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Contabilidade Forense

Brasília-DF.
Elaboração

Ronaldo Balestra Choze

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................. 4
ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA..................................................................... 5
INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7
UNIDADE I
NOÇÕES DE CONTABILIDADE................................................................................................................. 9

CAPÍTULO 1
CONTABILIDADE........................................................................................................................ 9

CAPÍTULO 2
FORENSE................................................................................................................................ 18

UNIDADE II
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA................................................................................................. 24

CAPÍTULO 1
CONTABILIDADE FORENSE....................................................................................................... 24

CAPÍTULO 2
POR QUE AS FRAUDES SÃO COMETIDAS?................................................................................ 28

CAPÍTULO 3
POR QUEM AS FRAUDES SÃO COMETIDAS?............................................................................. 48

CAPÍTULO 4
O SURGIMENTO DOS PARAÍSOS FISCAIS................................................................................... 53

UNIDADE III
PREVENÇÃO E DETECÇÃO DE FRAUDES CONTÁBEIS............................................................................. 59

CAPÍTULO 1
PREVENÇÃO E DETECÇÃO...................................................................................................... 59

UNIDADE IV
RESPONSABILIDADE E PAPEL DO CONTABILISTA FORENSE....................................................................... 68

CAPÍTULO 1
A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO CONTABILISTA E SEU PAPEL COMO CONTABILISTA
FORENSE......................................................................................................................... 68

PARA (NÃO) FINALIZAR...................................................................................................................... 74


REFERÊNCIAS................................................................................................................................... 75
Apresentação

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela
interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da
Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade


dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos
específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém
ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a
evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

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Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos
básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar
sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para
aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de
Estudos e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Praticando

Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer


o processo de aprendizagem do aluno.

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Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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Introdução
A cada nova realidade, uma nova conduta se faz presente e também se faz necessária.
Essa frase pode e deve ser apropriada e colocada em prática em muitas questões no dia
a dia das pessoas e das empresas.

O mundo muda, as tecnologias mudam, as pessoas mudam e não necessariamente


nessa ordem.

A possibilidade de cometer fraude é inerente ao seu humano, a depender de seus valores


éticos versus sua ganância ou sua necessidade.

Fraudes são atividades existentes desde a antiguidade. Então, com o decorrer do tempo,
foram desenvolvidas técnicas de detecção e prevenção, dentre elas o aprimoramento do
trabalho dos contabilistas e auditores.

Nesse estudo esmiuçaremos mais sobre essas práticas, qual a legislação pertinente,
qual o trabalho desses profissionais e citar/analisar alguns casos de fraudes conhecidas
mundialmente.

Bom proveito!

Objetivos
»» Demonstrar a real existência de processos fraudulentos ao longo da
história.

»» Especificar o porquê e por quem as fraudes são cometidas.

»» Ressaltar a importância do trabalho dos contadores e auditores para


prevenir processos fraudulentos.

»» Pontuar a importância do estabelecimento de padrões de conduta ética


dentro das empresas além de rígidos controles internos.

»» Mostrar como a contabilidade forense está relacionada nestes contextos.

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NOÇÕES DE UNIDADE I
CONTABILIDADE

Para que possamos melhor estudar o tema geral proposto precisamos, primeiramente,
conhecer cada uma das palavras que compõem o escopo do termo Contabilidade
Forense.

Iniciemos, então, pela compreensão do primeiro termo: contabilidade.

CAPÍTULO 1
Contabilidade

Todos já ouviram falar sobre contabilidade. Grande parte das pessoas, porém, pouco
sabe o que significa, e como fazê-la de forma correta e legal.

Existe, em cada país, uma legislação específica para se “fazer” contabilidade. No Brasil,
as regras de contabilidade foram definidas e são regidas pelo Conselho Federal de
Contabilidade (CFC – <http://portalcfc.org.br/>).

E o que é contabilidade?
Para os leigos, contabilidade é a prestação de contas, para o Governo, a fim de pagar
impostos. Nada mais é do que a forma que o “Leão” tem de “morder” ainda mais o
dinheiro dos pobres e cobrar ainda mais das empresas.

De acordo com o dicionário, contabilidade é uma área científica que, teoricamente ou na


prática, estuda os métodos e técnicas usados para calcular e registrar a movimentação
financeira de uma firma, companhia, empresa.

Ao formando no curso superior de Ciências Contábeis dá-se o nome de Contador.


Para a prática da profissão, porém, é necessária a aprovação em um teste conduzido

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UNIDADE I │ NOÇÕES DE CONTABILIDADE

pelo Conselho Federal de Contabilidade obtendo, desta forma, um registro o qual o


identificará como profissional apto a contabilizar as contas de uma pessoa física ou
jurídica qualquer.

Figura 1. Caduceu.

Fonte: <www.crcsp.org.br>

O caduceu é utilizado, no Brasil, como símbolo dos cursos de graduação em Ciências


Contábeis, do Conselho Federal de Contabilidade e dos conselhos regionais de
contabilidade.

O caduceu, também usado como emblema de Hermes (Mercúrio), é um bastão em


torno do qual se entrelaçam duas serpentes e cuja parte superior é adornada com asas.
Estas duas serpentes opostas figuram forças contrárias que podem se associar, mas não
se confundir.

A palavra contabilidade deriva do termo italiano contabilità, numa referência ao uso


das contas contábeis. Estas devem ser expressas com títulos em conformidade com os
atos e fatos administrativos provocados, e figurar num plano de contas, de acordo com
as suas características, similaridades ou eventos econômicos produzidos. Uma conta
deve representar exatamente a operação realizada.

À prática de reunir informações nos livros e documentos dá-se o nome de escrituração.


Por esse motivo, até a metade da década de 1970 os contadores eram conhecidos como
“guarda-livros”.

O objeto principal da contabilidade é o patrimônio e sua aplicação tem como objetivo


representar, apreender e analisar suas mutações.

O objeto principal da contabilidade é o patrimônio e sua aplicação tem como


objetivo representar, apreender e analisar suas mutações.

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NOÇÕES DE CONTABILIDADE │ UNIDADE I

A aplicação da contabilidade busca prover informações sobre aspectos de natureza


econômica, financeira e física do patrimônio da entidade e suas mutações.

Essas informações compreendem registros, demonstrações, análises, diagnósticos e


prognósticos, expressos sob a forma de relatos, pareceres, tabelas, planilhas e outros
meios.

Por econômico, entende-se todas as mutações quantitativas-qualitativas do patrimônio,


aquelas que alteram “receitas” e “despesas”, ou seja, o patrimônio líquido de uma
entidade.

Por financeiro, entende-se as mutações ocorridas no fluxo de caixa, ou seja, as transações


feitas no caixa da entidade.

Há diversos fatores internos e externos que influenciam essas mutações e devem ser
observados: ambiente social, econômico, político, legal, fatores relacionados à gestão
empresarial, entre outros.

Todos esses “acontecimentos” devem ser organizados e relatados em fatos contábeis, os


quais devem ser escriturados. Dessa forma, um sistema contábil deve ser aquele capaz
de organizar os fatos contábeis a partir de três objetivos primordiais:

»» registro;

»» controle;

»» informação.

Para essa finalidade a contabilidade utiliza quatro técnicas:

»» Escrituração: consiste em efetuar, de forma sistematizada, os registros


das ocorrências que influenciam a evolução patrimonial. A escrituração,
portanto, é realizada levando em consideração a ordem cronológica de
todos os acontecimentos. A técnica contábil da escrituração é baseada
em documentos comprobatórios, ou seja, todos os acontecimentos a
serem escriturados devem corresponder a um documento legalizado que
comprove a sua veracidade.

»» Demonstrações contábeis: consiste em apresentar todos os registros


efetuados em uma forma condensada, que apresente os resultados
atingidos pela empresa em um determinado período. Os fatos registrados
devem constar em demonstrações expositivas, que, segundo a Lei no
6.404/1976, são denominadas demonstrações financeiras.

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UNIDADE I │ NOÇÕES DE CONTABILIDADE

»» Auditoria: técnica que busca ratificar a exatidão dos registros já efetuados


e apresentados nas demonstrações contábeis. Consiste em um exame
pormenorizado de todos os dados escriturados pela contabilidade,
verificando se todos foram efetuados seguindo os princípios fundamentais
da contabilidade.

Essa técnica pode ser aplicada de duas formas distintas: auditoria interna e auditoria
externa.

A auditoria interna é uma técnica realizada como forma de verificar/certificar os


processos e resultados expostos pelas diversas áreas de uma entidade.

Muitas empresas têm em seu quadro de funcionários auditores responsáveis por auditar
as práticas internas dos departamentos. Cabe a essa auditoria verificar, controlar e
solicitar correções nos processos e resultados das áreas.

Por exemplo, a auditoria interna faz escolhas aleatórias de lançamentos contábeis para
verificação por amostragem. Os lançamentos escolhidos são verificados quanto à sua
veracidade, correção nas contas lançadas, existência de documentos comprobatórios.

A auditoria interna é a “validação” do trabalho contábil realizado na empresa a fim de


que no momento das demonstrações financeiras/prestação de contas a empresa esteja
pronta para relatar suas informações de forma correta, de acordo com a legislação
contábil e, ainda, as partidas lançadas “fechem a conta”, demonstrando de forma clara
e precisa os resultados alcançados pela empresa, seu patrimônio líquido, receitas e
despesas.

Já a auditoria externa é feita por empresas especializadas contratadas especificamente


para a finalidade de realizar o trabalho feito em algumas empresas pela equipe de
auditoria interna.

Geralmente empresas compostas por sociedade e/ou empresas de capital aberto têm
suas contas auditadas a fim de que os resultados apresentados pela empresa sofram
essa verificação ratificando a veracidade das informações para a garantia dos sócios.

Uma vez contratada, a empresa externa deve ter total acesso às informações e
independência para analisar e solicitar correções necessárias diretamente ao contador
e às áreas da empresa.

Algumas empresas de auditoria externa no Brasil bem conhecidas são: PwC –


PricewaterhouseCoopers e KPMG.

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NOÇÕES DE CONTABILIDADE │ UNIDADE I

Há, ainda, empresas que praticam as duas formas de auditoria. Nesse caso, o trabalho
realizado pela equipe interna é auditado pela equipe externa. Fica a cargo da auditoria
interna a interface com a auditoria externa e o contador que assina as demonstrações
da empresa.

»» Análise de balanço: levando em consideração que as demonstrações


contábeis representam dados sistematizados, que apresentam de forma
sintética os resultados da empresa, nem sempre os usuários têm condições
de interpretá-los. Assim, cabe à própria contabilidade decompor,
comparar e interpretar os demonstrativos contábeis, com a finalidade de
fornecer informações mais ágeis para os usuários.

A contabilidade trabalha com um conceito chamado “equação fundamental da


contabilidade”. Esta equação é escrita na forma A=P+PL e significa que o total de
ativos (A) sempre é igual à soma do total de passivos (P) com o patrimônio líquido (PL).
Ela é desdobrada da equação A=P, anterior às teorias que introduziram o conceito de
PL como a diferença entre ativos e passivos.

Por esse motivo, fala-se em partidas duplas. O que entra de um lado, obrigatoriamente
sai do outro. Ao final têm-se todos os movimentos e o tamanho do patrimônio da
empresa após essas mutações.

Equação Fundamental da Contabilidade: A=P+PL

Sendo: A os ativos, P os passivos e PL o patrimônio líquido.

Um pouco de história
A história da contabilidade é tão antiga quanto à própria história da civilização. Está
ligada às primeiras manifestações humanas da necessidade social de proteção à posse.
Assim, com a separação da propriedade para uso do solo, cada pessoa passou a criar sua
riqueza individual.

Ao morrer, o legado deixado pela pessoa passava como herança aos filhos ou parentes.
Essa herança ficou conhecida como patrimônio, termo advindo da palavra patris, ou
herança relacionada aos pais. Mais adiante o termo passou a ser utilizado para quaisquer
valores, mesmo que estes não tivessem sido herdados.

A origem da contabilidade está ligada à necessidade de registros do comércio, nas


atividades de compra e venda efetuada à época pelos comerciantes que precisavam
quantificar seus bens para efetuar tais transações.

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UNIDADE I │ NOÇÕES DE CONTABILIDADE

As trocas de bens e serviços eram seguidas de simples registros ou relatórios sobre o


fato. Mas as cobranças de impostos, na Babilônia, já se faziam com escritas, embora
rudimentares.

Quanto mais valor obtinha o homem, mais queria ver render suas posses e os
registros passaram a ser requeridos e com o surgimento das primeiras administrações
particulares aparecia a necessidade de controle a fim de que se pudesse prestar conta da
coisa administrada. O desenvolvimento do papel e da pena de escrever no Egito antigo
facilitou extraordinariamente o registro de informações sobre negócios.

As escritas governamentais da República Romana (200 a.C.) já traziam receitas de


caixa classificadas em rendas e lucros, e as despesas compreendidas nos itens salários,
perdas e diversões.

Podemos resumir a evolução da ciência contábil da seguinte forma:

»» Contabilidade do mundo antigo – período que se inicia com as primeiras


civilizações e vai até 1202 da Era Cristã, quando Leonardo Fibonaci,
o Pisano, escreveu o Liber Abaci – Livro do Ábaco ou do Cálculo. Foi
baseado na aritmética e “Álgebra” que Fibonacci aprendeu durante as
suas viagens pelo Mediterrâneo.

Foi um dos primeiros a introduzir os numerais indo-árabes na Europa.


Contém não apenas as regras para cálculo com os numerais indo-árabes,
mas também diversos problemas, que incluem questões, certamente
muito úteis aos mercadores tais como: cálculo de juros, conversões
monetárias, medidas, e outro tipo de problemas que Fibonacci resolve
recorrendo a diversos algoritmos e métodos, entre eles o método da falsa
posição e a resolução de equações quadráticas.

»» Contabilidade do período medieval – período que vai de 1.202 da Era


Cristã até 1494, quando apareceu o Tratactus de Computis et Scripturis
(Contabilidade por Partidas Dobradas) de Frei Luca Paciolo, publicado
em 1494, enfatizando que a teoria contábil do débito e do crédito
corresponde à teoria dos números positivos e negativos.

»» Contabilidade do mundo moderno – período que vai de 1494 até 1840, com
o aparecimento da Obra La Contabilità Applicatta alle Amministrazioni
Private e Pubbliche – A contabilidade aplicada à administração privada
e pública, da autoria de Franscesco Villa.

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NOÇÕES DE CONTABILIDADE │ UNIDADE I

»» Contabilidade do mundo científico – inicia-se em 1840 e continua até os


dias de hoje.

Na antiguidade o inventário exercia um importante papel, pois a contagem era o


método adotado para o controle dos bens, que eram classificados segundo sua natureza:
rebanhos, metais, escravos etc. A palavra “Conta” designa o agrupamento de itens da
mesma espécie.

As primeiras escritas contábeis datam do término da Era da Pedra Polida, quando o


homem registrava os seus primeiros desenhos e gravações.

Os registros combinavam o figurativo com o numérico. Gravava-se a cara do animal


cuja existência se queria controlar e o número correspondente às cabeças existentes.

