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Niklas Luhmann
Legitimação 'pelo
Procedimento

1\ questão básica deste livro de Niklas Luhmann consis-


11)um suher em que sentido a estrutura "direito" pode
01 chamada de legítima. O tratamento que ele dá à
qIlO$ljI() do legitimid~de está no terr±~ p~r~mente fa~-
Itwl. ( onsidera legítima uma estrutu (a jurídica na medi-
dCI 1)11' que esta é capaz de produzir uma prontidão ge-
I~
flolclli7ild" pura a aceitação das suas decisões, ainda in-
(It)lOllllll1dda<; quanto ao seu conteúdo concreto, dentro
do 1'011.1margem de tolerância. Ouêrn apenas abstrai
(ln[l orltórlos do seleção e não encara o seu fracasso co-

dfll1l:lf1 fi 1m este livro como teoria de um processo de


o dor ríocor rendo num processo jurídico, e se in-
,
I,
condená 10. Mas não constitui o objetivo deste
r

ol1OCllndosGomo sistemas sociais que estão sincro-


I)
1I.~
III1ll(lo6 C:OIllos processos de decisão, mas que não se
ídllnlillC}UIlI com estes. O livro não trata de legitimar a
inlllitlllilfio do procosso legal através da justificação de
r ruta. isto sim, da revelação do problema
ação resolvia, e isto é facilmente omitido
;"'I.CIIIIIIl 342.36 L9511.Pc
o Identifica com os problemas que se pro-
Autor: L!..JIIMI\NN, Nikla .•.
Título: Lcgitimtl~·~opelo
011. tUtlllHH111é professor de sociologia na Universida-
jl) BiuliJld (I~FA). Escreveu, entre outros livros, So
11oIIlIfkllim,,(]. Mucht e, traduzido para o por 11111111111111111111111111\ 1111111111111111111 111\
-e-' eu) ::3f./.2 ...:6
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Niklas Luhmann
Legitimação pelo
Procedimento
Pensamento
Político

BE:! Edilom: Universidade de Bmsrlia


Este livro ou parte dele
não pode ser reproduzido sob nenhuma forma,
por mimeógrafo ou outro meio qualquer i
sem autorização por escrito do Editor

Impresso no Brasil

Editora Universidade de Brasília


Campus Universitário - Asa Norte
70910 Brasília - Distrito Federal

Legitimation durch Verfahren, de Niklas Luhmann


Copyright © 1969 by Hermann Luchterhand Verlag, Darmstadt e Neuwied.
BEJ
CONSELHO DIRETOR
DA FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
Tradução:
Maria da Conceição Côrte-Real Abílio Machado Filho
Amadeu Cury
Aristides Azevedo Pacheco Leão
Isaac Kerstenetzky
José Carlos de Almeida Azevedo
José Carlos Vieira de Figueiredo
José Ephim Mindlin
Revisão: • José Vieira de Vasconcellos
Tércio Sampaio Ferraz Jr.
Reitor: José Carlos de Almcid a Azevedo
Capa: Vice-Reitor: Luiz Otávio Morais de Sousa Carmo
Arnaldo Machado de Camargo Filho

EDITORA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA


CONSELHO EDITORIAL

Afonso Arinos de Mello Franco


Arnaldo Machado Camargo Filho
~ Cândido Mendes de Almeida
Geraldo Severo de Souza Ávila
José Francisco Paes Landim
Luhmann, Niklas. Octaciano Nogueira
L951L Legitimação pelo procedimento, Trad. de Maria da Orlando Luiz de Souza Fragoso Costa
Conceição Côrte- Real. Brasília, Editora Universidade de
Brasília, 1980.
Tércio Sampaio Ferraz Júnior
210 p. (Coleção Pensamento Político, 15) Vamireh Chacon de Albuquerque Nascimento
Vicenu- de Paulo Barreto
Título original: Legitimation durch Verfahren.
Presidente: Carlos Henrique Cardim
1. Governo - Formas distintas - Direito constitucio-
nal 2. Legitimidade - Formas de gover[lo.
I. Título lI. Série. ..\

CDU - 342.3
"
SUMÁRIO

Apresentação 1
Prefácio 7
Prefácio à nova edição 9

PARTE I - FUNDAMENTOS 15

Capítulo A Concepção clássica do procedimento legal 17


Capítulo
Capítulo
11
III
Legitimidade
O Procedimento como sistema social
®
37

PARTE 11 - PROCESSOS JUDICIAIS 49

- Capítulo I Diferenciação 53
-Capítulo 11 Autonomia 61
Capítulo III Sistema de contato 65
Capítulo IV Adoção de papéis 71
Capítulo V Representações e desencargos 79
Capítulo VI Conflito permitido 85
Capítulo VII Limites da capacidade de aprendizagem 91 I

Capítulo VIII Representação para os que não participam 103


Capítulo IX Estrutura do programa e responsabilidade 09
PARTE III - ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO 115

Capítulo I Positivação do direito 119


Capítulo 11 Democratização da política 127
.Capítulo III Eleição Política 131
Capítulo IV Legislação 145

PARTE IV - PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINIS-


TRAÇÃO 163

PARTE V - CONSEQÜÊNCIAS E PROJEÇÕES 177

Capítulo I Variáveis instrumentos e expressivas 181


Capítulo 11 Estruturas e frustrações 189
apítulo JII Diferenciação funcional 195
c';lpfllllo IV SI'P:' 1.IÇoIC) dos siSI ernas soei .•is (' pesson is 1 <)1
APRESENTAÇÃO

NIKLAS LUHMANN é, indubitavelmente, um dos mais interessantes autores


que vêm se ocupando da sociologia do direito nos últimos quinze anos. Em con-
fronto com a produção mais difundida, tanto na Europa quanto nos Estados
Unidos. seu enfoque empírico do fenômeno jurídico se distingue dos demais ao
menos por três razões básicas. Em primeiro lugar, porque afronta de modo ex-
plícito a questão teórica da definição do direito, elaborada já ~ente VOlume e
aperfeiçoada em trabalhos posteriores. Em segundo lugar, porque propõe uma
análise dos problemas precípuos da sociologia do direito a partir de uma perspec-
tiva unitária e bastante original. Em terceiro, porque amplia esta perspectiva não
só dentro de uma concepção global da teoria sociológica mas também de um án-
guio epistemológico e até de uma filosofia geral.

Luhmann concebe a sociedade como um sistema estruturado de ações sig-


nificativamente relacionadas que não inclui, mas exclui do sistema social o homem
concreto que passa, analiticamente, a fazer parte do seu mundo circundante. Ou
.l."eja, a conexão de sentido que liga as ações do sistema social não coincide com a
conexão de sentido das ações do ser humano concreto. Homem concreto e socie-
dade são um para o outro, mundo circundante, sendo, um para o outro, complexo
e contingente. O homem é para a sociedade e esta para aquele um problema a
resolver. Apesar disso, ambos são de tal modo estruturados que possam coexistir.
N a verdade, 9 homem concreto precisa da sociedade para viver, embora isto não
queira dizer que ele faça parte dela. Segue-se daí que a juridicidade das relações
inter-humanas não é dedutível da natureza humana. O direito é visto, então, como
uma estrutura que define os limites e as interações da sociedade. Como estrutura,
ele é indispensável, por possibilitar uma estabilização de expectativas nas intera-
ções. Ele funciona como um mecanismo que neutraliza a contingência das ações in-
dividuais, permitindo que cada ser humano possa esperar, com um mínimo de
garantia, o comportamento do outro evice-versa.

Para se ter uma idéia de como funciona esta concepção de Luhmann, po-
demos imaginar uma situação entre dois indivíduos que trocam entre si, por exem-
plo, tijolos por madeira. Não é impossível prever-se que esta troca pudesse ser
1'(',lIi/a<la s('m qUI' () dilt'ilO lida interviesse como estrutura. Quando, porém, co-
1IH'1,;llIlOk;J 1)(,1l~al 11,1' 10111111).\('111 i.ls '1111' podl'l iam ti fl'w I' as expccuuivas rcctprocas
1I0H II(hildtlll'~, VI'IIII1I1~ q"l 11,\ 11111.1 ~Í'lil'lk I.IIOI(·~ q\ll' IOlllplil.11Il1I ~il\l.I~.I() nd
2 LEGITIMAÇÃO PELO PROCEDIMENTO
APRESENTAÇÃO 3

infinitum, Para que haja um mínimo de garantia, é preciso que as partes possam
Normas, instituições e núcleos significativos não são mecanismos congruentes
ter uma relativa certeza de que o combinado agora prevalecerá no futuro. Não só
entre si. Nem sempre normas são adequadas a instituições e estas a valores ou pes-
pela mutabilidade das opiniões e desejos, mas também das contingências biofísicas
soas e assim reciprocamente. Por isso Luhmann entende, afinal, que o direito é
(alguém pode morrer antes de completada a transação), o negócio está sujeito a
uma generalização congruente e dinâmica entre eles, possibilitando, socialmente,
variações imprevisíveis no tempo. Contra esta contingência temporal que afeta as
uma imunização simbólica de certas expectativas contra os fatos, em termos de se
expectativas recíprocas, é o estabelecimento de normas que irá dar a elas a garantia
poder atuar de modo indiferente ao que realmente acontece ou venha a acontecer
requerida. Normas, segundo Luhmann, garantem as expectativas (mas não o com- - indiferença controlada (Luhmann, Rechtssoziologie , Reinbeck bei Hamburg,
jortamento correspondente) contra desilusões. Assim, estabelecido por via con- 1972, vol. I, pago 94).
tratual que o negócio será realizado dentro de 30 dias, respondendo a parte ina-
dimplente pelos prejuízos etc., fica garantida a expectativa de cada um contra o
Note-se que, neste esboço de concepção do direito que resumimos para o
comportamento desiludidor do outro. As normas não podem evitar as desilusões
leitor, estão pressupostas algumas categorias teóricas fundamentais. A primeira
(por exemplo, que os tijolos não sejam entregues), mas garantem a expectativa,
delas -é a complexidade, Para entendê-Ia é preciso explicar duas outras, a de sis-
permitindo que, apesar dos fatos contrários ao que se esperava, a parte prejudicada
lema e a de mundo circundante. Isto porque, lembremos, a sociedade é um sistema
mantenha, sob protesto, o seu ponto de vista. Normas, nestes termos, são expec-
e o homem concreto faz parte do seu mundo circundante.
tativas de comportamento, garantidas de modo contrafático. Normas dão às ex-
pectativas duração.
Pois bem, sistema é para Luhmann um conjunto de elementos delimitados
segundo o princípio da diferenciação. Os elementos, ligados uns aos outros, ex-
Mesmo com a celebração de um contrato no sentido de norma entre as partes, cluem outros elementos do seu convívio, formam em relação a estes, um conju~to
novas contingências poderiam ser previstas. Uma delas seria a interposição de outra diferenciado. Todo sistema pressupõe, portanto, um mundo circundante com o
norma, de fora, que provocasse uma reviravolta na expectativa garantida. Qual qual se limita. O mundo é, por hipótese o que não pertence ao sistema. Ora, se o
delas prevalece, em caso de dúvida? Aqui entra um segundo mecanismo de controle sistema é um conjunto estruturado, o mundo é, em relação a ele, complexidade, is-
das contingências e que se refere à possibilidade de garantir uma expectativa nor- to é, um conjunto aberto e infinito de possibilidades. Ou seja, todo sistema é uma
mativa contra a outra. Para obtê-Ia, temos que supor que os outros, aqueles que redução seletiva de possibilidades em comparação com as possibilidades infinitas do
não participam do negócio, apóiam isto ou aquilo. Segundo Luhmann, os mecanis- mundo circundante. Como as possibilidades selecionadas do sistema podem ou não
mos sociais que permitem esta suposição, isto é, que permitem imputar a terceiros ocorrer, diz-se que o sistema é sempre contingente. Aquilo que garante o sistema
um consenso suposto que garante o sucesso provável de uma expectativa normativa contra a contingência das possibilidades escolhidas é a estrutura do sistema. Nestes
contra as demais chamam-se instituições. E o processo referido de suposição se t~rmos: a sociedade é um sistema de interações sempre ameaçado pela contingên-
chama institucionalizaçâo . Assim, por exemplo, o contrato é uma dessas insti- cia; a sociedade escolhe interações baseadas, por exemplo, na reciprocidade, mas o
tuições que, no caso, garantiria o estabelecido entre as partes por acordo mútuo indivíduo concreto, que faz parte do mundo circundante, introduz na sociedade a
contra uma outra norma que uma das partes quisesse impor unilateralmente. A contingência do seu arbítrio. Aí aparece o direito como uma das estruturas sociais
idéia de que o acordo é superior ao imposto unilateralmente, nos negócios priva- que garantem as expectativas sociais contra a contingência a que estão sujeitas
dos, é uma instituição, isto é, conta com o consenso presumido de terceiros. Em iReclussoaologie, ci t. I - 31).
suma, através da institucionalização conferimos às expectativas o consenso de teL-
ceiros, ainda que, de fato, alguns não estejam de acordo. A questão básica do presente volume, que ora se apresenta ao leitor, se re-
sume, assim, em saber-se em que sentido se pode chamar esta estrutura - o direi-
to - de legítima.
No que diz respeito ao conteúdo das expectativas em jogo, pode haver, por úl-
timo, um terceiro tipo de contingência. Que nos garante que os tijolos, objeto da
troca, sejam, na intenção de ambas as partes, a mesma coisa? De qualidade su- O tratamento que dá Luhmann ao problema da legitimidade se põe no ter-
perior ou inferior, na hora de se concretizar a troca, tijolos e madeira podem reno puramente fático. Uma estrutura jurídica é para ele legítima na medida em
desiludir as expectativas quanto ao seu conteúdo. Para enfrentar esta terceira con- que é capaz de produzir uma prontidão generalizada para aceitação de suas deci-
tingência Luhmann se refere aos núcleos significativos, isto é, centros doadores de sões, ainda indeterminadas quanto ao seu conteúdo concreto, dentro de certa mar-
sentido dotados de garantia relativa. Por exemplo, o dono dos tijolos confia pes- gem de tolerância.
soalmente no dono da madeira. A pessoa funciona como centro doador de sentido
à troca a ser realizada em termos do conteúdo daquilo que se espera. Ou se confia A posição de Luhmann se insere, até certo ponto dentre as chamadas concep-
no dono da madeira que é um comerciante respeitado, caso em que o núcleo sig- ções decisionistas da legitimidade. Normas jurídicas concebidas como decisões só
nificativo é o papel social exercido. Ou, caso nem pessoa nem papel sejam co- podem ser fundadas em outras decisões, havendo, então, uma decisão última que
nhecidos. se confia na eqüidade ou na justiça que devem prevalecer, caso em que estabelece inapelavelmente a legitimidade da série. Como as decisões normativas
o núcleo significativo é um valor. Os núcleos são mais ou menos abstratos, portanto são proposições deóru icas , dI' deverse, a elas niio cabe a ahcrnauva V<'ldad('ilo(lal
mais ou menos confiáveis. Quanto mais abstrato, mais extenso é o âmbito de sua 50. Com isso, a possihilidadr d(' ,(' IlIlId.1I li I('/olililllid.ldt' em v.dol(·' \lIp"'lIlm I~
atu acuo , m('!1OS confiável é concretamente e vice-versa. rcchacad a blO plll qUI, 11,1 "111 11411""",1 tI,l\ dl'l "'11"', 'oI'IIlJlII' Itll',1I1It1~ rtllll 11111
4 LEGITIMAÇÃO PELO PROCEDIMENTO
APRESENTAÇÃO 5

pturarismo de valores que não se fundam em verdade. mas são. ao contrário. atos
de crença. adrnit idos como fatos. Em conclusão: para Luhmann, sendo a função de uma decisão absorver e
I('duzir insegurança, basta que se contorne a incerteza de qual decisão ocorrerá
Luhmann. contudo, é um dccisionist a mais arguto. Sem eliminar o caráter prla ccrt cz a de que uma decisão ocorrerá. para legitimá-Ia. Em certo sentido.
dccisório da legitimidade, ele evita o problema do regresso a uma decisão última. Luhrn a nn concebe a li-git irnid adc como uma ilusão funcionalmente necessária, pois
no início da série, mostrando que a legitimidade não está ali. mas no próprio se baseia na ficção de que existe a possibilidade de decepção rebelde, só que esta
processo que vai do ponto inicial do procedimento de tomada de decisão até a não é. de fato, realizada. O direito se legitima na medida em que os seus proce-
própria decisão tomada. É. assim, o procedimento mesmo que confere legitimidade dirnenros garantem est a ilusão.
e não uma de suas partes componentes.
'Tércio Sampaio Ferraz ]r .
Procedimentos sào para ele sistemas de ação, através dos quais os endereçados
das decisões aprendem a aceitar uma decisão que vai ocorrer, antes da sua ocorrên-
cia concreta. Trata-se de sistemas no sentido acima mencionado, pelos quais os
diferentes motivos a que alguém possa sentir-se obrigado ou não a aceitar decisões
são reduzidos e especificados num limite de alta probabilidade, de tal modo que o
endereçado da decisão se vê na contingência de assumi-Ia, sem contestá-Ia, ainda
que lhe seja, no caso, desfavorável.

Lu hm ann analisa, basicamente, três procedimentos jurídicos: o judiciário, o


legisl at ivo e () administrativo. Nenhum deles é entendido no sentido usual do di-
I('il() processual, mas com o significado amplo de sistema ernpirico de ações sociais,
ont Iolados por regras jurídicas, mas também por componentes extra -jurídicos.

No procedimento judiciário, a confrontação direta entre os contendores. ob-


serva Luhmann, éreduzida e cnfraquccida , Isto é obtido pela criação de lealdades
(r-nt re juizes. promotores, advogados e mesmo entre as partes) que se cruzam c não
deixam ver quem é realmente contra e a favor: em tese, todos buscam uma decisão.
Na verdade, o estabelecimento de instâncias de decisão retira e confere a posição
de oposit or para outras pessoas, criando-se condições para que os oponentes não
clecidam por si próprios, mas através dos papéis que vão assumindo no correr do
procedimento: papel de parte processual decorrente, de autos e réu etc . A impor-
l;tll( ia disto está em que o efeito obtido {: o de limitar o conflito, impedindo-se a
sua gcnerulizacâo. Assim. a maior discrepância entre os contendores, no início do
processo, é controlada aos poucos, criando-se condições para a aceitação de uma
decisão final. Note-se, porém, que a função legitimadora do procedimento n10 está
em se produzir consenso entre as partes, mas em tornar inevitáveis e prováveis
decepções em decepções difusas: apesar de descontentes, as partes aceitam a de-
I isao. Uni comportamento contrário é possível, mas a parte que teima em manter
HI,\ cxpcct at iva decepcionada acaba pagando um preço muito alto, o que a força a
«(·(ler. Ncsu- sentido, a função legitimadora do procedimento não está em substituir
1I111i1d('('('pçáo por um reconhecimento. mas em im u nizar a decisão final contra as
<11'(('P~()('S im-vit âvc is .

I':~L\ 11'11111.1di' 1II'lIll,r1inll as decepções é a mesma no caso das decisões 1('-


1~1.,li\';,~ \' .IIIIIIIIII,II.IIIV", () IIIH' muda (: o sistema de procedimento. No caso do
Iq\\~Ii'II\l1 11,111\M' d, 1I"IIIIIIII'IJtm 1I1.t('l() sociológicos, como a eleição', as disê"i:iS-
lIf ~ 1'1111.11111 1I1\1'_'~'1"" \',~,I\II 11"1,11111'111(', a produzir o efeito de neutralização. No
r ,\\" '-'li .IIIIIlllllhllt".H" "1'"'" ,,,," ',1 1I'llI'tl'. r orn a diferença de que o decididor
,dlllilli~III'"I1' 1~'l\t"1I111\ IIII'II'~ 1',11,\ l1111L11,11." d('('i~()(.'s C01no se não houvesse
dl'l':I"IIIII(IIli', l'IIII'I"it,l •• hllll~ 1I'\lfll'/It'~ di pm ..ihdid.ld(' ao lcgislativo e ao ju-
til' iril t«,
PREFÁCIO

Ao pensamento liberal sobre direito, estado e sociedade, que se vai liberando


do tesouro da antiga tradição européia, pertence a hipótese de que procedimentos
legalmente organizados podem contribuir ou mesmo levar à legitimação de opções
obrigatórias do ponto de vista jurídico. Consciente ou inconscientemente, esta tese
foi concebida para substituir o antigo modelo europeu duma ordem hier'ár qnica de
fontes e matérias jurídicas. Parece deixar entrever mais sinceridade para o esta-
belecimento de normas, maior elasticidade e adaptabilidade do direito e um poten-
cial mais elevado para transformações estruturais da sociedade. Tal como a ca-
tegoria do contrato para o âmbito da "sociedade", assim a categoria do procedi-
mento para o âmbito do "estado" parece apresentar aquela fórmula mágica que
combina a mais alta medida de segurança e liberdade que se pode praticar con-
cretamente no dia-a-dia e que transmite, enquanto instituição, todas as resoluções
do futuro. Contrato e procedimento parecem, numa perspectiva evolucionária,
aquisições improváveis que permitem à época atual estabelecer-se sobre a varia-
bilidade e eliminar qualquer futuro possível.

Pode dizer-se que isto teria sido uma ideologia de revolucionários e capi-
talistas. Podem também apalpar-se as condições e grau de possibilidade de rea-
lização duma tal aquisição. Para isso poderia ter servido como exemplo a pergunta
de Durkheim quanto aos fundamentos não contratuais do contrato ~ o que nos
levaria ao problema espinhoso duma teoria geral da sociedade. Os estudos aqui
apresentados seguiram outra orientação. Aproveitam a circunstância de o conceito
de legitimação já ter sido definido há muito tempo, empiricamente, através de um
relacionamento à faticidade do opinar e procuram conseguir um segundo fun-
damento para o controle da tese liberal dentro duma teoria sociológica do pro-
cedimeruo , Procedimento deve ser aqui entendido como um sistema social de for-
ma específica, portanto como uma solidariedade de sentido da ação fática; e le-
gitimação deve ser entendida como a tomada de decisões obrigatórias dentro da
própria estrutura das decisões. Daí resultam possibilidades de nos aproximarmos da
tese liberal de uma verificação empírica com a ajuda de fundamentos teoréticos
das teorias do sistema e da aprendizagem.

A articulação abstrata duma das perguntas quanto ao fato do procedimento


poder ou não tornar legítimo, com certeza, dá origem, em primeiro lugar, a urna
chuva doutras perguntas e a poucas perspectivas de tornar todo o problema cien-
tificamente amadurecido pelo agravamento de poucas cxpcriêncius ('I ftiras, 1),1
que a prinr ip al finalidadl' (It-~ll' livro sl'jll «()IHili,11 lima idt"i,I, ,Iilld.l '111"plOVI
~ÚIia, d,l illlt'l d"IH'I\lklll 1,\ dI' r1iv,',,"~ 11111;1111111\
dI' pl()b"'III.I~ "111qll' hI • ","111.
H LEGITIMAÇÃO PELO PROCEDIMENTO

11111,\'(l( il'dtldl' que já não legitima o seu direito por meio de verdades invariáveis
I~I'\I'''\('~, mas sim apenas, ou principalmente, por meio de participação em
plllll·dillll'n\os. Pode-se comprovar neste resultado, caso se queira, frustrante, que
.1 IIHI\IIII.\~<i() pelo procedimento pode ser compreendida não como efeito de uma
1111,d,l\lIlIloI~ I ausas apur áveis , mas sim como um desempenho do sistema que de-
111'11111' dI' I'~II ut uras cheias de pressupostos e que, por isso, se determina de forma
11111110r umplr-x a e não sem alternativas. É isso justamente o que se quer dizer com o
( 11"( ('ito dum progresso evolucionariamente improvável.
PREFÁCIO À NOVA EDIÇÃO
() t 1.1ha lho nestas investigações só me foi possível graças ao Centro de Inves-
li",I~.11I SOl ial da Universidade de Münster, em Dortmund. Recebi conselhos e
.1)1111.1~(l"II,tudo dos senhores doutores: Dr. Klaus Kõnig , DI'. Werner Krawietz e
Este livro procura reconstruir para os modernos sistemas políticos as idéias
J li Riidigrr Lautmann, que examinaram, criticamente, o primeiro manuscrito e me
jurídicas centrais do processo legal com a ajuda de meios sociológicos e principal-
dI I .un varias sugestões para a versão final.
mente com meios da teoria dos sistemas. A tentativa foi indicada como um desafio
aos juristas (1) e como tal agiu provavelmente não só sobre eles. O debate anexo
Niklas Luhmann
mostrou que a interpretação que eu propus não satisfez claramente todas as expec-
Jí tativas que se não atinharn a conceitos tradicionais tais como legitimidade e proces-
Bielefeld, maio de 1969
so jurídico. Isto deve residir em que conceitos da teoria dos sistemas devem ser
freqüentemente estabelecidos duma forma especial e simultaneamente abstrata
perante conteúdos de significação determinada. Só assim se podem introduzir as
experiências a eles ligadas e as relações inter-disciplinares. O que é válido duma
forma especial para este caso. Nestas circunstâncias eu não gostaria .de deixar
publicar a segunda edição sem tornar claras perante os argumentos críticos, al-
gumas das opções abstratas deste livro. Reporto-me aqui a novas reflexões, sem
por isso revisar o texto do livro em direção a uma linguagem de conceitos mais lima
vez declaradarnente abstrata.

I - Uma série de objeções diz respeito ao conceito de legitimidade'. Os argumentos


contrários reduzem-se a recorrer aos conceitos convencionais que acabavam com a
convicção da verdade do conteúdo das decisões (2). A esta objeção pode emprestar-
se ênfase e plausibilidade através duma referência aos campos de concentração.
Naturalmente que uma pessoa não se pode colocar numa posição que legitime
também tais organizações ainda que apenas por equívoco. Mas este não é o pro-
blema que me parece importante em relação a uma modificação da compreensão
de legitimidade" Os teores das decisões possuem as suas próprias leis e os seus
pr9prios conceitos jurídicos. que se podem indicar co,? exatidão relativamente aos
valores básicos e às normas das ordenações jurídicas. E pura e simplesmente supér-
fluo ter ainda à disposição um outro conceito, °
da legitimidade, apenas para se
poder dizer que as decisões justas são legítimas e que as decisões injustas não são. °
Na discussão jurídica também se deveria apontar, em primeiro lugar, que
não pode ser racional para um indivíduo, por causa de vantagens coletivas com res-

1 -- Por Wolf Lepenies, em Frankfurter Allgemeinen Zeitung , de 5 de junho de ) 97ú.·


2 - Assim. por exemplo, Peter Graf Kielmansegg, em Legitirnitài ais analyrische Karegorie (Legiri-
rnidade como categoria analitica), Polirische Vierteljahresschrifr 1~ (Publicação política trimestral. 12)
(1971). págs 367 401: Reinhold Zippelius Legitimation durch Verfahrcnl (Legirimação pelo pnx csso
jurídico/) Festschrift Karl La renz (Homenagem a Karl Lareru) Munique. 1973. pág\ 29~ ~CH IMn
rico , mas com um conceito mais formal (k Ic/{itimidilck. l lans Ryffc], R('lhtSS'l/io\o/(it· Hn(' 'y~\('rn"m
che Ori ••mcring (Sn(ÍnloKil1 do lIil"1I0 11111,' ntil·n ••,~lio !i~It'IU:'1Í1.r), N,'uwlnl 111''',,", 1'1'11, ,,~,,~
1I2,2R!)
......,

lU LEGITIMAÇÃO PELO PROCEDIMENTO PREFÁCIO À NOVA EDIÇÃO 1I

""lto .1 valores geralmente reconhecidos, pôr para trás os seus próprios interesses ou 10, Assim Josef Esser (7'). Não constitui, realmente, o objetivo deste livro esque-
tlM) lorllal em consideração as desvantagens efetivas (3). Ainda que outros lucrem matizar o processo de opção do juiz. do legislador ou do eleitor politizado; isso
r urn ()~ pt iucípios, é racional, no caso particular, deixar compensar o prejuízo exigiria outras considerações (e que se aproximariam muito mais de Esser). O ob-
li) flpllO " opor-se até a que isso aconteça. O conceito convencional de legitimidade jetivo era apresentar uma perspectiva adicional. Os processos legais são encarados
""1"" ,,1.1, portanto, a partir daí, com uma. atitude irracional do ponto de vista in- como sistemas sociais que estão sincronizados com os processos de decisão, mas que
IIIVIIIIl,,t; nao se deixa vincular a uma teoria racional de argumentação. não se Ihes identificam. Nestes sistemas de inter ação fixar-se-ão apenas algumas, de
forma nenhuma todas, premissas de decisão: por exemplo, partindo daí, indicar-se-
A isso acresce que não se pode estabelecer empiricamente um consenso efetivo ão também premissas para o processo legal posterior dos interessados, que também
I~ I' ,tllllI'lll(' consciente sobre teores relevantes de decisão, o que na verdade é irn- desempenham uma função. Dum ponto de vista sociológico um processo jurídico
I" IIN.,Vd em situações extremamente complexas com regulamentos de flutuação não termina apenas com uma única decisão legal obrigatória. Também não se
),1I"d", 'I em então de se recorrer a mistificações como "consciência interior co- deixa racionalizar (8) só por esse motivo com respeito aos objetivos de alcançar
I, IIV,'" (1) ou imaginar um potencial de criação de consenso, que nunca poderá ser melhores decisões,
r huv.ulr). Tem de se encontrar uma solução para estes problemas, se não no
'IIIIItllo cla x omprccnsão convencional da legitimidade, então com a ajuda duma As próprias análises de Esser acentuam a transmissão de valorizações sociais e
"1111,I r ompi ccnsão . Eu proponho o seguinte: temporalizar o conceito de legiti- alterações de valorização no processo de decisão judicial: tornam evidente que, e
111111.,11,' 10m a ajuda do estudo e recuperar a certeza dependente do conteúdo daí como, o juiz, com a ajuda de figuras abstratas e métodos de argumentação, reab-
1I'~IlII''',II' pOI meio da diferenciação e reassociação duma pluralidade de processos. sorve as valorizações sociais e nessa medida elas se vinculam a um ponto de vista
I,,; III"~O IIl1'MtlO que eu vejo a força política da revolução burguesa. O meu interesse sociológico. Contudo permanecem incompletas como concepção da relação de siso
U'"~I~I" ,'1\1 tornar patente este resultado na sua formalidade, estrutura atual e tema social e sistema jurídico. Esta adequação social dum regulamento jurídico e
I IIllIpll'xidade institucional - numa época que se começa a tornar ingênua em até mesmo duma ordenação jurídica totalmente e ata, dependente da decisão em
qllnllWN pollticas e que começa a substituir as conquistas estruturais pelas boas in- circunstâncias de validade, não pode ser apenas cr.ticada de acordo com os pontos
II"IC.CII'N de vista que encontram consideração nos processos de decisão. Esta adequação não
constitui apenas um problema hermenêutico. O contexto dos papéis e a forma de
interação também têm de ser adaptados ao ambiente social do sistema jurídico.
(;I,II,"~ a li abalhos sobre uma teoria de meios de comunicação simbolicamente
Uma diferenciação nestes aspectos não só exime o processo de decisão de diversas
,tll/,ldos (5) também
«111'1 tomei, entretanto, consciência de que é indispensável
considerações, como principalmente lhe permite uma recepção dogmática e con-
d'"11I11-\11I1a~ formas de atuação desses meios de comunicação, entre elas verdade e
trolada de valorizações sociais num sistema jurídico, que tem de satisfazer preteri-
PlldC'I, ,li- tais critérios de seleção. Os meios traduzem funções contingentes de
sões maiores de consistência. Assim, a forma de interação do processo legal desem-
1 IC'~'IO, A sua forma de atuação nunca está completamente respaldada pelos
penha não só a função de filtrar pontos de vista práticos de decisão, como ainda
I lllh IOS dI' seleção nem sequer no caso da verdade (6). Esta distinção é essencial se
ajuda diretamente à modificação da repressão do conflito, do enfraquecimento e
11,1•• pOI IlIZ(ÍCS de lógica, então pelo menos por razões relacionadas com o tempo:
desmoralização dos participantes, da alteração e neutralização dos seus motivos no
";10 NC' podr-m manter em suspenso os resultados da comunicação e as versões da
decurso da história, e na exposição e comprometimento com ela, por meio da
,11'1,,11).11(' quc se desenvolvam e sejam aplicados critérios. Com isso não se exclui,
eliminação de alternativas. Só quando esta possilidade está institucionalmente as-
c \,111,'111 C'1I1('I\[(', a existência de critérios e de decisões determinadas por critérios
segurada é que uma sociedade pode renunciar a meios muito mais drásticos de
lt-I-\IIIIIIClk S6 que não se pode confiar a símbolos especiais a função simultânea dum
repressão de conflitos (9).
1111'10cll' r omunicacão para este objetivo. E finalmente só é possível integrá-Ios a
,lItI\'lI' pOl meio da criação dum sistema.
7 Em: .prê-cornpreensão e escolha de métodos na criação jurídica: garantias de racionalidade da
11 QU('1l1 abstrai apenas dos critérios de seleção e não encara o seu fracasso prática judicial de decisão, Frankfurt, 1970. Próximo na acentuação da compreensão comunicativa e da
legitimidade anterior está Hubert R. Rottleuthner; Zur Soziologie richterlichen Handels, Kritische justiz
c CIIIIII11111pi ohlema estrutural terá a tendência para ler este livro como teoria dum
(Para a sociologia da atuação judiciária, justiça crítica), 1970, pags 282 . 306,1971, pags 60 38; do
1'"11 C'~S()dI' (\(O('isHo decorrendo num processo jurídico - e inclinar-se-á a condená- mesmo autor: Rechtswissenschaft ais Sozialwissenschaft (A ciência jurídica como ciência social), Frank-
furt, 1973, pags 141 167; Andrés Ollero: Systemtheorie: Filosofia Dei Derecho o sociología jurídica?
(Teoria dos sistemas: filosofia do direito ou sociologia jurídica?) Anales de Ia cátedra Francisco Suarez
!I I ~""I """ M'IIIIIOI OlHOU, " .. 'Ihc Logic of Collective Action: Public Goods and the Theory of 13, 1973, pags 147 177. Insustentável é sobretudo a argumentação de Rottleuthner, que Esser cen-
(:"'" I" (A I ('Mil" 11.,.1\.1" 1 "II'c IV a . OH hl'lts püblicos c a teoria dos grupos), Cambridge Mass. 1965. sura que ele desconheça, a qual consta dum conhecimento racional-comunicável, pois isto não pode ser
1\" 111",
li" MIj, "I', I 11 11.111'11 realizado no processo pelos juízes; a mim, ao contrário, que perfilho esta opinião, censura-me a trans-
formação do problema da legitimidade interna e da sua intervenção comunicativa. É este o estilo frank-
furtiano: uma mistura de cálculos políticos errados com um ilusionismo moral, que permanece ele
próprio sem qualquer contato com desenvolvimentos teóricos relevantes.
8 Conf. com Othmar Jauernig: Materielles Recht und Prozessrecht (Direito material e direito preces
sual), Juristishe Schulung (Ensino jurídico) li, 1971, pags. 329 334.
9 Quem aqui apresenta um bom material para comparação é Volkmar Cessner : RI'I hc uml Konflik
te: f.in~ S07iologis! he IJIlI('rSllchung privatrechrlicher Konflikre in Mexico (Direito •. 111"1111,,, 1""" IWO
LEGITIMAÇÃO PELO PROCEDIMENTO PREFÁCIO Á NOVA EDIÇÃO 15

1II Em que consiste, no fundo, o desafio para os juristas e para os representantes quem receber essa impressão, deve atribuí-Ia a uma formulação demasiado suges-
1111111" prática de orientação moral, como se demonstrou? Um dos obstáculos con- tiva e dar-lhe o devido desconto (12)
"\C', ur ovavcfrnente. no fato das estruturas, que vão ser analisadas, não se po-
c1111'1I1 con.lensar como "motivos" para uma opção legítima ou um processo legal A análise funcional é uma técnica de revelação de problemas já resolvidos.
(1111),Esta renúncia a "motivos" tem, por exemplo, num conceito teórico, um Reconstrói, com a ajuda de hipóteses da teoria dos sistemas, de preferência aqueles
1I11l1ivoque se pode precisar. Não se pode reduzir a função dos meios de comu- problemas que já não o são na realidade social, que se encontram como que por
111(,I\.I{) simbolicamente generalizados à de "intrinsic Fersuaders" (persuasores in- detrás dos objetivos, causas e justificações. Com isso· adquire um ponto de vista
IIIIIM'(os) ( 11), por mais importantes e convincentes que tais argumentos sejam, se relacional, um relacionamento das qualidades, impressões e resultados de situações
I' 1IIIIIIular situatiuamente um desejo e se se eliminar momentaneamente a con- experimentadas como um todo na vida quotidiana. Assim se torna possível com-
1I,ldl~.Iu. Na sua função social coletiva e de eficácia os meios de comunicação têm, preender o existente como solução de problemas e variar, quer as condições de es-
Iwl.lvi.\, de abstrair de coisas como poder e verdade (Parsons desenvolveu o pen- truturação da problemática, quer as soluções dos problemas - primeiro com uma
AillllC'II10110caso da "influência"), têm, portanto, de dispor de apoios institucionais, facilidade serni-ideolôgica e depois talvez mesmo na realidade. Só com este passo,
'1111'c oncilic-m os deficits de convicção. Só em relação a situações onde não exista só com o esgotamento de todas as soluções de problemas, se tornam conscientes
11111 '(IIIM'I\SOnítido e onde seja provável a ausência de acordo só em relação a outros contextos de condições situadas para além da função específica, contextos
~IIII,I"CU'Scom uma contingência agravada, se diferenciam em geral, os meios de que não se podem analisar suficientemente de forma situacional - nem na si-
11I11I11I1Í('ação. Isto não significa, naturalmente, que os argumentos sejam realmente tuação do investigador, nem na do prático. Estes contextos, que condicionam o
1IIIIIIIM'qikntcs, insignificantes, que sejam simultaneamente apresentados como um possível, podem ser estabelecidos como valorizações: supõe-se, por exemplo, que se
1'" 11 CH 010 de imcração em torno da existência. Eles têm conseqüências num caso tornará indispensável uma medida elevada de não-legitimação de conflitos para a
I~tlllldo " :'Is vezes num conjunto de casos isolados. A combinação de estruturas industrialização da economia, para a democratização do processo político, para o
11!f'I,di/atlas de símbolos e de argumentação interativa carece de estudo mais por- método pedagógico etc., embora isto não se saiba e portanto se estabeleça como
"" 1Ill1l/ado. Sendo ambas socialmente necessárias, a minha sugestão é que as in- valor o estado constitucional. Se isto for posto em dúvida, a única coisa que então
ItllllI.I~ÚI·Scatast rôficas. muito mais do que as boas razões, facilitam a continui- pode ajudar é um aumento da análise funcional; têm então de se tornar patentes e
d."lc·, pois as negações têm efeitos mais fortementes generalizados. Para o âmbito especificados os problemas, problemas esses que se alojam em condições de com-
cI.1vl,\Clacl,', Popper , como se sabe. elaborou estes pensamentos sob a designação de patibilidade do sistema jurídico, econômico, político, pedagógico etc.
",",dll/l(a(lio ". Igualmente os projetos jurídicos são testados mais quanto às con- <JI
I'Iilc\l1d.lS insustent âveis do que quanto aos bons motivos. Um caso de fraqueza Conceitos, teorias e valorizações serão utilizados nesse procedimento sem res- ..I
Ilol(Ula ai i uina o poder. um caso de traição arruína o amor. Contudo, isso pres- trições, salvo reserva (13). Só assim a universalidade da reivindicação está em si-
"11tH' qut' se assegure a independência da normalidade do trabalho comunicativo tuação de pactuar com a capacidade de afirmação. Só assim se poderá, nas atuais
ti" 1I.1I1~"lissào. O que assegura essa normalidade duma forma altamente gene- circunstâncias, introduzir um futuro, que provável ou efetivamente dará origem a
,.tI",II!.' t, O mecanismo de regulamento do direito em vigor e a tipicidade de uma atualidade diferente. Tem-se, pois, uma razoável segurança no controle
I'lolI.dltli(\,ldt'S conhecida através da experiência de vida. E esta estrutura de co- daquelas perspectivas de problemas, em que se decidirá a questão da transição
IIIIIIIII.I(,C)(,Spode integrar-se em sistemas de processo legal que devem estar em para outras formas.
\illl.IC,.I() dt' ga\ autir a acei.ação de decisões, independentemente da exatidão ob-
IC'IIV,Ido~ :l1!,!UIllt'IlLOS. Este livro não trata, portanto, de "legitimar" a instituição do processo legal
através da justificação duma função; trata, sim, da revelação do problema qUL a
I\' )10\ motivos que foram muito discutidos no debate metodológico, as justificação resolvia e isso é facilmente omitido porque não se identifica com os
,III,t1IM'Sf UIl(iouais podem não "justificar" o seu assunto. Por vezes isto pode não ser problemas que; se procuram resolver nos processos legais por meio das decisões.
11II11J)tI'C'llClido por criticos não familiarizados com este debate. Jürgen Rodig, por
nl"lllplo, que vf: com exatidão que este livro liga o processo de decisão com o seu
I ClIIII'II(\O,(' de- opinião que ele se ocupa, por isso mesmo, dum aspecto secundário,
'1111'11.\11pod,' justificar o processo judicial. A exposição duma função atua ela-
1.11111'1111'~ob\(' (,I,', assim corno sobre outros, como uma recomendação oculta, uma
111\1111.1111,11,.10 c Ihil".l. Eu só (>osso acentuar que não é isso o que se pretende e que

'1"10.11111111111111,
11"'" 111111111". 111'tllll'lIlIprivadono México), tese de habilitação, Bielifeld, 1974 (ms).
"'1.1.• "''''~. IIIH,IIII.I\"'"·'
(l'" 111111'••1111
•.•111'lU j,l)lonesas)da disposiçãojuridicamentegarantida do con-
111," di 1'"11".IIIII.h~1I1,111111111'II·V.III"" I" " II.lvltlllSI' a institucionalização efetivado processoordenado
12 Theorie des gerichtlichenErkennrnisverfahrens: GrundliniendesZivil , srraf-undrverwaltungs-
h 1I.11"""lt,'''"'111,,1li"•.•1li" ,1~111II .11'1,·••~Ii~ .tIltlr'lrr\V()h~l'I'\enlo
industrial.
gerichtlichen Prozesses (Teoria do Processojudicial do conhecimento:princípios do processocivil,penal
lu I 11,,1 111111.1 I" IIIIIIIfl.I" 11111'-"11 li, "1'",,11,,". "11 til . p"g 297, de que constamafinalos motivos e administrativo).Berlim Heidelberg Novalorque, 1973, pags. 41 e segs.
13 "Avecdes reserves"(com reservas).Gaston Bachelard formula: Le matêrialisrnerationnel (O
II materialismoracional), Paris, 1953. ~.' edição 1972, pag. 126, para as opçõesideaisduma ciência do
l'r~i"II 1Ii1"I.1,.11'17) 1%'1,1'''IIs ~7 62 (48). couhecirncru o Kfl 111,
~ Ij\ltnu
CAPÍTULO I
A concepção clássica do procedimento legal

Os procedimentos juridicamente organizados fazem parte dos atributos mais


extraordinários do sistema político das sociedades modernas. Ou pelo menos ador-
nam a fachada desses sistemas; porém, para o conteúdo das decisões. adquirem um
significado semi-indefinido, difícil de avaliar. ainda que determinado por critérios
objetivos. Para pensadores liberais da teoria do Estado, os regulamentos do pro-
cedimento legal podiam constituir a existência de Estado e direito (I), embora não
pudessem decidir por uma renúncia conseqüente aos critérios reais da correção da
decisão; assim, o peso relativo das premissas reais e procedimentais de compor-
tamento permaneceu um problema.

Talvez a insolubilidade deste problema constitua a causa próxima que dificul-


tou a formação duma teoria homogênea de todos os procedimentos, juridicamente
regulados, que são praticados de formas tão diversas pelas autoridades, tribunais,
parlamentos, em eleições, planejamentos, aplicações jurídicas, decisões de' adju- ,
dicação, etc. Nem o pensamento liberal, nem qualquer outra orientação do pen-
samento jurídico ou político. apresentou uma teoria adequada sobre o procedimen-
to pura e simplesmente (2), teoria essa que está também ausente da literatura
jurídica mais especializada. Até aqui, constitui um exagero falar da "concepção
clássica do procedimento". E contudo é urgente, quando se lêem explicações sobre
o direito de voto, leis orgânicas para parlamentos gabinetes, ministérios, comitês ou
sobre leis de procedimento jurídico para tribunais ou administrações, uma unifor-
midade última de pontos de vista, uma certa homogeneidade de preconceitos. Por'
exemplo, acha-se que é típica a expectativa de que o próprio procedimento não
constitui um critério de verdade mas favorece a correção da decisão; que possibilita
c canaliza a comunicação: que garante a realização das decisões, independente-
mente do fato de que a lógica funcione. e permita ou não os cálculos apenas das
soluções exatas; e· que contribui para abolir as perturbações previsíveis. Com base
nestas expectativas pode conjeturar-se corno que uma concepção clássica do
procedimento, que assenta mais sobre premissas não formuladas e transcrições de
objetivos vinculadas a determinados valores, de que sobre uma teoria elaborada e ca-
paz de critica. Satisfaz-se com hipóteses vagas e sem provas empíricas sobre a idonei-

Conf rorn Erncst Barker: Rellections on Covernment (Reflexões sobre o governo), Londres, 1942.
I'~II "(lI> 'C-II" 1'111 comparação com processos legais de legislação.
~ ,,11,1111,1<1,1 "\('01 i,l pUI a do direito" é avançada de modo mais extenso e conseqüentemente pos-
~Í\oI li.' :11,,,.1,11' 1I'liltlir lod" " dill·illl p,olcssual. Como uma tenrativa de fundação transcendenta! do
,li" j", '"' I'''H """ Ik 11111111'1111"'11111 IlI".Ini',I(\O\ de acordo com os procedimentos legais. consultar
11,,111 IIÍ!! 11,\1,""'111""",;\. M.,iI ••dl' 011'1 RI'I h"pilil",oplti(' IIl1d dI" BI'griffdl's Rechtsverfahrens
11" "" 1,,,tI'"I.II' tI,I ill,,,,,II.I ti •• ti 11.,.11. I tllI 111111('110 dt !lI C1t t'.,o II"!d,, o) 1('iI" 111iil lill 'M
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18
FUNDAMENTOS rBIBLiOTECA - DA PUC - MO I
A CONCEPÇÃO CLÁSSICA DO PROCEDIMENTO LEGAL 19
dade dos meios (se se partir da hipótese, por exemplo, que a publicidade do procedi-
mento promove o encontro da verdade). Permanecem na obscuridade as condições O objetivo declarado da eleição política é a ocupação das instâncias politi-
sociais de comportamento e a consolidação do procedimento em sistemas abrangen- camente decisórias com pessoas especialmente capazes e que tomarão corretamente
tes, e pré-estruturados da sociedade.
decisões, isto é, de acordo com a vontade do povo, que, neste sentido, podem,
portanto, representar verdadeiramente. De acordo com a diretriz da instituição
Os esforços empregados até hoje para se chegar a uma teoria geral de pro- servem a este objetivo os princípios segundo os quais se organiza a eleição, prin·
cedimento separam-se conscientemente da sociologia de direito por influência de cipalmente a concorrência ao cargo, a liberdade, generalidade e igualmente a
Kelsen e concebem-se como acentuadamente inerentes ao direito. Em rigor me- eleição, o sigilo da entrega dos votos e ainda, embora muitas vezes menos men-
tódico, estes esforços não podem tratar do procedimento, mas sim do direito proces- cionada mas igualmente importante, a especificação e pré-estruturação da co-
sual. As dificuldades em que tropeça um positivismo jurídico, que se funda a si municação do escrutínio: o eleitor não pode fazer mais do que marcar com uma
próprio, como teoria, tornam-se, entretanto, evidentes. Trata-se mais ou menos de cruz a sua cédula de voto. Permanece obscura a forma como aquele objetivo pode
percorrer o caminho contrário e de se voltar para a sociologia e perguntar por um ser assim atingido. Algumas conjeturas podem ser efetuadas pela experiência, como
sistema sociológico do procedimento (e não do direito processual) (3). Não se pode
por exemplo no caso da concorrência ao cargo, que supõe que essa concorrência
apenas tratar de conceber empiricamente o comportamento fático das partes
trarâ ao cargo a pessoa mais capaz (4). Parecem ser indispensáveis para a cons-
processuais e de contrastá-Io com as normas do interesse maior, as pesquisas so-
trução posterior da relação causal as conjeturas ideológicas adicionais - por exem-
ciológicas sobre a forma como o juiz realmente decide, quais os sentimentos que o
plo as que se relacionam com uma volonté générale (vontade geral) já existente mas
movem e quais os interesses que o determinam, quais os fatores que desempenham
não expressa, ou as que se relacionam com o eleitor isolado, bem informado e
um papel na eleição política ou sobre quais as influências que dirigem de forma
decidindo duma forma puramente racional. Mas estas hipóteses secundárias são,
visível ou não o andamento das negociações parlamentares; apesar disso, até agora
não só empiricamente insustentáveis, como tão pouco se deixam agregar ao pro-
' não produziram qualquer ponto de partida para uma teoria geral do procedimento
• juridicamente organizado. Nem a teoria pura do direito, nem a teoria pura da cedimento sem que este fique destruído - no primeiro caso, o da vontade geral,
realidade pode ser adequada a um tema que nas estruturas significativas pre- pela transformação em aclamação puramente expressiva, no caso do eleitor ra-
cional isolado, pela não-admissão de todos os outros eleitores que não satisfaçam os
viamente apresentadas e no comportamento real tenha dois pólos, que devem ser
considerados como variáveis em relação um ao outro. requisitos de informação completa e capacidade racional de decisão.
Uma consciência demasiado sutil deve agir de forma corruptora nessas auto-
contradições das diretrizes da instituição. Com base nessas hipóteses clássicas, não
Ainda assim, nas últimas décadas, a teoria sociológica, em relação estreita
se podia desenvolver uma teoria do procedimento. A análise sociológica tem, em
com as investigações empíricas, avançou bastante. A sociologia do direito tem de
contrapanida, a possibilidade de investigar os chamados princípios da eleição
tentar entrar em contato com este desenvolvimento. Isso abrir-lhe-ia a possibilidade,
política juntamente com a refutação quanto às suas funções e seu significado e de
de testar expectativas sobre o sentido de regulações jurídicas, neste caso, sobre o
reconhecer as condições de estabilidade no caso destas [unções. Vamos tentar essa
semido do procedimento juridicamente organizado, com meios sociológicos de
análise no terceiro capítulo; levará à conclusão de que os princípios do procedi-
raciocínio, Proceder-se-á a uma dessas tentativas nos dois primeiros capítulos deste
mento da eleição política estabelecem um sistema de comunicação que se deter-
trabalho. Ela focará as hipóteses de raciocínio daquilo que podemos então designar
mina duma forma relativamente autónoma devido à separação dos papéis e pode
como teoria clássica do procedirpenro com a ajuda duma perspectiva sociológica
contribuir, nesta qualidade, para a criação duma legítima autoridade de decisão
incongruente, conscientizando essas hipóteses e simultaneamente submetendo-as
política.
à crítica. Esta crítica será então o motivo para trazer o problema da legitimação (e
não o problema da verdade ou da correção da decisão) para o centro da teoria do Não menos problemático é o objetivo declarado do procedimento parlamen-
procedimento,e para se poderem então orientar a partir dela posteriores reflexões. tar de legislação e das suas instituições auxiliares. Seria um erro grave de opinião
-supor nele apenas o "espírito" do parlamentarismo e ver desaparecer com o "es-
;omo não existe uma doutrina unitária do procedimento como base para uma pírito" a "substância" (5), tal como no caso do processo legal de eleição política. O
IIlv('stigação deste gênero, temos de nos ater a determinadas formas de procedi- sentido oficial justificador do procedimento parlamentar orienta-se para o objetivo
111I'1IlO. Escolhemos para isso procedimentos que conseguiram uma importância es- da verdade dos fundamentos da decisão e da correção da mesma em situações em
)H'( ia I, estruturalmente decisivos nos sistemas políticos atuais: o procedimento suspenso, não programadas. Por isso o ponto central da instituição é constituído
tI.1 ('I('iC;ão política, o procedimento parlamentar da legislação e o processo judicial. pelo debate público entre os cidadãos com iguais direitos e eleitos para essa fi-
nalidade. Por esse motivo são suspeitas, senão mesmas proibidas, a sujeição a ins-

'I i\ P"'j(lIlIl., M' ,"11,11.111"011"<10p,oll'dillWlllO pode dar um estímulo político-jurídico para um


w 4 Mesmo nos Estados Unidos se chega entretanto ao conhecimento de que é "clear ly wrong to suppose
''I , ""~''''"'''1I1O do "" •.ito p"" ""\1.01,<Ir,x,lU'o1,\em aberto, assim como a pergunta seguinte, quanto ã rhat political competition is either virtually universal or universally virtuous" (manifestamente errado
1"",""11",\11"01""(.,,, ',I ,'''1011< ,I 01, ,,,,,,,",, " "'1",,,1\111,"r JS estruturas sociais na sua própria estrutura
supor que a competição política ou é virtualmente universal ou é universalmente virtuosa) para isso
""111'1'1\1,011'.11"..,1., ,,11111'';
1',1111' \11 ,,111"1.11111'1111'
"''''01"", MUIlt'r' Normstrukru- und Normativirál
ver j arnes O. Bar ber: The Lawmakcrs. Recru itrnent and adapraiion to Lcgislativc Life (Os legisladores.
(1''''''11",,01 .•• ""11\1,"" \I"I,",,,ill",III,,) l\llll \'I,h;'hll"VUII R,',IlIlI"d Wi,klithk('il indcrjuristischen
i\li~l"'lt('1I1<1 " ad,ljHilçaO " vitla I(');isI.H,va),New 11aven l.ondrcs, 1965, pago I,' M');S (1), <0111"1<li,
", '11I1"II'III,k,'"11\'. ~·'II ,\1111,111'""," \'t'II"I~II"~ ,'"1' '1"1'\,""111()'m ,,'I.I~,IUrom dheilO (' ,calidadr 11, h11
••" , .tI", whl" "SI!'pl"hl.-IlI,1
li,' I••""'""11111',1illrllli'_II ""~llIhll~IIIIII'iI! 'I\'pw·,,·~ d, I""'''''''I,'~,I" d,II""'III",~.l,,), 11<-11,"1,
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t.••••nutju;~ ••••• 01'111\ '\ ".,.Ii. H •. ,lilll
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'W FUNDAMENTOS A CONCEPÇÃO CLÁSSICA DO PROCEDIMENTO LEGAL 21

11ucócs, coação dum grupo político, permuta de vantagens concretas e mtercepção conhecimento exato daquilo que é legalmente válido e é legal no caso específico. Aí
de papéis. Por esse motivo o parlamento é, de acordo com a sua constituição ju- se prt'vi', tal como no caso da eleição política e da legislação, que através da decisão
Ildi, ,I, não uma repartição burocrática, mas sim um ciclo de sessões realizadas em se realizará aquilo que é justo. De acordo com isso, o objetivo principal do pro-
( ,1'0 de necessidade. Por esse motivo a liberdade de expressão, ou seja, a liberdade cedimento judicial serâ geralmente indicado como proteção jurídica e, nesta ver-
de' IOdo procedimento é protegida em medida fora do comum através de imuni- são, usado como justificação dos institutos particulares do direito processual (7).
d.l(l('s. Por esse motivo o deputado só é responsável perante a sua própria consciên- Esta opinião apresenta, porém, as suas dificuldades quanto ao problema da decisão
11,\ E por esse motivo o procedimento parlamentar orienta-se de acordo com o incorreta, mas que se torna vâlida. Tal como a teoria teleológica da ação, da es-
dC'l',lle repetido e ponderado de todos os pontos de vista e exclui paroxismos impul- colástica, tem de definir a "essência" do processo através duma característica que
IVOS(' decisões súbitas e improvisadas. Todas estas disposições parecem ser con- de forma alguma lhe está necessariamente ligada (8) ou então tem de recorrer a
I ('h!llas de acordo com a verdade - e não, porventura, determinadas por poder, fórmulas duplas, contraditórias, como proteção jurídica, paz jurídica, que oculta
dllllwiro, amor. honra ou fé. decisões justas e injustas (9). Com isso, porém, sobrevém 'aquele momento de ar-
bitrariedade ria instituição. que já se observou nos princípios da legislação par-
Elllretanto deveria também perguntar-se aqui como é possível harmonizar este
olql'l ivo com aqueles meios. Poder-se-á atingir a verdade permitindo a todos os lamentar e que anula o sentido do processo: não há suficientes instruções para os
p.1I111ipanrcs dizerem sem coação aquilo que a consciência lhes dita? E sobretudo: decisores quanto ao procedimento estar organizado para dar como resultado de-
lia "llIa~'ão altamente complexa e não programada da função legislativa poderá is- cisões justas ou injustas, por amor da verdade ou por amor da paz. Tampouco se
111,li oiucccr de forma a que tudo seja alterado? Também existem aqui. projetos pode contestar ser oportuno e válido no procedimento judicial, que uma pessoa se
Id"olúHiros secundários que suavizam a tensão entre objetivo e organização e tor- deva esforçar por estabefecer a verdade, quando é possível um objetivo desejável
CI.IIII('~Ia mais digna de crédito - principalmente o antigo conceito de justiça que deste tipo, tirar uma conclusão quanto à essência do próprio assunto, quanto à
,li II·ctil,lva poder assegurar, com a generalidade da forma, a validade universal, aprovação ou legalidade dos meios (10) ou ainda quanto às funções efetivas do
1111~i'lll ido da verdade (6), ou o pensamento de que a concorrência de opiniões é o procedimento: uma obrigação para os participantes não constitui ainda uma teoria
1111111'1111' para garantir a verdade. Contudo, também estas hipóteses adicionais, suficiente do seu comportamento (11 ) .
I IIIIM'qi\clill'mente ponderadas, vão minando o sentido do processo oficialmente in- Estas reflexões prévias a três procedimentos juridicamente organizados, mas de
dll .ulo , pois, segundo elas, qualquer coisa pode ser verdadeira se tornar a forma natureza muito diferente. deixam imediatamente reconhecer tanto de comum, que
1111111:1 lei geral ou se decorrer da concorrência, mas, como tal, já não compen- podem ser formuladas as bases da concepção clássica do procedimento. O núcleo
,I os l'slorc.;os do processo legal. Depois de tudo, é de supor que uma análise so- de todas as teorias clássicas do procedimento é a relação com a verdade ou com a
11111()l-\iul também possa justificar ao procedimento parlamentar as funções latentes verdadeira justiça como objetivo. "Toutes les combinaisons de Ia machine poli tique
d.' 11·/o\i~I{\~·à();é difícil de admitir que uma instituição tão divulgada e enérgica seja
, IIIIWI vndu por razões meramente museológicas. 7 Ver. por exemplo. Fricdrich Srcin. Martin Jonas! Adolph Schbnke /Rudolf Pohle: Kcmmeritar zur
Zivilprozessordnung (Coment ário à organização do processo civil). 18.' edição. Tübingen 1953, vol I,
Nos procedimentos judiciais de aplicação jurídica surge hoje, com menos anexo C, que mencionam garantia jurídica e paz legal uma ao lado da outra. Igualmente Leo Rosen-
I\l'qi\(~II('ia, essa discrepância entre objetivo oficial, organização institucional e berg: Lehrburh des dcutschcu Zivilprozessrechts (Manual do direito civil alemão) 9.' edição, Munique-
Berlim 1961, pags. 2 e segs. Comparar ainda com Franz Becker: Das allgemeine Verwaltungsverfahren in
t"1I11(;f)('slatentes. A autodescrição da justiça já foi anteriormente aceita no debate
Theorie und Gesetzgeburg. Eine rechtsvergleichende Untersuchung (O processo administrativo em geral
d., II'DI ia do direito e o da teoria política e mesmo assim não foi posta em evidência na teoria e na legislação. Investigação de direito comparado.), Stuttgart Bruxelas 1960, pago 18; Carl
('"\1 " 1IH'~ma precisão e força de persuasão do que a da eleição democrática e a Hermann Ule: Verwaltungsprozessrecht (Direito processual administrativo). 4.' edição, Munique-Berlim
d,1 Iq~illl,Ição parlamentar - supostamente porque as situações de opção da justiça 1966, pags. 1 e segs.; Klaus Konig: Der Begriff des Rechtschutzes und die offentliche Verwalltung (O
"S!,I" 1111'1 hor cstrut uradas e o seu objetivo pode ser mais facilmente operaciona- conceito de garantia legal e a administração pública), Colõnia-Berlirn-Bonn-Munique 1967, pags. 59-
1",Hln, "l'ambérn aqui o estado de coisas não é essencialmente diferente. 80. Em Studien über Recht und Verwaltung (Estudos sobre direito e administração).
8 Conf. também a crítica insistente de james Goldschmidt: Der Prozess ais Rechtslage, Eine Kritik
() ~('lil ido do procedimento judicial juridicamente organizado será igualmente des Prozessualen Denkes (O processo como situação jurídica. Uma crítica do pensamento processual).
" 1.111011,1(10a um critér io de verdade pelas doutrinas dominantes do processo, a um Berlim 1952.
Y Na teoria zeral do processo acentua. por exemplo, Eduardo J. Couture: El proceso como insti-
11 1',1/ p.IIII· "'SI'III .,001\)('nt(·
deste conceito de lei o recurso à natureza, no sentido duma existência tución (O processo como instituição. Em: Studi in onore di Enrico Redenti, Estudos em homenagem a
I' 111.111,'''''.
I' 1111,1111'111,·,
<t\l" n.ro requere uma causalidade específica para a sua fundação e que é válida Enrico Redenti), Milão 1951, vol I, pags 349-373. a aplicação ao objetivo do processo, sem se deixar
"1""'"""" 1k\IS 11,\11 nIN\1I 0\1 IIl10;(' preocupar com o problema humano" (Hugo Grorius: De iure belli desconcertar para maioria (e a contraditoriedade) dos objetivos existentes.
"' 1""" 111 ••1 111" 1'1111"""1111'(1,, 11 Sobr« o dirviio da guerra e da paz. livro três. Prolegómenos 11) 10 Existem. por exemplo. meios de encontrar a verdade que são inadmissíveis. pois tem de se manter
II 11"~,I,,,,"01'"11\1 ,) "d'~,I" d., 1\111'1,·.11 ..10 17~(). pago X). Daí só resultou, após o fracasso do direito cru suspenso a possibilidade para os participantes, de dizer Ialsid.•.des com dignidade. Gonf. aproxi-
""1111,,,)"" ~1I11"III0111",0111"1111 v•.•II"dl·I.II I.' t·Ki~\(·llt(·.o núcleo formal do pensamento natural (conf. rnadamente C0111pags. 9te segs. Além disso o fecho desta finalidade leva apenas, por meios apropriados,
1,1111 Iot", '"1" 11I 1',01 "., 1111'11111
•• I, 1111111 11) .1 II·II·'~.\()<\(' causas externas que é agora entendida como " regras de coac ão muito indefinidas. 4"" não dispensam a decisão no caso particular. Cone. para isto
lt'I"II•.II<01••.1""'1111111.11."" "li "'11' I,1(,01 I"" 1111'"d,' IIIII'II'M~I'K ~o,iais específicos e assim jã não apresenta corn Erich Dnriug: !li,' Lrforschung drs Sachvcrhalts im Prozess (A exploração do estado de coisas no
11.-.1111111\,' ,,.\'q;rjtl !IJ!II 11 "fi d!Hlt.1 1',1I"·f tI"i u~;f.lq "••hu' ttiu'iln polttico ('tn detalhe conf. com Ernst- I" li< I'SSO) Ikw,·i,,·rlu·I'"IlK und B,·wl'i:.würdigung (Recolhimento e crítica das provas). Ein Lehrbuch
\\ ••li ''''''11 li,'" ~.,,"11\, 01"1 'li ~',11 111111 1,."~',III1'I" 111\'1,'·W.oIl Vnn dr-r AnNngrn der deutschen Staat- (Lh" 1II.'olUlIl).Ikolil1l 1961, pal!:~."t' 8('8s.
li' l'lllpllli' I,j, 111111,,1110I,'~11.1j,,,,,, 111111111 111'''''"''1"'''''' (I,·, ,. I.II~.,1"II;~I"liv" I)f~dl' os inícios da
II """ ,,"11111<"01 ;'~""N • 1111\1.'
\I 01111\1.10
d,· 'I'H' a verdade seja o objetivo do processo. no decurso duma
,.·",1" 1,,,111 i, " ,.I, ",., ~II"1"' 1'''_"11j."" . .IA \I .,,1·, 1",1,1"i,l, IIJo,II'I\)'I',H
,1I1,\It
••' 111,\1,"~,I\,' "" 1"'"'''''' 1111111"" """ 1I",v,'1(li '0, C:ol1f al1ui corn Ilenri LI'vy Bruhl , sob li fnrma
FUNDAMENTOS
A CONCEPÇÃO CLÁSSICA DO PROCEDIMENTO LEGAL 23

clOIV("1I1donc tendre , d'une part, à extraire de Ia société tout ce qu'elle possêde de


da burocracia no caso particular ou podem conceber-se mesmo como formalidades
J,IIWII, de just ice , de vérité , pour les appliquer à son gouvernement; de l'autre , à
burocráticas sob o domínio do direito. Os procedimentos parlamentares progra-
PJOV()(lu('r lcs progrês de Ia société dans Ia raison, Ia vérité, et à faire incessament
mam a burocracia e autorizam o seu equipamento financeiro. A eleição dos re-
p,I~M'1 ccs progrês de Ia société dans son gouvernement"
m.iquina política devem tender,
(Todas as combinações
por um lado, a extrair da sociedade tudo o que
da 1 presentantes do povo submete a burocracia a um 'controle superior de maior ou
menor alcance. Em todos estes procedimentos consolida-se a idéia duma verdade e
.1., possui de razão, justiça, verdade, para as aplicar no seu governo; por outro lado
duma justiça independentes dos detentores do poder e que se Ihes opõem (16). Sob
di-vt-m tender a provocar o progresso da sociedade na razão, na verdade.; e a
estas circunstâncias e nesta perspectiva polêmica contra o poder, não era possível
1I.11\~p()l constantemente para o seu governo os progressos da sociedade). - Assim
11'1111i11,1Guizot a sexta lição da sua História do Sistema Representativo (12). Tais ver na legitimação do poder o sentido do procedimento juridicamente organizado.
'lllJl,tivm protegem e reforçam uma afeição manifestamente antiburocrática das t '
1"OII,I~ do procedimento e dos seus postulados institucionais. Dirigem-se contra A posição central do valor da verdade' e das funções de conhecimento orien-
'1"1'111 administra o poder. Isto é válido para as idéias "jurídico-estatais" do pro- tadas para ele tem, sem dúvida, raízes antigas no pensamento histórico, não po-
I nllll1(,l\to na tradição alemã (13) e, que desconfia da burocracia por causa de sua dendo, contudo, ter boas condições de sobrevivência durante tanto tempo porque
tll'pl'Jul('ncia política e, por esse motivo, associa as regras do procedimento carac- proporcionava à polêmica contra a burocracia possibilidades de cobertura e
1I'IIMlt(lmente com os direitos subjetivos contra o estado (14): Mas também a apresentação. Entretanto o pensamento moderno especificou o conceito de verdade
I 1,ltl~td<l do "due process" da constituição americana tem o seu problema relativo no contexto do desenvolvimento das ciências e, vinculado a fortes pressupostos
11.11011,,1 da burocracia e nos perigos do abuso dela; e também ela está em tão ín- metodológicos. decompôs, por esse meio, os pensamentos de direito natural, po-
sitivando o direito. quer dizer, fundamentando-o em torno dos processos de de-
Iilll;1 1clação com os direitos materiais da liberdade, que aos seus comentadores
cisão. Depois disto tudo, torna-se difícil ver qual a outra forma, prescindindo do
1"" 1'1 (' roruer , em primeiro lugar, não apenas as garantias constitucionais, como
recurso a uma idéia pré-concebida , de poder estabelecer a opinião de que o co-
uuuhém as garantias substanciais; e ambos os pontos de vista só se separam mais
nhecimento verdadeiro e a verdadeirajustiça constituem o objetivo e conjuntamen-
1:11dI', lia história da exegese (15). Os procedimentos judiciais controlam as decisões
te a essência dos procedimentos juridicamente organizados, e quando e como se
poderia atingir esse objetivo. Segundo esta opinião, um procedimento constituiria,
1111111 1 on flOllIo de provas cientificas e judiciais: La preuve judiciaire. Êtude de sociologie juridique (A
entre os outros papéis sociais, uma estrutura separada, com relativa autonomia, em
111""" judicial. Estado de sociologia jurídica). Paris 1964, pago 21 e segs. A apresentação de provas
que seria acionada uma comunicação com o objetivo de decisão certa (orientada
1'''' .'"11' o u ihunal não visa a verdade, mas sim a criar convicções relevantes dentro dum espaço de tem-
I''' Cl'~lrI!Il Outro dos críticos da opinião dominante foi Ludwig Bendix. Ver: Der alte Geist in den para a verdade, legítima, justa). Mesmo quando se estabelece esta formulação de
III'IIC'IIRcgierungsentwürfen z~m Gerichtsverfassungsgeserz und zum Rechtsgange in Strafsachen (O es- matizes mais sociológicos, não se torna todavia, perfeitamente compreensível, antes
1'111111 umigo nos novos projetfs governamentais para a lei da organização judicial e ordem judicial em continua muito problemático, como é que num tal sistema de papéis se poderá
n,,,~IC~penais). juristische Wochenschrisft 49 (Revista jurídica 49), 1920, pags 267-269 (268) com outras garantir a verdade no sentido da solução correta e totalmente convincente dos
""rl~,,fiJb. Ultimamente Vilhelm Aubert tratou muito dum contraste entre a mentalidade jurídica e a problemas de decisão.
1o"~1 I1I ientlfir-a da verdade. Conf. com Legal justice and Mental Health. Psychiatry 21 (justiça legal e
~,\I\,It,ment al. Psiquiatria 21). 1958, pags 10I-I 03: do mesmo autorlSheldon L. Messinger: The Cri-
111111111 und lhe Sick. Inquiry I (Os criminosos e os doentes. Inquérito I), 1958, pags 137-160; ambos A diferenciação dos papéis específicos do procedimento para a função especial
••.101l!l'CIISOS em: The Hidden Society (A sociedade oculta), Totowa, N.]. 1965; do mesmo autor: The de encontrar a verdade pode constituir uma importante condição prévia, da mesma
'111ItI"Til 01 Legal Thinking (A estrutura do pensamento legal) Em: Legal Essays (Ensaios jurídicos). forma que a procura científica da verdade se realiza em funções específicas ou pelo
hmkdlt til Frcde Castberg, Copenhague 1963, pags 41-63. ' menos segundo regras específicas (método) e valores e é, portanto, socialmente
I~ M. Guizot: Histoire des origines du governement représentatif em Europe (História das origens do diferenciada. As possibilidades de comunicação são mobilizadas pela diferenciação
K"VI'lIltlr epi escntativo na Europa), voll, Bruxelas 1851, pag 87.
e não subsistiriam se estivessem intimamente ligadas a outros papéis, extra-
1:1 I'nnl a sua história anterior ver Wolfgang Rüfner: Verwaltungsrechtschutz in Preussen von 1749- procedimentais. O livre estabelecimento da comunicação constitui um segundo
IH1~«;,H(lntias do direito administrativo na Prússia de 1749 a 1842). Bonn 1962.
momento, e a organização concorrente ou mesmo contraditória da comunicação
II I'. at~ mesmo temporariamente no domínio da intensa burocracia do processo civil como o mostra constituirá um terceiro momento. Tudo isto não está em condições de garantir Que
;1Ii/(IIJ,\do "diuiu, à garantia legai".
I', Pura este assunto encontra-se uma boa interpretação de Paul G. Kaupers: The Frontiers of Cons-
IIIIItll/lI.1Il.ih(·lIy (As Ironteiras da liberdade constitucional), Ann Arbor 1956. e entre elas, uma for- do direito e da verdade, mas sim numa vinculação interna da atuação política através de barreiras
III,oIu~H"«lIl' rorna claro, que a distinção entre garantias substanciais e de acordo com o processo, se jurídicas e regras de processo. Isso exclui tanto a democracia parlamentar quanto o estado de justiça. -
111'111., ,IPO'II,'N a diversos processos, correspondendo à separação de processos da aplicação e estabele- Para a cláusula do "due process" conf. ainda com Rolf Deppeler; "Due process of Law", Ein Kapitel
11111.'1110 ,,,rftli«(): "The subsraruive liberties assume their central signilicance as limitations 'on the le- americanischer Verfassungsgeschischte. Beitrag zur Erhellung des Problems der Verfassungsinterpre-
/(1.1.111'"I'0WI" in mulding and reshaping the basic policy of the state. The procedural safeguards as- tation, Diss. Berna 1957 (Um capítulo da história da constituição americana. Contribuição para o es-
~IIIIII'Ilu'il PIII" i\l;" ~ignifi(<l1I(t'hislO";tally as resrrairus on executive and judicial power in insuring clarecimento da interpretação constitucional, dissertação).
,,,.,.,,,,.1' XC'I ""I} whwn pilll'(1 "1(,11""i lu- .ulmi nisuation of criminal justice. (As liberdades substanciais 16 As razões históricas para isso não podem ser aqui convenientemente descobertas. Por um lado,
,."""11"111" "'li "'111111" 1"""111011'01""' li""",I~(l"N,111poder legislativo moldando e dando nova forma à residem, na fundação transcendente da idéia jurídica na Idade Média, alcançada sobre a sociedade
1'0111H.~ 1).\,\11" .lu )(O\lf" IUI A .• k'" 11111 I.Ui plllll·'!'IIII.tI~ .isvumvrn o seu principal sentido histórico como rés- política, e. por outro lado. no fato de que a nova autonomia do poder do sistema político no "estado"
1111,''''.,1111'"01"1'''' 1111'"I ,,,1111,"111, u ,1111",,111 ,I "'III",'''~<1 pessoal quando disputadas contra a ad- contemporâneo se tornou visivelmente perigosa e carecendo de controle no executivo burocrático. De
IlIi"i~II.,~.11Ili•• 1"011\1'IIIIIIIII.tI ) 1"'11 1111 1" ••• ,·."ml~"'" c1,'1II0I1stramsimultaneamente os perigos passagem: Parsons vé nessa separação entre o direito e o sistema político um avanço duradouro do
,I•• 111""I 1••111"I"".I~ "" , '11 ,••i,,', 11111111 1.IIIIloflllrlll ",,1"8 os 6IgJ(IS do I(ov('rno, farejados pelo progresso. sem por isso considerar suficientemente a posirivacão do direito atual (ver sobretudo Talcou
lutlh .uu, t '1'" 1'1.- H~1i 1"'1"") IlfuHHl,n IIIIUI 101l1IUI., ,H/",o"
j IIll"v~" c(oultUS 6tgJos mais próximos Pai WIIS Soei," il's 1'.vollllÍolI, ••Y,11111
Cornp,••ruive Pcrspecrivcs (Sociedades. Perspectivas evolue ionã rias ('
IOl\lp,lr,'llv,,~1. I-t,,,Ic'wolli\('Id", N J 1'IlIh, ".1/1" "rI. '/7,!lH,' "'''~
H'I FUNDAMENTOS A CONCEPÇÃO CLÁSSICA DO PROCEDIMENTO LEGAL 25

~I'lllpl" que SC' alcançar a verdade, se encóntrarão as decisões certas. A isso se opõe das decisões (21). Se, em contrapartida, se puser de lado a hipótese de que os
01 111'(cssid adc de decisão. Um sistema que tenha de assegurar a possibilidade de processos legais servem para revelar a verdade, adquire-se a possibilidade de inves-
dC'II~,1O dI' todos os problemas levantados, não pode, sirnuh aneamenu-. garantir a tigar a função dela para a legitimação da decisão imparcialmente considerada
111"1(,<1da dccisâo. A espccificacão de funções duma orientação exclui as doutra numa forma sociológica moderna.
11111'111,1<.
ão ( 17).
Na verdade seria nitidamente desacertado negar ao problema da verdade
dilema não passou naturalmente
bl(' despercebido e deu ocasião a diversas qualquer sentido prático para o procedimento jurídico ou contestar à verdade o seu
111,11\0111", dI' desvio. São prova disso as hipóteses ideológicas adicionais já men- valor. O que falta é uma teoria que possa pôr em dúvida o problema da verdade,
c I<III,I<I.IS1'111tiros especiais de procedimento. Também lhcs deveriam ser avaliados tal como acontece no procedimento e que não aceite, a priori, que o procedimen-
II~ "li unos esforços para uma limitação e uma justificação do princípio da maioria til
to preste serviço à verdade. A soci-ologia pode construir uma dessas teorias na
( 1M) OUIt as tentativas enfraquecem diretamente o objetivo da verdade por medida em que concebe a verdade não já como um valor, mas mais precisamente
1 ~I'llIplo se uma ressoa afasta do âmbito da decisão assuntos que implicam a ver- como um ,mecanismo social que permite algo de determinado, que desempenha
d ••<lc' "absoluta" (por exemplo, os de natureza religiosa), limitando, portanto. a uma função declarada e se pode comparar com outros mecanismos do ponto de vis-
I'm~iI)llidad(.' de mobilização de temas; mais ainda, se uma pessoa se contenta com ta desta função.
\1111.111", ulat ivas. provisórias por assim dizer, uma renúncia que se baseia na idéia
Itllllillltlla do "eterno colóquio" (19), e não em último lugar, por meio duma ar- Aquilo que a verdade realiza no convívio social é a transmissão de reduzida
11111,11111,1 jur ídica , com a qual pensa poder sair-se o liberalismo tardio: que o complexidade (22). Para toda a gente o mundo é excessivamente complexo, cheio
I" cIIl'd 1J1H'lllO não justifica a decisão mas fundamenta uma presunção da exatidão de possibilidades im previsiveis e, como tal, desconcertante. Cada indivíduo precisa,
cllI ~1'\1 <unu-údo (20). Tudo isso, porém, tende a afastar-nos do problema sem o t
portanto, duma orientação significativa e duma direção de vida para poder adotar
1<'~lIlvl'l (ou sem precisar as condições de solução). O preço de tão excessivo esforço obras de seleção de outros. quer dizer, que possa tratar o sentido que os outros es-
ti." 1H1~"hdidad('s da verdade tem de ser pago de qualquer forma quer pela colheram, como tal e não como se fosse diferente. Essa transmissão pode ser ~-
,111111.1(,,111 <1m postulados numa forma rclauvist a ou fictícia, quer pelos círculos lizada por meio de mecanismos sociais diversificados, que nas sociedades mais
1.lll1l1lcl/oli(0' ou premissas contraditórias que permitem o que se quiser. O mínimo prími tivas não se diferenciam, atuam em conjunto e trazem, portanto uma "recons-
11\11''" Jlodl' falei i' perguntar de forma mais radical se atingir a verdade constitui, rruçâo da realidade" de complexidade diminuta (23). Sô no decurso do desenvol-
C'I,dllll'lI\{', a f unção principal do procedimento juridicamente organizado. 'j vimento civilizacional em ordem a uma complexidade mais elevada das sociedades
e da sua visão do mundo se difere'nciam e especificam estes mecanismos e só com o
1'1)1('111 esta pergunta diz respeito a uma das raízes do pensamento político pré- início da idade moderna é que esta diferenciação se tornou assunto de rigorosa
IICIlIlolo\i<o , Todos os esforços pensáveis, quer da teoria política democrática, quer reflexão teórica. A verdade só constitui transmissão de idéias com base na certeza
I1lIcl.l <L. uoria polit ica liberal, e pregados para provar o apoio, mesmo daqueles obrigatoriamente intersubjctiva e assim se diferencia com rigor da aceitação de
'I'tI' 11'11\opiniões diferentes, a exatidão, mesmo daquilo que fracassou ocasional- idéias por motivo de simpatia pessoal ou de filiação ou de submissão ao poder. As-
IIIC111(', (I seru ido do esforço pelo que se quer, seriam provocados por premissas sim muitas idéias, sobretudo objetivos e valores, perdem a sua capacidade de ver-
CIC"IIt',\~, caso no procedimento jurídico se não tratasse, em primeiro lugar, do dade e com isso se agrava simultaneamente a problemática doutros mecanismos. A
"C 111111('( inu-nto dto verdades já afirmadas. Ao inverso, o domínio do objetivo da questão da personalidade nas relações sociais e a questão da legitimidade no poder
\ I "l.lclc' a lu-ra a problemática dos sistemas sociais, que produzem decisões nos adquirem um radicalismo até então desconhecido.
I" clIc'dilll('IH()~. A verdade é evidente. É natural que ela se difunda e se torne
c 1I1t1II'1Ida. 1\ quem nào a apóie pode negar-se senso e inteligência. Junto dela não A verdade compromete o homem como ser humano, isto primeiro em sentido
1111111' ~lIhsiMir nenhum problema especial de reconhecimento. assim como tam- difuso, ainda não subdividido. A moderna especificação do mecanismo da verdade,
111'111.10 laclo da justiça não pode subsistir nenhum problema especial de legiti- porém, deveria corresponder a uma especificação exata deste compromisso. Não se
111111.1<11', Nestas circunstâncias não se pode duvidar que, juntamente com O esta- aplica já ao individualismo concreto da pessoa (como o amor) e também não ao
1",lc'c 1IIII'IHo de decisões concretas, se difundiria também a convicção da exatidão status social ou às suas funções (como a filiação), como ainda não à sua capacidade

I' "',IIIII"IIC,'I1l1'iIcat acu-ríst ica t ipica da espccificacão funcional que ela se torne reconhecível. e a 21 Consutui uma prova disso a segurança e emoção com as quais o liberalismo iluminista equiparava
1-1I,.:I.i d~' 'I'U' '''IU"OC'''' d"\ol' M'I J,lillK"id~1. A:, fórmulas de objetivos da teoria clássica não contêm recusas
o verdadeiro •. o justo à luz, à abertura e ao acessível para todos. Como testemunho impressionante ver
II,'~'" "1''' I ,I,,, 1,"1111
•..•" 11:10pod,'''', port anro. reivindicar seriamente serem declarações de funções. Anselrn Rirtcr \'OTlFeucrbach: Betrachtung über die bffentlichkeit und Mündlichkeit der Gerechtigkeit-
IH I li' 1(01"11 , 1>,,101 C'II(0"",' '" um bom debate que penetra criticamente nas condições prévias spflcge (Considerações sobre a publicidade e o caráter oral do exercício da justiça), vol I, Giessen 1821,
oIc 1"11"11'"""" ,\ I'C"!,", I" 11,'11'"1',111(I hc'o,y (Um prefácio à teoria democrática). Chicago 1956. espocialrncnrr-pags. 68 e segs.
C..•.tI .,;"cl" c111'1I'h,,~ II"'N I"'","C '111Y." ••, 11••. M,'jority Principie. A Siudy in Twelve Corucrnpor ary 22 Para o valor de colocação deste pensamento numa teoria de sistemas sociológico-funcional conl.
1'••11111,111111 ,,'I'" 111011111'I., c " I" 111111'111.1.,111,1'011,1
"li 11mestudo sobre doze teorias políticas contem- t arnbérn com Niklas Luhmann: Sociologie aIs Theorie sozialer Systeme (Sociologia como teoria de sis-
plll ,IIIII"~) (111" UlhlHHI 1'111',
lemas sociais). Külmer Zeitschrift für Soziologie und Sozialpsychologie 19 (Revista coloniana de so-
11.1 ~IIII1Htt,!tp til ",' ••• tI (I "fK'~1 I 'h111UI\l II ."I'IH .•,1u p~II.,., SU,l import ância para o parlarncruaris- ciologia e psicologia social 19), 1967, pags. 615-644 (633).
111"
23 Pal~ C"'" "'TI"" e par a este assunto conf com Peter L. Berger/Thomas Luckmann: The Social
.'(1 j\,,,ttl plll' '11111,.1" 1\ 1111'1111 II 1)111'1
.lIc·IIllc""'1I dC'1~1.1.It,wilkn. in d,', Demokratie Cnnsu ur uon 01 R"alil\' (,\ <')I''''lI~dO social da realidade). A Treause in lhe Sociology of Kmowledge
('I"IItI., I li.lI.i~\li1.1,4 111 II"~II !i"! 11 li "11..l ) III,i'lllC' 1<1'11I"'M' 11)c' ~c'lI' (\'", t r .11
.••1••,••I,,,, " "" illl"14'"do, ollllt'l in••.CII
11) (;d' dl'fI City, N I. 1966
A CONCEPÇÃO CLÁSSICA DO PROCEDIMENTO LEGAL 27
'Jh FUNDAMENTOS

que, no procedimento se criem essas razões adicionais para aprovação das decisões
.I •. " i'l\pOl (corno O poder) mas sim à sua subjetividade. Em questões de verdade o e de que, neste sentido, o poder gere a decisão e a torne legítima, isto é, que se tor-
1"'''"'11' ('SI.! cngajado como sujeito, isto é, como alguém que está indicado como ne independente, pelo imperativo exercido concretamente. Visto desta forma o
I ,"1" I) pm t ador de sentido do mundo (e que já não entra em linha de conta quan- objetivo do procedimento juridicamente organizado consiste em tornar intersub-
rlII 111',4,1VI" dados) (24). jetivamente transmissível a redução de complexidade - quer com a ajuda da ver-
dade. quer através da criação do poder leg ítimo de decisão.
NI'IIIrIlIll procedimento pode prescindir de verdades nesta função específica;
1111111','kn m a perder-se-ia num poço sem fundo de possibilidades sempre diferen- Hipóteses indefinidas nesta direção são já evocadas na concepção clássica de
II'~ 1lr'II"'llinadas observações e determinadas conclusões tém de ser' garantidas procedimento. A sua idéia central era assegurar uma esfera de comunicação mais li-
11111111"h, i,4atórias, Há sempre um sentido que não pode ser negado sem tirar vre e mais independente contra as influências da sociedade, vantagens do status ou
,111111'1.,u-lr-vá ncia social à própria opinião e sem que se sacrifique a possibilidade de harmonia de papéis, sob a forma do processo legalmente organizado. Isto consti-
11111IVI'II~d(), (' um dos resultados essenciais do método comunicativo em muitos tuía um pensamento certo, de importância permanente. Todavia, era ilusão inter-
1"11' 1dlllll'I1lOS consiste em agrupar de tal forma o sentido confirmado que se torna pretar uma tal solução como um meio para alcançar o objetivo da verdade - uma
.111111111110 I) espaço de manobra da decisão. Está igualmente fora de dúvida que, depreciação do problema da complexidade, típica da época do iluminismo. Por
1·1111"ItI)J(' c orno anteriormente, verdades com este sentido específico não são su- meio do livre estabelecimento da comunicação não se pode alcançar nenhum ob-
111IIIII,'~ p.ua Icsolvcr todos os problemas com uma absoluta certeza intersubjetiva. jetivo. O mesmo se passa, como veremos, quanto à diferenciação e autonomia
1'111I~~I), uma teoria do procedimento necessita dum ponto de vista mais abstrato relativa do procedimento, condição prêvia inalienável da sua capacidade de le-
rll' ,,'1.",;1() lu ncion a l, que inclua o mecanismo da verdade, mas que não se esgote gitimação; porém esta obra de legitimação só é levada a cabo duma forma muito
11111 I', nu tura l que para isso se apóie na função da verdade e, partindo dela, se mais complicada, como pode ficar expresso no pensamento conforme meios e fins
1""' 1111'11'ouu os mecanismos de transmissão funcionalmente equivalentes, de com da teoria clássica. E ela não será facilitada nem só por si, nem sequer pela verdade.
101, III.,d(' mais i eduzida , Aí deparamos com o mecanismo do poder e o problema
rI,l '11,1 1I',4ililllidade. A descoberta e crítica das premissas da teoria clássica do procedimento cons-
titui o primeiro passo na preparação das nossas investigações. Mas ele, só por si,
I', '1111'() poder também um mecanismo
é de transmissão de resultados de seleção não €i suficiente. 'rambém o conceito e princípios de uma teoria de legitimação
t .111 1111'\1111) d(' obras de seleção produzidas pela decisão. Quem tem o poder pode careceriam de demonstração, pois também eles estão aquérri daquilo que a teoria
1111111\.11OIlIIOS a adotar as suas decisões como premissas de procedimento, por ta n- sociológica pode hoje realizar. Para este assunto necessitaríamos de mais um ca-
111, .1 ,1(1'11,11corno compulsiva uma seleção dentro' do âmbito de possíveis alter- pítu~o.
u.iuvns d,' comportamento (25). A transmissão intersubjetiva tem, pois, aqui, fun-
rI.'"U'IIIOS diferentes dos que tinha no caso da verdade. Não pode ser apresentada
1111110r ouscqüência da razão de ser do mundo contra a qual uma pessoa se possa
.,h~\1I dalll('IILc revoltar. Ela constitui a atenção desejada de uma decisão.

