
Que concluir, pois? Visto que o rádio e outros instrumentos
mecânicos vieram para ficar, como ministros deveremos considerá-
los como vantagem ou desvantagem, como amigos e auxiliares da
igreja local ou como rivais e inimigos do púlpito? Se o pastor
aprender tudo quanto pregadores pelo rádio podem ensinar sobre
a maneira de atrair as pessoas, dará graças a Deus por este curso
PROBLEMA DA DURAÇÃO DO SERMÃO 21fS

mulheres, meninos e meninas a caminho da Igreja Católica Roma-


CAPÍTULO XX na, regressando meia hora depois. Durante estes trinta minutos
ouviram um culto em latim, com um pequeno sermão de cinco
minutos. E por que vão à Igreja todas as semanas? Em geral por
causa do culto e não do sermão. Por outro lado, será que a
Igreja Protestante poderia sobreviver tendo nada mais que sermõe-
PROBLEMA DA DURAÇÃO DO SERMÃO zinhos de cinco minutos, por mais maravilhosos que fossem?
Também pelo rádio o culto não dura mais que trinta minutos.
Depois da música, da leitura da Palavra de Deus e das orações,
O PROBLEMA QUE AGORA vamos considerar diz res- tudo breve e apropriado, vem a mensagem que não dura quinze
peito a todos os pregadores e a todos os sermões: minutos. Às vezes todo o culto toma apenas quinze minutos, com
quanto tempo se deve pregar? As respostas variam um sermão que abrange metade deste período. Semelhante tra-
enormemente, por vezes sem razão. Não há uniformidade na His- balho de púlpito serve para muitos indivíduos com "mente cinema-
tória da Pregação, embora pareça que nos dias bíblicos os profetas tográfica" ou sem mente alguma. É certo que o ritmo de vida
e apóstolos não falavam durante muito tempo. No culto de des- hoje é mais rápido do que no tempo dos "Peregrinos", mas mesmo
pedida o apóstolo Paulo falou até à meia-noite (At 20.7), mas, assim continua a ser um problema saber até que ponto o púlpito
dadas as consequências, não deve ter repetido a experiência. deve ceder ao espírito do século. Muita gente que pensa, queralgo
Também na Igreja Primitiva os pais aparentemente não fala- mais substancial do que o lanche que recebem, por vezes na forma
vam durante muito tempo, pois tal costume parece ter surgido de "sermõezinhos" de rádio.
depois da Reforma. Claud Harms, na Alemanha, costumava falar
1

Por que então os leigos protestam contra semões muito lon-


de um discurso que durou o dia inteiro — felizmente foi no inverno,
gos? Não por causa do comprimento, mas por causa do tédio.
quando a noite vem mais cedo do que no verão. Para os puritanos
Protestam contra a monotonia e falta de interesse. Não podem
ingleses a mensagem que durasse uma hora não parecia longa e
gostar de sermões em que não há faíscas. Se o discurso durar
nos Estados Unidos houve ministros que pareciam corredores de
quarenta minutos, têm duas vezes mais oportunidades para des-
fundo, a quem nunca falta fôlego.
cobrir erros do que se durasse apenas vinte. Têm, muitas vezes,
a impressão de que o pastor tenta usar mais material do que pode
dominar e ilustrar. Quando fala sobre um episódio da vida de
A DURAÇÃO DOS SERMÕES ATUALMENTE José ou de Moisés, os ouvintes ficam sem saber por que o sermão
apresenta toda a carreira do herói. Preferiam que o pastor come-
Tudo mudou e hoje em dia o pêndulo passou para o outro çasse com algo de específico e depois não deixasse a bola fugir.
extremo. "Grande número de nossos pastores mais jovens desejam Esquecem, infelizmente, que a pregação incisiva necessita mais
ver o sermão curto e reduzido a quase nada, como no caso do gato tempo e poder de raciocínio do que o horário de trabalho do pastor
em Alice no País das Maravilhas, com um mero sorriso no fim". permite. É por isso que tem de vaguear, muitas vezes começando
Estes jovens ministros observaram grande número de homens e em Adão.
1
Ver Blackwood'3 Magazine, Edimburgo, fevereiro de 1868. Nem lodos os Esses ouvintes críticos opõem-se a todo e qualquer sermão que
estudiosos estão de acordo neste assunto.
pareça fastidioso, talvez se impacientem, até mesmo com quem fale
PROBLEMA DA DURAÇÃO DO SERMÃO
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

A tendência para a concisão nos sermões surgiu no tempo em


apenas quinze minutos. Começam a agitar-se quando se lê um que o púlpito declinou em prestígio. Há muitos anos um famoso
texto tão longo, que não pode ser repetido de cor, ou quando se escritor de Homilética punha os seus irmãos de sobreaviso, contra
começa tranquilamente, sem pregar logo de início e especialmente a moda de encurtar os sermões. Afirmava que este costume con-
3

quando se aproxima o parágrafo final com um "finalmente" após duziria à ignorância geral da Bíblia e à ausência de doutrina cristã.
outro. Acham que o pregador chama a atenção para a sua falta Desde então muitos sermões se tornaram mais curtos do que
de preparação, que não sabe usar a imaginação e que deveria apren- aquele professor pensou ser possível e durante este período grande
der a pregar. No seu desejo premente de sermões mais curtos, número de nossos leigos se desinteressou pelas Escrituras e pela
esses indivíduos talvez não saibam que o pregador frequentemente doutrina cristã. Quem poderá dizer se os sermões curtos foram
verifica que é mais difícil preparar sermão de quinze minutos do a causa ou a consequência deste fato?
que de meia hora. O mesmo se passa na fabricação de um camafeu
e de uma estatueta. Esta tendência tomou impulso no começo do século XX, de
tal maneira que um professor e teólogo inglês protestou veemen-
É possível que o desejo de sermões curtos seja mais do ministro temente. Como os seus livros foram publicados, aquilo que tem
que do leigo. Muitos pastores, desejando enriquecer o culto o a dizer acerca da pregação exige atenção. P. T. Forsyth influen-
mais possível dão lugar secundário ao sermão. Se assim fôr, por ciou bastante o atual avivamento que existe no interesse pelas
que não tornar a colocá-lo no lugar certo, no centro do culto pú- Escrituras e pelas doutrinas. Se as palavras que se seguem pa-
blico ao Deus todo-Poderoso? Ultimamente, em várias igrejas recem exageradas, lembremo-nos de que foram escritas numa épo-
locais, há muitos indivíduos inteligentes que se queixam porque os ca em que as mensagens evangélicas se tornavam cada vez mais
pastores apresentam pequenas palestras, em vez de sermões que curtas. Os pastores, em alguns círculos, começavam até a pedir
saciem as almas. Não se importam que o pastor fale vinte e cinco "moratória na pregação". Graças a Deus mais recentemente teó-
minutos, desde que tenha algo para dizer e saiba como dizê-lo logos e ministros começaram a pensar muito em pregação e teo-
com eficácia. A maioria dos nossos leigos não insiste tanto em logia ligadas entre si. Mesmo assim todos nós devemos ponderar
sermões mais curtos, quanto em melhores. esta advertência:
Um brilhante estudioso e ensaísta inglês chamou a atenção
A exigência de sermões breves por parte dos cristãos, é uma das
de alguns líderes da Igreja ao discutir "Os Bancos Vazios da influências mais fatais na destruição da pregação, no sentido mais puro
Igreja". Falando do .ponto de vista do indivíduo que deixou de da palavra. Como podemos pregar, se sentimos que a congregação colocou
ir com frequência à Igreja, afirma que no púlpito se deveria ali- um relógio em nossos lábios? É possível que a brevidade seja a alma da
mentar as ovelhas e não apenas "divertir a assistência". finura de espírito, mas o pregador não é um espirituoso. Quanto aos que
dizem querer pouco sermão, porque vêm adorar a Deus e não ouvir homens,
" O que o ausente exige e deixa continuamente de achar, é algo que o estes ainda não compreenderam os rudimentos da ideia principal do culto
interesse e desafie na Igreja. O que mais o desaponta são os sermões — cristão... U m cristianismo de "sermõezinhos" é um cristianismo de pouca
não como muitos pastores modestamente supõem, por serem longos demais fibra". 4
ou porque ofendem o ouvinte, mas pela razão oposta, por serem mesquinhos,
por não irem bem ao fundo da questão e por serem conciliadores e tímidos Atualmente, em muitos círculos, a tendência é para regressar
demais... Quando o sermão começa, o que deseja ouvir... é o pastor a um ministério didático mais popular. Se qualquer ministro de-
que, sem temor nem compromisso, relacione o seu assunto, qualquer que
seja, com as verdades mais profundas do cristianismo". 2 » Ver Austin Phelps, My Portjolio, Nova York, Charles Scribner's, 1882, pp-
117-122.
* Ver Positive Preaching and the Modem Mind, Nova York, Hodder & Stough-
,„..
2 V
Charles Morgan, Reileclicms in a Mirror, Toronto, The Macmillan C o ,
e r

1948, pp. 146-148. ton, 1907, pp. 109-110.


246 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES PROBLEMA DA DURAÇÃO DO SERMÃO 247

seja ensinar do púlpito, deve ter tempo para desenvolver o assunto. celebrar o centenário da sua fundação ou o fim da hipoteca
Se resolver tratar determinada doutrina bíblica ou dever cristão, do templo. Os oficiais da igreja convidam um orador de longe
deve tomar o tempo suficiente para tornar clara, luminosa e prática para pregar o sermão especial. Desejam ouvir mensagem como
essa verdade ou dever. Se pretende apresentar a verdade e luz
a que John A. Broadus pregou, há muitos anos, na Segunda Igreja
contidas numa porção dos Evangelhos ou num texto áureo de
Batista de St. Louis. Na dedicação do santuário falou sobre
Isaías, o intérprete deve ter tempo para apresentar os fatos salien-
"Culto", de maneira a tornar aquela congregação uma força desde
5