Com o tempo o aspecto numérico tornou-se mais qualificado, com o acréscimo do valor
monetário ao quantitativo. Esta evolução permitiu que, paralelamente à “Aplicação”, se
pudesse demonstrar, também, a sua “Origem”.

Há 5.000 anos antes de Cristo, o homem já considerava fundamental apurar os seus


custos.

Os registros tornaram-se diários e, posteriormente, foram agrupados em vários


períodos, o que lembra o diário, o balancete mensal e o balanço anual.

Já se estabelecia o confronto entre variações positivas e negativas, reconhecia-se a


receita, a qual era confrontada com a despesa. Pode-se citar, entre outras contas: “Conta
de Pagamento de Escravos”, “Conta de Vendas Diárias”, “Conta Sintética Mensal dos
Tributos Diversos” etc.

Naquela época a escrita no Egito era fiscalizada pelo Fisco Real, o que tornava os
escriturários zelosos e sérios em sua profissão. Tudo indica que foram eles os primeiros
a usar o valor monetário em seus registros com a utilização de moedas cunhadas em
ouro e em prata.

Os gregos aperfeiçoaram o modelo egípcio, estendendo a escrituração contábil às várias


atividades, como administração pública, privada e bancária.

Você sabia que há interessantes relatos bíblicos sobre controles contábeis?


Seguem algumas passagens:

»» Lucas: capítulo 16, versículos 1 a 7: o administrador que fraudou seu


senhor, alterando os registros de valores a receber dos devedores.

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UNIDADE I │ NOÇÕES DE CONTABILIDADE

Gênesis 41.49: no tempo de José, no Egito, houve tal acumulação de


bens que perderam a conta do que se tinha.

»» Jó, capítulo 1, versículo 3 detalha o inventário do patrimônio de Jó.

»» I Reis 4.22-26 e 10.14-17: os bens e as rendas de Salomão também


foram inventariados.

O período medieval, também conhecido como “Era Técnica”, foi também de grande
importância na história do mundo, especialmente na história da Contabilidade, devido
às grandes invenções tais como o moinho de vento, o aperfeiçoamento da bússola etc.,
que abriram novos horizontes aos navegadores.

Novas técnicas no sistema de mineração e metalurgia surgiram. Foi então que os


venezianos fizeram surgir o livro-caixa para a prática do comércio exterior. Tal livro
recebia registros de recebimentos e pagamentos em dinheiro, o débito e o crédito.

O advento do capitalismo, nos séculos XII e XIII, período no qual houve uma
grande geração/acumulação de capital, trouxe a necessidade de aperefiçoamento
da contabilidade. As relações de trabalho foram alteradas uma vez que a escravidão
foi cedendo lugar ao trabalho assalariado. Desta forma, os registros de trabalho
tornaram-se mais complexos.

A conta chamada “Capital” passou a ser utilizada no final do século XIII intitulando os
valores dos recursos injetados nas companhias pela família proprietária.

O Livro da Contabilidade de Custos surgiu na Itália para lançamento das Partidas


Dobradas.

No início do Século XIV a escrita já se fazia nos moldes de hoje, considerando, em


separado, gastos com matérias-primas, mão de obra direta a ser agregada e custos
indiretos de fabricação. Os custos eram contabilizados por fases.

A descoberta da América em 1492 e do Brasil em 1500 representaram enormes potenciais


de riquezas para alguns países europeus.

É compreensível que a formalização da Contabilidade tenha ocorrido na Itália, afinal,


neste período instaurou-se a mercantilização sendo as cidades italianas os principais
interpostos do comércio mundial.

Foi a Itália o primeiro país a fazer restrições à prática da Contabilidade por um


indivíduo qualquer. O governo passou a somente reconhecer como contadores pessoas
devidamente qualificadas para o exercício da profissão.

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NOÇÕES DE CONTABILIDADE │ UNIDADE I

Foi Vicenzo Mazi quem, pela primeira vez, em 1923, definiu patrimônio como objeto
da Contabilidade. A contabilidade passou a ser enxergada como muito mais do que um
mero registro para, então, ser compreendida como um instrumento básico de gestão.

A criação de grandes empresas nos Estados Unidos passou a requerer grandes capitais,
de muitos acionistas, e essa foi a causa principal do estabelecimento das teorias e
práticas contábeis que permitissem correta interpretação das informações, por qualquer
acionista ou outro interessado, em qualquer parte do mundo, conforme explicitamos
anteriormente a respeito dos processos de auditoria de demonstrações financeiras.

No Brasil, com a vinda da Família Real Portuguesa, houve o aumento dos gastos públicos
e também da renda nos Estados. Para tanto, constituiu-se o Erário Régio ou o Tesouro
Nacional e Público, juntamente com o Banco do Brasil (1808).

As Tesourarias de Fazenda nas províncias eram compostas de um inspetor, um


contador e um procurador fiscal, responsáveis por toda a arrecadação, distribuição e
administração financeira e fiscal.

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CAPÍTULO 2
Forense

Antes de iniciarmos o estudo propriamente dito do objeto deste Caderno de Estudos,


precisamos compreender a outra metade do termo, ou seja, o significado do termo
forense.

O que significa forense?

Forense é uma palavra derivada de forum, da língua latina. Na Roma Antiga, fórum era
a praça central das cidades, onde ficavam os prédios administrativos e de justiça. Com
o tempo, fórum passou a designar o local onde se julgam as disputas e os crimes em
primeira instância.

Forense é um termo relativo ao Direito e, na maioria das vezes, é relacionado ao


desvendamento de crimes.

Existem, porém, outras aplicações do termo como, por exemplo, expediente forense,
que designa o horário de funcionamento dos tribunais, linguagem forense e psiquiatria
forense, entre outros.

Ciência Forense é a aplicação de um conjunto de técnicas científicas para responder às


questões relacionadas ao Direito, podendo se aplicar a crimes ou atos civis.

O esclarecimento de crimes é a função de destaque da prática forense. Por meio da


análise dos vestígios deixados na cena do crime, os peritos, especialistas nas mais
diversas áreas, conseguem chegar a um criminoso.

O esclarecimento de crimes é a função de destaque da prática forense.

O esclarecimento de crimes, normalmente, é efetuado por peritos, pessoas que pelos


seus conhecimentos adquiriram determinadas aptidões acima do normal relativas a
um sujeito, técnica ou conhecimento. Perito em sentido amplo significa qualquer
especialista.

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NOÇÕES DE CONTABILIDADE │ UNIDADE I

Existem peritos em diversas áreas de atuação. Perito criminal, por exemplo, é o servidor
público, policial ou não, devidamente investido, por concurso público, nos cargos de
nível superior elencados na Lei no 12.030/2009.

Ao perito criminal cabe encontrar ou proporcionar a chamada prova técnica ou prova


pericial, mediante a análise científica de vestígios produzidos e deixados na prática de
delitos.

No local, eles realizam a análise da cena do crime, identificando, registrando, coletando,


interpretando e armazenando vestígios.

São eles os responsáveis por estabelecer a dinâmica e a autoria dos delitos e realizar a
materialização da prova que será utilizada durante o processo penal.

Assim como os auditores, os peritos têm autonomia garantida para que suas análises e
seus resultados possam ser imparciais e verídicos.

A prática forense é conhecida como Ciência Forense ou Criminalística.

Uma das áreas atuais mais colaborativas para qualquer atividade forense é a computação
forense. Esta utiliza métodos científicos para coletar, identificar, analisar e interpretar
as evidências digitais de determindo crime.

Com a atualização constante da tecnologia, mais árdua ficou a tarefa de aplicação dos
métodos forenses. O volume de informações hoje armazenáveis em discos rígidos faz
com que técnicas específicas de computação sejam imprescindíveis para uma eficaz
varredura de arquivos e programas.

Aos especialistas cabe a correta e lícita extração dessas informações frágeis para que
possam servir como provas comprobatórias em um tribunal.

A constante evolução da tecnologia, aliada à ampla acessibilidade hoje oferecida ao


público em geral possibilita que, cada vez mais, os criminosos utilizem-se de ferramentas
digitais para planejar e/ou praticar seus crimes.

Para examinar um dispositivo computacional, como um disco rígido, é necessária a


realização de quatro fases do exame:

»» Preservação: consiste em uma série de procedimentos para garantir que


os dados no dispositivo questionado jamais sejam alterados, incluindo
a duplicação de conteúdo por meio de técnicas como espelhamento ou
imagem de disco.

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UNIDADE I │ NOÇÕES DE CONTABILIDADE

»» Extração: executada para recuperar toda e qualquer informação presente


no dispositivo questionado, recuperando arquivos apagados e realizando
a indexação do disco, por exemplo.

»» Análise: coleta das evidências digitais necessárias para o caso. Para isso,
diversas técnicas podem ser utilizadas, além de tentar superar eventuais
desafios, como a existência de senhas e criptografia.

»» Formalização: elaboração do Laudo Pericial, explicando e apresentando


as provas digitais coletadas com garantia de integridade.

Softwares e equipamentos especiais e direcionados foram criados ao longo do tempo


com o objetivo específico de facilitar e fortalecer o trabalho desses especialistas forenses
na área computacional.

A evolução da tecnologia, porém, apresenta a cada dia novos desafios que precisam
de acompanhamento e constante atualização dessa importante área forense. Como
exemplo:

»» Cloud computing: computação em nuvem – prática na qual os arquivos


são salvos diretamente em um ambiente digital, chamado “nuvem” e em
que os usuários não têm informação sobre a localização precisa deste
armazenamento. Desta forma, muitas vezes o servidor de armazenamento
das informações pode inclusive estar fora do limite jurisdicional do perito
responsável pela investigação.

»» Grandes espaços de armazenamento: conforme falamos anteriormente,


a possibilidade de armazenamento de grande quantidade de informação
faz com que seja necessário tempo suficientemente longo para a varredura
de todos os arquivos. O laudo pericial, porém, deve ser entregue com
brevidade. Desta forma, o trabalho do perito é dificultado com mais
essa possibilidade facilitadora de “diluição” de informações importantes
dentre informações numerosas.

»» Inteligência artificial: diversos dispositivos móveis e virtualizados cada


vez mais atuais com o emprego de tecnologia avançada. Tanta mudança
e evolução torna praticamente inviável o acompanhamento por parte dos
peritos que, em muitos casos, não têm familiaridade com os equipamentos
com os quais se deparam.

20
NOÇÕES DE CONTABILIDADE │ UNIDADE I

Ainda relacionado à tecnologia, em 2012, assistimos nos noticiários um exemplo claro


de crime eletrônico praticado por pessoas que hackearam o computador pessoal da
atriz Carolina Dieckmann roubando algumas fotos íntimas e publicando-as na web.

Por meio da perícia policial pode-se descobrir que tais fotos estavam hospedadas em
Londres e haviam sido furtadas por uma quadrilha de hackers moradores de diferentes
cidades do interior paulista.

A informação descoberta nos e-mails enviados pela atriz foi conseguida por intermédio
de um spam enviado pelos acusados à atriz. Ao clicar no link malicioso, informações
como senhas foram enviadas para os computadores dos criminosos.

Utilizando-se dessas imagens as quais feririam a imagem da atriz, contatos telefônicos


foram feitos para a casa de Carolina e duas imagens enviadas ao seu empresário com
um pedido de extorsão.

E foram nas informações deixadas pelos próprios hackers nos acessos aos e-mails de
Carolina que os investigadores encontraram uma espécie de impressão digital eletrônica
dos suspeitos, o IP de suas máquinas (Internet Protocol – número que identifica cada
computador).

A cada vez maior exposição das vidas pessoais e da governança estabelecida nas
empresas possibilita, a cada dia, aumento da possibilidade de invasão das privacidades
pessoais e corporativas.

Usualmente as empresas possuem um código de conduta para utilização dos equipamentos


e de toda a tecnologia disponível no ambiente da empresa e, ainda, a extensão dessas
condutas fora dos limites físicos da empresa para aqueles funcionários os quais possuem
guarda de equipamentos como computadores e celulares disponibilizados pela empresa
para que possam fazer seus trabalhos conforme demanda cada função.

Exemplo disso são os profissionais da área comercial que ficam constantemente


ausentes do escritório uma vez que seus trabalhos necessitam, primordialmente, de
visitas aos clientes, prospects, PDVs, distribuidoras.

Esse código empresarial especifica a limitação de acesso a determinados endereços


eletrônicos que configurem informações tais como: conteúdo pornográfico, redes
sociais, entre outros.

Cada empresa pratica um nível diferente de “liberação” desses acessos de acordo com
sua avaliação do perigo de se atrair para a empresa conteúdos maliciosos, roubo de
informações sigilosas.

21
UNIDADE I │ NOÇÕES DE CONTABILIDADE

Por esse motivo, considera-se propriedade da empresa todo e qualquer conteúdo


constante desses equipamentos, Desta forma, o departamento de tecnologia tem total
liberdade de atuar como perito fazendo a varredura dos computadores e arquivos.

Ao funcionário que não obedecer aos critérios estabelecidos pela empresa pode caber
desde uma advertência, uma denúncia e até demissão por justa causa e responsabilidade
criminal dependendo da amplitude do que foi cometido.

Há relatos de crimes sexuais praticados através de computadores empresariais. Há, por


exemplo, um caso em que um funcionário do departamento jurídico que solicitou ao
departamento de recursos humanos a proibição da circulação de funcionários ao redor
de sua mesa de trabalho uma vez que ele era o responsável pela condução de causas
trabalhistas sigilosas as quais não poderiam, de forma alguma, ser visualizadas por
qualquer outro membro da equipe.

Considerando pertinente a solicitação, esta foi acatada e uma comunicação foi enviada
para todos com a informação de restrição de acesso àquela determinada área de
trabalho. Porém, o departamento de recursos humanos não tinha conhecimento de
que, há algum tempo, o departamento de tecnologia vinha acompanhando os acessos
feitos por esse mesmo funcionário.

O procedimento não havia sido comunicado uma vez que ainda se tratava de suspeita a
ser confirmada como prática habitual.

A partir do conhecimento da comunicação do RH a gerência de tecnologia decidiu


intensificar as investigações e apresentar as provas concretas àquele departamento.

Surpreendentemente a solicitação do funcionário havia sido fundamentada não na


necessidade de manutenção do sigilo de suas atribuições trabalhistas, porém, no fato de
que, durante o expidiente de trabalho esse funcionário acessava sites para a prática de
sexo pedófilo. O funcionário, claro, foi demitido e a restrição de acesso à área jurídica
foi cancelada.

Até onde vai a liberdade pessoal dentro da empresa?

Você tem conhecimento de crimes tecnológicos praticados dentro de empresas?

Quem não se lembra do esquema fraudulento aplicado, em 2008, por um hacker


americano que retirava de contas bancárias R$ 0,01 (um centavo)? O pequeno
valor faltante não era notado e tal indivíduo chegou a acumular um montante de
U$ 50 mil.

22
NOÇÕES DE CONTABILIDADE │ UNIDADE I

A exposição nas redes sociais também precisa ser avaliada. Com base nas informações
inseridas pelo usuário, criminososos tomam conhecimento de cada detalhe que circunda
a vida daquela pessoa e podem utilizar as informações para fraudar as empresas.