\ .trlOI,<lO de resultados de uma seleção baseados apenas em decisões, é fato


'1"1 ',11"«' (\e motivos mais especiais (26). A verdade de certas premissas de de-
I 1'.111,~I) pOI si, não é suficiente para isso. Portanto, tem de se partir da hipótese de

11 I" ,,'cI,u 11.JOI\," S",ialphilm.uphic der indust riellen Arbeitswelr (Filosofia social do mundo indus-
I' ,,01cI•• 1,,01,,01100), Siuuga: t 1960, pag, 69 e segs, parece dar pouca importância à diferenciação pro-
1'11101" cI", nu: ,ll\i'IIIO' de transrrtissão, quando deduz a radicalidade da pergunta atual quanto à le-
1111111'\."" ti" 1'0<11",din-rameruc da comui acão da metafísica sobre a subjetividade da consciência do
1""1"'" .,oIf11 1)1110\111\1'11«' agor a Bernard Willms: Revolution und Protest oder Glanz und Elend des
111\'11,,111 1,,'11~"hj('kl' (Revoluc ão c protesto ou brilho e desdita do sujeito burguês), Stuttgart-
1\,,11111 (:"11'1",,.MO!(IIlH ia, 1969. Existe uma relação que concilia a prática, mas realiza-se através da
III"rln 'li' 1111 ,11"'111\.1<11'
di' V"Id,lelt', pou aruo da carência de decisão.
~HI l'I('~ltiIH ,11.f UlU ,'1111 ti" 1014 •••1 djl Ollh'-1I1 (aut hoi ity). em Herbert A. Simon: Das Verwahungsha n-

di, 11 11"1 11111'


,,11111111111
.1"1 I',,,,, 1It,,,ltlllllsvOlg,IIII(('
in Behõrden und privatcn Unrernehrnen (A ação
1I1I1I111I1"lltHI\,1 111\' ~IIK''',llo .lu", IHtHI'IiI"III" dc' d('(I'~IO ern repartições e empresas privadas). Direitos de
111,,111',,1"
~IIIIIN,III1'1',', ""li Mil, IoI'N'
,'li I ,11111.,111 ,Ulld 11 IIU I "IIII\IU" li •• I'"d,', "'If ddl'lt'IH id cio mecanismo da verdade. A verdade é se-
Muid,1 ,., HI 111*'11\"" It'I"I.Ld~ lU 111~Iqq, I t' ptl",h, l nulu _o H!'t nun ivos pelos quais se prefere considerar as
\oj I d~.t,·" I' I 11111"- I id,u fJ~!I' ,••.- I flll ••i~'I' II 111 I" d"1 I~t-H''' i,lhc'!.\\ (orno ,IS próprias premissas de compor-
IIIII,,"WIt. '1111 HIII!' 1'.-".(1'1 ftll .".!all"I'~H'h_lit, IIHI' IUlld,UIU'1I14t1 1H'I.tlHt' bi mesma C perante os outros e
1111111111;11 1111111\"" jlt-fI,,1 j'lIIf1 A IlfI +t1.1" nll IJ"'" "U \1111, •• 1411,1"" 4''''1101111,,\ de' ,c'IHido SdO substituidas. por
P~tllqtlll " 1I11I1I"-'I.•lIlIul I!plo do! ilil p'.liIj,lll~tJ illlllH·IH,. IUlllhhn ,I lIf·tc'",,,,id.ulc' (1(. IlluLÍV()"o (' r arioua
CAPÍTULO 11
Legitimidade

Usado na Idade Média como conceito jurídico para a defesa da usurpação


e tirania e com este sentido consolidado e propagado principalmente pela res-
tauração napoleônica, o conceito de legitimidade perde o seu fundamento moral
com a positivaçâo do direito, que se impôs completamente no século XIX (I).
Primeiro foi equiparado à posse do poder efetivo, depois foi usado de novo para
dominar a problemática dum princípio de legalidade puramente positivo. For-
mulado com este fim, e abstraindo das tentativas para a restauração do direito
natural, o conceito foi impelido para a realidade pura. Hoje ele significa a convic-
ção, realmente divulgada, da legitimidade do direito, da obrigatoriedade de deter-
minadas normas ou decisões, ou do valor dos princípios que as justificam (2). Mas
apesar de tudo isso só se conseguiu chegar a uma pergunta: como é possível divul-
gar a convicção real da legalidade ou da força compulsiva desta decisão, quando só
alguns é que decidem?
Normalmente a informação é concebida nos seguintes termos: nenhum sis-
tema político se pode apoiar apenas sobre uma força física de coação, mas antes
deve alcançar um consenso maior para permitir um domínio duradouro. Como
também é certo que um consenso atual, baseado na coerência "casual" dos interes-
ses, não constitui apoio suficiente da soberania; os rebeldes têm de poder ser do-
minados em caso de necessidade. Ambos, coação e consenso, têm, portanto, de

o pomo da discussão era o problema do ditador deposto pela força. Aí se demonstrou ser impossível
achar um momento determinado, a partir do qual a legitimidade se transferisse para o novo governante,
ou então indicar critérios racionais segundo os quais esta transmissão pudesse ter sido construída jurt-
dicamente. Para esta discussão que termina com o futuro do conceito de legitimidade como conceito
jurídico, ver Friedrich Broackahus: Das Legitimitats prinzip. Eine Staatsrechrliche Abhandlung (O prin-
cípio da legitimidade. Dissertação de direito público). Leipzig 1868.
2 Ver em Hans Welzel a visão de conjunto sobre o debate jurídico: An den Grenzen des Rechts. Die
Frage nach der Rechtsgeltung (Nos limites do direito. A pergunta quanto ã validade ju-
rídica). Colônia·Opladen 1966. Quanto a declarações sociológicas e politolôgicas conf. com Gaeteano
Mosca: Die her rschende Klasse. Grundlagen der polirischen Wissenschaft (A classe dominante. Fun-
damentos da ciência política), Munique 1950; Max Weber: Wirtschaft und Gesellachaft (Economia e
sociedade) edição de estudo, Colónia-Berlim 1964. pags. 22 e segs, 157 e segs: e ainda Johannes Winckel-
man: Legitirnitat und Legalitat in Max Webers Herrschaft-soziologie (Legitimidade e Legalidade na
sociologia da dominação de Max Weber), Tübingen 1952; Guglielmo Ferrero: Macht (Poder), Neuwied-
Berlim 1962. pags. 70 e segs.. Carl J. Friedrich: Die Legitimitat in politischer Perspektive (A legitimidade
numa perspectiva política), Politische Vierteljahresschrift (Publicação política trimestral) 1. 1960. págs.
119-132: do mesmo autor; Man and his Government (O homem e o seu governo), Nova Ior quc-Sâo-
Francisco-Toronto-Londres 1963, pags. 232 e segs.: Seymour Martin Lipset: Soziologie der Demokratie
(Sociologia da democracia). Neuwied-Bcrlim 1962 pags. 70 e segs.: David Easton:A Systems Analysis of
political tire (Uma análise de sistemas da vida políuca), Nova lorque-Londres-Sydney l gêg , principal-
Jlwnl" p.ll(S 2711,. M'/I'
30 FUNDAMENTOS LEGITIMIDADE !lI

(')(I~III ~CJh qll,!1qU('1 forma de relação de associação (3). Com ce rtez a isto é exato, ciona1íza, tem de ser altamente instável - ou então que requer garantias muito com-
II"I~ 11'1\1 1'0 11tol impon áncia quanto aos processos efetivos que produzem o fenô-
plexas e instituições complementares em todos os domínios da vida pública, garan-
11111111 npollltosn (' surpreendente duma aceitação geral das decisões do governo e as
tias que devem ser investigadas (7).
".11,11111'111COIIS('IIS0 e coação, ambos constituem "recursos escassos" do sistema
1'1111111 o !I. ~lIa soma não deveria ser suficiente, nem capaz, de explicar a institu- Apesar do caráter questionável da legitimação racional-legal, a indubitabi-
I illIl'''".I~d() da legitimidade. Na aceitação efetiva das decisões. a apresentação do Iidade da validade legítima de decisões obrigatórias faz parte das características
IIICIIIVIIIl'al (' a relação associativa exata - quer no caso da aceitação da decisão típicas do sistema político moderno; é como que uma espécie de consenso básico,
1'111 III('do ou por apoio - podem permanecer sensivelmente em suspenso: e. so- que se pode alcançar sem acordo 'quanto ao que é objetivamente justo no caso par-
I iologicamente, o problema é exatamente esta indecisão. esta generalização d~ Ü.cular e que estabiliza o sistema (8). Sem a certeza de que decisões. obrigatoria-
IC'gilimidade que provoca uma aceitação quase desmolivada, tal como no caso da, ,nente tomadas, também são a9andonadas, as burocracias racionais em grande es-
verdades. Pode definir-se a legitimidade como uma disposição generalizada para cala não poderiam funcionarj' Na medida em que cresce a complexidade da so-
aceitar decisões de conteúdo ainda nào definido, dentro de certos limites de to- ciedade no decurso do progresso civilizacional, aumentam os problemas carecendo
lerãncia. Porém, com isso fica em aberto se na base dessa disposição se encontra de solução e, portanto, têm de se ultrapassar as formas mais antigas de acordo es-
uma causa psicológica relativamente simples - como que uma satisfação interior pontâneo e confirmação do que é exato. Essas formas são substituídas por mecanis-
quanto a uma troca de obediéncia contra uma "participação" democrática _ ou se mos de criação e estabilização de símbolos, mecanismos esses indiretos e mais
essa disposição é o resultado dum elevado número de mecanismos sociais que iden- generalizados. Isto pode acontecer em parte pela abstração interior categorizada do
tificam conjunturas muito heterogêneas de motivos. sistema de regulamentos, pela criação de conceitos; mas esse auxílio embate contra
Para voltar a esta pergunta e a responder fazem falta no debate do restrições, pois afinal cada decisão isolada tem de ser concretamente fundamen-
problema da legitimidade pontos de apoio suficientes. O conceito que mais se tada. Por conseguinte partindo dum determinado limite de desenvolvimento, têm
aproxima da nossa pergunta quanto à legitimação pelo procedimento. por exem- de se procurar qualitativamente outras formas de legitimação de decisões. Devido à
plo, é o conceito da legitimidade racional, baseada na crença na legalidade das or- elevada complexidade e variabilidade do sistema social da comunidade, a Iegiti-
dens est abclecidas, exposto por Max Weber (4), que não deixa identificar suficien- mação do poder político já não pode ceder a uma moral apresentada de forma
temente a forma como uma tal legitimação da legalidade é sociologicamente pos- natural, antes tem de ser aprofundada no próprio sistema político. É, portanto,
sível (5). As mais recentes pesquisas também não avançaram muito neste ponto legítimo, como Bourricaud oportunamente formula, "u n pouvoir qui accepte ou
(6). Em primeiro lugar deve parecer que uma ordem social, que apóia a validade même qui institue son propre procês de légitirnation" (9) (um poder que aceita ou
de quaisquer conteúdos jurídicos apenas no procedimento e só assim os institu- que até institui o seu próprio processo de legitimação). Além disso tem de se as-
segurar que decisões obrigatórias sejam consideradas como premissas do compor-
tamento, sem que se possa especificar com antecedência quais as decisões concretas
g E.V. Wallcr: Power and Violence (Poder e violência). The American Political Science Review 58 que serão tomadas. A legitimação pelo procedimento e pela igualdade das pro-
(Revista americana da ciências políticas 58), 1964, págs 350-360, apresenta uma visão de conjunto sobre babilidades de obter decisões satisfatórias substitui os antigos fundamentos jus-
inúmeras variantes, em que se defende esta opinião. Ver, como redação digna de atenção, de Stéphane { naturalistas ou os métodos variáveis de estabelecimento do consenso (10). Os
Ikll1uld: Esquisse dung théorie structurelle - fonctionelle du systêrne politique (Esboço duma teoria
rNI,ut ••ra l funcional do sistema político). Revue de I'Institute de Sociologie 36 (Revista do Instituto de
Sucinlugia 36), 1963,pags.594-614.
dáncia legal: 1) "the use of recognized sources of authority" (o uso de fontes de autoridade reconheci-
I VI'r a exposição de Max Weber,op.cit.:Wirtschaft und Gesellschaft (Economia e sociedade). das), 2) "the clarity of legal norms" (a clareza das normas jurídicas), 3) "the use of specific sanctions and
r. Jo.Jnhoraeste conceito esteja no centro da obra principal de Max Weber, é, sociologicamente, o penalties" (o uso de sanções e penalidades específicas) e 4) "threat to the individual's staying in rhe sys-
,nlliN1101(0c deixa reconhecer, ainda menos do que os conceitos de legitimidade tradicional e caris- tem" (ameaça à permanência do indivíduo no sistema), pago 384. Tais condições' deixam em suspenso
11l~1i( .1, corno é que uma tal crença se pode realizar. É de apontar, de forma geral, que Weber não quais os mecanismos psíquicos a considerar. Para este assunto, ver ainda nota 33.
,·I"ho' ou suficientemente o seu conceito de legitimidade em relação aos processos sociais que levam a 7 Consultar aqui também Niklas Luhmann: Gesellschaftliche und politche Bedingungen des Rechts-
I ,t1lU:oI,'gitimidade e em relação às condições sócio-estruturais que o permitem. -Conf, nomeadamente,
taates. (Condições sociais e políticas do estado constitucional) Em: Studien über Recht und Verwaltung
111111 Tnlcou Parsons: Introduction (Introdução). Em: Max Weber: The Theory of Social and Eco- (Estudos sobre direito e administração), Colônia-Berlim-Bonn-Munique 1967, pags. 81-102.
1I()flli,'Organization (Max Weber: a teoria da organização social e econômica), nova edição, Nova lor-
8 é oportuno Reinhard Bendix: Nation-Building and Citizenship. Studies of our changing Social Or-
11"'-Londres, 1966,pags. 68 e scgs.Ver também a crítica de Peter M. Blau: Critical Remarks on Weber's der (Criação duma nação e cidadania. Estudos sobre a nossa ordem social em evolução), Nova lorque-
IIIC'C)'Y 01 Aut hority (Observações críticas à teoria da autoridade de Weber). The American Political
Londres-Sydney, 1964, pags 21 e segs. e pags 137 e segs.
SI inH" R,-vj('W f,7 ( Revista americana de ciência política 57), 1963, pags. 305-316 (311) e de Easton,
"li, I iJ , 1)'111',~()I " ~I'KN,Com isto, naturalmente, não se censurou ao investigador isolado uma omissão; 9 Conferir com François Bourricaud: Esquisse d'une théorie de I'autorité (Esboço duma teoria da
ICIIIHIII 111'111
, ,,"lr~, ~i,,",h,'IlI'icl.I<i1'os problemas em aberto da teoria clássica (de Maquiavel e Hobbes) autoridade), Paris 1961, pago 7. Para os juristas e filósofos do direito, que não explicam o problema em
dll )11101," )11111111111)11"_l, 1'001,· "I" COllvNlid"em lema por meio duma mudança racional do princípio da conceitos como trabalho e organização, mas que procuraram compreendê-Io como relação de depen-
\1'111111<111 1'11011'1 V" ,\1,"1" )1,1111 1"", .1'~lIl1toli u'nl9tiva de Talcott Parsons: On the Concept of Political dência suspeita e, por essa razão, continua a ser atual o problema do direito natural. Ver, em vez
I'"w'" 1'11"''1'11111,," 1111111' i\ III1',Ít,"1 1'lolio.'"l'hil,11SOciNy, 107 (Sobre o conceito do poder político, Atas
doutros, Luis Legaz y Lacambra: Legalidad y Legitimidad. (Legalidade e Legitimidade). Revista de Es-
01.,~1I1 II'Ii"d, 111"0(,)).,1111111,11'1111.1 IO'/) l'lh~, )I,IílH2!12262. tudios Políticos 101, 1958, pags. 5-21.
to I '"1 "'''li """111.01)I,h li""" '"1 ti., , •.•" 0" 011'IIII!.Ini',I,ilo: Oaniel Katz/Robert L. Kahn: The 10 Também Talcott Parsons: Societies. Evolutionary and Comparative Perspective (Sociedades. Pers
1>'101.01
1'.v.IIIIIIIIII'i,) f)'jI,IIIÍ'!illlIlI. (\ I"" 1111111'"
0111'111 clllHfllgal1il.açõcs),Nova Iorque-Londres-Sydney pectivas evolucionãrias c comparativas). Englewood Cliffs Nova lorque 1966, pag 27; ver deste mnrlo
lil"" II.I~,\ 11, Ifl!' 11·:".1:,." 1I,00'"III),li""II' (, '"U ,,,c1I\,1C 111 h'g,tI) como um problema de psicologia o pensamento de processo jurídiro ('(l,no 11m•• aquisição evolucionária : "Only on d.r basis of PIO("1111.11
1111;,1I"'I~ I1"~III••i,.~" ',11
1 I i li d. 11", .IIIjIlIJI""~IIII,Irlllt'•. SI'" '"""('lId,IS quatro condições de concor- plinllu y cun tlU' .y~I<""(01'" whh I' w'(I•. valil'lY 01 I hlllllllnl{t'Ír(,IIn1Nt"n('r~arlllIY(i"~(lI ('UNI'N
witllllllt
32 FUNDAMENTOS LEGITIMIDADE 33

procedimentos encontram como que um reconhecimento generalizado. que é in- cc duma verdade e justiça em que realmente se acredita r.Nephum sistema político
dependente do valor do mérito de satisfazer a decisão isolada, e este reconhecirnen- pode, pois, fazer depender a sua estabilidade de atingir objetivos tão exagerados e
to arrasta consigo a aceitação e consideração de decisões obrigatórias. ninguém está em situação de criar convicções para todos os temas atuais de-decisão.
Esta opinião desconhece a alta complexidade, variabilidade e capacidade de con-
Max Weber não só deixou em suspenso os mecanismos sociais, que podem tradição dos temas e das premissas de decisão, que têm de ser tratadas, em cada
estabilizar a arbitrariedade como positividade, como, na sua sociologia do direito caso, de acordo com o sistema político-administrativo das sociedades modernas. Es-
( 11). para além de referências à formalização da validade jurídica. não encon- ta complexidade das sociedades modernas só pode ser tida em conta pela gene-
tramos qualquer análise elaborada do procedimento legislativo ou judicial como ralização do reconhecimento de decisões. Depende muito menos de convicções
um mecanismo legitimador. Na sua época. nem a sociologia. nem a psicologia motivadas do que duma aceitação sern.motivo , independente da aceitação (nisso é
social apresentavam bases suficientes para isso. Essa lacuna pode ser hoje preen- idêntica à verdade) do caráter próprio de personalidades individuais, que se pode
chida. prever tipicamente sem demasiada informação concreta (15).
Em primeiro lugar tem de se distinguir claramente no conceito de legiti- O conceito de aceitação tem de ser correspondente mente formalizado. O
midade, entre a aceitação de premissas de decisão e aceitação da própria decisão. que quer dizer é que os indivíduos, por quaisquer motivos, assumam sempre as
Esta distinção é particularmente importante, pois o processo legitimador de decisão decisões como premissas do seu próprio comportamento e estruturem as suas expec-
f
opera sob uma condição do tipo sim/não. Existe uma grande diferença quando es-
ta condição é aplicada só às premissas de decisão ou também às próprias decisões.
tativas de acordo com isso (16). Uma tal integração de novas estruturas de expec-
tativas na antiga personalidade, que permanece idêntica, pode processar-se de for-
Pode-se optar por afirmar os princípios e as normas dos quais uma decisão tem>de mas muito diversas e afetar estruturas da personalidade mais centrais ( 17), através
"derivar" e negar contudo a própria decisão, por ter logicamente resultado errada da mudança de convicções, da abstração de regras de assimilação de vivências,
ou com base em interpretações falsas ou aceitação de fatos errados. E. ao invés. nova interpretação do passado, isolamento e encaixe dos assuntos problemáticos,
podem aceitar-se decisões, sem preocupações quanto aos méritos a que se repor- desvalorização, resignação elegante, adesão a novos ambientes etc. Encontrar a
tam, numa atitude de total indiferença, talvez até numa recusa das suas razões fórmula de harmonizar, que permita uma integração na personalidade pela con-
como regras gerais de decisão (12). À positivação do direito. isto é, a tese de que servação da sua identidade, fica a cargo da fantasia e do poder criador do par-
rodo o direito é posto por decisão, corresponde a estabelecer o conceito de legiti- ticular e das suas chances de apoio social. Em todo o caso, na base do reconhe-
midade sobre o reconhecimento das decisões como obrigatórias (13). Este é o con- cimento está um processo de estudo, uma transformação das premissas segundo as
ceito mais amplo. Compreende, também, o reconhecimento das premissas de quais se elaboram os acontecimentos e se escolhem atuações em que o indivíduo
decisão. contamo que se decida sobre elas (noutro tempo e através doutras pas- procura continuar a viver em protesto contra a decisão, apresenta resistência, vai
sagens). Igualmente, leis, atos administrativos, sentenças etc. são, pois, legítimos sempre buscar o seu direito lesado, volta sempre a arrancar a crosta da ferida e
como decisões, quando e enquanto se reconhecer que são obrigatoriamente válidos procura organizar auxílio e adesão contra a decisão, em resumo, não aprende: per-
c nevem fundamentar o próprio comportamento. manece com as suas anteriores expectativas frustradas. Por meio dum aprendizado
Com esta definição as dificuldades deslocam-se para o conceito da apro- bem sucedido, as expectativas alteradas pela decisão serão automaticamente con-
vação ou aceitação. A opinião predominante considera este conceito dum ponto de sideradas de dentro para fora e tratadas como um fato (oportuno ou inoportuno);
vista demasiado limitado quando suprime a "convicção" da autenticidade dos
valores. princípios de legitimacão ou teor das decisões (14). Esta noção estreita har-
moniza-se com a concepção clássica do procedimento como busca da verdade; subs-
titui o conceito absoluto de verdade por um conceito relativo, que tranqüiliza o es- 15 Esta. é realmente a razão pela qual não se conseguiu desenvolver uma teoria psicológica da le-
pírito. A convicção da autenticidade das decisões deveria ser divulgada pelo alcan- gitimidade legal. A legitimidade legal, em relação aos mecanismos psíquicos ainda não está especifi-
cada.
16 - A teoria sociológica mais moderna das alterações de organização termina, aliás, em considerações
prior commitmcnt to specific solutions" (Só com base na primazia do processo é que o sistema pode semelhantes. Uma organização é alterada. não através da decisão formal, mas sim através duma reor-
medir forças com uma grande variedade de circunstâncias em alteração e tipos de caso sem um anterior ganização das expectativas. Para isso não é necessária nenhuma alteração das personalidades partici-
cumpromisso corri soluções específicas). pantes (como pretendiam os partidários do movimento das relações humanas) mas sim apenas uma al-
II Ver Max Weber: Rechtssoziologic (Sociologia elo direito). Neuwied 1960. teração das esperanças efetivas de papéis no grupo. Ver, por exemplo, Cyril Sofer: The Organization
I\! Para ('SIC assunto conf. com o capítulo sobre "Dccision under Protest" (Decisão sob protesto), de from Within: A Compara tive Study of Social Institutions Based on a Sociotherapeutic Approach (A or-
(;,·"lIoc'y Vi(k('r~: '1Iw Arl of judgernenr. A Siudy of Policy Making (A arte do julgamento. Um estudo ganização vista por dentro: estudo comparativo das instituições sociais baseado numa abordagem só-
~11111(' U 1'1 •• 1>••• "~,,,, do' Jlolh i< .rs). Londres 1965, pags. 216 e scgs. cio-terapêutica), Chicago 1962, pago 102 e segs; Eliot D. Chapple/Leonard R. Sayles: The Measure of
I~ A "1'"".111 c\II'U"",'''U' 1(·'1Ik. contrariamente a isto, a considerar como decisivo o reconhecimento Management (A medida da administração), Nova Iorque 1961, pago 191 e segs.: Robert L. Kahanl
0111' 111/'" 11.10\ 01•• 01,·, ",111, "101' I," ilN VI'/rs ,·st.1 claramente consciente desta distinção. Isto pode estar em Donald M. Wolfe/Robert P. Quinn/Dietrich j. Snoek: Organizatinnal Stress. Sudies in Role Conflict
•.•100"1.\00'1.,\11"''''li " ",111"""11""\"" I,IIIl"'I1l"H(' difundida, ela lógica da opção jurídica .. and Ambiguity (Tensão de organização. Estudos sobre conflito e ambigüidade de papéis), Nova Iorque-
11 1"".101"" Ii ,••, j""'III., .(, ")111',"'o 1)'11'(UI"(·~., a explorar o ideal da socialização total e confor- Londres-Sydney 1964. pago 396; Daniel Katz/Robert L. Kahn: The Social Psychology of Organizations
lI,id"",, li;' t'~lh·"t",i,. f' 1\,1.,,,,I~'.~II 1.11111'""" 1)('I\1\i.' Wrong: The Oversocialized Conception ofMan (A psicologia social das organizações), Nova Iorque-Londres-Sydney 1966. pago 390 e segs.
ill 1\1••"",," :\ ••, illl"II' «(I (1'"' fi", ~III'" .", 1,0111.11111 do homem na sociologia moderna). American 17 O.J.Harvey/David E. Hunt/Harold M. Schroder: Conceptual Svsterns and Personality Organi-
li' 1,,1"lIh "I Il,'Yil'W 1.'1, (Ilr>\i"" ~I" .,,1"111'H '"'" 'li ."". ~h). 1!J61, pago Hl3 e principalmente Irving zaLion (Sistemas conceptuais e organização da personalidade), Nova lorque-1961 apresentam, por exem-
1!1I~i.'W- I',,, '". ,,",1 1111\' tÍffi'" tll 1\'-''''' :;O(;1111,.11 ",,' (h" III,I~ ~ funçóes de socialização adulta). Social plo, uma possibilidade de aperfeiçoamento psicológico deste pensamento. Estes autores atribuem uma
lu, (~'. ,I I é 1',,"•.1. "fI! h.l. '\",1 I !I!i~,P;'HI ~~ '1:'0 '\1,"1 •• II~ V 1'", Ir. , ,'pll "I" IV. importância especial li dimensàu centro periferia.
M f1JNDAMENTOS LEGITIMIDADE !lo

1\0 ,lplcndizado fracassado há necessidade, de situação para situação, de estímulos pergunta de como o sistema parcial político-administrativo da sociedade pode rees-
,"xll'liOtes para estabelecer um comportamento correspondente à decisão. truturar as expectativas na sociedade, através das suas decisões, apesar de ser
apenas um sistema parcial. A eficácia desta atividade duma parte pelo todo depen-
Um tal aprendizado não pode ser realizado pelo indivíduo sozinho, não pode derá, consideravelmente, de se conseguirem integrar novas expectativas em outros
VI"11 IIt:\lse sem apoio social. Uma mudança de expectativas, que servem como sistemas estabelecidos - quer personalidades, quer sistemas sociais, sem causar
JllC'lIlis~,IS de comportamento e, em determinadas circunstâncias, estruturam todos neles considerável transtorno de funções.
II~ .uuhitos de papéis, põe em perigo a identidade pessoal do indivíduo; essa mu- Quando se concebe de forma realista quanto se distinguem as personali-
11."11;.1(. demasiado problemática, como se pudesse realizar-se sem fazer caso da dades e os sistemas sociais nas modernas organizações sociais diferenciadas, quanto
IIJlIIII,1Odos outros. Ela não deve ser apontada ao indivíduo como uma contradição as personalidades se individualizam e os sistemas sociais se especificam, é de sur-
1'1'1,1111(' de próprio, como uma quebra com o seu passado, como um sinal de pouca preender, em primeiro lugar, que seja mesmo necessária uma doutrina de orien-
'11I11Ii.lnça pessoal, ou de culpa. Ela não deve desacreditar a sua auto-ré- tação centralizada. É de admirar, ainda com mais razão. em que medida a di-
1""M'nt;tçao, deve antes aparecer aos presentes como evidência, como ocasionada minuição das decisões obrigatórias se tornou efetivamente uma coisa natural e neste
pw IfIOIivos exteriores. A legitimidade depende, assim, não do reconhecimento caso uma rotina irresponsável. Isto tem, naturalmente, várias causas - muitas
"vuluut âi io". da convicção de responsabilidade pessoal, mas sim, pelo contrário, mais do que podemos abranger e examinar no contexto desta pequisa. Contudo há
,111111 r lima social que institucionaliza como evidência o reconhecimento das op- uma coisa que é certa; numa organização social de grande complexidade esta obra
"Õ"II oln ig atôrias e que as encara, não como conseqüências duma decisão pessoal, não poder ser deixada a cargo do acaso, mas antes tem de ser realizada ou então
III,IN sim corno resultados do crédito da decisão oficial. Só através da substituição dirigida , não apenas de per si, nos processos de decisão do sistema político-
.1.1 urorivação e responsabilidade pessoal se podem preservar a justa proporção administrativo. O que nos interessa é, em primeiro lugar, a contribuição para a
'lI'ee'H~alÍa de observância de regras e uma prática de decisão que decorra sem legitimação das decisões que o próprio sistema de decisão pode apresentar.
"tlullldade em organizações sociais muito complexas, que têm simultaneamente de
A consistência interna do regulamento jurídico estabelecido através de
dllc'H'ndar com rigor e individualizar as personalidades. Só quando se renuncia a
decisões constitui, de mais a mais, um importante fator de legitirnação - ainda
viII. ula: o conceito de legitimidade à autenticidade das decisões, na qual se
que um entre vários. O trabalho político-jurídico, o cuidado na votação dos
li lI'dita pessoalmente, se podem investigar convenientemente as condições sociais
programas isolados de decisão e, do mesmo modo, a retórica jurídica e o talento
d.1 rustitucionalizaçâo da legitimidade e capacidade de aprendizado nos sistemas
mímico dos magistrados administrativos na aplicação do direito, ou do juiz, cons-
oc l,tiS.
tituem momentos do processo de legitimação. Encarado como procedimento, este
QUI' a transformação estrutural tem de dizer respeito a um contexto social trabalho simbólico-protocolar sobre o direito traduz a legitimidade duma opção
dI' expectativas - e não a uma personalidade individual - é, de resto, condição em relação a outra e facilita assim o estudo. Os limites internos desta arte torna-
!,1('vi.1 para uma mudança efetiva de comportamento. A adoção duma nova con- ram-se, pois, evidentes na autocrítica da teoria do direito das últimas décadas; e os
e C'pc;.1\I (11' direito. sugerida pela decisão oficial, sozinha significaria pouco. A con- limites exteriores consistem em que a sua aplicação exige uma cultura especializada
IOllllidnde atingida por este meio é, muitas vezes, sobreestimada pelos sociólogos e, em e que tem de se especializar quanto a papéis determinados, cuja lógica profissional
li' imciro lugar, mesmo pelas teorias jurídicas pré-sociológicas, que pretendem específica desperta, como um todo, uma desconfiança, não formulada. Por isso
II1Wtodos os problemas se podem resolver pela divulgação das convicções certas. Na mesmo é oportuna a pergunta de se, junto dessa legitimação por implicações sim-
VI'Ic1,l<lc', ainda está por resolver em sociologia o problema da eficácia de ação de bólicas, por relações compreensíveis de "se/então" entre decisões, não existirão
.t!tc'raç()cs de orientação e só é certo que, de novas orientações, não decorre sem outras formas de legitimação - como a legitimação pelo procedimento.
ICI.II~undu um comportamento correspondente ( 18). Até mesmo a interiorização de Se se entender a legitirnação de decisões como um processo institucionali-
1I0V,IN PC'lspcctivas significa apenas que desvios e outras reincidências de formas ul- zado de aprendizado, como uma transformação estrutural permanente de expec-
,,11, .If>assadas de comportamento se tornam problemas de consciência e não que se tativas que acompanha o procedimento de decisão, então não se pode indicar. com
lI'alilt·m. A adoção, sempre necessária, de decisões surpreendentes, não se pode a pergunta quanto à legitimação pelo procedimento jurídico, a relação jurídica
111IC'IlHU apenas para os mecanismos psíquicos. com o direito processual, nem a sua crítica político-jurídica. Se as eleições corres-
pondem ao direito de voto, a votação plenária ao regulamento das sessões do
1'01 conseguinte, na legitimação de decisões trata-se, basicamente, dum es-
parlamento, os registros de provas à organização dos procedimentos e se os re-
tllclo Vl'ldadtiro, se possível isento de perturbações dentro do sistema social (19).
gulamentos existentes carecem ou não de reformas de caráter jurídico, isso são
11.11.1M' dum aspecto do problema geral de "como alterar as perspectivas" e da
outras perguntas. A legitimação pelo procedimento não é como que a justificação
pelo direito processual, ainda que os processos legais pressuponham um regulamen-
IH Ce",! 111m Millon Rockeach: Au itude Change and Behavioral Change (Mudança de atitude e to jurídico; trata-se, antes, da transformação estrutural da expectativa, através do
1U,"t""~,1 ,\•• mmpcnl.un('lllo). Public Opinion Quarterly 28 (Opinião pública, 28) 1966-67. pags. processo efetivo de comunicação, que decorre em conformidade com os regulamen-
,~" MIO tos jurídicos; trata-se, portanto, do acontecimento real e não duma relação mental
111 c;••"'" 'rlll""VI' III1IÍtllllCh" '1IIr. ttlllluclll, •••••rua sobre as bases fracas da teoria clássica da ciência
normativa. Não existe um conceito sociológico de procedimento que exprima esse
,", ,,,,,,., •••"''''''"'". '"111 '""1 111l,"'dlill M'H"dCh.,rlrl C. Callahan: Law and Learning Theory. A
""Iv I" I "lI_1 (;",,1•••1 (I.rl ., 1""11_,1." '~I" i•••.• ,,"IH Illbrl' () conrrole legal). The Yale Law Journal 53 dado emptrico , Eis por que, antes de passarmos à investigação pormenorizada,
(ltni.l~ ,Ir 11,"·•••,.Ir \'.111r.~), ItlH,1'."" 1.1''' temos 1>1 inwilO de nproluud,u ,'Sst' conceito.
I
if

CAPÍTULO m
O procedimento como sistema social

A dogmática jurídica apresenta, em substância, três conceitos básicos para


,.. uma compreensão teórica do procedimento. A sua teoria processual constrói o
processo, quer a partir do conceito básico da ação, quer a partir do conceito básico
da situação (situação jurídica), quer ain-da a partir do conceito básico da relação.
Estas três concepções aparecem em primeiro lugar como quase sociológicas,
praticamente libertas de regulamentos e de aplicação empírica. As teorias corres-
pondentes do procedimento estão, contudo, em conflito irreconciliável e demons-
u arn , por esse meio, a sua insuficiência (1). Para uma teoria jurídico-sociológica do
procedimento nenhum destes conceitos básicos seria suficiente. No desenvolvimento
das mais modernas teorias sociológicas, às quais se deve também ligar a sociologia
do direito, conceitos como os de ação, situação ou relação parecem antes estar as-
similados ao conceito de SIstema social e desta forma integrados na teoria (2). O
proced irnento também pode ser compreendido como um sistema social de ação, de
Iipo especial.

Aqui existe um erro óbvio a ser evitado: um procedimento não pode ser con-
Nicl('1 ado como uma seqüência fixa de ações determinadas. Uma tal opinião con-
( ('bel ia o procedimento como um ritual em que uma única ação estaria certa em
c.ula caso e as ações estariam de tal forma encadeadas que, excluindo a possibi-
~ 1111,,(\('de escolha, uma dependeria da outra. Essas ritualizações têm uma função
c'spl.,tifica. Fixam a ação estereotipada e criam assim segurança, independentemen-
1(' das conseqüências fáticas que são depois atribuídas a outras forças, que não a
.I~.\() (S).

Para esta forma de redução da complexidade existem também, nas comu-


nnludes muito civilizadas e diferenciadas e mesmo nas organizações relativamente
r.uiouais de tipo profissional, possibilidades de aplicação, sobretudo nos lugares

.aetano Foschini: Natura giuridica dei processo (Natureza jurídica do processo). Rivista di diritto
1ro(t'ssuale S (Revista de direito processual 3), 1948. págs. 110-115. pôs, com toda a acuidade, o pro-
1ll~rna da unificação das teorias do processo jurídico. Entretanto sã conseguiu reconduzir aquele con-
{I"lO básico para "aspectos" duma realidade única e não a um esclarecimento conceptual da unidade
desta própria realidade.
Trata se(' aqui, duma evolução não totalmente incontestada, uma tendência decisivamente afas-
tada por muitos. Não obstante. a teoria dos sistemas é atualmente a única concepção que pode, com
I MUO. reinvidicar ser, pura e simplesmente. teoria da sociologia. Conf. com Niklas Luhmann: Soziologie
.,Ia l'heorie soriat er Sylteml' (A sociologia como teoria dos sistemas sociais). Kolner Zeitschrift für 50-
1IC1IClUir \111(1 S()li.,lp~YIholouir 19 (R,·vi~I., • ClIII"I'''~I' de sociologia e psicologia social 19), 1967, pags.
li!'. 11-11
" I'~," 'I 1.lllhlll~lI •• I:XII"1101 "'"'u ,1',"1& " .lI' ".·~tllI,",·.IiOIl,'\lIf'II!() dI' .i8l('lIl11s l('I.,tivOlnlC'"lr 111111111-.
"'V 1111,,1 S.III.lilrt li'), til. llilIll.JIH
o PROCEDIMENTO COMO SISTEMA SOCIAL S9
S8 FUNDAMENTOS

colha de comportamento, não por ação de alavancàs prê-estabeiecidas , mas antes


onde se verifica uma necessidade especial de segurança (4). Mesmo em organizações
de decisão, que não vivem, em geral, de forma muito perigosa, existe um protocolo
T pela informação sobre as capacidades de seleção dos outros; isto e, reagem não
apenas às possibilidades escolhidas, como também às possibilidades eliminadas por
ritual (5); por exemplo em situações típicas de perplexidade, como na abertu-
esse meio, que se mantêm no horizonte da existência do procedimento como uma
ra dum debate oral, onde o ritual facilita o início até a cena se desenrolar por si
possibilidade negada. Assim o procedimento decorre como uma história da decisão,
própria. O ritualismo impede aqui a expressão e com isso o auto-reforço dos sen-
em que cada decisão parcial dum só participante se torna um fato, para que es-
timentos de medo e insegurança. Do mesmo modo pode servir para reprimir outros
tabeleça premissas de decisão para os outros participantes e assim 'estruture a si-
sentimentos, por exemplo, os de agressividade (6), ou de compaixão. Nos proce-
tuação geral, que não aciona mecanicamente. Isso constitui o passo seguinte.
dimentos de decisão deve, de vez em quando, haver lugar para tal - como no caso
duma atmosfera densa de conflitos, que se manifesta no protocolo rigoroso do
Uma conexão de ações desse gênero, aberta e em parte autodirigida e que
procedimento judicial, na acusação e réplica, e onde toda a agressividade se tem de
reduz a complexidade. pode ser entendida como sistema social. Os procedimentos
diluir sob a forma de propostas. Sem dúvida, os procedimentos públicos apresen-
são, de fato, sistemas sociais que desempenham uma função específica, designa-
tam elementos ritualistas em si.
damente a de aprofundar uma única decisão obrigatória e que, por esse' motivo,
Em resumo: seria com certeza falso interpretar o procedimento como rito nos são de antemão limitados na sua duração. Esta aplicação da teoria dos sistemas
atuais sistemas de decisão. Do ponto de vista histórico, os procedimentos de decisão significa, na verdade, que tem de se renunciar às violentas oposições dominantes
resultam da combinação de procedimentos arcaicos de arbitragem, sem decisões ntre sistema e processo, ou estrutura e processo, ou que estas têm de ser modi-
obrigatórias, e rituais coatores para obtenção de uma decisão sobrenatural; essa ficadas em aspectos essenciais. Os processos são sistemas e têm uma estrutura;
combinação que termina nos procedimentos, começa com francas possibilidades e, ~ doutra forma não podiam ser processos e doutra forma não podiam ser sistemas e
apesar disso, leva a decisões obrigatórias dentro do próprio procedimento - uma estruturas. Antes de podermos trabalhar com estes pensamentos, tornam-se neces-
conquista revolucionária, que marca, simultaneamente, a transição do direito ar- sã ri as algumas explicações.
aico para o direito das grandes civilizações pré-contemporâneas (7). Em contraste
corn o decurso inevitável do ritual, é característico para o processo legal, que a in-
Uma das características importantes dum sistema é uma relação com a com-
erteza do resultado e suas conseqüências e a sinceridade das alternativas de com-
plexidade do ,mundo. Por complexidade deve entender-se a totalidade das possi-
portamento no contexto da atuação e da sua estrutura de motivações, entrem em
o hilidades que se distinguem para 'a vivência te aí - quer seja no mundo, (comple-
consideração e sejam aí elaboradas. Mas não são a forma concreta já definida, ou o
xidade do mundo) quer seja num sistema (complexidade do sistema), Para cada
gesto, ou a palavra exata, que impelem o procedimento para diante, mas sim as
('(JUSI rução dum sistema é significativo que ela apenas abranja um aspecto do mun-
decisões seletivas dos participantes, que eliminam as alternativas, reduzem a com-
plexidade, absorvem a incerteza ou transformam a complexidade indeterminada de do, apenas admita um número limitado de possibilidades e as leve a cabo. Os sis-
todas as probabilidades numa problemática determinável e compreensível. É-lhes tt'liHIS constituem uma diferença entre interior e exterior, no sentido duma diferen-
atribuída a seletividade duma comunicação. Ela empresta-lhes o sentido, (não (iaçao em complexidade, ou ordem. O seu ambiente é sempre excessivamente com-
como a cópia fiel dum modelo existente), e os participantes reagem com uma es- ph-xo, impossível de abarcar com a vista e incontrolável; em contrapartida, a sua
(lJ(!l'1l1 própria é extremamente valiosa na medida em que reduz a complexidade; e
r omo a~ão inerente ao sisteÇ1a só admite, comparativamente, algumas possibili-
4 É esse. por exemplo. o caso. quando o sucesso tem de ser alcançado à custa de riscos elevados e não d"dl's. A ordem inerente do sistema pertence ainda um projeto seletivo de ambien-
depende só dos que trabalham; para a organização militar consultar Morris janowitz: The Professional 11', uma visão "subjetiva" do mundo, que, de entre as possibilidades do mundo, só
Soldier (O soldado profissional). Glencoe 111, 1960. pags. 96 e segs, para a profissão de enfermagem ('Nl'olll(' alguns fatos relevantes, acontecimentos, expectativas, que considera sig-
Isabel E.P. Menzies: A Case Study in the Functioning of Social Systems as a Defense against Anxiety. A
uiticarivos. É através dessa redução que os sistemas permitem uma orientação in-
Report on a Study of the Nursing Service of a General Hospital (Estudo dos fatos no funcionamento do
sistema social como uma defesa contra a ansiedade. Relatório sobre um estudo do serviço de enfer- II'lif\('llt(' da ação (8).
magem dum hospital civil). Human Relations 13 (Relações humanas 13). 1960, pags. 95·121. Conf. ain-
da com Everett C. Hughers: Men and TheirWork(Os homens e sua obra). Glencoe lH, 1958, pags. 96esegs.
segs.
5 Conf. com o destaque unilateral e, portanto, distorcido desses ritos e mitos administrativos de ~ I\. teoria dos sistemas esboçada (cont. aqui, para além do artigo citado na nota 2, também com
IIcnri Deroche: Les mythes administratifs. Essai de sociologie phénomenologique. (Os mitos adrninis- N,~I.,· I.uhmann: Funktionale Methode und Systemtheorie, Soziale Welt 15 (o método funcional e a
rrarivos. Ensaio de sociologia fenomenológica), Paris, 1966. Conf. ainda com Peter M. Blau: The Dy- Ii'mia dos sistemas, Mundo social 15) -1964, pags. 1-25 e ainda do mesmo autor: Soziologische Auf-
namics of Bureaucracy (A dinâmica da burocracia), Chicago 1955, pags. 184 e segs.; do mesmo autor: Bu- k,\IUIIg, Soziale Welt 18 (Esclarecimento sociológico, Mundo social 18) 1967, pags 97·123) situa-se
,IIIIIV~Sduma função e aplica as estruturas do sistema a essa função. Perante isto, a teoria de sistemas
reaucracy in Modero Society (A burocracia na socieade moderna); Nova lorque 1956, pags. 86 e segs.;
,,1I'dominante na sociologia não é concebida .funcional-estruturalmente, mas sim estrutural-
Michcl Crozier: Le phênomêne bureaucratique (O fenõmeno burocrático), Paris 1963, passim. Esta
luuc ionalrnenrc. Ela analisa os sistemas apenas em relação às condições de manutenção da sua es
literatura deixa a impressão de que, na administração principalmente, uma sensibilidade aguçada ao
n utur a , portanto. não pode discutir a mudança estrutural, ou apenas em sistemas parciais em relacão a
1'110 leva à ritualização.
Nistcf1la&amplos. Para ('sca opinião consultur designadarnente Talcott Parsons: Th ••SOli,,1 Sysl<'m (O 41.
b Consultar aqui Yehudi A. Cohen: Some Aspects of Ritualized Behavior in Interpersonal Relation-
terna wd,c1). GII'IIII)(' 111: I % I. I', 1011111111 a disU\nda crescente. do mesmo auuu ()i,. jllllj(_Il' I'illwi,
~Iolp~. J luman Relurions 11 (Alguns aspectos do comportamento ritualizado nas relações interpessoais.
Rrl.,~c)r~ h"m"na~ 11), 1958. pags, 195·215.
klllllll ill "'-I ~lIl1kl,"I'J1 1u 1\1<.11111",111'1\
Th"Cllir «) I1llll~ t('(I'nl(' desenvolvimcur« 'li' 11"1"111 "01'"111",1
IlIlItiulIlIl), Kulllr' /,·i ••, 1,,1111111","1111"1111111111SO/i»lpNYlhull'III,' Ir. (Rrvl.hl 'Olcll"'1I0" lI!- ~,",,,I,,,,I.,
7
(:1'"
I\I~i,", P')! ""',"»10 I.l)ui~ (;I'lllC't: Droir ('I prêdroit em Crêce aneienne (Direito e pré-direito na
L.t iIlIIHh') I 't'tIlU('I' •.ni llilouilUIf' "".i r- '\ (C) nl\') SOt inltuliC'o. !'Ilórit' ~\). 191849. nazs. 21·119.
1'01,01",,11,.111h,1 lh), I'lh·1 ""li' ,.1 1'1 A ""dOI "0""11111111111111011,,1, .0i_I'"1
'1"1' v~ 11.1 IR ,I.,•• hlfll'
40 FUNDAMENTOS O PROCEDIMENTO COMO SISTEMA SOCIAL 41

bla função de redução da complexidade


n i,l~il(J dI' estruturas. isto é, pela generalização
é essencialmente desempenhada
das expectativas de comportamento
pela -- tema. Podem eXISl1r ou não. Tentativas
só prolongariam o transtorno.
de comunicação para apresentar
Não é raro a única possibilidade
desculpas
de prestar ho-
'1111', drpois , durante largos períodos de tempo, são válidas transitória e objeti- menagem ao sistema transtornado consistir numa retirada nâo-sistêmica.
\ 01111('1\11'
pai a diversas situações e são válidas socialmente para uma maioria. Por
111<10d,l rr iacâo de estruturas, o sistema adquire uma identidade "franca", que não A vantagem da estrutura e definição dos limites concretamente reconhecidos
( xr lu: possibilidades de variação e possui assim uma capacidade de adaptação res- do sistema não constituem as únicas formas de redução, nem as mais importantes
1111,1('I), A estrutura, que já é, ela própria, seleção perante a complexidade do am- para o nosso problema. Os procedimentos pressupõem sempre uma organização
111<111(',orn-nra o comportamento seletivo do sistema, permitindo, portanto, uma básica, sendo possíveis só como sistemas parciais dum sistema maior, que lhes
ti, Ilvl(ladc dupla e, graças a isso, um aumento sensível do desempenho (10). Ii sobrevive, que os representa e que Ihes mantém determinadas regras de compor-
tamento. Dentro deste quadro, possuem, porém, uma autonomia para a organi-
1\ ('~llutula de um sistema de procedimento é, primeiramente, delineada por zação duma história própria e é através desta história do processo jurídico que
11111111.1\ jur id icas gerais, válidas para diversos procedimentos. Estas normas não reduzem ainda mais a complexidade que lhes é atribuída.
, '111~IIIIII'nl, pOI érn , o procedimento propriamente dito e uma justificação por
H" 111\11" (,Ias não constitui a legitimação pelo procedimento. Coritudo, elas re- Para o caráter metódico do procedimento e sua relativa autonomia é signi-
dll1l'1t1 .• 1.•1 ponto o número ilimitado de formas possíveis de comportamento, que 'ol ficativo, que cada processo tem a sua própria história, que se diferencia da "his-
111111,\po~sívd, sem incómodas discussões prévias sobre o sentido e finalidade tÓI ia ge-ral". Os participantes têm, por esse meio, uma hipótese e tentam-na muitas
dlllll:1 1('\1111<10, por procedimentos individuais em movimento como sistema, definir vezes: consiste em atribuir-se dentro do procedimento, um passado novo. Enquanto
1 ~II!I \('I1I"II( ,I e os seus limites e tornar os participantes conscientes disso. Como ~(' csfoi çam por isso, envolvem-se, por descuido, naquilo que se vai tornar o pas-
1~1"III." (OIH·l"., de acâo , esses procedimentos ocupam então um lugar único no es- sado do processo legal e que restringe agora, progressivamente, as suas possibili-
l',lI," I' 110 1(,lI1pO. Adquirem, assim, uma perspectiva que lhes é peculiar quanto ao dades de ação dentro do próprio procedimento. Quem se quiser tornar mestre na
,'li ;l1It!)I( 111('(' quanto au seu próprio significado, manifestando-se numa conjun- "ft(' do processo jurídico tem, portanto, que aprender a controlar simultaneamente
IlIlil ('''1)(I lal d(' acontecimento, símbolos e representações e reconhecendo-se, co- dois passados.
1110 1(',1\1 iI ,1\('1ai, tom rapidez ( 11). As mulheres da .Iimpeza que entram demasiado
",dI) 11,1.•,,1,1 de audiências, ou os freqüentadores de restaurantes que, em vez da Para poder apresentar uma história própria do processo jurídico, o compor-
IIII'~:I P()~I" ('II(011lram cartazes de eleições, cabines, listas e fisionomias oficiosas, t ame nto dos participantes dentro dele tem de ser elegível e assim também atri-
l'I',IIHIII unt-d i.u arm-ntc que se extraviaram num outro sistema, que exclui certas hu ível . Os processos estão estruturalmente organizados de tal forma que realmente
1",~"ihilid,ldl'" dI' comportamento c abre outras. Eles perturbam, definem a si- não determinam a ação, mas trazem-na, contudo, para uma perspectiva funcional
111111, :í" (OIIlO um t r anstorno e subordinam-se com isso às regras do sistema transtor- dt,tl'l minada. Todas as comunicações, até mesmo uma declaração involuntária,
II,Id" Cont udo , nao possuem à disposição um comportamento adequado ao sis- que contribua para o processo, são consideradas como informações que abrem,
multiplicam ou eliminam possibilidades, que definem os figurantes e o seu passado
I'~II1""1,1110. " último problema funcional de relação, não estaria em condições de compreender tam- relevante e que tornam mais estreito o espaço de manobra da decisão. Cada con-
1,,',\1 ,,, 1'"11
,."", ({>l11O sistemas, cujo sentido não reside na manutenção duma estabilidade, mas sim na tributo entra na história do processo e pode, talvez, dentro de estreitos limites, ser
"'11,1111/,1\,10 d,1 MI,I t ransforrnação. Consultar como tentativa importante neste sentido Neil J. Smelser: interpretado doutra forma, mas já não pode ser readmitido. Assim, se constrói,
111111, V "I eoll('c 11
VI' Behavior (Teoria do comportamento coletivo), Nova lorque 1963. pouco a pouco, uma conjuntura de fatos e de relações de sentido, que está do-
11 (», HIU l'ItU dll
1f'~II'I<.dO C,'1:tll utu ra l de var raçõvs rem uma longa história. Para a formulação mais cumentada com o selo indelével do passado e que absorve cada vez mais incertezas.
""'"11 Rohc'lI K Ml"tOI1: Soc ral Theory and Social Structure (Teoria social e estrutura so-
'''11',,11,11 À IU7 daquilo que já está estabelecido, é interpretado e restringido aquilo que ainda
I ,,2
i.rl}, ~ " "I"~,III, <.I"II(O{' 111, 1!J:,7, pago ou lIarry M. Jonson: Sociology (Sociologia), Nova lorque
está em suspenso , A história do processo jurídico serve então, aqui, como o
1'11,11, ",'" 11'1
equivalente duma estrutura (12), afasta mesmo este processo durante algum tempo
111 1111, d"s {·"'I1'pl". "MIS conhecidos disso é a linguagem, com a sua diferença fundamental entre
como um sistema especial, em que já não é possível tudo aquilo que antes era pos-
111,""1,,. ""1M'" ,li "CI~iIlVO"c' lI'grilS de emprego dum lado e do outro a fala corrente.
sível.
\I

Desta forma o processo jurídico individual se torna uma matriz de aconte-


cimentos possíveis que só se podem realizar dentro deste processo, por causa dos
seus teores significativos específicos,

12 No mesmo sentido a sociologia de organização considera, de vez em quando, a história ou a idade


dum sistema como Fator de institucionalização. Ver, por exemplo, Philip Selznic: Tva and the Grass
Roots, Berkelev-LosAngeles 1949; do mesmo autor: Leadership in Administration. A Sociological In-
terpretation (A liderança na administração. Uma interpretação sociológica), Evanston III White
!'l.ins. Nov,l 10111"" 1%7, S,\llllld l Iuuungron: Polilic',ll Development ano Poliriral Decay (Evolução
O.Wllll.al . .t llt'l.dUl:lLL1o.L uu~.L WudilVulu.h. I? (P .• lt. u ...•••. I •• u,l ..• l '" 10"-1.. .--IHo •..•...• 1\
I' FUNDAMENTOS o PROCEDIMENTO COMO SISTEMA SOCIAL 43

1'111meio de regras de irrelevância , por meio de regras de admissão, aprovação existem expectativas de comportamento normativo-social, regras de jogo da in-
lI! PI'kW,IS e introdução de temas, por meio de regras de tradução e definição tcração , de cuja observância depende a relação dos participantes, apoiando-se
11.11111110 que perturba ou até destrói o sistema e daquilo que se pode fazer para o ou sancionando-se mutuamente e em cuja direção se dirigirá, assim, a história do
1\\1,\1, M' circunscreve o processo e se leva o mesmo a despertar para uma certa processo legal. Tal como numa festa ou numa relação amorosa, não é logo desde o
,l\llolIOlllia, até que a decisão seja emitida (13). À medida que o processo se desen- início que tudo é permitido, Os participantes têm, primeiro, de aquecer as suas
i ul.r, I\'du/('m se as possibilidades de atuação dos participantes. Cada um tem de relações, ganhar a confiança recíproca através duma aproximação de tom e estilo,
111111.11C'1l1 consideração aquilo que já disse, ou se absteve de dizer. As declarações ou também em coisas em que se possa levar para diante um ataque mais nítido,
1111I'I"oIIH'tt'm. As oportunidades desperdiçadas não voltam mais. Os protestos antes do uso dum tom mais livre. O juiz nao pode estar impaciente desde o início;
,111;",Ido~ 11aO são dignos de crédito. Só por meio de ardis especiais se pode voltar a só o pode fazer quando a evolução do processo judicial implica uma mudança para
,dlll1 \l11It\ complexidade já reduzida, se pode conseguir uma nova segurança e se uma outra atitude. Os participantes podem adquirir crédito ou perdé-lo e, de acor-
1"1I1t 1.11('1 que volte a acontecer o que já aconteceu: agindo assim, geralmente, do com isso, pôr em vigor um outro jogo de regras de interação. Se algum dos par-
cll',plIl.1 M' a indignação dos outros participantes, sobretudo quando se tenta isto ticipantes romper em lágrimas, esse pode, temporariamente, tornar-se o seu estado
d, m.ivi.ulo t ai de. em relação ao assunto e justificar um andamento mais lento ou um tom mais
humano, Em resumo; tal como é típico para todos os sistemas de interação elemen-
o~ p.u ucrpantes cooperam na determinação da história do processo jurídico. tar, os conceitos de normas, que funcionam concretamente em cada caso, estão
r"ti 11'1('111d(' se pôr de acordo quanto a um ritmo comum. Não se pode ir à frente sujeitos a uma revisão permanente; e quanto a isso, pode estabelecer-se em relação
dl~llI. () juil não pode ainda justificar a sentença enquanto o acusador estebelece a à exigüidade e clareza do sistema, um consenso relativamente rápido, na medida
11,"'.11,.10. Este imperativo torna-se particularmente sensível em interações face á em que os participantes, enquanto colegas, não fujam ao assunto e permaneçam
1.111 IIlIdl' náo se pode intercalar um tempo intermédio (nas comunicações escritas, capazes de negociar.
1'"1 (' )(('1 li pio), portanto em negociações orais. Em conseqüência do imperativo de
<,1111IO\li/,,~'à(), para uns a interação decorrerá muito depressa, para outros muito Se se utilizar esta concepção da teoria dos sistemas em relação ao processo
dI v.IH.tI. Impaciência, paciência forçada e interrupção vão ternar-se perceptíveis. jurídico, pode estudar-se a sua vida própria nas relações tcmporais, objetivas e
sociais e conhecer a sua capacidade que não se baseia nas normas jurídicas, Deve
"111111.11110que o advogado se aborrece tanto, que não 'consegue esconder com-
1111-1.11111'1\1(' que está fora do assunto e assim perde pontos, o seu cliente tem de evitar-se aqui, não só uma interpretação ritual defeituosa, como também um ponto
de vista histórico que considera o processo jurídico como uma cadeia de atuações
111H'III.II unu-s de refletir sobre o próximo passo a dar. Em situações destas, aquele
objetivas e ao mesmo tempo já passadas, ignorando com essa atitude que senão a
'1"1' I' ma is rápido, O que é típico dos participantes mais experimentados e tam-
maior parte, pelo menos as atuações mais importantes, que conferem uma nota
\11<111do~ que têm de orientar relativamente poucas negociações próprias, tem
especial ao processo isolado, são escolhidas num horizorue de incertezas e doutras
11;II\lI.t1I1ll'llle vantagem, Consegue tempo para prever as conseqüéncias da sua
.111I.1~.1OI' pai a se orientar para resultados prováveis. Tem a chance duma maior possi bi 1idades de contornos mais ou menos rigorosos. É, precisamente, esta absor-
1.11IIll1alid.\de (' duma maior influéncia sobre a evolução das coisas. O vagaroso, em ~a() da incerteza através de graus de seleção, que constitui o sentido do processo
jurídico. torna necessária uma restrição em relação ao ambiente de informações, que
I 0111l.lIlOl1tidd , está sempre sob a ação do imperativo. Tem de se orientar pelas
I ~1j.\1"lIda~ do momento, ou seja, do presente, em vez de se orientar pelas exigéncias não pertençam ao processo, e condiciona uma certa autonomia no processo de deci-
elo uturo: só pode encontrar
í a medida precisamente nas ocorrências atuais ou na são.
~II.I pl Úl)l ia condição, por exemplo, na sua obstinação, estando, assim, taticamente
A idéia dum sistema de atuação relativamente autônomo permite compreen-
c!I'IIOI.l<!O. Ele tem de atuar - e só depois é que pode definir aquilo que realizou, a
der outras características e assim também as funções do procedimento juridicamen-
11.1()M'I que isto já tenha também sido tratado pelos seus colegas mais rápidos.
u- organizado. Só porque a estrutura do sistema processual deixa em suspenso pos-
sibilidades de- comport arneruo , portanto absorve ainda uma complexidade de-
I'",a derrota faz também com que o mais vagaroso se entregue com maior
c l.u "da, se pode apresentar o processo jurídico aos participantes como um papel
\I~()I :., «xpcct ativas que orientam a situação. É dominado pela situação, ou então
(, IOI~ildo a compromissos permanentes entre os seus objetivos últimos e os que a qu« eles terão ainda de desempenhar e que compromete e vincula as personalidades
(0111 as suas próprias representações e as suas outras relações de papéis no proce-
~1I11.1~'1Orvqucr , O que parece necessário altera-se continuamente. Como conse-
dinu-nto.
1J11{l1I( iH d.1 hi~tlÍl ia do plOCCSSOjurídico e dependente daquilo que aconteceu em
pllll\t'ilO 111101.11, .1'(' 1\1('~Il\O as normas de intcraçâo social se podem alterar. Isto é
A preparação dl' papéis singulares no processo, concretizados em processos de
vn lulo l"iIlIIJl.IIII('III(' p.II.1 O~ pr orr-dirncntos judiciais. Naturalmente que as nor-
comunicação específicos do sistema, dá origem a uma separação de papéis entre o
111,1\,II"d\( .I~ ~.III JlII n.l,du 1I'IItI,,~ (' ,)('1 11\ a 111'(em constantes. Ao lado delas, porém,
processo jurídico e o seu ambiente, isto é, uma diferenciação entre o procedimento
c a sociedade em relação ao plano dos papéis. Na eleição política, o eleitor não age
!lI imariameruc como cabeleireiro, marido, colecionador de selos ou membro da
III
M'i,.1 1IIC'lOdisla não podr-, por exemplo, como contribuio da sua obra, oferecer
11111< 0111' d(' ndwlo a()~ nllldidalos ou rezar por eles antes fica vinculado ao
p.lpd <'" dl'lIOI Illldl' pud,', 1(11.11\110111111'0."cunviderar" alguns motivos tirados do
I 11111(')(10c1C1~OUIIIJLjJ.lill,;~. UlI l.Íi;uuwllUII lhlU uodmu UI01l10VCl 110 U.ul.\lIII'11I1I IIS
O PROCEDIMENTO COMO SISTEMA SOCIAL 45
44 FUNDAMENTOS
que cada passo da decisão aceitaria como premissa incriticável o sentido escolhido
illll'! esses da indústria de conservas através da compra de conservas ou da publi- pelos outros, que associasse, portanto, um passo ao outro e por este meio reduzisse
ddad(' dada às ditas conservas, mas sim através da participação na votação, ou sugestivamente a complexidade da situação inicial. Perante isto, o tempo de de-
:II.,IV(-S da influência nos votos, portanto de acordo com as regras de jogo válidas cisão dum sistema, que não se fiadefinitivamente em todas as comunicações, é
I;. At(, mesmo nos processos de divórcio, o queixoso não funciona em primeiro diminuto o meio tem, pois, de lhe conceder mais tempo -; mas para isso são
IU).IoIl corno marido, mas antes em primeira linha como queixoso e tem que se dis- maiores a abertura, a complexidade e a capacidade de contradição das possíveis
'1Ipllll.\I de acordo com isso. Essa separação de papéis que, conforme as circunstãn- comunicações. Uma estrutura de processo jurídico pode, graças a esta complexi-
c I.I~ SC' pode acentuar ou diluir através de regulamentos especiais, age como um dade no sistema, dar mesmo origem a crítica e alternativas e mantê-Ias em suspenso
fil\lo Os participantes só podem ser motivados pelos seus outros papéis de acordo durante algum tempo (17)_ Os processos jurídicos podem, por conseguinte, assumir
1111li () sistema de processo e não, tipicamente, através de todos os outros papéis, ou funções que estão vedadas a sistemas mais simples, designadamente funções de
da. I'xif.\l"ncias dos outros papéis, no caso de quererem agir de forma racional e ser procura cooperante da verdade a partir de pontos de vista divergentes e funções de
IU'III \It1 ed idos no processo jurídico. apresentação e decisão de conflitos (18).
lru c onu-apartida. o procedimento protege-os da responsabilidade das con-
c '1"1'111Ias sobre outros papéis (14), O patrão não pode exigir que os seus em- Não se decide, previamente, entre cooperação e conflito através da estrutura
1'1I'Il"l(lo~ rout ribuarn , através da eleição, para o sucesso dum determinado partido. do sistema. Ela permite ambos. Por isso não tem de se esclarecer, em cada caso,
A 111111111'1 não pode exigir do marido que ele ganhe a causa de denúncia de alu- qual a função que domina nas comunicações isoladas de processo jurídico. Donde os
IIc~1 () que pode é aconselhá-lo, antes da sua apresentação perante o tribunal - procedimentos, tipicamente, fundirem ambas as funções. Isso permite resolver con-
IIfi" I'odl' 01 iont ar esta apresentação de acordo com as exigências duma vida fa- Ditos sob a ideologia duma procura coletiva da verdade, opinião que conseguiu en-
111111.11 1"11(imoniosa , mas apenas de acordo com as exigências do processo judicial. ganar a concepção clássica de processo jurídico. Assim se "regularizam" (19) os
n~ """P" "dOI es". doutras relações de papéis, estão, portanto, obrigados ares- conflitos, isto é, se fortalecem através de certas condições secundárias de inter-
l"'II:t1 .1 Il'galidade própria do processo jurídico e têm, também, de aceitar o resul- pretação do processo.
111.1", WIII rt-nsur ar os colegas que participam no processo, a menos que o compor-
1,1111(Ilto (lestes tenha sido desonesto, segundo as regras do processo legal. A au- A situação do assunto corresponde a esta estrutura e a estas funções do pro-
lelllOIIlI.1 nl.u iva do processo jurídico quanto aos planos de conduta e papéis con- I cdirnento juridicamente organizado. Correspondendo à complexidade do sistema,
11111111,pCll c onscq üéncia , para a generalização social do resultado. As decisões .\ sinceridade da decisão tem de penetrar na motivação do processo e ela é, de fato,
••111i~ .•IOI i,IS t ém , também, de ser aceitas pelos participantes indiretos, senão ut iliz ad a como motivo concomitante. Por um lado, há participantes altamente
I'liltlll ,1111('111(',então perante os seus mediadores e essa generalização social é, como (Cllll\letcntes ou honorários, que têm de ser motivados em muitos processos, de for-
\'11111" no c a pit ulo sobre a legitimidade (15), condição essencial para a legitimação 111,1II~O especificamente cooperadora ou correspondente, através de remuneração,
elel de e ""0,
pois () indivíduo só a pode aceitar com apoio social. tllll exemplo. Para estes, a sinceridade da decisão torna-se uma obrigação, que tem
dI '('I cumprida por meio do trabalho. Todos os outros participantes têm de ser in-
1\ .uu ouomia do processo jurídico e a visível seletividade das comunicações que
rluz rdos através do próprio sistema específico do processo jurídico a uma coope-
11'\1i ,I dl'( isão , constituem outras condições prévias para que os papéis no processo
I ;1~.1Ojustificativa da causa ~ Para isso são essenciais os seguintes componentes: um
111",.1111,('1 confrontados de forma concorrente, senão mesmo contraditória. É para
illll'I('ss(' próprio pelo assunto; a certeza de que será tomada uma decisão; e a jn-
i~SIl, pl('lisill11('lIte, que serve a orientação característica para uma complexidade
"'111111<\,\, mas todavia conservada, para uma condição prévia de possibilidades
111')4,1(1."I' roniudo dctcrrninantcs de sentido e conduta, orientação essa que já dis- 1'/ A estrutura desta alternatividade contraditória merece que só se possa aludi-Ia sob a forma
c IIIIIIII)S '1 ('11\ de ser admitida pela estrutura do sistema. As comunicações dos par- 011111',1 .mot aç ão, uma atenção especial e uma investigação cuidadosa. Não se trata de alternativas ins-
li. IjI,III\I'S t<-m lealmente de apresentar uma realização de seleção, têm mais ou III'OIIC'IH.,is ou funcionais no sentido de outros meios apropriados ou equivalentes para a solução dos
1'IIIIIIe'I1I.I> As alternativas. que um processo abre, baseiam-se muito mais no fato de que as informações
IIIC'1I0SdI' par t ici par que aconteceu isto (e não aquilo), ou que deveria acontecer, Pilei.,,,, ~"I obtidas a partir de pontos de vista subjetivos contraditórios e em cujo horizonte interpre-
111.1\r ont iuu.un a ser, na sua scletividade (e não apenas com o sentido que esco- I.•IIVCIpodem ter um ou outru sentido. A redução desta complexidade subjetiva, a eliminação destas
lhe 1,1111).\SSUllto de comunicações posteriores. São tratadas como mera comunicação dll'III.llIva, ronuadirôrias . não será realizada nem por um controle de consistência puramente lógico,
e 11,1111(JIlW clc'( isao parcial; e só a interposição doutros participantes reduz, tanto 111'11' !,\lI IIIl1processo de escolha e otimização orientado de acordo com o valor. mas sim primariamente
'1".11110 I) «)IlM'~lJ(', a complexidade para o sistema. Num sistema desses permitem- ••11,Ivh cI.1conscreruização da sua relação de perspectivas, da sua subjetividade. Esta técnica permite
el",eoh.i, ." pontos fracos, ou generalizar, desacreditar pontos de vista completos, com a descoberta
lU, pelll.\IIIO, iníoi macõcs que aumentam a complexidade elevam com isso as di- C1111 11~IKUlllt'nt()errado ou duma mentira ou, pelo contrário, abonar comunicações convincentes de
11\Itld,ICII'~ ele: dl:1 j'.\<I I' ,I 111< ci tcz a (16). O caso contrário seria um sistema em JlC'I~IJ('((ivas das quais resultam e permite chegar assim a uma decisão.
111 Opiniões muito parecidas sobre a diferença entre sistemas mais simples e mais complexos deli-
1,1 """.1111~r lia reoria psicológica dos sistemas de Schroder, Harvey, Hunt e outros. Ver ultimamente
11.11 olct M Schrodcr IMichael J. OriverlSiegfned Streufert: Human Information Processing. Individuais
allcl (.IOUp~ Funnioning in Complex Situations (Processamento das informações humanas. O funcio-
ILI '1111111"1110 dc' uuhvíduos (' de grupos em situações complexas). Nova Iorque 1967; e ainda O. J. Harve-
11. i, rll~ 11\11. illll.h.dh,1J rlr"l!' campo com a teoria matemática de V 1>.lvlIlI'.. 1111111/1101101<1 M. Schrodci : Conceptual Systems and Personality Organization (Sistemas con-
, •• llilltlttl, I' "1.•livfl ,11111111,11,I111
r II\Upnssivelmerue teórico de Thornton • "1'111,11' .' o'lo\.'lIi/.•~.1!lelc'PC'Isonalidades), Nova Jorque Londres 1961.
li Ue,!ir \ 1~llõU. I"IW '/O,, '/0'1 (ClllllpHIIl,is.,o,Ciência da Conduta 11. (O""\lh.11 I'tP ,I .''''u' .1,,,,,,,.1\0 11.110(" 100 t' ~t'K~
46 FUNDAMENTOS
O PROCEDIMENTO COMO SISTEMA SOCIAL
47
«'I tela quanto à natureza desta. E sobretudo a incerteza quanto ao resultado que é
«sscncial ao procedimento. Dá aos participantes o incentivo de contribuir para o plexidade indeterminada, ao invés, na eleição política e na legislação (22). As úl-
progresso do procedimento por meio das suas próprias tentativas de redução, man- rim as servem para reduzir a complexidade das situações políticas para que a
t('I1\ lhes vivas as esperanças e conduzi-Ios através do caminho que, de acordo com pr inteira possa fazer progressos. Isso acontece graças a decisões de alistamento ou
,IS regras do processo jurídico, levará à decisão. Por outras palavras, a incerteza programação - até mesmo graças eleição e à legislação
â que estabelecem em
III00iva a aceitação dum papel e conjuntamente também da relação desse papel, t r ,I~'()S largos quem decide e o que deve ser decidido.

que absorve gradualmente a incerteza (20). Se não existir essa incerteza, então não
O( orre um processo jurídico singular, como por exemplo em eleições políticas com Na parte seguinte das nossas investigações debruçamo-nos atentamente sobre a
dt't isao programada e principalmente sobre o processo de aplicação jurídica dos
listas únicas incontestáveis ou em "processos de exibição"; mas antes uma decla-
u ihuna is. Aqui, o problema da legitimação pelo procedimento apresenta-se de for-
ração ritualista de valores dum outro sistema, que deve então ser também motivado
11101Iclativamente concreta e empírica. Daí resulta uma ação-modelo. Dum ponto
exteriormente.
di' vist a histórico, estes procedimentos constituem também as mais antigas e ele-
Isto é mais ou menos o que se pode estipular para o processo jurídico. Como 111('11( a I ('S regras de comportamento. Fazem parte dos elementos fundamentais da
ponto cardeal para a compreensão da estrutura, funções e estímulos e para o en- I IIIt til" jurídica ocidental; e a sua institucionalização não exige mais sociedade e à

tendimento da sua coerência interna, serve-nos a concepção duma complexidade oIlJ~('U sistema político do que os procedimentos de votação política e de legislação.
limitada, própria do sistema de processo legal. Com ela se pode substituir a con- S" depois disto se pode tratar dos procedimentos, bem mais problemáticos, de
1('clll~àO da complexidade indefinida.
cepção clássica do processo jurídico pela verdade como objetivo. Simultaneamente, a
partir destes dois pensamentos fundamentais, adquirimos um ponto de apoio para
•.•disposição das investigações parciais seguintes. A complexidade própria dum sis-
tema de procedimento depende, essencialmente, da complexidade da tarefa de
decisão. Esta ....•.por sua vez, depende da medida em que as premissas de decisão
devam ser pressupostas ou procur adas. Correspondentemente, existem situações e
processos de decisão de complexidade determinada ou indeterminada (21) . Nos sis-
temas políticos encontramos, tipicamente, complexidade determinada nos âmbitos
de decisão de utilização jurídica ou que expõem um objetivo, e encontramos com-

lW Esta incerteza de decisão do assunto tem de ser distinguida de anteriores formas de processo de
risco. que resultaram de regulamentos ritualistas do processo, formalizados sobre atuações que eram as
únicas certas. Serviam como caso, instuucionalizados. que levaram o processo a uma decisão sem de-
monstração objetiva. Tinham, portanto, a função. perante a capacidade diminuta de decisão do assunto
do juiz, de atribuir aos partidos mais riscos geralmente um sintoma de pouca diferenciação, auto-
nomia e complexidade do sistema do processo. Quem tem muito material para este assunto é Heinrich
Siegel: Die Gefahr vor Gericht und in Rechtsgang, Sitzungsberichte der Philosophisch Histurischen Clas-
se der Kaiserlichen Akademie der Wisscnschaften (O perigo perante o tribunal, e na ordem judicial
relatos das sessões da classe histórico-filosófica da Real Academia das Ciências), 1856, pags. 120-172.
l!1 Encontram-se, com freqüência. classificações ,deste tipo na literatura científica de organização,
mas na maioria não atingem para os nossos objetivos o necessário grau de abstração. Comparar. como
exemplo citado amiúde. a oposição entre decisões de rotina c decisões críticas (decisões de orientação)
em Philip Selznic: Leadership in Adrninistration. A Sociological Interpretation (A chefia na adminis-
tração, Uma interpretação sociológica) Evansion Ill , White Plains, Nova lorque 1957, ou então a dis-
tinção entre decisões programadas c não programadas, reformulada por Simon e reportando-se a outras
variáveis organizatórias consultar, em especial, Herbert A. Simon: Recent Advances in Orga-
niz arion Thcory (Progressos recentes em teoria da organização) Em: Research Frontiers in Politics and
Government, Brookings Lecture 1955 (Fronteiras de investigação em politica e governo, palestra
Brookings I%5), Washington 1955, pags. 23·44 (38 e segs); do mesmo autor: The New Sciencc of
Management Decision (A nova ciência da decisão de gestão). Nova lorque 1960. pags. 5 e segs. (Versão
alemã em, do mesmo autor: Perspektiven der Automation für Entscheider (Perspectivas de auto- <;0'"0,1 distinção é atingida funcionalmente, ela só tem, em primeiro lugar, um valor analítico e
111.lÇ.iOpara o decisor) Quickborn 1966 ; e, elaborado em pormenor, em James G. March/Herbert A. <lri.,I 1'111,111('110ati' que pomo os pro(CSSOSde decisão se diferenciam respectivamente na realidade. Por
SitlH1I1 Orguni,ations (O,!!all;,a~õ('s), Nova Iorquc-Londres 1958. pags. 26 e scgs. 141 e segs, 172 e segs. 1\111,,. "O.· •• dl'dsão IHOg' amada rem, lia maioria das vezes, também uma ação prejudicial, portanto
C' ".·I1U'lh.ll\lt·~ Nau 't' im luem aqui ou não se incluem devidarnerue as decisões com um objetivo pro-
dO'l'''' 1••1,.'1" ,I'S l)t0ll' ,1I11,ulosqlll' '~'f11clI' SI" (.tll uludos: (' a atuação não programada tem de se apoiar
11,,"",'(\11 I' ,'s (\I'<i,O'" Ik .!1i,t'''lI<'lIlO. Como pa i alclos tirados da teoria geral dos sistemas ver ainda a
II411MIIIII"""1'11\I'HI1111 "'W\ d,' M'lIt"l" """"11'1",1''''' 11,10h,\ qu,dqul'r sentido numa complexidade total
tll'"O~,III 1'0111 1'"111'1<",,1.111111111,'111/,,.1.. I' 'ÜO 0I11,1I1i,,,d.1d,' L.udwig von Berralanffv: General Systcrns n"'lIt, lIuh·IIIIUI.I, •.•.•,,~ 4'fljllUlllllU ti., ~1"I1I1It., "nuu II,tI.I(L,~ (UlIH) IH(·lllis~i.ls (' n 10 (OlHO CJ IHuhlt'Il1.1
11••.", y (I."" L. 11.·".1ti", "'11'\1',") ('1111",01~V.II·II" 7 (''''I'IIl,I\ I!Nais 7); 1961!, pags. 1 l!0 (2).
1''-''' 1'''''1111'10, 11 IHUtU'H, 1111111•• 1" d! I "WIHl.lltl" lIottlf'IHlo\ 1',11.1 .1 .-I,'u,.IO OU .1 qll.llllld.ltlt' d"~ IHIIII1I'~
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Esta parte trata dos processos de aplicação judicial e por isso orienta-se pelos
julgamentos. A partir de consideráveis diferenças dos processos nas seções especiais
do tribunal é que vemos em substância por que é que isso nos levará a porme-
nores intricados. Demais, as diferenças das ordenações jurídicas especiais também
deveriam ser consideradas possíveis para além deste quadro. Naturalmente que não
se deve contestar a necessidade e utilidade de investigações pormenorizadas de so-
ciologia do direito. A aceitação, por exemplo, duma sentença condenatória, tem,
com certeza, outras condições prévias, psíquicas e sociais. do que as que podem ser
observadas no caso duma jurisdição civil ou duma jurisdição administrativa. Se-
guramente, o domínio partidário sobre o processo civil confere, com mais vigor, ao
processo jurídico o caráter dum empreendimento próprio de risco. sobretudo para
o acusador. Geralmente as perspectivas dos acusadores e acusados diferenciam-se
no processo civil de forma diferente da -do processo penal e de forma também
diferente da do processo jurídico-administrativo. Isto pode ter importância para o
papel dos participantes e para a sua disposição em aceitar as sentenças. A diferença
entre o ponto de vista próprio, fixado com antecedência e a sentença, uma variante
sem dúvida importante para o efeito de legitimação, pode ser muito diferente nas
formas particulares de procedimento. Em certos casos, pode-se estar convencido do
próprio erro e ser levado a tribunal como criminoso confesso ou como devedor in-
solvente; no processo jurídico-administrativo não existe uma tal conjuntura. As
normas típicas do processo jurídico, importantes para a decisão, também variam,
Sobretudo aquelas devido às quais se pode perder ou ganhar "baseado apenas no
processo", as regras que agravam a argumentação e que tem no processo civil uma
importância diferente da que têm no processo penal, onde o delinqüente deve ser
declarado culpado; e a sua existência, mais ou menos apócrifa, dispersa por múl-
tiplas distinções no processo jurídico-administrativo, é um sintoma da dificuldade
de fundamentar as conjeturas jurídicas de princípio na relação entre cidadãos e es-
tado. Uma outra perspectiva poderia separar a jurisdição administrativa, finan-
ceira e social das formas clássicas de justiça criminal; elas estão estreitamente
ligadas à atual prática política de decisão do moderno estado legislativo e têm de
legitimar, simultaneamente, uma legislação de flutuação rápida, enquanto que na
justiça civil e criminal do estado não se apresenta como conceito agressivo, variável
e adaptável da realidade social, mas aparece antes como um interesse de organi-
zação, que se pode apoiar nas convicções relativamente constantes da sociedade.

Tudo isto poderia ser relevante para o problema da legitimação por processo
jurídico, duma forma reiteradamente conciliatória. O nosso objetivo não consiste,
porém, na descoberta, interpretação e exame destas diferenças. Por isso só se pode
dar aqui uma pr 01 icntncão t' só S(' pode redigir uma forma de apresentação do
é

pl()bh'Il\,I. EI1I PlilllC'ilO hlH,cl c' IIc'(C's~;lIio encarar o coletivo, que (- caractertsuco
r,' PROCESSOS JUDICIAIS

dc' iodos os processos judiciais e reconhecer estes processos como sistemas de


.\llhIÇ~IO organizados e empiricamente compreensíveis, podendo ser orientados, não
,
" pOI meio de disposições jurídicas, mas também pelo exercício social institu-
IIClII,t1ll.a<!oe, finalmente, pelas expectativas de comportamento que se geram cir-
1IIIINlllllcialmente a partir daí. Isso já permite adquirir uma opinião geral sobre as
tllll~(ks que tais processos desempenham, sobre os problemas que se podem assim
II'NOIVl'I (' sobre os mecanismos sociais que aí estão em jogo. CAPÍTULO I
{,
Diferenciação

Como todos os sistemas, os procedimentos judiciais constituem-se pela diferen-


.... ciação, pela consolidação dos limites frente ao meio ambiente. Não se trata aqui de
romper a continuidade com estruturas e acontecimentos para além dos procedi-
mentos. Diferenciação não quer dizer isolamento causal ou comunicativo. Os
tribunais não são prisões. Trata-se antes de construir para si próprio um ambiente
'Il
intelectual, de forma a que os processos seletivos de elaboração de informações do
meio ambiente possam ser orientados por regras e decisões próprias do sistema,
portanto, que estruturas e acontecimentos do meio ambiente não 'sejam auto-
maticamente válidas no sistema, mas sim que só possam ser reconhecidas após fil-
tragem de informações. A diferenciação só pode, pois, ser realizada pelo estabe-
lecimento autônomo do procedimento judicial e avança tanto, quanto as possi-
.. bilidades de decisão do sistema .

Em alguns aspectos, este procedimento pode comparar-se ao processo de


,procriação e nascimento. Os organismos não são gerados, como se sabe, por uma
nova evolução presidida pelo acaso - isso seria demasiado lento, tornando im-
provável qualquer êxito' - mas antes se criam pelo acionamento dum programa de
seleção pré-constituído, que dá origem ao organismo no mais curto período de tem-
po, por meio de regras hereditárias. Assim os procedimentos judiciais não são des-
cobertos e ajustados caso a caso. É que isso constituiria uma espera ociosa no acaso
e seria tão demorado que, entretanto, se desfaria a organização da sociedade ou se
recairia numa situação extremamente primitiva. Em todas as sociedades com uma
certa complexidade, os procedimentos têm de ser' "instruídos" de forma a poupar
tempo, por meio da escolha dum modelo pré-constituído. Este modelo já existe cul-
turalmente como programa para o procedimento judicial relativamente diferen-
ciado. A independentização, prevista nele, pode ir mais ou menos longe. A dimen-
são da diferenciação possível está relacionada com outras estruturas da sociedade
temos, em primeiro lugar, de tornar clara essa relação.

A compreensão da importância desta pergunta é dificultada pelo ideal das


únicas decisões concretas e únicas. O procedimento jurídico torna-se irrelevante na
medida em que essas decisões existem e podem ser encontradas. A certeza da
decisão não depende da forma como foi alcançada. O procedimento, como sistema
social, só tem um espaço de manobra de desenvolvimento por motivo da existência
da incerteza em questões de direito e de verdade e só na medida do alcance dessa
inr ertr-za. A dih'I('Ot i.H,,1O (li' 1)J()«'dinwnto~ jurídicos refere-se ao processo de' ab "
MIIÇ.IO tlc'M.1 illCC'ltC'f,1 c' IIH'III 11111,1 'l'H'c'slI' P\(I«'~S() (I diliHidn 11m tlit{'lios illtC'I'\I)~
54 PROCESSOSJUDICIAIS
DIFERENCIAÇÃO 55

do procedimento e não por critérios externos.


