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Cefaleia e enxaqueca

 Enxaqueca
A enxaqueca, é uma síndrome recorrente de cefaleia associada a outros sintomas de disfunção neurológica em várias
combinações, sendo a segunda causa mais comum de cefaleia e a causa mais comum de incapacidade neurológica
relacionada à cefaleia no mundo, aflige cerca de 15% das mulheres e 6% dos homens ao longo de um período de 1 ano.
Em geral, é uma cefaleia episódica associada a determinadas manifestações, como sensibilidade à luz, som ou
movimento; náuseas e vômitos. A enxaqueca muitas vezes é reconhecida por seus desencadeadores, chamados de
gatilhos.

encéfalo do paciente com enxaqueca é particularmente sensível a estímulos ambientais e sensoriais; os pacientes
propensos a enxaqueca não se acostumam facilmente com os estímulos sensoriais. Tal sensibilidade é amplificada nas
mulheres durante o ciclo menstrual. A cefaleia pode ser desencadeada ou amplificada por vários gatilhos, incluindo
reflexos e luzes brilhantes, ruídos e outros estímulos aferentes; fome; cansaço por estresse; cansaço físico; tempestades
ou alterações da pressão barométrica; flutuações hormonais da menstruação; ausência ou excesso de sono; e álcool ou
outros estímulos químicos, como os nitratos.
Essa sensibilidade provavelmente se deve a uma disfunção dos sistemas de controle sensitivos monoaminérgicos
localizados no tronco encefálico e no hipotálamo. A principal via para dor na enxaqueca é a via aferente
trigeminovascular dos vasos meníngeos, que passam através dos gânglios trigeminais e fazem sinapse nos neurônios de
segunda ordem no complexo trigeminocervical (CTC). Tais neurônios seguem no trato quintotalâmico e, após cruzarem
o tronco encefálico, realizam sinapse nos neurônios talâmicos. Modulação importante dos impulsos nociceptivos
trigeminovasculares advém do núcleo posterior da rafe, locus ceruleus e núcleo magno da rafe. A ativação de células no
núcleo trigeminal resulta na liberação de neuropeptídeos vasoativos, em particular o peptídeo relacionado com o gene
da calcitonina (CGRP), nas terminações vasculares do nervo trigêmeo e dentro do núcleo trigeminal. Centralmente, os
neurônios trigeminais de segunda ordem cruzam a linha média e projetam-se para os núcleos ventrobasal e posterior do
tálamo para processamento adicional. Além disso, há projeções para a substância cinzenta periaquedutal e o
hipotálamo, a partir das quais sistemas descendentes recíprocos estabeleceram efeitos antinociceptivos. Outras regiões
do tronco encefálico propensas a ser envolvidas na modulação descendente da dor trigeminal incluem o locus ceruleus
na ponte e o bulbo rostroventromedial.
Dados farmacológicos e outros dados apontam para o envolvimento do neurotransmissor 5-hidroxitriptamina
(serotonina) na enxaqueca e um papel para a dopamina na fisiopatologia da enxaqueca. A maior parte dos sintomas de
enxaqueca pode ser induzida por estimulação dopaminérgica. Além disso, há hipersensibilidade dos receptores da
dopamina naqueles que sofrem de enxaqueca, conforme demonstrado pela indução de bocejo, náuseas, vômitos,
hipotensão e outros sintomas de uma crise de enxaqueca pelos agonistas dopaminérgicos com doses que não afetam os
indivíduos que não têm enxaqueca. Os antagonistas dos receptores de dopamina são agentes terapêuticos eficazes na
enxaqueca, em especial quando administrados por via parenteral ou simultaneamente com outros agentes
antienxaqueca. Além disso, a ativação hipotalâmica, anterior à observada na cefaleia em salvas, tem sido atualmente
demonstrada na fase premonitória de enxaqueca usando exame de imagem funcional, e isso pode representar uma
chave para a compreensão de uma parte do papel da dopamina no distúrbio.

