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JACOB D O LI NGER

Dignidade: o mais antigo valor •


da humanidade. Os mitos em torno
da Declaração Universal dos Direitos
do Homem e da Constituição brasileira
de 1988. As ilusões do Pós-Modernismo/
Pós-Positivismo. A visão judaica

EDITORA ri?
REVISTA DOS TRIBUNAIS
Separata da
REVISTA DE DIREITO CONSTITUCIONAL
E INTERNACIONAL
Ano 18 - v; 70 - jan.-mar./2010
p. 24-90
DOUTRINA 'JACIONAL 25

humana refletida no trat.imento dos es- 1wo monotheistic relig1ons. Human


2 cravos, dos estrangeiros e dos trahalha- dignity reflected in the treatmcnt of
dores no direito bíl)lico. O 'i." Manda- slaves, of foreigners and oi workers in
Dignidade: o mais antigo valor mento do DeLá logo. As diversas visões bi blical law. The 5,i. Command ment of
dos fi lósofos e dos historiac.lorc~ sobre Lhe Decalogue. The different perspec.ti ves
da humanidade. Os mitos em torno o D irei1o j udaiw. Desinteresse de uns, of philosophers and hisl orians regarding
depoimentos positivos ele ou lros. Danos Jewi sh Law. lndifferenc.e of .0111e, po~itivc
da Declaração Universal dos Direito morais estabelecidos há 1q séc ulos atrás. 1es11mo111e~ of others. Moral damages as
no Talmud. A Declaração Universal dos ,et 19 centuries ago in the Talmud. The
do Homem e da Constituição brasileira Direi tos do Homem e o Tribunal de Nu- Universal Declarat ion oí Human Rights
remberg compostos por cúmpliLes cio na- and thc 'Juremberg Tribunal composed
de 1988. As ilusões do Pós-Modernismo/ zismo. Em defesa do positi vismo 1uríd1co of accomplrces of Nazism. ln defense of
Pós-Positivismo. A visão judaica contra a teoria pós-modernista que lhe
atribui responsabilidade pelo nazismo
legal positivism againstthe post-modcrn ist
theory that posi livisrn was respon~ible for
A inoperância dos tratados de direitos Nazism. The ineffectiveness oi trcaties
humanos diante das real idades cruéis of human rights in iace oi the cruel
do mundo aluai. Os genocídios Pós-Se- real iUcs 01 the modern worl d. 1he post
gunda Guerra M undial. A inoperância da VVW li genocides. The inoperativeness
JACOB Ü OLINGCR ONU. cujo~ órgãos são todos submissos oi the United Nations, as 1ts departments
à maioria árabe muçulmana na Assem- submit to the Arab-Muslim maJority in
ProtC',~or titular dposentado da UERI. Professor Vis1t,mtr d,1 bleia Geral. A falência da Corte Interna- the General Assembly. The bankruptcy
Llnivcrsidade de Miami e da USP. lonrerrncista da Academiil dr cional de Justiça demonstrada no caso do oí the lnternational Coun 01 Justice
Dirt'ito lntern.ic.ional da Hai.:i. muro construído por Israel como antepa- demonstrated in the case of the wall built
ro aos " homens bomba". Os princípios by Israel as a defense againsl suicide
como ponte entre o direi to natural e o bombers. Principies as a bridge betwecn
direito positivo. A Consti tuinte de 1987- Natural Law and Positi\'e Law. A report
ÁREA oo D1Rerro: Internacional; Constitucional 1988 como vista por um participante. A on lhe maki ng of the 1988 Constitution.
Constituição de 1946 e o respeito pelos The Consti tution of 1946 and the
R ESUMO: Desrazer a impo rlânc,a atribu- direitos humanos. A clássica do utrina protection of human rights. The classical
AesrRACT; To undo the importance given
ída ao enunciado "dignidade da pessoa to the "dignity of the human person" brasileira enaltecedora da dignidade hu- Brazil ian cloctrine as it extolled human
humana" na Constituição dl· 1988 e re- statement thal appears in the Brazilian mana. A subversão do princípio da digni- d ignity. The subversion of the principie oí
examinar o v,1lor da Declaração Univer- Constitution of 1988 and to reexamine dade humana na jurisprudência do STJ. human dignity in the jurisprudence oí the
sal dos Di reitos do Homem. A dignidade the value of the Universal Declaration O di reito e o amor, aliados necessários. Superior Tri bunal ot Justice. Law and Love
humana como conceituadil na obra dos of Human Rights. The concept oi human A Igreja Católica e os juueus. As reformas as necessary allies. The Cathol ic Church
grandes filósoíos através dos séculos. A dignity as it appears in the works of do Papa João XXIII e sua extraordinária and the Jews. The reforms oi Pope John
convergência do direi to romano com o the grc·at philosophers throughout the maniiestação de re,pei to à dignidade hu- XXIII and his extraordinary mani1eslation
direito canônico, na era ml:!dieval e nas centuries. The convergence of Roman mana. oi respect to human digni ty.
la~es ~egu1ntes da história do direito, de- and Cannon legal S}'Stems in the Middle
monstrando a influência da religião, da Dignidade da pessoa hu-
PALAVRAS- CHAVE; KevwoRos: Dignity oi lhe human being
Apes and in the later times of the h1story
moral e da ética no direito e o respeito mana - Direitos humanos - Co nstitu ição - H uman rights - Constitution of 1988
OI .la.w, demonstrating the importancc oi
advogado pela dignidarle humana. O re- de 1988 - Declaração Universal dos - Universal Declaration of the Rights oi
re l1g1on, morality, and ethics in law, and
conhecimento da iniluência rio Antigo e Direitos do Homem - Organização das M an - Organization of the Lnited Nations
the respect shown for hurnan dignitv. Nações Unidas - Rel igião - M oral - Ética
do Novo Testamento em todas as iases da - Rcligion - Morais - Ethics - Second
The recognition 01 the O ld ,md the ,-..:e.;,. - Segunda Guerra Mundial - Holocausto
história cio D irei to. O pós-modernismo e World War - Holoca ust - Gcnocide.
Testaments' iniluence in al i phases of 1he - Genocídio.
a descon tinuidade cultural. A (ilantropia history of law. Post-modernism anel the
r a henemerência como verdadeiros fa- discont)nui~y of cuilure. Philanthropy
tores_ da dignidade humana. A o rigem da and Charity as truthíul IJclor, of
dignidade humana na criação do homo human rfignity The origin oi human
sapic·m retratada no Gêne~1s, como re- di~nity in the creation 01 homo ,.ipiens
conhecido por iilósofos e teólogos. O retlected in Genesis. as recognizcd bv
respeito do judaísmo para com as outras philosophers and theologian~. Judaism;s
duas rel igiões monoteístas. 1\ dignidade recognition and respec1 íor lhe other
26 RI VISTA Df D!Rl/10 co:,:STJTUCIO!vAL t //\; TI R.'i. \(/(),"','AL 201 O • N(){ J 70 DOUTRl'JA NACIONAL 27

'i1 MA~10: 1. Introdução - 2. A Filosofia: 2. 1 San to Agostinho (354-


enunciado da '· dignidade da pessoa humana··. Por uma questão de boa
4 lOJ; 2.2 Hugu Groti us 11583-1645); 2.3 Thomas l lobbes ( 1588-
1679); 2.4 Samuel Puffendori \1632-1694 ); 2.5 B.irul h Spinoza
organização do trabalho. uma vez que. basicamente, todos estes autores
1632-1677!; 2.6 M ontesquieu (1689-17551; 2.7 Jean-Jacques Rous- seguiram a mesma linha (sendo que, mais recentemente, alguns come-
seau (1712-17781; 2.8 lmmanuel Kant (1724-18041; 2.9 G(•orr, çaram a retroceder parcialmente de suas posições oriP,inais). preferi
Wilhelm Friedrich Hegel (1770- 18rn; 2.10 John Stuart Mi ll tl ll0<,- não fazer refe rência especifica a ne nhum d eles e/ou a seus trabalhos,
1073) - 3. A Histó ri a: 3.1 A dignidade humana ao longo do Direito mantendo uma linha de total impessoalidade e objeti vi.d ade em minha
Roma no-Canôn ico-Medieva I; J.2 Pós-Pos itivismo/Pós-Modernis'l lo;
3.3 A ca ridade. a íi lantropia, a temperança - 4 . A vi~ão judaica: 4 .1
forte oposição à hermenêutica aplicada ao atual direito constitucional
Direito judaico: o início de tudo; 4.2 Tratamento d~ escravos; 4.3 brasileiro. Assim, o trabalho versará as ideias sem referir os auto res.
Tratamento dos estrangeiros; 4.4 Direito do trabalhador; 4.5 Honra Paralelamente, o trabalho cuidara da Declaração Uni\·ersal dos
teu pa i e tua mãe; 4.6 A visão cristã do direito judaico; 4.7 Um auto r
Direitos do Home m e do excelso valor a ele atribuído por autores nacio-
de d ireito canônico com v isão la rga; 4.8. Danos morai~ - 5. A Decla-
ração Universal dos Direitos do Hom em: 5. 1 A Conferência de Evian;
nais e estrangeiros d edicad os a diversas áreas do direito. Também aq ui
5.2 As informar.,õcs sobre o Holocausto; 5.3 A cumr li c1dade com as sem fazer referência aos ilustres doutrinadores da ··uni versalização cios
atrotidadcs de Hitler: .5.4 Bombardear Auschwitz?; 5 ..5 O Tribunal d ireitos humanos··. O endeusamemo deste documento será severamente
de f'-urcmberg; 5.6 A coniecção da Declaração: 5.7 O " famigerado'' criucado tanto pelo enfoque de seus antecede ntes como pelo total
J)O\i tivismo Jurídico como re~pon\ável pelo nazbmo: 5.8 Tratados,
fracasso na consecução de seus objetivos.
pacto~, convenções, rcsoluçõc\ et r aLf.'rva; 5. 9 De genocídio em gc-
nrx ídio: 5. 1O A lógit:a do d ireito i11 te>rn.1cion;d rio\ di,vitos hL1manos A história do pensamento huma no através d e todos os tempos,
6. ,\ rontinuid,1de dos l und,m1entos: 6. 1 Os princíp1m ele direito abrangendo todos os povos que deixara m sua marca na filosofia e na
no d ireito nt1tural e no direito positivo; 6.2 o~ modernos antecerlen- teologia. inspirou-se na ideia da dignidade pessoal do ser huma no. Vamos
tf's da dign,cl.ide humana 7 . Hr,,~d: 7. l A Co11~titu1çào de 1988;
encontrar o princípio fortemente inserido na moral. na ética , na religião,
7.2 Os direitos e> as g<1ranti,1, n,1 Constituição de 1946; 7.3 Doutrina
bras i leira c.lássica; 7. -1 Legislação rea tiva; 7. 'i Excesso de legisl ação na fil osofia e. modernamente. também na psicologia. En foca rei o tema
- mínguJ de> atitude,; 7.6 L.:ma 1als,1 ap licação jurisprudencial d.:i da dignidade humana no plano da filosofia e da história do direito, apre-
dign ,clade huméln,1: 7.7 Reação inicial cios juri~tas brasileiros; 7.8 sentarei a vi.são judaica e, em seguida cuidarei cspecificamemc dos dois
Uma aba liLada opinião estrangeira 8. Conclusão: 8.1 Meu concei- temas - a Declaração t.:nivcrsal e a Constituição Federal.
to de dignidaclf' hum.ma e m inha dbcordância dos pós-tudistas; 8.2
O ,1111or; 8. l D1gn1d.:ide parai. A ideia da liberdade d o ser racional, expressa por todos os pensa-
d ores, refletia a sua independência, sua a uto nomia, sua dignidade.
E, paralelamente, a defesa do direito à vida, à integridade fisica, à
"Tlw 1ai1011a/ st11cl_1 of law is still Lo a large ex1ení tli c study i,f segurança, o direito à autod efesa. predominaram na maioria das civili-
liisto1 v" (Oli ver \Vendcll H o lmcs, Jr The Path o f 1hc Law. 10 zações. A grande luta foi sempre pelo direito à liberdade, afetada pela
Harw11tl Lm\ Rcv,cw. 4 57 apud C larence Morris. instituição da escravidão, prevalente na Judeia, na Grécia e em Roma.
rJic Greut Legal Philosopl1C1s , p. 428).
Mas mesmo esta instituição foi frequentemente moderada por ideias
libertárias, ou, pelo menos, por medidas que visavam minorar a dureza
"O di11.:iw ro111w10 é anl1Ro, lllCIS só po, is~o não se to111c>11 i11111il A
a11Lig111dadr do acn,dilc> nao n tin 11/a. nem o rnuli/i za"
da institu ição.
(TJSP, Rccur'io de Revista 157.498. RF233/l4]). De maneira que, pretender qu e direitos humanos se iniciam com
a Declaração Universal dos Direitos do Homem no plano internacional
1. l 'JTRODL,Ç.A.0 e que a dignidade huma na foi inaugurada no Brasil pela Constituição
de 1988 representa desconsideração a séculos. a milênios d e atuação do
Este trabalho \ÍSa desmistificar a importância atribuída por toda espírito humano.
uma geração ou quiçá duas geracões de ilus tres juristas hrasileiros Por outro lado, no plano internacional, excetuados os períodos da
que passaram a endeusar a Constituição d e l 988 e principalmente o Primeira e da Segunda Guerras Mundiais, os direitos humanos jamais
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foram tão vilipcnd ia<los, a vida humana jamais foi tão barateada, nunca amo r à sobrevivência, que testem unhamos na doen ça, na miséria, na
houve tanto sofrimcnio <lo ser humano nas mãos do o utro ser humano guerra, aLravés dos mais longos e do lorosos sofrimentos. em todas as
como a partir da Declaração Universal dos Direitos do Ho mem . apesar pessoas, de todos os povos cm toda a historia .
ele todoc; os tratados. convenções. resoluçõec;, dccl,1rnções. comissões. San to Agoc;t inho (Cidade ele Deus. XI. Capítul o 27) discorre sobre
tribunais e demais ini ciativas tomadas pela sociedade das n.1cócs nos esse fenômeno e con ecta-o à dignidade humana.
ultimos 62 anos, pretensamente em prol da proteção dos povos e dos o valor que damos a vida - está af a caracteris Lica imanente da
indivíduos. dignidade humana.
E, no Brasil , jamais ho uve tanta injus tiça, tanta corrupção, do que
a partir ela Constituição de 1988. ela mesma nascida sob o signo do 2.2 /Iugo Grotius (1583-1645)
desvirtuamento do que realmente significa uma Constituinte.
"Some-se a isto qu e a história sagrada. além dos preceitos que
f\o Brasil , a doutrina que se rejubila em considerar-se "pós-posi- contem para esse propósico. fornece um motivo nada desprezível para a
tivista" se <ledicou à extremada louvação dos feitos dessa Constituição,
afeição social, uma vez que ensina que todos os homens descendem dos
que sequer tem uma filosofi a central, que foi alterada dezenas de vezes. p rimeiros pais. De modo que a esse respeit o pode-se verdadeirament e
que não tC'm sido respeitada naquilo que tem de corre to, cloULrina esta
afim1ar, o que o Florentinus fez em outro sentido. que a natureza nos
formada po r uma geração ck mestres que vivem se c itando recipro-
fez todos sem elhantes: daí se segue que é crime para um homem agir
camente, cada um somando mais um texto rcpc titi \'O ao que ja ficara
em prejuízo d e outro~ (Direi to da Guerra e ela Paz. Discurso Preliminar,
dito pelo ouuo. nu que ele m esmo já escrc\'era anteri o rmente, numa
XIV).
permanente cons trução piramidal , que nada ele rea lmente concreto
soma. Surpreend ente a repctiç,10 dos conceitos, a dupla, tripla colocacão 2.3 Thomas Hobbes (1588-1679)
elas m esmas i<leias no mesm o cscrilo , novame nte d1rcilos humanos e
dignidade humana e. mais uma vez graças à Constituição ele 1988, numa N o Capítulo 10 do Leviathan:
insis tência em to m o ele um mesmo ponto, algo que não se vê cm outros "O valor público de um homem, que é valor estabelecido para e le
temas do direito cm geral. pela comunidade. é aquele que as pessoas comumem c chamam de digni-
E, paralelamente a tudo isso - a total inércia dos pen sadores, dos dade"'.
escri tores. dos p rofessores, no sentido de t0111ar inicia tivas no campo.
cm esforço corretivo da lasUm(\vel realidade. do desvirtuamento de toda 2.4 Samuel Pu.Jfendmf (1632-1694)
e qualquer dig nidade que impera nas ruas. nas favelas, e principalmente Puffendorf. no original, é difícil. 1'a u·adução para inglês. continua
nos gabinet es parlamentares. E é jus tamente nas salas de aula, no recinto difícil. Verter para o vernáculo seria um esforço ina udi to e supérfluo.
acadêmico que se fo rma a responsabilidad e pelos males que asso lam a Deve-se invocá-lo do texto de que dele se dispõe. Em The \.Vhole Duty of
República. Man Accordi11g to ihe Law of Naturc tradução de Andrew Tooke, Li beny
,\queles que poderiam dar inicio a uma revolução dos cosmmes. Fund, p. 102:
a uma reviravolta no plano ético-moral, mantêm -se Lrancaclos em suas
"Whence this also is an universal Duty of Lhe Law >!aturai. That no
torres. ocupados pontificando sobre o que não é e nunca virá a ser.
Man, who has n ota peculiar Right. ought to arrogate more to himself.
2. A F11 OSOFIA than h eis ready to allow to his F ellows, but thal he pem11t o ther \1en to
enjoy Equal Privilege with himself.
2. 1 San lo Agostinho (.354-430) The same Equality also shews wha1 every Man's behavior ough t to
A dignidade humana esta ligada á viela: o apego à \'ida. a luta para be, when his busiaess is to distributejustic e (originally jus. which might
manter-se em vida são mani festações e.lesse fanát ico. quiçá misterioso, here be het1cr translated as 'right') among others: to wit, that he treat
30 REVISTA l)f DIRIITCJ C01\o.SI// U(IO,\ · \I I /Nlfk"!ACIONAl.2010 RDCI iO DOUTRINA NACIONAL 31

Lhcm as Equals. anel indulge nol thaL, unless thc Mcrits o f Lhe Cause "( ... ) pois. o mero impulso da apetite é escravidão, enqua nto que
rcqui re il, Lo one, \vhich he denies lo another. For if he do otherwise, he a obediência à lei que prescrevemos para nós mesmos, é libcrcladc" (O
who is discoumenanced is at Lhe c;ame time affrontcd and wronged, and ccmtrato !.OCial, li\TO 1, n . 8 ).
toses somewhat of the Dignity whicb Nature bestowed upon h1m ."
2.8 /mma1111rl Ka111 (1724- IBM )
2.5 l3a111ch Spi noza (1632-1677)
Kant é praticamente o único clássico referido pelos constiluciona-
l\o final da segunda parte de sua "Ética" , o gênio da comunidade listas brasileiros e também pelos civilistas convertidos ao constituciona-
ju<laica de Amstcrdam, dela afastado. depois de proclamar que a virtude lismo. mas a referência é apenas à s ua afi11nação de que o homem não é
e o scrv1,o de Deus representam felicidade e a mais e levada liberdade, uma finalidade, não um meio. São, na maioria das vezes, referências de
nos dá o segui nte sermão: segunda ou terceira mão. Um ligeiro passeio pela obra do imortal filósofo
"[sLa doutrina contribui para o b em estar de n ossa existência faria bem para a capacitação de como estão redescobrindo a roda.
social , pois nos ensina a não odiar ninguém . não desdenhar ninguém. A passagem aludida pelos autores se encontra nos Princrpic>s
não debochar de n111guem. não ficar zangado com ninguém, não im·cjar J1111damcnLais der metafisica da moral, segunda seção. onde Kant assim se
ninguém. Ensina a cada um a ficar satisfeito com o que é seu. e ser pron unc1a:
pres1a1ivn para com seu vizinho, não como decorrência de algllma pena
"Agora eu digo: o homem e gera lmente iodo ser racional existe como
feminina, por parcialidade. ou superstição, mas pela condução <la razão
fim em si mesmo , não mlTw11c111e como um meio para ser arbitrariamente
só, de acordo com os reclamos do tempo e das circunstancias. como
<lcmons1rarci na Terceira Parte. usado por esta o u aquela vontade, mas cm todas as suas ações. sejam
concernentes a si mesmo ou aos outros seres racionais, de,·c sempre ser
[sw doutrina contribui cm muito para uma melhor sociedade, na
considerado (ao mesmo tempo) como um fim ".
medida em que no) ensina por que meios os cidadãos elevem ser gover-
nados e dirigidos; nào para serem escravos. mas para que possam razer Pouco adiame, Kant fala na "autonomia da vontade" e, repetindo a
livremente as coisas de que gostam··. ideia dos fins e não meios, acrescema o seguinte:
Temos aqui a nobreza e a dignidade com que os homens se devem ''Assim . resulta uma união sistemática de seres racionais por
tratar reciprocamente. meio de leis comuns, ou seja, um reinado que pode ser denominado
um reinado de fins, pois o que estas leis visam é exatamente a relação
2.6 Mo11Lesquicu (1689- 1755) destes seres uns para com os outros como fins e não meios. E cenamemc
'·A liberdade filosófica consiste no livre exercício da vontade. A apenas um ideal."
liberdade pohtica consiste em segurança (. .. )" (O espirita das leis. Livro Considera Kant que lOdo membro deste "reinado" e um legtslador,
Xll . n. 2) . que se s ubmete às suas leis. E aí aparece a palavra-mágica (pa ra os pós-
positivislas):
2.7 Jcan-Jacq11cs Rous!.cau (l 712-1778) ·'( ... ) e isto não decorre de qualquer outro motivo prático ou qualquer
"O homem (diversamente do bruto) recebe o impulso da natureza. vantagem futura. mas da ideia da dignidade !grifo elo própno Kaml do ser
mas tem a liberdade ele aquiesce r ou resistir; e é particularmente na racional, obedecendo a nenhuma lei senão aquela que ele mesmo dá."
conscientização de sua liberdade que a espiritualidade de sua alma se Segue-se o trecho conhecido:
retrata·· (Da origem ela desigualdade dos /10me11s. prim<>irn pane) ·'No reinando dos fins , tudo tem valor ou dig11iclacle. Tudo aquilo
"Seria, pois, necessário, a fim de legitimar um governo arbitrário , que tem valor, pode ser substilu!do por outra cmsa que lhe seja equi-
que em cada geração. o povo tivesse a possibilidade de aceita-lo ou valente. mas tudo aquilo que está acima do valor, e que. portanto. não
rejeita-lo (. ..)" (O contrato social, Livro 1. n . 4). admite equivalente, tem uma dignidade ( ... ) ".
32 RI \/STA Df VIRLITO COS5/ ITUCIO."•:AJ l /1\.'1 / RNAC IONAL 201 C- RDCI 70 DOUTRI 'IA 'IACIO'IAL 33

