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EXMO SR DR JUIZ DE DIREITO DA VARA CIVEL DO FORO CENTRAL

DA CAPITAL DO ESTADO DE SÃO PAULO

Distribuição urgente – Pedido de tutela antecipada – NEGATIVAÇÃO


JUNTO AO SERASA

CRIS MODAS MEI, pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob o nº
23.549245/0001-78, com sede na Rua Dionísio da Costa, 109, apto 91, Chácara
Klabin, São Paulo/SP, por seus procuradores ora constituídos (contrato social e
instrumento de mandato anexos), cujo endereço eletrônico para fins de recebimento
de intimações neste processo é claudiaqueiroz@qzadvogados.com.br vem,
respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, propor a presente

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS COM PEDIDO


DE TUTELA ANTECIPADA

em face de AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A., pessoa


jurídica inscrita no CNPJ nº 29.309.127/0001-79, com endereço R ARQUITETO
OLAVO REDIG DE CAMPOS, 105 , ANDAR 6 AO 21 TORRE B, VILA SAO
FRANCISCO, CEP 04711-904, São Paulo/SP, cujo endereço eletrônico é
desconhecido, pelas razões de fato e de direito a seguir aduzidas.

DOS FATOS
1. Em novembro de 2015, a Autora firmou com a Ré contrato de
plano de saúde empresarial (produto Blue 300 Plus Nacional e Lincx LT3 Nacional) Amil
de nºs 350749000, (doc. 01), tendo como beneficiários CRISTINA FERREIRA
QUEIROZ (código de identificação nº 9832824475 – doc. 02), e MARIA
FERNANDA FERREIRA QUEIROZ (código de identificação nº 983282455, PLANO
LINCX-LT3 NACIONAL AMIL ONE–. Os beneficiários formam, na verdade, um
grupo familiar ( mãe e filha) e primeiro conta com mais de 60 (sessenta) anos de
idade.

2. Ocorre que, dados os reajustes abusivos do plano (que serão


objeto de ação própria), tornou-se impossível a manutenção do contrato. Por diversas
vezes, a Autora solicitou à Ré a readequação dos valores, o que não foi atendido.

3. Portanto, não houve alternativa à Autora senão o


encerramento da contratação mantida com a Ré por mais de seis anos, sem um único
dia de atraso nas mensalidades durante todo o período.

4. E, assim, a Autora seguiu o protocolo de cancelamento do


contrato previsto no site da Ré, mas o sistema gerou uma carta em que reconhecia
como legítima a cobrança de duas mensalidades adicionais, a título de aviso prévio .

5. Sabedora de que esta cobrança foi considerada ilegal e


abusiva pelo Judiciário nos autos da Ação Civil Pública nº 0136265-83.2013.4.02.5101
(2013.51.01.136265-4), em trâmite perante a 18ª Vara Federal do Rio de Janeiro/RJ, a
Autora notificou a Ré por e-mail sobre a sua intenção de cancelamento imediato
do contrato .

6. Todavia, a Ré prosseguiu com a cobrança das


mensalidades seguintes à rescisão do contrato, atinentes aos meses de junho e
julho de 2021, em notório descumprimento de decisão judicial proferida em face
de sua agência reguladora, como será explicado, tendo realizado diversos contatos
por telefone com a Autora, bem como enviado reiterados e-mails com os boletos,
exigindo o indevido pagamento.

7. Não obstante, a Ré pretende NEGATIVAR a Autora no


tocante ao boleto referente à mensalidade de junho e julho /2021, conforme email
enviado à Autora.

8. Ou seja, se a Autora não proceder ao pagamento dos


boletos em aberto, terá seu nome lançado no rol dos maus pagadores, em razão de
um débito expressamente fundamentado em dispositivo considerado ilegal pelo
Poder Judiciário, em caráter definitivo, como será demonstrado a seguir DO
DIREITO

II.I A JÁ DECRETADA NULIDADE DO ART. 17, PARÁGRAFO ÚNICO, DA


RN 195/2009 DA ANS, POR ACÓRDÃO TRANSITADO EM JULGADO DO
TRF (2ª REGIÃO), ÚNICO DISPOSITIVO QUE REGULAVA A COBRANÇA
DO AVISO PRÉVIO E QUE EXPRESSAMENTE FUNDAMENTA O
CONTRATO

– O contrato mantido pelas partes tem expressa previsão na Resolução Normativa nº


195/2009, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), agência reguladora
vinculada ao Ministério da Saúde, responsável pelo setor de planos de saúde no Brasil,
que promove a defesa do interesse público na assistência à saúde e exerce a
fiscalização deste segmento de mercado, regulando as operadoras de planos de saúde a
nível nacional.