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Os genes da enxaqueca identificados por estudos de famílias com enxaqueca hemiplégica familiar (EHF) revelam
envolvimento de canais iônicos, sugerindo que alterações na excitabilidade da membrana podem predispor à
enxaqueca. As mutações que envolvem o gene CACNA1A do canal de cálcio dependente de voltagem tipo Cav2.1 (P/Q)
são atualmente reconhecidas como as responsáveis pela EHF 1. As mutações no gene ATP1A2 da Na+- K+ATPase
causam EHF 2. As mutações de SCN1A do canal de sódio dependente da voltagem neuronal causam EHF 3.
Neuroimagens funcionais sugerem que regiões do tronco encefálico na enxaqueca e a região de substância cinzenta
hipotalâmica posterior próxima às células do marca-passo circadiano humano do núcleo supraquiasmático na cefaleia
em salvas são boas candidatas para o envolvimento específico na cefaleia primária.

Um alto índice de suspeição é essencial para diagnosticar a enxaqueca: a aura da enxaqueca, que consiste em
perturbações visuais com flashes luminosos ou linhas em ziguezague que se movem ao longo do campo visual, ou
outros sintomas neurológicos, é relatada em apenas 20 a 25% dos pacientes. Um diário da cefaleia muitas vezes ajuda a
definir o diagnóstico; também é útil na avaliação da incapacidade e frequência do tratamento para crises agudas.
Pacientes com episódios de enxaqueca que ocorrem diariamente ou quase diariamente apresentam enxaqueca crônica.
A enxaqueca deve ser diferenciada da cefaleia tensional, a síndrome de cefaleia primária mais comum observada na
população. A enxaqueca apresenta várias formas definidas:
A enxaqueca crônica pode ocorrer por 15
dias ou mais no mês. A maioria dos
pacientes com cefaleia incapacitante
provavelmente tem enxaqueca. Os
pacientes com enxaqueca acefálgica (aura
típica sem cefaleia) apresentam sintomas
neurológicos recorrentes, em geral com
náuseas e vômitos, mas com pouca ou
nenhuma dor na cabeça. A vertigem pode
ser proeminente. A aura da enxaqueca
pode apresentar sintomas proeminentes
do tronco encefálico, e os termos
enxaqueca da artéria basilar e tipo artéria
basilar foram atualmente substituídos por
enxaqueca com aura do tronco encefálico.
Quando se estabelece o diagnóstico de
enxaqueca, é importante avaliar a extensão
da doença do paciente e sua incapacidade,
e isso é feito com o Migraine Disability
Assessment Score (MIDAS).
A orientação do paciente é um aspecto importante do tratamento da enxaqueca. É útil aos pacientes compreender que
a enxaqueca é uma tendência hereditária à cefaleia; que a enxaqueca pode ser modificada e controlada por ajustes no
estilo de vida bem como por medicamentos, mas não pode ser erradicada; e que, exceto em algumas ocasiões nas

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mulheres em tratamento com estrogênios ou contraceptivos, a enxaqueca não está associada a doenças graves ou
ameaçadoras à vida.
A enxaqueca pode muitas vezes ser tratada, até certo ponto, por diversas medidas não farmacológicas. A maioria dos
pacientes se beneficia da identificação e prevenção de gatilhos da cefaleia. Um estilo de vida moderado é útil, incluindo
dieta saudável, exercícios regulares, padrões de sono regulares, além de evitar o consumo excessivo de cafeína e álcool
e evitar mudanças agudas nos níveis de estresse, sendo particularmente importantes os efeitos-rebote. Como o estresse
da vida diária não pode ser eliminado, diminuir a resposta de uma pessoa ao estresse, por meio de várias técnicas, é útil
para muitos pacientes. Essas técnicas podem incluir ioga, meditação transcendental, hipnose e técnicas de
condicionamento, como o biofeedback. Para a maioria dos pacientes, essa abordagem é, na melhor das hipóteses, um
adjuvante à farmacoterapia. Medidas não farmacológicas provavelmente não evitam todos os episódios de enxaqueca.
Quando tais medidas falham na prevenção de uma crise, as abordagens farmacológicas são necessárias para abortá-la.
O princípio da terapia farmacológica é a utilização criteriosa de um ou mais dos muitos medicamentos que são eficazes
na enxaqueca. A seleção do esquema ideal para determinado paciente depende de vários fatores, sendo que o mais
importante deles é a gravidade da crise. As crises leves de enxaqueca podem geralmente ser tratadas com agentes
orais; a taxa média de eficácia é de 50 a 70%. As crises graves de enxaqueca podem exigir terapia parenteral. A maioria
dos medicamentos eficazes no tratamento da enxaqueca são membros de uma das três principais classes
farmacológicas: anti-inflamatórios não esteroides (baixa eficácia em crises moderadas e graves), agonistas dos
receptores de 5-HT1B/1D e antagonistas do receptor de dopamina.
Em geral, uma dose adequada de qualquer
agente escolhido deve ser usada o mais
rápido possível após o início de uma crise.
Se for necessária medicação adicional
dentro de 60 minutos, é porque os
sintomas retornaram ou não diminuíram,
e a dose inicial deve ser aumentada para
crises subsequentes, ou uma classe
diferente de medicamentos deve ser
tentada como tratamento de primeira
linha. O tratamento da enxaqueca tem de
ser individualizado; não é possível uma
abordagem-padrão para todos os
pacientes. Um esquema terapêutico talvez
tenha de ser constantemente aprimorado
até que se identifique um que forneça ao
paciente o alívio rápido, completo e
consistente com mínimos efeitos
colaterais.
Os medicamentos para crises agudas, em
particular a codeína ou analgésicos
compostos que contêm barbitúricos, têm
uma propensão a agravar a frequência da
cefaleia e induzir um estado de cefaleia
refratária diária ou quase diária chamado
de cefaleia por uso excessivo de
medicamentos. Este distúrbio provavelmente não é uma entidade distinta de cefaleia, mas uma reação do paciente
com enxaqueca a determinado medicamento. Pacientes com enxaqueca, que apresentam cefaleia em dois ou mais dias
por semana, devem ser orientados sobre o uso frequente de analgésicos.