l ogo ad iante fa la em tudo aquilo que tem va lor intnnseco, ou seja. de que manteve e ho nrou cm s ua pessoa a: "humanidade em s ua própria
dignidade. di g11idacle".
E ronlinua: Na versão britânica:
"A moralidade é a un ica cond ição sob a qua l um ser rac io nal pode ~( .. . ) is hc nlll s us taincd by thc co nscio usn css tha t hc has main-
ser um fim cm si mesmo, porque somente assim é possível que ele seja tai ned humanity in its proper dignity in his own person a nd ho nored it,
um membro legislador no reinado dos fins. Po rtanto, moralidade e a that he has n o re:ison to be ashamed of himsclf in his own sight, o r to
huma nidade na medida em que é capaz da m esma, é a única que tem dreacl the inward glance of self cxamination?··
c/ign idade...
2.9 Georg Wilhclm Fried,ich /-lcgcl (1770- 1831)
Continuamos na Metafisica da moral , seção segunda e lemos:
"Esta esti mativa mostra que u valor de ta l disposição é a dignidade e Na lntrodução à Filosor,a do direiw. ao criticar a s ubstiLuição dos
colora infinitamente acima de todos valores. com os qu ais n ão pode. por princípios do di reito, mora lidad e e vida élica pelos sentimentos, entu-
siasmo e o coração, em qu e a ciência da fil osofia caíra. diz no parâgrafo
um momento ser colocada em comparação o u concorrência sem ,iolar
s ua san1idade. 2 l , que:
"(. .. ) estavam ro ubando a humanidade de tod a ve rdade. valor e
A legislação que atri bui valor a wdo. precisa por esta mesma razão
pú!>St1ir clig11idculc". di gnidade. A dignidade de uma vestimenta filosóftca é desejada" (p.
) 9).
Ka nt. em seguida. rcfe re-se ao respeilo e à a utono mia como bases
Logo na Primeira Parte. parágrafo 36, Hegel nos ensina que o impc-
d a clig11idadc do ser h uma no.
ralivo do dire ito é:
Em Kant fica claro 4ue como o homem é um fim e não um me io. as
"Seja uma p~!>!>Oa e rcspeü e os o uLros com o pessoas."
leis a que se submete deve m ser po r ele consideradas como produzidas
"Bc a person and respect others as persons" - da versão utilizada,
co m s ua colaboração pa rticipação, e q ue islo implii.:a cm s ua <lig nidade.
Assim . diz ele: q ue satisfaz tão pouco como a versão vernacula r. No alemão a palavra
uülizada pod eria ser mencsch tão rica cm significado: como dize r apro-
"um mundú ele seres racionai<; (111u11dus intdligibilis) é possível ximadamente. !>eja geme e respeite os o utros como ge nte. Q ue falta aqui
como um re inado ele fin s, e is to por força da pro pria legislação dirigida a para a ideia, o valor, o principio, o caminho do respeito pela cli.gniclade
todas as pessoas como me mbros.·· humana? E no fim, nas adições ao parâgrafo 35 diz que a maior gló ria do
Kant insiste na dignidad e sem ulteriores inLcresses que se possa homem é ser um mentsch.
pre te nder dela us ufruir, do com port amento desinLeressado. da dignidade Na Filosofia da História. Hegel escreve na Introdu ção, sob n. Jll q ue
do homem toutc seu/e. a conscientização que o homem, qua h omem , é livre - a liberdade do
Depois j usLapõc a dignidade, uma certa s ublimida de à pessoa que espírito que constitui sua essên cia - surgiu pri meiramem e na religião - a
cumpre suas obrigações. não pela s ubmissão, mac; por sua participação mais interna região do espírito - e dela se espalhou rn uiLo lentamente.
como legis lador. E. Já no final ela obra. quando trata do mundo gem1ãn ico, na Seção Ili,
afim,a que os Estados e as leis nada mais são do que a religião se man i-
Pa ra os seguido res de Kant n a concep ção da dig nidade humana, vale
festando n as relações do mundo real.
ressalta r o c uidado <.:om qu e Lra ta na C rflica der w:;::ão p1á.tica o comando
de ''Ame a Deus acima de tudo e o Le u semel han1 e com o a Li mesmo ... 2.IO]ohn Stuaic Mil/ (180b- 1~73)
l\esta o bra, na PrimeJTa Parte, Capnulo rn . ao Lratar da resistência moral
às tentações para evitar problemas mediam e u ma mentira o u outra O grande pa ladino da liberdade, em geral, e da mulher em parti-
indign idade. chz q ue assim o homem se fo rtalece pela consciemização cular. exala em toda sua obra a ideia da dignidade humana. A liberdade
34 RF 1 /STA OI DIRIITO C0.1\'5 li fUC/0.'\'AL t l•\J li R:V,\( /0.\!AI 2011 R/)CI i1) DOU TRINA NA(IOI\.AL 35

do homem <lc <lb por sobre si mc~mo não vai ao ponln de poder dispor Caenegem, p. 65). Também no campo da processualrsLi.ca o di reito canô-
<la própria liberdade. escreveu cm 0 11 Li/Jcrty, Capnulo V ao Lratar ela nico se inspi rou no d ireito romano (Van Caenegem, p. 66). Por outro
auLOvenda a escraddão: "O princ1pw da liberdade não pode exigir que lado o direito canônico teve considerável iníluência no direito secular.
ele seja li, re para não ser livre". A c<luca,;ão moldada pe lo gove rno e :\ estrutura institucional da Igreja posl-gregoriana, com sua hierarquia,
qualificada como um despo tismo sobre a mente. levando à natural centralização, administração e sua burocracia. serviram de modelo para
tendência <lc dcspo1ismo sobre o corpo. as ins tituições ele reinados e principados a partir da ldade Média baixa
em diante (Van Caencgem, p. 66). Seria a estrutura administrativa da
3. A H 1qóRIA Igreja servindo de modelo a estruturação dos poderes laicos.
3.1 A dignidade hu11w11c1ao longo cio Di rciw Ro111a110-Canônico-Mcdicva/ Aqueles que costumam relegar a religião como fato r inoperante
na atualidade, como uma velharia que não tem mais influê ncia sobre o
Si , l lcnri Sumncr \tlaine é para os ingleses o qu e Montesquieu foi direito, poderiam voltar à leitura dos modernos estudos sobre a história
para os franceses. Outros dirão que ele representa para o século X LX o do direito na Europa (Stein , Caenegem, Zimmennan , e outros). e seria
que aquele loi para o século XVIII. in teressante que retrocedessem um pouco na história do direito para
r m sua obra clássica A11cic11 1 Law, v1aine afirma que devemos ao procurar as fontes que alimentaram nossos amepassados espanhóis
direit o natura l a doutrina da i~ualdade ele Lodos os seres humanos. Ele e ponugueses, com suas repercussões no direito moderno. A Lei <las
retroage a doutrina ao direito romano - om11cs Ji o111i11cs natu ra <1cc1ualcs Sete Partida~. iniciada por Ferdinando 111 e conclu1das por Afonso X,
s u111 , que teria dado um fim às distinções que o direiLO ci,·il ro mano foi um trabalho composto cios tradicionais costumes de Castila e Leão,
manti,·cra entre as d iversa~ classes de pessoas (p. 76). Na modernidade. de direito civil e canônico derivados do Velho e do Novo Testamentos
continua Mainc. '>àO os pensamentos dos j uric;tas franceses que 5e trans- (Peter Stein, p. 65). Dali se desenvolve uma longa evolução do direito
portam para o Novo Conti nemc e ali encontra m eco nos escritos ele através das Ordenações, clc~ernbocando, a final, nos códigos civis de
Jefferson e aí vamos encomrar a/1 mrn are ('(fttal , ai/ mcn an.' bo111 cqual. Ponugal e Brasil.
ai/ mm are born Jrcc. E chegamos à Declaração de Independência. O direito canônico evol uiu, e a partir do século XV foi consagrada
Mas antes disso, muito antes disso, fom1ou-se uma tradição na uma coleção oficial de decretos que compuseram o Corpus iu ris ca110-
Europa da colaboração do direito romano com a lgreja Católica (Peter 11icL atualizado em 1582, que vigeu até 19 l7, quando foi substituído
Stein. Ro111a11 Law i11 European 1/i~to ,y, p. 40). O Digesto já dizia que pelo Codex /uris Canonici de Benedito XV, concebido como um código
a jurisprudência é o conhecimento das coisas humanas e divi nas. Ao moderno que, a final , revisto durante o Segundo Concilio do Vaticano,
longo da história mtcleCLual europeia, de suas unh·ersidadcs, destaca- resultou na promulgação de um novo código, em 1983, que está em
se a L niversidade de Bologna, criada pelos proprios estudantes, que vigor (Peter Stein . p. 64).
contrata\'am os professores para ensinar-lhes. Deviam pertencer os estu- Conta ainda Peter Stein (p. 88) que Henrique Vlll da Inglaterra
dantes ás classes privilegiadas de todas as partes da Europa, e ao lado estabeleceu as cadeiras reais (Regius Chairs) em Ox ford e Cambridge ele
da teologia e da medicina. estudava-se. acima ele LUclo. o direito civil e o direito civil, acoplou o estudo de disciplinas da renascença como grego.
direito canônico ( Peter Stein . p. 53). hebraico e teologia protestante. Ejá que estamos na Inglaterra. ninguém
l la\'ia uma forte inter-relação entre o direito civil da época, conhe- melhor do que Reinhard Zimmennan (Ro ma11 Law, Contcmporary Law,
ci.do como direito ro mano medieval e o direito canônico, e estes dois European Law - The Civilia11 Tradirio11 Today) para corrigir um erro clás-
ramos do direito - o ci\ il medieval e o canônico - passaram a ser conhe- sico relativo ao "isolamemo da commo11 law". Não, diz ele. Assim como o
cidos corno o ius rn1rn11111ie (Van Caencgem, An liisLmical lllr roduction direito continental, larnbém o commo11 law sofreu infl uências do direito
lo Pdvate Law. p. 46). Os canonistas recorriam ao estudo do direito romano, do direito canônico, do direito feudal, da Lex Mercato,ia e das
romano. onde aprendiam a ··gramaticar elo direit o erudito. assimilando teorias do direito natural. Esta colocação é importante para os estudiosos
c;eus métodos, conceitos fundamentais e terminologia juríd ica (Van do direito comparado. disci plina a que se dedicaram alguns autores,
36 RI V/) T4 Df [)/RI /TO CON) l l l U( 1C >N-11 I IN l l R,'\1 \ ( I< ).VAI 201 O Rm / 70
DOUTRINA NACl01'AL 37

especialmente americanos. sem visão his tórica. que distorcem o sentid() rínuidacle cu ltu ra/_ Interessa-lhes o último autor estrangeiro, sua mais
do direilO dos pafses codificados, numa atitu<lc de arrogânc ia intelectual, recente colocação, a sofi s ticada e às vezes pouco inte ligível definição
que nada mais revela do que consideravel ign orâ ncia de um colega da mesma escola. as referé ncias de segunda e às vezes
Par~1 nos capaciu:irmos da inegável inlluência do direito romano e de te rceira mão dos clássicos (com muita economia e muita reserva).
do direi10 civil sobre o direito anglo-am ericano. leia-se \1. H. 1Joeflich. Entre nós. desaparecem os mestres bras ileiros de gerações anterio res, os
Romw, and Civil Lmv w1d tlie clcvclopmcnt of A11Rfo-Anw íccw }111 ispru- grandes doutrinado res de décadas passadas, os clássicos do Iluminis mo,
clc11cc in lh e Ni11eler11t/1 Ce11tury . Este au tor trabalha prin cipalmente com as obras dos legisladores da Pemnsula Ibérica, os mestres ela Escola de
a~ obras de Austin na Inglaterra e de Story nos Cstados L n1<los para direito natural, as luzes d os sábios da ldade ~edia , o direito canônico.
dem onstrar sua teoria ( p. 48). e atravessa uma série d e grande!> mestres o direito rom ano, a junção dos dois formando o ius commw1c daqueles
do direito americano do século XIX que trataram o direito ro ma no com tempos, e voltando mais e ma is. a gló ria ela filosofia grega e o colosso do
a <lig nidade qu e lhe é m erecida. l loeflich conc.:lui seu livro lançand o a direito biblico-mishnaico-ta lmúdico-rabinico que atravessa mais de Lrês
maic; veemente cntica fü) paroq uialismo e à insularidade dos advogados nül~nios. sempre se atualizando. sempre se am pliando. sempre iníluen-
americanos. Alias. ninguém mais ilus tre do que O liver Wendell Holmes. c ia ndo. apesar do s ilêncio em que é envolvido devido a sentimentos
cuja obra classica T/1<' Commcm Law está pontilhada de fontes romanas. menos dignos de clelenninados setores.
o que voltamos a reencontrar na in taessante correspondência entre ele e
Sir rrcderick Pol lock . nos a no<; 1874- 1912, n:velanJo profunda erudição J.J A caridade, a Jilanuopia, a remperança
nas fontes antigas do direito. O gra nde historiador d o direito anglo- Esses são conceitos não muito do agrado dos m odernos juristas. Ao
amcrícano. W W. Hold worlh. igualmente im·oca com muita frequência direiLO cabe solucionar tudo, todas as diferen ças sociais, por isto foram
a fone influência do direito romano no corn 1no11 /m1, criados pactos inte rnacio nais sobre os direito'> civis, sociais e econômicos
O estud o da hi'iló ria do direito e d o dire ito comparado devem ser e uma série de regras em prol <los menos afonunados , cm sede constitu-
prncediJos com di gnidade, reconhecendo o va lor das fomes antigas. dos cio nal, com o se lê nos escri tos sobr e a "dignidade da pessoa humana",
princípios estabelec idos pela religião, das obras de "alor dos estudiosos sobre os direnos human os, os direitos fundame nta is e LUdo mais que
de todos os tem pos, compo ndo um arco-tris histórico e geográfico da o o timismo destes mes tres ilustres, daqui e d'alhures desenharam e
marcha do humano através da his tôria. pintaram nas cores mais vivas e o timis tas.
Csse estudo demonstra que a ideia e a prática da dignidade humana Acontece que n enhum regime estalai consegue resolver todos os
sempre estiveram presentes. acompanhando a vida dos povos d os q uais problemas. Isto nos regimes de países pequenos. de população estática,
herdamos os valores éticos e jurídicos. de honorabilidade política, tradição, correção, trans mitidas de geração
em geração. Sempre haverá u m pobre de espírito, uma alma atormen-
3.2 P<>s-Posi tivismofPôs-.'vf odcn1ism,,
tada, uma figura deprimida que precisara de uma palavra carinhosa, de
Um críti co literário israelefüe, diante do desinteresse votado pela um gesto de compreensão e de aproximação e às vezes de um apoit1
comunidade !iteraria para com determinado autor do passado, escreveu material.
o seguinte: Já nos paises grandes, de população em cons tante crescimem o , de
·· fhe minor role Brcnner plays in the cultu ral life of our gc neraLion política m aldosa, de po líticos canalhas , de ro uba lheira sistematizada, de
is connected to the gen eral phcnomenon of cultural discontinuitv corrupção escandalosa, com o certo pais que todos bem conhecemos, o
charactcristic of post-modnn re;ilit) " (Arik Glasner. Zionism's Ncglected que pode c;alvar - um pouco - é o g rupo daquelas senhoras católicas que
Existcmialist. Revista Azurc, n. 32. p. 149-150). cuida voluntariamente ele um orfanato, evitando que os internos caiam
"!ada mais certo, mais direto, mais cortante. do que caracterizar a nas garras da criminalidade , assegurando-lhes a limentação adequada e
gerai;ão que se ufana ele seu pós-modernismo como praticante da descon- escolaridade razoâveL Estas senho ras conhecem a clignidade humana.
38 RI VIWA OI D/RI/ 1< H O.V\ 1/TL'C/ON-'\I I /,' \' TI RN.·\UO."JJ./ 2010 RI)( l 71J DOUTRINA NACIONAi 39

[la!> \WCm a dignidade humana. Elas engrandecem a dignidade humana. conhecimemo e ntre juris ta!> pátrios e estrangeiros quanto à in[Iuência
1: como elas. centenas c.k grnpos e milhares de ressoas. espalhados por das leis fixadas no Velho Testamento sobre os códigos civis modernos.
nosso pais, que se dedi cam ao bem fazer, a benemerência. a ajudar os sobre o c.Ureito penal e sobre outras arcas cio direito. Começando pelo
solridos e maltratados pela vida, estes nos ensinam que acima de tudo. Velho TestamenLo - o direito vivo mab amigo da História-. que a rigor
de todas as regras da lei, clc todos os princtpios jurídicos. de lúdos os deveria ser bem conhecido pelos cristãos. que jamais o rejeitaram. mas
direito<; fundamentais garanlidos pelo Estado, paira bem ai to e bem forte pelo contrário, sempre reconheceram-no ao lado do Novo Testamento
o '·Amaras teu Semelhante como a ti mesmo". - Velho Testamemo este cuja interpretação, sua crescente hermenêutica
Os Estados Unidos e.' um pais rico, que em tese. poderia atender ás teleológica e os decretos dos sabios das sucessivas gerações formaram
necessidade de toda sua população. No entanto. considerável parte dos direito que se desenvolveu durante cerca de um milênio e meio pela via
problemas sociais é resolvida pela filamropi.a , tão bem praticada pelas da transmissão oral d e geração cm geração, até a consolidação efetuada
f undaçôcs, pelas grand es fortunas e também pelas pessoas e famílias pela Mislrnalr , composta no sectilo 11, e. em seguida pelos comemári.os
de classe média, enfim por todoc; aqueles americanos que se dão coma e debates conlidos na G,icmarah, que somada à Mishnah compõe o
de que existe a lgo alem do "cu ". a lgo tão importante como o "meu··. e Talmud, fechado oficialmente no século VI, seguido de uma ininterrupta
produção de comentários, códi.gos. rcspcmsae rabmica. que compõe o
que ao estender o braço ao necessitado. fazendo-o com respeito po r s ua
mais longo, ininterrupto sistema jurídico da humanidade. A r iqueza
dignidade. por sua humanidade, a vi.da. com Lodo seu labor e todos os
deste manancial s upera tudo que os demais p ovos produziram ao longo
seus .!>ofrimentos. passa a ter um signi.ficado mai s elevado. um sentido
da história em matéria de direito, moral. equidade.
maic; nobre, uma esperança mais confonadora.
Veremos como é errôneo pensar que a l3fblia de Moisés é um livro
Já Aristóteles afi rmava na Ética ele Nicc11J1aco, Livro li, Capítulo 4:
de religião. Não se nega em abso luto o conLeúdo religioso ela obra. nem
'·( ... ) tornamo-nos j ustos pela prática de atos justos. e temperados a iníluência religiosa sobre a parte jurfdica. mas isto era a característica
pela pratica de atos temperados, pois se o homem pratica tão somente de todo o direito antigo e, de certa forma, o fator religioso continua
atos justos e temperados, e le já é justo e temperado, exatamente como tendo iníluência sobre cenos aspectos do direito dos tempos modernos.
ocorre quando atua de acordo com as le is da gramaLica e da música: ele Praticamente desconhecida a riqueza de comeudo jundico desta obra de
já é gramático e músico." aproximadamente 100 sucessivas gerações, que abrange todos os ramos
Ou, como explicado por um sabio judeu: o homem caridoso, forçado do d ireito privado e do direito público.
a exercer as fun ções de carrasco da con e, torna-se cruel . enquanto o Em pane essa ignorância decorre do trabalho da própria Igreja cristã
homem duro e insens,vel que for encarregado de distribuir ajuda às e até do direito canônico que se esforçou em camullar a influência direta
\·iuvas e órfãos. tomar-se-a sensíYel e caridoso. que recebeu das fontes judaicas. Mas nada resiste ao clássico Mosaicamm
Outra passagem de Arisroteles que se relaciona com o tema da et Roma11arw11 Legum Co llat10, obra anônima do século V que apresenta
dignidade encontra-se na Politirn , Liwo VI, Capitulo 2, onde trata dt:1 os paralelos do direito romano com o direito bíblico. e, na medida em
democracia, disserta sobre a vontade da maioria. frisando que ela é que o direito canô nico permaneceu inLimamente ligado e d ependenLe
composta dos pobres, e cuida da liberdade e da igualdade. do direito romano, as influências do direito mosaico sobre o direito da
lgreja cristã são incontestáveis.
4. A VISÃO JUDAt(./\
Curioso como a ignorância extrapola do campo j urídico para a
4. J Dircilo judaico: o inicio de tudo própria hi.stória. a ponto de se ler em respeitado autor brasileiro que o
cristianismo foi a primeira religião cm que se deu a relação direta entre
E crassa a ignorânc ia que JJt! grassa nos meios jundicos univer- o homem e Deus, diversamente do que acontecia até então em que a
sais sobre a contribuiçào do direito judaico pa ra o direito universal. relação era enLre um Deus e um povo. Ora, é sabido que o judatSrno, o
Neste campo surpreende o pouco e às vezes o absolmamcmc nulo cristianismo e o islamismo são as denominadas religiões abrahamicas,
40 Rl VISTA l>I {)/RI/TO ( 0 ,\ ;5 f/7 l'C/ONAI f 1.1\' I LRNA< IONAI 2 01 0 k/)( / ~(1 DOUTRINA '-ACIO'JAL 41

