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ANÁLISE ESPECTRAL E TEMPORAL DE DESLOCAMENTOS VERTICAIS NO

PAVIMENTO FERROVIÁRIO E SUA APLICAÇÃO NA DETERMINAÇÃO DO


MÓDULO DE VIA

RESUMO
A interação entre os elementos do pavimento ferroviário é responsável pela magnitude de deslocamentos gerada
na passagem de trens. Esta interação no sentido vertical tem como resposta global da estrutura a deflexão medida
a partir do patim do trilho, que pode ser analisada por modelos como o de uma viga contínua sobre apoios elásticos
e relaciona carregamento e deflexão pelo módulo de via, parâmetro utilizado vastamente na avaliação da condição
estrutural do pavimento ferroviário. Neste artigo é realizada uma comparação entre dois métodos distintos para
obtenção do módulo de via, denominados método do tempo e da frequência, ambos originados de um mesmo
modelo analítico, mas com dados de entrada em domínios distintos. Os resultados obtidos no domínio da
frequência mostraram alto potencial de serem comparáveis aos obtidos no domínio do tempo, com a vantagem
principal de não serem necessários dados de carregamento para a sua determinação.

ABSTRACT
The interaction between railway track components is responsible for the magnitude of displacements generated by
passing trains. This interaction in the vertical direction has the rail deflection as a global response of the structure,
which can be analyzed by models such as the beam on elastic foundation (BOEF), which relates loading and
deflection by the track modulus, a parameter widely used in the assessment of the track condition. In this article,
a comparison is made between two different methods for obtaining track modulus, named the time and the
frequency methods, both obtained from the same analytical model, but in distinct domains. The results obtained
in the frequency domain showed a high potential to be comparable to those obtained in the time domain, with the
main advantage of determination without wagons axle load information.

1. INTRODUÇÃO

O desempenho do pavimento ferroviário é dependente da interação entre todos os seus


componentes, que são responsáveis por transmitir e atenuar as tensões geradas pela passagem
de trens até o subleito. Esta interação se traduz em tensões e deformações nos sentidos
longitudinal, transversal e vertical da via, esta última sendo preponderante. Conhecer as
deformações verticais da via é fundamental tanto na etapa de projeto quanto na manutenção do
pavimento ferroviário. Os componentes de uma via nova são dimensionados com base em uma
resposta global esperada da estrutura, com critérios para garantir a vida útil dos seus
componentes. Por outro lado, é esperado que com o uso da via, esta apresente variações de
deformações verticais no seu sentido longitudinal, gerando incrementos dinâmicos de
carregamento e acelerando o desgaste de componentes, tornando necessária a manutenção.

Um dos modelos analíticos mais utilizados para descrever o comportamento mecânico do


pavimento ferroviário no sentido vertical é o de uma viga de Euler-Bernoulli infinita e sobre
apoios elásticos, submetida à carregamentos dinâmicos. Segundo Powrie e Le Pen (2016), este
modelo é obtido a partir de várias simplificações, como a consideração de um módulo de
elasticidade linear único para representar materiais com comportamentos diversos colocados
em série, materiais geotécnicos com módulo dependente do estado de tensões, além de
palmilhas e possível existência de gaps entre o dormente e o lastro, com comportamento não-
linear. De acordo com Li et al. (2016), apesar destas simplificações, o modelo (Equação 1)
utiliza do conceito de módulo de via (termo introduzido nos trabalhos de Talbot, 1918), um
parâmetro que foi extensivamente utilizado para quantificar a rigidez do suporte de um
pavimento ferroviário e que ainda é bastante utilizado comparativamente como indicativo de
qualidade do suporte.

