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TUDO QUE VOCÊ SEMPRE QUIS

SABER SOBRE OS PORQUÊS


A primeiríssima coisa que no geral sobe à cabeça de todos, ainda que de lá
não lhes desça para a língua, é a seguinte: por que raios não escrevemos
todos os porquês iguais, de um só jeito?

A vida já não é suficientemente difícil, caceta?

Existir já não é ficar à mercê de forças incontroláveis e inesperadas? A


hemorragia de boletos não se estanca nunca; o mundo gira sem parar,
chacoalhando tudo o que nele há todo santo dia.

Então por que não escrever este meu último porquê com a forma “porque”?
Por quê?

Ora, uma das consequências indigestas do ensino "facilitado" do português,


que foge à análise de sua lógica interna como o Capeta foge da Cruz, tudo
reduzindo a eternos macetes, truques e artimanhas, é criar nos alunos,
macete a macete, a impressão de que a língua inteira é um enorme sopão
de letrinhas boiando aleatoriamente.

Sendo os alunos, por seu lado, heroicamente preguiçosos e imediatistas, a


macetização (sim, eu acabei de criar essa palavra) universal do português
vai-se impondo com tranquilidade e sem esforços.

Mas o Português não é aleatório. Não é tão inescapavelmente exato feito a


Matemática, claro; mas também não é a Casa da Mãe Joana.

Se bem haja, realmente, alguma confusão que poderia ter sido evitada em
relação à grafia do “por que” interrogativo,1 coisa que inexiste em francês

1
Em Portugal, escreve-se “porque" também quando se faz perguntas, e Napoleão Mendes de
Almeida diz ser estranho que na ortografia oficial brasileira exija-se a separação do “que” de “por”
quando “por que” é um advérbio interrogativo. Noutras línguas, o “por que” interrogativo é sempre
escrito junto. Só o Brasil quis ser diferentão.
(‘pourquoi’) ou italiano (‘perché’), a verdade é a seguinte: funções
diferentes, porquês diferentes.

Cada uma das formas tem suas funções e todas as suas características (se
separado, se junto, se com acento…) podem ser explicadas por meio da
análise morfológica.

Isso quer dizer que os macetes levarão todos um pé na bunda? Não.


Macetes são válidos, desde que sirvam de auxílio à análise e não se finja que
são suficientes ou mágicos.

“Raul, peraí, tô perdido.”

Tudo bem, estamos apenas no começo da aula. Tudo o que eu disse aqui
será mais bem explicado2 um pouco à frente.

Agora, o importante é você entender que não existem quatro porquês por
frescura ou malvadeza de gramáticos amargos que, não pegando ninguém,
passam dia e noite a inventar novas regrinhas como torturas linguísticas.

Comecem a treinar-se para pensar sobre a língua com lógica — é isso que
tentaremos fazer aqui.

Quatro porquês, várias funções.


Vejamos quais são eles e para que servem.

2
Hoje, no Instagram, um seguidor perguntou-me se a seguinte frase, que postei nos stories, estava
certa:

“Neste ano, o plano é tornar o conteúdo muito mais consistente e melhor planejado."

Perguntou-me ele se o “melhor” antes do verbo no particípio não estava errado. Reproduzo aqui
minha resposta:

“Gramaticalmente, a ferro e fogo, boa parte dos estudiosos dirá ser errado usar “melhor" ou “pior”
antes de um verbo no particípio — como no caso de “preparado”. Como professor, portanto, sou
obrigado a dizer-lhes que essa é a regra. Em provas, quem usasse uma construção dessas perderia
pontos. Só que eu tenho birra com “mais bem preparado” e construções aparentadas. Nesse caso,
meu senso estético mostra o dedo do meio às normas.”

Como se vê, engoli meu (bom) gosto e aqui usei um “mais bem explicado”. Sempre que possível,
quero mostrar-lhes as sutilezas da língua e os pontos de conflito entre a estilística e a gramática
normativa.
Hoje em dia, o bom professor tem duas funções. O ensino é a segunda e só
vem depois. Antes, vem um sistemático, impiedoso e profundo desensino.

Duas meias lições não criam uma lição completa. Vão criando, isto sim, uma
cabeça confusa, repleta de informações fragmentárias e desconexas. Vão
criando um hábito de preguiça e frouxidão cognitivas.

Em uma palavra: vão deixando você mais burro.

