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08/02/2020 DIREITO PENAL I

Capítulo 1: Parte 1

Capítulo 1

A Ciência Penal

A Ciência Penal
1.1 História do Direito Penal

Desde a Antiguidade até hoje verificamos grandes mudanças nos institutos criminais. Se analisarmos

a pena, por exemplo, podemos traçar a seguinte evolução: perda da paz ou vingança indeterminada,

vingança limitada pela lei do talião, composição voluntária, composição legal e pena pública (BRUNO,

1956, p. 70 e 71).

Conforme ensina Aníbal Bruno, nas sociedades antigas, onde ainda não havia um órgão que

exercesse a autoridade coletiva, o respeito às normas era baseado no temor religioso ou

até mesmo mágico. E a punição, que era a vingança, visava aplacar a ira dos deuses

(BRUNO, p. 66).

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ACapítulo 1: Parte
religião sempre esteve 1
muito presente no Direito Penal. Algumas normas podem servir de

exemplo: Leis de Manu, Índia, sécs. 12 ou 13 a.C., e Pentateuco ou Torá, dos hebreus, 1250 a.C. Até

hoje normas com cunho religioso são utilizadas pelo Direito Penal de inúmeros países, em especial

os orientais.

BIBLIOTECA

Vigiar e Punir, Michel Foucault. Publicado originalmente em 1975, na França, é dedicado à

análise da vigilância e da punição, que se encontram em várias entidades estatais (hospitais,

prisões e escolas). Leva à discussão sobre os suplícios, a tortura e as formas modernas de

prisão.

VÍDEO

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Capítulo 1: Parte 1

1:39 / 2:43

O segredo dos seus olhos, direção de Juan José Campanella, 2009. O filme trata de um crime bárbaro,
levando à reflexão sobre punição estatal, proporcionalidade e vingança privada.

Remontando às sociedades mais primitivas, a vingança privada era um ato de guerra entre tribos e

não uma pena (BRUNO, p. 68). Entre os membros do grupo a pena era a expulsão, e essa pena

equivalia à pena de morte, pois dificilmente o indivíduo conseguiria sobreviver fora dos domínios de

proteção e cooperação de seu clã.

Procedendo dessa maneira poderia haver a completa dizimação de grupos inteiros. Surge, assim, a

lei do talião, visando aplicar certa proporcionalidade ao Direito Penal. Como exemplo, podemos

citar o Código de Hamurabi, Babilônia, 2.083 a.C.

Da vingança o Direito Penal evoluiu para a composição. Por esse método o autor do delito

“comprava” a sua liberdade. Em vez da vingança de sangue era oferecido um valor sufi ciente para

“cobrir” os danos sofridos pela vítima.

CURIOSIDADE

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Capítulo 1: Parte 1
Porém, todos esses métodos são de ordem privada. Com a evolução social e uma maior organização

estatal, aproximadamente a partir do séc. XII, o Estado afastou a vingança privada e assumiu o

poder-dever de aplicar a vingança pública. Torna-se dever do Estado manter a ordem e fazer

justiça.

As partes envolvidas perdem o direito de buscar por si próprias uma solução. A nova postura é

submeter-se a um poder externo, que é o Estado. Este substitui a vítima durante o processo.

Até o advento do período humanitário, essa justiça


estatal era marcada pela in uência religiosa, pela
arbitrariedade dos processos e pela crueldade das
penas.

Durante a Idade Média e a Moderna, o direito visava a proteção do príncipe e da religião. Suas

práticas eram baseadas no arbítrio e na crueldade, criando uma “atmosfera de incerteza,

insegurança e justificado terror” (BRUNO, p. 86). O direito era instrumento para que a nobreza e o

clero permanecessem no poder político e econômico.

“ A ausência de proporcionalidade ou respeito à dignidade humana era vista na

desigualdade de punição entre nobres e plebeus, na indeterminação das penas e

na definição dos crimes, na falta de publicidade no processo, na ausência de

defesa e nos meios inquisitoriais.

— (BRUNO, p. 86)

Esses excessos criaram na consciência comum a exigência da imediata reforma das leis penais, e

assim inicia-se o período humanitário.

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Capítulo mais
Personagem 1: Parte 1 desse período é sem dúvida Cesare Beccaria, que publicou em 1764 a
importante

obra Dos delitos e das penas. Essa obra é um marco no Direito Penal, pois visava romper com o

direito vigente, baseado em suplícios e no arbítrio dos reis.