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Os pacientes com crises de enxaqueca em frequência crescente, ou com crises que não respondem ou respondem
precariamente a tratamentos abortivos, são bons candidatos aos agentes preventivos. Em geral, uma medicação
preventiva deve ser considerada no subgrupo de pacientes com cinco ou mais crises por mês. Efeitos colaterais
significativos estão associados ao uso de muitos desses agentes; além disso, a determinação da dose pode ser difícil,
pois as doses recomendadas foram obtidas para diferentes distúrbios de enxaqueca. O mecanismo de ação desses
fármacos é obscuro; parece provável que a sensibilidade do cérebro subjacente à enxaqueca seja modificada. Os
pacientes em geral começam com uma dose baixa de um tratamento escolhido; a dose é então gradualmente
aumentada até um máximo razoável que atinja benefício clínico.
Os medicamentos devem ser tomados diariamente, e em geral há um intervalo de 2 a 12 semanas antes que os efeitos
possam ser observados. Os medicamentos aprovados pela FDA para o tratamento profilático da enxaqueca incluem
propranolol, timolol, valproato de sódio, topiramato e metissergida. Além deles, a amitriptilina, nortriptilina, flunarizina,
fenelzina, gabapentina e ciproeptadina.
 Cefaleia tensional (CT)
Descreve uma síndrome de dor de cabeça crônica, caracterizada por um desconforto bilateral como uma faixa apertada
ou em peso. A dor costuma desenvolver-se lentamente, oscilar em intensidade e pode persistir de maneira mais ou
menos contínua por muitos dias. A cefaleia pode ser episódica ou crônica (presente por mais de 15 dias por mês).

