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Rev Port Cardiol.

2017;36(9):655---668

Revista Portuguesa de
Cardiologia
Portuguese Journal of Cardiology
www.revportcardiol.org

ARTIGO DE REVISÃO

Sacubitril/valsartan: um importante avanço no puzzle


terapêutico da insuficiência cardíaca
Pedro Marques da Silva a,∗ , Carlos Aguiar b

a
Núcleo de Investigação Arterial, Medicina 4, Hospital de Santa Marta, Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE, Lisboa, Portugal
b
Departamento de Cardiologia, Hospital de Santa Cruz, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, EPE, Lisboa, Portugal

Recebido a 11 de novembro de 2016; aceite a 26 de novembro de 2016

PALAVRAS-CHAVE Resumo O sacubitril/valsartan (LCZ696) é um complexo supramolecular de sal de sódio do


Sacubitril/valsartan; pró-fármaco sacubitril, inibidor da neprilisina, e do valsartan, um antagonista dos recetores
Insuficiência da angiotensina (ARB), administrado por via oral, recentemente aprovado no tratamento da
cardíaca; insuficiência crónica (classes II-IV NYHA) com fração de ejeção reduzida (IC-FER). A inibição
Inibição da neuro-hormonal é um elemento central no tratamento da insuficiência cardíaca. No entanto,
neprilisina; os benefícios obtidos com o aumento de outros sistemas, tais como os péptidos natriuréti-
Antagonista cos, foram muito parcelares (e inconsistentes). O desenvolvimento do sacubitril/valsartan e os
do recetor da resultados do PARADIGM-HF mudaram a situação e abriram uma alternativa no tratamento da
angiotensina-inibidor insuficiência cardíaca crónica. O PARADIGM-HF foi um grande estudo prospetivo aleatorizado,
da neprilisina; com dupla ocultação, que demonstrou que a morbimortalidade na insuficiência cardíaca pode
PARADIGM-HF ser melhorada com o sacubitril/valsartan, com redução significativa da morte cardiovascular ou
da hospitalização por agravamento da insuficiência cardíaca. O sacubitril/valsartan foi também
superior ao enalapril na redução da mortalidade total e na limitação da progressão da insufici-
ência cardíaca. O novo ARNi foi geralmente bem tolerado, sem incremento dos eventos adversos
potencialmente fatais (apesar da maior incidência de hipotensão sintomática, mas com uma
baixa ocorrência de angioedema). Por essa razão, o sacubitril/valsartan deve substituir o ACEi
(ou o ARB) no tratamento da IC-FER, afirmação já expressa em muitas das novas recomendações
terapêuticas.
© 2017 Sociedade Portuguesa de Cardiologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Todos os
direitos reservados.

∗ Autor para correspondência.


Correio eletrónico: pmarques.silva@sapo.pt (P. Marques da Silva).

http://dx.doi.org/10.1016/j.repc.2016.11.013
0870-2551/© 2017 Sociedade Portuguesa de Cardiologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Todos os direitos reservados.
656 P. Marques da Silva, C. Aguiar

KEYWORDS Sacubitril/valsartan: An important piece in the therapeutic puzzle of heart failure


Sacubitril/valsartan;
Abstract Sacubitril/valsartan (LCZ696), a supramolecular sodium salt complex of the neprily-
Heart failure;
sin inhibitor prodrug sacubitril and the angiotensin receptor blocker (ARB) valsartan, was
Neprilysin inhibition;
recently approved in the EU and the USA for the treatment of chronic heart failure (HF)
Angiotensin
with reduced ejection fraction (HFrEF) (NYHA class II-IV). Inhibition of chronically activated
receptor-neprilysin
neurohormonal pathways (the renin-angiotensin-aldosterone system [RAAS] and sympathetic
inhibitor;
nervous system [SNS]) is central to the treatment of chronic HFrEF. Furthermore, enhance-
PARADIGM-HF
ment of the natriuretic peptide (NP) system, with favorable cardiovascular (CV) and renal
effects in HF, is a desirable therapeutic goal to complement RAAS and SNS blockade. Sacu-
bitril/valsartan represents a novel pharmacological approach that acts by enhancing the NP
system via inhibition of neprilysin (an enzyme that degrades NPs) and by suppressing the RAAS
via AT1 receptor blockade, thereby producing more effective neurohormonal modulation than
can be achieved with RAAS inhibition alone. In the large, randomized, double-blind PARADIGM-
-HF trial, replacement of an angiotensin-converting enzyme inhibitor (ACEI) (enalapril) with
sacubitril/valsartan resulted in a significant improvement in morbidity and mortality in pati-
ents with HFrEF. Sacubitril/valsartan was superior to enalapril in reducing the risk of CV death
or HF hospitalization (composite primary endpoint) and all-cause death, and in limiting progres-
sion of HF. Sacubitril/valsartan was generally well tolerated, with a comparable safety profile
to enalapril; symptomatic hypotension was more common with sacubitril/valsartan, whereas
renal dysfunction, hyperkalemia and cough were less common compared with enalapril. In sum-
mary, sacubitril/valsartan is a superior alternative to ACEIs/ARBs in the treatment of HFrEF, a
recommendation that is reflected in many HF guidelines.
© 2017 Sociedade Portuguesa de Cardiologia. Published by Elsevier España, S.L.U. All rights
reserved.

Introdução ajustada à idade também diminuiu6 . Apesar disso, persiste


o paradoxo da IC6 : o incremento, iterado e progressivo, da
Os avanços obtidos na prevenção, diagnóstico e tratamento entidade, embora os fatores contributivos individuais (e.g.
da doença cardiovascular (DCV), nas últimas décadas, têm síndrome coronária aguda, hipertensão arterial [HTA], car-
sido muito relevantes, propiciando reduções muito significa- diopatias valvulares e congénitas) tenham tido melhorias
tivas nas taxas de mortalidade por DCV, ajustadas à idade. prognósticas substanciais. Possivelmente, esta contradição
A taxa de mortalidade padronizada por doenças do aparelho redunda da constância de morbilidade arrolada a cada um
circulatório, por 100 000 habitantes, em Portugal continen- destes fatores, ainda que a redução de mortalidade seja
tal (de 2008 a 2012) diminuiu 15,5% (e é, em 2013, de 144,7 incontestável; além disso, a maior expetativa de vida torna
por 100 000 residentes)1 . mais consequentes os efeitos da idade avançada (e.g. o
Contudo, a insuficiência cardíaca (IC) é uma exceção aumento da frequência de morte e/ou apoptose dos miócitos
a esta propensão. A prevalência --- apesar de proceder da e as sequelas adversas cardíacas de diversas comorbilidades:
definição aplicada --- atinge cerca de 1-2% da população HTA, diabetes mellitus tipo 2, doença renal crónica, doença
adulta, com valores ≥ 10% nos adultos > 70 anos. Aos 55 anos, pulmonar obstrutiva crónica e arritmias, especialmente a
o risco de IC, ao longo da vida, é de 33% nos homens e 28% fibrilação auricular [FA]). Logicamente, também a melho-
mas mulheres (e é ainda maior nos hipertensos)2,3 . Natu- ria prognóstica --- lenta, mas progressiva --- da IC acaba por
ralmente, por isso, esta patologia afeta primariamente os concorrer para o aumento da prevalência desta condição6 .
idosos e é uma causa frequente de hospitalização. Nos Esta- Fruto da reconhecida interação --- variável, mas cons-
dos Unidos, a IC é responsável por mais de um milhão de tante, ao longo da história natural --- entre a função cardíaca
internamentos anuais2 . Apesar da escassez de dados recen- e os sistemas neuro-humorais (e inflamatórios), a abordagem
tes, a prevalência de IC, em Portugal, foi estimada em 4,4%, atual da IC com fração de ejeção reduzida (IC-FER) centra-
com valores similares nos homens (4,33%) e nas mulheres -se no bloqueio do sistema renina-angiotensina-aldosterona
(4,38%). A incidência aumenta com a idade e a maioria da (RAAS) e do sistema nervoso simpático (SNS), com recurso
carga de doença sobrevém nos doentes com mais de 65 anos a inibidores da enzima de conversão da angiotensina
(a prevalência, entre nós, atinge 12,67% no grupo etário de (ACEi) --- ou antagonistas dos recetores da angiotensina
70-79 anos e mais de 16% depois dos 80 anos)4 . Os dados (ARB), quando os ACEi não são tolerados ---, bloquea-
sobre o internamento por IC, entre nós, são limitados, mas dores adrenérgicos ␤ (␤-B) e antagonistas dos recetores
alvitram que as taxas de hospitalização tendem, como seria mineralocorticoides (MRA)3,7---9 . Contudo, mesmo com a
conjeturável, a aumentar significativamente com a idade5 . otimização da intervenção farmacológica sublinhada, a taxa
A sobrevivência após o diagnóstico de IC melhorou clara- de mortalidade aos cinco anos detém-se perto de 50%5 , pelo
mente durante os últimos 30 anos e a taxa de mortalidade que se torna elementar identificar os indivíduos em risco de
Sacubitril/valsartan: um importante avanço no puzzle terapêutico da insuficiência cardíaca 657

