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Anais do XIX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178

Anais do IV Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420


23 e 24 de setembro de 2014

O Desenho da Figura Humana: indicadores cognitivos e emocio-


nais em crianças institucionalizadas e não institucionalizadas

Rafaela Fabri Lopes Solange Muglia Wechsler


Faculdade de Psicologia Grupo de Pesquisa: Avaliação Psicológica do
Centro de Ciências da Vida Potencial Humano
Rafaela.fl@puccampinas.edu.br Centro de Ciências da Vida
wechsler@lexxa.com.br
to medida de avaliação dos aspectos cognitivos, o
Resumo: Objetivo: Verificar a validade do teste desenho é entendido como expressão de aspectos
DFH, como um indicador cognitivo e emocional. desenvolvimentais (Wechsler, 2003).
Método: participaram 24 crianças de escola pública No Brasil,Wechsler, baseando-se nos sis-
e 29 crianças de abrigos, na faixa etária entre 5 e 8 temas de Harris, Koppitz e Naglieri (Wechsler,
anos, sendo 26 mulheres e 27 homens. Os dese- 1996/2003), foi precursora na elaboração de um
nhos foram corrigidos através do manual DFH cog- sistema quantitativo de avaliação do desenvolvi-
nitivo, e a folha de correção emocional composta mento cognitivo a partir do DFH. A primeira edição
por 59 itens.A pontuação é obtida pelo total de indi- de seu estudo foi publicada em 1996 na qual foram
cadores presentes nos desenhos, avaliados de apresentados os indicadores de validade e precisão
acordo com o sexo e idade da criança. Resultados: da proposta. Realizados estudos que comprovam
os resultados obtidos demonstraram que o total que o DFH é uma forma de medir indicadores cogni-
emocional feminino se correlaciona significativamen- tivos, estuda-se a validação de indicadores emocio-
te com o total emocional masculino (r= 0,625, nais nos desenhos da figura masculina e feminina.
p≤0,01). O total feminino cognitivo se correlaciona A análise dos indicadores emocionais do
significativamente com o total cognitivo masculino, desenho foi bastante difundida a partir dos trabalhos
(r= 0,836,p≤ 0,01). Conclusão: as correlações entre de Machover, em 1949, ao indicar que a figura de-
os totais dos sistemas emocionais e cognitivos, senhada representava o próprio sujeito e o seu am-
apesar de ser negativas, não são significativas. Tais biente, podendo, portanto, ser visto sob um enfoque
resultados demonstram que não existem relações projetivo (Koppitz, 1968). em estudos mais recentes
significativas entre os dois conceitos. Isto é, não por Wechsler, Prado, Oliveira &Mazzarino (2011)
existe relação significativa que quanto mais inteli- foram observadas influências significativas do sexo
gente a criança for maiores serão os problemas da criança, idade, figura desenhada e do tipo de
emocionais. escola no total de indicadores emocionais presentes
no desenho. Tais dados indicam a necessidade de
Palavras-chave: DFH, medida cognitiva e emocio- mais pesquisas no país que atestem a validade
nal, validade empírica do desenho como medida emocional.
Para validar o desenho como medida emo-
cional, a pesquisa contou com o apoio de crianças
Área do Conhecimento: Ciências Humanas – Fun- estudantes de escolas públicas e crianças instituci-
damentos e Medidas da Psicologia – Fapic onalizadas, as quais são privadas dos vínculos afe-
tivos da família e principalmente da presença da
mãe, a qual é tão importante para o desenvolvimen-
1. INTRODUÇÃO to saudável da criança. Segundo Hecht& Silva,
(2009), essa afetividade provida da interação mãe-
O Desenho da Figura Humana conta como bebê, acarreta nas primeiras representações men-
forma de avaliação, o desenho, este que é um dos tais da criança.
mais antigos modos de comunicação entre as pes- Para Barros (1998), as crianças recebem di-
soas. Segundo Goodenough, Harris (Wechsleret al., versos estímulos do meio e de suas relações. Sen-
2012) diz que ao desenhar, a criança expressa seu do assim identificao desenho como uma das manei-
conceito de ser humano e sua compreensão das ras mais eficazes para compreender como a criança
características essenciais que o compõem. Enquan- lida com esses estímulos, e também como uma
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forma de ajudar a descobrir o que pode estar preju- A validade de critério será verificada, por
dicando uma infância saudável e feliz. meio do teste t de student, para observar se existem
diferenças significativas entre os totais de indicado-
res emocionais em crianças do grupo institucionali-
zado e não institucionalizado.