tes, mostrando em seguida o seu valor hodierno. Só um príncipe


então. Aquele príncipe do púlpito não teve que se dirigir a pes-
da oratória é capaz de fazer tudo isto em menos de vinte e cinco
soas cansadas por outros exercícios, nem se sentiu obrigado a parar
minutos.
quando soou a campainha para o almoço.
Bem ou mal, o pregador convidado muitas vezes tem a im-
O CAMINHO DA SABEDORIA pressão de que os serviços especiais duram tempo demais e que
o sermão começa quando os ouvintes já se sentem cansados, quando
Onde está o caminho da sabedoria, atualmente? Ninguém não enfarados. Por que não abreviar as outras partes do culto
deseja regressar aos intermináveis sermões de antanho, pois anti- público, quando a ocasião requer mensagem mais longa do que é
gamente muitos pregadores chegaram a extremos de prolixidade costume? Para fazê-lo não é necessário desprezar a música, nem
e profusão. Serviram mesa tão cheia, que quase provocaram indi- a leitura da Palavra, nem as orações, ou seja, tudo quanto merece
gestões; mais recentemente, alguns dos seus sucessores no minis- lugar de honra. Por outro lado, se necessário, o dirigente do culto
tério, reduziram demais as iguarias. Onde está, pois, o meio termo deve planejar um sermão mais breve, de modo a dar tempo para
áureo? Cada pastor deve descobrir a resposta na sua própria igre- tudo. De qualquer maneira, nunca se deve prolongar o período
ja, onde deve ter em consideração as tradições do passado e as dedicado ao culto para além da capacidade de resistência dos nossos
necessidades dos nossos dias, especialmente estas últimas. De dias, especialmente se houver crianças.
qualquer modo, algumas sugestões pedem ajudar.
3. Numa ocasião especial, o culto poderá conduzir a um ato
1. O comprimento do sermão deve variar de acordo com o de adoração coletiva. Se esta parte do culto durar mais do que
caráter do culto. No culto matutino estão presentes meninos e alguns minutos, o pastor deveria planejar para que o ponto má-
meninas, que ficam âté à bênção. Nesse caso, quem tiver de ximo ,se iniciasse antes de as pessoas começarem a pensar em ir
planejar o culto, poderá fazê-lo de forma a durar no máximo uma para casa. Numa igreja de Chicago, por exemplo, a Ceia é dada
hora. Não necessita chamar a atenção para a hora ou anunciar uma vez por mês, alternadamente, no culto da manhã e da noite.
que vai parar quando bater o meio-dia. Sabe, porém, que o pre- Nos outros domingos, a hora de culto culmina no sermão, que
lúdio ao órgão começa às 10:45, e pára exatamente às 11. Por ocupa o lugar outrora dado à música. No dia de Comunhão, po-
isso pode planejar o culto de modo a terminar ao meio-dia ou pouco rém, a Ceia do Senhor constitui em si o sermão em ação: "Todas
depois. Numa hora pode pregar um sermão que dure, no máximo, as vezes que comerdes este pão e beberdes o cálice, anunciais a
vinte e cinco minutos. Diz-se que Buttrick pensa em termos de
morte do Senhor, até que Êle venha" (1 Co 11.26). A palavra
vinte e dois minutos.
"anunciar" significa literalmente "pregar".
2. É possível que se torne necessário um sermão mais longo
em ocasiões especiais. A congregação pode querer, por exemplo, Ver Sermons and Addresses, Londres, Hodder & Stoughton. 1887, pp. 1-25.
2JfH A PREPARAÇÃO DE SERMÕES PROBLEMA DA DURAÇÃO DO SERMÃO 249

Naquele dia eminente, o povo devia vir à Mesa do Senhor como necessidades presentes do campo. O ministro, depois de conhecer
ao lugar na terra mais próximo do céu. Em especial numa con- os fatos como eles são, dará graças pelo conselho de Beecher:
gregação grande, é possível que o ambiente na hora requeira a "O comprimento de sermões... nunca deveria ser determinado pelo
abreviação do culto que conduz ao Sacramento. O pastor, em relógio, mas por considerações mais vastas — sermões breves para assuntos
vez de preparar um sermão normal, poderá empregar uma medi- simples e sermões longos para assuntos vastos. ( A sabedoria prática) não
exige que os sermões tenham todos o mesmo comprimento. Um poderá
tação de quinze ou somente doze minutos. Não deve tentar en-
ser breve, o outro longo e o seguinte nem uma coisa nem outra. A melhor
sinar doutrina ou apresentar um dever, visto que deseja criar at- forma de concentrar um sermão é torná-lo interessante. O objetivo da
mosfera semelhante à do Monte da Transfiguração. Em semelhan- pregação não é fazer com que a congregação saia do templo mais cedo...
te "atmosfera de maior visibilidade", os leigos não devem "ver Não se podem discutir grandes temas em poucos minutos, nem é possível,
homem algum, mas apenas Jesus" e então ser transformados à por meio de truques — com sermões de dez ou vinte minutos —, conduzir
uma congregação ã consideração mais vasta e profunda de grandes temas".*
Sua imagem. A preparação de tal mensagem requer capacidade
e labor, sempre em espírito de oração.
5. Um pastor experiente talvez necessite preparar sermões
4. Para ir ao encontro das necessidades da igreja, os oficiais curtos. Talvez declare ter ouvido Charles E. Jefferson pregar, em
talvez devam planejar mais do que um culto público no domingo. Nova York, uma série de mensagens doutrinárias, cada uma du-
Neste caso, o segundo deve ser diferente do primeiro. Se no culto rando uma hora, à multidão que se apinhava no tabernáculo da
matutino se consegue elevação da alma com mensagem inspira- Broadway. Esse príncipe do púlpito, porém, nem sempre falava
dora, o outro poderá apelar mais diretamente àqueles que gostam durante uma hora. De fato nunca o fazia, a menos que a mensa-
de pensar. Nem todos os que vêm de manhã estarão de novo gem precisasse dos sessenta minutos. Se vivesse hoje, talvez não
presentes à noite ou ao anoitecer, mas se o segundo culto tiver ultrapassasse os quarenta e cinco minutos. Quanto aos indiví-
forma muito sua e fôr ao encontro de outro tipo de necessidade, duos sem o seu talento, o melhor é tomarem como limite máximo
outras pessoas começarão a assistir. Assim a Igreja deve alcançar vinte e cinco ou trinta minutos. Infelizmente quanto mais o
indivíduos de vários tipos. No serviço noturno, pelo menos de vez ministro avança em idade, mais pensa que deve ser ouvido pelo
em quando, o sermão poderá durar trinta e cinco minutos, mas seu muito falar.
de qualquer modo o culto não deve ultrapassar uma hora. No
6. O jovem pregador, por outro lado, talvez necessite consi-
entanto, se a congregação gostar de ter um culto cantado de ante-
derar a sabedoria que existe em pregar mais do que quinze ou
mão, talvez não se importe se o culto todo demorar cerca de uma
vinte minutos. Se der ouvidos apenas àqueles que murmuram a
hora e um quarto.
respeito dos seus sermões, talvez não considere convenientemente
Em Washington. D. C . o programa de uma igreja central exige o problema. No entanto, se estudar a história da pregação, des-
cobrirá que os ministros mais famosos em geral usavam seu tempo
três cultos dominicais e seus líderes pensam em acrescentar ainda
para desenvolver o assunto do sermão. Como vimos, Fosdick afir-
um quarto. Numa outra igreja central, o quarto culto se realiza
ma que a mensagem normal no púlpito dura trinta e cinco mi-
na quinta-feira, ao meio-dia. Durante a quaresma, nesta congre-
nutos. Há quem pense em termos de mais ou menos vinte e cinco.
gação que não usa liturgia, há cultos ao meio-dia diariamente,
Em suma, recomendamos um áureo meio-têrmo.
com exceção dos sábados. Cada um dos cultos dura apenas trinta
minutos e a mensagem toma dez. Quaisquer que sejam os porme-
nores na igreja local, o programa deve estar de acordo com as « Yale Lectures ou Preachino, p. 234.
aso A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

Qualquer que seja a tua idade, considera o assunto em oração.


Faze com que cada sermão traga glória a Deus e salvação ao povo.
Se pregares bem, os ouvintes pouco pensarão acerca do tempo que CAPÍTULO XXI
passa, mas se nada mais tiveres para dizer depois dos quinze mi-
nutos, o melhor é parar enquanto o povo deseja que prossigas.
Pela graça de Deus resolva fazer cada sermão tão longo que seja
possível apresentar o assunto convenientemente e tão curto que
seja interessante. Se sentires, em qualquer momento, que não
MENSAGENS PARA CRIANÇAS
sabes se hás de preparar um sermão longo ou curto, o melhor é
fazê-lo não muito longo. Porém, quando afinal desceres do púl- Os DIRIGENTES DE CADA congregação devem pensar
pito, deves, acima de tudo, dar graças pelos sermões que foram muito sobre como atingir crianças, como recrutá-
úteis e não pelos mais curtos. las para o culto público e prepará-las para se
tornarem membros da Igreja. A ausência de meninos e meninas
LEITURAS SUGERIDAS no culto matinal é causa de muita preocupação. A menos que
Brown, Charles R., The Art of Preaching, Nova York, The Macmillan Co., 1925, se habituem a assistir regularmente ao culto antes dos doze anos,
cap. IV.
é muito possível que nunca se tornem .seus assistentes regulares.
Burton, Nathaniel J., fn Pulpit and Parish, Nova York. The Macmillan Co . 1925. Na maioria das igrejas os adultos não vão ao culto, porque dei-
cap. V I .
xaram de fazê-lo entre seus dez e doze anos. Aqui está um dos
James, William, The Principies of Psychology, Nova York, Holt. 1908, I, 402-458. problemas mais sérios do protestantismo e ao mesmo tempo a
"Atenção".
mais atraente das oportunidades.

OS PLANOS HODIERNOS

Para atrair meninos e meninas à igreja, no domingo de manhã,


alguns líderes imaginaram três métodos, que descrevemos como
bom, melhor e ótimo. Qualquer método é melhor do que ignorar
o assunto, esperando para ver o que acontece quando os que agora
vão à igreja morrerem. Depois de Deus, o bem-estar e o progresso
da congregação dependem principalmente de homens e mulheres,
velhos e novos, que vão à igreja sempre que podem. Muitos deles
assistem regularmente aos cultos porque se habituaram a isso
antes de completarem os doze anos. Por isso, estudemos três mé-
todos de recrutar jovens assistentes aos cultos para os próximos
anos.
Vamos pensar em primeiro lugar no pregador e veremos que
nenhum ministro está errado, a não ser aquele que fecha os olhos
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
MENSAGENS PARA CRIANÇAS 253
à seriedade da situação. Consideramos o primeiro plano como
bom, porque se adapta a igrejas excepcionais; o segundo, como Oberammergau. Enquanto alguns atôres se preparam, por detrás
melhor, porque se adapta a maior número de igrejas; finalmente, da cortina, para a cena seguinte do Novo Testamento, outros apre-
o terceiro, como ótimo, porque serve em toda parte. Se alguém sentam episódio análogo do Antigo. Se, por exemplo, a cena se-
descobrir outra maneira de fazer com que crianças venham ao guinte se relaciona com a Ceia do Senhor, o quadro representa a
culto, que se regozije com isto. Talvez descubra que se parece oferta do Maná. Quando a última cena apresenta Judas traindo
com um dos três seguintes: Jesus, o quadro representa os filhos de Jacó vendendo José, seu
irmão.
1. A Igreja Menor. Para este plano é necessário existir pessoal Um sermão assim é quase o ideal, quando as crianças se sen-
e equipamento que só uma grande congregação pode ter. Uma tam com os pais nos respectivos bancos da igreja e ali permanecem
igreja com mais de mil membros, tem crianças em número sufi- até o fim do culto. Se os pais não assistem, os seus filhos podem
ciente para formar uma igreja dentro da igreja. Essa consistiria sentar-se com os professores da Escola Dominical. Se meninos
de jovens com idade escolar, mas novos demais para frequentar e meninas se ajuntam nos bancos da frente, tornam-se centro da
o segundo ciclo dos colégios. Não nos interessam agora as crianças atenção de todos. Se saem atropelando-se, enquanto os adultos
fora da idade escolar. Também elas precisam de cuidados e cari-
estão tentando cantar um hino, os que abandonam o santuário
nho, mas não como membros e oficiais da igreja, que ministra
perdem grande parte do valor do culto público. No entanto, os
meninos e meninas com a consciência de estarem crescendo e não
defensores do sermão para menores afirmam, com justiça, que
gostam de ser considerados "crianças".
vinte minutos com Deus na Sua Ceia, toda semana, ajudarão
Para este tipo de programa é necessária uma capela que sirva muitíssimo mais as crianças do que qualquer outro tipo de "tra-
para o culto, suficientemente afastada do santuário para não per- tamento de ausentes".
turbar. E, o que é mais importante ainda, o pessoal da igreja deve
3. Culto Regular. O terceiro plano nada apresenta de novo.
incluir uma pessoa que saiba dirigir crianças no culto público,
Baseia-se na ideia antiga de que o culto matutino deveria incluir
que inclui o género de pregação mais difícil que existe.
as crianças, além dos pais e das mães. O ministro e outros diri-
A Igreja Menor reúne-se, em geral, à hora de culto no santuá- gentes, ao escolher os hinos e a música, as leituras bíblicas, as
rio. Este plano é excelente, se fôr bem dirigido. Há, no entanto, orações e as leituras responsivas, devem tentar fazer tudo o mais
um problema: o 4 transferência do menino ou da menina para
a
atraente possível para esses jovens amigos. Se o plano fôr eficaz
a corrente principal da vida e culto congregacionais. A menos que para crianças até doze anos, os dirigentes não se devem preocupar
haja alguém encarregado disso, afastar-se-ão da igreja ao deixa- com os adultos, inclusive com os avós. As pessoas de idade amam
rem de assistir ao culto que lhes é dedicado. a igreja que cuida dos homens e mulheres de manhã.
Consideremos um livro de Willard L. Sperry, onde encon-1