LCZ696

Estrutura química

Me
Me
CO2-
H
Antagonista do recetor Me N
Inibidor da neprilisina
da angiotensina O
3 Na+ 21/2 H2O
O OH
HN H
O O Me HH O -N N
N N HO O Me O N
H
N
O N CO2-
H N
O O

Figura 1 Antagonista do recetor de angiotensina --- inibidor da neprilisina (ARNi): sacubitril/valsartan (LCZ696).

Fragmentos ANP ANP/CNP


inativoss dos ANP/CNP BNP
NPs CNP BNP Ang II
BNP

Neprilisina
(NEP)
NPR-A NPR-B NPR-C Recetor AT1

GTP GTP
Reciclagem
do recetor Cascata de
sinalização
Internalização
cGMP
Expressão genética; ↑ síntese de
proteínas; ↑ proliferação celular
Péptidos inativos

Vasodilatação Vasoconstrição
↓ Fibrose/hipertrofia ↑ Fibrose/hipertrofia
cardíaca cardíaca
↑ Natriurese/diurese ↑ Retenção de Na+/H2O

Figura 2 Mecanismo de ação da neprilisina e dos péptidos natriuréticos, em paralelo com o sistema renina-angiotensina (e recetor
AT1) --- de acordo com Bayes-Genis et al13 .

IC (e.g. maior índice de massa corporal e de obesidade vis- arterial e do volume de fluidos, tanto na atividade nor-
ceral, elevação da glicemia em jejum, aumento da pressão mal, como em estados patológicos (e, em particular, nos
arterial sistólica, dislipidemia e alteração do rácio apolipo- doentes com IC) constitui um paradigma elementar da
proteína B/apolipoproteína A e tabagismo)6 e fundamentar colaboração interdisciplinar e tutelar10,11 que culminou,
novas vias de intervenção farmacológica capazes de minimi- mais recentemente, no desenvolvimento e introdução no
zar o prognóstico desta síndrome clínica. arsenal terapêutico do primeiro antagonista do recetor
De forma sumária, tendemos a considerar a IC como uma da angiotensina-inibidor da neprilisina (ARNi): o sacubi-
síndrome clínica na qual um conjunto de adaptações locais tril/valsartan (LCZ696) (Figura 1). A neprilisina (NEP) ---
e sistémicas intentam manter --- e, ao mesmo tempo, des- também conhecida como endopeptídase neutra, CD10,
regular --- a homeostasia cardiovascular (CV). Será, muito encefalinase, antigénio da leucemia linfoblástica aguda
naturalmente, esta complexidade e dualidade fisiopatoló- comum e endopeptídase 24.11 --- é uma enzima responsá-
gica que torna a definição e o desenvolvimento da melhor vel pela clivagem dos NP (Figura 2), os efeitos e principais
estratégia terapêutica desafiante, não inteiramente exclu- características dos quais estão sumariados na Tabela 18 .
siva e frequentemente individualizada. A multiplicidade,
interrelação e enunciação dos processos arrolados na pro-
gressão e manutenção da IC constituem-se, assim, alvos
Breve sumário da inibição farmacológica
potenciais de intervenção terapêutica --- complementares, da neprilisina
idealmente, aditivos --- no alívio sintomático, na melhoria
da qualidade de vida e na redução da morbilidade e morta- Ao longo dos anos, fruto de défices de compreensão fisiopa-
lidade associadas. tológica e funcional, de opções menos corretas nas doses e
A compreensão do papel do sistema dos peptídeos natriu- nas vias de administração, e de preferências «desajustadas»
réticos (NP) --- a par do RAAS --- na regulação da pressão na opção das combinações terapêuticas, a inibição da NEP
658 P. Marques da Silva, C. Aguiar

Tabela 1 Sumário do sistema de péptidos natriuréticos14---19


Péptidos natriuréticos ANP BNP CNP
Localização Aurícula Ventrículos Células endoteliais
vasculares
Desencadeadores Distensão auricular Aumento do volume Aumento da tensão
ventricular de cisalhamento
Recetor NPR-A NPR-A NPR-B
Efeitos fisiológicos Natriurese e diurese Natriurese e diurese Vasodilatação
Vasodilatação Vasodilatação
↓ RAAS e SNS Anti-hipertrófico
↑ Fluxo sanguíneo renal ↓ RAAS e SNS Antifibrótico
e da TFG
↑ Relaxamento miocárdico ↑ Fluxo sanguíneo renal Anti-inflamatório
Mobilização lipídica, efeitos e da TFG
metabólicos ↑ Relaxamento miocárdico Antitrombótico
Anti-hipertrófico
Antifibrótico Mobilização lipídica, efeitos Regulação do crescimento
↑ Permeabilidade endotelial metabólicos ósseo
Anti-inflamatório
Antifibrótico

Depuração do Depuração via Depuração via Depuração via


NP/degradação NPR-C/degradação pela NEP NPR-C/degradação pela NEP NPR-C/degradação pela NEP
enzimática
ANP: péptido natriurético auricular; BNP: péptido natriurético cerebral; CNP: péptido natriurético tipo C; NEP: neprilisina; NPR-A:
recetor de peptídeo natriurético de tipo A; NPR-B: recetor de peptídeo natriurético de tipo B; NPR-C: recetor de peptídeo natriurético
de tipo C; RAAS: sistema renina-angiotensina-aldosterona; SNS: sistema nervoso simpático; TFG: taxa de filtração glomerular.

