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A Biblia de Alef A Omega - Um Gu - Rodrigo Silva
A Biblia de Alef A Omega - Um Gu - Rodrigo Silva
Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), em vigor
desde 1o de janeiro de 2009.
Silva, Rodrigo
A Bíblia de álef a ômega : um guia para entender como a Bíblia chegou até nós / Rodrigo Silva. -- São
Paulo : Ágape, 2020.
Bibliografia
1. Bíblia - História 2. Bíblia - Miscelânea 3. Bíblia - Antiguidades 4. Arqueologia I. Título
6 A História da escrita
9 Do pergaminho à internet
12 Compreendendo as Escrituras
13 A Bíblia hoje
19 Considerações finais
Referências
INTRODUÇÃO
Ainda me lembro com nostalgia quando, aos sete anos, pedi a meus pais uma
Bíblia Ilustrada de presente. Era uma manhã de domingo e um vendedor
chegou à minha casa oferecendo o precioso livro, já que meu pai não
comprara dele a enciclopédia que tentou lhe vender. Com muita insistência,
acabei ganhando aquele exemplar sob a forte advertência de que aquele seria
meu presente de Natal e que não adiantava pedir outra coisa. Eu nem liguei.
Já tinha o que queria. Apesar de crescer num ambiente não religioso ― meus
pais eram “católicos não praticantes” ―, minha devoção pelo Santo Livro
começara desde cedo.
Era uma Bíblia grande, capa preta e dourada, ilustrada a quatro cores,
repleta de quadros renascentistas, alguns Caravaggio e outros tipos que
ilustravam as histórias do Antigo e do Novo Testamentos. Eu decorei cada
desenho e ficava me exibindo para as visitas, passando uma por uma as
páginas ilustradas e dizendo do que se tratava. Coisa de criança.
Depois vieram os estudos teológicos, o tempo passado em Israel e outros
estudos mais. Porém, nunca me desliguei desse livro. Eu sempre soube que
alguma coisa dentro dele daria um rumo especial à minha vida. Não deu
noutra: aqui estou eu publicando pela Editora Ágape mais um título, visando
tornar conhecido o conteúdo do maior livro de todos os tempos.
A emoção é tanta que tomei a liberdade de escrever esta introdução num
tom autobiográfico. Como dizia Karl Barth, “tenho lido muitos livros, mas a
Bíblia é o único livro que me lê”. Verdade! Nas páginas do Gênesis, sinto-me
objeto do desejo do Deus que a si mesmo bastava, mas resolveu contar com a
humanidade. Quando vou para Êxodo, é como se estivesse fugindo a pé do
Egito na companhia dos hebreus. O livro de Jó parece falar das minhas
tragédias e o de Eclesiastes, de minhas inquietudes. Os evangelhos falam do
meu herói (Jesus) e o Apocalipse, da minha esperança.
Dizem que um casal resolveu, certa vez e por conta própria, estudar
junto uma velha Bíblia que tinha em sua casa. Depois de uma semana lendo
todos os dias vários capítulos, o marido virou para a esposa e falou:
― Se esse livro estiver certo, nós estamos errados.
Uma semana depois, foi a vez de a esposa falar para o marido:
― Se esse livro estiver certo, nós estamos é perdidos!
Na terceira semana, o marido concluiu, maravilhado:
― Se esse livro estiver certo, acho que nós podemos ser salvos!
E eu posso garantir para você: o livro está certo! São anos de
investigação acadêmica confirmando isso. Contudo, a convicção com a qual
escrevo agora ultrapassa em muito as ideias expressas nesta pesquisa. Trata-
se de uma certeza que advém da experiência com o Autor do livro, Deus.
Aquele que nos criou e inspirou os profetas a traduzir verdades celestes num
“sotaque” humano.
Homilético demais? Talvez. Então venha comigo conhecer a história da
Bíblia Sagrada. Aprenda como seus livros foram escolhidos, como podemos
saber que se trata de um livro divino, quem o dividiu em capítulos e
versículos, como podemos confiar na transmissão de seu conteúdo… essas e
outras temáticas, tenho certeza, falarão à sua alma e fascinarão sua mente. Se
você permitir, o mesmo Deus que tocou em minha vida tocará hoje na sua. A
Bíblia ainda continua fascinando pessoas. Seja mais um a se deixar ler pelo
Sagrado Livro.
CAPÍTULO UM
A BÍBLIA COMO
LITERATURA
O QUE É A BÍBLIA?
A Bíblia Sagrada é, sem dúvida, um dos maiores livros da História. Para
aqueles que possuem a fé judaica ou cristã, ela é muito mais que um livro
antigo e interessante. É a voz de Deus expressa em linguagem humana. Um
compêndio por meio do qual o Espírito Santo usou homens para se dirigir
com amor à humanidade e revelar os propósitos divinos para ela.
Victor Hugo declarou: “A Inglaterra tem dois livros principais,
Shakespeare e a Bíblia. A Inglaterra fez Shakespeare, mas a Bíblia fez a
Inglaterra.” Poderia ter dito mais. A Bíblia quase fez o mundo inteiro.
Praticamente todo o Ocidente e boa parte do mundo oriental. Em que pesem
as críticas feitas ao Livro Sagrado, há de se admitir que muitas vidas foram
transformadas pela Bíblia, e pessoas dotadas de grandiosíssima envergadura
intelectual creram piamente no que ela diz. Logo, não se trata de um livro
qualquer.
Ninguém nega que seu texto foi produzido por homens. A Bíblia não
caiu pronta do céu nem foi ditada por anjos. Contudo, seus autores não
falaram sozinhos, eles foram inspirados e movidos pelo Espírito de Deus.
Noutras palavras, emprestaram sua voz e estilo para que Deus pudesse falar
com “sotaque” humano. E o que o Todo-Poderoso tinha de tão importante
para nos dizer? Que ele nos ama e que, aconteça o que acontecer, ainda temos
um Pai celestial que em breve intervirá uma última vez na História para trazer
a justiça e inaugurar a eternidade.
Essa mesma visão da inspiração bíblica como um todo pode ser vista em
2Timóteo 3:16: “Toda Escritura é divinamente inspirada por Deus”
(theópneustos, lit. “soprada pelo Espírito de Deus”; em hebraico, beruach há-
kodesh). Logo, pode-se dizer que a Bíblia foi um presente dado pelo céu a
cada um de nós.
Nenhuma obra literária enfrentou maior questionamento crítico-
científico do que o texto da Bíblia Sagrada. Muitos a acusaram de ter sido
modificada ao longo dos anos para satisfazer os interesses políticos da Igreja.
Mas isso não é verdade. Graças a diferentes critérios acadêmicos e
laboratoriais, podemos dizer que temos em mãos praticamente o mesmo
conteúdo dos livros canônicos originais, da forma como saíram das mãos dos
autores inspirados. Ainda que um texto ou outro seja tema de disputas
hermenêuticas e tenhamos reconhecidos problemas de crítica textual (como
algumas discrepâncias entre os diferentes manuscritos), aquilo que era
importante para a salvação dos homens foi maravilhosamente preservado.
Tanto a origem como a preservação do texto bíblico são fortes
argumentos para a existência do Deus que inspirou essas páginas. Afinal de
contas, sempre que alguém precisa confirmar algo a seu favor, apela-se para
uma testemunha superior (ainda que circunstancialmente) que possa
apresentar um depoimento em sua defesa. É assim que funcionam os
procedimentos jurídicos em geral, e também algumas questões corriqueiras
do dia a dia. Um pai que confirma para o diretor que o filho de fato esteve
doente pode ajudar tremendamente na reposição de uma prova.
Por isso, pode-se dizer que a testemunha tem autoridade singular, pois
confere certeza ao depoimento de uma pessoa. Deus, no entanto, por ser
incomparavelmente maior, não precisaria de outro (circunstancialmente
superior) que desse testemunho a seu respeito. Ele em si mesmo se basta.
Contudo, por sua infinita bondade, Deus preferiu contar conosco. É neste
sentido que sua Palavra é, ao mesmo tempo, um testemunho que ele dá de si
usando seres humanos para reproduzi-la. A Bíblia é, em síntese, um grande
testemunho da existência de Deus.
Alguns podem
argumentar que a Bíblia
também provocou muitas
mortes nos tempos da
Inquisição, mas isso não é
verdade. Foi a autoridade
eclesiástica de então que
mandou matar em nome da
fé. A leitura da Bíblia, além
de proibida para a
população em geral, era um
dos motivos da pena
capital, pois muitos foram
mortos apenas por ter em
casa um exemplar do Livro
Sagrado ou tentar lê-lo por
conta própria sem
autorização da Igreja.
Autoridade eclesiástica e
ensinamentos bíblicos não
são, necessariamente,
sinônimos perfeitos. A
história, portanto, das
Escrituras Sagradas está
bem distante daquela
relacionada ao Livro
Vermelho da China
comunista.
Não encontramos nas Escrituras o nome “Bíblia”. Esse título foi usado pela
primeira vez, em relação à Palavra de Deus, por João Crisóstomo, patriarca e
reformador de Constantinopla (354-407 d.C.).
O nome Bíblia deriva de Byblos, que é o nome de uma importante
cidade portuária da região dos fenícios que hoje fica no Líbano. Foram os
gregos que deram esse nome ao lugar devido à sua importância no comércio
de papiro, um tipo de papel importado do Egito. Aliás, Byblos também era o
nome que os gregos davam ao papel que os egípcios preferiam chamar de
“wadj” (ou ).
Com a diferença de apenas uma letra, Byblos virou Biblos e passou a
significar “livro”. O diminutivo de livro em grego é biblion, que quer dizer
“livrinho”, e o plural é bíblia, que quer dizer “livrinhos”. Foi justamente por
ser uma coleção de pequenos livros que a Escritura Sagrada passou a ser
chamada de Bíblia, nome este que ficou até os dias de hoje.
▶ Escritura Sagrada
O nome Antigo Testamento foi criado por Melito de Sardes em cerca de 170
d.C. para referir-se aos livros sagrados escritos antes da vinda de Jesus Cristo
a este mundo. Ele não menciona a expressão Novo Testamento, mas o
conceito parece implícito em seu comentário, pois seria a sequência natural
de escritos, tanto que um documento antimontanista da mesma ocasião
referiu-se ao cânon cristão como sendo a palavra do “Novo Concerto
(Testamento) do Evangelho”. A expressão Novo Testamento, neste caso,
tornou-se o título da coleção de livros canônicos que foram escritos depois do
nascimento de Cristo. A primeira parte, portanto, seria uma espécie de
prenúncio do Messias que haveria de vir, e a segunda, um anúncio do
Messias que veio e que voltará. A primeira conta a história da criação do
mundo e da queda da humanidade, mas se concentra na história de Israel. Já a
segunda concentra-se no ministério de Jesus e na história da igreja cristã
primitiva.
E por que Antigo e Novo Testamento, e não Antiga e Nova Escritura? A
bem da verdade, algumas antigas versões gregas preferiam chamar essas
porções de Antiga e Nova Alianças (palaia diathéke e kainé diathéke). Mas,
ao que tudo indica, os teólogos consideraram que, sendo a aliança ou o
acordo de Deus com a humanidade algo que demanda muito mais a ação
divina que a ação humana, seria preferível traduzir o termo por testamentum,
que quer dizer justamente isso, um testamento que Deus, em pessoa, deixou
para nós. Uma herança em forma de livro, daí o uso dos nomes latinos Vetus
Testamentum (Antigo Testamento) e Novum Testamentum (Novo
Testamento).
PECULIARIDADES DE UM LIVRO
A Bíblia foi escrita por homens como nós, escolhidos pela providência divina
para colocar em linguagem humana aquilo que Deus queria revelar a seus
filhos. Mas o que quer dizer esse “como nós”? Não seriam homens especiais?
Claro que sim, porém não no sentido que muitos interpretam. As calejadas
mãos que escreveram a Bíblia não eram de super-heróis, mas de pessoas
errantes, sujeitas às mesmas paixões de qualquer ser humano.
A diferença, portanto, não estava em que fossem perfeitos ou jamais
errassem, mas no fato de que amavam a Deus e não recusaram o chamado
recebido do céu. Dentre esses autores, temos nomes como Moisés, Davi,
Daniel, Isaías, Pedro e Paulo, sujeitos comuns dotados de uma grande paixão
pela causa divina. Eles são indiretamente referidos no texto de 2Pedro
1:20,21, que diz: “… sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia da
Escritura é de particular interpretação. Porque a profecia nunca foi produzida
por vontade dos homens, mas os homens da parte de Deus falaram movidos
pelo Espírito Santo.”
A Bíblia traz sobre si uma reinvindicação muito séria que, se for
verdadeira, faz dela o livro mais importante de todos os tempos, mas, se for
mentirosa, o mais terrível que a humanidade já produziu. Ela diz que é de
origem divina: “Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para
ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça” (2Timóteo
3:16). Por isso o escritor George Bernard Shaw estava parcialmente correto
quando chamou a Bíblia de “o livro mais perigoso do mundo”.
Afinal de contas, um livro que se declara vindo de Deus só pode ser
creditado a dois fatores: histerismo ou inspiração. Seja qual for a alternativa
adotada, é impossível ficar neutro em relação a ele, principalmente nós, que
vivemos no Ocidente. Ou ela é inteiramente absoluta ou incrivelmente
obsoleta.
Imagine agora que a Bíblia nunca tivesse sido escrita ou preservada até
nossos dias. O que teria acontecido? Uma resposta precisa é difícil de ser
dada, mas James Kennedy e Jerry Newcombe lançaram-se ao desafio de
encontrar uma resposta. Eles escreveram juntos o livro What if the Bible Had
Never Been Written? [E se a Bíblia nunca tivesse sido escrita?], e concluíram
que praticamente todos os grandes exploradores, cientistas, escritores,
artistas, políticos e educadores do Ocidente foram tão influenciados por este
livro que, sem ele, esses homens jamais teriam oferecido tantas contribuições
ao mundo.