2. O Sermão para Menores. Este plano chama-se, por vezes,


tramos alguma luz acerca deste assunto. Sperry é professor na
"sermão para crianças", embora os meninos e meninas da idade
Faculdade de Teologia da Universidade de Harvard e realizou um
em vista mereçam um título que os encoraje a olhar para o alto
estudo especial a respeito do culto público, passado e presente.
e não para baixo. O sermão para menores pode tomar formas
Neste livro publica a substância do que apresentou num clube
várias, na maioria boas. Certo pastor inglês costuma pregar a
feminino, na cidade de Nova York. Afirma êle que o culto de
crianças uma breve mensagem como prelúdio do sermão para adul-
tos. Este género de plano assemelha-se ao Auto da Paixão em
What Yov Owe Your Child. Nova York, Harper & Bros., 1935.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES MENSAGENS PARA CRIANÇAS

manhã oferece a melhor oportunidade para levar o menino e a e pão-duro em opiniões, o professor perguntou à classe: "Quantos
menina para junto de Deus e desenvolver hábitos sadios, que per- dentre vós iam regularmente ao culto da manhã aos seis anos?"
maneçam toda a vida. Muitos de nós concordamos, pois a nossa Dos noventa presentes quase todos ergueram o braço. Se alguém
experiência e observação de igrejas por toda parte nos mostra o pretendesse discutir o assunto poderia ter perguntado: "Qual dos
mesmo. planos apresentados conduziu jovens, de ambos os sexos, a entra-
Certo professor de homilética passou a maior parte do seu mi- rem no ministério ou no trabalho missionário? Quantas biografias
nistério ativo em duas igrejas situadas junto a Universidades. Pri- é possível ter, semelhantes às de Schweitzer e Rauschenbusch?
meiro meditou longamente sobre maneiras de atrair professores e Tem certeza, pelo menos, de que a maneira antiga é eficaz? Nesse
estudantes e a certa altura fêz uma descoberta que transformou caso, por que não experimentá-la?"
completamente sua maneira de pensar. Descobriu que professo-
res e alunos gostavam de ir a uma igreja em que crianças se
sentissem em casa e que os universitários podiam compreender OS CORAÇÕES DAS CRIANÇAS
e apreciar tudo quanto interessava às crianças em idade escolar.
Êle não manteve todos os cultos neste nível, pois desejava que A maneira antiga às vezes ainda é eficaz. Por que não sempre
sentissem o ministério da fé e ficassem buscando algo fora do e em toda parte? Em parte, porque muitos dos líderes não com-
seu alcance. Porém, em cada parte principal do culto — hinos, preendem o coração dos meninos e meninas. Como deverá o indi-
leitura bíblica, oração e sermão — procurava incluir algo para víduo no púlpito atrair crianças de dez ou doze anos? O pastor,
os mais novos, a quem considerava os membros mais importantes para responder a esta pergunta, tem que saber algo sobre psico-
da congregação. logia. Talvez não penetre na matéria tão profundamente quanto
Weatherhead, mas todo e qualquer pastor precisa conhecer algo
Acima de tudo, o ministro ambiciona a presença de meninos acerca dos corações humanos, em especial de meninos e meninas.
e meninas na celebração dos sacramentos. É possível que, de Deve, pelo menos, compreender algo a respeito de impulsos e ten-
momento, pouco compreendam do que vêem e ouvem, mas quantos dências inatas, antigamente conhecidas pelo nome de instintos.
de nós adultos conseguimos penetrar no mistério do Evangelho, Estas características, qualquer que seja a sua origem e número,
que aparece através destes símbolos sagrados? Mais tarde, quando existem nos jovens a quem o pastor deseja alcançar para Cristo
essas crianças forem oficiais leigos e ministros, ou missionários e Sua Jgreja. A seguinte lista foi organizada por Arthur T. Quiiler-
em terras longínquas, relembrarão os dias em que o Senhor Deus -Couch, da Universidade de Cambridge. - Afirma êle que cada
se dava a conhecer aos seus corações, quando contemplavam a criança normal, além de alimento e exercício, deseja:
lavagem com água e o partir do pão. Os que quiserem investigar
mais profundamente, podem começar com a vida de Albert Sch- 1. Falar e ouvir. Principalmente falar! Estes ouvintes sen-
weitzer e Walter Rauschenbusch. Albert, rapazinho ainda, sem ter tem-se felizes quando podem repetir o texto e participar de outras
idade suficiente para se tornar membro da Igreja, eis que descobre partes do culto. Apreciam "pregação cooperativa", com um dá-
Deus maravilhoso e junto de si, durante a celebração da Ceia do -cá-toma-lá, que consiste em conversar com o pregador no púlpito.
Senhor; com o pequeno Walter aconteceu o mesmo, quando assis- Esta tendência comunicativa da parte de meninos e meninas, tal-
tiu à celebração da ordenança do batismo. vez faça com que se modifiquem alguns dos nossos conceitos sobre

"Com que idade deve um rapaz começar a ir à igreja?" eis


o que certo formando perguntou ao professor. Sendo escocês - Ver On the Art o/ Reading, Nova York. G. P Putnam's Sons. 1920. !< 56.
Í56 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES
MENSAGENS PARA CRIANÇAS 257

serem "vistas mas não ouvidas". Por outro lado, se o pregador nhã mostra se o pastor ama ou não as crianças. Se escolher mú-
não sabe como levá-los a prestar atenção ao sermão como ato de sica com apelo para elas, verá que se interessarão pela mensagem
culto, é possível que algum deles tente sobressair-se. Quem, a não que o seu amigo no púlpito lhes apresenta. Em breve descobrirão
ser o seu pastor, deverá guiá-los carinhosamente por meio da que o ministro se preocupa com elas e gostarão, pois, de ouvir o que
palavra falada? diz, pelo menos aquilo que entendem. Porém, como diz Quiller-
-Couch, o pastor deve evitar jargões, "enfermidade de linguagem"
2. Representar, como num drama. Gostam de tomar parte
que faz com que se "usem paráfrases em vez de linguagem breve
numa procissão, entrando no santuário com togas, especialmente
e correta", "escolhendo geralmente substantivos vagos, melodra-
no Domingo de Ramos. Gostam de se levantar para a Leitura
máticos e abstratos, em vez de verbos concretos". Que teste de in-
%

Responsiva e de participar nas orações coletivas. Apreciam os


teligência e humildade para um homem!
sermões daquele que prega com imaginação, não dogmàticamente,
e toma um problema e apresenta uma verdade ou dever "com 5. Conhecer o porquê das coisas. O rapaz normal gosta de
pés e mãos". Tudo isto se parece com um tipo atual de homilética aprender e o mesmo acontece à sua irmã. Gostam do pregador que
e culto público! apele ao seu sentido de maravilha e reverência. De acordo com um
perito, gostam de dois tipos de assuntos e não mais do que dois:
3. Desenhar, pintar, esculpir. Meninos e meninas gostam do coisas que saibam e coisas que não saibam. É por isso que este
pregador que vê o que diz e diz o que vê. E gostarão mais dele
perito recomenda: "Ao falar acerca do que sabem, acrescente algo
se o seu amor pela beleza revelar alma de poeta. Querem que
que lhes pareça novo e estranho. E ao apresentar algo que vejam
use palavras com vida, que lhes mostre algo para sentir, ver e
ser novo e estranho, mostre-lhes como está relacionado com o que
fazer. Se falar de Davi e Golias, querem ver o estilingue e as
conhecem e amam". Tudo isto se parece com a maneira como Su-
cinco pedras tiradas do ribeiro. Gostam até mesmo de usar papel
sana Wesley ensinou João, Carlos e todos os seus outros filhos.
e lápis para ilustrar o discurso do pastor. Pelo menos podem fazer
Sperry dizia que, ao falarmos a crianças, devemos começar e ter-
esses desenhos ao chegarem a casa, se puderem recordar um
sermão tão longo. minar com o maravilhoso, e preencher o intervalo com admiração.
Que arte!
4. Dançar e cantar. Aqui só precisamos pensar em cantar!
6. Construir. Estes nossos amigos querem construir. O rapaz
Por que não organizar um coro para crianças de ambos os sexos?
gosta de brincar com construções, a menina, com bonecas. Ambos
A ordem de culto deveria incluir, pelo menos uma vez por mês, um
número especial por esses jovens que pertencem à Igreja. Que, se interessam por lares para os seres humanos e gostam de ouvir
em quase todos os domingos, apareça no boletim um "cântico para o pregador, quando fala de religião e vida em termos de constru-
meninos e meninas", ou um "hino para decorar". Escolha-se um ção. É possível que não saibam que Paulo e o Mestre falaram mui-
hino que tenha sobrevivido aos anos em virtude da sua beleza. Em tas vezes desta maneira e que qualquer deles talvez tenha parado,
vez de haver dois hinos longos pelo coro da igreja, contentemo-nos no meio de um dia fatigante, para observar um carpinteiro ou
com um só, deixando espaço para três hinos que as crianças co- pedreiro trabalhando numa casa nova. Hoje em dia, sempre que o
nheçam e apreciem. Ficaremos espantados, talvez, ao verificar ministro prudente sobe ao púlpito, verá que os jovens futuros cons-
que quase todas elas amam a boa música. trutores ouvem e respondem àquilo que diz.
Quem tem tudo isto a ver com a conquista de sua atenção para
o sermão? O tipo de música tocada no santuário domingo de ma- s Ver A. T. Quiller-Couch. On the Art of Writing, pp. 101-105.
MENSAGENS PARA CRIANÇAS 250
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