(NEPI) foi menos conseguida, acumulando alguns desaires, combinação de um ARB a um NEPI, administrada em duas
amontoando perplexidades, mas, ao mesmo tempo, permi- tomas diárias (BID). Estava chegada a hora do LCZ696, dos
tindo aperfeiçoamentos e progressos2,10---13,20,21 . ARNi24,27 (Figura 3). Os efeitos fisiológicos esperados com as
O primeiro NEPI sintético disponível foi o tiorfano, o diversas formas de modulação da NEP e do RAAS são com-
metabolito ativo do racecadotril. Em voluntários saudáveis pendiados na Tabela 213
--- assim como na HTA e na IC ---, os NEPI determinam aumento
das concentrações plasmáticas do peptídeo natriurético
auricular (ANP) e peptídeo natriurético tipo-B (BNP) endó- Sacubitril/valsartan* (LCZ696): características
geno, um incremento do monofosfato cíclico de guanosina farmacodinâmicas e farmacocinéticas
(cGMP), circulante e urinário, e uma resposta salutar hemo-
dinâmica, de curto prazo, com um efeito hipotensor discreto Farmacodinâmica
e efémero13,22---24 , sem efeitos significativos na IC grave.
A investigação farmacológica foi prosseguindo, do can- O sacubitril/valsartan, ao contrário do que o nome poderia
doxatril passou pelo ecadotril, sem eficácia comprovada fazer supor, não é uma combinação fixa de medicamen-
e descontinuidade do seu aperfeiçoamento. A monotera- tos. O sacubitril/valsartan é um complexo supramolecular
pia com NEPI evolveu para a combinação com ACEi: os de sal de sódio do pró-fármaco NEPI sacubitril (AHU377)
inibidores das vasopeptidases. Foi, então, o tempo do oma- e do ARB diprótico valsartan numa razão molecular de
patrilato (e dos estudos IMPRESS e OVERTURE), do fasidotril, 1:123,24,27---30 . Com uma estrutura cristalina estável, alta-
do sampatrilato e do mixanpril13 . Os benefícios potenci- mente hidrossolúvel, contém seis moléculas aniónicas de
ais anotados foram ensombrados pelo risco de angioedema sacubitril e seis de valsartan complexadas com catiões de
grave25 --- motivado pelo excesso de bradicinina, des-Arg9- sódio e água (Figura 1). Após a administração oral, o com-
bradicinina e, possivelmente, substância P22,26 ---, o que plexo dissocia-se em sacubitril e valsartan (cada comprimido
levou à interrupção do desenvolvimento dos inibidores das de 200 mg --- administrado BID, dose alvo de manutenção
vasopeptidases. A inibição das três enzimas arroladas à na IC-FER --- contém 97 mg de sacubitril e 103 mg de
degradação das bradicininas (por ordem de ponderação: valsartan).
ACE > aminopeptídase P » NEP)22 motiva a acúmulo de bra-
dicininas bastantes para a provocação de angioedema, um
efeito adverso potencialmente fatal, quando há compro- ∗ Diz-se do ácido que pode libertar dois protões por molécula
misso das vias aéreas superiores. A perceção do risco e o (Dicionário da Língua Portuguesa. Porto: Porto Editora, 2003-
acerto de doses (não conseguida, e.g., no caso do omapa- 2016) [consultado em 16 de julho de 2016]. Disponível na Internet:
trilato), no contexto da IC, sustentou o passo seguinte: a http://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/diprótico).
Sacubitril/valsartan: um importante avanço no puzzle terapêutico da insuficiência cardíaca 659

Angiotensinogénio
(secreção hepática) Vasoconstrição
Sistema renina-
Elevação da pressão arterial
angiotensina Angiotensina I
Aumento do tono simpático
Angiotensina II Recetor AT1 Aumento da aldosterona
Aumento da fibrose
Hipertrofia ventricular

Valsartan

Insuficiência LCZ696
cardíaca
Sacubitril (AHU377)

LBQ657

Vasodilatação
ANP BNP CNP
Adrenomedulina
Redução da pressão arterial
Péptidos Substância P Neprilisina Redução do tono simpático
pro-BNP Bradicinina (NEP)
natriuréticos Angiotensina II Redução da aldosterona
Outros
Fragmentos Natriurese/diurese
inativos

NT-pro BNP (não é substrato da NEP)

Figura 3 Mecanismo de ação farmacológica do LCZ696 (adaptado de Vardeny et al.2 ).

Tabela 2 Efeitos fisiológicos da inibição isolada da nepri-


regional média (MR-proANP) e do NT-proBNP no plasma23 .
lisina e da combinação com moduladores de sistema
Estas variações são consistentes com uso mais iterado com
renina-angiotensina (de acordo com Bayes-Genis et al13 .)
aumento, na urina do ANP e do cGMP (também no plasma)
e redução do NT-proBNP, aldosterona e ET-1 no plasma
NEPI ACEi NEPI + ACEi ARNI (Figura 3). Num estudo de escalonamento de dose, em
Efeitos nos níveis plasmáticos dos péptidos voluntários saudáveis, houve um acréscimo máximo de 40%
Angiotensina II ↑ ↓ ↓ ↔↓ nos níveis médios de cGMP às quatro h --- ainda significativa
Renina ↓ ↔ ↔↑ ↑ 12 h após a toma --- e que atingiu o valor máximo 12 dias
Aldosterona ↓ ↔ ↓ ↓ da administração continuada, com retorno aos valores
NP ou cGMP ↑ ↔ ↑ ↑ basais 24 h após a administração de LCZ69623,31 . Ao mesmo
ET-1 ↑ ↔ ↑ ↓ tempo, fruto da porção valsartan, há um aumento signi-
Big ET-1 ↑ ↑ ficativo dependente de dose da concentração de renina,
Bradicinina ↑ ↑ ↑↑ ↑ da atividade da renina plasmática e da angiotensina II,
que permanecem elevados durante 24 h. Acresce-se que,
Efeitos fisiológicos face à farmacodinâmica exposta, o BNP não é um mais
Pressão arterial ↔ ↓ ↓ biomarcador adequado na IC, em doentes tratados com
Excreção de sódio ↑ ↑ ↑ ↑↑ sacubitril/valsartan, enquanto o NT-proBNP, como não é um
Hipertrofia CV ↔↓ ↓ ↓↓ ↓↓ substrato da NEP, parece manter a conformidade.
Fibrose CV ↓ ↓ ↓↓ ↓↓
cGMP: monofosfato cíclico de guanosina; CV: cardiovascular;
ET-1: endotelina 1; NP: péptidos natriuréticos. Propriedades farmacocinéticas

A Tabela 3 resume os principais parâmetros farmacoci-


Sacubitril (pró-fármaco) é metabolizado in vivo (cliva- néticos2 . Após a administração oral, o complexo é
gem enzimática do éster etílico) em sacubitrilato (LBQ657) rapidamente absorvido (sem variação na presença de ali-
(ativo), que inibe a NEP, mas sem inibir a aminopeptídase mentos) e, como já referimos, dissociado em valsartan
P. Logicamente, o valsartan inibe o RAAS ao ligar-se e ao e sacubitril; este é, posteriormente, metabolizado por
bloquear o recetor AT1 da angiotensina II21,23---25 . carboxilesterases inespecíficas 1 b e 1 c no metabolito
Do ponto de vista farmacodinâmico, o sacubi- ativo sacubitrilato. No conjunto, atingem as concentrações
tril/valsartan condiciona um incremento não sustentado máximas (Cmax ) em 90, 30-60 e 120 min, respetivamente.
da natriurese e do cGMP urinário (que advém como A biodisponibilidade oral absoluta do sacubitril é mais
biomarcador da NEPI) e uma diminuição do pró-ANP fração de 60% e a do valsartan cerca de 23%2,23,24,28,29,32 . O sal
660 P. Marques da Silva, C. Aguiar

Tabela 3 Sumário da farmacocinética do sacubitril/valsartan (adaptado de Mills e Vardeny2 )

Valsartan Sacubitril Sacubitrilato


(AHU377) (LBQ657)
Biodisponibilidade (%) 23 > 60
Distribuição (litros, l) 75 103
Ligação às proteínas (%) 94-97
Tmax (horas) 1,5 0,5 2
Metabolismo Mínimo (≈ 20%) Metabolizado em Sem metabolismo
(< 10% como metabolito sacubitrilato por esterases significativo
hidroxil)
Excreção Renal (≈ 13%) Renal (52-68%), Fezes (37-48%),
Fezes (86%) primariamente como primariamente
sacubitrilato
t½ (horas) 9,9 1,4 11,5
l: litro; Tmax: tempo para atingir a concentração máxima (Cmax) no plasma; t½: semivida plasmática de eliminação.