2. MÉTODOS
3. RESULTADOS
Participantes: A amostra foi composta por
24 crianças de uma escola pública de Campinas e A partir da correção dos testes e a exposi-
29 crianças que residem em abrigos, na faixa etária ção dos resultados em planilhas foi possível verificar
dos 5 aos 8 anos. Os abrigos e as escolas foram a relação da idade dos participantes correspondente
determinados por critério de conveniência. a sua instituição.
Instrumentos: a) Desenho da Figura Huma-
Tabela 1. Descrição da Amostra
na (DFH). Para avaliação cognitiva, o desenho foi
aplicado conforme a proposta de Wechsler
(1996/2003), na qual é solicitado um desenho de Freqüência Percentil
uma pessoa do sexo feminino e masculino. O dese- Publica 24 45,3
nho é pontuado conforme o número de itens dese-
nhados pela criança (por exemplo, cabeça, braços, Abrigo 29 54,7
pernas, boca etc). Total 53 100,0
b) Para a avaliação emocional, é feita uma
triagem emocional através da folha de correção
composta por 59 itens. A pontuação é obtida pelo A tabela 2 verifica a relação entre o numero total de
total de indicadores presentes nos desenhos, sendo crianças e suas respectivas instituições.
estes avaliados segundo o sexo da criança e sua
Tabela 2. Descrição da Amostra
faixa etária. Dentre estes 59 itens, 6 são de caráter
quantitativo englobando dimensões das figu-
ras,tamanho, localização do desenho na folha e Freqüência Percentil
inclinação, e 53 de caráter qualitativo, avaliados Feminino 26 49,1
pela presencia ou ausência, qualidade da integra-
ção, sombreamento e figuras bizarras. Masculino 27 50,9
Procedimento: Inicialmente foi feito o conta- Total 53 100,0
to com a escola pública solicitando a sua permissão
para a pesquisa em sua instituição. Após a anuên-
cia da direção foram encaminhados os Termos de Na tabela 3, com a correção dos testes e a
Consentimento Livre e Esclarecido para os pais e exposição dos resultados em planilhas foi possível
responsáveis. O Desenho da Figura Humana (DFH) verificar a quantidade de meninas e meninos, que
conforme a proposta de Wechsler (1996/2003) foi participaram do teste.
aplicada na própria sala de aula, dos alunos do pri- Podemos perceber que as médias por pon-
meiro aos terceiro ano. Cada aplicação na sua res- tuação na escala emocional por tipo de instituição
pectiva sala durou cerca de 30 minutos. (escola publica e abrigo) são bastante similares. No
Em seguida foi feito o contato com o abrigo, total emocional feminino, da escola pública, inclusi-
requerendo a permissão deste para a pesquisa em ve existem maiores pontuações do que no abrigo.
sua instituição. Após a direção do abrigo, aceitar a No total emocional masculino as médias são bas-
realização da pesquisa, foi solicitado que a coorde- tante semelhantes tanto no abrigo quanto na escola
nadora assinasse o Termo de Consentimento Livre pública.
e Esclarecido. O DFH foi aplicado primeiramente
nas meninas, e depois nos meninos. Os testes fo-
ram realizados separadamente nas crianças, pois
estas moram em abrigos específicos para meninas
e meninos.
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Tabela 3. Médias da Pontuação por tipo de escola Tabela 5. ANOVA- Diferenças de Pontuação por tipo
de escola