𝜕 4 𝑤(𝑥, 𝑡)
𝑝(𝑥, 𝑡) = 𝐸𝐼 + 𝑢𝑤(𝑥, 𝑡) (1)
𝜕𝑥 4

onde 𝑝: carregamento (𝑁/𝑚);


𝐸: módulo de elasticidade (𝑃𝑎);
𝐼: momento de inércia do trilho (𝑚4 );
𝑤: deflexão do trilho (𝑚);
𝑥: posição de referência (onde é analisado o deslocamento) (𝑚);
𝑢: módulo de via (𝑃𝑎).

A Equação 1 permite descrever o comportamento do pavimento ferroviário com carregamentos


diversos e pode ser desmembrada em uma função de forma (s(t)) e uma função de carregamento
(f(t)). Le Pen et al. (2016) apresenta a função de forma (Equação 2) para as deflexões geradas
em um ponto x = 0 ao considerar uma carga unitária na posição x = vt.

1 −𝑣|𝑡| 𝑣|𝑡| 𝑣|𝑡|


𝑠(𝑡) = 𝑒 𝐿 (cos ( ) + cos ( )) (2)
2𝑢𝐿 𝐿 𝐿

onde 𝑣: velocidade do trem (𝑚/𝑠);


4 4𝐸𝐼
𝐿: comprimento efetivo (𝐿 = √ ) (𝑚).
𝑢

O carregamento em função do tempo (Equação 3) é obtido com o uso das características


geométricas do trem analisado, também da velocidade do trem e da carga por roda. As
características geométricas compreendem a distância entre eixos de um mesmo truque (𝐿𝑎 ),
distância entre truques ( 𝐿𝑏 ) e a distância entre engates dos vagões ( 𝐿𝑣 ), utilizadas para
determinar a distância 𝑥𝑛 de uma carga (𝐹𝑛 ) até o ponto 𝑥, onde deseja-se obter a deflexão.
𝑁
𝑥𝑛
𝑓(𝑡) = ∑ 𝐹𝑛 𝛿 (𝑡 − ) (3)
𝑣
𝑛=1
A deflexão em x = 0, gerada pelo carregamento com função f(t), é obtida pela convolução desta
por s(t), resultando na Equação 4.

𝑁 𝐹𝑛 −|𝑣𝑡−𝑥𝑛 | |𝑣𝑡 − 𝑥𝑛 | |𝑣𝑡 − 𝑥𝑛 |


𝑤(𝑡) = ∑ 𝑒 𝐿 (cos ( ) + sin ( )) (4)
𝑛=1 2𝑢𝐿 𝐿 𝐿

Passando a Equação 2 e a Equação 3 do domínio do tempo para o domínio da frequência, pode-


se realizar a multiplicação das duas funções e obter uma equação para o deslocamento em
função da frequência. A grande utilidade da Equação 5 é evidenciada quando são tomados os
valores de magnitude de dois harmônicos (𝑓𝑎 = 𝑎𝑓1 e 𝑓𝑏 = 𝑏𝑓𝑏 ), em uma análise do conteúdo
espectral. Ao dividir estes valores é obtida a Equação 6. É possível observar que neste novo
formato, não é mais necessário o conhecimento prévio da velocidade do veículo (𝑣) e da carga
por roda (𝐹𝑛 ). Isolando o módulo de via (𝑢), esta é uma forma alternativa de obtenção deste
com a passagem de trens. A aplicação do modelo analítico desta forma evita a necessidade de
dados de carregamento, dependentes da interação dinâmica entre os trens e o pavimento,
fundamental na representatividade do fenômeno, entretanto, por vezes de difícil mensuração e
obtenção em algumas ferrovias brasileiras.