de valsartan no complexo é diverso do da monoterapia. Interações medicamentosas


A biodisponibilidade plasmática do valsartan com 400 mg de
LCZ696 é equivalente a 320 mg em monoterapia, correspon- O sacubitril inibe os polipéptidos transportadores dos aniões
dente a uma exposição sistémica cerca de 40% mais elevada orgânicos (OATP), nomeadamente o OATP1B1 e o OATP1B3,
(imputada à presença da forma iónica em vez do ácido expressos na membrana basolateral do hepatócito e arrola-
livre presente no LCZ696)33 . Assim, a dose de 97/103 mg dos à depuração hepática de vários fármacos (e.g. estatinas
de sacubitril/valsartan, BID, é bioequivalente a 160 mg de e furosemida). A coadministração de sacubitril/valsartan
valsartan, BID. aumentou a exposição sistémica à atorvastatina e aos seus
Com BID, os níveis estacionários farmacocinéticos são metabolitos. É, por isso, desejável precaução com o uso
atingidos em três dias, sem acumulação significativa do concomitante com inibidores da redutase do HMG-CoA13,28 .
sacubitril e do valsartan (mas de 1,6 vezes para o meta- O uso concomitante de furosemida levou a uma redução
bolito ativo NEPI). Tanto o sacubitril e o sacubitrilato, como da sua Cmax e da AUC em 50 e 28%, respetivamente24,27 ,
o valsartan, ligam-se fortemente às proteínas plasmáticas com decremento da excreção urinária de sódio. O sacu-
(94-97%), com um volume de distribuição aparente médio bitril/valsartan diminui também a exposição sistémica à
do valsartan e do sacubitril de 75 e 103 l, respetivamente. hidroclorotiazida e à metformina (≈ 23%). A relevância clí-
O sacubitrilato atravessa a barreira hematoencefálica numa nica destes resultados é desconhecida13,28 . Naturalmente,
extensão limitada (a exposição no líquido cefalorraquídeo é e como é previsível, nos idosos, nos doentes com depleção
0,28% da plasmática)23,28 . de volume ou quando há um compromisso da função renal
À parte da bioativação do pró-fármaco, o sacubitrilato comprometida, o uso concomitante de sacubitril/valsartan
não é mais biotransformado. O valsartan é parcialmente e anti-inflamatórios não esteroides pode levar a um maior
metabolizado (≈ 20%), principalmente num metabolito risco de agravamento da função renal, sendo recomendável,
hidroxil (valeril-4-hidroxi valsartan) --- identificado em bai- neste caso, monitorizar adequadamente a função renal.
xas concentrações (< 10%), no plasma --- presumivelmente
pelo CYP2C9. Cerca de 52-68% do sacubitril (primariamente Sacubitril/valsartan no tratamento
como sacubitrilato) e de 13% do valsartan são excretados
na urina; 37-48% do sacubitril (primordialmente como sacu-
da insuficiência cardíaca
bitrilato) e 86% do valsartan são excretados nas fezes.
A semivida de eliminação é aproximadamente de Insuficiência cardíaca com fração de ejeção
1,43 h para o sacubitril, de 11,48 h para o sacubitrilato reduzida
e de 9,90 h para o valsartan23,24,28,32 .
A farmacocinética do sacubitril/valsartan não é afetada O sacubitril/valsartan encontra-se aprovado e indicado «em
pelo género, mas, nos idosos, a exposição ao sacubitri- doentes adultos para o tratamento da IC crónica sintomática
lato e ao valsartan aumenta em 42 e 30%, respetivamente, com FER», desde novembro de 2015, pela Agência Europeia
presumivelmente como resultado da disfunção renal e/ou do Medicamento (EMA)28,34 . Esta aprovação foi fundamen-
hepática. Ao contrário do valsartan, há correlação entre a tada nos resultados do estudo The Prospective Comparison
função renal e a exposição sistémica ao sacubitrilato em of ARNI With ACEI to Determine Impact in Global Mortality
doentes com compromisso renal ligeiro a grave (podendo and Morbidity in Heart Failure (PARADIGM-HF)35 .
duplicar com maior afetação da taxa de filtração glomerular O estudo PARADIGM-HF foi desenhado em dupla-
[15 ml/min/1,73 m2 ≤ TFG < 30 ml/min/1,73 m2 ]). Da mesma ocultação para avaliar a superioridade de sacubi-
forma, há também um aumento da exposição sistémica ao tril/valsartan 200 mg BID, em comparação com o enalapril
sacubitril, sacubitrilato e valsartan nos doentes com com- 10 mg BID na redução de morte CV e hospitalização por
promisso hepático ligeiro a moderado23,24,28 . IC (objetivo primário composto) nos doentes com IC-FER
Sacubitril/valsartan: um importante avanço no puzzle terapêutico da insuficiência cardíaca 661