O desenvolvimento institucional pode ser mais claramente observado no direito A diferença entre os procedimentos de sociedades mais: .primitivas e os pro-
dI' argumenraçâo (1). Numa esquematização precária e sem a preocupação de cedimentos judiciais atuais não deve, contudo,' ser exagerada. A apreciação do
manter uma: seqüência de desenvolvimento, necessariamente histórica) podem dis- comportamento em função dos papéis e a demonstração podem 'ocorrer duma for-
unguir-sc três formas de coordenação
1"1iorcs ao procedimento: a demonstração
da demonstração com estruturas
divina, a demonstração
sociais ex-
dependente dos
" ma mais ou menos pronunciada,
com critérios processuais específicos.
e serem mais ou menos racionalizadas
Esta questão serviu, por assim dizer, como res-
de acordo

".Ip(·is e a demonstração livre. valadouro para a diferenciação dos procedimentos judiciais. Ela estende-se entre a
instituição de jurados, que estavam obrigados como parentes a secundar a sua
Na primeira forma, a demonstração não serve para preparar a decisão do família perante o tribunal, sem que a sua credibilidade se tornasse um problema, e
I1 ihunal através do esclarecimento duma questão parcial, antes provoca uma o fato, que ainda hoje se pode observar, de os declarantes desfigurarem os seus tes-
c1c'cisau de autoridades mais elevadas, que elimina a incerteza através do juízo de 'i" temunhos em relação aos seus próprios papéis fora do procedimento. (4). Também
1kllS, () procedimento mesmo não tem qualquer autonomia e nem sequer a so- é de supor que até mesmo os juízes não se deixem impressionar pelos outros papéis,
11I'c1.I(\r, como um todo, se atreve a decidir. Tomar a decisão constitui parte in- sem grande relevância, dos participantes no procedimento e que os membros das
"'I(1.IU\(· da organização de vida de fundamento mágico-religioso. A força de con- camadas sociais mais elevadas gozem, por exemplo, duma credibilidade maior
VI(~.\O (' a legitimidade da decisão dependem dessa certeza de fé sem "-ãlternativas perante o tribunal (5), e ainda que também lhes é mais fácil confundir outros par-
( Y)
... ticipantes,
ticipantes
designadamente
no procedimento
os declarantes (6). Nestes casos, a orientação
para outros papéis, serve para dirigir o curso da decisão
dos par-

para uma outra direção, o que, de acordo com as circunstâncias, pode significar
/\ dcrnonstr ação dependente dos papéis tem, em comparação com esta, um
I .\lU!,O de ação muito mais vasto. As sociedades mais primitivas não estão, ou estão um acréscimo ou decréscimo de incerteza.
1111111,1 lor ma muito imperfeita, em situação de separar os papéis. Também elas, de
.11 01 do rorn as situações, ativam diversos papéis - na família, por exemplo, nin- ,A relevância doutros papéis constitui uma grandeza variável (e por isso suscep-
",,(1"1 SI' apresenta como soldado -, mas a análise, crítica e controle dentro dum tível de desenvolvimento). Pode ser aceita com maior evidência e, então, pouco ou
nada se diferencia do assunto da própria decisão. Pode, porém, ser incluída no
p''I'''1 c'stá concretamente ligada a uma pessoa e não é possível, independentemente
cio compor tamento em outros papéis. Precisamente em procedimentos jurídicos que controle interno do procedimento através de reflexões cada vez mais racionalizadas
IIH\lII.1I1l de conflitos e desilusões, se pode, portanto, ver diversos papéis do par- - reflexões mais ou menos do tipo daquelas que os políticos, místicos e professores
111iJI.lllt,. " () seu comportamento é submetido a uma apreciação moral global (3). mais altamente colocados não se podem permitir (por exemplo, mentir perante o
~i
N•• IIlft'SldO da violação dos deveres conjugais não se pode ignorar se o homem tribunal), e que por isso merecem crédito. A .medida que a dependência do proces-
t 01110 produtor, guerreiro, praticante do culto dos antepassados, membro da tribo, so político se liberta doutros papéis, o crédito específico do papel pode converter-se
,-li " M' prese: vou ou prevaricou. E, para a apreciação dum testemunho, também é em ceptismo específico do papel. Devem poder encontrar-se exemplos disto na trans-
il(lI.dlllt·lll{· importante a totalidade dos papéis duma personalidade social e a sua formação da apreciação judicial dos testemunhos dos agentes da política nos últimos
1,-"~onl\lIda na vida duma comunidade de certa importância. Assim, pois, no cem anos.
1IIII(\'c1illlcnlo jurídico, os papéis se podem separar doutros papéis, de acordo
'11111_I situação e não pelos critérios de análise do comportamento.
...•
11"", h".1 visJo de conjunto. ainda que sem uma elaboração de teõria dos sistemas, é dada por 4 Hans von Hentig: Entlastungszeuge und Entlastungstechnik (Testemunhas de defesa e técnicas de
11•.•11Y I.l'vy /l, uhl: La preuve judiciaire. Êtude de sociologie juridique (A prova judicial. Estudo de defesa), Stuugart 1964, reuniu inúmeros casos onde isso se pode ver.
'u ,"1"11'"lU'1<1 ••.i). l',ll is 1964. Mais pormenores em Richard Thurnwald: Die menschliche Gesellschaft
5 Ver também as especulações que, todavia não estão melhor comprovadas, sobre um quadro social
111li u "11(·,hllu soriologischcn Grundlagen, Bd. V (A sociedade humana nos seus fundamentos etno-
do juiz alemão dependente de estratos. da autoria de Ralf Dahrendorf: Bemerkungen zur sozialen Her-
'li IIIlflI\lIm,VIII V), 'I<-rlim Lcipzig 1934, pags. 145 e segs, especialmente pags. 161 e segs.
kunft und Stellung der Richter an Oberlandesgerichten. Ein Beitrag zur Soziologie der deutschen Ober-
I"'VI', 1I,lIlI.,oIlll(·"IC, supor-se a existência de mecanismos latentes, que reduziam a casualidade do schicht (Observações sobre a origem social e posição dos juizes no tribunal superior. Contributo para a
"'0,,11.••111",,~ J"flOs(\(-Deus, mais Ou menos como uma pré-sondagem informal do gênero de boato, fora sociologia das classes superiores alemãs), Hamburger Jahrbuch für Wirtschafts-und Gesellachaftspolitik
,I•• li' ('1"111)I' C/( (""', dt· lal (o. ma que apenas os possíveis culpados se tivessem de submeter aojuízo de 5, (Anais de Hamburgo de política econômica e social 5), 1960, pags. 260-275 (273 e segs). Reimpresso
1h"'. II«*,,, lorlll,' podiam ser então considerados também o status, papéis e relações sociais do indi- em: dó mesmo autor: Gesellschaft unf Freiheit. Zur soziologischen Analyse der Gegenwart (Sociedade e
vhlllll, dr 1.011111111,. 'I"" (J~ jufws divinos acabassem em geral na ratificação duma organização já exis- liberdade. Para uma análise sociológica da atualidade), Munique 1961, pags. 176-196. Conferir tam-
"'1111 bém com Klaus Zwingmann: Zur Soziologie des Richters in der Bundesrepublik Deutschland (Para a
/I ''''I'".,,~nlj (""11' 11111"111 r ,"01,01P'l'bSUPÔ(', portamo. uma diferenciação de papéis rigidamente sociologia do juiz na república da Alemanha Federal), Berlim 1966, principalmente pág. 25.
"""""\11 ,nollll"""I"·I,,,,,,,lIhi. •• (-.JI(,(IIÍlII~di' relevância um progresso sócio- estrutural, que já se
6 Ver aqui Enrico Altavilla: Forensiche Psychologie (Psicologia forense), vol lI, versão alemã Graz-
111110., 111111,,,1,, 10,\,,,,,11,, I'.\I~ " IIIIIII'",IIII'U'IIIII1\\1.mal, mas que, para os casos de conflito, em con- Viana-Colónia 1959, pag. 254 e segs. Além disso é digno de nota que, até mesmo este conhecido manual
I' ,'I'" .1101".fI li li ••"""111111111 ••111"01".,.(.,IIV,"'U-II'"t.ude, com dificuldade e dependendo do desenvol- de psicologia judicial, afirma categoricamente que os policiais têm tendência para dizer a verdade, a!
'~."\ iI',L"I,,~I" hIlIIlY"', M." W," kmau: The Judicial Process Among the Barotse of prostitutas. pelo contrário, para mentir; com outras palavras aconselha ao juiz. como regra principal, a
(lI 111'" ~I'" )110110 .,01'·I.tll' "" ",""I\r (I() Noite da Rodésia), Manchester 1955, so- manter-se em papéis exteriores ao processo (conferir com as pags 231 e sego e 234). O mesmo manual
i"oI" ,j. "" •• 10 01I'. N••,I" 1(1· •••'"\ .•nd Unrcascn in African Law (Razão e mede a condição de formação pela credibilidade de testemunhas de grande importância. e cita. sen: se
itli ••111.,I!H.li 1"'''" lhO "11~ (170 (' ~('III.),que concorda essencialmen- distanciar nitidamente. uma fórmula de Bunrigarius: Testes in summa paupenate non crederem; si duo
dl'\~" .11·••",••.•Im .l'lrV'IllII'!ldos papéis também JlOI lunl paup"",s JlIO "n,1 ~'''tt· 1'1(\"0 drviu- IH()••lia. pral'f('to divites (Não acredito em testemunbos de
"~"rn", ,111111"'••, "•., pll' '"1\ I~IIII,,,~ Iltll. !,,,!llr" r fl\ll outro (Inl"li(tl', prl'firtl (lI riro~)
DIFERENCIAÇÃO 57
~6 PROCESSOSJUDICIAIS

A consideração racionalizada dos papéis converte-se em "apreciação livre de Para a outra instituição, o papel do juiz tem de ser diferenciado. Ele tem, por
Jutras palavras, de ser eximido da consideração dos outros papéis que o podem
)11OV.I~". Esta transição é efetuada pela sua apresentação para debate e aparece nos
motivar para decisões definidas como membro duma determinada família ou
Iunrl.rmentos da decisão como uma de entre as várias interpretações possíveis,
camada social, duma igreja ou seita, dum partido, dum clube, dum bairro. Se esta
'1(11 01 und ada no próprio processo jurídico. O princípio jurídico da apreciação livre
isenção for institucionalizada como obrigação para um parecer objetivo e impar-
II,I~ provas (§ 286 do ZPO- Código do Processo Civil) tem este sentido. Ele não
cial, com o tratamento de todos os assuntos com igualdade e apartidarismo, então
101 pensado corno liberdade a alcançar ou não, tal como receava um conhecido
neutralizam-se as relações particulares para com a pessoa do decisor. Pelo menos já
1'1111e'lt~u"lisla (7), mas sim como liberdade de não considerar os papéis alheios ao
não servem à formulação de reivindicações legítimas e expectativas; o decisor já
1""II'It~(). O princípio jurídico assegura, com certeza, apenas os fundamentos res-
não pode ser abordado ou influenciado no caminho da troca como companheiro,
IlI'e i ivos e não, dessa forma, o processo correspondente (8). Ele não pode, só por si, veterano ou vizinho, mas sim e apenas, através da aceitação dum papel dentro do
1I11!lI'dir que outros papéis tenham influência sobre a tomada de decisões. Todavia, próprio procedimento. Qualquer outra influência é desacreditada como corrupção.
1111 pl inrípio , até mesmo os presidentes da república, os arcebispos, os secretários Ela parece, pelo menos tanto quanto é 'compreendida pelo direito penal, estar ex-
tios p.lltidos ou os magnatas econômicos têm de estar preparados para que a purgada do essencial (11). A crítica ao procedimento jurídico e às decisões do juiz
1)(.II.d.1O das suas declarações perante o tribunal .seja tratada como uma pergunta não pode também apoiar-se nas interações dos papéis fora do procedimento. Uma
.\ '111.11SI' podem dar duas respostas. A sociedade tem de estar organizada de tal Imunização contra a crítica faz parte do contexto significativo dum regulamento,
1111111,1. caso se queira tolerar isto, que essas investigações judiciais não transtornem, l1li,1-\
juntamente com a livre apreciação jurídica das provas e constitui, além disto, como
otl, 111do mais. a sua estrutura de papéis (9)_ adiante se mostrará (12), um requisito do papel do juiz em processos diferenciados.
() rlist anciamento perante o fundo social das declarações serve para a diferen- A diferenciação aumenta as dificuldades da decisão. Priva o procedimento
I 1.11.. 111 dos processos, não podendo, porém, assegurá -Ia sozinho. Não basta separar ~I jurídico de inúmeras probabilidades de simplificação. Até mesmo a própria ex-
o, di" 1.11antes, os panidos e as testemunhas dos seus outros papéis fora do processo. periência de vida e o saber pessoal do juiz - qualidades que em processos de
I t 111dI' M' apresentar. pelo menos, mais duas instituições complementares.

1',11" uma, a influência social sobre o procedimento tem de encontrar um es-


direta (portanto duma troca ad hoc não vinculada à estrutura da sociedade) tem uma origem muito an-
• "1"', poi1> a di ferenciação não pode, naturalmente. significar falta de consideração
terior por exemplo a legislação das doze Tábuas ameaça já o juiz corrupto com a pena de morte. In-
11\1uulurt ilidadc dos procedimentos jurídicos. A influência é agora dirigida sobre dependentemente disso, contudo. fatos que são encarados como corrupção em sentido mais lato em
dl'llso"1> de configuração jurídica e finalmente sobre opções expressamente legis-
••
sociedades complexas, fortemente diferenciadas, correspondem, nas sociedades primitivas, ao contrário
1,IIIV,I/t (' desta forma concentrada e especificada , A canalização e controle das in- da expectativa, moral, exigindo diretamente - tem que se ajudar o próximollsto foi o que ensinaram as
,",,1 11(1'-11>sociais através da legislação, portanto a positivação do direito, constitui
i
mais recentes investigações dos países em desenvolvimento, que neste problema se encontram numa fase
de transição com conflito institucional. Consultar, por exemplo, de entre a literatura abundante, Jakob
11111,1 r oudicão prévia essencial da autonomia social da evolução legal da decisão. O
'''li u-t ira o seu parecer do direito escrito, onde se definem quais são os fatos e qual
van Kleveren; Die historische Erscheinung der Korruption, in ihrern Zusammenhang mit der Staats
und Gesellschafrsstruktur betrachtet (O aparecimento histórico da corrupção encarado na sua relação
11~e'lItid() ('111que são relevantes para a decisão e não já diretamente a idéia do ver- com as estruturas de estado e sociedade), Vierteljahresschrift für Sozial-und Wirlschaftsgeschichte 44
d.ld,·ilo c do justo que lhe foram impostas numa organização visualizada da vida (Revista trimestral de história sócio-económica), 1957, pags. 289-324; Fred W. Riggs: The Ecology of
til r.rl. Assim ele pode operar com um afastamento maior e não está obrigado, em Public Administration (A ecologia da administração pública), Londres 1961, pags. 98 segs, e do mesmo
IlIdol> m assuntos muito diversificados sobre os quais tem de decidir, a poder autor: Thailand. The Modernization of a Bureaucratic Polity (Tailândia. A modernização duma co-
."IVIII!I'II os \)1 incípios morais do parecer que sejam susceptíveis de consenso. Ele munidade polltica burocrática), Honolulu 1966; Ralph Brabanti: Reflections on Bureaucratic Corrup-
tion (Reflexões sobre a corrupção burocrática). Public Administration 40 (Administração pública 40);
!,oelc- t' deve decidir como um estranho (10) .
1962, pags. 357-372; Myron Weiner: The Politics of Scarcity. Public Pressure and Political Response in
Índia (A polltica da escassez. Pressão e resposta politicas na Índia), Chicago 1962, pags. 120 e segs, 235 e
segs.: Ronald E. Wraith/Edgar Simpkins: Corruption in Developing Countries (A corrupção nos países
"''''.''11'' SII'III' Ilil' KUIIMder Rcclusprechung (A arte da administração da justiça), sem indicação
em desenvolvimento), Londres 1963; H .A.-Brasz: Some Notes on the Sociology of Corruption (Algumas
d,- I"",.. ""!lI ".0'''. D,cMlt-n 1900. pag 13.
notas sobre a sociologia da corrupção), Sociologia Neerlandica I, 1963, pags. 11-128; W. F. Wertheim:
Sociological Aspects of Corruption in Southeast Asia (Aspectos sociológicos da corrupção no sudeste
11 1',11.1 •• ,I~P"I\" l',ilolúKil'o conferir com Gotthold Bohne: Zur Psychologie der richterlichen über- asiático), Sociologia Neerlandica I, 1963, págs. 129-154. A relação com o problema da diferenciação
11'''II''"II"llIltI''l1l((1':0,.) " I',i, ulugi:o da formação da eloquência judicial). Colônia 1948. que. pelo social do sistema polltico e dos seus processos juridicos é compreendida por Sarnuel P. Huntington:
""'''I'' 1'.\11J." 111'11.I.'NÜllilll,lSevolurões da teoria da personalidade. Political Development and Political Decay (Evolução politica e decadência politica), World Politics 17
(1965), págs. 384-430, de acordo com a formulação: "Political organizations and procedures which lack
11 0"•.",",, 1101"1I111''''n~" 1 """., ;lili"t'ncias que põem em risco o status tenha os seus limites. tem autonomy are, in common parlance, said to be corrupt" {As organizações politicas e processos que
d, .'1 ,""0" ••.,.111"I""" 11101••••• 0"1"'11,,,10-8 A.'''H, há sinais de que os mecanismos de solução dos con- carecem de autonomia são consideradas corruptas em linguagem corrente) (402).
1111",""","',,,, ti" I""'·I~'"I., li I.I,'"",~ qllr (,81,10situados em categorias superiores e que apresen-
1.,~,1,. 1",.11'" " 1I1),II,,,d'·11'li "" ,,,"11.,,111,.1,,II.\Ud,'ll)dlliado crassa com a organização do status, lI Hans von Heruig: Das Verbrechen (O crime), vol. 111, Berlirn- Gottingen-Heidelberg 1963, pago
I ""I '''1'11' '"11 I"h·," 1•. ,11111111' 11I~'"'"II1""III1'"CWllIi.I J{C'~olulion(Resolução institucionalizada de 456 informa para a Alemanha desde 1900 nenhuma condenação dum juiz de acordo com o § 334, 1
••• "11".,,, 1,"""01,,11',0,, 11.",.,,), ti'· 111"11.,,d, "''''"''11''1,11''" ..,h"'.1 paz), 1965, pags. 348 397 StGB (Código Penal). 30 condenações de acordo com o § 334 do 11 StGB, um número relativamente
('\111 ,.~, 111· elevado de sentenças absolutôrias e posições de "fundo obscuro" consideravelmente elevado.
,I diferenciação do sistema
I'l'n,dill'l,lo tI.1 corrupção 12 Vr. P,lftr li, Capitulo 9 (Fsnuu» ~ (10 programa e responsabilidade).
"'"T

DIFERENCIAÇÃO 59
,li PROCESSOS JUDICIAIS

tI,,( i~i'i()diferenciados, o tornaram apto para a magistratura duma forma muito es- essa impressão, mas têm também de dissimular o estabelecimento da representação,
II('( i.11 são anuladas artificialmente (I~). Cada procedimento tem de principiar porque a correlação do estabelecimento da representação torna aparentes outras
o\) c ondicão prévia de que qualquer coisa pode, dentro do vasto quadro dos fatos possibilidades de representação o que. portanto. desacreditaria a impressão', Pode,
(' r ,1i~ (' conhecidos, (14) ser outra coisa (por fatos gerais e conhecidos entende-se: pois, chegar-se a uma situação em que os participantes se sintam forçados a perder a
r unlu-cidos do juiz através da sua própria atividade oficial). A sentença não pode já sua inocência, a fim de terem razão.
"I 1.10 Iacilrncnte obtida a partir de preconceitos. No lugar de preconceitos têm de
euu.u 1>1é-conceitos, no sentido de idéias pré-concebidas ou decisões -legais que já Com a diferenciação dos procedimentos aumentam, em cada caso, as exigen-
1',10 ('stabdecem o caso isolado e deixam em suspenso sobretudo a questão da ver- cias quanto ao talento tático dos partidos em litígio. Eles não podem aparecer
tI.lele da afirmação dos fatos. como já reconhecidos e detentores de confiança, como nas sociedades primitivas
(16); têm de ganhar essa confiança dentro do processo como desconhecidos. O seu
Num sistema que,
pela sua diferenciação, se torna tão. aberto a alternativas, status social coletivo e os seus outros papéis não lhes conferem uma base firme.
1(1111 d(' SI' desenvolver as técnicas eficazes correspondentes de seleção - ou então Podem apresentar como benefício a certeza da conduta e do talento erudito de
( Itq~.lma utilizar-se, de forma latente, .simplificações ilegais de forma no sentido de comportamento no procedimento jurídico: e é neste sentido indireto que os mem-
q\l(' I) juiz se deixa influenciar pela classe social diferente dos restantes participan- bros das camadas mais elevadas da sociedade poderiam ser mais favorecidos peran-
II'~, 011 que ele se serve das suas experiências, que lhe aparecem como modelo, que te o tribunal. O s.eu status e a relação dos seus papéis não podem ser diretamente
11.10 apn'scnta para debate esses fundamentos da sentença e que não o's deixa ampliados para o procedimento e não Ihes serve de muito mencionar de passagem o
.lp.tll·n'l na argumentação da opção. A prática desenvolve técnicas mais racionais convite para o chá em casa da princesa X ou a posição importante do genro no
.I,' II,II><lIho, sobretudo graças à ajuda de regras esquemáticas para a redação de gabinete do ministro Y - têm, quando muito, melhores possibilidades de atuação,
1',II('('ll'S e decisões (15). Essas regras fixam a apresentação dos resultados rdo que só podem, contudo, ser realizadas no processo jurídico através de trabalhos de
11••h.ilho e, simultaneamente, dirigem, num segundo plano, aquilo que tem de ser acordo com as regras do processo.
,,'ilo pala o estabelecimento da apresentação.

Os outros participantes, na medida do seu interesse, têm de levar o processo


IlIlldil'o a uma decisão, têm de resolver o mesmo problema com outras técnicas.
I ,1I1l[,(lm para eles a redução da complexidade, o afastamento doutras possibili-
d.,d •.~ d,' interpretação, se torna um problema de representação, ou até mesmo um
fllllhkrna de auto-representação. Vêem-se obrigados, se querem adquirir ascen-
,1.'111 ia sobre o curso do processo de decisão, a impressionar o tribunal duma forma
onvincente e
fidedigna. Têm de parecer dignos de crédito, e isso significa, na
• conduzir-se e comportar-se como merecedores de crédito. O que é, precisa-
"'('Ill(' por esse motivo, muito difícil, pois a necessidade é evidente. e a consciência
'\lH·1:. para a intenção. Os partidos em causa tornam-se conscientes do quanto a solu-
\,;.10 do processo depende da impressão convincente que causem. Têm de restabelecer

I~ Cllnfl'rir com Friedrich Srein: Das privare Wisscn des Richters. Untersuchungen zum Beweisrecht
"dei •.• l"07.<:5S(·(Os conhecimentos particulares do juiz. Investigações sobre o direito de argumentação
eI •. 1I1111ws08 processos). Leipzig 1893. É digno de observação. em contraste com isto. quão fortemente se
,f" <li '" 1105 processos legislauvos, designadamente nas comissões parlamentares, às experiências indi-
vi.tw,i~ "ocasionalmente" existentes do deputado isolado.
II E mesmo nestes fatos notórios (de conhecimento geral ou judicial) é ainda duvidoso na juris-
1',,"II'ucia se, e até que ponto, eles se podem tornar, voluntariamente, assunto de argumentação ou con-
111' 111 K\'m(,nlação. Respondendo afirmativamente Leo Rosenberg: Lehrbuch des deutschen Zivilprozes-
"r; hl&(Manual de direito civil), 9,' edição, Munique 1961. pago 553.
Ir, tlllfitttis,icaml'nll', rrnrase nestas regras dum saber próprio da profissão, meio suspeito, inapto
111"•• 8t't IIH"\( i"",,.lo " ((U" (' ,,,II;"l(lidn (' transmitido de forma puramente artesanal, para além da
1I111t~~OIIl1iVl"~II~II,I c' ,.,'111KI.II"h-S ('xil\~ndas. Ver na literatura respectiva: Das arntsgerichtliche
1)"""",11. 11"11'tI'lIit'l VIIII1-1')1'" 1,1,,·., (RI'I),I'li~.J{) do tribunal da comarca, fundado por Eugen Ebert),
1'. • ""I~III1, ..,lill,.I" plll 11.11'"M,',,_, 1'"",kl,"1 IH!í4; Paul Sartelmacher: Bericht, Gutachten und Ur-
,,·tI I"" •. AIII""I1'M tlll tI," VIIII" " "IIIIK.c1"'II~1 "t'r l~•.fcrendare (Relatório, parecer e sentença. Ins-
11111 ".0..
.•'"
"I,I,~",
11."1111.11,I. 1'"'1,.0,",.111 ti,,, "111'111(11111'), ,I'I\I,\(lido por Paul Lüttig e Gerhard Beyer. 24.'
1\•. 11011h .II.~IIIII 1111;'\ IA 11••hrel ,I" 11t"II"'1I "li mudunça de editores deixam reconhecer que
16 Também no procedimento
represent açôes moralístico-racionais:
judicial das sociedades' mais simples se podem observar auto,
através da familiarização tornam-se porventura imprescindíveis.
,11111 O" II"IU '''1111,I,'II~,,,."" "lIIi.I" '11"'11111,10"'_oil" e11' ill"tilUi\ô •.~. Aliás conferir aqui com J. Gillis Conf. com A. L.. Epstein: Judicial Techniques and theJudicial Processo A Study in African Customary
W, 11li l hr 'Ivi,. lIi AI'I" 11.11' I",ti, i",1 '-11'111111110 A C:"or SllIdy in Cornparatlve Law (Os estilos de Law (Têr nicas judici a is e J.)1()('t'~S()
judicial . Um estudo sobre o direito .consuetudinârio. africano). Man-
1"11,,. ti. ,1\" 1.'\.1", 111•• 1)1I"t., ,I•• ~_!! 1'-,1•• ,' ,1111'11"''''III'~I "tln), l..-ydl'II 1960. ('\WKIl'r 1 %4.
CAPÍTULO 11
Autonomia

~
A diferenciação é uma condição prévia indispensável para se chegar a uma
elaboração própria de informações, de autonomia restrita, dentro do procedimen-
to, embora ela não possa, por si só, garantir essa autonomia. Daí que fique em sus-
penso a pergunta de se, e até que ponto, o sistema pode adquirir autonomia do
procedimento jurídico e de que hipóteses específicas ele depende.

Para se poder falar de autonomia temos, em primeiro lugar, de definir este


conceito tão utilizado. Para isso é necessário distinguir autonomia de autarquia. O
conceito de autarquia aplica-se diretamente aos processos de permuta (intercám-
bio) entre sistema e meio ambiente. Um sistema é autárquico (ou independente) na
medida em que pode reduzir essas relações de intercâmbio, na medida em que se
pode tornar independente do meio ambiente e existir por conta própria. O conceito
de autonomia aplica-se, em contrapartida, à orientação destes processos de inter-
câmbio, através de estruturas e métodos próprios do sistema, portanto parte logo
do princípio de que o sistema não é independente. Autonomia não exclui, porém,
do seu meio ambiente, uma grande dependência dum sistema de realizações. Que
um procedimento judicial seja dependente disso, que se construa um edifício, que
se contratem ou se mantenham juízes, que se fixem ou estabeleçam competências,
que se ratifiquem ou promulguem leis, que se conheçam ou participem fatos, tudo
ISSO não exclui que a ação dentro do sistema seja, em parte, orientada segundo
critérios próprios de seleção.

A autonomia dos processos judiciais tem, naturalmente, limites nítidos; con-


tudo é muito maior do que geràlmente se pensa (1). Ela se verifica quando, e na
medida em que os pontos de vista se vão aprofundando no procedimento, pontos de
vista esses que determinam a atuação seguinte no processo e que determinam'
sobretudoo resultado. Pode estender-se às informações que se podem inferir quan-
to às normas ou aos fatos e pode estender-se também ao comportamento próprio do
sistema, que se pode escolher perante estas informações. Cada seleção é um exer-
feio de autonomia, como o é também a seleção da lei, que se pode utilizar numa
conjuntura de fatos que adquiriram força no procedimento. E todos os participan-
tes podem, de acordo com as possibilidades que o seu papellhes dá, participar nes-
ta autonomia - também, por exemplo, o réu que resolve não indicar determi-
nadas testemunhas, ou o acusador que decide fazer uma demanda de preferência
sobre uma relação de dívida basicamente existente, do que sobre uma troca. Uma

Paru isto vai,' sem\>l C' a pena ler I}enjamin Cardozo: The Nature of lhe Judicial Process (A natureza
clu pll)(r~,",juclid,.I), NI'w lIavl'" I'l!ll
h' PROCESSOSJUDICIAIS
AUTONOMIA 63
l
juridico (3). Assim se alivia o processo da pressão social e daí resultam possibili-
pl'S~(ln deve, portanto, abster-se de confundir a autonomia do procedimento como
dades internas duma mudança de princípios de orientação: uma pessoa tem de (e
1.,II'lllil social, com a autonomia (necessariamente limitada) do juiz no seu papel.
deve) escolher e expor as normas, de acordo com os fatos do caso e também, ao in-
~(' e em que medida se pode alcançar a autonomia, isso depende para os sis- vés, os fatos de acordo com as normas (4). Nenhum ambiente possui o monopólio
1I'1l1"~ em geral e para os processos jurídicos em particular, duma perspectiva tem- sobre a determinação de todas as premissas de opção. Assim se evita o perigo de
IIIH.rl. objct iva ti social, de diversas circunstâncias, que tém de estar de acordo. que o processo se possa tornar um braço prolongado dum determinado setor do
meio ambiente. Na linguagem de decisão dos próprios processos jurídicos, esta
Na dimensão temporal tem de se dar tempo ao procedimento para poder pôr condição de autonomia exprime-se manifestamente sob a forma duma separação
'-111 luuc iouarnento os seus própr-ios métodos 'de elaboração de informações; tem, rígida entre problemas de direito e problemas de fato, cuja correlação fica a cargo
IUII\, d(' poder separar no tempo, input e output, A autonomia do sistema seria im- de cada caso particular (5).
JI"N~IH'1 se, a cada causa no meio ambiente, se seguisse imediatamente um efeito do A articulação de condições dum estabelecimento relativamente autônomo de
~I~I('I".I no meio ambiente. O ambiente social tem de conceder aos processos ju- decisões no procedimento deixa entrever a forma complicada e cheia de hipóteses
du lal~ um tempo de aprofundamento. Que os juízes disponham de prazos dentro como os processos são construidos como sistemas e, simultaneamente, por que meio
di' li 11\ues mais ou menos elásticos e que nisso se possam ater às necessidades ine- podem ser ameaçados. As sociedades primitivas não podem engendrar, nem a
"'1111', <10 processo. é do conhecimento geral. Ao mesmo tempo, também a "mo- diferenciação, nem a autonomia; e mesmo as sociedades muito complexas podem,
IIISIII.I<Il''' do processo constitui um velho e eterno tema de crítica à justiça, porque voluntária ou involuntariamente, perturbar ou destruir a autonomia a atingir nos
Ii pl.uu-jarnento cronológico dos tribunais não é coordenâvel com o do amo processos judiciais. A programação objetiva e detalhada da decisão, podendo
l'Ii'III1' (2). chegar até à automação, constitui uma dessas possibilidades, a pressão do tempo
constitui uma outra. As regras mais minuciosas do direito processual, com todas as
N,I dimensão das diferenças objetivas de sentido, a autonomia parece depen- garantias dum estudo constitucional, não levam à autonomia, se não forem secun-
.I, I , 'Ohl('lUdo, de que as relações de sentido entre sistema e meio se estabilizem em dadas pela diferenciação social do meio; levam antes a um único lugar, como que a
(l'I lu 1I1('110S)dois planos diferentes de generalização, um dos quais se aplica ao siso uma central política, controlando tanto as informações jurídicas, quanto as efetivas
11'111,1t orno tal e o outro, pelo contrário, aos processos concretos de interação entre que são apresentadas ao tribunal (6).
\,,1"1\1,1 I' meio. Por um lado, os processos jurídicos são geralmente reconhecidos
11111111 uist it uicões e são permitidos sob forma jurídica. A sua existência fica asse-
~\l11,ld,1 I' 1\010 depende do que pode realizar o sistema isolado de procedimento. Os 3 F.m idêntico sentido. a autonomia duma exploração econômica depende de que o confronto dos
111m IlOS procedimentos não levam diretamente a uma alteração da ordem do diversos mercados - mercado de produtos, mercado de trabalho e mercado financeiro seja conci-
plill (',~(), ou mesmo à supressão dos processos jurídicos sem mais. Por outro lado, liado através da empresa e nenhum mercado pode,_só por si, determinar os sucessosda empresa.
1'II1,ISvantagens quanto ao significado e segurança são geralmente asseguradas de 4 Também neste debate jurldico de métodos se cai nesta orientação alternada de premissas nor
mativas ou efetivas de decisão. aceitando-a, porém, como caratcrística do método jurídico, sem dar
1,.1 forma, que não determinam o procedimento concreto, mas antes deixam em arcnção à diferença social que está por trás dela. Ver. por exemplo, Wilhelm A. Scheuerle: Rechtsan-
"IWIIO um espaço de manobra para a decisão. Neste espaço de manobra pode wendung (Aplicação jurídica), Nurernberg-Düsseldorf 1952, pago 23 e sego; François Gorphe: Les
rl('M'lIlolar·se uma elaboração de informações relativamente autônoma. Uma oro décisions de justice. Étude psychologique et judiciaire (As decisões da justiça. Estudo psicológico e judi-
)o\,lIii/J\'iio jurídica generalizada do procedimento constitui, simultaneamente, uma ial), Paris 1952, pago 82 e segs.; DietrichJesch: Unbestimmter Rechtsbegriffund Ermessen in rechsts-
rhcoreuscher und vcrfassungsrechtlicher Sicht (Conceito jurídico indefinido e parecer no aspecto da
tI.I\ (IIndições prévias da sua autonomia.
teoria do direito. Conferir aqui com a crítica e contrapropostas de Friedrich Müller: Normstruktur und
püblico 82), 1957, pags. 163·249 (188 e segs): Karl Engisch: Logische Studien zur Gesetzanwending (Es-
Sozinha, porém, não seria suficiente, se o sistema de procedimento tivesse rudos lógicos sobre a aplicação das leis), 3. a edição, Heidclberg 1963, pago 82_ Só conheço pesquisas
'1I)('II<1Sque ver com um meio que lhe apresentasse, em primeiro lugar, as infor - "llIl'lril"5 sobre este problema na administração. Conferir com Roy G. Francis/Robert C. Stone: Service
II\,I~()('S gerais, depois as especiais e, no fim, lhe diminuísse, a capacidade. Na di, ""li Pi oe edure in Bureaucracy (Serviço e procedimento na burocracia), Minneapolis 1956, principal-
nu-usao social. a autonomia depende da diferenciação do meio. Para os proce- li11'1111' pâgs. 39 ~ segs. e Gümer Hartfieldz'Lutz Sedatis/Dieter Claessens: Beamte und Angestellte in der
V"Iw••hungspyramide. Organisations-soziologische und verwaltungsrechtliche Untersuchungen über das
dilll('ntos judiciais das sociedades civilizadas (contrariamente aos das arcaicas) é I'11,",hdtlungshandeln in der Kornmunalverwaltung (Funcionários e empregados na pirâmide adminis-
1':\1:11I{'l'Ísti(o que os âmbitos de introdução para premissas jurídicas ou efetivas de uuilv, •. I'l'squisas de organização sociológica e direito constitucional sobre a atuação da decisão na ad-
dt,( isao , sejam socialmente distendidos. As mesmas instâncias que estabelecem o ,,'iill~II,'~~Omunicipal). Berlim 1964 principalmente pag_ 88 e segs.
dil('ito não denunciam simultaneamente quais os fatos verdadeiros e quais os não- '1 (;01110 esta separação entre questões de direito e questões de fato desempenha uma função sigo
III'"11lIV,I,impóssc t ambêrn a teoria do direito. Intensifica-se numa diferença radical entre norma e
VI'I<I,1<\(0 iI 05. Ambos os meios estão separados e nem sequer se podem dominar 1"••1111:,,11', ,'Illn' dever e ser. Se isto é uma conseqüéncia necessária. terá que ser provado na própria
11'(Ipl()('allH'III(', O SI'II l(lllrl<)I110 só pode realizar-se dentro e através do processo 1,'1111,1do direito. Conferir aqui com a crítica e contrapropostas de Friedrich Müller: Normstruktur und
NIIIII",dvlllll Zum Vcrhâltnis von Recht und Wirklichkcit in der juristischen Hermeneutik, entwickelt
111•.•.1111.11 d," Vcrfnssungsirncrpreration (Estrutura das normas e normatividade. Para a relação entre
01111'1111 " 1\'"li,I.I('" 11,1 hermcnéurica jurídica desenvolvida em questões de interpretação da constituição),
1I1'I1I"II'lhh
li Nu t lI~il.11.10dever ncoruecer ,'111 casos isolados contra!' Sentido declarado da instituição, tornam.
1;1111101
\1111
,I im,jl ill~,;AI' (1111'11 i,;, ,1".111I" 11,,11'11111
I IIIlI"1iI tOIll Ilalls ZcilCl/liarry Kalven, ~" 111'1 r ••~rI.l. ""IIJllInllhl~ 1I/1,II,fI,·.
tllll'·8111I1HlrHlCs.
lIâ muito IObre isso em Otto Kirchheimer: Politis-
,111JII.III OIl.II\III'III1II1'~),vru,HlIlIt-III,I, Nl'nwl,·tlllr.lIm 196~.
1I ')\',",,1111111,101,"11li, t.'v ill.I!'"II! (l\t""i!i,l.d, 11111111111,,"1),
l\iI~IOIII'"III\W 1!!ti!).
64 PROCESSOS JUDICIAIS

É difícil
afirmar se a autonomia dos processos judiciais foi crescendo com a
(OIlSlI ucão do moderno estado industrial ou não. A sugestão constitui, no âmbito
da autonomia, um desvio do direito para os fatos. Por um lado a regulamentação
h'g.11 dos âmbitos de decisão aumentou consideravelmente em alcance e precisão e é
completada eficazmente por uma aperfeiçoada técnica de axiomas, revistas e li-
1(" atura cxplicativa. Isto tem como finalidade uma restrição da autonomia para o
Pl()('('sso Isolado. Por outro lado, a apreciação do estado das coisas tornou-se muito
m.ris complexa: o juramento perdeu o sentido como meio de provar, a influência
doutros papéis parece ter voltado à apreciação das provas, os antecedentes psi- CAPÍTULO ur
«olôgicos duma declaração podem e devem ser esclarecidos(7). Isto quer dizer, po-
I(lm, que a seletividade, e com ela a autonomia do processo jurídico, têm de~r Sistema de contato
maiores perante um meio encarado duma forma mais complexa(8). Também tem de
NI' considerar, de acordo com isto", a distribuição temática de autonomia a vincula-
l.H).
Primeiro que tudo, deve examinar-se uma conjuntura especial. Ela não é
Uma pessoa tem, naturalmente, de evitar considerar a autonomia relativa dos típica do processo jurídico, só podendo de fato realizar-se sob certas condições
PIO«'~~()S judiciais como um valor em si, com o qual uma pessoa se teria de iden- prévias especiais, mas depois tem as maiores probabilidades de desempenhar as
1 ti 11 ;lt c que aumentaria de acordo com as possibilidades. Nenhum sistema é in- funções consideradas essenciais à participação no procedimento. Quando com-
1111Mil uível. Se a autonomia não for assegurada, então suas funções terão de ser preendemos os mecanismos sociais que imprimem o seu cunho a este caso especial
d('S('IIIJlI'nhadas por outras instituições; ~ sistema político-administrativo da so- de sistema de contato, podemos, simultaneamente, reconhecer na conclusão inver-
I i('d.tcl(' ficará, então, congestionado noutros pontos. Isto é válido principalmente sa, por que motivo o procedimento jurídico normal e sobretudo o processo judicial
".11,1 a função legitimadora do procedimento: tem chances menores de motivar os participantes para a tomada de decisões de-
sagradáveis.
Pata uma legitimação pelo procedimento são a diferenciação e a autonomia
'1"1' abrem um espaço de manobra para a atuação dos participantes pleno de altero Os sistemas de contato geram-se quando os próprios participantes se encon-
1I,\liv,l~ C de importância básica, reduzindo a complexidade, Só assim os partici- tram mais amiúde por diversos motivos e aí prosperam separadamente, em depen-
llollllt:h podem ser motivados a tomarem, eles próprios, os riscos da sua ação, a dência alternada, na medida em que uma vez um lado é mais forte, outra vez o
( O()IH'lar('m, sob controle, na absorção da incerteza e dessa forma a contraírem outro, e agora um e depois o outro se sente sempre obrigado à cooperação com o
/oI1.tllu,tlmeme um compromisso. Até onde leva este mecanismo e até onde ele pode adversârio. Essas conjunturas são por demais típicas em relação às administrações e
im plicar uma reestruturação das expectativas e com ela a legitimação da decisão convênios de interesses, e também a relação de juízes e advogados, designadamente
" 11m problema que temos de enfrentar com as investigações que se seguem. nos lugares pequenos, mostra caraterísticas desse tipo. Nestas circunstâncias de in-
terdependência alternada, seria menos racional para os participantes planejar
taticamente a sua ação apenas com respeito ao procedimento isolado, sem con-
siderar que em outros procedimentos o poder pode estar repartido doutra for-
ma (1). Eles estão sob a lei da necessidade de reverem-se, a esta lei obriga-os à
generalização das perspectivas. Aquele que é, no momento, mais fraco, pode, de
acordo com as possibilidades, aspirar a vingar-se em outros processos, se foi tratado
de forma injusta (unfair); ou, pelo menos, mostrar-se-á rígido, consciente do seu
direito e inabordável. O vencedor do momento tem de considerar, de antemão, es-
ta possibilidade de generalização do conflito, e isso pode inspirar-lhe o conselho de
se moderar no aproveitamento das suas chances momentâneas (2)

, A generalização
pecto temporal,
das perspectivas que se impõe
objetivo e- social. Cronologicamente,
em situações
o horizonte
dessas tem um as-
dos acontecimen-

7 Conlrri, (um I~ri, h O\)h, ing: Oie Erforschung des Sachverhalts im Prozess, Beweiserhebung und I Conferir. em princípio. com Thomas C. Schelling/The Strategy of Conflict (A estratégia do con-
l\(>w,'iNw(l,dill""1I hll 1.('111\,.11 h (/\ investigação do estado das coisas no processo, levantamento e Ilito), Cambridge, Mass. 1960. Ainda Harold J. Leavitt: Managerial Psychology (Psicologia de gestão)
1'1""( ',I~I\" .Ie- I''''V'." \1111 "'''''11111). lkrlirn 1964 pags·6 e segs.; Henri Lévy-Bruhl: La preuve judi- Chicago-Londres 1962. pags .. 113 e 131 que distingue, neste sentido entre a situação de poder por en-
(hti •• , "11111, 11",,, j"I"III" 1IIIIIIIIIIIr (/\ I''''VII iudicial. Estudo de sociologia juridica), Paris 1964, págs. coruros isolados Ou por relações duradouras.
Ve-r ,IS observações que se referem à convivência de organização interna em Robert L,
110 r .,'''"
1\ 1)111' ,It-~•.• "I~I,,,.11,0" ,I••, ,,~,III.II ••• d. dr( i.,II, .,' possam tirar conseqüências para a preparação- K,dlll Ih)ll,oI11 M, Wol!f Robt-u P. Quinn Dicdrick Snoek: Organizational Stress. Studies in Role Con-
li" 11111 PUtl'1 til IIqul ~.I';'tI'.I"} li•• I .11111 Àlllbi/olllllY ( 1"",.10 orgnnir acional. ESIUdob sobre conflito de papéis e ambigüidade). Nova Ior-
'1111 111,"1,,·, .~yd,n- y I '1ft I ""/01' '11 ,. "'M~
66 PROCESSOS 1UDICIAIS SISTEMA DE CONTATO 67

lOS a considerar pelos participantes é empurrado para o futuro; torna-se assim assim a questão. Terá razão em atribuir a decisão às "circunstâncais", ou talvez
maior o período de tempo que tem relevância para eles. Objetivamente surgem mais mesmo à situação-real desfavorável e em não apontar malícia ou preconceito pes-
assuntos. As possibilidades de ação, que "em si" não têm qualquer relação, são pos- soalmente ao decisor; essa versão tem de ser a interpretação oficial apresentada por
tas numa relação artificial por motivo do intercâmbio, da vingança ou da gratidão. ele, no caso de querer manter as relações. Dentro de certos limites de agravamento,
O estilo de encontro unifica-se através dum denominador tipicamente esperado e o sistema de contato motiva a inversão dos interesses e o controle expressivo da
que, em todo caso, não tem de ser redescoberto como cooperação, por exemplo, ação. Este próprio limite de agravamento vem a ser a restrição do sistema de con-
ou como conflito. Esta generalização, encara de forma cronológica e objetiva, tato e, simultaneamente, a pedra angular da tática racional dos participantes: eles
significa um acréscimo de complexidade, um maior número de acontecimentos devem poder desempenhar aquilo que para outros membros ainda é tolerável como
possíveis, que são relevantes e devem ser calculados. Por esse meio as possibilidades exigência e onde se encontra o limite além do qual os indivíduos isolados perdem
de orientação do participante isolado tornam-se rapidamente exageradas, o jogo o domínio sobre si próprios e com ele o seu futuro no sistema (6.).
pode. quando muito, ser ainda apreciado nos lances próximos, mas não já na sua
totalidade. POF isso é aconselhável urna simplificação, que não se pode realizar nas Tudo isto deixa supor, e muitos observadores crêem reconhecer (7), que os sis-
dimensões, quer temporal quer objetiva, mas tão somente na dimensão social: a temas de contato deste tipo facilitam a legitimação da decisão. Também junto dos
orientação alterada, deslocada pelas características
é particulares, suas perspectivas juristas este mecanismo de legitimação encontrou pouca aprovação ou até uma
e conseqüências fora do sistema social de todos os contatos que se podem estabe- recusa desconfiada (8). Parece-Ihes, e não sem razão, que deixa passar os regu-
lecer entre os participantes. As "boas relações" amplas aparecem como tal no cam- lamentos jurídicos e que arranca pelos gonzos o dispositivo oficial de garantia
po visual dos participantes e são válidas para eles, úteis e dignas de serem man- jurídica de acordo com o processo; pois o cuidado em relação ao seu sistema de
tidas. Motivam ataques à sua consolidação e aprofundamento, cuidados e até mes- contato pode levar os indivíduos a renunciarem aos seus direitos; torna-se um
mo sacrifícios e renúncias. O conjunto dos contatos e não apenas o episódio isolado problema a pergunta se uma pessoa negocia com base no direito, ou se se deve
adquire assim o caráter dum sistema social que orienta a atuação respectiva através arranjar fora dele. É natural que esta legalidade dos sistemas de contato não deve
duma organização normativa própria. ser, forçosamente, compreendida como uma tendência para a violação do direito.
Esse sistema de orientação abstrai o plano de reconciliação, onde os par- A relação para com a garantia legal é multifacetada, complexa e altera os acentos.
ticipantes se encontram e permite-lhes considerar permanentemente a elevada Os participantes, apenas com respeito à duração do processo judicial, podem até
preferir um compromisso que poupe tempo e podem também utilizar este mecanis-
complexidade das suas relações globalmente, quando muito, na medida em que
mo ao contrário para tolerar a decisão e ganhar tempo, ou podem concordar em
antecipam possibilidades indefinidamente estáveis e acreditam que sejam honrados
abandonar a decisão ao sabor do acaso, à guisa dum processo-padrão de conclusão
a deferência e o desejo de cooperação. Os participantes têm sempre presente na
imprevisível. Em qualquer dos casos, os sistemas de contato servem de medianeiros
execução do estabelecimento dos fatos a sua confiança e o seu crédito (3). De acor-
à garantia jurídica, na medida em que a tornam assunto duma votação social ano
do com as possibilidades, eles filtram tudo o que escurece a atmosfera, desperta
suspeitas ou pode mesmo dar lugar à mudança repentina em hostilidade (4). Pode
atingir-se assim uma dose elevada de fluência e concentração do contato, em con-
6 No centro duma teoria de organização. a chamada "teoria de coalizão, formulada de forma mais
seqüência do que os participantes aumentam freqüentemente a sua influência
rigorosa, existem reflexões deste gênero. Conferir designadamente com Chester Barnard: The Func-
recíproca e podem tirar proveito da confiança mútua (5). rions ar the Executive (As funções do executivo), Cambridge Mass. 1938 sobretudo pags. 139 e segs.;
James G. March/Herbert A. Simon: Organizations (Organizações), Nova Iorque-Londres 1958, so .
. -No âmbito dum tal sistema de contato a decisão isolada converte-se num bretudo pág. 83 e segs.: Richard M. Cyert/James G. March: A Behavorial Theory of Organizational
momento ao lado de outros. Quem perde no caso isolado pode consolar-se com a Objectives (Teoria de conduta dos objetivos organizacionais) Em: Mason Haire (Editor): Modern Oro
esperança de conseguir melhorar na próxima vez. Ou, pelo menos, ele moderará, ganization Theory (Moderna teoria da orgaaiz ação), Nova 10rque·Londres 1959, pags 79.90.
em atenção às boas relações e enquanto perdurar esta esperança, a sua oposição à 7 Comparar com as referências existentes facilmente multiplicáveis no capo lI, nota 4,12-17. Des-
onheço pesquisas empíricas sobre este assunto trabalhadas pormenorizadamente e metodicamente con-
decisão e mostrará uma compreensão de princípio para o fato de se poder liquidar troladas.
8 Os sistemas de contato dão na vista aos juristas, principalmente no direito econômico adrninis-
Irauvo, onde os interesses particulares têm esperanças em benefícios não reclamáveis e, por isso, não se
3 Como tentativa de investigar empiricamente as relações de confiança. ver as experiências de Mor-
.Ill('vrn·, a esgotar-se em outros casos de administração perante a sua posição jurídica. Ver, por exemplo.
ton Deutsch: Trust and Suspicion (Confiança e desconfiança), The Journal of Conflict Resolution 2
,'s indicações e atitudes em Ernst Rudolf Huber: Wirtschaftsverwaltungsrecht (Direito econômico.
(Periódico de resolução de conflitos 2), 1958, e do mesmo autor: The Effect of Motivational Orientation
.Idminislrativo), 2.' edição: Tübingen 1954. vol. li, pago 20 e seg., Herbert Krüger: Diskussionsbeitrag,
upon Trust anel Suspicion (O efeito da orientação de motivos sobre a confiança e a desconfiança).
V(',offcntlichung der Vereinigung der Deutschen Sta"'<rechtslehrer 11 (Contriburo para o debate).
Hurn.m Rclauons 13 (R('\.I~óes humanas 13), 1960, pags. 123-139.
(1'lIl1lil ,1~:iO da associação dos professores alemães de teoria política 11), 1956, pago 96-135 (129); Hans
4 I Ir11,I hdlhall\(' .i,,~li~I' do sist,'ma de contato que se cria entre os deputados duma comissão oro 1'1'"'' I pS"n: offenrliche Subventionierung Privater (Subvencionamento público dos particulares), Berlim-
~.llIlflll.d •. ". ,di'" 111111111",1111" 11I1I1I,,,·ri.lispor ocasião do conselho anual de orçamento pode ser en- C"ltulliI I 'l%, 1M!!. 1-1. nota 23 e pago 16; Claus-Dieter Ehlermann: Wirtschaftslenkung und Ents-
,,""1 •••1•• 1'111A.'"II Wdd"v.ky 11\1' l'olituH 01 lhe l3udgctary Process (A política do processo de oro ,1,',101'111111 (f)III'~,\()
1\ econOmica e indenização),lIeidelberg 1957, págs. 38 e segs, 50 e seg., 146 e segs:
~jU1Itlllll), Utllrillilll 11111111111, 111(1'1
I '"'' "'"'1 hlll I l.rlll l>udl des Vcrwahungsrechis (Manual de direito administrativo). vol. I. 9' edição,
" t~",,1t li' ""I' r: .1 1••1" t 1111,1101,.,,,tI I h.! 1'"111,, (0, fl1l1lionários e o público), Public Adrninis- MIIII"I'''' tI.,dim 1%6 p.l/\,' 71 e ~t'g~.Para problemas análogos dum acoplamento formal de vários
1Io,li,," li I,\tlllll"i!iill~;-'" l"ilolli".'!l1 Itrll,I"'/I' I', "',I "" "111,10JOIC'Jlh Bensman/Artur Vidich: PONer li' ""1 ,••, ,11111111",11 ,111,,,,,''''''1'''' ,li JIIII\,' com I lJI old l)oll1browski· Missbrauch der Verwaltungsm.u. lu.
(;li'l'II'í i~, 1I1,,~,'"I'"li, 1:", i'l~ (1'1",.11, __ ,.I•• I""I,~, ,\., ~"'l\'oIl1t1(' hlIlO' "i!ir,I), Sociul Rescarch 19 (Pes- '/1111'I', ,,101,'" ,I<, ""1'1",111"14v," H\ 1111'11"111" V"I wilh 1I11!!S/WI'\ 1',,,,,,,
ke (A huso do podr, ,\(lmini'I' ,11ivo
II"I •.I."'.I~I Illl, I'II'M 1'."'
_lli'/.111 1,",101,,",01 •• 111111"..1" d •. .!'HIO'" "10"'1",,, ,HIo"I"I'II"IIVU~). M"""", i.1 1'1117
/til PROCESSOS JUDICIAIS
SISTEMA DE CONTATO 69

lI'IÍOI e , com isso, a organização do direito torna-se dependente das estruturas de


te tão especificados, que não se podem produzir quaisquer situações alternativas
!llIclt" t' motivo, que já não podem mais ser controladas dentro do próprio processo
imprevisíveis de poder e dependência, ainda que se encontrem regularmente os
)111 klico .
funcionários dos correios ou da inspeção industrial.
Na vida quotidiana são normais J essas reflexões prévias, e quando são rati-
Prevalecendo essa descentralização de contatos, então os sistemas de contato já
li, ad as c registradas sob a direção e bons conselhos do juiz, a ciência jurídica não
não se formam espontaneamente, têm de ser procurados e estabilizados através
"Iilhall' contra elas. Motivos egoístas são submetidos à administração pública e um
duma união pessoal mais ou menos artificial entre inúmeros processos; quer no caso
d"Nldvd de poder, demasiado acentuado em relação para com os cidadãos, é sub-
duma pessoa procurar um advogado que "conheça bem o juiz", na vaga esperança
1111'11(10aos seus sistemas de contato. Sobretudo quando os indivíduos descobrem
de não vir a ser uma vítima desse bom conhecimento; quer no caso de vários in-
1I11~~ihilidades e as aproveitam para se subtrair ao controle judicial, esta suspeita é
teressados se fundirem em consórcios de interesses e estabelecerem escritórios de
11.11,111.,como quase já confirmada. Isto constitui um juízo prévio, mais ou menos
contatos no setor governativo com o mesmo objetivo das boas relações e com os
,\ISII hrndo , na medida em que falham as investigações empíricas. Entretanto o
mesmos riscos. Com isso, porém, poê-se a pergunta, se, e até que ponto, se podem
11,,11.11('revela não só este juízo prévio, como simultaneamente certos problemas
confiar aos representados os argumentos e o efeito da legitimação dum sistema de
1(' ,IIN
contato formado por representantes, principalmente quando a clientela muda de
processo para processo, Aliás o artificialismo dessas criações indica que se trata de
na~i«\Inente, cada procedimento de legitimação, que não se apóia direramen-
exceções. Todavia a exceção confirma a regra. A análise dos sistemas de contato
11' 1111poder de persuasão e no valor do considerando das normas jurídicas, fun-
esclarece, simultaneamente, a função do fato de as relações com as autoridades e
11,11111'111<1 S(' em mecanismos extra-legais. O que é válido também para a legiti-
com os tribunais se processarem, normalmente, de forma esporádica. Esta descen-
111,11.,101)('10 procedimento. De que outra forma se deveria efetuar o salto do fato da
tralização dos contatos impede a criação de sistemas de contato e assegura, assim, a
ill,lIll1li~,ihilidade para o fato do reconhecimento duma decisão desfavorável? A es-
possibilidade de programação central da ação administrativa. Pois como suges-
)"'1.111(,'\ duma legitimação pelo procedimento destrói pela base o cosmos jurídico.
tivamente prova uma longa história de refeudalização e decadência do vasto im-
\)111.1 (I,,~ funções essenciais, que também faz parte do processo jurídico, na mo-'
pério burocrático, só se pode garantir uma auto-orientação relativamente autô-
hill/.I<,·'lO dos considerandos não-programados juridicamente, consiste na abertura
noma do sistema político, quando a burocracia, nas suas restrições, for considerada
dI' 1I0V,IS fontes de considerandos para apoiar as decisões obrigatórias. Os sistemas
livre (10) duma implicação em determinadas redes particulares de relações por
d,' (OlllalO são apenas uma expressão particularmente eficaz e séria deste pensa-
motivos familiares, econômicos ou religiosos. Por outro lado, põe-se com particular
1111'1\10. O seu estilo de generalização contradiz com maior intensidade o estilo de
urgência o problema da sua legitimidade, precisamente como conseqüência .desta
).(1'11('1 ali/.ação do direito do que os dos sistemas isolados de processo. Os sistemas de
autonomia social e orientação interna da burocracia política em grande escala. A
11I1I1"lO podem fazer descarrilar a vontade centralizada do "legislador". Estão em
diferenciação social dum "estado", relativamente autônomo e agindo por auto-
I hOI(\I(' c orn o princípio da igualdade. Os pequenos sistemas que se formam nas
programação na Europa atual, condiciona a acrimônia com que se põe agora o
~\lI)('1 fki(,s de contato das grandes organizações ameaçam estas espécies de parasitas problema da legitimidade. Os sistemas de contato, que. agora se tornam moralmen-
dI' Ihch tirar as forças, ou então a capacidade de manejo (9). Seria digno de sério te suspeitos e já não são socialmente institucionalizáveis, já não podem resolver este
I XilllI(' V('Ii ficar se pelo efeito de aplacarnento e legitimação , com tais conseqüên-
problema. Assim fica em aberto a pergunta quanto à sua possibilidade de resolução
I i.ls, nao se pagaria caro demais.
por processos jurídicos isolados.

sempre, também
COI1\O aqui se podem pesar as vantagens e desvantagens e es-
I ,d)('!t-I ,'Ique só uma pequena parte dos processos jurídicos correntes é abarcada e
IIIOI('j.(ida pOI esses sistemas de contato. É típico, precisamente para as adminis-
II.\~(H'S ('001 grande burocracia, divisões de trabalho muito diferenciadas e para os
I" hl1l1ê1i~, que os contatos entre determinados cidadãos e determinados funcio-
11,\lIOh ~6 podem realizar-se esporadicamente, não se repetem num horizonte visível
d,' It'IIlI)() t' interesses e por isso não se identificam num sistema que abranja diver-
~!lN (lIO(('SSOS ju rídicos. Não se pode estender nenhuma ponte do processo para a
li, "II~" dt- condução de automóveis, para o processo de desquite, para a distri-
IHII~.1() do «)II('jo ou p.uu as funções de controle dos funcionários da 'inspeção in-
ChIHIII.d, IH'1I1 tiO (t'lIlpO, 1H'11\oh ;('1 iva nem socialmente. Os contatos são tipicarnen-

'1 .t.,.
1',01.,., ,1111"1'''"'''' 1111",11""'" rOII ,1\,'8 d". ~'"' 1"<"1"111\ I /)11 [,1I0Sexteriores e para os problemas
I () COllf(,tir (Un, Shrnuel Eisensiadt: The Political Systern of Empires (O sistema político dos imo
í """'lt\iIH i .t _ .11111111
'''11,," ""' ('''1''" .1. (••,,11," 1111"11,"," ,IIJIl Ntlda~ Luhmann: Funktionen und
'" 1,,11101,1., c"1t1l.'"III,li""lllIldkl" 1IIIIIn,,\lll.I." tI.IIII",\I",.'~,1!1[UIIl'oIl).Bci lirn 1964, pág. 237 fI~'IO'), Nov, lorque Londres 1963. Para um caso isolado característico consultar também L10yd A.
,",,111'1"1\,111111 111111','"'
','I Y 1\ C,'IIIU'y 01 Political Evoluuon among lhe Basoga of Uganda (A buro-
u..••u .•. t.. • .utu, Um &h.lIllO d. ","III~III. pulh 01,. "1111"'" 1I'''()I!,l <Ir Uganda), 2.' edição, Chicago 1965.
T

..•

CAPÍTULO IV
Adoção de papéis

Podemos agora perguntar de forma mais precisa se, em que sentido, através de
que mecanismos psíquicos e sociais, e dentro de que limites, a participação num
processo jurídico, expirando como sistema, fortalece a disposição dos cidadãos para
aceitarem decisões como obrigatórias - não necessárias, porém certas - indepen-
dentemente do seu conteúdo e fundamento. É difícil admitir que seja suficiente queo
povo e os participantes com interesse tomem parte como espectadores passivos nos
esforços sinceros em prol do direito dos funcionários administrativos e juízes .
-Opiniões deste gênero, se se der o caso de virem a aparecer, deviam constituir uma
ilusão de classe. Perante isto, carece de exame mais rigoroso a questão do que se
pode atingir nos processos de decisão através duma implicação atuante daqueles a
quem se dirige a decisão (I). Para isto é conveniente utilizar o conceito sociológico
de papéis e compreender o sistema burocrático de administração do poder público
(parlamentos, autoridades administrativas incluindo tribunais) como um sistema do
comportamento nos papéis (2). Torna-se então possível esclarecer o mecanismo
social sobre o qual se especula, com a ajuda do conceito da "adoção dos papéis im-
plícitos" (em resumo: adoção de papéis), isto no caso de se esperar do processo
jurídico um efeito legitimador. Como este conceito, nos seus traços essenciais, se

Thomas ElIwein: Einführung in die Regierungs und Verwaltungslehre (Introdução à teoria de


governo e administração). Stullgan·Berlim.Colônia-Mogúncia 1966, pago 126, observa criticamente
1'('O'ant(' a tradição alemã de estado constitucional, que para ela é natural a proteção dos cidadãos e que,
ao invés. a participação lhe aparece como desnecessária ou até indesejável. A grande ênfase do
pensamento processual deve, entretanto, permitir livremente não apenas a proteção mas também
(I participação e isto é significativo: participação apolítica.

\! Esta ut ilizacão do conceito de papel para organizações burocráticas de toda a espécie não carece
de mais nenhuma recomendação, pois se tornou evidente na pesquisa mais recente sobre sociologia de
m ganiz acâo (sem o que estaria livremente ligada a um esclarecimento totalmente teôrico daquilo que o
"papel" realmente é). Conferir, por exemplo, com Shmuel N. Eisenstadt: Bureaucracy and Bureau-
crauzauon (Burocracia e burocratização), Current Sociology 7 (Sociologia atual 7), 1958, pags. 99·164
(1l11 e scgs.): Ncal Gross/Ward S. Mason/Alexander W. Mc.Eachern: Explorations in Role Analysis.
Siudics of t hc School Superirucndency Role (Investigações sobre análise de papéis. Estudos sobre o papel
da superintendência da escola, Nova lorque 1958; Oaniel J. Levinson: Role, Personality and Social
Su ucrure in the Organizational Setting (Papel. personalidade e estrutura social no âmbito da organi-
",\.\0), '111<'Joull\al of Abnorrnal and Social Psychology 58 (Periódico de psicologia anômala e social
I);), 1%" J'.lli~ 170 180: 1{'·llat(· Maynu.: Soziologi« der Organisation (Sociologia da organização), Rein-
Ir•.~ lllh' JI"H" HI r NI'H" i n."1irl Knll./Rohrrt I .. Kahn: The Social Psychology of Organizations (A
11,,11 IIIIIIr.I"1 IUH 1.11 d .•..•UIt.l.ltl\III\Uf''') NUV.I IUltHI~ [untlu"" S'dllf'V lC)6(11l~HOL l71 tO ,!iI('wH.
72 PROCESSOS JUDICIAIS ADOÇÃO DE PAPÉIS 75

deve ao psicólogo social e filósofo americano George Herbert Mead (3), a sua teoria de papel, pois admite os papéis como algo que se pode "adotar" antes de chegar â

será aqui esboçada em breves traços. constituição do sentido objetivo e das identidades sociais, e entre elas das perso-
li
nalidades. Assim alargado, o conceito torna-se frouxo e inútil para posteriores
q
Mead fala de role-taking. Com isso ele quer dizer que o homem experimenta análises.
os outros homens, não simplesmente como objetos, mas sim como portadores de Entretanto esta desvantagem pode ser levemente corrigida na medida em que
perspectivas próprias e individualistas, para as quais se pode transferir. Ele pode se inverter primeiro a prioridade dos conceitos de papel e identidade, e se encarar a
t ompcnetrar-se do papel dum outro e encontrar nele um ponto de vista, a partir do formação da identidade do outro e a própria como de maior importância do que a
qual ele pode olhar retrospectivamente para si próprio. Através da adoção dum identificação do comportamento dos outros, sob o aspecto de determinados papéis
p.ipcl alheio, ele pode assinalar o seu próprio papel, pode tornar-se o objeto, dum sociais. O outro é uma pessoa e não um papel, e através dele como pessoa, e não
"eu " converter-se num "me", e descobrir assim, simultaneamente, aqueles aspectos como papel, eu comprovo a minha própria identidade como pessoa. Os papéis
do mundo que apresentam significado idêntico para ambas as perspectivas. A sociais, por exemplo as relações mãe/filho, ou outras equivalentes, são, realmente,
.rdocão do papel, neste sentido lato, é um processo da auto-identificação e da necessários para se aprender a agir como pessoa humana. Mas para este processo
ti iaçâo dum mundo objetivo como uma síntese de perspectivas subjetivas, acessível de aprendizagem é decisivo que o caráter dos papéis desta relação seja mascarado,
,I todos. que o outro seja experimentado pelo aprendiz não como papel, mas sim como tu e
No fundo, trata-se aqui duma análise do processo de criação intersubjetiva de depois como outro eu (6),
M('ntido,tal como foi tentada de forma mais profunda, e simultaneamente, também
11I,tis problemática, na fenomenologia transcendental de Edmund Husser! (4). O
Através desta correção mais conceptual do que realmente existente, o ponto
concvito de papel merece em Mead uma atenção parcial. Não é mais aprofundado central da teoria meadiana, a aceitação duma relação entre o desempenho do
C', pm t anto , este conceito do role-taking teve pouca utilização também na teoria
papel e o devir individual, não é decisivamente atingido, mas é formulável a ponto
()(iolôgica predominante sobre papéis. (5) Mead como que hiperestende o conceito
de esclarecer toda a complexidade do tema. O homem aprende a sua própria iden-
tidade dentro de, e com a ajuda dos papéis sociais pré-constituídos e, quando está
~ Conft'l ir especialmente com George H. Mead: Mind, Self and Society from the Standopoint of a seguro da sua própria identidade e transmissibilidade de perspectivas do alter ego,
SOl hll Bchaviorist (Mentalidade, pessoa e sociedade sob o ponto de vista dum behaviorista social),
pode então estudar os papéis como tais e, finalmente, com a ajuda dum jogo de
<:111<.111°, 111.1934, passim, sobretudo pago 234 e seg.: do mesmo autor: The Philosophy of the Act,
Chil,II{O, 111.1938 passim principalmente pags. 544 e segs, 610 e sego Ver ainda Ralph H. Turner: Role- combinação de papéis, pode "desdobrar", qualificar, apreciar e variar a sua
IttklJ11i I'r()<r~ Versus Conforrnity (Adoção de papéis. Processo contra conformidade). Em: Arnold M. própria personalidade, Aquele que ele adota, as condições que deve satisfazer para
H 11M'("ditado por): lIuman Behavior. and Social Processes. An Interactionist Approach (Conduta hu- manter as relações sociais correspondentes ao seu comportamento no papel e para
111,1,,11 " processos sociais. Um enfoque de interação), Boston 1962, pags. 20-40 e como um bom pa- poder prosseguir com eficácia nesse comportamento, os aspectos da conduta no
111111"",1Ii('ral sobre lodos os lemas desta escola George G. McCaIl/J,L. Simmons: Identities and Iruerac- papel que podem ser-lhe imputados pessoalmente, de acordo com as normas,
1I1111~ (Ideuudades e iruerações), Nova lorque Londres 1966.
ocasiões ou circunstâncias, tudo isso estrutura as suas possibilidades de adquirir um
I Clln~ultar sobretudo Edmund Husserl: Cartesianische Meditationen und Pariser Vortrãge (Me-
thllll()('~ cartesianas c conferências de Paris) Husserliana vol. I, Haia 1950 e para crítica Alfred Schutz: caráter definido, uma personalidade individualmente ~struturada,
1l,IN I'r ohk-m der transzendemalen Intersubjektivitat bei Husserl (O problema da intersubjetividade
IlIlm( 1'"dl'l1lal em Husscrl), Philosophische Rundschau 5 (Revista filosófica 5), 1957, pags. 81 - 107, ou
No âmbito desta concepção global que Mead procura descobrir através do
Mil h\",1 'I'heunisscn: Ocr Andere. Studien zur Sozialontologie der Gegenwart (O outro. Estudos de on-
101"1\1,180cial da atualidade), Berlim 1~65, págs. 13 e segs. Quem procura uma vinculação entre ra- conceito de role-taking, pode-se, saindo do conceito habitual estreito de papel
nul u .I~IWSda escola fenomenol6gica e a psicologia social meadiana são Peter L. Berger/Thomas Luck- social, restringir as causas íntimas da adoção de papéis implícitos (7}, Cada papel é
11111'"1 111(' Social Construction of Reality , A Treatise in the Sociology of Knowledge (A construção
~"I t.tI "li Jl·,ditlad ••, Tratado sobre a sociologia do conhecimento), Garden City, Nova lorque 1966.
6 Conferir aqui com Dieter Claessens: Familie und Wertsystern. Eine Studie zur "zweiten sozio-
()II<!I' isto aconteceu, na escola de Chicago da "interação simbólica" também se tornou então
kulturellen Geburt" des Menschen (Família e sistema de valores. Um estudo sobre o "segundo nascimea-
1'1'1111'1111' ,I prnhlemâtica interna da exposição de Mead, que antecedia o conceito de papel ao conceito
to sócio-cultural da pessoa humana), Berlim 1962. '
dI' 1011'111111.1<1(': a sua posição mais importante desacreditava o conceito de identidade. Ver, por exemplo,
A 1,••·1,,1~t""lNS: Mill()IS ano Masks. The Search for Identity (Espelhos e máscaras. A procura da iden- 7 Turner, op. cit., fala de "imputed other-role" (papel atribuído de outro). Conferir também com
McCall/Simmons, op. cir., pags. 121 e segs., pags. 130 e segs. Na literatura americana surge ocasional-
1111,,,11'),CIi'II1 0(' , 111.1959; Barney B. Glaser/ Anselm L. Strauss: Awareness Contexts and Social In-
11',.11111111 (Contl'x\()s de consciência e irneracão social), American Sociological Review 29 (Revista so- mente um conceito análogo do papel destinado implicitamente, tendo, porém, outro sentido. Significa
111tI('/I I1'I .IIIII',il,lII.1 29), 1961, pags. 669-679; Edward Grass/Gregory P. Stone: Embarassment and apenas uma atribuição latente, inconsciente ou inconfessável. Consultar, por exemplo, John P. SpiegeJ:
A"'IIYNIN111Rol!' RI'qllll('l1lt'nu, (Diflculdadc e análise dos requisitos dos papéis), The AmericanJournal The Resolution of Role Conflict within the Family (A resolução do conflito de papéis dentro da família),
111"IIIIlIIII!<Y70 (1'I'II(ldllll ,11lH'III,lllO tlt' sociologi« 70) 1964, pags. 1-15; e particularmente interessante Psychiatry 20 (Psiquiatria 20), 1957, pags. 1-16 ou Florence R. Kluckhohn/Fred L. Strodtbeck: Va-
1',11,' I'~I<' """" "'~1I11111l'ul\l'lll' A, Wrlnsll'il1/P,IUI Dcuischbcrger: Some Dimensions of Altercasting riations in Value Orientations (Variações nas orientações de valores), Evanston , 111. Elmsfor, N.I
(/'III""H'~ 011111('1",-",. <I•. cI"III""I~.ltI dI' p,I,,~I~), SOl iOJl\rlry 26 (Sociornerria 26., 1963, pags. 454-466 e 1961, pags. 40 e segs. N6s não queremos, em contrapartida, fixar o conceito de "implícito" neste sentido
0111111., I .'~~N, 11111/1,1111' ,,,,,11<11111111"0 (I 111ri.", 111'\li" h,15,' identidades) Social Forces 42 (Forças Sociais restrito, mas apenas exprimir por meio dele que, no desempenho de papéis dos outros, se pressupõe um
,I~) "1111 1"1"" ,I~" 1'11, Ihllllol 1""11" 111'111 1 "1"1·"n"III\' tlI('M,I M' a esie principio da tese de que não papel complementar próprio assim como o papel dos que ordenam pressupõe o papel dos que
""'01'"1 0111.1;'I'lJJI!illd". ,)~ 1"·ItJ.'II."IJI.II\t~ 1,"1<-"•.•,,1""1'" dI>, IIJP(ois g('lalmenlc detcrminantes para obedecem e vice-versa . Se se pode conscientizar esta condição prévia ou se ela se pode tornar assunto
1,"111\ it •• 1I11~dl'" ,1 1':11111,"1". ,)~ 1'~li~" ,:,!.IIII 1)1\111,·(; IIdm I' . P('fSOllalily as Role learning (A da comunicação social o papel do réu que se defende a si próprio está clara e conscientemente imo
11'-"'"1,";,).111, '''111'' ;l)lIi.I"lil~"" .Ii! l"II,,'i,I, 1:111 lI., I"", 11.11,,1<1W, SII'V"t"on (editores): Pcrsonality pllcito, o do criminoso, que se subtrai à perseguição, ao contrário, só está implícito latentemente isto
It,·.,tllll'"1J 111111I lol.tlnl lil Ik~njíiolvilj"'"l" ,).1 I",,, ••11111 Ir n.•• I ti,tII~,I~), AUSlin 11)60, pugs. 127
11,1,11 consritui um,\ disrincão muito importante, que é contudo de natureza secundária, e que se pode ex-
Ir,l/, Illilllil ,\tI ,Ivl-I (IUMIU!lI 1'110' ,'llidol\ais d,I implicaçúo "aberta" e "latente".
74 PROCESSOSJUDICIAIS ADOÇÃO DE PAPtIS 75

oln igado a um comportamento complementar nos papéis dos outros donde implica para o relacionamento mútuo dos participantes (11). Ê a partir daí que se põe a
um convite a conduzir-se duma forma correspondente (8). Cada intromissão pessoal nossa pergunta quanto ao que pode ser feito desta forma para a aceitação de
('11\ papéis envolve, pois, uma atuação que obriga pessoalmente aquele que atua a decisões pouco desejáveis.
I'" de representar "uma parte de si próprio", a não ser que o contexto dos papéis
pi evoja uma atuação "pessoal" ou possibilite que uma pessoa se desprenda do seu Esta é, provavelmente, a teoria secreta do processo jurídico: que, através do
11Ióprio desempenho por meio dum estilo expressivo de ação, portanto através da envolvimento no desempenho dum 'papel, se pode captar a personalidade, rees-
lur ma como atua, exprimindo que uma pessoa não gostaria de ser identificada com truturá-Ia e motivá-Ia para a tomada de decisões. Ê característico disso um exem-
,SN(' desempenho. O desempenho de papéis leva ainda a uma intuição dos papéis plo já antigo: a proximidade, a harmonia íntima de conselho e auxílio no pen-
dos outros, a uma troca de perspectivas, à estabilização das expectativas comple- samento medieval (12). No conselho existe também a obrigação pessoal de cooperar
meurarcs de interpretação e de premissas prevalecentes de interpretação signifi- na execução das propostas aceitas - uma concepção que, em todo o caso, não deve
(,ItiVi\ (9) ou então esse desempenho tem de ser interrompido por falta de pos- ser totalmente irrealizável na prática. A designação para conselheiro podia, assim,
'Ihilidade de entendimento. servir como instrumento de compromisso político (como um passo para a criação
dum "sistema de contato") e a associação de conselheiros como o lugar de nego-
o
desempenho dum papel é uma condição prévia de caráter geral para uma ciação sobre as condições duma tarefa especial de auxílio. Implantada no ponto
11111'1H~:ÜOcontínua. No processo jurídico, todos os participantes têm de propor aos central da organização político-social , esta instituição de "consiliurn et auxilium"
0111Ios papéis, permanentemente em alternância, confirrnar-lhes os seus papéis e exigia livremente uma lealdade mínima e uma elevada homogeneidade de interes-
•IJloiü los na interpretação, apoio que Ihes permitirá que cada um se compenetre do ses e preestabelecia um sistema social apreciável e relativamente simples ( 13).
'li papel e nele se mantenha mesmo quando se verifique um agravamento. Ao juiz
I olll'sponde, sobretudo, procurar que, mesmo no caso duma comunicação penosa
" p"II).(I'nt<:, todos os participantes possuam um espaço garantido de ação, que não Retomar este pensamento nos dias de hoje causa uma impressão de especu-
os dl'svic Ou irrite, mas antes Ihes proporcione com tranqüilidade uma boa exe- lação desbotada e irreal. Foram usadas reflexões deste gênero no chamado mo-
'11\.10 (10) (boa de acordo com as proporções do papel). Mesmo quando o teste- vimento corporativo , por exemplo. Estão na base de inúmeras tentativas de "in-
1I1\II)ho leva o próprio, ou os outros, a uma situação de catástrofe, a catástrofe não
dl'vI' sol» evir nem no momento, nem para o processo jurídico como sistema. Em ,
VI" disso, uma parte das forças disponíveis deve ser separada para a manutenção do
I onuuo l' a capacidade de ação nos papéis. Isto constitui condição prévia para um
.uul.uru-nto do processo jurídico, relativamente isento de perturbações, e é válido

1I Erich Dôring: Die Erforschung des Sachverhalts im Prozess. Beweiserhebung und Beweiswür-
digung. Ein Lahrbuch (O estudo do estado de coisas no processo. Coleta e apreciação de provas. Um
manual). Berlim 1964, pags. 28 e segs., mostra muito bem isso na relação entre juiz e pessoa compro-
hatória. De fato, Doring vê no cultivo dos contatos, em concordância com a concepção c1âssica de
11 COlllparar, por exemplo, com Frederick L. Bates: Position, Role and Status. A Reformulation of processo jurídico, um meio de encontrar a verdade, sem pensar que a segurança dos papéis também ser-
(,!IIIU'PU(Posição, papel e sratus. Uma reformulação de conceitos). Social Forces 34 (Forças sociais 34) ve para dizer falsidades.
1%11,Ihl1l8.313321 ou Siegfried F. Nadei: The Theory of Social Structure (A teoria da estrutura so- 12 Conferir com Ouo Brunner: Land und Herrschaft. Grunfragen der territorialen Verfassungsges-
11\11)
<:1('11('0(',111.1957, pags. 85 e segs. chichte Südostdeurschlands im Mittelalter (Terra e soberania. Questões básicas da história da consti-
tuição tcrritorial do sudeste alemão na Idade Média), 3. a edição, Brünn-Munique-Viena 1943, págs.
" F~I('~ecnhccimcruos têm uma importância primordial para a teoria do sistema de ação de Talcou 30M e segs.. com mais observações.
""'HOIIS Comparar principalmente a "General Statement" (Afirmação geral) estabelecida com Talcott
1'1t1.()II~/l>:dwardA. Shils (editor): Toward a General Theory of Action (Para uma teoria geral de ação).
(;""1111id)l(', Mass, 1951, pags. 3-27 (14 e segs.). Também, de forma análoga, Ragnar Rommetveit: 13 À literatura contemporânea não parece que o problema resida aqui, mas sim na virtude do bom
S,,<\1.1NOll118and Roles. Explorations in Psychology of Enduring Social Pressures (Normas sociais e conselheiro, de tal forma que us problemas de conduta se ordenem à volta deste problema. Princi-
1'.ll'hw, IIlV('NlÍ);'I(I)I'S
em psicologia de pressões sociais constantes). Oslo-Minneapolis 1955, pags. 44 e palmente a literatura dos séculos XVI e XVIl, que tem já presente o conselheiro palaciano, adverte,
·'·H· previne, informa tanto soberanos como conselheiros quanto aos perigos dessa relação. Consultar como
exemplo Martinus Garatus Laudensis: Tractatus de consiliariis principium (Tratado sobre o princípio
lU I'IH t.I1l',l'I ItUIIIt'. '1111 Ilih\lIl.,1 quc' njlo considera este preceito infringe mesmo o princípio da
dos conselheiros), em: Tract atus illustrium jurisconsultorum (Tratado sobre os jurisconsultos ilustres)
"tU~I" li' 1")11111""C:O"•• alllIl \I '''~'' d",l(ladh pelo u ibunal administrativo federal pela sentença de vol. XV, 11.212. Veneza 1584; John Fortescue: The Governance of England (O governo da Inglaterra),
'/'/ 11 I"h~ (N,." 11111011 •• 1" W",h,· •••,I"tll 17 Novn revista jurldica semanal T? 1964, pag 787e edição Plummer, Oxford 1885, XV·XVII (particularmente interessante para a mudança para o con-
"11) ,.•" " ••t •• 1111/',I"'"'' 11111
•• ,"'111111.<1.1111
',hl 11,,11\11(,
li!)queixoso através da pergunta sobre ele ter ou selheiro da corte); Híppolytus a Collibus: Princepes, consiliarius. palatinus, sive aulicus et nobilis, ed.
"~II 111101<1(1'1'" ,I, 11,."1""" "-'111111 •••• ,111,'111'"1111,"o deb.ur-, Por ('SIC motivo foi anulada a sentença novas, Helrnstedt 1667, Francesco Guiccardini/Giovanni Francesco Lottini/Francesco $ansovini: Pro-
o .• I" j",f'ifi' ""1,\1111., "", "111,"1.,,1•• tlIIIi11""111'>I ""tI:" ,li (·i.o" q\lr tribunal fosse obrigado a mano (j
positioni overo considerarioni in materia di cose di tato, sotto titolo di avvertiment, avvedimenti civili e
In 1'111. p~HtidpIOHI!I 1'11\ '''tlnl,t di,,-":'IIIII. o'q 1'1111'11114.1 1\11111 "t' C'IU HlIlliUTl fI\lt .unerue os limites da juris- «lI)('t,lti politici, Venera 1598; joanncs Mariana: De reg et regis institutione, libri tres, Mogúncia 1605;
.lid"":doilldUd,, tI"l """""1 ,1,-,,"'011'10 •• 1'1'1.1"" 1111'11 ,,,.' •• 11'.""'''HI C()nklir tom l Ians Dahs: Das 'O"MlIl Al1dra~ Ork('II: COI11IlH'nl,uio t'" COl1silliseorumque iure , Diss. 'Tübingen 1654 (citado muitas
.ft 11111.
I!!' ."ltli, I'" I'\lIjil"HiIf'Ú (1\ (!"di,,í•.-,1"llíllll'" "" I"'" r••" prn.tl), MllIIiqu('·Oc:Jlim1965. pago 20 vrll'R NO" () nOl1wdo PI\'"'"''O''' WOIj(,illj(An.,.ltlI'IINLaurcrbach): Laelius Zechius: Politicorum sivc de
pdndp" ri l'ailltlPllllllfl "dlllllll." ••II"o., 111111I,r~, VI'I!lll.1 1Ii2r>; C.lh,i('ir Zill,lllO' li CUl\siHlirri,
71, PROCESSOS JUDICIAIS ADOÇÃO DE PAPtIS 77

IC'/,par no estado" (14) interesses econômicos, através da audição prévia e da par- pode ser aumentada a disposição para aceitar a decisão através da participação no
Iic ipação consultiva no processo de decisão dos órgãos do estado. E mesmo quando processo de decisão, adquiriu maior dose de confirmação (17). À primeira vista,
M' 11.10 ponham grandes esperanças numa estrutura estadual correspondente, o que porém, não existem quaisquer dados, pois é quase impossível negar que alguns
(, hoje a opinião corrente, aparece sempre a tese de que uma participação consul- abandonam a sala de audiência insatÍsfeitos ou até mesmo indignados. Estamos na
IIV,' dos indivíduos no processo de decisão serve como válvula de escape para res-
pista da teoria que está na base da legitimação por processo jurídico: mas seria
sC'lIlimrnLose crítica, absorve objeções e promove assim a hipótese, ou pelo menos a
manifestamente falso subordinâ-la a uma simples relação causal ou a uma deter-
possibilidade , de estabelecer a decisão definitiva (15). "A cooperação dos parti-
minada correlação estatisticamente verificável entre processo jurídico e aceitação
cipunics , cuja necessidade se deve a motivos constitucionais, serve para isso", diz
dos resultados em geral. Temos de aperfeiçoar consideralmente esta teoria da
1)11, "assim como uma estreita ligação entre o indivíduo e a administração, cujas
adoção de papéis implícitos na personalidade, a fim de chegarmos a conclusões
elc',IMWS, mesmo desfavoráveis para os participantes, são de antemão aceitas por
úteis.
l'lc's quando se realizaram sob a sua intervenção decisiva" (111). "Em numerosos in-
vr-st iKilçõesempíricas a pesquisa sociológica empresarial para esta hipótese, de que

1~ V",, por exemplo, Heinrich Herrfahrdt: Das Problem des berufstandischen Vertrutung von der
1",\I,,~~I~c hen Rcvolution bis zur Gegenwart (O problema da representação corporativa desde a Re-
vlIl\l~l\o l-i ancesa até a atualidade), Stuugart 1921; Edgar Tartarin-Tannheyden: Die Berufstãnde, ihre
,~I,'II\1"" irn Sraatsrccht und in der deutschen Wirtschaftsverfassung (As corporações e a sua posição no
""rilfl público c na situação econômica alemã), Berlim 1922. Como exemplo de uma nova tomada de
" •••,~,l" mais discreta e que, entretanto, considera as experiências, ver Hans Ryffel: Staat und Wirts-
,I ••,h~v.'rh:lndc im nationalen und übemationalen Recht (O estado e os consórcios econômicos no direito
'"Ii 'OIIJI e internacional), Schriftenreihê der Hochschule Speyer (Série de documentos da Escola Suo
IX'rlur Speyer), vol. 22, Berlim 1964, págs. 159·188.
17 Conferir com a crrnca positiva de Lester Coch/john R. P. French: Overcoming Resistance to
Change (Vencendo a resistência à mudança), Human Relations I (Relações humanas I) 1948, pags.
I'. Cllnfl'rir, por exemplo. com E. Pendleton Herring: Public Adrninistration and the Public Interest 512·532; William F. Whyte, entre outros: Lohn und Leistung (Salário e produção), versão alemã Co-
(Administração pública e interesse público), Nova Iorque-Londres 1936, pags. 37, 213 e outras.; R.V. l ônia-Opladen 1958, pazs. 188 e segs., 247, 255 e segs.: John R. P. French/joachirn Israel/Dagfin Ás:
V"IIIIIIIIN Manscrgh: Advisory Bodies. A Study of their Uses in Relation to Central Government 1919· An Experiment on Participation in a Norwegian Factory (Uma experiência sobre participação numa
I'I~!J (eo, pos consultivos. Um estudo da sua utilização em relação :om o governo central de 1919·1939), fábrica norueguesa), Human Relations 13 (Relações humanas 13).1960, pags. 3·19; Floyd C. Mann
I "'ICII('~ 19'10, pago 25; Reinhard Bendix: Higher Civil Servants in American Society. A Study of Social ILawrence K. Williams: Observations on the Dynamics of a Change to Êlectronic Data-Processlng
O"l<illi, d,e carccrs and the Power-position of Higher Federal Administrators (Altos funcionârios civis Equipment (Observações sobre a dinâmica duma mudança para um equipamento de processamento
li,' .111i"cI,,(\(' americana. Um estudo das origens sociais, carreiras e posições de poder dos altos adrninis- eletrônico de dados), Administrative Science Quarterly 5 (Revista trimestral de ciência administrativa
1,.;,1011'0 11'(\('1ars), Boulder, Col. 1949, pag. 96; Herbert A. Simon/Donald W. Smithburg/Victor A. 5). 1960, págs. 207·256 (225 e segs.): Victor H. Vroom: Some Personality Determinants of the Effects of
IIoIII\lpmll: Public Administration (Administração pública), Nova lorque 1950, pags. 122 e segs. e 464 e Participation (Alguns determinantes de personalidade dos efeitos de participação) Englewood Cliffs, N.
I'''" , 1'(\",11(\ Naege li: Die Mitwirkung der Verbãnde bei der Rechtsetzung unter besonderer Berüuck- J. 1960; Rensis Likert: New Patterns of Management (Novos modelos de gestão) Nova Iorque-Toronto-
_lI 1IIII(uIIII d('r qualifizierten Rechtsver-ordnung. Em: Festgabe Hans Nawiasky (A colaboração das cor- Londres 1961, pags. 26 e segs., principalmente pags. 39 e segs.; Bernard M. Bass/Harold]. Leavitt:
I"""~'''''N no ('Mdbclccimcnto do direito sob a especial consideração de decretos legais qualificados) (Em: Some Experiments in Pianning and Operating (Algumas experiências em planejamento e atuação),
I1l1l11rll,'/("1l) a lIans Nawiasky). Zurique-Colõnia 1950, pags. 205·227 (212); Udo Krauthausen: Tat· Management Science 9 (Ciência da gestão 9), 1963, pags, 574·585. Há, porém, um número pelo menos
••" "rll "lIl1'bung und Beratung in der deutschen offentlichen Verwaltung (Coleta de fatos e deli- idêntico de declarações críticas, que chamam a atenção para a generalização precipitada das conclusões,
111'1.1\,111 ",' adrninistracão pública alemã) Deutsches Verwaltungsblatt 73 (Revista administrativa alemã para as premissas duma concordância de interesses, a insignificância da diferença no resultado da
~), I""H, p,',,~. 729·733; August Kresbach: Lebendige Demokratie durch Ausschüsse und Berück- produção e o número elevado de outras variáveis concomitantes. Ver alguns contributos para a cole-
(Ikllllu ',li i,1 viva através de comissões e juntas consultivas), Staars und Kornmunalverwaltung 1959 (Ad- tânea de Conrad M. Arensberg, entre outros: Research in Industrial Human Relations (Pesquisa sobre
IIIÍlII.(1.\~;\O públn a c regional 1959), pags. 2·4. A outros observadores parece, contudo, que os convênios relações humanas industriais). Nova lorque 1957 (por exemplo pago 33 e seg., 111); Leonard Sayles:
e11'111U'II'I,'('~eXCHCm uma estratégia de prudência nos grêmios consultivos para "avoidance of final Behavior of Industrial Work Groups (Comportamento de grupos de trabalho industriais), Nova Iorque
'''"'"'''"11'''l'' (evhur um compromisso definitivo), a fim de evitar este efeito de vinculação; da mesma 1958, sobretudo págs. 168 e segs.; Chris Argyris: Understanding Organizational Behavior (Cornpreen-
111111'1.1'1',1': Advis01 y Commiuees on British Covernment (Comités consultivos no governo britânico). dendo o comportamento organizacional), Homewood, 111. 1960, pago 114 e seg.; Michel Crozier: Le
1.1111c1,(·x I '!fiO. P"K8.!l1 ('~rK8. phénornêne bureaucratique (O fenômeno burocrático), Paris 1963, pags. 269 e segs.; George Strauss:
Some Notes nn Power Equalization (Algumas notas sobre igualização do poder) ,em: The Social Science
of Organization (A ciência social da organização), editado por HaroldJ. Leavitt, Englewood cnrs. N.j.
I li C •••• 11 1.111'V., W.oIl1l1'''"'' 1111111 .00NVI'I Iassungsvollzug (Reforma administrativa como ratificação 1963, pags. 39·84 (60 e segs.). Como um novo ponto de vista sobre o debate geral e como tradução para
11111111111''"11111)h" 1(., 1111111W.II,lId 1II'lIlil/(., IUr Strórnungen und Fragen im heutigen Recht Fests- a linguagem conceptual da teoria dos sistemas ver Daniel Katz/Robert L. Kahn: The Social Psycholqgy
dll,1I 1",,"1."101111111 ,.01," « •••1 Iky"',."". V•••••lf( K C. (O direito em evolução. Contributos para of Organizations (A psicologia social das organizações), Nova Iorque-Londres-Syd.ney 1966, pags. 390 e
• "111 "li'. " '1'II"lill'~ 111'"111"111.1111111 11''''''''',1111'111.'" M'\quice11lenário de Carl Heymann) edição co- segs., c Fiedcr Naschold: Organisation und Demokratie. Untersuchungen zum Demokratisierungs-
111,,,"1,,., «;,<1.',,111\I" ,li"" I""", ~I""i'llll' I Uli'" 1"'1<' ',~ 11'1(%) Por outro lado, há também opiniões poteruial in Komplcxen Organisationcn (Organização e democracia. Investigações sobre o potencial de
'IIU- ".:tu '1IIIItId~nUII II'.'I- ••• " •• ,illlllflllll ,lflllli' I,U.i" ti II1tH do, clhkos. interessados ou peritos numa d('mO('rati"'~<ÍI; nas organizações complexas), Stuttgart·Berlim·Colônia·Mogúncia 1969. Uma das mais
tt", I"PII 'III~' .,i'ifA f'_ilqIV~~1 'Iill I illIl il~' li' '" ,In)ll'" pll' nU'lI'plo Kt'JlIH'lh C. Whcare: Governrnent rXl1i\Of(I"'~1 i,l~ c1('fi(i~ndils em iodo l'stl' debnu- consiste na sua psicologia primitiva. Tal como é carac-
liv CtlU-Hllillt"" ,\" t~""V lii, Ht ili~1i ((""111111 iuu ((j"VII nu pUI t UIIU\!tt)('l. Um ("olSJio sobre a constituição 1"11.11111 clu iHvr.lil<.'~,11I "",."Nulo,,' "'",l1li/.I~,I(l, 1I,i(!l'xi~II' () conuuo com as novas descobertas no cam-
I,;il~"í,'"i,11.1;",-, I!I',IJ, 1i1'lIt, ,,', ".rlu· IH'II~ Irlllli. ti,. 1I1·IOIII,.oIill.lII<
=

CAPÍTULO V
Representações e desencargos

o conhecimento de que o procedimento de adoção de papéis, tal como qual-


quer interação social com interpretação de sentido, se liga também a uma auto-
descrição das personagens atuantes, contribui para um avanço importante. Logo
que alguém é notado, exprime através do seu comportamento se quer ou não al-
guma coisa quanto à sua compreensão da situação e simultaneamente quanto à sua
própria pessoa (1). Geralmente uma pessoa não pode impunemente permitir-se ig-
norar se vai ou não ser aproveitada. Tem, sim, de manter sob controle a sua con-
duta logo que venha a ser. exposta.