Exagero? Difícil dizer. Mas pelo menos uma coisa pode ser dita e que
calaria muitos que consideram a Bíblia um livro sem significado positivo.
Conta-se que, em 1936, um antropólogo descrente da Bíblia estava
entrevistando Kata Ragoso, um líder tribal da Nova Guiné. Em uma de suas
perguntas ele quis saber o que o nativo achava de ter sua cultura
terrivelmente modificada pelos hábitos trazidos por esse livro de brancos. Era
realmente um motivo de agradecimento? “Se é motivo para eu agradecer, não
sei” — respondeu Ragoso —, “mas para você, deveria ser, caso contrário eu
agora o estaria degolando e encolhendo sua cabeça, conforme o costume de
meus ancestrais.”
Imagine os milhões de pessoas que tiveram sua vida mudada para
melhor por causa da leitura desse livro chamado Bíblia Sagrada! É claro que
houve muitos outros clássicos que trouxeram benefícios para a humanidade,
mas nenhum deles transformou diretamente tantas multidões de diferentes
níveis sociais e culturais. Tome por exemplo um livro como O capital, de
Karl Marx. Ele realmente influenciou muito os rumos da economia moderna,
mas quantos presidiários poderiam ser citados que deixaram o mundo do
crime por terem lido os escritos de Marx? Quantos assassinos se
arrependeram de seus crimes e mudaram de vida por terem lido os
pensamentos do marxismo? Quantas pessoas tiveram uma morte mais
tranquila porque, em seu leito, um amigo leu trechos sobre a dialética e a luta
de classes? Logo, por mais que alguns se mostrem apaixonados por Marx e
suas teorias econômicas, seus escritos, nem de perto, produziram as
transformações de vida que testemunhadas por aqueles que se apaixonaram
por Cristo.
Isso mostra que o mundo pode estar repleto de bons e excelentes livros,
mas só a Bíblia pode se dizer inspirada por Deus. E o que significava
originalmente essa palavra “inspiração”?
De um modo bastante simplificado, podemos dizer que inspiração, no
sentido bíblico do termo, significa “o que vem diretamente de Deus”, isto é,
que tem origem divina. Em latim, esse termo significa “soprar para dentro”,
assim como um adulto faz ao insuflar um balão de ar. Seria também essa a
imagem figurativa de Deus soprando o Espírito na mente de uma pessoa. Em
seu correspondente grego, esse termo só aparece uma vez no Novo
Testamento, em 2Timóteo 3:16.
Em 2Timóteo, o termo vem da junção de duas palavras gregas: Theos
(que quer dizer “Deus”) e pneustos (que quer dizer “sopro”, “espírito”).
Logo, algo que foi soprado por Deus ou simplesmente “inspirado” por ele —
o mesmo sentido da versão latina. Assim, a melhor tradução para 2Timóteo
3:16 talvez fosse “expirado” ou “soprado” por Deus.
1 Disponível em http://www.statisticbrain.com/bibles-printed/. Acesso em 9/6/2015.
2 Disponível em http://www.guinnessworldrecords.com/world-records/best-selling-book-of-non-fiction.
Acesso em 2/6/2015.
3 Disponível em https://www.visionvideo.com/files/DTB_ColorBookLR.pdf.
CAPÍTULO DOIS
COMO SURGIU
A BÍBLIA
A LINGUAGEM E DEUS
“No princípio era o Verbo” ou “a Palavra”. Assim inicia o Evangelho de
João. Tal afirmação, no entanto, implica uma série de questões que
demandam a mais profunda reflexão sobre a gênese da linguagem humana.
Tema que, apesar de reunir muitas discussões e especialistas, não encontrou
consenso algum sobre como e quando tudo isso começou.
O que surgiu primeiro: o pensamento ou a linguagem? Como, quando e
por que o ser humano passou a falar? Estas são questões que realmente
intrigam os antropólogos, especialmente os que buscam uma compreensão
das origens da humanidade abstendo-se de qualquer participação divina no
processo.
Para os que creem no relato bíblico do Gênesis, isso não é problema,
pois Deus teria criado Adão com a capacidade de falar e entender a
linguagem que, no princípio, seria do próprio Deus. Já para os que advogam a
teoria da evolução, isso pode ser um dilema insolúvel. Afinal, se não existe
Criador, se somos frutos de uma geração espontânea, como adquirimos a
capacidade de falar? Com quem aprendemos a nos expressar por meio da
linguagem?
Essas perguntas fazem todo sentido se entendermos que todos os estudos
realizados até hoje no campo da linguagem demonstram inequivocamente
que, para falar, precisamos de alguém que nos ensine e nos estimule, pois
sozinhos nunca aprenderemos. Segundo os especialistas, toda criança nasce
com um órgão biológico no qual estão inseridos dados de previsões daquilo
que é comum a todas as línguas naturais e das variações que poderão ser
encontradas.
Isso é o que eles chamam de gramática universal. Ela só é desenvolvida
se houver a exposição, isto é, se a criança for exposta a uma determinada
língua para, então, desenvolver o órgão da linguagem. É por meio dos dados
que recebeu que a criança irá “montar” a sua gramática. Mas isso tem um
limite. Se ela não for exposta a uma língua até os 6 anos, em média, terá
sérias complicações. Após esse período, adquirir a fala não será mais um
processo natural, e a expressão pela linguagem será algo impossível.
Veja que não se trata de um mistério que a ciência simplesmente ainda
não desvendou. Os especialistas já descobriram. O ser humano, para
desenvolver a linguagem, precisa aprendê-la com alguém que já a utilize
previamente. E se não houve esse alguém no princípio, é complexo teorizar
como foi que nossos ancestrais começaram a falar.
É justamente por essa dificuldade até agora insolúvel que, apesar do
grande número de propostas sobre como, por quê, quando e onde a
linguagem começou, trata-se de um assunto reconhecido por vários
especialistas como “o mais difícil problema das ciências humanas”.4
Por meio do testemunho bíblico, sabemos que Deus, desde os mais
remotos tempos, se comunicou com a humanidade, e esta respondeu à sua
voz interagindo com ela em expressões e falas que hoje se perderam no
tempo. Alguns rabinos afirmam que Adão falava hebraico, porém essa é uma
declaração teológica sem qualquer tipo de comprovação bíblica ou
acadêmica. Seja como for, embora configure ser tarefa inglória decifrar a
língua de Adão, é possível dizer que ele conversava com Deus, ouvia-lhe a
voz e compreendia suas palavras.
Mais que isso — Adão e Eva interagiam em diálogos com Deus.
Expressões como: “Ordenou o Senhor Deus ao homem…” (Gênesis 2:16);
“Assim o homem deu nomes a todos os animais…” (Gênesis 2:20); “E,
ouvindo a voz do Senhor Deus, que passeava no jardim à tardinha…”
(Gênesis 3:8) deixam registrado que a linguagem humana é tão antiga quanto
o próprio ser humano.
Tal processo de comunicação divino-humana continuou por um tempo
após a expulsão do Jardim do Éden. Não somente os seres humanos
continuaram conversando entre si, apesar da confusão na torre de Babel
(Gênesis 11), como continuaram recebendo mensagens divinas seja por
sonhos ou aparições especiais da divindade.
Todos os patriarcas bíblicos, Noé, Abraão, Isaque e Jacó tiveram
revelações de Deus, isso muitos séculos antes de Cristo. Porém, com o passar
do tempo, falhas de memória e imprecisões na transmissão das mensagens
fizeram com que a comunicação oral de Deus com um ou outro indivíduo se
tornasse um meio inadequado para preservar o conteúdo da revelação dada
aos homens. É aí que surge o fenômeno de escrituração das mensagens de
Deus por intermédio da Bíblia Sagrada.
Contudo, mesmo que de forma escrita, a comunicação ainda continua
sendo por meio da palavra. A Bíblia é a maior testemunha de que Deus
estabeleceu sua comunicação com indivíduos, povos e, por fim, com a Igreja.
A mais importante comunicação divina, no entanto, se deu por intermédio do
envio de Jesus Cristo, o próprio Filho de Deus, que revelou na carne o caráter
do Pai.
O livro de Hebreus inicia dizendo: “Havendo Deus antigamente falado
muitas vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos
dias a nós nos falou pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas
[…] sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder […]” (Hebreus
1:1-3). O que estas palavras significam? Que muitos homens e mulheres, de
várias partes e em diferentes línguas, registraram em linguagem humana a
comunicação que receberam de Deus. Os profetas e hagiógrafos (escritores
sacros) são instrumentos humanos que Deus usou para registrar, em
linguagem humana, sua revelação especial. Daí o surgimento da Bíblia
Sagrada, Palavra escrita de Deus.
Quando Paulo diz que toda Escritura é inspirada por Deus, está
evidentemente fazendo referência à já mencionada coleção de livros sagrados
que ele conhecia em sua época, a saber: a Lei, os Profetas e os Salmos,
conforme vimos em Lucas 24:44. Ele também já considerava os evangelhos
ou, pelo menos, os evangelhos de Mateus e Lucas, pois em 1Timóteo 5:18 ele
cita Deuteronômio 25:4, associado a Mateus 10:10 e Lucas 10:7, e chama de
“Escritura” (ver 1Coríntios 9:9,14). Ambos, Antigo e Novo Testamentos
vieram de Deus para os cristãos, e são igualmente considerados Escrituras
(1Coríntios 2:10-13; 1Timóteo 5:18; 2Pedro 3:15,16).
Isso nos leva a entender que a inspiração envolve, via de regra, um
agente humano usado por Deus. É, em outras palavras, a operação divina que
toma conta do autor sagrado, esclarecendo-o, guiando-o, assistindo-o na
execução de sua tarefa. Foi isso que o autor aos Hebreus quis dizer ao afirmar
que Deus falou nos tempos antigos aos pais pelos profetas (Hebreus 1:1).
Mas como se dava esse processo?
O teólogo alemão Karl Rahner (1961) encontrou um modo interessante
de explicar o fenômeno da inspiração bíblica. Ele percebeu que o uso do
termo latino autor para designar Deus como quem compôs as Escrituras
poderia ser um tanto dúbio. Então ele se lembrou de que, em alemão, você
pode falar de alguém como autor literário (Verfasser) ou como originador de
um livro (Urheber). Assim, segundo Rahner, Deus originou os livros
sagrados, isto é, propiciou que fossem produzidos, mas não os escreveu no
sentido de que ditou suas palavras ou utilizou-se do profeta como se fosse
uma máquina de escrever ou um teclado de computador. Na verdade, Deus
inspirou os pensamentos e os ensinos na mente de seus servos, mas a
linguagem e as imagens usadas nas Escrituras eram do próprio profeta de
acordo com a cultura e com a cosmovisão em que ele estava inserido.
A Inspiração é uma
operação do Espírito Santo,
atuando nos homens, de
acordo com as leis da
constituição humana; que
não é neutralizada pela
influência divina, mas
aproveitada como um
veículo para a expressão
completa da mensagem de
Deus. […] a Inspiração está
geralmente combinada com
o progresso moral e
espiritual do Doutrinador,
de maneira que há no todo
uma conformidade moral
entre o Profeta e a sua
doutrina. (Westcott apud
APOLINÁRIO, 1989)
Veja esta declaração de Davi em 2Samuel 23:2: “O Espírito do Senhor
fala por mim […]” Somando o que foi dito com essa declaração de Davi,
podemos concluir que a Bíblia é um livro divino, mas não caiu pronto do céu.
Ela foi se formando ao longo do tempo, admitiu rascunhos, contextos,
pequenas edições. Para que a Bíblia se concretizasse, o Espírito Santo se
serviu de instrumentos que eram humanos e que conservavam a respectiva
personalidade, caráter, talento e gênio, os hábitos intelectuais e poderes de
estilo típicos de sua época. Deus não violentou nem destruiu as faculdades
daqueles que escolheu para transmitir sua mensagem. O autor continuava
sendo um ser humano com suas peculiaridades e seu próprio modo de pensar.
É claro que Deus não permitiria à humanidade do profeta intervir de
modo a prejudicar o conteúdo da revelação. Não obstante, é notório, por
exemplo, que homens simples como Pedro e João escreveram de modo
simples, com vocabulário reduzido e expressões mais simplórias, bem
diferente de Salomão ou Paulo com toda a erudição que lhes dizia respeito.
Por isso a carta aos Romanos é muito mais primorosa e repleta de figuras
literárias que o discurso de Pedro expresso no livro de Atos, capítulo 3.
De acordo com o que a própria Bíblia nos dá a entender, com a história
de Gênesis, capítulos 1 a 3, não era plano original de Deus usar um livro para
se comunicar com os seres humanos. Ao que tudo indica, Adão e Eva tinham
franca comunhão com seu Criador e, possivelmente, com outros agentes
celestiais. Mas a entrada do pecado causou uma ruptura entre criatura e
Criador (Isaías 59:2). O Senhor agora tinha de usar outros meios de se
comunicar com o ser humano, e a revelação nos indica alguns deles:
OS PROFETAS
Os que foram eleitos para a tarefa de produzir a Bíblia eram “movidos pelo
Espírito Santo” (2Pedro 1:21); logo, as palavras, as expressões e a
concatenação das ideias poderiam até ser humanas, mas a autoria, em última
instância, era divina. Os agentes humanos poderiam, portanto, se valer de
pesquisa, depoimento de testemunhas, descrição de eventos e até material que
não fosse inspirado (Lucas 1:1-4). Todos esses métodos, no entanto, tinham a
direção do Espírito Santo a fim de que o lado humano não afetasse a essência
daquilo que Deus intentava transmitir (João 16:13 cf. Apocalipse 22:19).