justamente porqui:- descendem e.la íe cio palriarca. o primeiro a reconhecer fundamental no judaís mo, implica necessariamenle na igualdade dos
um só Deus e a com Ele travar vários pactos. Uma leitura s uperíu.:ial da ho mens, <la1 a expressão do rabino Akiva - a maior figura talmúdica
Biblia. da 13íblia dos judeus e dos cristãos e respcnada pelos muçulmanos. de todas as gerações - que o assassinato de um ser humano representa
re\'ela •~to nos primeiros capttulos. a diminuição <la imagem de Deus ( Haim C.ohn, Human Rtghts, Jewish
A importância do <lireito judaico para o prescmc estudo e justa- Law. 150).
mc-mc po rque é nele que se inicia a grande viage m <la clignidaJe elo ser O pensamemo judaico valoriza a viJa de toda pessoa, sendo cada
humano. como iremos descrever. se r humano considerado único e insubstituível; por isto, diziam os
Aliás. não se trata tão somente do direito judaico per ~e. mas de todo talmudistas, que quem mata uma pessoa t como se tivesse causado a
um sLcma ciYilizatório iniciado no Gênesis com a criação do homem.
s1 destruição do mundo. Assim como as pessoas têm fisionomias diferentes,
também têm pcnsamemos diversos. Eslc um axioma talmudico, írisan<lo
A 131blia conta que ú hnmem foi criado à imagem de Deus. Este
a originalidade, a indivicl ualidadc de cada pessoa, a concepção de que o
o ponto de panida. A nobreza e a dignidade foram ins tiladas no livmo
mundo íoi criado por causa de cada ser humano, individualmeme. o que
sapirn~ origi nal ao ser equiparado à Divinclade. Soma-se a isw a colo-
exige que cada um reconheça o mesmo direito no outro. e a consequente
cação talmudica de que o barro com o qual o primeiro homem foi criado.
igualdade do valo r de todos os seres humanos.
fora colhido em todos ns cantos da terra. para simbolizar a igualdade
dos seres humanos, ideia que aparece com todas as cores no último dos Ouçamos uma lição sobre dignidade humana ligada a um sistema
profetas do Velho lcstamcnto (Malaquias, 2: 10): constilucional. 1:: a palavra do professor de hlosofia, Sir Jonathan Sackc;.
"Porventura não é um mesmo o pai de todos nós? Acaso não foi um rabino chefe da Grã-Bretanha e da Comunidade Britânica:
mesmo Deus o que nos criou? Porque razão logo despreza cada um de "t;m principio democrático básico é posto em prática: a ideia ele
nús o Sl'u irmão, violando o pacto ele nossos pais?'" que uma lei não pode ser ratifi cada sem a concordância ele todos aq ueles
Está aí a ideia <la lratemidadc. que são afetados por ela. Este fato cm si foi uma revoluçào no conceito
da dignidade humana.
A ideia do barro colhido ele todos os can tos da terra é lembrada
em uma resenha bibliográfica de autoria do Prof. Louis René 13cres, da A ideia de um pacto moral e legal entre deuses e ho mens Leria soado
Purduc Univcrsiry ao livro Towanl ajust World Ordcr. editado por Richard absurda. No entanto, íoi exatamente isLO que Deus propôs no Sinai e
Falk, Samuel S. Kim e Saul 1-1. Mendlovitz. Assim escreve no Amcrican sua proposta trazia extensas implicações. Significara que o direito era
Jounra( of Tnlernatimwl Law, 1983 , p. 248: soberano sobre o poder e que não há governo legítimo sem o aval dos
governados - mesmo quando o governante é o próprio Deus. t-:aq uelc
"The Talmud tells us: 'The dust frorn which thc first man was made
momento. muito mais do que a democracia de Atenas, configurou-se o
was gathered in all the eorncrs of the world'. Accepling this cosmo-
fundamento da tradição política ocidental com sua ênfase sobre governos
poli tan fiel d oí consciousness, ·Toward a J ust World Order' encourages a
limitados pelos direiLOs dos indivíduos: poder algum, nem mesmo o
common concem íor the dignity ofhumankincl anel the true communion
oí planetary citizcns (. .. )''. poder ilimitado de Deus, é absoluto. Acima de reis, imperadores e gover-
nantes democraticamente eleitos, está a autoridade suprema da lei moral.
Thomas Painc cm seus Righ1s oj ,\ifan. de 1791 . refere-se ao Gênesis É a primeira e eterna defesa da liberdade. não apenas contra a tirania dos
(] :26-27) que narra a criação do homem por Deus a Sua imagem e diz tiranos, mas também contra o que Alex de Tocqueville e John Swan Mill
que "se isto não tiver auto ridade divina tem pelo menos autoridade chamam de 'a tirania da maioria··· (Uma letra da wra. p. 14-+).
histó rica e mosLra que a igualdade do homem, longe de ser uma doutrina
moderna, é a mais velha ideia registrada" (Haim Cohn , Human Rights. Voltando 400 anos. trago outra lição sobre dignidade humana,
Jewish Law. p. 149) . ao que Haim Cohn, membro <la Cone Suprema baseada na tolerância religiosa.
israelense. seu \ice-presidente e eminente autor sobre direito judaico, Uma das mais cativantes figuras da intelectualidade judaica da Idade
acrescenta que, sendo a crença na criação do homem a imagem de Deus. Média íoi Judah Loew ben Bezalel, conhecido como o :vlaharal de Praga,
42 R{ VISTA or DIR/111) ( 0 1\/.\ 1/{U( /()N A/ I /,",' ] / RN \( IO NA/ 21Jl ( I 1</)( 1 70 DüL TRl/'.A NACIO/'.AL 43

o nde desempenhou o cargo de rab1110 c hcre da coletividad e judaica, seu es trangeiros que viviam na Comunidade d e Israel n ão eram obrigados a
túmulo naquela capital loi transrnrmado em local de peregrinação para observar a lei mosaica Uo hn Locke, Lctte, Conccniing Tolcration).
judeus e cristãos. [m uma de suas obras. assim cscreYcu:
4.2 T, atamento dos rscrnvos
·' Mesmo que s uas palavras !:.cjarn di rigida'> conua a fé e a rcli-
gii\o, não diga à pessoa que não fale, e não tolha ~uas pa lavras, pois se Como wdos os povos da Antiguidade, os judeus também prati-
assi m fi zeres, não have rá esclarecimento em assumos religiosos. Muito caram a escravatura, que está previs ta no Velho Testamento. cercada de
pelo contrario . deve-se dize r üs pessoas para expressar o q ue quer que garantias a favor do escravo.
desejem, para que nunca possam dizer q ue diriam mais se lhes ti vesse A cügnidade humana se manifesta no tratamento que o juda1smo
sido dada a oportuni dade (. .. ) Assim. minha opi111ão diverge da opinião d ispensava aos escravos. Nenhuma distinção poderia exis tir entre o
ele outrns que pensam que quando se proíbe falar rn mra a relig ião, esta tratamento dis pensado ao escravo e ao operário co ntratad o (Lev1tico,
se fortalece, mas não e assim . A eliminação das opiniões daqueles que se 25:39-40); o patrão não podia tratar o escravo "com rigor" (Le\.1tico,
opúem a relig ião mina-a e enfraqu ece-a." 25:43, 46, 53) . nem maltrata-lo ou oprimi-lo. lmplicitamentc está colo-
Uma lição de túlerância religiosa, de respeito pela dignidade cado q ue o escravo maltratado f-ica legit imamen te autorizado a fugir,
alheia. pois onde se refugiasse. deverá ser bem aco lhido, vedado devolvê-lo a
seu pa trão (De utero nô mio. 23: 16).
Lodos lh tempo'-, dcs<lc o<; prim,'lrdio-, cio jucla,smu, nenhuma
I::111
iniciativa foi jamais 1omada para invadir a privacidade da pe!>SOa quanto O mais importame aspecto da escravidão praticada na Judeia era
o tratamento que o Talmud determinava se dispensasse aos escravos:
ao que pensa e quanto a seu tompnn amcm o cm s ua vida privada.
deveria comer o mesmo pão e beber o mesmo vinho que seu patrão
[sse respeito pela dignidade humana. manifestada na tolerância e dormir em cam a com o seu patrão (Talmud babilônico, Tratad o de
re ligiosa atinge nu judaismo a seu cl1111ax na s ua relação com as m uras Kidushin !casamentos] 20 a 22a) .
duas re ligiões monoteístas, em ali tude filosófico-teológica totalmente
E quanto ao descanso sabático, o Velho Testam ento enfatiza que o
diversa daquela q ue impera n as mesmas. Enquamo cada uma destas
mesmo abrange não somente a familia do judeu, mas seus escravos e as
duas se considera como a ,·erdadcira. e a través da história envidaram
familias destes: todos devem descansar no shabbat (Êxodo, 20:10. 23:12
toda sorte ele esforços para con \'cner os fiéis das o utras, o judaísmo e Deuteronômio, 5: L4 e 16: l J ).
reconhece a validade elo cristian ismo e do islnm1sm o. De aco rd o com
Os judeus deixaram de praticar a escravidão no século I da era atual
o pensamento judaico, todo ser human o que respeita as chamadas Sete
(Talmud Babilônico, Tratado Kidushin. 69a).
Leis de :"loé é incluldo entre os assim denominados "j ustos das nações
do mundo·· e merecedor ela recom pensa no outro mundo, mesmo que se 4.3 Tratamento dos estrangeiros
ma ntenha fora cio juda1smo (os assim chamados Sete Mandamemos dos
Filhos de l\oé são os seguintes: ( 1) Não adorar fdolos: (2) Não matar; (3) Os dispositivos bíblicos recom endando o tra tamen to a ser dispen-
Não cometer adultéri o ou incesto: (-+) Não blasfemar; (5) l'.ão roubar; sado aos estrangeiros estão à gra nde distância da intolerância que carac-
(6) Estabelecer con es de justiça: (7) Não comer órgão retirado de animal terizava os clemai!> povo:, ela Antiguidade. Temos assim:
vivo. Temos a1 o respeito pelo Divino, respeito pelos d ireitos humanos "O sétimo dia, porém, é o dia do descanso, consagrado ao Senhor
- vida. propriedade, família e justiça <' o respei to aos animais vivos). teu Deus. l\ão farás nesse dia ob ra alguma, ne m 1u, nem teu filh o, nem
Portanto. a afirmação dr Jnh n I oc.: kc ele que "LOda igreja se considera tua filha, nem o teu escravo, nem a tua escrava, nem a Lua besta. nem o
ortodoxa. enquanto para os ou tros ela está errada ou é herética" não se peregrino que vive das tuas portas para demro" (Êxodo, 20: 10 ) .
aplica à religião judaica que nunca considerou herética as outras religiões '·Não entristecerás. nem a fl igirás o estrangeiro, porque também vós
monotc1stas. \la verdade. o proprio Lockc assina la logo adiante que os fostes estrangeiros na terra do Egito'· (Êxodo, 22:20) .
44 RI VI.STA OI IJIR/ //0 CO,\<;TffUCJO,'vAI E IN 11 R.VA< IONI\/ 2010 RD< 1 70 DOUTRINA NACIONAL 45

"Não molestaras o peregrino: porque vós sabeis que coisa é ser No plano do direito civi l. a situação dos estrangeiros evoluiu posil i-
prrcgrino; pois lambem vós o fos tes na terra do Egilo' (Êxodo, 23:9). vamente, na medida cm que cenas discriminações foram sendo abolidas.
"\Jão recolheras tambem na tua vinha os Glthos, que íic:aram na Narra u Talmud .que dois romanos vieram investigar o direito judaico,
vindima. nem o-; hngns que ca1rnm; mas deixa-los-t\s aos pohres e aos sendo recebidos pelo rabino Gamliel , sob cuja orientação estudaram
peregrinos" (Lev1uco. l 9: 1O). a Lei Escrita e a Lei Oral. Concluído o curso e ao se despedirem do
mestre, disseram: "Estudamos detidamente suas leis. elas nos pareceram
··se algum prosélito habitar na Yossa terra, não lhe fa çais vi1upério.
boas e verdadeiras - com exceção da regra que objetos perdidos por um
O estrangeiro que se torna pro-,clito deve ser exatamcme como aqueles
não judeu, não precisam ser devolvidos, ou (segundo outra versão), a
que é natural cmrc \ Océs. Vocês o amarão como a vós mesmos. Porque
também \'ÓS foste:-. estrangeiros no Egito·· (Lev1tico, 19:33-34 ). regra de que um judeu não é responsável pelos prejuízos causados por
seu animal ao animal do não judeu··. Prossegue o Talmud que o Rabino
·'Quando vós. porém. segardes a seara do vosso campo não lhe corta-
Gamliel imediatamente revogou estas regras, a fim ele evitar a profanação
reis as canas reme do chão. nem enfeixareis as espigas que ficam; mas
da lei divina (Talmucl babilônico, tratado Bava Kama 38a e Talmucljeru-
c.lcixa-las-cis para os pobres. e para os forasteiros" (Levnico. 23:22).
salemita , tratado Bava Kama, 4:3).
"Será urna mesma lei e uma mesma ordenação, tanto para vós como
para os que são estrangeiros no vosso país'' ('\Jumcros, 15: 15). 4.4 Direito do llubalhador
. ''[ lhes mande'. , dizendo: Ouvi-lls e .1ulgai o que ío r justo: ou ele seja
Grande a preocupação da lei bíblica para com os direitos do traba-
etdadão ou estrangeiro. l\enhuma distinção haverá ele pessoas, do mesmo
lhador, que se materializam em inúmeras regras. como:
modo ouvireis o pequcnL> que o grande, nem tereis acepção de pessoa
alguma. porque este é o juízo de Deus" (Deuteronômio, l : L6-l 7). - o direito do empregado de deixar o emprego a qualquer momento.
seja qual for a natureza do trabalho ou o tempo ele duraçao elo emprego.
"[ assim vós amais os peregrinos, porque tambem vós fostes esLran-
geiros na terra do [giro·· (Deuteronômio, 10: 19). desde que não esteja devendo trabalho em contrapartida a salário pago
antecipadamente;
~l\ão perverterás a Justiça na causa do estrangeiro , nem do úrfão:
-a remuneração deve ser paga de acordo com o costume elo mercado
nem tiraras por penhor o vestido da viuva" (Deuteronômio, 2-+: 17).
ou conforme acordo especifico entre empregador e empregado;
''Ma ldito o que perverte a JU!>tiça do estrangeiro, do órfão e ela
- a remuneração deve ser paga em espécie e não i11 ncrtu1a ;
viuva: e todo o povo responderá: Amen" (Deuteronômio, 27: 19).
>los Profetas encontramos estas ideias repetidas em inumeras - a remuneração não pode ser adiada sequer por um dia (Levítico,
passagens Oeremias, 7:6. 22:3; Ezequiel 47:22-23: Zacarias. 7: LO). 19:13 e Deuteronômio, 24: 1.4-15): a disposição do segundo verso refe-
rido é a seguinte:
Ao inaugurar o Templo de Jerusalém, o Rei Salomão discursa e
entre outras colocações. proclama o seguinte: ">lão negarás paga a teu irmão indigente e pobre, ou ao peregrino.
que mora contigo na terra, e está de tuas ponas a dentro: mas pagar-lhe-
"Também quando algum estrangeiro. que não é do teu povo de
ás no mesmo dia o preço do seu uabalho ames do sol posto, porque é
Israel, ,·ier ele algum país remoto por causa do teu nome (porque ouvirá
pobre e disso sustenta a sua vida: não suceda que ele clame contra ti ao
a grandeza do teu nome e a força de tua mão e o poder do 1eu braço
Senhor, e isto te impute a pecado."
dilatado por toda a pane) quando vier por isso fazer oração neste lugar,
tu o ouvirás elo céu. do nrmamen10 da tua morada e farás tudo O que 0 - nas divergências sobre se houve contratação ou não, ou se já
estrangeiro te pedir: para que todos os povos da terra aprendam a temer houve pagamento ou não, o trabalhador tem direito de receber mediante
o teu nome. como faz o teu porn de lsrael e para que experimentem _juramento. pois que o empregado só tem esta preocupação na cabeça
que o teu nome foi invocado sobre esta casa que eu edifiq uei " (Reis J, e lembra melhor do que o empregador, que tem outras preocupações
8:4l -43). (Talrnud babilônico, tratado Shavuot, 45a-b).
+6 Rl-\/1.ffA f)f 011mro CONST/1 UC/UtvA/ [ //\!TI RNACIONA/ 201O - R0(/7() DOUTR INA f\.ACIOf\.AL 47

- os em pregados lêm direi lo de se associar para a prow.;ão c.lc 5eus 4.6 A visão cristci do din:itojudaico
interesses (llaim Cohn. op. cit., p. 10 1).
- Banolus de Saxoferato: o grande mestre de Perngia, que viveu
- os empregados lêm direilo a férias anuais, de in1crrompcr a e brilhou no século XlV, considerava a Bíblia com o de transcendental
jornada <lc Lrabnlho para alimemação e orações e ao descanso sabático. imponãncia tanto para a religiao com o para a lei, invocando frequen-
Este é um panorama abreviado da dignidade humana e dos direitos tem ente passagens do Pentateuco para ilustrar e comparar (vide A. T.
humanos nas milenares fontes judaicas. Sheed y, Bartolus 011 Soci al Condilions in lh e Fourtecnth Centu ry apud Boaz
Em suma, :,1 filosoíia. a his tó ria, a religião, e principa lmente a reli- Cohen,Jewislt and Roman Law, p. xxii).
gião judaica demonstram à saciedade que o homem vive com a ideia e - Grolius: De júri Bel lí ac Pacis (século XV LI I )-Ao tratar da distinção
com a p rática e.lo respeito à dignidade do seu semelhante há milênitis e emre o lad rão noturno e o ladrão diurno , invoca a passagem bíblica que
que nada de novo, abso lutame nte nada, foi inovado no século XX. versa este 1ema - fome do direito a aulOdefesa - reproduzindo a palavra
bíblica n o seu o riginal - bamachtercl em carácteres hebraicos - e que
-+ .5 /-1011rn teu paí e I uc1 mãe significa invasão d omiciliar subterrãnea. comparando a regra bíblica
com a norma inserida sobre a mesma matéria na Lei das XII Tábuas (vide
René Cassin c.lissc que t uclo começa com o Decálogo - ele é o ponto
edicão espanho la de Jaime Tonuhiano Ripoli, vol. 1, p. 273).
de panida e o Preâmbu lo da Cana das Nações Unidas "nosso temporário
- John Selden: cristão, grande jurista inglês do século XVI , era um
ponto de chegada" ( Rene Cassin, From ific Comma ndments to thc Ríglits
eminente estudioso do direito judaico, tendo publicado vários li vros
<f Man , Jubilee, vol. Cohn 197 1. p. 22). Em provocante c uno traba lho,
sobre os mais diversos tem as como:
baseado no Pentateuco. Alan \,Vatson mostra a influência do 5. 0 Mancla-
me nlO - Ho nra teu Pai e tua Mãe - sobre o moderno direito ho landês • De Sucessionibus in B011a De.functorwn - sobre a lei judaica de
(Alan WalSon, From Legal Transplams Lo Legal Fonnants. Thr Americcm heran ça;
Jounrnl of Co111paraiivc Law, l 995, p . 469 e ss.) e invoca Hugo G rolius • De Jure Natu.rali et Ge11tiu111 Ju.xta Desciplinam Ebraeorum - em
que declarou que os filhos lil1eraclos do poder paterno ''continuam a que disserta comparat ivamente sobre o direito judaico e os direitos cios
de\'er obediência e reverência a seus pais. como determinado pela lei da gregos e d os romanos;
natureza e pela lei de Deus" (Gro tius, fnl ciding tot de Hallandsche Recl1ls- • De jure Nawrali et Gent!um - outra obra comparativa;
geleertlieycl, J .6.4). • De Anno Civili - uma obra sobre o calendário judaico;
!\ão há dúvida que se distingue o homo sapie11s elo reino an imal pela • Uxor Ebraica seu De Nupliis cl Dívorliis Vcierum Ebraeorum -sobre
relação entre as gerações, q ue permanece viva duran1e toda a existência o direito judaico em maléria de casam ento, C:Üvórcio e o status da mulher
individual e que deslaca. acima de ludo. o respeito pelos genitores, algo casada:
que Adão e Eva não experimentaram e que seu filho Cain desrespeitou • De Synhdriis Vewwn Ebraeorum - em que versa diferentes
da forma mais trágica. Da!, segundo Calum Carmichael (Th c Origíns of assuntos da lei e ela filosofia juda ica, além do tema do titulo, o Sinédrio,
13iblical Law: The Deca logue crnd 1/ie /Jool? o.f the CovenanL apud Watson, corte suprema da Judeia, no qual trata do sistema judicial insLitu (do pelo
p. 4 70). a inspiração bíblica de inserir o 5.0 mandamento n o Decálogo, Talmud.
peça que entrelaça história, religião. m oral e direi to.
Selden tem uma passagem muito importante, reveladora de sua
!\ada mais condizendo à dignidade h umana do que o respeito honestidade intelectual quando se refere aos escritorec; católicos e
devido pelos filhos aos pais, a mais autênlica manifestação de gratidão, protestan1es que ignoram a tradição judaica ao explicar o Pemateuco.
de reconhccimenlú. sentimentos e aliludes derivad os daquela condição Ele compara isto à tentativa de interpretar o direi10 romano independen-
de dignidade. tememe dos juristas clássicos Ulpinian o, Papiniano e os ouLros Uohn
48 Rf \!/.\ TA /JI /l/R/11 O C< Ji\: , li/ ( '</(),"v't\/ I ltv TI RNAC /()l',A/ 2011) R/)C 1 70 DOUTRINA NACIONAL 49