Ora, e o que acontece quando um aluno serelepe põe-se a vasculhar a


internet para descobrir quais são os porquês e como usá-los? Dá de cara
com coisas assim:

“'porquê' vem sempre depois do artigo ‘o’”;

“'por que' é para perguntas diretas e indiretas”;

“‘porque’ é para respostas”.

Dá de cara com as explicações simplistas. E o problema com as explicações


simplistas é este: às vezes, funcionam. Às vezes. O aluno acredita ter
entendido a coisa e fecha-se para novos aprendizados. Mas os macetes só
“funcionam”. Não existe aprendizado real. Não existe inteligir.

Inteligir, que segundo o dicionário quer dizer “alcançar com a inteligência”,


“compreender" ou “entender”, vem do latim intellegere. Segundo uma antiga
tradição, na raiz etimológica do termo latino estavam as palavras intus e
legere — “ler dentro”.

Entender o que se lê é ler dentro do que se lê. A inteligência não fica


só a patinar sobre a superfície das palavras e frases. Entra nelas. Disseca-
lhes o sentido e as estruturas gramaticais. Conhece os diversos níveis de
análise de uma língua.

Em uma palavra: você fica mais inteligente.

Nesta breve análise sobre os porquês, iremos analisar os quatro diabos e,


sim, aqui e acolá, usar alguns macetes úteis. A ideia é que você saia daqui e
tanto tenha conseguido inteligir algo quanto tenha coletado ferramentas
práticas para melhorar o seu português JÁ HOJE.

Então beleza? Bora aprender tudo o que você sempre quis saber sobre os
famigerados PORQUÊS.
O primeiro porquê é o todo junto, com acento. A primeiríssima pergunta a
nos fazermos não é como saber quando usá-lo ou por qual palavra
poderíamos trocá-lo.

A pergunta é: que raios de tipo de palavra é ele?

Como você, caro aluno, com certeza já deu uma olhada no PDF do
Intensivão, está careca de saber o que vem a seguir quando eu falo de tipos
de palavras, né não?

Acertô, mizerávi!

São as CLASSES GRAMATICAIS.

A primeira pergunta que você tem de se fazer, portanto, é esta: qual é a


classe gramatical do “porquê" junto e com acento?

Sabendo-a, poderá saber quais são suas características e para que ele serve,
afinal de contas, nas frases.

Pois bem. Cortemos o lengalenga e digamos de uma vez que porquê é um


substantivo. Como tal, está sujeito às regras que se impõem a todos os
substantivos.

“Raul, que regras?”

Ora, pode-se dividir as dez classes gramaticais em três grupos diferentes: os


grupos NOMINAL, VERBAL e RELACIONAL.

No grupo NOMINAL estão os substantivos, pronomes, adjetivos, artigos e


numerais. Ao todo, portanto, cinco classes gramaticais.

No grupo VERBAL estão os verbos e advérbios.

No grupo RELACIONAL, as preposições e conjunções.


As interjeições, a décima classe, não têm grupo e andam por aí desgarradas,
as coitadas.

Reparem que temos três panelinhas. Na panelinha nominal, uma das classes
é a mais importante. É a estrelinha. A popular do grupo. Um spoiler
importantíssimo para sabermos de qual classe estou falando vê-se logo na
cara da panelinha: NOMINAL tem a ver com NOME. E quais são as palavras
responsáveis por dar nomes às coisas?

São os substantivos.

As outras quatro são suas paga-paus.

Os pronomes, os adjetivos, os artigos e os numerais existem em função dos


substantivos e a eles se ligam. Daí que estejam agrupadas numa só
panelinha.

“Beleza, Raul, entendi. Você é um professor massa, de


verdade. Tô entendendo tudo.
Mas o que isso tem a ver com o ‘porquê’?”

Ora, um dos macetes incompletos contra os quais trovejei no começo desta


aula diz respeito precisamente ao porquê substantivo.

Diz a regrinha: "quer saber se é um ‘porquê' junto e com acento? É só pôr-


lhe um 'o' na frente e ver se funciona.”

Isso é balela.
Não é verdade que o porquê substantivo sempre tem um “o" antes de si.
Pode tê-lo? Sim, claro. Mas nem sempre. Então qual é a regra?

A regra verdadeira é a seguinte: quase sempre, o porquê substantivo está


determinado por outras palavras. Que é ser determinado? É ser
especificado. Alguma outra palavra especifica os porquês substantivos.

Mas não é qualquer palavra. São quatro tipos específicos de palavras.


Consegue adivinhar quais são?