10. Eis a cláusula 5 das “Condições Gerais” do contrato firmado


entre as partes, que reconhece expressamente que as disposições contratuais possuem
fundamentação normativa na Resolução Normativa nº 195/09, da ANS:

11. A citada Resolução Normativa 195/09, da ANS, por sua


vez, previa em seu artigo 17, parágrafo único, (Subseção II), a notificação prévia,
com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias, pela parte que pretendesse
rescindir imotivadamente contrato empresarial de plano privado de assistência à
saúde, conforme transcrição abaixo:

“Subseção II

Da Rescisão ou Suspensão

Art. 17 As condições de rescisão do contrato ou de suspensão de cobertura, nos planos


privados de assistência à saúde coletivos por adesão ou empresarial, devem também
constar do contrato celebrado entre as partes.

Parágrafo único. Os contratos de planos privados de assistência à saúde coletivos


por adesão ou empresarial somente poderão ser rescindidos imotivadamente após
a vigência do período de doze meses e mediante prévia notificação da outra parte
com antecedência mínima de sessenta dias.” (grifou-se).

12. Portanto, com expressa fundamentação neste dispositivo


da Resolução Normativa da ANS (repita-se, indicada nas condições gerais do
instrumento contratual) é que a cláusula 30.1, alínea “a”, do contrato firmado entre
as partes previa o seguinte:

13. Ocorre que a exigência do aviso prévio foi declarada


ILEGAL por sentença proferida na Ação Civil Pública nº 0136265-
83.2013.4.02.5101 (2013.51.01.136265-4), promovida pela AUTARQUIA DE
PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR DO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO (PROCON-RJ) em face da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE
SUPLEMENTAR – ANS, perante a 18ª Vara Federal do Rio de Janeiro/RJ .

Referido decisum declarou a nulidade do citado parágrafo único do artigo 17 da RN


195/2009 da ANS, autorizando, de conseguinte, que os consumidores possam rescindir
os contratos, sem que lhes seja imposto o pagamento de duas prestações subsequentes.

11. Portanto, tornou-se definitiva a decisão que declarou “a


nulidade do parágrafo único do artigo 17 da RN 195, de 14 de julho de 2009, da ANS,
autorizando, de conseguinte, que os consumidores possam rescindir o contrato sem que
lhe sejam impostas multas contratuais em razão da fidelidade de 12 meses de
permanência e 2 meses de pagamento antecipado de mensalidades, impostas no ato
administrativo viciado” e, ainda, condenou a ANS “à obrigação de publicar, às suas
custas, em dois jornais de grande circulação, em quatro dias intercalados, a parte
dispositiva deste julgado de modo a conferir aos consumidores o direito de informação”.

14. Como se vê, a r. sentença muito bem observou que o


parágrafo único do artigo 17 da RN 195/09 da ANS, a pretexto de criar uma
suposta penalidade recíproca entre operadora de plano de saúde e consumidor,
em verdade, só favorecia as prestadoras de serviços, porque estas nunca
rescindem os contratos de plano de saúde imotivadamente, sendo que só os
consumidores o fazem, justamente por não conseguirem arcar com o seu alto custo.
15. Ponderou, ainda, que o dispositivo foi maliciosamente
interpretado pelas operadoras de planos de saúde, para cobrar mais 2 (dois) meses dos
consumidores que cancelarem as contratações, mesmo sendo estes a parte mais fraca
da relação jurídica estabelecida, impondo, assim, um “dever de fidelidade irrestrita”,
em “desvantagem exagerada”, bem como propiciando às prestadoras de serviços um
“ganho ilícito”, em clara afronta à legislação consumeirista e, inclusive, ao direito de
livre escolha do consumidor.