Esses escritores eram chamados profetas ou videntes de Deus. Mas o
quem seriam eles? Como reconhecê-los na História? Embora o texto bíblico,
especialmente o Antigo Testamento, traga várias palavras hebraicas para
definir esses autores inspirados, chama-nos a atenção que a palavra mais
comum em português, “profeta”, vinha originalmente do mundo grego e
servia para referir-se ao que fala algo em lugar de uma autoridade
especialmente divina ou sobrenatural. Por isso, o vidente bíblico é aquele que
fala “por Deus” aos homens e como tal ele pode, algumas vezes, dar uma
advertência, revelar uma situação específica ou ainda antever acontecimentos
futuros.
Vários povos, além dos judeus, diziam possuir mensageiros com dom
profético. Entre eles estavam os babilônios, hititas, gregos, entre outros. No
caso bíblico, a orientação é checar se um profeta vem ou não de Deus, pois,
assim como há verdadeiros profetas, também há falsos líderes dizendo-se
inspirados por Deus quando, na verdade, não receberam nenhuma mensagem
do Altíssimo (cf. Deuteronômio 18:20-22; Mateus 7:15-20; Romanos
16:17,18; 1Tessalonicenses 5:20,21).
Como podemos reconhecer um falso profeta? Estudando a Bíblia. Se
alguém prega algo que vai contra as Escrituras, é falso profeta. Mas note que
este argumento se torna circular, a menos que tenhamos primeiramente
estabelecido que a Bíblia é, de fato, a Palavra de Deus. Somente depois dessa
certeza podemos tomá-la como parâmetro de verificação da autenticidade
profética de uma pessoa.
Também é importante ver se a profecia se cumpre. Se não se cumprir,
provavelmente é porque veio da imaginação da pessoa, e não de uma
revelação de Deus. Há casos, no entanto, que um prognóstico pode ocorrer
por coincidência, previsibilidade comum ou manipulação de fatos.
Novamente, em caso de dúvida, a Bíblia será a regra de fé, prática e
validação da mensagem apresentada.
Por isso, é possível dizer que a Escritura tem, em última instância,
autoridade e característica normativa. Ela não pode ser desrespeitada (João
10:35) nem violada sem consequências (Mateus 5:17-20). Ela vem de Deus
(Mateus 22:31; 2Pedro 1:18-20). Foi revelada e inspirada pelo Senhor.
PALAVRA DE HOMENS?
SELEÇÃO DOS
LIVROS
▶ Critérios cristãos
Que critérios, portanto, Igreja Cristã primitiva teria usado para reconhecer os
livros que eram inspirados por Deus? Por evidências indiretas e citações de
vários autores antigos, eis algumas perguntas básicas que eles provavelmente
fariam:
HISTÓRIA DO CÂNON
▶ Cânon hebraico
No fim do século I, ou
início do II e seguintes da
Era Cristã, alguns judeus
empregavam a expressão
“sujar as mãos” para se
referir à sua literatura
sagrada. Neste período,
alguns judeus começaram
os debates sobre quais
livros “sujam as mãos”
ritualmente, isto é, quais
textos religiosos são
Escritura Sagrada. O
significado dessa expressão
é um tanto obscuro, mas ela
se refere aos livros que os
judeus consideravam
sagrados. […] “Sujar as
mãos” era uma referência à
sacralidade dos livros
sagrados. Aceitar a
propriedade das Escrituras
de sujar as mãos era uma
forma de aceitar seu caráter
sagrado. (McDonald, 2013,
p. 119)
▶ Cânon Alexandrino?
Epifânio ⸺ ⸻
▶ Cânon cristão
Conspiração em Niceia?
▶ Antigos cânones
As evidências indicam que, embora houvesse por algum tempo certa disputa
quanto aos livros de Hebreus, Tiago, 2Pedro, 2João, Judas e Apocalipse, os
cristãos primitivos já tinham em mente quais livros eram ou não inspirados
por Deus para compor as escrituras cristãs.
O Cânon Muratoriano, escrito 150 anos antes do concílio, já mencionava
os evangelhos que fariam parte da Bíblia. Esse mesmo cânon, juntamente
com Orígenes (outro escritor antigo do cristianismo), possivelmente já
utilizava os 27 livros que temos hoje no Novo Testamento. Igualmente,
outros autores que viveram bem antes do concílio — como Papias, Justino e
Ireneu de Lion — já abordavam a questão dos evangelhos e dos livros
neotestamentários que seriam ou não inspirados por Deus.
Taciano foi outro autor convertido ao cristianismo pela pregação de
Justino, o Mártir, em torno de 150 d.C. Após longos estudos de doutrinação,
ele retornou à Síria e organizou uma composição dos quatro evangelhos com
o objetivo de harmonizá-los em todas as suas narrativas. Essa composição
recebeu o nome de Diatessaron, que quer dizer “[harmonia] através dos
quatro”. Em pouco tempo essa obra serviu de texto litúrgico para a igreja
siríaca centralizada em Edessa.
Mesmo entre os autores controversos, reconhecidos como hereges pela
Igreja do século 2, encontramos pistas de um cânon formalizado pela maioria
da Igreja Cristã. Marcião de Sinope é um exemplo clássico. Atuando ainda
como bispo na Ásia menor, ele propôs uma cisão teológica entre o que ele
chamou de “Deus do Novo Testamento” e “Deus do Antigo Testamento”.
O primeiro seria um Deus bom, caridoso e cheio de misericórdia para
com os homens. Já o segundo seria um Deus legalista, condenador, pronto
para condenar a quem cometesse o menor deslize. Em virtude desse
raciocínio, Marcião rejeitou praticamente todo o Antigo Testamento e só
aceitou partes do Novo. Seu cânon constava apenas das epístolas de Paulo
(menos as epístolas pastorais) e do Evangelho de Lucas, com exceção dos
textos que ligavam Jesus ao Antigo Testamento.
Embora alguns acadêmicos reputem o cânon de Marcião como original
ou como evidência de que não havia ainda uma lista oficial de livros
inspirados dentro do cristianismo, é possível ver aqui outra hipótese: de que
já havia um cânon quase totalmente sistematizado. Caso contrário, a tarefa de
Marcião se limitaria a criar um cânon e não rejeitar uma lista já existente.
Em favor dessa ideia é possível citar uma passagem de Tertuliano que
diz:
▶ Torá
Yehoshua (Josué)
Shoftim (Juízes)
Shmuel (1 e 2Samuel)
Melakhim (1 e 2Reis)
Yeshayah (Isaías)
Yirmyah (Jeremias)
Yechezqel (Ezequiel)
Hoshea (Oseias)
Yoel (Joel)
Amos (Amós)
Ovadiá (Obadias)
Yoná (Jonas)
Mikhá (Miqueias)
Nachum (Naum)
Chavakuk (Habacuque)
Tzefanyá (Sofonias)
Chagai Zecharia (Zacarias)
Malachi (Malaquias)
▶ Ketuvim (Escritos)
Tehilim (Salmos)
Mishlei (Provérbios)
Iov (Jó)
Shir Ha-Shirim (Cântico dos cânticos)
Ruth (Rute)
Eichá (Lamentações)
Kohelet (nome do autor) (Eclesiastes)
Esther (Ester)
Daniel
Ezra e Nechemyah (Esdras e Neemias — tratados como um só livro)
Divrei Ha-Yamim (As palavras dos dias) (Crônicas)
LISTA CRISTÃ
▶ Evangelhos
Mateus
Marcos
Lucas
João
▶ Livro histórico
▶ Cartas (Epístolas)
Romanos
1Coríntios
2Coríntios
Gálatas
Efésios
Filipenses
Colossenses
1Tessalonicenses
2Tessalonicenses
1Timóteo
2Timóteo
Tito
Filemon
Hebreus
Tiago
1Pedro
2Pedro
1João
2João
3João
Judas
▶ Livro profético
Apocalipse (Revelação)
LIVROS PERDIDOS,
BANIDOS, ADOTADOS
ESCRITOS PERDIDOS
A Bíblia Sagrada menciona diversos livros dos quais nada sabemos por que
desapareceram da História. Seu conteúdo provavelmente tornou-se perdido
desde cedo e, por alguma razão, não foram preservados nem pela geração que
se seguiu imediatamente à época de sua produção.
Quanto à lista desses livros, é importante esclarecer que não se trata de
livros perdidos da Bíblia, no sentido de que um dia fizeram parte dela e
depois foram excluídos. Também é importante diferenciá-los dos chamados
pseudoepígrafos, isto é, livros escritos muito tempo depois dos eventos
mencionados e falsamente atribuídos a personalidades famosas, como
Enoque, Melquisedeque e até Adão e Eva.
Começando pelo Antigo Testamento, costuma-se mencionar como
exemplos de livros perdidos o chamado “Livro das Guerras do Senhor”,
mencionado em Números 21:14; o “Livro do Justo”, Josué 10:14; o “Livro do
profeta Natã”, 1Crônicas 29:29, entre outros. Seriam, neste caso, livros
inspirados que se perderam?
Esta é uma pergunta difícil de se responder, pois comporta duas
possibilidades. A primeira de que pelo menos alguns deles seriam inspirados
por Deus, mas apenas para uma situação específica e, por isso, não tinham
necessidade de entrar no cânon. Este seria o caso de um registro escrito pelo
profeta Isaías sobre o rei Uzias, e do qual nada sabemos (2Crônicas 26:22). A
segunda possibilidade é que nem todas eram obras inspiradas, mas apenas
históricas e, com esse fim, foram citadas pelo autor inspirado. De fato, muitas
delas serviram de base à composição dos livros de Samuel, Reis e Crônicas.
A inspiração profética, portanto, não significa ineditismo ou originalidade,
mas orientação do Espírito de Deus no uso correto das fontes que menciona.
Quanto ao Novo Testamento, a Igreja Cristã foi definida em Efésios
2:20 como uma casa “fundamentada nos apóstolos e profetas”. Tal expressão
indica que eles já trabalhavam com escritos tanto de um grupo quanto de
outro. Logo, essa larga aceitação de livros, ainda nos tempos apostólicos, em
contraste com umas poucas disputas ocorridas posteriormente, indica que eles
já tinham bem amadurecida a ideia de possuir uma coleção de escritos
inspirados. É possível, contudo, que alguns desses escritos não tenham
sobrevivido até nossos dias.
Um caso exemplar seria a forte suspeita de que Paulo havia escrito mais
de duas cartas aos coríntios, e que, infelizmente, se perderam. Em duas
passagens, ele se refere a conteúdos enviados à igreja, mas que não estão em
nenhuma parte das cartas atuais.
Em 1Coríntios 5:9 ele fala de uma carta anterior, de modo que a que
chamamos “Primeira” Coríntios, na verdade, não foi a primeira. Já em
2Coríntios 2:4 ele diz que escreveu anteriormente aos membros em meio a
muita tribulação e angústia, mas os estudiosos não conseguem ligar tais
circunstâncias com o conteúdo de 1Coríntios, de modo que são grandes as
possibilidades de haver outra(s) carta(s) perdida(s) de Paulo.
E temos ainda uma referência em Colossenses 4:16 a uma carta enviada
aos cristãos de Laodiceia, cujo conteúdo ninguém atualmente conhece. De
igual modo, alguns estudiosos pensam que a carta aos Filipenses seria, na
verdade, uma coleção de vários bilhetes.
Por volta do fim do primeiro século d.C., Clemente de Roma atuava
como presbítero da Igreja Cristã e, estando em Roma, enviou cartas para a
igreja em Corinto. Ele se demonstrou familiarizado com as cartas de Paulo e
as tratou como palavra de Deus. Alguns pensam que esse Clemente seria o
mesmo mencionado por Paulo em Filipenses 4:3 (veja Eusébio de Cesareia,
[História Eclesiástica, III. 38, 4). Clemente também faz menções ocasionais
a certas “palavras de Jesus”, e embora elas fossem autoritativas para ele, não
são tratadas como “evangelhos”, muito menos como escritos inspirados. Ao
que tudo indica, eram sentenças que ele tinha de memória, possivelmente
transmitidas de maneira oral, mas que não foram preservadas de forma
escrita, como no caso dos evangelhos. Um exemplo seria Atos 20:35, onde
Paulo atribui uma frase a Cristo que não se encontra nos evangelhos.
Eusébio de Cesareia (Ecclesiastical History, III, 25), após apontar os
livros do Novo Testamento na ordem como os temos hoje, faz menção a
outros títulos que circulavam pelas igrejas cristãs de seu tempo, mesmo sem
serem reconhecidos como inspirados por Deus. Dentre eles estariam um certo
Evangelho dos Hebreus, Cartas de Barnabé e um Apocalipse de Pedro.
