FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e a crise do capitalismo real.
São Paulo: Ed. Cortez, 1995.
Os socialistas estão aqui para lembrar ao mundo que em primeiro lugar
devem vir as pessoas e nao a produção. As pessoas não podem ser sacrificadas. Nem tipos especiais de pessoas — os espertos, os fortes, os ambiciosos, os belos, aquelas que podem um dia vir a fazer grandes coisas — nem qual- quer outra. Especialmente aquelas que são apenas pessoas comuns (...) É delas que trata o socialismo; são elas que o socialismo defende. O futuro do socialismo assenta-se no fato de que continua tão necessário quanto antes, embora os argumentos a seu favor não sejam os mesmos em muitos aspec- tos. A sua defesa assenta-se no fato de que o capitalismo ainda cria contra- dições e problemas que não consegue resolver e que gera tanto a desigual- dade (que pode ser atenuada através de reformas moderadas) como a desu- manidade (que não pode ser atenuada).
Eric Hobsbawn
A epígrafe de Hobsbawn é capitalismo real, ultrapassando as
apropriada para começar estas bre- visões apologéticas e apocalípticas. ves palavras sobre o novo livro de Em segundo lugar, a opção por Gaudêncio Frigotto. Não apenas realizar essa tarefa partindo de uma porque o historiador inglês constitui reflexão rigorosamente crítica uma das referências permanentes desde a perspectiva do materialismo (tácitas ou explícitas) desta obra, histórico; um materialismo histórico mas também porque o seu conteúdo renovado e capaz de se reformular, resume três das principais razões ele próprio, à luz do colapso do que orientam a estimulante reflexão socialismo soviético e da queda dos teórica aqui proposta pelo autor do regimes comunistas da Europa presente volume. Primeiramente, a Oriental. Por último, embora cer- necessidade de pensar as condições tamente não menos importante, o históricas que dão origem à pro- livro de Frigotto propõe um enorme funda crise que atravessa hoje o desafio ético: pensar e compreender a crise do capitalismo desde um lectuais que as combatiam no pas- renovado enfoque socialista, como sado. Tal continuidade entre ambos forma de contribuir para a cons- os trabalhos não deve nos fazer pen- trução de uma sociedade demo- sar que, em seu novo livro, Frigotto crática e radicalmente igualitaria, limita-se a denunciar que "o velho" fundamentada nos direitos, e que ainda não morreu e que "o novo" é respeite as diferenças, a diversidade; apenas uma armadilha que encobre uma sociedade — segundo Hobs- um status quo imune ao passar do bawn — de pessoas comuns, das tempo. Justamente um dos valores maiorias, justamente aquelas conde- mais destacados deste trabalho re- nadas pelo mercado a mais absoluta side em que o autor pretende dis- miséria. cutir a racionalidade (ou irracio- Este livro, de alguma forma, nalidade) que encerra os enfoques é a continuação mais eloqüente de do neocapital humano no atual con- A produtividade da escola impro- texto de profundas mudanças vivi- dutiva, texto que ainda hoje conti- das pelas sociedades de classe nes- nua sendo de consulta obrigatória te fim de século. A especificidade para aqueles que desenvolvem pes- da crise estrutural que atravessa quisas na área de Educação e Tra- hoje o capitalismo real é o marco balho. Essa linha de continuidade no qual cobram materialidade as entre duas obras separadas por uma perspectivas discutidas por Gau- década constitui, ao mesmo tempo, dêncio neste novo livro. um dado alentador e trágico. Alen- De fato, o contexto mais tador, porque Frigotto continua dis- amplo da reestruturação capitalista cutindo de forma clara e decidida contemporânea nos planos político, os enfoques economicistas que re- econômico, jurídico e educacional duzem a educação a um mero fator funciona como um enquadramento de produção, a "capital humano". iniludível para avançar tanto na Trágico, porque ainda hoje esta úl- crítica teórica aos enfoques apolo- tima perspectiva continua se expan- géticos da sociedade pós-industrial, dindo com novas roupagens, com quanto para recusar as saídas inéditas e