Adjetivos, numerais, pronomes e, sim, artigos. E, não: não é coincidência


nenhuma que sejam as classes gramaticais do grupo NOMINAL, já que o
"porquê" junto e com acento é um substantivo.

Está entendendo? Sendo um substantivo, o “porquê” dança conforme a


música dos substantivos. Está no grupo NOMINAL e sua panelinha são as
quatro classes gramaticais cá de cima, e não “o" ou algum outro artigo só.

Já se pode ver, apenas com este primeiro exemplo, como é superficial e


criminosamente incompleta aquela abordagem reducionista dos macetes.

Existe, aqui, todo um tesouro de morfologia à espera de algum marujo que


não tenha medo de descer às profundezas da língua em vez de só ficar na
praia, brincando com seus baldes de areia.

Vamos aos exemplos:

Determinado por algum adjetivo, pode surgir assim: “Falsos porquês3 não
me comovem”.

Por algum numeral, pode ser determinado por número que seja cardinal:
“três porquês”; “cinco porquês”;

ordinal: “Este já é seu quinto porquê e você ainda não me convenceu”;

fracionário: “Sua explicação não chega nem a meio porquê”.

3
E se o adjetivo vem antes ou depois do substantivo, tanto faz.
Pode ser determinado por pronomes: “Seu porquê não faz sentido” ou
“Este porquê não faz sentido”.

Pode ser determinado, enfim, por artigos: “Uns porquês” ou “o porquê”.

Por que, porém, eu escrevi que “quase sempre” são determinados? Porque,
em raras ocasiões, podem surgir livres em alguma frase, determinados por
palavra nenhuma: “Porquês não me interessam.”

Qual é um macete bom aqui? Em caso de dúvida, basta saber se o tal


“porquê" pode ser pluralizado. Se sim, é substantivo e tem de ser escrito
junto e com acento. No mais, observe as palavras ao seu redor.

E o primeiro porquê (viu?) já foi.

“Ai, Raul, esse aí eu já sei. A gente só usa ele em


perguntas, antes de pontos finais”.

Errado.

Veja, por exemplo, esta frase: “Não fui lá, e já lhe disse por quê!”

Como se vê, nem se trata de uma pergunta, nem o “por quê” veio antes de
um ponto final.

Aqui, porém, o melhor é sem rodeios já dizer como se identifica a


necessidade de usar o “por quê”: ele vem sempre no final de alguma frase.
Ou seja: antes de um ponto, seja ele final, de interrogação ou exclamação.

O modo mais fácil de saber quando usá-lo é caçar uma pausa. Se


vier antes dela, bingo.
“Mas, Raul, por que o acento?”

Pelo mesmo motivo que nos obriga a pôr um acento circunflexo no porquê
substantivo: pela entonação da voz.4 Diga, em voz alta, com a velocidade
normal da fala, estas duas frases:

“Por que você chegou mais cedo?”


“Você chegou mais cedo por quê?”

Reparou em alguma diferença? Se não, leia-as de novo e preste especial


atenção ao início da primeira e ao final da segunda. Nesta última, o “quê” não
some na fala como o primeiro, que mal é dito e só serve para fazer uma
ponte até o “você”. É um monossílabo átono. Uma palavra cujo som é
fraquinho e não se garante sozinho. Tem de pegar carona na pronúncia de
outros vocábulos.

Quando aparece no final da frase, o “quê" torna-se tônico. Nós o


pronunciamos com maior intensidade. Deixa de ser um fracote sonoro e
ganha autonomia. Torna-se um fonema empoderado (urgh).
Para resumir a história, portanto: cace pontos (finais, interrogativos ou
exclamativos) e saiba ser o seu “quê” acentuado por conta do som mais forte
que ganha no final das frases.

O “por quê” é mamão com açúcar.

4
O “porque" junto e sem acento, que é uma conjunção, faz parte dos poucos vocábulos átonos do
português. Ou seja: palavras cujo som é fraco, débil, e quase não se sustenta sozinho. O “porquê"
substantivo não é assim. Seu som é forte, acentuado. Destaca-se e faz-se ouvir nitidamente. O
acento marca sua tonicidade.
Aqui já temos um caso mais interessante, que dá pano pra mangas. Se no
“por quê” o melhor a se fazer era pular a classificação morfológica, aqui o
inverso é verdadeiro.

“Por que” pode ser ou locução adverbial interrogativa ou


preposição + pronome relativo.

“Raul, não entendi nada."