(≤ 35%)36 . Os doentes incluídos eram seguidos em ambu- (pelo score MAGGIC) e dos níveis de hemoglobina glicada
latório, com um diagnóstico de IC crónica estabelecido, (HBA1c)23 .
em classe II-IV da New York Heart Association (NYHA) Nos objetivos secundários, o sacubitril/valsartan reduziu
e fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) ≤ 40% a mortalidade por todas as causas em 16% (HR: 0,84; IC 95%:
(alterada para ≤ 35%, posteriormente, quando esta- 0,76-0,93; p = 0,0005), com um incremento da esperança de
vam incluídos 961 doentes), com um BNP ≥ 150 pg/ml vida estimado em 1,3 anos (IC 95%: 0,3-2,4) nos doentes
(NT-proBNP ≥ 600 pg/ml) OU BNP ≥ 100 pg/ml (NT- com 65 anos do estudo (a esperança de vida foi de dez
-proBNP ≥ 400 pg/ml) e hospitalização por IC nos últimos anos nos tratados com enalapril e 11,4 anos com sacubi-
12 meses. No global, 4,6% estavam em classe I da NYHA, tril/valsartan). Significativo, o sacubitril/valsartan reduziu
70,5% em classe II, 24% em classe III e só 0,7% em classe também a morte súbita cardíaca em comparação com o
IV. Os doentes teriam de estar medicados com um ACEi enalapril (HR 0,80; p = 0,008)39 . O ARNi melhorou tam-
(ou um ARB), na dose diária ≥ 10 mg de enalapril (ou bém significativamente os sintomas e as limitações físicas,
equivalente), estável, pelo menos, quatro semanas antes quer segundo o Kansas City Cardiomyopathy Questionnaire
do início do estudo. A idade média dos doentes foi de 64 (KCCQ), quer pela classe funcional NYHA40 . Não houve
anos e 87% eram homens, maioritariamente caucasianos diferenças entre os tratamentos no risco de agravamento
(66%) e asiáticos (18%). Era ainda obrigatória a medicação da função renal ou de FA de novo. A utilização de recursos
com um ␤-B, exceto se contraindicado ou não tolerado, de saúde arrolada ao tratamento foi menor com o sacu-
numa dose estável durante, pelo menos, quatro semanas bitril/valsartan, tendo-se verificado reduções significativas
antes do início do estudo35,36 . O PARADIGMA-HF contemplou dos números totais de hospitalizações por IC (risco relativo
um período de run-in de avaliação sequencial do enalapril [RR]: 0,77; IC 95%: 0,67-0,89; p < 0,001), hospitalizações CV
e do sacubitril/valsartan (com uma mediana de exposição (RR: 0,84; IC 95%: 0,76-0,92; p < 0,001), hospitalizações por
ao fármaco de 15 e 29 dias, respetivamente) antes do todas as causas (RR: 0,84; IC 95%: 0,78-0,91; p < 0,001), um
período aleatorizado, em dupla ocultação, que confirmou a menor número de dias de hospitalização em unidade de cui-
tolerabilidade dos doentes a cada um dos tratamentos em dados intensivos (UCI) por qualquer causa (RR: 0,79; IC 95%:
análise. 0,63-0,99; p = 0,0434), e um menor número de episódios de
O estudo veio a ser parado precocemente, ao fim de um urgência por IC (RR: 0,70; IC 95%: 0,52-0,94; p = 0,0170)40 .
período médio de acompanhamento de 27 meses, porque se Além disso, o novo tratamento reduziu a necessidade de
atingiram os critérios pré-especificados para uma diferença intensificação do tratamento (520 versus 604; HR 0,84;
entre grupos considerada irrefutável: nas três análises inte- p = 0,003), de recorrerem a fármacos inotrópicos positivos
rinas (a última com dois terços dos eventos necessários) intravenosos (redução de risco [RRR] de 31%, p < 0,001)
confirmou-se uma redução muito significativa da morte por e de serem submetidos à implantação de dispositivos ou
causas CV (e também do objetivo primário composto)36,37 . A transplantação cardíaca (RRR de 22%, p = 0,07)40 .
medicação dos doentes cumpria as recomendações interna- A redução incremental da mortalidade obtida neste
cionais, sendo que 82% dos doentes tomavam um diurético, estudo foi similar à verificada no Studies of Left Ventricular
mais de 90% um ␤-B, mais de 50% faziam um MRA, 30% com Dysfunction --- Treatment Arm (SOLVD-T), contra placebo,
digoxina 15% tinham um cardioversor desfibrilhador implan- que estabeleceu os ACEi como tratamento imperativa, de
tável (CDI) e 7% terapêutica de ressincronização cardíaca primeira linha, na IC41 . De assinalar que a dose de enala-
(TRC), na data da aleatorização38 . Na última avaliação, a pril (10 mg, BID), no PARADIGM-HF, é maior que a alcançada
dose média de sacubitril/valsartan foi de 375 mg e a de no SOLVD-T. O PARADIGM-HF avulta pelo seu caráter pros-
enalapril de 18,9 mg23 . petivo, aleatorizado e controlado, justeza de comparador,
O sacubitril/valsartan foi significativamente superior ao relevância e consistência de RRR («ensaio dos 20%»)42
enalapril, reduzindo em 20% o risco do objetivo primário (Tabela 4) e poder e adequação estatística para adjudicação
composto (hazard ratio [HR]: 0,80; intervalo de confiança de diferenças clinicamente relevantes em objetivos bem
a 95% [IC 95%]: 0,73-0,87; p < 0,0001), assim como o dos definidos.
seus componentes individuais, nomeadamente uma redução O sacubitril/valsartan contribuiu para um menor número
de 20% do risco de morte CV (HR: 0,80; IC 95%: 0,71-0,89; de eventos adversos (EA) graves e uma menor de
p < 0,0001) e de 21% do risco de hospitalização por IC (HR: descontinuação do tratamento por EA (10,7 versus 12,2%)35 .
0,79; IC 95%: 0,71-0,89; p < 0,0001). A redução do risco de A hipercaliemia (11,6 versus 14%), a tosse (8,8 versus
morte CV foi atribuída essencialmente à redução do risco 12,6%) e a disfunção renal (10,1 versus 11,5%) foram
de morte súbita (HR: 0,80; IC 95%: 0,68-0,94; p = 0,008) e de significativamente menos reiteradas nos doentes tratados
morte por agravamento da IC (HR: 0,79; IC 95%: 0,64-0,98; com sacubitril/valsartan. No entanto, a hipotensão sin-
p = 0,034)39 . Em termos absolutos, o número de indivíduos tomática foi significativamente maior nos doentes com
necessário tratar (NNT) para evitar um evento de morte sacubitril/valsartan (14,0 versus 9,2%), mas raramente con-
CV ou hospitalização por IC foi de 21. Os NNT para evi- duziu à descontinuação do fármaco35 . O angioedema ocorreu
tar um evento de morte CV e um evento de hospitalização em 29 doentes com sacubitril/valsartan e em 25 doen-
por IC foram 32 e 36, respetivamente, num período de tra- tes com enalapril. De notar que nenhum foi ponderado
tamento com duração média de 27 meses34 . As reduções como risco de vida, não tendo havido compromisso das vias
do risco de morte CV e do risco do objetivo primário aéreas35 . Um subestudo de biomarcadores afirmou o já espe-
composto foram consistentes em todos os subgrupos de rado acréscimo dos níveis plasmáticos do BNP e urinários
doentes analisados35 e independente da idade, dos níveis do cGMP (fruto da NEPI). Os doentes tratados com sacu-
de FEVE, da pressão arterial sistólica, do grau de risco basal bitril/valsartan sustentaram níveis consistentemente mais
662 P. Marques da Silva, C. Aguiar

Tabela 4 PARADIGM-HF: sumário dos resultados obtidos no objetivo primário composto (e componentes) e na mortalidade total

Objetivo Razão de risco HR (IC95%) Redução de risco relativo (%) p


Objetivo composto primário 0,80 20 < 0,001
de morte CV e (0,73-0,87)
hospitalização por IC
Componentes individuais do objetivo composto primário
Morte CV 0,80 20 < 0,001
(0,71-0,89)
1.a hospitalização por IC 0,79 21 < 0,001
(0,71-0,89)
Objetivos secundários
Mortalidade total 0,84 16 0,0005
(0,76-0,93)
CV: cardiovascular; HR: hazard ratio (razão de risco); IC: insuficiência cardíaca; IC95%: intervalo de confiança a 95%.