PSEUDOEPÍGRAFOS
▷ Apocalipses
Apocalipse de Abraão
Apocalipse de Adão
Apocalipse de Baruque
Apocalipse grega de Baruque
Apocalipse de Daniel
Apocalipse de Elias (copta)
Apocalipse de Elias (hebraico)
Apocalipse de Esdras ou 4Esdras
Apocalipse de Sidraque
Apocalipse de Moisés
Apocalipse de Sofonias
▷ Testamentos
Testamento de Abraão
Testamento de Adão
Testamento dos Doze Patriarcas
Testamento de Isaque
Testamento de Jacó
Testamento de Jó
Testamento de Moisés ou Assunção de Moisés
Testamento de Salomão
Ascenção de Isaías
4Baruque ou Omissões de Jeremias
Perguntas de Esdras
1Enoque ou livro de Enoque etíope
2Enoque ou Enoque eslavo
3Enoque ou Apocalipse hebraica de Enoque
Livro dos Jubileus
Livro de Janes e Jambres
Livro de José e Asseneth
Livro de Noé
5Macabeus
Odes de Salomão
Oráculos sibilinos
Oração de José
História de Achikar
História dos recabitas
Vida de Adão e Eva
Visão de Esdras
Vidas dos profetas
Esdras grego
Odes
Oração de Manassés
1Macabeus
2Macabeus
3Macabeus
4Macabeus
Salmos 151
Salmos 152-155
Salmos de Salomão
Judite
Eclesiástico (Sirac)
Baruque
Epístola de Jeremias
Suzana
Bel e o Dragão
A LXX não é unânime
Os mais antigos
manuscritos gregos da
LXX, exceto aqueles
fragmentos descobertos no
deserto da Judeia e no
Egito, datam da época de 3º
e 4º séculos d.C. Nenhum
deles contém a lista exata
de livros aceitos,
reconhecidos como
deuterocanônicos pelo
Concílio de Trento (1545-
63). Apenas à guisa de
ilustração: o Códice
Vaticano (“B”) não tem 1 e
2Macabeus (canônicos,
segundo o entendimento
católico), mas inclui
1Esdras (não canônico,
segundo o entendimento
católico). O Códice
Sinaítico ( ) omite
Baruque canônico, segundo
as versões católicas), mas
inclui 4Macabeus (não
canônico, segundo as
mesmas versões). O Códice
Alexandrino (“A”) contém
três livros apócrifos “não
canônicos” (1Esdras e 3 e
4Macabeus). Vê-se,
portanto, que até os três
mais antigos manuscritos
da LXX demonstram
considerável falta de
certeza quanto aos livros
que comporiam a lista dos
apócrifos ou
deuterocanônicos.
Judite
Tobias
1Macabeus
2Macabeus
Sabedoria
Eclesiástico ou Sirácide
Baruque
Carta de Jeremias
Oração de Azarias (Daniel)
História de Susana (Daniel)
Bel e o Dragão
Versão grega de Ester
▷ Evangelhos judaico-cristãos
▷ Evangelhos gnósticos
Apócrifo de João ou Livro de João evangelista ou Revelação secreta de
João
Diálogo do Salvador
Livro secreto de Tiago ou Apócrifo de Tiago
Livro de Tomé
Pistis Sophia ou Livro do Salvador
Evangelho de Apel
Evangelho de Bardesane
Evangelho de Basilide
Evangelho copta dos egípcios
Evangelho grego dos egípcios
Evangelho de Eva
Evangelho segundo Filipe
Evangelho de Judas
Evangelho de Maria ou Evangelho de Maria Madalena
Evangelho de Matias ou Tradição de Matias
Evangelho da perfeição
Evangelho dos quatro ramos celestes
Evangelho do Salvador ou Evangelho de Berlim
Sabedoria de Jesus Cristo ou Sofia de Jesus Cristo
Evangelho de Tomé ou Evangelho de Dídimo Tomé ou Quinto
Evangelho.
Evangelho da verdade
▷ Evangelhos da Paixão
Evangelho de Gamaliel
Evangelho de Nicodemos
Evangelho de Pedro
Declaração de José de Arimateia
▷ Outros evangelhos
Pregação de Pedro
Evangelho de André
Evangelho de Cerinto
Evangelho dos Doze
Evangelho de Mani
Evangelho de Marcião
Evangelho secreto de Marcos
Evangelho dos Setenta
▷ Atos apócrifos
Atos de André
Atos de André e Matias
Capítulo 29 dos Atos dos Apóstolos
Atos de Barnabé
Atos de Bartolomeu ou Martírio de Bartolomeu
Atos de Santippe e Polissena
Atos de Felipe
Atos de João
Atos de Marcos
Atos de Mateus
Atos de Paulo
Atos de Paulo e Tecla
Atos de Pedro
Atos de Pedro e André
Atos de Pedro e dos Doze
Atos de Pedro e Paulo
Atos de Pilatos
Atos de Simão e Judas
Atos de Tadeu
Atos de Timóteo
Atos de Tito
Atos de Tomé
▷ Cartas apócrifas
▷ Apocalipses apócrifos
1Apocalipse de Tiago
2Apocalipse de Tiago
Apocalipse da Virgem (etíope)
Apocalipse da Virgem (grego)
Apocalipse de Pedro (grego)
Apocalipse de Pedro (copta)
Apocalipse de Paulo (grego)
Apocalipse de Paulo (copta)
Apocalipse de Estêvão
Apocalipse de Tomé
▷ Ciclo de Pilatos
Sentença de Pilatos
Anáfora de Pilatos
Paradosis de Pilatos
Cartas de Pilatos e Herodes
Cartas de Pilatos e Tibério
Vingança do Salvador
Morte de Pilatos
Cura de Tibério
▷ Outros pseudoepígrafos
2Pedro 3:15,16
Edições católicas da Bíblia possuem uma lista de livros mais extensa que as
edições protestantes. Teólogos católicos denominam essa lista de
deuterocanônicos, isto é, livros que foram canonizados num segundo
momento pela Igreja, mas não na antiguidade judaica. Costuma-se também
argumentar que, conquanto não fizessem parte da Bíblia hebraica, esses
livros seriam reconhecidos pelos judeus de Alexandria.
Autores protestantes, por sua vez, discordam dessa assertiva e preferem
classificar esses livros como apócrifos ou apócrifa. Este termo vem da língua
grega e significa literalmente “aquilo que está oculto”, “escondido” ou que é
“difícil de entender” (Xenofonte, Memorabilia 3.5,14). Seu uso na literatura
antiga era, às vezes, pejorativo e, às vezes, neutro. Podia se referir tanto a
livros supostamente sagrados, mas de origem duvidosa ou desconhecida,
como a livros esotéricos que só eram lidos em lugares secretos.
Contudo, nos séculos 4 e 5 da nossa era, autores cristãos tornaram-se
quase unânimes no uso pejorativo do termo para se referir àqueles escritos
que não deveriam fazer parte da Bíblia Sagrada. A questão é saber que livros
os antigos cristãos colocariam na prateleira dos “apócrifos”.
São sete livros ao todo cuja canonicidade é disputada: Judite, Tobias,
Baruque, 1 e 2Macabeus, Sabedoria de Salomão e Eclesiástico. Além disso,
temos alguns acréscimos aos livros de Ester e Daniel. Os protestantes, no
entanto, embora não reconheçam a inspiração profética dessa coleção,
admitem o estudo deles como meio de conhecer melhor o judaísmo dos
tempos antigos. Os católicos, é claro, por considerarem esse material como
escritura inspirada por Deus, evitam chamar-lhes de apócrifos, preferindo
referirem-se a eles como deuterocanônicos.
Essa questão não pode ser discutida sem a devida referência a São
Jerônimo, que, no quarto século, iniciou, a pedido do papa Dâmaso, uma
revisão das bíblias que culminou numa nova tradução comumente chamada
Vulgata latina. Ele acrescentou à sua tradução os livros a mais que as bíblias
católicas trazem até hoje e que também apareciam, de modo diversificado, na
versão grega do Antigo Testamento chamada Septuaginta.
Sua classificação, no entanto, gera diferentes interpretações entre os
acadêmicos, pois, pelo menos numa passagem do Prologus Galeatus,
Jerônimo definirá esses sete livros como apócrifos — termo que continua
negativo em todos os seus escritos. Noutras partes, porém, o mesmo
Jerônimo denomina-os como livros eclesiásticos e de leitura proveitosa,
usados até em liturgias da igreja.
Seja como for, uma coisa é certa: Jerônimo não os definiu como
canônicos, isto é, não poderiam ser lidos na conta de escritura autoritativa da
Igreja, nem usados como fundamentação doutrinária. O mesmo
posicionamento incerto acerca desses livros a mais perdurou nos séculos
seguintes, sendo percebido em muitos autores reconhecidos da Igreja. João
Damasceno, papa Gregório Magno, Walafrid, Nicolau de Lyra e Tostado
foram alguns dos que continuaram duvidando da canonicidade dos livros
deuterocanônicos.
Em 1540, o reformador Andreas Carltadt, munido do Prologus de
Jerônimo, afirmou dogmaticamente, em seu De Canonicis Scripturis Libellus,
que aqueles livros deveriam ser banidos das bíblias cristãs. A Igreja,
respirando o espírito da Contrarreforma que havia na época, respondeu
oficializando-os em seu cânon. Assim, no famoso Concílio de Trento,
realizado em 8 de abril de 1546, oficializou-se que os textos
deuterocanônicos (que os protestantes chamavam de apócrifos) deveriam
fazer parte das bíblias aprovadas pelo Papa.
A bem da verdade, a disputa entre católicos e protestantes é apenas parte
da história. Como dissemos anteriormente, diferentes tradições cristãs
possuem diferentes apócrifos ou deuterocanônicos, como podemos ver nas
tradições orientais. Contudo, as diferenças mais conhecidas no Ocidente são
aquelas que marcam as bíblias publicadas por protestantes e aquelas
publicadas por editoras católicas.
Apócrifos são livros que não fazem parte do cânon inspirado por Deus e não
podem ser reputados como Bíblia Sagrada. Vários de seus autores usam
pseudônimos, isto é, afirmam ser uma personagem importante do Antigo
Testamento, como Abraão ou Enoque, mas tais livros foram, de fato,
compostos séculos depois da época em que viveu o suposto autor. Nisso não
há discordância entre os segmentos católico e protestante. A divergência
surge quanto ao grupo de livros presentes nas edições católicas que os
protestantes, por negarem sua inspiração, denominam de livros apócrifos, e
os católicos de deuterocanônicos, isto é, canonizados posteriormente.
Os deuterocanônicos são livros do Antigo Testamento questionados
pelos protestantes, mas legitimados pela Igreja Católica e algumas igrejas
orientais. São assim chamados por não constarem na Bíblia Judaica
Palestinense (definida pelos judeus da Palestina em 90 d.C.), mas na Bíblia
Judaica Alexandrina (por referência aos judeus que viviam nesta cidade do
Egito). Os livros que coincidem em ambas versões são chamados de
protocanônicos.
Foi Lutero que os denominou de “apócrifos” no século 16,
principalmente por conterem ensinos defendidos pela Igreja, mas negados
pelos reformadores, como a intercessão dos santos, a oração pelos mortos e a
realidade do purgatório.
Isso indica que estamos diante de uma crença cristã comum, e não apenas de
um dogma católico. As catacumbas de Roma, construídas por cristãos
primitivos, são pintadas com cenas descritas nos deuterocanônicos, o que
indica que eles tinham grande apreço por esses livros. Importantes
manuscritos bíblicos, como o Códex Álef e B, intercalam os
deuterocanônicos entre os livros do Antigo Testamento, o que mostra que
realmente faziam parte da Bíblia Sagrada. Até ao século 19, versões
protestantes da Bíblia costumavam trazer os livros deuterocanônicos, o que
indica que até eles reconheciam sua canonicidade.
A versão grega do Antigo
Testamento (Septuaginta),
usada pelos judeus
alexandrinos, contém mais
livros que as versões
católica, ortodoxa ou
protestante. Os livros
presentes na Septuaginta,
conforme a ordem original,
são:
Gênesis
Êxodo
Levítico
Números
Deuteronômio
Josué
Juízes
Rute
1Samuel (1Reis)
2Samuel (2Reis)
1Reis (3Reis)
2Reis (4Reis)
1Crônicas (1Paralipômenos)
2Crônicas (2Paralipômenos)
1Esdras
2Esdras (Esdras e Neemias)
Ester
Judite
Tobias
1Macabeus
2Macabeus
3Macabeus
4Macabeus
Salmos
Odes
Provérbios
Eclesiastes
Cântico dos Cânticos
Jó
Sabedoria
Eclesiástico (Sirac)
Salmos de Salomão
Oseias
Amós
Miqueias
Joel
Obadias
Jonas
Naum
Habacuque
Sofonias
Ageu
Zacarias
Malaquias
Isaías
Jeremias
Lamentações
Baruque
Epístola de Jeremias
Ezequiel
Suzana (7)
Daniel
Bel e o Dragão.
A Glossa Ordinária, um
comentário católico da
Idade Média, trouxe a
seguinte declaração sobre
os apócrifos (ou
deuterocanônicos),
demonstrando que a
aceitação deles não era um
consenso entre os teólogos
da época:
Os livros canônicos
são fruto do ditado do
Espírito Santo. Não
sabemos, no entanto,
em que tempo ou por
quais autores os não
canônicos ou
apócrifos foram
produzidos. Desde,
porém, que eles sejam
proveitosos e úteis e
não contenham
qualquer contradição
com os demais livros
canônicos, é permitido
à Igreja lê-los para sua
devoção e edificação.
Sua autoridade,
contudo, não é
considerada adequada
naqueles assuntos que
ainda são dúbios, nem
servem para confirmar
a autoridade
eclesiástica de um
dogma, como o bem-
aventurado Jerônimo
declara em seu
prólogo ao livro de
Judite e também aos
livros de Salomão. Por
outro lado, os livros
canônicos possuem tal
autoridade que tudo
que está contido neles
é para ser considerado
uma firme verdade e
um assunto
indiscutível.