Torna-se, portanto, necessário um controle, pois se espera uma certa dose de


consistência na interpretação como base para a orientação de todos os participan-
tes (2). Quem se apresentou como não-fumante não pode sem mais começar a fumar.
Tem, no mínimo, de apresentar uma boa explicação que certifique que, quanto ao
resto, ele continua .a ser o mesmo, portanto continua a ser objeto duma consti-
tuição segura de expectativas e de liberdade autonegada. Geralmente as auto-
interpretações dos atuantes fixam-se sobre uma determinada personalidade. Tam-
bém os papéis, que foram alguma vez desempenhados, obrigam neste sentido à
continuidade e a variações restritas sobre aquilo que se pode tornar plausível sem
prejuízo para a identidade. Sem uma tal determinação recíproca das interpreta-
ções, não seria possível uma interação duradoura, nem nada que se parecesse com
o "processo jurídico". Já através do início da interpretação do processo jurídico se

Que existem suuações em que os presentes, em virtude de convenção, ou para evitar conflitos mais
penosos, têm de ser tratados como ausentes confirma a regra sem ser uma exceção. Pois os ausentes-
presentes não estão de forma alguma livres da realização de declarações; têm, ao invés, de representar o
papel do ausente e a si próprios, correspondenternente. sem importância, com especial cuidado, pois tais
as coisas não são naturais e também porque a perfeição da representação como ausente constitui a única
possibilidade de co-representar uma referência permitida à sua presença e seu significado. Isso é apon-
tado simultaneamente como exemplo de como temos depois que lidar com fatos variados e muito com-o
plexos.
2 Inúmeras publicações de Erving Goffman se ocupam do problema da consistência da declaração.
Consultar principalmente: The Presentation of Self in Everyday Life (A auto-apresentação na vida
quotidiana), 2. a edição, Garden City Nova lorque 1959; e ainda: On Face Work (Sobre a tarefa no-
minal), Psychiatry 18 (Psiquiatria 18), 1955, pags. 213-231; Alienation from Interaction (Alienação da
interacão). lIuman Relations 10 (Relações humanas 10), 1957, pags. 47-59; Encounters, Two Studies in
lhe' Sociology of Intcraction (Encontros. Dois estudos sobre a sociologia da inreração). Indianápolis, Ind ,
Illfil; Srigma, Notes on tht: Managcment of Spoiled ldentity (Estigma. Notas sobre a gerência da iden-
litl.ltlt' iuut iliz.ulu), Engl,·wood Clifls, N, J. 1963; Behavior in Public Places. Notes on the Social Or-
)1,11111.1111111 01 (;,'III"IIII/lH (<:011'1'1111.1111<'11111 11()~ lug ar •.s públicos, Notas sobre a crga nização social dos
'·II<""I'''~).Nltvl\ 111111'''' 1.,,",10 •.• l'Ih~
80 PROCESSOS JUDICIAIS REPRESENT AÇÕES E DESENCARGOS 81

tem de excluir que o juiz se comporte repentinamente como dentista ou que o con- Os depoimentos registrados documentam acordos bem sucedidos - se não quanto
vocado se comporte como vendedor de loteria (3). ao conteúdo, então pelo menos quanto ao fato dum depoimento definido - e as-
sim se convertem em regra à qual uma pessoa só se pode opor com motivos par>
ticulares de defesa - como quando surgem diferendos em outras passagens do
Tem ainda de se refletir sobre a peculiaridade da situação em que se esta- processo jurídico que sugerem uma diferenciação tênue de depoimento. Sem esses
belecem princípios válidos do comportamento em Questão e se pode exigir respon-
apoios é mais conveniente, ou mais fácil, quando se deixa registrar que uma pessoa
sabilidade. Tam.bém existem situações destas na vida quotidiana, ainda que apenas
sob condições prévias especiais. Já aconteceu sobrevir uma certa desilusão recíproca se remete às atas já existentes.
que exige esclarecimento. Os participantes têm de partir dos princípios do seu Essas ligações não devem ser confundidas com as ligações exteriores do proces-
comportamento para esclarecer as expectativas recíprocas como condição prévia so jurídico. Elas são o resultado da história pessoal do sistema. Cada um pode, logo
duma posterior convivência e isto significa moralizarem-se a si próprios e deixarem desde o início, escolher com considerável liberdade a sua linha de conduta, a sua
entrever consistência também como personalidades morais, como seres racionais. interpretação de sentido e o estilo expressivo dessa mesma conduta: pode estabe-
lecer a extensão dos seus interesses, apresentar um estilo taciturno ou falador, duro
Na vida diária este dever de consistência de 'interpretação nos processos ou complacente, consciente do direito 'ou conciliador, objetivo ou egocêntrico. A
judiciais é ainda consideravelmente agravado em comparação com as exigências pessoa tem, além disso, uma certa liberdade na escolha daquilo que quer propor
normais ('\). O processo tem de chegar a uma decisão e tem, portanto, de poder como o seu conhecimento dos fatos e a sua opinião jurídica. Se for engenhoso pode,
referir-se com segurança a informações voluntárias ou involuntárias, fornecidas em. medida restrita, adiar o compromisso e até mesmo tornar a ordem cronológica
pelos participantes. Todos eles são exortados por meio do sentido e protocolo do da declaração tema de reflexões táticas ~ como procurar deixar resplandecer
processo judicial, a encarar com seriedade o seu comportamento e a considerar a verdade com surpresas impressionantes (para agravar os outros) só depois deles já
como obrigatório ter em conta estas expectativas como uma cadeia de promessas terem dito falsidades - ou então conservar argumentos em reserva até chegar o
por meio da prova eliminatória da sua conduta. O requisito de consistência é momento mais oportuno de os revelar (7). Geralmente o processo jurídico oferece
repetidamente verbalizado, por exemplo através de repreensões por motivo de in- poucas possibilidades para isso e, mesmo estas, têm de ser simultaneamente ganhas
frações; todavia ele anda no ar de forma tão sugestiva que pode levar os espíritos no jogo contra a instituição. Pois nos papéis se insere um impulso para a decisão
mais simples, que não sabem medir a sua conduta pelas conseqüências, a emudecer como sentido da instituição; e uma tática reconhecidamente demorada vinga-se
- numa última tentativa de se subtrair às implicações simbólicas da presença, com facilidade do jogador, sobretudo quando ele deixa seguir por pistas erradas
apesar da assistência física (5). não só o adversário, como também o tribunal (8).
As cenas e o protocolo do processo jurídico convertem-se, assim, em normas, As opções obrigatórias sobre as declarações são, portanto, praticamente
quando não em armadilhas, para os participantes que não querem assumir tal inevitáveis para todos os participantes. Cada um tem de chegar a uma decisão
compromisso. Além disso, o seu próprio comportamento converte-se história do prévia sem com isso poder reagir ao resultado do processo jurídico, que realmente
processo Jurídico e, com isso, em entrave. Muitas vezes ele é registrado numa língua ainda não está determinado, portanto na incerteza e apenas em atenção ao próprio
que já não é a do orador mas sim a da polícia, do tribunal ou a da lei; ou então procedimento como um sistema de representações. F.le escolherá a linha, que lhe
preservado em recordações, que não são as suas e defronta-o no decurso posterior pareça prometer êxito, duma atuação cooperante a longo prazo. Assim compro-
do processo jurídico como complemento com o qual ele tem de se identificar ( 6). metido, já não pode alterar a sua declaração mesmo que o próprio procedimento
lhe dê para isso um motivo representativo. Como projeto de futuro, o processo
jurídico absorve a incerteza, enquanto a história converte-se em compromisso:
Em ambos os aspectos e através da sua cooperação, o procedimento adquire uma
3 Para este assunto dificilmente existem investigações, mas sim um panorama animador sobre legalidade própria considerável, que na realidade não o determina, mas que lhe
problemas e estratégias'. Marvin B. Scorr/Stanford M. Lyman: Accounts (Considerações), American levanta, contudo, barreiras consideráveis. Este efeito de compromisso seria também
Sociological Review 33 (Revista americana de sociologia 33), 1968, pags. 46·62. independente das leis do processo e realizar-se-ia então quando todos os parti-
4 Encontraremos o mesmo fenômeno, pelos mesmos motivos, nos processos legislativos. cipantes fossem completamente livres de encetar ou não um procedimento; ele não
5 O autor experimentou diferentemente que em tais casos em que uma declaração ameaça não se pode, pois, ser deduzido da lei, mas origina-se apenas no procedimento e através
realizar (mais precisamente: quando amea-ça tornar-se em declaração de não-declaração) por com- dele. Mas, naturalmente, este efeito de compromisso 'obriga, sem mais, ao re-
pr'ra~('><'s ou pOI confusão, primeiro os juízes procuram suavizar o rigor do protocolo, procuram per-
conhecimento do resultado e, além disso, existem, como veremos, certas possibi-
~u.l(li, «lIn hum.mid.ide Ou facilita] o relance sobre as conseqüências do comportamento; mas que, a
1""'" d"I, .," 0\1'"'' I1l1ltid(lunte5 se sintam também obrigados, não obstante os seus objetivos do mo- lidades de o suprimir.
nll'llIlI I ''''''II·'~f., .1 "\Ir r ,1114'"11,\(ois" pOI i5110através do tato ou outros auxílios, que o sistema per-
7 Uma das poucas pesquisas sobre o aspecto tático do processo judicial, Wilhelm A. Scheuerle:
1I1l111l'~'U"11111111\111111'11111 I' 'l\lr 110"1411.' pt'lo nICIIOSa uma declaração. Advogados que aproveitem as com-
St udien zur Prozesstaktik (Estudos sobre táticas dos processos), Archiv für die civilistische Praxis 152
I'hl .I~II." ti•••1•.~ItIlI\IIIIo••• 1111ti". 1"" "tI••~,nu q'lI' a' incremeruern, operariam nos seus supostos interes-
(Arquivo para uma prática civil 152), 1952·53, pags. 351·372, trata, entre outros assuntos, de questões
,,'0 • 111111.\" ",""1,' ti" I"'" I"." 1"110110" 1(\11' ,1"\1,' 1(',oIl/,lf o seu interesse, e podendo, em geral, causar-
Ih" 111,"1 IHt·,,,1/tt', d.• 11'''_11'111\-'1 11i_1' deste tipo,
h 1\ ~l~" ,.,.,h,li""I.)llI 11l,~ tI"lu~"IIt'o 1,,,·",,••1••• I "''''"IIi 11m lugar comum da psicologia forense. 11 •..• n ',\NU' ('XIII'mll' m jlllll" ,·nU)IIlr.lIll mr-smo (J apoio do legislador que 00 Z. P. O. (C6digo do
C;" ••" I j, '"' I!'I d,' '-'11\,,)•• ,-"til rnl i,-ij ,'III •• ilk 11",,· ••• j •• 11f' l'.ydlCllc)Ki~ (Pslcologia forense), vol. 11, 1',," r~~"Civil) (~~ n'l ,,~'I) P'" ,·•• ·l11pln, P"I 111110-
\llllll 1('(II,a dos meios de ataque e defesa quando a
,'_ ••• ~._ ••l.•..•.•
_~._,
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_J .• L.._ -'-J--.l-I _.0_._ ~U
'" .1~1", 1'~ln, ~II'I " ~III"
82 PROCESSOS JUDICIAIS REPRESENT AÇÕES E DESENCARGOS 85

Pois o dever de consistência aumentaria até a um peso insuportável de de- até levar a sanções se ele quisesse, na sua vida particular, fazer troça do seu papel
clarações e complicações de comportamento e não se limitaria, em alguns aspectos, oficial, designar a sentença de morte como uma piada, dar a conhecer a sua
a ser moderado ou até mesmo suprimido. Só em organizações sociais muito pri- própria opinião mesmo derrotada, ou afirmar que ele poderia fundamentar tudo o
mitivas se pode pensar que as pessoas, em todas as situações da sua vida, sejam pes- que quisesse. Segundo esta orientação ele fica obrigado à apresentação de consis-
soalmente .reconhecidas e apresentem consistência na sua exposição e sejam con- tência e à contínua identificação com a sua atuação e respectivas premissas.
tinuamente idênticas a si mesmas. Sob esta condição prévia só pode haver relati-
vamente poucos gêneros diversos de atuação. Todas as organizações sociais de com- Para o problema da legitimação são, entretanto, mais importantes os in-
plexidade mais elevada devem exigir do indivíduo mais atuações do que as que ele tervenientes no processo participando com caráter não-profissional, os solicita-
pode trazer duma fórmula pessoal de vida e integrar como expressão do seu ca- dores, reclamantes, réus que são afetados pela decisão. Eles não gozam da proteção
ráter. As organizações sociais mais complexas obrigam, pois, por um lado a uma da impessoal idade legítima. Pelo contrário: o processo jurídico está preparado para
.abstr açâo simbólica e "a dar um caráter mais profundo" ao controle de consistên- captar a sua personalidade e a comprometer ( 10).
cia9 e, por outro lado, carecem de inúmeros dispositivos de descarga que impeçam
que cada atuação seja atribuída à personalidade.
Assim não se indica apenas que, de acordo com a conjuntura de questões
jurídicas, se proporcionem informações sobre relações pessoais até à esfera mais ín-
Há duas formas de desencargo particularmente -difundidas: a obrigação, ou a tima e que elas sejam debatidas com os interessados. Pelo menos tão importantes
atribuição da ação "impessoal", e uma espécie de distanciamento expressivo do quanto a temática, são a forma e o estilo da exposição e principalmente que os
papel. Ambas as formas de desencargo criam objetivos para aquelas estratégias, participantes possam renunciar livremente e sem coação à tomada de posição (11)
por meio das quais os participantes no processo o podem levar à perfeição, por com a qual se podiam eles próprios sobrecarregar. Até a procura da verdade de
meio das quais se pode conservar intato o protocolo, manter as situações num curso caráter puramente científico encontra os seus limites no princípio da declaração
desimpedido, preservar o curso em direção aos seus próprios objetivos e simulta- livre (12). Esta liberdade só é imaginável partindo dum fundo de possibilidade de
neamente manterem-se eles próprios livres de compromisso obrigatório. não falar a verdade. Nessa medida ela é sugerida ao interessado como privilégio. A
liberdade das declarações parece aos juízes ser condição indispensável de crédito,
É impessoal um procedimento que apresente a própria pessoa como incom- portanto da descoberta da verdade, o que, entretanto, não lhes impede de avaliar a
petente e, simultaneamente com isso, procure impedir relações de causa e efeito do recusa de declarações como autodeclaração (I~). Deve considerar-se, a partir daí,
procedimento quanto à própria pessoa e aos seus outros papéis. Um tal distan- que a liberdade de declarações tem, por coação externa, a função latente de com-
ciamento não fica isolado sem mais; careçe dum respaldo institucional, pois nor- prometer a personalidade. Quem aparece com algemas e presta declarações sob o
malmente nas situações "naturais" domina o interesse pela pessoa como garante de chicote, torna simultaneamente evidente que o motivo das declarações lhe é alheio.
expectativas de comportamento. Em organizações sociais complexas está, todavia,
muito divulgado um estilo impessoal de comportamento como um mecanismo do
isolamento do sistema parcial de funcionamento político e em diversas esferas con-
verte-se mesmo em obrigação. Principalmente a profissão e a família, os negócios e 10 Contra isso frisa Vilhelm Aubert: The Hidden Society (A Sociedade oculta), Totowa, N.J. 1965,
a-cultura, a religião e a política estão separados uns dos outros de tal forma que as pàgs. 67 e segs .. a tendência dos modernos processos judiciais de compreender as personalidades duma
forma. ainda e apenas. marginal. Essa tendência dá-se com a abstração. especificação e variabilidade do
expectativas dos papéis já não possam ser transpostas duns âmbitos para os outros e direito e com a possibilidade de movimentação de massas do processo jurídico. Contra isso se está.
que a identidade da pessoa que participa de todas as esferas não permita qualquer porém. a trabalhar com sucesso no processo legal.
conclusão segura sobre o seu comportamento: este é regulado especificamente de 11 O anrigot'nerno tenetur edere contra se" foi realmente reduzido de forma considerável no proces-
acordo com o sistema. No interesse da manutenção duma organização social com- so civil. mas continua a ser válido. sem restrições no processo penal. Assim. por exemplo. no conceito
plexa e dum sistema de procedimento relativamente autônomo dentro dela, todos anglo-saxônico, o privilégio contra a auto-incriminação (privilege against self-incrimination) faz parte
aqueles que têm uma participação profissional no processo como presidentes ou dos requisitos fundamentais dum processo jurídico (due process). No Código alemão do Processo Penal
vogais, advogados ou representantes de interesses, secretários ou moços de recados, (St , P. O.) a liberdade de declaração está garantida pela lei (§§ 136. 136a. 243 III). A partir daí. as
ações processuais são, de forma geral. construídas juridicamente como atos de livre vontade, que podem
são obrigados a apresentar uma conduta impessoal.
ser retratados por insuficiência de vontade como coação ou ilusão. Sobre isso consultar um trabalho de
drrnensões monogrâficas de Karl Siegert: Die Prozesshandlungen, ihr Widerruf und ihre Nach-holung
Isso não lhes permite livremente eximir-se por completo durante o resto das (As ações processuais. sua retratação e sua recuperação). Berlim 1929.
suas vidas do seu comportamento no processo jurídico. A impessoalidade é esta-
12 Comparar aqui com uma literatura em rápido crescimento como a de Jean Graven: Les procédés
belecida institucionalmente como filtro de ação unilateral e não como separação
nouveaux d'invcsrigarion scientifique et Ia protection des droits de Ia défense (Os novos processos de in-
completa. Um juiz não deve comprometer qualquer sentimento ou relações, atitudes vestigação científica e a proteção dos direitos da defesa), Conferências suíças do Congresso Internacional
Ou illrOI HI.I~()(,~ ll() (lIUU'SSOjurídico; deve deixar ao processo jurídico o seu caráter de Direito Comparado. Zurique 1958. pags. 205-251; Altavilla, op. cit. pags. 342 e segs. com outras
()I 11o 1>1\11'111•1 Mil i,tI I('/(ido 'I!wllas pela lei. Por outro lado seria estranho e poderia referências bibliográficas; Jerome S. Skolnick: Scientific Theory and Scientific Evidence. An Analysis of
Lie Detection (Teoria científica e evidência científica. Uma análise da detecção da mentira), Yale Law
[our na l 70 (Periódico de direito de Vale 70).1961, pags. 694·728.
!I <::.111111111111'
illlfll"fllllJII 11., 11111"irlll L, f1 <I" hhf"ltllHk da nln~dl'ncia, sob este ponto de vista, 15 Erich Dõring: Die Erforschung des Sachverhalts im Prozess. Beweiserhebung und BcweiswOrdi
111111"."." '''''' Ni~ '"4 1,1111111111111 1li" Ihwj,~f"lIll1illl"lI '''111 .1". (;'·W.~"tl\ (A lihl'rdddr dI' consciência e a gung. Ein Lelu buch (A inv(·slll(aç.l(l dll~ falOs. CO]('IU e apreciação de provas. Um manual), 1I1',lim
1964, 1"'11' 1711I' "'II~ II,"'~""'"11111,\VI"IU d,' conjllnllJ 8obH' as drfererucs 9tillldt~ pc'ralllr 11~11~n.\11
,"!I~, Iflll I.Ú,'\" Ioiv ,I,)~"lln,ili,Io!'" I{,',ltl' (lu (A''1I1I~" ti" ,111,'1111l~ühlllll'IU), l"MI, 1111••. 21S7 J ••
84 PROCESSOS JUDICIAIS

Pode separar o seu eu das declarações e defendê-Io (14)_ Está em posição diferente
aquele que consegue ser levado a prestar livremente declarações. A sua conduta é-
lhe atribuída como autodeclaração. O direito da liberdade de declaração confere
ainda o privilégio de cometer um crime em si na própria sala de audiência.

Essa coação à liberdade e à declaração pessoal dificulta o comportamento dos


participantes, necessariamente ambivalente. Pois o processo jurídico constitui um
sistema dum gênero tão específico, que o interveniente não pode aparecer tal como
se sente ou realmente é. Pode observar-se, tipicamente, uma angústia característica
CAPÍTULO VI
e uma incerteza daqueles para quem o processo jurídico não é assunto de rotina. A
isso acresce que também Ihes está vedada a outra saída: um distanciamento expres-
Conflito permitido
sivo em relação ao papel. Eles não têm a possibilidade de exprimir, através da for-
ma como estilizam o seu comportamento no papel, que não se trata deles mesmos Uma das mais surpreendentes características dos processos judiciais é que a
no procedimento (15). Se bem que se possam sempre observar princípios e esforços .1(,",10 neles é contraditória, isto é, que neles se permite uma ação dirigida contra os
de distanciamento perante o próprio papel pelos visitantes aos departamentos, par- out I os. É do domínio público (1) ser possível uma "institucionalização dos conflitos"
tidos do processo e antes de tudo, naturalmente, pelos réus no processo criminal, o (um vantagens. É menos aparente, contudo, a que se aplica em detalhe este resul-
protocolo retir a-Ihes a força impressionante das cenas e a gravidade dos aconte- I.,do (2). A exemplo do processo judicial, esta discussão pode ser debatida de forma
cimentos, retir a-lhes os mais importantes meios de expressão como o gracejo, o p.u t icularmente convincente, pois os conflitos têm de ser aqui apresentados numa
exagero, o descuido, etc. (ll!). Nunca devem atribuir importância de menos às suas 1 onclut a elementar de cara a cara.
oportunidades. Os organizadores dos procedimentos reagem tipicamente, de forma
nítida, a qualquer tentativa de distanciamento expressivo dos papéis, porque isso Já o desenvolvimento histórico do auxílio pessoal, diretamente motivado para a
contradiz o estilo expressivo da situação e dos próprios papéis nessa situação e Ihes uuposição do direito interpretada legitimamente, mostra do que se trata. Sabemos
aparece então uma "incongruência".

Esta relação problemática de declaração e descongestionamento no processo Por exemplo. Ralf Dahrendorf fala em diferentes ocasiões da "institucionalização de conflitos"; ver,
jurídico indica uma contradição imanente cujo significado fica por esclarecer. Até 1'"' exemplo: Soziale Klassen und Klassenkonflikt der Industriegesellschaft (Classes sociais e conflito de
aqui só tratamos duma forma geral a problemática da declaração e defesa e , I ••"" lia sociedade industrializada), Stuttgart 1957, pags. 70 e segs. ou: Sozialstruktur des Betrieos -
procuramos concretizá-Ia com o exemplo do processo. Agora temos de considerar 111-1 """"07iologie (Estrutura social da empresa sociologia de empresas), Wiesbaden 1959, pags. 64 e
com maior exatidão o próprio procedimento como motivo para representações. 1'/1' (.\ ~"guir a Theodor Geiger: Klassengesellschaft im Schmelztiegel (Sociedade de classes num crisol).
1:,,1,\11,.• 1I.,ge! 1949. pags 182 e segs .. que pretende observar uma "insritucionalização do antagonismo
d,· .1.,.,,"" e Bernhard Küulp: Theorie der Drohung (Teoria da ameaça). Colônia 1965. pags. 100 e
(-/I' () mesmo pensamento em Talcott Parsons: The Social System (O sistema social). Glencoe, 111.
14 Existem, naturalmente, inúmeras possibilidades de exercer coação, mas para impedir a co-re- "Irl! 1"'/1.282.
presenração de ser obrigado; por exemplo, por meio duma separação no tempo e no espaço. da situação ( :111111 ihutos interessantes para isto são: E. Paul Torrance: Function of Expressed Disagreement in
de coação e da situação de declaração, ou por meio de drogas, controle biofisico das declarações, etc. III.dl (,I!IIIP Processes (Função do desacordo expresso em processos de grupos pequenos). Social Forces
Têm de se disringuir aí métodos que levem os interessados a assumir outra personalidade antes da sua 111(1'1"\'" Sociais 35) 1957. Reimpressas pelos editores Albert H. Rubenstein, ChadwickJ. Haberstroh:
entrada em cena. Isto significa que a reestruturação das expectativas, portanto a aprendizagem, é subs- 111111' 1ilrllllt·S of Organization (Algumas teorias de organização) Hornewood, 111. 1960, pags. 250·258
t ituld a no processo através duma aprendizagem antes do processo. li l.i("II'II'· A I heodorson: The Function of Hostility in Small Groups (A função da hostilidade em grupos
15 Comparar com este tema o On Role Distance (Sobre o distanciamento do papel), em: Er I't'l,,"III1I) I IlI' Journal of Social Psychology 56 (Periódico de psicologia social 56). 1962, pags. 57·66.
ving Goffman: Enc:ounters (Encontros), op. cit., pags. 83 e segs. e além dISSO Rose Laub Coser: Role 1:'"110'li ,lIl1da (a-seguir a Sim mel) Lewis A. Coser: The Functions of Social Conflict (As funções do con-
Distance, Sociological Ambivalence, and Transitional Status Systems (Distanciamento do papel. 111'" ~'" 1,11).<.II'IICO(·.111, principalmente pags. 121 e segs.; Robert C. Noth/Howard E. Koch, ]r./Dina
Ambivalência sociológica e sistemas de transição de status). The Arnericam Joumal of Sociology 72 \ 1.1'"11""' 11", lruegr arive Functions of Conflict (As funções de integração do conflito), The Journal of
(Periódico americano de sociologia 72), 1966, pags. 173-187. Goffman ilustra a necessidade de se liber- 1':,",111'I 1(1,,"ll1lioll 4 (Periódico da resolução de conflitos 4). 1960; pags. 355-374; Ralf Dahrendorf:
tar do peso global do seu papel por meio do exemplo do rapaz que está andando no carrossel, mas que iH'~[II•• It,dl IIl1d Frcihcit , Zur soziologischen Analysc der Gegenwart (Sociedade e liberdade. Para uma
na realidade já tem mais idade do que é permitido para andar no carrossel; e mais ainda na gíria usada .IIM ••, ~1I1,"I(\~I\.' do presente), Munique 1961, principalmente pags. 197 e segs.; J. M.G. Thurlings: The
pelos médicos e enfermeiras em situações da maior responsabilidade. Aliás, tem de se distinguir entre II~"III"" 1'III1.ltOIl 01 Conflict (A lunção dinâmica do conflito), Sociologia Neerlandica 2. 1965. pags.
um •• distancia que ~ ('X pressa durante o desempenho do próprio papel por meio duma conduta incon- I IV, Ihfl ,,,11,111(,ahllng: Insrirurionalizud Conflict Reso1ution. A rheoretical Paradigm (Resolução ins-
1("1('''''', dum d('8~onll""sti(lnanl('nto que é procurado posteriormente em outras situações, nas quais uma lillll j,,".,II.',I1I., (\1' conflitos. Paradigma teórico), Journal of Peace Research 1965, pags. 348-397; e para
p,·~",.1 b(' Jlllel,' ,·XII.lllli. i.l'InÍrll ou sarcasucamerue. de forma amigável ou especializada, sobre o seu 1111111",,1 l'IIIOI(,~il () •• vrs.io dc conjunto de Robert LeVine (edíts): The Anthropology of Conflict (A an-
Ili'l'd, ~,'II' ""1"'1111••• d.\ 11m111111111 d •• 1>'''1<'1 Conlerir aqui com Peter M. Blau: The Dynamics of Bu- IHil'"I"~I" 010 IIII.llilO). I'Iw Journal of Conftict Resoluuon 5,1961, pags. 3-108. Além disso, há. prin-
'",1''' I ," V (A I1111A 111 I<" ti ,I 101111111.111,,), ChU.II!II 19!í5. págs. 88 e segs., e do mesmo autor: Orientation I il1~IIIIi;111' 1\," 1'""1,(",,••..-.1·. angtosaxónicas, defensores cngajados da opinião de que os conflitos "não
I nW111 d ( 11•.•110111\, ,',,1011, Wdl.l1'· A/(I'III V ()III'nlll~~u pai a os clicrues numa agência de orevidência '1111:"''1 >1'" ~,' I' '1'11', <'111«"ta nu-did a , api cscruam algo de bom e construtivo. Ver, em vez doutros,
11111011, ,,). AIIi"II'I,",tiH' :-" I' 11" \.l1l'"l101v " (HI'VINt,1 u irnesu al dI' ciõncia administrativa 5), 1960. "'III~' c:, ~"" ••:,,II l.y",!.,1I Urwu k (l'dilOrc.) Dynarnic Administration. The Collccted Papers of Mary
P.III" 1-11,1111, 1',"1", 1••11," (AoI'"I1I1MI,'I,.iO "111;1,,",,1 COII'I:IIW,' dv u.rb.ilhos de Mary Parkcr Folleu) Londres-
11, 1:'"11•• 1, l"llIi '"111 1.1'"111"111' !til "li 111'111111/1 ~lr'"~1I ""~ 1111,I'S4'1), I(Ir.r •. [l.lg -tO!!
II (111111,11 a '"111111111'111" 1'111 1'.111' :\1), "'11'. (.,,11 hll'dlHh 11••. New !III,'ll<'of illt' Cnnunun Mau (A Il()V"
,,,,"i"A~1I .111111 .1"11, illiPlIlI,llI ""Iil !l11",11'"111 "'~II .1. "'1 .~hl" 11111"11"'1I' d •• Irl 1"" ,·••r '1\"10 .'1)(1'11 11111"1:('111,ll* hUIIU'IU f4lllHlltl). ~ .: I f'&lu,ao 1\0'"HI1 t'lr,o, P.IK". Irli c' ~rH"',
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.....•

86 PROCESSOS JUDICIAIS CONFLITO PERMITIDO 87

hoje que as organizações sociais sem papéis de decisão centralizada, que só co- nhecidas. Contudo isto só não basta. Por outro lado, a gravidade do conflito deve
nhecem o próprio auxílio como meio de imposição do direito, podem ser intei- também ser mantida. A forma não deve ser congelada num protocolo que é re-
I amente estáveis. Nunca terminam numa guerra contra todos, que Hobbes supõe presentando como uma competição, enquanto que os conflitos reais são ou não
como condição natural, (3), pois é multo difícil travar uma luta de todos contra resolvidos doutra maneira (6). Esta dupla exigência do alargamento e limitação dos
todos. Em todas as lutas, têm de se erguer frentes e ainda que seja metade da visão conflitos é realizada através da forma de conflito regulamentada por papéis.
ele conjunto têm, porém, de se apresentar realizações 01': organizações sociais, não
."H'lIas durante' os tumultos, como sobretudo anteriormente a eles. Cada conflito Só é possível uma institucionalização de conflitos quando se consegue suspen-
pi essupõe uma sociedade estruturada. Esta correlação entre estrutura de sociedade der provisoriamente o poder, mantendo-o. no entanto. O poder tem de ser posto em
,. fOI ma de conflito impõe-se obrigatoriamente e por si mesma; a pergunta é movimento com uma certa demora (o que parte do princípio de que o sistema dis-
''I)('lIas: a que nível de complexidade? põe de tempo). Em primeiro lugar têm de ser estabelecidas situações ambivalentes
em número suficiente que serão mantidas em suspenso até à decisão, e que serão
Sociedades com direito de defesa própria nunca podem ultrapassar um limiar interrompidas por um confronto demasiado direto dos adversários nos seus papéis
dI' c omplexidade diminuta (4). SÓ podem ser atingidos degraus mais elevados de como adversários, e que impedirão sobretudo que os atos isolados dos participantes
dl'M'lIvolvimento através duma centralização crescente das decisões sobre a utili- reduzam a complexidade para os outros de forma tão drástica, que só os passos
"I~I\() da coação física. Sociedades que o tentam estão, simultaneamente, perante a desesperados tenham sentido. Isto pode acontecer de diversas formas, por exemplo
(I) através de lealdades entrecruzadas, que não deixam reconhecer quem pode ser
111'1essidade de reestruturar os seus conflitos e a ficarem reduzidas durante os
considerado corno adversário e quem pode ser considerado como aliado; (2) através
I onf litos a recorrer a decisões oportunas. Os conflitos sem solução têm de ser subs-
das regras do jogo, no sentido das condições de comportamento que, por exemplo,
ut uhlos por conflitos com solução.
excluem ou aconselham determinados meios; (3) através da institucionalização
Isto torna -se necessário sobretudo porque os conflitos em SI tendem para a duma regra de decisão, tal como a do princípio da maioria ou (4) dum distan-
u-ncralização, para se estenderem a todas as qualidades, situações, relações e meios ciamento perante a decisão que orienta uma parte da atividade de adversário para
d()~ adversários (5). Na medida em que a falta de consenso e os impedimentos outras pessoas e traz assim a jogo considerações sobre os papéis de vários géneros.
1('dpl(l("OS se assumem, aproveitam-se cada vez mais assuntos e ao mesmo tem- nquanto as sociedades primitivas se apóiam principalmente no princípio indicado
po os adversários arrastam cada vez mais as relações nos conflitos, relações que com o número 1, para os procedimentos estão indicadas as estratégias de 2 a 4,
M'lÍalll suportáveis em si. Aquilo que o adversário é, tem ou faz, aparece em cada para os procedimentos judiciais também as mesmas com a vantagem essencial de
(,ISO (orno condenável; quem é seu amigo não pode ser meu amigo. Esta tendência que por esse meio se pode garantir a aprovação duma decisão.
)1,11a a generalização origina conflitos desnecessários. Vai tornando-se progressi-
V,lItH'IHe insuportável com a diferenciação funcional crescente da sociedade, por- Todos os procedimentos judiciais se organizam assim sobre uma diferenciação
IJUI' nessa sociedade a gestação de conflitos e a sensibilidade às perturbações vão dos papéis, que garante que os interessados não decidem por si. Dessa forma
poucas vezes se encontram condições favoráveis para uma disciplina e controle
siutult aneamerue aumentando. Essa tendência tem, pois, de ser detida e, tanto
mútuos, designadamente um sistema pequeno e de fácil compreensão, uma te-
'111,11110possível, desviada para um processo oposto de especificação dos conflitos
mática restrita e igual para todos e uma diferenciação funcional da posição dos
.11I.W(-S de instituições de efeito contrário. É exatamente isso que acontece quando
participantes perante essa temática (7). No capítulo seguinte voltaremos aos por-
os I onflitos sobre a decisão são para lá canalizados.
menores desta diferenciação de papéis. Primeiro temos de considerar com maior
Tal como cada ruptura de tendências naturais, este empreendimento não é exatidão as formas de comportamento que são assim admitidas. A distribuição de
fátil (' só em certa medida pode ser bem sucedido para os sistemas sociais com- ompetências, só por si, depõe muito pouco quanto à forma como funciona o
pll'xm. f: que têm de ser ligados inúmeros mecanismos. Por um lado, devem arran- regulamento do conflito. Isto só esclarece, se se lhe der atenção, qual será o com-
l'alSl' das mãos dos partidos em luta determinadas armas e o conflito deve ser portamento que ela sugere aos partidos.
uanslerido para um plano verbal mais vasto. Para isso têm de se abstrair simulta-
IU',IIlH'ntc as regras pelas quais os partidos se orientam coletivamente. Tornam-se Enquanto os militantes, para terem êxito, se submetem a determinadas regras
I.Ida VI". mais necessárias para a condenação da conduta, não apenas expectativas de conduta e inserem o seu comportamento no sistema de processo jurídico em
di' c OIllPO! 1 a 1lH'I'to criadas complementarmente (do gênero: quando desembainhas evolução, reconhecem-se mutuamente como partes nos seus papéis. Isto é possível
,I 1 \1,1 espada desembainho a minha), como também regras coletivamente reco- porque desta forma não se decidiu ainda sobre a própria opção. Cada parte dá ao
outro como que um salvo-conduto para a oposição, sem que com isso se influencie
a solução do conflito. Nessa medida o princípio da igualdade das partes é um prin-
(,,, •••,,11.,, 11"""." 1101h,',~ Lcvi.uhan. capo 13. citação de acordo com a edição da Everyman's
l,illl.IIY. I 11,,01"'0NO"II 1<"11111' l'lfl~, PIl)(S. 63 (' segs.
,I 1',11"" "11".11,1""" 01" "llflll,I~~U dI' {(mOitos nestas sociedades comparar com Max Gluckman:
1;,,'1"'" ""ti ( <1,,11 i, 1 li. AI'I'" ( .•••1'"11.· •. <C\ul1ilt, na África), OxCord 1955 ou do mesmo autor: Politics,
I."IV i"'" 111111••1 'li '1',"It,,1 :;"fI"ly (1'1111111 ••, di.riH, r ritual na sociedade tribal). Oxford 1965. pags. 81 e 6 Conferir com Galtung. op, cir., pags. 356, 363 e segs,. sobre isomorfismo e relevância em relação
com O conflito instirucionalizado e servindo de base ao conflito real.
, M"
11(111'''111 1"",,1'"1: 1>1.N •.wllllllh Ali APIH(),Ith \O thl' Study of Communicativc Acts
I,itl" " ••, ,:Ilij~ ,I" '-'"""1,1.-11\.111), I'ay. 1If,I"Mi,••1 HI'"i,'w e,o (I{I''''~I,' lte- psÍ("oloJ!ia 60), 1953. ~() ".' pud, li,' ptlillt li •• IIIUMII HIII •• U\UI.' t uudi\.lO ,ufvi.l ftue' I\t. IIJ1IO)(11I1fI d,' 1'".,,,,111.1111,, clu.di
"l'
1'11 I' ."11." t".JIIII'II, 111 "101M ~'H lu 1''''.'''' pUI 11\1'IU d.! 1',11 lU 11"'\1'" ti. "d\'u~.ltltt.
1111 PROCESSOS JUDICIAIS CONFLITO PERMITIDO 89

pio fundamental do processo jurídico. Perante o tribunal, esta reestruturação No procedimento trata-se exatamente desta "mediação" de verdade e direito (11),
p.lssase de forma que o conflito de interesses como que se interrompe e só é tratado Em todo o caso impedir-se-á, se possível, um compromisso existencial. "Outras pos-
(ClI1\O falta de consenso sobre fatos ou questões jurldicas (8), pois todos são iguais sibilidades" devem ser mantidas em vista e apresentadas, Pode-se afirmar e de-
!lI'I,lnte a verdade. Numa tal atmosfera de moderação prática, em que uma de- clarar algo' de determinado, mas tem de se exprimir ao mesmo tempo no estilo ex-
I Ia I ação não pode remover o próprio fato, não pode modificar a própria verdade pressivo do procedimento que a apresentação doutras opiniões não tem, em si,
III.I~ pode, naturalmente, influenciar as chances de ganhar, as partes podem outor- nada de injurioso, Que urna pessoa se situe incondicionalmente fora da verdade e
1(.11 se mutuamente papéis de chances neutras onde se podem apresentar e manter da existência jurídica não pode ser levado para o procedimento de acordo com a
(I)mO adversários. Cada comportamento implica de tal forma o adversáro, que ele linguagem, porque uma tal auto-representação não se adapta ao conflito permi-
(' torna reconhecido por isso, portanto que tem o direito de ser adversário. Toda a tido, pois não se pode discutir sobre ela. A auto-representação só é admissível nos
.1111.1<;50 em conflitos é fundida num molde que interpreta urna opinião do adver- papéis, Qualquer pessoa sente que isso pode ser insatisfatório. Por outro lado, o
.n io correspondendo à própria interpretação pessoal e que é por ele confirmada na processo jurídico protege as pessoas da desgraça duma identificação pessoal de-
11.1 .uuaçâo (9). Assim o procedimento é integrado corno sistema e é mantido em masiado estreita com a verdade e o direito através desse compromisso de papéis e
luuciouarnento (10). do protocolo simbolizado por ele.

Naturalmente que urna luta pelo direito.: tal corno urna luta pela verdade, é O seu próprio eu é, portanto, tratado no procedimento com acuidade e
preparado com moderação para um resultado ainda incerto. É-lhe mantida em
uuult.meamente luta sobre a luta. Quer dizer: é negado ao adversário o direito à
1111.1 Sob essas condições, o comportamento militante desacredita ao mesmo tempo aberto a possibilidade de se ·distanciar e sobreviver à verdade e ao direito, Isto não
,I~ ,\lHO r epresentações , tem aquele perigoso efeito de generalização e consegue, em quer naturalmente dizer que pode assim ganhar o apoio também para decisões
1.1111)extrcmo , a morte não apenas física, como também moral. A ameaça à iden- prejudiciais, Na literatura postula-se ocasionalmente que os grupos efetivos com-
Iul.l<l<' física e social radicaliza a luta e dispensa, finalmente, da observância das binam urna maior discrepância no início do processo de decisão com urna dispo-
I"HI.I~, No conflito institucionalizado, pelo contrário, não há nenhuma luta válida sição maior para aceitar 0S resultados, podendo, portanto, manejar maior número
p.\I ,I além do direito à luta e portanto, também nenhuma luta perante a justifi- de conflitos sem pôr em risco a legitimidade da decisão (12). Mas não se quer com
I.dnlidacle de auto-representações controversas. Desta forma são captadas para a isto dizer que esta aceitação pode ser efetuada pela admissão da possibilidade de
,111\0 declaração, as mais graves conseqüéncias; isso impedirá que, de disfarces expressão por falta de consenso. A causa principal esconde-se, enigmaticamente,
•1I1H'ilçados ou destruídos, ressuscitem conflitos renovados, determinados por sen- sob o conceito de grupo efetivo .
rimemos cada vez mais fortes, e conseguir-se-á manter a situação sobre controle. Os
II.IIIH ipantes já não podem apresentar o seu direito na pura afirmação, na inten- Resolver esta cifra de implicações demasiado complexas não constitui o
aidade da conservação das suas expectativas: têm de moralizá-Io, isto é, têm de vin- propósito deste estudo, que apenas menciona um aspecto do problema, o esta-
culâ-lo a urna projeção das possibilidades duma futura convivência social. belecimento dos procedimentos jurídicos regulados, Temos, pois, de deitar uma
vista de olhos sobre o funcionamento do próprio processo e dar aí maior atenção à
O preço deste sucesso é uma relação destruída para com a verdade e o direito. dinâmica do sistema, à seqüência cronológica auto-regulada das declarações.