BIBLIOTECA

Dos delitos e das penas, Cesare Beccaria. A obra é um marco do Direito Penal, rompendo com

a arbitrariedade e a crueldade e abrindo as portas para o período humanitário.

Vivendo sob a égide do Iluminismo – de cunho racionalista e jusnaturalista – podemos afirmar que

Beccaria sofreu a influência de filósofos como Locke, D’Alembert, Diderot, Hume, Montesquieu,

Rousseau e Voltaire.

Beccaria propunha um direito baseado no respeito


à personalidade humana. Ele defendia a
elaboração de leis claras e precisas, penas
proporcionais e o m da pena de morte e da
tortura.

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Capítulo
As 1: Parte
ideias de Beccaria 1 aceitas e incluídas, mesmo que de modo ainda embrionário, na
foram

legislação de diversos países, como Rússia (1767), Toscana (1786), Áustria (1787), França (1791 e

1810) e na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) (FRAGOSO, 1959, p. 43 e 44).

CURIOSIDADE

1.1.1 História do Direito Penal no Brasil

O Direito Penal brasileiro sempre recebeu influência do direito penal europeu, em especial dos

italianos e alemães.

O Livro V das Ordenações Filipinas, de 1603, foi a legislação penal utilizada no Brasil

durante o período colonial. Essa legislação refletia o espírito dominante à época, que não

distinguia o direito da moral e da religião.

Outra característica das Ordenações é a extrema crueldade das penas, que também eram

um reflexo da época, duramente combatida por Beccaria e outros iluministas.

CURIOSIDADE

VÍDEO

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Capítulo 1: Parte 1

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Milk, direção de Gus Van Sant, 2008. É baseado na vida do político e ativista gay Harvey Milk, que foi o
primeiro homossexual declarado a ser eleito para um cargo público na Califórnia. O filme mostra a luta e o
preconceito sofrido pelos homossexuais quatro séculos após as Ordenações Filipinas.

No Brasil temos o exemplo de Tiradentes, que foi condenado à morte pelo crime de lesa-majestade,

e, após ser enforcado, teve seu corpo esquartejado e seus membros fincados em postes e colocados

à beira das estradas como “exemplo” para os demais súditos da coroa. Era a intimidação pelo terror.

O Direito Penal desse período era visto como primeira ou única opção. As condutas hoje abarcadas

por outras áreas do direito, como o administrativo ou civil, recebiam tratamento penal. Ex. Título

LXXXI – Dos que dão música de noite (pena de prisão por 30 dias, multa e perda dos instrumentos

musicais e armas).

Outra característica que merece ser comentada é a


interferência da qualidade do autor na de nição da
pena.

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Capítulo
Ex. 1:–Parte
Título XXXIII 1 e mulheres solteiras. A pena era de açoite, multa e degredo para a
Dos rufiões

África. Porém, se o homem fosse escudeiro, a pena seria de multa e degredo para fora da vila. Resta

assim evidente o total desrespeito ao princípio da igualdade.

SAIBA MAIS

Uma questão que deu margem a dissídio no Parlamento durante a aprovação do projeto foi a pena

de morte (na forca). Os conservadores queriam mantê-la no Código, e os liberais, extirpá-la.

Venceram os primeiros, sob o argumento de que os escravos não temeriam nenhum outro castigo.

Não obstante os elogios recebidos, esse Código mantinha resíduos de uma sociedade escravocrata.

A crítica da sociedade da época era que o caráter liberal do Código contribuía com o aumento da

criminalidade, o que levou à posterior elaboração de leis de cunho retrógrado, principalmente

contra escravos (TOLEDO, 2002, p. 59).

Com o fim da escravidão e o advento da República, novamente se fazia necessária a ruptura com o

velho, e, assim, a elaboração de novos diplomas legais. Em 1890 foi promulgado o Código Penal,

antes mesmo da primeira Constituição da República, promulgada apenas em 1891.

Ao contrário do Código Criminal do Império, o Código Penal de 1890, foi elaborado às

pressas, e apresentava, além de defeitos técnicos, um posicionamento atrasado em face da

ciência de seu tempo.

Não obstante as críticas, cabe ressaltar que esse código aboliu a pena de morte e instalou o

regime penitenciário de caráter correcional.

Tendo em vista as sucessivas alterações processadas no texto do código, em 1932 foi

adotada a Consolidação das Leis Penais de Vicente Piragibe, publicadas sob a denominação

de Código Penal Brasileiro, pelo Decreto nº 22.213/1932.

Entre o final do séc. XIX e início do séc. XX houve um grande desenvolvimento da ciência penal.