~cldcn anel Jewish Law. em /11cla1rn1, Law anel rtliils. de lsa ac Herzog. p. para o impulso que levou ao mundo moderno. Se tivéssemos olhos para
67-79). ver os elementos sutis do pensamento que constituem a substância de
- Mo ntesquieu: O csptrito dtb leis, Livm XX\' Caplltdo 3· nossos costumes atuais, Lanto no campo da vida privada, com o da ação
do Estado, descobrina mos facilmente q uam o devemos ao judeu além da
· As kis de M u 1ses e ram sabias. O ho me m q ue matasse invo lunta-
religião.''
1ia mente um o utro ho mem era moccntt . mas d everia ser levado parn
longe dos olhos d os parcmcs do morto . Para Lanto. Moisés estabe leceu - F. A. Mann: em seu clássico Thr Legal Aspect~ of Moncy, alude
um asilo para estas pessoas inrelizcs (. .. ) ~e as pessoas que tivessem a d iversas obras de direilo juda ico da ldade Média em que o tema da
come tido homic1dio c ulposo fosst m ba nidas e.lo país. como era costume mudan ça da moeda corrente e da d esvalo rização da moeda são tratados
emre os gregos, os judeus temiam que eles acabassem ado rando outros (p. 72, rn. 1, 2. ed ., 1953). Efetivame nte, desde os tempos talmúdicos
dcu<;cs, da í o estabelecimento de cidades de rdúgio. o nde os assassinos o direito judaico se ocupo u das consequências jurídicas decorrentes
pod e riam Ílcar até a mo rt e cfo ~umo '=iaccrdotc." das alterações do valor d as moedas. A matéria está codificada no Shul-
- J . J. Ro usseau: O rn111rnl1l S()cia/. Li vro li , Capítu lo 7: c han Aruch . Choshen Mishpat, do século XVI, no Cap itulo 74, Seção
'·A lei judaica que continua subsistindo, a lei <lo íilho de Ismael que 7; seguiram-se. como acontece em tod os os temas, inúmeras respostas
por dez séculos vigcu em mernd e <lo mundo, ainda procla mam os grand e::, rabínicas sobre consultas apresentadas. que atravessam os séculos de lá
ho mens que estabeleceram-nas; e enqua n to o orgulho da filosofia ou a para cá. O Shuk han Aruch é a principal codificação do direito j udaico
cegueira facciosa (the bli11d spirit <>J Jacticm ) vee m nelas não mais do que d epois do Código <le \.1aimonides, só que, enquanto este se ocupou de
imposLU ra. o ve rdadeiro teorico po htico admira nas instituições que eles todos os temas versados no Talmud, indusive de leis que só se aplicam
cria ram, o grande e poderoso gê nio q ue preside sobre as coisas rcitas na Terra Santa e outras, ainda mais especificas que só se aplicam no
para perdurar.'· Templo de Jerusalém , o Shulchan Aruch , de a utoria do rabino J oseph
- Henry James Sumner Mainc: Ancient Lmv, p. 74: Caro. concentrou-se nas leis que têm a plicação em toda pane, em todos
"Demre os registros antigos havia um que valia a p ena estudar os tempos.
- a historia antiga dos Judeus. Mas o rec urso a isto foi impedido pelos - Oliver Wendell Holmes e Pomes de Miranda: no campo da
preconceitos da época. Uma das poucas características que a Escola de responsabilidade civil o grande jurista e juiz american o e o eminente
Rousseau tinha cm comum com a Escola de Voltaire era um absoluto jurista brasileiro invocam as regras bíblicas consignadas no Êxodo, Capi-
desdém por todas as antig uidades religiosas; e acima ele ludo, daquelas tulo XXI , sobre a resp on sabilidade do proprietário do animal que fere
da raça hebreia. É bem sabido que constituía ponto de honra entre os uma pessoa na via pública (Ho lmes em The Commo11 Law, l.ª lição sob o
pensadores daquela época. e ntender não som ente que as instituições título '·Early Forms o f Liability.. , p. 7 da edição de 1881 , reproduzida em
atribufdas a Moisés não h aviam sido diviname nte inspiradas. (. .. ) mas 1909 e em 1923. e Pontes d e Mira nda, Tratado de di rr?ilo ptivado, vol. 53,
que elas e tod o o Penta teuco não passa\·am de uma falsificação gra tuita, p. 305, e mesmo volume, p. 7 e 9).
efetuada após a volta do cativeiro (. .. ) Os fi lósofos da Fran ça. na sua
- Otto de Souza Lima: em Negócio Fiduciário. 1962, refere-se (p.
ânsia de escapar do que consideravam a s uperstição dos sacerdotes, se
18-23) ao Collatio Mosaicarum et Romanarum , como "um repertório
entregaram à sup erstição cios ad vogados."
comparativo do direito mosaico e roman o , composto nos fins do século
- Wood row Wilson: Sta1c, Seção 220: IV ou começos do v··.
"Seria um erro a tribuir as concepções j uríd icas romanas a unica - Jorge Medeiros da Silva: em trabalho intitulado "O direito penal
influê ncia sobre o dcsem ·olvi menw da lei e das ins tituições durante a
dos h ebreus", publicado na rcvb1a Justi1ia, n. l07, p. 26. assim escreve.
Idade Média. Os teutões foram inílucnciados não por Rom a, mas pelo
cristianismo e através da Igreja . ingressou na Euro pa o pensam ento "~ossos estudiosos descuraram em demasia o direito hebreu,
judaico. As leis de Moisés. ass im como a le i de Roma, contribuíram encharcados que esta mos de roma nism os. Não podemos nos esquecer de
50 /~{VISTA VI 0/Rf lf() (Ol'ó TI/ UUONAl 1 /,'\J li RNACl()NAI 201O R/Jl/ 70 DOUTRINA NACIONAL 51

que a legislarão hebraica. além de avan,ac.la para sua época, reperculiu O auLor aponta (p. 11 7) que os impe<limentos matrimoniais canô-
<le forma intensa sobre o mundo ocidental , através do Cris tianismo." nicos decorrem das prescrições .i uclaicas. Não seria difícil demonstrar
- Eben Vianna C hamo un : em Instituições do direito romcmo, 4. ed., como vários e.los impedimentos <lirimentes ao casamento, estabelecidos
p 16, assim escreve: no Código Civil brasileiro, decorrem d iretamente cios mandamentos
bíblicos.
"(. .. ) o direito desta fase (pós-clássico dos séculos V e VI) deixa-se
influenciar bastante pelos direitos orientais, sobretudo grego, egípcio e
4.8 Danos morais
judaico. os quais lhe prestam. é bem verdade. excelente co ntribuição" .
- Vicente Ráo: na o bra clássica d o mestre paulis ta, um capítulo Os pós-modernos entendem qu e a dignidade humana, como nova
sobre o ''Direito Israelita··. em que versa a Bíblia . a le i oral. a 1\!lis/111ah . figura do direito pós-positivis ta, e os direitos humanos, como conce-
a G11emarah e o consequente Talmud , alude ao Talmud ·'jerusamelita" e bidos pelas modernas constituições que se infiltraram no pobre direi to
ao posterior Talmud babiló nico. prossegue dissertando sobre os grandes civil que não teria como gerir a sociedade de per se, levaram a grand e
comentaristas tahnúclicm,. os eminentes juristas que consolidaram e conquista da aplicação de indenizações por danos morais de diversas
codificaram o resultado dos deba tes da Escola Oral e dos talmudim e categorias.
enfatiza a continuidade qu e se processou atraves dos séculos qu e se Parece-me interessante informar que há 1810 anos atrás a Mishnah,
seguiram. De se u cuidadoso relato: no tratado Nezilún ( Danos e prejuízos), no vol. l (Bava Kama). 83b,
"E. note-se, esse labor legislativo processou-se sem solução de interpretando um conjunto de versículos do Êxodo assim consolidou:
continuidade apesar da dispersão dos judeus por toda a superfície cio ·'A pessoa que fere seu semelhante. fi ca obrigada a indenizar-lhe de
planeta, apesar de não lerem eles unidade nacio nal , um centro 1erritorial cinco maneiras:
o u um corpo legislativo pró prio'' (O direito e a vida dos direitos, p. 186- Pelo prejuízo causado ( inca pacitação permanente) ;
189).
Pela dor infligida:
No final uma nota de agradecimenlO do professor a seu antigo
Pelas despesas para a rec uperação (gasLOs médicos);
aluno da USP Dr. Adolfo Taubin, "hoje brilhante advogado e estudioso
elas ciências jurídicas" pela elaboração elas "no tas acima"'. Pelo período de inatividade causado pelo ferimento;
Pela vergonha soírida."
4. 7 Um auwr de direito canônico com visclo la,ga Quatro longas páginas duplas de Guemarah explicam esta Mislrnah
- Jean Gauclemet: Les Sources du Droit de tÉg/ise e11 Occide11t, p. (a duração para compreender e assimilar uma página do Talmud equivale
15-16: "A ' lei nova' não abrogou inteiramente a 'lei antiga'. O velho a muitas e muitas horas de estudo conduzidas com inusiLacla concen-
Testamento também é, em pane, fome d o direito canônico". E adiame tração) . E como ocorre com toda a literatura talmúdica, estas quatro
explica que quando os textos can ô nicos se refer em a Le.x, podem estar páginas vêm acompanhadas de dezenas e dezenas de com entaristas, de
aludindo à lei em geral. como à lei mosaica. enquanto que a lei nova é diversas gerações, em que se discute o semido exato das posições colo-
referida como /ex fidci o u /ex Christi. cadas.
No clássico Clnstirutions de l'A111iq11ilé, do mesmo autor, há várias Cerca de mil anos mais tarde, o grande filósofo , médico e codifi-
passagens interessantes e bem informadas sobre o direito hebraico e cador do direito judaico, Moisés ben Maimon, conhecido em hebraico
sua iniluencia sobre o direito ocidental. Assim, à p. l l trata do regime como o Rambam, e nas línguas ocidentais como Maimõnides, em seu
das prnvas e d epois de lislar alguns aspectos processuais. cone! ui que a código da lei judaica (que 1amhém podf' <sf'r ronsidPrado como uma
legis lação hebraica sobre esta maté ria. às vezes m ais detalhada do que a consolidação que se transformou em codificação) dedicou dois longos
romana, inspirou o direito canôn ico medieval c por meio deste alcançou capítulos da parte que denominou "Leis do Agressor e do Prejudicador"
as jurisdições seculares d o Ocidente. em que detalha LOdos os aspectos relativos às indenizações, explicando
52 RF \ lffA OI VIR! li () CC Jf\içTITU(/0.t-..'A/ f IN HkNA( IONAL 2010 RIX 17(1 DOUTRI '11\ NACIONt\l 53

como nem sempre ha\'cra motivo para a!:. cinco condenações, eis que O importame agora t deixar bem claro que os nazisLas jamais Leriam
Ludo depende das circunstâncias e das consequências da agressão. conseguido praticar o genocídio, ou os genoc1dios. sem a colaboração
Quanto à vergonha soírida (be lcidigimg para O!:. que apreciam a a ti va e passiva da maioria dos povos da terra.
língua de Kanl e Hrgcl ) :i ciricntação talmuclica é de que tudo cJependc No início, Hitler pretendia que os judeus fossem embora da
de qurm envergonhou e quem foi envergonhado, ou seja, há que ava liar Alemanha. Dizia-o claramenLe. Duas razões levara m a maioria a fi car:
a rclat ividade, pois a \'ergonha sofrida por uma pessoa modesta n ão Lerá a (a) as vitimas não acreditavam que algo de Lerrfvel lhes fosse ocorrer:
mesma gravidade do qur a de um e mine nte mcsLre. E a ve rgonha provo- (b) aqueles que cmenderam o perigo e quiseram emigrar, não tiveram
cada por um moleque de rua não se equipara â de uma pessoa distinta e para onde ir.
bem ed ucada que perde o controle e envergonha seu semelhante.
Não é esta a oport1111idade para uma mais ampla expla nação de 5. 1 A Confer~ncia de Evian
um tema talmúdico, mas que fiquem ass~gurac.los Lodos aqueles que No dia 06.07. L938 foi aberta uma coníerência inLe rnacional em
enaltecem a suposta iníluência benéfica e enriqueced ora da Consti- Evian, uma cidade de veraneio francesa às margens d o Lago de Genebra,
tuição sobre o sisLema iunclico páLrio, que na verdade não há nada de com a finalidade de discutir a recepção de refugiados. A iniciativa partiu
nnvo sob o céu. que os homens desde os primordios, com bom senso, do Presidem e Rooseveh , que esperava desviar a pretendida fuga dos
com inteligência. esqucmaLizaram soluções para praticamente todos os j udeus para outros paiscs e convidou 20 paises la Lino-americanos, Ingla-
eventos que ocorrem na vi<la da sociedade. que cslas soluções sofrem terra. França. Itália, Ilélgica , Sufça, Suecia, !\ova Zelândia, Africa do Sul,
altcraçôc:s com o corre r do tempo (law 11rn:,l /)e :,ta/Jle, cmd yet it cw111c1l Noruega, l lolanda, Dinamarca, Canadá e Austrália (A rthur Morse, While
sta11d sti/1 , Benjamin NaLhan Car<lozo cm Growtlt (~ tlie Law). mas basica, Six Million Dice/, p . 166). A Conferência deliberou criar uma agên cia
íundamentalmeme, exis te uma linha mestra que segu e no tempo e no
intergovernamental para examinar o que pod eria ser feiLo. Mas à medida
espaço, e predsamo~ ~alr cm busca das origens, dos amcccdenLes, das
que crescia o número de judeus alemães, ausLríacos e de pa1ses vizinhos
ide ias dos antigos. que íoram sendo aprimoradas. adaptadas às novas
desejando enconLrar um país d e refúgio, as restrições 1migraLórias se
realidades da vida, mas sempre em sintonia com a conce pção de que a
agravavam . A Grã-Bretanha, a Austrália, os países laLino-americanos,
lei serve a justiça e que a justiça se baseia na moral, e que a moral exige
enfim , LOdos ado Laram politica imigratória restritiva. Os Estados Unidos
o reconhecimento e o respeito pelos d ireitos dos outros e que tudo é
esLabeleceram que só permiliriam a entrada de refugiados alemães e
envol vido pelo s ublime sentimemo do amor ao se melhante.
austriacos de acordo com as cotas ofi ciais já exisLentes em sua legislação
Os filósofos, os juris tas, os canonisLas, os historiadores e att os pós- desde 1924 - 27.370 refugiados anuais. Holanda e Dinamarca foram
modcrnis tas, que ignoram o direito judaico cm suas obras. têm onde os únicos países que demonstraram alguma boa voma<le para receber
pc~quisar para aprender, e certamente desejam aprender. refugiados judeus. A Holanda já havia recebido um número razoável nos
anos ameriores e a Dinamarca sofria de superpovoamento.
5. A o, CLI\RAÇÃO U'-liV[R<;,\[ l)O', D IRLITOS DO H OM[M
Hitler em endcu a mensagem e passou a tratar os judeus com
A motivação para elaborar este documento teria sido. segundo a requintes ele crueldade (Martin Gilben, The H olocau st, p. 64-65). A
absol uLa maioria dos autores que traLa do Lema, as aLrocidades com elidas Grã-Bretanha, polência mandatária dos LerriLó rios que eram denomi-
pelos nazis tas durante a Segunda Guerra \1undial; numero consideravel nados Pales tina. que abrangiam a atual Jordânia, a atual Cisjordânia e
faz questão de frisar o assassinato frio. planejado e executado indusLrial- o atual EsLa<lo de Israel, para onde poderiam ter escapado cemenas de
mcn1 e. d e c;eic; milhões d e judeus. Houve. efetivame nte, muitas e grandes milhares de judeus alemães e do resto da Europa. fechou as portas da
diferenças enLre o que acom eccu aos judeus e o que su cedeu aos outros terra que ela mesmo prometera transformar cm Lar Nacional Judaico ,
grupos humanos sacrificados pela monsLruosiclade nazisLa. mas csLa não na Declaração Balfour de 1917, não pcrmiLindo a enLr.ada de mais do
é a oportunidade adequada p:tra este exame. que um punhado de judeus, enquant o abria as comportas para a entrada
54 RF\ /STA ()/ 0/Rf {/() e01\'\ TIT t,C/(),\!4/ I JN rrnt,'·\( /0,'vAI 21)1 o RI)(/ 7(1 DOUTRINA ,ACIO'JAL 55

de arabes das mais di\'cro.;as proveniências. \Ja Conferência de Lvian, o rização dos Estados Unidos para o desembarque, pelo meno:, daqueles
c.lclcgado su1ço fo i o mais enfatico quanto à oposição de seu governo de que já haviam s ido incluídos nas cotas imigratórias dos anos seguintes.
per111i1 ir a entrada de refugiados judeus (.\ora Levin. T/1e l lolocaust - lhe Nada, absolutamente nada foi conseguido. Ninguém pode desembarcar.
drstn1< Lio11 o( Europrnn Jcwry I 933-1945. p. 77-78). Milhares ele j udcus Schrocc.ler leve que retornar a em harcaçãn para a F urnpa, ond e
atraves<;aram os Alpes entre a frança e a ~uíça nos anos 1938- 1942, passaram a se concentrar os esforços junto a diversos paísrs para rece-
alguns consegu iram entrar degalmente e permanecer. Ylilharcs. quiçá berem os refugiados. A final os refugiados foram distribuídos da seguinte
dezenas de milhares. foram impedidos ele entrar cm territorio helvctico forma: 287 para a Inglaterra, 214 para a Bélgica, 181 para a Holanda
e muitos que já ha\'1am com,cguido entrar, ao serem descobertos pela e 224 para a França (Morse, p. 219-233). Morse estima que como a
pokia s u fça , foram dcvoh idos ao posto da SS, instalado na fromei ra guerra começou em setembro de 1939 (e a 111vasão dos Pa!ses Uaixos e
franco-su1ça . De la seguiram para os campos de concentração Uosep h da França se iniciou a 10.05.1940), e como a maioria dos judeus que se
rrirdenson e David l<ranzler. I lrminc of Rc.scue, narram vários e pisódios encontravam nestes países foi devorada pela hiena nazista e enviada para
desta natureza). as câmaras de gás, resulta que. excetuados os que conseguiram e ntrar na
Cm 17.08. 1938, 53 judeus alcançaram I lclsinqui pelo mar. O Inglaterra, a absoluta maioria dos judeus que foi e retomou no St. Louis,
go"erno da Finlúndia proibiu que desembarcassem; alguns tinham pereceu no Holocausto.
,·is tos para os Estados Lni<los e pediam tão somen1e direito ele trânsito. Morse rnnclui esta narrativa com o rnmentário publicado no Der
Negado. Uma senhora iniciou o trabalho de pano . A FinlâncJia permit iu Wcl1ha111pf, de agosto ele 1939:
yuc desembarcasse. e, levada a uma maternidade. deu a luz. Mãe e
"Nós dizemos abertamente que não queremos os judeus, enquanto
criança úvcram q uc voltar ao navio que foi obrigado a retornar para
que as democracias vivem clamando que es1ão dispostas a recebê-los - e
a Alemanha. No caminho três judeus se jogaram ao mar (Gilben, p.
depois deixam seus hóspedes no frio la fora. A final , não somos nós, os
65). Tragédias destas se repetiram ao longo daqueles anos tcnebroc;oc;.
bárbaros, homens melhores?" (p. 234).
envolvendo vários países e seus go,·emos.
Enquanto se desenrolava o drama do St. Louis nas costas ameri-
[ntre os alemães que não se deixaram levar pelo fanatismo hiLlc-
ca nas. sem que o governo se sensibilizasse, o bispo James Cannon Jr..
riano, havia um certo capitão Gustav Schrocder, da marinha mercante
de Richmond , Virg1nia enviava uma dramática carta ao Richmo11d Times-
alemã que, comandando o St. Louis, uma luxuosa embarcação da
Dispatch em que lançava veemcme crítica ao governo de ~eu país por não
Hwnlmrg-America11 Li11c. partiu da Alemanha cm 13.05.1939, levando
pern1itir o desembarque dos refugiados. Em outros momemos. ilustres
936 passageiros, 930 cios quais rcf ugiados judeus. detentores de vistos de
prelados católicos e protestantes norte-americanos, assumiram posições
entrada para Cuba. Em cada passaporte alemão. o granclcj em vermelho
da mais alta dignidade em defesa daqueles que o governo (Executivo e
e na memória de cada um seis anos de crescente terror. Foram pratica-
Legislativo) haviam decidido abandonar.
mente os últimos judeus que conseguiram escapar cio inferno. \!luitos
pretend iam ficar em Cuba, 73-t também possu1am documen tos qu e lhes Mais tarde um projeto foi introduzido no Congresso americano
permitiria entrar nos Estados Unidos na cota de um d os anos seguintes, para ampliar as cotas imigratórias a fim de permitir a entrada de maior
ele maneira que de Cub.1, alcançado o ano de sua cota imigratória ameri- número ele refugiados. Não houve suficiente apoio. Roosevelt era contra.
cana, poderiam se transferir para sua des tinação fina l. Como diz Anhur Um grupo de clérigos católicos e protes1ames se moVimentou a favor da
Morse, Caplain Schraccler was mahi11g amcnds 011 tliis arte journcy for lhe iniciativa, mas no final nada resultou.
cnlirc Gtnnan 11atio11 (p. 221 ). Quando o navio se aproximava de Havana,
5.2 As informações sobre o Holocausto
chegou a noucia de que os vistos não seriam hnnracio, A comocào no
navio é facilmente irnagtnável. Em 08.08.19-+2, o jovem advogado Gerhard Riegner, representante
Todos os esforços para demover o governo cubano de sua decisão cio Congresso Mundial Judaico na Su1ça transmitiu ao representante
foram debalrJe, iniciando-se então um intenso 1rabalho para obter auw- americano naquele país o plano alemão de transferir quatro milhões de
56 Rf\lSTA {)f l)/R/lf0(0NS7/1U(/0N \I fl'vffRN\( /0:VAL 2010 R/)(/-o DOUTRINA NI\CIO,AI 57

jude us para a Europa Ori ental e liquichi- lo!> co m gà.c:. Zyklon B. info r- alca n ça- los . Esforços para dem nver Lo ndres d e su a cruel polftica foram
mação que recebera de um ?,rand e 111dus tria l a lemão. que nao havia d e balde. Enquam o a Ingla terra adm itia a lguns m il hares de refugiad os
aderido ao nazis mo. A no u cia c hegou ao foreign Ojjicc e ao S1<1lt' Dcpa11 - c m seu p ró prio te rrilôrio. ma nteve fechadas as portas d a Palestina, só
ment. Du ra nte mui to te mpo o mundo hco u se m saber o que rea lme nte se pe nrn1indn a c•ntrnda de u m n umC'm in signtfi c:rntc. tudo d e acordo com
passava nos campos d e extc nmni o. o famigerado Livro Bran co editacl0 cm J 933 .
O Leor cio Lelegra ma é o seguinte: De pois da gue rra, milhares de sobreviventes, Vt'ge t a ndo c m
" Recebida a n oticia a larma nte de que n o q u a rt el general do ruhrer campos de imernação na Alemanha oc upad a q ueriam fugir d a Europa
es tá send o examin,1do e co nstde rad o um pla n o segundü o q ual nos países ensang u en tada e a p ri me ira opção era a Palc::.tina. Mas para se u h orror
oc upad os ou co ntrolad os pela 1\ lc ma nha , tod os os jude us. que são de
3.5 a 4 milhões, se riam, d ep ois ele d epo rtad os e co ncentrad os n o LcsLe,
extermina düs ele uma só vez., pa ra resolver d efin itivame nte a Q u estão
Judaica na Europa. A ação estaria p l:t ne jad a pa ra o ci uton o e os mé todos
l e de todos human os d ecen tes q u e acllmpa n ha,·am os aco m cci mentos
daque les a n os - 19-+6. 19-+7 e início d e 1948 - a Ing la terra mant eve
lec hadas as po rta::. da Terra Santa para oc; jude us. Aq uel es q u e se atre-
viam a seguir para lá, era m recam biad o'> pa ra a Europa o u internados
em exame inclue m o acido prussico. Tran smitimos a info rmação com cm C hipre. O mund o d e h o.ic ign ora toda e.<,La crueldad e dos ingleses,
todas as reservas. ja que,,.não pod e ser confirmada a sua exa tidão. O mas muitos le mb ra m n filme "[xodus·· q ue narra a tragéd ia <laqueies
informante declarou ter ligações estreitas co m as mais a ltas autoridades que d e pois d e a no!> d e sofrim e ntos inen arraveb, ven do o porto e as lu zes
a lemãs e s uas informações são ge ralme nte fid edignas" ( Walte r Laqucur. d e I la ifa à s ua lrcnlc, a terra promeLida, o local pelo q ua l eles e seu s
O Tcrr1 vcl Segredo - a I crdadc solnc a mani17ule1çdo de informaçc"ies 11a a nte passados duran te quase dOLs milê ni os rezavam d iaria mente. e com o
"so lu cc1o.f111al" de Ititl c1. p. 75). qual eles so nha ram n o infe rn o de Auschwi tz. eram fo rçados a volta r! É
Seguira m -se outra::. no u cias e, linalmenl e, d epoime ntos de pessoas possrvel imagina r ma io r d esrespei to pelo ser huma no, por sua liberdad e,
que conseguiram escapar d e campos d e c0 ncc nLração e exte rrn!nio e por s ua dignidaJe, tlo que w nur á-lo mais urna vez: primeiro os alemães
presLara m informações minuciosas e c.ktalhadas so bre a ternvel ma tança e ago ra os ing leses. O h olocausto a pos o Ho loca us to!
que se iniciara, dirigida contra milhões d e se res huma nos (leia-se o li vro E nqua nto isto estava se ndo redig ida a Declaração Un iversal d os
ele Laquc ur d e 200 e p ou cas páginas). Direitos do Ho mem! Q ue tragica, cruel. iron ia!
:\ s info rmações eram recebidas como " propaganda ele guerra'·. O
Thc New Yorh Times - ne fanda publicação - nem seque r se incomodava 5.-f Bnm/Jardca, Auschwitz?
e m tra ns mitir as n ou cias e. quando a lgo d e muito con creLO apa recia nos Em 1944, com a g ue rra perdida para a Ale manha. mas a ma ta nça
d esp ach os telegráficos.jogava-o s cm po u cas li nhas pa ra uma d as paginas e m Auschw itz a plen o vapo r. su rgiu a ideia ele qu e os a liad os bom bar-
internas d o jo rnal. deassem e destruíssem as câma ras d e gás elo ca m po. o qu e pa ralisaria
o sis te mático assass ina10 indus trializad o d e milha res d e seres hum anos
5.3 A cwnplicicladc coni as atrocidades de Hitler
por dia.
Nos an os 30 a Ingla terra fec h ou as p ortas ela Palestina Centenas Vá rios pcdid c1s fo ram e ndereçadoc; as a utoridadec; britânicas e
de milha res d e judeu s alemães e de o utros paises eu rop eu s imagi n avam no rte-americanas n este sentido. O pedido era de u ma simplicidade
ma te ri alizar o sonh o s ionista de re to rno à te rra de seus a nte passados extre ma, eis que a aviação cios aliados e,;tava b ombardea ndo as fábricas
d onde foram expulsos pelo in va~or roma no. Sonh o que se reforçara da 1. G. Fa rben , de óleo sintét ico. qu e ficava n as proximidades cio cam po
pela necessidad e de fugir da pc rseguicão nazista q ue tudo fez c mrc ele cxLerm111io. No ca minho de i<la o u volta d estas c'( p l'tli','OC!> aéreas e
1933 e 1939 para ate rro rizar as comunidad es judaicas de wdo o país, com algumas bom bas. esta ria clestru1da a maquina d e morte. É sahido
e a partir de 1938 também d a Austria e da Tch ecoslováqu ia. além d os q ue q uase meio milhão de j udeus, na maioria da Hu ngria. fora m exter-
jude us do leste e u rope u q u e se dava m conta d e que o perigo pod e ri a minados no verá.o e no ouwn o de 19 44 cm Ausc h witz . .\s pesquisas
Rf\/15TA Dt DIRflTO (Of\JSI /TU( /()NAL I IN TE RNAC/0.'JAI 201 O - R()Cf 71) DOUrnlNA NJ\CIONAL 59
58