li Conferir aqui com Vilhelm Aubert: The Hidden Society (A sociedade oculta), Totowa, N J. 1965,
""H~ /lI>(' ,,'ss .. principalmente pags. 98 e segs,
'I (h (ótligo, de !l' ocessos mais amigos continham instruções, muito mais expressivas, de que não
",,""iI~ a dignidade do tribunal, corno também a do adversário, deviam ser guardadas. de que não se
1I,'vi.\lll realiz ar insultos, injúrias e coisas desse gênero, e de que "ninguém devia ser enfraquecido, nem
"I ,ti 111 ente , nem por escrito" (Reichskarnmergerichtsordnung Código da câmara imperial de 15551
~~~ 2, cita de acordo com L. Levin: Richterliche Prozessleitung und Situzingspolizei in Theorie und
1'1.\Kis (Orlr-ntaçào judicial do processo e controle de sessões na rcoria c na prática), Berlim 1913, pago
~·17
lU AlIás () tato social efetua algo de muito parecido. Tato é a disposição para a cooperação na auto-
"'I""M'lnação c rnrsmo sob desistência desta cooperação pelos assuntos atuais da comunicação social.
I .unbém ('k pt·"nitt' urna conversação controversa por este meio: os participantes, na apresentação da
,",, O;III1IJO, mosu am ~lrnul",rH'atlH'nt(' (I seu respeito por outras opiniões, portanto, exprimem que a
,ltlll~.", 11,,"11," ()pi",i ••'~ 0;\ •• dl'~MIf'dil, i ,I~ ouu.rs pessoas, O conceito clássico-liberal da "opinião aber
1,1 PIl"\lIIHH' .1 II\\III\H lOu.lil/il\'IO
i clo tulO 11(':\1(' M'luido c não seria com certeza criado numa época que
1I Pensar nesta intervenção como "meio para um fim, tal como O faz a teoria clássica de processo
,li ,,·di ••, I'"d" 1"" Ir,11 li" 1.11""'" c1t'\"IIIIIII.III", llellll". 'oliais, A reoria ela "opinião aberta" linha, por
jurtdico, (o tocar de perto neste problema.
,'M' IIIIII'VII, 11111 ••• d,I~.1II ~'"'I"" plI.ItIc-II.,1I11,I '''''' ,I vcrd adc. ESI~s reflexões esclarecem, simulta-
1If'.llIlnlll', 11_ tI)U"t'tj"('l\ti,l~ 111lt'tlhl"" o.• 1111\111· ••• du ,llIllMtl 1(·Oli.l pollrica liberal. Ambos os sustentá I\! J\s~illl por exemplo Torruncc, op, cu., a versão jurídica desta hipótese sócio científica encontra se
1\11.,,,. " UpIUII\U -111'1111" fi 1~I'HI,,.i'lI 111111.11111 1"M,dUlt-lH" OIJ\.IIHltldo, d('s(:ansan1 sobl(' premissas cons 11.' ,di, "'a~.\11 d(' '1"1' ;, di"us~;.(} I ouu aditôria crmt inua a ser o melhor meio de trazer à IUI a verdade.
111I1d,ul I••,,;,lrl.ulo!lu -.1I1t1l' +1 11I\llIudflll.llllílçrin dll~ tfllllhlo!l r .If' IIH''i11l0It'mpo solHt..~ uma !(')~\(:ão in 1',11,. Idlil,llOIllPdlol' (f)1l1 Jt'lIl1l11' FI,ll\k: (:'11111' Oll TriJI Myt h and I{('ali\y in AI1I('lil,11I JlI~lin'
It1jlUluI'ulu II.",,~ , 1111111 H~IILlill' I,,,,•• li •• _ t~HIII,illl rXIHI ."•• 11,1 IIOIWUlIl\!r4.l0 do PWUUlilclo du l,tt<, p,lI~l os (I dllll",IIN"'" í"I)(,lI11"IlIIl. Mil" ( 1I'lIlrtl.,tI, 11,'III"i~,. ,,"11'11'.,,"') , P,ill~I'1I111,N J 1'1,111,IM)(".IW I' "')I',
"liH r."'ilIIt jlldd" ••", "'-IIUilll IpU1 tJi 'HI~I.-! InM/'ttlillllt ""IIIIII\II1.U" "1.111 tll.d" f' "()!II clc-tllI/IIHu" du tlll('ll0 1111 no tllIl'lto ,dnu.to lU c u""UI"',it.I)"" tltH eL.o 111011VU, no (;(,clIKU du p, 4ft ""'\0 (~iVII •• t 111""1 \.'" do
1111111111111'111 ~.I0111;liM"idllil.· 111.111.11 I~IH ·111111',11 (1'''''' .1.. \1:.,1:••1,)
CAPÍTULO VII
Limites da capacidade de aprendizagem

o sentido dos procedimentos judiciais oficiais, ao qual se devem subordinar a


encenação e comportamento dos participantes, consiste na apresentação dum
método de alcançar a decisão, baseado em normas. Aí é importante em todos os
procedimentos determinados para a utilização do poder de decisão do governo,
uma separação clara e inconfundível entre. os decisores e os que recebem a decisão:
os primeiros tomam a decisão, os segundos têm de considerá-Ia como premissa do
seu comportamento. Ambos os papéis, aos quais se podem subordinar os papéis
secundários como o de chefe do protocolo, de secretários, de policiais, de men-
sageiros, advogados e conselheiros respectivamente, têm de produzir , de acordo
com a sua posição diferente no processo jurídico, realizações distintas de decla-
rações, donde uma responsabilidade diferente 'pelo decurso livre de impedimentos.
Ambas as realizações têm de se completar complementarmente para o processo ser
bem sucedido, tendo portanto de se ocupar reciprocamente dos "papéis implícitos".
Isso presupõe e leva a que se consolidem uma perspectiva comum de sentido, causas
comuns, informações indiscutíveis sobre um sistema de suposições e símbolos que
não pode ser posto' em questão (1) sem um grave desajuste do procedimento - e
daí riscos para os participantes. Pois aqueles que recebem a decisão só assim se
comprometem com respeito a um resultado incerto de decisão, na esperança de o
poderem influenciar. Não se deve, contudo, supor que, devido a isso, esta esperan-
ça possa governar os resultados.
A apresentação e execução dum tal procedimento tem de ser resgatada com
consideráveis débitos, que não diminuem, antes aumentam, devido ao fato de não
poderem ser declarados. Estes agravamentos do procedimento não residem apenas
na desigual distribuição da influência, mas sim em que esta assimetria não pode ser
psicologicamente compensada de forma suficiente no caso do processo jurídico (2).

São instrutivas neste aspecto as experiências relatadas por HaroldCarfinkel: Studies of the Routine
.rounds of Everyday Activities (Estudos sobre os fundamentos de rotina da vida quotidiana), Social
I'roblcms 11 (Problemas sociais 11), 1964, pags. 225·250. Servem para o esclarecimento dessas prernis-
$:15 de consenso na conduta diária e esclarecem, também, quais as condições prévias que devem realizar-
SI' primeiro. quando desconhecidos se reúnem para um processo jurídico.

~ Distribuições de influências hierarquicamente desiguais são válidas na sociologia atual como es-
11 uturas sociais instáveis em princípio. mas capazes de estabilização. Como discussão particularmente
digna de atenção deste problema ver Chester I. Barnard: Functions and Pathology of Status Systems in
Formal Organizarions (Funções e patologia dos sistemas de sratus em organizações formais). Editado
por William F. Whytc: l ndusrry and Society (Indústria e sociedade). Nova Iorque-Londres 1946, págs.
1683. PI'II'I M. Blau: Exchange and Power in Social Life (Troca e poder na vida social), Nova Iorque-
1.0n(\,I·s SYc\IlI'y \%1, (;('Ihurd E. Lcnski: Power and Privilege , A Theory ofSocial Stratification (Poder
r ".ívil"Kiu IIm.I 1,'0"., ,!t. I·Sll,lIif".I~,lO sod.d), Nova lorque 1966. Esta forma de encarar O problema
11"" .1 V,,,,I.III"1I1 <11 111111.\1 11111" ,,'1111' 11 \l1ohl.·",.1 tI.I 1 omp<·OlH.'Ç.\O (' di' PI'tlOlllil IlIn.' n)mp'II.I~~n. ~lIh n
11'•.•• "0 IHIIIIO ti,· \'1••11. dt, tlIVf'UO'i t'l'o" .Ir' ''''111\11",).·"
1
I~'
PROCESSOS JUDICIAIS LIMITES DA CAPACIDADE DE APRENDIZAGEM 93

Urnadas fontes de tensão reside no grau diferenciado de personalização da Nestas circunstâncias não deveria ter fundamento suficiente na instituição (5)
d,'( l.uucão de ambos os lados. A pessoa do decisor tem de ser desligada da de- a expectativa de poder alcançar o acordo dos receptores da decisão através da par-
r 1.1I.IÇào, pois a decisão deve aparecer como uma conseqüência de normas e fatos. ticipação no processo jurídico em proporções razoáveis, ou pelo menos alcançar um
1101 ouu o lado, a pessoa que recebe a decisão tem de se inserir na exposição do auto-ajuste inteligente com a decisão. Nem a investigação psicológica está em con-
1'1 ()«'dimento, pois a decisão deve constituir para ele uma premissa de compor- dições de apoiar tais esperanças (6). Pode ser até que o interessado numa situação
l.llIH'llto c deve alcançar o seu objetivo pela aceitação como premissa de decisão. mais confusa escolha a saída psiquicamente possível de se identificar com o resul-
I' S!.I discrepância dificulta a comunicação e é muitas vezes sentida como um tado e, de certo modo, possa encontrar um álibi na decisão oficial.' Isso
Plobi<'ma: há juízes e funcionários administrativos que se sentem, por isso, inci- acontece sobretudo quando se pode encontrar uma explicação histórica que lhe seja
I.Hlo~ H abandonar periodicamente os seus papéis e, se necessário, a ter uma con-
adequada e quando os seus outros papéis sociais o apóiem na sua atitude perante a
VI'1.\.1 de homem para homem; e encontram-se destinatários das decisões que se
mulher, os amigos, os colegas de trabalho e os vizinhos e o reconhecimento não lhe
Idw!l.lnl deste fardo na medida em que enviam um representante, na medida em
seja levado a mal, como uma reviravolta incompreensível (7). Contudo, o próximo
qUI' também decompõem o papel do assistente engajado no duplo papel de assis-
está, geralmente, tão agarrado ao velho eu do perdedor, que este não pode de
te'lI!I' IIHO comprometido e assistente comprometido.
repente aparecer com novos conceitos sobre justiça e injustiça; senão ele recearia
perder não só o processo, como também os seus amigos.
Com isso está relacionado que situações que, por um lado, são tratadas de
.u 111 do rom a rotina, pelo outro, opostamente, significam uma experiência ex-
11.ICHdin.íria, sendo igualmente instáveis (3). Elas facilitam a quem queira expor 5 Numa tentativa de fundamentação, deveria ser dada aos participantes uma boa oportunidade de
11111tksejo importante, o sentimento de ser responsabilizado sem ser visto nem escapar de infrações do direito para os levar ao reconhecimento das regras do jogo e dos seus resultados:
uuvulr: c, portanto, também sem esperar. A aplicação impessoal e rotineira do assim Murray Edelman (The Symbolic Uses of Politics Os empregos simbólicos da política Urbana.
I I I. 1964. pags. 44 e segs.). especula demasiado sobre o sentido anglo-saxônico de desporto. concorrên-
"( .I~()" r uma parte integrante do processo jurídico e da sua exposição, pois a
cia e câmbio como se ele se pudesse generalizar. Mesmo no direito fiscal ou no direito de circulação
d", ""'0 rem de ser apresentada como uma conseqüência dos fatos e das normas. devem fazer continuamente falta a esta concepção as atitudes pressupostas.
1 I 111dI' ser organizada em conformidade com isso e os participantes têm de ser 6 Gordon W. Allport: The Psychology of Participation (A psicologia da participação). The Psy-
pie P,II .idos para ela (4). Daí só poderem ser relevantes as informações que estão chological Review 53 (Revista de psicologia 53). 1945, págs. 117·132, abafa a sobrevalorização da ativi-
I'"'vi" .l~ no programa de decisão. A decisão tem de ser tratada como algo de es- dade social. que se encontra de vez em quando na América por meio da distinção de atividade e par-
1.1111'1(·(ido mas ainda desconhecido. Aos receptores da decisão, que estão presentes, ticipação envolvendo d ego. Com isso, contudo, pouco mais se ganhou do que uma formulação cética do
11.10 pode ser atribuído nem abertamente, nem de forma latente, o papel daqueles problema. .
11111' !('1I1 de legitimar a decisão. Eles serão tratados apenas como portadores de in- 7 Para a importância dos contatos entre as pessoas e outros relevantes para a capacidade de apren-
1IlIIII,H,()('S, ou como fontes de erros, e não como pessoas, como o outro eu, como dizagem e alteração. ver ainda Paul F. Secord/Carl W. Backman: Personality Theory and the Problern
IOIH(' or iginária de sentido e direito É fácil de compreender que isto se pode passar of Stability and Change in Individual Behavior. An Interpersonal Approach (Teoria da personalidade e
", I (·,tlllH'llle se passa, com respeito para com a dignidade humana. Mas com isso só problema de estabilidade e mudança no comportamento individual. Uma aproximação interpessoal),
J>sychological Review 68, 196 I. pags 2 I ·32; dos mesmos: Social Psychology (Psicologia social), Nova Ior-
~I ('XI IU(,1l1 as ofensas mais imperdoáveis e não as formas de tortura mais requin-
que. S. Francisco-Londres-Toronto 1964, pags. 583 e segs. e Carl W. Backman/Paul F. Secord/jerry R.
t,ld.I~, tOI!lO também não aquele atentado puramente objetivo à personalidade, que Peirce: Resistance to Change in the Self-concept as a Function of Consensus Among Significant Others
1:1 .1(OIIl('("('U no estilo de situação e que atinge duma forma tão sutil e profunda, (Resistência' à mudança no conceito pessoal como uma função de consenso entre outras significativas),
II'U' M' ~\lbtl ai à contestação e, freqüentemente, até ao conhecimento. Sociometry 26 (Sociometria 26). 1963, pags. 102·1 I I. Entretanto, é improdutiva para os nossos obje-
tivos. uma série de investigações empíricas sobre mudanças de opinião como conseqüência de compor-
tamento nos papéis, pois têm em vista outras situações. Ver, por exemplo, Irving L. janis/Bert T. King:
" he lnfluence of Role Playing on Opinion Change (A influência do desempenho do papel na mudança
de opinião). The journal of Abnormal and Social Psychology 49 (Periódico de psicologia anormal e
social 49). 1954,. pags. 211·218; Bert T. King/lrving L. janis: Comparison of the Effectivness of Im-
provised Versus Non-improvised Role-playing in Producing Opinion Change (Comparação de eficácia
do desempenho improvisado do papel contra o desempenho não improvisado na criação da mudança de
opinião), lIuman Relations 9 (Relações humanas 9), 1956, pags. 385-402; Frances M. Culbertson:
Mudification of an Emotionally Held Altitude Through Role Playing (Modificação duma atitude man-
tida emocionalmerue através do desempenho do papel), The journal of Abnotmal and Social Psy-
rhulo!\,y 54, 1957, pâgs. 230·233; Chadwick F. Alger: United Nations Participation as a Learning Ex-
1"111''''''lplo h!wartl I',. .JOIl(·'/W T'hihaut: Irueraci ion Coals as Bases of Interference in Interper- ,,,,ti,·,,,,, (Participação das Nações Unidas como uma experiência de aprendizagem), Public Opinion
IlIl.tI 1'•.•• 1'1"inn (MI'I .I~ dI' 111('1,I~.IO t 01110 UilWS de interferência na percepção interpessoal). Editado QII,ltu'dy 27 (Opinião pública 27) 1963, págs. 411-426, Theodore R'. Sarbirr/Ver-
1'''1 ,(.·".110 I '\klllll 1.1"1111'1'1I11110 1"'''1111 P"I( "p(iOIl and Interpersonal Behavior (Percepção das pes- 111111I.. AIII'n: Role Enactmcnt, Audience Feedback and Altitude Change (Desempenho do papel,
".I~I 1111111""1.11111'1110 ;"I,·I) ••.·'o.d), SI,,,dllld, C.tI 19f,8. pags. 151-178 (157). Ver ainda Niklas ."0"'1110 da audiência e mudança de atitude). Sociometry 27, 1964. págs. 183·193 (os estudos mais
1.01"".",,1 1,.,11 d," Ho"IIIW (1,1"111"d., 111110,1),V"lw,dtullgsarchiv 55 (Arquivo administrativo 55), Il'It'lIlr~ r onrm d.un tOI1l o resultado muito interessante de que os que desempenham os papéis, ao en-
'!lIi I. 1'10"., I '1'\{~11I) '''"110111'1111••~j8t~I\('J,I, süo tentados a uma mudança de opinião em direção ao seu papel como tal). Estas
1""1111'", .•• o"do .1 hi,,(Il"~" de' CjIlC'I) p.tpC'i ,'.t:\ em contradição com a opinião própria anterior e não
1"1 1111 "i~dIlH.'llIt 11111l'1ílíl" ~IIIII'~IIVII110-'1>IllIlIli('.lç~o "humana", amistosa, lit•. ti" 11",11111111.1 1"""IIIIIII,llk !Ir "X(lIl'~"I(1, M'riilll1 inlC'r~S$"n\('5 quanto li pergunta se os jurados podem
"rlll~Hllulll I IIJIf'i.IIII
''''01111,1111"111"'I1I,IIUIIl(I !1'(lp"O ;lIil anuncia depois c fun- 11'111"11111111' "l'tllh)" lI\rlh", ."h" " I""II~ •• HC')I.'ltil ip.III'11I 1\('1,1.Nos (il~()' que paI ,I ,1'I"i t"lIl il\ll'll'"''
i",IíI'~~hl'1 IlllIdl/.1 ." 11I1,,"t1,I~III'~d,lIl.l~ num runtextn 11111 Jt, •.•11 ItIIltlo"hlllld ••, .t. 1'~l'fl. 'I'''' Ilo-v,'''' 1"l'p,UAI l'o~"illllitl."Ic·1 Ilr "~,1I1·,~1", 1'1"" .1 11I{\(lII'1
94 PROCESSOS JUDICIAIS
LIMITES DA CAPACIDADE DE APRENDIZAGEM
95

Essa solução do problema psíquico através da aceitação não é, entretanto, a


precisa, pois, causar espanto (!l). Serve de válvula de escape ainda relativamente
única possível. A alternativa do endurecimento interno e duma generalização do
inofensiva. Os procedimentos geram não só conhecimentos permanentes, como
conflito a todos participantes e a todas as situações semelhantes pode ser um
também ilusões permanentes. A sua função não consiste em impedir desilusões,
equivalente funcional. Portanto não se dev~ntestar <l!:!.e_um.0:º-cesso juridico
mas sim em trazer as desilusões inevitáveis para uma forma última de ressentimento
possa trazer à razão os que 1aboramem erro", ou ~ossa torná-los conscientes do particular difuso, que não pode converter-se em instituição.
direito e dispostos a um acordo. Mas a idéia motriz principal, ou apenas a função
latente do sistema de processo legal, não é nem ceder, nem examinar os erros (8). Que nos procedimentos se possa chegar a uma aprendizagem orientada para o
objetivo e não suscetível de desilusão não é de esperar em casos comuns. Depois d
Naturalmente que uma reestruturação das expectativas, um efeito de apren- tudo o que sabemos quanto ao método de aprendizagem e especialmente quanto ao
dizagem, se realiza duma, ou doutra forma, através da decisão. Depois do processo estudo de, opiniões e atitudes, deveria ser reestruturado de forma completamente
diferente um sistema social que pudesse realizar esse estudo (12). Não deveria ser
já não se podem alim~ntar as mesmas expectativas do que antes do processo. ~
programado por meio de disposições invariáveis, deveria sim, dentro de certos li-
pergunta é, porém, se este efeito de aprendizagem é orientado no processo e com
respeito ciO direito, incluído na opinião pessoal dos participantes, ou se se realiza mites, poder dispor das possibilidades de se desviar de valores reconhecidos, tolerar
infrações ou então prescindir de sanções. Esse sistema não deveria atacar frontal-
após a decisão através duma experiência desiludida. Neste caso, o método de
mente idéias preconçebidas, deveria antes permitir um avanço indireto, deveria
aprendizagem'é incalculável. O desenganado terá de reorganizar e reforçar (9) as
suas experiências, formas de comportamento e objetivos num papel "diferente". Ele organizar primeiro posições de reserva com novas expectativas e, partindo delas,
poderia ir abandonando as antigas posições. Deveria ainda poder compensar os
procurará, no futuro, fazer consistentemente as vezes de humilhado, escravizado,
violentado, desconhecido, enganado, senão mesmo de doente. Ele reestruturará as ( sucessos da aprendizagem e estar preparado para progredir gradualmente. Teria,
suas expectativas de tal forma que "expliquem" a sua desilusão e, ao mesmo tempo, finalmente, de dispor da possibilidade de aceitar as carências e dificuldades da
permaneçam consistentes com as expectativas frustradas, não confirmadas pelo aprendizagem e regular-se por elas. Não se pode esperar tudo isto dum sistema (13,)
direito. Ele procurará e encontrará um culpado, por exemplo: o JUIZ,. o seu ad- __
vogado, uma testemunha que prestou declarações falsas, etc. (1(\). As suas ante- 11 "O que é mais insatisfatório e até mesmo perigoso na nossa administração do direito é o elementar
.riores expectativas aparecem-lhe como justas, quer antes, quer depois, mas não já distanciamento do direito e alheameruo do mesmo do nosso povo, que caminham lado a lado com o seu
alheamento da história, com a sua falta de um sentimento de nacionalismo simples e por isso não agres-
como suscetíveis de serem impostas; e o seu futuro ficará sobrecarregado pela ) sivo, e com uma falta assustadora de convicções coletivas básicas e noções de valor" conta um juiz (Her-
hipoteca da permanente frustração, que só a pouco e pouco poderá ser compen-/ mann Weinkauff), por ocasião do seu discurso de despedida como presidente do tribunal federal: con-
sada. ferir com Deutsche Richterzeitung 38 (Jornal alemão de jurisprudência 38), pago 135. As suas recomen-
dações não se realizam de forma correspondentemente conservadora: redução da profusão de leis, retor-
no ao direito natural, elevação do status do juiz.
A divulgação duma imagem negativa estereotipada do jurista e do juiz não 12 É fundamental sobre is;;o Talcott Parsons: The Social System (O sistema social) Glencoe, Ll l .
1951. pags. 249 e segs. Desde então tem aumentado incomensuravelmente a literatura sobre coletividades
"re apéuticas", empiricamente relacionada sobretudo com prisões, estabelecimentos hospitalares,
8 O predomínio do pensamento de arbitragem é, de vez em quando, defendido para os processos r rcches, erc .. dos quais se espera. pelo menos na análise sociológica, que ajudem os seus internados na
jurídicos das sociedades mais primitivas. A imposição do direito não Ihes parece constituir um objetivo (,11reira moral do seu próprio eu. Como exemplo típico desta concepção consultar Maxwell Jones: The
em si mesmo mas antes a forma em que se' podem ordenar perturbações e desavenças. Comparar, por
r ,
'I'hcrapcuuc Community (A comunidade terapêutica), Nova Iorque 1963; Robert N. Rapoport/Rhona
exemplo, com Richard Thurnwald: Die menschlicbe Gesellschaft in ihren ethno-soziologischen Grun- Rapopouy}, Rosow: Community as Doctor (A comunidade como médico). Londres 1960; Oscar Grusky:
dlagen (A sociedade humana nos seus fundamentos sócio-etnolôgicos), vol. V, Berlim-Leipzig 1934. Role Conllict in Organization. A Study of Prison Camp Officials (Conllito de papéis na organização.
pags. 145 e segs.; Paul Bohannan: Justice and Judgement Arnong the Tiv (Justiça e julgamento entre os Um estudo sobre funcionários dum campo de prisioneiros) Administrative Science Quarterly 3 (Pu-
Tiv), Londres 1957. Como crítica A. L. Epstein: Judicial Techniques and the Judicial Processo A Study blicação trimestral sobre ciência administrativa 3), 1959, pags. 452-472; Donald R. Cressey, editor: The
in African Customary Law (Técnicas judiciais e processo judicial. Um estudo sobre direito consuetu- 1'lÍwn. Studies in Insritutional Organization and Change (A prisão. Estudos sobre organização insti-
dinário africano) Manchester 1954, T. Olawale Elias: The Nature of African Customary Law (A na- u« ional e mudança), Nova lorque 1961; e do mesmo autor: Prison Organizations (Organização das
tureza do direito consuetudinário africano), Manchester 1956, pâgs. 212 e segs.; Max Gluckman: Po- Jl,i.ücs), Editado por James G. March em: Handbook of Organizations (Manual de organizações),
litics, Law and Ritual in Tribal Societies (Política, lei e ritual nas sociedades tribais) Oxford 1965. pags. :hicago 1965, pãgs 1023·1070; William R. Rosengren: Communication, Organization, and Conduct in
183 e segs. Ih" "Therapcuuc Milieu" (Comunicação, organização e comportamento no meio terapêutico), Adrninis-
I,."iv(' Scicnce Quarterly 9, 1964, pags. 70-90; Earl Rubington: Organizational Strains and Key Roles
9 Para esse compromisso pessoal num comportamento divergente como papel consistente conferir (I ('IISÕCSorganizacionais e papéis-chave), Administrative Science Quarterly 9, 1965. pags. 350-369.
com Michael Schwartz/Gordon F. N. Fearn/Sheldon Stryker: A Note on Self Conception and the COll1par;or ainda com Dieter Claessens: Familie und Wertsystem. Eine Studie zur "zweiten, soziokul-
Emotionally Disturbed Role (Notas sobre concepção pessoal e o papel emocionalmente perturbado), 111 ••.11('" Ccburr" des Menschen (Família e sistema de valores. Um estudo sobre o "segundo nascimento
-('<111c ulrurul'' do ser humano), Berlim 1962, principalmente pags. 141 e segs. sobre a transmissão
Sociometry 29, 1966, págs. 300-305.
'l"iI.,t!oxal" (' elâstica de valores da nova geração e a aptidão especial da família para esta tarefa,
I~ '1 umbém hâ em. crítica em Ilarry C, Bredmeier: Law as au Integrative Mechanism (A lei como
10 Como se sabe de diversas fontes. por exemplo da, investigação emológica sobre a crença nas li'" """ .IlIi",," d,' iutegração). Editado por William M. Evan em: Law and Sociology. Exploratory Es-
1>1uxas, ou das investigações socio psicológicas sobre estereótipos de bodes expiatórios, os esclarecimentos '.'y. (1."; " IIIl('Íolol\i", FIl~.';OM Clxplcl1.III1,ios), Nova Iorque 1962, pags. 79·90, 85 e segs., Conferir tarn-
p('s~()ais dI' (\(·~il\l'ó~s (\"s 11' tipo of""'{clll consideráveis vantagens, porque as pessoas são um ponto de 1,,'," '0'" AIIIrC'II, "1' 'li ,1"'1\ IH, "01., 11 A op,"i,ll1 (ol1lr~lÍa de' Talcou Parsons: The Law and
,('sJ)(>IIN.dlll"I.lllr '"\1110 pl,.",lvt'I 11,11.,.1I"••~•••·s COIlIJl.tfM, em ver doutros, Neil J. Srnelser: Theory of :;, ••1111COI1"ol (1\ II'i f' 11. olll."lt Mil ,,01), "'" I'V'III, UI' (11 ,P"K8 f)6 72, vers.io alemã editada por ElI181
(:0111'(Ilvc' l\I'h.lv,o, ('11'1" ,., d., '""1111111.11111'11111 IIIltdvlI), Nuv,. Inrq\ll' I 'lh~, 1>1 iucipulmeruc pags, 105 e " Ili,.,Io 1\.1.1,,1"'11Ihhlll'"Io-. riu :>" ••1"·,, .".01 1\.I••II'II,du'" "" RI'(IoI."u/iolnKil' (I'.~,,,"o~ I' lllolII',i.1\
rMM" O~I/'J I' •• M'" HHH 1)\,,,,"'1111'1"'(-1\1 i.Hl ClltltU IHIIIII t , , 1,,,,.1.111"'IH,' o f')(C'lllplo du 1)10"'1"0 ;ut1dit"o p~,., ".'"M
•• .111llt"'j(III, (,,,lti,,i.1 11"1.,,1•.,, 1'11;7,
li .'" 11,111111 1'/1 I~I, 'I''' ." "I",i ••• "11"'11111,,"li 110'1'1'1
LIMITES DA CAPACIDADE DE APRENDIZAGEM 97
96 PROCESSOS JUDICIAIS

trás (l~), valor esse que apóia a confirmação das normas para sua fixação como
que se especializou, em primeiro lugar, na aplicação do direito no sentido da premissas obrigatórias de comportamento e de compromisso pessoal.
execução dum programa. Um sistema desses abre realmente possibilidades de
aprendizagem - sobretudo quando não apresenta para os participantes a aparên- Se se tratar duma colaboração confirmatória do interessado, a questão da en-
cia de decorrer à deriva e de forma totalmente incompreensível, antes lhes dá uma vergadura das conversações adquire grande importância no procedimento. Um
oportunidade de apresentar a causalidade da sua própria atuação, presenciando a tribunal que exija dos participantes apenas algumas informações que ainda fal-
força de persuasão da sua própria argumentação (14). Esta hipótese já é difícil de tem e decida depois, surpreendentemente, de acordo com o seu próprio parecer,
se ver em problemas jurídicos complicados. Aliás, a necessária intolerância do não aproveita as hipóteses de decisão que o procedimento oferece. Quanto mais se
direito fala contra infrações e contra a estrutura do "ou/ou" da decisão, que deter- convertem em assunto de debate não apenas perguntas efetivas em suspenso, como'
mina uma cota de 50% de desilusão e, ao inverso, que no próprio processo jurí- também problemas jurídicos, tanto maior é a perspectiva de distinguir ternati-
dico, sem o desvio sobre a experiência do desengano, se pode alcançar uma eficácia camente o material de discussão, ou então de o reduzir a questões isoladas difíceis
essencial na aprendizagem. A aplicação e a aprendizagem do direito são funções e, dessa forma. descongestionar a decisão final (17).
distintas e discrepantes e nenhum sistema se pode especializar simultaneamente nas
duas, sem que ambas sofram com isso. No decurso dum debate desses, as partes são levadas a especificar o seu des-
contentamento e a destacar os poucos pontos de discussão em suspenso, até mesmo
Com estas reflexões não se nega, no entanto, a função legitimante do com a ajuda das ordenações jurídicas e sua retórica, que entra como tal na de-
procedimento, antes se aponta para uma expectativa exagerada e irreal e se indica, claração. Uma vez caídos no funil do procedimento, as partes têm de se mover para
aliás, a direção em que se deve procurar uma resposta. Um procedimento não tem chegar a uma decisão. Só através da observância dos limites do possível, que se vão
geralmente um motivo suficientemente forte para conseguir dos receptores das progressivamente estreitando, é que podem esperar obter uma decisão favorável.
decisões um reconhecimento, ou até uma inovação pessoal, mas em todo o caso Para alcançarem pontos suscetíveis de consenso, têm de limitar a sua liberdade, es-
leva-os a uma coisa: a um trabalho protolocar não remunerado. colher determinadas dúvidas, apontar argumentos - levando com isso a um ponto
que não pode fazer despertar um verdadeiro interesse para a sua demanda especial,
Através da sua participação no procedimento todos os intervenientes são in-
senão àqueles que disso se ocupam profissionalmente e que têm de decidir sobre is-
duzidos a expor o âmbito decorativo e a seriedade do acontecimento, a distribuição
so. Já não se trata então, como parece em primeiro lugar ao queixoso e seus amigos
dos papéis e competências de decisão, as premissas da decisão procurada, na ver- e talvez também à imprensa, duma usurpação escandalosa dos direitos e liberdades
dade todo o direito, na medida em que não se discute a sua apresentação e confir- dos cidadãos, dum ato de violência da burocracia contra o qual a coletividade teria
mação por esse meio ( 15). Não basta que os representantes do poder anunciem com de se defender; trata-se. sim, e só, duma questão problemática da lei da expro-
solenidade unilateral os princípios da sua' opção e decisões. O que tem um valor es- . priação à sentença contrária do tribunal, mas não havendo ainda quaisquer de-
pecial é, precisamente, a cooperação daquelas que possivelmente ficam para isões do Supremo Tribunal.

A função do procedimento é, portanto, a especificação do descontentamento e

14 Quem prova esta variável são Julian B. Rotter/Shepard Liverant/Douglas P. Crowne: The
Growth and Extinction of Expectancies in Chance Controlled and Skilled Tasks (O crescimento e exrin-
ção das expectativas em tarefas práticas controladas pelas possibilidades); The Journal of Psychology 5~
(Periódico de psicologia 52), pags. 161-177. Comparar também com Melvin Seeman: Alienation, Mern-
bership and Political Knowledge. A Comparative Study (Alienação, filiação e conhecimento político. Um
estudo comparado), The Public Opinion Quarterly 30 (1966), pags. 353:367; William A. Watts: Re-
lative Persistance of Opinion Change Induced by Active Compared to Passive Participation (Persistência 16 Nisso se bàseia o pensamento antigo, oriundo da Idade Média, da representação como uma
relativa de mudança de opinião induzida pela participação ativa comparada com a participação pas- aprcseruação solene da ordem social "in corpore et rnernbris". Conferir com Jürgen Habermas: Struk-
t urwandel der Offentlichkeil. Untersuchungen zu einer Kategorie der bürgerlichen Gesellschaft (Mu-
siva), Journal of Personality and Social Psychology 5 (Periódico de personalidade e psicologia social 5),
1967, pags. 4-15. Possivelmente haveria aqui também possibilidade de comprovar empiricamente o dança de estrutura na publicidade. Pesquisas sobre uma categoria da sociedade burguesa), Neuwied
processo de aprendizagem nos processos jurídicos e, com isso, o seu efeito de legitimação. 1962, pags. 17 e segs.
17 A atual prática alemà de julgamento prescinde em regra, por motivos práticos compreensíveis, da
15 Que as violações do direito dão ocasião a uma restauração do direito acentua-o Émile Durkheim: discussão pormenorizada de questões jurídicas. Certas dificuldades duma tal "conversa jurídica" devem.
De Ia division du travail social (Sobre a divisão do trabalho social), 7.' edição, Paris 1960, págs. 35 e t arnbérn , Fundamentar-se perante o tribunal no fato de que nessa conversa falta a igualdade a pres-
segs. (comparar também com a obra do mesmo autor: Les régles de Ia méthode sociologique As WI)O'. Enquanto os partidos têm de fixar as suas posições, o tribunal tem, pelo contrário de deixar as
regras do método sociológico 8. a edição, Paris 1927, pâgs. 80 e segs.), vendo nisso uma importante IU.IS em suspenso c só apresentar para o debate opiniões potencialmente relevantes. Os interessados só
função positiva de variação. Consultar também George H. Mead: The Psychology of PunitiveJustice (A podelll eruão precisar as suas próprias opiniões jurídicas ao acaso e não em relação à maneira de pôr O
psicologia da justiça punitiva), The American Journal of Sociology 23 (Periódico americano de socio- problema do tribunal. A crítica desta prática encontrou um eco cético em Adolf Arndt: Das Rechtgehtir
logia 23), 1918, pags. 557·602, e com uma valorização diferente, Floyd H. Allport: Institutional (A ,.udi~nda jurldica), Neuc jurisusche Wochcnschrift 12 (Nova publicação jurídica semanal 12), 1959.
Behavior. Essays Toward a Rc iruerpreting ()I COIIII'I1I)ltllU'Y Social Organir ation (Comportamento ins- I"'II~ fi R (' do ,,"'MltO autor: Di,' Ver f •• ssungsbeschwerde wcgen Vcrlctzung des rechtlichen Gehors (Os
titucional. E.\I ••i()s ~()hlf' .\ lI·illl,·'"If·I,'~,'" ,1.••• III,tI '''K,II.i/,.~a •• MKi••I), Ch''1)rlllill 193~, pags, 106 t 1'.IIl~\U' uos (nUSIil IIIIIIII,.i. t1"y.cI ••, " Y ••• l,.~,w cI, r ,Hl(li~n( ia jurtdic.i). N"IH' JuriM iMh(' WO( lH'n~(hr irl 12,
K('MII F.. 'ur IWIUI,"iWUIU I'tU'" II,lI"qUU M' Ih\1 .• 11 IH'Ht .u fln )o(t·I,.1 A IWIHiti('t'\'~H) 11\l1\""IUpC,t fIo direito 1'1'.'1, P.'I4~ I ~'17 I 'lU I 1',11.1 ,I ~I\1111\.10 tllI pII.hl,·III.' • lIul"I\' l.ulIhhll '"!lI II.IUH 1).lh~ Il,." rc·tI"l" lu-
1""\'("" IlIlIt., 'w1'lln.l"ltLI1IIHjWlI,llubll!111 J.1Ut' '11\11'"1 ~'1H'!';''J I~'\ 1\ f·IIIIHI\,'\,'\u tI.à illCt'I'.·,.l t· t\ur (,dHII IUI ~tl .dlHItIf'.' tj\ IUHlu lU I" lu ..! uu l!JtH 1''''\1I1HI ••'111 MUII1YJlf' Ikllltll Ittll.!!•.
98 PROCESSOS JUDICIAIS LIMITES DA CAPACIDADE DE APRENDIZAGEM 99

o fracionarnento e absorção dos protestos (18). A força motriz do procedimento é, sa própria de comportamento (22). Quem tiver de alterar as suas ex-
porém, a incerteza quanto aos resultados. Esta incerteza constitui a força impul- pectativas e as suas formas de comportamento em conseqüência disto, adapta-as a
sionadora do procedimento, o fator efetivo de legitimação (19). Daí que ela tenha uma situação da qual ele próprio se pode distanciar; mas, não só não é preciso,
de ser tratada e mantida no procedimento com todos os cuidados e através dos como também não se espera que ele aceite novas orientações de valores ou que se
meios do protocolo - por exemplo, através da declaração enfática da independên- adapte às circunstâncias de interesses profundos ou formas de tratamento das ex-
ia e imparcialidade do juiz, evitando determinadas promessas de decisão e dis- periências (23). É decisivo que temas de conflito, antes de levarem à utilização da
simulando opções já tomadas; nos procedimentos ingleses é até através da regra de .coação física, mantenham uma forma na qual já não possam ser generalizados e
que o juiz aparece para o debate totalmente não preparado e todos os detalhes têm donde também não possam já ser politizados. A forma de política correspondente a
de lhe ser comunicados verbalmente. A curiosidade tem de ser conservada desperta esta organização da aplicação jurídica deve, como ainda veremos (24), pressupor
até a proclamação da sentença. Um juiz que peque contra este mandamento pode um fracionamento dos conflitos para poder depor a política como sistema au-
ser recusado por "parcialidade". Aplica -se a incerteza para levar os receptores tônomo da preparação da decisão.
das decisões a um trabalho de protocolo não-remunerado. Depois de o ter cum-
prido, ele encontra-se como alguém que confirma as regras na sua validade e os Nesta posição isolada, o _perdedor_pode realmente manter suas expectativas.
decisores nos seus cargos e a si próprio como alguém que aproveitou as possibili- mas por um alto preço. Depois entram em ação os processos sociais que já não as-
dades para generalizar os seus interesses como capazes de aprovação e para cons- piram a fazê-Io aprender ou a modificá-io , mas que o estabilizam no papel de mar-
I it uir grandes alianças sociais ou políticas em relação aos seus objetivos (20). Auto- ginal. As estabilizações de desvios estão quase inevitavelmente ligadas à perda de
isolou se (21). Portanto, agora, quase não tem sentido uma revolta contra a decisão status. O perdedor converte-se no diferente, no litigante, naquele cujo assunto
(' em todo o caso também não tem mais chances. Está mesmo vedada a possibili- preferido é conhecido e evitado sempre que possível. Tem de escolher cuidadosa e
dad(' de sofrer publicamente por efeito duma injustiça moral. A decisão é aceita Iimitadamente o seu público, não pode falar com qualquer um sobre o seu proces-
r omo obrigatória sem que isso dependa duma disposição interior A envergadura so. Ele é caracterizado de tal modo que a sua expectativa já não conte, sobretudo
do reconhecimento institucional da jurisdição pura e simples (e gue sempre acon- que já não conte para a forma como os outros têm de se conceber a si mesmos.
1('( eu e também os resultados alegados no procedimento - criam uma situação Uma tal fixação na divergência mereceu alguma atenção como alternativa para a
meq uivocamente estruturada, que já não deixa ao indivíduo quaisquer chances. E sanção na investigação moderna. Pode ser observada, por exemplo, em prostitutas,
" exatamente esta evidência que facilita a aceitação, determina a debilidade do homossexuais, drogados, doentes mentais, políticos extremistas, gagos, presos (25).
Se houver uma investigação empírica, é de supor que também os perdedores dos
p(',c!edor isolado, possibilita-lhe aceitar com maior rapidez a decisão como premis-
processos, que recusam a aprendizagem oferecida, se comprometam com essa iden-
tidade negativa e se contentem, simbolicamente, com ela.

A legitimação pelo procedimento não leva, pois, necessariamente, ao consenso


IH Em sentido geral, o tema da "absorção de protestos" na organização social encontra hoje um in- efetivo, à harmonia coletiva de opiniões sobre justiça c injustiça, ou ainda àquilo
11'11'".'('crescente. Conferir por exemplo, com Clark Kerr/]ohn T. Dunlop/Frederick K. Harbison/Char- que Parsons enigmaticamente denominou "articulation of power with real commit-
1(," E. Myeis: Industrialisrn and Industrial Man. The Problem of Labor and Management in
~(ul\omir Growth (O industrialismo e o homem industrial. O problema do trabalho e da gestão no cres-
1111\('1110 econômico). Cambridge, Mass. 1960, sobretudo pags. 194 e segs.: Amitai Etzioni: A Cornpa-
1,\tIV(' Analysis of Complex Organizations. On Power, Involvement and Their Correlates (Uma análise 22 Nisso pode dizer-se em sequencia a Leon Festinger: A Theory of Cognitive Dissonance (Uma
lOIl'p.lrada ele organismos complexos. Sobre poder, envolvimento e afins), Nova lorque 1961, págs. 246 teoria de dissonância cognitiva), Evanston, 111. White Plains, Nova lorque 1957, principalmente
" ~('/oIN , Myron Weiner: The Politics of Scarcity. Public Pressure and Political Response in India (A pâgs. 84 e segs., que, em tais situações, resulta uma dissonância cognitiva normalmente diminuta. Eu
POIlII(,' da escassez. Pressão e resposta política na índia), Chicago 1962, pág. 4 e segs.; Neil J. não posso seguir Festinger na hipótese de que por isso mesmo é que as chances de interiorização são
~,"('I~('I '1 hcory of Collccrive Behavior (Teoria de comportamento coletivo), Nova l or que 1963, so- menores do que no caso duma dissonância cognitiva mais elevada, com presões mais fortes de equilíbrio
1"l'llIdo pags. ~31 C segs.: Ruth Leeds: The Absorption of Protest. A Working Paper (A absorção do interno de tensões. Pois uma dissonância altamente cognitiva pode ser normalizada totalmente de forma
!',,'Ir,(o Um trabalho). Editado por William W. Cooper/Harold J. Leavitt/Maynard W. Shelly II em: diferente da interiorização da exigência forçada, por exemplo através da adoção duma visão do mundo
N,'w I'rlsp('<LÍV('S in Organization Research (Novas perspectivas na pesquisa sobre organização), Nova frustrada.
1,",1'''' Londres Sydney 1964, págs. 115·135. 23 Correspondentemente distingue Howard S. Becker: Personal Change in Adult Life (Mudança peso
I II )"""1)(' F••mk: CourtS on Trial. Myrh and Reality in American Justice (Tribunais em julgarnen- soal na vida adulta), Sociometry 27, 1964, págs. 40·53, entre ajuste à situação e compromisso e acentua'
111 Mil •• t' I('alulad(' n,I justiça americana), Princeron , N.j. 1949, deu uma ênfase especial a este mo. que a organização social pode, em geral, atingir uma situação de adaptação, sem reestruturar de forma
11\('1110d,' "Cllan('ÍI\('s~" (, ,,(o) do processo judicial e o caricaturizou como excêntrico, pois a função profunda as personalidades. Analogamente Irving Rosow: Forms and Functions of Adult Socialization
1'".lIlv,1 11.1<1 ,illllll Hitlll ~lIh"('''I/'In('lIl(' tomada em consideração. Esta função positiva da imprevisihi- (Formas e funções da socialização adulta), Social Forces 44, 1965, págs. 35·45.
lid,lIl, tI.I ",,1111,.'"di' (1'1,1111""~ ,li (·ntu.ICI., plII Cahung , op. cit ., pág. 370. Conferir ainda com Vilhelm 24 Conferir com 111 Pane, capítulo 3.
AlIlJfll I li, '1(011111111' 011,·".11 I 110111<",/01 (A vsrrutura do pensamento legal), em: Legal Essays (Ensaios 25 Algumas referências literárias: John I. Kitsue: Socieral Reaction to Deviant Behavior. Problerns of
!t·II.II.), """I.klllt 111"' •.•It C.,,,II'I·IM, (:")1"1111,111'"'1963. pags. 41·63 (43 c segs.). Theory and Method (Reação da sociedade ao comportamento desviado. Problemas de teoria e método),
"O Social Problems 9 (Problemas sociais 9). 1962, pags. 247·256; Thomas j. Scheff: Being Mentally 111. A
Sociological Theory (Sofrer de doença mental. Uma teoria sociológica), Chicago 1966; Erving Goffmarl:
Stigma.i Uber Teschniken der Bewaltigung beschadiger ldentit at (Estigma. Sobre as técnicas de-domínio
da identidade danificada). Frankfurt 1967; Edwin M. Lernert : Human Dcviance, Social Ptoblcms and
1111 Social Control (Desvios humanos, problemas sociais e controle social). Englewood Cliffs, Nova lorque
I !Hi7. suhret udo I"'K' 40,' "'/('
100 PROCESSOS JUDICIAIS
LIMITES DA CAPACIDADE DE APRENDIZAGEM 101

mcrus" (26) (articulação do poder com compromissos efetivos). A legitimidade não


pode ser totalmente concebida como "interiorização" duma instituição, como cons- Todas as características sistemáticas dum procedimento, que anteriormente
l icntização pessoal de convicções socialmente constituídas (27). Trata -se, no fun- apresentamos em teoria, têm de cooperar para atingir este resultado: o procedi-
do, dum processo de reestruturacão das expectativas jurídicas, portanto do estudo, mento tem de ser diferenciado por meio de normas jurídicas específicas da orga-
110 sistema social, que pode tornar-se consideravelmente indiferente quer esteja, ou nização e por meio duma separação de papéis socialmente institucionalizada, como
uao , de acordo, quem tem de modificar as suas expectativas. Parece que assim se um sistema especial de ação; tem de adquirir uma certa autonomia graças à li-
.11)1iu caminho para uma relação de indivíduo e organização social que depende gação com as normas jurídicas para se poder individualizar, por meio durnâ his
duma separação mais rigorosa de sistemas, revelando um potencial mais elevado de tória própria; tem de ser suficientemente complexo para poder submeter ao debate
I Olll plcxidade: desta forma a organização social (28) pode ser apresentada como os seus conflitos e poder deixar na incerteza, durante algum tempo, as soluções des-
r onsidcravelmente independente da originalidade das personalidades individuais e, ses conflitos. Só assim, pode mobilizar motivos junto dos interessados para cola-
cxararnerue por isso, pode permitir uma pronunciada individualização das per- borarem em papéis caracterizados pela tendência para fixação e delimitação. As-
~()naljdades. sim se elva os interessados a abandonarem as alternativas, conscientes ou incons-
(;('1 almente ter-se-à de compreender a função social dum mecanismo de so- cientes, de comportamento, a executar isso que acontece como redução da com-
1tI(,.I() de conflitos não como a provocação de determinados processos psíquicos da plexidade e finalmente a aceitar a decisão, em situações posteriores de vida, sob a
.III'II.I~·'-IO, mas antes como a imunização do sistema social contra estes processos. A ativação de mecanismos psíquicos de adaptação, contra a escolha dos quais a
"ti 1.1 til' clareza do conceito de "aceitação", que a maioria considera realmente sociedade pode permanecer consideravelmente indiferente.
111111() uma satisfação interior de tipo agradável, encobre este problema (29).
N,lllIl.dmente que o interessado "aceita", sempre que lhe é apresentada, uma
tll'l I~,I() que não pode alterar ou ignorar. Para isso não é necessário um processo
I"IIIII('(). O problema não reside em reconhecê-Io, mas sim em proteger o sistema
111l,tI r oru ra as conseqüências da escolha duma solução psíquica para o uso desse
tu\O. K~ta escolha já não deve encontrar nenhuma ressonância social, os ressenti-
11I1·tl10S proclamados não devem, como se disse, converter-se em instituições. E é es-
lI' () 11101ivo pelo qual o indivíduo deve ser levado, através dum processo jurídico, a
nul rvul u a liz.ar e a isolar voluntariamente a sua posição.

'.110 V('I Tal, ~ Parsons: Some Reflections on the Place of Force in Social Processo (Alguma reflexões
.,,111" " luga! d. orça no processo social). Editado por Harry Eckstein em: Internal War. Problems and
AI'I'"MC IH'~ (Glr~ ra interna. Problemas e enfoques), Nova lorque 1964, pags. 33-70 (57). Para uma
1IIIIIIItI.I~.l() mais amiga e em parte ultrapassada do conceito parsoniano de legitimidade ver Talcott
1'.11.11118Aut hor ity, Legitimation and Political Action (Autoridade, legitimação e ação política).
1.111.'.1" por Car l J. Friedrich em Authority (Autoridade), (Nomos I), Cambridge Mass. 1958, pags. 197-
"'/1 r, 1111 •.111\(,111<' do mesmo: The Political Aspects of Social Structure and Process (Os aspectos pohticos
ti., "M IIlIlIl d r 1)1ocesso sociais). Editado por Oavid Easton em: Varieties of Political Theory (Diversi-
.1.1.1, ti., 1"0' i" polttica), Englcwood Cliffs. N.J. 1966, pags. 71-112. sobretudo pago 82 eseg .
•)'/ 1'11I~OIlN. em contrapartida, em seguimento a Durkheirn, atribui aos processos psíquicos deste tipo
11111,1 1111plll Ifi 111i.1 fundamental para a estabilidade das instituições sociais e não pergunta por equivalen-.
11'. !tllll iOIl.tÍs, Conferir aqui com as notas críticas de Einhard Schrader: Handlung und Wertsystem.
1111" 1I,',pill (\!'I IlIstillJ!ion,tli,il'rung in Talcou Parsons' soziologischen System (Atuação de sistema de
V,tI""'H 1',11.1fi 100HI'tlO d,1 ,,"slil\l!ic)II.lltnl~.l() no sistema sociológico de Talcott Parsons), Soziale Welt
17 (MlllltI" HllII,Ii 17), 1%10, P,IMH. 111 1% (122 t' scgs.)
:.!14 1)111111.11111111.11'<1111'111 ••I. ",,~ ••, ·M· IIldd"If'II~~~ semelhantes por meio da filiação em organizações .
.""1,, I' ,"•••, ""1 1'''11111'11''1,N,kl.l. 1,,11111111111 I-tlllktiOllcn und Folgen formaler Organisation (Funções e
111'.IIII••tlII. ,LI •••" ••"i/"\.,,, 1,,,,,,,(1) 1\•.•111111'11•.•.• ,,!tll,tud() pags. 89 c scgs,
;"1 •.••1111111011,1.1111IIII.II,.to 111'''' .1' I' I'""~I"" tlr 1011.••\ (;,lItung: Institutionalized Conflict Reso-
htli,," (1~,·~.,III,.rI" IlIO,illlci"""li,ulhl 01" ,,,,,1111"'). )11111,,,"11111'"',1«'\{(·b(·.lnh (Periódico da Pesquisa da
".1' I, 1'11'-', 1'"11', ri 1M11'1",1"111''1',,1,," 111. l'ifM· ~',I, '1111.111'11111.1 1\111'11,111 M' t\(ove esperar uma aceitação
'
\111.tl tlllWI rlllllf '''1111 lil(;'~lIltltll-ll!hl "t"lilt~(' ,J11 11111111141" IIUt' II plUUlicLIt' ('t1\.U (·ilUI podia ser a urrte n-
1111_'" 1,,1&. ill~IIIUIilllll.IIlIt~~h·1 dll liii't MII"liil! '_1.11'1.' I'HI ! ,I IIU.',.'I ti t 011( ,'!lU dto IH l'II~,,,,jlu
CAPÍTULO VIII
Representação
para os que não participam

Certas hipóteses psicológicas fundamentais fazem parte das premissas da


teoria dos símbolos promovida por Durkheim e Mead e, num sentido equivalente,
também por Freud; entre elas destacam-se aquelas em que os símbolos unem sen-
timentos e, com a sua. ajuda, conscientizam normas sociais e as convertem em lei
pessoal - substituindo a coação social externa pela coação interior. Não há que
duvidar que se descobriu assim uma importante possibilidade de integração soci-
al (1). Por outro lado, há ainda dúvidas quanto à extensão em que as sociedades or-
ganizadas de forma muito diferenciada se podem servir de tais mecanismos através
de papéis especificados e variáveis, que comprometem personalidades concretas de
acordo com o sentimento. A nossa análise levantou pelo menos a suspeita de que,
nos limites entre burocracia de decisão e público, não podem agir com êxito
mecanismos conscientizados como esses; a burocracia e o público estão, para is-
so, muito afastados uma do outro. O que não quer dizer que os procedimentos que
criam símbolos e os declaram se encontrem aqui no lugar errado e possam ser
abandonados; mas eles desempenham uma outra função que é a de isolar temática
e socialmente o indivíduo quando ele não está de acordo, de tal forma que os
seus protestos não tenham conseqüências. Parece, pois, que uma legitimação pelo
~ procedimento não consiste em comprometer internamente o interessado, mas sim
em isolâ-lo como fonte de problemas e em apresentar a organização social como in-
dependente do seu acordo ou da sua rejeição. Esta indiferença perante as estruturas
individuais de motivação e acordo ou rejeição através do indivíduo está expressa no
conceito de "validade" de valores e normas. Os procedimentos servem para realizar
este requisito de validade, sem perigos para a vida social. Entretanto, isso não
pode ser atingido apenas através dum tratamento separado do participante isolado
no procedimento. A sua escolha, através da limitação da filiação 'partidária, é
baseada nas restrições dos interesses legítimos no procedimento. É, de mais a mais,
uma exigência mais eficaz através dos papéis de interação regulamentada: não é
qualquer um que se pode apresentar e tomar parte no debate. Além disso, o prin-
cípio da admissão limitada tem a função latente dum mecanismo para isolamento
dos únicos interessados. Nem todo aquele que se interessa pelos problemas tratados,
ou que se pode sentir afetado pelas decisões possíveis, tem acesso ao processo ju-
rídico; uma pessoa tem antes de poder demonstrar interesses muito especiais e de
orientação jurídica, a fim de poder desempenhar no procedimento o respectivo

Em seqüência a Durkheirn e Freud , Parsons recorre sobretudo a estes pensamentos de interiori-


açlo paico161fit-u na 8111\ Ic"mi.\ (I;, intl",ioril"\;aO dos valores sociais (' normas. lIá uma boa inlroc1uçlo
'.I,t.•.
tr__•.•.••.••. "'....t.;....h_...J __
104 PROCESSOS JUDICIAIS REPRESENTAÇÃO PARA OS QUE NÃO PARTICIPAM 105

papel ativo. Assim se neutraliza politicamente o conflito (2) e se impede que A publicidade disto é essencial para permitir uma participação desinteressada
problemas especiais se convertam, por ação de mecanismos de generalização como do público no procedimento. O decurso do processo tem de poder ser presenciado
filiação partidária, identificação, permuta de apoios recíprocos, sentimentos de pelos não-participantes. Trata-se de facilitar aí o acesso, não tanto quanto à
vingança e outros semelhantes, em ponto de cristalização de frentes gerais de con- presença atual, mas sim quanto à ida efetiva, quanto à assistência. É decisivo que
Iliro que separam os grupos da população ('I). exista essa possibilidade. Ela fortalece a confiança, ou pelo menos impede a criação
daquela desconfiança que se liga a todas as tentativas de guardar segredo. A fun-
Isso não quer contudo dizer q~e a atitude dos não-participantes seja pura e ção do princípio de publicidade do processo jurídico consiste na criação de sím-
simplesmente irrelevante para a legitimação pelo procedimento. Verifica-se exa- bolos, na ampliação do procedimento a um drama que simboliza a decisão correta
i.uncruc o contrário. A legitimação é a' institucionalização do reconhecimento de e justa e para tal não é necessária a presença contínua duma parte maior ou menor
dl'("isõcs como obrigatórias. Institucionalização quer, porém, dizer que o consenso da população. Basta um conhecimento geral e indefinido de que tais procedimen-
soln e determinadas expectativas de comportamento sugere e pode ser utilizado tos se realizam continuamente e de que qualquer pessoa pode, se necessitar, infor
(OIllO fundamento da ação. Isso só é possível quando o consenso realmente persiste mar-se com maior exatidão sobre eles.
,'111 grande dimensão, ou quando é simulado através da não-declaração de falta de
'OIIM'nso.( 4). Para poder estabilizar essas conjeturas de consenso relativas ao caráter Mesmo assim não se pode esperar dum público presente um controle. efetivo e
0111 iHHlúrio da decisão oficial, tem também de se fazer participar no procedimento um acréscimo de racionalidade do processo de decisão. A publicidade do processo
0' ".to participantes. Claro que eles não terão acesso ao papel de oradores, mas o leva' antes a que os componentes não-declaráveis do procedimento de decisão sejam
I:I(H r-dimcruo , como drama, também a eles se destina. Têm de chegar à convicção arrancados ao campo compreensível de ação e sejam anteriormente ou entretanto
,li- qll(' tudo se passa naturalmente, de que pelo esforço sério, justo e intenso se in- resolvidos. Pertencem também a esta parte invisível do procedimento público prin-
v",lÍ/oIará a verdade e a justiça e que, eventualmente, com a ajuda destas insti- cipalmente as decisões sobre a representação da decisão. O procedimento público
t III(,()('~, também eles recuperarão os seus direitos. Se esta atitude está efetivamente contêm, quando muito, fragmentos do processo de elaboração de decisões: aliás
dlv\lIHada, ou se ela for supostamente divulgada com base na situação de cornu- serve para uma representação escolhida e preparada da elaboração da decisão. Mas
lIil ,I"ao, aquele que se quer revoltar contra uma decisão obrigatória não pode con- isso é suficiente para uma função simbólico-expressiva e é desta função que se
t,11 ('011) o apoio dos outros. O seu protesto ser-lhe-à imputado e não atribuído a trata na legitimação da decisão. De acordo com isto as salas de audiência vazias ou
unia falha da instituição. Aparece como teimosia, critiquice, estupidez ou, pelo cheias por sensacionalismo não constituem argumento contra o princípio da pu-
1\\1'1105, como uma atitude de vida extravagante e praticamente irracional. Com esta blicidade.
iUI(" prctação ;o CI \dição do problema não se pode divulgar, fica apenas circuns-
(I it a ao único inte \ssado (5). Com isso se está perante a pergunta de se a idéia do procedimento é suficien-
te como um sistema primário de interação , integrado num plano de papéis, para
abranger esta função simbólico-expressiva. A ausência também constitui uma
relação inteligente para, a notoriedade do procedimento no caso de persistir a pos-
'I. I)dvid Easion também aceita esta função da capacidade partidária restrita no processo judicial
sibilidade da presença. Também as reportagens da imprensa, rádio, cinema e
,0,,1,'1 i, ((001: A Systems Analysis of Political Life (Uma análise de sistemas da vida política). Nova 10r·
televisão podem transmitir a impressão de que se aplica a justiça sob determinadas
11"" I.III\(ln', Sydney 196:'. pags. 264 e segs.
~ Qu,' islO nem sempre é bem sucedido. tem de se confessar. como é o caso. por exemplo. de grandes formas e independentemente dos interesses pessoais e disposição de espírito dos par-
11''''1 I,I~'WS qUI' pleiteiam processos- padrões com Importância política. tornando-se-lhes então difícil ticipantes. Através do trabalho de transmissão dos meios de comunicação a função
.1"'1l1l1 .1 dl'( isão do rribunal e renunciar à ação política. Significativamente. são estes casos. em que a de assistência vê-se livre da necessidade da presença física e por esse meio também
111~d~,1I1JO podr desempenhar a sua função latente de neutralização política. que são simultaneamente se estabiliza e se torna independente dos condicionamentos de motivação individual
.IItlll'It-S ,'111qur se torna problemática a legitimidade da justiça. Ver como exemplo a sentença do tri- dos deveres posteriores do papel. Torna-se indiferente, em comparação, se al-
hllll,tI f,·tlnal ,te- trabalho. datada de 31 de outubro de 1958 (SAE 1959. pags. 41 e segs.) na greve dos
guém, quando alguém tem tempo e vontade de registrar as informações e as
1111'1,,11·Hl\i.os dt· Schleswig Holstein e o debate continuo, porventura a crítica como "opção política". de
WIIIIII,II18 Abcndroth: Innergewerkschaftliche Willensbildung. Urabstimmung und "Kampfmass- aproveitar - no trem para os subúrbios ou durante o café da manhã, no intervalo
11.011111( •... (lks('I1VolvimenlO da vontade no interior dos sindicatos. primeira votação e "medidas de com- do almoço, na televisão antes do programa realmente interessante, ou durante
h.IlI'''\. 1\01,,'" und Rccht 7 (Trabalho e direito 7). 1959. pags. 261·268 (263). a comunicação murmurante da esposa que está lendo o jornal. Os meios de co-
I \'('1. r orno uma investigação que descobre uma elevada dose de consenso fictício nas expectativas municação poupam uma sincronização concreta dos papéis do processo jurídico
,I, 1l11l11)(1I1.lIncntOmoralmente institucionalizadas. Richard L. Schanck: A Study of a Community and com a assistência - é exemplo disso que em organizações sociais diferenciadas se
li. (;'UlIllft ,,"e1 In~titulion8 Conceivcd or as Ikhüvior of Individuais (Um estudo duma comunidade e l{lrn de encontrar formas mais fortemente generalizadas da sintonização de si-
."11. 1I'1II1")ftt' illstil\li~O"1 c 01\{rbit!os corno rompon ameruo de indivíduos), Psychological Monographs
tuações, empregos de tempo, obrigações dos papéis e interesses. De mais a mais es-
(MIIIIUllt.fi.tft 1l~1«(l11l,,1".~),vol 4~. 11" 2 I'IÍIIU·UlIl. NJ. Albany. N.I 1932. Esta problemática é re-
1111111111" 1'111 11('11\111SI IotlNky ~lI/l1lll1l<lr ti", Srxll.lill nt , Uber die Bcziehungcnzwischcn Geschlecht , iabelcccm a passividade necessária da assistência tecnicamente e, por esse meio,
Mo,," 111111 (:r."II,d,,1I1 (~"ti ••I,,"II' ti ••• '·KIIIIIIIIIIII,· SlIh,,' as 1t'i,'Çc}C8CIIIIC sexos. moral c sociedade). S('~lIramcnle convincente. Só através da imprensa se torna "Ia publicité facile sans
1111111111111111 111 ,'1.1',1,,0 '111.'11".1111."" Illlilli.,· ,li, i!1I111111,",;..ft'Hi.•1 do 1('lat6rio Kins('y,
'

IIIWllid ,I I{,. iI\U'IIH,'IU!iIl\l ()C COl1l/'lllpur li I y SO<Íitl Org,lI1i,.1I ion (Componarneruo inst it uriunu l En
•• 1,,0 rlll "III'~'lU ,I 11m•• Irlt1lf'l)lrl~\~II.I~ 11I1I.UlIt.I~.(t)/lCldlll 'ClIII'·ll1p",~"ru). Chllpt·1 11;111'1'1'1.P.'II~
.,""'- IIU-u\ -
106 PROCESSOSJUDICIAIS
REPRESENTAÇÃO PARA OS QUE NÃO PARTICIPAM 107

réunions tumultueuses" (a publicidade fácil sem reuniões tumultuosas), e com ISSO


unta instituição política permanente, já dizia Guizot (6). cidade" sistemático (11). Até mesmo um hábil diretor de imprensa do tribunal
dificilmente poderá excluir que esta transmissão de atuação acaba em determi-
Vantagens deste gênero têm naturalmente de ser resgatadas por demissões. A nadas exigências institucionais do procedimento - um conflito que denuncia si-
IIlIt'gração dum sistema que inclui na sua periferia espectadores anônimos ausentes multaneamente uma contradição imanente do procedimento e que tem de ser
já não pode realizar-se pelo jogo de combinação dos papéis mas só pela identifi- decidido ou a favor dos tribunais ou a favos dos meios de comunicação. Trata-se
c acao coletiva com alguns símbolos abstratos que proporcionam pouca segurança aqui de não estender o conflito à ideologia, mas sim de destacar com precisão as
quanto às posições concretas e as qualidades de ação das outras pessoas. Portanto funções parciais em que se espera umu interferência recíproca. Há sobretudo três
não (: de estranhar que a esta "üblen Trend zur Publicity" (Delicada via para a interferências de funções que levaram a dificuldades e que têm de se manter afas-
publicidade) (7) se oponha resistência - não apenas da parte dos juristas mas tarn- tadas:
h(ol1l dos sociólogos (8). Geralmente após recentes revoluções empíricas (9), a dis- Os meios de comunicação podem prejudicar as cenas no tribunal até mesmo
c lI'S<lO literária parece, contudo, proporcionar um quadro exagerado das divergên- pela sua presença física (12). É esse o caso quando a montagem e manejo dos seus
('i.ts n-ais. A aversão devia dirigir-se sobretudo contra a presença invisível duma aparelhos técnicos se tornam tão extensos que começam a causar uma perturbação
1II,\SSa que não pode ser levada ao desempenho de papéis, donde não pode ser ob- física ou simbólica através de momentos estilizados discrepantes, como uma re-
M'I vada , controlada e mantida em paz no seu lugar. Há indignação quanto presentação especial do procedimento. Quando os fotógrafos correm em volta, ou

l
11O~motivos baratos da curiosidade e da conversação e ao fazer-se do destino alheio se ajoelham para bater uma foto sob o ângulo certo, quando começam a fazer
"bjc'to de divertimento próprio, sem negar que estes motivos servem os próprios ob- vibrar ou disparam as máquinas, iluminam as pessoas que estão atuando com lâm-
II'IIVI/S, comportando simultaneamente uma participação identificada simboli- padas de magnésio ou projetores, sussurram instruções quanto a bater chapas,
cometem ou corrigem erros, tudo isso pode desviar a atenção do acontecimento
1.11111'111('no procedimento jurisdicional e ajustam-se assim ao processo de legiti-
principal, ou até pôr em dúvida o primado do acontecimento principal. A dose de
111;1\,10 da decisão política. Certamente que os meios de comunicação apresentam
confusão depende naturalmente das expectativas cênicas. Se a cena do tribunal for
PII.IIII(' o u ibunal , como muitas vezes é costume, um quadro seletivo e parcial dos
,111111(('(imcruos, não permitindo ao que assiste por seu intermédio um juízo objetivo desempenhada tão tradicionalmente quanto na Inglaterra, então esse fotografar
\0111(' o c <ISOparticular. Mas isso é um destino contínuo e inevitável de presença em converte-se em sacrilégio e é por isso proibido.
'Ivtlll,I~'Ô(,S altamente 'ferenciadas. Em nenhum dos seus papéis ou funções se
pilei c' MlJ)()J que o cidad dê pareceres racionais e justos. Não é disso que se trata, Um outro problema é a reportagem atual, antecipada ao resultado, durante
111," sim da convicção, oporcionada simbolicamente, de que a justiça se reali- procedimentos em curso. Podem surgir aqui perigos para a imparcialidade do juiz,
1.1 (l()). A atuação dos eios de comunicação pode, pois, servir geralmente para sobretudo na Inglaterra, onde têm grande importância os tribunais de júri e onde
tI,ll Il'sMHláncia pública aos procedimentos. Os tribunais são avisados de encarar o juiz também deve chegar ao debate sem estar preparado, sendo qualquer prepa-
111111M'I icdadc estas possibilidades de atuação e dar início ao "trabalho de publi- ração suspeita de parcialidade (13). Perante a garantia institucional desta impar-
cialidade tem, contudo, de se duvidar se será este o único problema (ou talvez
11 11"1011 i,· d•.~ origmes du gouvernement représentatif en Europe (História das origens do governo apenas o ponto de arranque para a construção jurídica da sua solução). O sentido e
II'I'"''''III,IIIVUIIJ Europa), vol. I, Bruxelas 1851, pago 80. função do procedimento dependem não só duma diferenciação do papel dos juízes,

7 1,,",dlll"I1I1'l-.bclhard Schmidt: l:)ffentlichkeit oder Publicity (Publicidade ou publicity). Em: Fests-


,IIIlft lill W,lh"1 Schmidt (Homenagem a Walter Schmidt), Berlim 1959, pãgs. 338-353 (338). Em por-
""'''"1. do 1""SIlH)autor: j ustiz and Publizistik (justiça e publicismo), Tübingen 1968. Comparar tarn-
1o~1I1 'ilJlI 1',lul Bockelmann: Offemlichken und Straafrechtspflege (Publicidade e jurisprudéncia cri- II Assim, de Horst Bührke: Pladoyer für die Offentlichkeit der ]ustiz (Discurso em defesa da pu-
uun.rl). N"II" jur ivnsche Wochenschrift 13 (Nova revista jurídica semanal 13),1960, págs. 217-221 com blicidade da justiça), Deutsche Richterzeitung 44 (Revista jurídica alemã 44), 1966, pago 579, Com-
'I 1""lltd,IIII' d,' dist.uuiar a publicidade dos tribunais da publicidade política; Dieter Brüggemann: Die parar também com Rudolf Wassermann: justiz und Public Relations (justiça e relações públicas), Deut-
1"1111'1'''''III'IHI<-(,(·walt. Wegmarken des Rechtsstaates in Deutschland. Eine Einführung (A força juris- sche Richterzeitung 41. 1963, pags. 294-298_
dI! 11111,11,QII.ditl,,<!.,sdo caminho do estado constitucional na Alemanha. Uma introdução), Berlim 12 Comparar aqui. do ponto de vista jurídico, com Heinrich jagusch: Rundfunk-und Fernsehüber-
1%" p.íl(" I /ir. I' M'gs.
tragungen von Gerichtsverhandlungen (Emissões radiofônicas e televisionadas de sessões de tribunal).
( ,111",,11
,1/ )(\18"11I labcrmas: Su ukturwandel der Õffentlichkeir. Untersuchungen zu einer Kate- Deutsche Richierzeuung 38. 1960, pag. 85. É sobretudo contra este perigo que se dirige o §169, pago 2
1(111"11.-11r(11('"li,111'11(;(·,,·Ibrhaft (Mudança de estruturas da publicidade. Investigações sobre uma GVG. que exclui durante as sessões as captações sonoras, radiofônicas e televisivas, assim como gra-
,.'1'11"11,'d., "" 11'11,111,·
10\111(1
••..101).Neuwied 1962, pags. 227 segs. vações de som e filmagens para fins de publicidade.

13 Comparar aqui com Harold P. Romberg: Die Richter Ihrer Majestat. Portrait der englischen
~I \'", W••II,,1111 /"" 111" 11,,' 1\('/11'11\(111(1'11 zwischen der Presse und dem deurschen Strafrichter (As ]ustiz (Os juízes de Sua Majestade. Retrato da justiça inglesa), Stuttgart-Berlim-Colônia-Mogúncia 1965,
"I.",i,,'~ '"Ire' •• illll'lI''''''' " 1"111• 1I1I11I1.d
.lIrlll,lo), Kid 1968; Manfred Rühl: Die Zeitungsredaktion ais
pags. 226 e segs., com a anotação inteligente de que nestes casos, embora se fale de desprezo do tribunal.
"11I1U11~lflll'. ~",i'''';8 ~~,ltlll 1,\ lI·d"~,11I.I••• 1'"I1"i. '''"to um sistema social organizado), Gütersloh 1969, não se queira proteger o tribunal, mas sim os réus e os partidos. Comparar, além disso, com Et. Du-
pfí!•. 1<1 H~
monr: De l'orga nisation judiciaire et de Ia codification. Extraits de divers ouvrages de]érémie Bentham
I"'; 1'!('plllI, IMllidlhUH("!) diretos no processo se sentirem ir- . (Sobre a organização judicial e a codificação. Extratos de várias obras de]érémie Bentham), Paris 1828,
P'_"I!Aí.11'"' ""11'1 I', pm i",(), deturpado da sua exposição pago 194. Sobre atitudes mais recentes consultar, por exemplo, Wolf Middendorf: Der Strafrichter.
Auch ein Beirrag zur Srrafrcrhtsrcform (O juiz criminal. Uma contribuição para a reforma do direito
f: di•••• 'I"" 1'."" W"111t'1Slll''''d: Rundfunkaufnaht:nen
,,,Ii~,,,-i·"l. '"11'1,,, 111'HIII"I'llInu (Rl'vi"tn jurídica), pl'llal), '·I.'il1\1I1II')h~, p.II(K,~,1,. M'I(". \11mli l'illnl'l' Unwl,l"ill" I'n's,dwl ithlt' vou 110-1 11,IUPIVl'
•.•••.' IlIõlllllll"'v.·•• ~Ollll'., ''''''''\01"'''' m.d), 1\•.•,,'1 I,,~1(" 1""1/1'11111111
,h,,,"IIIIIIII (1{d.II(""" alI' 1111[" I1
108 PROCESSOS JUDICIAIS

mas também duma diferenciação de todos os papéis do procedimento, como ja se


discutiu em detalhe. (14). Durante o procedimento não se deve organizar um
parecer social prévio contra os intervenientes no processo, parecer que os desa-
(H'dite nos seus papéis ou possa deixar a impressão de que a sua aparição no
t ribunal não é livre e sem compromisso. A incerteza da conclusão do processo tem
dt' ser mantida e tem de motivar visivelmente no procedimento o desempenho dos CAPÍTULO IX
p,lpfis. Só assim se realiza o efeito duma auto-represent açãn, uma adoção dos
p,lpfis implícitos, uma especificação voluntária dos assuntos em que se baseia a Estrutura do programa
função legitimadora do processo. Se a conclusão fosse conhecida com antecedência
() pi occdirnento congelar-se-ia num protocolo organizado à volta da forma. e responsabilidade
Em terceiro lugar distingue-se ainda o problema da crítica dos procedimentos
t' cl.rs sentenças através da imprensa. Uma intensificação da representação faz parte Através da participação no cerimonial do procedimento e na ratificação das
premissas e competências de decisão, são retiradas aos interessados, como vimos,
cI.I.~ necessidades duma imprensa que, concorrendo com outras fontes de infor-
cada vez mais possibilidades de crítica e outras possibilidades são orientadas para
t\l.,~·Ú(), tem que lutar para obter a atenção. Uma repressão da crítica faz parte das
determinadas vias. Uma tal repressão da crítica através dos interessados só pode, no
'\('( vssldades dum procedimento judicial que deve decompor os problemas, tra-
entanto, ser alcançada se eles forem conciliados com as formas em que, aliás, a
h.dh(. los em detalhe e isolá-los. É de supor que a conclusão seja a permissão da
decisão pode ser criticada, portanto sobretudo com as formas de responsabilidade
(thka objetiva e a proibição, em contrapartida, da crítica sem objetividade. Só
na escala hierárquica da organização da decisão e na publicidade. É que se a
'1\1(', com este compromisso, não estão ainda fixas as limitações. Dificilmente seria
crítica hierárquica ou pública fosse dada livremente sem barreiras, os interessados
uliricutc a exclusão da crítica dirigida a pessoas (15), pois se trata exatamente da
encontrariam sempre novos motivos para manter desperto o seu descontentamento
q\l('slào de qual o tipo d. ~ítica que atinge pessoalmente. Para podermos aqui ver
em todos os aspectos, para o atiçar e o instilar no decurso posterior da decisão. A
III,ds claro temos de deb. er num capítulo próximo o sentido e os limites duma
íll1urtil.ução do juiz perant, crítica. instituição da validade exclui, definitivamente, esta possibilidade.

Os sociólogos não se podem contentar com esta informação. Artifícios deste


gênero têm os seus limites sociais de agravamento. Não funcionariam se, por trás
deles, se juntasse um excesso de pressão social. A validade das decisões obrigatórias
não pode, só por si, absorver todo o descontentamento; tem de ser preparada
através de processos de antecipação, especificação e eliminação da crítica - pela
crítica privada, hierárquica e simultaneamente pública.

A intensificação e coordenação das diversas responsabilidades não pode


realizar-se isoladamente e sem atender ao contexto estrutural e programático da
decisão (1). Antes de mais nada, os limites da capacidade de crítica e estrutura do
programa, portanto as condições de controle e as condições de decisão, têm de ser
harmonizadas. As decisões que têm de ser aprofundadas no procedimento, devem
ser programadas de tal forma que se possa especificar a crítica e a responsabili-
dade; doutra' maneira não é possível alcançar um isolamento objetivo, temporal e
social dos problemas através do procedimento.

I Geralmente o exame da interdependéncia da estrutura organizatória e programâtica , por um lado,


e por outro a racionalidade da decisão, contam-se entre as aquisições fundamentais da mais recente
teoria de organização e decisão. Ver, por exemplo James G. March/Herbert A. Simon: Organizations
(Organizações), Nova Iorque-Londres 1958: Horst Albach: Zur Theorie der Unternehmens organisation
(Para a teoria da organização de empresas), Zeitschrift für handelswissenscha!1tiche Forschung II
(Revista para investigação da ciência comercial l l ) 1959, págs. 238·259: Rolf Kramer: Information
und Kommunication. Bctricbswinschaftliche Bedcutung und Einordnung in dic Organisation der Uno
rernehrnung' (Informação e comunicação. Significado da economia das empresas C classificaçãona or-
H ( ""'1'"'"' 111111 ~ 11".1111• ""'1,illlluI g"ni/aÇnU ela ('nll)ll'~a), Ikoli'll 19hf),
I A, •••• 11'.' tu rtiiUBlhnn. fln I\.ihti.ililllll'il .u •. ".•
1
110 ESTRUTURA DO PROGRAMA E RESPONSABILIDADE 111
PROCESSOS JUDICIAIS

(;nalmente há à disposição, para a programação de decisões, dois gêneros que têm de ser controlados politicamente e em detalhe desde cima até abaixo. O
l und.uucnt ais: programação finalística e programação condicional (2). Os pro- que seria válido doutra forma, se houvesse possibilidades de calcular pura e sim-
i 1.1111.1\finalísticos partem dos resultados desejados e daí procuram, considerando plesmente as decisões ótimas. Contudo isso está praticamente fora de questão, .pelo
•1\ r oud ições secundárias, encontrar os meios propícios; são racionalizados através menos na administração pública de valores complexos .
ti" I .d( ulo da rentabilidade (5). Nos programas condicionais as premissas de de-
'I\.tO I(~m, em contrapartida, a forma de causas, de informações, que estão em Nos programas condicionais, porém, tudo isto é diferente em princípio e, sen-
'"l1dl~ci('s de resolver determinadas decisões, sempre que estejam presentes. sivelmente, na prática. Aqui é escolhido um "se" de acordo com o "então" pro-
I, .u.uuse, portanto, de programas de "se/então" e esses programas são racio- gramado. Para o decisor, os resultados são aceitos não como justificadus, mas como
o agravamento que o programa permite (querendo com isso atingir talvez por sua
lI.dll.ldos sobretudo através do trabalho de elaboração de conceitos jurídicos. En-
parte objetivos determinados). A responsabilidade pode ser aqui superiormente
'11101I1LO que os programas finalísticos estão orientados para o futuro, os programas
atribuída, pelo menos em grande parte. Numa decisão de programação condi-
, uudicionais têm que ver com fatos passados. A vinculação e concatenação, ou ain-
cional trata-se apenas da verificação da existência efetiva de determinados fatos e
cI.1 ,I necessidade de união de ambos os tipos de programa permite, daí, uma coor-
cll'l\ação de futuro e passado. de que se trata aí daquele 'sinal que, de acordo com o programa, deve ocasionar a
decisão. Para decidir basta competência jurídica, que se pode informar, caso o
necessite, através de declarações e .eeritos competentes, mas só a decisão justifi-
A diferença entre estes dois tipos de programa é de importância fundamental
ca (6). Desta forma se pode imunizar, na prática, a decisão contra as inúmeras
(lara a moderna organização política, altamente burocratizada (4). Dela depen-
possibilidades de crítica (7), sobretudo 1) contra uma crítica à pessoa; 2) contra
dr-m , entre outros, os pc ~os de interação e o alcance dos critérios possíveis de
uma crítica ao procedimento (B); 3) contra uma crítica da competência (não-
(lt-çisão (5). Ambos os tipo de programa abrem, naturalmente, possibilidades de
( I ít ira e de controle lógic e empírico à medida que vão sendo aperfeiçoados jurídica) especializada e principalmente 4) contra uma crítica das repercussões
cll'l alhada (" opcracionalmei . Em ambos os casos, é válido que a indefinição das (contrariamente às conseqüências puramente jurídicas). Esta limitação da crítica é
pr cmissas dificulta a crítica gue a sua definição a facilita. Excetuando isto, a paga com uma intensificação da conscientizacão do erro e da sensibilização ao erro
plol-pamação condicional orienta a crítica da decisão para vias muito mais es- dentro do âmbito ainda criticável: cada desvio daquilo. que foi considerado certo
II('il.IS. constitui um erro e os erros são graves (9). O estilo de exposição dicotomicamente
detalhada das' argumentações jurídicas, o estabelecimento de conceitos e fatos
Os programas finalísticos podem sempre ser atacados quando não se verificam como sendo assim e não doutra forma, corresponde precisamente a esta função de
c1C'(lOisos I csultados propostos (portanto foram escolhidos meios inadequados), ou reduzir a capacidade de crítica duma decisão e de a limitar a fontes de erro menos
MI' dl'S('obl iram outras vias com uma distribuição diferente do peso das conseqüên- controláveis - contrariamente a pensar em probabilidades e chances, escalas
l'las c', sobretudo, outros meios econômicos. Os resultados constituem aqui o pólo móveis, prêmios de aproveitamento, proporções de valores e oportunidades con-
cI., I I Íl ica , Sobretudo na nossa cultura científica diferenciada e especializada, a dicionadas pelo tempo, o que é sugerido por este programa finalístico (10).
,tllI,IIIIl,'~·Ü() de resultados, eventualmente escolhida, expõe-se à censura reiterada
!lI! os mais variados e especializados pontos de vista, que nenhum indivíduo pode
IllollS (ooldt'nar. O decisor não pode ser indicado aqui, como praticamente liberto 6 A posição, tradicionalmente central, dos juristas na administração pública européia continental
do M'U pi op: io juízo de valor. Donde permanecerem suspeitos ele próprio e o seu constitui, assim, um sintoma do que se esperava destas administrações de programação condicional e, ao
1'101 t'1>~(), que o leva a uma determinada decisão. A administração, que atua em invés, as exigências políticas pessoais dum alistamento duma inrelectualidade especializada constituem
1\l1I~.i()dum objetivo programado, por exemplo, estilos de planejamento econômico um sintoma para avançar o programa de objetivos.
7 Ver também algumas observações sobre a estandardização como defesa contra erros em Ri-
chard M. Cyert/James G. Mareh: A Behavioral Theory of the Firm (Uma teoria de conduta da. em-
:' 1'111,1,'\1,1 distinção e sua relação com o problema da responsabilidade encontram-se exposições ex- presa). Englewood Cliffs N. J. 1963, pago 105. Muito interessante para este problema é ainda: Isabel M .
,drllln ,'11' 'Lorstcin EckhofflKnutt Dahl Jacobsen: Rationality and Responsability in Administrative P. Menzies: A Case-Study in the Functioning of Social Systems as a Defense against Anxiety. A Report
•\1111'1IIIi, I," D," ision making (Racional idade e responsabilidade na tomada de decisões administrativas on a Study of the Nursing Service of a General Hospital (Estudo do funcionamento de sistemas sociais
, Illdlll"i~), Copenhague 1960. Como tentativa de fundamentação de teoria dos sistemas destes dois tipos com uma defesa contra a ansiedade. Relatório sobre um estudo do serviço de enfermagem dum hospital
.I. 1" "11,.1111,1 f()I)SUh ar também Niklas Luhmann: Lob der Routine (Elogio da rotina), Verw'altungsar- civil), Human Relations 13 (Relações humanas 13), 1960, pags. 95·121.
11", ',', (Ar quivo .rd minist rat ivo 55),1964, pags. 1·33. 8 Torna-se aqui necessário um esclarecimento. Também aqui existe, naturalmente, uma crítica ao
.~ .,,,1,, ,. 'NSO, pormenor izud aruenre. Niklas Luhmann: Zweckbegriff und Systemrationalital. Uber die processo dum tipo especial, como crítica da falta de normas processuais especiais. Mas esta crítica
1'lIlIklllll' VlIII í'.W(·' kl'lI iu \o/i,d"n Sysicrnen (Conceito de objetivo e racionalidade do sistema sobre a não tem qualquer relevância como tal para a decisão. Com ela se pode forçar, sob certas circunstâncias,
""I~.I\' dll~ IIhl"IIV'" II,,~ ~""'Ill.I" >(1( iais), Tübingen 196B. uma repetição do processo e não uma outra decisão no caso. Uma dessas separações entre questões de
I Nu ,\111111111 d,·,11 ",'1111" 1'''' ",'0 1'0(\(' ser convenientemente debatido. Para outros usos desta dis- fato e questões de direito reside, caracteristicamente, no âmbito da programação de objetivos, só onde se
líll,.nll di' 111'11'I ,,,,,,,It11 NI'I,I' 1\111111,,"11.()If(·ntlich rechtliche Entschadigung rechtpolitisch berra- possam aplicar cálculos de otimização e se possa comprovar a legalidade absoluta da decisão, indepen-
1111'" (f "'"1''''',11 ..,,, d, dlll"" 1',,1<111
li "" ,".1(1.1 dum ponto de vista polírico-jurídico). Berlim 1965, dentemente do processo jurídico em que foi conseguida.
1';,,,., ~'I .' .' li' i d" III"MII" 11111'" lI. I li, ,,"d Aurom.u iun in der offentliche Verwaltung. Eine Verwal- 9 Para aqui e para os mesmos mecanismos de garantia possíveis, consultar Niklas Luhmann: Funk-
III"M~wi'I" ••• lh"lllrl,,' 1'111111111'11111111 (1111\1'" ,. """'IIl,It;Ü() na administração pública. Uma pesquisa tionen und Folgcn formaler Organisation (Funções e conseqüências da organização formal), Berlim
,i,'lIlíl"" .ldlllj,lIilfl!II\,11 lIi'IIIIII 1\11111I'.\~. 'I',.· "'11' , .Iinda do mesmo autor: Positives Recht und 1964, pags. 256 e segs .. e do mesmo autor: Recht und Automation in der tlffentlichen Verwaltung
Id,nk'MiI' Illillllfl 1"l\lIi\" I' ,oI""\"l\ia; .,,, li" 11111(,.. li" IIlItI SO/i.dphilosophie 53 (Arquivo d e filosofia (Direito e automação na administração pública), op, cir., pags. 75 e segs .
.t" di •• íll1 r 1'\.11;011"~lIIlId ti'li I !Iill, Ililj(" '1'11 r.71 ,,,,,"" "'11') 10 Vilhelru i\ul,..n c hcg a ao mesmo resultado nos seus esforços atrás citados (Parte I, cap. I, nora
11) 1><,1.1
I IInlP,,, ,I~.111"111lI' ,I~ (Ollll," tI(· p""'.II jllllclir ,I t' rienrlfica.
""

112 PROCESSOS JUDICIAIS ESTRUTURA DO PROGRAMA E RESPONSABILIDADE II3

Estas reflexões mostram que a absorção da crítica, que da parte dos interes- gir a responsabilidade, de eliminar alternativas, de suprimir a crítica e apoiar as-
sados leva à legitimação das decisões, é atingida da parte dos decisores através da sim, no decurso da decisão, aquela redução de complexidade, na qual colaboram
programação condicional da sua atuação e argumentação respectiva. Ambos os as- também 'os outros interventores do processo, para sua sorte ou desgraça.
pectos do procedimento de decisão servem de forma complementar para diminuir
as possibilidades de escolha, para reduzir a complexidade. Daí ser correta a suo
A declaração da imparcialidade do juiz fica em risco quando este demonstra
posição de que uma legitimação pelo procedimento só pode ser institucionalizada
demasiada atividade (11). Sob este ponto de vista não apresenta inconvenientes a
vinculada à programação condicional da decisão. Portanto, não é de forma ne- exigência de Arndt, tratada aqui (parte 7, nota 17), exigência duma autêntica dis-
nhuma por acaso que a legitimação do direito, conforme ao processo, se tornou
cussão jurídica no processo; realmente qualquer atividade de averiguação jurídica
mais aguda na virada para o século XIX, no mesmo momento histórico em que foi
constitui um problema. Isto indica, principalmente e uma vez mais, a prudência da
abandonada a argumentação teleolôgico-naturalista do direito e este foi sendo
limitação do direito a programas condicionais. Um juiz a quem se exija alcançar
progressivamente positivado como sistema de programas condicionais de decisão. O
determinados objetivos na realidade social, dificilmente poderá atuar com ímpar-
que ainda hoje subsiste da teoria teleológica do direito serve para a interpretação cialidade e, em todo o caso, não pode parecer apartidârio , pois os partidos teriam
elas decisões alheias (nomeadamente as de leis) e não para a interpretação da le- no instrumental de realização dos seus objetivos, quase inevitavelmente, um valor
gitimação pessoal direta. de posições diferentes. Um juiz a quem fosse dada plena responsabilidade pelas
conseqüências da sua decisão, não poderia ser um juiz imparcial. A atitude do juiz,
liberta da crítica inspirada nos resultados, constitui também, sob este aspecto. um
Também se pode consegu este resultado doutra forma, através da análise do
principio da imparcialidade d iuiz. Este princípio tem um alcance ainda maior, momento essencial do processo judicial.
quando é válido legitimar a sob ania última da sentença, funcionando, portanto,
como se já existisse na imparcial. ade uma garantia de verdade. O princípio não
enuncia mais do que a igualdade negativa de todos os interesses específicos na
oportunidade de exercer influência sobre o juiz dentro do seu programa e assim
não pode nunca fundamentar uma sentença que, afinal, tem sempre de ser de-
idida a favor de determinados interesses. Por detrás da ideologia da imparciali-
dade dos juízes podem imaginar-se mecanismos sociais latentes, que determinam
que, apesar disso, o princípio é digno de crédito.

Por um lado serve, naturalmente, para a conservação da verdadeira incerteza


quanto à conclusão do processo ~ uma função que deve permanecer latente, por-
que todas as decisões, de acordo com a declaração oficial, já foram decididas no
direito, não podendo portanto persistir já qualquer incerteza. De fato, o princípio
da imparcialidade do juiz proporciona aos partidos a confiança de que o juiz não se
compromete especificamente antes do processo e é nesta confiança que se baseia a
sinceridade da situação ~ como antenormente se demonstrou ==, o motivo de se
engajar no procedimento judicial. É nisso que o princípio de imparcialidade cons-
titui condição básica para a implicação pessoal dos interessados no acontecimento
simbólico que legitima a decisão. Isto é uma função correspondente ao procedi-
mento.

Por outro lado, em relação à estrutura do programa e responsabilidade da


decisão judicial, o princípio da imparcialidade desempenha a função complemeri-
tar , que também deve permanecer latente. A imparcialidade age, aqui, como
separação de papéis, que corresponde à limitação de crítica e responsabilidade es-
bocada acima, cobrindo e escondendo. Corresponde à decisão de determinados
compromissos sociais (familiares, políticos, religiosos, de interesses, de especiali-
la~'ão ri('nIHiru, ('11). Compromisso significa simultaneamente que, neste aspecto, a
d(·( ,i~.,() 11,111
JlOc\I' SI" jusI iliC'ada, ,1('111 criucada. Pode ser inoportuna politicamente,
tI,lI .) 11111,11,.11' UIlI 11ll(llllNIIilldl'sl'javd, i cforçar a luta de classes, impedir a divul-
~''' ••III d.1 ,"loi •.:I 1<'II)(ilitl Vnc!lldl'il.l. ou coruradizcr os conhecimentos mais re-
I iili,·~ ",,!til 11111., 'li I' 111,'1,1111
d, VII!.' ~.\"tI,lvI·1 1I0Saglorncrados industriais ~ e até II Observações inteligentes para este assunto em Torstein Eckhoff: Impartiality, Separation of
1I11'~II,tI,'~ It I~ \1'1'1 1111.111 ti, "' Id\lI.III.,~ () jllll s() a etcs obedece, Por conseguin- Powers, and Judicial Independence (Imparcialidade. separação de poderes e independência judicial),
" 1'"1 d"ltÍII' d" "lilltÍl'i "h
•• 111'1"'" 1.1111,111, tio )'"1, I'NI;I.1 11('("('ssidade de rest ri n- Scandinavinn
1441\ 1"
SludiC"s in Law 9 (FJllUdos escandinavos sobre direito 9). 1965. pairs. 11·48. IIObrt'tudo
.,..0 ttr, ,. tlt"ull
-,
\
Até agora deitamos uma vista de olhos aos procedimentos de aplicação ju-
rídica, aos procedimentos para uma decisão programada. Eles constituem os fatos
primários, tanto histórica quanto sociologicamente, pois regulamentam a ação
elementar face a face. Eles podem existir só por si, mesmo quando não há um
poder legislativo, e nesses casos são .autoprogramados .. No decurso da aplicação do
direito, logo se decide o que é válido como direito; na fundamentação das decisões,
as bases são formuladas convincentemente, sem que a programação seja demons-
trada ou justificada como teor de decisão. Os conceitos, segundo os quais as infor-
mações são classificadas por categorias, e as regras, segundo as quais as decisões são
tomadas, aparecem no mundo ontologicamente, são tratadas como fatos, portanto
como se nunca tivessem sido realizados, mas apenas descobertos e interpretados.
Por meio deles se alivia o procedimento de decisão judicial da sua complexidade,
que ele próprio nunca poderia dominar. O procedimento judicial, como sistema de
complexidade relativamente pequena, não pode prescindir de estruturas relati-
vamente concretas e invariáveis de assimilação da informação, de formas de pen-
samento bem delineadas e imutáveis e de instituições jurídicas, tais como pro-
priedade ~ pátrio poder, representação ou tentativa criminosa, ato administrativo,
"trust" ou conditio, que, apesar-de toda a generalização e elasticidade, envolvem
contudo associações realistas e referências de sentido, para poderem ser utilizadas
com rapidez. Apesar de tudo, o processo de decisão judicial oculta a sua própria
causalidade, o que lhe é tanto mais fácil quanto a quantidade de pensamentos
jurídicos que é formulada em procedimentos, de tal forma que o contributo de
cada procedimento isolado é, na realidade, mínimo (1).

Não acontece, portanto, como se se devesse de alguma forma manter uma or-
dem lógica e também cronológica, de que os programas de decisão devessem, em
primeiro lugar, ser feitos e só depois pudessem ser aplicados. As sociedades mais
primitivas conhecem apenas um plano de decisão e têm, por isso, um "direito
natural" fixado ontologicamente. A separação entre o estabelecimento de normas
jurídicas e a sua aplicação, a sua diferenciação através de diferentes normas, di-
ferentes papéis, diversos procedimentos jurídicos, pressupõe uma cultura jurídica
altamente desenvolvida e, a partir daí, uma sociedade já muito complexa e dife-
renciada. E mesmo então há, como hoje se começa a ver, barreiras imanentes das

Especialmente aqui existem paralelos surpreendentes com a teoria psicológica dos sistemas acima
mencionada, teoria que postula igualmente uma relação entre complexidade do sistema e complexidade
do meio amhicnu-, disponihilidade dI' alternativas, concrcutudc, respectivamente abstração das regras
elu ,.,i'U'lll.t pai tl O~ t nur.uos ('(nu o meio amhieur«, t' da possibilidadr- <1(' u'('uuh(·ft·r c' Oll,(illd/ar ta
p,l'lP",o o ,,,o',tlod.ocI.· .OllO.1I0\('
118 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO

quais se pode extrair, excluindo do processo de decisão jurídica, aquilo que se pode
tornar independente como legislação (2).

A tarefa dos próximos capítulos consiste em compreender a função duma tai


diferenciação de decisões programadas e programantes, esclarecer algumas das suas
c ondições e problemas e sobretudo reconhecer qual a importância que os proce-
diruéruos ordenados juridicamente possuem para a institucionalização e legiti-
mação desta diferença. Quando nos voltamos para esta tarefa, temos de abandonar
o ponto de vista, que até agora foi microssociológico e, excetuando os sistemas
~('( undã rios de interação face a face, temos de considerar também os sistemas
CAPÍTULO I
NOI iais abrangidos, pois só eles podem suportar o risco do estabelecimento de nor- Positivação do direito (I)
nl,IS jurídicas ou o risco de positivação de todo o direito. Aí conservamos como
qll,ldlo teórico de relações a teoria sociológica dos sistemas, mas temos' de encarar
~lIl1l1ltaneamente diversas referências de sistemas e portanto aplicá-Ias não só aos Por direito positivo entende-se as normas jurídicas que entraram em vigor por
IMt'llHlbisolados do processo, mas também ao sistema político e à sociedade como decisão e que, de acordo com isso, podem ser revogadas (2). Se e até que ponto o
1111\ lodo. direito pode ser responsável pelos processos de decisão, isso constitui para os juristas
um problema sem solução. Habituados desde há muito e orientados para decidir
conflitos estabelecendo aquilo que é justo, leva-os a pensar em trabalhar visivel-
mente para estabelecer a própria justiça até através da decisão. O abismo de ar-
bitrariedade que se pode abrir quando todo o direito só for válido mediante de-
cisão, deixar-lhes-á calafrios. E, contudo, uma vista de olhos imparcial às formas
reais de atuação dos modernos sistemas políticos mostra que, pelo menos desde o
século XIX, o estabelecimento do direito se converteu em objeto de trabalho per-
manente dum empreendimento organizado de decisão e abrangeu todos os campos
do direito, incluindo o direito constitucional. Não se pode mais dizer que nas al-
terações jurídicas se trata apenas de conceitos isolados ou de regras de exceção
mediante um. direito de soberania política de tundamento especial, como o Jus
eminens, portanto que se trata duma manifestação atípica da vida política, como
se pretendeu até ao século XVIII; já não se diz também que só o degrau mais baixo
duma hierarquia de instituição divina de normas jurídicas fosse assim posto como
lex positiva à disposição do homem, que nisso teria de se ater a um direito superior.

Para esta parte comparar também com Niklas Luhmann: Gesellschaftliche und politische Bedin-
gungen des Rechtsstaates. (Condições políticas e sociais do estado constitucional). Em: Studien über
Recht und Verwaltung (Estudos sobre direito e administração), Colõnia-Berfim-Bonn-Munique 1967,
pags. 81-102 e, do mesmo autor: Positives Recht und Ideologie (Direito positivo e ideologia). Archiv für
Rechts-und Sozialphilosophie 53 (Arquivo de filosofia do direito e filosofia social 53). 1967, pags.
531-571.
2 Esta definição tem de ser lida cuidadosamente a fim de se evitarem mal-entendidos, Ela não con-
tém uma limitação a determinados tipos de decisão mais ou menos no sentido de que apenas os atos
legislativos podem estabelecer o direito positivo. Também as sentenças judiciais, por exemplo, consti-
tuem decisões neste sentido. na medida em que exercem uma ação normativa (igualmente Theodor
Ceiger: Vorstudien zu einer Soziologie des Rechts Estudos prévios para uma sociologia do direito
Berlim-Neuwied 1964, págs. 182 e segs. sobre "opção judicatória sobre a regra da habituação"). Não se
diz mais nada sobre os motivos da decisão. Todavia esses motivos são necessários e estão sujeitos ao con-
trole social. O direito positivo não pode de forma alguma ser compreendido como um regulamento ar-
bitrário. O estabelecimento do direito está muito mais dependente, como toda a decisão. por exemplo.
de premissas de decisão. de acordo com um valor, premissas que se pressupõe que já existam socialmen-
te. A particularidade do direito positivo consiste apenas em que também estas premissas de estabele-