4𝑣 3 𝑁

𝑖𝜔𝑥𝑛
𝑤(𝜔) = ∑ 𝐹𝑛 𝑒 𝑣 (5)
4𝑢𝑣 4 + 4𝐸𝐼𝜔 4 𝑛=1

𝑖2𝜋𝑎𝑥𝑛

𝑤(𝑛 = 𝑎) 𝐿𝑣 3 𝑢 + 16𝐸𝐼𝑏 4 𝜋 4 𝑁 𝑒 𝐿𝑣
= 3 ∑ (6)
𝑤(𝑛 = 𝑏) 𝐿𝑣 𝑢 + 16𝐸𝐼𝑎4 𝜋 4 𝑖2𝜋𝑏𝑥
𝑛=1 − 𝐿 𝑛
𝑒 𝑣

onde 𝜔: frequência circular (2𝜋𝑓𝑛 ) (𝐻𝑧);


𝐿𝑣 : distância entre engates dos vagões (𝑚).

Nesse contexto, o objetivo desse artigo foi comparar os resultados de módulo de via obtidos
com o uso de dados analisados no domínio do tempo (Equação 4) e frequência (Equação 6),
avaliando a aplicabilidade do método da frequência e as técnicas de processamento de sinais
necessárias para a sua utilização. Para tanto, analisou-se os sinais de deslocamento vertical
gerados pela passagem de trens em 4 segmentos da Estrada de Ferro Vitória Minas (EFVM).
Adicionalmente, foram apresentados dados de velocidade dos trens e sua variação no momento
da passagem do veículo pelo ponto instrumentado, informações facilmente obtidas no domínio
da frequência (Ju et al., 2009), consideradas também relevantes para análises do comportamento
dinâmico da via.

3. METODOLOGIA

3.1 Estudo preliminar e calibração do modelo

Dada a influência da geometria do veículo no modelo analítico de uma viga sobre apoio elástico,
estudada por Le Pen et al. (2016), foi realizado um estudo teórico prévio para a calibração deste
modelo, adotando dados geométricos dos vagões GDE, que são normalmente utilizados para o
transporte de minério de ferro na EFVM. As características geométricas destes vagões são
apresentadas na Figura 1.
𝐿𝑏
𝐿𝑎 5,500 m
1,727 m
𝐿𝑣
9,750 m
Figura 1: Características geométricas dos vagões GDE

Com o intuito de exemplificar e calibrar a aplicação da metodologia no modelo analítico, é


possível analisar as deflexões geradas por um trem de mesma carga ao passar em locais com
diferentes módulos de via (u). Supondo vagões com 20 tf/eixo a uma velocidade de 9,75 m/s
(equivalente à passagem de 1 vagão por segundo - 𝑓1 = 1 𝐻𝑧), as deflexões (w) que seriam
causadas em um local com u = 10 MPa, 40 MPa, 70 MPa e 100 MPa são apresentadas na Figura
2. Nota-se que, em condições de módulo de via baixo (10 MPa), é esperada a maior
sobreposição das bacias de deflexão geradas pelas cargas de cada roda, fazendo com que o pico
de deflexão real (linha contínua) não coincida com o pico de deflexão gerado por rodas isoladas
(linha traço e ponto). Nestas condições, pode haver inclusive a sobreposição das deflexões
geradas pelos dois truques de um mesmo vagão, impedindo o trilho de voltar para a sua posição
original durante a passagem da composição. Por outro lado, para módulos de via maiores (40,
70 e 100 MPa), as bacias de deflexão ficam mais estreitas e os picos de deflexão ficam mais
definidos, sendo possível distinguir, inclusive, os picos gerados por eixos de um mesmo truque.

... ...

Figura 2: Influência do módulo de via nas deflexões geradas pelo modelo analítico

Considerando trens periódicos (Milne et al., 2017) sem variações de carregamento e de


velocidade, os deslocamentos no domínio temporal neste caso são estacionários e podem ser
passados para o domínio frequencial utilizando a transformada rápida de Fourier (FFT), como
apresentado na Figura 3. Nota-se que para vagões com as características geométricas citadas,
os harmônicos proeminentes são o primeiro e segundo harmônico. Estes harmônicos
representam a maior parte do conteúdo espectral, devendo ser escolhidos para utilização na
Equação 6. É importante enfatizar o efeito que o número de vagões teria no domínio espectral,
onde os picos seriam mais largos e menos precisos para um número pequeno de vagões
registrados, por isso é desejável que sejam analisados no domínio espectral sinais com o maior
número de vagões registrados possível. A partir da Figura 3 observa-se que, para o vagão
estudado, um módulo de via menor (10 MPa) resulta no maior pico ser referente à frequência
fundamental, ou seja, a frequência de passagem dos vagões. Por outro lado, um módulo de via
maior (40, 70 e 100 MPa) tende a aumentar o pico referente ao segundo harmônico, em relação
ao valor de pico do primeiro.

