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INTRODUÇÃO

O Direito Penal é o ramo do direito público que tem como objectivo a


regulamentação do poder punitivo do Estado, através da interpretação e aplicação do
conjunto normativo criado pelo legislador para definir quais acções são consideradas
criminosas, ou que configuram um delito.

Embora o Direito Penal lide com crimes que pessoas cometem contra terceiros,
é um ramo do direito público pelo facto de que compete ao Poder Público, na figura do
Judiciário, a aplicação da punição adequada ao delito praticado pela pessoa.

O Direito Penal é um ramo do Direito necessário para a vida em sociedade,


uma vez que um dos principais papéis do Estado é a protecção dos direitos dos
habitantes do seu território.

A função do Direito Penal, portanto, é de proteger os bens jurídicos


estabelecidos como importantes dentro de uma sociedade em seu contexto histórico.

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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO PENAL

Desde os primórdios da humanidade, o homem tem progredido em todos os


sentidos. Através do desenvolvimento da razão, dom não atribuído a nenhum outro
animal, excepto à espécie humana, o homem tem sempre estado organizado em grupos
ou sociedades. No entanto, a interacção social nem sempre é harmónica, pois nela o
homem revela o seu lado instintivo: a agressividade.

Pode-se afirmar que através dos tempos o homem tem aprendido a viver numa
verdadeira “societas criminis“. É aí que surge o Direito Penal, com o intuito de defender
a colectividade e promover uma sociedade mais pacífica.

Se houvesse a certeza de que se respeitaria a vida, a honra, a integridade física


e os demais bens jurídicos do cidadão, não seria necessário a existência de um acervo
normativo punitivo, garantindo por um aparelho coercitivo capaz de pô-lo em prática.
São haveria, assim, o “jus puniendi“, cujo titular exclusivo é o Estado.

Por isso é que o Direito Penal tem evoluído junto com a humanidade, saindo
dos primórdios até penetrar a sociedade hodierna. Diz-se, inclusive, que ele surge como
homem e o acompanha através dos tempos, isso porque o crime, qual sombra sinistra,
nunca dele se afastou (Magalhães Noronha).

PERÍODOS DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO PENAL.

Período da Vingança

Tendo início nos tempos primitivos, nos primórdios da humanidade, o Período


da Vingança prolonga-se até o século XVIII.

Nos tempos primitivos não se admitia a existência de um sistema orgânico de


princípios gerais, já que grupos sociais dessa época eram envoltos em ambientes
mágicos e religiosos. Fenómenos naturais como a peste, a seca, e erupções vulcânicas
eram consideradas castigos das divindades, pela prática de fatos que exigiam reparação.

Podem-se distinguir as diversas fases de evolução da vingança penal, como a


seguir:

 Fase da vingança privada;


 Fase da vingança divina; e
 Fase da vingança pública.

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Fase da vingança privada

Neste período histórico na vingança privada, cometido um crime, ocorria a


reacção da vítima, dos parentes e até do grupo social (tribo), que agiam sem proporção a
ofensa, atingindo não só o ofensor, como todo o seu grupo. A inexistência de limites
(falta de proporcionalidade) imperava no revide à agressão, bem como a vingança de
sangue. Foi um dos períodos em que a vingança privada constituiu-se a mais freqüente
forma de punição, adoptada pelos povos primitivos.

A vingança privada constituía-se numa reacção natural e instintiva, por isso, foi
apenas uma realidade sociológica, não uma instituição jurídica.

Contudo, nota-se uma dita evolução a partir de um grande ícone de tal período:
a Lei do Talião.

Olho por olho, dente por dente. Propagava a lei.

Também nomeada como Lei da Retaliação, considera-se a mesma como um


instrumento moderador da pena, modulada de forma a aplicar ao delinquente ou
ofensor, o mal que ele causou ao ofendido, na mesma proporção. O vocábulo latino talio
é afim de talis, que significa tal, de forma a ressaltar que aquele que praticava o mal
deveria sofrer como pena um mal equivalente. Neste sentido, acabou por limitar a
abrangência da ação punitiva em si. Verifica-se que aqui também passa a ser revelado o
primeiro traço do princípio da proporcionalidade – ainda que em seu aspecto meramente
formal – entre a pena e o crime, ao prescrever a máxima “olho por olho, dente por
dente”

Vingança Divina

Nesta era, a religião atinge influência decisiva na vida dos povos antigos.