(;II"ln I1 ,,111' r~fllll'l", '-""1 1.#,," 1111""" I Lu ""n~IOIIflJIiOIlS de Ia responsabilitê , Étude sur Ia cimento do direito s6 podem ser pressupostas como direito válido. quando se tiver tomado uma decisão
!ir".r. 1"11111'1"" (A. 1'.II.f,,",j~~.,\.'~,I. "11"." •.• 101"",,",. F~""I() ftolll!' O pensarneruo jurldico), Paris sobre elas. A posirivação do direito significa. portanto. que todos os valores sociais. normas e expe
111-17 ,,,111.11111 •• I'~N.' I~,. 'fil" "" I,,~~I ''lI.r, I 1]"""1 •.,,, 11",1 NIIII1Ii" ,1"1 til luer lichen Fortbildung des rativas de cornpurt .11111'111()1~1ll cI.- SI' r lih rudes dI' av('s til' prt)( ""OS d,' decisao, ames d,' rXIt!"1 em «)I\
,'. 'VIII',.,Iot. (I'lllIf Ir.l" 11,,,,mlh ",,' ~nr, IdI:O"'''''"'' 1111hlh" ,1.,"" dt" 111,v,."nl. I ilhirlllrn I'H,I, J"r.íiI'.ui.t v....tbc.hule Ict.u•..I.
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120 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO POSITIVAÇÃO DO DIREITO 121

Ambas estas formas de pensamento facilitaram muito a introdução da positivação Enquanto essa invariabilidade atuar como critério do direito só se podem
do direito no pensamento jurídico ocidental - mas não apresentam uma teoria let ~izar relativamente poucas expectativas de comportamento; e tem de se tratar
adequada da realidade atual. de \peclativas das quais se possa afirmar, inteligentemente, que sempre foram
O mesmo é válido quanto ao postulado do poder absoluto do príncipe, livre de vá li' ~s e que sempre o serão. Em sociedades relativamente estáticas isso pode ser
mpromisso com leis. Até aos tempos modernos, o "poder absoluto" restringia-se cons ~uido, Um ambiente bastante seguro de processos naturais, psíquicos e sociais
as possibilidades de conquista e coação, de confiscação e recrutamento e era dá chances de sobrevivência a essas sociedades, concreta e rigidamente estrutu-
praticamente impotente quando se tratava duma modificação da realidade social radas. Bastam-lhes alterações apócrifas do direito. que são executadas no decurso
de acordo com uma finalidade. As estruturas da sociedade eram demasiado sim- do trabalho de conceitos, de falsificação, ou através da redescoberta do antigo
ples, as formas de comportamento dirigidas eram alternativas, o potencial de direito próprio (7), Se no decurso do desenvolvimento civilizacional aumentam a
omunicação das instâncias de decisão demasiado pequeno de acordo com imput e complexidade e a variabilidade das condições naturais, psíquicas e sociais de vida
output, para que se pudesse ter estabelecido o direito positivo como instrumento - um processo onde a complexidade crescente da própria sociedade e do seu
variável de modificações 'sociais (3). A dissolução do dominador absoluto já há direito constituem uma causa predominante e, concorrente - torna-se cada vez
muito que não quer dizer que ele pudesse estabelecer a justiça (4), mais inadequada uma estrutura jurídica rígida. Aumenta a necessidade de conferir
Jã anteriormente o positivismo jurídico dos finais do século XIX tivera a pos- também a essas expectativas as qualidades jurídicas, tão efetivas, de ordem técni-
ihilidade e a coragem de ver a realidade. Mas a sua informação de que o direito ca, que são, evidentemente, novas e têm, necessariamente. de ser alteradas. Numa
('1,1 válido mediante a decisão dos órgãos do governo, permaneceu tão ingênua medida modesta a princípio e, depois, cada vez maior, tem de ser possibilitada a
quanto O seu conceito de intenção. Substituindo o conceito de intenção pelo con- variedade das estruturas e depois institucionalizada. Assim se altera o sentido do
t c'il() de sistema (5) adquire-se um hábito teórico de referência, com a ajuda do direito; ele é obrigado a já não excluir a variabilidade, mas sim a absorvê-Ia. O
(\\1111 se pode voltar a conceber o problema do positivismo do direito. pensamento do direito natural retira-se do âmbito normativo das esferas de valor e
é afirmado ideologicamente como sintoma para que não possam ainda suceder-se
Um sistema social, sobretudo o sistema social da sociedade abrangida cons-
os valores mais altos da reestruturação das normas e papéis,
titui, como direito tornado obrigatório, as expectativas de comportamento e utiliza
.1 Rua interpretação simbólico-significativa como estrutura de comportamento. A Com a positivação absoluta do direito atingiu-se um novo plano de funcio-
Iunção duma tal estrutura reside na redução da complexidade das variantes pos- namento da sociedade mais completo e rico em alternativas seguindo as suas
slvds de comportamento dos indivíduos. Esta função exige que o direito, nos próprias condições de estabilidade(8) e que não é compatível em detalhe com o di-
111 ocedirnentos estruturados por ele, não possa ser alterado, tem antes de ser pres- reito anterior, apesar de toda a continuidade de normas e formas de pensamento.
uposto como invariável - senão todos os pontos de referência se podem desfazer Pode compreender-se, não por puro acaso, a nova situação, com as mesmas Ca-
t' todas as premissas se podem anular. Esta irrevogabilidade e indisponibilidade são tegorias de sistema que nos servem para a caracterização do procedimento como
de' importância tão grande que constituem, em primeiro lugar, o sentido do di- sistema,
,,·ito. Prever a par da invariabilidade indispensável, conjuntamente a sua varia-
hilidade, tem de surgir à primeira vista como contradição evidente e é, na reali- Aumenta a com-plexidade objetiva e temporal do direito, o número de expec-
dade, tão dificil, que o pensamento se interdiz a si próprio. Defender um direito tativas legitimáveis e as possibilidades e tempo de as alterar. Existem, naturalmen-
totalmente alterável parece ser tão absurdo quanto tentar construir com pedras te, restrições práticas desta complexidade, dependendo daquilo que os processos
liquidas e não sólidas. Não existe (6). têm possibilidade de compreender e reduzir. Em princípio, porém, torna-se possível
agora qualquer complexidade e variabilidade do direito. O direito deve ter-se es-
tendido a todo o mundo. Enquanto estrutura de sociedade, ele não deve limitar o
mundo que a sociedade pode ter - e. se o fizer. então apenas mediante decisão a
ser revista. Tem de poder criar-se um direito adequado, onde surjam problemas
~ Comparar aqui com lH, Driberg: The African Conception of Law (O conceito africano de di- novos, por exemplo no caso do processo de conserva de peixe se demonstrar pre-
1(';111).Journal of Comparative Legislation and International Law, 3 Séries 16 (Periódico de legislação judicial, ou as conjunturas se apresentarem como carecendo de estabilização.
s omparuda C direito internacional 5, série 16). 1954, pâgs. 250-245; ]oseph Schacht: The Origins of
M"hllmmadan Jurisprudence (As origens da jurisprudência maomerana), Oxford 1950; Fred W. Riggs:
I hniluurl , Thc Modernization of a Bureaucratic Society (Tailândia. A modernização da sociedade Comparar como um exemplo da obra de reforma de Solon e ainda Erik Wolf: Griechisches Rechts-
hlllon:llica). l lonolulu 1966. sobretudo pâgs. 85 e segs. e 152 e segs. denken (o pensarneruo jurídico grego). volume I, Frankfurt 1950, pâgs. 199 e segs. Para a Idade Média
11 conhecida exposição de Fritz Kern: Recht und Verfassung im Mittelalrer (Direito e constituição na
1 N" realidade OS portadores de tal poder tiveram de recorrer sempre a uma legitimação religiosa Idade Média), nova edição. Tübingen 1952. págs. 38 e segs.
1lI111~ ou menos rradk ional, tal como hoj~ não se pode deixar de ser democrático, Por esse meio se res-
11I"I(H,un. C'\lI pdnc:lpio. 'I~
1II1I,.~ Irlll.niv'IH cll' aspirar a uma autonomia do domlnio político também H Conferir aqui com a interpretação do desenvolvimento
g"neralizcd adaptive capacity" (capacidade de adaptação
social como preparação
mais generalizada)
duma "greater
da Talcott Parsons: So-
IUU I. (I ~tHhil0 tlu (I!'('III> \lllll' VINil" clc' • "ojl1l1111 II(lhr,· ('8\(' assumo é dada por Shmuel N, Eisenstadt:
I ;('ti('~. Evolutionary and Cornparative Perspectives (Sociedades, Perspectivas evolucionárias e compa-
I li•• 1'lIhd, ,11 Syft1rll14 1111·,llll'ltr. (O •• I.,rlll ••• p"lltlftl4 dOi impêrioe]. Nova lorque-Londres 1965. pags
r,H1vas, Engkwood Cliffs. N,]. 1966. pâg , 110 e o conceito de "evolutionary universais "de Talcou Par-
I ~7 I' .,'''" "'1ft: I'.volulionary UniV('rsals in Socieiv (Universais cvolucionãrias na sociedade Universal no sentido
ti
'IP"'K"lIllldo no Novo J)iC'Íon(lIio AurC<lio, Edi\()l<l Nova Frorur-ira , 1975. Rio de Janeiro. pãg. 1442
to I'vllllldllll 01 Ihr CUII( r\lllclO of LlIw ln numa and I • •••1",,1. lill·"I,.\O I~). A.uC'til.tll SIH ioI01(;C.11 HC'vi,'w 29, 1!164. P~IIS. 33!) 3f,7. rum IIIJIIIII KC'pod,'
'''' SI ••• ). 11t,. 11111111"1,,1111,. Si~1I1 SuC'irly!lH (lornul til' 1.It"h~", !aII1'II" ('1111 .\ I'mlllvlI~.\O do 11111'1111 () l'''ll'do 1'.11 "011' j"II(,1I 1." C'III ".1111'. IivlI'llIl'olr 1111111til
L .•.•• , .•.•••••.•• I ••.•~.,_.~ _.u,I. •••••.• .6.•••.. 1.. I •• _u .•
122 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO POSITIV AÇÃO DO DIREITO 12~

Uma complexidade tão elevada só é atingível através de desistências corre- lamento é considerado como já existente, como uma categoria do mundo (10). A
r.uncnte localizadas. Algumas partes integrantes de sentido, que estavam anterior- grande quantidade doutras possibilidades é já eliminada sem a intervenção do
1I1('lItC desligadas do direito (e na experiência jurídica natural permaneceram homem. A verdade nega às outras possibilidades a qualidade de existir e o passado
dlo ante muito tempo ligadas ao direito), tiveram de ser abandonadas. Isso acon- também não conhece já qualquer espaço de manobra de disposição. Ambos os con-
\c'( eu por intermédio da diferenciação do direito. Mais intensamente do que até ceitos simbolizam uma complexidade já reduzida. O mesmo é válido para a con-
.rqui se separou o direito doutros mecanismos sociais, sobretudo dos que garantiam cepção especificamente ocidental da natureza e, com ela, a interpretação do direito
.1 verdade de sentido e da moral social geral. O direito per-de a sua capacidade de como direito natural (11). Tais concepções não podem ser simplesmente aban-
verdade devido ao fato da própria verdade ir sendo especificada no pensamento donadas, têm de ser reconhecidas na sua função e substituídas.
moderno quanto a uma certeza intersubjetiva obrigatória, portanto quanto a um
<11'1\'1 minado modo de transmissão de opiniões. Agora o direito já não pode ser ver- Se uma sociedade positiva o seu direito, abandona neste campo a suposição
d.uleiro ou falso, mas apenas válido (9). Desde o século XVIII foi-se tornando cada duma complexidade reduzida e tem agora de realizar por si própria a redução da
VI', mais evidente que se deve distinguir entre direito e moral. A distinção fun- complexidade, através do seu sistema político. Ela assume a responsabilidade pela
dallll'lllava-se e fundamenta-se, predominantemente, por referência a mecanismos sua própria estrutura. Tem então de estabelecer a multiplicidade de possibilidades
("1)('( ioÁ:~ .Ic sauçâo do direito: contudo da reflete, simultaneamente, a forma es- de comportamento humano e decidir aquilo que deve ser válido. As certezas,
IH'I ial da origem do direito e que consiste em que mesmo as expectativas para al- pretensamente exteriores. ligadas ao ambiente, têm de ser substituídas por certezas
I.III<;JI a validade do direito têm de ser filtradas e legalizadas através dum processo interiores, imanentes ao sistema. A sociedade tem de aceitar, com a sua estrutura,
di' dI'( isão. riscos elevados, tolerar incertezas, permitir a falta de consenso e poder reelaborar
tudo isto sozinha com a sua atuação. Tem de aceitar contradições e conflitos em
vez de os rejeitar categoricamente como conflitos de valores, de programas, ou de
O fundamento duma
tal diferenciação é a carência de especificações fun-
papéis, regulá-los e decidi-los. Tem de arrancar ao velho nomos do mundo a sua
i tonais e desencargo funcional do direito. O direito só pode atingir uma com-
problemática e reformulá-la em problemas necessitando decisão e possíveis de
plexidade elevada quando for aliviado de inúmeras funções secundárias, por exem-
resolução, portanto deslocar problemas de fora para dentro para mobilizar alter-
plo, duma base religiosa ou dum regulamento individual de sentimentos e quando
nativas e poder encontrar soluções bem integráveis.
1\lI talhado para a sua função específica do estabelecimento temporal, objetivo e
~()( ial de estruturas generalizadas de expectativas. Logo que isto acontece, torna-se Tudo isto sugere o pensamento de equilibrar a perda do direito natural
evidente que uma tal estrutura de comportamento temporal estável, independente mediante o direito processual. Não é certamente por acaso que começa a surgir um
da situação e certa de consenso, pode ser adquirida também como um direito al-
lI'l âvcl. As [unções duma tal estrutura implicam não poderem ser postas em dúvida
ou mesmo alteradas durante os processos que estruturam; o que não quer, porém, 10 Conferir com Lingat, op, cit .. para a interpretação hindu.
di7('r que sejam absolutamente constantes e pura e simplesmente intocáveis. Não há II É caractcrlstico para o conceito de natureza a negação da causalidade atuante do sistema, que se
pi oblcma que noutro tempo, noutros lugares e noutros procedimentos judiciais es- vê perante a natureza. A natureza é uma verdade irnanente, nascida de si mesma. Apreender o mundo
ruhelcca. ou altere respectivamente aquilo que hoje e agora funciona como premis- sob o aspecto da natureza é. portanto, sintomático de sistemas psíquicos e sociais de organização re-
~<I, Contudo, tem de se poder comprovar o que é válido e tem de se evitar que os lativamente simples. que não podem ainda tornar perfeitamente consciente a sua própria causalidade e
processos de decisão sejam, em determinados pontos, sobrecarregados de com- não as podem. portanto. utilizar como princípio corretivo nas suas relações com o meio ambiente. Por
outro lado. é característico do conceito ocidental de natureza, que esta, analogamente à técnica, é conto
pk-xidade. Para isso são suficientes diferenciações de organizações.
preendida como tendo uma estrutura causal se bem que de forma alguma em sentido mecânico ou
funcionatista da atual teoria causal. Com isso se estabeleceram os princípios para uma integração de
natureza e técnica, tal como ela poderia ser realizada depois que as atuais ciências naturais aingissem
Estas renúncias à confusão difusa com outras normas, outros mecanismos, um grau de abstração, que possibilitasse uma mais ampla substituição de motivos. Na realização desta
outras funções, permitem a posterior renúncia decisiva: a renúncia à invariabili- integração consolidou-se o domínio do homem sobre a natureza em sistemas complexos, de tal forma
que ele se póde tornar consciente da sua causalidade atuante e póde abandonar o conceito da natureza,
dade, O direito positivo já não pode ser defendido como invariável e portanto deve
prosseguindo sob a mesma designação (comparar, por exemplo. como Werner Heisenberg: Das Natur-
substituir as certezas que residem na invariabilidade e no enterro social do direito bild der heurigern Physik O quadro da natureza da física atual Hamburgo 1956, pago 12)
antigo. Este problema está intimamente relacionado com o da complexidade; pois Se se refletir sobre isto, reconhecer-se-â , então, que o cerne do pensamento de direito natural reside
a cor reza é, basicamente, confiança numa complexidade já reduzida. Opiniões que menos na elevada valia hierárquica do direito natural, do que no fato de as causas do direito serem
significam invari ab ilid adc c com isso prometem a certeza - nomeadamente' projetadas numa esfera exterior à sociedade. Esta separação entre ordem cósmica natural e sociedade
aquelas opinio('s dI' que ,IS no: mas jurídicas são algo que já existe, são verdadeiras e histórica, que é alheia às sociedades mais primitivas (consultar. por exemplo. Elias de Tejada: Berner-
v,ilid,Is nu-di.uue III~'I'''II,,1O 1\0 passado, instrução dos que já morreram, ou me- kungen über die Grundlagen des Bantu rechts Observações sobre os princípios do direito b antu Ar-
chiv für Rechts-und Sozialphilosophie 46, 1960. pags. 503·535 532 ; ele permite já uma oposição
di,lllll' VI" 1"'1" 11l1I'11I11I.Iwl 1010l'<lII1 o homem perante uma complexidade já.
entre direito natural e direito legal e só secundariamente é que esta diferença é compreendida hierar-
1(:dU/icl,\ c' 1011'1111'1'11111'11) II MI.\ lf'I.I<'lI0 c om o mundo sob este aspecto .. O regu- quicarnente, O direito natural também tinha a sua competência mediante a sua faticidade óntica e sem
,,1\(·1I13tiv38.Com isso se põe também doutra forma o problema da solução e compensação do direito
uutural. Normas jui ldkas di' grande valia (quando não absolutamente imutáveis) podem igualmente in
'I 1',,0., ,j,," 01,'"11,,,"1"1,,,. li ,1'\1"\' 1I'"lilloilliluol.· .t.I' Vf'III•••11'O.II\1,II~I1l<lS03 10010 este traço de 81,11~.81'IIUdilt'iw I>(,~i\,v(" (101I'xnllplo ,1I"IV~8da d iíerenciação entre direito constivucionul e o simples
''''11 1"'lltlli\.iO "oh .1 toltnt' duma refu 11110'1101 •• ".01 1\ '1"1"11111
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124 ELEIÇÃO POLlTlCA E LEGISLAÇÃO POSITIVAÇÃO DO DIREITO 125

novo tipo de confiança no procedimento judicialmente regulamentado no mesmo soa pode prescindir da história na sua função de absorção da complexidade (13).
período de tempo em que o direito natural fracassa na sua última manifestação, o No lugar daquela tradição passada entra a história da decisão tomada no sistema,
direito lógico, portanto como se à confiança em decadência no direito se sucedesse que não pode ser apagada com um traço de caneta e totalmente substituída. Os sis-
uma nova compressão mediante as garantias do processo. A teoria clássica de
temas complexos estão comprometidos, como já vimos no exemplo do procedimen-
processo, orientada para a verdade, resultou, portanto, desta situação. Ela era
to judicial isolado, através da reconstituição da sua própria história.
compreendida, por assim dizer, como a segunda melhor solução: quando a legi-
timidade e a verdade não se evidenciam diretamente a partir da natureza das
Com isto não se exclui que, no contraste entre direito natural e procedimento
coisas, têm de se inventar caminhos para se aproximar o mais possível delas. Se não jurídico, se veja algo de certo e que os procedimentos adquiram um significado es-
se puder chegar a um acordo quanto a determinadas soluções de problemas, então, pecial no direito positivo, que depende exclusivamente da decisão; apenas se per-
pelo menos, tem de se chagar a um acordo quanto aos processos jurídicos median- fila com maior acuidade a pergunta quanto à função e restrições da sua atividade.
os quais os problemas, surgidos em cada caso, são levados a uma decisão. Através da positivação do direito, os processos de decisão conservam maiores pro-
babilidades de refundir uma complexidade mais elevada e indeterminada e de
Este pensamento é, entretanto, muito mais simples do que aquilo que preten- afrouxar a dependência do sistema da sua própria história de decisão. Só podem
de demonstrar. Uma instituição isolada, como o processo legalmente organizado, aproveitar estas chances quando elas estão estruturadas correspondentemente e
núo pode ser suficiente para expectativas tão elevadas. O risco social da positivação proporcionam a correspondência. Antes de podermos investigar com maior pre-
do direito é milito maior do que pode ser garantido através de determinadas formas cisão quais os requisitos que daí se deduzem para os procedimentos jurídicos de
Ik processo, ou apenas então através de normas processuais isoladas e de efeito eleição política e de legislação, antepostos ao procedimento de aplicação jurídica,
c ontrârio. Devemos tentar conseguir um quadro mais realista do significado dos temos de criar um quadro mais nítido de quais os problemas especiais e sobrecargas
PI<){('ssos legais para a positivação do direito. a que se expõe uma atuação por ação duma alta complexidade não programada.

Em primeiro lugar, dificilmente se pode aceitar que numa sociedade com-


plr-xa , altamente diferenciada como é a atual, antigas instituições e mecanismos
possam ser substituídos por um único sucessor. O objeto dos regulamentos dos
processos não pode consistir apenas em garantir a estabilidade de normas jurídicas
mais positivas e propostas para decisão. Isso acontece, continuamente, através da
coruplcxidade objetiva extraordinariamente elevada do próprio direito, comple-
xidade que se manifesta como a sua certeza mais importante, imanente ao sistema.

Numa ordenação jurídica posruva , todo o direito pode mesmo ser alterado,
mas não duma só vez. Perante o volume e interdependência das normas jurídicas
em Funcionamento , cada intervenção tem apertadas restrições por decisão única.
Apenas algumas alternativas permanecem em aberto, como sendo convenientes e
(ada arbitrariedade se faz pagar através das suas conseqüências (12). Logo que se
devem alterar conjuntos maiores de normas jurídicas, aumentam as exigências do
111 ocesso de decisão de tal forma que dificilmente se podem dominar e se alguém
quiser fazer reformas tem de se arriscar a dar alguns passos no escuro. Em nenhum
111/(<11 se indica na prática uma possibilidade de regeneração a partir do embrião.
'I ambém não existe já um pré-direito no sentido de que só ele, em virtude da sua
.uu ig'üidade , mantém a prioridade perante o direito novo, ou então que exclui as
11IIIV<\çó('s. Isto não quer ainda dizer, por um largo espaço de tempo, que uma pes-

1:1 Com iseo nào se excluem. naturalmente. transformações profundas do direito como conseqüência
d,' "'vulu(ck~ polllÍ'''s. Sohn-t udo. nenhum direito do mundo pode garantir a sua própria permanência
,. "'''1111 011110" p.,.,ihillll.Hlr, d,' c·vuluç,IO. Mas a intervenção racional, planejada e de conseqüências
1"/\'11." 11011",'1111.IIIIIV~' 11.,d,·, I~.Ü,. 1""I.IIIIU o emprego técnico do positivisrno do direito para atingir
iklr, ",III.,d". ti"., 11'11',1111"ol,ulll 11111,.1 II"I{'C 1111"til' decisão, estreitos limites. É suficientemente deter-
IHIII.tllIt' 'lU!" II 111!tU ,U,.I'O illU 1""111 "'I' Ldl"t.1 .lu dll"IIo ,lIc'lrüto não fosse, a principio. dirigida sobre leis
111••• 11111'''1 ~•. ",''''' d, ," ..hll. ". 1'1''m 1',01'11.". I••.".",II~. SfI .11'HV~S da influência extra-legal da prática
I" "1"."" '"'',, 1"1,,, ,,,,,1, ,i., ''',I~rllllll 'I'" ,,,.t,, " 01111'110 '.",1' i cinu-r prerado a CUltO prazo de acordo
'''11' I'''' ""I'" (" ..t" (""li', i, '''lllí ";11' 11" ••011\1'1"•.•• I )i(' ,,"hc'j(It'1l1\(' Auslcgung. Zum Wandel der I!\ COIllJl;lIoH, (011111II'~I"\,III e1c'I'M Infl'( inu-mo racionalizado sociologicamente. também com Niklas
1'01'"1""111 1" ••1IIIIi'I! li" N.ti.",~I""ii''';IIII., (A illlr'l""I~~J" 011111111111.,
Suh, e a alteração das orde- I."hlllllllll SOIiIlI"III•• I,,· A"'~""I1"1I (1{III'UII."i'"Hl .odolflllÍ<o), $o/i.1I1' Wrll li!. 1%7, P~lIs 97 12~
11M\ iI!"1 ,_I.: ,JI11:11,_,I'ÚVlj,l'l.l"11) IIkdil!i~111I1 1111'111';'')'1 ill 01"M' " '''''tI 1i 111.
CAPÍTULO 11
Democratização da política

o efeito que tem a positivação do direito sobre o sistema político duma so-
ciedade, portanto a variabilidade de todas as premissas de decisão que servem
como programa, nem de longe tem merecido suficiente atenção. A complexidade,
não apenas do direito, mas também do próprio sistema político, aumenta assim
duma forma tal, que se tornam necessárias modernas formas de estabilização, caso
contrário não se mantém. Numa medida que seria impensável, ou insuportável em
sociedades mais antigas, as alternativas tornam-se visíveis e decisivas. Isto significa
também que o apoio político já não pode ser pressuposto, mas sim concedido. Ins-
tituições invariavelmente legitimadas como a coroa e o altar não são complexas em
si mesmas, e não são suficientemente móveis para poderem aproveitar e ordenar de
forma convincente as novas possibilidades; elas não funcionariam como garantes do
poder legítimo (I). São substituídas pelo fato de o apoio político se converter em
problema permanente a ser resolvido pela organização e pelo trabalho quotidiano.
A mobilização das premissas de decisão e a mobilização das condições de apoio
polttico condicionam-se mutuamente e dão, conjuntamente, lugar àquela indeter-
minação estrutural do sistema político, que é típica e necessária aos sistemas com
omplexidade elevada. As possibilidades de variação que o direito proporciona não
estão invariável e automaticamente ligadas às condições de flutuação do apoio
político, por exemplo através da "verdade"; ambos os campos têm a sua dinâmica
própria e têm de permanecer suficientemente abertos e indeterminados para serem
oordenáveis. As incertezas que daí resultam não constituem, pura e simplesmente,
fenômenos concomitarues da vida política; são provocados estruturalmente para
garantir a adaptação do sistema ao seu ambiente, que também é altamente com-
plexo e varia com rapidez.

Devido à uma tão ,elevada complexidade de sistemas, tem de se abandonar


orno modelo de sistema a antiga concepção dum exercício hierárquico da força de
soberania, sob o qual o sistema político primeiramente se diferenciou da sociedade
c se tornou independente; essa concepção está talhada para uma função técnico-
organizadora na administração. O que é característico para uma hierarquia é que
da desemboca numa cúpula e conserva-se intata por seu intermédio. Se a hierar-
quia serve como estrutura de sistema, então isto significa que a cúpula simboliza o
todo. Ela constitui a expressão da legitimidade. Com isso o todo é representado
através dum papel, num plano perigosamente concreto, portanto, e irnpugnável.
COIHudo, se aumenta a complexidade e, juntamente, as possibilidades de variação
c' os riscos intcrnos do sistema político, de acordo com o que se descreveu, então

Clllmotll'u n li ••h,lllIo ,,0111111111'0 .1 o\),a de' Fred RiKKS: Thailand. The Moderniaation of a Bu
1t'~,1I1 1'"lily ('IlIilAII,lin
11111 A IIIClClrllll/n,lIn dt uma comunidade poltrica burocrãtica), l Ionnlulu
1'1101" 1"'1\1 '11 ,.• ,'Il~.
DEMOCRATIZAÇÃO DA POLÍTICA 129
128 ELEIÇÃO POLITICA E LEGISLAÇÃO

complexidade elevada, sem uma nova definição (5). O problema fundamental con-
têm de se procurar e encontrar formas mais abstratas de simbolização do sistema. siste na forma como se pode manejar uma tão grande complexidade e como se
A identidade do sistema consolida-se nas normas, quando não nos valores e pode levá-Ia a um sentido decisivo, mantendo-a contudo como momento estrutural
ideologias; separam-se mais rigorosamente os planos técnico-operacional de decisão permanente (9). Os processos legais da criação e estabelecimento da "vontade
e simbólico-constituinte de sentido (quando não também sem referência um ao popular" têm de ser analisados como contribuição para a solução deste problema ..
outro) e estabilizam-se por si. A conciliação desta diferença converte-se num
problema permanente, que pode ser resolvido sob a forma do processo jurídico, Se a complexidade política for preservada e refundida no sentido descrito, en-
quer dizer, através da apresentação do processo de decisão como operação técnica e tão têm de se preencher determinadas condições prévias, que podem ser descritas
como símbolo do todo (2). O pensamento do processo legalmente regulamentado mediante conceitos gerais da teoria dos sistemas. Os processos políticos têm de ser
substitui, no caso de ser esta a solução escolhida, não só o direito natural, mas tam- diferenciados especificamente num sistema parcial de tipo especial, tal como o
bém a hierarquia como estrutura política primária do sistema político (.3). Esta conhecemos sob a forma de política partidária. Estes processos têm de ser aplicados
situação, historicamente nova, dum sistema político de complexidade tão elevada é a um problema de relação relativamente abstrato, que estimule e incite a criação
insuficientemente interpretada, se não mesmo equivocamente, através das teorias de alternativas e estas têm de ser funcionalmente diferenciadas e especificadas em si
de constituição democrática, desenvolvidas nos séculos XVIII e XIX. Cornpreen- mesmas. Os processos políticos contribuem para todos estes requisitos. A sua função
sivelmente , uma pessoa ateve-se primeiro à teoria tradicional das formas de gover- de preservar e reduzir a complexidade política não programada demonstra-se
no e concedeu a inovação necessária e realizada respectivamente como alteração da quando se considera o seu contexto de sistemas como um feixe de obras diversas,
forma de governo, como passagem da soberania para o povo. Como conseqüência que são resumidas e integradas na continuidade duma instituição como a eleição
surgiu a pergunta quanto à forma como o povo podia exercer a soberania como política ou a legislação. Instituições que garantem uma tal estrutura mulri-
maioria, ou através de representantes, ou através dum dirigente que se lhe iden- funcional, avançam, desta forma, para o centro dum sistema político que tende a
tificasse e ainda quanto aos perigos ligados a isso, do ponto de vista do interesse prever com atenção uma complexidade elevada. Dificilmente podem ser substi-
teórico-político. Segundo já as condições, já os perigos dum poder popular efetivo tuídas sob o ponto de vista duma função específica, não podendo, por exemplo, ser
num ou noutro sentido, sejam considerados como um problema central, encon- substituídas por outra forma de recrutamento, ou por uma outra distribuição de
tram-se variantes mais democráticas ou mais liberais, cujas diferenças não podem competências. A sua eliminação tornaria necessária uma nova estabilização de todo
ser aqui discutidas em pormenor (4). Elas erram simultaneamente o verdadeiro o sistema. Neste sentido contam-se como fazendo parteda constituição.
problema, pelo fato de tratarem a soberania, ou poder, como uma constante trans-
missível, enquanto que, na verdade, o problema reside num aumento considerável
da complexidade do poder que, devido à sua envergadura, exige novas formas de
organização e de comportamento. As teorias clássicas de democracia desempe-
nharam uma importante função de transição e isso explica também por que se
orientavam pela teoria tradicional das formas de governo e tinham que acabar com
a "posse" variável do poder. Contudo, apesar da sua missão histórica, foram ul-
trapassadas e extinguiram-se. No seu horizonte não se pode conceber adequada-
mente a realidade política que contribuiram para fazer surgir.

Também assim se podem designar os procedimentos jurídicos de eleição


política e legislação como formas de criação e estabelecimento da "vontade po-
pular" e se podem legitimar politicamente, embora com isso não se tenha conse-
guido qualquer reconhecimento. A noção duma vontade que tem de ser criada e
estabelecida. é colhida da atuação isolada e não se pode traduzir em sistemas de

2 Uma outra solução, funcionalmente equivalente, deste problema, seria a coordenação contínua de
ideologia e prática de decisão através dum partido, que significaria um monopólio bem sucedido da
política. Para comparação de ambas as soluções encontram-se mais alguns pontos de vista em Niklas li Se se tenra r uma tal redefinição, então a preferência da informação interna sobre a informação ex-
Luhmann: Posuives Recht und Ideologie (Direito positivo e ideologia), Archiv für Rechts-und Sozial- «'trla aparece como essência da vontade, o que pressupõe uma diferenciação do sistema, uma abstração
philosophie 53, 1967, pags, 531·571. .
dos 8('\18 princtpios de decisão e uma diferenciação interna dos seus processos. Conferir aqui com Karl
S Na 1('(1111, "HlI\ 'Nrme' do lisl('ma político esta mudança é expressa por meio dum padrão de cir- W, I)('ulsch: The Nervs of Government. Models of Political Communication and Control (Os nervos do
1\1IVt'1 no. Modelos de comunicação política e controle), Nova Ior que-Londres 1963, principalmente
(" la~í\(), 11., 1i1~1l"II\HII ( ,hro ,,~tinl. Conaultar , como constituindo a exposição mais detalhada, a obra de
l)\lvl(\ """1"'1 1\ Sy."·"'. AlIl\ly.'~ \lI I'olitj(nl Life (Anâlise de sistema da vida política), Nova Iorque- P"K~, I or, (' segs, Esta reinter pretação leva, portanto, a categorias com as quais interpretaremos depois
1 no 14li •.•'''ydll''Y 11111', '" plOlC "",os poli, il os, mas ela jâ não se pode aplicar "ao povo" e sim ao sistema político, como portador
d,· youttult',
11 C""."II., Ulltonl 1\. 11.,101 1\ 1',..1,,, n 10 tlr-","( 1111ir Theory (Um prefácio à teoria demoçrática),
to 1'.,10,,, I" li'" (01)( ('110 1011"SI'''"(\''II\(' d,- dernocracin em Niklas Luhmann: Kornplexitat und De-
C"i'~II" 1'11,'" •• ,111" I' ,"1'01"" ,10 11••111"111,,, 1 ••• ·!o·lIIr a"llIr IIIl{umas premissas destas teorias clássicas
VII MI,,,I" I' Il.u 11"'141 ",."',,,,.' V "".1 tI",.M"I"d,y (IIruII'"Allft •• o plindl1io da maioria. Um estudo IIII1~,,01w (CI,"plc'XIII,III., " 01""",, , li' '") P"I,lio' !t.' Vi", 1('1ja!t, ('s'l!trif, (Puhli, ação polüicn lt irnesual).
ul ••, .I"I"I •.•"I~! 1',".l!lkM ,"üillf.j'l'il.AlI!'M'. (."'" "I'_Nur 111M,
CAPÍTULO 111
Eleição política (1)

De acordo com a evolução externa, na eleição política trata-se dum método de


recrutamento para os cargos públicos, sobretudo para a ocupação do parlamento.
Este método decorre segundo determinadas condições realmente necessárias.
Requere, por exemplo, o registro dos eleitores, esclarecimento e programação das
candidaturas, fixação dum prazo de eleição, entrega e coleta dos votos, contagem
dos resultados e informação dos eleitores. Outras modalidades, como restrição da
admissão de eleitores ou candidatos, estruturação das alternativas (problema das
"listas"), votação pública ou secreta, ou estabelecimento do sistema de contagem,
não derivam diretamente da própria tarefa de alistamento, antes parecem servir
para a sua coordenação, como outras necessidades do sistema. Trata-se, eviden-
temente, dum processo ordenado juridicamente no sentido das nossas reflexões de
caráter geral à teoria processual (Parte I, capítulo 3). Geralmente, criam-se papéis
vspcciais como o do eleitor, do candidato, do presidente eleitoral e das suas forças
auxiliares, que são limitados nas suas possibilidades de comportamento por meio de
t('/{ulamentos jurídicos e, depois, postos concretamente em ação caso a caso, por
ocupação. A incerteza do resultado da eleição serve como motivo essencial para a co-
laboração comunicativa e compromisso (2). É típico ainda, pois, o impulso para a
decisão e a neutralização ultra-artificial de inúmeros aspectos do processo mediante
a decisão: a competência, que se relaciona com o cargo a preencher, será ine-
quivocamerue transmitida ou não, independentemente do candidato ter ganho ou
perdido a eleição por uma maior ou menor margem de votos, do quanto ele se es-
forçou e de quão influentes sejam os seus protetores (3). Também o eleitor não
[em qualquer possibilidade de reforçar a eficácia do seu voto mediante uma
atuação especial ou uma repetição - possibilidades que ficam inteiramente em
aberto em outros âmbitos de atividade política. Por que motivo é tudo isto assim e
não diferente? E, dentro disto, o que é que constitui condição duma "legitimação
pelo procedimento jurídico"?

Pode simplificar-se a resposta a estas perguntas mediante a fixação de valores,

Consultar para o mesmo assunto. sob o aspecto da garantia do direito fundamental do direito de
.,,11.11(10, Nlkl,,~ Luhmann: Grundrechte aIs Institution. Ein Beitrag zur politischen Soziologie (Direitos
1,,"d~II"'IlI.m «uno instituição. Coruributo para a sociologia política), Berlim 1965, pags. 136 e segs.
Ond,' nao ('xlSla esta incerteza não se pode, a rigor, falar de "eleições" e em todo o caso não se
1''''''' 1.01••• rlu m prol ('SSO no sentido duma teoria. pois é essencial para ele que a situação de decisão seja
" ••, 1111(111.'111 ~"hP"II~(),
\ (:,,".,,11 ,11 1',\1 ,I I'~l,' Plllldpio .I" univocidndr- muito importante ainda que pouco acentuado. Tal-
o ,,\I 1',\1 ""'~ lI ••. I',,!tlll ,ti A~p,', I 01 Son.1I S\I \111 \11" .llId Proc "S5 (O aspecto polltico da estrutura social
I"'" I'~"') I·.1,1,,,1 •• I"" I ),IVIII 1>.."""1 1'111 V,u II"T 11" •• I Polilk,oI Thcorv (\)iv.'"id,Hl<' da !t'olla poltiicn),
1:IIIIII:WlllloI( 1111,. N I 1%11. I',I~'"/I li'! (11I)
1!}2 ELEiÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO ELEiÇÃO POLÍTICA 133

por exemplo, mediante as teses de que só é "democrática" uma eleição que respeite p.II.1 um alistamento orientado para a aptidão ou capacidade (6). À medida que a
determinados princípios e de que só uma eleição democrática pode legitimar a u-l.içâo invariável dos papéis, relacionada com a pessoa, se vai afrouxando, a
soberania. Neste plano ideológico, podem coordenar-se os comunicados oficiais MlI iedade vai perdendo a certeza baseada nele. Adquire mobilidade, ou seja, alter-
para uma unanimidade mais nítida. De resto, as teorias clássicas da democracia, u.u ivas para o desempenho dos papéis, mas tem que estabilizar de novo a sua es-
com as suas premissas demasiado simples, permitem uma outra forma de resposta, u uiura de papéis. A relação de papéis transmitida através da pessoa, seja ela um
ou, quando muito, um gênero diferente relacionado com o valor. O insatisfatório pol!tico, ministro ou funcionário igualmente acomodado, seja ela ligada a uma
(k tais informações é, contudo, evidente. Elas não transmitem qualquer atenção a 1141l'ja, casada, membro duma corporação, veterano de guerra, etc., converte-se
ouu as possibilidades de funcionamento equivalente, não permitem qualquer com- numa conjuntura individual ocasional, que pode ser influenciada, mas na qual já
paração de sistemas e tendem, por isso, a revestir as diferenças com a forma n.ro se pode confiar (7). O apoio e controle social já não podem ser transmitidos
c aicgôrica da fixação de valores. O conceito sem valor de legitimidade, para o qual .ru avês dos outros papéis, têm de ser transmítidos por meio de papéis complernen-
SI' dirigem as nossas investigações, já não admite essas saídas. A teoria sociológica turcs, opostos aos outros. Isto apresenta a vantagem essencial de que a revelação de
dos sistemas oferece novos récursos para isso. papéis de apoio e de controle já não se baseia em confusões difusas de diversos âm-
bitos de papéis, mas sim que é funcionalmente especificâuel. Simultaneamente
Na perspectiva distante e de longo alcance da teoria dos sistemas, aparece já aumenta o potencial de expressão de conflitos na ordem social, mediante os papéis
«orno digno de nota que o alistamento se converte principalmente em problerria e opostos, que têm de encontrar um modus vivendi para apoio e controle. E apenas
objeto de processos especiais. As sociedades primitivas conferem papéis políticos e sob estas condições prévias que tem sentido contrapor ao governante oolitico papéis
dill'itos de decisão, quando os prevêem assim, na maioria das vezes segundo cri-
especificamente políticos do público, por exemplo o do eleitor.
1('1 ios atributivos. isto é, em estreita ligação com 'outros papéis já atribuídos (4). As-
hilll se assegura automaticamente que os mais velhos, os atuais -chefes duma deter- Só' quando se têm presentes estas relações baseadas na estrutura do sistema, se
minada linha principal, os primogênitos duma determinada família, os proprie- reconhece com que intensidade variam no sistema social a complexidade alcan-
1.11ios rurais e urbanos, os presidentes zle associações de artistas, ou quaisquer çada , a individualização da posição do indivíduo, a_ especificidade dos sistemas
out I OS, representem as funções político-administrativas. Esses agrupamentos de de 'papéis, as incertezas estruturalmente condicionadas e o potencial para exposição
pap(-i revelam um grau muito pequeno de diferenciação do sistema político. A sua c solução pacífica de conflitos. Numa sociedade que evolui, neste sentido, para
cst abilidade é alcançada por meio da integração na sociedade, designadamente por uma maior complexidade, processos dinâmicos de alistamento substituem as an-
nu-io do apoio e ligação a outros papéis sociais dos decisores. A soberania baseia-se, ligas ligações estáticas de papéis.
pois, no apoio mediante os outros papéis próprios dos governantes em contextos de
l\(,,1<) de acordo com o status, contextos religiosos, econômicos, militares e fami- Daí resulta aquilo que podemos estudar no processo de eleição e que esses
liuu:s. E, correspondentemente, o controle social da soberania é transmitido pelo processos devem realizar: têm de ser especificáveis como funcionais e separáveis das
cuidado com os outros papéis próprios dos governantes. O governante fica poli, outras relações de papéis; têm de poder produzir incerteza e alternativas, de acordo
ti(.ltllente imobilizado pelo fato de que os cuidados econômicos, militares, reli- m a complexidade necessária; e têm de conter uma norma reguladora de apoio e
i\iosos c familiares também Ihes levantam restrições. Por isso ele é independente do controle, que permita que estes problemas sejam decididos. Essas são condições que
"I ('conhecimento" dos seus subordinados, na medida em que este é preservado pelo podem ser preenchidas de acordo com a nossa concepção teórica geral do tipo de
1('01' dos papéis. Não há necessidade de quaisquer processos legais que devam as- sistema do "processo jurídico"; e, realmente, pode ver-se que o processo legal da
Sl'j.\lllar esta adesão (5). eleição política é institucionalizado respectivamente a estes requisitos funcionais·(8).

O progresso social decorre, em geral, de acordo com a diferenciação crescente


dum sistema parcial, especificamente político, a partir dum alistamento atributivo 6 Também especialmente para os papéis político-administrativos David Easton: Political Anthro-
pology (Antropologia política). Editado por BernardJ. Siegel em: Biennal Review of Anthropology 1959
(Revista bienal de antropologia 1959), Stanford, Cal., 1959. pags. 210-262 (244 e seg.(; MarionJ. Levy
),.: Modernization and the Structure of Societies. A Setting for Internacional Affairs (Modernização e a
estrutur a das sociedades. Um ambiente para relações internacionais). Princeton 1966, vol. 11. pags. 440
4 Siegfried F. Nadei: The Theory of Social Structure (A teoria da estrutura social), Londres 1957, t' segs.: Reinhard Bendix: Nation-Building and Citizenship. Studies of our Changing Social Order (A
I'.III~. 77 c scgs .. tornou clara a significação especial desta forma de alistamento para a consistência dos criação duma nação e a cidadania. Estudos sobre a nossa ordem social em evolução). Nova Iorque-
~1~1t·,n,lssociais. Londres-Sydney 1964. pags. 115 e segs.
Os "Jl' ocessos" de dctci minação da sucessão nas sociedades primitivas, que não conhecem uma 7 Comparar aqui. de forma contrastante, com Meyer Fortes: The Structure of Unilineal Descem
dC'Nillll.,~,I()fiXd, b('rvrm muis (10 domínio duma incerteza momentânea surgida "por acaso", pela perda Croups (A estrutura de grupos de origem unilinear), American Anthropologist 55, 1953, pags. 17·41
cllI un(r, io\ !\HVC-lIlunlc'.dll I(\lC' ~ li" te.a sistemática e política de consenso. Isto já é visível no fato de (36); Nadei. op. cit. pago 63 e segs.
111.1111(-0.1I\llt\,1c'1'11\~C-II"'cllI~"" 1111,-(inH'I1IO. Além disso estes processos quase sempre constituem soluções 8 Que também nas democracias modernas com sufrágio político. com sistemas pequenos e primitivos
!t,,"
11I'III'·"lIlIcI.,~cllI~ 1',"1110-""," r I(lIr 111111111'mal. Ver, por exemplo. Aidan W. Southall: Alur Society. que combinem pessoalmente papéis de tipo mais antiquado, se tenha ainda que contar com planos
A S,"tly 111I'llIt c·.,,·•• ".tI I YI"'" 111111111';11.,111111 (A sociedude alur. Um estudo sobre os processos e tipos locais mostra-o James D. Barber: The Lawmakers. Recruitment and Adaptation to Legislative Life (Os
011'"'0111111111), (:.01,,11111111",
1"111.11•.•••'. I"'I~, I"I~' !ir. (' 8C'1\5,358 c scgs.; I. Schapera: Government and legisladores. Alistamento e í'daptação à vida legislativa). New Haven-Londres 1965. pags. 116 e segs.
1'••11110.'li 11\1••01."" 11'11'. (n"~l'II'" 1'"llt1,,, 1'1" .II,I,-dncl(·s uibais), Londres 1956, pág. 50 e segs, 58,
usta-Ihes, como conseqüência das vinculações pessoais e que contundem os papéis, realizar o alista-
1111, t' 11 '!II'1 1'1'11 W I\illll' 'I ",tll,,,,,1 11,,· M,,,I,·, 1111.'"01101 ,I Burcaucratic Polity, Honolulu 1966,
""M" ,I!.!, •• li' I." k 1"""ly: I >.111'" '1,"" A.,,," "M"1111 11110,,·(A Nllt(·".iO nos altos cargos). Cambridge,
mento da assembléia legislativa nos trâmites dum conflito eleitoral. Os seus deputados são "mobilizados"
por motivo de vinculações não-políticas c papéis e aparecem no parlamento corno relutantes. Compar.u
11I1\1.00'I,.,.I'II,li também com Niklas Luhmanu: Grundrer hu' ais lnsriuuion. Op. eir., PJII If,!), noiu [d.
154 ELEIÇÃO POLÍTTrA E LEGISLAÇÃO
ELEIÇÃO POLÍTICA 155

A distribuição de papéis e a diferenciação do processo legal de eleição e, con- (I~ critérios próprios. Portanto, a comunicação não se rompe, tem, sim, de se inten-
juntamente, do sistema político numa limitação importante do sistema, são garan- silicar. Com a independência da política cresce também a sua dependência da
tidas principalmente por meio de três princípios, segundo os quais se organizam sociedade - um fenômeno poucas vezes compreendido no debate sobre a "sepa-
hoje as eleições políticas livres, designadamente (1) mediante a universalidade do ração entre estado e sociedade" - pois aumenta o número de alternativas sobre as
acesso ao papel de eleitor para toda a população (excetuando as restrições de base quais se tem de decidir, mediante a aquisição de influência.
funcional para menores, incapacitados, criminosos), (2) através da igualdade de
peso dos votos e (3) mediante o segredo da votação. Na base de todos estes prin-
cípios está a abstração e individualização dum papel do eleitor no sistema polític- ,
Daí que a segunda função essencial do processo eleitoral seja formar alter-
portanto a sua substituição por outros papéis sociais e compromissos (9). O pensa- nativas e mantê-Ias em aberto. Institucionalizar a eleição como processo legal tor-
na-se conveniente na medida em que se conseguem reproduzir oposições neste
rncnto de igualdade que ela comporta não é uma expressão dum estado real das
processo e solucionar conflitos. Só assim, mediante a criação do sistema, se podem
coisas da "natureza" (todas as pessoas são iguais), nem uma expressão dum valor
abrir e generalizar novas fontes de motivos, enquanto que as "eleições" unitárias,
dado e a realizar (todas as pessoas devem ser tratadas com igualdade), mas sim
não-conflituosas, para participar num cerimonial de adesão, dependem da mo-
dum princípio de indiferença e de especificação de motivos: todas as diferenças
tivação já ter sido assegurada anteriormente. Se esta abertura de alternativas con-
podem ou devem ser ignoradas respectivamente, exceto aquelas que se podem trárias for mantida até ao final da eleição em curso, então têm de apresentar-se ao
basear adequadamente numa relação específica de funções (10'). O acesso à atuação eleitor premissas diferenciadas de .decisões futuras nos candidatos - quer pelo fato
política no papel de eleitor e os seus efeitos situam-se independentemente doutros dos candidatos mostrarem ao eleitor o seu verdadeiro perfil como indivíduos, e
p''I)éis sociais e o tipo de decisão como eleitor não precisa de ser justificado em prometerem impor-se; quer por se identificarem com promessas heterogêneas; quer
011 li os contextos sociais, pois goza da garantia do segredo (11). O contexto político de
ainda por fazerem parte de diversas organizações, que se distinguem umas das
d('cisão consegue, desta forma, uma certa autonomia e indiferença perante outros outras. Finalmente faz parte deste padrão que cada vitória eleitoral só tem impor-
.unbiios da sociedade. Isto significa o não-isolamento da política dentro de si tância provisória, pois as eleições repetem-se periodicamente, de forma que os que
IHópria, o não-estabelecimento dum novo poder de decisão arbitrário, mas sim foram derrotados não enterram as suas esperanças, antes têm de as adiar. São con-
uma variabilidade determinada, independente da política em relação com outros siderados como adversários .
•unbitos da sociedade. As alterações num campo também não determinam, au-
A criação e conservação duma complexidade indecisa e contraditória é uma
romaricarnente , as outras: acontecimentos na economia. na ciência. na vida fa-
realização social extremamente difícil, pois os sistemas sociais, tal como os sistemas
miliar , não têm eoipso determinadas conseqüências políticas ( 12); quando muito. psíquicos, tendem normalmente para urna redução imediata de todas as incertezas
('I iam problemas e motivos na política sobre os quais se pode decidir de acordo com
e não vêem as vantagens, a longo prazo, duma complexidade elevada. Por isso não
se deve nutrir a ilusão de que este problema só pode ser resolvido através da admis-
" '·.montra-se esta interpretação do sufrágio político livre em Srein Rokkan: Mass Suffrage, Secret são do pluripartidarismo e de listas concorrentes. Mesmo a concorrência pela mes-
Vormg anel Political Panicipation (Sufrágio em massa. voto secreto e participação política). t:uropais- ma coisa - por exemplo o acesso a determinadas competências de decisão - leva
,lll's Archiv für Soziologie 2 (Arquivo europeu de sociologia 2). 1961. pags. 132-152. Conferir também a uma assimilação, e não a uma diferenciação, das estratégias e das obrigações do
'0111 a obra do mesmo autor: The Comparative Study of Political Participation. Notes Toward a Pers-
programa. Nos sistemas pluripartidários encontra-se, por vezes, que o mecanismo
''''( [IV,' on Current Research (Um estudo comparado da participação política. Notas para uma perspec-
tiva sobre a investigação corrente). Editado por Austin Ranney em: Essays on the Behavorial Study of eleitoral de forma alguma absorve os conflitos e o êxito eleitoral fica, praticamente,
Polulcs (Ensaios sobre o estudo behaviorista da política) Urbana. Ill .. 1962, págs. 47-90 (66 e segs). sem conseqüências, pois nem as pessoas, nem os programas, nem os partidos se
podem diferenciar. O processo legal consegue até gerar incerteza, mas a incerteza
10 Quem mais se aproxima desta interpretação do teorema da igualdade é Luhmann: Grundrechte
permanece em primeiro plano como a dramaticidade artificialmente organizada
.01, I"••itution. op. cir.. pags. 162 e segs.
11 Q,Il' " garantia do segredo eleitoral. primeiramente. e também hoje, não funcione neste sentido
dum acontecimento desportivo. Pelo menos num aspecto também falha a diferen-
,'11' .dl(tll'b países em desenvolvimento. ensina que também esta instituição pressupõe um ponto especial ciação do sistema político, devido à confusão entre política e conversação.
d, d""'IlvolviIllCf,tO da sociedade e a capacidade de o utilizar. Onde ele não exista. por exemplo na Cada tentativa de garantir a complexidade do sistema político só através do
1',,,,,,., .ig rárin do século XIX (aí as eleições para a dieta foram públicas até 1919) ou na América do mecanismo eleitoral e de levar na própria eleição a uma decisão, leva a um dilema
~"I do ,(" \110 XX, O latifundiário pode contar com tanta certeza com os votos dos seus trabalhadores que inevitável: por um lado tem de se evitar que as frentes compactas de conflito, que
1'",,," li', onu-uda r uma ampliação do direito de sufrágio. Este exemplo ensina ainda que os três prin-
,11'111',ú podem lunc ionar em conjunção uns com os outros: a perda dum corromperia os outros.
sempre .predominam .na sociedade, sejam simplesmente prolongadas para o sistema
político, Quando os católicos e os protestantes, os trabalhadores e os capitalistas, os
I') 1\ 1"'S'Ioi,.1 r-mpíric a eleitoral, por exemplo, nem sequer pôde averiguar as correlações evidentes
("111 li' oS J' ()lItt'lIlIWnw\ "«lIlúmi«» ,. a condura política do eleitor, mais ou menos no sentido de que.
pretos e os brancos, se opõem já em todos os.papéis (13). não se pode dar ainda ao
,1111'" M' "",I.- su put , IIJ" 'I i,,'s '" o,,"miras aumentam a atividade política e os interesses dos eleitores.
13 Esta situação é muitas vezes designada com uma expressão originária da sociologia neerlandesa
(:11111<-,"'''1'" ""11 1{,,!lI"1 I'.. 1.11'(" 1',,1<1 H .11l.dc' Whv People Get Involved in Politics (Vida política. A
"ernpilharnento" da sociedade. Conferir com Georg Geismann: Politische Struktur und Regierungssys-
loIfilO 1'''' '1'"' .•• ,••.••" .•• " "11\·••1V1"1" C"l1I1'"II(II,,).C;I'·IH"oe. 111. 1959, pags. 329 e sego Por outro lado há
tem in den Niederlanden (Estrutura política e sistema de governo nos Países Baixos) ..Frankfurt/Mena-
l"U'Jil!$ d" '1"1' 1\ IIIMH"lhlll,il I fllll"'IIIII'il pudl' 1\1\'ClIC'II'1 u'ndt'ndtls para uma radicalização política, pelo
111t'111I" " •• I.. 1 1111111.1;", dl~IIII'II!JII" lu It'II If'" , V"I, IIIH l'lu'mpln, Marrin Trow: Small Businessmen. Po- Bonn. 1964. pags. 85 e segs. com base em J. F. Kruijt: Verzuiling, Zaandijk 1959. Para o prôprio
1111.',11 1111, 1.1111 f~ ;!illl '1111'11111 11II j\1t ':"'lhy (h pnl'u'1I0\ t',nprt'"üio\ Tolerância polít ica e apoio a problema consultar também Seymour M. Lipser: Soziologie der Dernokratie (Sociologia da democracia),
~I, 1;,11li,) I. I I,,' 1\1I11'd,ill' JIIII,",tI iJl S'I[ i"I"IlY li I I'I',H 1"'1\' ~70 lIHI. M.,," i«· Zeirlin, Economic In- versão alemã Neuwied-Berlim 1962, págs. 18 e seg .. 77 e segs. O conceito de "isolative political culture"
,., 111111,11"I 11,,' 1',,111i. I' i i\ Iltllldr. 1'1 I :,Ii ,,!li \\"" ~t·,. (I ""'11'" ,1I1~,'("'""f>III1C.1 (. ,IS.uuudes políticas dos (cultura política isolante) parafraseia um fato idêntico em Gabriel Almond/Sidncy Vrrh.\ 1'))(' Civi,
""1".111111111 •• ",,1,,,,1,'" i\iliI"'(III,htill:"nMhllll(l\l!'w~1 1'lIili.II.'II' 1', r,l Culturc. Polirirnl Auitudes and Demoi r ac y in Five Nations (/\ cult ur a dvir.1 Alitlul"A ",,111;,.'~ ,. ,I.
m()(f,'(I,' em (I til 11Il.,~i)('~). 1'1I1l('II>II, NJ l'lh~
136 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO ELEIÇÃO POLÍTICA H7

seu conflito uma expressão política. Isso intensificaria o conflito, politicamente A posição da eleição política, fora da própria gerência dos interesses, aponta
manipulável, e endureceria os antagonismos sociais de tal forma, que se tornaria para uma diferenciação funcional interna do sistema político, que é produzida jun-
agudo o perigo de guerra civil. Por esse motivo as frentes multifragmentadas de lamente por meio do processo eleitoral. Assim, após a discussão da diferenciação
conflito são condição essencial para uma politização inofensiva de conflitos sociais. da complexidade própria do processo eleitoral, chegamos a uma terceira carac-
Só quando a sociedade já é suficientemente complexa, pode o sistema político ad- terística de estrutura: que os sistemas, quando duma grande diferenciação e duma
quirir uma complexidade própria. elevada complexidade própria, têm de se diferenciar internamente e preparar ins-
Por outro lado, mesmo sob estas condições, os temas de conflito social são tão rituições específicas para funções específicas como o alistamento e o apoio. Pela
numerosos e as condições de apoio político tão flutuantes, que as conjunturas de instituição da eleição política, os processos de recrutamento, concessão e respecti-
varnente recusa de apoio político, são, por um lado, separados daqueles que re-
interesses nas eleições já não podem ser expressas. Tem de se calcular tipicamente e
nuo por acaso, que interesses opostos apóiem os mesmos candidatos e os mesmos in- presentam interesses e, por outro lado, da participação de reivindicações - uma
(('lesses apóiem candidatos opostos. Os interesses realmente motivadores já não se instituição que contribui para a criação dum poder legítimo autônomo dentro do
podem agravar numa ou em várias alternativas programáticas mas são, sim, arnal- sistema político (17). Esta separação entre eleição política e imposição direta de in-
~amados nos partidos, mediante processos internos de pré-seleção e desintensifi- teresses absorve conflitos da seguinte forma: em primeiro lugar, na eleição são dis-
ração e apresentados aos eleitores apenas sob a forma dum programa ideal, do tribuídos apenas lugares e competências e não, simultaneamente, a satisfação das
tl~1 <Ido geral. O processo de eleição política dificilmente se presta a deixar decidir necessidades.
os conflitos sociais básicos através do "próprio povo" (i4). Mas presta-se a trazer es-
tl'S conflitos para dentro do sistema político, em vez de os levar para fora. Tem de A eleição política não se presta para a expressão de interesses concretos, como
SC'I compreendido como o primeiro grau dum processo escalonado de absorção dos tão pouco para a decisão de conflitos concretos. O ato de comunicação nela ad-
( ouf liros. mitido restringe-se à entrega dos votos para um candidato ou uma lista, portanto à
cooperação dum preenchimento de papéis e à expressão do apoio político numa
Pois onde apenas o fato de ganhar as eleições leva ao poder legítimo e perdê- forma altamente generalizada. Os motivos para esta decisão podem ser inteiramen-
I.IS significa perder o poder, os partidos tém de se colocar perante os conflitos te deduzidos do âmbito dos interesses. A comunicação entre as esferas de interesses
kO( iuis em aberto e que carecem urgentemente de decisão. Senão durante, então e o apoio político não é, pois, de nenhuma forma impedida. Ela é até estimulada,
,II\(('S ou depois das eleições, têm de procurar vias para reconciliar mutuamente as mas atravessa uma série de filtros com o resultado de só se realizar uma comuni-
I'xi~('ncias diferentes, contentar umas e outras, reformá-Ias ou desviá-Ias para uma cação abstrata e os eleitores já não se ligarem mais a interesses específicos (18).
11I clevãncia política - quer mediante processos de compensação, ou de acordo Naturalmente falta não só o compromisso jurídico com um "mandato imperativo",
p'lItidário interno, quer através de negociações interpartidárias de coligação. Para que seria pressuposto como uma organização corporativa do eleitorado, como tam-
I'SSI' trabalho sobre os conflitos a incerteza, gerada pelo processo eleitoral, constitui bém a possibilidade de reconhecimento dos interesses constitutivos. É igualmente
uni H força motriz essencial insubstituível (se bem que o próprio trabalho não se incerto o cálculo das probabilidades de contra-eleição. O político vê-se como que
I('alilc naturalmente "dentro do processo"). A conservação e aumento dos votos dos' forçado à liberdade de decisão. A indeterminação da sua situação de decisão é
ek-itorcs serve-lhes de finalidade suprema e critério último de decisão (13). Este ob- gerada para a conservação da complexidade do sistema político no processo
;I'livo alua como se fosse uma fórmula de reserva para a complexidade política eleitoral e tem, então, de ser detalhada em outros contextos de papéis e canais de
/o(lobal, que não deve ser concebida diretamente e elaborada. Nesta versão secun- comunicação (19). Ela remete os eleitores para os contatos com os representantes de
l""lia c desviada, os problemas políticos, apesar da elevada complexidade, podem
SI" aprofundados e convertidos em decisões. O processo eleitoral não regulamenta
C'~lt' trabalho mas institucionaliza os seus objetivos, incluindo certas condições
M'! undárias (16). Uma conseqüéncia desta análise seria a reivindicação de maior
publicidade e facilidade de acesso dos conflitos partidários internos e dos processos 17 As possibilidades de elaboração deste pensamento resultaram. sobretudo. do emprego do modelo
dI' decisão. de imput-output nos sistemas políticos, Para a separação entre "supports" e "dernands'' como funções
diversas do input, comparar sobretudo com David Easton: A Systems Analysis of Political Life (Urna
análise de sistemas da vida política). Nova lorque-Londres-Sydney 1965, pags. 37 e segs. e agora tam-
bém Gabriel Almond: A Developmental Approach to Political Systems (Um enfoque do desenvolvimento
dos sistemas políticos). World Politics 17 (Política mundial 17). 1965, pags. 183-214,
II Aliâs, CSI{' ~ um dos motivos pelos quais não pode haver nenhum domínio da maioria mas apenas;
18 Para este "funnel of causality" (funil de causalidade) conferir com Angus Campbell/Philip E.
\111.1<>
O ••hl r.io \WIlI {o, •••ul". (01'. rit . pago 132) um domínio da minoria.
Converse/Warren E. Miller/Donald E. Stokes: The American Voter (O eleitor americano), Nova Iorque
I', A (·I.t1"" .,~lIo "',IIN \11111,,·,,<1.1
<I"NC,'printlpio de decisão é a de Anthony Downs: An Economic 1960, pags. 24 e segs. e a interpretação como generalização do apoio político em Talcott Parsons:
11"·,,,y (11)"111°' ,.HY (11"1>' "'11111' "'"I1(IIt1"d ck dt'IIH)(,aria), Nova Iorque 1957. "Voting" and the Equilibrium of the American Political System (Votar e o equilíbrio do sistema político
110 I' ti,· ,"",,,1,·,,,, '1"1 M 1""1.1 .'1 "'·II·"~.111•• 11111,rMfc'Mo das relações de valores, normalmente
americano). Editado por Eugene Burdick/Anhur J. Brodbeck em: American Voting Behavior (Compor-
lamento eleitoral americano), Clencoe, l l l . 1959, pags. 80-120,
vdllll., •. i>III~li< I"" IId" •. '''1111.'' i'"'"'III" 1\ V.""'I ••~1111 ~Ih tld 1(1',,01,nao procuram os VOtOSdo eleitorado
lU" ,~t\l." ti.' P' UN' I'nu ••• 1ft. I 'l,'ulult)), III:'~" 111111"111lIilU, u, IHUI(II"Ud~ pUI causa de ganhar as eleições. 19 Que mesmo então seja problemático um mandato imperativo. porque não é compatível com a
IJIIIII ",I '01'111':111 01., 11111',11 HoI'_liv~ \,H'UIII"lI I"" .,'11 l••tllI 11111.1 ('Irv~",\ 11I,'(Ii(1.1dI' diferenciaçâo do generalização necessária do apoio político. mostra-o de forma bem clara Christoph Müller: Das im-
1~11'I1\j.1 1'"11I"~'1 ""IU phtll'-! IIUIIII.Hi\1I ti ,1)tIIHI.-I.~ 111111 11 I'I'p~'h. pOli. dt, 0"",1
1 fCHlnil.l pulfti(" "fiO perativa und freie Mandat. Ubcilcgungcn LUr Lehre von der Reprâsenration des Volkes (O mandato im
1",,1, 11" '''1" ••1111"'".\ 'l!tiW '1''''111''. '"I \,~,í"!,ji"1\", .,,,, •.11'" p("ativo I' tl nl;\otl.H() livre. }{(,nt'x,k~ ~Obl('.I II'mi,\ d.1 , ••pfl'R(·nt.,~;iO (lu povo), 1.1·idrn I!}(ih
1'8 ELEIÇ!\O POLÍTICA E LEGISLAÇÃO ELEiÇÃO POLiTlCA 139

interesses importantes e com grande número de votos e para a consideração de da adesão dos interessados (22) (sendo então obrigadas a simular a adesão dos não-
"sintomas" da suposta vontade eleitoral, como eleições complementares, eleições aderentes) (23). Perante isto, a expectativa duma troca de reconhecimento contra
locais, declarações da imprensa, levantamentos de opinião, Tudo isto são ajudas de influências é de refutar duma forma mais realista, mas também, por isso mesmo,
orientação que d-ão, até, estrutura, mas não aliviam o peso da decisão: apenas o duma forma mais empírica. Já quando do tratamento dos processos isolados de
suavizam, tornando-o suportável. Uma permuta concreta de exigências de interes- aplicação jurídica tínhamos tido a dúvida de qual o ponto em que se justificam tais
N('S contra o apoio político na eleição não é possível sob estas circunstâncias, ou en- esperanças de participação, Isto só é válido aqui. Esta tese desconhece o essencial: a
rao é muito difícil (20), complexidade da transmissão entre a influência concedida e a decisão a aceitar,
Esta transmissão é tão indireta e tão incompreensível que não se pode estabelecer
Uma tal separação estrutural do apoio e reivindicação pela distribuição por emocionantemente uma relação, nem calculá-Ia racionamente , Por que motivo é
diversos papéis e vias de comunicação leva, pOIS, a um compromisso direto e de que uma pessoa sensata deve levar o seu carro a uma revisão, por que motivo deve
unobilização recíproca das negociações auxiliares satisfatórias e cria-se um âmbito desistir dum projeto de construção planejado, por que razão deve deixar-se vacinar,
d(' decisão relativamente autônomo, mediante uma relação de permuta fortemente pagar impostos, etc. só porque de vez em quando pode marcar com uma cruz o
f.:('lwralizada através dum apoio conferido globalmente contra a satisfação em seu boletim de voto?
/0:('1 al , (21) À vista do público esta diferenciação de .papéis aparece como um des-
dO!>1 amento das vias de contato com a política, Há dois caminhos abertos para o A legitimidade não pode ser considerada como algo mais do que uma relação
indivíduc: num deles, o do eleitor, ele tem uma influência garantida, ainda que jurídica consentida e também não como assunto de cálculo de vantagens indivi-
nnnima , sobre a política, mas sem capacidade de ampliação, sem poder promover duais; e mesmo uma opinião que se desligue do sentimento individual de valor,
vuficienternente os seus interesses específicos. No outro, ele pode expor os seus in- ou das condições sociais de "interiorização" pessoal, não chegaria ao essencial (24),
1I't('~S('Ssobre contatos pessoais e intervenções, cartas de leitores e outras publi- Os mecanismos psíquicos deste tipo tornam-se pouco seguros perante tão grande
I.it;f)('s, petições, consórcios de interesses, demonstrações, etc., e devido ao gasto de complexidade e variabilidade da organização social. Uma teoria sociológica da
umpo c dinheiro pode promover o seu aumento, mas tem que deixar aos outros a legitimação através da eleição política considerará que são mais decisivas as es-
dl'( isào , Ambos constituem tipos de influência que se diferenciam ainda do papel truturas do sistema do que a anterior investigação eleitoral e atribuirá legitimidade
d.lq\lelc que recebe a decisão, Esta disposição contrasta extraordinariamente com a ao sistema social (25) e não ao uso de experiências.
.llllif.:<l relação unitária hierárquica e funcionalmente difusa entre a autoridade e o
-ubordinado . Onde reside aí o progresso e o que se alcançou com isso para a le- A grande diferenciação de papéis constitui um indício extraordinário desta or-
Hil imacão da decisão política? ganização do comportamento político formado através do processo eleitoral e o
efeito mais importante desta diferenciação é a transmissão psíquica da decisão do
Podem distinguir-se três estádios na resolução deste problema: as teorias eleitor (26). Cria -se, assim, uma situação que neutraliza a influência das estruturas
polliicas do direito natural, que têm ainda presente aquela relação não- sociais sobre o sistema político, ou que, pelo menos, as dispersa. Não se exclui que
dill'll'nciada entre autoridade e subordinado e, portanto, uma unidade não di- as experiências do indivíduo com o sistema político, ou em outras esferas de papéis,
1I'It'I\ciada de temas, podiam imaginar leis jurídicas verdadeiras apenas em virtude da sociedade refluam para o sistema político, na medida em que motivam as de-

22 Consultar, por exemplo, Emmanuel Kant: Metaphysic der Sitten (Metafísica dos costumes).
Parte I: Elementos meta físicos da teoria do direito, § 46 (c.tação de acordo com a edição da biblioteca
filosófica. Leipzig 1870, pags. 152 e segs.)
li Isto mostra-se, por exemplo, no fato de que os consórcios de interesses dificilmente se encontram 23 "L'absurditê de Ia consêquence" (O absurdo da conseqüência), comenta Guizot: Histoire des
"'li ~iluaç~o de sancionar efetivamente as suas exigências através da conduta eleitoral. "When pressure origines du gouvernament répresentatif en Europe (História das origens do governo representativo na
I('IIIIP spokesmen threaten reprisal at the polls, thireaten as one unwisely does now and then, they are Europa), vol I, Bruxelas 1851, pág. 80 "n'a pas toujours fait abandoner le principe, mais elle l'a toujours
IIHII.llly pointing 1n unloaded gun at the legislator" (Quando os porta-vozes de grupos de pressão fait violer" (nem sempre levou a abandonar o princípio. mas levou sempre à sua violação).
,1HH'a~,,," rcpresâlias nos sufrágios. como se faz erradamente de vez em quando. estão geralmente apon-
24 Comparar com a pags. 117 e segs.
1.\IIdu uma arma dcscarregada ao legislador), observa V. O. Key Jr: Public Opinion and American
1)\',,")( ,,'<y (Opinião pública e democracia americana), Nova lorque 1961, pág. 522. Para o mesmo as- 25 A pesquisa sôcio-psicológica corrente sobre comportamento do eleitorado tem estruturas SOCiaIS,
HUlltHronsult a r t arnbém Lcster W. Milbrath: Lobbying as a Communication Process ("Lobismo" como como diferenças de status social. de educação, de profissão. de raça. da situação econômica, natural-
'"11 lI",io (\(o r omuniruçâo), Public Opinion Quarterly 24 (Revista trimestral de opinião pública 24), mente não consideradas, mas ela não as considera como estruturas de sistema. O seu ponto de vista con-
1%1) p.1KS ~2 r)~ Comp,lIa' t arnbém com a obra do mesmo autor: The Washington Lobbyist (O "lobis- siste em poder prever as decisões do eleitorado através da pergunta sobre os fatores determinantes duma
I••" ti., W, •• h"'l\ton), Ch,( ,'1(0 I!)h~ ,. aind •• Raymond A. Bauer/lthiel de Sola Pool/Lewis Anthony Dex- conduta individual de decisão, de estrutura simples (e por isso favorável à investigação), comprometida
t.·, 1\IIII',i"," III10i",,, ,1"tI 1',,10111l'olilY 'lIw Politics of Foreign Trade (Empresariado americano e com um objetivo prático. Ver, como continuando a ser a melhor exposição, Robert E. Lane: Political
1'"111•• ,, "NI •• I.1i 1\ 1'"lItll" 01",,,,,,(,,, ". ,·xt"'"I1). Nov •• loHIUC 1963, pags. 433 esegs. Life: Why People Get Involved in Politics (Vida política. A razão por que as pessoas se envolvem em
política). Glencoe, 11I. 1959, e como o mais recente ponto de vista e também com outras referências
bibliográficas. Nils Diederich: Empirische Wahlforschung. Konzeptionen und Methoden im interna-
tionalen Vergleich (Investigação empírica ele.coral. Concepções e métodos em confronto internacional)
Colônia 1965.
26 Este fenômeno (', aliás. confirm ••do através da pesquisa eleitoral mencionada na nota anterior,
ainda '1UI' I) M'U illl(''''"o' !l' il\o,l'.oI ~.' ti" Jja em romplera I)po,iÇ;iO à d(·srolll'rI.1 das c1rp('IHltnrÍIIN MlI 1.1;'
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140 ELEIÇÃO POLÍTICA 141


ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO

cisões de muitos eleitores isolados; mas cada um é como que sobredeterminado, isso, porque não sabe como a tratarão as pessoas a eleger, se da mesma forma que
anteriormente os eleitores a tinham tratado. A eleição converte-se num mecanismo
medidante um grande número de papéis. que lhe proporcionam experiências po-
liticamente valiosas, tornando-se assim iivre para eleger. Se ele elege como católico por meio do qual o sistema político se auto-sanciona e a decisão político-
ou como mineiro, ou se exprime' a sua crítica sobre determinadas decisões, sobre o administrativa do passado confirma ou rejeita,
101'UI>O que está no poder; ou se ele reage mais a uma situação ridícula de política Não obstante , o comportamento do eleitor continua a ser influenciável, pois a
externa ou a fracassos da .politica econômica: se ele, nas suas próprias preferências história não determina o futuro. A casualidade da decisão do eleitor também pode
políticas, prossegue uma tradição de família ou age em oposição a ela, se é influen- ser reduzida pela atividade dos políticos, que, nas suas tentativas de exercer in-
c iado pela propaganda eleitoral correspondente. ou leva a cabo o "ponto de vista" fluência, vinculam crítica e promessas, orientação histórica e planejamento. Uma
adquirido na' conversa informal, é-lhe facultativo. Há mais causas do que possi- casualidade influenciável , carecendo de redução neste sentido, devia constituir um
bilidades de decisão, de modo que se torna inevitável um processo de filtragem. momento estrutural que se revestisse de grande importância para a conservação da
Nisso reside a participação do eleitor na redução da complexidade polírica. Nesta complexidade elevada e autonomia do sistema polírico. Que com isso se tivessem de
hiperdeterminação existe uma certa contingência para o sistema político. tomar riscos, que não fossem inferiores aos da positivação do direito, é mais do que
evidente (29), Estes riscos são, no fundo, os perigos da perda de complexidade, do
É igualmente importante que esta capacidade de redução se efetue num papel, retrocesso para formas drasticamente simplificadas do manejo de experiências e do
espccffico, cujo desempenho não tenha quase conseq~ênçias para a existência em comportamento, por classificações categóricas exclusivas e finalmente para uma
f.:/'ral (27). Esta falta de conseqüências é condição prévia para que a atuação dos luta aberta. Pode agir-se contra esses perigos principalmente através da distri-
participantes possa ser traduzida num papel, apesar da complexidade elevada e buição da complexidade no sistema. Isso acontece na medida em que as situações
confusão das situações de decisão, e não apenas, como no caso da legislação, in- de decisão se diferenciam de acordo com os papéis mediante objetivos distintos,
I('!-Irada no processo sobre valores abstratos e identificações simbólicas, A atuação premissas distintas e possibilidades em aberto que se estruturam e se ligam, que
r orno eleitor não carece, portanto, de ser justificada. Não permite quaisquer con- permanecem para todos como a continuação das condições de decisão do sistema.
I'illSÜ{'S sobre quem é, aliás, 'o eleitor - se ele é, realmente, um bom pai ou um
Se se encarar o papel do eleitor no processo de decisão política como parte in-
bom marido, um experiente homem de negócios, um vizinho cuidadoso, um con-
tegrante duma estrutura tão diferenciada, torna-se evidente que ele sozinho não
vidado interessante. A atuação na eleição já não pode, neste caso, ser objeto de
pode ser fonte de legitimidade. Uma reestruturação de expectativas, e é esse o nosso
c onflitos sérios em outras relações de papéis. E é nesta medida que se torna facul-
conceito de legitimidade, não pode realizar-se sozinha mediante o fato do desi-
1.11iva (28). Com muito mais razão se pode agora tornar objeto de influência.
ludido se converter em participante no sistema como eleitor. E, contudo, o processo
nnancnte na própria vida política.
de eleição cria determinadas condições prévias e realizações parciais para o proces-
so de autolegitimação do sistema político, que investigamos. Tais contributos
Desta forma, a eleição, repetida periodicamente, converte-se num processo em
com todas as incertezas que se baseiam no estado atual da investigação empírica
quI' o sistema político se pode orientar pela sua própria história. Pode aprender a
podem conjeturar-se segundo duas direções:
I('agir a si mesmo e à sua ação na sociedade. É precisamente a situação supercorn-
plicada e confusa da eleição que sugere ao eleitor a satisfação da sua necessidade de A eleição política oferece uma oportunidade de expressão da insatisfação sem
I'Sl! utura através da história {e não atravês do planejamento) a utilizar, portanto, a risco para a estrutura, portanto, uma oportunidade duma atuação expressiva, que
história criada para redução dê complexidade no próprio sistema. O eleitor reage a funciona como descongestionante. Nessa medida ela pertence aos mecanismos de
'1.7 Com esta afirmação se distingue. essencialmente, a concepção aqui apresentada, da opinião absorção dos protestos.; tal como os processos judiciais também desempenham essa
pror-minente e conhecida defendida por Tocqueville, de que no estado moderno o indivíduo defenta co- função (3Q). Esta função expressiva de comportamento do eleitor não depende,
,tiO indivíduo concreto o poder cada vez mais centralizado do estado. Se se der atenção às estruturas para o indivíduo, do fato de que aquele que foi eleito ocupe efetivamente o cargo e
dllb papéis ver-se-â que não é este o caso. O que há é, apenas, um novo género de intervenção; a interven- possa influenciar as decisões. A contra-reação já é satisfatória e, de resto, o número
ç,lo através duma maioria de papéis próprios como eleitor, contribuinte, leitor de jornais, interessado,
de votos tem já valor expressivo e é digno de atenção como "sintoma" de alteração
queixoso, erc. COM os quais uma pessoa está filiada ao sistema político conforme a diferenciação sis-
u-mãric a e processual deste sistema. Não é a individualidade concreta que leva à mobilização do sistema da vontade eleitoral no sistema político (31).
pulllico, mas sim a possibilidade de parcelamento da atuação do indivíduo em papéis muito distintos,
sob exigências muito pequenas de consistência, Portanto, a personalidade individual não tem uma fun-
~.lo como princípio de consistência da sua própria atuação (como por exemplo na família), mas sim
como mecanismo, individualmente diferenciado, de assimilação de vivências, que rompe com a influên- 29 Conferir com Neil J. Sme1ser: Theory of Collective Behavior (Teoria do comportamento coletivo),
(I,' de.' outros sistemas sociais sobre o sistema político, de diversas maneiras, Nova Iorque 1963, págs. 180 e segs, sobre as condições prévias estruturais dos "entusiasmos" políticos e,
'I.H Confe) i, (Oll' E' win K Sc hcuch: Die Sichtbarkeit politischer Einstellung im alltaglichen Verhal- especialmente para os países em vias de desenvolvimento, Samuel P. Huntington: Political Development
Itl\. (A l'vidi'tltllI rl,, U",'IlII'~"O polh ica no comportamento quotidiano). Editado por Erwin K. and Political Decay (Evolução e decadência política), World Politics 17, 1965, pags, 386-430.
SII"'lId./Rlltllllt Wil,t.'II'",II'JI "li, /til S(lIi"lol{i,' der Wahl (Para a sociologia da eleição), caderno es- 30 Conferir com a pag 111 e seg.
""d," " " " d., II'V"'" II,I'''II •••r 1\0- ,,,"olol(i., I' psicologia social, Colõnia-Opladen 1965, pags, 169·
31 Um bom exemplo disso é -li reação sensível ao resultado eleitoral dos novos partidos nacionalistas'
•.• () 1,,(01"'" ~,III"" 10, '1,11,•• li ",I!t,fll' 111 "III'llIlII.\ das orientações políticas na vida quotidiana como
na República Federal. Votar pelos partiqos. desesperados, radicais, por exemplo, pode constituir, aliás,
\l1I'~"'Ij\f," 1,1 01""0,, ,'Mo ,'ltHIII ,,,), '" , 01•• ',III1IHIII.IIII(,'I\O, que procura no consenso aparente uma es-
uma participação completamente racional no sistema político. por exemplo no sentido duma advertên-
"I', i" ,k, "', ••,,,\ '.~l'(,,"i; 11'1'"' "'.'" ~ "'"11 ""'''''1i1~'1( i., d, independentiração funcional do sistema cia de que não se produzem alternativas suficienr ••s. Votar assim não custa, quando se pode estar certo
l'flI1I1111 (~fllllll .'1 1',-ntf1iLuu tj(lUil.O h~! t-,-,"'110 .IIIIHIt'UIH"f)C·" polftita, na vida quotidiana, se o sistema
de que o partido eleito não chegará ao poder, Para este assuntu consultar rarnbérn Lane , op. CII, 1959,
1'111111'"li:!" I",~.' ,lil,', i'," illll.), fi "J'~t'!!iI ~I'i!""'" 0(, "1.1 'li" mtltlli\ vivI'1Idi -quundo e enquanto não
pag. 309.
li'" ,t
142 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO 143
ELEIÇÃO POLÍTICA

A par destas desilusões da função de equilíbrio, o processo eleitoral permite, cificá-los em outros papéis de puro interesse) e descongestiona com isso o sistema
mediante a sua função única e isolada de separação, uma espécie de confiança político do compromisso direto com outros papéis sociais. Desta forma serve final-
negativa: cada um pode contar que os outros, como eleitores, estão na mesma mente para a absorção dos protestos. O resultado é uma extraordinária autonomia,
situação que ele, quando utilizam apoios de orientação e outros mecanismos psí- altamente operacional, do sistema político. Que as suas decisões encontrem con-
quicos diferentes dos que ele utiliza para chegar a uma decisão; eles não são, tam- tinuamente adesão, dificilmente pode ser assegurado através da organização de
bém, favorecidos pelos seus outros papéis. O mecanismo eleitoral como tal não eleições, mas um sistema político criado por meio de eleições pode conseguir tantas
transmite uma desigualdade social no sistema político (32). Naturalmente que ele alternativas que se pode autolegitirnar num processo seletivo de decisão.
não leva a cabo uma democracia, no sentido duma participação igual de todos no
poder, mas confere ao princípio da igualdade um lugar proeminente na base do
processo de alistamento político. Isso leva a que todas as desigualdades apareçam
no sistema como secundárias, a que não se consolidem na integração com a so-
iedade, mas antes se baseiem nos processos de informação e decisão que podem ter
de ser justificados, controlados e alterados.

Um tal. sistema de alistamento tem a possibilidade de aplicar o princípio de


IHlI.ddade também aos processos reais de decisão do estabelecimento do direito e de
;Il'li('tlC;ào jurídica, isto é, de exigir uma motivação de todas as desigualdades.
1'0(11', cruão , "com imparciaiidade", isto é, sem atenção às relações pessoais ou aos
IHIlIOSpapéis próprios do decisor, decidir de acordo com os critérios universais, es-
I)('('!liea e funcionalmente escolhidos (33). Que isso efetivamente Aconteça, natural-
IIIC'IH('não pode ser assegurado apenas através das eleições. Junto às condições
JlI€'viasdo meio ambiente, que têm de se realizar, as eleições não se devem conver-
11', ('111 far a e os processos de elaboração dos programas decisivos têm de aproveitar
I~ possibilidades no sistema político e realizar as que são apresentadas através do
111(I( ('SSO de eleição política. Pois só a forma de alistamento do órgão decisivo não
1\lll'M'IHa mais nenhuma garantia para a legitimidade desenganadora da sua
P' ()pl ia decisão.

1\ função do processo da eleição política (contrariamente a outras formas de


,IIIM.lIll('ntO)não reside, afinal, exatamente na orientação da indicação oficial dos
ohjl'l ivos para selecionar os melhores representantes do povo para os cargos polí-
111 O~, 1\ eleição traz, numa situação crítica, um contributo para a diferenciação do
"MI'll1d político. Proporciona a este uma complexidade elevada e uma indeter-
IIIÍII.I~.I()estrutural, e sobretudo uma certa impossibilidade de cálculo da situação
dl'l ,~iv" (orno estímulo para a construção interna do sistema e eliminação de alter-
u.u rv.rs. Assim o sistema político pode, portanto, adaptar-se às inúmeras neces-
~1I1.\dl's de Ilutuação rápida da sociedade. A eleição obriga, além disso, o indivíduo
,\ c,ll1l1inar por si um grande número de motivos possíveis de decisão (ou a espe-

~~ QUI' camadas sociais de status mais elevado, melhor educação, mais posses, habitando a cidade,
''I"I''CIlII'm uma COla mais elevada de participação nas eleições não deveria constituir um fator essencial
dI' 111iI'n'.I~,I() na pollrica e, aliás. não deveria impedir aquela confiança negativa, pois pode ir às eleições
'IlIlIlq"," UI1I,S(' sentir desconfiança.

I~ 1\1••\\ ,.1I111r('1II (, vúlld ••• 1 relaçao inversa c encarada dum ponto de vista histórico ela foi, possível-
""'''11', ., I"~I' <'li•.•" ,fi '1\1.111(10() sisrcm» polltico pode assegurar uma decisão puramente objetiva,
I'MIIIIIIIII .lth I'" di' I"" "'"VI' ••,aI, 11I1{\"11I os clreulos sociais dominantes renunciar ao preenchimento das
1""I~fII" Illld. illll'"II.IIIII" 1''''''' 'I'''~ "'1"""'''1,11111'', deixar o processo de recrutamento da eleição, res-
I'" IIV,Otll'lItt' .111 t,,., •• 1 p" ,·,thd d. tHllw 1.111'" ("\1)('( itlliJlldos em exercer meramente por influência de
1'.",('10 "1'''''''' No,,,, IIlnllll., "dl'~1 "",,111""1 111",dl'l.lú)(ICO (' dI' l(-tnicas de decisão de direito ocidental
t 0""1 11 HIII H"I~ 1IIIItIi'."1I 1'"'\1\0\ f~Mhll i.•1 IL. 1I1••dnull th'mO('1ílCia. Se a influência de posições não-
111111111 ,til 11., '1,_"11'1 11".t(' 011 dllli'IiII_"P
11'111dil "t·, i.H il'IIlUI
,'hill I"I.llltll 11111,_'111(';(,10 (k <h'cisão diacil.
1'111 I tll"lllJir~q,'-it~
A alteração consiste
•• pOli ;11110 1('ln (k s(', explicado, enquanto que
..
itlH'M .1._1
1_IJipli, 'Ii"lkl n\lltllllll""I'~t~u'" dtll tllIPtI jC'IH 1.1 dus dc\( i",ot(·~.
CAPÍTULO IV
Legislação

Que o processo parlamentar não se presta para a elaboração de leis já o sabia


Mill ( I),. o jovem experiente. Carl Schmitt procura tornar plausível que, com a dis-
cussão pública em busca da verdade~ o "espírito" e a "substância" sejam apagados
desta instituição (2). Nenhum dos processos aqui tratados pode deixar publicar
uma crítica tão forte sobre si quanto o processo da legislação parlamentar. Os ob-
servadores deste processo estão, geralmente, de acordo em que as decisões próprias
não podem ser abandonadas no processo parlamentar, mas sim realizadas através
dum pacto entre as forças políticas relevantes, fora do processo formal. O processo
jurídico não constitui, portanto, o próprio processo de decisão. Mas será isso uma
objeção contra o processo jurídico?

Parece que a critica ao parlamentarismo resultou duma expectativa falsa dum


equilíbrio do processo de decisão com o processo jurídico. Como ainda estabele-
eremos pormenorizadamente na parte seguinte sobre o tratamento do processo ad-
ministrativo, este equilíbrio mesmo assim fracassa. Já tínhamos visto que um
processo não pode ser compreendido como um ritual, como uma conseqüéncia fixa
de determinados passos. A moderna teoria da decisão torna completamente impos-
sível identificar processo jurídico e processo de decisão. O poder legal teria, aliás,
de se comparar ·a um programa de computador, teria de regular o resultado
cronológico dos passos da decisão numa relação firme de condições; isso signifi-
caria, porém, suprimir a separação do direito material e do direito processual. Até
mesmo a organização dos processos judiciais não regulamenta o processo seletivo da
criação e eliminação doutras possibilidades nem o próprio estabelecimento da
decisão mas sim, quando muito, a apresentação do estabelecimento da decisão (3).

Conferir com John SI. Mill: Representative Government (Governo representativo), Capo V (citado
de acordo com a edição da Everymans' Library, Londres Nova Iorque 1953. pags. 235 e segs.). Mas
o assunto não pára de agitar os ânimos. Assim, como exemplo duma geração mais jovem, Walter Eu-
chner: Zur Lage des Parlamentarismus (Sobre a situação do parlamentarismo) e Hans Joachim Blanc
/joachirn Hirsch: Zum Verhálmis von Verwaltung und Gesetzgebungsprozess (Sobre as relações entre a
administração e o processo legislarivo), ambos em Gert Schâfer/Carl Nedelmann: Der CDU Staat.
Studien zur Verfassungswirklichkeit der Bundesrepublik (O estado da União Democrática Cristã. Es-
tudos sobre a realidade constitucional da República Federal), Munique 1967, págs. 63·79 e 80·99.
2 Conferir com Carl Schmilt: DÍe geistesgeschichtliche Lage des heutigen Parlamentarismus (A si:
tu ação histórico- filosófica do parlamentarismo atual), 3. a edição. Berlim 1961.
3 Ai tem de dominar. sobretudo nessa ocasião, a clareza, se se pensa numa automatização do proces-
so de aprovação jurídica. Comparar com Niklas Luhmann:' Recht und Autornation in der 'óffentliche
Vcrwaltung. Eine verwaltungswissenschaftliche Untersuchung (Direito e automação na administração
11 pública. Investigação cientifico·administrativa), Berlim 1965, pags. 49 e segs.
146 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO LEGISLAÇÃO 147

Só quando se soluciona esta confusão e se separa ideológicamente o uso da infor- sim a sua distribuição no sistema, que pode ser alterada (que aqui não é o número
mação do sistema social, do processo legal, se pode perguntar qual a função do de votos mas sim a sua distribuição de eleição para eleição, respectivamente de
processo e investigar até onde os sistemas de processo jurídico influenciam o proces- processo legislativo para processo legislativo, que se pode alterarj re ). Esta regra
so de decisão. efetua uma simplificação artificial da avaliação do poder, que, sob circunstâncias
Para adquirir uma imagem clara têm, além disso, de se separar diversas re- muito complexas (especialmente as que têm uma multiplicidade de fontes de
ferências de sistema: o processo de legislação não se identifica com o órgão de poder) se converte na base fundamental duma atuação racional. Devido a uma tal
decísão, o parlamento eleito na altura. Também não é uma sessão isolada-e, ainda estrutura do sistema, o conflito é apresentado a longo prazo. Cada perda de poder
menos o conjunto de normas (constituições, leis, regulamento das sessões), que (perda de votos) leva, eo ipso, a um acréscimo correspondente de poder do adver-
rege o processo. O processo legal é antes, respectivamente ao nosso padrãogeral , o sário e vice-versa. Além-disso, as relações de poder são claramente quantificadas e,
sistema especial de comportamento que trata dum determinado método especial por isso mesmo, podem ser apreciadas, Pode, portanto, conhecer-se com ante-
da legislação e que prossegue o objetivo de elaborar uma lei e a pôr em vigor. O cedência e avaliar o resultado duma discussão controversa. Dificilmente há incer-
direito processual rege diversos processos, o órgão de decisão trata de diversos teza quanto ao resultado da disputa e isso permite uma cedência racional através
processos e mesmo numa única sessão são tratados, na maioria das vezes, diversos de representantes, cedência essa que pode ser fundamentada perante o represen-
processos, uns após os outros. Num tal sistema básico pode observar-se então, tante. Certamente o cálculo assim conseguido se aplica à situação do poder como
muito claramente, uma multiplicidade de processos que reclamam a atenção uns. tal, não à temática objetiva da decisão atual e, por isso, pouco contribui para a
atrás dos outros. Cada vez que se altera o sistema relacional estrito do processo, racionalização do processo de decisão, donde também para o processo legislativo
muda-se o tema, apresentam-se novos documentos, outros se convertem em ora- isolado,
dores proeminentes ou adquirem uma relevância de fundo, reagrupam-se adver-
S(jl ios ou partidários, torna-se relevante uma outra história prévia e a retórica tem Tanto teoricamente quanto na prática, não sabemos quase nada sobre as
de ser adaptada a um outro público. Cada processo legislativo constitui um sistema premissas estruturais do sistema dum tal compromisso entre poder e constância de
('111 si. repetição. O que é certo é que esta não se compreende fora da essência do poder,
só podendo ser criada artificialmente. ~ que lhe fornece as bases é o processo de
A diferença do sistema global em exercício constante e dos sistemas isolados de eleição política. Só porque a eleição se relaciona com o alistamento para um
I)\OCeSSOé condição prévia importante para a possibilidade de normalização do número fixo de lugares (e não um número de lugares dependente do zelo político,
conflito. Assim se pode garantir que uma orientação extensa acompanhe constan- da intensidade dos esforços ou de meios não-políticos), o poder político, desta for-
temente a consciência e que a conservação deste sistema global permaneça sempre ma, pode curvar-se ao princípio da maioria. Só porque a votação na eleição se
mais importante do que a solução de cada conflito. Esta orientação no sistema coloca, pelo seu efeito, sob uma condição nítida de "ou/ou" - ou o candidato as-
geral adquire realidade prática sobretudo nas regras de decisão formal de processo sume o cargo, ou não - pode formalizar-se a luta política pelo poder através do
legislativo: no principio da maioria. A sua função necessita, em primeiro lugar, de ato eleitoral. Permanece, entretanto, a pergunta quanto às circunstâncias em que
('srla rccirneruo , esta transformação abrange e reconstrói' o poder político real e quão representativos
A politologia clássica gosta de apresentar o princípio da maioria como uma podem ser, conseqüentemente, os processos parlamentares racionalizados sobre a
solução provisória e fundamenta-o pelo fato de que, infelizmente, não se pode al- votação. A análise do mecanismo de diferenciação da eleição política opõe-se,
lançar um consenso suficiente para uma decisão unânime (4). Uma tal caracte- ceticamente, às ideias clássicas de representação. A realidade parece antes terminar
Iilação de ideais inatingíveis não proporciona, contudo, muitos esclarecimentos na criação dum modelo para os sistemas processuais, que não pode ser construído
sohrr- o sentido próprio deste princípio e as condições estruturais de funcionamento, isomorficamente com precisão perante os conflitos sociais que deve solucionar, que
sob as quais ele pode operar. A função positiva do princípio da maioria reside cria, perante as forças sociais reais e díspares, o poder político puro e com ele
numa transformação do poder político. Se o princípio da maioria for institucio- bloqueia o acesso direto às competências de decisão. Em comparação com o
naliz ado como regra decisiva, todo o poder político, antes de se tornar legitima- processo judicial pode estabelecer-se aqui um isomorfismo diminuto e uma grande