sedutoras máscaras que individualistas e místicas que aca- convencem, inclusive, muitos inte- bam defendendo os intelectuais apocalípticos. A Educação e a crise rocracias governamentais conser- do capitalismo real é um livro para vadoras e dos intelectuais re- ser lido à luz da atual hegemonia convertidos: "sociedade do conhe- dos regimes neoliberais e neocon- cimento", "educação para a com- servadores (tanto na América La- petitividade" e "formação abstrata tina quanto num número nada des- e polivalente". prezível dos países do Primeiro Em segundo lugar, realiza Mundo), e reconhecendo as novas uma crítica não menos radical aos condições materiais e culturais cria- enfoques defendidos por três auto- das a partir da crise do regime de res que, desde óticas não conver- acumulação fordista, de seus esta- gentes e diferenciados ainda da tri- dos de bem-estar e da própria reor- vialidade que caracteriza os admi- ganização (ou desorganização) da radores do capitalismo pós-indus- classe operária que é derivada de trial, "acabam silenciando ou elimi- tal processo. nando os grupos ou classes sociais E aqui cobra sentido a du- fundamentais e os movimentos com pla tarefa crítica à qual se propõe eles articulados como sujeitos da Frigotto. história (o qual os conduz), ironi- Em primeiro lugar, discutir camente, a reforçar a tese do fim as novas concepções do "capital da história": Adam Schaff, Claus humano" que se respaldam na su- Offe e Robert Kurz. posta legitimidade das teses do fim No contexto de um capita- da história e das ideologias, segun- lismo transformado, e não por isso do as quais (e afortunadamente) o mesmo excludente e discriminador, mundo é e será para sempre capi- Frigotto desenvolve uma minucio- talista. A recusa de tais perspecti- sa análise marxista da educação. vas conduz o autor a discutir a Enfoque marxista que, à medida que validade das posições que as ca- é aplicado a si próprio, se reformula racterizam no plano educacional. e se enriquece. Logo, de certa for- Frigotto analisa assim três cate- ma, este livro difere da citada obra gorias básicas no discurso neolibe- A produtividade da escola impro- .ral dos homens de negócio, dos dutiva. O leitor encontrará aqui no- organismos internacionais, das bu- vos conceitos, novos percursos teó- ricos, novas perguntas e, também, Horizonte, Angra dos Reis e mui- certamente, novas respostas a ve- tas outras, que constituem hoje um lhas perguntas. modelo de gestão eficiente e demo- Por último, este livro pos- crática de uma política educacional sui um inestimável valor político. pública e de qualidade. Tais experi- Ele contribui com um conjunto de ências inspiram o autor deste livro idéias relevantes no campo da ação e são uma referência tácita ao lon- política e, ao mesmo tempo, está go de todos os capítulos que com- inspirado na necessidade de apro- põem o presente volume. fundar, defender e ampliar as expe- O novo livro de Gaudêncio riências democráticas de resistência ajuda-nos a pensar que é possível e oposição ao programa de ajuste renascer das cinzas, que é possível neoliberal existentes em nosso país. e necessário lutar por um mundo No plano educacional, as reflexões mais justo e igualitário. Simples- de Frigotto inserem-se e inspiram- mente, porque a história ainda não se numa multiplicidade de experi- terminou. ências alternativas de gestão que foram (e estão sendo) desenvolvi- Pablo Gentili das no Brasil por administrações Universidade Federal Fluminense populares: em Porto Alegre, Belo (UFF)
Vozes plurais: aprendendo a aprender
MARQUES, Mario Osório. A aprendizagem tia mediação social do apren-
dido e da docência. Ijuí: INIJUÍ, 1995.
Por entender bakhtiniana- resenha, meu processo de leitura do
mente a leitura como diálogo, quero novo livro de Mario Osório Marques. compartilhar com você, leitor desta No momento mesmo de um primeiro
Gíria é um fenômeno de linguagem especial usada por certos grupos sociais pertencentes à uma classe ou a uma profissão em que se usa uma palavra não convencional para designar outras palavras formais da língua com intuito