A repressão ao delinqüente nessa fase tinha por fim aplacar a “ira” das
divindades ofendidas pela prática do crime, bem como castigar ao infractor.

A administração da sanção penal ficava a cargo dos sacerdotes que, como


mandatários dos deuses, encarregavam-se da justiça.

Aplicavam-se penas cruéis, severas, desumanas. A “vis corpolis” era usa como
meio de intimidação.

Os indivíduos colocavam sua fé nos totens, que era, de certo modo, uma forma
de referenciar suas divindades, visto que o desrespeito a esses objetos seria severamente
punido, pois acreditavam que se os infratores não recebessem castigo, a vingança dos
Deuses seria implacável. Os tabus deveriam ser rigorosamente seguidos e a punição
deveria ser de forma colectiva para que todos pudessem se afastar da fúria de seus
Senhores (PIMENTEL, 1983).

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Vingança Pública

Com uma saciedade um pouco mais organizada, especialmente no que tangia


ao desenvolvimento do poder político, surge, no seio das comunidades, a figura do
chefe ou da Assembléia.

A pena, portanto, perde sua índole sacra para transformar-se em uma sanção
imposta em nome de uma autoridade pública, a qual representava os interesses da
comunidade em geral.

O Estado tomou para si o poder de dizer o direito e resolver os litígios,


garantindo, com a pena pública, a sua própria sobrevivência e, de modo geral e
comparativo, a paz social. A agressão ao soberano (rei, príncipe ou regente), e à sua
Divina autoridade (“lesa-majestade”), era tida como a infracção mais grave do regime,
fazendo com que o indivíduo que a praticasse fosse cruel e arbitrariamente punido, pois
cometeu infracção a um “soberano escolhido por Deus”. E, apesar de haver uma
insegurança jurídica, a sociedade, de certo modo, respirava aliviada, pois a pena não era
imposta por terceiros ou pela comunidade, mas sim pelo Estado (ESTEFAN;
GONÇALVES, 2013).

Período Humanitário

O período conhecido por Período Humanitário transcorre durante o lapso de


tempo compreendido entre 1750 e 1850.

Tendo seu início no decorrer do Huminismo, esse período foi marcado pela
atuação de pensadores que contestavam os ideiais absolutistas.

Pregava-se a reforma das leis e da administração da justiça penal no fim do


século XVIII.

Os povos estavam saturados de tanto barbarismo sob pretexto de aplicação da


lei. Por isso, o período humanitário surge como reação à arbitraruiedade da
administração da justiça penal e contra o caráter atraz das penas.

Os escritos de Montesquieu, Voltaire, Rosseau, D’Alembert e o Cristianismo


foram de suma importância para o humanismo, uma vez que constituíram o próprio
alicerce do mesmo.

Período Cientifico

Também conhecida como período criminológico, esta fase caracteriza-se por


um notável entusiasmo científico. Começa a partir do século XIX, por volta do ano de
1850 e estende-se até os nossos dias.

Inicia-se, neste período, a preocupação com o homem que delínque e a razão


pela qual delínqüe.

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Puig Peña refere-se a esse período, afirmando que, caracteriza-se pela irrupção
das ciências penais no âmbito do Direito punitivo, e graças a ele se abandona o velho
ponto de vista de considerar o delinqüente como um tipo abstrato imaginando sua
personalidade".

ESCOLAS PENAIS

As escolas penais são corpos de doutrinas mais ou menos coerentes sobre os


problemas em relação com o fenómeno do crime e, em particular, sobre os fundamentos
e objectos do sistema penal. (Aníbal Bruno).

As escolas penais são um sistema de idéias e teorias políticas-jurídicas e


filosóficas que, num determinado momento histórico, expressaram o pensamento dos
juristas sobre as questões criminais fundamentais.

São chamadas escolas penais as diversas correntes filosófico-juridico em


matéria penal que surgiram nos Tempos Modernos.

Elas se formaram e se distinguiram umas das outras. Lidam com problemas


que abordam o fenómeno do crime e os fundamentos e objectivos do sistema penal.

O Direito Penal é o produto da civilização dos povos, através da longa


evolução histórica.