6 Bíblia de Estudo Arqueológica. São Paulo: Editora Vida, 2013, p. 1973.
CAPÍTULO CINCO
ORGANIZAÇÃO
DOS LIVROS
CAPÍTULOS E VERSÍCULOS
A NTIGO TESTAMENTO
Gn Gênesis 50
Ex Êxodo 40
Lv Levítico 27
Nm Números 36
Dt Deuteronômio 34
Js Josué 24
Jz Juízes 21
Rt Rute 4
1Sm 1Samuel 31
2Sm 2Samuel 24
1Rs 1Reis 22
2Rs 2Reis 25
1Cr 1Crônicas 29
2Cr 2Crônicas 36
Ed Esdras 10
Ne Neemias 13
Et Ester 10
Jó Jó 42
Sl Salmos 150
Pv Provérbios 31
Ec Eclesiastes 12
Is Isaías 66
Jr Jeremias 52
Lm Lamentações de Jeremias 5
Ez Ezequiel 48
Dn Daniel 12
Os Oseias 14
Jl Joel 3
Am Amós 9
Ob Obadias -
Jn Jonas 4
Mq Miqueias 7
Na Naum 3
Hc Habacuque 3
Sf Sofonias 3
Ag Ageu 2
Zc Zacarias 14
Ml Malaquias 4
N OVO TESTAMENTO
Mt Mateus 28
Mc Marcos 16
Lc Lucas 24
Jo João 21
Rm Romanos 16
1Co 1Coríntios 16
2Co 2Coríntios 13
Gl Gálatas 6
Ef Efésios 6
Fp Filipenses 4
Cl Colossenses 4
1Ts 1Tessalonicenses 5
2Ts 2Tessalonicenses 3
1Tm 1Timóteo 6
2Tm 2Timóteo 4
Tt Tito 3
Fm Filemom -
Hb Hebreus 13
Tg Tiago 5
1Pe 1Pedro 5
2Pe 2Pedro 3
1Jo 1João 3
2Jo 2João -
3Jo 3João -
Jd Judas -
Ap Apocalipse 22
8 Epístola vem do grego antigo epistolê, e significa uma espécie de carta especial enviada a um amigo
ou a uma comunidade em particular, tratando de assuntos políticos, filosóficos, morais ou teológicos.
CAPÍTULO SEIS
A HISTÓRIA DA ESCRITA
A ESCRITA NA ANTIGUIDADE
Antigos tabletes
desenterrados no Curdistão
mostram os exercícios que
os alunos faziam.
Normalmente, consistiam
em cópias na argila de
sentenças previamente
escritas pelo professor, cuja
leitura era exigida
posteriormente na frente
dos colegas. O aluno,
portanto, deveria copiar nas
costas do tablete a mesma
coisa que estava na frente
sem errar, caso contrário,
seria punido.
A princípio, a escrita era pictogrâmica e ideogrâmica onde os sinais
representavam coisas ou ideias. Mais tarde, os sinais passaram a representar
sons, primeiramente silábicos, algo como lulu, que quer dizer homem, e lu-
gal, que quer dizer rei, e assim por diante. Por serem inicialmente feitas em
tabuinhas de argila cunhadas com uma pequena vara de junco, a escrita ficou
conhecida pelo nome de cuneiforme, isto é, feita a partir de cunhas. Os
tabletes de argila, portanto, foram as primeiras “folhas de papel” usadas na
Antiguidade. É por isso, aliás, que os sumérios chamavam as primeiras
escolas de eduba, que quer dizer “casa das tabuinhas”, isto é, dos tabletes de
argila sobre o qual escreviam suas lições.
Com o passar do tempo, os símbolos deixaram de representar apenas
objetos, como cavalos, bois ou carneiros, e começaram a representar a
linguagem humana. Atualmente, alguns arqueólogos afirmam poder localizar
o mais antigo registro dessa transformação: uma tábua suméria de 3.000 a.C.
encontrada na cidade de Jemdet Nasr, no Iraque.
Nela, os pesquisadores encontraram o desenho de uma haste de junco
em posição horizontal numa lista de objetos do templo. O que o desenho de
uma haste de junco estaria fazendo numa relação de objetos sagrados? Até
que um dos responsáveis pela tradução percebeu que o mesmo som que
significava “junco” na língua dos sumérios — gi — também significava
“fornecer” ou “pagar”. O responsável pela contabilidade do templo percebeu
a semelhança entre os sons das duas palavras e “pegou emprestado” o
símbolo do junco para criar outra palavra, em outro contexto.
E não pense que eles escreviam apenas coisas simples, ideias soltas.
Grandes obras literárias, poemas, tratados médicos, matemáticos e
astronômicos foram escritos pelos sumérios e depois pelos babilônios, seus
primeiros herdeiros literários.
▶ Egípcios
PROVIDÊNCIA DIVINA
Até pouco tempo atrás, afirmava-se que a invenção do alfabeto tinha ocorrido
lá pelos séculos 11 ou 12 a.C., o que representaria uma negação da autoria
mosaica dos livros que levam seu nome. Afinal, Moisés teria vivido bem
antes disso. Entretanto, escavações arqueológicas em Ur, na antiga Caldeia,
têm comprovado que, já no tempo de Abraão, ali estava uma metrópole
altamente civilizada. Nas escolas de Ur, os meninos aprendiam leitura,
escrita, aritmética e geografia. Isso sem contar, como já dizemos, as
inscrições alfabéticas descobertas no Sinai, em Biblos e em Ras Shamra e que
são anteriores ao tempo de Moisés.
É importante notar que pelo menos uma dessas escritas foi encontrada
na península do Sinai, no mesmo lugar onde Moisés esteve quando recebeu a
incumbência de escrever seus livros. Êxodo 17:14: “Então disse o Senhor a
Moisés: Escreve isto para memorial num livro, e relata-o aos ouvidos de
Josué.”
As evidências, portanto, indicam que Moisés provavelmente usou
alguma forma de escrita fonética para escrever o Pentateuco. É difícil saber
que tipo de letras estariam nessa forma original. Tudo leva a crer que os
fenícios inventaram um tipo especial de alfabeto do qual derivaram os
alfabetos grego, latino e hebraico, cujas letras foram evoluindo até chegar ao
formato que temos hoje.
A objeção apresentada por muitos críticos quanto à autoria da escrita
mosaica dos primeiros livros da Bíblia sugere que, pelos indícios atuais,
parece que o alfabeto fenício, do qual derivou o alfabeto hebraico, dataria do
século 11 a.C. Logo, a escrita hebraica que conhecemos deve ser posterior e,
por isso, muito distante dos dias de Moisés.
Sobre isso, em primeiro lugar, é hipotética a ideia de que o hebraico se
originou do fenício, pois os dados disponíveis apenas sugerem hipóteses, mas
nenhuma certeza. Além disso, o alfabeto hebraico pode até ser posterior a
Moises, mas não a língua hebraica, e essa pode ter se utilizado de outros
sinais gráficos, como os encontrados em Ugarite, na Síria, e que seriam, pelo
menos, duzentos anos mais antigos que o alfabeto fenício.
Que o hebraico poderia se utilizar de outros tipos de sinais para
reproduzir por escrito seu idioma fica claro pelo achado de uma inscrição em
Khirbet Qeiyafa, Israel, e datada do século 10 a.C. Sua tradução ainda é
motivo de disputa entre os especialistas, e há quem pense que seria um
idioma diferente do hebraico, mas tudo leva a crer que esse era um tipo de
escrita usual em Israel no primeiro milênio antes de Cristo e que não derivava
do fenício. Isso não comprova, mas permite supor que, mesmo antes da
elaboração do alfabeto que conhecemos atualmente, tanto Moisés como
outros autores hebreus teriam plenas condições de escrever um livro sagrado,
mesmo que as evidências ainda sejam fragmentárias.
Atos 7:22 declara que Moisés era versado na língua egípcia, que,
conforme visto, era registrada em forma de complexos desenhos
hieroglíficos. O mais natural, neste contexto, seria Moisés escrever seus
livros nesse idioma, que era bem mais rico que a língua dos escravos hebreus,
e que muito provavelmente era um idioma ágrafo, isto é, sem representação
escrita.
Os hieróglifos, além de mais versáteis para escrever textos sagrados,
eram chamados pelos egípcios de mdju Netjer, isto é, “palavras dos deuses”.
Eles foram não apenas a primeira e mais rica forma de escrever dos egípcios,
mas também a de maior duração. Moisés certamente sabia ler e escrever
muito bem em forma de hieróglifos. Porém, a providência divina trabalhou
para que ele rejeitasse essa língua, bem como a escrita dos sumérios, e usasse
alguma forma proto-sinaítica de redação, que era uma forma escriturística
mais vulgar (no sentido de simplicidade), rústica e própria de nômades do
deserto.
Se Moisés tivesse escrito a
Bíblia na língua dos faraós
ou dos sumerianos,
precisaríamos esperar até
os séculos 18 e 19 para
poder ler o Antigo
Testamento, pois foi
somente nessa época que
Georges Grotefen decifrou
os primeiros sinais
cuneiformes e Jean-
François Champollion, os
símbolos egípcios. A ida de
Moisés para o deserto do
Sinai antes mesmo de
libertar o povo o fez
esquecer a língua de Faraó
e se familiarizar com outra
forma mais funcional de
escrita usada em Midiã, isto
é, a alfabética ou
protoalfabética, cujos
caracteres representam
sons, ao invés de
complexos sinais e ideias.
Como você sabe, a Bíblia não foi originalmente escrita em nosso idioma. O
que temos é uma tradução, e muitas vezes é complexo o trabalho de traduzir.
Primeiro porque alguns elementos que em nosso idioma contam com apenas
um vocábulo para representá-lo, em outra língua pode contar com dois ou
três. Por exemplo, enquanto nos referimos à morada de Deus e ao ambiente
estelar pelo simples nome de céu, as pessoas de língua inglesa usam dois
diferentes termos, heaven e sky.
Além disso, há palavras que simplesmente não possuem um equivalente
noutra língua. É o caso de “saudade”, que, em inglês, tem de ser traduzida
por um verbo ou quase uma frase (I miss you) porque não existe um
substantivo que lhe seja equivalente.
Por fim, há também o problema de que a língua é um organismo vivo e
as palavras sofrem transformação. Isso é chamado de mutação ou
transformação semântica. Veja este caso: quando você entorna um líquido no
chão, costuma dizer que o líquido derramou, não é mesmo? Pois bem, no
tempo de seus ancestrais, derramar era cortar as ramas de uma parreira de
uvas. De modo que, quando os antigos diziam: “Vou derramar aquela
parreira”, não estavam dizendo que iam entorná-la em algum lugar.
É por essas e outras dificuldades que o trabalho dos tradutores é uma
arte difícil e sempre sujeita a críticas (algumas injustas). Os italianos
costumavam dizer “traduttore, traditore” — o tradutor é um traidor. Triste
adágio para um trabalho tão importante.
▶ Expressões idiomáticas
▶ Hebraico e aramaico
▶ Grego
Em seu desespero, o filho pródigo pensa consigo de ir ter com seu pai.
Sua expressão “pequei contra o céu e diante de ti” é inteiramente hebraica.
Não fazia sentido, na mentalidade grega, alguém pecar contra o céu. Neste
caso, “céu” seria um eufemismo para “Deus”. “Encheu-se de compaixão”
também é um hebraísmo, considerando que a compaixão não seria algo
abstrato, como era para os gregos, mas um sentimento “concreto” capaz de
preencher o corpo de uma pessoa.
Do mesmo modo, diferentemente do que está na tradução em português,
não é dito no original que o pai ordenou colocarem um anel no “dedo” do
filho, mas sim “na sua mão”. Ora, era em hebraico (e não no grego comum)
que se dizia colocar um anel na mão, ao invés de colocá-lo no dedo de uma
pessoa (cf. Gênesis 41:42).
Em termos de conceitos ou redefinição de significados, Mateus 10:28,
por exemplo, traz as seguintes palavras de Jesus acerca da alma humana: “E
não temais os que matam o corpo, e não podem matar a alma; temei antes
aquele que pode fazer perecer no inferno a alma e o corpo.” Aparentemente,
Jesus estaria fazendo eco à ideia de alma imortal, que não é partilhada no
pensamento hebraico, pois ele descreve uma situação pós-morte em que a
alma é condenada. Na visão do Antigo Testamento, a alma deixa de existir
quando o corpo desaparece. Não existe a ideia de uma alma queimando no
fogo do inferno — isso é uma criação dos gregos inspirados em certos
conceitos do mundo persa.
O teólogo protestante Hans Wolff, que lecionou por muitos anos na
universidade de Mainz, escreveu um denso estudo sobre Antropologia do
Antigo Testamento,9 no qual esclarece a palavra hebraica nefesh,
normalmente traduzida por alma, designa a “garganta”, necessária para
alimentação e a respiração. Também pode significar o pescoço, a parte
exterior da garganta. Mas, os dois significados vão traduzir o ser humano
como um todo e não partes distintas uma das outras. Wolff explica que nefesh
pode ser traduzido por “alma”, mas num entendimento diferente daquele
advindo do mundo grego.
Nefesh pode ser traduzido, também, por sentimentos sempre ligados ao
emocional. Com isso entende o significado por “vida” (traduzido no Antigo
Testamento), mas, vida no sentido concreto, o ser humano se tornando um ser
vivente. Trata-se do ser humano inteiro como um ser à procura de sua
sobrevivência. Assim, conclui-se que nefesh e “alma” não são termos que
possam ser intercambiados na Bíblia. Para Wolff, ainda existe uma
dificuldade da tradução do termo nefesh para a filosofia helênica.
É com esse pano de fundo que devemos entender o discurso de Cristo.
Lembremos, ele não estaria falando em grego, mas certamente em hebraico
ou aramaico. Assim, se olharmos atentamente o texto, observamos que Jesus
não está endossando o pensamento grego, mas questionando-o ao apresentar
um conceito mais próximo do pensamento hebraico. Ele fala de uma alma
que, juntamente com o corpo, pode perecer. No pensamento grego, a alma
nunca perece, ela vive eternamente no paraíso dos campos elísios ou no
sofrimento do inferno, chamado aqui de “tártaro”. Mateus captou bem o
sentido que Jesus queria dar, considerando que o Mestre estaria falando em
aramaico ou hebraico. Mas ao traduzir as palavras do Senhor para o grego, o
evangelista modificou o sentido original da palavra “alma” no mundo
helênico, dando-lhe uma conotação mais em harmonia com a doutrina do
Antigo Testamento.