Desvio
F Sig.
Tipo de Escola N Média Padrão
Publica Total Emo- Tipo de Escola TotEmocFemini ,384 ,539
24 4,25 2,327
cional F
Total EmoMasc ,039 ,844
Total Emo-
24 4,33 3,171
cional M Sexo TotEmocFemini 2,339 ,133
Abrigo Total Emo-
29 3,76 2,573 Total EmoMasc 2,903 ,095
cional F
Total Emo- Tipo de Escola * Sexo TotEmocFemini ,406 ,527
29 4,10 2,257
cional M
Total EmoMasc ,234 ,631

4. DISCUSSÃO
Na tabela 4 as correlações são significativas so-
mente entre os totais entre si. Isto é, o total emocional As correlações entre os totais emocionais e
feminino somente se correlaciona significativamente com os totais cognitivos são negativas, como seria espe-
o total emocional masculino (r= 0,625, p≤0,01). O total rado, pois um ponto é dado para cada indicador
cognitivo feminino se correlaciona significativamente com emocional, enquanto que um ponto é dado para
o total cognitivo masculino (r=0,836, p≤0,01). cada ganho no desenvolvimento pelo sistema cogni-
Tabela 4. Correlações entre os totais emocionais e tivo.
cognitivos Entretanto, as correlações entre os totais
dos sistemas emocionais e cognitivos, apesar de
ser negativas, não são significativas. Tais resultados
Total Total
demonstram que não existem relações significativas
Total Total DFH DFH
Emo F Emoc M F M entre os dois conceitos. Isto é, não existe relação
Total Pearson Correlation 1 ,625** -,012 -,095 significativa que quanto mais inteligente a criança
Emoc io Sig. (2-tailed) ,000 ,934 ,498 for maiores serão os problemas emocionais. Desta
Fem maneira, observa-se que inteligência e problemática
Total Pearson Correlation 1 -,104 -,201 emocional não estão relacionadas, como demonstra
Emocio Sig. (2-tailed) ,459 ,149 a literatura. Tais resultados confirmam os estudos
Mas anteriores de Wechsler, Prado, Oliveira e Mazzarino
Total Pearson Correlation 1 ,836** (2011) que demonstraram existir uma baixa relação
DFH Sig. (2-tailed) ,000 entre inteligência e problemas emocionais.
Fem Segundo Koppitz (1968) compreender o de-
Total Pearson Correlation 1 senho da figura humana de acordo com os itens
DFH Sig. (2-tailed) propostos traz grandes relações com o rendimento
Mas escolar da criança. Contudo em relação ao DFH
como medida emocional, esta é vista como um en-
** p≤0,01 foque mais projetivo, e apesar da ampla utilização
dos sistemas projetivos para interpretação do dese-
nho, a interpretação do DFH como medida de per-
sonalidade é uma das técnicas que mais tem sofrido
Na tabela 5 os resultados apontados pelo críticas quanto a sua validade. Assim avaliar aspec-
teste F indicam que não existem diferenças signifi- tos emocionais das crianças em relação a aspectos
cativas nas pontuações emocionais por tipo de insti- cognitivos, tende a não obter resultados similares.
tuição nem pelo sexo da criança. Desta maneira Notam-se nos dados presentes uma simila-
pode-se concluir que não é valido discriminar crian- ridade, entre as médias emocionais da escola e do
ças de abrigo das crianças de escolas públicas pela abrigo, sendo assim não houve uma discrepância
pontuação emocional. significativa, que apontasse maiores índices emoci-
onais entre um ou outro. Os resultado obtidos e os
demográficos de discrepância apresentados confir-
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mam o dado, já que pudemos observar que as pon- partir da Privação Materna. Trabalho de
tuações maiores ou menores oscilam entre abrigo e conclusão de curso de Graduação em Psi-