10 MPa 40 MPa

(a) (b)

70 MPa 100 MPa

(c) (d)
Figura 3: FFT de um sinal simulando a passagem de vagões GDE com 20 tf/eixo em uma via
com: (a) Módulo de via de 10 MPa, (b) Módulo de via de 40 MPa, (c) Módulo de via de 70
MPa, (d) Módulo de via de 100 MPa

Para obter o módulo de via a partir do sinal analisado no domínio frequencial, os valores dos
picos referentes ao primeiro e segundo harmônico são inseridos na Equação 6, variando 𝑢 em
um processo iterativo. Seguindo procedimento semelhante ao realizado por Le Pen et al. (2016),
é possível obter uma curva de calibração para a variação da relação entre as amplitudes dos dois
harmônicos predominantes dos vagões GDE, relacionando ao módulo de via, como pode ser
observado na Figura 5.

120

100
Módulo de via (MPa)

80

60

40

20

0
0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 2,0
Razão de amplitude w(f2)/w(f1)

Figura 4: Calibração do modelo analítico para os vagões GDE

3.2. Características geométricas dos vagões e seções instrumentadas

A instrumentação para obtenção dos sinais de deflexão vertical no patim do trilho foi realizada
em 4 segmentos (A, B, C e D) da EFVM, abrangendo condições diversas de materiais
constituintes da seção da via permanente (Tabela 1). A escolha de locais com diferentes
configurações do pavimento teve como objetivo validar a aplicação do modelo analítico para
condições diversas, não sendo objetivo deste artigo a comparação dos resultados obtidos em
cada segmento.

Tabela 1: Características estruturais das seções instrumentadas e sinais obtidos em cada seção

Idade aproximada Identificação dos


Segmento Tipo de dormente Tipo de subleito
do lastro sinais
A Aço Areno-Argiloso 7 anos 1, 2
B Concreto Areno-Siltoso Novo 3, 4
C Aço Arenoso 10 anos 5, 6, 7, 8, 9, 10
D Aço Areno-Argiloso 3 anos 11, 12

Nos locais selecionados, diversos equipamentos foram inseridos na via para registro de tensões
em diferentes profundidades e deslocamentos em diferentes componentes. No entanto, neste
artigo são analisados apenas dados de um Linear Variable Differential Transformer (LVDT)
utilizado para medir deslocamentos verticais no patim do trilho, conforme mostra a Figura 5.
Para atenuar o efeito das vibrações geradas pela passagem do trem na base de fixação do LVDT,
foi utilizado o Dispositivo para Medição de Deslocamentos (DMD), como proposto por Costa
(2016).
Figura 5: Medição de deslocamentos utilizando LVDT no DMD

O registro dos dados foi realizado com um sistema de aquisição PMX, que transforma o sinal
contínuo da passagem dos trens em discreto, realizando interpolações. A frequência de
amostragem escolhida foi de 1,2 kHz, bastante acima das frequências normalmente encontradas
para deslocamentos verticais oriundos da passagem de trens na ferrovia em questão (até 25 Hz
para trens com velocidade em torno de 40 km/h - Kouroussis, et al. 2015). A frequência de
amostragem escolhida atende o teorema de Nyquist, segundo o qual uma boa resolução
frequencial é obtida quando a frequência de amostragem é superior a duas vezes a maior
frequência do sinal analisado.