Uma abordagem clínica útil é diagnosticar a CT em pacientes cujas cefaleias são Na prática clínica, é altamente
completamente isentas de manifestações associadas, como náuseas, vômitos, recomendado dicotomizar os
fotofobia, fonofobia, osmofobia, latejamento e agravamento com movimentos. pacientes com base na presença
Porém, a definição principal da International Headache Society de CT permite a de manifestações associadas
presença de náuseas, fotofobia ou fonofobia em várias combinações, embora a (enxaqueca) e na ausência de
definição do apêndice não; isso ilustra a dificuldade para distinguir essas duas manifestações associadas (CT).
entidades clínicas.
Parece que a CT é decorrente de um distúrbio apenas de modulação de dor no
sistema nervoso central, ao contrário da enxaqueca, que envolve um distúrbio da modulação sensorial mais
generalizado. Os dados sugerem uma contribuição genética à CT, mas isso talvez não seja um achado válido: pelos
critérios diagnósticos atuais, os estudos indubitavelmente incluíram muitos pacientes com enxaqueca. O nome cefaleia
tensional implica que a dor decorre de tensão nervosa, mas não há evidências claras da tensão como etiologia. A
contração muscular tem sido considerada uma manifestação que distingue a CT da enxaqueca, porém não parece haver
diferenças na contração entre os dois tipos de cefaleia (tensão prolongada na musculatura cervical e da musculatura ao
redor do crânio). Se manifesta na testa, nuca ou na parte de cima da cabeça.
A dor da CT geralmente pode ser tratada com analgésicos simples como paracetamol, ácido acetilsalicílico ou AINEs. As
abordagens comportamentais, como relaxamento, também podem ser eficazes. Para CT crônica, a amitriptilina é o
único tratamento comprovado; outros tricíclicos, inibidores da recaptação seletiva de serotonina e os benzodiazepínicos
não se mostraram eficazes. Não há evidências de eficácia da acupuntura.
 Cefalalgias autonômicas do trigêmeo (CATs)
Correspondem a um grupo de cefaleias primárias, incluindo cefaleia em salvas, hemicrania paroxística, SUNCT (crises de
cefaleia neuralgiforme unilateral de curta duração com hiperemia conjuntival e lacrimejamento)/SUNA (crises de
cefaleia neuralgiforme unilateral de curta duração com sintomas autônomos cranianos) e hemicrania contínua.
As CATs são caracterizadas por crises de dor de cabeça de relativamente curta duração associadas a sintomas
autônomos cranianos, como lacrimejamento, hiperemia conjuntival ou congestão nasal. A dor em geral é intensa e pode
ocorrer mais de uma vez ao dia. Devido à congestão nasal e rinorreia associadas, os pacientes muitas vezes são
diagnosticados de maneira errada com “cefaleia sinusal” e tratados com descongestionantes, que são ineficazes.

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1. Cefaleia
em salvas: é
uma forma rara
de cefaleia
primária,
sendo uma dor
profunda,
em geral
retro- orbital,
muitas vezes de

intensidade
excruciante,
não flutuante e
de

característica explosiva. Uma característica fundamental da cefaleia em salvas é a periodicidade: pelo menos uma
das crises diárias de dor recorre aproximadamente na mesma hora todo dia, ao longo do episódio de salvas. O
paciente típico com cefaleia em salvas tem surtos diários de uma ou duas crises de dor unilateral de duração
relativamente curta por 8 a 10 semanas por ano, o que costuma ser acompanhado de um intervalo sem dor que
dura em média um pouco menos de 1 ano. A cefaleia em salvas é caracterizada como crônica quando permanece
em remissão menos de 1 mês sem tratamento. Em geral, os pacientes sentem-se perfeitamente bem entre os
episódios. O início é noturno em cerca de 50% dos pacientes, sendo os homens acometidos com frequência três
vezes maior do que as mulheres. Os pacientes com cefaleia em salvas tendem a deslocar-se durante as crises,
andando, balançando ou esfregando a cabeça para alívio; alguns podem mesmo tornar-se agressivos. Este é um
grande contraste em relação aos pacientes com enxaqueca, que preferem permanecer quietos durante a crise.
A cefaleia em salvas está associada a sintomas ipsilaterais de ativação autonômica parassimpática craniana:
hiperemia conjuntival ou lacrimejamento, rinorreia ou congestão nasal ou disfunção simpática craniana, como
ptose. O déficit simpático é periférico e provavelmente causado por ativação parassimpática com lesão das fibras
simpáticas ascendentes que circundam uma artéria carótida dilatada ao entrar na cavidade craniana. Quando

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presentes, há probabilidade muito maior de a fotofobia e fonofobia serem unilaterais e no mesmo lado da dor, e
não bilaterais, como na enxaqueca. A cefaleia em salvas provavelmente seja um distúrbio envolvendo os neurônios
do marca-passo central na região hipotalâmica posterior.
O tratamento mais satisfatório é a administração de fármacos que evitam os episódios em salvas até que a crise
tenha passado. Entretanto, o tratamento de crises agudas é necessário para todos os pacientes com cefaleia em
salvas em algum momento.
As crises de cefaleia em salvas atingem o pico rapidamente, sendo portanto necessário um tratamento com início
rápido. Muitos pacientes com cefaleia em salvas aguda respondem muito bem à inalação de oxigênio. Este pode ser
administrado como oxigênio a 100% em 10 a 12 L/minuto por 15 a 20 minutos. Parece que o fluxo alto e o alto
conteúdo de oxigênio são importantes. O sumatriptano, 6 mg SC, tem início rápido e em geral encurtará uma crise
para 10 a 15 minutos; não há evidências de taquifilaxia. O s sprays nasais de sumatriptano (20 mg) e zolmitriptano
(5 mg) são eficazes na cefaleia em salvas aguda, oferecendo uma opção útil para pacientes que podem não querer
autoinjetar diariamente. O sumatriptano oral é ineficaz para prevenção ou tratamento agudo da cefaleia em salvas.