16. De outro lado, o v. acordão do TRF – 2ª Região reconheceu


que é abusiva a exigência de cobrança de multa consubstanciada no pagamento de
mensalidades extraordinárias para o consumidor que rescindir contrato de plano
de saúde, sob a seguinte fundamentação:

“O apelante insurge-se contra a interpretação firmada pelo juízo a quo em relação


ao artigo 17 da Resolução Normativa 195/2009 da ANS, sob o fundamento de que a
regra ali contida seria referente ao contrato firmado entre a pessoa jurídica (ao qual
o beneficiário/consumidor se encontra vinculado, em caráter associativo, de classe ou
empregatício) e a operadora de planos de saúde.

No entanto, seu inconformismo não merece prosperar, senão vejamos.

Inicialmente, vale observar que a Resolução Normativa 195 de 14 de julho de 2009,


dispõe sobre ‘a classificação e características dos planos privados de assistência à
saúde, regulamenta a sua contratação, institui a orientação para contratação de
planos privados de assistência à saúde e dá outras providências’.

Em seu artigo 17 tratou sobre as condições de rescisão e suspensão dos contratos de


planos privados de assistência à saúde coletivos por adesão ou empresarial,
consignando, em seu parágrafo único, que os referidos contratos ‘somente poderão
ser rescindidos imotivadamente após a vigência do período de doze meses e mediante
prévia notificação da outra parte com antecedência mínima de sessenta dias’.

Por sua vez, importa considerar que o plano de saúde coletivo é aquele contratado
por uma empresa, conselho, sindicato ou associação junto à operadora de planos de
saúde para oferecer assistência médica e/ou odontológica às pessoas
vinculadas a essa empresa e aos dependentes dessas pessoas, podendo ser um plano
de saúde coletivo empresarial ou coletivo por adesão.

Ademais, insta esclarecer que a controvérsia sobre a validade e o conteúdo das


cláusulas do contrato de plano de saúde coletivo atrai a aplicação das normas do
Código de Defesa do Consumidor, haja vista os beneficiários do plano de saúde se
enquadram no conceito de consumidor, pois utilizam os serviços na condição de
destinatários finais, previsto no art. 2º da Lei 8078/90, e as empresas de plano de
saúde se enquadram no conceito de fornecedor de serviços, uma vez que prestam
serviços de assistência à saúde, mediante remuneração, nos termos do que dispõe o
art. 3º, caput e §2º, do mesmo Diploma Legal.

Trilhando esta mesma linha, o verbete nº 469 da Súmula do Superior Tribunal de


Justiça formou diretriz de que: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos
contratos de plano de saúde".

Dessa forma, a relação firmada em contrato de plano de saúde coletivo é


consumerista, ainda que decorrente da relação triangular entre o beneficiário, o
estipulante e a seguradora/plano de saúde, pois, embora se assemelhe ao puro
contrato de estipulação em favor de terceiro, dele difere na medida em que o
beneficiário não apenas é titular dos direitos contratuais assegurados em caso de
sinistro, mas também assume uma parcela ou a totalidade das obrigações, qual seja, o
pagamento da mensalidade ou prêmio.

Nesse passo, como bem ressaltou o douto representante do Ministério Público


Federal, em seu parecer de fls. 161/165, ‘ainda que o contrato seja firmado entre o
empregador e a operadora do plano de saúde, posteriormente, o beneficiário passará
a figurar na relação jurídica e, a forma como a mesma foi estabelecida, não retira,
de forma alguma, o consumidor de sua relação de hipossuficiência’.

Por seu turno, como bem explicitou o MM. Magistrado de Primeiro Grau, ‘a
circunstância de os contratos privados de assistência à saúde gozarem de uma
regulamentação específica, na Lei 9.656, de 03 de junho de 1998, bem como através
das resoluções da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, não afasta a
conclusão de que fazem parte efetivamente da categoria dos contratos de consumo. O
Código de Defesa do Consumidor (Lei 9.078/90) permanece como uma lei básica, de
caráter geral’.