escola, ou seja, nenhuma se mantém como dotada cologia. Pontificia Universidade do Rio
de maior ou menor pontuação em relação aos índi- Grande do Sul. Faculdade de Psicologia
ces emocionais. Portanto o sistema emocional de (Porto Alegre, RS, Brasil).
correção do DFH não pode discriminar crianças 6. Hutz, C. S. & Bandeira, D. F. (1995). Avalia-
institucionalizadas e de escolas públicas. Conclui-se ção psicológica com o desenho da figura
que este sistema não possui validade. humana: Técnica ou intuição? Temas em
Segundo a pesquisa realizada, compreen- Psicologia.
demos que os aspectos cognitivos da criança ten- 7. Hutz, C., & Bandeira, D. R. (2000). Desenho
dem a não estar relacionados com os aspectos da figura humana. In J. A. Cunha (Ed.)
emocionais. Mais pesquisas são necessárias com- Psicodiagnóstico- V (pp. 507-513). Porto
parando outros grupos clínicos com crianças regula- Alegre: ArtesMédicas.
res para que possa confirmar se o desenho é ou
não valido como medida emocional. 8. Koppitz, E. M. (1968). Psychological evalua-
tion of children's human figure drawing.NY:
Grune&Stratton.
5. AGRADECIMENTOS 9. Miceli, P.A.M. (2003). O Brincar Segundo
À Pontifícia Universidade Católica de Campinas Winnicott e Aucouturier.41f. Trabalho de
pela bolsa e apoio concedidos e agradeço a minha Conclusão de Curso (Especialização em
orientadora Dr Solange Muglia Wechsler e as meni- Psicomotricidade). Universidade Cândido
nas do LAMP que tanto me ajudaram para a reali- Mendes, Rio de Janeiro, 2003.
zação da pesquisa. 10. Souza, E.J.C & Pedroso, J.S. s.d. As vivên-
cias emocionais de crianças abrigadas atra-
vés do desenho livre. Programa de Pós
Graduaçao em Psicologia. Universidade
6. REFERÊNCIAS Federal do Pará.
11. Van Kolck, O. L. Testes projetivos gráficos
1. Anastasi, A., &Urbina, T. (2000). Testagem no diagnóstico psicológico. São Pau-
psicológica. Porto Alegre: Artes Médicas. lo:Editora Pedagógica e Universitária Ltda. -
EPU, 1984.
2. Arteche, A. X.,& Bandeira, D. R. (2006). O
desenho da figura humana: revisando mais- 12. Wechsler, S. M. (2003). DFH III. O desenho
de um século de controvérsias. Revista Ibe- da figura humana: Avaliação do desenvol-
roamericana de Diagnóstico y Evaluación vimento cognitivo de crianças brasileiras.
Psicológica Campinas: LAMP/PUC-Campinas.
3. Barros, V. (1998). A Importância do dese- 13. Wechsler, S.M., Prado, C.M, Oliveira, K.S.,
nho na educação infantil e no diagnostico da &Mazzarino, B. G. (2011). Desenho da figu-
psicopedagogia. WEBArtigos. 13 de janeiro ra humana: análise da prevalência de indi-
de 2011.Disponível cadores emocionais. Psicologia, Reflexão e
em:http://www.webartigos.com/artigos/a- Crítica
importancia-do-desenho-na-educacao- 14. Wechsler, S. M. (2012). O desenho da figu-
infantil-e-no-diagnostico-da- ra humana: medida cognitiva, criativa ou
psicopedagogia/56808/ emocional. Em S. M. Wechsler, & T. C. Na-
4. Chemama, R. (1991).A Importância do desenho kano (Orgs.). O desenho infantil: forma de
na educação infantil e no diagnostico da psico- expressão cognitiva, criativa e emocional,
pedagogia. WEBArtigos. 13 de janeiro de pp.15-32. São Paulo: Casa do Psicólogo.
2011.Disponível
em:http://www.webartigos.com/artigos/a-
importancia-do-desenho-na-educacao-infantil-e-
no-diagnostico-da-psicopedagogia/56808/
5. Hecht, B &Silva, R. F.P (2009). Crianças
Institucionalizadas: A construçãoPsiquica a

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