Fica, então, fácil acompanhar o dia a dia, horários, locais frequentados, pessoas de
relacionamento, enfim, diversas informações que podem servir de fonte para a prática
de crimes diversos como sequestro, estupro e homicídios.

Como você se comunica com o mundo?

Suas informações pessoais estão de forma “aberta” na internet?

23
CONTABILIDADE
FORENSE NA UNIDADE II
PRÁTICA

CAPÍTULO 1
Contabilidade forense

Significado
Tendo repassado os conceitos de contabilidade e prática forense de forma breve,
podemos agora, com um pouco mais de entendimento sobre cada um dos termos,
combiná-los e adentrar o objeto-fim deste estudo: a contabilidade forense.

A contabilidade forense é a perícia judicial, auditoria e perícia contábil utilizada para


comprovar as irregularidades praticadas em entidades públicas e privadas com base no
conceito da contabilidade.

Nesse sentido, há muito o que se estudar a partir de casos reais de crimes praticados
por governos, empresas privadas e públicas e pessoas físicas, tanto no Brasil como no
mundo.

No Brasil os crimes financeiros sempre tomaram conta dos noticários. Por meio de
apurações feitas pelos auditores do Banco Central entre 1976 e 1997, parte da legislação e
das normas regulamentares foi alterada com a finalidade de combater as irregularidades
praticadas por meio do sistema.

Verificando a necessidade de fiscalização, o Banco Central (BC) passou a contratar para


seus quadros apenas auditores aprovados em concurso público.

Após a promulgação da Constituição de 1988 o cargo de contador foi extinto no Banco e


aos poucos todos os até então contadores concursados aposentaram-se. Hoje o trabalho
é conduzido por profissionais não especializados no tema, fator, esse, que dificulta a
correta avaliação interna das contas apresentadas.

24
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

Em 2007 o artigo 5o da Lei no 11.638 passou a exigir que os órgãos públicos contratem
contadores externos para auxiliar a condução do trabalho legal a eles atribuído.

Existe, porém, uma discrepância entre as normas praticadas pelo Conselho Federal de
Contabilidade e as regras exigidas aos contadores que atuam no Sistema Financeiro
Nacional (SFN).

Tanto no Banco quanto nas instituições financeiras e demais entidades autorizadas


a funcionar pelo Banco Central deve-se proceder a uma escrituração diferente da
estipulada pelo Conselho Federal de Contabilidade.

O Banco e essas instituições seguem as normas internacionais, as quais são divergentes,


muitas vezes, das normas obrigatórias aplicadas a todos as outras entidades nacionais.

A globalização das fraudes

Com a globalização das atividades pessoais e empresariais, globalizaram-se, também,


as atividades fraudulentas que, diversas vezes, inclusive, beneficiam-se da “ausência” de
fronteiras físicas para praticar seus crimes de forma mais livre e de difícil rastreamento.

Em tempo, a globalização em decorrência do avanço tecnológico, trouxe várias


consequências positivas e negativas. Entre os efeitos positivos pode-se enumerar: a
diminuição de barreiras geográficas, políticas e econômicas; a criação de uma única
moeda; maior fluxo de capitais, pessoas e mercadorias, aproximando sobremaneira as
pessoas de diferentes regiões do mundo.

As pessoas se beneficiaram pela cada vez maior disponibilização de produtos e serviços


a preços competitivos e acessíveis, antes não viável para a população em geral.

O intercâmbio de culturas, alimentos, músicas, artes em geral, enfim, de todo o universo


antes considerado apenas nacional, hoje extrapola as fronteiras territoriais e estão
disponíveis para os quatro cantos do mundo.

Hoje em dia qualquer pessoa com acesso à internet consegue efetuar compras de
produtos chineses que oferecem preços muito mais interessantes e recebê-los no
endereço que escolherem.

Com o uso de um cartão de crédito internacional podemos efetuar transações antes


burocráticas as quais exigiam presença física e documentos comprobatórios de renda e
residência, por exemplo.

25
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Pela internet pessoas se conhecem, se relacionam, namoram, praticam sexo virtual e


se fazem apaixonar para, enfim, conhecer o cônjuge pessoalmente e, então, cometer o
objetivo-fim de todo o processo: o golpe financeiro.

Todo o relacionamento construído em cima de arrimos de tecnologia virtual com a


finalidade única de extorquir uma pessoa emocionalmente vulnerável.

Outra forma muito utilizada e conhecida pelos brasileiros de se cometer fraudes pelas
fronteiras é pelo cruzamento da Ponte da Amizade, fronteira entre Brasil e Paraguai.

Diz-se que brasileiro tem sempre um jeitinho próprio de conseguir resolver suas
questões. Triste mesmo é tomar consciência que esse jeitinho brasileiro sempre envolve
meios não tão corretos e, por vezes, não tão lícitos.

Brasileiro busca vantagem nos negócios e uma boa forma de obtê-la é comprando barato
e lucrando na venda, sendo pelo lucro embutido no valor final e também pela falta de
emissão de notas fiscais dessas movimentações.

Sabe-se que milhares de brasileiros cruzam a Ponte da Amizade diariamente trazendo


produtos paraguaios para revender no Brasil. Sabe-se, ainda, que tais produtos nem
sempre são de boa qualidade e, inclusive, muitas vezes, representam réplicas de
baixíssima qualidade as quais já conferiram aos produtos advindos do país adjetivos
pejorativos.

Além disso, há o fato de não serem respeitadas as regras estabelecidas pela Secretaria
de Receita Federal do Brasil que definem uma cota ou limite de isenção de US$ 300
tanto para quem volta por via terrestre como de avião saindo de Foz do Iguaçu.

Essa cota só pode ser utilizada de 30 em 30 dias e é pessoal e intransferível, não sendo
possível juntá-las entre pessoas da mesma família, por exemplo, para aumentar o limite.

O que ultrapassar esse valor será taxado, consequentemente, em 50% sobre o que
ultrapassar os US$ 300.

Não entram na cota, porém, itens considerados como pessoais tais como celular, câmera,
artigos de higiene e beleza, roupas, calçados, maquiagens, porém em quantidade que
não caracterize comércio.

O que acontece na prática, porém, e que assistimos nos noticiários, são os sacoleiros que
cruzam as fronteiras com mercadorias sem notas, pessoas que não declararam alguns
itens que deveriam tê-lo feito, mercadorias escondidas em porta-malas de carros ou
ônibus, enfim, o jeitinho brasileiro de sempre tentar lucrar mais, de alguma forma, nem
que essa forma não seja por um meio correto.
26
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

O mesmo podemos falar sobre as compras trazidas do exterior, principalmente de


viagens como as dos parques da Disney, ou viagens para Nova York, em que familiares
fazem “pequenas encomendas” e as pessoas começam a ver nos lucros ganhos com as
roupinhas da Carter’s para aquela prima grávida uma fonte de renda fácil e prazerosa.

É aí que mora o perigo. A princípio não se está fazendo nada de mal. Não se está lesando
ninguém. Mas será mesmo?

A partir de quando umas comprinhas dessas para familiares e amigos passariam


a ser consideradas ilegais?

Para as empresas, por outro lado, também houve uma facilitação e diversos benefícios
advindos desse processo de globalização. O capital pode ser empregado onde há uma
maior rentabilidade e onde os tributos e a fiscalização são mais brandos.

Mão de obra barata e rápida passou a ser exportada e os custos de produção passaram a
ser mais baixos e os preços finais mais competitivos. Aliás, esse movimento fez crescer
a oferta e acirrar a competição entre produtos e serviços.

Por outro lado, pode-se elencar consequências negativas também geradas em razão
de todos esses benefícios: o crime organizado, paraísos fiscais, tráfico de pessoas, de
mercadorias, de entorpecentes e órgãos, e de baixos salários. Referidas características
tornam-se mais presentes entre os países emergentes, onde há um grau maior de
dependência com países desenvolvidos, além de um menor conhecimento sobre outras
formas de sobrevivência.

Quando tratamos do assunto mão de obra barata, qual é a diferença entre a


época da colonização pelas Grandes Navegações e a época atual?

27
CAPÍTULO 2
Por que as fraudes são cometidas?

Exatamente por causa desse movimento competitivo e da ausência de fronteiras para


atuação de pessoas e empresas, a forma de se manter no mercado e ainda conseguir
crescer é ter vantagem competitiva.

A motivação das fraudes vem em um segundo momento, a qual veremos tão logo
compreendamos como funciona o mercado da competição.

Como obter vantagem para permanecer e


crescer no mercado?

A diferenciação faz com que os clientes escolham seus produtos e/ou serviços entre
tantos outros oferecidos. Essa diferenciação é o que caracteriza vantagem competitiva.
São características que, segundo os clientes, entregam mais valor.

Resumindo, podemos utilizar a definição utilizada pelo site Merkatus: <www.merkatus.


com.br>:

Vantagem competitiva, ou diferencial competitivo, para um dado


segmento de mercado, é a razão pela qual os seus clientes escolhem
a oferta da sua empresa, e não a dos seus concorrentes, exatamente
porque sua oferta tem algo - a vantagem competitiva - que eles buscam
e é única ou melhor do que a oferta dos concorrentes. Disponível em:
<www.merkatus.com.br>. Acesso em: 26 out. 2015.

A ideia de vantagem competitiva é relativa uma vez que vantagem é avaliada


diferentemente de acordo com a ótica de cada cliente.

Vejamos: para uns, vantagem é entrar em uma loja e ser muito bem atendido,
independente do preço do que está adquirindo. Como atendimento é algo muito pessoal,
e nem sempre um potencial dentro das empresas, bom atendimento passa a não ser
visto como obrigação inerente e sim um diferencial.

Para outros, a vantagem buscada é o melhor preço. Desta forma, há aqueles que não
se importam com a marca do arroz uma vez que o que procuram é saciar sua fome e de
seus familiares.

28
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

Há, ainda, aqueles que não buscam vantagem, mas apenas um consumo mais barato
pela sua condição financeira.

Então, o mercado está aberto para que as empresas definam seu público-alvo e, desta
forma, desenvolvam esses diferenciais direcionados àqueles clientes que precisam
enxergá-las como vantajosas.

Tomando por base os 5 Rs – Relevância, Reconhecimento, Receptividade, Responsividade


e Relacionamento – os quais são a chave para o sucesso de um negócio, podemos dizer
que Reconhecimento é uma vantagem competitiva.

Por que reconhecimento é sinônimo de vantagem competitiva?

Podemos dizer que reconhecimento é o que faz com que os clientes, na hora do consumo,
busquem pelos produtos/serviços de uma determinada empresa porque a reconhecem
como a melhor.

Deve-se observar que a vantagem de uma empresa precisa ser absoluta. Se a vantagem
oferecida pela empresa pode ser, de alguma forma, substituída pela vantagem de outra
empresa, sem grande prejuízo do resultado, essa vantagem é neutralizada. Da mesma
forma, a vantagem oferecida precisa ser constante e duradoura para se firmar como
única a ser escolhida pelos clientes.

Então, por exemplo, de nada adianta um restaurante abrir suas portas com uma
carta de vinhos completa e extensa pensada estrategicamente e cuidadosamente para
harmonizar com cada um dos pratos oferecidos pela casa e, depois de um curto espaço
de tempo não ter condições ou interesse em manter todos os rótulos do cardápio quer
seja pelo custo de aquisição, pela falta de espaço de armazenamento ou pela pouca
saída de alguns.

Os clientes apreciadores de vinhos que passaram a frequentar o restaurante e, muitas


vezes, indicá-lo exatamente por sua variedade de rótulos e possibilidade de degustação,
uma vez se deparando com uma escolha não atendida pela falta de estoque tem a imagem
do estabelecimento abalada em seu conceito e, em pouco tempo, passarão a lembrar
daquele lugar como uma opção que um dia foi boa, mas que por descuido passou a
apresentar suas fraquezas e o não merecimento de reconhecimento como melhor.

De acordo com o exposto no mesmo site, são necessários 4 passos para serem praticados
sempre afim de obter essa vantagem:

29
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Fique de olho na concorrência

Para ter e manter uma vantagem competitiva você precisa ser único ou diferente. Para
você ter essa garantia fique de olhos bem abertos sobre os concorrentes. Se possível,
tenha amigos ou conhecidos de confiança que sejam clientes dos seus mais importantes
concorrentes para detectar antecipadamente possíveis diferenciações, cópias ou
substituições que estejam sendo preparadas por eles.

Outra forma de estar a par das práticas dos concorrentes é contratar consultorias
especializadas no levantamento de informações relacionadas ao mercado no qual atua.
Essa prática é chamada de benchmark e é uma excelente ferramenta para que uma
empresa possa verificar sua posição e suas práticas em relação ao mercado.

Faça a diferença

Só há três maneiras de sua empresa atuar e se manter no mercado:

»» copiar;

»» inovar;

»» revolucionar.

A cópia é o que os seus concorrentes tentam fazer com a sua vantagem competitiva.

Quando você atua na inovação, na melhoria contínua do seu diferencial, você busca
manter a distância dos seus concorrentes, ou ampliar esta distância.

Se você é único na sua oferta ao mercado, se só você oferta esse serviço ou produto, ou
característica destes, é porque você foi um revolucionário. Após a sua revolução você
pode melhorar continuamente o seu serviço e cair na inovação, ou providenciar uma
nova revolução (difícil, mas desejável).

Leia o artigo Só há 3 estratégias! Escrito por Carlos Alberto de Faria <http://www.


merkatus.com.br/11_artigos/33.htm>. Acesso em: 26 out. 2015.

Bote a boca no mundo

Já que você tem “Reconhecimento” no mercado por ser único ou diferente, por você ter
uma vantagem competitiva, anuncie, divulgue, publique, faça das tripas coração, mas
faça chegar ao ouvido, ao âmago do seu cliente potencial que você tem esse bendito
diferencial.
30
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

Faça com que o seu público alvo saiba, experimente, veja, saboreie, absorva, vibre, mate
o desejo com a sua vantagem competitiva, com esse diferencial que você tem, que é a
razão da escolha dos seus clientes por você.

Ponha o seu bloco na rua e anuncie aos quatro ventos, sem vergonha de ser feliz e sem
medo do sucesso.

Há que se fazer presente na mente e no coração dos clientes. Sua vantagem tem que ser
realmente “contagiante e contaminante” para preencher a mente e vir à lembrança dos
clientes. Conquiste pela razão e pela emoção já que alguns clientes agem racionalmente
enquanto outros tomam decisões de compra baseadas em situações de alegria ou
tristeza.

Cumpra o prometido

Cuide para que o anunciado seja entregue. Sempre! Como disse Yoda, no filme “O
Império Contra-Ataca”:

- “Tentar! Isso não existe. Só existe fazer ou não fazer!”

Isso pode significar ficar de olho em tecnologia e conhecimento, personificados nos


seus empregados. E também na prevenção do erro (indesejado, mas inevitável),
e os respectivos procedimentos na sua ocorrência, devem estar estabelecidos e
constantemente atualizados.