e sobranceiro como dantes. Porém o pilão prossegue a sua obra. Vai o


E acerca do uso de objetos didáticos no púlpito? A sua pre- ferro ao ar e torna a cair cinco, dez, cinquenta vezes, talvez até cem e
sença é admissível algumas vezes. Novo Testamento, hinário, ca- a pouco e pouco o pilão é cravado profundamente no leito do rio e fica tão
neta ou relógio, talvez não chamem demasiadamente a atenção so- firme e seguro, que já não há medo de fazer dele parte dos fundamentos
bre si. Porém, tudo quanto seja estranho, principalmente se fôr de uma casa".*
volumoso, poderá perturbar. Quando meninos e meninas vêem o
pregador fazer bolinhas de sabão ou festas a um gatinho preto no Se algum jovem ministro aprender a atrair crianças por meio
púlpito, não podem pensar muito acerca de Deus, especialmente dos seus sermões e a dirigi-las noutras partes do culto, poderá du-
se a bola de sabão rebenta ou o gato começa a miar. Se o seu pas- plicar seu proveito.•'• Como é possível estudar, de forma mais
tor e amigo descer do púlpito sagrado e fôr ao seu encontro, no prática, homilética e liturgia? Os pastores, que têm conseguido
seu próprio nível, talvez passem a gostar ainda mais dele, mas es- influenciar crianças, conseguiram por várias razões influenciar os
tarão formando hábitos de culto para o futuro? Em geral pensam pais. O indivíduo que fala ao coração desses jovens amigos seus e
que o objeto didático não passa de entretimento e não faz real- os leva junto a Deus, necessita possuir "a simplicidade e pureza
mente parte do culto. Também os mais idosos gostam, mas será devidas a Cristo" (2 Co 11.3).
que adoram a Deus?
LEITURAS SUGERIDAS
Poderíamos considerar ainda mais alguns "impulsos natos",
como nos são apresentados nas obras de William McDougall e ou- Bowie, Walter R.. The Armour of Youth, Nova York. F. H. Revell Co.. 1923.
tros psicólogos semelhantes, e discutir as "leis do hábito". Mas já Cavert, Walter D., Story Sermons from Literature and Ari, Nova York. Harper &
elaboramos o suficiente para mostrar a dificuldade que existe em Bros-, 1939.
pregar para crianças. Um observador que considere com simpatia Cofíin, Henry S., The Public Worship of God, Filadélfia, Westminster Press. 1946,
os pregadores visitantes, queixa-se, acima de tudo, dos seus ser- cap. IX.
mões para menores: "tentam, uns após outros, dizer três ou quatro Hutchison, S. Nye, The Voice Within Us, Nova York, F. H. Revell Co.. 1932
coisas quando mal têm tempo para dizer apenas uma, e usam pa- Jeffs, H., The Art of Addressing Chitdren, Nova York, Geo. H. Doran Co.. 1904.
lavras tão compridas e abstratas que nada mostram que seus ou- James, Mary A., The Faith of Our Childreií. Nova York e Nashville, Abingdon-
Cokesbury Press, 1943.
vintes mais jovens possam ver ou sentir. Esses pastores falam mui-
Kerr, Hugh T., Children's Parabie Sloru-Sermoiis, Nova York, F. H. Revell Co.,
to depressa e tempo demasiado. Deviam aprender a dizer uma só 1945.
coisa e repeti-la vinte" vezes, de vinte maneiras diferentes. Por que Orr, W . M., The Ftngerprints of God, Nashville, Cokesbury Press, 1939.
não há quem nos seminários ensine todos os jovens pregadores a Schofield, Joseph A., A Year of Children's Sermons, Nashville, Cokesbury Press,
trabalhar, qual artista no seu cavalete?" Vejamos, para exempli- 1938.

ficar o que este crítico tem em mente, partes de um sermão para Sherrill, Lewis J.. The Openning Doors of Childhood. Nova York, The Macmillan
crianças de Charles E. Jefferson. Notemos especialmente a repe- Co., 1939.
tição acerca do fixador de pilares que todos os rapazes podem ver Stewart, R. W., The Singing Montain, Londres, 1946.

com sua imaginação:

"É preciso repetir muitas vezes uma grande ideia, para fazer com que
ela penetre na pequena alma do menino. Já vistes, alguma vez um fixador
< Mv FatherS B u s i n e s s , N o v a Y o r k , Ç r o w e l l C o , 1909. g 6 V e r t a m b é m
de pilares fazendo a sua obra? O pilão lança-se no ar, grande bloco de
5 Para outro aspecto, ver Brooks, Lectures ° " p
J a c h
" ' £ J £ h
, c
t 0 n . 1934, PP-
f e r r o , e sem prévio aviso cai sobre o topo do pilar. O pilar não se importa
E . R. M i c k l e m . O u r Aproach to God, Londres. H o d d e r & Stougnto
muito de receber o primeiro golpe, pelo que continua a manter-se orgulhoso 197-204.
A ÉTICA DAS CITAÇÕES 261

vros e coleções de sermões prontos para serem utilizados sem


alteração.
CAPÍTULO XXII
Uma dessas coleções de sermões espalhou-se por toda a Europa
de então. Intitulava-se "Sermones Dormi Securi", e tornou-se tão
popular entre os sacerdotes, que alcançou vinte e cinco edições.
No prefácio, indicava-se a razão de ser do seu título: Sermões para
Dormir Tranquilo; de outro modo o sacerdote misterioso poderia
A ÉTICA DAS CITAÇÕES pensar que quem deveria dormir eram os ouvintes. Quanto à
possibilidade de o livro cair nas mãos dos que iam à igreja, devemo-
nos lembrar que poucos sabiam ler e muito menos coisas como
"DEVE U M MINISTRO dizer a fonte de tudo quanto
esta:
cita?" Este problema ilustra a dificuldade em dis-
cutir ética prática sem ir a extremos, tanto de seve- Aqui felizmente começamos os sermões dominicais com exposições dos
Evangelhos, durante todo o ano, bem conhecidos e úteis para todos os
ridade como de frouxidão. Se o ministro escreve para os jornais
sacerdotes, pastores e capelães, que também são chamados de Dorme Bem,
está sujeito a leis de imprensa, que deve conhecer e obedecer, mas
ou Dorme sem Cuidados, porque podem ser apropriados e pregados ao povo
isto não nos preocupa aqui. O problema está relacionado com sem muito estudo. -
aquilo a que Jeremy Taylor chama "liberdade de profecia" e que
Josiah Royce designa "a maior prudência". Como homem honrado, Vale a pena repetir a última frase: "podem ser apropriadas e
o pastor pensa mais a respeito da sua reputação em termos de pregados ao povo sem muito estudo!" É possível que tudo isto
integridade, do que sobre as leis do Estado e muito mais sobre a Lei pareça inofensivo, como o ensaio de Joseph Addison sobre Sir Ro-
Áurea do que sobre os Dez Mandamentos. Compreende as duas ger de Coverley, o velho provinciano que afirmava que "o domingo
palavras do Apóstolo: "Onde está o Espírito do Senhor, aí há tira a ferrugem de toda a semana". Sir Roger, de acordo com
liberdade" (2 Co 3.17b) e "abstendo-vos de toda forma de mal" The Spectator, instruía seu capelão para que lesse, do púlpito,
(1 Ts 5.22). sermões dos pregadores famosos. Ninguém ficava decepcionado,
pois todos sabiam o que ia surgir. Não só o capelão podia tratar
Este problema surgiu principalmente depois da Reforma. Em de outros assuntos durante toda a semana, como "dormir bem"
épocas anteriores, de acordo com historiadores da Igreja, o cos- no sábado à noite e a congregação podia dormir serenamente du-
tume de o indivíduo se apropriar de materiais completos, sem lhes rante todo o sermão, não fora o caso de o velho autocrata ter de-
atribuir a origem, "não era reprovado, se feito com habilidade e cretado que ninguém pestanejasse, exceto êle mesmo. Porém,
quando as ideias ou palavras tiradas de outrem eram usadas com "nesses bons tempos", a maioria dos pastores preparava os seus
êxito. A ofensa literária estava na ignorância e incapacidade de-
monstrada, quando o conhecimento roubado era empregado impro- próprios sermões.
priamente". Na Idade Média a atitude tomada era análoga, muito
1 O problema tornou-se mais complicado recentemente. Hoje
em especial quando a pregação se aproximava do nadir. Era co- em dia os leigos podem adquirir livros de sermões, que por vezes
mum, entre os párocos, a anexação de sermões; havia, mesmo, li- usam para testar o pastor. Querem saber se trabalha no escritó-

v / Yf J
r Vn1,
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y'R
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' . the Traveller and The Roman Citizen, Nova
m s

»ork, G. P. Pulnam's Sons, 1001, p. 242.


a s t p < r u
Ver E. C. Dargan, .4 History o/ Preochino. Nova York. A. C. Armstrong &
Son, 1905, I. 309; ver também p. 187.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A .ÉTICA DAS CITAÇÕES

