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DIREITO PENAL – PARTE HISTÓRICA E SUAS FASES

O que é o Direito Penal?

O direito penal é ramo do direito público, cujo objetivo corresponde a estudar as


infrações penais e as respectivas sanções, aplicadas aos infratores da lei penal.

Para alguns doutrinadores, como por exemplo, Edgar Magalhães Noronha,


“direito penal é o conjunto de normas jurídicas que regulam o poder punitivo do Estado,
tendo em vista os fatos de natureza criminal e as medidas aplicadas a quem os pratica”
(Direito Penal, vol.1).

Para José Frederico Marques, o Direito Penal “é um conjunto de normas que


ligam ao crime, como fato, a pena como consequência, e disciplinam também as
relações jurídicas daí derivadas, para estabelecer a aplicabilidade das medidas de
segurança e a tutela do direito e liberdade em face do poder de punir do Estado (Curso
de Direito Penal, vol.1).

Direito Penal nas civilizações antigas

Antes do homem codificar as condutas criminais, as regras eram transmitidas


oralmente e conservadas pela tradição.

A legislação mais antiga do mundo é Código de Ur- Nammu, fundador da


terceira dinastia de Ur, por volta de 2.000 anos antes de Cristo.

Entretanto o Código mais famoso é Código de Hamurabi, antigo rei da


Babilônia, que viveu a aproximadamente 1.726 a 1.686 a.C. O livro é composto por 282
artigos, contendo disposições criminais, sendo uma das primeiras leis penais a ser
reconhecida.

FASES DO DIREITO PENAL

O desenvolvimento inicial do Direito Penal na sociedade é dividido em quatro fases:

1ª Fase: Vingança divina

Nos primórdios a pena continha uma origem marcadamente sacral, de forma


que o homem possuía um olhar muito limitado de si mesmo e da natureza ao seu redor,
de forma que não entendia os fenômenos naturais como raios, trovões, ventanias, secas,
invernos rigorosos, achando que os mesmos eram castigos divinos.

Os indivíduos acreditavam que os fenômenos naturais eram punições totens, ou


seja, entidades, materializadas por animais, as quais prestavam veneração.

Conforme os estudiosos, acredita-se que tais proibições originaram os tabus,


que representam ideias de vedação social quanto a determinadas atitudes.
Por isso, quando ocorria uma desobediência ao tabu, toda a coletividade
deveria reunir em forma de desagravo para aplacar a fúria divina, caso contrário, seriam
castigados.

Tratava-se de um direito penal religioso, teocrático e sacerdotal, e tinha como


finalidade a purificação da alma do criminoso por meio do castigo. Esta sanção era
aplicada pelos sacerdotes, com penas cruéis e degradantes, de forma intimidar o
transgressor e todos ao seu redor.

2ª Fase: Vingança privada

Traduz-se pelos atos de fazer justiça com as próprias mãos, no qual o indivíduo
reage a um determinado ato praticado por seu semelhante de forma violenta e
desproporcional.

Nesta fase, existiam dois tipos de penas: a “pena da perda da paz”, quando um
sujeito era banido do convívio com seus pares, ficando a própria sorte e a mercê dos
inimigos, e a pena da “vingança de sangue”, aplicada a um integrante de um grupo rival,
gerando assim uma verdadeira guerra entre os agrupamentos sociais.

Destaca-se que com o passar do tempo, e com o fortalecimento do poder social,


a vingança privada cedeu lugar a justiça privada, atribuindo-se ao chefe do clã, das
tribos e das famílias, o poder absoluto de decidir sobre a sorte dos infratores.

3ª Fase: Vingança Limitada (Lei de Talião)

A Lei de Talião consistia na justa reciprocidade do crime e da pena. O objetivo


da Lei era evitar a vingança desproporcional, pois antes da Lei de Moisés e do Código
de Hamurabi, se um indivíduo sofresse uma lesão corporal, o agredido matava seu
agressor, ou se alguém matasse um familiar seu, toda a família do homicida era
exterminada.

Devido à ausência de equilíbrio entre o delito praticado e a pena imposta,


acarretava-se um grande prejuízo social aos grupos e tribos, uma vez que estavam
aniquilando-se, com o banimento e as penas capitais desmedidas.

A Lei de Talião foi adotada pelo Código de Hamurabi (Babilônia), no Êxodo


(hebreus) e na Lei de XII Tábuas (romanos).