Muitos conceitos haviam sido discutidos e estabelecidos e novamente se mostrava necessário um

novo Código. O Código Penal de 1940 foi originado no projeto de Alcântara Machado, revisado por

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uma Comissão de que participavam Nelson Hungria, Roberto Lyra, Costa e Silva, entre outros. O
Capítulo 1: Parte 1
Código foi inspirado no Código Rocco de 1930, porém sem adotar a pena de morte e de prisão

perpétua, e no Código Suíço de 1937.

Nasce no período entre guerras, em pleno Estado Novo, de índole ditatorial, onde

Getúlio Vargas detém os Poderes Executivo e Legislativo. Mas, conforme leciona

Francisco de Assis Toledo (TOLEDO, p. 63), “o curioso é que, fruto de um Estado Ditatorial

e influenciado pelo código fascista, manteve a tradição liberal iniciada com o Código do

Império”.

Em 1984, a Lei nº 7.209 substituiu toda a Parte Geral do Código Penal, alterando profundamente

certos institutos como o erro, as penas e o concurso de agentes. Com o advento da Constituição

Federal em 1988, houve outras alterações e adequações, como a Reforma no Título dos Crimes

contra a Dignidade Sexual, visando obedecer aos novos preceitos constitucionais.

CURIOSIDADE

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BIBLIOTECA
Capítulo 1: Parte 1

Jornada pela Liberdade (Amazing Grace), direção de Michael Apted, 2006. Filme sobre a

campanha contra a escravidão liderada por William Wilberforce, um famoso abolicionista inglês,

responsável por levar ao Parlamento Britânico a legislação antiescravagista.

12 Anos de Escravidão, direção de Steve McQueen, 2013. Adapta a autobiografia de 1853 de

Solomon Northup, um negro livre nascido no Estado de Nova Iorque que foi sequestrado em

Washington, D.C. em 1841, e vendido como escravo.

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Capítulo 1: Parte 1

Amistad, direção de Steven Spielberg, 1997. Após uma rebelião, um navio negreiro é tomado

por seus escravos. Capturados, param em terras norte-americanas, onde geram uma enorme

discussão jurídica sobre posse, abolição e liberdade.

A Vida de David Gale, direção de Alan Parker, 2003. Advogado e ativista contra a pena de

morte, é preso, acusado de estuprar e assassinar uma colega. No corredor da morte, ele pede

que uma jovem jornalista faça e publique sua última entrevista.

1.2 – Controle Ssocial, Ciências Penais e Estado Democrático de Direito

O controle social pode ser formal e informal. O informal é aquele aplicado pela família, escola, igreja,

partido político, opinião pública, vizinhos, clube. Nem sempre será suficiente para solucionar

conflitos mais complexos ou graves.

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Capítulo
Das 1: Parte
necessidades 1 decorrentes da vida em sociedade surge o Direito, que visa garantir
humanas

condições indispensáveis à coexistência pacífica.

O fato que contraria a norma legal, ofendendo ou pondo em perigo um bem jurídico tutelado, é um

ilícito jurídico e poderá ter consequências em vários ramos do Direito.

O Direito Penal constitui uma das espécies do


sistema de controle social formal. Possui regras e
princípios especiais, devendo ser utilizado apenas
como ultima ratio, ou seja, para os casos de
ofensas graves aos bens jurídicos fundamentais,
os mais sensíveis à sociedade.

Os princípios penais decorrem da Constituição Federal de 1988 que deu forma, na República

Federativa do Brasil, a um tipo de estado designado como Estado Democrático de Direito.

“ A Constituição Federal estabelece como fundamento do Estado Democrático

de Direito a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III). No art. 5º determina

que são invioláveis os direitos à liberdade, à vida, à igualdade, à segurança e

à propriedade.

— 

Dessa forma, a limitação a esses direitos ou garantias constitucionais somente se justifica quando a

ofensa ou a ameaça sejam proporcionais à intervenção do Direito Penal e a aplicação da pena ou

medida de segurança.

CURIOSIDADE

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Capítulo 1: Parte 1

1.3 – O Direito Penal


1.3.1 Conceito, Características e Funções

CONCEITO

O Direito penal é o ramo do direito público que se encarrega de selecionar condutas atentatórias

aos mais importantes bens jurídicos — justamente aqueles considerados essenciais para a vida em

sociedade —, sancionando-as com uma pena criminal ou medida de segurança. Tem por função

primordial servir como modelo orientador de condutas adequadas, promovendo o normal

funcionamento da vida em sociedade.