rio ou se passa o tempo na ociosidade durante a semana, se pensa mente os que nunca tinham lido o original. Os poucos que já o
por si mesmo ou confia nos frutos do labor de outros, se alimenta tinham lido ficaram admirados com o fato de o pregador não di-
o povo com comida que êle mesmo preparou ou com conservas. zer que seguia os passos do grande pregador de Boston. É certo
Será que tudo isto se parece com solilóquios de poltrona? Se que a maneira como o sermão foi usado não implicava a citação
assim é, leia parte de uma carta escrita no domingo à tarde por direta de uma única sentença, mas mesmo assim o orador devia
um leigo: "O nosso pastor completou uma série de oito sermões ter defendido a sua reputação, referindo-se a Brooks e seu sermão.
extraídos do último livro do Dr. Fosdick. De acordo com o boletim, Bom fora que os fatos a respeito do empréstimo sempre fossem
a próxima série vai seguir o livro mais recente de Weatherhead. tão simples como este!
Já li cuidadosamente ambos os livros". Como prova, o autor da O mesmo princípio é verdadeiro quando o ministro usa o es-
carta enviava um exemplar do boletim anunciando a próxima sé- boço de outrem, principalmente se é conhecido. Quem sabe se no
rie. Este anúncio constava de um parágrafo copiado, palavra por mesmo lugar, um outro ministro tenha feito o mesmo, sem se re-
palavra, do prefácio do livro de Weatherhead. Seguiam-se. palavra ferir a outra fonte que não a sua. Que concluirá, pois, o leitor? O
por palavra, os tópicos de oito sermões extraídos do índice do livro.
problema surge principalmente em relação a mensagens para crian-
Os sermões também seguiam fielmente o livro, no entanto nem no
ças, talvez porque muitos pastores acham difícil preparar esses
boletim, nem em parte alguma, o pastor se referia a Weatherhead
sermões. Se o jovem pastor tiver a fama de pregar normalmente
ou, na série anterior, a Fosdick. Que pensaria o membro da Igreja
os seus próprios sermões, não deve hesitar em informar os ouvin-
de um ministro que pregava apenas um sermão por semana, nem
tes adultos de que, no caso dos sermões para crianças, busca auxílio
este sendo dele?
de outrem. Não deveria necessitar mais de semelhante auxílio ao
Estes leigos amam a sua igreja, tanto que zelam pelo seu pres- fim de um ano ou dois.
tígio e pelo bom nome do pastor. Não protestariam se êle lhes Por que se há de chamar a atenção para a fonte dos sermões
dissesse, de quando em vez, que estava lendo um livro de sermões
para crianças? Que querem eles saber onde seu amigo arranja as
de fulano e gostaria de lhes apresentar alguns pensamentos do li-
ideias, se as torna interessantes? Pois bem, que aconteceria se um
vro. Em regra, porém, preferem que pregue mensagens distinta-
dos rapazes recebesse do avô, como prenda de Natal, The Armour
mente suas. Como estudou vários anos no colégio e no seminário,
of Youth, de Walter R. Bowie; Holy Ground, de S. Nye Hutchison,
não deve aparecer publicamente com roupas usadas, mesmo que
ou um dos livros de sermões narrados, de Hugh T. Kerr? Que diria
tenham pertencido a um famoso pregador metropolitano. Con-
o rapazinho aos companheiros, quando o pastor pregasse substan-
siderando tais sentimentos, onde se encontra o bom caminho? Deve
o pregador referir-se sempre à fonte usada? cialmente qualquer sermão de um destes livros? O adulto que es-
creveu aquela carta sobre o fato de seu pastor pregar sermões de
outrem, nunca disse nada a ninguém na sua própria igreja, mas
os rapazes são excelentes propagadores de novidades. Não será
LIMITES DA LIBERDADE CRISTÃ
melhor o pastor manter-se no lado seguro?
Sempre que o ministro prega sermão que não seja seu, mesmo E se não conhecer a origem do esboço do sermão? Alguns pla-
em grande escala, deve dizer com toda a franqueza o que vai fa- nos de sermões não se tornam propriedade comum, talvez comum
zer. Certa vez um pastor visitante pregou a substância do famoso demais? Tome-se, por exemplo, a maneira tão familiar de tratar
sermão de Brooks intitulado "O Fogo e a Vitela". Na sua nova o Salmo 119.11 — "Guardo no coração as tuas palavras para não
forma a mensagem agradou e auxiliou a congregação, especial- pecar contra ti". "O Melhor Livro, no Melhor Lugar, para o Me-
A ÉTICA DAS CITAÇÕES 26:,
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

lhor Propósito". Quem seria capaz de melhorar esta maneira de estas palavras tão conhecidas se encontrarem na Primeira Epístola
inculcar a verdade no coração das crianças? Se o jovem pastor de Paulo aos Coríntios, capítulo quinze, versículo cinquenta e oito",
deseja seguir esta forma de palavras perfeitas, que diga de passa- ou para o fato de "Lord Tennyson, que foi poeta laureado da In-
gem e sem grande ênfase, algo como: "Há anos um grande prega- glaterra e vate favorito de tantos cristãos, escreveu os versos: Soa
dor falou deste mesmo texto e mostrou como diz três coisas". Deste o antigo, soa o novo". O melhor é presumir que o ouvinte o sabe,
modo o jovem ministro evita as suspeitas de alguém que tenha pois assim se economiza tempo.
ouvido o mesmo sermão meses antes. Se o indivíduo no púlpito
conhece o valor da repetição para a ênfase, pode fazer com que o Deve-se tratar, de maneira diversa, um poeta menos conhe-
plano de sermão permaneça na memória dos rapazes anos e anos, cido. Se se recitar de cor o poema de Sidney Lanier, "Balada das
quiçá para sempre. Arvores e do Mestre", é necessário pronunciar bem o nome do poeta.
Caso se queira tomar bem conhecido localmente, o nome do poeta
Claro que o pastor prudente não busca frequentemente este
poderá vir antes e depois da citação. O pregador, para determinar
ou qualquer outro tipo de estrutura. Talvez deseje, no entanto,
que força dar ao nome do autor, deve tentar colocar-se no lugar
falar uma vez acerca de 2 Co 8.9, "Pois conheceis a graça de Nosso
do leigo assentado no banco da igreja. Então o pregador fará o
Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico. se fêz pobre por amor de vós,
que melhor imprima na memória estas palavras de verdade e
para que pela sua pobreza vos tornásseis ricos".
beleza. :í

"Quão rico era. quão pobre se tornou, quão ricos nos fêz".
Em mensagem acerca dc "As Riquezas da Encarnação", onde seria O ministro, ao preparar-se para falar pelo rádio, deve ir ainda
possível encontrar texto mais glorioso e plano mais brilhante? In- mais longe. Ouçamos o que dizem os peritos:
Antes de incorporar um poema no seu sermão para rádio verifique,
felizmente, talvez, nunca alguém conseguiu descobrir o seu autor.
juntamente com a estação ou com a gerência da rede, se há direitos autorais.
Mesmo assim o pregador hoje em dia deve manter o seu bom no- Há dois poetas cujos poemas não podem ser utilizados: Henry Van Dyke
me, dizendo de passagem: "Alguma vez ouvistes falar do sermão e Rudynrd Kipling... Não esqueça, pois. de fornecer dc antemão à Igreja
pregado, outrora, por certo pastor?" o titulo do poema, o nome do autor, do editor c da revista ou livro onde-
Também se torna necessário dizer, de qualquer maneira, a encontrou o poema...

fonte de citação mais longa, mas isto não traz dificuldades. Se As leis de diicitos autorais incluem também citação de prosa, acima
dc cinquenta palavras, extraídas de um texto devidamente registrado, fcste
a citação é de um livro famoso, o ministro poderá referir-se à obra
fato não deveria preocupar o autor de sermões. Uma citação de mais de
citando nome e autor." Tal referência aumenta o efeito da citação.
cinquenta palavras é longa demais para um sermão pelo rádio. Alem do
Oradores como Robert E. Speer neste caso liam sempre o que ci- perigo de fugir da linha principal de pensamento, há o perigo de usar
tavam. O autor de Como Falar com Eficácia Sem Notas, nunca algo que não encaixa na moldura. *
lia nada no púlpito, a não ser a lição das Escrituras e as palavras
das citações feitas. Citava muitas vezes textos longos, talvez lon- COMO MANTER-SE DENTRO DE CERTOS LIMITES
gos demais, mas fazia-o condignamente. Lendo a mensagem de "É o plágio?" Todo formado de seminário sabe que plágio é o
outrem, fazia-a sobressair em contraste com o que dissera em seu uso impróprio de material de outrem. É óbvio que todo ministro
próprio nome. digno de seu chamado deseja manter-se dentro de limites decentes,
Estas preocupações não se aplicam à citação das Escrituras mas sente-se confuso quando tenta descobrir a linha que divide
ou de literatura clássica. Dever-se-ia, em qualquer dos casos, de-
corar as palavras, dizendo-as de coração para coração, sem olhar a Ver Luccock e Brcntano. The Questitip Spirit.
para o papel. Não é necessário chamar a atenção para o fato de * Parker e Outros, Retíffíòuj Radio, pp. 115-116.
266 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES A ÉTICA DAS CITAÇÕES

o certo do errado, ou antes, coisas decentes de coisas impróprias. Usemos este teste para o sermão. Não precisamos, felizmente,
Plágio vem, literalmente, de uma palavra latina relacionada com pensar muito mal do pastor em causa, pois êle não precisou aplicar
rapto e o latim vem de raiz grega que significa "oblíquo, curvo, o critério a si próprio. Não cometeu plágio, pois a mensagem como
tortuoso, traiçoeiro". Para que usar expressão tão dura, na maio- tal não se refere a nada semelhante. Parece-se, no entanto, um
ria dos casos? Frequentemente envolvem mais algum tipo de "men- pouco com o sermão de Fosdick: "Seis Maneiras de Discernir o
tira branca" ou falsa pretensão, do que com roubo ou furto. Certo do Errado", semelhança como a que existe entre um carro
Nós ministros às vezes usamos eufemismos para atenuar o que de quatro cilindros e um de seis, com o mesmo desenho. Como o
chamamos os nossos erros, fraquezas e fragilidades, porém, para excerto se refere precisamente ao problema que estamos conside-
que racionalizar o que os outros homens condenam? Por exem- rando, vejamos parte da obra de Fosdick, tal como saiu do seu
plo, certo jovem de Harvard foi para um seminário onde alguns escritório quatorze anos antes do modelo acima apresentado:
dos estudantes faziam mofa de sua Universidade, como "ateia". Em quarto lugar, se o indivíduo estiver sinceramente confuso sobre um
Aprendera em Harvard a considerar o plágio como crime grave, que problema de certo ou errado, deve submetê-lo à prova da publicidade. Se
todos soubessem o que tenciono fazer? Tire-se-lhe todo o segredo e obs-
usualmente provocava a expulsão, sem desagravo. Porém, nas pri-
curidade. Tragamos para o ar livre aquilo sobre que temos dúvida. Supo-
meiras seis semanas no Seminário ouvira dois desses "piedosos" nhamos que a nossa família e os nossos amigos soubessem tudo. Imaginemos
estudantes pregar sermões tirados integralmente de livros, só cor- esse problema contadr. publicamente, com menção do nosso nome. Pensemos
taram alguns parágrafos para tornar mais curtos os sermões. Um ter sido escrita a nossa vida para nossos filhos lerem. Usemos o método
deles usou mensagem de Henry Drummond e o outro de Spurgeon. da publicidade. •"•