baixos de NT-proBNP (como reflexo da menor stress miocár- 42% com antecedentes de hospitalização por IC; 42% tinham
dico) e de troponina (por menor lesão cardíaca). Enquanto história de FA e 21% de enfarte do miocárdio. A pressão
substrato da NEP, os níveis plasmáticos de BNP refletem a arterial estava bem controlada nos dois braços (mediana
ação do fármaco e os níveis de NT-proBNP resultarão do 136/79 mm Hg) e sem dissemelhanças na medicação basal
seu efeito cardioprotetor, pelo que a aparente discrepân- (93% dos doentes estavam com ACEi [54%]/ARB [39%], 79%
cia evolutiva destes biomarcadores (ao contrário do habitual com ␤-B e 21% com MRA). A avaliação ecocardiográfica ini-
curso em paralelo durante a história natural da IC), registada cial exibiu, em média, uma elevação da relação E/e’ e um
com o sacubitril/valsartan, é interessante e merecedora de aumento do volume indexado da aurícula esquerda, consis-
atenção acrescida13,40 . tentes com a elevação ligeira das pressões de enchimento
ventricular esquerdo.
Insuficiência cardíaca com fração de ejeção O objetivo primário do PARAMOUNT: variação do NT-
preservada -ProBNP às 12 semanas foi significativamente superior nos
doentes tratados com sacubitril/valsartan (p = 0,005); o
valor médio do NT-proBNP desceu de 783 para 605 pg/ml
A IC com fração de ejeção preservada (IC-FEP) é ainda um com o ARNi e de 862 para 835 pg/ml com o valsartan; a
repto diagnóstico e terapêutico3 . A FEVE é normal (≥ 50%) e diferença entre grupos reduziu-se às 36 semanas (p = 0,20).
os sinais e sintomas IC são, frequentemente, pouco especí- Às 36 semanas, notou-se reversão da remodelagem auri-
ficos e difíceis de descriminar de outras condições clínicas, cular esquerda com sacubitril/valsartan, patenteada pela
por vezes coexistentes. A perceção diagnóstica é mais usual redução significativa da dimensão (p = 0,03) e do volume
nos idosos, com comorbilidades e sem sinais óbvios de sobre- indexado da aurícula esquerda (p = 0,007), regressão não
carga de volume fluido central, mas deve ser sustentada na observada com o valsartan e que foram mais acentuadas nos
objetivação de disfunção cardíaca, em repouso ou durante doentes sem FA.
o esforço3 . O diagnóstico de IC-FEP demanda: a presença O declínio da TFG estimada (ao contrário do rácio
de sintomas e/ou sinais de IC; a presença de uma FEVE de albumina/creatinina) foi significativamente menor
«preservada»; níveis elevados de NP (BNP > 0,35 pg/ml e/ou com sacubitril/valsartan (-1,5 versus -5,2 ml/min/1,73 m2 ;
NT-proBNP > 0,125 pg/ml); e a comprovação de alterações --- P = 0,002). O agravamento da função renal, definido como
funcionais e estruturais --- cardíacas. um aumento da creatininemia > 0,3 mg/dl e/ou > 25% entre
O plano de investigação do sacubitril/valsartan abrange visitas, foi menos frequente com o ARNi, embora a diferença
também a IC-FEP. Como é reconhecido, não há, até à não seja estatisticamente significativa44 . Embora a redução
data, nenhum fármaco disponível com evidência susten- tensional tenha sido mais pronunciada com o sacubi-
tada na modificação do seu curso e história natural3,7 . tril/valsartan (em média, 9 mm Hg na sistólica e 5 mm Hg
O estudo de fase II Prospective Comparison of ARNI With na diastólica versus 3 e 2 mm Hg, respetivamente, com val-
ARB on Management of Heart Failure With Preserved Ejec- sartan), não se encontrou correlação entre a variação da
tion Fraction (PARAMOUNT) avaliou a segurança e eficácia pressão sistólica e as alternações, observadas às 12 semanas,
do sacubitril/valsartan 200 mg BID versus valsartan 160 mg do NT-proBNP e, às 36 semanas, na TFG, classe funcio-
BID em doentes com IC-FEP43 . A aleatorização foi prece- nal NYHA e volume auricular esquerdo45 . No PARAMOUNT,
dida de um período run-in de duas semanas com placebo. a dose desejada de sacubitril/valsartan e de valsartan foi
O estudo incluiu 301 doentes com idade ≥ 40 anos, história alcançada em 81 e 78% dos doentes, respetivamente (o
de IC sintomática medicados com diurético, FEVE ≥ 45%, NT- recurso a diuréticos de ansa foi maior com o valsartan). O
-proBNP > 400 pg/ml, TFG ≥ 30 ml/min/1,73 m2 e um potás- sacubitril/valsartan foi bem tolerado. A incidência de EA
sio sérico ≤ 5,2 mmol/l, que foram tratados e seguidos graves, hipotensão, disfunção renal ou hipercaliemia não
durante 36 semanas43 . A idade média foi de 71 anos e 57% diferiu entre os dois grupos (com só um caso de angioedema
eram mulheres; 94% tinham HTA e 38% diabetes mellitus; com o sacubitril/valsartan)43 .
Sacubitril/valsartan: um importante avanço no puzzle terapêutico da insuficiência cardíaca 663

Tabela 5 Riscos relevantes potenciais e informação não disponível com sacubitril/valsartan (adaptado do sumário da EMA e de
Bayes-Genis et al13 .)

Riscos relevantes potenciais

Risco Conhecido Recomendado


Hepatotoxicidade Metabolização hepática limitada, sugerindo risco Precaução nos doentes com compromisso hepático
baixo de lesão hepática moderado (Child-Pugh B) ou com AST/ALT 2 x LSN
Contraindicado com compromisso hepático grave,
cirrose biliar ou colestase (Child-Pugh C)
Alteração NEP: uma das protéases que degradam o A␤, Avaliação da função cognitiva no PARAGON-HF
cognitiva componente das placas de amiloide da doença Avaliação cognitiva compreensiva e deposição
de Alzheimer* cerebral de placas amiloides, por PET, no estudo
Sem evidência em macacos tratados na IC-FEP
com 300 mg/kg/dia durante 39 semanas
Sem maior incidência de EA cognitivos
ou demência49 nos estudos realizados
Em voluntários saudáveis, o sacubitrilato alcançou
concentrações inibitórias da NEP no LCR, mas não
causou alterações das isoformas agregáveis de A␤
(apesar do aumento da A␤ 1-38 solúvel)51
Interação com Pode aumentar os níveis plasmáticos das Recomenda-se precaução na coadministração
estatinas estatinas, condicionando a ocorrência possível com estatinas
de efeitos adversos Estudo de segurança pós-autorização de avaliação
do risco de eventos relacionados em associação
com estatinas na IC
Angioedema Casos de angioedema (quando associado a edema Se ocorrer angioedema, descontinuar
da laringe pode ser fatal): 0,5 (sem compromisso imediatamente o tratamento e dar terapêutica
das vias aéreas) versus 0,2% com enalapril (ter em e acompanhamento apropriados até à resolução
conta período de run-in e possível viés de seleção) completa e sustentada dos sinais e sintomas
Não foram estudados doentes com antecedentes Contraindicado nos doentes com antecedentes
de angioedema (e risco maior na raça negra --- de angioedema arrolado a ACEi/ARB ou com
só ≈ 5% nos estudos clínicos) angioedema hereditário ou idiopático
Gravidez e Não há dados sobre o uso em mulheres grávidas. Uso não recomendado no 1.◦ trimestre e
aleitamento Estudos em animais com mostraram toxicidade contraindicado durante o 2.◦ -3.◦ trimestres
reprodutiva de gravidez
Desconhece-se se é excretado no leite humano Não recomendado durante a amamentação pelo
(comprovado em ratos) risco potencial para em recém-nascidos
Sem dados sobre o efeito na fertilidade humana e lactentes

Informação não disponível


Uso em PD/PK, segurança e eficácia não foram Sem indicação em crianças < 18 anos
crianças estabelecidas em crianças e adolescentes Estudo de dose única de fases II e III de avaliação
< 18 anos com IC da PK, segurança e tolerabilidade do LCZ696,
seguido de estudo de 52 semanas, em comparação
com enalapril, em crianças com IC
Compromisso Experiência clínica muito limitada nos doentes Avaliação e monitorização da função renal nos
renal grave com compromisso renal grave doentes com IC
(TFGe < 30 ml/min/1,73 m2 ) Sem ajuste posológico compromisso renal ligeiro
Maior risco de hipotensão com compromisso renal (TFGe 60-90 ml/min/1,73 m2 )
Não existe experiência nos doentes com doença Considerar a dose inicial de 24 mg/26 mg BID
renal terminal com TFGe 30-60 ml/min/1,73 m2
Pode estar associado a agravamento da função Com TFGe < 30 ml/min/1,73 m2 usar com
renal, que pode condicionar a titulação da dose precaução, na dose inicial de 24 mg/26 mg BID
Não recomendado na doença renal terminal
O risco de agravamento significativo da função
renal é maior com desidratação ou uso
concomitante de AINE
664 P. Marques da Silva, C. Aguiar

Tabela 5 (Continuação)