mente eficiente quanto à decisão, tem de se submeter ao princípio da constância de complexidade e, supostamente, uma por causa do outro.
rcpctiçõo do poder (5). Com isso se afirma que não é a quantidade de poder, mas
O artificialismo e disparidade dos princípios da constância de repetição e da
maioria' só se torna tolerável porque nos processos legislativos se tem que dominar a

,CCln~lIlll\l, po, exemplo, Robcri A. Dahl: A Preface to Democratic Theory, Chicago 1956; Elias
111-'14 \)"11'0.1 ••\ Y .lIId ,lI(' M••jo.ily Pi inciple , A Study in Twelve Contemporary Political Theories 6 Para a possibilidade de análise teórico-interpretativa dos sistemas decisivos com a ajuda destas
(111'111111111( 111 r •• 1""1111'111 ti., II.,.i", ia, Um estudo sobre doze teorias políticas contemporâneas), Co- premissas consultar L. S. Shapley/Martin Shubick: A Method for Evaluating the Distribution of Power
1",,,It,'IIII" ll\hr, 'in A Committee System (Um método de avaliar a distribuição de poder num sistema de comissões) The
American Political Science Review 48 (Revista americana de ciência política 48), 1954, pags. 782·792;;
William H. Riker: A Test of the Adequacy of the Power lndex (Teste sobre a adequação do índice de
1\ 1'"111111"111,, .1. ••• " .• 'ttll.itlr! .•~•• Illlplit 11,11111'111". ('SI(' princípio como uma caraterística essencial
poder), Behavorial Science 4 (Ciência do comportamento 4), 1959, .pags. 120·131; e do mesmo autor:
d, )141ft. _ , tl.1t1. IIWII IUH 1IIIIdt 1,1 '·~,lil,,11 IIHillh I h n ('lU hipõteses. Consultar Niklas Luhmann: Klassis-
The Theory of Political Coalitions (A teoria das coligações políticas), New Haven-Londres 1962. James
,lu li ••11.1•• tI'l 1'11,"111. h.lllh itll; I 1',,1,",, ,"11 (I ""1I1t ,1~N,ira do poder. Crítica das 'suas premissas),
D. Barber apresenta um quadro muito mais complexo em: Power in Cornmiuees. An Experimeru in lhe
11,·~I'I.' 1',.IIIIt:., (111) ,,[fI"1 IA 1"'1 ,'11" 1111111\,• ..r•. 111'" 1,",1,., r i i.u urna compreensão adequada do prin-
Governmenlal Process (O poder em comissões. Uma experiência no processo governamental), Chieago
,11'111'1., ",.ill'I. ••
1966.
148 ELEIÇÃO POLíTICA E LEGISLAÇÃO LEGISLAÇÃO 149

gr ande complexidade, para cuja redução o número de votos oferece um ponto de .'~IW( tos temporais, objetivos e sociais, pois as possibilidades de variação nesta ül-
l('f('rC>ncia imprescindível, mas não constitui, de forma alguma, o único processo rimu dimensão dependem umas das outras; pois, por exemplo, o consenso a alcan-
decisivo na determinação de sentido. Só se adquire uma imagem real quando se (,.Il depende da versão objetiva do assunto e do momento da comunicação e, assim,
encara com maior precisão o processo legislativo como sistema social. Considerado terna e momento não podem ser escolhidos independentemente um do outro e in-
num corte longitudinal cronológico, esse processo decorre de acordo com regras fixas depcndentemente da pergunta quanto ao potencial de apoio político que oferecem.
e , portanto, ~com uma tipicidade determinada, sem se poder deduzir onde e quan-
(10 recaem as decisões parciais mais importantes e se recaem déntro ou fora do Informações deste e doutro tipo só se tornam produtivas e valorizáveis em
\lIOC('SSO ("7). O processo inicia-se com a elaboração dum projeto oficial (na maioria relação com o processo individual e com a sua história. Primeiro, tem de se poder
das vezes nos ministérios competentes para tal). Depois há uma votação do gabi- constituir sistemas de processo com a ajuda de disposições jurídicas confirmadas,
ueic. O projeto é enviado ao parlamento e aí percorre rapidamente e em seqüén- em geral compreensíveis e pressupostas. Isto constitui uma importante condição
da, sessões plenárias e comissões, as quais o fixam em traços largos, o prévia, embora não a única suficiente, para o início e desenvolvimento duma es-
que pode, contudo, variar nos detalhes. O' projeto é então discutido nestas (e além trutura tática de complexidade elevada. Doutra forma não se poderiam avaliar as
d(,~tas) sessões, até ser encontrado ou um consenso suficiente para a votação como restrições daquilo que é possível (ou apenas para conjunturas muito mais simples).
h-i sob urna versão determinada, ou até que seja retirado ou enterrado, tornando-se Tem de se saber, mais ou menos, como se dá início a esse processo, a quem uma
uhsulcto , mediante encerramento das sessões do parlamento, sem aceitação da res- pessoa se deve dirigir com o quê, quem pode estabelecer quais divergências e com
pousahilidade formal por um resultado negativo. que possibilidades de decurso se pode contar para que o comportamento de todos
os participantes possa ser previsto de tão longe, que se possa dar início no próprio
Porque os processos legislativos não são programáveis (ou, quando muito assunto a um complicado jogo de considerações e contra-considerações, segundas
,111.\vês de determinações políticas facultativas de objetivos e promessas políticas intenções e desistências preventivas, planejamentos cronológicos e inerentes pos-
("li compromisso), é extraordináriamente complexa a sua situação de decisão. Por sibilidades de retirada. Só dentro de limites reconhecíveis do sistema se pode cul-
iNM) S(' torna tão importante uma criação de sistema, pois esta complexidade in- tivar um sentido tão fértil em relações.
drlinirla se transforma em complexidade definida de alternativas distintas, tornan-
do as finalmente decisivas. Para o funcionamento dum tal processo e como fun- Estas considerações referem-se à teoria geral do processo esquematizada no 3. o
d.uucruo para a escolha de comunicações eficazes, tornam-se, portanto, neces- capítulo da 1. a parte e demonstram, pelo menos, uma coisa: que pode haver tam-
"(\I ios conhecimentos dos gêneros mais variados, que sirvam para averiguar as pos- bêm, neste sentido, processos para uma decisão não programada. A disposição de
rhilidades de movimento do assunto e as restrições do processo como sistema. possibilidades de procedimento através de preceitos jurídicos e organizações, a in-
Fa/('m, também, parte déIas, ó conhecimento das etapas e prazos da decisão formal dividualização dos processos como sistemas especiais de duração limitada, que as-
(' d.\5 competências necessárias, além da informação corrente sobre os pontos em piram a uma decisão de compromisso, a complexidade própria destes sistemas e a
\lsp('nso a cada vez, que podem aumentar ou diminuir no decurso do processo, criação duma história própria do sistema para redução dessa complexidade -
port a nto , informação sobre o estado atual do processo. Tem, ainda, de se poder todas estas caracteristicas estruturais gerais podem ser tembém demonstradas
jull-(al a situação do processo no tempo, a sua 'intercepção temporal com outros mediante processos legislativos. Com isso não se compreendem suficientemente as
•H onu-cimcnros, a sua urgência, assim como a correlação destes dados com interes- particularidades do processo legislativo, confrontadas com outros tipos de processo .
s('~ d(' aceleração ou demora. É importante saber quem precisa de quanto tempo Elas resultam, em primeiro lugar, dos problemas específicos que têm de ser resol-
p.II.\ a preparação de que alternativas; e, para isso, tem de se poder avaliar quais vidos no sistema político por decisão não-programada mas programável.
m ulveis de reivindicação válidos e de que forma se distribuem a incerteza e os
uu-ios de a dominar. Os acontecimentos fora do processo devem ser considerados na Estes problemas não estão suficientemente indicados com as antigas fórmulas
uu-dida em que o podem afetar. É esse o caso não só quando eles se convertem no de objetivos para uma boa legislação - por exemplo, o estabelecimento de leis jus-
'.Is~nlll() do processo, mas também quando abrem ou fecham probabilidades de con- tas, certas, convincentes, a promoção do bem comum ou da maior felicidade pos-
,'IIS0, bloqueiam alternativas e as deixam tornar-se melindrosas ou então inarti- sível da maioria. Trata-se, antes, de problemas, cuja solução tem de ser atribuída
c nl.\v(·is, quando levam a confusões latentes de temas ou então desmoralizam, ao processo legislativo, porque ela pressupõe a disposição duma complexidade
sohl\'c.trregam, reforçam de acordo com o prestígio, ou deixam esperar os adver- muito elevada e por isso só se pode realizar em decisões não programadas. É este o
N,IIios Ou os defensores do assunto, ou duma única das suas variantes. Como estes caso nos problemas de integração que resultam da estrutura diferenciada do sis-
('x('llIplos o demonstram, torna-se necessário um pensamento global que integre os tema político e, precisamente, (1) pelo novo compromisso entre necessidades con-
formes com os interesses e apoio político (2) pela integração da "imagem" pessoal
ou de grupo, que está na base do alistamento, com a prática objetiva da decisão e
(3) pela coordenação da política e administração. No primeiro caso trata-se da
I""., tln. "~"" 1"11",'1111111,111., .,,10•• 1.01111(1("10 encorura se em Ouo Stammer, entre outros: Ver. supressão duma diferenciação conforme aos papéis, no segundo da abolição duma
1.11,"1,.111111(;('('\'1\"11""11 !l,,' l'I,IIII,." ••tllIlI" d~, Vr,hlínde auf die Gestaltung des Personalvertretungs- diferenciação de premissas de decisão, no terceiro da supressão duma diferenciação
H•.•tltr. (1\"'"1,11,'"' , I, III.i~, .\11 \ '''I''hl~,\" ,I•. 1111111/111(1.,
sobre a formação da lei de representação
de sistemas parciais do sistema político.
1"~'-"oI), ( "Ir""., 11"1.••1,,, 1ti 10 " '.""'1'."1" ,11,"1.,""11 1{1I111.ln Schnur: Srrategie und Taktik bei Ver.
Wltl,,",~,.1I11I11I1I1I 11,11""IIIU ,I 1.lio" 11.1',('1'1\11"'0,,,toIlU"'II.IIIV.'I). 8Jdt'n Baden 1966; e, como o
1"•.111111, ,11111" '11"l"hllllllll" ,11111'111111111H 1Ii1llry(111111"'·1Milk,· s ., I.IIW (O (ongrcs~o faz a lei). Nova No capítulo sobre a eleição polttica , iínhamos visto que' li S('p.'I"H::1II di' p.lp(·i~
111111',,1111',0 para o apoio polttiro (' pal<l ,lpr<'S('lIlat.,',1O (li- il1l('I('SS('~ c' ('xiHc\lI( la~, f' 11111.11011
150 ELEIÇÃO POLfTICA E LEGISLAÇÃO
LEGISLAÇÃO 151

dição de alta autonomia e elevada complexidade do sistema político. Só graças a


esta diferenciação de papéis se encontram à disposição, no sistema político, um c de decisão (e não só. mas principalmente a legislação) no seu relacionamento e,
número suficiente de alternativas de decisão, que não estão diretamente ligadas a correspondentemente, o comportamento da decisão no cargo constitui um dos
uma fórmula de intercâmbio. Este espaço de manobra da decisão pode ser usado meios mais importantes de apresentação da imagem. Também a integração da
entâo do seu lado para encontrar decisões que satisfaçam de tal forma os interesses, apresentação da imagem e da programação administrativa só pode ser realizada
[uc o auxílio político seja conservado e desenvolvido. As chances de encontrar essa nos processos que deixam em aberto um número suficiente de alternativas e pre-
solução e de legitimar assim a prática da decisão a longo prazo, geralmente através vêem não apenas a decisão programada, pois doutra forma a decisão é cornpreen-
do consenso, são normalmente tanto maiores, quanto maior for o número de altero dida como conseqüência impessoal do programa e não é atribuída à imagem. A
nativas à disposição, e tanto menores quanto menor for o número de decisões es- fusão das premissas pessoais de decisão, partidárias e prograrnáticas, resulta ti-
p('dficas tratadas antecipadamente com determinados grupos de interesses. Que picamente tão bem, que até agora a investigação empírica não pôde voltar a se-
tais compromissos sejam sempre reaceitos, sobretudo quando o mecanismo elei- parar estatisticamente estes fatores na estrutura de motivação do eleitorado (10).
toral, só por si, não tenha conseguido crédito político suficiente, é do conhecimento
/oI('I'al. Mesmo então entram em função dois limiares eficazes, que permitem, em Finalmente, as tarefas de integração colocam-se em planos de sistema logo que
I .ISO de necessidade, um restabelecimento da autonomia de decisão: nomeadamen- se chega à criação de sistemas parciais específicos de funcionamento. Nos modernos
1(' (I) a pluralidade de partidos concorrentes, que têm de cooperar nas decisões e, sistemas políticos encontra-se, quase sempre, uma diferenciação primária funcional
!lOltunto, não fazem promessas fixas de decisão, podendo prometer apenas uma in- na política e na administração' com uma separação estrutural mais ou menos
tl'l venção a favor de determinados interesses (8.) e (2) a "condição de crise" im- manifesta dos sistemas parciais correspondentes (11): A política trata da formação

pli( itarncnte aceita, que menciona perderem tais processos a validade, quando há do poder que goza de apoio político, com o alistamento e experiência de 'perso-
dll'l ações importantes nas circunstâncias políticas ou nas crises políticas, econô- nalidades dirigentes, com o tratamento de símbolos legitimadores e ideologias,
IJlI('as, financeiras ou outras. com a elaboração de temas e programas capazes de alcançar o consenso, com a
criação e teste de consenso para projetos' definidos. A administração (em sentido
Além disso, os políticos têm de considerar a sua "imagem" pessoal, conforme mais lato, portanto incluindo parlamentos e tribunais) aproveita competências para
110 purtido , como aquela representação duma relação pessoal, de acordo com a or- decisões obrigatórias e trata da elaboração e execução de decisões justas. Tem de
M.llli/açao das premissas de decisão, sobre cujas bases foram pressupostamente pressupor a capacidade de realização da política, tal como a política pressupõe uma
I'1l'ilO~ (9). Esta representação tem, geralmente, de se harmonizar com os aspectos administração que funcione. que realize o que é politicamente possível. A política é
v"fVl'is da prática de decisão, no caso da personalidade ou do partido quererem '0 sistema mais complexo e instável e, por isso mesmo, destinado à direção duma
I oru inuar a funcionar como símbolo para premissas de decisão. As imagens po- burocracia administrativa menos complexa e mais estruturada (12). Ambos os cam-
1111<,IS sao meios de simplificação, que tornam compreensíveis as práticas eleitorais pos têm de se diferenciar, não só pessoalmente e de acordo com os papéis, como
também, cada vez mais, de acordo com as normas, valores e critérios de racio-
nalidade, no caso de deverem trabalhar orientados para funções especiais.

H hl1 (ontrapartida, nos lugares onde domina um partido com uma clara maioria, ele tem crédito Numa tal organização, a ligação entre política e administração converte-se
1I"lfti(() 8uficicnte para poder evitar compromissos que não lhe tragam mais apoio político. num impasse da organização, a transmissão das comunicações dum âmbito para os
II QUI' agora se fale de "imagem" e já não do caráter dum político ou dum partido baseia-se no fato
d.1 m.mipulação de opiniões e é mais fácil do que uma manipulação do próprio assunto. Uma imagem 10 - Para a situação indecisa da investigação consultar Iane, op. cir., 1959, pág. 24 e seg.: Key, op.
"OIdr, (oro uma cena independência do assunto reproduzido, ser mantida como variável ou constante, cit., 1961 pags. 247 e segs., 467 e sego
.1. .11ru du com leis próprias. Assim ela é apropriada a ser como que peregrina entre dois mundos, que 11 Como clássico desta distinção ver Woodrow Wilson: The Study of Administration (O estudo da
v,,, 111111 uulependcnternenre um do outro - aqui às condições do alistamento político e apoio e à prática administração, Political Science Quanerly 2 (Publicação trimestral sobre ciência política 2),1887, págs.
d,· t1'·IIH.lo inteligente de acordo com leis próprias. Não é, com certeza, por acaso que os sistemas sociais I Q7·222: Albcrt Scháffle: Über den wissenschaftlichen Begriff der Politik (Sobre o conceito científico de
'"1111" dal"I('nciados que têm de institucionalizar uma grande parte de independência e interdependên- política), Zeitschrift für die gesarnte Staatswissenschaft (Revista de ciências políticas) 53, 1897, págs.
'I~ ,LJ~ M'\!' componerues.. recorram a esses mecanismos de intervenção. Para a teoria da imagem em 579·600; Frank J Goodnow: Politics and Administration. A Study in Govemment (Política e adrninis-
"1101Cunxult ar I I 0.1I1S Peter Dreitzel: Selbasbild und Gesellschaftsbild: Wissensociologischc Überlegungen tração. Um estudo sobre governo), Nova Iorque-Londres 1900. M. G. Smith: On Segmentary Lineage
1111 ,,",111(' IkWiff (AUIO retrato da sociedade: reflexões sociológicas sobre o conceito de imagem), Systerns (Sobre sistemas de linhagem segmentária) TheJoumal of the Royal Anthropological Institute of
1'1""1111;"!t,'s Ar chiv ror Soriologie 3 (Arquivo europeu de sociologia 3), 1962, pags. 181·228. Para a Great Britain and Ireland 86 (jornal do Instituto Real de Antropologia da Grã-Bretanha e Irlanda 86),
1""'11""1 dm p,lIuclos poltticos consultar. por exemplo V. O. Key Jr: Public Opinion and American 1956, pâgs. 38·80, prossegue esta distinção até às sociedades humanas mais primitivas, onde ela se en-
11<'""" I, u Y (Op,ni. ••• puhli".l t' demorrax ia americana), Nova Iorque 1961, pags. 433 e segs.: ou Marek contra, de qualquer forma, apenas na forma elementar duma separação, conforme com a situação, en-
<'•• Ia"lo-wNkl Ilw VI>II',~ l'oll1l1.i1 Opllllllllb ,.'Ilel Elections: Some Problems of Political Representation (As tre preparativos de decisão e realização da decisão. Comparar com a obra do mesmo autor: Govemment
"I'IIIII"u-N 1'"11111 ilN olUN,'l!-II,"C'N " ,'~ ,'I"I~,kN' ,alguns problemas da representação política). Em: Horne- in Zazzau 1800·1900 (O governo em Zazzau de 1800 a 1900), Londres-Nova Iorque-Toronro 1960, págs,
111'11"11' ., (,,'111.11.1 1.·"",,;1,, 1""11111"1' I'11th, 1',111".3~:1·366 (359 c segs.). Para a imagem pessoal do 15 e segs.
1',,11111"10••1,••1111,,1 ,,,"IIIIaIlI' •• ,0111•••1". I"" I.·" Il.lInon/Albcr! Mabileau em: La personnalisation du 12 Thomas Ellwein: Einführung in die Regierungs und Verwaltungslehre (Introdução às teorias
I"HI""il (\ 11I••",,"II .• ~.I" 01" 1"1111,I 1"11'11"" d,' Il'i"" (l',aI('Mro.lde Dijon), Paris 1964. Comparar rarn- governativa e administrativa), Stuttgart.Berlim·Colônia:Mogúncia 1966, pago 213, pergunta
111'111 ,,," " , l'''lhl'l' L, ,,,,,,, ,,' (~,.",~,. ""1":1" 1li- (,.,"11.· ,mel I':i.rnhowcr: Thc public Image of the com sublime admiração. como pode "ser possível, dentro do âmbito dum sistema global, a direção
\'''1;10 i""o 1.,01' 1',11(111' I ..••aI" , Ili~r"I",w"I'; I1 1111,1111'111 1'""lil,' do /11'111"ai vitorioso) Em: Angus Campo duradoura da pane estável deste sistema, através da parte instável, condicionada pelo sistema " Ares
1u 11, (""111 """ ••• 1:11i 11••", .",,1 lia.' 1',.11111\,1(1,,11' ('\0 ,'''''V''', " ,I oll\(om polltica). Nova lorquc posta só pode ser a seguinte: a direção tem que se encontrar no lugar onde houver maior número dI' ai
rernarivas, portanto maior complexidade a ler de S('I dominada.
152 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO LEGISLAÇÃO 153

outros converte-se num


problema crítico, em cuja solução se confirma o sistema senso e de falta de consenso (15). Na estabilização desta diferença encontram-se, en-
políuco como um todo Para esta tarefa torna-se necessário um processo que
(13). tão, motivos secundános, enquanto que a "verdade", pois aliás ela não fala ela-
possa satisfazer ambos os campos - que seja, por um lado, politicamente influen- ramente, perde o seu status como objetivo e problema: os "amigos políticos" sãc
riãvel com base em considerações as quais não 'possam reivindicar para si mesmas, sempre considerados como simpatizantes e nos diferendos cede-se-lhes sempre;
!1('!TI compromisso, nem legitimidade; que esteja, por outro lado, igualmente em quanto aos adversários, são sempre contraditos e considerados como opositores,
situação de apresentar decisões formais obrigatórias. O processo legislativo pode
mesmo quando os diferendos objetivos são secundários, ou têm primeiro de ser or-
bastar a estas reivindicações, enquanto processo, que serve principalmente para
ganizados. As assembléias deliberativas, partindo delas próprias, constituem assim
Kt"I\('ralizar e legalizar causas políticas. Sem a positivação do direito, quer dizer,
sem a legislação, não se poderia estabelecer o espaço de manobra da decisão neces- os partidos.
Ao lado destas estruturas toscas, que estão determinadas em frentes mais ou
~:hia para isso.
11' menos formalizadas e obrigatórias, criam-se, tanto dentro dos parlamentos, como
também na sua periferia, sistemas informais de contato, boas relações pessoais,
relações de confiança ou desconfiança, diferenças de ponto de vista e força de
Todas estas funções de integração exigem uma execução sob uma comple- irradiação de personalidades isoladas, dum tipo mais específico ou mais genera-
xuladc muito ele~ada e indefinida. Se se conseguirem apresentar decisões dentro Iizado. só reconhecíveis pelo adepto (16). Essas estruturas reduzidas facilitam a pos-
durn espaço de tempo limitado, o processo legislativo lerá de preparar, ou pelo sibilidade de orientação, facilitam também o afastamento do caminho do ideal;
111t'1I()Stolerar , estruturas simplificativas que sirvam especificamente para reduzir a elas proporcionam ao novato o clima e limitações da conduta oportuna, servem de
IIldC'iinição e a falta de clareza duma situação de decisão extremamente rica em auxílio na criação de consenso, em resumo, diminuem o congestionamento alta-
Id.I~Ó('S, de tal forma que se tornem possíveis expectativas complementares e uma mente complexo da decisão, através de estruturas sociais num formato em cujas
111ivutação adequada dos participantes. Os modelos de debate interminável, ou da "
limitações o indivíduo pode reconhecer o que pode e não pode dizer e de que forma
I t!\H 01 réncia independente do representante único do povo, refletem a comple- os outros 'reagirão ( 17). Estas estruturas também se mantêm firmes ainda que sejam
)(u!.\(l(' da sua situação, mas não mostram qual a forma de a dominar (14). Isto é
It',lli,ado por inúmeros mecanismos auxiliares, necessários ao funcionamento, mas
15 Encontram-se reflexões idênticas sobre a diferenciação entre concorrência e troca em casos de
dc' nll áter acessório, ou até mesmo divergente, comparado com os objetivos oficiais
complexidade crescente em Peter M. Blau/W. Richard Scott: Formal Organizations: A comparative
tI.1 inst it u ição. Apresentam-se como exemplo: a separação entre concorrência e Approach (Organização formal: um enfoque comparativo),.S. Francisco 1962, pags. 217 e segs.
I\lU!,C'1ação; a personalização 'informal das relações de trabalho; a confiança nas 16 Também aqui são as pesquisas americanas que melhor esclarecem, rujas observações podem,
.IJII c'sc'lIla~'ões; a recepção de informações reduzidas do meio exterior; estratégias nesta questão ser generalizadas sem mais nada, porque entram aqui em Jogo qualidades especifi-
uunimiz antes de burocracia; a troca entre situações públicas e não-públicas; e a cas da cultura. Comparar, por exemplo, co.m Garland. C. Routr: Interpersonal Relationships and
the Legislative Process (Relacionamentos interpessoais e o processo legislativo) The Annals of
uupor t ância do poder executivo e das comissões.
the American Academy of Political and Social Science 195 (Anais da Academia Ameri-
cana de Ciências Políticas e Sociais, 195), 1938, pags. 129-136; James A. Robinson: Decision -
S(' começarmos pelo ideal do debate de opiniões concorrentes, então notar-se-â Making in the House Rules Committee (Tomada de decisões nos comitês de regras do Parlamento) Ad-
ministrative Science Quarterly 3 (Publicação trimestral de ciência administrativa 3), 1958, pags. 73-86
q\l\' este princípio estrutural deixa em aberto a oposição e concorrência de opi- (81 e seg.). Samuel C. Patterson: Patterns of Interpersonal Relations in a State Legislative Group
IIIIWS. A concorrência e a cooperação permanecem juntas e indeferenciáveis. Ar- (Padrões de relações interpessoais num grupo legislativo estadual), The Wisconsin Assembly, Public
~11\lH'llla se contra aqueles que são considerados partidários. Este modelo de con- Opinion Quarterly 23, 1959, pags. 101-118; Heinz Eulau: Bases of Authority in Legislative Bodies. A
du!a pll'sta-se não só para sistemas muito simples, como pressupõe, além disso, que Comparative Analysis (Bases de autoridade nos corpos legislativos. Uma análise comparativa), Adrninis-
.1 VC'Idad(' é evidente e rege as opiniões como critério de opção. Logo, que os sis- I trative Science Quarterly 7,1962, pags. 309·321; John C. Wah1ke/Heinz Eulau/William Buchanan/
LeRoy C. Ferguson: The Legislative System. Explorations in Legislanve Behavior (O sistema legis-
H·I\I.I~ l' lemas de decisão se tornam ricos de sentido e relacionamento, essa or- lativo. Explorações sobre comportamento legislativo) Nova Iorque-Londres 1962, principalmente pags.
"
~.llIi/.lça() torna-se demasiado difusa. Exigiria demais dos participantes uma va- 135 e segs.: Alan Fiellin: The Functions of Informal Groups in Legislative Institutions (A função dos
11.1~.iOc onst ante dos temas objetivos e das relações sociais em relação umas com as grupos informais nas instituições legislativas), Journal of Politics 24, 1962, pags. 72-91. Reeditado por
Robert L. Peabody/Nelson W. Polsby em: New Perspectives on the House of Representatives (Novas
OU! I .I~. As situações para oposição têm, então, de ser pré-estruturadas, através' da
perspectivas na câmara representativa), Chicago 1963, pags. 59-78; James S. Barber: The Lawmakers.
1/I!I'/"I'/IcÜl.çiio das relações sociais, através da separação das probabilidades de con- Recruitmente and Adaptation LO Legislative Life (Os legisladores. Alistamento e adaptação à vida le-
gislativa), New Haven-Londres 1965; para a relação entre parlamento e burocracia consultar AAron
Wildavsky: The Politics of the Budgetary Process (A política do processo orçamental), Boston-Toronto
1964; para o sistema bi-partidário dum sindicato ver Seymour M. Lipset/Martin A. Trow/jarnes S.
Coleman: Union Democracy (Democracia da união), Garden City; N. Y. o.]., 195b, pags. 282 e segs.
17 Possivelmente, esta tendência para uma preparação contraestrutural de relações pessoais sociais
como ajuda para orientação, constitui uma característica geral típica dos sistemas complexos com livre
I~ N.·",. IIlf'cllcI••• '''10111" ru ' 1I1".II'i,,~IIp;, m (\("esclarecimento prê-sociolôgico, quando incluem, não concorrência. Também nos sistemas de mercado, que se aproximam do modelo da livre concorrência, se
'I""~. 10 '"1111'1.'.111.1\1. ""._., 111'"""1.",,, 11.1HIW redução em sentido determinado. Isso procura observou este fenômeno. Consultar Cyril S. Belshaw: Tradicional Exchange and Modern Markets (Câm-
\I'••lil'o' 11111• ·,,1,111"11'""111 ~""lIlflMIo11, '1ltt Ir", ti.· r onsiderar, exatamente por esse motivo, funções bio tradicional e mercados modernos), Englewood Cliffs, N.]. 1965, pags. 56 e segs., 67 e seg., 78 e segs.
I.\h 1'"'111 t' IIlt'nutIIllWII', I tllI! hHIiIJU', fi, I IIIIII'IH I.IUU·tHWI divt"'lgentcs. Conferir também com Niklas Para os dispositivos governamentais na política e., também, em ações industriais progressistas ver GÜn·
1,,1"","11, SUl j"I"III".I ••' .\ IIn 1i1,1t!'KtI~~. I •••• 1111""'" OUIIIII"')(III), Soziale Welt 18 (Mundo social 18), ther Roth: Personal Rulership, Patrimonialism, a nd Empire-Building in the New Srates (Governo PCg
IlIi17. ,.,'111 !I'I I~;\, soal, patrimonialismo e construção de impérios nos novos estados), World Politics 20, 1968, palls. 19~
1,1 hlll t,. '''''''' ,:"i!,,~ 1••1 206 (197 e segs.).
154 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO LEGISLAÇÃO 155

modificáveis, perante o processo isolado e ajudam-no a encontrar rapidamente os expectativas dum projeto de lei, serve a um objetivo semelhante. Juntar diversos
seus limites. projetos de lei num "pacote" constitui uma estratégia nova e de grande futuro. que
restringe a variabilidade de projetos. Encontra um apoio vigoroso no fato de que
Tal como os processos judiciais (18) também os processos legislativos depen- uma administração que planeja, vê interdependências crescentes e já não pode
dem duma pessoa se poder orientar em especial pelas descrições dos participantes tratar, em separado, as leis isoladas. Finalmente, a saída do status quo confirma
/1O processo e poder confiar nelas - e, precisamente, menos no sentido de que as um meio de simplificação em voga e, muitas vezes, imprescindível, principalmente
descrições sejam "corretas", do que no sentido de que o representante permaneça nos projetos anuais de orçamento (22).
!l('rLO deles. Daí encontrarem-se no parlamento as regras informais de conduta, de
que as descrições têm de apresentar maior estabilidade do que é comum na vida A mudança do processo da etapa pública para a privada, portanto a mudança
quotidiana e obrigam (19:). Esta expectativa adquire a forma duma reivindicação do seu círculo de ouvintes, atua duma forma completamente diferente, mas fun-
moral, que é encarada e sancionada como condição de honradez pessoal e influên- cionalmente equivalente. Este ritmo facilita o uso de motivos proibidos para sim-
11.\ pessoal; ademais, ela é demonstrada pelo fato de as descrições terem de ser con- plificação da situação de decisão e para permitir desligar do consenso o estabe-
riuuamente levadas ao alto nível duma informação da opinião própria, de cuja lecimento e a apresentação. Assim se torna possível trabalhar nas sessões privadas
kl(ilimidade o orador está convencido. A concepção oficial do processo legislativo com pressões ou oferecimentos de permuta, que não podem ser indicados publi-
(01110 debate de opiniões não é, de acordo com isso, um caminho de confiança para camente ou, ao ínverso , mostrar maíor sensatez e boa vontade do que se podem
•1 verdade, mas tem a função latente duma coação de descrição, que facilita a ~oadunar com a linha declarada do partido, ou com o seu papel como oposição .
II'dll~'ão de complexidade. Desta forma podem manter-se publicamente intatos os símbolos integrantes. ainda
que não sejam suficientes para organizar o próprio processo de decisão. (23)

Um outro meio de redução consiste em confiar na informação já adaptada e


Finalmente, o fenômeno tão discutido do adiamento da atividade real de
111 1/1 II rim ida,
vinda do exterior, quer seja por parte da administração, por parte decisão perante o diagrama oficial tem_ aqui a sua base. Os grêmios m,enores
r\,Ih .ruioridades partidárias locais, por parte dos consórcios de interesses, por parte com papéis definidos, posse de informação visivelmente distribuída, concorrência
11.11 i(-Ilria, por parte dos conhecimentos ocasionais, ou por parte da imprensa. É suprimida (24,) e a possibilidade de poderem falar sobre o assunto de forma direta e
111'1<a , ele certa maneira, para a vida moderna (zo ) esta dependência de processos resumida. sem ter de recear um abuso da comunicação, têm um potencial mais
IIj Iivos ai heios, particularmente
I (1).\ manifesta aqui", porque a carência' de irÍfor- elevado do que as grandes assembéias, para o estudo de fatos mais complexos. O
1I1.I~.I() (. tão complexa, que nem sequer todo o saber público correspondente pode trabalho sobre as leis reside, pois, necessariamente, em reuniões nas repartições, no
WI r omprccndido em si, e tão precária, porque a responsabilidade para o aprofun- gabinete, em comissões parlamentares. Aí têm de se separar parágrafo por pa-
d.""C·IHO completo dos fundamentos da decisão em si é atribuído ao legislador. A rágrafo, alternativa por alternativa, para que o hemiciclo possa finalmente aceitar
(ol\ll.\Jl~·a em "fontes" é necessária, mas não institucionalizada. Ninguém exige o ou rejeitar o projeto. Nesta decisão final trata-se, então, precisamente, dum todo
1111 !lossív('\ e cada um fará censuras quando, num caso isolado, se confiar numa complexo - mas um todo uno, coeso, que só pode ser admitido ou recusado como
1111\(' ('1 rada , ainda que o conhecimento correto fosse evidente. Também aqui se decisão última binária.
('qllrlil)larn diversos níveis de exigência para comprovação e certas possibilidades de
, As sessões públicas plenárias do parlamento conservam inteiramente uma fun-
(1.1,,~milir censuras com efeito descongestionante.
ção essencial, embora as decisões próprias se afastem delas. Essa função não reside
Ligadas a isso e dignas de especial
estão. determinadas estratégias atenção na transmissão da verdade, mas sim na apresentação do conflito político com a
inn orraticas para minimizar o risco dum processo legislativo.
O mais fácil é, na- ajuda de argumentos e motivos da decisão, com os quais se identificam posições
111I.rlllH'IIIC, não o iniciar. A reserva de vários ministérios em propor disposições .políticas controversas (25). Isto é, de forma semelhante à da fundamentação da
IC'I4.IIScomplcmcntárias para as leis carecendo de reforma é exemplo d-isso - nunca . sentença judicjal, etapa necessária do processo, cuja antecipação ideológica o es-
M' ~.Ih(' () que o parlamento faz duma pequena disposição legal, totalmente inofen-
"VOt. dr-limi tada com exatidão, quando "nessa ocasião se dá ouvidos a antigos ou 22 Sobre isso, sob o ponto de vista duma complexidade' excessiva. é muito instrutivo Aaron Wildavs-
""VOS rlesejos" (21). A eliminação prematura de alternativas no estado de pré- ky/Arthur Hammond: Cornprehensive versus Incremental Budgeting in the Department of Agriculture
(Orçamento compreensível contra orçamento incrernentâvel no departamento da agricultura). Adrninis-
trative Science Quarterly 10. 1965. pags. 321-346.
1M (;111111'.11
•••(11111pags. 156 c scgs. 23 Os politólogos acentuam, com alguns argumentos arriscados. a necessidade duma coordenação
li, I tltllhhn .HI\l1 ,'1)('''''\ 'h_ao tio meu conhecimeruo afirmações que se relacionamcom as assembléias com igualdade de direitos erure trabalho de comissão e debate plenário designada mente Heinz Raus-
hW.I.I"vu~ Illl~F.'Itnllm11niclOM. Conírrir com j.C. Wahlke. entre outros, op. cit ., pags. 144, 146, J .D. ch: Parlarncntsreforrn. Tendenzen und Richiungen (Reforma parlamentar. Tendências e orientações).
11.••li.. "I' ." . ,,:I/( 1100 Zeitschrift für Politik 14 (Revista de política 14). 1967. pags. 259-289 .
••n (''''''1'.11,11' 11111 1(111••."" 1..11111111'1),0,11111' "f Poluics and Ideology in a Knowledgeable Society 24 Tem especial interesse para Edward Gross: Social Integration and the Control of Compe-
11) ti.·.11111" d.1 1',,11111
,I I ,.1•.,,1"11'.'111""11 ,", II'd.lllr """ \1111.1).
Arnerican Sociological Review 31 (Revista tition (Integração social e o controle da competição). The American Journal of Sociology (Periódico
ru ,,,1111111.1.11111'111.111·1'11l 1"11010 I',IH~ 101')hh:' americano de sociologia 67), 1961. pags. 270-277; Jane S. Moutorr/Robert R. Blake: The l nflueuce nf
~, I ul'1lI. '"1',,111 (i dl_' I ullh'lllllllllll ,tIl ;,111"" 11tlllV('; di' p.:uh ~\dos ministérios alemães. Para a ex- Cornpetitively Vestcd Iruerests on Judgemenl (A influência de interesses ocultos no julIO) '[ IIc'JOIIIII.IIul
III I ji'w L' :nlllllllill~! '_lIlil it.IIU!llIn fit IIM"-: li!! jllIlI ,'I lU I1 KU.II,tlvo Cun'illhf.lI Berrrarn M. Gross: The Le- Conflict Resolurion 6 (Periódico de resolução de confliros 6). 1962. I>ugs,140 I r)~
lIi,I"I'" •• 1\ !l1",ly i" !I,,;I<tI1-,,,,,1',11lU
1)1111'1111 "",1\1111I"MI~I.IIIV() Um estudo sobre a luta social). 25 Um dos cldc'nwl('S (·III1,.j.ld",d"M.1Ul'inl.H>(o Wilhrlrn Il(,l\lIi~ Rc'cIIIIrIII/(IIIIM111111 K'IlIk d"1
~lIq, IlIlqw" I fllÚllllt I ülHhr' 111ft'; ti •• l\un(\,'s',IIIS.lIll1"lU'''III".,~.IU I' cI1l1l,' d" 11.,111.1100
c\Ul1.lIlilll\fIlIU1("11,'1.11).1111'
lI!:Ul:.t,rullld, ••h ).ICA _
T
1~6 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO LEGISLAÇÃO 157

I I ut ura ; não se é obrigado a expor publicamente os seus motivos ou os seus ins- métodos orientadores da decisão serem tratados à porta fechada. Ambos, o proces-
pi! adores sob os olhos dos adversários, mas sim as suas razões para as sujeitar à so e o desinteresse, são antes a expressão duma condição fundamental geral, que
I l!tira, julgando restrita, por esse fato, a escolha de posições sustentáveis. (26). Em rege as situações de decisão, designadamente a da reunião duma complexidade
«jualquer caso, dificilmente se pode esperar que o parlamento anime a política, se elevada com uma grande necessidade de especificação. Sob estas condições, a for-
11,10 se der o caso da política animar o parlamento. ma processual da legislação e o desinteresse geral correspondem-se e estabilizam-se
mutuamente.
Resta estabelecer como resultado destas exposições concisas, que carecem de'
SI'I completadas e corrigidas em pormenor, que a elevada complexidade do proces- Este de~interesse não admite igualmente urna realização casual, por exemplo
~() legislativo só pode ser desbastada com a ajuda de estruturas e mecanismos mais uma realização de pura burocracia interna, ou de planejamento científico do
PU menos divergentes. Dever-se-á daí concluir que o processo legislativo está so- processo legislativo e, por isso, se chega àquelas discrepâncias entre a descrição
I iologicamente mal organizado? oficial e as formas efetivas de trabalho. Na grande variabilidade e incompreensível
complexidade do sistema político existem riscos singulares que afloram na socie-
Isso seria precipitado, pois até a apresentação oficial do processo tem o seu sig- dade e são formulados (28) como problema de "certeza". Aí não se torna perigosa a
nifirado. A discrepância que aí se cria, leva-nos de volta ao problema da legiti- reação conhecedora, mas sim a reação ignorante. O sistema político pode absorver
1II,I~'fi{)pelo procedimento. Perguntando duma forma mais exata: como pode um uma dose grande de influências bem informadas e com uma finalidade específica
JlI()( esso reestruturar as expectativas dos interessados, quando procura determi- pois ele reserva-se para reivindicações planejadas e realistas de interesses, quer seja
1I,ld.IS soluções em situações de decisão até então em aberto? Também esta pergun- .para as satisfazer quer para as isolar politicamente. As reações de ignorância cons-
1.1 JlOS remete para suposições no estado atual da investigação empírica. tituem, em contrapartida, um problema, pois quase se deixam fundir e genera-
lizar de qualquer forma por causa duma situação incompreensível e buscam ob-
Todavia, há uma coisa que se pode, seguramente, esperar: que o estado de in- jetivos incertos. Assim pode-se chegar a situações repentinas e inclusive de futura
111I1I"1~'iiodo público e, conjuntamente o exercício das expectativas nas circunstân- - perigo que aumenta na- medida em que cresce a mobilidade social das comu-
c I,IH<I(>legislação, são extremamente reduzidos. Mesmo em perguntas que afetam nicações e contatos e o poder de imaginar alternativas.
fClIlt'llH'nle os interesses próprios, por exemplo, no direito fiscal, no direito de
\.'!llll()S e previdência, no direito à habitação, só se pode adotar um conhecimento Perante a forte diferenciação da sociedade e da respectiva individualização das
.11(' <('llO ponto adequado, nos pontos onde os papéis profissionais se ocupam do as- personalidades, não se deve contar que se possa reagir contra este perigo pela or-
'11\10. J\. oferta de informação é tão colorida e diversa, que se torna diminuta a ganização duma estrutura física e homogênea de motivos, de tipo emocional
Plnh,djilidade de que o indivíduo preste alguma atenção a leis. Ninguém lê o primário, ou através dum cálculo dos benefícios feito de forma prática e racional.
huh-t iru lcgislativo. Aquele que se desviar das concepções clássicas sobre a opinião Por outro lado, entre outras condições civilizatórias, há certas atitudes básicas que
puhlica l' a legislação, lamentá-Io-á. Ignorância e apatia são, todavia, as con- fazem parte da vida e que têm de ser preservadas duma ou doutra forma. Assim
dlC,O('hprévias mais importantes para um intercâmbio despercebido dos parágrafos, torna-se necessária uma aceitação global e, sem medo, de grande complexidade e
p.II,' li variabilidade do direito e, nessa medida, funcional para o sistema. Quem variabilidade das relações e esta aceitação, que denominamos legitimidade no âm-
("liM'1 ('J iar uma frente política a favor, ou contra uma determinada alteração bito político, pode ser facilitada por uma confiança generalizada no sistema (29).
1'11 [dica, pode apoiar-se, nos casos mais raros, num interesse existente ou numa
M'lI~ihilidade geral à comunicação, mas terá de sacrificar trabalho e organização Sabemos pouco sobre as condições empíricas e os: elementos concretos da idéia
P,II,I vencer um alto limiar de indiferença. Tem de dominar as regras e técnicas de duma tal confiança. Contudo, pode pressupor-se que tanto causas como conteúdos
c I i.,~·,,() dI' lemas políticos e isto só é possível para participantes do sistema político de confiança no sistema, podem variar - sob as condições existentes, o contrário
I!lI(' M'jam muito ativos e já se socializaram no sistema (27). dificilmente se poderia estabilizar - e que, por esse motivo, são necessários para
criar essa confiança processos de criação de símbolos, que possam operar de forma
E~lt, desinteresse não é, naturalmente, uma conseqüência premeditada do suficientemente abstrata, para poderem utilizar diversos mecanismos psíquicos e
IHOI,'SSO leg'islativo - como que uma conseqüência do fato de os mais importantes sociais. A criação da confiança carece, por outras palavras, dum serviço adequado
que, em primeiro lugar, sujeite formalmente a atuação e deixe em suspenso tudo o
que se quiser. A angariação da confiança política para pessoas concretas, grupos
dirigentes, partidos ou programas específicos, por mais necessária que seja, não
III.V•• MOI ••• d, ••,," (11), I!)b7, pags. 10 I 111. Ver ainda Thomas Ellweinl Axel Gorlitz: Parlament und Ver-
'w,,1i11 "1\. I 1('11 (;"HI'IIgl'huIIK u nd ('>oliLÍschl'Korurolle (Parlamento e administração I Parte: legislação
r: • 0111I olt· pol1111"), ~I 1.111\.111 1\",lilll COIÓlli", Mogúllcia 1967. principalmente pags. 237 e segs.
"li hl,' f 1I.1~.ln ~ fC'I'H'~'·I\I.II ••11I.uu.r, ."';IH, duma forma necessariamente pouco racionalizante. ou
I" 'h'~ 1111 li! IIl,dll d, d,'!'." 111111111'111 .1 f 1If1'I'I('xid.H!t· tio sistema. Uma das técnicas de prevenção para 28 É de observar que a incerteza politicamente condicionada não pode ser expressa incondicional-
II~II' .iI\lII~litl 1111111111111 •. I'tll _. 14."IIIt'lIulI ~.n ,Hlvf·tNtuio, dlo ta! forma que este não possa atacar sem se mente no sistema político, mas pode ser surpreendida sim, nas aspirações à segurança econômica ou na
111"11".1 011" (11,,111 família; mas o oposto também é possível. A origem e ternatização dos problemas podem adiar-se re-
":1 ""I,P'
1"11' .1 1"1I".ol,III.I~.tIJ" 1\'1111,1<' ti. '1"' 11.\111",,,,'11l Rt'rnr, produzir nenhum efeito, ou tão ciprocamente, pois se trata duma situação de complexidade indeterminada.
111111'1111' 1\111,IIÍ[" ill~lIllIlIl~o!II ,\11' '1'\11"~I~IIIh- 1""" II~1·."I\I,IIIII·~, por ")(('1111'\0, é-Ines dificil dar 'um 29 Quem daqui mais se aproxima é Niklas Luhmann: Vertrauen. Ein Mechanismus der Reduktion
lIutUilll_lIlfI pnllHt IJ __ 11111 hj~tllllH 111'!t"illill;"I" *IIIIHI fi lIu IdtUllIil nIHv(·"cit!\da. S(\ aumentarem os seus Sozialcr Komplexirát (A confiança. Um mecanismo de redução da complexidade social), Stuttgart 1968,
,'.11', ~"!, i'~'_1 1"1'11ft " l••çji'J 0I'\li! r'\~I"liill-",IIII, !', 111.' "111 d. 11111111111\ ac' "111.10"clíN"I' hi()NNludanli,". pags. ~~ e scgs.
158 ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO LEGISLAÇÃO 159

bast a a estas-exigências. Tem que ser posta duma tal forma que leve a criar, simul- ferenciação entre estabelecimento e descrição e, da parte do público, a diferen-
taneamente, a confiança no sistema. Para isso servem os processos, nomeadamente ciação dos diversos interesses e mecanismos de desenvolvimento da opinião.
os processos legislativos, onde a decisão é simultaneamente atribuída àqueles que
estão de acordo com ela e ao sistema, podendo assim agir sobre dois planos, crian- Também é essencial para a autq,determinação opcional como espectador num
do a confiança. (30). campo complexo e ilimitado de possibilidades, que se aproveite a dimensão tem-
poral. As informações com interesse político, quando resultantes de processos em
ontrariamente aos processos de aplicação jurídica, em que se decidem os curso, têm um caráter não estático mas sim dinâmico, até mesmo dramático. Não
casos isolados, no processo legislativo dificilmente se realiza uma participação se apresentam, citam, celebram ou inculcam apenas alguns símbolos, sempre os
dir<-ta e de acordo com os papéis de todos os interessados. Assim o seu vinculamen- mesmos - como no caso duma hierarquia que se confirma a si mesma. O espec-
10 recai, mediante a auto-representação, numa atuação conforme com o o papel. tador é introduzido a várias histórias. E-feito o convite para assistir a um acon-
Mas continua a ser possível uma participação, conciliadora de sentido, de cada in- tecimento dramático com teores variáveis, entre os quais o indivíduo pode pro-
divíduo, em determinados aspectos dos acontecimentos, participação que leva à curar, por si, os pontos de cristalização do seu interesse, das suas simpatias, ou an-
decisão quer seja pura e simplesmente sob a forma dum interesse no drama tipatias. Enquanto o faz, perde, tal como num papel, a sua liberdade original,
pnllt ico , quer seja através da identificação com atores isolados ou partidos, quer através da história da sua participação, a complexidade de atitudes possíveis reduz-
H(-j,I sob o ponto de vista de determinadas perspectivas de seleção, por exemplo dos se a um tipo de processo de estudo e socialização e as suas alternativas reduzem-se a
.rlrus c baixos da bolsa de valores ou do prestígio nacional (31.). O mecanismo de algumas variantes susceptíveis de orientação política.
irh-iu ificação simbólica age, contrariamente à aceitação de papéis, à distância e
NI'III obrigação direta de atuação. Por isso ele não comporta nenhum controle social
(·it',iv() de consisténcia do comportamento. (Se necessário, esse controle terá de ser
Tal como no caso do processo das autoridades e tribunais, a continuação da
IIlBltllilado de propósito, política ou policialmente.) Mas a distância não é apenas,
participação está ligada ao reconhecimento das regras de evolução, que constituem
IOIHO considerava a teoria da representação, um mal inevitável; ela é, simulta-
o sentido e interesses. O reconhecimento continua a apresentar interesse, sem ser
II(·."'H'I1I(' , uma condição de funcionamento da identificação simbólica e da criação
objeto duma decisão. A atenção dirige-se, sobretudo, no dia-a-dia, para assuntos
da wllfiança, pelo fato de confundir os detalhes e a multiplicidade das conseqüên-
que estão sendo tratados no sistema. Entre eles pode escolher-se aquilo que se con-
I iilH 1>1ãucas dos acontecimentos isolados e assim facilitar a redução da comple-
sidera seletivo. Também se pode escolher a atitude a adotar perante eles. Num sen-
xid.\(k por parte do público (32). Desta forma se podem vincular diferenciações
tido tão lato e duvidoso, o sistema está implicado mas não simbolizado, ou seja,
1t1'II'fo/{êneas numa relativa ambigüidade, sobretudo da parte da política, a di-
não está apresentado como um todo. Só o próprio processo é que é símbolo. Nos
temas, projetos, propostas e assuntos controversos do processo isolado, o sistema
político só entra como premissa constitutiva de sentido e não se converte em tema,
'1() ()lIv,'rger parece ter em vista algo semelhante quando distingue, por ocasião duma observação em pois não é tratada no processo. Uma pessoa habitua-se - quando segue de perto as
IIINIIINO,t(I,"deux circuits de confiance" (dois circuitos de confiança) no sistema político. Consultar em 'histórias do sistema - a que elas sejam, a par dos escândalos, principalmente his-
ftlj~\10 (Ir 1.1'0 llamon/ Albert Mabileau: La personnalization du pouvoir (A personalização do poder), tórias das decisões. Quando os processos não podem realizar essa integração - há
I'.df~lr.\ d,' Dijon 1964, Paris 1964, pago 442 e sego exemplos disso em alguns países em vias de desenvolvimento - o indivíduo já não
~I Comparar como teorias de coloração muito diferente e que se baseiam na possibilidade de iden-,
pode apresentar uma relação no sistema, mas sim uma relação para com o sistema,
lil" .,~iI() simbólica" por um lado a teoria de integração de Smend (Rudolf Smend: Verfassung und Ver-
IlIM,HlK81('chl Constituição e direito constitucional 1928). Nova edição do mesmo autor em: Staat· seja ela apatia ou rebelião. O sistema político corre então o perigo de converter-se
~'I'( lullchc Abhandlungen und andere Aufsátze Dissertações sobre direito político e outros temas em assunto duma decisão, em vez de permanecer no horizonte da mesma. É
Ik,ll1l\ 195&, pags. 119-267, especialmente pags. 148 e segs. sobre a integração funcional, que se realiza exatamente este o perigo a ser evitado, como indicamos ,mediante a instauração
1l1l!t'I)('n(\('ntemcntc da satisfação quanto a determinados resultados objetivamente corretosrdo mesmo
do sistema político em processos de princípios hierárquicos.
'I\OIOi. (Teoria da integração. Dicionário portátil de ciências sociais) Integrationslehre. Handwõrterbuch
tlr, SOIiulwisscns~haftcn, volume 5, Stuttgart·Tübingen·Gottingen 1956, pags. 299-302-2/e, por outro
1.1110,()~ pr incípics da teoria americana de símbolos, de fundamentação psicológica mais rigorosa, es-
",'lltI,'ndu mais sobre o sentimento do que sobre o espírito por exemplo Harold D. Lasswell: Psy- Tudo isto tem conseqüências significativas para a situação de consenso. Vimos,
I htlpall!oloffY and Politics (Psicopatologia e política), Nova lorque 1933, ou então Murray Edelman: na generalidade, e encontramo-Io aqui confirmado, que a legitimidade não pode
I li•• Symbolic Uses of Politics (O emprego simbólico da política), Urbana, 111: 1964. Em ambas as
ser equiparada ao consenso real. O consenso é conciso e, por isso; tem de ser se·
It"''''H /l,jo SI' ~p,rda suficientemente a possibilidade de convivência horizontal-indireta e não temática,
ti•• 'IUIII d"P"'HI"IItOS l1a~ análises que se seguem. neralizado. Constitui uma expressão superficial dizer que a decisão é confiada à
~Z 1{"flnl)rH Htll",lhll/lI<'S h-vnru m l\ It'se de que uma certa distância'social constituía condição prévia maioria. O próprio princípio da maioria não é uma forma de legirimação , mas sim
1""11 ti /lItHI'""'11'" "li I'II'HIIK'" ~"l i.i l I', ronjumamente, para o nascimento dos mais altos papéis de uma solução de compromisso. As teorias clássicas de democracia tinham visto isso e
,1I1t'~,ltI Vr', 1IIIIIIr",)""II""", t 1«-1111 KllItll' Sorialprestige und Sozialerstatus (Prestígio social e status aí residia o seu problema principal. Ou procuravam dar proteção ao indivíduo, ou
."" ••1). 111""1111111'1',7, "111~'N,tllllt·/lIII.\ I,"WIHI,,'opol<l: Prcstige(Prcstígio), Londres 1913. Ainda Gotz à minoria, mediante direitos subjetivos e medidas de prevenção contra a maioria
1\11•.1, l\'I'II'I ••llIh, 111111
IIlId 1\1:\11'".1, I"·,, ,,' ,11" 1/I(II'81,j~ (Orientação e vida duma empresa na indús-
(para compensar, portanto, a ausência de consenso), ou defendiam que, na de-
111.11,\'''''11,,'1 1111-1 ".1._ 101 "'li' "" I·,,·" I, "il',lI,',: The Leader's Psychological Distance and
1.""'1' 1 Ih. 111<1111' •• ( \ 111,.,,\,":i., I"" ••I(ollill ti" 11,11",. li "111,1t'\lI de 11"upo), Editado por Dorwin Cart- mocracia, graças aos seus processos de formação da vontade, se chegava, finalmen-
\\'1111111:\Ivill 1""".\1(" li' '.1'"'1' Ilr"~II,ir. (111".\,"1, 'I ,Ir i!'"I'O), 2.' ('diç;\n Evanston , 111. Londres te, à expressão dum consenso geral, pelo menos duma forma sintomática, represen-
'""'11., 1"'11' Mil f,llI, tativa e conjetural.
ELEIÇÃO POLÍTICA E LEGISLAÇÃO LEGISLAÇÃO 161
160

A nossa análise do procedimento permite-nos precisar estas afirmações: não é um valor que possa ser realizado. mas sim um princípio estrutural que
procura realizar algo de duas formas: a separação dos papéis perante o meio e uma
Os procedimentos servem, por um lado, dentro dos limites do possível, para grande sinceridade e variabilidade das probabilidades de consenso no sistema.
aumentar o consenso atual, portanto para esgotar raros recursos. Esta realização Se um procedimento. tão organizado como é o processo legislativo , mantém o
não deve ser subestimada, principalmente nos processos legislativos com a sua que promete e está realmente em situação de generalizar o consenso e ganhar a
elevada complexidade, objetivamente pouco estruturada. Mas o mais importante é confiança do público que assiste. isso é um fato que depende de muitas outras cir-
que a forma processual em que é angariado o consenso, implique e estabeleça uma cunstâncias. que têm de ser pressupostas. Por exemplo, a sociedade tem de poder
determinada orientação para o consenso dos outros: cada voto conta. O consenso aceitar a separação de papéis e a autonomia do sistema político e tem de estar, ela
de cada indivíduo (na eleição, do eleitor; nos processos legislativos, do deputado) é própria. estruturalmente equipada para isso. Em qualquer dos casos, a necessidade
relevante em princípio - não exatamente no sentido de que todos tenham efeti- vital tem de estar encoberta, para cada um poder ter esperança. e os valores e in-
vamente de estar de acordo com cada decisão, mas sim no sentido de que a opinião teresses tem de ser tão diferenciados, que se possa organizar na política uma satis-
de alguém possa ser declarada, a priori, como irrelevante, por exemplo devido à fação oportunista dos desejos, satisfação essa que pode alterar rapidamente os seus
sua religiâo.i ao seu status social, à_ sua classe, à sua raça, à sua filiação numa or- objetivos. Só então se pode descobrir o princípio da igualdade de oportunidades
ganização, ou a um sentido econômico. Outras estruturas sociais neutralizam-se no através das realidades. Por outras palavras: tem de ser socialmente possível fun-
processo pelo seu efeito preconceituoso (33). damentar a estabilidade política sobre a variabilidade do direito e da satisfação dos
interesses (35). Além disso, tem de se atingir já na sociedade uma diferenciação
Isto, só, não constitui motivo suficiente para o cidadão se sentir reconhecido e, funcional do sistema e especificação de realizações, pois só então será possível
por conseguinte, para reconhecer. Desta forma consegue-se, porém, ter de pôr-se precisar alterações através de decisão como processos de substituição exatamente
de novo a questão do consenso e tentar resolvê-Ia em cada projeto isolado. Sem delimitados, equilibrar as suas conseqüências secundárias e, assim, levar a cabo
uma ligação estrutural, as chances de consenso são consideradas invariáveis na sem perdas. as inovações: os sistemas de estruturação difusa têm, em contra-
medida do possível, para que não afrouxe o interesse de- ninguém. Todas as di- partida, de seguir necessariamente uma orientação tradicional, porque não podem
ferenças e desigualdades têm de poder ser apresentadas e fundamentadas como Isolar alterações e toda a inovação tem conseqüências imprevisíveis (36).
resultddo dum processo. Todos são iguais perante o processo. Nisto reside, tam-
bém, o motivo real pelo qual não podem ser reconhecidas as estruturas de facili- Estas e outras condições prévias carecem, só por si, de investigação. Os proce-
tação da decisão acima discutidas e que se formam nos processos legislativos, antes dimentos, até mesmo os processos legislativos, nunca bastam, só por si, para efe-
tenham de subsistir como comportamento divergente: o seu reconhecimento levaria' tuar a legitimidade da decisão, no sentido duma reestruturação contínua das ex-
à fusão daquela diferença que deve ser mantida pela instituição do processo - a pectativas. Mas constituem a forma pela qual o sistema político contribui para a
diferença de igual" relevância do consenso que sobrevive à alteração dos temas e à sua própria legitimação. Pela sua consolidação institucional e jurídica eles sim-
situação de consenso aprofundada político-realmente no caso particular. . bolizam a identidade de forma da decisão e a continuidade de experiências idên-
ticas - e isso é uma condição prévia indispensável para qualquer estudo. O pú-
A política e os seus processos conservam, por este motivo, uma estrutura blico pode. portanto, aprender pela experiência, sentir-se geralmente seguro apesar
. igualitária e segmentária (dividindo-se em subunidades iguais) em oposição ao da variabilidade de princípio de todo o direito e exprimir confiança no sistema. Os
princípio da hierarquia e da diferenciação funcional que domina os processos na procedimentos constituem um dispositivo necessário. ainda que só por si não seja
justiça e na administração (34). Nestas condições não é de admirar que o princípio suficiente. para a legitimação de decisões. Por isso. tem de se saber primeiro como
de igualdade seja proclamado na política como valor de legitimação , A igualdade funcionam e o que podem realizar. antes de se investigarem as condições de que se
trata.
33 Que isto constitui uma ordem extraordinária e rica em hipóteses tem de acentuar-se mais uma
vez. Normalmente os sistemas sociais usam estruturas sociais, simultaneamente, para a diferenciação da A linha' de raciocínio deste capítulo. que já se tornou um pouco confusa,
relevância de consenso das outras pessoas (o que atesta uma dose diminuta de diferenciação do sistema). pode resumir-se então da seguinte forma: o processo legislativo tem de dominar'
Isto significa: não se devem apenas contar as opiniões mas sim pesá-Ias, não deixando de se considerar
aquilo que cada um é (nos outros papéis). Consultar, como um exemplo entre outros: Felix M. Keesin-
IMrie M. Kessing: Elite Communication in Samoa: A Study of Leadership (Comunicação de elites em The Political Aspect of Social Structure and Process (O aspecto político da estrutura social e o processo).
Samoa: Um estudo sobre liderança) Stanford, Cal. Londres 1956, sobretudo pags. 96 e segs. Verifica- Publicado por David Easton em: Varieties of Political Theory (Diversidade da teoria política), Engle-
se um caso par.uelo ao da diferenciação política através do sistema social da ciência, em que o consenso wood Cliffs, N.]. 1966 pags. 71-112 (84 e segs.) que sublinha que a capacidade de decisão do sistema
pesado d~ 11(0. do «lll' li repuraçâo. mas é igualmente independente de quais dos aderentes defendem político já não pode ser hoje decidida por uma hierarquia, antes deve ser alcançada por estruturas
UII!I()I P" p<'i~. igualmente segmentadas. que. por seu lado, só têm que fundamentar a hierarquia dos cargos e com-
M M (, ~1I11111."11 ,1\ . v~ I111N t"l(Ilt1~i~Õ"8queaarnoern merecem consideração na sociologia política petências.
'0 11•• Mil.illllllllo' ti" .111.'11••. '10' \1"1",",'1.,111rll!lr preparativos de decisão de estrutura segmentada e a 35 Quem formula uma teoria correspondente do processo de decisão democrática é Charles E. Lind-
1(,,,11/"1,,111.I,. ti,·, ,••,11 11111.11'/"",'''11"'111'r~I"'III,"dJ. O princípio fundamental dos sistemas políticos e blom: The Intelligence of Democracy. Decision-Making Through Mutual Adjustment (A inteligência da
W""II"' r_Ir 1'"'111111'; ti, 1111.1/ 'li j"o;'hl .111'~I \()Ckc!ades mais primitivas. Comparar também com democracia. Tomada de decisões através dum mútuo ajustamento). Nova Iorque-Londres ) 965.
1I,.vlIl "'•••111111',,11111,1\lItllIl'I",I.'IIY 14\111'''1',,1''111,.pnlhira). Editado por BernardJ. Siegal em: Bien- 3b Há algumas observações nesta direção em Bert F. Hoselitz: Main Concepts in the Analysis of lhe
11,011~.vi",~.oI A"IIIII'I",I"lIv IlI',11(IV,i'IM 101l1•.d.J,. .1I1111111<111I/(i.\ 1959). Stanford, Cal. 1959. pags. 210· Social Implications of Technical Change (Conceitos principais na análise das implicações sociais da .11
'1"" (- (I(I~~IV<'I ratificar estruturalmente esta sepa- teração técnica). Em: Bert F. Hoselitz/Wilbert E. Moore: lndustrialization and Socit'ty (InclIlMII.t1ill\~ilCl
tllII t IIlll'''pOIHlc'I\IC'~ Conlt'ri. com Talcou Pt\1S0ns: e sociedade), sem indicação de lugar (UNESCO Mouton), 1963. pa/(s. 11 ~ I (12)
162 ELEIÇÃO POLíTICA E LEGISLAÇÃO

lima complexidade extremamente elevada, pois trata o direito como variável. Esta
complexidade, no caso de se quererem evitar desenvolvimentos regressivos do sis-
lema político, tem de ser institucionalmente assegurada, continuamente mantida e
ainda avaliada, em cada caso, em determinadas decisões legislativas. Para isso serve
li dupla estrutura protegida, o reforço da versão oficial do processo duma assem-
blêia deliberativa decidindo por maioria, por I,1mlado, e duma forma de trabalho
i ealmente imposta com a criação de grupos, relações informais e alterações de
competéncias. por outro. Em relação ao público desempenha -se, dessa forma, uma
função dupla. Por um lado, simboliza-se a grande variabilidade e capacidade de
decisão e assim se motiva uma orientação para uma complexidade elevada, se não
positiva, então indiferente. Por outro lado procura-se, de procedimento para
procedimento, na medida do possível, alcançar um consenso real suficiente, como
base de atuação política. Quando estes procedimentos encontram apoio suficiente
lias restantes estruturas da sociedade e nos seus outros sistemas parciais, um pro-
blema que só poderíamos tratar de.forma alusiva, então pode conseguir-se assim
'1\1(. 03 interessados recebam bem as variações do direito nos casos isolados, em par-
1('; todavia, na generalidade, pode conseguir-se que eles as aceitem como um acon-
«ximcnto real e modifiquem as suas expectativas correspondente, sem que, por esse
IIIOlÍvO, surjam complicações consideráveis, 01,1discrepâncias nos seus outros papéis.

Parte IV
PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS
DA ADMINISTRAÇÃO
Os métodos de decisão pura e simples e, sobretudo, os processos de decisão das
grandes organizações administrativas da burocracia em política e economia, têm
merecido nos últimos vinte anos uma atençao científica crescente. Em todas as
matérias concorrentes, tanto nas ciências quanto nas especializações, interessadas
nas decisões racionais certas ou normativas, este interesse veio corromper uma fé
antiga nas únicas decisões justas que, partindo de premissas extremamente SIm-
ples, podem ser atingidas por meio da reflexão. O que levou a este resultado foi
não só a crítica da capacidade de verdade das premissas de valor, como também a
informação sobre a complexidade inconcebível dos problemas, que têm de ser
resolvidos pela decisão. O tempo e capacidade do indivíduo para reflexão racional
não são suficientes para cobrrr aeapacidade de decisão dos grandes sistemas. O seu
potencial para o uso da informação só pode ser aumentado por meio da coope-
ração.

Assim, tornam-se relevantes para o processo de decisão a organização e pre-


ceitos processuais, e isto não apenas no sentido geral de que têm ce ser postos em
hipótese para se poder efetivar realmente a cooperação organizada, mas Sim, par-
tindo daí, no sentido específico para as organizações de decisão, de que a racio-
nalidade alcançada no processo de decisão depende da escolha das formas de or-
ganização e processo. Só quando e na medida em que as decisões atingem uma
racionalidade ótima, ou podem ser controladas segundo critérios unívocos de
autenticidade (e isso exige, no mínimo, que o meio relevante possa ser preservado
como, uma constante durante o processo de decisão, portanto que este não se
prolongue demasiado), é, em princípio, indiferente, ou, quando muito, constitui
um problema da economia de organização e processo, a forma corno se efetuam as
decisões. Porém, logo que há diversas soluções utilizáveis ou "defensáveis", e isso é
típico das situações reais de decisão da administração, o próprio processo de seleção
adquire um peso real. Dele dependem, então, quais as soluções a serem escolhidas.
Trata-se, então, de saber quais são as informações e onde existiram em primeiro
lugar, como o problema define, como se estruturava a situação no início, em que
~ direção as reflexões e posteriores averiguações eram por elas orientadas, quais os
custos e circunstâncias ligados às únicas diligências possíveis de reflexão e averi-
guação, quais as possibilidades eliminadas desde o princípio por motivo de infor-
mação ainda insuficiente, onde e como se fixaram os "pontos em suspenso" e as al-
ternativas sobre os quais se discutiu com seriedade e que eventualmente, nas esferas
mais elevadas, se «íiscutiram de forma responsável (I). No âmbito da atividade

Esta vinculação da estrutura objetiva à estrutura temporal constitui uma caraetertsrica tfpi~a elas
modernas teorias de decisão. Isto é válido tanto para as tentativas de cneruacão mai~ ('mllh k. <11'lt)Jlft
PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO 167
166 PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO
decide-se sob o ponto de vista da economia de pessoal. enquanto que os próprios
u-alisra de decisão. a organização e formas do processo devem. pois. ser projetadas teores de decisão não são tratados como dados constantes e já apresentados (6),
(' julgadas não só sob o ponto de vista da economia de esforço. corno também en-'
contrarn o seu critério último na racionalidade da decisão; economia de esforço e É de prever que isto não pode ficar assim, Não é apenas a automatizacão cres-
c I itério que lhe tornam possível abranger várias possibilidades dentro dum espaço cente dos métodos administrativos que leva a um exame cuidadoso do progresso na
dI' tempo limitado e lhe permitem ponderar umas em relações com as outras, decisão. A diferenciação especializada de inúmeros contributos isolados e a forte
dispersão das informações relevantes e dos contatos externos exigem, igualmente. a
Por agora uma tal teoria de organização orientada para o processo de decisão organização dentro das repartições implicadas do decurso do processo de decisão
I orn certeza existe. até mesmo na ciência. como uma exposição aperfeiçoada dum segundo teores e estruturas temporais'. de tal forma que se abranja o maior número
pr ohlerna (2) e é desconhecida na prática da administração pública (3), Nem as possível de informações sem sobrecarga para o portador isolado de informações
lH'squisas teóricas de organização. nem as investigações sócio-psicológicas ou so- ou para o entroncamento isolado da rede de comunicações; que se pondere o maior
l iolôgicas sobre o método de decisão. se encontram dentro do campo visual da- número possível de alternativas e. portanto. que as decisões sejam tomadas o mais
quclas repartições que se ocupam da legislação no domínio do processo adminis- rapidamente possível. Para isso a administração tem de ser planejada como sistema
t 1.11ivo , O projeto-padrão duma lei administrativa (1963) (4) iorienta-se il!ddiq.: de processos de decisão. com o objetivo de só ativar as informações relevantes pos-
111('1\1('pelos regulamentos e pareceres jurídicos existentes. por lacunas. contra- sivelmente onde e quando desempenhem uma função seletiva, Isto pressupõe. em
dll,()('s c necessidades que surjam de completar e adaptar. 'e. sobretudo. por neces- compensação. que a relação das decisões parciais isoladas se organiza no sentido
nl.ulr-s de uniformização (5), No âmbito do cálculo de gastos. decide-se unicamen- dum reforço mútuo de seletividade , de tal forma que uma repartição possa utilizar.
le' snhn- uma automatização dos métodos de decisão. o que requere. todavia. uma como premissa. trabalhos de seleção doutras repartições.
!\I1.ilisc' exata de todas as. diligências parciais que careçam de decisão e. na prática.
/.
Perante a complexidade deste problema. um planejamento racional do
procedimento apresenta exigências para cujo domínio não houve. até hoje. pro-
1111\ ,10 posterior das evoluções efetivas da decisão consultar. em vez doutros, R, M, Cyert/E. A. gressos nem na teoria. nem na prática, A saída típica e provisoriamente indispen-
11'11!1·1I11.lllln/j. G, March: Models in a Behavorial Theory of the Firm (Modelos numa teoria de com- sável consiste. pois. em prosseguir as diligências de decisão e a coordenação das
1'"11.11'"'1110 da empresa). Behavorial Science 4 (Ciência de conduta 4). 1959. pags. 81-95, e, primo- contribuições isoladas para fixar o processo ad hoc e para coordenar os diversos
IO'UIIU"lltRichard M. Cyerr/james G, March: A Behavorial Theory ofthe Firm, Englewood Cliffs, NJ. processos isolados, unicamente através de alguns "princípios" de ordem geral -
1'1"'\ qu.uuo rarnbêrn para as análises estatísticas das conseqüências das decisões. que contam com o
por exemplo. de que todas as repartições. cuja esfera de atividade é afetada. têm
VIII••• rnlormarivo das decisões anteriores para as decisões seguintes. Ver. por exemplo. o panorama geral
de intervir (7), É evidente que dessa forma se implicam consideráveis desvantagens,
1'111W.ud Edwards: Dynamic Decision Theory and Probabilistic information Processing (Teoria da
.11"IH,,,,dinâmica c processamento da informação probabilista). Human Factors 4 (Fatores Humanos 4). Sobretudo distorce-se a decisão sobre o caminho que um assunto tem de tomar, em
1'Ih~. I"'/ls, ~)973. ou Gérard Gãfen: Theorie der wirtschaftlichen Entscheidung. Untersuchungen zur caso isolado. mediante razões de competência específica e mediante estratégias de
11I1!,k1111(1 HkOllomischen Bedeutung des rationalen Handels (Teoria da decisão econômica. Investi- poder, A "correspondência" converte-se em problema de poder. pois implica a
MII\""'~M,II,,' a lógica e significado econômico da atuação racional). Tübingen 1963. pags. 214 e segs., decisão sobre o projeto a seguir em cada caso, Hoje procura-se. sobretudo. com-
'I()~I' SI'fls,(': ainda de notar que também o conceito de programa da teoria de automação não significa bater na burocracia motivos incontroláveis e preferências mediante a ampliação da
''1l1'lI.IHum critêrio objetivo de decisão ou um arranjo ideológico de sinais. mas sim O regulamento orien-
1.11111 ",1111lima seqúência de passos da decisão, Ver. por exemplo. Herbert A. Simon: Perspektiven der garantia legal no interesse do representante legítimo, Mas desta forma nada se
AIIIIlII,.1I iOIl fUI Entscheider (Perspectivas de autornação para os decisores). versão alemã Quickbom lucra com o estabelecimento de alguns poucos princípios e condições mínimas (8),
1%1<.P,II!, 71. No fundo, trata-se dum problema de racionalização interna do método de decisão
" VI'I tomo idéia geral Julian Feldman/Herschel E. Kanter: Organizational Decision-Making da administração, Muito provavelmente, só se tornará racional uma padronização.
( 111I1I,.cI,1 or/lilni/acional de decisões). publicada por James G. March em: Handbook of Organizations que abranja o próprio processo de decisão num elevado grau de especialização.
(M,IIIII,IId,IS organiaacões). Chicago 1965. pags. 614-649. Há também um rápido esboço em Niklas
I 1111111,11'", l heorie der Verwahu ngswissenschaft. Bestandsaufnahme und Entwurf (Teoria da ciênci•
•••IIIIIIII"I.lIiv<I,lnvcruãr io e projeto.), Colônia-Berlim 1966. pags. 47 e segs,
'\ 1·.XIMt'l1l. cru ccrurapartida, regulamentos pensados do decurso dos negócios em ocasiões típicas e
111"ill'llIl'III1'nt(' •cpct idas. Consultar. por exemplo. Pius Bischofberger: Durchsetzung und Fortbildung 6 Quem mais se aproxima é Niklas Luhmann: Recht und Automation in der Offentlichen Verwal-
IlI'lllI'hHwllt~dwltli(h('. Erkenrnisse in der offentlichen Verwaltung. Ein Beitrag zur Verwaltungslehre tung. Eine verwaltungswissenschafltiche Untersuchung (Direito e automação na administração pública.
(1'J<,.d,,·II'1 i""'1110 " apcr íeiçoarncruo da economia das empresas na administração pública. Um con- \ Uma pesquisa de ciência administrativa). Berlitn 1966. pags. 116 e segs, Ainda assim. reclama-se uma
,"1111111 1',11.1,I 'I'oli .• d.1 .ulmiuisuuçúo). Zurique-Si. Gallen 1964. principalmente pags. 90 e segs. Hans revisão de regulamentos sob este ponto de vista. Para este assunto Malte von Berg: Automations-
11 ~'11 11111" .. (:1'" 11',11"/1,11111 hl'i Ikll("dt'n, Dargestclh and ausgewahlten Beispielen der kommunalen gerechte Rechts-und Verwaltunzsvorschriften (Regulamentos jurídicos e administrativos justificando a
VI'!w.IIIIIIIII(O dl'lIlI ~o dl)~ 111'11(1( 'o. II,I~"'p:1I tiçôes. Apresentado em exemplos escolhidos da adminis- automação), Colônia-Berlim 1968.
1111\""I "II'IIV,.).(:••111111\1 11•. 11111 11111111
M,,"iqlll'. N,'rJl data,
I 111111111.11101111 (.11111'\, •.•1.,,, ~. 1'111,.101:01111\1,1 Ikrlim 1968, Ver para este assunto Franz Mayer: Cescháftsgang (O andamento dos negócios), Publtcado por
1\ "'"1 10111111(111 11•• 1..111 .1.11111111
••,\11.I, I""'o~ P;II,I li simplificação da administração no Ministério Fritz Morstein Marx em: Verwaltung. Eine einfürhrende Darstellung (Administração, Uma exposição
11dfl.d "" 1111, 1111' Iltlllll 1111.11 I"'~~ ','I I' .1'''' 1.lIlIh~1lIas considerações. em princípio. postas por introdutôria), Berlim 1965. págs. 298-314 (305 e segs).
1'1\.111 \1" \"" .t ltlllljl~,~i'"111~I. \fll:I\\IIIIII"'1I1I/1I1!(l{dlllI1lJ udminisu auva como ratificação cons- 8 Conferir com Carl H. Ule: Rechtmassigkeit (Legitimidade), Publicado por Morstein Marx, op. cit.,
págs. 245-263 (251 e segs) ou, com base numa comparação de diversas ordenaçõesjurldicas. Franz Bec-
lilll' illo.lI). 11111111,1<1'"1 \\'IIIII!!L 't"!I.dlllll 11111 1lIlIlIlt'lll(llIl/il!,llIti/l('1IUt'lttl'lWI1dcs Carl Heyman- ..•...
'" V. 1I.III"~(11dl"ill'I'IIII'1I1II1~1i1l11C.,llfllll~'1111111 M "11111 1'1"1'11,11lU 1t.II'cli~.IIl(\(OCarlll('ymann). Colônia- ker: Das allgemeine Verwaltungsverfahren im Theorie und Gesetzgebung (O processo administrarlvo
1\""1," Ilr!llllflllllli'lIl1l, 1[111'.pjll!~ f,1 /lU,",III/fll', 111"'"""'1111.""III'II~,IIIII'II\I);lIddi«() <Irpi inctpio. geral na teoria e na legislação). Stuugart-Bruxelas 1960. pãgs. 40 e segs.
168 PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO 169

permitindo uma freqüente revisão do mesmo. Ela abre, simultánearnerue , a poso decurso da decisão e sobrecarrega a racionalidade da decisão. As pesquisas mais
sibilidade de automatização dos processos de decisão. recentes em países em vias de desenvolvimento (12), em relação com as empresas
típicas de prestação de serviços (escolas, hospitais. prisões de orientação "tera-
o pensamento duma organização ótima de decisão, completamente racio- pêutica", -hospícios. etc.) onde a cooperação dos que aí são atendidos é condição de
nalizada no âmbito do sistema político, é, e permanécerá, tão utópico quão sucesso (13), mostraram claramente que as organizações têm de ser desburocra-
claramente se indique a orientação dos requisitos a satisfazer pelos processos de tizadas, no caso de se lhes querer atribuir uma.co-responsabilidade pela orientação
decisão administrativa. Quanto maior for a complexidade dum sistema, com- do seu público. Sob determinadas condições sociais, ou em determinadas tarefas.
plexidade que deve ser reduzida por meio de processos internos, tanto J~.ú.:s isto pode· ser indispensável. O que deveria ser válido, sobretudo quando os próprios
oln igatória se torna uma legalidade essencial própria do sistema, que requere con- processos políticos não conseguem suficiente apoio político para a administração,
sidcraçâo das formas de organização e de processo. Com isso se torna cada vez de forma que esta necessita de desempenhar por si mesma funções políticas e or-
mais difícil e constitui uma sobrecarga para a racionalidade exeqüível exigir ainda ganizar, em cada caso, um público cooperante. Com isso se renuncia às vantagens
dos processos administrativos funções legitimadoras. Dificilmente a disposição dos duma diferenciação funcional de política e administração. Em -resumo: a adminis-
passos de decisão, do ponto de vista dum aprofundamento racional do problema e tração burocrática, que está equipada com os meios financeiros necessários e con-
(1(. oportunidades maiores para resultados úteis, tal como aqueles a que ambiciona forme às competências e é sempre independente do consenso dos interessados,
.1 moderna investigação da organização da teoria de decisão. poderá adotar uma deveria ser mais eficaz, pois a sua forma de trabalho pode ser gravada de forma
íorrna que apresente simultaneamente uma situação ótima quanto a um efeito de conseqüente e específico-funcional para a adaptação de certos programas de de-
1" opaganda e proporcione ao cidadão o sentimento de ser interveniente num as- cisão. A sua racionalidade e eficácia convertem-se, então, em fator de apoio de
\1I11()próprio. É precisamente perante os olhos do público que se separam, dum legitimação (política) do sistema administrativo como um todo. Permite escolher
l.ulo a eficiência, e do outro o valor de satisfação ou legitimaçâo da decisão (9). entre diversas alternativas e propor à administração mais programas de objetivos do
que quando a çooperação dos mais interessados na ocasião tinha de ser assegurada
SI' SC'olhar com mais atenção, então as condições de decisão da administração concretamente e sob a forma de permuta. Aquela complexidade maior e liberdade
p.IH'«('(1) tão diversificadas que se exclui automaticamente um juízo unânime ou de decisão na administração perder-se-ia, se se quisesse retirar à administração a
IlIe'SIll() ti institucionalizacão dum tipo uniforme de procedimento. De acordo com co-responsabilidade política pela adoção bem-intencionada das suas decisões
IHNO, podem distinguir-se, muito por alto, diversos tipos de situação de decisão 'e através do público. Na medida em que a política desempenha essa função, a ad-
e!lIIICIsilo programados, dependendo daí se, e até que ponto, se podem encontrar ministração pode ser aliviada da própria conservação politica com o consenso.
1'0IlIO~ de inserção na administração para processos de legitimação.
Da programação condicional das decisões administrativas resulta uma situação
A~ decisões administrativas são programadas numa escala muito maior, bem diferente mas com semelhanças judiciais. Aqui a administração compromete-
IlIc'dilllllt' a vantagem de objetivos e restrições da eleição intercalados. Nestes casos, se a decidir em determinado sentido, quando existem no programa condições es-
1'~l'e'l01 SI' dos processos de decisão um grande volume de atividade orientada para o pecíficas. Estas condições podem ser de tipo puramente interno, por exemplo,
olljc'llvo, por parte dos que organizam os procedimentos. Eles têm de se identificar regras de regime de orçamento, caixa e cálculo. Contudo podem referir-se a infor-
e0111() S('\I objetivo, ou pelo menos apresentar essa identificação. Não podem cobrar mações do meio do sistema administrativo, que conservam uma espécie de função
dlllll [uiz a posição de neutralidade quanto ao objetivo e, simultaneamente, va- de solução através dum programa de decisão. Assim, por exemplo, a distribuição
lelli,.11 c!t- forma diferente 'os que são atingidos pelas decisões, caso eles se apresen- das tarefas governativas é programada condicionalmente: sempre que existam fatos
le'lII r umo o meio ou o impedimento para atingir o objetivo. descritos de forma aproximativa, sejam apresentadas propostas ou com-

No~ )lI ocessos de decisão orientados para um objetivo, pode procurar-se,


qll,'I"!O muito, mediante a criação de "sistemas de contato" (10), ou mediante uma
12 Ver. principalmente. Elihu Katz/Shmuel N. Eisensatdt: Some Sociological Observations on the
di~JI()si"ao mais aceitável de meios e compensações, alcançar o consenso e a co- Response of Israeli Organizations to New Immigrams (Algumas observações. sociológicas sobre a resposta
"111'1,1".10 ma is concretos possíveis entre os interessados (11). Este esforço não é das organizações israelitas aos novos imigrantes). Administrative Science Quarterly 5. 1960. pags.113-
IHCllc·"~iv(), pois leva a uma considerável restrição das possibilidades de decisão ad- 133. Comparar também com Elihu Katz/Brenda Danet: Peritions and Appeals: A Study of Official-
1I11111~11
at iva , obriga à admissão de várias informações e objetivos secundários no Client Relations (Petições e apelos: um estudo das relações oficial-cliente), American Sociological Re-
view 31, 1966. pags. 811-822. E ainda Reinhard Bendix: Nation-Building and Citizenship: Studies of
our Changing Social Order (A criação de nações e a cidadania. Estudos sobre a nossa ordem social em.
evolução). Nova lorque-Londres-Sydney 1964. págs. 263 e segs ..
li (:1111'1
••11111'li i11>11
JI.IK~ I ~I t· M·KN. 13 Da literatura de organização sociológica sobre empresas de serviços. que começa agora a surgir.
111 , """ ••,,.11 """ .1 \I ".1111.I 11(Ifi 11111
~ ver como exemplos típicos Oscar Grusky: Role Conflict in Organization. A Study of Prison Camp Of-
11 hnl hll'~I\1I lli 111"\1111Ik ,1111.1'11.11 ~ IIIUIIIlI ,I<"lIlUada sobretudo na literatura americana. Con- ficials (Conflito de papéis na organização. Um estudo sobre oficiais de campos de prisioneiros). Ad-
I, 111 I"" ,'" 1111'1" 1""I II!ÍI,I,,"d 11111111,11111111'1 Civil Scrvarus in American Society. A Study of the ministrative Science Quanerly 3.1959. págs. 452·472; William R. Rosengren: Communication. Or-
~'" 1111(11IlIlm 11" 1;,,,, 1'1. 111111 11", l'IIw!:I' 1"""'''" 0\ I "lIh"1 FI·d(', ai Administrators (Os altos Iun- ganization and Conduct in the "Therapeutic Milieu" (Comunicação. organização e comportamento no
thllh11111' 11\1 •• IIH '111 if',I.IIIt~,1I11t IIt ,111.' '-'111 t ~,"clo ""0'"« u. OfIMf'n~ SOditis. carreiras e posição de poder meio terapêutico). Administrative Science Quar Zeterly 9. 1964. pags. 70-90: Earl Rubington: Orga-
.t". ~1i",·"I"IIIII.I, ."1",, h·"'·I~I.), 11\'.'11101."1'11\ 1'11'1 (1""_ '1', r H(·K~ .. I'hilip S('\lIIick: TVA and the nizational Strains and Key Roles (Tensão organizacional e papéis-chave), Administrative Science Quar-
\01,'" \C',,'I~, I\II~"I!:~ III~ 1\11/1""8 1t1l~1, II!-Ihtl! ,\ :>111111" 1)""111.1W ~llIilhhIIlK/VÍlI()r A. Thomp terly 9. 1965. págs. 350-369. e a formulação básica de Talcolt Parsons: Stucture and Process in Modern
li" 1',,11110,'dllli"illllili"" \1\,""i"i",~ç~'!III\I,Ii,'"), fIIm., 1"1'I1\I·1'lr,o. ,,,1,,,'1\1110 "li" I!I, 21 t' 22. Socierv (Estrutura ~ processo na sociedade moderna). Glencoe. 111. 1960. paga. 71 f' 8('g8.
170 PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO 171

provadas decisões prévias, tem de ser conferida uma possibilidade correspondente podem ser adaptadas a uma planificação individual diversa, os debates orais
de decisão. Com isso se apresentam fundamentos certos para procedimentos le- exigem um término coletivo, que não pode ser favorável à tarefa de todos os par-
girirnadores: o decisor não tem a responsabilidade de atingir determinados fins, ticipantes. Esta sobrecarga age então de forma especial quando os participantes
não tem que defender nenhum compromisso para o futuro, apenas comprova se se variam de processo para processo e uma multiplicidade de processos diferentes não
verificam as hipóteses _preestabelecidas para uma decisão definida. Graças a este pode ser tratada numa única sessão, como, por exemplo, nas entidades legislativas.
altvio de responsabilidade ele pode manter-se objetivo e neutro.
A sobrecarga aumenta ainda com o número de participantes, Um debate pres-
E é nisso que reside a diferença essencial perante os procedimentos judiciais. supõe uma condensação institucional de todos os resultados das decisões num úni-
»('1 ante o tribunal, a situação está de tal forma estruturada que, em cada processo, co lugar. Isto corresponde ao quadro administrativo clássico, que previa uma orga-
Sc' paga uma desilusão de que perdeum ou outro partido, de que ambos cedem e nização hierárquica simples, no plano horizontal, uma multiplicidade de fun-
SI' põem de acordo. Nestas circunstâncias, vale a pena adaptar o processo à assimi- cionários administrativos trabalhando lado a lado, mas independentes uns dos
lação da desilusão e ao aprendizado. Os procedimentos de decisão programada outros do decurso da atuação. À medida que a diferenciação hierárquica e fun-
condicionalmente da administração decorrem, em contrapartida, sem desilusões: cional do processo de decisão progride em diversos pontos por decisões parciais e
cada um propõe o seu rendimento e o observa e não se pode, em geral, prever quais aumenta a interdependência dos contributos isolados, vai-se tornando irreal esta
os processos que levam a uma desistência ou são frustrados. Neste estado de coisas, hipótese. Se uma pessoa ainda se ativer, então, ao princípio do debate oral, este
nao tem sentido deixar, desde o início, decorrer todos os processos com decisões tem de degenerar num cerimonial de atitudes, propostos através duma repartição
pt<l/o!1 amadas condicionalmente sob a ficção duma falta de consenso: geralmente
sem competência para decidir só por si (16). Há então um grande perigo de que a
d('v(' bastar para o caso da frustração pôr à disposição um processo semelhante ao exposição oral não tenha conseqüências, ou então de que se produza uma quan-
!lI ocesso judicial, portanto, só acionar mecanismos de legitimação quando se tidade de protocolos, difícil de manejar e onde o participante tardio no processo
.cHudizao problema da frustração. não encontre as poucas informações de que precisa. O verdadeiro decisor , a "rede
de comunicação", não pode aparecer no debate oral (17). As experiências ame-
Com isso se condensa a suposição de que num sistema político que diferencia e ricanas, ainda que não sejam comparáveis em casos isolados, falam contra o uso
especifica os seus sistemas parciais de acordo com as funções, não se devem pedir à das discussões orais e com semelhanças jurídicas nos procedimentos administrativos
( 18).
sua administração simultaneamente funções legitimadoras, funções que consistem
C'UI alcançar o consenso e dominar a desilusão, porque isso sobrecarregaria os seus
É evidente que as relações informativas entre a administração e o público não
11I()Ç('SSOS de decisão com funções secundárias e dificultaria a sua racionalização.
têm de ser cortadas com demasiada violência. A administração não pode prescindir
lun.í lmc-nte esta opinião deve ser corroborada mediante exame daquelas disposições das informações do público. Um direito dos interessados na audiência do processo
JUlídlco administrativas às quais se pode, quanto antes, atribuir uma função le- sublinharia esta carência de informações e torná-Ia-ia independente da vontade e
K" imador a , designadamente do debate oral das leis, do direito de audiência e da
parecer administrativos (19), Por outro lado, a prática hesita, não sem uma razão
1('1 e1(' fundamentação de decisões administrativas.

16 Para as dificuldades que surgiram no direito administrativo americano devido à regra "He who
Um debate oral, que se prescreve em várias leis do processo administrativo ( 14)
decides .rnust hear" (Aquele que decide tem de ouvir) e que levaram praticamente ao abandono consul-
c' i.unbém o projeto-padrão duma lei do processo administrativo de 1963, §§ 53 e
tar Robert A. Riegeter: Das Amerikanischa Administrative Law: Eine Darstellung für Deutschen )uris-
.\ :1<1 para "procedimentos administrativos formais" prevêem (15) que isso é inoportu- ten (A lei administrativa americana: uma exposição para os juristas alemães), Berlim 1967, págs. 74 e
110 para a maior partes dos processos de decisão administrativa, pois é muito demo- segs. Uma visão de conjunto sobre as formas jurídicas da cooperação na administração alemã, que
r.ulo , Isto não é tão importante para a duração do procedimento isolado, que até levanta questões semelhantes, é transmitida por Eberhard Klingler: Pat und Beratung in der deutschen
offentlichen Verwaltung (Conselho e deliberação na administração pública alemã) Dissertação Mürz-
pod(' seI acelerado mediante uma discussão oral entre todos os participantes. A
burg 1965.
Nol)l('( <lIga reside na necessidade da presença, com uma cota de inatividade neces-
17 Existem problemas idênticos nos processos judiciais da administração. Aí uma repartição deter-
s.u iumcntc elevada e, ainda na sincronização da conduta dos participantes. En-
minada. demasiado acusadora, deve representar "o estado", ainda que não seja exatamente aquela que
qll.IIIfO que as declarações escritas são sucetíveis de armazenamento, portanto fixou a decisão nos aspectos discutidos. O juiz. que deduz a partir dos atos a história da decisão da ad-
ministração interna: terá muitas vezes a sensação de discutir contra os ausentes, sobretudo quando vê
que o representante do processo que tem diante de si, ou a sua repartição, representa uma outra linha
II v,o,. pnr (·X(°t\lplo.. \ vis.ro de conjunto sobre os regulamentos estrangeiros na edição de Carl Her- nos debates prévios. Em casos desses podem-se iniciar acordos. como o autor já presenciou. sobre os
"0.'"" IJl,· ,"li V(·,w;ohUnHW(·tf.t1111·mj(t·S('I/Cdes Auslandes (Leis de processo administrativo no estran- quais, apesar do "debate oral". não se pode discutir oralmente.
N"''''). 1"''',111 1'1107. ""I\P,II.tI 11IIIV('III.i,iu sob "debate oral".
18 - Comparar com Peter Woll: Administrative Law. The Informal Process (Direito administrativo. O
I', (,111111'.11111 "'"' 1'.\)1" ~~ \' ."H (' ~ 11 r M'/(S. Na fundamentação, o preceito do caráter oral é
processo informal), Berkeley-Los Angeles 1963. Ver ainda Elmar Breuckrnann: Grundzüge des Federal
11'111.,1111 111"'li" h"lilr ., I'xlll"'" I., d,o ."III1~I\,;1I .1I1Ipl(1,como se esta não pudesse suceder por escrito. ou
Administrative Procedure Act (Características da lei federal de procedimento administrativo), Disser-
nu.' 1""ucI ••, 1'.1I""I'.IIli,il',IIII' i,"I>"I" j, ,'vlclrl\lr 'IUt'., idéia é plagiada do processo judicial sem que
tação, Mogúncia 1962, pags. 40 e segs. e Riegert, op. cit., pags, 110 e segs., que aliás atribui ao proces-
fr '4IlIljIlU\I- ~, -,".1 I tHlfttlfl~1I1 t,t i IHII 0' 1'11I1t1t·1fl." th' e onulenação administrativa interna. Comparar
so formal, apesar da sua raridade, uma importância essencial como possibilidade. que permanece em
""" •• 11·111111 d., (1I,,,i,.flll ,I" l'tllI", " .••" .III'I'It" ••t~.1II tI.1 .ullllinislração no Ministério Federal do In-
segundo plano.
1",1<".11111111l!lhU.l'tIN_.III·I.! ~'''_ J.~,IIIII\1,III1·' "III,"ln!11 Nt,((lti('o rrn : Zum Musterentwurf eines
VnWIlItIIl'M""illllIl'''lIi'~HIf'1 il·.II~ '''li' i""I'I"I""I'11I ti 1111111
h'i do I)'()«'S~() adrnlnlstrauvo). Bayeris- 19 Ver Hans-Cünrher Konig: Der Grundsatz des rechtlichen Cchnrs im verwaltungsbehordlichen
,111' \', 1••• 111111.,101_111', ""vl,"i'
IIi (I~~vi\j" l'ihllilli'IIHIIVH til. 1(1). l'l/d, pll)l~, 2711277 (276), Verfahren (O princípio da audiência jurtdica nos processos das autoridades administrativas), ()('uls('hr~
172 PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO 173

compreensível, em conceder incondicionalmente um tal direito (20). A adminis-


e, para tudo isso, forneceria e elaboraria uma abundância de informações auxi-
Ilação nunca pode, aliás, obter informações "completas"; ela tem sempre que
liares no decurso do procedimento preparatório. Isto não pode acontecer e, real-
decidir sob a condição duma incerteza parcial, não pela não-existência de infor- mente não acontece, no processo judicial. .Já o fato de que a fundamentação duma
mações suficientes, ms sim porque os esforços para o seu emprego, ou quanto ao es- decisão discutível será redigida de forma igual para os ganhadores e perdedores
clarecimento da questão da sua existência, seriam demasiado dispensiosos (21). A mostra que ela não se pode especializar em obter o consenso (23). A força de per-
medida em que é racional obter informações será logo objeto de cálculo próprio, suasão da fundamentação constitui, nestas circunstâncias, quando muito, um ob-
em que entrariam não só os critérios de relevância dos programas, como também as jetivo complementar que, em conflito com outros objetivos - por exemplo, eco-
questões de gastos de tempo, mão-de-obra, dinheiro, etc. Os limites do uso razoável nomia de tempo e aceleração da decisão, ou exatidão jurídica e intangibilidade da
de informações só poderiam ser averiguados através do cálculo administrativos in- exposição - é deixado para trás.
terno.
Atualmente isto é pura teoria, pois não existem ainda modelos de decisão para A função de fundamentação é outra, nomeadamente a dum membro de li-
situações administrativas práticas, modelos segundo os quais se pudesse calcular o gação para controle jurídico-administrativo contínuo. A fundamentação fixa as