De outro lado, cumpre ressaltar que a autorização, concedida pelo artigo 17 da


RN/ANS 195/2009, para que os planos de saúde coletivos estabeleçam, em seus
contratos, cláusulas de fidelidade de doze meses, com cobrança de multa penitencial,
caso haja rescisão antecipada dentro desse período, viola o direito e liberdade de
escolha do consumidor de buscar um plano ofertado no mercado mais vantajoso, bem
como enseja à prática abusiva ao permitir à percepção de vantagem pecuniária injusta
e desproporcional por parte das operadoras de planos de saúde, ao arrepio dos incisos
II e IV, do art. 6º, do CDC.
Diante de tal quadro, restou configurada a abusividade do art. 17 da Resolução
Normativa da ANS nº 195, na medida em que tal dispositivo deixa os usuários de
plano de saúde em situação de desvantagem em relação as operadoras e obrigam o
consumidor, sob pena de suportar penalidades, a permanecer vinculado a
determinado plano de saúde, mesmo que este não atenda mais suas necessidades.”
(grifos nossos).

Perceba, Excelência, que a decisão colegiada acima


destacada encerra qualquer discussão sobre o assunto, pois reconhece que a única
fundamentação normativa para a cobrança ora discutida era o artigo 17, parágrafo
único, da Resolução Normativa 195/09 da ANS, dispositivo que foi declarado NULO
por decisão DEFINITIVA – repita-se, transitada em julgado (doc. 17) – do TRF – 2ª
Região.

17. Ademais, não há dúvidas quanto aos efeitos da decisão em


comento a todos os estados da Federação, como, inclusive, foi reconhecido no
acórdão do E. TJ/SP indicado no preâmbulo desta peça inicial e será mais bem
abordado em tópico específico.
Mesmo com essas informações já tornadas públicas pela ANS, referente ao acórdão
definitivo do E. TRF – 2ª Região, que proíbe a cobrança do abusivo “aviso prévio”, a
Ré se nega a obedecer a sua própria agência reguladora e o Poder Judiciário.

11. E assim o faz sob a alegação de que há previsão contratual


para a cobrança, mas este posicionamento é de todo equivocado e oportunista.

12. Afinal, como visto, em que pese a previsão da cláusula do


contrato possui expressa fundamentação na RN 195/09 cláusula 5 – Condições Gerais,
cujo dispositivo (art. 17, § ú) foi declarado nulo.

13. Em outros termos, inexistindo outro ato normativo que


estabeleça a necessidade de notícia à seguradora sobre a rescisão do contrato com
antecedência mínima de 60 (sessenta) dias e tendo o contrato feito expressa referência
à RN 195/09 da ANS, cuja previsão do artigo 17, parágrafo único, é nula, nada está a
sustentar a cobrança de duas mensalidades adicionais pela Ré.

14. A propósito, como já se destacou no preâmbulo desta inicial,


o E. TJ/SP recentemente enfrentou hipótese idêntica à presente, em acórdão da
lavra do Ilustre Des. Relator Alcides Leopoldo, da 4ª Câmara de Direito Privado (doc.
19), como se vê da ementa que se pede vênia para novamente reproduzir:

“SEGURO SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL -


Cancelamento

Imotivado – Iniciativa da estipulante

Observância de antecedência de 60 dias com o


pagamento dos prêmios - “O cancelamento imotivado do seguro por iniciativa da
Seguradora e/ou do Estipulante, sem direito a devolução dos prêmios pagos, somente
poderá ocorrer após a vigência do período de 12 (doze) meses e mediante
comunicação por escrito por qualquer das partes, com no mínimo 60 (sessenta) dias
de antecedência.”.Previsão no art. 17 e parágrafo único da RN ANS n. 195/2009
julgada nula em ação coletiva beneficiando tanto o consumidor individual quanto a
empresa instituidora do benefício – Efeitos e a eficácia da sentença coletiva que não
estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que
foi decidido - Nulidade da previsão contratual – Cobrança indevida - Recurso
provido.” (TJSP; Apelação Cível 1072039- 42.2018.8.26.0100; Relator: Alcides
Leopoldo; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 28ª
Vara Cível; Data do Julgamento: 26/09/2019; Data de Registro: 27/09/2019 – grifou-
se).

18. Note-se que, no caso em comento, também havia previsão


contratual acerca do aviso prévio, mas, mesmo assim, acertadamente entendeu o TJ/SP
que a declaração de nulidade do artigo 17, parágrafo único, da RN 195/09 da ANS, não
possui limitação territorial, gerando efeitos em todo o território nacional, daí porque é
vedada a cobrança de mensalidades extraordinárias, a título de multa.

19. Vale observar que, aparentemente, trata-se do primeiro


precedente do Tribunal de Justiça paulista que enfrentou o tema após o trânsito em
julgado da Ação Civil Pública no Rio de Janeiro, sob esse específico enfoque.