realizadas demonstram que l>S ingleses e os ameri can os se recusaram judeus gasificados e queimado:. cm A usclnvitz, como tinham estes
a atender o apelo. justificando c;ua inércia com a pohtica estabelecida dois países autl1ridadc. compe1ê ncia juríd ica e moral para processar e
de não encetar qualquer operação militar que visasse tão somente uma condenar os cnminosos de guerra? Os c riminosos a serem julgados por
açao de salvamento.Já cm fc,erciro de 1944. o \ilinistério da Gu erra dos c;ruc; cumplicec;' O q 1prnc;<;nmo cl,1 hirmcri..;i:11
Estados Unidos havia determinado: E a té hoje não e conhecida confissüo a lguma. de caráter oficial, de
·'Não se contempla que unidade elas fo rças armadas sejam uúlizadas qualquer um dos países democráticos sobre sua corresponsabilidadc no
para finalidade de salva r vítimas da opressào inimiga a não ser que tais l lolocausto, nos crimes de guerra dos nazistas. O importante, como visto,
salvamem os sejam um resultado direto de operações militares conduzidas era ga nh ar a gu erra. Os civi.s indefesos, homens. mulheres. cria nça!>, s uas
com o objetivo de destruir as forças armadas d o inimigo" (Leni Yahil. Thc vidas eram irrelevantes naque le mo mento. Depois viriam os lamentos.
Holoc,wst - Tll e feire of Europeanjcw,y. p. 638, invocando: :vfichael Weis- a condenação dos crim es. l> j ulga mento de \J uremberg, que po r sinal
mandel, Min J-lá-metzar, p . 182-189; Gilbert, Auscfnvitz and Ll1e Allies, p. deixou de cuidar de muitos grandes criminosos que contin uaram soltos,
234-236; Braham, The Politics of Gt:nocide. p. 754; Braham, Thc Destruction recebendo aposentadoria da Alemanha de pós-guerra.
oj H1111garia11j rws, vol. 2, n. 187. p. 427 e n . 342, p. 734). Os a mericanoc; levaram para os Estados Unidos um bom numero
Como escreveu S. Wyman: ·'Os judeus europeus representavam um de nazistas para ajudá-los na guerra f1;a comra a URSS. E o \iatican L>,
proble ma extrãneo e um peso indesejado'· (S. Wyman. Thc Aho11do11ment. através da "Operação Odessa" l'acil itou a escapada <le grandes crimi-
()f thc]ew1>, p . 307 apuc.l Leni Yahil, op. cit. , p. 638). no:,os para a América Launa: bchman, Mc ngelc, Stangl e muito!> outroc;.
Não era n ecessário mais d o q ue um bilionésimo das bombas que os E a Su1ça se apoderou das fortunas dos jude us que pereceram, recusando
·'aliados·· haYiam lançado sobre a cidade alemã de Dresden, destruindo-a, en trega-las a se us herdeiros, sem uma certidão de ó bi to - o cumulo da
arrazando-a, sem qualquer utilidade estratégico-militar - para eliminar perversidade hipócrita . A campanha de l litlcr saia moralmente vitoril>sa,
as câmaras de gás ele Auschwitz. Mas este, de acordo com a cínica, crimi- apesar do e nforcamento ele a lgu ns "graudos" pela justiça anglo-a meri-
nosa "po lítica·· anglo-americana não era objetivo militar. cana. A Rússia participou de toda a farsa. ela que se quedara inerte às
portas de Va rsóvia quanclt> um punhado de judeus se levantou contra
5.5 O Ti-ibunaJ de Nurcrnberg o poderio nazista e travou a batalha mais nobre e digna da história ele
todas as guerras, sem auxilio das potências cm g uerra com a Alemanha!
Por algum tempo durante e depo is do J ulgamento de Nuremberg
puristas questionaram a competência do tribunal: seria a jus tiça dos 5.6 A. confecção da Dccla1 acào
ve nced ores sobre os vencidos, o que s ignificaria falta de imparcialidad e.
Esta posição não teve grand e adesão: a alternativa era a sugestão de Chur- Assim , quando a Comissão de Direitos l lumanos da ONU , reunindo
chill. antes do término da guerra: reunir todos os chefões do nazismo e representantes dos ·'aliado:,'' , soh a presidência da Sra. Eleonor Roosevelt.
passou a redigir a Declaração. como reação às "atrocidades nazistas" .
executá-los sumariamente.
como insistentemente repetem os au tores de direito internacional e de
Levamo, agora, 64 an0s mais tarde, outra questão. muito mais
direito constitucional. o valor <la vim a do presidente americano e do
séria, muito mais grave: como puderam os representantes dos Estados
Proí. René Cassin devidamente respeitados. a verdade é que cslavam ali
Cnidos e da lnglaterra, que foram cúmplices dos crimes de Hi.tler, que
como representantes dos paiscs vencedores e ao mesmo tempo cumplices
lhe deram cana branca para fazer com os judeus o que bem lhe apro u-
dos vencidos.
vesse - ao fechar suas portas e as <la Palestina aos perseguidos-. que não
desceram de paraquedas sobre os campo'> de concentração para eliminar .5.7 O 'Jamigcrw/o" posiuvismo jw ulico w nw responsável pelo nazismo
as tropas da SS e libertar os prisioneiros. que n ão empreenderam um
esforço sequer para dar fim à s istemática matan ça. nem quando uma Os autores tendem a atribuir o nazismo e o fascismo ao positivismo
o u duas bombas fa riam cessar a rnone dos últimos quatrocen tos m il jurídico. Ledo en gano. Q ue um regime fundado na lei pode ascender
:Vtll l01O - RD< 170 DOL f RI/\.A /\.,\ CIO.\ lAL 61
60 Rf VIS TA Of 0 /R( 110 ( ON5 TITUUO NA/ I INJJ R"IAC/0

dos Direito s
à barbar ie em nome da lei nada d emonsu-a contra o
positivismo. Todo contava c11m 147 Estados-pan es: n Pacto In ternac ional
a Conve nção
sistem a em LOdos os planos da vida pode levar ao bem ou
ao mal. No Cco11ô micos, Sociais e Cultur ais com 145 Estados- panes,
inaçào
plano cienuli co, o p oderio a tômico é a melho r demon stração
. Nas mãos sobre lonura com 124. a Conve nção sobre Elimin ação da Discdm
o. Hirosh ima c; , Con v<>nc,:iio o.,nhrr Fli minaçà o da Discri-
dos amcn canos serviu para te1 min.u com a guerra no Pacific contra a Mu lher, l68 Estaclo :i
s da Crianç a,
evitou a contin uação da guerra que traria muito mais vitima
s d o que o minaç ão Racial , 157 Estado s, a Conve nção sobre Direito
naquel e ataque atômic o ( para a destru ição l 9 1 fa tados- parte.
número que foi 5acrifi cado
encon tro explica ção plausl\ cl). !\as
de t\agasa ki, logo cm seguida. não E dai?
de Tchera n, poderá levar
mão!> dos iranian os, sob a tirania do moru,t ro Por e!>scs dias chegou a noticia que na lndia menin as clc sete
anos
todo. A ciên cia da
a um desastre no Oriente. Médio . ou até ao mundo são vendid as pelos pais cndi\·i dados por uma bagate la, entreg u es à pros-
em geral. enfim
compu tação tem servid o à medici na, ao direito , à pesquisa ti tuiçno. estupr ndas numa média de dez vezes ao dia, sohrev
ivenclo um
à pedofilia ,
ao progresso da human idade. Também tem servi.do ao crime, max imo de um ano. J\ Índia e Cstado -pa n c da Conve nção sobre
Direitos
à invasão da privacidade, ao assalto a bancos e p oderá,
um dia, causar
da <...rianç;i.
óficas. Assim também o pos itivismo
uma tragéd ia de proporções catastr s e
o para mante r a discipl ina, a ordem Veja-se a Conve nção para a ~upres são do Tráfico ele Pessoa
jundico. Em certos países tem servid
e o progresso das suas sociedades , ao dcsenv olvime mo de s ua economia. Explor ação da Prnsti tuição de Outros , aprovada sob o
ir, \ uprim ir e
pat roc111io da
Punir o Tráfico
1
r, contra os judeus , ONU cm 1950 e o Protoc olo para Preven
Em o utros tem servido para discrim inar contra a mulhe s. de 2000. cnnhe cido
comra os cristãos, cont ra todos que não seguem a religiã o que esta lei esta- de Pe!::>soas. especia lme nte mulhe res e crianca
respon der
belece como única. De maneir a que o segred o reside 110 empre
go que se como o Protocolo de Palermo . que, a legada mente veio para
os trafica ntes,
faz da técnica , da tecnologia, das armas , e també m do direito
positivado. ao5 cntico5 de que a Conve nção se conce ntrava em punir
te vítima s. O Depar tamen to de Estado
é um mas não prmeg ia s uficien temen as
Haven do amor, o direito é uma dádiva , não havend amor o
res e crianç as 'v1tima s deste trafico
este trabalh o, ameri cano calcula o numero d e mulhe
perigo ( vide meu Direito e amar, referid o em outras partes d a 800 mil) mas varias
do). Mas cm 560.00 0 (outra fonte arnedc ana fala cm 600
onde o desast re resulta me do positiv ismo germâ nico está explica de vítima s anuais
é nocivo porque os alemãe s se d eixaram o rganizaçõe!::> não govern ament ais calcula m o numer o
gen eraliza r que o positiv is mo mulheres
cruéis é uma genera lização errône a em milhões. As inform ações sobre o Brasi l se referem a 70.000
levar pela maldad e e aceitar am leis o (estas e
levada s para a Europa para supri r a indust ria da pros tituiçã
e injus ta. a Holma n, T he \tfoder n-Day Slavc
as do muitas outras inform ações cm Mcliss
Qual o scmid o de enalte cer o Gru.11d Gcsctz de 1949 e as palavr 2008, p. 99 e ss.).
tucion al alemã ficou garan- Trade... , Texas /11t e111alio1wl Law Jo11nwl,
Konrad Hesse de que p ela nova ordem consti não são
tida a inviola bilidad e da dignid ade d o homem . se para a teoria
nacion al Os Estado s Unido s (e a Sornalia) são os únicos paiscs que
aos estatís ticos
socialista os judeus . os cigano s e outras raças não eram homen s, eram pan es da Conve nção sobre Direit os da C riança. Asseguro
s Un idos são
s ubuma nos? lsLO demons tra que palavr as nada valem , docum
entos nada destes d iplomas internacionais que as crianç as nos Estado
brasile iras 110
ga rantem , constit uições e conven ções nada assegu ram.
Tudo está n a razoav elmen te bem tratada s, melho r do que as crianç as
a, enfim dos nordes te e das favelas carioca s.
depen dência das atitudes. do compo rtamen to, do espirit
e o regime do
sentim entos que inspira m o ho mem individ ual. a socied ade Que valem esses númer os, que valem esses Pactos diante
ias, da discrim inação conLra a
jundico que eles formam . racism o , da discrim inação comra minor
a prostit uição (milhõ es por
mulhe r, do intens o tr:ifico de mulhere~ para
5.8 Tratados, panos, convençôes, resoluçcies, et caterva ano!) , da supres são de outras religiões (Arabia Saudit a e muitos
outros
dios que
Leio em texto de um dos entusiastas pela obra de pós-gu
erra que países muçul manos ). das desigu aldade s gritant es e dos genocí
e Polític os se multiplicam cada ve:: mais?
até junho de 2001, o Pacto Inte rnacio na l <le Direitos C ivis
,,.,,A/ 101 O R/J(/ 70 63
62 RI VIS rA OI OIR/110 CONSTITUCIONAi f /Nrl ~1'-:AC/O

nela, l\.icaragua,
Em 1982 publiq uei no Texas lnle11iatio11a l Law Journ
al um artigo ~toça mbiq~e, ~gand a, Iraq ue, l3osnia-Herz egovin a. Rwa
imolad os no a ltar
sobre a ordem p ublica verdad eiram ente inte rnacio na
l, que foi traduz ido Sah·a<lor, mtlhnes. d ezenas d e milhõ es <le ~ere~ hu manos
ios inenar ravcis
e public ado na Revista de lnfo nna(ão Legislativa do Sene1d
o Federa l ( n. 90, da bestia lidade huma na, após solrimen toc; atroze s. martír
tios aman tes da
1986), n o qual escrev o a p. 220:
e tudo aco mpan hado do silênc io mo rt al da human idaelc.
ticos de todas
cha mado Decla ração Uni versal dos Direit os do l lomem . dos estalls
·· Este século, esligm alizad o pela impot ência d o assim mos a mais uma
s ucedid as de geno- as conve nções , inclusive a do gcnoc fdio. E agtira assisti
mund o civiliz ado em face de várias campanhas bem ele mort os e ma is
s, tem sido bastante tragéelia do povo do Sudão com centen as de milha res
c1dio e da mais cruel perseguiçào a indivíd uos e grupo de elois mil hões de fugitiv os e m sua p ropria te rra.
-
ent os refere ntes
fértil em co1wc rsaçõe s estére is c elabor ação <le docum ou 26 conde -
aos direitos huma nos. Decla rações , conve nções e tratad
os d e LOdos os A venerável Comissão d e Direi los Huma nos já aprov
terror is tas pales-
tipos e taman hos foram feitos, assina dos, a prova dos
e anunc iados a um ~açõe s a lsracl (por atos de legítim a d efesa com ra os
a conele nação
mund o perple xo e care nte de paz e da mais elcme mar segurança." unos, arabcs , cm s uas vá rias ramificaçõe s), mas ne nhum
mais variad os e
ao Sudão . Alias, os seguin tes países , todos palco dos
s recebe ram uma
5.9 De grnoc rclio em gcnoctclio per versos aten tados contra os elirei tos h uman os. jamai
. Bósn ia-Her ze-
ios - um e conde nação: Angola, Ara hia Saudita, Bahra in, Bangladc~h
O século XX começ ou com o genoc idio cios annên govin a, Burki na- Faso, C.amc ron, Cuba. [gito, Gabão , Gha na, Lndon ésia
ças levada s da Turqu ia para
me io milhã o de ho mens, mulhe res e c rian Qatar. Madagascar, Mauri tius, Nicará gua. Nigcri ;i, Pa kis tão, Zàm bia. Un~
, ch icotea d os. barba ra-
o deserto, maltra tad os, esfom eados , desnudados aclend t? '. mpo rta~1c: são toelos memb ros da Comi ssão. Imagi ne-se como
lo da espad a de lslam
mente tortur ados e morto s. Era mais um capítu se senun am. se ,wos losscm hoje, René Cassin , Eleon or Rousc , ·eh e mais
mundo silenciou
destru indo o pacífi co povo armên io. de fé cristã. O Guerr a Mu ndial.

!
algun s idealis tas daque les mome ntos Pos-S egund a
ia genocida saiu
duran te e d epois. Nos acordos de pós-gu erra a Turqu idade reina. Os
. E não há indíci o ele que esta w rm cn1 a cesse. A impun
premiada e os armén ios ficaram sem sua terra. is são lentos . m uito lentos . muito buroc ra-
elimin ar os tn bunai s penais intern acio na
Q uando Hitler. 25 anos mais tarde, deu a ordem de ticos. A Con e Crimi nal lmern aciona l foi politiz aela no seu nasce douro
assess or mais cautel oso.
judeu s da Europ a, tranqu ilizou um ou outro Aspira punir soldad os ameri canos que em m issão de paz. comet am alou~
dize nd o-lhes: "Quem se lembra dos armên ios?". des lize matan<lo um civil n a Somalia ou alhure s. Ou ir a tras ele ofi~ia is
esmen te de m mnnc de
E vieram os acontecime ntos q ue o mu ndo chama simpl gener ais israele nse~ que, em lutas ele legítim a deíesa . cause
para as barba ridade s que a lica política d os
"atrocidades nazis tas··. referên cia inadeq uada c ivis arabc s. colo~ados na fren te d e batalha pela diabó
r conhe ce em toda s ua satâni ca prol de sua nefasta e
maior ia dos q ue a elas se refere nem seque palest inos de sacn ftcar suas p rópria s crianç as em
perversidad e. ne fanda p ropag anda anti-is raelen se.
ada, porqu e de Direit os
A Alema nha nào foi punida, pelo comra rio foi premi Esta Corte. a Corte Internacional de jus tiça, o Conse lho
antep aro ao avanç o comu nista na lho de Segur ança.
os ameri canos precisavam dela como Hum~nos _da 01\~. assim como . o Excelso Conse
, aos milha res, memb ros da es que cont rola m
Europa Ociele ntal. E os criminosos de guerra subm isso a. ma1o n a muçu lma no-ara be e seus satélil
gover n o alemã o. o u apose n- dos na m issão
Gesta po e da SS foram recont ratado s pelo a Assem bleia Geral. todos c;intnn izados e arregimenta
le nclo comra
tados pelos cofres pu blicos. ele perseg uir o Estado ele Israel, que sobrevive se defenc
seguid a dos 1973, Jm ifada J,
E veio a Decla ração Unive rsal dos Di reiLOs do Ho mem, as guerras e invasões elos países ara bcs (1948 . 1967,
ardeir os do sul
genoc íd ios das d écada s de 50. 60. 70, 80, 90 e prime ira décad a d o século lntifada 11 , bomb arcleir os do norte pela Hezbo llah, bomb
sistem a, icame ntc condc n aclo pelos órgào s da O~U por
XXl. pelo I lamas ).
ctros da Carta.
R ússia s ralinis ta. Ch ina de Mao e dos seu s herdei ros.
Indon ésia, q ualqu er elefesa emp reendi da den tro dos estrito s paràm
es em suas campa -
Camboja, Biafra. Burun di , Congo . Argelia (tortu radore
s e assassinos enqua nto q ue o:, terror istas árabes cont inuam impun
enviad os de Paris) . Sudão . Liberi a, l\igér ia, Som ália,
Etiopi a, Angola, nhas ele agressão e propa ganda maqui avélica.
RI \'/STA DL O/RI /fO ((),\,'\/ IH 'Cl08AI I J/\/11 R,\J,\CIONAI 20111 RDCI 70 1lOL. TRINA NACIONAi 65
64

o cúmulo <la hipocrisia emana da Corte lntcmacional <le Justiça, camentc ele destruir OLll ro pais membro da ONU como o Presidente do
ao opinar em resposta à consulta do Conselho de Segurança da ONU, Irã 1cm feito com relação a Israel? E que ao mesmo tempo prossegue no
que O muro construído por Israel para se defender cont'.a os ataques programa de produção de uma bomba nuckar? E que nega ter havido o
dos ·'homens-bomba" que ceifaram a vida tle centenas de 1s1aelcnses ao l lo k1causto da Curnpa?
longo dos anos, é ilegal. porque avança sobre t_c'.ritórios dos "paleslinos". Tah ez o mundo atual dos direit os humanos espera até que se
Estes territórios estão ocupados por lsrael leg1 ttmamente como qualquer consuma mais uma hecatombe para depois preparar uma nova, remo-
superficial pesquisa nos livros de direito internacional pu?lico poderá delada. embelezada. sofisticada Declaração de Direitos Humanos. cm
confirmar - é legítima a ocupação do território de onde paruram ataques sinal de lamento pelo segundo genocldio do povo judeu. pelas mãos
até que se materialize uma garantia absoluta de paz. Condicionar a paz do moderno Hitler, recebido pela L.:niver~idade de Columb1a, cm Nm·a
à saida dos territórios, ao invés ele condicioná-la a garanuas absolutas de Torque, pela BUC cm Londres (para uma mensagem de Ano Novo) e
paz pelos palestinos e pelos países que lhe~ d~o ~poi~ miUt~r'. é uma visão finalmente pela grande d emocracia brasileira, capitaneada por este
antijundica, representa simplesmente d1scn11:111~çao ant1-1sra.ele~se. a chanceler que. ou não sabe cm que mundo , ivc ou desrnmprc cons-
face moderna do antissemitismo, que se espeCLahza na demomzaçao do cientemente todas as co1wençõcs de direitos humanos de que o Brasil
Estado Judeu. é pane. bem como o arl. I.º, 111. da CF/1988, levando o inoccnt e útil
Recentemente, a tão festejada Con e Penal Internacional decidiu do Presidente a <lançar ungo com os tiranos <le Tehcran e de Carncas,
emitir uma ordem de prisão contra o Presidente elo Sudão, Omar Al criminosos, campeões do desrespeito aos direi tos humanos.
Bashir, que ocupa o cargo de primeiro mandatario deste país por tod~s E onde estão os intclcctuai'>. os gTandes pós-modernistas. pós-posi-
os seis anos em que vem ocorrendo a tragédia de Darfur. A acusaçao tivistas, poetas da dignidade humana? Q ue dizem em sala de aula? Que
aprovada por uma turma de três juízes decidiu que havi_a prova sufi- debates organizam cm suas Universidades? Que escrevem em seus livros
ciente para uma ordem de prisão por crimes de guerra e crimes contra a e artigos? Mais teorias. mais repetições. mais citações? Onde a coragem
humanidade, mas - contra o voto de um dos juízes - não por genocídio! do internacionalista, do constitncionalista, de enfrentar a Jura realidade,
(fntcrnational Law News . da American Bar Association . vol. 38, n. 3. p. totalmente divorciada do que passou a vida a escrever e deíender?
23). o presidente da Venezuela, 1 lugo Chavez. qualificou a ordem .de Os enaltecedores da Declaração Universal dos Direitos do I lomcm
prisão como uum horror judicial e um desr~speito aos po~os_ do Tercetro nns informam que a partir deste marco O!> direitos humanos se imer-
Mundo" ( fntcrnati onal Law Ncws, da Amencan Bar Assoc1at1on. vol. 38, nacionalizaram , admitindo-se intcr\'enções no plano nacional cm prol
n. 3, p. 23). da proteção dos direitos humanos. Será mesmo assim? Chamam isto de
Há cerca ele dois anos, ordens de prisão foram expedidas comra interação entre o direito constitucional e o direito internacional e nova-
Ah mar Harun, ministro sudanês e Ali Kushayb, líder miliciano. Ambos mente acham que descobriram uma grande no,,ida<le. [ Kelsen. onde
está? Ele que tão bem e claramente delineou a pirâmide. jurídica cm que
continuam livres.
Este O mundo que festeja a Declaração Universal dos Direitos do o direiLO internacional está no cume. controlando tudo com o princípio
de palia s1111L servanda.
Homem, "criada em vista das atrocidades nazistas". au ocidades estas
dirigidas principalmente contra o po,·o judeu e este mesmo mundo Por outro lado. se e tão certo que os direitos humanos admitem a
colabora agora, novamente, de forma mais direta ainda .. para um novo intervenção no plano nacional. que dizer das criticas lançadas à inter-
Holocausto a destruição dos seis milhões de judeus que vJVcm n o Estado venção em Bósnia-Herzegovina? E na Somália?
de Israel p~lo axi~ Lrã-Hezbollah-Hama s, com a culaboração da Arábia O Presidente i;Hl Clmton comemorou a entrada no noYo milénio
Saudita, Síria. l1bano e outros satãs menores. com cinco grandes banquetes na Casa Branca, realizados ao longo do
Que deveria lazer o mundo dos Direitos Humanos ante o fato qu_e ano de 1999. Em um deles o convidado de honra e orador da notte
chefe do governo de um pais membro ela ONU ameaçar aberta e publi- foi o Prêmio Nnbcl da Paz, Prof. Elie Wicscl. Comou-me ele quando
0
IJOUTl<INA NACIONAL 67
66
ro CONSTl7 l 1CIO,-..:AJ I JN1 f Rl',ACIONAI 201 O
REVISTA DL D/RI 1 RDC/ 70