Destaca-se que a Lei de Talião, buscou reestabelecer o equilíbrio social e


proporcionalidade entre o crime praticado e a pena imposta, de forma que o mal
praticado deveria corresponder de forma igual ao ofensor. Diante disso, surgiu a
expressão: olho por olho, dente por dente. Destaca-se que com o passar do tempo a
população desta época passou a sofrer deformações por conta da perda de membro,
sentido ou função.
Ressalta-se, que a pena infligida além de ter caráter proporcional, deveria
também ser individual, de maneira que punia-se apenas aquele que delinquia e não toda
a sua família ou tribo.

Passou a existir a figura da composição, onde o infrator comprava a sua


liberdade, livrando-se dos castigos, tal pratica foi uma forma antecedente das penas
pecuniárias do Direito Penal e da reparação do dano no Direito Civil.

4ª Fase: Vingança Pública

O Estado passa a intervir como o único legitimado a impor penas criminais,


uma vez que cabe a ele a manutenção e segurança da integridade territorial, política e
social de seus súditos, de forma a manter segurança do soberano ou monarca por meio
da sanção penal, com as características da crueldade e da severidade, com o objetivo
intimidatório.

A pena passa a ser pública, garantindo-se a existência do próprio Estado.

Idade Antiga

Direito Penal Romano

O Direito Penal Romano era exclusivo do cidadão romano, sendo excluídos as


mulheres, os escravos e os estrangeiros. As decisões tomadas nos julgamentos passaram
a ser fundamentadas, buscando a segurança jurídica, apesar de não existir nessa época a
aplicação do princípio da reserva legal.

Neste período, reconhecia-se a figura dos delitos públicos, ou seja, aqueles que
envolviam traição e ou conspiração política contra o Estado, sendo os outros delitos
tidos como privados, como por exemplo furto, dano e injúria

Ressalta-se que os julgamentos dos crimes públicos eram presididos por um juiz
e eram realizados em tribunais especiais, chamados de sinédrios. A pena aplicada era a
capital.

Os romanos visualizavam a pena com o caráter retributivo, e já vislumbravam o


princípio da reserva legal, pois segundo as leis Cornelie e Juliae, os fatos incriminados
e as sanções correspondentes deveriam estar previamente catalogados.

A pena de morte havia praticamente desaparecido até o reinado de Adriano (117


a 118, d.C), porém ressurgiu , no século II depois de Cristo, com o aparecimento de
crimes extraordinários, como furto qualificado, extorsão, aborto, estelionato e exposição
de infante, além dos crimes religiosos como blasfêmia, bruxaria, que já geraram a pena
de morte.

A prisão era vista apenas como o caráter de custódia, como um depósito, no qual
os condenados aguardavam a execução da pena propriamente dita.

Direito Penal na Idade Média


Direito Penal Germânico

No Direito Penal Germânico aplicava-se as regras da Lei de Talião e o sistema


de composição pecuniária, neste período não havia leis escritas, e as regras pautavam-se
nos costumes.

Destaca-se que quando o delinquente ofendia interesses da comunidade, ele


perdia o seu direito a vida, podendo qualquer um cidadão matá-lo. Entretanto, quando
feria um direito privado, atingido uma pessoa ou uma família, fomentava-se a vingança
de sangue, ou seja, olho por olho, dente por dente, como forma de reestabelecer a paz
social.

Com a instalação da Monarquia, foi extinta paulatinamente a vingança de


sangue, passando a existir a composição pecuniária, que tinha por finalidade compensar
os prejuízos sofridos pela vítima, suprimindo a vingança privada.

As leis bárbaras definiam detalhadamente as formas, meios, tarifas e locais de


pagamentos, segundo a qualidade das pessoas, sexo, idade, e natureza da lesão. Esta
composição representava um misto de ressarcimento e pena, parte era devida a vítima
ou aos seus familiares pelo prejuízo causado, já a outra parte era devida ao tribunal ou
ao rei, simbolizando o “preço da paz”. Destaca-se que, no caso de infratores insolventes,
estes tinham que pagar pelos seus crimes por meio de penas corporais.

Cabe ressaltar também a presença das provas ordálias ou juízo de deus, cuja
prova da inocência baseava-se em superstições e penas cruéis. Ex: caminhar sobre o
fogo ou mergulhar sobre a água fervendo.

Direito Penal Canônico

É o Ordenamento Jurídico da Igreja Católica Apostólica Romana, aplicado aos


religiosos e leigos, desde que os fatos tivessem conotação religiosa.

Primitivamente o Direito Penal Canônico teve caráter disciplinar, de tal forma


serviu para procedimento da inquisição, no qual diversos cientistas, filósofos e
pensadores, que divergissem dos pensamentos da igreja, eram submetidos a julgamentos
e penas cruéis, como forma de penitência pela heresia praticada.