As cargas por roda foram consideradas como sendoa carga estática fornecida na ficha dos trens,
acrescida de um fator de impacto (AREMA, 2020), calculado com base na velocidade média
do trem e no diâmetro aproximado das rodas destes vagões (36 pol.). Além de dados teóricos
de momento de inércia dos trilhos TR68, sem considerar possíveis perdas de seção ocasionadas
pelo desgaste ao longo da vida útil do componente, considerou-se um módulo de elasticidade
de 210 GPa.

3.3. Processamento de sinais reais para aplicação no modelo analítico

Em relação ao processamento de sinais, após a digitalização dos mesmos, os pontos do sinal


referentes às locomotivas e ao período antes e depois da passagem da composição foram
removidos, de modo a serem analisadas apenas as deflexões geradas pela passagem dos vagões
GDE. Do sinal obtido após estes procedimentos foram extraídos valores de picos de deflexão,
utilizando estes em conjunto com os dados de carregamento dos vagões na Equação 4 para a
determinação do módulo de via.

Prosseguindo para a análise no domínio da frequência, foi subtraída a média de todo sinal,
deixando-o centralizado em relação à média. Para a escolha do método de análise foi necessário
primeiro verificar se os sinais obtidos eram estacionários. Adotando um número de pontos
equivalente à passagem de aproximadamente 10 vagões, foram analisadas a média e a variância
móvel dos sinais. Concluiu-se que os sinais se tratavam de sinais não estacionários, ou seja,
média móvel de um conjunto de pontos variável ao longo do tempo, dadas as variações no
carregamento de cada vagão e de velocidade em situações de aceleração ou frenagem. Por
consequência, a FFT utilizada na seção 3.1 deste artigo não apresentou bons resultados para os
sinais reais, uma vez que este método não é capaz de modular variações de amplitude ou
frequência ao longo do tempo.

Para transpor o fato dos sinais serem não estacionários, prosseguiu-se com o uso de um método
tempo-frequência, sendo a Short-Time Fourier Transform (STFT) escolhida. Neste método, foi
necessário encontrar a melhor relação de número de pontos por amostragem, para obter
resultados com boa resolução tanto no tempo (menor número de pontos por janela) quanto na
frequência (maior número de pontos por janela). Para tal, foi minimizado o erro relativo pela
variação do tamanho de janelas hamming, de 4.000 até 30.000 pontos por janela, com os
melhores resultados ficando entre 4.000 e 12.000 pontos, a depender do sinal analisado,
utilizando uma sobreposição de 50% do número de pontos entre janelas adjacentes.

No que se refere aos cálculos do módulo de via, adotou-se: (i) método da freqüência (𝑢𝑓𝑟𝑒𝑞. ) de
acordo com a Equação 6; e (ii) domínio do tempo (𝑢𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 ), determinado com os valores de
pico de deslocamento registrados na passagem de cada vagão.

4. RESULTADOS

4.1. Análise de espectrogramas e variações de velocidade

Utilizando as medições realizadas nas seções instrumentadas apresentadas na Tabela 1 foram


obtidos espectrogramas com o uso de STFTs. Destes espectrogramas foram analisados valores
de amplitude ao longo do tempo referentes aos harmônicos que contemplam maior quantidade
de energia, que no caso dos vagões GDE são a frequência fundamental (primeiro harmônico -
𝑓1 ) e o segundo harmônico (2𝑓1 ). Para estes harmônicos, foi calculada a média e o desvio padrão
das amplitudes em cada sinal, utilizando estes resultados na Equação 6 para obter o módulo de
via.