Se os referidos estudantes soubessem que o seu colega apresentou


o caso ao professor, teriam classificado o "denunciante" como Vejamos agora a aplicação prática. Se fosses o pastor daquela
congregação, serias capaz de publicar no boletim mensal os dois
traidor. Quando o professor tratou do problema em particular com
parágrafos acima citados? Por que não? Que todo o ministro, pois.
cada um dos alunos, nenhum deles pôde ver que tinha feito mais
resolva sempre salvaguardar a sua reputação. Pode ler sermões,
do que "ganhar um tento por ser apanhado com os bons".
mas não com a intenção de os citar sem dizer. H. P. Liddon, na
Ao ouvirmos inúmeros sermões de estudantes, quase nunca Catedral de S. Paulo, em Londres, costumava ler um sermão todos
encontramos um caso tão flagrante, embora por vezes haja alguns os dias, mas no púlpito apresentava o Evangelho segundo Liddon e
que se aproximam milito do limite máximo. Por exemplo, certa não segundo John Donne, Jeremy Taylor ou John Tillotson. Lendo
congregação publicou um folheto mensal, bem editado e impresso e estudando constantemente, queria manter o reservatório de tal
com arte. Um dos números contém uma seção do pastor intitu- maneira cheio, que tivesse abundância de material, sempre que de-
lada: "Como Discernir o Certo do Errado". Nessa seção vinha sejasse preparar um sermão.
publicado um excerto de sermão seu. O pregador apresentava Um ministro assim pensa por si próprio. Afasta-se de auxílios
quatro critérios: homiléticos, na maioria das vezes prejudiciais. Para que se há de
gastar tempo com material de segunda mão? Não deveríamos ter
O primeiro é a publicidade. Se tiveres dúvida a respeito de um pro-
em nossas estantes livros de esboços de sermões ou de ilustrações,
blema moral faze para ti mesmo a seguinte pergunta: "Se toda gente
soubesse, eu ainda faria esta ação?". Pergunta a ti mesmo: "Continuaria mesmo que sejam de Spurgeon ou qualquer outro autor mais re-
ou, se meu pai e minha mãe soubessem disto, se o meu melhor amigo cente. Dever-se-ia fazer o mesmo com os comentários homiléticos,
estivesse a par do que estou fazendo? E os meus colegas? -Em outras
palavras, submete o teu problema ao que chamamos prova da publicidade.
« The Hope of the World, pp. 131-132
268 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

que tiram ao ministro a duradoura alegria de usar os músculos


intelectuais. Pode-se encontrar nos comentários exegéticos o sig-
nificado de todas as passagens no seu contexto próprio e depois CAPÍTULO XXIII
usar a imaginação para resolver como dar vida à verdade. Quanto
a citar as palavras dos comentários exegéticos, aquele que pretende
escrever bem e tem gosto literário nem pensa nisto!
Para contrabalançar todas as negativas deste capítulo, vamos
citar o que disse um professor que inspirou uma hoste de estudantes O SERMÃO COMO ATO DE CULTO
a pensarem e falarem por si. Este professor bem amado pensava
no significado dos dias passados na Faculdade, mas as suas palavras
apresentam o ideal para o pastor no seu gabinete de trabalho, onde POR AMOR À simplicidade temos considerado o ser-
pode transformar trabalho penoso em deleite: mão em si, como se fosse "uma estrela à parte".
Agora vamos ter uma visão mais ampla e pensar
E para que tudo isto? Por causa do conhecimento que torna a vida
mais abundante, por causa da amizade que torna a vida mais suave, por
na mensagem apresentada no púlpito como ato do culto público.
causa do treino que dá poder à tarefa dura e difícil, por causa da sabedoria Como culto público entendemos a revelação de Deus acerca de Si
que sofre, triunfa e se mantém forte, por causa da visão que ilumina o mesmo, por meio da Graça, e a nossa resposta pela fé. De acordo
nosso caminho como um pilar de fogo, por causa da verdade que nos liberta. 6 com o Antigo Testamento os anjos subiam e desciam, subindo até
ao trono de Deus com as ações de graças e orações dos seus filhos
LEITURAS SUGERIDAS
e regressando para junto dos homens com as bênçãos do Pai Mise-
Artigos sobre "Copyright" e "Plagiarism" na Encycloptaedta Britannica. ricordioso. Estas bênçãos de Deus vêm, em parte, pela leitura das
Karmon. Nolan B.. Jr., Ministerial Efhics and Etiquette, Nashville. Abingdon-Cokes-
bury Press, 1928. Escrituras e pela pregação da Palavra. É por isso que a hora de
Turnbull. Ralph G.. The Mini-itcr's Obstacles, Nova York, F. H. Revell Co., 1946.
culto requer interdependência entre o humano e o divino e entre
o divino e o humano.
Ao dizer isto, o duplo movimento intelectual e sentimental
aparece com mais simplicidade do que os fatos o demonstram. O
culto público a Deus deve continuar sempre em mistério, embora
seja "mistério da luz". Ao analisarmos a teoria do culto talvez
hesitemos, mas quando a consideramos como assunto da experiên-
cia cristã, encontramos Deus nos esperando para abençoar. Entre-
tanto devemos lembrar-nos de que alguém deve dirigir as várias
fases do culto público. O ministro, num tipo de ministério sacer-
dotal, encontra-se parte do tempo perante Deus, rogando por mi-
sericórdia e graça. Noutra parte do culto, em especial durante o
sermão, o dirigente serve de profeta em nome de Deus perante os
homens. É por isso que o ministro serve no culto público, tanto
p. 135 "
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" e a l l d Id
eals. Boston. Houghton Miíflin Co., 1904. quando prega como quando ora.
270 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O SERMÃO COMO ATO DE CULTO 271

IMPORTÂNCIA DO ASSUNTO considerar o problema de como aproveitar ao máximo o sermão


como ato de culto.
Esta maneira de considerar os fatos deve elevar o nosso con- Pensemos no dirigente como guia. Se souber como agir du-
ceito do sermão, bem como de tudo o que fazemos no culto. Às ve- rante os primeiros vinte ou vinte e cinco minutos, poderá guiar o
zes nos referimos descuidadamente às outras partes, como "prelú- povo, passo a passo, até alcançar o cume, onde estará face a face
dio" ou "preparação para o sermão". Por outro lado é possível com o Senhor Jesus Cristo, na Glória da Sua Transfiguração. An-
que um indivíduo de outra escola exalte as partes restantes do culto, tes do sermão se poderá cantar um hino suplicando a presença do
ofuscando o sermão. Dizem que em Londres, na Igreja de S. Mar- Espírito Santo. Se a tradição da Igreja permitir, pode dirigir a
tinho, metade da assistência costumava aturar o culto por amor congregação na expressão da fé comum. Em seguida, enquanto o
do sermão e a outra metade costumava aguentar o sermão por amor
povo espera dele a mensagem de Deus, pode imaginá-lo dizendo:
do culto. Mas para que fazer esta distinção? Por que não apreciar
"Agora, pois, estamos todos aqui, na presença de Deus, prontos
ambos? Não há dúvida que todas as partes do culto cristão são
para ouvir tudo o que te foi ordenado da parte do Senhor" (At
interdependentes! "O que Deus ajuntou, não o separe o homem".
10.33b). Que deve o ministro fazer quando começa a pregar? Con-
(Mt 19.6b).
tinue a dirigir o culto público a Deus!
Por que então discutir a importância relativa da pregação e do Se o sermão na Igreja fosse o que deve ser — não a exibição do pregador,
culto? Não deveríamos pensar antes na pregação como parte in- mas de Jesus — nada deve existir nele que esteja em oposição com o culto,
tegrante do culto, e no todo como muito mais importante do que mas o contrário. Que melhor descrição se pode dar do culto do que o
as partes? Por que havemos de deixar o sermão dominar a hora correto ouvir da palavra de Deus, com penitência, contrição, fé e dedicação,

do culto? Em dias especiais, como a Páscoa e o Dia do Pentecostes, com votos de maior consagração? Se isso não é adoração em espírito e
verdade, o que é então? 2
o tema do dia deve dominar todo o culto, incluindo a mensagem.
Nos cultos regulares, porém, as ações de graça e as orações no
O dirigente, depois do sermão, deve fazer pouco mais do que
santuário devem abranger maiores áreas de pensamento e senti-
pronunciar a bênção, mas este pouco deve ser feito com distinção.
mento, embora nunca sem unidade e progresso como no Messias
Se tiver pregado bem, sabe que aquele que está sentado à sua
de Haendel. Portanto, ao planejar o culto público, faze com que
frente quer agir e já. Por isso o sermão poderá conduzir a uma pa-
o sermão assuma parte integrante no todo. 1

lavra de oração, exprimindo o espírito de dedicação a Deus. Poderá


Alguns de nós pensam que a leitura das Escrituras é a parte seguir-se um hino pelos cultuantes, individual e coletivamente.
mais importante do culto público, exceto os sacramentos. Damos Depois de o membro da Igreja ter entoado um hino em que se en-
toda importância às orações e estimamos muito à música, especial- trega a Deus, deve sentir-se pronto a curvar a cabeça e receber a
mente os hinos cantados pela congregação. Como pode o dirigente bênção do Deus Triuno.
manter a proporção correta, em meio a todas estas santas ocupa- Na Igreja Luterana, como noutras igrejas, a última parte do
ções? Pensando muito na glória de Deus e nas necessidades do culto toma forma diferente, mais culminante ainda. Depois do
povo! A nossa atenção agora tem como centro o sermão, mas de- sermão e do hino, os oficiais da Igreja recebem as ofertas do povo.
vemos lembrar-nos de que a sua eficácia depende, em grande parte, Em seguida o ministro toma essas ofertas, coloca-as no altar e di-
daquilo que o precede e daquilo que o segue. Devemos, portanto, rige a congregação em oração pastoral, plena de ação de graças e

i Ver A . W. Blackwood. The Fine Art of Public Worship. Nova York e Nash- 2 Frank Cairns, The Prophet of the Heart, Londres, Hodder & Stoughton, 1934,
viiie, Abingdon-Cokesbury, 1939, cap. X. pp. 64 e 46-92.
272
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O SERMÃO COMO ATO DE CULTO gyj

súplicas. Uma ordem de culto como esta coloca o sermão prati- piar das Sagradas Escrituras e daí por diante devem considerar
camente no centro da liturgia e encoraja todos os presentes a con- as suas mensagens do Livro como atos santos do culto coletivo.
siderar a mensagem como ato de culto.
Sempre que consideram a verdade ou o dever mencionado, devem
Noutra congregação, em dia especial, o sermão poderá con- contemplá-lo através da luz que vem do alto.
duzir a um ato memorável de culto coletivo. Podemos pensar, por Este ideal deveria influenciar o espírito do pregador, tornan-
exemplo, no batismo de recém-convertidos, na ordenação de oficiais do-o reverente quando fala do púlpito, tanto quanto o é ao orar
ou na apresentação dos obreiros da Escola Dominical. Que ex- em comum. Deveria levar o povo, de quando em vez, face a face
celente oportunidade para o ministro variar o programa, usando com os seus pecados e para fazê-lo tem que falar com humildade,
o sermão como preparação do ato de culto especial! Porém, é pos- ainda que com "santa audácia". Quer orando, quer pregando, o
sível que o ministro resolva ter o ponto culminante antes do ser- pastor considera-se a si mesmo ministro da reconciliação. Noutros
mão. Se vai ministrar a Santa Ceia, depois, poderá planejar de tempos um ministro como Richard Baxter referia-se, por vezes, à
modo que a meditação venha antes. Por que não fazer o mesmo sua pregação como de "um moribundo a moribundos". De certo
com o outro sacramento, o Batismo, e com toda e qualquer ceri- medo isto continua sendo verdadeiro, embora em nossos dias a
mónia que mereça lugar especial no culto público a Deus?
maioria dos pastores prefira considerar-se um homem vivo, com
Todo este problema de fundir o sermão com outras partes do palavras de esperança para homens vivos.
culto requer tempo e ponderação, em espírito de humildade e ora- No culto público a Deus o dirigente devia levar cada um dos
ção. Do começo ao fim de cada culto deve existir harmonia. Nin- ouvintes a ter relações corretas com Deus, mostrando-lhe em se-
guém deveria notar falta de ligação antes ou depois do sermão. guida como sentir-se feliz no Senhor. Como exemplo de tal pre-
Por que permitir brechas ou fendas, para não falar de abismos, gador "feliz" tome-se Brooks ou Jowett. Será que este conceito de
entre partes essenciais da adoração coletiva? Que ideal! O que trabalho do púlpito dá lugar para humor? Há grande variedade
acontece é que o adorador sente-se elevar na primeira meia hora e de respostas. Spurgeon, por exemplo, diria que sim, mas Gossip
pode tirar muito do sermão. Mas, de regresso a casa, pode admi- por seu turno afirma que o pregador em geral devia evitar o humor
rar-se porque as duas partes não se entrelaçavam. Noutro dia no púlpito. Dá, no entanto, lugar para exceções para pregadores
pode perguntar-se porque o pastor não pôs a mesma quantidade "felizes", como o "Spurgeon Escocês", John McNeill. Também
de cristianismo no sermão, como o fêz em outras partes do culto Brooks gostava de toda espécie de "piadas" inofensivas, embora
público.
pusesse os jovens ministros de sobreaviso paia evitarem tornar-se
conhecidos como "palhaços clericais".
*
IMPLICAÇÕES DESTE CONCEITO •