Invista em treinamentos e saiba sempre que recursos financeiros só podem ser


sustentados por uma constante e excelente prática de recursos humanos.

Como surgem as fraudes?

Podemos iniciar esse subcapítulo utilizando-nos do Corolário da Lei do Almoço de


Graça:

Não há almoço de graça, ou seja, não há benefício sem custo!

Por que esse enunciado deve ser cuidadosamente observado? Porque o custo das
escolhas é determinante para a escolha da estratégia de atuação de uma pessoa, de uma
empresa, de um governo.
31
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

E o que tudo isso tem a ver com fraude, globalização, almoço?

Como vimos anteriormente, as pessoas, as empresas, os governos, estão sempre em


busca da melhor opção, com o menor custo. Essa relação também é chamada de relação
custo x benefício.

O dicionário explicita, em termos gerais, o que significa custo-benefício:

s.m. Relação entre o investimento, valor gasto, e o que se recebe como


lucro.

Figurado. Toda relação estabelecida entre o que se gasta e aquilo que se


recebe em troca.

Relações ganha-ganha

Segundo o Sebrae Nacional, esse tipo de relação significa que a negociação tem uma
característica incomum: ninguém perde, todos ganham. É o que se pode dizer, por
exemplo, da relação ideal entre uma empresa e seu fornecedor, entre uma pessoa e
uma empresa, entre o governo e uma empresa, entre um governo e outro, ou seja, nas
relações em geral.

Para entender melhor, vamos comparar com dois jogos: o tênis e o frescobol. O tênis é
uma relação ganha-perde. Quando a bolinha cai no chão e fora do local, faz-se ponto.
Alguém tem de ganhar, um jogador será o ganhador e o outro necessariamente será o
perdedor.

Já o frescobol não tem essa característica. É que para se ganhar o jogo, não podemos
deixar a bolinha cair no chão – os dois jogadores ganham. A ideia e a ação do frescobol
são totalmente opostas ao tênis: “Somos bons se tivermos nivelados e juntos, nos
ajudando mutuamente, em um verdadeiro trabalho em equipe”.

As relações ganha-ganha, então, são relações do tipo frescobol. Esse tipo de relação é
saudável para ambas as partes e a cooperação, a clareza e as conversas francas para
exprimir pontos de vista são fatores preponderantes para o resultado.

Planejar é fundamental para a relação ganha-ganha.

O planejamento para definição da estratégia, porém, se depara com o fator custo.


Entre outros, custo envolve questões como prazo, mão de obra, escassez ou excesso de
matéria prima, política monetária, tributos, situação econômica mundial, câmbio, para
listar alguns.

32
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

Para uma correta tomada de decisão sobre como atuar, onde, por quanto tempo, a
qual custo, de onde se deve contratar a mão de obra, qual a necessidade de investir
capital, onde fazer esse investimento, qual o melhor momento para injetar capital,
quando trocar maquinário, como conduzir a vida financeira de uma instituição assim
como todas as outras decisões que dizem respeito ao negócio, devem se basear em uma
análise prévia chamada SWOT.

O termo é um acrônimo das palavras Strenght, Weakness, Opportunities e Threats,


que significam: forças, fraquezas, oportunidades e ameaças.

Para “desenhar” sua matriz de análise a empresa/pessoa/governo precisa iniciar por


avaliar seu ambiente organizacional.

Entende-se por ambiente organizacional tudo o que envolve uma determinada


organização, interna ou externamente.

Considera-se ambiente externo todos os fatores e atores externos que estão direta ou
indiretamente relacionados a uma organização. Exemplos: sociedade, governo, outros.

Entende-se por ambiente interno todos os fatores e atores que estão dentro de uma
organização e que têm implicação imediata e específica em sua administração.

Por meio da análise do ambiente interno são levantadas as qualidades e as deficiências


de uma empresa, ou seja, pontos fortes e fracos.

Os pontos fortes conferem-lhe vantagem operacional, enquanto os pontos fracos


apresentam desvantagens (análise feita mediante comparação com outras empresas do
mesmo setor – benchmark, conforme vimos anteriormente).

Quando em um determinado momento não se consegue classificar uma qualidade como


forte ou fraca, opta-se por inseri-la no cenário como ponto neutro. Em oportunidade
futura poderá ser reclassificada, quando houver mais clareza.

Uma empresa deve sempre optar por atuar nas áreas em que possui maior competência/
capacidade, identificando seus pontos fracos, pontuando-os e trabalhando para
corrigi-los.

Para que possa, então, executar uma boa gestão e efetuar seu planejamento estratégico,
a empresa deve proceder à sua análise SWOT:

33
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Figura 1.

Fonte: <https://coachingsp.wordpress.com/tag/analise-swot/>. Acesso em: 26 out. 2015.

Para avaliação e definição do ambiente interno, a organização precisa levar em


consideração os seguintes fatores:

»» Aspectos organizacionais: estrutura da organização, políticas,


procedimentos e regras.

»» Aspectos de pessoal: relações trabalhistas, programas de treinamento,


avaliação de desempenho, recrutamento, taxas de rotatividade e
absenteísmo.

»» Aspectos de marketing: estratégia do produto, preço, promoção e


distribuição, nicho de mercado.

»» Aspectos de produção: pesquisa e desenvolvimento, tecnologia, estoque,


layout da fábrica.

»» Aspectos financeiros: liquidez, lucratividade, investimentos.

Faz-se importante salientar que os valores, a cultura e tudo o que acontece no ambiente
interno das empresas influencia seu modelo de governança corporativa.

A governança corporativa é uma prática de gestão que cria valor para a companhia,
facilita seu acesso ao capital e contribui para sua perenidade.

Alicerces da governança corporativa: transparência, equidade, prestação de contas e


responsabilidade corporativa.

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CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

O ambiente interno da governança corporativa define o padrão das relações entre os


acionistas, o Conselho de Administração e a Diretoria Executiva, bem como a eficácia
dos órgãos de governança. É ela que, por consequência, define o desempenho da
companhia e seu valor de mercado.

Vale lembrar que mudanças institucionais e econômicas influenciam o ambiente interno


e, consequentemente, o redefinem por meio da implementação de novas práticas de
governança.

Vejamos, a seguir, uma matriz SWOT retirada da internet:

Figura 2.

Fonte: <http://www.ocoruja.com/index.php/2009/analise-swot-cirque-du-soleil/>

Conhecido mundialmente como o melhor circo, aquele que move multidões dispostas
a pagar pequenas ou às vezes grandes fortunas para assistir cada um dos vários
espetáculos apresentados pela trupe.

Por que esse circo se difere de todos os outros? O que faz com que as pessoas
aguardem ansiosamente pela liberação da compra de ingressos meses antes da
estreia do espetáculo no país?

A resposta é simples: o Cirque du Soleil é uma empresa, sim, uma empresa que, ao
longo dos anos, com sua estratégia muito bem definida, obteve Reconhecimento!

35
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Analisando a matriz desenhada por eles, podemos perceber como eles dividem muito
claramente o que querem manter, o que precisam eliminar e/ou reduzir, além de
trabalhar fortemente em seu carro-chefe: a criação.

A partir desta análise todas as estratégias podem ser desenhadas para o atingimento
dos objetivos.

O circo emprega artistas de todos os cantos do mundo e está constantemente em busca


da melhor mão de obra, independentemente de onde ela vem. Outro pilar importante é
a não utilização de animais em seus espetáculos.

Isso quer dizer que o tráfico de animais utilizado no passado pelos outros circos
concorrentes não representa problema para eles. Construíram, desta forma, uma
vantagem baseada em movimentos precisos aliados à música e a aposta rendeu e ainda
rende todo o sucesso experimentado por eles. Foram Revolucionários! Não há, ainda,
quem seja páreo para eles. Outros circos podem estar em estágio de evolução/inovação,
mas ainda não representam concorrência direta e não abalam a supremacia do grande
circo.

E você sabe como é que o circo se financia?

Os espetáculos do circo são patrocinados por empresas as quais, por vezes, se utilizam
de incentivos fiscais para tal movimento.

No Brasil, ao longo dos anos o circo vem sendo patrocinado primordialmente pelo
banco Bradesco.

Por que há interesse do banco nesse tipo de atividade?

Figura 3.

Fonte: <https://www.neogamabbh.com.br>

36
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

Por meio de renúncia fiscal o governo brasileiro criou a Lei Rouanet - Lei Federal de
Incentivo à Cultura. Por ela, as empresas que apuram lucro real podem descontar até
4% de seu Imposto de Renda devido, enquanto as pessoas físicas podem abater até 6%
do imposto devido para aplicar em projetos culturais pré-aprovados pelo Ministério da
Cultura.

O que o banco ganha com isso?

Além de muita publicidade, propaganda feita pela mídia espontânea, e do fortalecimento


de sua imagem por aliá-la a um produto cultural de altíssimo renome, ainda tem seu
lado social trabalhado, podendo comunicar essa ação como parte de sua prática social
responsável.

Há os que digam que essa prática nada mais é do que, como diz o ditado popular: “fazer
graça com o chapéu dos outros”. O chapéu, nesse caso, seria o chapéu do governo,
representado aqui pela renúncia fiscal, o “perdão” de parte de seu recolhimento para
promover atividades culturais.

A empresa, em contrapartida, utiliza o dinheiro que pagaria o imposto para financiar


sua imagem cultural e social.

Essa é uma relação ganha-ganha em que tanto o governo, quanto as empresas e a


sociedade obtém benefícios.

A parte contábil desse relacionamento é simples e transparente: o investidor deve


depositar o valor desejado para o patrocínio na conta bancária do projeto (aberta e
supervisionada pelo MinC) até o último dia útil do ano corrente.

Após o depósito, a entidade ou pessoa que propôs o projeto emitirá um recibo e envia
ao patrocinador, sendo que este servirá como comprovante para que a renúncia fiscal
se efetue.

O ressarcimento do patrocínio feito virá no ano seguinte, na forma de restituição ou


abatendo do valor do IR a pagar.

Portanto, a fraude nesse tipo de relacionamento não é possível.

No entanto, a fraude se faz possível em fases anteriores ao processo de patrocínio pela


Lei.

Como e onde poderia haver fraude nas outras etapas desse processo?

37
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Conforme visto anteriormente, o valor a ser investido depende exclusivamente do lucro


real apurado pela empresa no ano. Sendo assim, quanto maior for o lucro, maior é o
abatimento.

Porém, conforme regra estabelecida pela Receita Federal do Brasil (RFB), os tributos
incidem sobre esse lucro fazendo com que, quanto maior for o lucro, maior seja o
montante cobrado pelos governos (federal, estadual e municipal) sobre as transações
que geram o lucro.

Internamente, via de regra, a contabilidade se organiza da seguinte forma:

Figura 4.

Fonte: <http://www.exactus.com.br/empresa-de-contabilidade/sistema-contabil>

Não limitada a essa divisão, mas bem representada, a contabilidade trabalha em


cima das informações dos diversos departamentos da empresa, fazendo o controle e
procedendo a escrituração das mutações que ocorrem no patrimônio.

Atenção máxima e muito conhecimento técnico é exigido deste profissional que deve
conhecer minunciosamente a legislação aplicada em cada tipo de empresa e/ou produto
bem como do mercado para onde seus produtos/serviços se destinam (nacional/
internacional).

Cada produto ou serviço praticado em um determinado local, para outro local, implica
em movimentações que precisam ser transcritas, escrituradas de forma legal para que

38
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

se saiba exatamente e com rastreabilidade tudo o que ocorre dentro da empresa e tanto
os acionistas quanto a fiscalização tenham fácil acesso a essas informações quando
queiram consultá-las.

Porém, principalmente em empresas de pequeno porte e em empresas familiares, nem


sempre a figura do contador é vista como investimento vital ao seu funcionamento.

Como almoço não sai de graça, o trabalho de um especialista tem um custo que, nesses
casos, pode ser considerado alto e, portanto, dispensável.

Essa é uma das situações em que pode ocorrer a fraude acidental.

Fraudadores acidentais x predadores

Nem sempre a fraude é ocasionada como forma de burlar o sistema legal. Em casos
como esses em que a pequena empresa opta por conduzir sua contabilidade de forma
interna e independente, a falta de conhecimento técnico-especializado pode fazer com
que erros sejam cometidos e o “retrato” final não corresponda, de fato, à realidade.

Estando o resultado final representado de forma errônea, o caminho estará, da mesma


forma, cheio de erros. A relação tributos/obrigações ou deveres/direitos das empresas
deve acontecer sempre de acordo com o fato gerado.

Isso quer dizer que: se uma empresa vende uma tonelada de grãos que devem ser
transportados de São Paulo para Goiânia, toda a documentação e todo o processo deve
ser conduzido com base nessa informação.

Se, por algum descuido, informa-se que a venda foi de 900 kg de grãos, todos os cálculos
em cima dessa informação representarão uma fraude. Entre eles estão: preço final de
venda, valor do transporte e do seguro, impostos tais como ICMS.

Se o fato ocorreu por descuido ou falta de informação de quem o pratica, chama-se esse
tipo de fraude de acidental, com culpa, porém sem dolo.

Fraude é todo artifício malicioso que uma pessoa emprega com intenção de transgredir
interesse de terceiros, sendo claramente observada a presença da má-fé.

Um exemplo de fraude acidental no passado ocorreu da seguinte forma: um importador


de pneus, ao fazer suas licenças de importação para liberação da mercadoria junto à
Receita Federal, cometeu um erro.

39
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Para cada tipo e medida de pneu deve-se registrar uma licença diferente no Siscomex
(Sistema Integrado do Comércio Exterior). Dessa forma, as licenças para pneus de
carga e de passeio são enquadradas em itens diferentes.

Dentro de cada uma dessas categorias há, ainda, a divisão de NCM (Nomenclatura
Comum do MERCOSUL – utilizada para parametrizar produtos e serviços da mesma
classe com suas características e, consequentemente, os deveres legais a eles atribuídos).

Ao importar 40 tipos diferentes de pneus, o importador deve registrar 40 licenças


diferentes com informações pertinentes a cada uma das medidas.

Em se tratando de um sistema informatizado ainda com muitas falhas à época, as


informações não poderiam ser salvas conforme registradas. Isso quer dizer que o
trabalho só poderia ser salvo uma vez que fossem inseridos todos os 40 pedidos de
licença. Muitas vezes o sistema “caía” durante esse processo. Às vezes isso ocorria logo
no começo e às vezes já no final do trabalho.

O trabalho precisava, então, ser recomeçado do zero.

Passando por essa situação diversas vezes no dia, e contando com a sorte do sistema
manter-se no ar, certo dia, depois de várias tentativas de sucesso e insucesso, um erro
foi cometido sem que fosse percebido.

No momento da liberação da mercadoria junto à Receita Federal o processo para pneus


sempre cai, no mínimo, no sinal cinza, o que significa que haverá conferência de carga
e documentação por amostragem (os canais são: verde – liberação direta, amarelo –
verificação de documentação, cinza – verificação de mercadoria e documentação por
amostragem e vermelho – conferência de tudo).