Vamos com calma. Sabe aquela história de o “por que” ser das perguntas?
Pois é. Não estava errada. Só está incompleta.

Antes de tudo, vamos analisar o que raios quer dizer “locução adverbial
interrogativa”.

Que caceta é “locução”? Ora, locução é uma expressão formada a partir da


união de duas ou mais palavras. A tal expressão acabará tomando o lugar
de alguma palavra única e fazendo o serviço que deveria ser dela. Ou seja:
em vez de usar o adjetivo “homem corajoso", usa-se a locução adjetiva
“homem de coragem”. Em vez de usar o advérbio “silenciosamente”, usa-se
a locução adverbial “em silêncio”.

Viram como são duas palavras fazendo o serviço de uma só? Aí estão as
locuções. Existem locuções adjetivas, adverbiais, conjuntivas, prepositivas,
verbais… enfim, um monte delas.

Já está respirando mais aliviado aí, né? Agora, só falta o “interrogativa”. “Por
que” é uma locução adverbial interrogativa. Ou seja: são duas palavras que
fazem o serviço de um advérbio interrogativo.

Fácil, né não?

Pois bem. Quando o “por que” é locução adverbial interrogativa, temos o


famoso “por que” das perguntas, que podem ser diretas (com a locução
logo no começo da frase):
“Por que você estuda português?”

“Por que o Brasil não vai pra frente?”

Ou indiretas (com a locução no meio da frase, e o ponto de interrogação


facultativo):

“Você sabe por que o Brasil não vai pra frente?”

E também pode ser usado em respostas:

“Você sabe muito bem por que o Brasil não vai pra frente.”

“Beleza, Raul, eu entendi. Mas não tem um jeito mais


fácil de identificá-lo numa frase? Algum macete?"

Pior que tem.

Em “por que” pode-se embutir sempre as palavras “razão” ou “motivo”:

“Por que [motivo] você estuda português?”;


“Por que [razão] o Brasil não vai pra frente?”

Para resumir a história, o “por que” locução adverbial interrogativa é


igualzinho ao “por quê” — a única diferença entre ambos é a posição que
ocupam na frase, e o consequente acento que neste último marca a ênfase
na voz.

Maaaaaaas…

Temos o mesmíssimo “por que” exercendo outra função. O “por que” pode
ser também preposição + pronome relativo.

Não precisa se assustar, a coisa é na verdade bastante simples. Como


sempre fazemos, vamos primeiro analisar cada um dos termos.

Que é uma preposição mesmo?


Preposições são palavras que ligam outras palavras entre si e entre elas
estabelecem certas relações. Lembra-se? As preposições fazem parte da
categoria de classes gramaticais chamadas relacionais — palavras que
existem para criar relações entre as outras. “Por" é uma delas. Existem várias
outras.

Pronomes, por sua vez, são uma classe gramatical gigantesca. Sua
definição clássica é que servem ou para substituir, ou para retomar o
substantivo.

Em vez de apenas repetirmos algum substantivo até torná-lo intragável para


leitor ou interlocutor, a língua nos deu os pronomes. Podem ser pessoais
(ele, o), de tratamento (você, o senhor), possessivos (meu, nosso, seu),
demonstrativos (aqui) e por aí vai…

O que seria, portanto, um pronome relativo? Veja este exemplo:

“Fulano comprou o curso que lhe parecia ser o melhor.”

A palavra que representa o substantivo curso. Relaciona-se com ele. A frase


acima é a alternativa, muito mais elegante, a dizer: “Fulano comprou um
curso. Este curso lhe parecia ser o melhor.”

Os pronomes relativos não têm significação própria. Refere-se sempre a um


termo antecedente:

“Havia a escola, que era azul…"

Este que significa escola.

Voltando, portanto, ao segundo "por que”: trata-se de uma preposição unida


a um pronome relativo. Que raios isso quer dizer? Leia com atenção a
seguinte frase:

“Estas são as reivindicações por que estamos lutando."

Pergunta: funcionaria aplicar, aqui, o macete de imaginar um “motivo" ou


“razão" depois da expressão?

“Estas são as reivindicações por que [motivo] estamos lutando”?


Não, obviamente não funciona. E não funciona porque são funções
diferentes, com significados diversos.

Que funções são essas? É muito simples. Voltemos ao nosso exemplo:

“Estas são as reivindicações por que estamos lutando.”

Quem luta, luta por alguma coisa, certo? O por da frase está ligado ao verbo
lutar.