Estados- me mbros al) retomo de estrangeiros cm snuação irregular (vide


esteve no Ri o de Janeiro. como convidado da LERJ, que lhe concedeu
t[tulo de Doutor Honoris Causae (o centésim o utulo recebido por este
Rcn,c Cliuq ue de Dmil l11tcn1ational Pri\'e. 2009, p. 395 e ss.).
0
grande batalhador, luta<.h)r no campo, cm inúmeras panes do mundo.
5.10 A logica do ,lircitu i11tc111acional do~ cli,ciro~ humano~
peloc; direitos humanos). que em sua fala na Casa Branca, explicou e
defendeu a intervenção na Bósnia-Herzegovina. Esta intervenção fo i Segundo um dos mais ilustres membros da Escola dos Direitos
realizada depois de inúmeras tentativas conciliatórias. inclusive por ele, l lumanos no Brasil a lógica dos direitoc; humanos é, sohrctudo, uma
Elie Wiescl. que foi a Belgrado e outras localidades para parlamentar. lógica material. mspirada no valor da dignidade humana. Esta lógica se
durante dias. com as partes envolvidas na matança, mas tudo sem êxito. ha'icaria exclusivamente na prevalência da norma mais benéfica. mais
No final de sua fala , levanto u-se distinta senhora da sociedade ameri.can a proteLOra. e mais favo rável.
e perguntou-lhe: ''Pro f. Wiesel: se estamos inves tindo, junto com o utras ,\qui se confirma a a rtnicladc dos dois ramos do direilO interna-
democracias, tanto esforço na antiga Iugoslávia, porque nada fizemos cio nal. No direito internacional privado segue-se efetivamen te o prin-
anos atrás quando se dava o genocídio de 800.000 seres humanos cm cipio proteti\'o da lei mais benéfica: Javor 11wui111011ii, favor i11fe111s. Je1vor
Rwanda?" Mestre Wiesel, com a elegância, a n obreza e a sinceridade que 1estamc111íi, favor 11egotii, Ja, nr dwnni e Clutros determinantes ela escolha
lhe são caractcnsticas, d isse à senhora: ··a pergunta é importante. mas da le i mais favoravcl à pessoa. à imti1uição. ou à transação. Aí não se
não se dirige a mim e s im a nosso anfitrião. o Presidente dos Estados trata de direiLos humano'i, ma'i de um si,;trma vic;andn a concretização
Unidos··. Sr. Clinton se levantou, expressou sentimentos de solidarie- dos negocios. a validade da~ operaçôe~. a pr~Heçào d o incapaz. a prntcc,:ào
dade para com o povo de Rwanda, arrependimento pela inérc ia emào do prejudicado, e a eficacia dos atos juríd icos. E is to LUdo se relletc na
ocorrida ... escolha da lei a ser ap li cada, que elevem ser aquela cujos efeitos sejam
A verdade é que a ONL.i, com o beneplacito <las g randes potências, os mais práticos, os mais e fi cazes, na medida cm que o direito deseja a
rcuro u as tropas que mantinha em Rwanda assim que começaram as soluçao das siluações que ele é chamado a reger ou solucionar
violências. ):a ép oca dirigia o departamento encarregado das tropas das
6. A CO\JTII\UIDADE DOS rUNDAMENTO'>
Nações Unidas, o Sr. Koffi Annan, que mais ta rde, como Secretário-Geral
da o rganização. deitou várias proclamações, declarações, Leses sobre 6. l Os principias de direito 11<1 direito natural e nn direito positn·n
como proceder em matéria de direitos humanos, pelo mundo afora.
Emendem os muito modernos que no positi vismo os princtpios
advogando a esdrúxula teoria do cuidado a ser tido no tratamento dos
ttnham uma função meramente auxiliadora, s ubal terna, um recurso
terroristas (vide meu "Terrorismo internacional derrota a Ot\U" em
ultimo a ser utili.zad o como fonte supletiva do direito, e para alguns.
Direito e amor, p. 63-109). O exagerado cuidado com os ·'direitos dos
inlc.rior aos costumes e a analogia que vi nham enunciados a sua frente
ter roristas·· ainda levará este mundo ao desastre, haja vista as recentes
no an. 4. 0 da U CC.
decisões da Corte de Justiça das Comu111daclcs Europeias que não admite
que um país me mbro mantenha um registro relativo aos cidadãos da O fereço outra visão: as questões jundicas foram e continuam sendo
União com o ohjetivo de lutar contra a criminalidade Qournaí de Droit solucionadas pelas regras, cm operações diretas. simples , sem dificul-
/ntemational, 2009, p. 643): o utras decisões liberais da Cort e de Justiça dades. :Vias ao surgir uma s ituação para a qua l o legis lador não previu
das Comunidades Europeias vem surgindo, para horror daqueles que solução (problema estudado d esde A ristóteles). o aplicador da lei deverá
se preocupam com segurança e estabilidade e não gostariam de ver a subir a um patamar mais eleYado, e procurar nas grandes verdadec; da
Europa engolfada em uma onda d e terrorismo (Journa/ de Droit Imer- Justiça. da m oral e da equidade, nos valores que estão acima da lei escrita.
national, 2009, p. 646 e ss. e 679 e ss.). Sobre resuições a uma pohtica nas sulu1,:0e.., 4ue inspiram o ho mem desde todos os tcmpl1~. as solw;,õcs
mais cuidadosa com terroris tas e potenciais terroristas basta examinar Lranscenden tais. E estas se localizam nos ptinctpios de direito. que, em
verdade, comandam todo o s istema. discretamente na maioria das vezes,
a Diretiva 2008/11 5/CE do Parlamento Europeu e do Con selho, de
abertamente quando surge a dificu ldade de encontrar a regra ad equada.
J 6. 12.2008. quanto às normas e procedimentos comuns aplicáveis nos
/ONA/_ 201 O RO(l 70 DOL TRIN;\ NACIO NAi 69
Rl\'ISTA /)/ D/RI 170 CON, t /TUCIONA I I /Nr/ RNAC
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na pela razão.
[m suma. nada realm ente mudo u: o principio é o rei
do s istema , unive rsais e ncccssarios que, extraí dos da natureza huma
imedi atame nte
ao qual só se recorre cm caso de a bsolut a necessidade .
mas. cm verdade, ora ins piram o direito positivo, ora por este dirciw são
home m."
esrnmos cônscios de que, mesm o quando não utilizado
direta mente, é aplicados. quand o deli nem os direito s fun<lamemais <lo
, composto u diu: ta) dos
dele que emana toda a just iça processada através do direito ,\qui vemos a i1Jíluê1 1cia indir eta (e ta111l,é111 a 1dai.;à
u ral e, por outro principias e.lo direito natura l sobre as norma!> positivas.
pelas regras. O princCpio é inspirado pelo dire110 na1
positi vo; e assim o princí pio serve
lado. o principio funda menta o direito [ concl ui Ráo. loc. cit.:
venerá veis filosof ias do direito .
de ponte entre uma e outra destas duas tratan do <lc
princ1 pios, nunca vingavam. E "O Direiw Pusitivo Peran te o Direito Nat ural - [ m se
Por ist0. as lei que desrespeitavam o:, nte os atrihu tos e poder es essen-
quand o vingaram, tro uxera m o desastre. do qual o nazism o é o exemplo relações que não afetam n ecessariame
do direito positi vo
ciais da natureza humana, mais ampla é a auton omia
clássico. e diretr iz de
acional d a que, então , no direito natura l apena<, proc ura in.:;piração
No curso que proferi na Academia de Direito Intern mas. se açôcs ou
pios, invoq uei várias apcrfciçoam enw, como um ideal supre mo de justiça;
! laia, no capttulo introd utório dedica do aos princf aquele s atribu tos ou r odercs, ao
k Morva n. em relaçõ es estão em jogo, que atingem
passagens da tese d e Le prfncipe de drait privé, de Patric sua legitim idade, declarar
natu.ral. ~ aut~r direi to positivo incum be, sob pena de perde r a
que demo nstra como os princí pios nasce ram no direito pios do
relaciona o direito positivo ao <lireito natura l através do
pnncCp10. Dtz e faze r obser var_ coercilivam cntc, oc; corrc<;ponclcntcs princí
direito nat ural."
à p. l L7:
no direito
.. Lc droit nat urel témoi gne en J' espece. sous le couve
n des 'prín- Novamente as duas diferem cs funço es cios princí pios
droit positif.º' positi vo.
cipes'. d' une influe nte com.idérablc sur la réalisa tion du
da justiça e
E adian te, a p . 12 1 , lemos: E mais um trecho do Ilustre pro lessor paulis ta, Minis tro
bleia Geral das Naçõe s Unida c;, à p. 99:
introd uit delegad o do Brasil à 5:' Assem
"Un prmcipe fondamenta l d e la procé<lure fut égalem ent
. éticos e
sous les coul eurs du droit naturet.·· "L nive rsais podem e devem ser os princ1pios gerais
imedi ata destes prin-
Entre nós a matéria foi muito bem exposta por Vicem
e Rao. em jurídi cos: podem e elevem ser, como decor rência
. ineren tes à sua
seu Direito e a vida dos direitos, do qual extraí mos algun s trecho s que cípios , os direitos e devere s funda menta is do homem
ade huma na
demo nstram a validade da ponte e111re o direito natura
l e o direi LO posi- personalidad e, à sua dignid ade, como diretrizes ela ati\'id
rsal. Não O são,
tivo. na comu nhão social e dos Estad os na comu nhão unive
se caract erizam como regras
À p. 75 do vol. 1, o mestre da USP assim coloca o direito
natural: nem podem ser. as norma s posilivas, que
e de fato variaveis e
pção geral de alcance panic ular, variáveis por natureza, porqu
"Mas, acima dessas concepções partic ulares, uma conce próprias a cada povo result am.''
pela força da coerção
do direito existe, que a todos os povos se impõe . não o direito
mater ial, mas pela força própr ia d os princfpios supre
mos, univer sais e Para uma elaboração mais profu nda da relação entre
, A Justiça e
necessários, dos quais resulta , princípios estes ineren tes
à nature do za natura l e o direito positivo, remeto o leitor para Hans Keben
vez nos remete
home m, havido como ser social dotado, ao m esmo tempo
, de vida fisica, o direi/O 11e1111ral ( Coimb ra, l 963, p. l 55 e ss.) que por sua
a Tomas Aquin o em sua Summ u Thco/( )gica.
de razão e consc iência ."
no an. 4.º
Logo adian te. à p. 76: VolLando à sequê ncia das fontes de direito enunciad as
anális e j unclica.
A razão extrai e declara os pnnc1pios gerais que
do concu rso de da UCC. leio cm meu Mestre Oscar Tenorio. em longa
comentarios a
acoplada a exame fi losófico-sociológico, à p. 138 de seus
h

decorrem; mas,
tais elementos result am e, po is da nature za huma na 37, da Consti-
nesta e não naque la se encon tra o funda mento <lo direito
natural. que Lei, que o dispositivo deve ser comp arado ao do art. ) 13.
si<lo adotada".
não t um supcrdireito , mas - um conju nto d e princí
pios supremos, tuição de 1934 , cm que "nenh uma hierarquia parece ter
DOUTRI '-A '-ACIO\JAI. 71
RI-VISTA Ot [)/R(llO CONrnTtlCIONI\I I IN71 RNACIONAI 2lllll ROC/ 70
70

Existe outra pers pectiva, que aprendi em Benjamin Na than Cardozo, e de qu e a hís 1t'> ría do l3rasil se divide cm duas panes: a d itadura mi li tar
em seu clássico ··Naturc of Judicial Process", à p. 179 de seus Selectecl decorrenLc do,;; aconl cci mcntos d e 1964 . seguida da rede mocratização
Writings -Tlte Choicc o.f Ty dw Brahe. onde ele reproduz uma interessante proc.:e:,sada pela Constituição d e L988. Ora. a ditad ura mil itar foi uma
colocação de Salleilcs, que assim vertt:u para o inglês: "One wills at elas Iases negras de nossa his tória, c:omo outras que 1ivcm0<; ao longo
lh e bcginning the result: one fineis the principie al'terward". lnterpreto da Republica. I a redcmocra1izaçào era uma necessidade que acabaria
assim: todo julgador tem um senso de justiça. de ética. d e equidade, d e vindo, como vieram a:, a nteriores queda~ ela-, tiranias que :,ofremos nas
bo m senso. com os quais, depois de o uvir as partes. ele estabelece em sua primeiras cinco elecadas de nossa atribulada história republicana. vias
mente qual o resultado JUSto a qu e deve chega r para solucionar o lit!gio; elividir a história cio Brasil cmre a maligna ditadura militar de 1964 aos
feita esta operação ele irá procurar no direito a justificativa para su_a mead os da década de 80. para depois cnaltec.:rr até os c:éus a Con sti tuinte
decisão. Com direi to, quer-se dizer, com aquela fo nte que melhor servir de L987-1988 e a desorganizada Cons t i tu i~·ilo que produziu . não respeita
para fundamentar seu julgamento - a regra, a equidade. a analogia, o a 11 isto ria.
cos tU1ne e acima de tudo. o princípio d e direito. sem esquecer, natural- Praticamente não :,C fala da Consti1uiç.10 de 1946. que ta 111bém se
mente, na modcrnic.lad c (não cheguei à pós-modernidade como parece seguiu a um regime ditatorial. A Consliluintc ele 1946, es1a uma aut ên-
j á 1cr ftcado claro) a do utrina e a jurisprudência. tica Constituinte, que reuniu a nata da int electual idade pol11ica brasi-
leira - homcni;; culto<; e p rohos - p roduzi u uma Carta digna. que zelou
6.2 Os modernos a11tcccclcn1cs t/(1 dignidade humana pelo bem-es1ar do cidaelàu, que Jdendeu praticame nte iodo:, os direi to:,
A França. na Declaração U nive rsal dos Direitos do Homem e do humanos que co ns tam na Cons tituição <lc 1988, co mo vere mos.
C idadão, de 1789, co nsagrou em seu arl. 2.º que: O encan to dos pos-modernis tas com a Carta de 1988 pro vavcl-
"A finalidade d e t0da associação polftica é a co nservação dos direitos mcnlc c;c deu devido à hiperholica do tex to que. em verdade. nada de
naturais e imprescrittveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a uul acrescentou.
pro priedade. a segurança e a resistência à o pressão··. Todas as repetições sobre dignidade da pessoa humana são real-
:'\os Estaelos Unidos a Declaração de Virgmia de 1776 estabeleceu mente desnecessárias. pois se uma Constitui(ão tem força. se é feita para
0
claramen te a dignidad e humana cm seu arL. 1. , na forma de direitos ser obedecida pelo legislador. pelo aplicador da lei e pelo cidad ão, não há
necessidade de jus tificar seus precei1 os. Vejamos só um exem plo: o a rt.
inatos do homem :
226, § 7.0 , CF/1988, d etermina que:
··Que todos os ho mens são criados iguais, que são dotados por seu
C riador com certos direitos inalienáveis, en tre os quais da viela, liberdade "§ 7 .º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da

e a busca da felic:ielade ... paternidade responsável. o planejamento lamiliar é livre deci~ão do casal.
Há . po rtant o. uma continuidade, através dos tempos. nas [unções com petindo ao Estado propiciar recursos educacionais e cien tífi cos para
o exercido desse direito. ,·ed acla qualquer forma coercitiva por parte ele
dos princípios. no respeito d evido aos direitos humanos. no supremo
ins tituições oficiais ou pri,·adas·· .
fundamento da dignidade humana. nos valo res transcende ntais que
tiveram inicio no Gêncsis e, apesar ele desrespeitados com frequência. Tenho algu ns problemas com esta c:oloc.:ação:
continuam o ideal da raça humana. - porque a imrodução de "fundado nos princípios ela dignidade da
pessoa humana" - veio para dar forca ao dispositivo? - não precisava;
7. BRASIL - por que a dignich1de humana C'ita q ualificada como ·'princ1p 1os··
7. 1 A Constituiçcio ele J 988 no plural. e não no sm gular?

A impressão que se tem da maio ri a cios escritos cios ilustres autores - por que está colocado corno p1i11 c1pio enquanto no an. l .º. [ ll. da
brasileiros sobre os direitos huma nos emanados da Constituição de 1988 CF/1988, a dignidade da pessoa humana aparece como Jw1dw11cnto?
RLVISTA Vl DIREITO lONWIT( l(IONA/ E INTIRNACJONAI 20 10 - RDU 70 IJOUTRl1'A 1'ACIONI\L 73
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- que significa pa1ernidade responsável? acresccma algo ao ··prin- artes, as ciências. No art. 16-1- a prmeçãn à maternidade, infáncia. adoles-
cipio da dignidade d a pessoa humana''? cência e amparo às familias de prole numerosa.
- a paternidade responsáve l oco1Te antes ou depois da gestação da E no an . 3.º d o CC/19 16 . a igualdade dos eslrangeiros aos brasi-
criança? leiros para a aquisição e o gozo dos d ireitos c1Yis. manifestação s uprema
- a obrigacào do Estado de propiciar recursos educacionais e cienu- (de origem bíblica) do respeito devid o a todús os seres humanos, estra-
ficos para o exercício deste direito nào lhe retira a naturalidade que deve nhamente ausente do Código de 2002.
existir em um direito que emana da dignidade da pessoa humana? Não se falou na ·'dignidade da pessoa humana·' - u ma expressão
- a necessidade de recursos educacionais e científicos nào retira da que nada soma. que nada garante, que nada acrescenta. O importante é
pessoa s ua dignidade humana? a enunciac.;ão dos direitos c m sua ex pressão concreta e, acima de tudo. a
educação, o espfrito, a vontade polnica, a decência pol(l ica de respeitar
En fim:
os d ireitos de todos.
Não teria sido mais simples, direto e compreensível dizer simples-
Além da "cUgniclade <la pessoa humana" do an. 1. 0 , Ili. da CF/1988
mente:
aparece a "existência digna·· e.lo art. 170 quando se trata da atividade
- o planejamento familiar é livre c.lecisào do casal, competindo ...
econômica. aja referida "dignic.lack da pessoa humana·· em maiéna de
Seguiu-se a Lei 9.263, de 12.01. 1996, com uma série de de talha- planejamento familiar (an. 226. ~ 7.". CF/1988) a ''d ignidade'· inclu,cla
mentos. Qual o eswdo sério realizado nas regiões mais miseráveis do país nos dire itos da criança enunciados no art. 227, e o mesmo <.:0111 relação às
e mesmo n as favelas das grandes cidades sobre a efetivação de todo este pessoas idosas, no an. 230 da Cf/1988. São palavras, expressões bo ni1as,
hiperbólico comprome1imento da Constituição? Há realme nte educação que não alte ram, não somam. não enriquecem. Ou exis1c o respeito pela
para o exercício deste direito? d1gmdade humana de toda cnatma, de toda idade, ou não há decreto,
lei, Constituição que a faça imperar nas relações humanas. Aliás, onde a
7.2 Os direitos e as garantias na Constituição de 1946
111e11s legis. ou seJa. a transcrição dos d iscursos dos constitui ntes manifes-
Veja-se o an. 14 l com seus 38 parágrafos - igu aldade, só lei obriga, tando a grande inovação que estavam in1rnduzindo na Constituiçã0, cm
direito adquirido, apreciação d o Judiciário, liberdade de manifestação uma revolução político-filosófica , que cloravame proporcionaria plena
de pensamento , sigilo epistolar, liberdad e ele consciência, respeito à p roteção a LOdos os direitos d o cidadão? Pode ser que tenha havido. ma~
convicção religiosa. assistência religiosa às forças armadas, cemitérios de não en contrei qua lquer notícia a respeilo nas leituras feitas nos longos e
caráter secular, liberdade de reunião, de associação, regime democrático m últip los trabalhos em torno do tema.
baseado na pluralidade partidária. liberdade profiss ional. inviolabili-
dade da casa. dire itos de propriedade em suas variantes, prisão restrita 7.3 Dowrina brasileira clássica
a flagra nte delito ou determinação de autoridade competente. garantia
'fossa d outrina esteve sempre sintonizada com o principio do
de fiança, comunieaçào de prisão ao juiz, direito ao habeas col'pus e ao
respeilO ao ser humano, com sua dignidade. Veja-se como Clóvis Bcvi-
mandado de segurança, direi tos de plena defesa, disciplina da compe-
laqua, em seus PJi11c1pios elcmc11ta1es de direito i11ternacio11al pri\'Cu/o, na
tência judicial e do sistema de condenação, júri, individualização da
original edição de 1906. escreve:
pena. vedação da pena de morte, vedada prisão civil por divida. vedação
de extradição por crime pohtico, disciplina tributária e processualistica "A noção de ordem p u blica é de uso adicionar a de bons costumes.
admLnistrativa. defesa contra abuso administrativo, delesa p elo cidadào porque alguma cousa existe de essencial à vida dos povos cultos que
do patrimôni; publico. No an . 157 longo enunciado de proteção ao diz respeito mais diretamente a moral, que fa la mais profundamente ao
trabalhador, com 17 incisos, seguem -se o direito de greve. liberdade nosso sentimento de respe ito à ~ocieda<le e à dignidade bumana ( ... )" (p.
sindical. Nos arts. l68 e ss. amplas ga rantias para o ensino, a cultura, as 83-84. Na 3. ed .. de 1938, o mesmo texto figura à p. LJ 4).
I O- RDCI 70 DOUrnl NA NA(IO'\I AL 75
74 REVISTA Dl DIRI-ITO (c>N\T/ 1U(ION AI I /,"vi/ RNACfO NA/ W