O fiscal observou, então, que uma das licenças apresentada para uma determinada
medida de pneu de caminhão estava com a descrição escrita correta, valores e medidas
corretas, porém com a classificação feita para pneus de passeio.

Houve fraude? NÃO

Houve culpa? SIM

Houve dolo? NÃO

O importador teve que recolher a diferença de tributos e foi multado em R$ 10 mil (dez
mil reais).

40
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

O fiscal avaliou que o erro não havia sido cometido com a finalidade de prejudicar
o recolhimento de impostos, e sim por descuido causado pelo cansaço e excesso de
trabalho.

Valores recolhidos, carga liberada sem outros procedimentos.

O importador não respondeu, portanto, pelo crime de sonegação ou nenhum outro


crime contra a ordem tributária.

De qualquer forma, o sinal de alerta já ficou aceso nos próximos processos feitos pelo
importador.

Você sabe a diferença entre fraude e erro?

Segundo um estudo apresentado pelo Instituto dos Auditores Internos do Brasil, em


2013, Fraude é qualquer ato intencional de omissão, manipulação de transações,
adulteração, ocultação. Já o Erro é um ato não intencional na elaboração de registros e
demonstrações contábeis, que resulte em incorreções.

Por esse motivo o importador foi enquadrado como erro e não como fraude. Desta
forma, não houve crime.

E o Predador?

Utilizemo-nos de um fato publicado pela Revista ACFE, set/out 2011:

Em 1978, o Walmart contratou Thomas Coughlin como diretor de prevenção de perdas.


Ao longo dos anos, Coughlin trabalhou na empresa para se tornar vice-presidente, um
dos cargos mais poderosos da organização.

Mas, em março de 2005, o conselho de diretores do Walmart forçou Coughlin a


renunciar em meio a alegações de fraudes e trapaças.

Em 5 de abril de 2005, em um artigo no The Wall Street Journal, os repórteres James


Bandler e Ann Zimmerman escreveram que “o Sr. Coughlin tinha periodicamente
feito subordinados criarem faturas falsas para fazer com que o Walmart pagasse suas
despesas pessoais, incluindo suas férias de caça, um par de botas de pele de jacaré que
custou US$ 1.359 e uma casa para seu cachorro no valor de US$ 2.590

De acordo com o artigo, a estimativa total de transações questionáveis ​​era entre US$
100.000,00 e US$ 500.000,00. Em janeiro de 2006, Coughlin declarou-se culpado de

41
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

crime de fraude eletrônica e evasão de impostos fiscais por desvio de dinheiro, cartões
de presentes e mercadorias do Walmart.

Essa modalidade de fraude é considerada predatória uma vez que é praticada


intencionalmente com a finalidade de obter vantagem financeira de forma ilegal.

Houve fraude? SIM

Houve culpa? SIM

Houve dolo? SIM

Traçando um perfil médio entre cada tipo de fraudador, pode-se ter, como informações
gerais, o seguinte:

Fraudador acidental:

»» infrator pela primeira vez;

»» de meia-idade;

»» bem-educado;

»» empregado de confiança, em uma posição de responsabilidade,


considerado um bom cidadão tanto no seu trabalho, no escritório, na
comunidade, ou em uma organização de caridade.

Visto como uma boa pessoa, correta e cumpridora de seus deveres, dificilmente é visto
como potencial fraudador. As pessoas acreditam que deve haver uma motivação muito
determinante que justifique sua atitude.

Uma fraude acidental cometida mais de uma vez já não pode mais ser considerada
acidental. A continuidade de atos fraudulentos caracteriza uma ação predatória de um
fraudador patológico.

Existe uma linha muito fina entre um acidental e um predador. Isso porque uma vez se
beneficiando do esquema sem ser descoberto e desfrutando dos ganhos obtidos com a
ação, o acidental passa a repetir seu comportamento para cada vez mais obter ganhos
(ego/ganância).

Como características básicas pode-se dizer que os predadores são indivíduos focados,
organizados, frios, arrogantes, capacitados e geralmente muito bem preparados para
lidar com auditores e demais mecanismos antifraude.

42
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

Alguns dados sobre fraude no Brasil e no mundo:

No Brasil, entre 5 e 10% do faturamento das empresas é desviado.

Nos Estados Unidos, entre 2008 e 2002 houve um incremento de 65% no montante
desviado pelas empresas.

Qual é a lógica do fraudador?


Para compreendermos como funciona o esquema de fraude praticado por alguém
precisamos, primeiramente, compreender sua lógica por meio de 4 etapas:

»» motivação;

»» modus operandi;

»» perfil;

»» áreas e controles vulneráveis nos processos.

Mas e no caso da fraude cometida por uma pessoa honesta por natureza que pratica
uma ação que sabe errada?

O triângulo da fraude

Para explicar esse fenômeno, o estudante de doutorado de Sutherland, Donald R.


Cressey, na década de 1940, criou a teoria do “triângulo da fraude”.

Essa teoria parte da visão do fraudador e tem 3 pontas distintas: oportunidade percebida,
pressão percebida e racionalização.

Figura 5.

Fonte: <www.brasiliano.com.br>

43
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Nessa perspectiva, a pressão e a racionalização não podem ser observadas. Segundo


o referido estudo, essa teoria “não explica adequadamente as ações de fraudadores
patológicos: os predadores que são mais organizados têm melhores sistemas de
ocultação, e são melhores em interação com auditores e profissionais antifraude.”

Com relação à pressão percebida ela nem sempre representa amplamente a motivação
do fraudador. Questionando indivíduos fraudadores sobre a razão de não terem
fraudado anteriormente, as respostas foram mais ou menos:

“Não havia necessidade de fazer isso como desta vez”.

“Não tinha tido essa ideia antes”.

“Antes eu achava que era desonesto, mas desta vez, no início não parecia
tão desonesto”.

E o que significa não ter havido necessidade prévia como tem agora, e que justifica tal
atitude?

Nos casos estudados, os fraudadores consideraram o momento da fraude como um


ponto em que seus problemas financeiros não eram mais suportáveis e não podiam ser
compartilhados.

Tais problemas iam desde escassez súbita de recursos, passando pela vida acima dos
padrões financeiros, ganância, pouca disponibilidade de crédito e/ou incapacidade de
obtenção de crédito, despesas médicas inesperadas e significativas, grandes despesas
com educação, família ou a pressão dos colegas, perdas por apostas ou jogo, custo e
falta de produtividade devido a drogas ou álcool, e custo de casos extraconjugais.

Ou seja, o desespero toma conta do indivíduo e ele considera que “o fim justifica os
meios” – Maquiavel.

O fator pressão, porém, por ocorrer internamente no indivíduo, dificilmente é observado


na investigação.

Quanto à oportunidade, o fraudador precisa identificar a oportunidade de cometer o


crime sem ser descoberto. A fonte dessa oportunidade pode surgir de:

»» pobres controles internos sobre processos e resultados. Por vezes esses


controles não acontecem pelo excesso de trabalho conduzido por uma
única pessoa já que as empresas cada vez mais enxugam seus quadros de
funcionários. Outras vezes porque a aplicação de controles implica em
custos e novos procedimentos, os quais mudam o modus operandi da

44
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

empresa (o primeiro temido pelas empresas e o segundo temido pelos


funcionários);

»» falta de treinamento das equipes para que não se pratique conluio;

»» falta de supervisão sobre processos e pessoas;

»» falta de julgamento dos culpados. Particularmente no Brasil há uma


cultura de fazer o que é mais fácil e não o que é necessário. Dessa forma, o
correto julgamento de culpados não é conduzido de forma séria, ficando
desacreditado;

»» programas antifraude, políticas, e procedimentos ineficazes;

»» fraca cultura ética.

Importante salientar que a cultura deve ser transmitida e disseminada pelas camadas
da gestão da empresa, ou seja, o “topo” deve servir de exemplo aos outros. A cultura
ética deve ser inerente ao processo de governança corporativa da empresa, fazer parte
de seus valores.

Quando tocamos na ponta do tripé chamada racionalização deparamo-nos com outro


fator não observável.

Isso ocorre porque a racionalização do crime, sua motivação e suas justificativas são
pensadas (racionalizadas) pelo indivíduo.

Pela pressão que a pessoa sofre, conforme vimos antes, ele mesmo se justifica e se
desculpa não considerando sua ação como prática de crime.

Um exemplo desse tipo de pensamento é: “Só vou pegar emprestado por um tempo.
Ninguém vai perceber. Assim que eu receber meu salário reporei e tudo ficará como
dantes. Ninguém sairá prejudicado e conseguirei resolver meu problema. Minha família
precisa que eu faça isso.”

Você seria capaz de cogitar praticar ou cometer uma fraude se alguém de sua
família estivesse com um problema de saúde?

Com base no tripé de Cressey, reflita:

Em que/quais ponta(s) do triângulo a empresa pode agir para prevenir fraudes?

45
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

A resposta é clara: ela só pode agir evitando as oportunidades encontradas no próprio


ambiente de trabalho. Ela precisa, desta forma, fazer sua análise SWOT e descobrir
suas fraquezas/fatores internos para que possa corrigi-los e controla-los de perto.

Quanto às outras duas pontas, a empresa nada pode fazer uma vez que estas ocorrem
internamente no indivíduo.

O diamante da fraude

Em complementação ao modelo de Cressey, em dezembro de 2004, David T. Wolfe e


Dana R. Hermanson apresentaram uma proposta pensada em cima de quatros lados,
na forma de um diamante, o qual incorpora a capacidade do indivíduo, além dos outros
três fatores do triângulo – teoria chamada de Diamante da Fraude.

Essa capacidade é o que demonstra o lado pessoal do indivíduo que faria com que ele,
de fato, diante dos outros três acontecimentos ou de algum deles tenha a capacidade/
habilidade de cometer a fraude.

Em outras palavras, não é qualquer pessoa em dificuldade que consegue planejar e


executar um esquema fraudulento bilionário.

Ainda segundo esses autores, quatro são as características observáveis que poderiam
levar ao cometimento da fraude:

» Posição de autoridade ou função dentro da organização.

» Capacidade de entender e explorar os sistemas contábeis e as fraquezas dos


controles internos, possivelmente aproveitando suas responsabilidades e
abusando da sua autoridade para completar e esconder a fraude.

» Confiança (ego) que não será detectado, ou, se for pego, que se safará do
problema.

» Capacidade de lidar com o stress criado dentro de uma pessoa boa que antes
agia de outra maneira, com outra pessoa que comete maus atos.

O modelo DICE

DICE é o acrônimo de Dinheiro, Ideologia, Coerção e Ego. Esses quatro elementos


seriam, desta forma, as motivações para os indivíduos cometerem fraudes, segundo
questão apresentada, em 2010, no “Exame de Contabilidade Forense e de Fraude”.

46
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

E o que pode passar na mente do fraudador para que ele reavalie sua intenção
de planejar, cometer ou repetir uma ação fraudulenta?

Qual é o maior medo do bandido? Ser descoberto e preso. Assim também acontece com
o fraudador, que é um criminoso.

Na obra Theft by Employees (Roubo por Colaboradores, SIMON; SCHUSTER, 1983),


Richard C. Hollinger e John P. Clark descobriu que a certeza de detecção percebida é
inversamente proporcional ao roubo dos empregados.

Esse movimento de desestimulação da prática de fraudes é chamado de dissuasão e a


forma de praticá-la é adotando rígidos controles internos e programas antifraude.

Criar um canal de denúncias que seja seguro e reconhecido como mantenedor do


anonimato também é um caminho importante para encorajar delações de casos
conhecidos ou supostos dentro da empresa.

47
CAPÍTULO 3
Por quem as fraudes são cometidas?

Uma vez sabendo a motivação do cometimento de fraudes precisamos, então, definir


quem as comete.

Fraudes podem ser cometidas por qualquer indivíduo, seja ele público ou privado,
pessoa física ou jurídica.

Grandes empresas, as quais movimentam grandes valores, são as mais propensas


a cometer esse tipo de crime. Isso porque a finalidade maior é ganhar mais e gastar
menos, ou seja, quanto mais se ganha, mais deve-se pagar. Então, fraudando é possível
declarar menos e, consequentemente, pagar menos.

Pessoas jurídicas
Dentro das empresas, os lançamentos contábeis são efetuados pelos funcionários de
diversas áreas, pessoas nem sempre conhecedoras da legislação contábil, ficando o
contador geral e seus auxiliares diretos incapazes de vistoriar todos os lançamentos,
em razão do volume.

Por esse motivo são contratados os auditores. Cabe a eles fazer a varredura dos
lançamentos e solicitar as devidas correções. Esse trabalho pode ser conduzido tanto
por um departamento de auditoria interna (Compliance Office), pela contratação de
empresas de auditoria externa ou por ambos, conforme vimos anteriormente.

Durante muitos anos prevaleceu a ideia de que apenas indivíduos podem cometer delitos
e, então, receberem uma sanção penal. Desta forma, entendia-se que pessoas jurídicas
não poderiam ser penalizadas uma vez que quem comete o crime é uma pessoa física
em nome ou dentro da pessoa jurídica para a qual trabalha.

Entretanto, diante de novas espécies de criminalidade, passou-se a prever também a


responsabilidade penal para pessoas jurídicas.

No Brasil, pela análise da Constituição Federal de 1988, nos artigos 173, § 5o, e 225,
§ 3o, vislumbra-se a possibilidade de punição criminal para pessoas jurídicas, o que veio
a ser também reconhecido, expressamente, no artigo 3o da Lei no 9.605/1998.

Devemos, aqui, relembrar duas teorias opostas a respeito da punibilidade da pessoa


jurídica:
48
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

Teoria da ficção

Criada por Friedrich Carl von Savigny, um dos mais respeitados e influentes juristas
alemães, a Teoria da Ficção versava que a pessoa jurídica tem uma existência meramente
fictícia, é um ente abstrato, não possuindo, assim, vontade própria, consciência,
de forma que eventual responsabilidade por atos criminosos seria apenas de seus
membros. Condenar a pessoa jurídica seria condenar todos os seus membros, culpados
ou inocentes.

Teoria da realidade

Tendo como precursor o jurista alemão Otto Gierke, sustenta que a pessoa jurídica é
uma verdadeira realidade, possuindo vontade e capacidade de deliberação e, portanto,
passível de responsabilidade criminal.

Segundo ele, a empresa nada mais é do que a soma da vontade de seus membros, por
deliberações e votos.

Em razão dessas divergências, surgiram ideias intermediárias para criação de um novo


direito penal, direcionado à macrocriminalidade, observando-se a possibilidade de
visualizar uma ação cometida por entes coletivos, afetando direitos coletivos e difusos,
como ocorre nos crimes ambientais, contra o sistema econômico e financeiro, contra a
ordem tributária.

Sociedades de capital aberto

As sociedades de capital aberto possuem, sem dúvida alguma, um maior controle


externo de sua contabilidade uma vez que, por ter suas ações na bolsa de valores, com
diversos acionistas, o acompanhamento/auditoria de suas movimentações e de seus
resultados é feito de forma mais precisa.