Riscos relevantes potenciais

Risco Conhecido Recomendado


Doentes naïve Só alguns doentes sem tratamento prévio Dose inicial de 24/26 mg BID e titulação lenta
de ACEi/ARB com ACEi/ARB foram incluídos nos estudos da dose (cada 3-4 semanas)
Segurança e tolerabilidade similares nestes
doentes
Doentes com Experiência clínica limitada (só 0,7% Precaução no início do tratamento dos doentes
classe IV da no PARADIGM-HF) com classe IV da NYHA
NYHA (e Sem dados robustos nos doentes hospitalizados Ter em conta os critérios de inclusão e exclusão
outras e nos doentes com IC no contexto do enfarte do PARADIGM-HF, tendo em conta que os critérios
populações) do miocárdio dos biomarcadores não fazem parte da
informação de prescrição da EMA (ou da FDA)
Duplo bloqueio Risco de angioedema na associação com ACEi Contraindicada a associação com ACEI
do RAAS Efeito desconhecido combinado com aliscireno Iniciar > 36 h após a última dose de ACEI (ou de
Complexo supramolecular do NEPI e valsartan sacubitril/valsartan); pode ser desejável um
washout mais longo porque ACEi podem ter uma
duração de ação prolongada
Não recomendado com inibidores diretos da
renina e contraindicado em doentes com diabetes
mellitus ou com compromisso renal
Não deve ser coadministrado com outro ARB
Hipotensão Evento adverso mais comum nos estudos clínicos, Não iniciar o tratamento com PAS < 100 mm Hg
sem diferença significativa como causa e monitorização da PA no início do tratamento
de interrupção do tratamento (ou durante o ajuste da dose)
Hipotensão sintomática, especialmente Se ocorrer hipotensão, é justificável a redução
em doentes ≥ 65 anos, com doença renal temporária ou descontinuação do tratamento e o
ou com PAS < 112 mm Hg ajuste posológico de diuréticos e de outros
anti-hipertensores e o tratamento de outras
causas de hipotensão
Depleção de volume e/ou de sódio deve ser
corrigida antes do início do tratamento
(ponderada com o risco potencial de sobrecarga
de volume)
Alterações do Pode haver um risco aumentado de hipercaliemia Não iniciar com K+ > 5,4 mmol/l
K+ : hipercali- Também pode ocorrer hipocaliemia Recomendável a monitorização do K+ ,
emia especialmente nos doentes com fatores de risco
(e.g. compromisso renal, diabetes mellitus,
hipoaldosteronismo ou dieta rica em K+ )
Uso concomitante de fármacos poupadores de K+
aumenta o risco de hipercaliemia
A␤: amiloide beta; ACEi: inibidor da enzima de conversão da angiotensina; AINE: anti-inflamatório não esteroide; ALT: alanina amino-
transferase; AST: aspartato de aminotransferase; ARB: antagonista do recetor da angiotensina II; BID: duas tomas diárias; K+ : potássio
sérico; LSN: limite superior do normal; IC-FEP: insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada; NEP: neprilisina; NEPI: inibidor
da neprilisina; PAS: pressão arterial sistólica; PD: farmacodinâmica; PK: farmacocinética; TFGe: taxa de filtração glomerular estimada.
* A enzima conversora da angiotensina (ACE) também degrada os péptidos ␤ amiloides, pelo que a ACEi pode também --- teoricamente

--- favorecer a acumulação da A␤23 .

Apesar do PARAMOUNT não estar dimensionado para esti- Perfil de segurança (tolerabilidade e efeitos
mar objetivos clínicos, perspetivou potenciais mercês do adversos) e posologia do sacubitril/valsartan
sacubitril/valsartan na IC-FEP, que estudos futuros pode-
rão ou não afirmar. Nesse sentido, foi desenhado o estudo As reações adversas mais frequentes (hipotensão, hiper-
Prospective Comparison of ARNI With ARB Global Outco- caliemia e compromisso renal) foram já referidas e estão
mes in Heart Failure With Preserved Ejection Fraction largamente documentadas23,24,26---28,35 . No entanto, alguns
(PARAGON-HF), com o objetivo de avaliar o efeito de sacu- aspetos merecem ser referidos e pensados42,47 e são a
bitril/valsartan comparativamente ao valsartan na redução base do plano de gestão de risco aprovado pela EMA34,48
de morte CV e hospitalização por IC em doentes com IC-FEP (Tabela 5).
(NCT0192071146 ). A recolha de dados teve início em julho A dose inicial habitual recomendada de sacubi-
de 2014 e está prevista terminar em maio de 2019. tril/valsartan é de 49/51 mg BID. A dose deve ser duplicada
Sacubitril/valsartan: um importante avanço no puzzle terapêutico da insuficiência cardíaca 665

Tabela 6 Indicações aprovadas e advogadas nas recomendações científicas para o uso do sacubitril/valsartan no tratamento
da IC-FER
Organismo Indicação Referência
European Medicines Agency (EMA) (. . .) indicado em doentes adultos para o tratamento da (28 )
insuficiência cardíaca crónica sintomática com fração
de ejeção reduzida
U S Food and Drug Administration (FDA) (. . .) indicado na redução do risco de morte cardiovascular (53 )
e hospitalização por insuficiência cardíaca em doentes
com insuficiência cardíaca crónica (NYHA classe II-IV) e fração
de ejeção reduzida
(. . .) normalmente administrado em conjunção com outros
tratamento da insuficiência cardíaca, substituindo um ACEi
ou outro ARB
The National Institute for Healt (. . .) recomendado como opção no tratamento da IC-FER (54 )
h and Care Excellence (NICE) sintomática, só em doentes:
• com classe II - IV NYHA e
• com FEVE ≤ 35% e
• que já estão com dose estável de ACEi ou ARB
(. . .) encetado por um especialista em IC, integrado numa
equipa multidisciplinar, que deve realizar a titulação da dose
e a sua monitorização
2016 European Society of Cardiology (. . .) recomendado em substituição de um ACEi para maior (3 )
(ESC, com Heart Failure Association redução do risco de hospitalização por IC e de morte em
(HFA) da ESC doentes com IC-FER em ambulatório, que permanecem
sintomáticos apesar do tratamento otimizado
com ACEi, bloqueador beta-adrenérgico e MRA (nível de
evidência: I-B)
2016 American College of Cardiology A estratégia clínica de inibição do RAAS com ACEi (nível de (8 )
(ACC)/American Heart Association evidência: A) ou ARB (nível de evidência: A) ou ARNi (nível
(AHA) Task Force on Clinical Practice de evidência: B-R), em conjunto com ␤-B e antagonistas da
Guidelines and the Heart Failure aldosterona, em doentes selecionados, é recomendado
Society of America (HFSA) nos doentes IC-FER crónica na redução da morbilidade
e da mortalidade --- classe de recomendação 1
Nos doentes com IC-FER crónica sintomática classe II ou III
NYHA, que toleram um ACEi/ARB, a substituição pelo ARNi é
recomendado para maior redução da morbilidade
e da mortalidade --- classe de recomendação 1
2014-16 Canadian Cardiovascular Society (. . .) nos doentes com IC ligeira a moderada, FEVE < 40%, NP (9,55 )
elevados ou hospitalização por IC nos últimos 12 meses,
K+ < 5,2 mmol/l e TFG 30 ml/min, tratados com doses
adequadas otimizada, devem ser tratados com
sacubitril/valsartan em vez de ACEi/ARB (. . .) (recomendação
condicional; evidência alta)
Depois da titulação da terapêutica tripla na IC com FEVE < 40%,
a presença de níveis aumentados de NP pode levar à mudança
do ACEi (ou ARB) terapia para sacubitril/valsartan
ACEi: inibidor da enzima de conversão da angiotensina; ARB: antagonista do recetor da angiotensina II; ARNi: antagonista do recetor da
angiotensina-inibidor da neprilisina; ␤-B: bloqueadores beta-adrenérgicos; FEVE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo; K+:potássio
sérico; IC-FER: insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida; NP: péptidos natriuréticos; NYHA: New York Heart Association;
TFG: taxa de filtração glomerular.

cada 2-4 semanas até se atingir à dose alvo de 97/103 mg O tratamento com sacubitril/valsartan não deve ser ence-
BID, de acordo com o tolerado34,50 . Nos doentes com tado nos doentes com um potássio sérico > 5,4 mmol/l ou
PAS ≤ 95 mm Hg, hipotensão sintomática, hipercaliemia com uma pressão arterial sistólica (PAS) < 100 mm Hg (Tabela
ou disfunção renal, é desejável o ajuste posológico da 5). Da mesma forma, o tratamento não deve ser coadminis-
medicação concomitante, a redução temporária da dose trado com um ACEi ou ARB e também só deve ser começado,
ou mesmo a eventual descontinuação do tratamento (nos pelo menos, 36 h após a paragem do ACEi (devido ao risco
doentes com PAS ≥ 100-110 mm Hg e, em alguns casos, potencial de angioedema, que não deve ser desvalorizado,
nos idosos é útil ponderar a dose inicial de 24/26 mg, BID). disfunção renal e hipercaliemia)52 .
666 P. Marques da Silva, C. Aguiar