20. Em outros casos, cujas ementas serão transcritas a seguir,


também houve o entendimento pela indevida cobrança das mensalidades relativas ao
aviso prévio, in verbis:

“PLANO DE SAÚDE – AÇÃO DE COBRANÇA – Empresa ré que solicitou o


cancelamento do plano de saúde, em abril de 2016, com aviso prévio de sessenta dias –
Cobrança de mais um mês (junho de 2016), sob justificativa de prévio aguardo de
noventa dias para cancelamento do contrato – Abusividade da cobrança – Tentativa
de se atribuir à ré os riscos do negócio explorado pela autora – Vinculação
obrigatória que não guarda abrigo no princípio da boa-fé – Multa compensatória
prevista apenas em favor da parte contratada – Violação à isonomia entre os sujeitos
contratuais – Sentença reformada – Recurso provido.” (TJSP; Apelação Cível
1095288-90.2016.8.26.0100; Relator: Fábio Podestá; Órgão Julgador: 5ª Câmara de
Direito Privado; Foro Central Cível - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 08/08/2018;
Data de Registro: 13/08/2018 – grifou-se);

“CONTRATO – Prestação de serviços – Plano de saúde – Contrato coletivo –


Resilição unilateral motivada pelo aumento por sinistralidade, considerado abusivo
pela contratante –

Admissibilidade – Desnecessidade de ser, a seguradora, notificada com 60 (sessenta)


dias de antecedência, nos termos do art. 17 da RN Nº 195 da ANS – Cobrança dos
valores, após a manifestação da intenção de rescisão contratual – Descabimento –
Recurso improvido.” (TJSP; Apelação Cível 1007564-48.2016.8.26.0100; Relator:
Alvaro Passos; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível -
2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 07/02/2019; Data de Registro: 07/02/2019 –
grifou-se);

“PLANO DE SAÚDE – Empresa autora que solicitou o cancelamento do plano de


saúde, regularmente adimplindo a mensalidade relativa ao mês do pedido do
cancelamento e também do mês posterior – Cobrança do segundo mês subsequente,
sob justificativa de prévio aguardo de sessenta dias para cancelamento do contrato –
Abusividade da cobrança – Tentativa de se atribuir ao consumidor os riscos do
negócio explorado pela ré – Dívida inexigível – Inscrição do débito nos cadastros
desabonadores de crédito – Inscrição irregular – Dano moral in re ipsa –
Entendimento STJ – Valor da indenização que deve atender aos critérios da
razoabilidade e proporcionalidade, indenizando o ofendido, sem acarretar-lhe
enriquecimento sem causa – Quantum que não comporta minoração – JUROS
MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA –Tratando-se de responsabilidade
contratual, os juros de mora incidem a partir da citação – Correção monetária
referente a danos morais deve se dar a partir da fixação (Súmula 362, STJ) – Recurso
parcialmente provido, em menor extensão, apenas para alterar a incidência inicial
dos juros moratórios e da correção monetária.” (TJSP; Apelação Cível 1000969-
72.2017.8.26.0011; Relator: Fábio Podestá; Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito
Privado; Foro Regional XI - Pinheiros - 3ª Vara

Cível; Data do Julgamento: 12/12/2017; Data de Registro: 12/12/2017 – grifou-se).

21. Como não foge ao conhecimento desse D. Juízo, o novo


estatuto processual prestigia os precedentes dos tribunais, devendo ser dado o mesmo
desfecho ao presente caso, com a procedência dos pedidos autorais.

II.1. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL SOBRE


EVENTUAL IMPLICAÇÃO DECORRENTE DO DESCUMPRIMENTO
DO AVISO PRÉVIO – INTERPRETAÇÃO EM FAVOR DO
CONSUMIDOR

22. Não fossem as razões apontadas acima suficientes para se


concluir pelo descabimento da cobrança de qualquer penalidade pela Ré em razão do
cancelamento do contrato pela Autora, o que se aduz por amor aos debates, há outros
motivos que levam ao reconhecimento do direito invocado nesta ação.