1.3.2 Fontes

As fontes do direito subdividem-se em fontes materiais, substanciais ou de produção e em fontes

formais, de conhecimento ou de cognição.

As fontes materiais indicam o órgão encarregado da produção do direito penal. Em nosso

ordenamento jurídico, somente a União possui competência legislativa para criar normas penais (CF,

art. 22, I).

ATENÇÃO

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Capítulo 1: Parte 1

Apenas a União, por meio do Congresso Nacional, é autorizada a legislar sobre o Direito Penal. Isso

significa que os governadores e prefeitos não podem criar novos crimes ou revogar os existentes.

Note-se que o parágrafo único do dispositivo constitucional citado prevê que lei complementar

poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas acerca de matérias penais.

"Não há crime sem lei anterior que o de na,


nem pena sem prévia cominação legal" (CF, art.
5º, XXXIX).

As fontes formais, por sua vez, subdividem-se em imediatas e mediatas.

Fonte formal imediata

Somente a lei pode servir como fonte primária e imediata do direito penal, porquanto não há

crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal (CF, art. 5º, XXXIX, e

CP, art. 1º).

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Fonte formal
Capítulo mediata
1: Parte 1

Tais fontes formais sofrem importante limitação como decorrência do princípio da legalidade (CF,

art. 5º, XXXIX, e CP, art. 1º). Não se admite que de seu emprego resulte o surgimento de crimes não

previstos em lei ou, ainda, a agravação da punibilidade de delitos já existentes. Os princípios gerais

do direito e os costumes, portanto, somente incidem na seara da licitude penal, ampliando-a. Os

trotes acadêmicos, por exemplo, traduzem uma prática reconhecida e costumeira, de modo que

possíveis infrações, como injúria (ex.: referir-se ao calouro como “bicho”) ou constrangimento ilegal

(ex.: obrigar o novato a fazer “pedágio”), são consideradas permitidas à luz do art. 23, III, do CP

(exercício regular de um direito).

CURIOSIDADE

Os costumes, além disso, representam importante recurso interpretativo, sobretudo no tocante aos

elementos normativos presentes em alguns tipos penais (p. ex., a expressão “ato obsceno” no art.

233 do CP).

Anote-se também que os costumes não revogam lei penal (art. 2º, § 1º, da LINDB).

1.3.2.1 Analogia em Direito Penal

CONCEITO

A analogia é uma forma de suprimento (preenchimento) de lacunas (brechas) legislativas. Consiste

em “aplicar, a um caso não contemplado de modo direto ou específico por uma norma jurídica, uma

norma prevista para uma hipótese distinta, mas semelhante ao caso não contemplado” (DINIZ, Lei de

Introdução às Normas do Direito Brasileiro, p. 108).

REFLEXÃO

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ACapítulo 1:deixar
analogia visa Parte 1
o Direito mais justo? Imagine a seguinte situação: o art. 128, II, do CP admite o

aborto praticado por médico em caso de estupro. No caso do aborto realizado por enfermeiro,

havendo a impossibilidade de atendimento médico, há o crime?

Para utilizá-la, portanto, é preciso que se verifiquem dois pressupostos:

1º) existência de uma lacuna na lei;

2º) encontro no ordenamento jurídico de uma solução legal semelhante, vale dizer, uma regra

jurídica que tenha sido estipulada para regular caso análogo.

Funda-se a analogia no princípio ubi eadem legis ratio, ibi eadem dispositio.

Em direito penal, contudo, somente se admite a analogia in bonam partem, ou seja, aquela utilizada

em benefício do sujeito ativo da infração penal. Exemplo: o Código Penal somente autoriza a reação

em estado de necessidade, afastando o caráter criminoso da conduta, se o sujeito busca afastar um

perigo “atual”, nada dispondo sobre a excludente de ilicitude se o agente visava escapar de um

perigo “iminente”; este, contudo, também se considera abrangido pela norma permissiva, por

analogia in bonam partem.

Proíbe-se, de outra parte, a analogia in malam partem, isto é, em prejuízo do sujeito ativo da infração

penal, justamente por importar a criação de delitos não previstos em lei ou no agravamento da

punição de fatos já disciplinados legalmente, atentando contra o princípio da legalidade. Acompanhe

os exemplos: o art. 63 do CP defi ne como reincidente aquele que comete crime depois de ter sido

condenado com trânsito em julgado por outro crime, no Brasil ou no estrangeiro.