Quando as terapias clínicas falham na cefaleia em salvas crônica, estratégias de neuroestimulação podem ser
utilizadas. A estimulação cerebral profunda da região da substância cinzenta hipotalâmica posterior tem sido bem-
sucedida em uma proporção substancial de pacientes, embora a sua relação risco-benefício a tenha tornado
inadequada, com tantas outras opções disponíveis atualmente. Resultados favoráveis também foram relatados com
a abordagem menos invasiva de estimulação do nervo occipital, com a estimulação do gânglio esfenopalatino e
com uma estimulação não invasiva do nervo vago.
2. Hemicrania paroxística (HP): caracteriza-se por episódios de cefaleia unilaterais, graves, frequentes e de
curta duração. Assim como a cefaleia em salvas, a dor tende a ser retro-orbital, mas pode-se senti-la em toda a
cabeça, sendo associada a fenômenos autonômicos como lacrimejamento e congestão nasal. Afirma-se que os
pacientes com remissões têm HP episódica, enquanto aqueles com a forma não remitente apresentam HP crônica.
As características essenciais da HP são: dor unilateral e muito intensa; crises de curta duração (2 a 45 minutos);
crises muito frequentes (em geral, mais de cinco por dia); manifestações autonômicas acentuadas ipsilaterais à dor;
curso rápido (menos de 72 horas); e resposta excelente à indometacina. Diferente da cefaleia em salvas, que
acomete predominantemente os homens, a proporção homens:mulheres na HP é quase de 1:1.
A HP secundária é relatada com lesões na sela túrcica, incluindo malformações arteriovenosas, meningioma do seio
cavernoso, patologia hipofisária e tumores epidermoides. A HP secundária é mais provável se o paciente exigir altas
doses (mais de 200 mg/dia) de indometacina. Em pacientes com HP bilateral aparente, deve-se suspeitar de
aumento na pressão do líquido cerebrospinal (LCS). É importante observar que a indometacina reduz a pressão do
LCS. Quando é considerado um diagnóstico de HP, deve-se realizar uma ressonância magnética (RM) para excluir
lesão hipofisária.
3. SUNCT/SUNA: a SUNCT (crises de cefaleia neuralgiforme unilateral de curta duração com hiperemia
conjuntival e lacrimejamento) é uma síndrome primária de cefaleia caracterizada por dor intensa, unilateral, orbital
ou temporal, em facadas ou latejante. O diagnóstico requer pelo menos 20 crises que durem de 5 a 240 segundos;
deve haver hiperemia conjuntival e lacrimejamento ipsilateral. Em alguns pacientes, a hiperemia conjuntival ou o
lacrimejamento não estão presentes, e pode-se estabelecer o diagnóstico de SUNA (crises de cefaleia
neuralgiforme unilateral de curta duração com sintomas autônomos cranianos).