23. Não há dúvidas sobre relação de natureza consumeirista


nas hipóteses de contratos de plano de saúde, a teor da Súmula 608, do Superior
Tribunal de Justiça, segundo a qual “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor
aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de
autogestão.”.
24. Nesse contexto, é de observar que a cláusula 30.1, alínea “a”,
do contrato (doc. 01), apesar de prever a necessidade de comunicação prévia sobre o
cancelamento, não autoriza a cobrança das respectivas mensalidades do período de 60
(sessenta) dias.

+“Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os


consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de
seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar
a compreensão de seu sentido e alcance.” (g.n.);

“Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao


consumidor.” (g.n.);

“Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela
autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos
ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu
conteúdo. (...)

§ 3º Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com


caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo
doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor.

§ 4º As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser


redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.” (grifou-se).

No caso, o pacto havido entre as partes carece da clareza exigida por lei, haja vista
a ausência de previsão sobre a penalidade a ser aplicada na hipótese de
descumprimento do aviso prévio estabelecido na cláusula 30.1, “a”.

25. A propósito, a própria sentença da Ação Civil Pública já


mencionada (doc. 15), confirmada pelo E. TRF – 2ª Região (doc. 16), que declarou a
nulidade do art. 17, parágrafo único, da RN 195/09 da ANS, abordou a ausência de
previsão normativa sobre a cobrança de multa equivalente a duas mensalidades
nas hipóteses de descumprimento do aviso prévio no referido dispositivo legal
(cuja redação é praticamente idêntica à cláusula 30.1, alínea “a”, do contrato
estabelecido entre as partes), valendo novamente transcrever os trechos da decisão a
esse respeito:

“Cabe salientar que o dispositivo da Resolução Normativa, antes destacado, não


prevê a cobrança de multa, limitando-se a estabelecer que ‘os contratos de planos
privados de assistência à saúde coletivos por adesão ou empresarial somente poderão
ser rescindidos imotivadamente após a vigência do período de doze meses e mediante
prévia notificação da outra parte com antecedência mínima de sessenta dias’.

Ao abrir as portas para que esse direito de rescisão unilateral seja previsto em
contratos de seguro de saúde coletivos, em meu sentir, a Resolução Normativa 195/09,
expedida pela ANS, violou direito do consumidor. (...)

Realmente afigura-se inconcebível que a Agência Nacional de Saúde Complementar


edite norma que autorize, por via transversa, que o contrato de prestação de serviços
médicos e hospitalares seja rescindido unilateralmente pela operadora.

E essa norma, tal como redigida, efetivamente autoriza tal previsão contratual, pasme-
se, com base em orientação da própria Agência Reguladora.” (grifou-se).

26. Por mais este motivo, impõe-se o reconhecimento da indevida


cobrança feita pela Ré, sendo inexigíveis os débitos relacionados às mensalidades de
junho e julho de 2021.

Ou seja, se a Autora não proceder ao pagamento dos boletos


em aberto, terá seu nome lançado no rol dos maus pagadores, em razão de um
débito expressamente fundamentado em dispositivo considerado ilegal pelo Poder
Judiciário, em caráter definitivo, como será demonstrado a seguir DO DIREITO
“O cancelamento imotivado do seguro por iniciativa da Seguradora e/ou do
Estipulante, sem direito a devolução dos prêmios pagos, somente poderá ocorrer após
a vigência do período de 12 (doze) meses e mediante comunicação por escrito por
qualquer das partes, com no mínimo 60 (sessenta) dias de antecedência.” (grifou-se).

27. No caso, a Autora não rescindiu o contrato mantido há mais de


6 (seis) anos com a Ré imotivadamente e, sim, em razão de abusivos reajustes, a ponto
de impedi-la de manter a contratação.

28. A propósito, rememore-se que, embora coletivo, o plano de


saúde em comento beneficia um pequeno grupo familiar (mãe e filha), tratando- se de
hipótese de “falsa coletivização”, o que impunha à Ré a obediência aos limites de
reajustes estabelecidos pela ANS para os planos individuais, conforme pacífico

entendimento da jurisprudência pátria5.

5 “PLANO DE SAÚDE – Plano coletivo empresarial – Contrato que beneficia apenas


dois integrantes da mesma família – Falsa coletivização – Aplicação do mesmo regime
jurídico previsto aos planos individuais ou familiares – Incidência à espécie do
disposto no art. 13, parágrafo único, II, da Lei nº 9.656/98 – Rescisão imotivada
inadmissível - Reajustes anuais – Aplicação dos limites divulgados pela ANS –
Recurso desprovido.” (TJSP; Apelação Cível 1069297-15.2016.8.26.0100; Relator:
Rui Cascaldi; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 27ª
Vara Cível; Data do Julgamento: 15/03/2018; Data de Registro: 15/03/2018).