PonLcs de Miranda , em seus Come11L dJios a Constitu ição ele 1967, "O direito que o homem tem de defender sua existência ffstca e
ea
com a LC 1/1969, assim escreve: moral. sua liberc.ladr. seus direitos naturais, e.ssa faculdade anteced
por que é
se Lodas le_~ posiLi,·as, provem ela naLureza e domina o homem
~A afirmação e o reconh ecimen to da dignidade humana, o que homem .
operou por lentas e dolorosas conqui sw~ 11a história da human idade,
foi o resu!Lado de avanços, ora contínuos, ora esporadicos, nas três Carlos Maximiliano, comen tando o art. 72, §§ l." e 2 ", da Con~Li-
Luição tle l891. escreveu:
dimensões: democracia, liberdade, igualdade (. .. ) A essa caminhada
corresponde a aparição de direitos. essenciais à personalidade ou à sua "1-oi preciso que o Direito descesse do céu para a te rra. se humani-
expansão plena, ou à subjeu vação e precisão de direiLos ja exisLemes"
(t. zasse. para admitir o individuo como anterio r ao Estadu e unira ent idade
I V. p. 6 18). real. aLiva, d icicme e responsável. Organ izou-se a sociedade para asse-
Nos momentos decisivos de nosso <lireiLo constitucional, vejamos gurar a felicidade do homem e não para anular a amonomia e a aLividade
o que disse Rur Barbosa: desse, em pro,·eiLo exclusivo daquela·· (Comrnta, io:. à Consliw içcio brasi-
lci1 a ele 1891. p. 687).
·'J\ Constiluição Imperial do Brasil tinha, nos trinta e cinco
pará-
ções ele direiLos .
grafos de seu art. 179, a mais copiosa e liberal das declara 7. 4 Legislação reativa
liberali-
A da nossa ConsLin1içào awal ( 1891) não lhe faz vantagem na
dade ou abundância cios princípios consagrados. Chamo de legislação reativa aquela que é promulgada cm seguida
~ ~1m desasLre humano como uma d iLadura. um genoc1dio, uma guerra
Onde, pllrém, a segund a se avamaja à primeira, com uma distancia
ui- m1usLa , em que a kgislaçélo reage a tragédia havida e faz um esforço
income nsuráve l, é em que a ConsLiLuição de 1824, como as ConstiL de
para evitar q ue ela se repita. É uma lcgblação que pode sofrer ele falLa
çõcs francesas e todas as consLiLuições monárq uicas até hoje, não dotava de equilib rio, que passa para
is: preparo adequado, f~lLa de Lranquilidade,
esses direitos de um escudo, não cometi a a proteção delas aos trihuna do,
vigente veio a realizar de modo comple to. normas repJeLas de hipérbole. Obra de um legislad or nervoso, revolta
o que a nossa Constituição que pensa poder resolver tudo pela força da palavra magica . É O caso ela
á-
cabal e perfeiLo (RE 1.397. 5.1.. S.d ., p. 65-66)'" (Ruy Barbosa. Coment Declaração Universa l dos Direitos do l-lomcm . da Lei Fundam ental da
e ordena dos por Homer o
rios a Co nstituição Federal brasileira, coligid os Aleman ha logo após a guerra e da ConsLituição ele 1988 (se e que houve
Pires, Saraiva, 1934. vol. 5, p. 176). conscicntização dos parlamcnLarcs Lransformados em wnsLiLuintes
Está af o que os pós-modernis tas chamam ele ·'judicialização" dos 4uanLo à dignidade humana).
direitos humanos ou dos direiLos fundam emais. Essas peças precisa m ser reduzidas às suas real idades, às suas
Em PimenLa Bueno, Direito publico brasileiro e análise da ConsLi- proporções verdadeiras. vistas com o olhar para o futuro e não para
Llli(ào cio lmptrio, à p. 350. lemos: o passado , o que leva a relirar a imponâ ncia atri buida à terminologia
"Os direitos individuais que se podem também denominar nalu- exagerada, que, em verdade , nada acrescc nLa.
rais, primitivos. absolu Los, primordiais ou pessoais do homem são,
a 7.5 Excesso de legislação - 111111gua de atiwdcs
como já indicamos. as faculdades, as prerrogativas morais que a naturez
conferi u ao homem como ser in LeLigenLe; são aLributos essenci ais de sua
E comum, em nosso sistema jundic o, que a lei delegue os <leLalhcs
individualidade, são propriedades suas inerenLes à sua personalidade; para diplom a legal de categor ia inferio r- o dccreLo presidencial. A Cons-
á
são partes inLegrantes da entidade human a." tituição por sua vez deLennina frequ ememcnLe que o governo legislar
es ou ouLros
'· l lomem como ser inteligen1e··, "indh idualidadE'", "personali- sobre esLe ou aquele Lema. por meio de leis comrlc mcntar
do
dade", "emidade human a", não esLaremos ouvindo aí a "dignid ade diplomas.
homo sapiens"? L ma ConsLiLuição ha ele deLerrninar a organização do Estado os
Adiante prossegue Pimenta Bueno: Poderes da Republica, as hases de seu func1onamemo, as relações entre
NAL 2010 RDCI 70 DOUTRINA N>\Cl01'A I
76 R[VIS1A OI 1)/NI l /0 C<)N5ff TU UOt\'AI I /,..., fl R!,'ACIO 77

lica e am as
c:.tcs Poderes, qucstôes tnbu1arias básicas, o orçam ento e.la Repúb com as sucessi,•as emend as consli t ucionais, que descaracteriz
social "vitori as'· das forças progressisrns.
os direitos individuais. A ordem econômica e financeira e a ordem
,
também têm seu lugar na Carta Magna . [ ali eslavam os posru la mes, os represe mames classis tas, os Jo/J/Jics
s. Como
Mas cenas questõ es como as duas uhimas, preferível que
sejam fazend o pressã o, defcndcn<lo sua:. po:-içôes, seus in teresse
ostensiva
versadas com parcimó nia, com brevidade, sem detalh ament o. observou um sagaz jornali s1a. Vi llas l3ôa<, Corrêa, ··a dese rção
invadido
enos da do povo expulso pelas suas frus1ra<;ões, abriu o vazio que foi
A o rdem econôm ica e fin anceira e a ordem social são fenôm partici pando
criand o, desenv olvend o, pelos lo/Jl~~cs ( ... ) ~ casa e deles. Estão cm todos o:. camos ,
vida de uma nação que ela mesma , por si só, vai palpite s. impon do \'elos, encam i-
e o inoper ante. da:, rcumo cs de lideran ças, dando
para o bem, o justo e o efi caz, ou para o mal, o injusto 0 de sem vergon hice inédita ".
com outros nhand o substitutivos. Um desc.:arame111
A ordem econô mica march ará para o sentid o da coope ração tuinte
Estados, to madas as devida s cautela s, ou seguir a para o isolam ento. Da narrativa de Pilatli se veri fica que n,; trabalhos da Consti
ado <lo mais alto ni,·el , cm que
pratin mdo o suic1dio econô mico. No plano da educaç ão, da familia , se dese nrolara m em um ambie n1 e politiz
dcba1ic los a base não só de
do meio ambiente, não será uma norma constil tlciona l que irá levar os alguns Lemas pohtico-econõmicos foram
os interes ses poluic os
govern antes a cuidar destes pilares do bom desenvolvimento
da nação. É conce~ções polnieas de cada g rupo, ma!> em que
maior impor-
nte, com p_css~)a1s_ dos panici pamcs desem penhav am papel da
na1t1ral que csias questões precisam ser reguladas legislativame m a toda
na procura tancia. Grupo s se formavam e se desfaziam. ueserçcies ocorria
muito cuidado, com a assessoria dos perito s. com patriotismo, am a
cias po líticas, mas não por via de hora (corno exemplo. 70 cons llluintes eleitos pelo PMDB deixar
de consen so entre as di versas tendên tuimc e 0
uma lULa entre gladia dores legend a) ··o carater extraorcl inario da decisão formal consli
uma Constituição. cuja feitura mais parece u a brasile ira
ulavam a caráter ordiná rio da íun<;ão parlamemar federativa na polític
roman os, com grupos po líticos que se formavam e se reform e contra dito ria'' (p. 05), e ''a invo-
emend as , nas se cntrclacaram de forma tào intensa
cada instant e, numa guerra d e projetos, suhsti tutivos, para travcs1 ir a defesa de peque nos
com as galeria s repleta s e barulh entas como cação de grande s princípios e teorias
comissões, subcomissões, interesses e as contra dições daí resulta mcs'' (p. 11 ).
vem narrad o em A ConstiLLtinte de 1987-1 988 - progre ssistas, conserva-
mica
Adrian o Pilalti. As grandes questõ es se concem ravam na Ordem Econô
dores, ordem cco11nmica e regras do jogo, de ão ao capital nacion al, acessú ao
um - definição de empresa nacional, pro1eç
Basta o fato de que não se tratou de uma Consti tuinte, mas de 1~ercado nacional, exploração minera l e de energi a hidráu lica, monop ó-
·'mant eve-se como locus
debate entre os memb ros daque le congresso que 110!> do petróleo e das telecomunicações, reform a agrária , conces sões de
de sua
político durante a ditadu ra e acabou por hosped ar o ato final emisso ras de rádio e 1elcvis ão e, naturalmente o manda to presid
encial
ntação
dissolução, em 1985'', como escreve Renato Lessa em sua aprese (Pilaui. p. l 5 e vide p. 190 quanto à declaração do porta voz de Sam ey
descre ve ··o mundo parlam entar em que a presid en-
ao livro de Pilaui. O autor s~brc aqueles que não votassem pelos cinco anos de manda to
rdinári a conviv eram simult anea-
polflica ordinária e a política extrao cial). Nem tudo se regia pela concep ção pol1lic a de cada consti tuime
decisó rios e 4 fases
memc num processo que se desdob rou em 34 foros havia ··as conexões eleitorais de caráte r corpor ativo ou patrim onialis ta:
protag o-
deliberativas diferentes" (p. 02-03). em que dois dos princip ais gan.hos elei~or~is difusos e de cus10 reduzi do cm face de decisõ es cujos
nistas eram candidatos à Presidência da República. preJuizos aung1ram um circulo restrno ele interesses (..)" (p.
J 6).
se",
A Constituinte foi o "palco de grande s conflitos de interes Quam as a1uações dos senhores consti tuintes fo ram influenciadas
e conser- ou1ras
segund o o autor. E '"a grande controvérsia entre progressistas pela pressão das galerias (,·ide Pillati, p. 128 e 129, entre muitas
respeit o à dignid ade human a naque les o na Ao;semhli>ia C'ons1i t uin1i>)7
,·adores··. !'-:ão houve muito alusões ao circo formad
violcn tos emreveros. Escreveu um jornal ista brasileiro hã décadas atrás (seu nome 0
- memó,ria
l\ào foi uma obra definitiva, como se gosLaria de ver uma Consti lltulo do artigo e o Jornal em que public ou se esvaíram ela
se dissolv endo aos pouco s um povo não é o que vem inscrit o na
tuição. O resultado do embate das forças vai deste autor) que a Consti tuição de
RI VIS TA (Jl rJJRI 1/0 (ON.\ f/1 UCIONAI I li\/ li RNAUONAL ..W 1O Rl)Cf 70 IJOLJ rKll'-1\ 'lr\CIONAI 79
78

Cana, 1nas o que o povo efctivamcm e quer e pratica. O esp írito de uma uma comuniclad e, pelo esforço voluntario dos bencf1ciaclos pela sorte,
nação, acrescento. é o resultado do que se transmite às crianças cm casa, em um grande mutirão patriótico. "Faca mos uma tentativa··, apelava a
tio que se lhes ensina em sala de aula, e daquilo que os cidadãos verda- prolcs:.ora de psicologia.
dciramcnLe patriotas se esforçam a transmitir anc; menos afortunado s Fez se silê ncio. A presidênci a da mesa rcJornou a ordem do dia.
que nada ou muito pouco receberam na familia , nem frequentar am a Sem comentári os. Ça va sw,s dirc que a delegação da UE RJ não ret o rno u
verdadeira escola. às reuniões da Comissão.
Um episodio sintomático - Darcy Ribeiro foi eleito vice-gover nador 'Ião se erradica a pobreza e a marginal ização social por d1cta1 ele uma
dL> Estado do Rio tle Janeiro, na chapa do governado r Leonel Drizola. Constituiç ão. nem por lei ordinaria. Isto se faz por m eio de iniciat ivas
Uma de suas primeira:. medidas foi organizar uma comissão junco à organizada s, partidas principalmente de entidades privaclas, com planos
Secretaria de Educação para '·pensar·· o ensino que as crianças do Estado inteligentes que executem mudanças radicais, relocalizan do populaçüc s
estavam recebendo . e o que poderia ser fe ito para melhorar o nível, das favelas pa ra os cinturões verdes das cidades. cm iniciativa:. agropecu-
nomeando um grupo de altos funcionári os da Secretaria e alguns profes- árias, devidamen te financiaclas e sob orientação de profissiona is, projetos
sores. S0lici 1ou ao Magnífico Reitor da UERJ. Prof. Miguel Salim, que que sàt> capazes de transforma r a vida de comuni dades inteiras.
enviasse dois professore s da Universida de para participar da comissão. O
Todos :.ahemo:, que continua havendo um lento genoc1clio dos
Reitor desip,nou a Profa. Rosita Edler, diretora do Instituto de Psicologia
e Comunica ção Social e esle autor. que na época ocupava a posição de rnclios bras ileiros. Para os juristas basta ler o acórclãn cio STF, em sua
Diretor do Centro de Ciências Sociais da Uni versidade. composiçã o plena, no RE 351.~87, publicado na Rn·isw r, imcstra/ de
Jurisp111dê11lia, vol. 200. p. 1360-13 78, numa bela lição sobre a convenção
A primei ra reunião, sob a presidênci a de Darcy Ribeiro, foi inlrodu-
e a lei relativas ao crim e de genoc1d10, da qual se ,·e ri fica como esta antiga
tória e formal: nada de concreto foi discutido
v~rgo nha de nossa his tória, esta mancha na nossa civilização , prossegne
Na segunua reunião, sob a presidênci a de uma das diretoras da
viva e atuante.
Secretaria. a Profa. Edler apresentou uma proposta original:
·'Vamos reunir um número de proressore s ligados à Secretaria lsso sem falar nas transforma ções que se fazem necessária:. no
de Educação e alguns professore s da L"ERJ e procurar alguns amigos nordeste brasileiro que pode ser convertido em um colossal pomar
para formar um grupo de voluntário s(as) que se organizarã o para um e um espetacula r jardim. capaz de fornecer as mais lindas flores e as
encontro semanal com uma criança de favela ou semelhant e, levar-lhe mais saudáveis verduras às populações europeias e norte-ame ricanas
um sanduíche e uma coca-cola e conversar com ele, em praça publica, ou durante os meses de seus rigorosos im~ernos. mas, naturalme nte isto
na beira-mar, sentados num banco por algum tempo. Ka medida em que exige uma radical revolução para afastamen to dos polfticos nordes-
a relação for se desenvolv endo. levar-lhe alguma leitura fácil , conversar tinos, entre os quais genocidas de suas próprias populaçõe s, daqueles
com ele sobre a vida, o futuro , criar um laço e passar a orientá-lo" (sic). ·'homens públicos~ que foram capazes de desviar fortunas destinadas
Esta ideia, continuou a Profa. Edler, poderia não levar a nada, mas. pelo orçamento público da União às populaçõe s necessitad as, para s uas
quem sabe. poderia servir de exemplo revolucion ário, e uma vez divul- ins tituições particulare s (os famosos an ões ela República - não sei de
gado, passaria a atrair a alençâo das pessoas, levaria quiçá a que centenas nenhum deles que esteja passando alguns anos em algum presidio). Este
de homens e mulheres das classes privilegiad as fossem aderindo e, com um projeto que exige vontade política fcrrea, pa1riotisn10 fanático, coor-
o passar do tempo, a atividade iria se ampliando e chegaríam os a ter denação panidaria e ... muita corage m. Kão hã Constituiç ão que possa
centenas. quem sabe, milhares de crianças sob a "proteção e orientação" levar avante um projeto desta natureza.
de pessoas dedicada:. a seu bem-estar, a sua recuperaçã o econômica e Onde estão os salmis tas da Cons tituição. os encantado s com a
social. cl:fesa dos direitos humanos, os poetas da clignidade humana? Porque
Um plano sem gastos, à base da boa vontade de pessoas interessada s nao levantam s uas penas e suas ,·ozes, nas revistas jundicas e nas salas
em rec uperar a dignidade humana de dez. cem, mil, quem sabe toda ele au la e porque não forçam s ua presença na imprensa geral. para lançar
RI VISTA OI lJIRl/TO e ONS TIi U( IONAI F IN I LRNACIONAI 20 1O- RD< l 7ll DOUTRII\A .'JACIONAL 81
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n grito de guerra contra a maldade. con tra a indignidade humana que Entendeu o Tribunal que ·a inlã ncia e a juventude passaram a
prevakce em todos os pontos fracos e delicados da República? contar com proteção integral. que ac; insere como prioridade absoluta,
Alguns dos que tanto en al teceram a Cons tituição começam a reco- garantindo. emrc outros, o dire110 a identidade , à convivência familiar e
nht:e.:e 1 que há um colossal h1alo entre o que consideram as prome<;c;ac; comuni1ári a. à ac;si<;lc>ncia 1wl,1c; pai<
da Cana e a realidade brasileira. Que a Constituição diz isto. promete A ementa do acórdão do llC 43 604. espelha com precisão a nova
aqui lo. exige aquilo outro, e nada se concretiza. Isto é assim simples- filosofia do STJ nesta matéria, que assim está redigida:
mente porque não se reformula a mentalidade de uma nação nem a · 1 - O ordenamento con'>t itucional de natureza pós-positivista e
desonestidade dos políticos mediante norma constitucional. A primeira principiológica . tutela a família . a infância e a adolescência. LUdo sob
exige educação e a segunda, cadeias. o palio da dignidade da pes~oa humana. fundamento jns-polflico da
Se as Co nslituições anteriores eram consideradas m eros pedaços República.
de papel, nada, absolutamemc nada aco nLeceu para que o mesm o não se
2 - Deveras, entreve nd o a importância dos laços socioafetivos
possa dizer desta atual. incorporou a família estável, 1ruto ele união espontânea.
7.6 Uma falsa aplicação ju risprudencial da dignidade humana 3 - Destane. inegável que a fa1111l ia hoje esta assentada na pater-
nidade soeioaíetiva por isso t1uc, absolutamente in<liferente para a
Já tive oportunidade de apontar como a falsa aplicação da dignidade manutenção do ítlho 1unto ao pai alienígena. a e,·emual dependenc1a
humana passou a influenciar a jurisprudência de nossa j ustiça federal, de
econômica; posto se sobrepor a dependência moral-afetiva.
maneira que acaba ferindo e não fortalecendo os princípios dos direitos
-l - Deveras, é asseme na Cone que "A vedação a que se expulse
humanos.
Em matéria de expulsão de estrangeiros, a lei protege sua família estrangeiro que tem filho brasileiro atende. não apena~ o imperativo de
brasileira quando tem cônjuge cio qual n ão esteja divorciado ou sepa- manter a convivência entre pai e íilho. mas um 0111 rock maior relevo. qual
rado de fato ou de direito e desde que o casamento tenha sido celebrado seja, o de manter o pai ao alcance <la cobrança ele alimentos. Retirar o
há mais de cincos anos, ou quando o expulsand o tenha filho brasileiro pai <lo território brasileiro é dificultar extremamente eventual cobrança
que, comprovadam em e estej a sob sua guarda e dele dependa economi- de alimentos pelo filho.··· (Grifei. Note-se a co n tradição entre os pontos
camente. Assim está definido no Estatuto do Estrangeiro - art. 75, Lei 3 e 4 da ementa. No primeiro sobrepõe-se o fator socioafelivo sobre o
6.815/1980. conforme redação introduzida pela Lei 6.964/1981. Mas o§ econômico, enqua m o no n. 4 o aspecto econômico é considerado de
l .º desre dispositivo - muito acertadamenle - acrescenta que não cons- maior relevo).
titui impedimento à expulsão a adoção ou o reconhecimento de filho Esta jurisprudência vem sendo reiteradamente confirmada pelo
brasileiro superveniente ao fato que motivou a expulsão. STJ. No dia 27.02.2008 foram julgados dois habeas corpus - 90.760 e
Assim comentei a recente jurisprudência brasileira. em arúgo 88.882 -. em que a tese exposta no HC 31.449 foi confirmada. Em um
publicado na RT, n. 880, às p. 56-59: destes julgamentos a tese foi repetida da seguinte forma:
··No HC 38.946. julgado em maio de 2005, foi con cedida a o rdem ·A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido da impossibilidade
em hipótese de filho havido posteriormen te ao ato delituoso e mesmo da expulsão de estrangeiro que tenha filho brasileiro dele dependente. O
ao decreto de expulsão. em que a Cone invoca o HC 31.449, no qual fundamento para a permanência do esLrangeiro no território brasileiro
foi inaugurada ·uma imerpretação mais ampliativa ao cerna em face da é a necessidade de proteção dos interesses do menor, sejam econômicos
legislação superveniente (Constituição Federal e Estatuto da Crianç~ ou afetivos. entendendo-se que a disposição consLante <lo art. 75. 1J.
e do Adolescente)', cu11duindo pela proibição do afastamento de pai h, da Lei 6.815/1980 (. .. ) deve sei intc1p1c1ada nn consonância com a
estrangeiro não apenas quanto à questão de ordem material e econômica. legislação superveniente especialmente com a CF/1988, a Lei 8.060/1990
mas, sobrerudo, ante a prevalência do interesse da crian ça em dispor da (ECA) bem como as convenções internacionais recepcLonadas por nosso
assistência afetiva e moral. o rdenamento jurídico. A partir dessas inovações legislativas. a infância e
REVISTA /)f /JIR/1/0 ( 0,\/\1 /WC/ONAI I /,'\'li R,1\1.'\C/ONAI 2010 - ROCI 70 DOU"TRI '<A NACIO'lAL 83
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a juventude passaram a contar com proteção integral que as insere como ave murns sexuais. Seguramen1 c serão tra tados com severidad e e sem
prioridade absoluta, garantindo entre outros, o direito à identidade, à concessões romanticas.
convivência familiar e comunilán a. à assistência pelos pais. (... ) Assim , Assim. um aspecto da nossa legislação de elevado s ignificado
busca-se resguarda r, além da subsic;1ência da c rian ça brasileira. a sua huma nit.àrio - a proteção ela íamflia do estrangeiro em detenninadas
convivência com a famflia·. 1•• hipóteses e o cuidado com a defesa do expu lsando - foi elevad o ao pa ro-
O STJ invoca a Constituição de J988, sem esp ecificar a que se x ismo da pós-moderna, pós-positiva proteção da dignidade ela pessoa
refere. Mas em dete rminados trechos dos acórdãos dos habeas corpus fica huma na, para proteger situações manifesta mente contra rias ao espirito e
evidem e que a referência é ao princípio da dignidade humana. inserida à letra do 1exto legal. cm mveis que o fende m os mais legítimos interesses
no arl. l."' da CF/L988, co mo um dos fundamentos da República Fede- n acio nais.
rativa do Brasil. Também não especifica a que convenções internacionais Com as devidas vênias ao E. Tribunal, esta me parece uma visão
está se referindo. provi.nciana cio direi1 0 que rege as relações transnacio nais. cm que
Con venhamos que este tratamem o da questão mui provavelmente acabamos protegendo os ma us filh os ele outras terras, à custa de nossa
levará criminosos com expulsão decretada a en contrar uma j ovem segurança. ele nossa tra nquilidade, d e nossa ordem pública, de nossa
ingênua. o u quiçá não tão ingênua assim, e com ela gerar uma crian ça, soberania n acional , que se expressa no dircn o ele recusar admissão c m
para ficar aqui e conúnua r com seu trá fi co d e drogas, com sua crimina- nosso terrilório de estrangeiros 1ndcscjaveis e na faculdad e d e ex pulsar
aq ueles que são noci\·os.
lidade.
No caso da jovem ingê nua, quem p rotege su a dignidade para que Note-se que o STF segue orie mação diversa . m antendo-se fiel
criminosos estrangeiros n ão se aproximem dela? aos requisitos do a rt. 75 da Lei 6.815/1980 ( Estatuto dos Estra n-
geiros), conforme vá rios julga mento::, reccnl es, entre os quais H C
O nde a dignidade das cria nças. in abscratum , a serem geradas como
94.896 (Dje 05.12. 2008), llC 82.893 ( DJ 08.04.2005) e llC 80.-+93 ( D)
consequência desta ingênua jurisprudê ncia?
27.06.2003).
Com o acreditar que o criminoso, que gera uma criança para evitar
expulsão do pais. terá com ela qualquer tipo de relação socioafetiva? 7.7 Reação iti icial dosju1istas brasileiros
Quem confia que ele sequer ajudará para o sustento desta criança?
Nos primeiros anos após a promulgaçao da Constituição não houve
Com todo respeito pelo STJ , trata-se de urna perversão da nossa esse a larde o timista que testemunhamos na última década e meia. Pelo
fé na dignidade da pessoa humana. Data ma.xi ma venia . trata-se de uma contrário a Carta foi recebida com frieza e críticas.
visão distorcida dos objetivos da legislação que protege a criança e o
Veja-se. por exemplo. n a obra coletiva editada por Fernando
ad olescente. W hitake r da Cunha, \llanoel de Oliveira Franco Sobrinho, Celso Albu-
Essa urna visão estreita que. no desiderato d e ajudar uma criança, qu erque Mello. Alcino Pinto Falcão e Arna ldo Sussekind. no vol. 1. a p.
abre as comportas para o nascimento de inumeras crianças a serem 108, o trabalho do segundo editor, q ue escreve em l 990 :
geradas pelos c1iminosos com expulsão decretada, que continuarão n a
''>la sucessão dos fatos. ao su rgir no Brasil um poder constituime
sua criminalidade e deixa rão mãe e filho ao desamparo.
instituído e não originário, repousado -;obre um Legislati vo já exis-
Estes criminosos devem ser devolvidos à terra em que nasceram e te nte, sua missão se ate,·e mais a revisar o a ntigo pacLO constitucio nal
fo ram criados, ao ambiente que os gerou e lá que cuidem dele e d e suas (1967/1969) que propriamente elaborar sistema novo no tocante à o rga-
nização esta tal.
Pode-se assim, conside ra r. a Carta de 1988, como um comp lexo ele
L. HC 90.760, l." Se1,:ào,j. 27.02.2008, rei. Min. Denise Arruda, DJ 17.03.2008, preceitos escritos que. m esmo com a rigidez das n ormas, substancial-
p. 1. No mesmo se n tido o 1!C 88.882, julgado e publicado no mesmo dia. mente não alterou a fi sionomia da nação, nem desconsiderou antigas
Rl·\f/STA D/ D/Rf/10( ON5/IIU(I ONAL I INII_R,,iA(/ 01\JAI 2010 RDU 70 DOU f RII\/\ 'SJACIONAI
84 85

