Você está na página 1de 3

32

fundamental na produção dos sons da fala. A seguinte passagem ilustra bem a


importância desse órgão para a articulação:

Para as vogais, a língua sozinha determina o tamanho da passagem


(abertura) nas zonas mais ou menos anteriores ou posteriores da
20
cavidade bucal (...). (CUQ, 2003, p. 26-27, tradução nossa)

O conhecimento em fonética articulatória pode ser um dos recursos para


se desenvolver as habilidades de pronúncia. Para tanto, será importante para
os professores conhecer o aparelho articulatório e saber como os sons
articulados.

Como os sons são geralmente classificados conforme o modo de


produção e o lugar de sua articulação, é necessário ter um
conhecimento, mesmo que resumido, do aparelho fonador e dos
21
mecanismos de produção da fala. (DERIVERY, 1997, p. 15,
tradução nossa).

Entretanto, a articulação dos fonemas está intimamente ligada à sua


discriminação. Desse modo, apresentamos a seguir uma definição de fonética
perceptiva (ou auditiva), bem como de algumas teorias relacionadas à
percepção de sons em LE.

2.1.3.2 Fonética Perceptiva (ou Auditiva)

A fonética auditiva estuda como os sons são percebidos pelo ouvido


humano.

A abordagem dos sons da fala considerando os aspectos perceptuais


(...) visa explicar como se dão os processos psicológicos pelos quais
as pessoas percebem a fala, ou seja, como o cérebro utiliza vários
traços e características de um ‘pedaço’ de um som para reconstruir a

20
« Pour les voyelles, seule la langue détermine la grandeur du passage (l'aperture) dans des
zones plus ou moins antérieurs ou postérieurs de la cavité buccale (...). »
21
« Comme les sons sont généralement classés d'après leur mode de production et leur lieu
d'articulation, il est nécessaire d'avoir une connaissance même sommaire de l'appareil
phonatoire et des mécanismes de production de la parole. »
33

imagem fônica pretendida pelo falante. À fonética auditiva cabe


estudar os sons da fala sob o aspecto perceptual. (SILVA, 2007, p. 9).

Embora a audição seja fundamental para o aprendizado de uma LE, no


caso dos adultos, a pronúncia não se aprende somente ouvindo. A dificuldade
na percepção implica a impossibilidade de produzir adequadamente os sons da
LE. Essa dificuldade é conhecida por surdez fonológica.
Conforme anunciamos na Justificativa, os estudiosos do Círculo
Linguístico de Praga, Polivanov e Trubetskoy, precursores das análises no
campo da fonologia estrutural, desenvolveram teorias sobre a aquisição e a
aprendizagem dos sons em LE.
A partir dessas teorias, encontramos as contribuições de Polivanov com
o conceito de “surdez fonológica” e de Trubetskoy com o conceito “crivo
fonológico”.
A surdez fonológica não se trata de uma surdez patológica, porém de um
hábito de tratamento do sinal da fala, isto é uma interpretação. (LAURET, 2007,
p. 30).

Quando ouvimos uma palavra estrangeira desconhecida [...] tratamos


de reencontrar nela um complexo de representações fonológicas
nossas, de decompô-las em fonemas peculiares à nossa língua
materna e em conformidade com nossas leis de agrupamento dos
fonemas (POLIVANOV, 1978, p. 113).

Já a noção de “crivo fonológico”, de Trubetzkoy, seria o fato de o sistema


fonológico da língua materna atuar como um filtro fonológico, isto é, um filtro
perceptivo.

O homem se apropria do sistema da sua língua materna. Mas, se ele


ouve outra língua, emprega involuntariamente para análise do que
escuta o crivo fonológico da sua língua materna, que lhe é familiar. E
como esse crivo não convém à língua estrangeira escutada,
acontecem vários erros e incompreensões. Os sons da língua
estrangeira recebem uma interpretação inexata, já que ele os fez
passar pelo ‘crivo fonológico’ de sua própria língua. (citado por LeBel,
2015, p. 66)

Nas palavras de GUBERINA (citado por Abry, 2007, p. 53, tradução


34

nossa):

Nossa percepção de sons é condicionada por nosso sistema


fonológico. Uma “peneira fonológica” nos impede de perceber
corretamente os sons da língua estrangeira aprendida. É preciso
22
reeducar o ouvido…

Isto é, o aprendiz não será capaz de reproduzir os sons de uma língua


estrangeira se não for capaz de distingui-los.
François Wioland, foneticista francês, apresenta a seguinte metáfora
desse fenômeno: “Da mesma maneira que é difícil reconhecer de vista alguém
que eu nunca vi, é impossível reconhecer de ouvido um som que não
conheço.23” (2005, p. 16, tradução nossa)
No entanto, conforme ressalva Lauret (2007, p. 30), ouvir a língua
estrangeira por meio do crivo de sua língua materna não impedirá a descoberta
de novas línguas.

2.1.2.3 Fonética Acústica

A fonética acústica contempla o estudo das propriedades físicas dos


sons da fala a partir de sua transmissão do falante ao ouvinte.

Acusticamente, a fala é formada por frequência (que se refere à


vibração das moléculas do ar causadas por um objeto vibrante e cujo
correlato auditivo é a altura, que distingue o grave do agudo);
amplitude (que se refere ao deslocamento máximo de uma partícula
de seu lugar de descanso e cujo correlato perceptual é a intensidade,
que distingue o forte e o fraco); e o tempo (que se refere ao momento
em que os articuladores se movimentam para a produção de um
segmento e cujo correlato auditivo é a duração, que distingue o breve
e longo). (SOUZA e SANTOS, 2012, p. 12)

Essa “ciência tem se beneficiado muito dos recentes avanços


tecnológicos (...) por esse motivo tem ficado cada vez mais próxima da Física e
da Engenharia (...)” (CAGLIARI, 2012, p. 114)

22
« Notre perception des sons est conditionnée par notre système phonologique. Un ‘crible
phonologique’ nous empêche de percevoir correctement les sons de la langue étrangère
apprise. Il faut donc rééduquer l'oreille... » Peter Guberina, 1960.

23
« De la même manière qu’il m’est impossible de reconnaître de vue quelqu’un que je ne
connais pas, il m’est impossible de reconnaître à l’oreille un son que je ne connais pas (...) »

Você também pode gostar