uso de informações de acordo com custo e rendimento. Enquanto a administração linhas da argumentação, linhas que a administração defenderá num procedimento
não puder justificar claramente a racionalidade duma renúncia a informações sub- semelhante ao processo judicial, dando assim ao interessado uma base para a sua
scqüerues, pode ser conveniente contrapor-lhe um direito de audiência, exceção decisão quanto à questão de querer ou não recorrer (24). Assim, também a fun-
f<oilapara casos que estão claramente fora das restrições econômicas. damentação é escrita na prática por juristas para juristas, para as repartições
superiores e para o tribunal; e ela é de tal forma condensad a no esforço pela justiça
A obrigação de fundamentar os atos administrativos promulgados por escrito e ausência de erro que, muitas vezes, os destinatários não a podem compreender
(lft'l('ce uma última prova para as funções pretensamente legitimadoras do pro- sozinhos e só podem decifrá-Ia com a ajuda de peritos,
(('dimento administrativo, atos administrativos que são hoje, em princípio, sempre
A obrigação de fundamentação e a sua prática na administração depois de
.
.rl n mativos (22). Pode-se supor que tais fundamentos sirvam o objetivo de fazer
pi opaganda para o ponto de vista da administração e de convencer os interessados tudo isso, dificilmente pode servir como prova para o fato de se realizarem no
d,l justiça da decisão, portanto de legitimá-Ia mediante o consenso. A fundamen- processo administrativo funções legitimadoras em proporções dignas de menção.
1.I~ao pode, sem dúvida, ter este efeito no caso particular; mas, entretanto, não é
t onsidcrada seriamente como um meio para atingir este fim, nem como sendo Estas considerações aproximam-se da proposta de aliviar continuamente das
tulhacla para ele. Deveria usar uma linguagem completamente diferente se quisesse funções legitimadoras a administração e conjuntamente os procedimentos adminis-
u-ntar convencer pessoalmente os interessados; deveria, por exemplo, oferecer-Ihes trativos e concentrar o trabalho administrativo específica e funcionalmente na
lima compensação, rnostrar-Ihes como é que se pode integrar a decisão na sua vida elaboração de decisões consistentes sob redução da maior complexidade possivel
(25). Isto corresponde a uma separação nítida entre política e administração como

V"lwnltungsblatt 74 (Icrnal administrativo alemão 74), 1959, paga. 189-196; Franz Becker: Das Recht
"..1 Geh(ir im deutschen und franzõsischen Verwaltungsrecht (O direito em audiência no direito ad-
1I11111KlrUtivO
alemão e francês), Colônia-Berlim-Bonn-Munique 1967. pags. 24-44 com mais indicações
rlll Siudien übcr Recht und Verwaltung (Estudos sobre direito e administração). 23 Pode-se observar, ocasionalmente. na prática administrativa que as decisões de recusa e sobrecar-
l!(J Comparar o regulamento como preceito atenuado, entremeado de exceções, que o § 21 do ga são esclareci das complementarmente perto da fundamentação. quer oralmente. quer por carta dum
chefe de repartição, para assim alcançarem uma alta dose de compreensão. A problemática desta
luujrlo padrão duma lei de processo administrativo (op. cit., pags. 21. 123 e segs.) propõe. Assume uma
prática é evidente. Obriga quase automaticamente aquele que explica a distanciar-se da sua decisão e
pll.i~ll() crüica Carl 11. Ule/Franz Becker: Verwaltungsverfahren im Rechtsstaat (Processos adminis-
do seu estilo pessoal, a inserir a sua futura benevolência. ou algo de semelhante, como meio de pro-
lIulivll\ no estado constitucional). Colõnia-Berlim 1964. pags. 40 e segs. e sego e Carl H. me em Recht im Wan-
paganda e a empurrar a "culpa" para a decisão dos outros. por exemplo a lei, os serviços centrais. o
d,·1, 0)1. c it., pags. 65 e sego
Ministério das Finanças. etc. A procura de consenso deste .gênero depende tipicamente de relações es-
~I »t'Mk hâ algum tempo que se começa nas ciências econômicas trabalhando-se sobre treitas, particulares e não burocráticas nos limites da administração e daí ser pouco conveniente para a
IIlodrlo, de decisão, que já não decorrem da informação completa. mas antes verificam os custos da ob- legitimação de direito.
("II~,I<) de infot rnaçõcs. Ver. por exemplo. John T. Lanzetta/Vera T. Kanareff: Information Cose, 24 Aliás. este argumento desempenhou um papel importante na fundamentação do dever de fun-
AIIIIlIlIll or Payoff', aud Levei of Aspiration as Determinants in Decision Making (Custo da informação. damentação. Vindo da fundamentação da decisão do Tribunal Constitucionab Federal de 16-1-1957,
"111""1" til' pagumeruo l' nível de aspiração como determinantes da tomada de decisões), Behavorial BVerfGE 6. pags. 32 e segs. (44) para a fundamentação dos pareceres da comissão de peritos do.
I'Illrllll' 7,1%2. PUIIS. 159173, ou C. ClIfncr. op. cit.. principalmente págs. 207 e segs. para a neces- Ministério Federal do Interior, op. cit., págs. 207 e segs. e daí para a fundamentação do projeto-
0,,11101,',!c- "1l'KI"~ ti" t(-"nino·'. qUI' ter minam a nova busca de informações num ponto ótimo. A )uris- padrão duma lei do processo administrativo . op. cit., pág. 145 parece convencer sobretudo os
Il\lJd~lIdll 1\11111>('111 M' oI'·V'·I.1I.lInili.1I iz .u t om I'Sl~ pensamento. O tribunal administrativo de Baden- práticos. Pelo menos este pensamento estabelece o "abastecimento", admissível em si. de novas fun-
WClII"II,)II"K """ I'(),'" 1111~1I11N",,"·,,~.I dI' !) J() 1963 A administração pública 17. 1964, pags. 103 e
damentações no processo. numa luz problemática.
,.". I)IU' 1I ,\lIIIIIIII.III,~III1, ~,' 1""11111111,.111de' INUS.\, poderia, por motivos de economia. indepen-
25 Tem de chegar a uma outra opinião aquele que vê o processo administrativo primariamente sob o
111-"1 •.• 111 ••n, ,.IIIII"IIV.II 11111 ••• II~ 111111,,,, '1II\l1t~.,,·. I)(~vills reivindicadas. Estão. portanto. confiadas à
aspeto duma função de garantia legal. Então a igualdade de função sugere uma relação de desconges-
111"•••1111I'lIlh it,1 ,.••••• 111"•·•• 111 ••11,·.11,'"IIi.1I I"" ,1,1111dllN illfol mações incxisterucs. Comparar com Her- uonamento recíproco entre processos administrativos e processos jurídico-administrativos. e este descon-
111 .•1111111111" /UI 111I'",i,' 11111111" ","1111111(1'.'11' " !t'/l11I111.,d,·,iH.lo). Em: Collcgiurn Philosophicum. gestionamento só pode ser concedido por uma determinada semelhança dos processos. Ver. por exem-
/11111111'11 1",/1111111 H ill' I 111111 1,111." 111111.( ·'11 11,:,,11'11'11
hl",(,Ii, 11 Jo.N( lidos 11111
01o sexagésimo aniversârio de plo, Carl H. Ule: Verwaltungsverfahren und Verwaltungsgerichtbarkeit (Processos administrativos e
1".•• 11111111(1111).1\;,.11,11 :;1111111'111, I Lllir,, l'=hU 11M 1111 jurisdição administrativa), Deutsches Verwaltungsblatt 72. 1957, pags. 597-603, ou Becker, op. cit.,
:1'1 <111)111'1"111 11111),,10,()I). eu.. e ainda como sobretudo págs. 37 e segs, Em posição contrária, designadamente Karl A. Beuermann: Das Verwalum
1[11"" 1101'"f,'I r "'1('. gsverfahren (O processo adrninisrrarivo), Veróffentlichung der Vereiuigung der Drlll.dwn S( .I,II~I('dI(
PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO 17'5
174 PROCEDIMENTOS DECISÓRIOS DA ADMINISTRAÇÃO

sistemas parciais diversos da organização política por um lado, entre administração u. (' ,\ necessidade de racionalização da administração, devido à democratização da
JI()lhic3 e, na República Federal, devido, sobretudo, a uma ampliação integral da
(' jurisdição administrativa por outro. A democratização da política como um sis-
rema de certeza de apoio político para o poder legítimo por um lado, a jurisdição jllll~dição administrativa. O aperto da organização reside agora na capacidade de
totalmente ampliada a divergências de direito público, por outro, constituem lI'alil.a~'ão da administração. As decisões administrativas têm de ser racionalizadas
para interceptar esta pressão do trabalho. Racionalizar significa orientação es-
aquisições institucionais que, devido ao seu estilo processual, são até mesmo li-
mitadas no seu potencial de complexidade, podendo, porém, assegurar uma gran- peclfica de função. A orientação específica de funções exige, porém, um alívio de
de legitimidade da sua atividade governativa de decisão, nomeadamente através do outras [unções, um alívio principalmente das funções de obter o consenso e de
alargamento dum consenso proporcionado simbolicamente para o sistema político e I('gitimar as decisões. Só quando o sistema político-administrativo do estado se
o seu atual governo, por um lado, e pelo isolamento expressivo dos protestos, por dl'senvolve globalmente é que uma dose suficiente de diferenciação funcional pode
outro. Entre estas instituições e, trazido por elas, haveria lugar para um sistema alcançar aquela complexidade interna que se deve esperar duma sociedade civi-
racional muito complexo de elaboração de decisões consistentes, que não precisaria lizada e que apóia a sua legitimidade.
agora de se sobrecarregar com preocupações de legitimidade, apoio político ou
desejo de cooperação dos interessados.

Nestas circunstâncias, a administração não devia encarar os seus processos


(orno instituição para o alívio da jurisdição administrativa e também não se devia
sobrecarregar com esta função suplementar. Este regulamento padrão não precisa
dI' excluir que, para determinados tipos de processos de decisão, onde se pode
1\'IH&nciar a uma cooperação funcional diferenciada na descoberta de decisão e on-
dI" por outro lado, se trata de obter o consenso, ou então uma determinação das
posições e o isolamento expressivo dos interessados, se procure uma outra solução e
\c ponha à disposição um tipo especial de processo. Por outras palavras também na
.rclministração se pode prever, para casos adequados, um processo com funções
II'gitimadoras. Talvez seja possível reservar para este fim a categoria de "processo
Ior rnal ", ainda pouco nítida na sua função, pelo menos no direito alemão (26). Este
g(\Ile1o de processo não poderia, de qualquer forma, ter a função do último meio
para os interessados, tal como é o caso nos Estados Unidos, perante uma garantia
Iq{al pouco satisfatôria e também não poderia ser válido como modelo do próprio
PIOC('SSO administrativo, que não pode progredir em toda a parte, meramente por
II'f 1ecs práticas. Com maior razão, não apresentaria nesta limitação sobre processos
dI' decisão atípicos e particularmente sujeitos a desilução, uma garantia eficaz, an-
II'~ d(' ser encarado como um fenômeno marginal e permanecer uma exceção.
...
Encaradas dum ponto de vista histórico, as administrações burocráticas, mes-
~II() num processo de diferenciação, nasceram da jurisprudência. Sobretudo no âm-
hii o americano, esta tradição permanece bem viva e confere uma colaboração mais
vigorosa às reservas para com a burocracia pura na administração e na justiça do
q\l(, as dúvidas sobre as influências políticas não-objetivas. Também aí, tal como
11.\ Alemanha, o processo judicial serviu de modelo ao processo administrativo e,
r-nquunto que nos Estados Unidos depende da proteção contra a burocracia, na
"1("lIlilnha depende da proteção contra a política. Todavia, a situação alterou-se
1111\(10111\('1)[,,1\111'1\[(' perante aquela situação inicial; devido à complexidade crescen-

~lrllI'" 17 (1'11 111 ••• I~.l".tu """, ",~~(l1 du~ 11'(l',·ssor('s alemães de direito político 17), 1959, pags. 118-182
(11tH,' N"M~) VNII' "~'"lplf\ "I"NII~ ''''lIdl~llIrilrncnl(" as conseqüências práticas posslveis da escolha do
I'.IIltlrllh. d •• ..t.'~II"!t••" 11111.01 .til111.1 " 111',' d'·I'IUII"'o.
'/h 110" I" li' """ .••10111111'" ,11 "" !til 111,01 I' IIII'VI~IO'IIIno um tipo especial de processo no projeto-
1'~,hM" ,11111'" .I,
10-1 1""""'" .uI"lllIillll""'" I'III~, ~~ ,I" (' M'I\S ,~('m que se possa reconhecer da fun-
.l,u, ••."lil\r;" ,._. ,.,1. ("I' .11 1'''/1' rllll' "11.) "",10 I"". r,l;" 11 ""nl;,lfl''''IlN'ial clrsl!' tipo de processo difererue dos
.,"' ••.•~.t., ,li ",,10 •• ""I '1'" , ,II~. 10.", h 111': i. ,••,.1. 1._••i••"r .••• 1111.1"1~1,d"11'I n,lu"ç,w"vâlidM para eles, Ênparcmc à comis-
'_"I"" d .•I)iU'''II-' "I"" !tI, 'u,iu, 1.-,tJ.:. ·I,.II)~I~~ qHf ja ~ -I'\ILIIO I'U)(f·· ••••• fflIlHiWU"-HldhaI\IM tt <""1,,(.", que, penamo. tarn-
Líf," fi.· ,h,,,,ti_ ,~I,", '
Pode tratar-se do tema da legitimação pelo procedimento com os meios au-
xiliares de concepção e método da atual psicologia social e da sociologia. Isso de-
veria ter ficado claro nas reflexões anteriores, ainda que provisórias. As nossas in-
vestigações teriam, portanto, de se classificar dentro do âmbito especializado da
sociologia do direito. Ao mesmo tempo elas tiveram pouco contato com a ideologia
que se publicou sob esta designação técnica. Isto não constitui um acaso. Na sua
forma atual, a sociologia do direito, enquanto não se destina a questões de atitudes
profissionais, carreiras e formas de decisão dos juristas (1), considerando a grande
amplitude dos métodos empíricos, continua presa (2) à forma de posição dos
problemas da jurisprudência, de certo modo como uma tentativa de os resolver por
meio de métodos não jurídicos. Entretanto o desenvolvimento técnico progrediu
tanto nas ciências sociais, que têm de se construir pontes. O direito pode ser con-
cebido como estrutura dos sistemas sociais e o instrumental da teoria dos sistemas
da sociologia geral pode ser utilizado para fazer frutificar as investigações de so-
ciologia do direito. Isso mostra-se com o exemplo do procedimento jurídico, que é
um caso de utilização, por agora "inverossírnil", da teoria dos sistemas. Para além
do conceito de sistema, a atual discussão sociológica apresenta inúmeros pontos de
contato para o nosso tema. Desta forma se pode justificar conjuntamente a impor-
tância central duma legitimação pelo procedimento para a moderna sociedade in-
.dustrial., A distinção entre variáveis expressivas e instrumentais, o conhecimento de
que as estruturas têm de ser garantidas contra as frustrações, a teoria da diferen-
ciação funcional e dos seus problemas conseqüentes, assim como determinados
pontos de apoio para uma crescente separação de sistemas sociais e pessoas, podem
servir-nos de guia.

Esta teoria predominante nos Estados Unidos começa a ser lá mesmo deplorada. Ver Jerome H.
Ckolnich: The Sociology of Law in America. Overview and Trends, Law and Society (A sociologia do
direito na América. Panorama geral e orientações, lei e sociedade Suplemento dos problemas sociais
1965), pags. 4·39; jack P. Gibbs: The Sociology of Law and Normative Phenomena (A sociologia do
direito e dos fenômenos normativos), American Sociological Review 31, 1966, pags. 315-325. Ver ainda
do mesmo autor: Norms. The Problem of Definition and Classification (Normas. O problema da de-
finição e classificação). The AmericanJournal of Sociology 70, 1965, pags. 586-594.

2 Pode convencer disso uma olhada à bibliografia da sociologia do direito reunida por Paul Trappe
em: Theodor Geige: Vorstudien zu einer Soziologie des Rechts. Mit einer Einleitung und internationalen
Bibliographie zur Rechtssoziologie (Theodor Geige: Estudos prévios para uma sociologia do direito. Com
uma introdução e bibliografia internacional para a sociologia do direito), Neuwied-Berlim 1964, pags,
421 e segs. Trappe queria dizer que, pelo menos em Geiger, ele reconhecia princípios para uma so-
ciologia do direito realmente sociológica (op. cit., pago 13). Isso pode estar certo para o seu ernpirismo
consciente do método. Mas também refere as perguntas, a que procura responder, do debate da filosofia
do direito e da teoria do direito e não da teoria sociológica do seu tempo. Considera até como ,sendo
"completamente insignificanrc Se quiserem considerar o meu trabalho como um contributo para a teoria
1('1<" do direito 011 p.II •• ,. "I( ,"101(1,' dI) direito" (op. cir.. pago 39).
CAPÍTULO I
Variáveis instrumentais e expressivas

Reservas nítidas perante o conceito de objetivo fazem parte das características


mais surpreendentes da recente teoria sociológica. Naturalmente que se não con-
testa a existência de objetivos, mas a categoria do objetivo é despida do seu status
ideológico: básico, status que possuiria no âmbito das anteriores ciências de
atuação. A orientação para um objetivo tem de ser hoje encarada como uma va-
riável. Os sistemas sociais podem concentrar o seu significado e a sua relação com o
meio ambiente mais ou menos continuamente sobre finalidades específicas, mas
têm sempre de desempenhar também funções que não podem ser garantidas só
pelo atingir do objetivo (1). Uma das versões, que mantém este parecer, é a distin-
ção entre as variáveis instrumentais e expressivas. Com a ajuda desta distinção
pode-se explicar que, e por que razão, também nos processos o significado da
atuação não se deixa capturar integralmente numa fórmula de objetivos.

Em geral, a legitimação não é declarada como objetivo dum procedimento,


mas sim a garantia legal ou ainda a elaboração de decisões obrigatórias e justas (2).
Este objetivo tem de ser alcançado e controlado nos seus resultados. Será definido
operacionalmente conforme as possibilidades. A legitimação da decisão, nesse sen-
tido, não poderia converter-se na finalidade do procedimento. Nem é sequer claro
se, e até que ponto, a legitimação pode mesmo ser atingida através de procedimen-
tos isolados, independentemente do contexto social que comporta a disposição para
a tomada de decisões, nem é possível indicar em que efeitos específicos se poderia
controlar este resultado. Não se trata duma finalidade operacional, mas sim duma,
função a ser realizada no decurso do procedimento, se se quiserem evitar durante
um largo espaço de tempo distúrbios sociais de grande peso político, mas que não
pode ser formulada como um programa que reja a escolha de meios específicos.

A nossa regca diz respeito ao seguinte: a função de legitimação não é realizada


mediante a escolha de meios apropriados para atingir um objetivo preestabelecido,
existindo na distância, mas sim mediante aspectos que se. verificam no compor-
tamento social, muitas vezes de forma latente , mediante a atuação simbólica-
expressiva que inclui os participantes em papéis implícitos e iOS não-participantes,
mediante exposição dramática do procedimento no seu significado e os concilia,
deixando-os participar de forma ativa ou simbólica no processo de redução. Esta
reflexão leva à proximidade da distinção ideológica entre variáveis instrumentais e
expressivas, distinção que foi encontrada pela primeira vez na teoria dos conjuntos,

Consultar sobre isso Niklas Luhmann: Zweckbegriff und Systemrationalitat (Conceito de objetivo e
racionalidade do sistema), Tübingen 1968.
2 Quando se fala aqui em objetivo do procedimento e a seguir das variáveis instrumentais ou das
necessidades com respeito a este objetivo, encontramo-nos sobre um plano de sentido diferente do
J da questão de qual o tipo de programa a usar no processo. Esta tese duma orientação instrumental do
processo não contradiz, portanto, as debatidas acima, de que são usados no processo não programas de
objetivos, mas programas condicionais como premissas de decisão.
VARIÁVEIS INSTRUMENTAIS E EXPRESSIVAS 18!1
182 CONSEQÜÊNCIAS E PROJEÇÕES

mas que vai adquirindo hoje uma importância crescente para a teoria geral do sis- ir relevante para a conservação da estabilidade (5). Naturalmente isto está errado.
u-rna social (3). As variáveis instrumentais constituem necessidades derivadas, que Arnbas as funções, tanto a instrumental quanto a expressiva, servem para a solução
adquirem o seu sentido a partir da realização de objetivos distantes e que são dos problemas do sistema e, neste sentido, servem para a sua conservação.
variáveis em relação a leis; variáveis expressivas (ou de consumo) são necessidades
satisfeitas diretamente através da ação, de tal forma que uma alteração da atuação
Na realidade a distinção refere-se a um problema cronológico. (6). Só se pode
pressuponha uma alteração da necessidade.
atingir um aumento de complexidade do sistema social através do adiamento da
satisfação de algumas necessidades, satisfação que se atinge por caminhos des-
Impõe-se utilizar
esta distinção para interpretar a relação da descoberta da
viados. Os objetivos servem para motivar esses desvios e para justificar as desistên-
decisão e, simultaneamente, para inserir este problema especial no contexto duma
cias atuais ou esforços em relação aos efeitos a longo prazo. Através duma tal dis-
ieoria geral do sistema social. Pois é evidente que a descoberta pressupõe um cál-
tensão cronológica entre causas e efeitos, podem obter-se possibilidades de es-
culo instrumental da decisão certa (4), enquanto que os efeitos de envolvimento pecificação funcional e variação da atuação orientada ideologicamente. A ação e a
simbólico do processo só se podem realizar através duma ação expressiva. satisfação dos desejos já se não relacionam tão intimamente a ponto duma per-
manecer ou cair quando a outra permanece ou cai. Podem, sim, estabelecer-se
Antes, porém, a distinção entre variáveis instrumentais e expressivas tem de ser
determinados objetivos distantes e escolher, de entre os diversos meios alternativos
u-Iundida e garantida contra uma significação incorreta e divulgada. A investi-
apropriados, os melhores, substituir meios deficientes por outros e, se for o caso,
HtI~:ãosobre pequenos grupos conferiu a esta distinção uma interpretação muito
modificar também os objetivos com respeito ao custo dos meios. (7). Estes processos
d('l('1 minada, na medida em que paralelamente a ela utiliza uma outra distinção
de substituição estão na base de toda a racionalização da ação.
f'1I1 I c realização de objetivos e conservação da estabilidade, tendendo para esta-
hdt'ccr coerentemente ambas as distinções. Daí nasce a impressão de que a função
Mas nem todas as necessidades se podem adiar neste sentido e entregar a um
expressiva, em contrapartida , serve para a realização do objetivos de conservação
cálculo de substituição. À medida que os sistemas se começam a orientar instru-
d,1 estabilidade, que os problemas da estabilidade são primariamente os da mo-
mentalmente para efeitos a longo prazo com respeito aos objetivos, vai-se tornando
I ivação sócio-emocional dos membros, enquanto que a realização do objetivo é
problemático o presente. Surgem problemas atuais de conseqüências, cuja solução
não pode ser adiada, sobretudo os da conservação intermediária do sistema, da
!I Como ponto de partida, conferir com Roberto F. Bales: Interaction Process Analysis. A Method for motivação contínua, do sentimento de segurança e da criação da confiança (8). Em
Ihl' Study of Small Grous (Análise do processo de interação. Um método para o estudo dos grupos lugar da satisfação direta das necessidades, aqueles objetivos distantes tém de ser
pequenos), Cambridge , Mass. 1951; para a posterior evolução da teoria dos conjuntos, por exemplo,
procurados e simultaneamente consolidados no presente como sendo razoáveis.
Robert F. Bales: Task Status and Likeability as a Function of Talking and Listening in Decision Making
:roups. (Status do cargo e similitude como uma função de falar e ouvir em grupos de tomada de de- Tem de se conseguir uma certeza atual quanto ao fato de que valem a pena os es-
(1IItkS), editado por Leonard D. White em: The State of Social Sciences (O estado das ciências sociais), forços, as renúncias e a paciência, de que o prejuízo momentâneo pode ser su-
Chicago 1956, pags. 148-161; Philip E. Slater: Role Differentiation in Small Groups (Diferenciação de perado através da prosperidade futura. A satisfação das necessidades mais simples
!'IIJléis em grupos pequenos), The American Sociological Review 20, 1955, pags. 300-310; Philip M. só pode ser resolvida, assim, através duma função dupla, uma ligação da orien-
M,ucus: Exprcssive and Instrumental Groups. Toward a Theory of Group Structure (Grupos expressivos
tação instrumental com a expressiva, cuja junção tem de ser assegurada.
(' msrrumeruaís. Para uma teoria de estrutura de grupos), The Americanjoumal ofSociology 66,1960,
!,l'IIS. 5459; john W. Thibaut/Harold H. Kelley: The Social Psychology of Groups (A psicologia social
dos grupos), Nova Iorque 1959, pags. 278 e segs.; Barry E. Collins/Harold Guetzkow: A Social Psy-
,hology of Group Processes for Decision-Marking (Uma psicologia social dos processos de grupo para 5 . Sobretudo a partir de Kenneth D. Benne/Paul Sheats: Functional Rolesof Group Members (Papéis
" romada de decisões), Nova Iorque-Londres-Sydney 1964, pags. 214 e segs.; Peter j. Burke: The De- funcionais 'dos membros do grupo). The Journal of Social Issuces 4, 1948, pags. 41-49. Para a utilização
vetopment of Task and Socio-Emotional Role Differentiation (O desenvolvimento da tarefa e da diteren- na sociologia da organização consultar também Alvin W. Gouldner: Organizational Analysis (Análise
,LI/,.io sõcio-emocicnal dos papéis), Sociometry 30, 1967, pags. 379·392. Como valorização extraída do organizacional), em Merton, entre outros, op. cit., pags. 400-428; Amitai Etzioni: Two Approachesto
,.m,po da sociologia da organização consultar, por exemplo, Amitai Etzioni: A Comparative Analysis ot Organizational Analysis. A Critique and a Suggestion (Dois enfoques da análise organizational. Uma
COll'pJeX Organizations. On Power, involvement and their Correlates (Uma análise comparativa de or- crítica e uma sugestão), Administrative Science Quarterly 5, 1960, pags. 257·278.
i!,lIlitaçl\cs complexas. Sobre o poder, compromisso e seus semelhantes), Nova Iorque 1961, sobretudo li Em princípio também Talcott Parsons ver, por exemplo, o ponto de vista do autor editado por
PIlK~. !lI c sego e passim; do mesmo autor: Dual Leadership in a Complex Orgamzation (Liderança Max Black em: TheSocial Theories of Talcott Parsons (As teorias sociais de Talcott Parsons), En-
dupla na organização complexa), American Sociological Review 30, 1965, pags, 688-698; para a so- glewood Cliffs, N. J. 1961, pags. 311-363 (324). Em oposição a ele havia a distinção íntima entre ra-
"olOlllll polluca ver Ulf l Iimmelstraud: Social Pressures, Attitudes, and Democratic Processes (Pressões ciocínio de objetivo e raciocínio de valor em Max Weber: Wirtschaft und Gesellschaft. (Economia e
•• I( i:,is, (,lil\,d('~ f IlIOf('S"OSdemocráticos), Estocolmo 1960; para a inclusão na teoria geral do sistema de sociedade), Edição de estudo, Colônia-Berlim 1964, pags. 17 e segs., orientada objetivamente e não
.IUI1(.IO, ,rs(l('t!ivól'III-nlt' do ~i8lrma social, Talcou Parsons/Robert F. Bales/Edward A. Shils: Working temporalmente; raciocinar objetivamente quer dizer determinação e justificação através de algo distinto;
""prll "I lhr 'I hrOlY 01 A,t\on, (EnSllios sobre a teoria das ações), Glencoe, .m. 1953; Talcott Parsonsl raciocínio de valor significa, em contrapartida, determinação e justificação por intermédio de si pró-
Hohrll I' nlll". I'I1.."i1y, S"tI"li/lll,nn, und lntcracuon Process (Família, socialização e processo de in- prio.
Ir, 11\.11') (;k" ••", III 1'1"'1,. "" ••I•••• d'K!inç.\o us.rda para a definição dos problemas do sistema de 7 Esta variabilidade relativa é também apresentada por David Apter como caracterlsrica de valores
111'." •• 111"••,·. 1m, 'H!,II·"",IN r '" '''''N'IIlI'' 1'1" I ,til 011 Pnrsons: General Theory in Sociology (Teoria geral instrumentais em oposição aos valores de consumo. Ver David E. Apter: The Political Kingdom in
1'''1 .11111,10"",). .·,11",,1., p'" 1(,,111" li. MI'lI'"' I rCUH" 11Broorn/Leonard S. Cotrell em: Sociology Today Uganda. A Study in Bureaucratic Nationalism (O reino político em Uganda. Um estudo sobre nacio-
(A _li' 1",""".10,,1,,). NII •. , 111"111"I!H,II, 1"'''1 ,~ ~H (" r MrIlM.). nalismo burocrático), Princeton, N.J. 1961, pág. 85 e do mesmo autor: The Politics of Modernization
, htll t UII'''I ••.••,•• ,,,"''' l'f"!;II'"'"". 11",,1"""'1\1,,1 .1•• 'lI( ,oll ••lidade jurldica por john Ladd: The (A política da modernização), Chicago-Londres 1965, pags. 83 e segs,
~i",
1'1." 11••1 I'" •• ri •.•• , I~,~.• j"IIIIli. i~,t'lui,i"" (11 I\lK~' ,I •• I ~1~1I I" dri, u ua decisão judicial), editado por 8 . Quem mais se aproxima é Niklas Luhmann: Vertrauen. Ein Mechanismus der Rcduktion sozialer
f;iul,1 ,'01,:,101.10f ,.,. 1~I"i",,~1 11((1&1[."'11,1\' •.111'.'111,,"1} (N••• "o. VII), Nova 101(1'"- 196~,pJgs.126· Komplexitat (A confiança. Um mecanismo de redução da complexidade social), Stuugnu 1961\, S()
1.11 bret udo págs. 7 r scgs.
CONSEQÜÊNCIAS E PROJEÇÕES
VARIÁVEIS INSTRUMENTAIS E EXPRESSIVAS 185
184

Pode, portanto, partir-se do fato de quê em todos os sistemas complexos se têm que. por outras palavras, a combinação entre conduta expressiva e instrumental
d(' realizar conjuntamente as duas funções e até mesmo, em caso de complexidade não fica subentendida, mas gera tensões e problemas de conseqüências, conflitos e
cresccnte , sob discrepância crescente e pressão mais aguda de realização. A sua sobrecarga de comportamento. Mas é normal, para todos os sistemas complexos,
possibilidade de combinação converte-se, portanto, num problema crítico. Se, com terem de realizar funções discrepantes e não excluir a sua capacidade de estabi-
esta posição do problema, se sondarem as funções do procedimento, tornar-se-à lidade (12). Seria antes de perguntar se, ao invés, não é possível aos sistemas que
combinam funções discrepantes, por meio da institucionalização desta tensão (13) e
claro , em primeiro lugar, aquilo que foi pressuposto pela antiga concepção clássica
das expectativas de comportamento que a ele se referem, aproximar o problema
liberal de processo: harmonia das funções instrumentais e expressivas do proce-
duma solução através do comportamento diário. É exatamente isto que parece ser
dimento. Os procedimentos jurídicos públicos deveriam servir, numa relação
característico dos gêneros mais importantes de processos do sistema político. Elas
unirâria entre objetivo e meios, para o estabelecimento correto do direito e, simul-
formam o ponto de união de dois horizontes temporais diversos e círculos de fun-
taneamente, para a divulgação da opinião jurídica correta. Não haveria aí con-
ções da orientação instrumental e expressiva no sistema político.
tradição alguma, porque se confiaria na p_osse coletiva da razão e da força de per-
suasão dos argumentos esclarecedores. Também para as opiniões atuais sobre O procedimento da eleição política, por exemplo, de acordo com o sentido
procedimento se conservou, de forma característica, a idéia de o encarar como oficial, serve ao seu objetivo de preencher determinados cargos do legislativo e
meio para um fim, remetendo-o, portanto, para um futuro ainda irreal e desco- executivo no sistema político com pessoas. Este fim não permite, nem abstratamen-
uheccndo as suas funções para a situação presente, para uma atuação expressiva e te, nem considerando todas as circunstâncias concretas, uma escolha racional
uma auto- representação atual (9). Traduzida na linguagem sociológica abstrata, orientada para o objetivo do meio mais apropriado (14). Assim, a eleição política
1'~la tese implica uma harmonia completa das funções instrumentais e expressivas e, adquire a função latente de atuação expressiva: ela manifesta, referida às pessoas
so\) esta forma, não resiste a uma revisão. ou ao programa, acordo político ou recusa. Esta dupla funcionalidade é facilitada
por determinadas medidas institucionais, sobretudo pela falha dum controle
Como resultado de extensas investigações sobre grupos pequenos, tem de se es-
•• inequívoco dos êxitos e pela secretividade da entrega dos votos, que alivia o in-
1,11>\'I('cer,em primeiro lugar, que as necessidades instrumentais e expressivas dum divíduo da justificação pública e racional da decisão eleitoral, mas lhe deixa em
f(IUpO existem normalmente do indivíduo comportamentos de diversos tipos, que aberto a possibilidade duma expressão das suas idéias políticas dentro e fora da
nüo podem ser realizados tipicamente por meio de obras idénticas. Nestas circuns- eleição (15).
\[\II( ias pode ser necessário levar em conta uma diferenciação funcional, através Os procedimentos de legislação constituem um outro caso da ligação insti-
duma diferenciação estrutural, quando a discrepância aumenta com a comple- tucional entre as funções mstrumentais e expressivas. Trata-se, neste caso, de
xidade crescente do sistema (10 Isto significa que as tarefas estão separadas de t ,
1).
decisões gerais que comprometem a população em parte diretamente e, em parte,
,11'01 do com as funções e são atribuídas às diversas pessoas, ou papéis, ou programas só programam a burocracia. Para os interessados, não se pode considerar como
(\1' ação. Ao lado dessa diferenciação estrutural, podem conceber-se outras formas uma participação direta no procedimento, conforme aos seus papéis, só uma
d(' separação, por exemplo o desenlace do conflito numa sucessão de diferentes coexistência identificada simbolicamente. Isto é orientado por exposições expres-
opiniões sobre a situação e estilos de comportamento (11). Daqui advém problemas sivas, dramáticas e públicas dos temas, projetos, dificuldades e resultados e aumen-
da passagem duma interpretação da situação para outra, e a necessidade duma tado de diversas formas, por exemplo por meio da doutrinação duma ideologia
dose mínima de consistência, que obriga a não perder completamente de vista o como premissa de toda a atuação consistente, ou por meio da estabilização do
objetivo na fase expressiva e vice-versa , o que restringe, portanto, as possibilidades processo como conflito. A seu lado tem de ser realizada a elaboração especializada
dI' especificação funcional do comportamento. dos programas, em contato com a administração, com consideração quanto à sua
consistência perante outros programas, legitimidade, viabilidade econômica e pos-
Em resumo: não se pode dizer que seria impossível colocar estas duas funções sibilidade de realização. Esta orientação instrumental pode contradizer a orien-
numa instituição muito complexa, por exemplo a do procedimento, e combiná-Ias. tação expressiva, pois a possibilidade de variação dos programas de decisão não
A teoria esboçada permite o prognóstico de que se originarão nisso dificuldades tem, de forma alguma, uma correlação automática com as condições de apoio
12 Isto é hoje completamente reconhecido na sociologia da organização. Como concepções teóricas
9 Drian Barry: Political Argument (Argumentação política), Londres 1965, pags. 97 e segs. inter- de vários tipos, que convergem nesta opinião de princípio, consultar: Pele r M. Blau!W. Richard Scott:
1>'1'1,1.1s,o,ima idéia de "procedural fairness" (lealdade de procedimento) como um' meio para o objetivo Formal Organizations. A Comparative Approach (Organizações formais. Um enfoque comparativo),
11.\ justiça não como um valor próprio que se realiza em ratificação do próprio processo. San Francisco 1962; Niklas Luhmann: Funktionen und Folgen formaler Organization (Funções e con-
seqüências da osganização formal), Berlim 1964; Robert L. Kahn/Uonald M. Wolfe!Robert P.
10 Na invcsrigação sobre pequenos grupos discutiu-se essa diferenciação sobre o plano da criação de
p.IJll'i8, pOrtrllItO, r omn dif(',cn<iação de papéis, e especialmente com respeito aos papéis de direção. Isso
Quinn!Diedrick J. Snoek: Organizational Stress. Studies in Role Conflict and Ambiguity (Tensão oro
ganizational. Estudos sobre o conflito de papéis e ambigüidade), Nova Iorque-Londres-Sydney 1964.
levou ~ ap'('~I',It,,\.\O ela I h.IIII."I,. "u-nria da dupla chefia" que pretende que, mesmo em grupos pe
'1"1"1('", hn I hl'l(', ill"IIIII.U',",;I. I' "'('1I1I'K~iv()8,lado a lado. e só em caso de exceção é que os "grandes 13 Ver o conceito da "tensão estabilizadora" em Amold Gehlen: Urmensch und Spãtkultur (O homem primirivoe a
cultura posterior), Philosophische Ergebnisse und Aussagen (Resultadosfilosôficose afirmações), Bona 1956,pags. 88e
1111"11'01"" "hei r ••, tlCW'II'tll',,11111 ~1I.",h\II\1'UIIH'''IC' \I~ duas funções. Ver além da bibliografia indicada na
segs.
•11.1.,~ III"oI~ ""1)111'I, 1111111""11 A,illIlI <'11111li Ruhrll F. Bales: Some Findings Relevant to the Great
14 Ver, como uma análise crítica do ponto de vista da racional idade objetiva econômica de Anthony
MillI II••.IIIY 111 11'.111,,.1111' (1\1"'"111." ,ln,,,III·II.IM ,rl(,vuIlII'~ para a teoria da liderança dos grandes
Dowus: An Economic Theory of Democracy (Uma teoria econômica da democracia), Nova Iorque 1957.
11111"""') 1\'"111' "'11'>,,,1.,1"111,·11lI, v" w I'I I'I', I 1"1,," 7% 7(,'1 Com isso não se resolve naturalmente
15 Também aqui se tern , aliás, de inserir uma premissa da teoria clássica do processo, que se
" ,unhlno.1 Uh"t d.' tk,;~IIj~ H 14\.hl t •• IU1 ••,,-,1Ut4 t,", "df'" uuclc· ~ ",.tiS f"dl ele' rrsolver.
ll
1

.,ti~
I .t~t o\llhu.. ,111 ,-~t_lIlIu-" I"JI n.-rtul'llIj ti iHlI IIIUII"~ll1i1n IH Ut UI~'. f"lU prin,~ho lURU1, a forma de
refere a uma fusão demasiado harmônica das funções instrumentais
concepção do eleitor, completamente
e expressivas, nomeadamente
informado e racional, que pelo fato de perseguir os seus interesses
a

", ••.ltll 1'1;'" I 011 ."" ti(ÍI'Mltlt, d'J 1'~'!~T.~n11.-,1 , 11 IlIuhn 1111" 111 u uu "lul1u tlr UHU\Clh.nl em ,)()hl~()c' onde de forma racional, permite uma realização do bem comum e reconhece este contexto.
01•• 1.:11111,111 " ••• tlllj" I~.111111" '''101''''11 111,"1111'11"111""" '"""
11\6 CONSEQÜÊNCIAS E PROJEÇÕES VARIÁ VEIS INSTRUMENTAIS E EXPRESSIVAS 187

político. A coordenação das duas variáveis constitui o problema e a tarefa da A tarefa deste procedimento não se esgota logo com o fato de determinar um
politica (16). Nela se combinam as necessidades instrumentais e expressivas, não no futuro incerto por meio de processos de seleção; permite, acima de tudo, resistir a
plano dos papéis, mas abstratamente em valores e programas (17). um futuro incerto. Os processos ajudam, perante um futuro incerto e sobretudo
perante uma pretensão exagerada, a proporcionar uma segurança atual através
Finalmente, os procedimentos judiciais também pertencem a este tipo de duma complexidade imprevisível de possibilidades do direito variável e ajudam a
procedimento de função dupla (18). Também eles aspiram, como todos os pro- tornar possível um comportamento representativo no presente, expressivo, denso de
ccdimentos a uma decisão, até mesmo num contexto de planos de decisão mais ou sentido e obrigatório (20'). Assim o interessado pode participar duma forma ra-
menos fixos. Têm, simultaneamente, funções expressivas, como se mencionou. A cional e atuar num presente sempre atual, ainda que viva para um futuro incerto.
ornbinação de ambas é facilitada principalmente, pelo papel de status do juiz que A decisão não recai sobre ele como uma surpresa inesperada, como sorte ou des-
rege o procedimento, domina a interpretação atual da situação, interpretação que graça que se aguarda com perplexidade sem se poder tomar posição, mas como o
rem de ser seguida pelos outros (1~).
resultado dum processo de decisão, na medida em que uma pessoa se pode pre-
parar para ele pela participação e ação. Quanto maior for a complexidade das pos-
Há assim, urna sêrie de procedimentos onde se procura, em parte insti- sibilidades futuras, menos intoleráveis serão essas surpresas e mais reforçada se tor-
tucionalmente , em parte processualmente, combinar com maior ou menor êxito as nará a perspectiva sobre acontecimentos inesperados que nem sequer se movimen-
Iuncões instrumentais e expressivas, a descoberta racional da decisão e a realização tam em vias de interpretação religiosa, mas constituem -obras humanas que deses-
NC'l\limentalpresente. Uma outra característica destes procedimentos consiste no seu tabilizarn o presente, portanto a existência. Neste sentido os processos constituem
pou'ncial relativamente pequeno de complexidade. Só poderão refundir poucas al- um complemento existencial da positivação do direito. Reduzem e tornam menos
u-r nativas se, juntamente com a sua função de decisão, tiverem de constituir re- agudo o momento da surpresa que estão ligado à decisão.
PI('S('lllações e deverem confirmar símbolos. Todas as conjunturas mais complexas
de problemas têm de ser preparadas e simplificadas antes de se tornarem objeto
dum tal procedimento. Isso é uma conseqüência desta constituição multi-funcional
do processo, onde ambas as funções se estorvam mutuamente. Donde que este tipo
dc' decisão não possa ser e permanecer único se a complexidade cresce tão rapi-
d.uncme quanto nos últimos cem anos. Os procedimentos de decisão administrativa
.l'm de ser descongestionados e organizados de forma instrumental pela previdência
pura a realização sentimental e para a legitimidade.

Poderíamos resumi-Ia assim: compreender-se-ia muito superficialmente a


elacão do processo para com a legitimidade r se se quisesse interpretá-Ia como uma
i

u-lação entre meios ~ fins, ou entre causas e efeitos, no sentido de acontecimentos


separados numa seqüência objetiva de momentos. Não se deve também apresentar,
em primeiro plano, um modelo teórico de aprendizado da reestruturação contínua
das expectativas. Não se pode abarcar suficientemente a relação entre sistema e
tempo, donde tão pouco entre processo e tempo, quando se pressupõe um conceito
objetivo de tempo, que iguala todos os momentos. Tem de se sair da experiência
rrrnporal sempre presente, pois só no presente existe tempo, realmente no sentido
dum horizonte do determinado (passado) e do indeterminado (futuro).

Ih Igualmenre Seyrnour M. Lipset: Soziologie der Demokratie (Sociologia da democracia), versão


.111'11\1\
Neuwied Berlim 1962, pags. 70 e segs. Comparar também com a distinção correspondente de
tfi, i~n( ia e legitimidade em Thornas ElInein: Einfürhnung in die Regierungs-und Verwaltungslehre (In-
c,H\lu~~O li 1('0' ia di' gcm'mo (' udministração). Sluttgart-Berlim-CoI6nia-Mogúncia 1966, págs. 171. '"
17 COlO I", ir com 11;1I\1I1('1~1I.lIld.op. cit.
1/1 1'''1,",,100 t' 11'1\"111I<uolull SIIIt'IIe1: Sluacsrrchtliche Abhandlungen und andere Aufsátze (Disser-
"I\llt·. 1101111' crlllBI 1'011111'11 r "" c10" "11111010'), Ilrolim 1955, pag. 208, que priva expressamente a justiça
,1111""hill~~O 1111"11""111
li. Ullr t"r 1 C1111 11,11."11111.' .HH~~n•• I •• ,·.tllo cI,· romportarncnto se perca também ou possa ser
:"-11,.••1,, li" 101, I"" 11",11," flll" 01"1 • ,,"~oli,1 " Ir,,~Rn "~ltI"dlll d~~l(' processo. O 8131US constitui apenas
li"'" "1,,,111,- """ II"'~ II~""IIII~ ,I,! ."I",;~" 11" 1'",Ioit-o ••, () ju;, poel,', '~alm("nt~. emenderse ern regra
i",
'"1" ,,,,, 1••• 11.", ,,,,,,1, l~oI" I' fi __ ill'l""lil """I II,I",.I~,'" 11'·III.,NllIII •• ~xp,r1,iva dl\ ceu ••, mas rem então
20 Partindo duma concepção de. tempo semelhante, George Mead interpreta o .problerna da certeza
.1111., .",,11.,. ~"~"" "0,,/:1 1!",,,~II'f'~"'" ",Iv"II'"'''' 114111"11
.11' ••·."·Il"'lIh.IK 11\1 JI'''ci''()~. qUl' (k~«) como solucionável apenas no futuro atual permanente. Consultar: The Philosophy of the Act (A Iilcsofia
ilo.~••dllfl~ *.11.II1 'HIIIU-HhU do ato), Chicago 1938, pago 175.
CAPÍTULO II
Estrutur as e frustrações
o problema do trabalho minucioso das frustrações de expectativas pode ser
tratado na sociologia a partir duma teoria de estruturas. Só quando se faz isto é
que se torna visível a envergadura total deste problema (1).
Não se pode elaborar neste contexto uma teoria de sistema social suficiente
para tal, nem sequer se pode traçar um esboço dela. Apenas podemos concluir uma
seqüência de pensamentos, que são para nós essenciais. Partimos da idéia de que
todos os sistemas sociais adquirem a sua identidade e a sua relativa autonomia
perante o meio ambiente mediante uma separação entre estruturas e processos (2).
A função desta separação consiste na instituição duma "seletividade dupla".
Através de estruturas, no caso dos processos de aplicação jurídica através de normas
jurídicas, é escolhido, com antecedência, um âmbito mais estrito de possibilidades,
dentro das quais se podem então orientar de forma racional e adequada os proces-
sos de decisão. As estruturas reduzem a extrema complexidade do mundo a uma
esfera de expectativas muito estrita e simplificada, expectativas essas que são pres-
supostas como premissas de comportamento e, normalmente, não são postas em
dúvida (3). Portanto baseiam-se sempre sobre ilusões, designadamente sobre ilusões
quanto à complexidade real do mundo (4), principalmente quanto ao verdadeiro

Os processos jurídicos não iriam apresentar um tal problema de assimilação das desilusões e a sua
introdução, se possível intata, na corrente de continuidade 'da vivência presente, pelo menos não como
um problema em princípio social. Partem do fato do direito já estar estabelecido e de que uma desilusão
agrava aquele cuja expectativa era falsa e tem de ser vencida por ele. Nisso se pressupõe que é possível
isolar socialmente o indivíduo que, por sua culpa, mantinha uma expectativa falsa. Que isto é necessário
e de que forma o é constitui um conjunto de problemas sociológicos que só se podem pôr, quando se
encarar as estruturas em geral, e as normas jurídicas em particular, como uma seleção problemática.
2 Para a relação deste pensamento com uma teoria geral do sistema social comparar com Niklas
Luhmann: Soziologie aIs Theorie sozialer Systcme (Sociologia como teoria dos sistemas sociais), Kolner
Zeitschrift für Soziologie und Sozialpsychologie 19 (Revista colonense de sociologia e psicologia social
19),1967, pags. 615-644 (623 e segs).
3 Em oposição ao conceito geral de estrutura, que é definido õnticamerüe através duma qualidade,
ou seja, da constãncia, este conceito de estrutura é definido funcionalmente através duma realização, a
seletividade. Foi elaborado um conceito de estrutura idêntico por Wendell R. Garner: Uncertainty and
Structure as Psychological Concepts (Incerteza e estrutura como conceitos psicológicos), Nova lorque-
Londres 1962.
4 Ver aqui a passagem com que Kenneth Burke, a Grammar of Motives (Uma gramática de moti-
vos), reeditada em Clevcland Nova lorque 1962, pago 59, introduz o capítulo sobre "Scope and
Reduction" (Âmbito e redução): "Men seek for vocabularies that will be faithfull rejlections of reality,
To this en d, they must develop vocabularies that are selections of reality. And any se1ection of reality
rnusr, in certain circumstances, function as a deflection of reality", (Os homens procuram vocabulários
que constituam reflexões fiéis da realidade. Para este fim têm de desenvolver vocabulários que sejam
seleções da realidade. E qualquer seleção da realidade, sob certas circunstâncias tem de funcionar como
deflexão da realidade.)
190
CONSEQüÊNCIAS E PROJEÇÕES
ESTRUTURAS E FRUSTRAÇÕES 191

dúvida (5), Portanto baseiam-se sempre sobre ilusões, designadamente sobre ilusões a reparação das desilusões é significativa a busca de segurança numa situação em
quanto à complexidade real do mundo (4), principalmente quanto ao verdadeiro suspenso e que se tornou incerta, portanto um esforço imediato para redução da
potencial de atuação do homem, e, portanto, têm de estar preparadas para frus- complexidade. No aprendizado, pelo contrário, trata-se, em primeiro lugar, da
trações. As frustrações, ou desilusões, não se deixam expulsar com eficácia mas, procura de alternativas, portanto de aumento da complexidade, e isso só é possível
não obstante, as expectativas podem ser estabilizadas contra a frustração (5), se é sobre a base duma situação segura. Em sistemas suficientemente complexos e
certo que elas "continuam a ser válidas apesar de tudo" e se ao que espera são diferenciados, ambos os mecanismos podem, apesar de tudo, ser colocados lado a
dadas regras de conduta para o caso de desilusão. As estruturas - e, portanto, lado, mas só se conseguirem separar suficientemente situações e papéis, respecti-
tambêm o direito positivo - não constituem de forma alguma projetos de sentido vamente para um e outro comportamentos.
qualquer e incerto; elas só podem ser estabilizadas e institucionalizadas quando es-
tão alicerçadas em regras eficazes e são assegur.adassocialmente para vencer as Para o enfraquecimento das desilusões é necessária uma multiplicidade de
desilusões _
símbolos e processos de elaboração das vivências, símbolos e processos que atuem,
Um regulamento das desilusões torna-se tanto mais importante, quanto au- em parte combinados, e em parte alternados, para que a desilusão não abale a es-
menta a complexidade dos sistemas e da sua compreensão do meio, quando cresce, trutura. A ele pertencem: um regulamento de atribuições de desilusão, no sentido
portanto, o número de alternativas, que se podem ver no meio ambiente, ou que de que a culpa da discrepância seja atribuida ao que age e não ao que espera; mais
podem ser ativadas no sistema. Então aumenta também o efeito de desilusão ligado plausíveis as ampliações do comportamento desenganador - quer através de re-
a cada determinação de sentido, aumenta o número de negativas que cada afir- lações com forças extra-terrenas, pelas quais está "possuido" e que age, quer
mativa implica. Os mecanismos que regulam e enfraquecem as desilusões, e assim através duma má-vontade moral, quer através de fatores sociais ou psíquicos es-
estabilizam indiretamente as estruturas, têm de se tornar então capazes de reali- tabelecidos semi-cientificamente, tais como pertença a uma classe ou a uma raça,
zação correspondente, o que significa, acima de tudo, diferenciar-se de acordo com complexos de inferioridade, repressões, defensivas contra o medo; ainda a possi-
funções específicas,
bilidade de expressão para manter a expectativa apesar da desilusão, sobretudo
através de reprovação, indignação e sancionamento; finalmente possibilidades de
Para as relações com os desenganos existem, duma forma geral, duas estra- reação sentimental de incerteza, que nascem da ameaça latente à estrutura: tem de
tégias funcionais equivalentes: enfraquecer as desilusões por vias que não preju- se poder exagerar a indignação, ou a sanção, para se encontrar assim, não apenas
diquem as estruturas, e a reorganização das expectativas, a modificação da es- uma confirmação da expectativa em perigo, como simultaneamente um resta-
trutura , Ambas as estratégias, ainda que funcionalmente' e.quivalentes, baseiam-se belecimento da estrutura em perigo.
em posições contrárias, que não se podem combinar sem mais nem menos (6). Para
Todos estes mecanismos estão à disposição para estabilização da estrutura
3 Em oposição ao conceito geral de estrutura, que é definido ônticamente através duma qualidade, oficial do sistema social e ajudam a passar por cima do comportamento desen-
ou seja, da constãncia, este conceito de ·estrutura é definido funcionalmente através duma realização, a ganador adverso à estrutura. São instituídos contra o infrator ou contra aquele que
seletividade. Foi elaborado um conceito de estrutura idêntico por Wendell R. Gamer: Uncertainty and se provou não ter razão. Também se tem de pensar na desilusão daqueles que per-
Structure as Psychological Concepts (Incerteza e estrutura como conceitos psicológicos), Nova Iorque- deram a luta pelo direito. Eles esperavam normativamente, tinham portanto, mos
Londres 1962.
trado a decisão de não aprender e agora vêem-se obrigados a aprender. As suas ex-
4 Ver aqui a passagem com que Kenneth Burke, a Grammar of Motives (Uma gramática de moti-
vos), reeditada em Cleveland Nova Iorque 1962, pág. 59, introduz o capítulo sobre "Scope and
pectativas frustradas já não encontram apoio social e estímulo. Os perdedores têm
Reduction" (Âmbito e redução): "Men seck for vocabularies that will be faithfull reflections of reaHty. que vencer a sua frustração mediante uma escolha especial de estratégias, uma dis-
To this end, they must develop vocabularies that are selections of reality. And any selection of reality tribuição desigual de chances que procuram assegurar o domínio da estrutura do
rnust , in certain circumstances, function as a deflection of reality". (Os homens procuram vocabulários sistema, mas que oferecem uma pequena ajuda para o aprendizado. O próprio
que constituam reflexões fiéis da realidade. Para este fim têm de desenvolver vocabulários que sejam processo de aprendizado do direito realiza-se num lugar completamente diferente.
seleções da realidade. E qualquer seleção da realidade, sob certas circunstáncias tem de funcionar como
deflexão da realidade.)
5 Comparar aqui com a experiência não discutida de Lloyd G. Humphreys: The Acquisition and Ex- Símbolos e processos que servem para acalmar as trustrações restringem a
tinction of Verbal Expectations in a Situation Analogous to Conditioning (A aquisição e perda das ex- variabilidade da estrutura defendida. Destinam-se a privar da problematização -
pectativas verbais numa situação análoga ao condicionamento), Joumal of Experimental Psychology 25 na verdade, de toda a questão - determinados fundamentos da expectativa e são,
(Psicologia experimental 25), 1939, pags. 294-391, com o resultado de que as expectativas incertas e que
portanto, pouco adequados para introduzir uma modificação da estrutura através
contam com desilusões são mais estáveis do que as expectativas seguras, que fracassam com a primeira
desilusão. Há uma visão de conjunto sobre a investigação ligada a isto em Ralph M. Stegdill: Individual de processos de aprendizado pela parte dos que esperam. Nenhuma das sociedades
Behavior and Group Achievement (Comportamento individual e realização de grupo), Nova Iorque, conhecidas através da história pode separar este problema do aprendizado es-
1959, pags. 59 e segs. trutura, do problema do domínio das desilusões, resolvendo-o como um tipo es-
6 Compara. com Niklns Luhmann: Norman in soziologischer Perspektive (Normas numa perspectiva pecial de estabilização, por meio da variação; todas elas confiaram, mais ou menos
'~ol'Íol()íli('a), Smialt'1 Wdl l!() (Mundo social 20), 1969, no prelo. No plano psicológico, Cyril Sofer: The
exclusivamente, em mecanismos de reação às desilusões e aprenderam, quando
()'I(.III;/lIt;UII flolll WIIIIIII 11 COII'1l11ldt;v.' Study of Social Institution Based on a sociotherapeutic ap-
IHUI" h (11 (l. 1(.11111 ••111'" p<l. 11<-1i1.1I"li' .'""do compar ado das Instituições sociais baseado num enfoque muito de forma latente. Para institucionalizar o aprendizado estrutural e a reorien-
1'" IfIUPI'.U" 11). ( I,,, "li" JlIII~ (I • ,.",1..'" I.II.ifl ••'H I!)ol), principalmente pags. 145 e segs. pergunta tação das expectativas são precisas, pelo menos, duas coisas: a organização dum
1'.-1" 1""~lhllidll(lr 01, ,,,,,01,1'"11 ••• '81 L" •.•'''"111''0 <111 dl'H;I"',IC1I' disposições para mudança. Também is- processo de aprendizagem livre de desilusões, e, portanto, livre de sentimentalis-
11 1'~iHh, '''"1' 11111'1111' ,Id.illil ,'I.:vutll4 I Hltht u"t •• 1tIII'IIt,I\.~O, I c'bativ.ulH"ntc· consciente, do sistema
1"1141'11111 11 "1_' 'U! ttnlU'HIII do IHf'ih.
mos, para a adaptação estrutural do sistema (e não apenas a transmissão do saber
para as outras geraçõesje a reorientação das expectativas, que não desacredita as
192 CONSEQÜÊNCIAS E PROJEÇÕES
ESTRUTURAS E FRUSTRAÇÕES

anteriores. Ambas as condições duma aprendizagem normalizada e desconges-


i Ipios novos. O aperfeiçoamento do direito judicial constitui polmcarnente uma
tionada só se podem realizar fora do âmbito daqueles processos, onde as desilusões
solução de dificuldades, que sempre se evidenciou como indispensável por vários
são assimiladas (7). Na medida em que as expectativas podem ser efetivamente
motivos, por exemplo, pela carência de tranquilidade após codificações complexas
reestruturadas para uma aprendizagem isenta de desilusões, nessa medida diminui
a pressão social que sobrecarrega as situações com frustrações. ou por sobrecarga, ou pelo mau funcionamento dos próprios processos pql íticos de
Só através da positivação total do direito e da reorganização do processo le- d~cisão e, nessa medida, desempenhou funções de compensações ( 11 ).
gislativo numa tarefa política normal e contínua, regulada de acordo com o
processo jurídico no século XIX, se levaram a cabo, dentro do âmbito do sistema Contudo é mais importante do que este um outro descongestionamento dos
político da sociedade, condições prévias para a variação estrutural (8). O sistema processos de decisão política e estabelecimento jurídico. As desilusões e protestos
político pode, graças a elas, adaptar-se à sociedade como o seu ambiente próximo, são filtrados continuamente, em cada caso particular, através dos processos de
numa posição de aprendizagem. De acordo com isto se organizaram formalmente aplicação jurídica e politicamente desativados. Constitui uma exceção declarada
os sistemas parciais mais importantes da sociedade e assim se instituiram, igual- os casos particulares converterem-se em algo de político; têm, então, de ter já uma
mente de forma não programável, e, portanto, capaz de aprender. Parece que esta importância sintomática para algo de generalizado. Com certeza não é proibido a
disposição essencial que elevou os efeitos da estruturação do direito em medida até ninguém, devido a um ato administrativo ratificado, ou a um processo perdido, es-
então desconhecida, se baseia muito mais numa diferenciação entre processos para colher um .outro partido, ou reagir politicamente doutra forma por mau humor.
estabelecimento do direito e processos de aplicação jurídica. Para 'poder apresentar reivindicações politicamente ativas e adquirir influência,
tem, porém de respirar ar fresco, isto é, de se comportar como se fosse uma outra
Os resultados das nossas reflexões para o problema da legitimação pelo pessoa. Os canais de comunicação politicamente eficazes referem-se a processos que
procedimento apóiam esta hipótese, pelo menos nos aspectos essenciais. Os proces- atuam no centro e, portanto, acabam com outros interesses de ordem geral. De
sos de aplicação jurídica não se encontram aperfeiçoados sob o ponto de vista das mais a mais, têm de preencher as duas condições prévias para uma adaptação es-
suas possibilidades de aprendizagem. Servem mais para o desvio e a redução das trutural que foram indicadas acima: permitir um exame de alternativas desconges-
frustrações na medida em que equipam os partidos em conflito com possibilidades tionado e isento de desilusões e não desacreditar, na sua validade, os programas de
de agressividade legítima mas canalizada, isolando então o perdedor de tal forma decisão válidos. Por esse motivo não podem ser associado como uma espécie de
que a sua frustração fica sem conseqüências. O efeito de aprendizagem é pequeno traço jurídico aos processos que regulam as frustrações dos casos isolados.
para ser apreciado. Isto é válido para as expectativas dos interessados e, também,
para o "aperfeiçoamento judiciário" a que atualmente os juristas dão tanto apreço. Se se incluírem assim, no debate, questões quanto ao tratamento das frus-
Com certeza existem casos em que o direito processual levou a transformações es- trações e do aprendizado, desaparece a forma de consideração puramente iminente
truturais sociologicamente exatas, que se impõem na prática de cada caso ('1). Em às normas (jurídico-exegéticas) do direito. Isto tem conseqüências importantes para
geral, porém, não há à disposição nos processos de aplicação jurídica, nem os meios a determinação da relação entre direito e legitimidade e abre novas perspectivas
para a comprovação de alternativas, probabilidades e concatenação de conseqüên- nesta questão, que parecia insolúvel desde o fracasso do direito natural. A opinião
cias (10), nem as liberdades para a construção de alternativas de princípio ou prin- hoje dominante separa a validade legal da legitimidade, através do abismo entre
ser e dever. A legitimidade constitui apenas a sua crença efetiva na justiça e no
valor do dever determinado e não uma qualidade imanente do próprio dever, sem
a qual ele não deve poder existir. Não se compreende muito bem, por que razão o
7 São completamente novas e, portanto, inseguras as tentativas teóricas de aplicar o conceito de puro dever necessita duma tal crença. A legitimidade do direito aparece como um
aprendizado aos sistemas sociais e de perguntar quais as condições da capacidade de aprendizagem dos complemento desejável, importante na prática, mas superficial (12). Para a análise'
sistemas sociais (em oposição aos sistemas psíquicos). Conferir, por exemplo, com Karl W. Deutsch: The sociológica é possível, em contrapartida, interrogar o conceito de dever quanto à
Nervos of Government, Models of Political Communication and Control (Os nervos do governo. Modelos
sua função e reconhecé-lo como cifra para mecanismos sociais muito complexos,
de comunicação política e controle) Nova Iorque Londres 1963, pags. 94 e segs.; Vincent Cange-
losi/William R. Dill: Organizational Learning. Observations Toward a Theory (Aprendizado organi- que estabilizam as expectativas de comportamento quanto às desilusões e assim as-
racional. Observações para uma teoria), Administrative Science Quarterly 10, 1965, pags. 175·203. seguram as estruturas. A noção de dever serve, conjuntamente, como abreviatura
8 Comparar com Niklas Luhmann: Gesellschaftliche und politische Bedingungen des Rechtstaates. para todos os processos que permitem perseverar nas expectativas, mesmo quando
(Condições sociars l' políticas do estado constitucional), em: Studien über Recht und Verwaltung (Es- estas não se realizam nos casos particulares. Esta noção permite, com concisão for-
tudos sobr e du eiro e .ulministraçâo), Colônia-Berlim·Bonn-Munique 1967, pags. 81.102.
mal, um entendimento social com este fim. A validade do dever é levar para um
<) Isto (, viÍlid", po, ('xC'lllplo para a adaptação de alguns âmbitos da responsabilidade civil de cul-
",telos 1""'",''' " "·K'".II~,' tontO (l i1.:0io, uma evolução que devia ser levada sociologicamente em subs-
nítido "ou/ou", pois é necessário decidir se se quer, ou não, perseverar nas expec-
d\Utlll ,I nmu t '('''Ilt'Hlt' 111~(I~UI.II1( •• 1 di! definição social de perigos. Para o desenvolvimento jurídico ver

'm'" I'·,,, (,'"lllll,,~, Illlo! hllw,dd\IIIK dr-r Gdàhrdungshaften (Base e desenvolvimento da respon-
.,01111111,,,1 •• lIil um .•\.,,1,, I, 11-1"",,1''' 11",10111I').1 I. Sobre isso devo esclarecimentos essenciais ao manus-
fi UII
I [u u pu"lu '" d" ~{'UIHU Ili 11411 ~t Itt'IIIH kc'
11 -- Como projetos de direito político contrários ao direito judicial em evolução. projetos que-deviam
tornar isto evidente, consultar Franz Becker/Niklas Luhrnann: Verwaltungsfehler und Vertrauens-
lU I~I", 10""11.011011.111"0 " ,1~lot • 01'" "'li'''' III1,d," "do; autores que não são juristas, ou que se liber-
schutz. Moglishkeiten gesetzlicher Regelung der Rücknehmbarkeit von Verwaltungsakten (Erros ad-
1111 h'" .1.\ 1''''1111 í'loIdl' ,,' oIiO ."".iol'h"o \ o, I"" 1"I·IlIplo. Torstcin EckhofflKnut Dahl Jacobsen:
ministrativos e garantia de confiança. Possibilidades de regulamento legal da retirada de documentos
1(.'li.II"IIIy,.IIoI Itr~jil"!~!,"iliIV I" /\.1""''''''00'"'' ",,,I ,,,111<,,,I Der ision-Making (Racionalidade e res-
administrativos), Berlim 1963; e Niklas Luhmann: "Offentliche-rechtliche Entschadigung rechtspolitisch
1"·IO'ltI.iliol.u I~ "li 1,"HÍld" '.Ii' 110', "t'lI" ("lilll"i~, r ,,",.,. , ,"d'u.ti,). Copenhague 1960; ou Geoffrey Vic-
betrachtet (Indenização do direito público considerada político-juridicamente), Berlim 1965.
~.rll 'I "li 1\'1 'JI.I!,ol!lfillfl" i\ 'lilllll' ,<I 1'lIli.y /I"'~"'N (1\ .,,,,. ti" Jlo!~'''t\(·I1«). Um estudo sobre ela.
' ••"tidO! ti., ""lid,"\!. 1 ,,,"I,n 1111:1). ,".aI (li 12 - Para a situação da discussão ver Hans Welsel: An den Grcnzcn des Rechts. Die Frage n.ich de
n. Colônia 001"01e.,, UJIiG
Rechrseelrune (Nos limites do direito. A' OCr2'UnLasobre a validad" Ic••..•.
194 CONSEQÜÊNCIAS E PROJEÇÕES

rativas de comportamento nos casos de frustração. Quando a expectativa é afiro


mada contra-vontade é-lhe conferida a qualidade de dever, "em caso contrário é
tratada como uma indicação de acontecimentos futuros, puramente cognitiva e
disposta a aprender (15). A dicotomia entre ser e dever tem a sua base nesta si-
tuação de decisão do caso de frustração e não em princípios insondáveis e absolutos'
da reconstrução do mundo.
CAPÍTULO m
Esta reflexão esclarece um sentido, inevitavelmente
validade normativa,
duplo, do problema da
que não pode ser resolvido, mas apenas descoberto na sua fun-
Diferenciação funcional
ção: os processos sociais do tratamento das desilusões e do aprendizado são preso
supostos em toda a padronização, não podendo, portanto ser refletidos no sentido Que o problema básico da estrutura e frustração dos sistemas políticos muito
padronizado. São pressupostos, porque a esperança certa e contrafeita do dever só complexos em processos de diversos tipos tem de ser refundido, constitui um caso
se pode manter firme, quando o futuro se estrutura de tal forma, que se pode es- de diferenciação funcional. Só selecionadas, se pode chegar a que o comportamen-
clarecer quem pode perseverar nas suas expectativas e quem tem de se modificar e to seja aliviado da pretensão multi-facet ada e contraditória (por exemplo, de re-
quando se pode com segurança obter o consenso. A validade do direito depende do parar as frustrações e de aprendizado) e seja assim aumentado o rendimento es-
funcionamento destes procedimentos de decisão. No sentido válido das normas pecífico,
jurídicas não se pode, todavia, considerar esta dependência como condição de
validade, pois isto constituiria uma solução para a estrutura indispensável de ou/ou Estas reflexões podem-se ligar á teoria muito divulgada na sociologia desde
como fundamento da decisão. Uma expectativa não pode ser válida na medida em
Spencer, Sim mel e Durkheim, da diferenciação funcional dos sistemas sociais (1).
que consegue realizar a assimilação das desilusões e processos de aprendizado no
seu sentido, porque estes processos pressupõem, por seu lado, a firmeza da validade
do dever. A reivindicação da expectativa padronizada é, e permanece, dependente
Cada aumento de complexidade dum sistema pode ser designado como diferen-
dos processos de legitímação, mas tem de se compreender como sendo independen-
ciação em geral, mediante a criação dum subsistema. Existe uma diferenciação
te deles. No horizonte das vivências daquele que espera não afloram, por isso, os
funcional quando os sistemas não são comparados como unidades semelhantes, mas
processos efetivamente legitimados. Aquele que espera refere-se em 'vez disto, a
se referem a funções específicas e estão então ligados uns aos outros. As vantagens
"normas mais elevadas" ou "valores absolutos" com os quais, realmente, cada um
do aumento de rendimento da diferenciação funcional são evidentes. Que elas
tem de concordar e acredita receber apenas daí a validade legítima da sua expec-
tenham de ser resgatadas mediante determinadas dificuldades e problemas de con-
tativa. Nesta fundamentação, contudo, vem expressa, como se pode dizer basean-
seqüencias, sempre se viu, mas era compreendido de forma muito diferente, por
do-se numa formulação de Durkheim (14), não a realidade da moral mas apenas a
exemplo, como necessidade de coordenação em cada distribuição de tarefas, como
forma como o moralista a imagina.
contexto de elevação da diferenciação e integração, diferenciação e autarquia dos
sistemas parciais, especificação ou generalização, ou então como discrepância
inevitável entre estrutura e função, que aumenta no caso duma diferenciação mais
marcada. Recentemente multiplicam-se os indícios de que as tarefas compensa-
doras são procuradas na diferenciação, menos nos princípios contrastantes do que
nos mecanismos igualmente específicos das funções, aumentando o rendimento, e
de tipo muito distinto (2).

I Como descrição clássica ver Herbert Spencer: The Principles of Sociology (Princípios da sociolo-
gia), 2, o volume, (cit. de acordo com a edição, vol. I, Londres 1885, vol. li Londres 1983) e: The Study
of Sociology (O estudo da sociologia), Londres, 1874; Ceorg Sim mel: Über sociale Differchierung (Sobre
diferer.ciação social), Leipzig 189U; Emile Durkheim: De Ia division du travail social (Sobre a divisão do
trabalho social), Paris 1893. Ver, como exposição mais recente Ta\cott Parsons:' Introduction to Part
Two. (Introdução à segunda parte). Editado por Ta1cott Parsons/Edward Shils/Kaspar D. Naegele/jes-
se R. Pitts em: Tbeo ies of Society (Teorias da sociedade), Glencoe, Ill.; vol. I, pag.;.239-264,
oIi!d••••~." ,11110." « •• ,11""11 Expecrarions and Interactions Processes (Expec
,i!, lu'l'UlY Y (lU'!uhllll z), 1%9. pags. 215 254. 2 Ver, a título de exemplo, a teoria das linguagens dirigidas em Talcou Parsons: Die jüngsten EIII
wicklungen in der strukturel-funktionalen Theorie (As mais recentes evoluções na tI·uri,. ('SI I 111li' ,li
H I 111111'4.,11 ,,','" I '!lil •• I"Ji~ 111'11"1 p" 1_ .11",,1.111 .Iu 1,.v"11 .111 1,1.1(Sobre a divisão do trabalho funcional) Kolner Zeitschrif; für Soziologie und S(l/i,d!l~Yl hologil' 16 ("'Vlsta t 0)'"11'11'" ti"
•.•-•• -lio.l, 'J " a ali. l,-. li ••••• IUII
196 CONSEQÜÊNCIAS E PROJEÇÕES DIFERENCIAÇÃO FUNCIONAL 197

Se classificarem as nossas análises dos diversos tipos de processo dentro do árn- distribui a sobrecarga ligada à seleção. Uma instância, e até mesmo uma hierar-
bito desta teoria, a diferenciação como tal converte-se em tema. Através desse meio quia, só poderia registrar relativamente poucas informações, absorver poucas con-
recai uma nova luz, tanto sobre o caráter do sistema e a estrutura geral do proces- tradições e conflitos, e teria de decidir de forma absolutamente primitiva .Um
so, como também sobre o sentido e contexto dos tipos isolados de processo. O processo não seria um processo, pois a sua diferenciação como sistema não teria
caráter do sistema de processo, a sua relativa autonomia de elaboração de infor- qualquer sentido. Os sistemas complexos têm de institucionalizar uma combinação
mações, a sua complexidade própria e a tipicidade distinta das diferentes formas de de diversos tipos de mecanismos, que operam sob condições diversas, que estão
processo, têm o sentido de obter as vantagens duma diferenciação funcional para o sujeitos a diversos critérios de racionalidade e colocam a seu serviço motivos di-
sistema político. ferentes, que são contudo pressupostos nas suas condições e são assim integrados. À
medida que são abandonadas as orientações com humogeneidade interior, desen-
volvem-se divergências e só premissas muito abstratas de funções, por exemplo o
A nossa investigação estendeu-se a quatro tipos de processo: eleição política, reconhecimento mútuo dos resultados dos processos isolados, coordenam o sistema,
legislação, decisão administrativa e processos judiciais. Estes processos distinguem- podem aumentar o potencial da complexidade. Numa tal organização torna-se
se, em primeiro lugar, pela dose de complexidade que aceitam e resgatam e, em oportuno e, finalmente, necessário que os processos parciais se constituam sob a
segundo lugar, conforme às suas técnicas de redução, o seu output e a sua atitude forma dum processo legal. Pois assim se realiza o exigido: uma diferenciação de
perante o problema da legitimidade. contextos de decisão relativamente autônomos, que constróem e reduzem, sob os
mais diversos pontos de vista, a sua própria complexidade.

Se se olhar com mais atenção pode-se reconhecer na distribuição da com-


A eleição política e a legislação constituem processos de complexidade muito
plexidade por diversos processos funcionalmente especificados, uma organização
elevada e grau respectivamente pequeno de racionalidade. Oferecem mais possi-
cronológica e objetiva, servindo ambas à integração do sistema global.
bilidades de generalizar temas politicamente, de encontrar correligionários e de
tratar os problemas como não-resolvidos, apesar da decisão. Neste sentido são ins-
táveis. Requerem, exatamente por isso, um engajamento fraco dos participantes Cronologicamente a eleição política precede o legislativo , este precede a de-
não-profissionais e facilitam assim a reorientação. Para redução da sua elevada cisão administrativa e o legislativo ou a decisão administrativa precedem o processo
judicial. Por outr as palavras: primeiro, a elevada complexidade política in-
complexidade utilizam uma separação mais ou menos profunda dos processos ex-
determinada do sistema tem de ser moldada na forma de pessoas-nos-cargos ou
postos e' do processo efetivo de decisão e trabalham em proporções consideráveis
com motivos divergentes e técnicas de decisão. programas-com-validade; pode, então, dar-se início ao trabalho sobre as decisões
circunstanciais justas. Estas podem, por seu lado, mas não são obrigadas, a ser
anunciadas na política corrente, criando um novo impulso para os processos po-
líticos. Nesta organização cronológica, os diversos processos são coordenados, não
Os processos de decisão administrativa e os processos judiciais constroem-se, com respeito a um objetivo comum como meio complementar, mas apenas na
nestes aspectos, em princípio, de forma oposta. A sua complexidade é reduzida e medida em que se considera o output dum como o mpui do outro. A diferenciação
determinada através da progr-amação das premissas de decisão. Por isso o esta- do sistema global exprime-se nesta seqüência cronológica através do fato de que a
belecimento e descrição do decisor são utilizados aqui como garantia; e pode estar decisão dum processo para o próximo é tratada apenas como mais um fato, pois é
aberta ao interessado uma participação em todo o processo de acordo com o papel, aceita em bloco e não é aprofundada ou controlada mais uma vez (5); e a inte-
participação que levará à especificação e isolamento dos seus interesses. Isto é con- gração realiza-se pelo fato de que esta aceitação do resultado se efetua e porque os
seguido no processo judicial e recua no processo administrativo quando este se des- processos não decorram, lado a lado, como que desligados. Objetivamente, a dis-
faz da função legitimadora e se concentra totalmente na descoberta da decisão. tribuição da complexidade é organizada através da sua realização sobre dois planos
de generalização: geralmente através da distinção entre tipos de processos e, neste
âmbito, através da introdução de processos isolados dum determinado gênero. A
determinação do gênero efetua-se mediante institucionalização da possibilidade de
Observados no contexto e como diferenciação, estes processos realizam uma
Ihl/ri/JIÚ('liO da co m.plexidade do sistema politico para diversus mecanismos de introduzir processos e através da determinação de características geralmente
TI'III/('(/II. ~i~t('llla político duma sociedade pode levar para decisão uma elevada
()
válidas. Não contém ainda nenhuma decisão prévia quanto à forma e número de
cUlllpl('xid"d(' pl('lJ)lia (', com cla , a capacidade e multiplicidade inapreciável de processos deste tipo que se realizarão a par, ou em oposição, e com que temâiica
p,oblt'lll.lo, da Illltll.,~.1O ••ípida t' constante da sociedade e só se mantém, quando concreta, deixando portanto em aberto a amplitude do emprego cronológico c ob
jetivo. Ela só será concretizada num segundo processo de decisão, caso por caso.

Correspondentemente a esta diferenciação e integração, têm de ser olhados de


dois planos diferentes: a distinção e o reconhecimento mútuo dos tipos de processo

3 Quando, i,I rlrulo !Ir exr cção se realizam esses controles por exemplo, sob a Iouna dum «11 \li 01(,
judicial ela Ic'Ki~I.'~,\1I "" ""m" I r lrica política à justiça torna SI' evidente a p' 01>11'111'" il ,\: os (.lIfr ios
d(O «()Illlolt· klll flll,'" dI' "l'I 1f·"tlIIIHlCln~ ,Htifid,dllWtHl' pOI M'U 1.1(1(.), P;UrI qlH'.1 It ripoH'4 lhilullldc'
lt l 1LtO

,'", CHlIllitl.1 I)II\III,~ h_lltl' I tlttllnH IIH ••oHl 1\llIt 1011.11 do", pttu •..,\014 I',H .,~~., f' fl '1IIItt'~III' '111111'111" II-M
198 CONSEQÜÊNCIAS E PROJEÇÕES

como partes integrantes do sistema político são, em geral, institucionalizados abs-


traindo da situação dos interesses, a introdução e execução processo certamente no
caso particular; a coordenação concreta através da aceitação já descrita de output
como input sucede-se, em contrapartida, em cada caso. Através desta separação
entre diversos planos de diferenciação e integração , o processo obtém uma certa
liberdade de escolha e com isso uma mobilidade restrita de combinações de proces-
sos: o processo legislativo depende realmente do processo de eleição política mas
não de forma que na eleição já se terrha decidido quem votará em que lei; a decisão
conjunta fez-se no processo legislativo isolado e é só através dele que se decide até
CAPÍTULO IV
que ponto é que a eleição é relevante na prática e sentencia respectivamente os Separação dos sistemas sociais e pessoais
eleitos a uma posição inativa. Da mesma forma não se liga invariavelmente o
processo legislativo isolado a determinados processos administrativos ou judiciais, o
que terminaria com a fusão num processo único; antes se decide só em casos par- Há separação de sistemas a distinguir da diferenciação funcional dos sistemas
ticulares, através das autoridades administrativas, ou do tribunal, qual a lei a ser sociais (ou também de outros) que se tornam necessárias mediante a constituição de
usada. A seqüência, segundo a qual o legislador procura, com um processo após o .. sistemas relativamente autônomos e determinando limites, mas que não podem já
outro, satisfazer as necessidades da sociedade. não precisa, por esse motivo, de ser ser anuladas e integradas num sistema; podem, apenas, ser resumidas por meio
coordenada com a seqüência de decidir em tribunal em face das queixas. Finalmen- dum horizonte comum. A moderna teoria dos sistemas oferece a possibilidade de
te, o mesmo é válido para uma nova vinculação da eleição política com a prática separar, em primeiro lugar analiticamente, os sistemas de atuação social e pessoal
de decisão do sistema. O eleitor decide se e quais das decisões do legislador, das (quer dizer, integrados por uma personalidade individual) e de perguntar depois se,
autoridades administrativas ou dos tribunais, ele quer sancionar nos trámites da até que ponto, e por meio de que estruturas e processos, se pode levar a cabo esta
eleição. Através da tipicidade geral das suas formas, os processos estão realmente separação em sociedades determinadas (I).
ligados uns aos outros, mas apenas sob a forma dum esquema geral, que não im-
pede a variação da associação concreta, antes a permite. A separação dos diversos
níveis de generalização tem exatamente este sentido de garantir de forma geral as A separação dos sistemas SOCiaiS e pessoais não pode, naturalmente, ser
relações, mas transferindo a sua realização para o caso particular, cuja conjuntura executada concreta e objetivamente no sentido de que ora atua o sistema social,
concreta não pode já ser prevista. Graças a tais liberdades estruturalmente inte- ora o sistema pessoal. Ela também não implica isolamento no sentido duma ne-
gradas, a complexidade do sistema pode provir daí, o que é previsível em contextos gação de influências recíprocas. Só se quer dizer que, no sentido da at.racão, exis-
adequados de ação. tem aspectos que podem ser atribuídos, ou ao sistema social, ou ao sistema pessoal,
mas não a ambos simultaneamente, e que, sendo assim, as reações têm de ser
A diferenciação funcional permite a um sistema organizar diversos tipos de repectivamente diferenciadas. Por exemplo, se uma mulher vai comprar salsichas
processo a par, processos que não poderiam ser resumidos num contexto de pro- num açougue, os elementos de sentido da sua atuação fazem parte do sistema social
da sua família, de quem ela cuida, e fazem parte do sistema social da loja, em ârn-
cedimento. Assim o sistema pode, não apenas obter as vantagens da especialização
de capacidades, como também deixar acontecer lado a lado contradições e pode bito mais lato, fazem parte do sistema econômico da sociedade que instituciona-
operar simultaneamente sob premissas contraditórias e, por esse meio, aumentar o lizou, por exemplo, que não se devem regatear os preços. O seu estilo de proce-
número de possibilidades de atuação e, portanto, a complexidade. Já acabamos de
vet as vantagens dum alargamento de processos de aprendizagem e da assimilação
da~ fI USlI ações, que se podem obter por meio da diferenciação dos processos. Que
1 - A teoria dos sistemas é discutida tanto na sociologia quanto naturalmente também na psicologia.
M' \t'lIh.1 d(' obedecer aos representantes do povo, que se elegeram, constitui um
Todos os psicólogos jamais definiriam o seu campo de investigação através duma teoria de sistemas de
(JUlIO I'X(·llIplo. Sem li diferenciação dos processos não seria possível velar por uma atuação de integração pessoal. Ver. como exemplo desta opinião R. G, Herbsr.Situarion Dvnamics and
fl111c!,III<,.1IqUll.1I dos detentores do poder, através dos que lhes estão sujeitos. A the Theory of Behavior Systems (Dinâmica da situação e a teoria dos sistemas de comportamento),
demo, 10111.1111'111'1\(1\' d(' diferenças. O mesmo é válido em relação à positivação do Behavorial Science 2, 1957, pãgs, 13·29; Merron Gill: The Present State of Psychoanalytic Theory (O
dir cu o , qlll' 11.\111'''c!I' pll'~('Índir de se poderem tratar como fixas as normas al- atual estado da teoria psico-analírica), The Joumal of Abnormal and Social Psychology 58, 1959, pâgs.
terávl''' 1.lInlu 111,I ico!<ililll.I~'ão se realiza desta forma contraditória em sistemas 1·18; O, J. Harvey/David E. Hunr/Harold M. Schroder: Conceptual Systems and Personality Orga-
nization (Sistemas conceptuais e organização da personalidade), Nova Iorque-Londres 1961; mais além
poltticr» 1011111111111 tltll 11'111 i.ulos c muito complexos. Ela baseia-se, por um lado,
de todos os sociólogos e psicólogos sociais, que procuram compreender desta forma a relação da per-
num 1111'( 01111',"111 di tli~1.1I111.lIlIi'lIlO ao acontecimento da programação, com um
sonalidade com o seu meio, por exemplo, James S, Plant: Personality and the Cultural Pattern (Per-
ajustnuu-iun .tilmlt, illll 11'11l.lIlo ximbolicamente , dos presentes; por outro lado, sonalidade e o padrão cultural), Nova Iorque-Londres 1937; Ta1cott Parsons: An Approach to Psy-
ela 1('al",1 ~I 111I~1'"".I'Ii~1I1 ill(llIl,li,~ d(' execução de programas através duma in- chological Theory in terms of the Theory of action (Um enfoque da teoria psicológica em termos duma
lusào 11Iodl'I.ld;1 Ilrl "111111, ,I" ,11101,,10di' papéis c isolamento social. A certeza in- teoria de ação). Editado por Sigmund Koch em: Psychology, A Study of a Science (Psicologia. Um es-
~n"
dubit avel 10111 ,I 1111111 11.'11illIl.l~ ,I" di'tisõ('s obrigatórias do sistema político nas tudo duma ciência), vol. III, Nova-Iorque-Londres-Toronto 1959, págs. 612·711; do mesmo autor:
MHli'd,ldl" 111.11','v ••l\lid{ln, ,I 11"" Ii 1'\11111111;1111i'f('liv.un('flt(' as expectativas, parece
Social Structure and Personality (Estrutura social e personalidade), Nova lorque-Londres 1964; Chris
Argyris: The Integration of the Individual and the Organization (A integraçâo do indivíduo e a orga-
\),1'1'.11 w, 1'llI ~Illllit{l l'lldl', 111'1.1111di' .llI\ho~ n~ 11\I'(;\lIisU\os poderem funcionar nização) Em Chris Argyris, entre outros: Social Science Approachcs tO Business Behavinr (Enfoque! de
\111\ .10 lad" ti" 11111111 " .• II''-'~l!l' ti" ~I Ir 1111111
01\\I', 1011111,11'11\1\1 1,111111.\0 011110, 111, 1062, llruca. 67 98~
i~ncias sociais ao cornpnrtarneruo nos, ncgódos), IloIYI('wllO<I,
201
SEPARAÇÃO DOS SISTEMAS SOCIAIS E PESSOAIS
"00 CONSEQÜÊNCIAS E PROJEÇÕES

\'111 contra partida .. aquilo que se pode atribuir à sua personalidade individual. tudo, dominados pela concepção indiferenciada; é de louvar que o indivíduo se in
l'ur a todos os participantes numa dessas cenas, é importante que possam atribuir, sira, por partes, no todo social e partilhe com os outros a sua convicção, mas in
com justiça, um sentido de assistência aos sistemas, porque, não sendo assim, felizmente esse caso não é muito freqüente.
hcgam a expectativas falsas e reações incompreensíveis; por exemplo, procuram
um comportamento socialmente determinado para motivar pessoalmente, ou para
premeditar acusações pessoais (~). Se se definir legitimidade normalmente através da divulgação da convicção da
validade ou da legalidade das decisões governativas, corre-se o risco de cimen-
A necessidade duma tal separação de sistemas e as exigências correspondentes tar este juízo prévio em conformidade: ou, pelo menos, torna-se difícil pó-lo em
feitas ao processo aumentam com 'a complexidade crescente da sociedade. A di- dúvida. Mas a questão reside em saber se uma elevada conformidade de opiniões
ferenciação social leva, como se sabe, à individualização das personalidades, O in- não tem o mesmo significado que a complexidade reduzida dos sistemas com
divíduo presencia a sua atuação como que exigida através de tantos sistemas sociais poucas alternativas e riscos de estabilidade correspondentemente elevados. Tem de
sempre em alteração, a que só pode juntar algumas conseqüências de atuação se pôr em dúvida se um sistern a político, altamente complexo, como o que se pode
relativamente consistente, conseqüências exeqüíveis na prática, como personali- observar tipicamente nas modernas sociedades industriais, pode alcançar a sua es-
dade. Ele precisa dum princípio de integração para além dos sistemas sociais. Ao tabilidade a partir duma duração básica de convicções jurídicas firmas e divul-
invés, os sistemas sociais dependem da garantia de atuação esperada e conforme à gadas. que pressupõem uma situação semelhante de motivos; ou se não deve a sua
estrutura, de indivíduos muito diversos, depende, portanto, de se tornar conti- estabilidade precisamente à heterogeneidade e flutuação das opiniões individuais.
nuamente independentes das conjunturas individuais de motivos. Entre os sistemas Realmente há algo que denota que a adaptação duma base à outra já evoluiu bas-
sociais e pessoais têm de ser acionados transformadores de generalização e mecanis- tante. Sendo assim, trata-se de reconhecer aquelas estruturas e processos que trans-
mos de indiferença mútua que, por um lado, neutralizam a motivação pessoal e, formam a variabilidade em estabilidade.
por outro, travam até um ponto tal a determinação social que o indivíduo apenas
tem um espaço de manobra suficiente para desenvolver uma única linha pessoal de
conduta (3;). Se se considerar excluída essa transformação, porque não se pode edificar com
segurança sobre areia, finge-se a possibilidade de tr at a r adequadamente o tema da
Por motivos que não podem ser expostos aqui em pormenor, a compreensão Icgitimação por processo jurídico. Que ser e não ser se excluem, que do não ser não
desta situação foi bastante difícil para a sociologia (4). O instrumentário ideológico pode resultar algo que seja, que a verdade é a idéia certa daquilo que é e portanto,
para a sua análise está preparado com a teoria dos sistemas e, em proporções muito é obrigatória todas estas condições prévias do pensamento se encontram por trás
restritas, com o conceito de papel. Em pontos isolados, a investigação empírica
da u-oria clássica do pensamento jurídico, por trás do conceito comum de lcgui-
parcial tornou reconhecível o sentido duma tal separação de funções contra um
rnidacle e por trás do ideal de conformidade. Se se sair daqui se os processos se
juízo prévio dominante (5)_ Muitos outros âmbitos de investigação ainda são, con-
deixarem justificar como meios de encontrar a verdade, mesmo assim só a verdade
pode legitimar, pois só ela é fixa e capaz de convencer todos.
1. Comparar com as observações sobre a visibilidade dos limites do sistema.
3 A partir deste pensamento fundamental pode compreender-se. acima de tudo, o fenômeno da or-
ganização crescente de todos os sistemas sociais, Consultar Niklas Luhmann: Funktionen und Folgen Na realidade, está implicado um pensamento completamente diferente nas
formaler Organisation (Funções e conseqüências da organização formal). Berlim 1964.
instituições já ativadas. A sociedade moderna atingiu um grau de complexidade
4 Um dos impedimentos reside na forma como é problematizada a separação dos sistemas sociais e
através do qual o impossível se torna possível e tem, então, de ser levado em conta.
pessoais como "alheamcnto". como se uma nova fusão fosse desejável uma opinião que, por seu lado,
se radicou na incapacidade de reconhecer como oportunas e estabilizadoras as contradições. É, igual- Um sistema político, quando se organiza apenas a si próprio de forma suficien-
mente, falha uma segunda tendência, originada nos séculos XVIII e XIX, de determinar a relação entre temente complexa nos seus'processos, pode produzir e reduzir alternativas bastan-
os sistemas sociais e pessoais através da proposição oposta de coação e liberdade. tes, tomar providéncias para que as suas decisões sejam aceitas sem exce pção como
" li pesquisa eleitoral mais avançada é talvez aquela que defende que a apatia pode ter funções obrigatória~; com isso pude recsrruturar efetivamente as expectativas sociais e, neste
p()~llivas asxirn, pOI exemplo Bernard R. Berelson/Paul F. Lazarsfeld/William N. McPhee: Voting. sentido, auto-legitimar-se (~). Para tal, não são de forma alguma necessários o con-
/I Sludy nl Opillion Formation in a Presidenti al Campaign (Votar. Um estudo sobre formação de senso universal. Cai-se nesta saída quando se mantêm as premissas clássicas e se
opi"i.lo 11\1111,1• ,1\lIP,lIlh,1 presidencial). Chicago 1954, pags. 314 e segs., especialmente sob o ponto de
utiliza uma realidade que saiu delas há muito. A alteração, muitas vezes notada,
Vl\I,1 d,1 ••• "II.I~,I\t d,1 dI" i,,\O Também na sociologia da organização aumenta o interesse pelo desin-
dos ideais democráticos em lotalitários, tem então uma conseqüência de corrup-
1\'1.'~,,' ,li.' ., Idl'l" dI' 1\l1\~\I'" p,,,il ivas na indiferença, Ver, por exemplo, Elliot Jaques: The Changing
(~\lIIIII" 111 ,I 1 ,"III'Y (1\ ,,,111\1,1 "\lI mudança numa fábrica), Londres 1951, pags. 302 e segs. sobre ção , se é que a verdade permanece o objetivo político, e a conformidade comprova
"0(')111')111
•.,10 ,••trqlll\vd",I(ltlrr'II l Iuhi n Industrial Workers'World. A Study ofthe"Cemral Life Interest" a verdade. Entre outras premissas, também se pode pensar nos sistemas políticos,
,,) Ihl' 1'ldlt",,,,1I \\"Ihlo (11 11"",,10 t111~u.rb alhadores industriais. Um, estudo sobre "o interesse cen- que não necessitam dum domínio absoluto sobre o seu meio ambiente para se
11•• 01" 011'vlll.1 011,.1\,011,0111,"1,,,1" 11101"'1".".), "0)( i,tI Pi ob lcms 3, 1956, pags. 131-142; Chris Argyris: Per-
."",1111\ 111111"111.1111111111111li •• (""11,, I III'IW"I'" Sysl\'m and lhe Individual (Personalidade e organi-
"1",1,, ti ","1111" "1\111 ,1',111111.1 I 11,,111111,,") N"viI 1'''<111(' 1957, sobretudo pags. 89 e segs.; David L.
,"111. I !r, \ ,,11111"'1" ~1,',,, •• ,,,,,I 1 ".1. 111 i' 1(.01""1,01 Olj{,lIlili'lion (Os voluntãrios. Meios c fins numa
I",,~III/ •••.,I" 1••• 11"•.•1) 1;lt'III-i" 111 I""" )I,IM' 111" .")(~ Rllhrll I'I/'slh"s: The Organizational Society.
/111 ,\I\..lv.l. 11111.1" III'lilY (/\ .",,, 01••1" "'M'I\II" )11",,1 ,1111,1,,,1.11,,,' (' 11111.1I<'(),in), Nova lorque 1962, 6 Para não se poder conceber urna tal alltojll~tilicaçãonoâmbitoclopcnsamenloclãssicor para ilS<l,'\II.lnç<l incvitâ
I'hll r 11', " Vl'1no direito ""tUI ,,\ 1M .,.' d,' 1\0vO I('k'~\1(i,1 ,I I ,lIi, I A'K'" l.egalidad y Legirimidnd
O" 'ONSEQutNCIAS E PROJEÇÕES

.'11'1411 im.u ern (7). Constituem -se por intermédio da diferenciação dum ambiente
soriu l , que pr essupõcm extremamente complexo e nem pla nejâvel , nem governável
em detalhe. Adaptam-se a esta complexidade na medida em que elevam a sua
própria complexidade. Podem orientar a redução desta complexidade própria (em
oposição ã da sociedade) mediante uma combinação de diversos tipos de processos,
que procuram atingir na diferenciação funcional, simultaneamente uma adaptação
polüica do sistema ao seu meio ambiente e uma adaptação administrativa e ju-
dicial do meio ambiente ao sistema. Um tal sistema tem elevadas chances de
aproveitar as suas próprias possibilidades de decisão e, simultaneamente. alterar as
expectativas do seu meio ambiente. Se realmente o conseguir, então legitima-se
pelo procedimento.

r.::;:::j'I ,-OMPOSTO E IMPRESSO


~ f:/JI70RA GRÁFICA ALVORADA LTDA.

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u, h .1111 1/H1I 1/1 s 221111il 221-11961

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