Bom, há os que digam que essa afirmação só funciona na teoria já que na prática não
há parametrização para avaliação dos balanços patrimoniais publicados. Diversas
vezes, ainda, o balanço é elaborado por pessoas que não possuem especialização e
conhecimento técnico no assunto. Existem, ainda, contadores e auditores direta ou
indiretamente ligados às fraudes contábeis e manipulação de dados do balanço. Muitos
desses profissionais alegam que são obrigados a proceder à fraude com a pena da perda
do emprego caso não o faça.

49
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Há auditores que agem de acordo com as ordens dos executivos que os contrataram e
não pelo interesse dos acionistas, donos das empresas. Outra possibilidade é a conduta
de fazer “vista grossa” aos erros devido a sua participação na trama.

À manipulação de dados do balanço patrimonial dá-se o nome de embelezamento de


balanços, contabilidade fraudulenta ou contabilidade criativa.

Por volta da década de 1990, em um curso ministrado na Receita Federal, falou-se


a respeito da manipulação de balanços de entidades governamentais europeias que,
desde aquela época, manipulavam seus balanços simulando ainda serem potências
mundiais apesar de estarem falidos e em fase de recessão quase irreversível.

O chamado embelezamento também foi descoberto em empresas norte-americanas


que fraudavam suas demonstrações com a finalidade de atrair investidores e viabilizar
a distribuição de lucros a seus executivos que, pela situação real, não teriam direito.

Sem contar as diversas empresas fantasmas que abriram capital na bolsa de valores
no Brasil na década de 1970, atraíram investidores com apresentação de lucros
espetaculares e desapareceram subitamente.

Havia, ainda, a manipulação de preços das ações na Bolsa de Valores. Para reprimir
esse tipo de fraude foi sancionada, em 1989, a Lei no 9.713 que dispunha sobre a Ação
Civil Pública de Responsabilidade por Danos Causados aos Investidores no Mercado de
Valores Mobiliários.

Vide:

<http://cosif.com.br/mostra.asp?arquivo=lei7913>.

Lei no 6.385/1976 a qual versa sobre os Crimes contra o Mercado de Capitais e


a Instrução CVM no 530/2012 a qual dispõe sobre as vendas a descoberto da
infração e as vendas de ações obtidas por empréstimos quando resultarem em
manipulação dos dados por informações privilegiadas.

Há ainda que se falar sobre os ataques especulativos à moeda brasileira na época do


governo de Fernando Henrique Cardoso. Tal ocorrência obrigou o governo a efetuar
constantes pedidos de empréstimo ao Fundo Monetário Internacional (FMI) em função
do esgotamento das Reservas Monetárias brasileiras.

Naquela época os dólares eram vendidos para não residentes que mantinham no Brasil
contas chamadas de CC5 (regulamentas pelo Decreto Presidencial no 55.762/1965 e
que previam a livre movimentação de recursos trazidos do exterior os quais seriam

50
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

convertidos para moeda nacional e depositados em contas correntes mantidas no Brasil


por pessoas físicas ou jurídicas residentes ou domiciliadas ou com sede no exterior).

Pessoas físicas e as fraudes contábeis


Pessoas físicas também são passíveis de cometimento de fraudes contábeis.
Na declaração de imposto de renda o indivíduo, por vezes acidentalmente, e por vezes
de forma predatória, comete infrações por não declarar todo o seu lucro, seus bens
e suas movimentações e outras vezes simulam gastos dedutíveis tais como despesas
médicas e escolares.

A malha fina da Receita Federal (RFB) é responsável por verificar, por amostragem e, de
um tempo para cá, por cruzamento de dados de planos de saúde, médicos e instituições
de ensino, por exemplo, o real valor e existência de tais lançamentos.

Uma forma de acidentalmente praticar omissão é, por exemplo, deixar de declarar


rendimentos de cadernetas de poupança ou créditos advindos de sorteios da nota fiscal
(ex.: nota fiscal paulista).

Outra forma de contribuição para as fraudes é a não exigência de nota fiscal para
produtos e serviços adquiridos, por menor que sejam os valores e, por vezes, ainda
combinar um valor menor para que se pague à vista, sem emissão de nota.

Não emitindo nota e não dando entrada no valor recebido no movimento de caixa nem
o contador é capaz de detectar a fraude executada pela empresa.

Governo e as fraudes
Há todo momento ouvimos no noticiário as fraudes cometidas em entidades
governamentais brasileiras.

Mais atualmente tomamos conhecimento da operação nomeada pela Polícia Federal de


Lavajato com a investigação e prisão de vários executivos tanto de empresas privadas,
quanto da Petrobrás, políticos e o doleiro responsável pelas manobras.

A fraude apresentou indícios de propinas pagas pelas empreiteiras a diretores e gerentes


da estatal.

As investigações estão sendo conduzidas por pela Polícia Federal e pelo Ministério
Público Federal. A Polícia Federal estima em R$ 19 bilhões o prejuízo na estatal.

51
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Essa é apenas uma das fraudes ocorridas dentro de órgãos dos governos federal,
estaduais e municipais, sobre as quais tomamos conhecimento.

Relembre outros casos de fraude que se tornaram públicos no Brasil e no mundo.


Imagine quais são os impactos para a sociedade? Como a contabilidade Forense
se insere neste contexto?

52
CAPÍTULO 4
O surgimento dos paraísos fiscais

As fraudes para manipulação de dados contábeis são antigas. Porém, com o aparecimento
dos paraísos fiscais, o avanço da tecnologia e uma crescente negociação de capitais nas
bolsas de valores, a frequência e o volume de fraudes sofreu um incremento.

A lavagem de dinheiro por pessoas físicas era feita por meio da obtenção de lucros no
Sistema Financeiro Nacional. Desta forma, justificavam seu acréscimo patrimonial.
Já as empresas desviavam seus recursos para o tão conhecido “Caixa Dois”.

A partir da criação do Mercado de Câmbio de Taxas Flutuantes (1989) esses recursos


clandestinos passaram a ser enviados para paraísos fiscais.

Foi durante o mandato de Ronald Reagan, presidente dos Estados Unidos entre os anos
1981 e 1989 que os paraísos fiscais se tornaram públicos. Isso aconteceu porque nessa
época foi aprovada no Congresso Americano uma lei que diminuía a tributação sobre
lucros obtidos no exterior.

Essa lei fez com que um movimento de subfaturamento de exportações e superfaturamento


das importações passasse a ser feito pelas grandes empresas. O lucro advindo dessa
diferença de valores era direcionado para paraísos fiscais, onde ficavam aplicados para
não se descobrirem as fraudes.

Significado de paraíso fiscal e lavagem de


dinheiro
Paraíso fiscal é um local onde é oferecida uma espécie de dumping fiscal (alíquotas
tributárias muito baixas ou nulas) para aplicação de capital estrangeiro.

Além do incentivo tributário, há ainda a possibilidade de se manter o anonimato dos


proprietários dessas contas em função do sigilo bancário.

Trata-se de locais onde quase não há burocracia para abertura de empresas e onde o
direito internacional, o qual investiga a lavagem de dinheiro, não é aplicado.

Lavagem de dinheiro refere-se a práticas econômico-financeiras que têm por finalidade


dissimular ou esconder as fraudes fazendo com que aparentem ter origem lícita ou não
denunciem os infratores em função do anonimato.

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UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

Nesses lugares são criadas as “contas fantasmas” para onde são canalizados diversos
recursos adquiridos de forma ilícita, incluindo, dentre outros, dinheiro advindo do
tráfico de drogas, desvios de dinheiro público, terrorismo, além do fato de que muitas
empresas abriram filiais nesses locais para facilitar essas transações, evitando o
recolhimento de impostos.

Segundo Geoffrey Colin Powell, ex-Conselheiro Econômico da Ilha de Jersey: “O que


identifica uma área como sendo ‘refúgio fiscal’ é a existência de um conjunto de medidas
estruturais tributárias criadas deliberadamente para tirar vantagem de, e explorar a
demanda mundial de oportunidades para se envolver em evasão tributária”.

Um levantamento feito em 2012 pelo grupo de pressão anti-impostos Tax Justice


Network estimou que o capital presente nesses paraísos, à época, somava cerca de 21 a
32 trilhões de dólares.

Alguns dos paraísos fiscais mais conhecidos mundialmente são: Ilhas Cayman, Bahamas,
Bermudas, Suíça, Mônaco, Luxemburgo.

Em 2012 o jornal Wall Street publicou a descoberta de que dos lucros de 60 grandes
empresas americanas, 40% estavam abrigados em paraísos fiscais e eram provenientes
de fraudes tributárias.

De acordo com a Instrução Normativa RFB no 1037 de 4/6/2010, a Receita Federal do


Brasil considera paraíso fiscal qualquer lugar que tribute a renda com alíquota inferior
a 20%.

O processo de lavagem de dinheiro

Geralmente o processo de lavagem de dinheiro é dividido em três fases:

»» Colocação – de forma pulverizada o dinheiro é inserido no Sistema


Financeiro por meio de pequenos depósitos ou compra de ativos.

»» Ocultação – nessa fase os valores são movimentados sistematicamente


entre contas ou entre aplicações em ativos de forma a despistar a fraude
e, ao mesmo tempo, aos poucos conseguir aglutinar todo o dinheiro.

»» Integração – momento no qual o dinheiro é inserido na economia formal


sob a forma de investimentos.

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CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

Uma forma frequente de praticar lavagem é por intermédio de doleiros que remetem o
dinheiro, em espécie, para paraísos fiscais e depois o reintegram na economia formal
como se fossem investimentos externos.

A lavagem de dinheiro não é feita com a finalidade de obtenção de lucro, mas,


simplesmente, de disfarçar a origem ilícita do dinheiro lavado até que este possa ser
reintegrado à sua origem.

Figura 6.

Fonte: <http://democraciapolitica.blogspot.com/2012/07/paraisos-fiscais-e-privataria-tucana.html>

Formado em 1989 pelo G-7, o Financial Action Task Force on Money Laundering
(GAFI) é um organismo intergovernamental cujo objetivo é desenvolver e promover
uma resposta internacional para combater lavagem de dinheiro.

Em outubro de 2001, o GAFI expandiu sua missão para incluir o combate ao


financiamento do terrorismo. O GAFI é um organismo de decisão política, que reúne
peritos jurídicos, financeiros e policiais.

O financiamento do terrorismo, em particular, é tratado internacionalmente como


assunto correlato à lavagem de dinheiro. Trata-se de uma exceção: nesse caso, a origem
do dinheiro não precisa ser necessariamente ilícita – contrariando a definição clássica
de lavagem.

Um milionário pode financiar um grupo terrorista usando dinheiro lícito, obtido de


seus negócios regulares. Terá, curiosamente, que “lavar dinheiro ao contrário”; ou seja,
dar legalidade a um gasto ilegal, e não a um ganho.

55
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

A expressão lavagem de dinheiro vem do inglês money laundering, ou seja, o


dinheiro adquirido ilegalmente é sujo e deve ser lavado ou branqueado.

Diz a lenda que Al Capone teria comprado, em 1928, em Chicago, uma cadeia de
lavanderias (laundromats), da marca Sanitary Cleaning Shops e que, por meio dela,
fazia depósitos bancários de notas de baixo valor nominal, habituais nas vendas de
lavanderia, mas que, na realidade, eram resultantes do comércio de bebidas alcoólicas e
de outras atividades criminosas como a exploração da prostituição, do jogo e a extorsão.

De fato, a expressão “laundering” aparece pela primeira vez no jornal inglês Guardian e
populariza-se nos anos 1970, no Caso Watergate. Um informante, batizado de “Garganta
Profunda” (William Mark Felt), aconselhou o repórter Bob Woodward, do Washington
Post: “- Siga o dinheiro”. O Comitê de Reeleição do então Presidente dos Estados
Unidos, Richard Nixon, envolvera-se em transações financeiras que direcionavam
fundos ilegais de campanha para o México e depois de volta para os Estados Unidos,
através de uma companhia em Miami.

Caixa dois
Falando em lavagem de dinheiro há que se adentrar o tema caixa dois. A expressão
“caixa dois” refere-se a recursos financeiros não contabilizados e não declarados aos
órgãos de fiscalização competentes do Poder Executivo.

O caixa dois é utilizado por algumas empresas, que deixam de emitir ou emitem notas
fiscais com valor menor ao da transação realizada, para que sejam devidos menos
tributos. Desta forma, ao declarar os valores das notas fiscais aos órgãos fiscalizadores,
apuram menos tributos a recolher ao erário. A diferença constitui o caixa dois,
“esquecimento do Contador da Empresa”. Com a multa e o juro, essa diferença deverá
ser paga ao erário público.

Ou seja, caixa dois é um dos instrumentos utilizados para sonegação fiscal, que é crime
financeiro (técnico-financeiro no Brasil), com pena prevista na Lei no 7. 492 de 16
de junho de 1986, quando cometidos no âmbito financeiro. De forma mais ampla,
aplica-se o artigo 1o da Lei no 8.137 de 1990 para relações tributárias, econômica e de
consumo. A reclusão pode variar de um a cinco anos, e multa.

A utilização do caixa dois se faz de diversas maneiras: compra de moedas estrangeiras,


joias, veículos etc., que sofrem as penas da lei por simples sonegação, resolvidas nas
Cortes de apelação e de primeira instância nos chamados Fóruns dos Municípios.
56
CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA │ UNIDADE II

Quando for o caso de Polícia Federal e Interpol, caminha-se necessariamente ao


Supremo Tribunal de Justiça. No âmbito do pagamento a servidores corruptos,
financiamento de campanha de políticos, financiamento do tráfico de drogas, de armas
e de pessoas, exploração da prostituição, contratação de capangas e assassinos, além
de outras formas, não são apenas casos de caixa dois e sim de lavagem de dinheiro e
organização criminosa.

Doleiro

Ainda para complementar os diversos atores do crime de lavagem de dinheiro, caixa


dois, terrorismo, não podemos deixar de falar sobre o papel do doleiro.

Doleiro é o indivíduo que compra e vende dólares no mercado paralelo. Ao caracterizar


alguém como doleiro a Polícia Federal já imputa a ele ao menos um crime, o de evasão
de divisas. Dessa forma, entende-se que o doleiro é quem converte moedas de um país
sem autorização ou além dos limites permitidos das leis vigentes (é um fora da lei).

Os doleiros também realizam operações dólar-cabo, ou seja, transferências de recursos


“do” e “para” o exterior, por empresas e/ou pessoas não autorizadas pelo Banco Central
do Brasil a realizar operações de câmbio e/ou fora dos mecanismos oficiais de registro
e controle.

As operações dólar-cabo podem configurar o crime de lavagem de dinheiro


(branqueamento de capitais) quando utilizadas para ocultar a origem ilícita de recursos,
bens e valores de modo transitório ou permanente, por dissimulação da origem ou do
verdadeiro proprietário dos fundos, conforme falamos anteriormente sobre o processo
de envio de divisas para os chamados paraísos fiscais e a posterior reintegração desse
montante na economia nacional.