normas principai s relativas ao poder soberano do Estado e os processo s também aponta para a necessida de de que a populaçã o geral seja educada
de imrgraçã ll federativa ." quan 10 aos d irei1os que lhe são constituc ionalmen te garantido s e como
E mais adiante, à p. l 25, o professor da Universid ade <lo Paraná C!>tcc; direitos podem ser implemen tado<;. Ac; pc"5oas precisam ser ensi-
faz referência ao principio cfa "dignida de da pessoa humana" sem fazer nadas ,1 valürizar e respeitar estes direitos. Quantias substanc iais de,cm
qualquer comemá no a respeito. ser dedicada s para que a assistênc ia legal aos indigentes e quase indi-
O Prof. Fábio Konder Compara to. em análise da parte econômi ca gentes seja verdadei ramente eficaz. Resumin do, diz. o mcs1re de Miami:
da Constitui ção de 1988, publicada no Thc American Jouma/ of Compa- "Sem um amplo comprom etimento social à noção de que os clircilos
raLivc Law, em 1990, diz em sua conclusã o. à p. 769 que: constitucionais individua is são da mais clc\'ada importân cia e de que
"O primeiro aspecto negativo é que um grande numero de seus um considerá vel investim ento cm íun<los, tempo e esforço coleli\'O deYe
preceitos são meramcm e retóricos . e nenhuma atenção foi prestada ao ser dedicado à proteção destes direitos, a concretiz ação cios imprcssiv os
rroblema de ~ como devem ser impleme ntadas. Os legis ladores no esforços dos redatores desta Cons1itu ição para respeitar os direitos
Brasil têm a convicçã o de que os problema s sociais podem ser resolvido s humanos fundamen tais não serão hem sucedido s" (Keith Rosenn A
simplesm ente através da promulga ção de leis, sem necessida de de imple- Compari son of lhe Prolcctio n of lndividua l Rights in 1he New Con~li-
mentá-la s através de polflicas publicas. Na realidade , a lei pode até ser tutions of Colombt a and Brazil. Thc Unil'crsity of 1\!fia111i l11tcr-A111e, icw1
law Rcview . 1992. p. 690).
um obstáculo , ao invés de uma solução."
Em ou1ro trabalho publicad o oito anos mai~ 1arde, o Prof. Rosenn
7.8 Uma abalizada opinião estrangeira transcrev e um trecho da Re,·ista \k:jn que narra como a policia paulis1a
puniu 5 J presos encarcera ndo-os cm urna diminuta cela, resultand o na
O Brasil coma com bo ns amigos no exterior. Destaca-s e a figura
morte de 18 deles por asfixia , e cscreYc:
de Keith Rosenn, professor da Universi dade de \iliami, que acompan ha
muito de perLo a evolução do direito e dos fenômen os políticos de nosso "Tortura e maus tratos de criminos os comuns são uma realidade
país, tendo publicado inúmeros trabal hos sobre estes temas. em muitas delegacia s de polícia e prisões no Brasil apesar das formais
garantias constituc ionais. A discrimin ação racial e sexual também são
Com relação à Constitu ição de l. 988, já em 1990 escrevi.a:
fatos da vida de todo dia. Transfon nar os direitos que figuram no papel
·' Paradoxa lmente, apesar do grande detalham emo em que muitas em realidade não é tão somente obngação das cones. Também é obri-
áreas foram reguladas . um vasto volume de legislação precisa ser apro- gação dos governos federal. estadual e municipal. Requer uma mudança
vada a fim de fazer com que a no"a Constitu ição do Brasil se tome eficaz. na cultura dominan te com relação aos direitos daqueles que vivem à
De acordo com Saul o Ramos, Ministro da Justiça n o regime de Samey, a margem da sociedade . Há sinais encorajad ores. mas a tarefa será prova-
Constitu ição exige a aprovaçã o de 285 leis o rdin árias e 41 leis comple- velmente lema e ardua·· (Keich Rosenn, Judicial Review in Brazil: Dcve-
mentares a fim de efetivar suas disposiçõ es (Ramos, ·A honra substabe - lopments Under the l 988 Constitu tion. So 111hwestenijournal of Lc,w anel
lecida'. Fo//rn de Sào Paulo, 16.09.1990). Este o resultado da natureza Tradc in Lhe Américas, 2000. p. 29 l e ss.)
programá tica e po lemica de muitas de suas provisões ; somente pelo
adiament o dos detalhes para a legislação futura a Assemble ia Consti- 8. Cü\JCLUS AO
LUintc pode completa r a Constilui çào'' (sic) (Keith Rosenn, Brazil's New
Constitut ion: na excrcise in transient constitut ionalism for a transilion al 8.1 Meu conceito de dignidade Jwmw1a e minha discordância dos pós-
tudistos
society, The Amencan Journal of Cn111para1ive Law, 1990, p. 778).
Em 1992 escrevia sobre a necessida de de fazl'.r investim entos subs- O respeiLo pela d ignidade da pessoa humana emana do coração
tanciais para elevar o nfvel da polícia e melhorar seu treiname nto, pois das pe~soas bem formadas . daqueles que 1êm respeito pelo ouLro, ni\o só
forças policiais mal financiad as e pobreme nte u·einadas não consegue m respeito, mas amor, e não há lei nem Constitui ção que faça os homens se
enfrentar os elevados níveis de criminali dade no país. O Prof. Rosenn respeitare m e se amarem, que leve os go\·ernos a colocar. ante~ e acima de
O - R/)(1 70 OOUTRl'\JA NACIO'- AL 87
86 Rf VfüA D/ D/RI/TO (ON5TI fUCION AI I IN li R,"''AC/0,',',\I 201

sua essên cia visa ga rantir a j ustiça, como formula do por li piano
outro, - sem
tudo, a efetiva materiali zação deste valor maior - a dignida de do outro, não há
a d ignida de elo diferen te. da o utra classe social, da outra raça, da ou tra a lOlerân cia pelo outro e sem o respeito pelo que é do
Kelsen ,
etnia, da outra naciona lidade. d a outra re ligião, de pen sament o diverso , vida individ ual cm paz com o universo. como fomm lado por
o da
de cultura d lferem e, <lt: costum e:., vestime ntas cliferen c1ad os. sem a compreensão pelas necessi dades do coleti vo e de cada membr
e até
coletiv idade, mensag em de que o direiw pode ser u ma norma fria
Em ·' Direito e a mor·· - aula ina ugural na f ac uldade de DireiLO da que a
crue l quando d esves1id o do espírito que o vivihca, mensagem de
U ERJ proferid a em 24.03. 1994 - eu disse. entre ou 1ras coisas: não só
e convivência huma na em h ar monia e tra nqu il idade requer a lma e
''A letra da lei, a téc nica legifera nte, pode tud o, pode inclusiv apenas regras. q ue o respeito pelo al heio - base
legaliza do, no rma, amizad e e não
criar um código assassi no, uma ordem sangui nária, o terror s human as - não é alcançá \'el sem am or pelo
os fu nda mental das relaçõe
a pervers idatlc pla nejada para ser sistema li came111 e executada. Nós, vao se unir as lições religios as do j udeo-
nhamo s em nossa vi da com um semelhante. Nesta mensag em
mais velho:, neste auditór io, testemu numa
o mais cristian im o, a fi losofia dos g regos. o cspirito jurídic o dos romano s,
povo tido como o mats civilizado, o mais culto. o mais estudio so, que a nós todos cabe materia lizar
p reciso. montou por meio de leis e magrnfica con fl uência de propós itos
sofisticado, jurid icamen te o mais profissi onal. trazend o nossa
, da qual, o uçam-m e bem , parti- em nossas vidas privada s e em nossa atuação
decreto s, a mais desuma na farsa j urídica
ica e. para nosso horror, colaboração pani uma \·ida erigida sobre n Dire ito e o Amor··.
cipou pra ticamen te toda a socieda de germân
grande pa rte cJe seus juris1as, dos seus professores de direito. seu
m in is- Portam o não e uma palavra mais, um parágrafo adicion al em urna
ade
tério publico , e seus magistrados. Constit uição que irão mudar a mentalidade, a d ispo:,ição, a capacid
, a 1oleràn cia, a amizad e, o amor
e pa ra o bem nu para o mal. O espírito
O assassin ato frio de u m milhão de crianças. a tortura lenta ão que
nas instilad o n o coração dos homen s e das mulheres é a u nica condiç
.ine narráve l de jovens e velhos submet idos às mais brutais e desuma de uma nação e no seu
cas nos assegura a tranq uilidad e na vida interna
experiê ncias biológicas. a dcslrui ção d e milhares de tem plos e bibliote da terra.
velhos e infante s cm carros hermet icamen te relacio na men to com os outros povos
ce ntenári as, o transpo n e de
fechado s durant e dias e n oites, sem luz. sem água, quase sem ar, através O aprend izado do respeit o pelo outro começa na família, qu a ndo
sados,
das ferrovia s europeias rumo a Auschw iLz e aos campos de exterm
ínio, bem esLruturada e portado ra de tradição vinda ele seu s antepas
utaram na escola da digni-
tudo plan ejado e executado de aco rdo com ordens , regulam entos ou quando formada por pais que se amoed
recfpro ca continu a
emanacJos das mais allas esferas de um governo q ue tecnicamenle
tivera dad e. A formação n o convív io sadio e de colabor ação
de Nurem berg, que no jardim d e infância, n a escola elemen tar, em sa la de au la, quando
origen s Lfcitas, que tudo ar4uite tou pa rtindo das Leis
tar
o rdenara m a discrim inação, a destruição a d esnacio nalizaç ão, a d esu - conduzida por mestres conscie nciosos e idealistas e vai se comple
formad os na
maniza ção. Tudo inspira do numa teoria politica destituC da de qu alquer na Uni versida de, quando dirigid a por homens e m u lheres
aris10-
sentim e nto , uma lei sem human idade, um Direito sem Amor. academ ia que ensina a modéstia platô nica, o orgulho no saber
ão da
Os mais jovens neste auditório muito pouco sabem da terrível télico. o respeito pela religião do outro, e acima de tudo a valoraç
capacid ade huma na no saber, no fazer, no dar. no contrib uir, na solida-
não
catástro fe que se abateu naqueles negros anos da década de 40.
man chou a cristan dade e maculo u riedade, e na luta pela mo ralização da coisa pública .
apenas sobre o povo judeu , eis que
a human idade, que perman eceram silente s e inertes diante da p erversi- Há algo que flui ele nossa herança antiga, tornand o. apenas como
dade sádica de um povo animalizado. Ide assistir a esla peça cin emato- ilusLraç ão a famosa dieta de t.:lpiano: Turis praccpw sw11 ltacc: lwncste
s
gráfica criada pelo gênio hollyw oodia no e tomai conhecimento de
quão vii cre, altc111111 1wn lacdcrc, suum rniquc lribuere. ou seja "os p rincípio
.
baixo o hom em, u ma nação podem descer. juntam ente com seu direito, bãsicos do d ireito são: viver honesta mente, não prejudicar a outrem
seu
quando esquecem a mensag em de H.illel, incorpo rada por Cristo,
como atribui r a cada um o que é seu". Os j udeus pautara m sua \ida,
signi-
fundam ento do Direito . direito, inspira dos no coman do b1blico: 1•cassita hayasha, v·t,atov,
justo e bom··, corresp ond ente ao c,eqao <'l bmw dos
Gostaria de d eixar esta mensag em aos jovens qu e estão no process
o ficando, ·'farás o que é
ilu minara m a história do direito através de
de iniciação para uma vida ligada ao direito: não há direito - que em romano s. conceit os estes que
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todos os seculos. Como então i.e pode escrever que o pós-positivGmo se
sernclh::rntes, por mais diferent es que sejam. enfim, que reconhece e
caracter iza pela rcaprox imaçà() entre o direito e a ética? A ética. a moral: respeita a dignida de humana .
sem pre acompanharam o direito aturalm eme que não falamos aqui
da relação emre a majestad e real. a elite feudal e o populac.ho, mas das 8.3 Dignidade papal
normas básicas do direito romano , do direito canônic o e do 111s commune
que a mbos formaram. como vi mos neste trabalho. O divórcio do direito Para 05 que querem conhecer a verdadeira face da Igreja Católica,
germâni co nazista de tudo que é huma no_ não ocorreu simplesm eme especial mente no seu relacion amenro com os judeus. recomen da-se acima
por falta de ética na lei, mas por algo mais íundam e1~tal - a falta d e de todas as obras publicadas no pós-gue rra. A espada de ConsLanti110 - A
amor, de compree nsão, de tolerânc ia, e foi uma fase rápida e_ local_mente Igreja e osj11dcu.s, deJamc s Carroll. De família extrema mente inserida no
concent rada dentro do penodo que os pós-positivistas class1ficanam d e catolicismo, James serviu por longo tempo como padre e. mesmo depois
positivis mo, modern ismo, seja lá o que preferire m ... Por outro ~ad~, d_e de ter abandon ado a batina , manteve-se fiel e leal à sua Igreja, adoland o
tudo que vemos ao nosso redor, chegam os à conclusão que a md1gm- uma atitude verdadeira. critican do todos os pecados cometidos ao longo
dade que impera atualme nte nas relações entre os governo s e os povos de 17 séculos, desde a oficialização da religião catolica pelo Imperad or
da maio r parle do globo terrestre , as discrim inações , as matanças. os Constan tino, alé os dias atuais.
genocíd ios nos mostram um mundo de '.otal incügnidade ~~~ana. Um Em seu volumos o lbno, disserta sobre a atuação do Cardeal Ângelo
mundo sem a mcrnlr parcela ele ética. E ~ isto que o pós-p os1t1v1srno quer Giusepp e Roncalli durante a Segunda Guerra \iiundial , narrand o como
se atribuir ? ele. na posição de núncio apostóli co na Turquia , con cedeu certidõe s
de batism o a milhare s de judeus que fugiam da persegu ição nazista ,
8.2 O amor salvand o-lhes a vida (Co11sta nti11c'.s 511'ord, p. 37). Mu itos anos depois,
sentado no trono de Paulo, como Papa joão XXl!I, recebeu no Vaticano
"O amor não é a relação para com uma pessoa específica; é uma
o escritor Jules Isaac que publicara Jesus e Israel, um estudo sobre a
atitude uma orientaç ão de caráter que determi na o relacionamento
conexão enlre a fundam ental crença cristã, especialmente como canoni-
de um; pessoa para com o mundo como um tod o, não em direção a
zada nos Evangel hos, e o cndemic o desrespe ito pelos judeus na Europa,
um ·objeto' de amor. Se uma pessoa ama somente uma outra pessoa e
que ati ngiu seu chmax com o program a de Hitler. O livro de Isaac desafia
permanece indiferen te para com o resto de seus semelha ntes, s_eu amor
presunç ões básicas d o cristiani smo e repudia a caricatu ra do judaísm o
não é amor. mas uma ligação simbiõn tica ou um egoísmo ampliado. No encontr ada nas fontes calólica., Contra riament e à posição negativa de
entanto , a maioria das pessoas acredita que o amor é constitu ído pelo muiws catolicos em relação a Isaac, o Papa convido u-o ao Va ticano e
objeto. não pela faculdad e. Na realidad e. até a~redita m qu_e é prova da com ele teve bom entendi mento, ouvindo do escritor a sugestão de que
intensid ade ele seu amor quando não a mam nmguém a n ao ser o ente fossem corrigidos os ensinam enlos antijuda icos da Igreja. Dois anos mai!:.
·amado·. lsto é uma falácia porque a pessoa não vê que o amor é uma tarde. em 1962, o Papa João XXII! convoco u o Conselh o do Vaticano, ao
atividad e, um poder da alma, as pessoas acredita m que só é necessário qual compare ceram 2.600 bispos, ocasião em que foi apresen tado pelo
encomrar O objeto certo - e que tudo marcha sozinho depois. ( ... ) Se eu chefe d a lgreja o famoso docume nto Nostra Actatc ("Cm nosso tempo"')
realmen te amo uma pessoa. cu amo todas as pessoas, eu amo o mundo, que inclui as seguinle s palavras:
eu amo a vida. Se cu consigo dizer a alguém ·Eu te amo' devo poder dizer:
'·Consid erando que o pa trimônio espiritual comum de Cristãos e
'Eu amo em você todas as pessoas. eu amo através d e você o mundo, eu
Judeus é tão grande. este sagrado sín odo deseja promo\' er e recomen dar
amo cm você também a mim mesmo'" (Erich Fromm, The Art of Loving,
o entendi mento e respeito recíprocos, que são fruto , acima de tudo, dos
Bantan Eclitio ns, p. 39). estudos bíblicos e teológicos e do diálogo fraterno".
Esse O amor que deve marchar junto com o direito, que respeita
O docume nto ainda d eclara que: "Apesar da Igreja ser o novo povo
a individu alidade. a diferença, a especific idade de cada um de nossos
de Deus. o~ J uclcus não devem ser apresen tados como repudia dos ou
">a~rada<i
m o se tai s po siç õe s <lccorn:ssc111 du.,
Deus co apu<l
am ald iço ad os po r Ab bo t, Do cu me nts oj Vatican ll, 66 6
Es cr itu ra s" (;,.;ostra
Aetace. em
l. p. 38 ). sa nt a da s
Ja m es Ca rro do rit ua l da sexta-feira
no u a re tir ad a
Jo ão XXlll or de pérfidos··).
jo ra tiv as ao s ju de us ("infiéis e
re fe rê nc ias pe do jo ão XX lll
l (p . 55 0) o gr an de m om en to qu an
Na rra Ja m es Ca rro Vaticano.
aç ão ele jud eu c:; qu e ,·eio visitá-lo no
de leg
recebeu a pr im eir a ião:
id ad e na qu ela ocas
Assim agiu a Sa nt
Su
no pa pa l e se nt ou -s
e em
u Jo sé , vo ss o irm ão '· . de sc eu do tro
'·Eu so tes .
. ao lad o do s vi sit an
um a ca de ira simples . re pl eto de dr am ati
cid ad e e do
ex tra or di ná rio
Este um m om en to elevada e
a ele tri za nt e ma ni fe sta çã o da mais
o, um es sa
ma is alt o significad eir o am or qu e atr av
id ad e hu m an a , in sp ira da no ve rd ad do s os ho m en s
no br e di gn a pa ra to
nte ira s. ra ça s e rel igiões, um a es pe ra nç
to da s as fro
em ne ste pl an eta .
e m ul he re s qu e \'iv

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