E o que? Lembre-se do que já aprendemos sobre os pronomes relativos:


representam algum termo anterior; relacionam-se com ele. Qual é o termo
representado pelo que? Estas? São? Claro que não. O termo por ele
representado é as reivindicações.

Fácil, não é? Outro exemplo:

“O túnel por que deveríamos passar desabou ontem”.

Quem passa, passa por alguma coisa. Por liga-se a passar. Que, por sua vez,
representa túnel.

“Raul, existe algum macete?"

Sim, criatura. Existe. E esse é dos bãos. Nunca falha.

Em linhas gerais, o “por que” equivale a “pelo qual” ou alguma de suas


flexões (“pela qual”, “pelos quais” ou “pelas quais”).

“Estas são as reivindicações pelas quais estamos lutando”; “O túnel pelo qual
deveríamos passar desabou ontem”.

E esse macete funciona sempre por um motivo muito simples: “por que” é,
simplesmente, a versão invariável de “pelo qual” e suas flexões. A função é
a mesma. Portanto, se lhe surgir alguma dúvida basta você se perguntar:
“aqui cabe um ‘pelo qual’?” Se sim, manda bala.

É um por que.
Moleza, só no sapatinho. Acabamos o “por que”. Passemos, agora, ao último
e mais chatinho.

O “porque”.

Ufa! Chegamos, enfim, ao último dos porquês. O porque junto e sem


acento.

Fiéis à nossa estratégia, antes de tudo nos perguntemos: qual é sua classe
gramatical?

O porque junto e sem acento é uma conjunção. Vimos já porquês


substantivos, locuções adverbiais interrogativas e preposições + pronomes
relativos. Em todos os casos, as regras que se impõem às classes impõem-
se também aos diferentes porquês.

Não é diferente com esse último.

No começo do aulão, eu disse haver três grupos diferentes de classes


gramaticais: o NOMINAL, o VERBAL e o RELACIONAL. A conjunção faz parte
deste último, de mãos dadas com as preposições. Ambas servem para ligar
elementos uns aos outros e entre eles estabelecer certas relações. Qual é a
diferença de uma para outra?

Preposições ligam palavras. Conjunções ligam orações.

Logo, o porque serve para ligar orações5 entre si. Mas não existe u só tipo
de conjunção. Na verdade, existem vários. E o tal porque pode ser de três

5
Orações são enunciados construídos em torno de um verbo. Não entendeu nada? Então pense
assim: se existe um verbo, existe uma oração. Se existem dois verbos, duas orações. E assim por
diante. Noutra ocasião, quando chegarmos à sintaxe estudaremos as orações com calma.
tipos. Pode criar relações de motivo, causa, ou justificativa. Vamos a
exemplos:

“Não deixe de assistir às aulas da Comunidade, porque vai perder muito


conteúdo”.

“Não chore, porque na segunda-feira haverá aula normal."

Em ambos os casos, porque introduz uma explicação ou motivo. Se você


não assistir às aulas, perderá conteúdo. Logo, é melhor não as perder. Não
precisa chorar, e por qual motivo? Na segunda haverá aula normal. Este
porque é uma conjunção coordenativa explicativa. 6 Não precisa
ficar com medo do nome enorme. Foque-se no “explicativa”.

“Raul, e aqui, tem macete?” Tem. Lembra-se daquela regrinha de substituir o


porque pelo pois? Ela funciona aqui:

“Não deixe de assistir às aulas da Comunidade, pois vai perder muito


conteúdo”.

“Não chore, pois na segunda-feira haverá aula normal."

O que mais pode ser o porque junto e sem acento? Além de explicação,
pode ele introduzir uma causa:

“Raul passou no vestibular porque estudara muito”. 7

“O tambor soa porque é oco.”

Repare bem: aí a relação é de causa e efeito. A diferença entre as relações


causais e explicativas nem sempre fica lá muito clara, essa é a verdade. Para
os fins práticos, porém, não importa: de um modo ou de outro, se você quiser
exprimir motivo, causa ou justificativa, use o porque junto e sem acento e
vá correr pro abraço.

6
Como ligam orações entre si, as conjunções já entram no terreno da sintaxe. Aprofundar o assunto
traria confusões demais e esclarecimentos de menos para os alunos. Portanto, sobre os termos hei
de falar apenas o mínimo possível.
7
Mentira, fiz um vestibular de merda para entrar numa faculdade paga e meia-boca, da qual saí
seis meses depois de nela ter entrado.
: é substantivo. Entre os quatro, é o único porquê que se deixa
flexionar em número. Pode ser determinado por adjetivos, pronomes,
numerais ou artigos. É sinônimo de “motivo” e pode por ele ser trocado em
alguma frase. Em casos raros, pode aparecer sem que nenhuma outra
palavra o determine. É acentuado porque, na fala, deixa de ser átono e
ganha ênfase na voz.