29. Como se vê, a Autora se viu compelida a romper a relação


contratual justamente em razão dos abusivos reajustes aplicados pela Ré, pelo que não
se aplica à hipótese a citada cláusula 30.1, alínea “a”, do contrato, haja vista que a
ruptura do contrato foi devidamente motivada.
30. Essa consiste em mais uma razão pela qual se impõe a
declaração de inexigibilidade dos débitos relacionados às mensalidades de junho de
julho de 2021, do contrato de plano de saúde sub judice.

II.2. ABUSIVIDADE DA COBRANÇA ESTABELECIDA EM CONTRATO DO TIPO


“ADESÃO” E HIPOSSUFICIÊNCIA DO CONSUMIDOR

31. Já foi visto que a relação mantida entre as partes é de


consumo, consoante previsão da Súmula 608, do Superior Tribunal de Justiça.

32. Não obstante, tal como foi reconhecido em sentença e


acórdão da Ação Civil Pública que culminou na anulação do artigo 17, parágrafo
único, da RN 195/09 da ANS, a previsão contratual é abusiva, tendo sido feita no
bojo de contrato do tipo “adesão”, em que o consumidor – parte hipossuficiente da
relação contratual – não tem a mínima possibilidade de alteração de suas cláusulas, o
que implica em afronta a diversos comandos do Código de Defesa do Consumidor.

33.
No mesmo sentido caminha a melhor doutrina. Vejamos:

“Assim, o CDC institui normas imperativas, que proíbem a utilização de qualquer


cláusula abusiva, definida como a que assegure vantagens unilaterais ou exageradas
para o fornecedor de bens e serviços, ou que seja incompatível com a boa-fé e a
equidade (veja o art. 51, IV, do CDC).” (MARQUES, Claudia Lima. Contratos no
Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das reações contratuais. 6. Ed. rev.,
atual. E ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. Pág 902);
“(...) sobre o regime das cláusulas abusivas no direito do consumidor, aqui também o
caráter abusivo de certas disposições contratuais decorre da posição dominante do
fornecedor em relação ao consumidor, que permite a

imposição unilateral de condições contratuais prejudiciais aos interesses legítimos dos


consumidores. Por tais razões violam a boa-fé objetiva que preside a relação entre
consumidores e fornecedores (artigo 4º, III). Percebe-se como traço distintivo das
cláusulas abusivas em relação às demais cláusulas insertas no contrato, o fato de as
mesmas comprometerem o equilíbrio contratual, em desfavor do consumidor, por que
seu conteúdo, desde logo, apresenta vantagem exagerada em benefício do fornecedor.”
(MIRAGEM, Bruno. Curso de direito do consumidor.4. Ed. rev. Atual. E ampl. – São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. Pág 196).

35. Dessa feita, não se pode perder de vista a hipossuficiência do


consumidor – no caso, a Autora – com relação ao fornecedor dos serviços – a Ré
–, não sendo razoável que a parte mais suscetível da relação contratual,
notadamente do ponto de vista financeiro, arque com penalidade em favor da
parte mais estável, em razão da ruptura da relação contratual e, muito menos, em
um montante equivalente ao dobro de algo que já não reúne condições de pagar,
sendo esta, inclusive, a razão do rompimento.

36. Por todos os motivos expostos acima, não há outra conclusão


a se chegar, senão de que é totalmente abusiva, ilegal e afrontosa à legislação
consumerista a cobrança das mensalidades referentes ao aviso prévio previsto na
cláusula 30.1, alínea “a”, do contrato.

PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA

37. No caso, estão presentes os requisitos para a concessão de


antecipação de tutela (tutela de urgência), ante o preenchimento dos requisitos exigidos
pelo artigo 300, do Código de Processo Civil 7, combinado com o artigo 84, do Código

de Defesa do Consumidor8.

38. A probabilidade do direito (fumus boni iuris) consiste na


prova dos fatos alegados, especialmente na abusividade da cobrança do débito em
discussão, cuja ilegalidade já foi declarada em Ação Civil Pública, mediante
acórdão

7 “Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que
evidenciem a

probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”.