No Direito Canônico a jurisdição dividia-se em razão da pessoa (ratione


personae) e em razão da matéria (ratione materiae). Nesta primeira, o religioso era
julgado por um tribunal da Igreja, por qualquer crime que fosse praticado; já na segunda
hipótese, a competência eclesiástica era fixada em razão da matéria, ainda que o crime
fosse fixado por um leigo.

O Direito Canônico contribuiu para o surgimento da prisão moderna, de forma


que o vocábulo penitenciária é proveniente do termo “penitência”, ou seja, castigo.

Idade Moderna
Na Idade Moderna desenvolveu-se o período humanitário, durante do Século
XVIII, no período do Iluminismo, tendo como um grande percussor o marquês Cesare
Beccaria, que escreveu a obra clássica “Dos delitos e das penas”, que pugnava pela
abolição da pena de morte e das penas cruéis, sendo um dos idealizadores das ideias
previstos na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, uma vez que
os pensadores desta época defendiam as liberdades do indivíduo e aplicação do
princípio da dignidade humana.

Cesare Beccari buscou também infundir a ideia da aplicação do princípio da


proporcionalidade entre o crime praticado e pena, bem como preconizava que a pena
deveria ser legalmente prevista em lei, como forma de intimidar que um individuo
viesse a praticar um crime, mesmo tendo o livre arbítrio, pois estaria ciente de seus atos
e consequências.

Para Beccaria a pena tinha uma concepção utilitarista, que procurava torna-se
um exemplo para o futuro e não uma vingança para o passado, de forma que para o
referido autor era “melhor prevenir delitos, do que castiga-los”.

Destacou-se também neste período a obra o “Contrato Social”, do filósofo


Rousseau, que ressalta a figura do criminoso como um violador do pacto social, tendo a
pena como função social de assegurar a paz e a sobrevivência dessa sociedade.

Direito Penal no Brasil

Com o descobrimento do Brasil, a partir de 1.500, vigorava o Direito Lusitano,


devido o Brasil ser colônia de Portugal.

Posteriormente passou-se a vigorar as Ordenações Afonsinas, promulgadas por


D. Afonso V em 1446, sendo consideradas o primeiro código europeu completo, e
revogadas pelas Ordenações Manuelinas, promulgadas em 1521, por D. Manuel I.
Ambas tinham como característica a arbitrariedade do juiz, bem como não definiam a
quantidade da pena a ser aplicada. Esse período foi marcado pela presença de penas
cruéis, e pela ausência dos princípios da legalidade e da ampla defesa.

Depois surgiu o Código Sebastiânico, em razão da compilação de leis esparsas


realizadas por D. Duarte Nunes Leão.

O Código Sebastiânico foi substituído pelas Ordenações Filipinas, promulgadas


pelo Rei Felipe II, no ano de 1603, as quais eram fundadas em preceitos religiosos,
continuando as penas a serem cruéis e desumanas, como açoite, pena de morte,
amputação de membros, dentre outras, além da arbitrariedade do juiz e a ausência dos
princípios da legalidade e da ampla defesa.

Com a promulgação da Independência e com a Constituição brasileira de 1824,


surgiu o Código Criminal do Império em 1827, de cunho protetivo e humanitário,
com a primeira manifestação do princípio da personalidade da pena no Brasil. O
projeto deste Código Criminal foi elaborado por Bernardo Pereira de Vasconcelos. E em
1830, ao ser sancionado por Dom Pedro I, ficou conhecido como primeiro Código
Autônomo da América Latina. Tendo influenciado o Código Penal espanhol de 1848 e o
Código Penal português de 1852, por sua clareza, precisão, concisão e apuro técnico.

Com a Proclamação da República, surgiu o Código Penal da República de


1890, sendo aprovado e publicado antes da Constituição de 1891. Este Código Penal
apresentava graves defeitos de técnicas, estando atrasado com relação à ciência de seu
tempo.

Estes equívocos e deficiências do Código Penal Republicano geraram uma


grande quantidade de Leis penais extravagantes, que no ano de 1932 gerou a
Compilação das Leis Penais – Consolidação de Piragibe (Dec. 22.213/1932).

Por fim, ano de 1942, surgiu o Código Penal brasileiro de 1940 (Decreto Lei
2.848/1940), sendo o projeto elaborado por Alcântara Machado. Este Código passou por
uma reforma em sua parte geral, com o advento da Lei nº 7.209/1984, com uma nítida
influência finalista, no qual humanizou as sanções penais, adotou penas alternativas,
bem como reintroduziu em nosso ordenamento jurídico a aplicação do sistema dias
multa

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