A figura do doleiro é comum nos países com um rígido controle cambial e rara nos
países com uma moeda plenamente conversível. No Brasil existe controle cambial e
é proibido o livre curso de moedas estrangeiras, isto é, as pessoas físicas ou jurídicas
só podem comprar ou vender moedas estrangeiras nos estabelecimentos legalmente
autorizados pelo Banco Central do Brasil a operar no mercado de câmbio.

O golpe é conceitualmente muito simples. Um golpista se apresenta como doleiro


ou intermediário de casa de cambio dizendo-se em condições de realizar operações
de câmbio de reais por dólares ou vice-versa ou ainda transferências de valores pela
modalidade dólar-cabo.

57
UNIDADE II │ CONTABILIDADE FORENSE NA PRÁTICA

As vítimas mais comuns são empresas com “caixa dois” e trading companies. Uma vez
entregue o dinheiro (no Brasil ou no exterior, em espécie ou por meio de transferências
ou depósitos) para a suposta operação de câmbio, o intermediário ou doleiro
simplesmente desaparece ou alega problemas, fiscalizações, ações policiais (falsas),
bloqueios, desvios, para não cumprir o combinado e ficar com o dinheiro.

As eventuais reações da vítima são obviamente dificultadas pelo fato de que ela estava
conduzindo uma operação ilegal (evasão de divisas e/ou, possivelmente, até lavagem
de dinheiro) e, portanto qualquer denúncia ou ação oficial pode, facilmente, levar a um
envolvimento criminal da própria vítima.

58
PREVENÇÃO
E DETECÇÃO UNIDADE III
DE FRAUDES
CONTÁBEIS

CAPÍTULO 1
Prevenção e detecção

As regras e recomendações internacionais apontam no sentido da criação de mecanismos


específicos de prevenção e detecção da lavagem de dinheiro, a instituir por bancos,
seguradoras, casinos, advogados, notários e outras entidades.

Tais mecanismos giram à volta de três aspectos centrais:

»» identificação dos clientes;

»» conservação de registos das operações e de documentos de identificação;

»» informação sobre indícios de transações suspeitas às autoridades


competentes para a investigação.

As empresas de prestação de serviços contábeis precisam estar constantemente


atualizadas nos conhecimentos e nas tecnologias uma vez que as leis sofrem constantes
alterações e a perda de tempo no processamento de informações causa elevado prejuízo
aos clientes.

Desta forma, é necessário que invistam pesadamente em equipamentos e no


treinamento de equipes para que estejam capacitados para oferecer o melhor serviço
(considerando que o melhor serviço, aqui, é a fiel e legal escrituração das movimentações
e o espelhamento de cada uma delas no balanço patrimonial, evitando, desta forma,
multas e penalidades cabíveis).

59
UNIDADE III │ PREVENÇÃO E DETECÇÃO DE FRAUDES CONTÁBEIS

Ao cliente cabe cobrar, mensalmente, o balancete contábil para que possa fazer o
acompanhamento dos tributos, operações bancárias, e todas as movimentações.

Para as empresas cabe o estabelecimento de controles internos dos processos


(averiguados pelo departamento de auditoria), a segregação de cargos, treinamentos
constantes e campanhas de educação e reconhecimento para que os funcionários se
mantenham motivados e, portanto, assegurando comportamento proativo e ético.

Entre outras providências, uma de extrema importância é o desenvolvimento,


recolhimento de assinatura e treinamento das equipes para o Código de Ética e
Conduta.

É esse documento que estabelece as condutas aceitáveis, os procedimentos não toleráveis,


os limites de reponsabilidade e de autonomia a cada um dos funcionários, executivos e
acionistas para com os stakeholders da empresa (públicos de relacionamento).

Os Códigos de Ética costumam trazer providências a respeito do relacionamento de seus


colaboradores com fornecedores, como, por exemplo, a definição do que se considera
aceitável receber como presente/lembrança em datas comemorativas para que não se
configure suborno.

Versam, também, sobre o sigilo das informações privilegiadas, que cada função tem
código de vestimenta, relações de parentesco, dentre muitas outras questões.

O Código de Ética e Conduta deve sempre trazer um canal de denúncia que garanta
o anonimato para casos de suspeita ou verificação de fraudes e qualquer outro tipo
de crime cometido pelos membros da empresa (por exemplo: assédio moral, assédio
sexual, conduta ilegal por atuação como porta-voz da empresa, entre outros).

O canal de ética deve ser de amplo conhecimento dos colaboradores, executivos,


acionistas e as denúncias devem sempre ser direcionadas para, no mínimo, três
executivos de áreas distintas, dentre eles o auditor responsável, para que se garanta a
proteção do denunciante entre os conhecedores da denúncia.

Outra forma de prevenir e coibir práticas fraudulentas nas empresas é por intermédio
da formação de um comitê de risco que, além de constantemente verificar os riscos
financeiros e estratégias referentes ao negócio, estabelece a sistemática de causas que
podem culminar em fraudes.

60
PREVENÇÃO E DETECÇÃO DE FRAUDES CONTÁBEIS │ UNIDADE III

Figura 7.

Fonte: Instituto dos Auditores Internos do Brasil.

Deve-se fazer um planilhamento da probabilidade de fraudes, os riscos inerentes e o


impacto deles em cada uma das áreas vitais da empresa.

De acordo com a apresentação feita pelo Instituto dos Auditores do Brasil, deve-se
definir pesos pelo grau de importância/impacto das fraudes.

Figura 8.

Fonte: Instituto dos Auditores Internos do Brasil.

61
UNIDADE III │ PREVENÇÃO E DETECÇÃO DE FRAUDES CONTÁBEIS

Desta forma, busca-se prever a lógica das fraudes como, por exemplo, de elas onde
podem proceder, quem tem o perfil pessoal ou executivo de cometê-las, em que situação
podem ser cometidas.

Além disso, deve-se avaliar a probabilidade x o tamanho do impacto para se definir o


que monitorar e a qual custo.

Estabelecida essa lógica com base no estudo da realidade da empresa, há que se montar
um esquema de monitoramento.

Figura 9.

Fonte: Instituto dos Auditores Internos do Brasil.

Provas
Ressalvados os casos previstos em lei, nenhuma autoridade, juiz ou tribunal, sob
qualquer pretexto, pode fazer ou ordenar que se faça diligência para verificar se a
empresa observa as formalidades previstas em lei.

As evidências devem ser levantadas pelos auditores e comunicadas à administração da


empresa para que sejam apurados e corrigidos.

Transações discrepantes da rotina de pessoas físicas e jurídicas levantam suspeitas e


devem ser acompanhadas para averiguação de possíveis fraudes.

Grandes montantes ou consequentes pequenos valores usualmente não praticados


sendo transacionados podem sugerir algum problema.
62
PREVENÇÃO E DETECÇÃO DE FRAUDES CONTÁBEIS │ UNIDADE III

A inteligência artificial atualmente é muito utilizada como forma de levantar e comprovar


fraudes.

Por exemplo, as fraudes nos cartões de crédito estão sendo cada vez mais monitoradas
pelas instituições financeiras por meio da identificação de padrões incomuns de gastos.

A queda na quantidade de fraudes eletrônicas deve-se ao crescente uso de redes neurais


que têm a habilidade de detectar comportamentos fraudulentos mediante análise das
transações seguidas de um alerta da atividade suspeita para uma equipe em prontidão.

Duas técnicas são muito utilizadas para detecção de fraudes:

»» Data Warehouse e Data Mining: são técnicas avançadas de análise de


dados por meio de técnicas e métodos estatísticos, para uma análise
interativa. Por intermédio destas técnicas pode-se descobrir novos
padrões de fraude e tipos de fraudes existentes ainda desconhecidas.

»» Pontuação através de Redes Neurais: para cada novo caso de fraude, o


sistema calcula um valor de pontuação conforme sua similaridade com
um padrão conhecido. Atualmente é a técnica mais utilizada, pois oferece
melhores resultados.

Conforme Bigelow (2002), as técnicas de redes neurais começam a partir da análise em


um banco de dados, utilizando métodos sistemáticos para identificar características,
tendências e padrões dos dados. Estas características podem ser utilizadas para analisar
dados atuais e adivinhar se a transação é legítima ou não como, por exemplo, compras
em joalherias.

Conforme Andreatto (1999), a função básica de cada neurônio é:

»» avaliar todos os valores de entrada;

»» calcular o total combinado dos valores de entrada;

»» comparar o valor total com um valor limiar;

»» determinar qual será a saída do neurônio.

Cada neurônio participa de uma rede formada para o cálculo progressivo do valor
final da pontuação referente à probabilidade de fraude conforme os valores (pesos)
de cada neurônio. Os valores de pesos de cada neurônio são determinados a partir de
treinamentos interativos da rede neural.

63
UNIDADE III │ PREVENÇÃO E DETECÇÃO DE FRAUDES CONTÁBEIS

Software de antilavagem de dinheiro (AML)


O software de antilavagem de dinheiro (AML, na sigla em inglês) é um tipo de programa
de computador usado pelas instituições financeiras para analisar os dados do cliente e
detectar operações suspeitas.

Trata-se de um sistema de dados de clientes que atua por filtro, classifica de acordo
com o nível de desconfiança e inspeciona para as anomalias. Tais anomalias incluem
aumento repentino e substancial dos fundos ou a retirada de grande porte.

Tanto nos Estados Unidos quanto no Canadá, todas as transações de US$ 10.000
ou mais devem ser comunicadas. Operações menores que satisfazem determinados
critérios podem também ser sinalizadas como suspeitas, como, por exemplo, uma
pessoa que deposita quantias menores diversas vezes em um breve período de tempo
para despistar um depósito de uma grande quantia única.

Legislação pertinente
A respeito da legislação brasileira sobre o tema pode-se consultar:

»» Lei no 7.492, de 16 de junho de 1986 <http://www.planalto.gov.br/


ccivil_03/Leis/L7492.htm> – Define os crimes contra o sistema
financeiro nacional, e dá outras providências.

»» Lei no 9.613 de 3 de março de 1998 <http://www.planalto.gov.br/


ccivil_03/Leis/L9613.htm> – Dispõe sobre os crimes de lavagem ou
ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção e a utilização do sistema
financeiro para os ilícitos previstos na Lei; cria o Conselho de Controle de
Atividades Financeiras.

Art. 14. É criado, no âmbito do Ministério da Fazenda, o Conselho


de Controle de Atividades Financeiras (COAF), com a finalidade de
disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar
as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas nesta Lei, sem
prejuízo da competência de outros órgãos e entidades.

»» Lei no 12,683, de 9 de julho de 2012 <http://www.planalto.gov.br/


ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12683.htm> – Altera a Lei no
9.613, de 3 de março de 1998, para tornar mais eficiente a persecução
penal dos crimes de lavagem de dinheiro.

64
PREVENÇÃO E DETECÇÃO DE FRAUDES CONTÁBEIS │ UNIDADE III

»» Decreto no 2.799, de 8 de outubro de 1998 <http://www010.dataprev.


gov.br/sislex/paginas/23/1998/2799.htm> – Aprova o Estatuto do
Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).

»» Portaria no 330, de 18 de dezembro de 1998, do Ministro de Estado da


Fazenda – <https://www.coaf.fazenda.gov.br/conteudo/legislacaoe-
normas/legislacao/portaria-no-330-de-18-de-dezembro-de-1998/>
– Aprova o Regimento Interno do Conselho de Controle de Atividades
Financeiras (COAF).

»» Portaria no 350, de 16 de outubro de 2002, do Ministro de Estado da


Fazenda <https://www.coaf.fazenda.gov.br/conteudo/legislacaoe-
normas/legislacao/portaria-no-350-de-16-de-outubro-de-2002/>
– Resolve que a SRF e o BC estabelecerão procedimentos especiais de
investigação e controle das operações de comércio exterior.

»» Lei Complementar no 105, de 10 de janeiro de 2001 <http://www.planalto.


gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp105.htm> – Dispõe sobre o sigilo das
operações de instituições financeiras e dá outras providências.

Além disso, o Banco Central do Brasil publicou, em 22 de dezembro de 2006, a


Circular no 3.339, que dispõe acerca dos procedimentos a serem observados pelos
bancos múltiplos, bancos comerciais, caixas econômicas, cooperativas de crédito e
associações de poupança e empréstimo para o acompanhamento das movimentações
financeiras de pessoas politicamente expostas ou PEPs (da sigla inglesa para Politically
Exposed Persons) voltada especialmente para detentores de cargos políticos, membros
do poderes Executivo e Judiciário e profissionais que ocupam cargos relevantes na
Administração Pública, bem como seus familiares em primeiro grau, que passam a ser
acompanhados com mais rigor.

A Lei no 4.729 de 1965 especifica os crimes que envolvem a contabilidade criativa bem
como as penalidades previstas:

»» prestar declaração falsa ou omitir informação com a finalidade de


eximir-se do pagamento de tributos, taxas e quaisquer adicionais
devidos por lei;

»» inserir ou omitir rendimentos ou operações em documentos ou livros


exigidos pelas leis fiscais a fim de eximir-se do pagamento de tributos
devidos à Fazenda Nacional;

65
UNIDADE III │ PREVENÇÃO E DETECÇÃO DE FRAUDES CONTÁBEIS

»» alterar faturas e outros documentos relativos a operações mercantis com


o propósito de fraudar a Fazenda Pública;

»» fornecer ou emitir documentos ou alterar despesas, majorando-as, para


obter dedução de tributos devidos;

»» exigir, pagar ou receber, para si ou para outrem, percentagem sobre a


parcela dedutível ou deduzida do Imposto de Renda como incentivo fiscal.

Pena: detenção de 6 meses a dois anos e multa de 2 a 5 vezes o valor do tributo.

Já o Decreto-Lei no 1.598/1977 estabeleceu, em seu artigo 256, as penalidades para o


crime de falsificação da escrituração o qual institui o pagamento de multa, independente
da ação penal de couber para esse tipo de crime.

Se o crime ocorrer durante o período de apuração do imposto, mesmo que o ano não
tenha encerrado, e este for verificado pela autoridade tributária, o contribuinte ficará
sujeito à multa em valor igual à metade da receita omitida ou da dedução indevida,
lançada e exigível (RIR/1999, artigo 981).

A mesma RIR relembra sobe a importância da observância do regime de competência


de lançamentos e, consequentemente, apuração do imposto com pena de multa em
caso de inobservância.

Ainda a respeito dos crimes relacionados à contabilidade criativa entrou em vigor, em


1986, a Lei no 7.492 a qual ficou conhecida como Lei do Colarinho Branco. Esta lei
define os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, Dentre eles:

»» fraudar a fiscalização ou o investidor com declaração falsa sobre documento


comprobatório de investimento em títulos ou valores mobiliários;

»» inserir ou omitir elementos exigidos em legislação nos demonstrativos


contábeis de instituição financeira, seguradora ou instituição integrante
do sistema de distribuição de títulos de valores mobiliários;

»» manter ou movimentar recurso paralelamente;

»» prestar falsa identidade ou sonegar informações para realizar operações


de câmbio;

»» promover evasão de divisas e não declarar depósitos mantidos no exterior.