ESCOLA CLÁSSICA

Também chamada de Idealista, Filosófico-jurídica, Crítico Forense, nasceu sob


os ideais iluministas.

Para a Escola Clássica a pena é um mal imposto ao indivíduo merecedor de um


castigo por motivo de uma falta considerada crime, cometida voluntária e
conscientemente.

A finalidade da pena é o restabelecimento da ordem externa na sociedade. Esta


doutrina possui princípios básicos e comuns, de linha filosófica, de cunho humanitário e
liberal (defende os direitos individuais e o principio da reserva legal, sendo contra o
absolutismo, a tortura e o processo inquisitório). Foi uma escola importantíssima para a
evolução do direito penal na medida em que defendeu o individuo contra o arbítrio do
Estado.

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A Escola Clássica dividiu-se em dois grandes períodos:

 Filosófico/teórico: no qual a figura de maior destaque foi Beccaria. Ele


desenvolveu sua tese com base na idéias de Rousseau e de Montesquieu,
construindo um sistema baseado na legalidade, onde o Estado deveria punir os
delinqüentes mas tinha de se submeter às limitações da lei.

O pacto social define que o individuo se comprometa a viver conforme as leis


estipuladas pela sociedade e deverá ser punido pelo Estado quando transgredi-las, para
que a ordem social seja restabelecida.

 Jurídico ou prático: em que o grande nome foi Franchesco Carrara, sumo mestre
de Pisa. Ele estudou o crime em si mesmo, sem se preocupar com a figura do
criminoso. Defendia que o crime era uma infracção da lei do Estado
(promulgada pra proteger os cidadãos); é impelido por duas forças: a física
(movimento corpóreo que produzirá o resultado), e a moral(a vontade consciente
e livre de praticar um delito).

Princípios fundamentais:

 O crime é um ente jurídico, ou seja é a infracção do direito.


 Livre arbítrio no qual o homem nasce livre e pode tomar qualquer caminho,
escolhendo pelo caminho do crime, responderá pela sua opção.
 A pena é uma retribuição ao crime (Pena retributiva)
 Método dedutivo, uma vez que é ciência jurídica.

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ESCOLA POSITIVISTA

Teve como precursor Augusto Comte, que representou a ascensão da burguesia


emergente após a Revolução de 1789. O crime começou a ser examinado sob o ângulo
sociológico, e o criminoso passou também a ser estudado, se tornando o centro das
investigações biopsicológicas.

Este movimento foi iniciado pelo médico Cesare Lombroso (1835-1909) com
sua obra L´uomo delinqüente (1875). Na concepção deste médico existia a idéia de um
criminoso nato, que seria aquele que já nascia com esta predisposição orgânica, era um
ser actávico uma regressão ao homem primitivo.

Após anos de pesquisa declarou que os criminosos já nasciam delinqüentes e


que apresentam deformações e anomalias anatómicas físicas e psicológicas.

Para os positivistas, o criminoso é um ser actávico, com fundo epiléptico e


semelhante ao louco penal.

ESCOLA TÉCNICO-JURÍDICA

Esta escola inicia-se em 1905 e é uma reacção à corrente positivista. Procura


restaurar o critério propriamente jurídico da ciência do Direito Penal.

Neste contexto o Direito penal seria aquele expresso na lei, e o jurista deve-se
ater apenas a ela.O Direito Penal é o que está na lei. O seu estudo compõe-se de três
partes:

1. Exegese: irá dar sentido as disposições do ordenamento jurídico


2. Dogmática: investigação dos princípios que irão nortear o direito penal fixando
assim os seus elementos
3. Crítica: que irá orientar na consideração do direito vigente demonstrando assim
o seu acerto ou a sua conveniência de reforma.

Princípios Fundamentais:

a) O delito é pura relação jurídica, de conteúdo individual e social;

b) A pena constitui uma reação e uma conseqüência do crime (tutela jurídica), com
função preventiva geral e especial, é aplicável aos imputáveis;

c) A medida de segurança – preventiva - é aplicável aos inimputáveis;

d) A responsabilidade é moral (vontade livre);

e) O método utilizado é técnico-jurídico;

f) Refuta o emprego da filosofia no campo penal.