8 “Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não
fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências
que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. (...)

§ 3° Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de


ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após
justificação prévia, citado o réu. (...)”.

transitado em julgado do TRF – 2ª Região (docs. 16/17 - autos nº 0136265-


83.2013.4.02.5101). O mesmo entendimento foi aplicado em acórdão do E. TJ/SP,
abordado no preâmbulo desta exordial (doc. 19 - processo nº 1072039-
42.2018.8.26.0100), bem como no item II.1.

39. O perigo de dano (periculum in mora) justifica-se pela


iminência de apontamento em prejuízo da Autora junto ao SERASA, que, como
visto, ocorrerá em 02/10/2021 (doc. 13), o que, além de danificar a saúde financeira
da empresa, pode acarretar, inclusive, a sua falência, causando notórios e irreparáveis
danos.

40. Vale ressaltar que, em ação análoga e muito recentemente, o


E. TJ/SP concedeu parcialmente a tutela de urgência, para imediatamente afastar
a possibilidade de negativação ou protesto, dada a probabilidade do direito e o risco
da demora, sob a mesma fundamentação ora apresentada, como se verifica:

Ementa: “Agravo de instrumento. Ação com pedido declaratório. Plano de saúde.


Decisão que indeferiu pedido de concessão de tutela de urgência. Inconformismo da
autora. Autora pretende a rescisão do contrato de plano de saúde. Demonstrou ter
notificado a ré. Ré enviou cobrança de mensalidade referente a período posterior ao
aviso prévio de 30 dias. Pedido de tutela de urgência para que seja suspendida a
cobrança. Perigo na demora consiste na possibilidade de protesto/negativação.
Probabilidade do direito diante da notícia do julgamento contrário às operadoras de
plano de saúde na ACP 0136265-83.2013.4.02.5101. Tutela de urgência
parcialmente concedida. Recurso parcialmente provido.”;

Trechos do acórdão: “A concessão de tutela de urgência depende, nos termos do


artigo 300 do Código de Processo Civil, da presença de dois requisitos, quais sejam a
probabilidade do respectivos boletos e a imediata sustação do protesto já levado a
apontamento junto ao Serasa Experian.

CONCLUSÃO E PEDIDOS

41. Requer-se, de plano, a prioridade na tramitação do feito,

com a necessária anotação nos autos, a teor do artigo 71, caput e § 1o, do Estatuto
do Idoso, já que os beneficiários do plano de saúde e sócios da empresa Autora – Maria
Fernanda Ferreira Queiroz– conta com mais de 60 anos de idade .

42. No mais, por todo o exposto, pleiteia a Autora a concessão de


tutela antecipada (de urgência) em sede liminar, para suspender a cobrança de
valores pela Ré, atinentes às mensalidades de junho e julho de 2021 do plano de
saúde, até o julgamento final da presente demanda, notadamente com a proibição de
negativação ou protesto dos respectivos boletos e a imediata sustação do protesto já
levado a apontamento junto ao Serasa Experian.

43. Ato contínuo, pede a Autora que se determine a citação da


Ré, para apresentar defesa no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de revelia, no
endereço declinado no preâmbulo da inicial, pela via postal, nos termos do artigo 246,
inciso I, do CPC.

44. Ao final, requer seja julgada procedente esta ação, para,


confirmando-se a tutela antecipada, declarar a inexigibilidade de débitos da Autora
para com a Ré, relacionados ao aviso prévio contratual (mensalidades de junho e
julho de 2021 do plano de saúde).

45. Para provar o alegado, postula a Autora pela produção de


provas por todos os meios em Direito admitidos, requerendo, desde logo, a inversão
do ônus da prova, a teor do art. 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do

Consumidor10.

46. A Autora manifesta, ainda, o seu desinteresse


na autocomposição, a teor dos artigos 319, inciso VII, e
334, § 5º, ambos do CP

47. Dá-se à causa o valor de R$ 8.299,76 (oito mil duzentos e


noventa e nove reais e setenta e seis centavos).

Termos em que,
Pede Deferimento.

São Paulo, 18 de agosto de 2021.

ANA CLAUDIA FERREIRA QUEIROZ FORTI


OAB/SP 150.336

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