A inclinação das faixas formadas pelas frequências dominantes no espectrograma está


relacionada à variação de frequência, que por sua vez pode ser utilizada para obter a variação
de velocidade dos trens registrados. Na Figura 6 (a) é apresentado o espectrograma obtido para
o sinal 1, referente a um trem registrado no segmento A, com leve redução de velocidade ao
longo da sua passagem. Na Figura 6 (b) segue-se a mesma metodologia para o sinal 11, referente
ao registro de um trem registrado no segmento D e com um aumento considerável de velocidade
durante a sua passagem.
(a)

(b)
Figura 6: Exemplos de espectrogramas obtidos dos sinais reais: (a) Sinal 1 – Trem com leve
redução de velocidade; (b) Sinal 11 – Trem com aumento de velocidade

A frequência fundamental é interpretada como a frequência de passagem dos vagões, podendo


ser utilizada na obtenção da velocidade aplicando 𝑣 = 𝐿𝑣 𝑓1 . Desta forma, a variação de
velocidade dos trens ao passar pelos pontos instrumentados pôde ser determinada e apresentada
na Tabela 2. Pode-se observar que os sinais 1, 2, 5, 6, 9, 10, 11 e 12 apresentaram variação de
velocidade, sendo esta uma característica comum a quase todos os sinais analisados. Esta
constatação reforça a necessidade do uso de um método tempo-frequência para análise destes
sinais. A escolha de uma janela hamming com 12.000 pontos resultou em espectrogramas com
precisão de 0,1 Hz, o que é equivalente a uma incerteza de 4 km/h na leitura de velocidade dos
veículos com este método.
Tabela 2: Variações de velocidade dos trens analisados

Velocidade Velocidade Velocidade Velocidade


Identificação Identificação
inicial final inicial final
dos sinais dos sinais
(km/h) (km/h) (km/h) (km/h)
1 56 49 7 49 49
2 56 49 8 49 49
3 56 56 9 39 46
4 63 63 10 39 46
5 53 56 11 18 32
6 53 56 12 18 32

3.2. Módulo de via e comparação entre métodos

A fim de obter o módulo de via (𝑢𝑓𝑟𝑒𝑞. ) pelo método da frequência (Equação 6), os valores de
magnitude dos picos correspondentes aos dois primeiros harmônicos são obtidos com o
espectrograma. No domínio do tempo, o módulo de via (𝑢𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 ) foi determinado com os
valores de pico de deslocamento registrados na passagem de cada vagão. Ambos métodos
resultaram em distribuições de valores para cada sinal, na Tabela 3 são apresentadas as médias
e os respectivos desvios padrão.

Tabela 3: Dados de módulo de via no método da frequência e do tempo


Identificação 𝑢𝑓𝑟𝑒𝑞. 𝜎𝑢𝑓𝑟𝑒𝑞. 𝑢𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 𝜎𝑢𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 𝐹 𝜎𝐹
𝑤(𝑓2 )⁄𝑤(𝑓1 )
dos sinais (𝑀𝑃𝑎) (𝑀𝑃𝑎) (𝑀𝑃𝑎) (𝑀𝑃𝑎) (𝑡𝑓⁄𝑟𝑜𝑑𝑎 ) (𝑡𝑓/𝑟𝑜𝑑𝑎)
1 0,89 13 3 7 0 5,43 0,13
2 0,72 9 2 3 0 5,43 0,13
3 1,51 42 8 39 6 5,54 1,43
4 1,46 45 11 55 8 31,98 1,43
5 1,02 17 3 18 2 30,78 2,13
6 0,85 12 2 15 2 30,78 2,13
7 1,02 17 2 19 1 32,00 0,21
8 0,89 13 2 14 0 32,00 0,21
9 0,79 11 2 7 1 5,20 0,13
10 0,93 14 2 6 1 5,20 0,13
11 0,96 16 6 43 3 28,65 0,13
12 0,93 14 3 11 0 28,65 0,13

Em uma análise do resultados, é possível identificar que os maiores desvios padrão do método
da frequência são referentes aos pontos de maior rigidez. Isto se deve à forma da curva de
calibração (Figura 5), que leva o módulo de via a ser mais suscetível a variações na razão de
amplitudes para valores altos. Outro ponto importante é que o método de determinação do
módulo de via no domínio do tempo apresentou desvio padrão menor quando comparado ao
método no domínio da frequência, indicando que o primeiro método levou a resultados mais
próximos da média.