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CARACTERÍSTICAS DO DIREITO PENAL

Ramo do Direito Público: haja vista que as regras do Direito Penal são
indisponíveis, obrigatórias, e não existe a possibilidade de transação;

Ciências penal: pois possui autonomia e princípios próprios;

Ciência cultural: é uma ciência do Dever Ser, ou seja, se submete às leis


humanas e não as leis da físicas, por exemplo. Suas regras se baseiam em regras sociais
de acordo com o dinamismo social;

Ciência normativa: não há, no Direito Penal, a importância de se estudar as


questões filosóficas ou sociológicas que levaram ao cometimento de um crime. Para al
ramo do Direito, é relevante apenas a existência ou não de uma norma na qual se faz a
adequação de uma conduta;

Ciência finalística: seu objectivo é revelar o conteúdo das normas jurídicas


analisando a finalidade do agente ao praticar tal conduta;

Fragmentário: pois recai a criminalidade apenas sobre fatos graves e sobre os


valores mais importantes ao convívio social.

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ESTRUTURA DO DOMÍNIO DO DIREITO PENAL

Em Angola, à semelhança do que acontece no Portugal e na maioria dos


Estados democráticos e de direito, o direito penal só é aplicável mediante processo que
tem como função: proceder à investigação necessária conducente à verificação da
existência ou não do crime; constatar se certos factos apurados constituem ou não
crime; quem os praticou; em que circunstância; porquê e qual o grau de
responsabilidade dos seus agentes.

Como resulta da tradicional “sumo division”, o direito penal e o direito


processual penal, ambos nascem de um tronco comum. A complementaridade é o elo de
ligação indispensável à realização do fim último que perseguem, a saber, “a realização
da justiça”. A aplicação das normas do direito penal faz-se mediante um processo regido
pelas normas do direito processual penal. Assim, dentro do processo, encontram-se
ainda os recursos, que, por sua vez, se subdividem em ordinário e extraordinário:

DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL

A maioria da doutrina jurídica faz uma separação entre direito penal e direito
processual penal; assegura que ambos são norteados por práticas diferenciadas.
Contudo, o direito penal só pode ser aplicado através dos procedimentos formais
presentes no direito processual penal.

DIAS (1974:25) considera mesmo que “em certo sentido, o direito processual
penal constitui uma parte do direito penal”. Segundo este autor, o direito processual e o
direito substantivo (penal) formam uma unidade.

Para BARAÚNA (1979) o certo, porém, é reconhecer a autonomia de cada um,


sem perder de vista a relação de meio e de fim que se verifica entre os dois corpos de
normas.

O processo penal é, assim, um processo dinâmico, pela sua forma


(encadeamento de actos) e pela sua intenção ou finalidade. A decisão judicial aparece
como síntese das posições contrárias: acusação e defesa e, traduz a convicção livre do
Juiz formada através de uma actividade que se desenvolve de forma dialéctica.

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CONCLUSÃO

Concluímos que, a história do Direito Penal é descrita em fases nas quais os


princípios e aspectos distintivos não se sucedem de forma estritamente linear.

As mais antigas são:

 A Vingança Privada;
 A famosa Lei de Talião;
 A Vingança Divina” onde direito e religião se confundiam;
 E a “Vingança Pública” cuja principal finalidade era a segurança do
monarca que detinha o poder absoluto.

Parece existir uma relevante importância do processo histórico na compreensão


da filosofia e dos princípios do Direito Penal Contemporâneo. Crimes e castigos
existiram na sociedade humana desde os primórdios. Com a conquista da escrita, os
governantes puderam lavrar suas leis em tábuas de barro e estelas que ainda hoje podem
ser lidas e se tornaram documentos preciosos para o entendimento da evolução do
pensamento sobre as regras de conduta, as proibições e as penas impostas aos
violadores da lei.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIAS, Jorge de Figueiredo (2004) – Direito Penal: Questões Fundamentais, a Doutrina


Geral do Crime. Coimbra, Ed. Coimbra, 2ª ed. tomo I.

https://jus.com.br/artigos/932/evolucao-historica-do-direito-penal

https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-penal/evolucao-historica-do-direito-
penal/

https://jus.com.br/artigos/72527/a-evolucao-historica-da-aplicacao-da-pena-no-direito-
comparado

ARAGÃO, Antonio Moniz Sodré de. As três escolas penais. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1938.

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