“Porquês são inúteis.”

: o negócio dele são os fins das frases. Vem antes ou dum ponto
final, ou de interrogações ou exclamações. É acentuado porque ganha força
na pronúncia, torna-se tônico e passa a obedecer as regras de acentuação
dos monossílabos tônicos.8

“Você demorou tanto para ler esta aula por quê?"

: pode exercer duas funções diferentes. Se for locução


adverbial interrogativa, um truquezinho para identificá-lo é imaginar se
depois dele caberia um “motivo” ou “razão”. Pode vir tanto no começo de
uma frase quanto no seu meio.

“Por que [motivo] você demorou tanto para ler esta aula?”

Se for preposição + pronome relativo, equivale a “pelo qual” e suas flexões:

"Os maus bocados por que/pelos quais passamos foram inacreditáveis.”

: é ou conjunção que serve para explicar algo, ou conjunção que


introduz uma relação causal. No geral, equivale a “pois".

“Ele deve trabalhar de madruga, porque/pois está sempre sonolento.

8
A saber: devem ser acentuados todos os monossílabos tônicos terminados em -a, -e, -o, sejam
eles seguidos de “s” ou não.
Ufa!
Pronto. A partir de agora, você já sabe tudo o que precisa saber sobre os
porquês. No mínimo, sabe onde encontrar tudo o que sobre eles precisa
saber.

Um dos problemas com os quais eu sempre topava quando, no começo,


estudava tópicos gramaticais específicos, é o seguinte: como eu não sabia
nada, para estudá-los precisava parar e estudar cada um dos termos
gramaticais que tinham a ver com o assunto.

Aqui, brevemente expliquei-lhe o que são as classes gramaticais,


preposições, substantivos, pronomes relativos, vocábulos átonos e tônicos
e outras coisas mais. Não foi para encher linguiça. Foi para que pudéssemos
fazer um estudo real, e não a simples decoreba de truques cuja lógica
escapa-lhe completamente.

Até agora, não vi um material que fosse tão completo ou explicasse cada
um dos termos com tantos detalhes. Espero que ele possa ajudar você a pôr
um cabresto nos tais porquês e nunca mais sentir medo dos Quatro
Cavaleiros do Apocalipse do Português.

Cá embaixo, há alguns exercícios para fixação. Faça-os segundo


lhe convenha, de acordo com o tamanho do seu saco em tal ou qual hora.
Complete as frases com os porquês que lhes cabem:

“Este ________ não faz sentido.”

“Não é fácil saber ________ a situação teima em não melhorar."

“A situação teima em não melhorar ________ existe a safadeza


generalizada."

“Estas são as reivindicações ________ estamos lutando.”

“Creio que os verdadeiros ________ mais uma vez não vieram à luz.”

“Ainda não terminou? ________?”

“Você ainda continua enchendo o meu saco? É ________ eu não abro mão
das minhas ideias?”

Identifique, nos exemplos abaixo, se o "por que" é


locução adverbial interrogativa ou a junção de
preposição com pronome relativo:

“As aventuras por que passamos foram frenéticas.”

R: ________________________

“Não se sabe por que tomaram aquela decisão.”

R: ________________________
“A razão por que agi assim.”

R: ________________________

“O avião por que fui ao Rio.”

R: ________________________

Qual é único porquê que se flexiona, e por quê?

R: ____________________________________________________________
______________________________________________________________

Qual é a explicação para o acento de “por quê”?

R: ____________________________________________________________
______________________________________________________________

Que é uma locução?

R: ____________________________________________________________
______________________________________________________________

Que são conjunções?

R: ____________________________________________________________
______________________________________________________________
Quantos grupos de classes gramaticais existem? Quais
são eles?

R: ____________________________________________________________
______________________________________________________________

Quais são as duas palavras que podemos imaginar


depois do “por que” para saber se é ele uma locução
adverbial interrogativa?

R: ____________________________________________________________
______________________________________________________________

O “por que” só é usado em perguntas?

R: ____________________________________________________________
______________________________________________________________

Quais são os quatro tipos de palavras que podem


determinar o “porquê” substantivo?

R: ____________________________________________________________
______________________________________________________________

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