Sacubitril/valsartan no puzzle terapêutico atual: Bibliografia


conclusão
1. Direcção-Geral da Saúde. Portugal --- Doenças cérebro-
-cardiovasculares em números --- 2015. Direcção-Geral da Saúde,
A evidência clínica sustenta as indicações aprovadas, pelos Direção de Serviços de Informação e Análise, fevereiro de 2016.
organismos tutelares28,34,53---55 , para o sacubitril/valsartan. 2. Mills J, Vardeny O. The role of neprilysin inhibitors in cardiovas-
Parece, no entanto, limitativa a afirmação categórica dos cular disease. Curr Heart Fail Rep. 2015;12:389---94.
critérios de inclusão e de exclusão aplicados no PARADIGM- 3. Ponikowski P, Voors AA, Anker SD, et al. 2016 ESC Guidelines for
-HF na decisão terapêutica. O sacubitril/valsartan é um the diagnosis and treatment of acute and chronic heart failure:
medicamento inovador que alarga e abona o princípio The Task Force for the diagnosis and treatment of acute and
da modulação farmacológica neuro-hormonal na IC e que chronic heart failure of the European Society of Cardiology (ESC)
Developed with the special contribution of the Heart Failure
vem preencher uma lacuna, com valor acrescentado, da
Association (HFA) of the ESC. Eur Heart J. 2016;37:2129---200.
melhor terapêutica disponível na IC-FER crónica sintomá- 4. Ceia F, Fonseca C, Mota T, et al. EPICA Investigators Preva-
tica (na certeza que se devem manter as outras classes lence of chronic heart failure in Southwestern Europe: the EPICA
farmacológicas [␤-B, MRA, ivabradina e digoxina] e dispo- study. Eur J Heart Fail. 2002;4:531---9.
sitivos [CDI, TRC], conforme apropriado, de acordo com as 5. Fonseca C, Ceia F, Brito D, et al. How patients with heart failure
recomendações científicas)3,7---9 . Na Tabela 6 sumariamos as are managed in Portugal. Eur J Heart Fail. 2002;4:563---6.
indicações aprovadas e as diretrizes internacionais para o 6. Braunwald E. Heart failure. JACC Heart Fail. 2013;1:1---20.
uso de sacubitril/valsartan no tratamento da IC-FER. 7. Yancy CW, Jessup M, Bozkurt B, et al. American College of Car-
A morbilidade e mortalidade associadas à IC-FER --- mesmo diology Foundation; American Heart Association Task Force on
em doentes discretamente sintomáticos e com terapêutica Practice Guidelines 2013 ACCF/AHA guideline for the mana-
gement of heart failure: a report of the American College of
médica adequada e estabilizada --- permanecem elevadas.
Cardiology Foundation/American Heart Association Task Force
A taxa de sobrevivência aos cinco anos por IC é maior do on Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol. 2013;62:e147---239.
que a registada com muitos dos cancros e os custos anu- 8. Yancy CW, Jessup M, Bozkurt B, et al. 2016 ACC/AHA/HFSA Focu-
ais, económicos, sociais e humanos, muito elevados. Há, sed Update on New Pharmacological Therapy for Heart Failure:
assim, um imperativo ético de alterar esta situação, tanto a An Update of the 2013 ACCF/AHA Guideline for the Management
nível da prevenção primária como da secundária (e terciá- of Heart Failure: A Report of the American College of Cardio-
ria). Recentemente, o Programa Nacional para as Doenças logy/American Heart Association Task Force on Clinical Practice
Cérebro Cardiovasculares, em parceria com a Fundação Guidelines and the Heart Failure Society of America. J Am Coll
para a Ciência e a Tecnologia, anunciou o seu apoio à pri- Cardiol. 2016, pii: S0735-1097(16)33024-8.
meira Joint Transnational Call (JTC2016) do projeto europeu 9. Howlett JG, Chan M, Ezekowitz JA, et al. Canadian Cardio-
vascular Society Heart Failure Guidelines Panels The Canadian
ERA-CVD: ERA-Net on Cardiovascular Diseases que versará,
Cardiovascular Society Heart Failure Companion: Bridging Gui-
entre outros, o reconhecimento precoce e prognóstico da IC delines to Your Practice. Can J Cardiol. 2016;32:296---310.
e as abordagens inovadoras de prevenção e tratamento (e 10. Braunwald E. The path to an angiotensin receptor antagonist-
de reversão ao processo de remodelação cardíaca)56 . Eis um -neprilysin inhibitor in the treatment of heart failure. J Am Coll
bom momento para refletirmos e inscrevermos na nossa prá- Cardiol. 2015;65:1029---41.
tica clínica os resultados do PARADIGM-HF. A maior subtileza 11. Braunwald E. Academic-industrial collaboration in the deve-
e celeridade na adoção do sacubitril/valsartan no armamen- lopment of the first angiotensin receptor blocker: neprilysin
tário terapêutico da IC-FER (e, no futuro, talvez da IC-FEP) inhibitor in the treatment of heart failure. Eur Heart J.
dependem, naturalmente, de fatores muito diversos --- que 2016;37:745---6.
passam também por análises de custo efetividade justas e 12. Prenner SB, Shah SJ, Yancy CW. Role of Angiotensin
Receptor-Neprilysin Inhibition in Heart Failure. Curr Atheroscler
fundadas. Este artigo de revisão é só um pequeno contributo.
Rep. 2016;18:48.
13. Bayes-Genis A, Morant-Talamante N, Lupón J. Neprilysin and
natriuretic peptide regulation in heart failure. Curr Heart Fail
Contribuições Rep. 2016;13:151---7.
14. Hsiao R, Greenberg B. Neprilysin inhibition as a PARADIGM shift
Após a aprovação do projeto do artigo, proposto por PMS, in heart failure therapy. Curr Heart Fail Rep. 2016;13:172---80.
os autores participaram, igualmente, no desenvolvimento, 15. Rossi F, Mascolo A, Mollace V. The pathophysiological role of
redação e aceitação do manuscrito final para publicação. natriuretic peptide - RAAS cross talk in heart failure. Int J Car-
diol. 2016;S0167---5273:30502---12.
16. Volpe M, Carnovali M, Mastromarino V. The natriuretic peptides
system in the pathophysiology of heart failure: from molecular
Conflito de interesses basis to treatment. Clin Sci (Lond). 2016;130:57---77.
17. Mangiafico S, Costello-Boerrigter LC, Andersen IA, et al. Neutral
Os autores declaram não haver conflito de interesses. endopeptidase inhibition and the natriuretic peptide system:
an evolving strategy in cardiovascular therapeutics. Eur Heart
J. 2013;34:886---93.
18. Ansara AJ, Kolanczyk DM, Koehler JM. Neprilysin inhibition with
Agradecimentos sacubitril/valsartan in the treatment of heart failure: mortality
bang for your buck. J Clin Pharm Ther. 2016;41:119---27.
Os autores agradecem a colaboração do Departamento 19. Bayés-Genís A, Barallat J, Galán A, et al. Soluble neprily-
Médico da Novartis Farma --- Produtos Farmacêuticos S.A, sin is predictive of cardiovascular death and heart failure
na pessoa do Dr. Daniel Brás, no apoio a toda a pesquisa hospitalization in heart failure patients. J Am Coll Cardiol.
bibliográfica necessária. 2015;65:657---65.
Sacubitril/valsartan: um importante avanço no puzzle terapêutico da insuficiência cardíaca 667

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