Apesar disso, não se pode dizer que o grego do Novo Testamento seja
inteiramente uma espécie de “grego bíblico”, como pensavam muitos autores
do passado. Hoje se sabe que o grego neotestamentário era um dialeto do
grego clássico conhecido como koiné, isto é, o grego “comum”. Essa
variação do grego surgiu dentro dos exércitos de Alexandre, o Grande, à
medida que seus soldados entravam em contato com outras culturas,
especialmente do Egito e da Mesopotâmia
Em termos gerais, é possível dizer que as diferenças básicas entre o
koiné e outras formas da língua grega é que ele seria um idioma mais prático
que acadêmico, colocando mais ênfase na claridade que na eloquência. Sua
gramática era mais simplificada, com poucas exceções em comparação ao
clássico e ao ático. A construção de sentenças, as inflexões e as desinências
eram simplificadas de modo que o grego koiné pudesse se tornar uma
linguagem do povo, um idioma de vida, e não de livros complexos.
9 WOLFF, Hans Walter. Antropologia do Antigo Testamento. Trad. Antônio Steffen. São Paulo:
Hagnos, 2007.
CAPÍTULO SETE
ESCREVENDO A
PALAVRA DE DEUS
O PROCESSO DE ESCREVER
Hoje, escrever um livro, e-mail ou uma mensagem é relativamente fácil.
Fazemos isso apenas com o uso de dedos no teclado do computador, do tablet
ou do celular. No passado, o mesmo processo era bem mais complexo e
exigia muito mais esforço humano.
A realidade do texto escrito em tela é uma facilidade muito recente da
tecnologia e podemos cair no erro de pensar que escrever uma mensagem era
tão simples antes como o é nos dias de hoje. Mesmo que alguns considerem o
contexto bíblico antes dos teclados, ainda assim podem incorrer num erro de
anacronismo, isto é, tomar uma realidade presente e projetá-la erroneamente
para o passado.
Vejamos: o papel que conhecemos hoje é, em grande parte, feito de
celulose, que é uma matéria-prima extraída de vegetais. Ecologicamente
falando, a produção em massa de papel e seu descarte excessivo na natureza
não é o melhor negócio para a ecologia. Para fazer, por exemplo, 1 tonelada
de papel são necessários, em média, o corte de 24 árvores. A qualidade do
papel determina o tipo de madeira a ser utilizada.
É claro que o programa de reflorestamento e reciclagem de papel usado
ajuda a diminuir o impacto ambiental. Porém, não solucionam
definitivamente o problema. Por isso, nosso desafio talvez seja o excesso e
não a falta de material para escrever. Bem diferente do passado onde a
simples tarefa de mandar uma carta exigia um grande empreendimento
pessoal.
Jerônimo, que viveu no quarto século de nossa era, enumera o processo
da produção de um texto: “Aquilo que digo, que dito, que escrevo, que
corrijo, que releio”.10 Note que havia coisas que eram escritas e outras que
eram ditadas. Também havia a correção, o que implica a existência de
rascunhos. Mas cuidado com anacronismos. O papel era caro, não se tratava
de escrever, embolar o papel e jogar no lixo (embora alguns digam que os
judeus massoretas faziam isso se a cópia da Escritura não estivesse boa). O
trabalho de escrever era meticuloso e demorado a fim de se evitar muitos
erros, mas como errar é e sempre foi um elemento humano, variantes
ocorriam.
O próprio Jerônimo avaliava o que seu escriba havia produzido. Ele fala
de emendare e emendatio, com o significado de correção e retratação. Ele
fala de sinais críticos feitos por ele mesmo e colocados no texto do escriba,
fala de anotações marginais etc.
Antes de Jerônimo, a prática de usar secretários como escribas já era
corrente, especialmente em Roma. Primeiro, temos de ter em conta que
apenas um percentual insignificante da população sabia ler ou escrever. As
poucas crianças que iam à escola aprendiam a escrever em cacos de cerâmica,
no contexto da Ásia, e em tabuletas de cera, no contexto de Roma (na
Europa). Plínio fala de crianças que começavam a ser incentivadas à arte de
escrever pelo fato de desenharem na madeira.
O processo era o seguinte: passava-se cera na tabuleta de madeira e o
aluno escrevia sobre a cera. Quando errava ou queria fazer outro texto
raspava-se com um estilete e começava tudo de novo. Mesmo adultos usavam
tabuletas de cera portáteis para fazer anotações do dia a dia.
Uma análise dos costumes redacionais dos tempos bíblicos nos dá uma
boa ideia de quanto custou para o povo de Deus, no passado, a produção da
Bíblia Sagrada. De acordo com Mateus 20:2 e João 12:5, um denário era o
que se ganhava por um dia inteiro de trabalho braçal no campo. Pois bem,
tendo isso em conta, imagine que uma simples folha de papiro poderia custar
até quatro vezes mais que isso, quatro dias de trabalho para se comprar uma
única folha de papel!
Some-se a isso o preço da tinta, que também era caro, das canetas etc.
De acordo com dados da época, 450 gramas de tinta valiam 12 denários, um
conjunto de dez canetas custava 4 denários, e um recipiente de couro, 40
denários. Dá para se perceber que com tais preços não era possível fazer
rascunhos e começar de novo embolando o papel e jogando no lixo.
A solução encontrada foi a contratação de escribas ou copistas que
pudessem fazer o trabalho de transcrever para um papiro ou pergaminho o
conteúdo desejado por um cliente. Esse trabalho era, a princípio, feito por
escravos que dispunham de cultura e podiam realizar a transcrição para seus
senhores. Com o passar do tempo, porém, especialmente no período romano,
o ato de escrever foi pouco a pouco se profissionalizando e muitos passaram
a cobrar por esse serviço.
Existe, inclusive, um decreto de Diocleciano fixando os preços máximos
que poderiam ser cobrados pelos copistas11. Estes seriam os seguintes:
Tudo isso, é claro, fora o valor dos materiais de escrita (caneta, tinta,
papel) e as taxas governamentais de direito.
Muitos não entendem por que nos tempos antigos um homem letrado como
Paulo, Cícero ou Sêneca usaria um copista para escrever suas cartas. Por que
não escreveriam eles mesmos com sua própria letra?
Veja o tom irônico que Cícero respondeu a um opositor jurídico quanto
ao uso de secretários para escrever suas cartas:
MATERIAIS DE ESCRITA
No tempo de Augusto
Cesar, um centurião de
baixa patente ganhava
3.650 denários por ano, 10
denários por dia. No
segundo século, uma
família de seis pessoas
precisava de 1.000 dracmas
por ano para comer, vestir e
pagar aluguel em Roma.
Esses dados demonstram
que a aquisição de um livro
seria um artigo de luxo
mesmo para aqueles que
não viviam em nível de
extrema pobreza.
CARTAS SECULARES
Marcos, tendo se
tornado o intérprete de
Pedro, escreveu
acuradamente tudo o
que ele lembrava.
Contudo, não foi na
ordem exata que
Marcos relatou os
ditos ou feitos de
Cristo. Pois ele nem
ouviu o Senhor nem o
acompanhou
pessoalmente. Por
outro lado, porém,
como eu disse, ele
acompanhou Pedro
que proveu as
instruções necessárias
[para seus
destinatários], mas não
com a intenção de
oferecer uma regular
narrativa dos ditos do
Senhor. De qualquer
forma, deve ser dito
que Marcos não
cometeu erros ao
escrever as coisas
como ele as lembrava
[…] com respeito a
Mateus, este ajuntou
os oráculos [do
Senhor] em língua
hebraica, e cada um os
interpretou o melhor
que pôde.
Fragmento VI-10
No caso de uma carta, esta poderia ser ditada palavra por palavra ou
recriada a partir de um conteúdo. Um líder religioso, por exemplo, podia
pedir ao copista que fizesse uma carta ao prefeito solicitando ao imperador
suprimentos para o templo de Minerva, em Roma. Neste caso, ele não ditou
as palavras que o copista deveria usar, mas determinou seu conteúdo que,
obviamente, era-lhe apresentado antes do envio para a conferência de sua
forma final. Como tudo era, em princípio, escrito na cera, havia condições
hábeis de apagar o registro, raspando a camada de cera e modificando uma
palavra ou até uma sentença inteira.
Não havia uma padronização exata do tamanho de cartas, isso variava
muito. Só para se ter uma ideia, as cartas de Cícero variam de apenas 22 até
2530 palavras com média de 295 palavras por carta. No caso de Sêneca, essa
média pula para 995 palavras por correspondência.15
Em ambos os casos, do ditado verbatim, isto é, palavra por palavra, ou
do conteúdo, aquele que encomendou o documento torna-se seu autor e, após
a conferência, envia ao destinatário. O autor é aquele que encomendou a
carta, nem sempre assinava embaixo do texto, mas o autenticava com um selo
(sinete). Outra maneira de autenticar o documento era escrever o prefácio
e/ou a conclusão e supervisionar a qualidade da cópia ― caso desejasse que o
mesmo texto fosse enviado para diferentes destinatários. Logo, nos antigos
tempos, autor e escritor não eram sinônimos perfeitos.
O ensaísta romano Valério Marcial (20-104 d.C.) menciona um bom
secretário copista que teve: “Sua mão é tão rápida quanto a fala e antes que a
língua pare sua mão já terminou”.
CARTAS APOSTÓLICAS
11 Bischoff, Latin Palaeography: Antiquity and the Middle Ages [1990] 182
13 Arns, 65.
14 Rex Winsbury: The Roman Book. Books, Publishing and Performance in Classical Rome. (Bristol
Classical Press, London/Nova Iorque k, 2009), p. 19 e 20.
15 Joseph R. Dodson, David E. Briones, (ed.). Paul and Seneca in Dialogue. Ancient Philosophy &
Religion, 2. Leiden; Boston: Brill, 2017, p. 68.
CAPÍTULO OITO
A TRANSMISSÃO DO
TEXTO BÍBLICO
PUBLICIDADE JUDAICA
Conta-se uma antiga lenda de que Deus havia reunido no céu representantes
de todos os reinos a fim de escolher um povo para si. A todos o Altíssimo
fazia uma única e certeira pergunta: “Se eu escolher vocês para ser o meu
povo, o que vocês fariam por mim?” Os sumérios disseram que fariam uma
grande torre em homenagem a Deus. Os egípcios se propuseram a erguer
pirâmides colossais e os gregos a criar complexos sistemas filosóficos para
descrever as qualidades divinas.
Cada povo apresentava sua proposta até que, por fim, vieram os hebreus.
“E quanto a vocês?” Perguntou o Altíssimo a um grupo de judeus que mal
conseguia erguer o rosto de tamanha vergonha. “Bem”, disseram eles, “não
temos a engenharia dos mesopotâmicos, nem a arquitetura dos egípcios,
muito menos os complicados raciocínios dos gregos. Mas somos um povo
pastoril acostumado com o campo e que ama contar histórias. Se o Senhor
nos escolher, diremos a todos quem o Senhor é.” Não deu noutra: o Messias
acabou nascendo judeu.
É claro que esta é apenas uma anedota e, como tal, pode ser criticada por
não corresponder exatamente à realidade histórica. Porém, ela encerra uma
importante característica dos judeus ― eles são contadores de histórias, e por
isso a Bíblia foi confiada a eles, pois tratava-se da história mais bela do
mundo, a história do amor de Deus, e todos deveriam ouvir falar nela.
Mesmo antes do nascimento de Cristo, os líderes do povo se
preocupavam muito com a transmissão do conteúdo bíblico de geração para
geração. Quando, ao voltar da Babilônia, percebeu-se que muitos judeus
haviam perdido a fluência que tinham na língua hebraica, os anciãos
prepararam comentários e paráfrases do texto escriturístico em língua
aramaica que pudessem ser lidos e compreendidos pelo povo em geral. O
importante era que ninguém ficasse sem entender o Santo Livro.
Mais tarde, com a expansão da cultura grega pelo mundo, judeus
helenistas que viviam em Alexandria viram ali o desafio e a oportunidade de
compartilhar com povos não judeus os ensinamentos da Santa Palavra. Sendo
o grego a língua franca da época, encontraram aí ocasião de traduzir o Antigo
Testamento para o idioma dos gregos e assim espalhar o judaísmo pelo
mundo.
DO PERGAMINHO
À INTERNET
TRADIÇÕES E MANUSCRITOS
Antes que a Bíblia fosse iniciada, os hebreus contavam com uma tradição
oral passada de pai para filho. Contudo, mesmo com o advento da Revelação
escrita dada aos profetas, a tradição oral permaneceu em uso no judaísmo e
isso perdurou até os tempos de Cristo.
O problema estava em que a tradição oral não era uma fonte
inquestionável de verdades reveladas, pois ela estava mais sujeita à distorção
que o texto escrito. E distorções poderiam ocorrer mesmo num povo
acostumado a repassar verdades orais de geração em geração. Ademais, com
o fim do cativeiro Babilônico, tradições desnecessárias e até contraditórias ao
texto bíblico permearam a religião dos judeus por intermédio de grupos como
os escribas e fariseus.
Os rabinos citavam a tradição como autoridade para interpretar a lei. Em
contraste com isso, Jesus falou por sua autoridade como legislador. A
expressão “eu, porém, vos digo” foi várias vezes usada pelo Mestre (cf.
Mateus 5:21-44).
Certa feita, ele disse aos guias do judaísmo de seu tempo:
O modo de um escriba
escrever um livro ou
documento era bem
diferente do modo como
escrevemos hoje, sentados
sobre cadeiras e apoiados
em mesas ou escrivaninhas.
Na Antiguidade, os
escribas não estavam
acostumados a escrever
sobre esse tipo de mobília.
Quando tinha de fazer uma
anotação curta, de no
máximo uma página, o
escriba a fazia em pé numa
tabuinha de cera ou em
uma folha de papiro ou
pergaminho. Ele
geralmente ficava de pé e
escrevia enquanto segurava
o material de escrita em sua
mão livre. No caso de uma
tarefa mais extensa, como a
cópia de um longo
manuscrito, aí sim, ele se
sentava, ocasionalmente no
chão, ou num banquinho ou
banco, apoiando o rolo
sobre uma tabuleta que
ficava apoiada em seus
joelhos.