O PALHAÇO CLERICAL
Se todos os ministros considerassem o sermão como ato de
culto, muitos púlpitos ganhariam em dignidade e poder. Aquele Aparece no e fora do púlpito. Põe as mãos em todas as coisas sagradas
que se encontra no púlpito deve servir como embaixador do Deus e profana tudo quanto toca. Conhece todas as anedotas sobre a Bíblia.
Altíssimo. Todos os pregadores deveriam considerar-se intérpretes Fala a respeito dos símbolos sagrados da Igreja na linguagem mesquinha
que tem sido. desde gerações, a dos palhaços clericais... Há passagens
do Livro no qual Deus apresentou a Sua vontade ao povo. Tanto
na Bíblia que ficaram manchadas para sempre, só porque lhe tocaram as
na Igreja Episcopal como na Metodista, todos os candidatos à mãos de ministros que apreciam piadas baratas e fáceis... A palhaçada
ordenação para o ministério recebem do Bispo oficiante um exem- que apenas me aborrece nos lábios de um grupo de operários cm seu
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES 0 SERMÃO COMO ATO DE CULTO 275

trabalho, me irrita e apavora nos lábios do capitão ao leme, ou do cirurgião Como ato de culto público, cada sermão requer o melhor da
de cuja habilidade depende a minha vida. pessoa. Se há quem necessite de uma divisa, para lembrar-se,
" H u m o r . . . é uma das qualidades mais excelentes que o pregador pode
que escolha as palavras de Davi sobre a compra de um terreno
possuir... O verdade humor é a flor da mais elevada vida... Humor,
porém, é muito diferente de frivolidade. Há quem pergunte, por vezes, se
para o altar: "Não o oferecerei ao Senhor meu Deus holocaustos
está certo fazer as pessoas na Igreja rirem com algo dito do púlpito — que não custem nada" (2 Sm 24.24). G. F. Watts, grande artista,
como se o rir tivesse sempre o mesmo significado, como se não houvesse disse o mesmo em outras palavras: "O Máximo para o Supremo".
um sorriso que penetra toda a congregação, qual brisa de manhã de maio. Possuindo semelhante ideal, o homem no seu escritório pode la-
frutificando a boa coisa semeada, e outro riso que mais parece crepitar
butar dia a dia, como se tudo neste mundo dependesse dele e do
de espinhos debaixo de uma panela". 3
sermão e no púlpito pode falar com segurança, pois tudo depende
de Deus e da Sua Graça.
Considerando o sermão como ato de culto podemos pregar com
autoridade que não é nossa. "Assim diz o Senhor"! A autoridade
LEITURAS SUGERIDAS
vem de Deus, que falou através dos profetas e dos apóstolos e, aci-
Calkins. Raymcnd. The Romance of the HtnUtry, Boston e Chicago. The Pilgrim
ma de tudo, através do seu Filho. Deus também fala aos corações
Press. 1944. cap. XIII.
em expectativa em nossos dias, por meio do Espírito Santo, na Forsyth, P. T., Positive Preaching and the Modem Mind. Nova York. Hodder 4c
pregação de Sua Palavra. Está pronto a abençoar tudo quanto Stoughton, 1907, cap. m .
o ministro disser em Seu Nome. "Em seu Nome"! De acordo com
Gossip, sempre que pregamos ou oramos estamos em frente do
povo "no lugar de Cristo". Por isso, o intérprete não deve dizer
e fazer senão o que é do agrado do Rei. Onde se manifesta Êle hoje
em dia na terra, de forma tão evidente como no Santuário? Onde
o Rei fala mais poderosamente, do que por seus servos ministrantes?
Esta maneira de considerar o sermão influencia a nossa atitude
para com os ouvintes. É preciso saber que:

As congregações desejam que os seus pastores possuam bases seguras


e falem com autoridade. Não há hábito pior do que o de permear a men-
sagem com a pobre expressão "talvez". Não nos cabe suavizar a palavra
de Deus, de modo a adaptá-la ao gosto de um auditório refinado. Costu-
mavam advertir-nos... para não pregar que "aquele que, por assim dizer,
não crer será. quem sabe, condenado". Revista a sua personalidade com
a armadura da certeza c deixe-a seguir livre, incansável e sem hesitação.
Que seja a personalidade de um atleta espiritual, que lutou em meditação
e chegou a uma conclusão pelo suor do seu rosto. Valerá a pena enviar
tal personalidade. «

3 hectares on Preaching, pp. 55-57.


4
John Kelman, The War and Preaching, Nova Haven. Yale University Press,
1319. pp. 211-212.
O CALENDÁRIO CRISTÃO 277

Para quase todos os tipos de calendário cristão é necessária a


existência de um lecionário — lista de passagens da Bíblia para
serem lidas do púlpito. Numa Igreja litúrgica o pastor é obrigado
CAPÍTULO XXTV
a usar algumas dessas listas no seu culto público, ainda que na
pregação. Nos outros ramos da Igreja ecuménica o ministro pode
adotar um lecionário ou então elaborar o seu próprio; se fizer isto
poderá compilar um novo cada ano. Como pregador pode usar o
lecionário como guia no seu planejamento do púlpito. Não deve, no
O CALENDÁRIO CRISTÃO entanto, seguir cegamente o lecionário, pois ficará tão obcecado
com o sistema, a ponto de ignorar as necessidades humanas e a
graça divina.
QUE TEM A VER O sermão, como ato de culto, com
o calendário cristão? A resposta a esta pergunta
depende em grande escala da Igreja a que o minis- INFLUÊNCIA NA PREGAÇÃO
tro pertence. Se serve a Deus como luterano ou episcopal, deve
O uso sábio do Calendário Cristão encoraja a pregação da
seguir o calendário eclesiástico como guia na pregação. Tam-
1

Bíblia. Em vez de viver improvisando, o pregador pode planejar


bém em igrejas não litúrgicas muitos aprenderam a ver o valor do
o trabalho de púlpito de modo a assegurar continuidade e pro-
calendário cristão como auxílio na preparação para o púlpito. Não
gresso. No período anterior ao Advento pode pregar frequente-
precisamos pensar nele agora, como já fizemos com os outros as-
mente no Antigo Testamento, mostrando como Deus se revelou a
pectos do culto público. Por amor à clareza trataremos apenas
vários homens, uns após outros, preparando assim a vinda de
do culto matutino.
Cristo. Na época da colheita no Calendário Cristão — ou seja no
Em geral o calendário cristão começa com o advento, período período que vai de meados de dezembro até a Páscoa — o intér-
que inclui os quatro domingos antes do Natal. Depois do ad- prete sacro pode tirar tesouros de um dos Evangelhos. Limitando-se
vento os períodos sucessivos se relacionam com as várias fases da a apenas um, pode conduzir o membro da Igreja na sua leitura
carreira terrena de Nosso Senhor. Do começo do Advento até a como a revelação da verdade na vida e morte de nosso Senhor Jesus
Páscoa, durante quase seis meses, o calendário cristão aponta cons- Cristo. Pode descobrir períodos culminantes, no movimento pro-
tantemente para Cristo. Nesses seis meses, não obstante fazer o gressivo da Redenção, especialmente no Natal, Páscoa e Pente-
pior tempo do ano, vai mais gente à Igreja do que em qualquer ou- costes. Deste modo pode começar a transformar em aventuras
tra época. Quando, porém, os céus abrandam a sua fúria invernal e de fé as tarefas do estudo.
a atenção se afasta de Cristo, a assistência começa a diminuir. É,
em parte, por este motivo, que o homem sábio insiste em que con- O calendário cristão nas mãos certas ajuda muito a preparar
tinuemos chamando a atenção para o Cristo vivo, para a operação séries bem ordenadas de sermões. Esta forma de planejar ajuda o
do Espírito Santo e para o Reino Vindouro. Devemos, de qualquer ministro a tratar, nos doze meses do ano, de todas as verdades cen-
maneira, reivindicar para o Rei as duas metades do calendário trais e todos os deveres principais do cristianismo. Pode abordar,
cristão. ano após ano, estas verdades e deveres básicos, de um ponto de
vista sempre diferente. Se não pensar senão em termos de uma
ou duas semanas, talvez deixe de apresentar algumas verdades e
i O "Calendário Eclesiástico" designa ordem litúrgica prescrita por um corpo
eclesiástico. O "Calendário Cristão" é ordem mais sugerida do que prescrita. certos deveres, dando ênfase demais a outros. Quase todos os pas-
d o
termos frequentemente aparecem trocados.
i s
278 A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O CALENDÁRIO CRISTÃO