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A dor de SUNCT/SUNA é unilateral, podendo ser localizada em qualquer local na cabeça. Três padrões básicos
podem ser observados: facadas isoladas, em geral de curta duração; grupos de facadas; ou uma crise mais longa
que compreende muitas facadas, entre as quais a dor não desaparece completamente, produzindo, assim, um
fenômeno “dentes de serra” com crises que duram muitos minutos. Cada padrão pode ser observado no contexto
de uma cefaleia subjacente contínua. As características que levam a um diagnóstico suspeito de SUNCT são a
capacidade de desencadeamento cutâneo (ou outros) das crises, ausência de período refratário para
desencadeamento entre crises e ausência de resposta à indometacina. Com exceção do distúrbio sensorial
trigeminal, o exame neurológico é normal na SUNCT primária.
O diagnóstico de SUNCT/SUNA frequentemente se confunde com a neuralgia do trigêmeo (NT), em particular na
primeira divisão do nervo trigêmeo. Sintomas autônomos cranianos mínimos ou ausentes e um nítido período
refratário para desencadeamento indicam o diagnóstico de NT.
A terapia das crises agudas não é um conceito útil na SUNCT/SUNA, pois as crises são de duração muito curta.
Entretanto, a lidocaína intravenosa, que suspende os sintomas, pode ser usada nos pacientes hospitalizados.
O objetivo do tratamento é a prevenção a longo prazo para minimizar a incapacidade e a hospitalização. O
tratamento preventivo mais eficaz é a lamotrigina, 200 a 400 mg/dia. O topiramato e a gabapentina também
podem ser eficazes. Os pacientes relataram que a carbamazepina, 400 a 500 mg/dia, oferece benefício modesto. As
abordagens cirúrgicas, como a descompressão microvascular ou os procedimentos trigeminais destrutivos,
raramente são úteis e muitas vezes produzem complicações a longo prazo. Uma injeção no nervo occipital maior
produziu benefícios limitados em alguns pacientes. A estimulação do nervo occipital é provavelmente útil nesse
subgrupo de pacientes. O completo controle com estimulação cerebral profunda da região hipotalâmica posterior
foi relatado em um único paciente. Para casos intratáveis, a prevenção a curto prazo com lidocaína intravenosa
pode ser eficaz, assim como a estimulação do nervo occipital.
4. Hemicrania contínua: caracteriza-se por dor unilateral moderada e contínua associada a oscilações de dor
intensa; resolução completa da dor com indometacina; e exacerbações que podem ser associadas a manifestações
autonômicas, como hiperemia conjuntival, lacrimejamento e fotofobia no lado afetado. A idade de início varia de
11 a 58 anos; as mulheres são acometidas duas vezes mais do que os homens. A causa é desconhecida.
 Outras cefaleias primárias
1. Cefaleia primária da tosse: é
uma cefaleia generalizada que começa
repentinamente, tem a duração de
alguns minutos, algumas vezes até
algumas horas, e é precipitada pela
tosse; é passível de prevenção ao se
evitar a tosse ou outros eventos
precipitantes, o que pode incluir
espirros, esforço, risos ou a inclinação.
Em todos os pacientes com essa
síndrome, etiologias graves têm de ser excluídas antes que um diagnóstico de cefaleia primária da tosse “benigna”
possa ser estabelecido. Uma malformação de Chiari ou qualquer lesão que cause obstrução das vias de LCS ou
desloque estruturas cerebrais podem ser a causa da cefaleia. Outros distúrbios que podem apresentar-se com a
cefaleia da tosse ou aos esforços como sintoma inicial incluem aneurisma cerebral, estenose da carótida e doença
vertebrobasilar. A cefaleia da tosse benigna pode assemelhar-se à cefaleia aos esforços benigna, porém os
pacientes com o primeiro distúrbio são mais velhos.
A indometacina, 25 a 50 mg, 2 ou 3×/dia, é o tratamento de escolha. Alguns pacientes com cefaleia da tosse
conseguem a interrupção completa da crise com punção lombar; esta é uma opção simples se comparada ao uso
prolongado de indometacina e é eficaz em cerca de um terço dos pacientes. O mecanismo de tal resposta é
obscuro.