17 Bruce M. Metzger, “When Did Scribes Begin to Use Writing Desks?” in: Historical and Literary
Studies: Pagan, Jewish, and Christian, NTTS, ed. Bruce Metzger, vol. 8 (Grand Rapids: Eerdmans,
1968), p. 123-34.
18 Filologia é o estudo rigoroso dos antigos documentos escritos e de sua transmissão, com o fim de
recuperar, estabelecer, interpretar e editar esses textos na forma original como saiu das mãos de seu
autor primário.
19 Fato relatado pelo Dr. Robert Smith, falecido mestre do Trinity College, a seu aluno Richard
Watson, como algo que Newton teria expressado verbalmente ao escrever seu Comentário sobre
Daniel. Apology for the Bible. Londres: 1806, p. 57. Livro disponível em PDF em
https://archive.org/stream/twoapologiesonef00watsiala#page/56/mode/2up acesso em 16/04/2020.
CAPÍTULO DEZ
CRÍTICA TEXTUAL DO
NOVO TESTAMENTO
Pelo que vimos até aqui, é fato que não possuímos mais os autógrafos da
Bíblia Sagrada, isto é, os textos originais, conforme saíram da pena dos
escritores inspirados. Mas isso não deve ser motivo de perplexidade para a fé
de ninguém. É claro que os críticos tomaram esse fato para colocarem em
dúvida a confiabilidade do texto que possuímos, contudo, precisamos levar
em conta algumas questões de ordem histórica.
Em primeiro lugar, leve-se em conta que material no qual se escrevia
não era tão resistente como gostaríamos, eles não possuíam a diversidade de
papéis que conhecemos hoje. O mais comum deles, o papiro, era frágil, que
logo se desgastava com a leitura e o manuseio fazendo com que os textos
fossem obrigatoriamente recopiados.
A princípio, conforme você viu no capítulo 9, estas cópias eram feitas
em rolos de papiro e, mais tarde, em códices em formato de cadernos.
Nalguns momentos optou-se por escrever tudo junto de forma contínua, como
você também já estudou neste livro. Os manuscritos gregos escritos todos
com letras maiúsculas receberam o nome de unciais, e os escritos somente
com letras minúsculas de códices minúsculos.
Havia ainda os chamados lecionários, uma coletânea de textos bíblicos
compilados num livreto que serviam para o uso litúrgico. Depois começaram
a aparecer mais cópias em pergaminho ou peles de animais que a princípio
eram evitados por serem muito mais caros (os primeiros copistas cristãos
tinham de trabalhar com parcos recursos).
Some-se a tudo isso as repetidas perseguições que os cristãos sofriam e
que, certamente, causou destruição de muitos exemplares que possuíam.
Assim, é provável que os cristãos primitivos tenham lido e relido os originais
até que eles se gastassem, desfazendo-se por completo e fossem,
necessariamente, substituídos por cópias feitas à mão. Foi, portanto, uma
circunstância natural que causou o desaparecimento dos originais, e não uma
espécie de negligência ou ação tendenciosa por parte da igreja cristã
primitiva.
CONFERINDO O TEXTO
Outro exemplo:
ENCONTREIMECOMAMADOCASTELOBRANCO.
Poderia significar:
ENCONTREI-ME COM AMADO CASTELO BRANCO.
ou
ENCONTREI-ME COM AMA DO CASTELO BRANCO.
Foi justamente uma situação assim que causou determinada textual na
redação de Romanos 6:5. Em muitos manuscritos está a conjunção ΑΛΛΑ,
que se lê “mas”. Noutros, o copista confundiu a repetição natural da letra
lambda (ΛΛ) com a letra mên (Μ), fazendo que o texto ficasse com “juntos”
(ΑΜΑ) ao invés de “mas”.
Vejamos agora alguns exemplos de erros mais comuns:
Marcos 16:9-20 (KJV) apresenta-nos o problema textual mais grave, que nos
deixa mais perplexos, dentre todos os outros. Esses versículos estão ausentes
em muitos dos mais antigos e melhores manuscritos, como o אÁlef, o B, o
itk (Antiga Latina), a Siríaca sinaítica, muitos manuscritos armênios e alguns
etíopes. Muitos dos antigos Pais da Igreja não demonstram ter conhecimento
desse problema, e Jerônimo admitia que essa passagem havia sido omitida
em quase todas as cópias gregas.
Dentre as cópias que contêm esses versículos, algumas também trazem
um asterisco ou óbelo, que era um sinal parecido com um travessão que o
copista usava para indicar que se trata de uma provável adição ao texto e que
não estaria no seu original.
Veja o final de Marcos no Códex Vaticanus:
A decisão sobre qual desses finais é o preferível ainda é controvertida
entre os especialistas, por isso versões modernas da Bíblia ainda a mantêm,
embora muitas a tragam entre colchetes indicando que não está presente nos
melhores manuscritos gregos.
Final de Marcos no Códex Vaticanus
1João 5:7 está ausente em algumas versões e entre colchetes em outras, mas
sem explicações. Todavia, há uma explicação para essa omissão, que
representa uma historieta interessante sobre o processo da crítica textual.
Quase não existe apoio textual para a redação apresentada aqui referente à
Trindade, em nenhum documento grego, ainda que haja apoio na Vulgata.
Então, quando Erasmo foi desafiado e lhe perguntaram por que ele não
incluíra essa passagem em seu Novo Testamento grego, em 1516 e em 1519,
o estudioso respondeu rapidamente que a incluiria na próxima edição, desde
que alguém mostrasse a ele pelo menos um manuscrito antigo que lhe desse
apoio. Descobriu-se um minúsculo grego do século 16, o manuscrito de 1520,
de um frei franciscano. Erasmo cumpriu sua promessa e incluiu esse texto em
sua edição de 1522. A KJV seguiu o texto grego de Erasmo e assim foi: com
base num único manuscrito tardio, insignificante, desprezou-se todo o peso e
autoridade de todos os demais manuscritos gregos. Na verdade, a inclusão
desse versículo como sendo genuíno quebra quase todos os cânones
principais da crítica textual.
Há uma situação
embaraçosa, porém
verdadeira, de erro nos
manuscritos. Alguns
cristãos de fala grega, ao
lerem o nome de Deus
como escrito em hebraico,
confundiam as letras
hebraicas com letras
gregas, e ao invés de
chamarem a Deus de
Yahweh diziam Pipi. Quem
nos dá essa informação é
Jerônimo, tradutor da
Vulgata latina no século 4
e, de fato, existem indícios
disso nos fragmentos que
temos da Hexapla de
Orígenes. Já pensou?
EVANGELHOS ANÔNIMOS?
21 Bolling, G. M. The Athetized Lines of the Iliad. (Linguistic Society of America: Baltimore, 1944).
22 Bird, Graeme D. “Multitextuality in the Homeric Iliad: The Witness of the Ptolemaic Papyri”
(Washington, D.C. : Center for Hellenic Studies; Cambridge, Mass.: Distributed by Harvard University
Press, 2010), p. 27-60.
24 O’Callangan, 26 e 27.
26 Thiede Carsten, Peter, e D’Acona, Matthew. Testemunha Ocular de Jesus [Coleção Be Reshit].
Riode Janeiro, Ed. Imago, 1996, p. 36.
27 Domenico Grasso, S.J. The Gospels, Historical and True (Surrey: Faith Pamphlets), pp. 5-8 (in The
Problem of Christ, Alba House, New York, 1969)
CAPÍTULO ONCE
CRÍTICA TEXTUAL DO
ANTIGO TESTAMENTO
INVESTIGANDO OS DOCUMENTOS
A principal fonte hebraica do Antigo Testamento são os Manuscritos do Mar
Morto e os textos copiados pelos massoretas da Idade Média. Os massoretas
eram copistas judeus que substituíram os antigos escribas (sopherins) por
volta do ano 500 até o ano 1000 d.C. Seu trabalho consistia em preservar,
cuidar e copiar as Escrituras Sagradas que hoje constituem o Antigo
Testamento. Embora grande parte dos manuscritos hebraicos medievais esteja
hoje na Europa, os massoretas centravam seu trabalho como copistas nas
cidades de Tiberíades e Jerusalém. O nome “massoretas” vem do hebraico
Masorah (ou Mesora), que quer dizer “transmissão de uma ideia religiosa ou
de qualquer tradição por escrito”. Por isso, os manuscritos por eles
produzidos são corretamente chamados de texto massorético.
Esses copistas judeus também realizaram a grande tarefa de vocalizar as
palavras em hebraico que não tinham vogais originalmente, e, por isso, ao
tornar-se língua morta, necessitou dessa indicação para poder ser lida. Além
disso, eles foram meticulosos na transmissão escrita do texto inspirado.
Eles também tentaram padronizar as divisões de parágrafos e manter a
reprodução adequada do texto para os futuros escribas, compilando listas dos
principais recursos ortográficos e linguísticos da Bíblia. Duas escolas
principais (ou famílias) de massoretas foram: Yaacov ben Naftali e Aaron
ben Asher, que preparou o texto hebraico ocidental, também chamado de
texto palestino, e Yaacov ben Naftali, responsável pelo texto oriental ou
babilônico.
Se compararmos as cópias feitas por cada uma dessas famílias,
perceberemos que ambas criaram dois tipos textuais ligeiramente diferentes.
A versão de ben Asher prevaleceu sobre a de bem Naftali e acabou se
tornando a base dos textos bíblicos modernos.
Apesar de seu valoroso esforço de preservar as Escrituras, não se pode
dizer que o trabalho dos massoretas esteja isento de deficiências. Assim,
outras versões do Antigo Testamento se fizeram importantes para suprir
certas carências do texto massorético. É o caso do Pentateuco Samaritano (os
samaritanos eram uma comunidade étnica e religiosa separada dos judeus que
só aceitavam o Pentateuco como Escritura Sagrada), dos Targuns, da LXX e
dos Manuscritos do Mar Morto.
De forma pioneira e embrionária, a primeira tentativa de padronização
de um texto a partir de diferentes manuscritos hebraicos ocorreu no século
16, por obra de Jacob ben Hayyim ibn Adonijah. Tendo muitos manuscritos,
ele sistematizou seu material e organizou a Masorah na segunda edição da
Bíblia Hebraica em Bomberg (Veneza, 1524–1525). Não obstante, o estudo
crítico do texto hebraico das Escrituras começou propriamente no fim do
século 18. Benjamin Kennicott publicou em Oxford uma lista de mais de 615
manuscritos hebraicos, massoréticos, advindos de diferentes bibliotecas da
Europa. Mais tarde, o perito italiano Giambernardo de Rossi publicou em
Parma as comparações de 731 manuscritos num pioneiro trabalho de colação
textual. Textos padrões das escrituras hebraicas foram também produzidos
pelo perito alemão Baer, e, mais posteriormente, por C.D. Ginsburg.
Rudolf Kittel, que era um famoso hebraísta, lançou em 1906 a primeira
edição da sua Bíblia Hebraica, fornecendo nela um estudo textual por meio
de notas de rodapé, que comparavam muitos manuscritos hebraicos do texto
massorético. Mas quando outros mais antigos e superiores se tornaram
disponíveis, Kittel empreendeu a produção de uma terceira edição,
inteiramente nova, que após a sua morte foi completada por seus colegas.
Hoje, o cômputo de manuscritos hebraicos do Antigo Testamento é
muito maior do que do Novo, e este é outro caso curioso da história da crítica
textual bíblica. Lembremos que os judeus, à semelhança dos cristãos dos
primeiros tempos, foram duramente perseguidos por movimentos
antissemitas da Europa (especialmente no tempo das cruzadas) e muitas
sinagogas foram incendiadas, tendo seus manuscritos destruídos. Mas havia
também outro tipo de destruição de textos motivada por uma razão oposta à
dessacralização — o respeito por um texto sagrado.
Normalmente, conforme o tratado judaico da Mishná Shabbat 16:1, uma
vez que que uma cópia da Escritura não podia mais ser usada (porque ficou
muito desgastada com o tempo), ela não poderia ser descartada casualmente
como se fosse lixo. Textos contendo o nome sagrado de Deus deveriam ser
enterrados ou, se o enterro não fosse possível, colocados em uma Geniza (ou
Genizah) que era uma sala dentro da sinagoga própria para guardar
manuscritos velhos — uma espécie de cemitério de livros sagrados. Se a
Geniza ficasse cheia, os manuscritos deveriam ser retirados e queimados
numa cerimônia de respeito.
Um fato, contudo, preservou importantes textos judaicos, tanto bíblicos
quanto não bíblicos. Provavelmente desde o início do século 11, os judeus de
Fustat, uma das comunidades judaicas mais importantes e ricas do
Mediterrâneo, reverentemente colocaram seus textos antigos na Geniza de
sua sinagoga localizada no velho Cairo. Notavelmente, no entanto, eles
colocaram não apenas as obras religiosas, como Escrituras hebraicas, livros
de oração e compêndios da lei judaica, mas também o que consideraríamos
como obras seculares e documentos do cotidiano: listas de compras, contratos
de casamento, ações de divórcio, páginas em árabe de fábulas, obras da
filosofia sufi e xiita, livros médicos, amuletos mágicos etc. Num momento
inusitado, doaram esse material para um cidadão inglês e tudo acabou sendo
preservado em Cambridge.
Foram mais de 260 mil manuscritos — o número exato varia de fonte
para fonte — e pelo menos 10 mil deles eram cópias hebraicas do Antigo
Testamento. Muitas, é claro, estavam fragmentadas e podiam ser datadas a
partir de 870 d.C. A maior parte da coleção hoje está arquivada em segurança
na universidade de Cambridge.