Na Figura 7 são apresentados os resultados dos dois métodos plotados com uma linha de
igualdade. A maior parte dos dados se concentraram na faixa entre 0 e 20 MPa, onde a maior
parte dos valores de 𝑢𝑓𝑟𝑒𝑞. foram menores que 𝑢𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 . Destaca-se no gráfico o ponto referente
ao sinal 11, que resultou em 𝑢𝑓𝑟𝑒𝑞. de 16 MPa e 𝑢𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 de 43 MPa, é importante enfatizar que
neste sinal e no sinal 12 houveram as maiores variações de velocidade, o que pode ter levado a
uma componente dinâmica diferente da estimada, que considerou apenas o diâmetro da roda e
a velocidade média do trem. Outros pontos que se destacam no gráfico são referentes aos sinais
3 e 4, que foram obtidos no segmento B onde os dormentes são de concreto, neste caso os
valores foram superiores aos observados para os dormentes de aço, mas mesmo assim os dois
pontos seguiram margeando a linha de igualdade. É importante enfatizar novamente que o
presente artigo não teve como objetivo a comparação de resultados obtidos para diferentes tipos
de dormente ou outras diferenças estruturais entre os segmentos, sendo estas características
apenas apresentadas para mostrar que os métodos aqui utilizados são aplicáveis às diversas
configurações.

60

50
utempo (MPa)

40

30

20

10

0
0 10 20 30 40 50 60
ufreq. (MPa)

Figura 7: Comparação de métodos para determinação do módulo de via

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho foram analisados 12 sinais de deslocamento vertical obtidos com a passagem de
trens em 4 diferentes segmentos da Estrada de Ferro Vitória Minas. A partir de resultados
observados no domínio do tempo e da frequência, as seguintes conclusões podem ser extraídas:
• Os deslocamentos verticais no pavimento ferroviário geram em grande maioria sinais
não estacionários, uma vez que as cargas e velocidades registradas entre vagões variam
consideravelmente, portanto é desejável utilizar métodos tempo-frequência como a
STFT para a análise destes sinais;
• Na análise de sinais usando STFT é necessário um estudo prévio da quantidade de
pontos a ser utilizada em cada janela, uma vez que esta interfere na resolução no tempo
e na frequência, janelas pequenas devem ser escolhidas em casos com alta variabilidade
de cargas e deslocamentos entre vagões adjacentes;
• Os espectrogramas gerados pelas STFT fornecem informações da variação de
velocidade de um trem ao passar por determinado ponto e da variação de magnitude nos
harmônicos que constituem o domínio da frequência. Tais dados podem auxiliar em
estudos futuros de análise do comportamento mecânico da via;
• O módulo de via determinado no domínio da frequência 𝑢𝑓𝑟𝑒𝑞. apresentou a maioria dos
valores próximos aos obtidos no domínio do tempo 𝑢𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 . É importante que no futuro
seja ampliada a quantidade de dados, para preencher também a região do gráfico para
módulos entre 20 MPa e 40 Mpa;
• Comparando o método 𝑢𝑓𝑟𝑒𝑞. para o 𝑢𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 , o primeiro método tem como grande
vantagem não precisar de dados de carregamento dos vagões, evitando não só incertezas
relacionadas à pesagem dos vagões, mas também em relação à componente dinâmica
pelo trem em movimento. Tal característica também é vantajosa para identificação
rápida de locais que precisam de manutenção, uma vez que apenas os dados de
deslocamento vertical e geometria do trem são necessários.

Agradecimentos
Os autores agradecem à Vale S.A. pela parceria em projetos de pesquisa e pela disponibilidade da equipe de
manutenção da via permanente da Estrada de Ferro Vitória Minas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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