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2. Cefaleia primária do esforço: tem características semelhantes às da cefaleia da tosse e da enxaqueca. Pode
ser precipitada por qualquer forma de exercício; muitas vezes tem a característica de latejamento da enxaqueca. A
dor, que pode durar 5 minutos ou 24 horas, é bilateral e latejante no início; as características da enxaqueca podem
desenvolver-se em pacientes suscetíveis. A duração tende a ser mais curta em adolescentes do que em adultos. A
cefaleia primária aos esforços pode ser prevenida evitando-se esforços excessivos, particularmente em climas
quentes ou altas altitudes.
A distensão venosa aguda provavelmente explica uma síndrome – o início agudo da cefaleia com esforço e
suspensão da respiração, como na cefaleia do levantador de peso. Como o esforço pode resultar em cefaleia em
diversos distúrbios subjacentes graves, estes devem ser considerados em pacientes com cefaleia aos esforços. A dor
da angina pode ser referida na cabeça, provavelmente por conexões centrais de aferentes vagais, podendo
apresentar-se como cefaleia aos esforços (cefalgia cardíaca). A ligação com exercícios é o principal indício clínico de
origem cardíaca. O feocromocitoma às vezes causa cefaleia aos esforços. As lesões intracranianas e a estenose das
artérias carótidas são outras etiologias possíveis.
Os esquemas de exercícios devem começar modestamente e progredir de modo gradual para níveis mais altos de
intensidade. A indometacina em doses diárias de 25 a 150 mg costuma ser eficaz na cefaleia aos esforços benigna.
Indometacina (50 mg), ergotamina (1 mg VO), di-hidroergotamina (2 mg por spray nasal) ou metissergida (1 a 2 mg
VO administrados 30 a 45 minutos antes do exercício) são medidas profiláticas úteis.
3. Cefaleia primária associada à atividade sexual: três tipos de cefaleia associada à atividade sexual são
relatados: dor surda na cabeça e pescoço que se intensifica à medida que aumenta a excitação sexual; cefaleia
súbita, explosiva e intensa que ocorre no orgasmo; e cefaleia postural que se desenvolve após o coito e é
semelhante à cefaleia da hipotensão liquórica. A última pode surgir com atividade sexual vigorosa e é uma forma de
cefaleia de baixa pressão do LCS. As cefaleias que se desenvolvem no momento do orgasmo nem sempre são
benignas; 5 a 12% dos casos de hemorragia subaracnóidea são precipitados pela relação sexual. A cefaleia do coito é
relatada por homens mais frequentemente do que por mulheres e pode ocorrer em qualquer momento durante os
anos de atividade sexual. Pode desenvolver-se em várias ocasiões em sucessão e depois não perturbar mais o
paciente mesmo sem mudança evidente da atividade sexual. Nos pacientes que interrompem a atividade sexual
quando a cefaleia é observada pela primeira vez, a dor pode desaparecer em um período de 5 minutos até 2 horas.
Em metade dos pacientes, a cefaleia do coito desaparece em 6 meses. Metade dos pacientes com cefaleia do coito
apresenta história de cefaleia aos esforços, mas não há maior frequência de cefaleia da tosse. A enxaqueca
provavelmente é mais comum em pacientes com cefaleia do coito.
As cefaleias do coito benignas recorrem de maneira irregular e infrequente. O tratamento muitas vezes pode ser
limitado à orientação e ao aconselhamento para interromper a atividade sexual se surgir uma cefaleia leve, de
advertência. O propranolol pode ser usado para evitar a cefaleia que recorre regularmente ou com frequência, mas
a dose necessária varia de 40 a 200 mg/dia. Uma alternativa é o agente bloqueador dos canais de cálcio diltiazem,
60 mg 3×/dia. A ergotamina (1 mg) ou a indometacina (25 a 50 mg) tomadas 30 a 45 minutos antes da atividade
sexual também podem ser úteis.
4. Cefaleia primária em trovoada: o início súbito de cefaleia intensa pode ocorrer na ausência de qualquer
provocação conhecida. O diagnóstico diferencial inclui sangramento-sentinela de um aneurisma intracraniano,
dissecção arterial cervicocefálica e trombose venosa cerebral. As cefaleias de início explosivo também podem ser
causadas pela ingestão de fármacos simpaticomiméticos ou de alimentos que contêm tiramina em um paciente que
está usando IMAO, ou podem ser um sintoma de feocromocitoma. Não se sabe se a cefaleia em trovoada pode ser a
apresentação de um aneurisma cerebral não rompido. Quando os exames de neuroimagem e a punção lombar
excluem hemorragia subaracnóidea, os pacientes com cefaleia em trovoada em geral ficam um longo período muito
bem. Em um estudo de pacientes cuja tomografia computadorizada (TC) e achados do LCS foram negativos, cerca de
15% apresentaram episódios recorrentes de cefaleia em trovoada e, quase metade dos pacientes desenvolveu
subsequentemente enxaqueca ou CT.
5. Cefaleia por estimulo frio: se refere à dor de cabeça desencadeada pela aplicação ou ingestão/inalação de
algo frio. Acontece rapidamente e em geral termina em 10 a 30 minutos após a remoção do estímulo. Ela é mais