66
PREVENÇÃO E DETECÇÃO DE FRAUDES CONTÁBEIS │ UNIDADE III

Uma vez tomando conhecimento de qualquer dos crimes citados acima, tanto o
Banco Central quanto a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) deverão informar ao
Ministério Público Federal enviando os documentos comprobatórios necessários.

Para as contas fantasmas responderão como coautores de crime de falsidade o gerente


e o administrador da instituição financeira ou assemelhadas que contribuam com o
crime (Lei no 8.383/1991).

Em relação aos crimes contra a ordem econômica e tributária e os crimes contra as


relações de consumo, a Lei no 8.137/1990 define-os:

»» omitir informação ou prestar declaração falsa às autoridades da fazenda;

»» fraudar a fiscalização tributária em documento ou livro fiscal;

»» fraudar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda ou qualquer


documento que gere operação tributária;

»» elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou


deva saber falso ou inexato;

»» deixar de recolher tributo ou contribuição social;

»» utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita


ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil
diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública (a legislação
brasileira já prevê as fraudes eletrônicas em processamentos de dados,
que resultam na manipulação de resultados entre outras fraudes, comuns
nas empresas em que seus administradores optaram pela contabilidade
criativa).

67
RESPONSABILIDADE E
PAPEL DO CONTABILISTA UNIDADE IV
FORENSE

CAPÍTULO 1
A responsabilidade solidária do
contabilista e seu papel como
contabilista forense

Segundo De Plácido e Silva, in Vocabulário Jurídico, V III, Forense, 11. ed., p. 431:

Preponente, entende-se, na linguagem jurídica e comercial, a pessoa


que pôs ou colocou alguém em seu lugar, em certo negócio ou comércio,
para que o dirija, o faça ou o administre em seu nome. Preponente é
propriamente o patrão, o empregador, quando se apresenta no duplo
aspecto de locatário de serviços e de mandante. Juridicamente,
o preponente é, em regra, responsável pelos atos praticados por
seus prepostos: caixeiros, feitores, viajantes, quando no exercício
da propositura, isto é, quando em desempenho das funções ou dos
encargos, que se mostrem objetos da preposição.

Preposto: designa a pessoa ou o empregado que, além de ser um


locador de serviços, está investido no poder de representação de seu
chefe ou patrão, praticando atos concernentes à locação, sob direção e
autoridade do preponente ou empregador.

De acordo com o art. 1.182 do Novo Código Civil, a escrituração ficará sob a
responsabilidade de contabilista legalmente habilitado, salvo se nenhum houver na
localidade. No exercício de suas funções, os prepostos (contabilistas) são pessoalmente
responsáveis, perante os preponentes, pelos atos culposos e, perante terceiros,
solidariamente com o preponente, pelos atos dolosos.

Por meio da Lei no 10.406/2002 foi institucionalizada a responsabilidade solidária do


contador (preposto) e de seus auxiliares.

68
RESPONSABILIDADE E PAPEL DO CONTABILISTA FORENSE │ UNIDADE IV

Mediante a instituição desta lei o contabilista passou a assumir, junto ao seu cliente, a
responsabilidade por atos dolosos, perante terceiros (de qualquer natureza jurídica).

Desta forma, balanços falsos ou simulados imputam pena ao administrador e ao


contabilista. Informações prestadas de forma errônea, independentemente de onde
partiram, são sempre de responsabilidade de ambos, uma vez que tanto o administrador
quanto o contador devem ter conhecimento pleno das condições da empresa e de todas
as suas operações, além de conhecimento da legislação tributária brasileira.

O antes citado “jeitinho brasileiro” de ajuste de contas traz consequências importantes


tanto para a empresa quanto para seus administradores e seu contabilista.

Por quais motivos administradores optariam por manipular informações dos


balanços de uma empresa?

As penas previstas compreendem ações na justiça cível, relativamente ao direito


societário/comercial, ambiental, trabalhista, previdenciário e fiscal, além de ações na
justiça criminal, as quais incluem falso testemunho e/ou falsa perícia.

O Código Civil institui que no caso de o erro ter sido cometido de forma involuntária,
por imperícia, o profissional responde pelo cometimento do erro diretamente ao cliente
que o contratou. Porém, se ficar provado que o profissional tinha conhecimento ou o
provocou deliberadamente ao publicar o balanço, então responderão ele e o cliente à
justiça e demais entidades.

Ainda, o Código de Defesa do Consumidor, ao qual também se sujeita o contador pela


prestação de serviço como profissional liberal, prevê a apuração de responsabilidade
pessoal dos profissionais liberais mediante verificação de culpa.

Por esse motivo, faz-se cada vez mais importante uma relação de parceria transparente
e organizada entre cliente e contador/auditor para evitar que erros que venham a
configurar fraude sejam cometidos e um seja penalizado pelo erro do outro.

O papel do auditor, conforme vimos no início desse estudo, é de extrema importância e


valia no auxílio às revisões das movimentações.

O auditor é o contador focado no exame sistemático das atividades desenvolvidas em


uma determinada empresa. Cabe a ele, como um perito, averiguar a adequação dos
lançamentos contábeis apresentados no balanço pela contabilidade.

69
UNIDADE IV │ RESPONSABILIDADE E PAPEL DO CONTABILISTA FORENSE

À auditoria independente cabe, por princípio, emitir opinião sobre a adequação das
demonstrações contábeis de acordo com a legislação.

Em verificando a existência de erro ou fraude cabe aos auditores internos e/ou externos
comunicar a administração da entidade e emitir relatório sobre a detecção, inclusive
sugerindo correções.

Por sua corresponsabilidade, o auditor/contador deve fazer seu controle com muito
rigor a fim de se obter evidências e emitir opinião a respeito da correição e legalidade
dos controles internos.

São os processos de controle interno que garantem confiabilidade ao processo. O controle


interno compreende o plano de organização e os métodos adotados para proteger seu
patrimônio e verificar o grau de exatidão dos dados relatados, promovendo, desta
forma, uma maior eficiência operacional.

O auditor pode operar por meio de questionários que sirvam de roteiro para realizar suas
avaliações. Tais avaliações devem incluir, dentre outras, questões como a competência
da administração, sua política de recursos humanos, a existência de segregação de
funções, principalmente no que tange à autorização, execução, registro e contabilização
de transações.

As fraudes podem existir em qualquer uma das fases do processo. Alguns exemplos
de questões corriqueiras que podem tornar-se problemas sem que sejam facilmente
percebidos porque se dissolvem nas questões do dia a dia:

»» contratação de um funcionário da tesouraria indicado por alguém da


diretoria ou por algum gestor;

»» ausência de política de aprovação de pagamentos por diferentes níveis


hierárquicos, ou seja, quem assina o pagamento é o mesmo que autoriza
e manda pagar.

Uma vez que as fraudes podem contar ou não com a participação do contador, este deve
estar sempre muito atento a tudo o que acontece dentro da empresa. Seu conhecimento
precisa ser muito amplo porque não há como restringir-se apenas às questões
relacionadas aos cálculos puros.

O contador precisa entender sobre legislação trabalhista para verificar, por exemplo, se
os cálculos do departamento de pessoal foram feitos corretamente (FGTS, férias, 13o,
rescisão, pagamento de bônus, entre outros).

70
RESPONSABILIDADE E PAPEL DO CONTABILISTA FORENSE │ UNIDADE IV

Ele precisa entender sobre seguro bancário caso a empresa tenha tido um acidente ao
longo do ano que tenha necessitado acionar o seguro e utilizar a franquia.

E todos os impostos nacionais e internacionais com diferentes datas de vencimento?

Há, também, que se conhecer fielmente as normas do direito societário porque os sócios
são a parcela de maior interesse no resultado positivo da empresa.

Isso tudo quer dizer que, algo errado, problema certo dentro e fora da empresa.

Uma demanda recorrente de simulação de resultados em empresas ou até mesmo


em demonstrações de rendimentos de pessoas físicas é a feita aos escritórios de
contabilidade ou aos contadores internos com o intuito de solicitar aumento de crédito
em bancos, conseguir empréstimos, fazer financiamento.

Mas por que motivo uma empresa precisaria alterar seus resultados se teve o ano inteiro
para acertar e demonstrar suas movimentações?

A resposta é simples e única: porque muitas empresas optam por não efetuar todos os
lançamentos para fugir dos impostos ao longo do ano e, de repente, precisam demonstrar
movimentação e saldo nas contas para realizar um empréstimo e não tem como fazer.

É nesse momento que vem a famosa frase:

“dá aí um jeitinho. Fica só entre a gente.”

Há, ainda, as inúmeras vezes em que o contador não é avisado de que não foram emitidas
notas fiscais para todas as saídas de mercadorias e, de repente, a fiscalização chega na
empresa e questiona o estoque.

É aí que o contador precisa se virar para arrumar uma solução e não sair de lá como réu
em um processo no qual ele nem estava ciente, porém deveria estar.

Principalmente quando a empresa não tem um contador internamente esse tipo de


problema passa a ser mais frequente. Compra-se um veículo, vende-se um imóvel,
faz-se um empréstimo e não se comunica o escritório de contabilidade na data.

Como os lançamentos contábeis são feitos cronologicamente, passando-se o prazo já


deixam de ser lançamentos legais e é assim que o balanço desanda. Importante pensar
nas formas de resolver isso se utilizando e a contabilidade forense.

O que fazemos em termos profissionais, exige, em sua grande maioria, um compromisso


com que é feito. Para o contabilista forense, não é diferente. Em qualquer situação em que

71
UNIDADE IV │ RESPONSABILIDADE E PAPEL DO CONTABILISTA FORENSE

este profissional venha a vivenciar, os valores mais importantes a serem considerados


são a ética, a moral, os valores pessoais. São eles que definem a conduta do indivíduo.

Figura 10.

Fonte: <http://liderancaeticaeservidora.wordpress.com/capitulos-do-livro/etica/>. Acesso em: 27 out. 2015.

Independente de códigos e normas estebelecidas nas empresas ou na legislação, cabe a


cada um agir de acordo com o que é legal.

Há algum tempo, as escolas ministravam uma matéria chamada Educação Moral e


Cívica. Naquele tempo, ao chegar na escola, os alunos eram enfileirados por altura,
ficavam todos em frente ao mastro e entoavam, orgulhosamente, o Hino Nacional
Brasileiro enquanto a bandeira era hasteada. A letra do hino tinha que estar na ponta
da língua e valia ponto.

A disciplina escolar foi imposta durante a ditadura militar por meio de um Decreto-Lei
no 869 de 1969 imposto a todas as escolas com o objetivo de estimular uma atitude e
consciência cívica nos jovens.

Na sala de aula os professores trabalhavam questões relacionadas à sociedade,


solidariedade humana, aprimoramento do caráter com apoio na moral, na família e no
bem comum.

A intenção não era catequizar as pessoas, porém estimular a reflexão e reforçar os


valores éticos e morais. A unidade familiar era a estrutura máxima e o respeito ao
próximo, fator inabalável.

Com o passar do tempo a imposição da disciplina foi extinta, assim como têm sido
extintos, cada dia mais, os valores ressaltados durante as aulas daquela disciplina.

72
RESPONSABILIDADE E PAPEL DO CONTABILISTA FORENSE │ UNIDADE IV

Por esse e outros tantos motivos temos visto tantas atrocidades sendo cometidas no
mundo atual.

A definição do que é certo e necessário depende da ótica de cada um, da consciência,


dos valores vitais de comportamento perante os outros e a lei.

O contador, o empresário, a dona de casa, o bilionário, todos nós somos indivíduos


racionais e, por vezes, irracionais. Agimos corretamente e às vezes por impulso.

Um indivíduo com valores éticos bem definidos não é corrompível, por qualquer valor
que seja.

Não é o título, a formação, a classe social, o bairro onde mora, os locais por onde anda
que define o comportamento de um homem ou uma mulher, mas sim seus valores éticos.

Por esse motivo, é muito importante vigiar, a todo momento, nossos valores, nosso
comportamento. Não podemos nos corromper e nos deixar contaminar pela possibilidade
de ganhos estrondosos e benefícios indevidos.

Precisamos estar atentos ao comportamento das pessoas com quem nos relacionamos
e a quem confiamos nossas informações que possam vir a representar interesse a essas
pessoas.

Já dizia o ditado: “diga-me com quem andas e direi quem és”.

Figura 11.

Fonte: <http://rouz-zl.blogspot.com/2010/08/conciencia-profesional.html>. Acesso em: 27 out. 2015.

Hoje em dia fala-se muito em sustentabilidade ambiental. As pessoas questionam que


tipo de mundo estamos deixando para as gerações futuras.

Você já parou para pensar que tipo de pessoas você está deixando para o mundo? Pense
sobre isso e o quanto o trabalho de Contabilidade Foresene pode ajudar neste sentido!

73
Para (não) Finalizar

Muitos esforços e muita evolução já foi conseguida através dos anos no sentido de
prevenir o cometimento de fraudes por parte de pessoas físicas, jurídicas e governos
em geral.

O fenômeno da globalização acabou por internacionalizar as possibilidades de


cometimento de fraudes com menor grau de risco.

Os contadores e auditores têm papel extremamente importante no levantamento de


informações e no controle interno dos processos contábeis das empresas clientes a fim
de supervisionar e aconselhar as práticas adotadas pelas empresas.

Indepente de tudo isso, cabe à consciência de cada um, seus valores éticos, avaliar a
necessidade, os benefícios, os riscos de se cometer fraudes (custo x benefício).

Rombos podem ser causados em qualquer lugar do mundo por qualquer um que veja
possibilidade e tenha predisposição para cometê-los, quer seja o pequeno trabalhador
que pelo seu rendimento é obrigado a declarar seus rendimentos e pode optar por criar
despesas dedutíveis a fim de obter maior restituição ou, ainda, o presidente de uma
grande empreiteria que, por ganância, procura expandir cada vez mais seus lucros.

Assim, a evolução da contabilidade forense entra neste contexto, para que independente
de tecnologia (com ou sem a ajuda desta), seja mais eficaz para as empresas, cidadãos
e sociedade!

Pesquise casos de fraude e lembre-se, também, de dar continuidade aos estudos


deste assunto para se manter sempre atualizado, independente da finalização
desta matéria!

Relacione estes casos e análise o quão importante é a contabilidade forense!

Bom estudo!

74
Referências

ANDREATTO, R. Construindo um Data Warehouse e analisando suas informações com


Data Mining e OLAP. Monografia de Conclusão de Curso de Ciências da Computação,
Faculdade de Ciências Administrativas Valinhos. 1999. <http://www.datawarehouses.
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CARDOZO, Júlio Sergio S. Controles internos: conceitos, objetos e princípios. Revista


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CARDOZO, Júlio Sergio S. Origem e conceitos de auditoria. Disponível em: <http://


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COELHO, L. RAITTZ. R. TREZUB, M. F Control: sistema inteligente inovador para


detecção de fraudes em operações de comércio eletrônico. Universidade Federal de São
Carlos, Abril 2006.

CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE. Princípios fundamentais de


contabilidade e normas brasileiras de contabilidade. Brasília: CFC, 2000.

DOGGART, Caroline. Tax havens and their uses (originalmente publicado em


1970), Economist Intelligence Unit, 2002 ISBN 0862181631.

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