tôres às vezes caem numa rotina muito pessoal. Onde é possível Senhor e Salvador. Sem o fazer intencionalmente, o pregador per-
descobrir melhor maneira de evitar tal rotina, a não ser pregando mite que causas e movimentos mantenham Cristo e o Reino de fora.
sistematicamente em todo o calendário cristão? Discutindo todos os assuntos sugeridos pelos que vão à igreja, pou-
Este meio de planejar anima os ministros a preparar de vez cas oportunidades terá de falar bem do seu Senhor.
em quando uma série, ou até um curso. Numa série o pastor anun-
cia o grupo de sermões como um todo e ao prepará-los trabalha da
mesma maneira como se estivesse escrevendo um livro com vários NECESSIDADE DE DRAMA NO PÚLPITO
capítulos, todos eles relacionados .com o assunto apresentado pelo
título. Num curso procede-se sem aviso prévio, de modo que cada O pastor que seguir o calendário cristão no seu trabalho do
semana no mesmo culto dominical, o ministro guiará o seu reba- púlpito, necessita cultivar o senso de drama. De outro modo fa-
nho por montes e vales cheios de verdes pastagens. Numa igreja rá todos os seus sermões iguais e todos parecerão "mortos". O
citadina, em que os ouvintes mudam constantemente, o pastor po- drama requer uma ou várias pessoas em ação, com luta, conflito
derá apresentar uma série após outra. Noutro tipo de igreja, o e suspense, depois do que vem o desenlace. Onde é possível encon-
pastor terá que se contentar com três ou quatro séries por ano, das trar isso de forma mais completa do que no drama da redenção?
quais uma durante a semana santa, mas poderá apresentar tantos Veja-se como no Antigo Testamento o Senhor Deus preparou a
cursos quantos desejar e quanto mais melhor. Para saber dos be- vinda do Redentor, chamando um homem após outro, que "subia
nefícios leia-se o que disse B. H. Streeter, de Oxford. Quando usa a escarpa em direção ao céu através de perigos, trabalhos e do-
a expressão "série" refere-se, por vezes, ao que chamamos "curso": res". Preguemos sobre esses heróis da fé, um de cada vez, consi-
derando-os à luz do Novo Testamento. Grande parte do drama da
Uma série sobre qualquer assunto, feita por uma pessoa com capacidade nossa redenção se encontra aí. Façamos com que o leigo sinta cada
comum, impressionará muito mais permanentemente do que igual número vez mais as suas maravilhas e progresso majestoso. Se pode pre-
de sermões isolados por um pregador notável. A congregação recordará o gar de acordo com um plano progressivo, não ande aos saltos.
que foi dito da última vez e espera ansiosamente pelo que será apresentado
Siga o curso do calendário cristão! Especialmente os reiatos
na vez seguinte... A congregação sabe que o pregador toma o seu dever
a sério. Os mais críticos não se podem queixar de que o assunto de sua
sobre o Senhor Jesus fornecem material para drama no púlpito.
exortação é determinado pelo texto que por acaso lhe veio à cabeça no Em vez de mensagens em que o homem é o centro, todos os sermões,
sábado de manhã, quando fazia a b a r b a . . . Ninguém pode dar o seu melhor durante seis meses e até mais, têm Cristo como centro. A variedade,
num único sermão. Em série de sermões há mais possibilidades de impres- de semana para semana, virá facilmente àquele que reparte com
sionar definitiva e permanentemente". 2 seus amigos o que encontra no Livro. Especialmente quando os
sermões se aproximam do Domingo de Ramos, início da Semana
O uso do calendário cristão na prédica faz com que a atenção Santa, devem revelar cada vez mais intensidade. No nosso púlpito,
do ouvinte se fixe em Cristo. Cada domingo, pelo menos durante como na peça da Paixão em Oberammergau, cada cena nova no
seis meses, aquele que vai à igreja tem a certeza de defrontar-se drama da Redenção deveria dar visão da graça que surgiu em
com dever ou verdade relacionada com o Senhor Jesus. Embora Jesus Cristo, de maneira suprema na sua Cruz e Ressurreição.
pareça estranho, há muitos que vão regularmente à igreja e afir- Depois da Páscoa o drama da redenção deve continuar, idealmente
mam raramente ouvir um sermão acerca de Jesus Cristo, como deveria atingir atinda maiores alturas. "Aquele que crê em mim,
fará também as obras que eu faço, e outras maiores fará porque
2
B. H. Streeter, Concerning Prayer, Nova York, The Macmillan Co., pp. eu vou para junto do Pai" (João 14.12). Nosso Senhor cumpriu
275-276.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES O CALENDÁRIO CRISTÃO 281

esta promessa depois da ascensão pelo Espírito Santo, guiando a método, e nenhum outro, como panaceia para os males de igreja
Igreja Apostólica de triunfo em triunfo. Hoje Êle quer guiar a e estado. Nenhuma forma ou método de trabalho que se empregue
Igreja na conquista do mundo, especialmente por meio da pregação no estudo e no púlpito, pode começar a curar os males profundos
do Evangelho. Hoje em dia, como em outras eras, quer abençoar que enfermam a humanidade. Para isso temos que contemplar
as boas novas como soam através do calendário cristão. Mas quer a graça de Deus: "Acaso não há bálsamo em Gileade? Ou não há
que o homem no púlpito saliente a mensagem do Evangelho e lá médico? Por que, pois, não se realizou a cura da filha do meu
nenhum método de pregação. Deus proíbe que alguém tente subs- povo?" (Jr 8.22).
tituir a mensagem por método!
No tempo de Weltschmerz em que vivemos, o Espírito de Deus
Considerando estes ideais, por que razão o uso do calendário vivificou a preocupação com as nossas orações em público e o tra-
cristão não resultou em melhor pregação? Em tempos antigos, balho de púlpito. Deu-nos esperança na vinda de um reavivamento
homens como Brooks, Robertson, Newman e Taylor, assim como os da pregação, de tal forma que a Igreja de Cristo acorde para a
famosos pregadores franceses do século XVII, mostraram as pos- importância da proclamação do Evangelho. Sentimo-nos contentes
sibilidades do púlpito numa Igreja litúrgica. Naturalmente ne- por verificar que este reavivamento já começou, pois muitos pre-
nhum deles seguiu um plano cegamente, mas todos tentaram, de gadores jovens já sofrem as suas consequências. E o mesmo acon-
uma forma ou outra, fazer com que os corações dos ouvintes pros- tece com muitos outros jovens de oração. Todos eles provaram a
seguissem na sua marcha em direção ao cume da montanha da alegria de ir ao encontro das necessidades humanas por meio da
experiência cristã na terra. Se este género de trabalho de púlpito pregação das verdades de Deus. Por isto resolveram colocar o tra-
ultimamente deixou de ser comum, é possível que uma das razões balho de púlpito em primeiro plano em todo seu ministério para
seja que os pregadores seguem o calendário cristão noutras partes Deus e para os homens. Confiados na Sua Graça, resolveram tor-
do culto público, mais do que na preparação dos sermões. E nesse nar mais valioso o futuro do púlpito cristão, do que foi o seu
caso, "por que não possuem o que lhes pertence?" passado. Quem os quer seguir?

Ninguém veja neste capítulo apelo para a adoção de formas Unge-os sacerdotes! Intercessores fortes,
litúrgicas no culto público ou argumento para não fazê-lo. Este de perdão, amor e paz!
problema inquieta a maior parte das igrejas hoje e pode tornar-se Oh, que com eles o mundo desviado possa ir,
ainda mais premente no futuro, mas o problema não nos interessa para a vida de sacrifício do Cristo amado!
agora. Muitos de nós herdamos outras tradições e sustentamos Faze-os Apóstolos! Arautos da Tua Cruz,
outros ideais. No que se refere ao culto púbiico, temos a liberdade avancem proclamando a Tua graça em toda parte,
de usar ou não formas históricas, dentro de certos limites, confor- Inspirados por Ti, que a tudo contem como perda
me o Espírito de Deus nos dirigir. mas finalmente estejam alegres perante a Tua Face.

E a nossa liberdade cristã aplica-se ainda mais no que se re-


fere ao uso do calendário cristão como guia na pregação. E aqui LEITURAS SUGERIDAS
muitos de nós se regozijam por ter liberdade e oportunidade. Ca-
Adams, Fred W., The Christian Year, panfleto, Nova York, Federal Council of
minhamos cada vez mais firmemente nessa direção e podemos
Churches of Christ in America, 1940.
testificar de que esta maneira de trabalhar e planejar dá estabi- Blackwood, Andrew W., Planning a Year's Pulpit Work, This Year of Our Lord,
lidade e poder ao trabalho do púlpito. Mas não consideramos este Filadélfia, Westminster Press, 1943.
A PREPARAÇÃO DE SERMÕES

Brooks. Phillips. Sermons for Principal Festivais and Fasts of the Church Year,
Nova York. E. P. Dutton & Co., 1910.
ÍNDICE DE PASSAGENS BÍBLICAS
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sity of Chicago Press, 1928.
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Hedley, George P., A Christian Year, Toronto, The Macmillan Co., 1934.
37-50 71 47.1-12 41
Keble. John, The Christian Years Thoughts in Verse, Nova York, D. Appleton
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DANIEL
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Strodach, Paul Z., The Church Year, Filadélfia, United Lutheran Publishing House,
1924 ÊXODO MQ
l UÉA
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Wilson, Franck E., A n Ouíline of the Christian Year. um opúsculo, Nova York, 3429 59 6.8 61, 62
Morehouse-Gorham Co., 1941. MATKUS
JUÍZES 5.48 60
6 126 6.10 144
6 33 101. 214
16 20 56
724-27 177, 202
I SAMUEL 11 28-30 70. 123, 180, 214, 224
17.39 154 12.12 200
13.3-23 75, 79, 204
II SAMUEL 17.5 113
2424 275 17.19-20 148
19.6 270
I REIS
19.30 140
6.7 88
MARCOS
SALMOS
2.1-12 93, 157
18.10 191
2.23-32 105
46.10 224
4.40 53, 103
55.6 64
92 170
90.9 65
10 45 66
91 73
14.41-42 147
97.1 33
16.15 53
119.11 263
121 72, 73 LUCAS
139 116 2.10 53
5.23 112
ISAÍAS
9.13 133
1.18 101
9 23 36
6.1-8 74
10.25-37 . 236
40 25, 166
12.16-21 183
40.1 37
35.17 133
4021 62
18.31 133
46.4 113
50.4 217 23 33 144
24 32 52
50.7 103
52.13-53 12 75
JOÃO
53.5 214
2.1-11 124
55 10-11 47, 79
3.8 39
3.16 63. 151
JEREMIAS
7.17 124
8.22 281
8.1-11 54
12.5 54
832 6 0 I I CORÍNTIOS
13-17 2 2 7 3.3 1 5 8
13.15 9 8 3.17 39, 260
14.12 2 7 9 4.6 1 8 0
16.13 4 9 4.7 2 0 9
19.5 6 4 5.14 4 1
20.8 1 1 1 5.15 1 2 7
20 24-29 1 0 5 8.9 2 6 4
11.3 167, 259
ATOS 13.13 1 4 8
2.16 5 4
8.26-40 7 6 Ertsios
8.35 7 5 5 2 5 1 7 6
8.37 5 4 FL I PENSES
10 7 6 2.12-13 1 5 7
10 33 2 7 1 4.7 1 0 4
20.7 2 4 2 4.11 1 7 0
26.18 1 4 9
COL.OSSENSES
27.24 5 3
27.35 1 0 3 Z2 1 1 1

I TESSALONICENSES
ROMANOS
4.13 1 1 0
7.14-25 7 6
5.22 2 6 0
7.23 1 5 5
8.19 6 8 I TIMÓTEO
8.28 33, 56, 63, 165 1.13 1 1 1
12.2 1 1 1
II TIMÓTEO
12.21 1 1 1
14.10 1 1 3 2 15 1 9 5
HEBREUS
1 CORÍNTIOS
1.1 7 8
6.19 2 2 1
11.8 1 4 7
8.13 3 5
10.13 6 5 I JOÃO
1156 *.. 101, 2 47 2.15 1 1 1
13 7 7 4.16 6 4
13.1 2 0 0 4.18 1 1 1
13.12 1 6 4
15 1 6 6 APOCALIPSE
15.58 1 5 6 4 3 1 0 6

• Composto e inipre«80
por
LINOGRAKICA EDITORA LTDA.
RUA BRE»SER. 1281-129» - FONE: 9Í-1ÍS2
SÃO PAULO *
ANDREW W. BLACKWOOD foi,

durante longos anos, professor de

H O M I L É T I C A (estudo das maneiras de

preparar e apresentar a mensagem

cristã) no Seminário Teológico de

Princeton, E . U A . Antes, porém, fora

pastor em grandes centros universitá-

rios.

Amplamente conhecido pela sua

autoridade nesse campo, o Dr. Black-

wcod é respeitado como autor capaz

de colocar sua larga experiência ao

alcance de estudantes e pastores que

desejam aprender ou aperfeiçoar a

maneira de pregar.

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