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bem reconhecida como cefaleia do “cérebro congelado” ou cefaleia do sorvete, que ocorre com a sua ingestão.
Embora o frio possa ser desconfortável, em algum nível, para muitas pessoas, é a natureza confiável, grave e um
tanto prolongada dessas dores que a distingue. O potencial de ação transitório do receptor da subfamília M
membro 8 (TRPM8), um conhecido sensor de temperatura fria, pode ser um mediador dessa síndrome.
6. Cefaleia por pressão externa: a pressão externa de compressão ou tração sobre a cabeça pode produzir
uma dor com algum componente generalizado, embora geralmente se concentre em torno do local da pressão. Ela
costuma desaparecer em uma hora após a remoção do estímulo. Exemplos de estímulos incluem capacetes, óculos
de natação ou rabos de cavalo muito longos. O tratamento consiste em reconhecer o problema e remover o
estímulo.
7. Cefaleia em facadas: dor em facadas restritas à cabeça ou, raramente, à face, que duram de 1 a muitos
segundos ou minutos e ocorrem como uma única facada ou uma série delas; ausência de características
autonômicas cranianas; ausência de gatilhos cutâneos das crises; e um padrão de recorrência em intervalos
irregulares (horas a dias). As dores foram descritas de maneiras variadas como “dores do furador de gelo” ou
“estocadas e solavancos”. São mais comuns em pacientes com outras cefaleias primárias, como enxaqueca, CAT e
hemicrania contínua.
A resposta da cefaleia primária em facadas à indometacina (25 a 50 mg 2 ou 3×/dia) costuma ser excelente. De
modo geral, os sintomas vêm e vão, e, após um período de controle com indometacina, é apropriado suspender o
tratamento bem como observar o resultado.
8. Cefaleia numular: é sentida como um desconforto fixo arredondado ou elíptico, que varia em tamanho de
1 a 6 cm e que pode ser contínua ou intermitente. Raras vezes, pode ser multifocal. Pode ser episódica, porém é
mais frequentemente contínua durante as exacerbações. Acompanhando a dor, pode haver um distúrbio sensorial
local, como alodinia ou hipestesia. Lesões dermatológicas ou ósseas locais precisam ser excluídas por exames e
investigação. Esta condição pode ser difícil de tratar; tricíclicos, como a amitriptilina, ou anticonvulsivantes, como o
topiramato ou valproato, são com mais frequência tentados.
9. Cefaleia hípnica: esta síndrome de cefaleia começa algumas horas após o início do sono. As cefaleias duram
15 a 30 minutos e são moderadamente graves e generalizadas, mas podem ser unilaterais e latejantes. Os pacientes
podem relatar volta ao sono apenas para serem acordados por uma nova crise algumas horas mais tarde; até três
repetições deste padrão ocorrem durante a noite. Cochilos durante o dia também podem precipitá-la. A maioria dos
pacientes é do sexo feminino, e o início em geral ocorre após os 60 anos de idade. As cefaleias, em sua maioria, são
bilaterais, mas podem ser unilaterais. Fotofobia, fonofobia e náuseas costumam estar ausentes. A principal
consideração secundária neste tipo de cefaleia é a hipertensão arterial mal controlada; o monitoramento da
pressão arterial de 24 horas é recomendado para detectar este distúrbio tratável.
Os pacientes com cefaleia hípnica geralmente respondem a uma dose de carbonato de lítio (200 a 600 mg) na hora
de dormir. Para os intolerantes ao lítio, verapamil (160 mg) ou metissergida (1 a 4 mg ao dormir) podem ser
estratégias alternativas. Uma ou duas xícaras de café ou cafeína, 60 mg VO, ao dormir são eficazes em 33% dos
pacientes. Alguns relatos de casos também sugerem que a flunarizina, 5 mg ao dormir, pode ser eficaz.
10. Cefaleia diária persistente nova (CDPN): ocorre em homens e mulheres, podendo ser do tipo enxaquecoso,
com características de enxaqueca ou assintomática, semelhante ao início de uma nova CT. As manifestações de
enxaqueca são comuns e consistem em cefaleia unilateral e dor latejante; cada manifestação está presente em
cerca de 33% dos pacientes. Náuseas, fotofobia e/ou fonofobia ocorrem em metade dos pacientes. Alguns
pacientes têm história prévia de cefaleia; entretanto, a proporção de pessoas acometidas pela CDPN com
enxaqueca preexistente não é maior do que a frequência de enxaqueca na população geral. Após 24 meses, cerca
de 86% dos pacientes deixam de ter cefaleia. O tratamento do tipo enxaquecoso consiste na utilização de terapias
preventivas na enxaqueca. A CDPN sem manifestações é uma das formas de cefaleia primária mais refratárias ao
tratamento. As terapias preventivas comuns podem ser oferecidas, mas frequentemente são ineficazes.

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