O art. 7º da Lei das Contravenções Penais, por sua vez, estipula ser reincidente o agente que pratica

uma contravenção penal depois de ter sido condenado definitivamente por outro crime, no Brasil ou

no estrangeiro, ou por outra contravenção penal no Brasil.

Na combinação dos dispositivos nota-se uma lacuna: não é reincidente o autor de um crime

praticado após ter sido ele irremediavelmente condenado por uma contravenção penal. Em

suma, se o agente for condenado de modo definitivo por uma contravenção penal e, após,

cometer outra contravenção, será reincidente, mas, se praticar um crime, será primário!

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Capítulo
Tal 1:legislador
omissão do Parte 1gera uma situação injusta, que não pode ser corrigida pelo emprego da
analogia, causando reincidência em ambas as situações, sob pena de agravar a punição de um fato

sem expressa previsão legal.

Há duas espécies de analogia:

1ª) analogia “legis”: dá-se com a aplicação de uma norma existente a um caso semelhante;

2ª) analogia “juris”: ocorre quando se baseia num conjunto de normas, visando retirar

elementos que possibilitem sua aplicabilidade ao caso concreto não previsto (p. ex. trata-se do

encontro e aplicação de princípios gerais do direito).

BIBLIOTECA

Última parada 174, direção de Bruno Barreto, 2008. Conta a história de Sandro, morto pela

polícia quando sequestrou o famoso ônibus 174, no Rio de Janeiro. Mostra a história por outro

ângulo, contando a vida de Sandro desde o nascimento até o dia do crime. Esse olhar é comum

na criminologia.

1.3.3 O Direito Penal e as demais Ciências Jurídicas

O Direito Penal é apenas um dos objetos de estudo das Ciências Penais. Há a dogmática penal, a

criminologia, a política criminal, psiquiatria e psicologia forense, dentre outras.

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Capítulopenal
Dogmática 1: Parte 1
é a “disciplina que se ocupa da interpretação, sistematização e desenvolvimento (...)

dos dispositivos legais e das opiniões científicas no âmbito do direito penal” (Claus Roxin,

Funcionalismo e imputação objetiva no direito penal, p. 186-187). Este livro, portanto, representa um

trabalho eminentemente relacionado à dogmática penal.

“ “A criminologia tradicional é uma ciência que procura uma explicação causal do

delito como obra de um autor determinado” (Enrique Bacigalupo, Direito penal:

parte geral, Capítulo I, § 7º). Com os resultados das investigações criminológicas,

visa tal ciência auxiliar o direito penal a encontrar uma solução para as causas

que levaram o delinquente ao delito.

— 

A política criminal, por sua vez, corresponde à que deve ser implementada no combate à

criminalidade. Discute-se se ela deve servir exclusivamente ao legislador, como critério de

orientação na construção de normas penais e suas consequências jurídicas (posição tradicional), ou

se, além disso, deveria também orientar o aplicador do direito diante da norma posta (posição

moderna).

SAIBA MAIS

O direito penal pertence ao direito público, pois seu objeto refere-se primordialmente às relações do

Estado com particulares em razão de seu poder soberano, atuando na tutela do bem-estar coletivo.

É possível dividir o direito penal em objetivo e subjetivo.

Direito Penal objetivo

Consiste no próprio ordenamento jurídico-penal, isto é, no conjunto de normas jurídicas que

perfazem o sistema penal.

Direito Penal subjetivo

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Capítulo 1:
Dependendo Partese1trate o sujeito passivo, é possível que o Direito Penal assuma uma outra
de quem

velocidade, ou uma outra forma de atuação. Trata-se de concepção criada por Günther Jakobs em

que o direito penal do cidadão teria como escopo garantir a vigência da norma (o indivíduo que

comete o crime desrespeita a norma, a qual, por meio da pena aplicada, mostra que permanece

incólume), e o direito penal do inimigo (como o de indivíduos que reincidem constantemente na

prática de delitos ou praticam fatos de extrema gravidade, como ações terroristas) tem como

finalidade combater perigos. Neste, o infrator não é tratado como pessoa, mas como inimigo a ser

eliminado e privado do convívio social.

Cuida-se de concepção polêmica, rejeitada pela maioria dos autores, os quais sustentam que jamais

se pode deixar de considerar um indivíduo como pessoa.

BIBLIOTECA

A vila, direção de M. Night Shyamalan, 2004. O medo como forma de controle social utilizado

no filme pode ser utilizado como analogia para interpretar o mundo pós 11 de setembro.

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Capítulo 1: Parte 1 CAPÍTULO 1

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