Some-se a essa lista os cerca de duzentos textos bíblicos encontrados
entre os manuscritos do Mar Morto, as versões da LXX, as cópias do
Pentateuco Samaritano, o papiro Nash, os targuns e outros exemplares
massoréticos (como o Códex de Alepo) e você terá a lista total de
manuscritos hebraicos disponíveis hoje para o exaustivo estudo da crítica
textual do Antigo Testamento.
Um fato surpreendente
sobre a transmissão da
Bíblia é que novas
informações continuam
surgindo, silenciando os
céticos e reforçando a
confiança na transmissão
do texto Bíblico. Uma
dessas descobertas foi feita
em 1970, perto da área
onde os pergaminhos do
Mar Morto foram
encontrados. Um grupo de
pergaminhos foi
encontrado na região do
En-Gedi, no deserto de
Israel. Infelizmente, os
textos foram gravemente
danificados pelo fogo e era
impossível lê-los usando a
tecnologia da época. A
única coisa que se sabia é
que esses textos haviam
sido copiados por volta do
ano 300 d.C., 500 anos
antes da mais antiga versão
do texto massorético que
possuímos.
Recentemente, porém,
técnicos do centro de
computação de Brent Sales
tornaram o texto
chamuscado finalmente
legível, e o que se
encontrou foi um texto
hebraico antigo que
coincidia perfeitamente
com o Texto Massorético
de Levítico 1:1-8.
Manuscritos Bíblicos de
Qumran
Os manuscritos de Qumran,
também conhecidos como
os Manuscritos do Mar
Morto, foram encontrados
num total de onze cavernas
(na verdade, doze, mas
uma, encontrada
recentemente, estava sem
textos antigos). Até o
momento, quase duzentos
manuscritos bíblicos foram
identificados entre esse
material, mais de cem
somente da caverna 4.
Todo livro do cânon do
Antigo Testamento está
representado em Qumran,
exceto Ester. Os livros mais
bem representados em
número de cópias são os
seguintes: o maior número
são cópias provenientes do
Pentateuco (15 manuscritos
de Gênesis, 15 de Êxodo, 9
de Levítico, 6 de Números,
25 de Deuteronômio). Dos
Profetas maiores temos 18
cópias de Isaías, 4 de
Jeremias, 6 de Ezequiel, 8
de Daniel e 8 dos Profetas
Menores. Dos Salmos
encontraram 27 cópias com
uma ordem bem diferente
do texto massorético.
Embora o termo
“Pergaminhos do Mar
Morto” seja oficialmente
aplicado apenas ao corpus
de manuscritos associado à
biblioteca de Qumran,
outros sítios na região do
Mar Morto produziram
cópias que foram
encontradas e incorporadas
à coleção. Os principais
sítios são os de Wād̂
Murabbaʿât, Naḥal Ḥeber e
Massada. Os manuscritos
de Murabbaʿt e Naḥal
Ḥeber são particularmente
interessantes, pois vêm do
tempo da Segunda Revolta
Judaica sob Bar Cochba,
(132–135 d.C.).
Portanto, sabemos que os massoretas judeus da Idade Média foram
meticulosos em seu trabalho de copiar as escrituras hebraicas. Eles se
esforçavam para garantir a confiabilidade do texto. Por isso, eles eram
altamente treinados e minuciosamente observados, copiando cada letra,
parágrafo e frase para então compará-los com o original. Um único erro
exigiria a destruição imediata do texto. Seus erros podiam se dar por
reproduzirem uma forma que já estava no manuscrito do qual copiavam e não
por uma mudança caprichosa. Eles deveriam levar a sério o conselho do
Rabino Samuel cujas palavras estão preservadas no Talmude: “Meu filho, por
ser este um trabalho celestial, não omita nem uma letra, caso contrário, o
mundo será destruído” (B. Sota 20 a). Hipérbole à parte, este é um
testemunho da seriedade daquele trabalho.
De fato, essa seriedade é hoje confirmada pela atividade acadêmica. Em
conjunto, a comparação textual entre o texto Massorético, a LXX, os
manuscritos do Mar Morto e outros geralmente suporta a precisão com a qual
o texto hebraico foi copiado.
Ao mesmo tempo, os manuscritos de diferentes períodos nos fornecem
leituras anteriormente desconhecidas e que nos dão uma maior compreensão
das variantes que já tínhamos em outros textos e versões. Graças a esse
trabalho técnico, estamos em uma posição melhor para explicar o
relacionamento entre as várias cópias manuscritas das Escrituras.
Antes das descobertas no deserto da Judeia, os trabalhos de crítica
textual do Antigo Testamento só poderiam ser feitos indiretamente com o
estado do texto, isto é, sugerindo uma forma alternativa do texto hebraico que
foi usado pelos tradutores das mais diversas versões. As descobertas em
Qumran forneceram cópias reais com os quais o crítico de texto pode
trabalhar. É justo dizer que as descobertas de Qumran revolucionaram o
campo da crítica textual.
ALTA CRÍTICA
ACRÉSCIMOS EDITORIAIS
29 Apud COSTA, Hermisten Maia Pereira da. Raízes da teologia contemporânea. São Paulo: Cultura
Cristã, 2004., p 304.
COMPREENDENDO
AS ESCRITURAS
LEITURAS SUPERFICIAIS
Um grupo de pessoas estava reunido numa espécie de “pequeno grupo” que
um pastor distrital tinha acabado de inaugurar. Elas se propuseram a estudar o
livro de Daniel. Este fato aconteceu com Ronald D. Worden, professor de
Bíblia no Houston Graduate School of Theology. Ele disse que o pastor
iniciou conduzindo um estudo sobre a festa de Belsazar. Então, ele pediu que
cada um ali presente comentasse sobre a história e seu significado. Um dos
irmãos sugeriu que a tônica do texto era a irreverência para com as coisas de
Deus, a saber, os vasos sagrados do Templo.
Outros prontamente retornaram a discussão para o que os vasos
significariam hoje. Ora, Paulo diz que nós somos os vasos de Deus (vasos
para honra ou para desonra, 2Timóteo 2:20-22), logo os vasos sagrados do
templo são pessoas. A diretora do departamento infantil não tardou em dizer
que as crianças eram os vasos mais puros e mais negligenciados de hoje e que
muitos pais, professores e membros de igreja, como o rei babilônio,
desonram esses pequenos vasos através da negligência, do abuso infantil etc.
Tudo muito lindo, gerando muitos pontos de vista interessantes. O único
problema: fugiram por completo da história e do objetivo original do livro.
Como o próprio professor Worden concluiu: talvez o senso intuitivo das
pessoas espirituais a levaram a uma aplicação até válida da Palavra de Deus
aos nossos dias, mas ao custo de fugir por completo daquilo que o livro teria
a nos dizer a partir de sua perspectiva histórica real.
Certamente devemos nos perguntar o que o texto diz para nós e que
aplicação ele teria em nossos dias, mas essa pergunta será muito mais
satisfatoriamente respondida se incluir métodos hermenêuticos de
interpretação que tenham a ver, especialmente, com o contexto histórico e
literário no qual o livro foi produzido. Afinal, os próprios autores da Bíblia
trabalharam suas narrativas dentro de uma perspectiva histórica de
compreensão da realidade. Este, portanto, é o grande desafio hermenêutico de
hoje: ensinar a Bíblia sem negligenciar o contexto histórico e o objetivo pelo
qual foi escrita.
O papel do teólogo biblista, concernente aos fatos que interpreta, deve
ser “voltar lá”,31 quebrar o lapso temporal entre ele e a testemunha e
compreender o que está por detrás das palavras. Vencer o lapso do tempo não
significa desconsiderar os aspectos históricos ou literários da narrativa nem
se prender apenas a isso. É dever do exegeta transpor o nível meramente
histórico da investigação para o nível da investigação teologica.32 Afinal, o
escritor bíblico testemunha — graças à inspiração recebida — o propósito de
um Deus eterno que lida com um povo circundado por uma realidade
histórica. Noutras palavras, o profeta capta através dos fatos e ocorrências
que viu ou ouviu a revelação de um Deus aparentemente oculto que age na
história dos homens. Mas as abordagens pós-modernas têm trazido
considerável negligência a esse exercício hermenêutico com visíveis
prejuízos à fé doutrinária.
Veja esta interessante citação de Daniel B. Wallace:
ESCOLA ALEXANDRINA
FILO DE ALEXANDRIA
ORÍGENES DE ALEXANDRIA
NOVOS MÉTODOS
32 G. Hasel. Old Testament Theology: Basic Issues in Current Debate. Grand Rapids, MI: Eerdmans,
1974, p. 75.
33 Citado por R. Price. Searching for the Original Bible. Eugene, Oregon: Harvest Publishers, 2007, p.
19.
35 Eldon J. Epp. “Issues in New Testament Textual Criticism: Moving from the Nineteenth Century to
the Twenty-First Century” in Rethinking New Testament Textual Criticism, Ed. David A. Black. Grand
Rapids, MI: Baker, 2002, p. 21.
37 Buscar a origem da língua era descobrir a origem do mundo. Havia duas escolas de pensamento
sobre a origem da língua: a dos anomalistas (ou da língua natural), a que pertencem, sobretudo, os
filósofos estoicos e os gramáticos da escola de Pérgamo; e a dos analogistas (ou da língua
convencional), dos gramáticos de Alexandria, sobretudo Dionísio de Trácia e Apolônio Díscolo. Os
anomalistas insistiam na frequência das exceções e na presença de diversos tipos de analogias dentro de
uma mesma classe de palavras. Estabeleceram que a língua não podia depender da convenção do
homem; se assim fosse, deveria ser mais regular, porque a lógica prevaleceria sobre a irregularidade.
Resulta que a língua nasce da natureza, revelada no uso. A resistência à criação de línguas planejadas,
que acontece ainda em tempos modernos, apresenta-se como um resíduo recessivo do anomalismo
estoico. Admitiam os estoicos uma relação entre o significado da palavra e seu portador material, de
cuja forma natural este significado derivava. Ainda que o uso corrompesse a palavra natural, ela
permanecia, podendo ser procurada. Em consequência, estimularam os estoicos à ciência da etimologia
para estudo dos étimos (étymos = verdadeiro, real, étimo).
38 Rita Copeland e Peter T. Struck (Eds). The Cambridge Companion to Allegory. Cambrigde:
Cambridge University Press, 2010, p. 2.
40 Theodore L. Kassier. The truth disguised: allegorical structure and technique in Gracian’s
“Criticon”. Londres: Tamesis Books Limited, 1976, 8 nota 19; Ellen Birnbaum. “Allegorical
Interpretation”. In: David Aune, Torrey Seland e Jarl Henning Ulrichsen (Eds). Neotestamentica et
Plilonica: Studes in Honor of Perder Borgen. Leiden: Brill, 2002, p. 308 e 309.
41 Jon Whitman. Allegory: the Dynamics of an Ancient and Medieval Technique Cambridge: Harvard
University Press, 1987, p. 2.
42 Rebecca Saunders. “The Agony and the Allegory: The Concept of the Foreign, the Language of
Apartheid, and the Fiction of J. M. Coetzee”. Cultural Critique, 47, (Winter 2001):223-224.
43 De Mund. Op. i.38; de conf. Ling. i. 405; Leg. All. i. 128; de Jos. Ii. 59.
44 Stromata 1.5.28.3. Veja também: Eric Orson. Clement of Alexandria. Cambridge: Cambridge
University Press, 2008, p. 88-92; e Annewies Van Den Hoek. Clement of Alexandria and his Use of
Philo in the Stromateis. An Early Christian reshaping of a Jewish model (Supplements to Vigiliae
Christianae III), (Leiden: E.J.Brill, 1988), p. 159.
46 e.g. Leg. all. i. 44; de Conf. Ling. i. 425; de Sosnn. 634; de Spec. Leg. ii. 329; de Agric. i. 324 etc.
47 Hoje existem autores que seguem outras abordagens alternativas, como a abordagem narrativa, a
abordagem retórica etc. Mas estes três segmentos ainda são os clássicos e modernos métodos que se
mostram apenas como desdobramentos deles. Para uma visão geral das modernas abordagens veja J. A.
Fitzmeyer, Escritura, a alma da Teologia. São Paulo: Loyola, 1997,
48 Walter C. Kaiser, Jr., Toward an Exegetical Theology. Grand Rapids: Baker, 1981, p. 47; David
Stacey, Interpreting the Bible. Nova Iorque : Seabury, 1977.
49 Veja E. Krentz, The Historical Critical Method. Filadélfia, PA: Fortress Press, 1975. Sobre o
predomínio do método nos estudos do Novo Testamento veja: W. G. Kümmel, The New Testament: the
History of the Investigation of Its Problems. Nashville, TN: Abingdon Press, 1972..
50 Cf. J. A. Fitzmyer. Escritura, a alma da Teologia. São Paulo, SP: Loyola, 1997, p. 26 e 27.
CAPÍTULO TREZE
A BÍBLIA
HOJE
A MORTE DO AUTOR
ESTRUTURALISMO E DESCONSTRUCIONISMO
Esta abordagem centralizada no texto e popularizada por Frei foi uma das
primeiras, mas não a única proposta desta nova hermenêutica pós-moderna.
Duas outras propostas seguiram paralelas: o estruturalismo e o
desconstrucionismo.
O estruturalismo surgiu primeiramente na França, por volta dos anos
1960, como fruto da mesma virada linguística proposta por Beardsley,
Wimsatt Jr e que esteve nas bases da Nova crítica literária. Não se pode
esquecer, é claro, da linguística estrutural moderna fundada por Saussure ―
disciplina que gerou o estruturalismo propriamente dito ― e o formalismo
russo, que questionava de maneira contundente aquela abordagem literária de
formação positivista com excessivos pressupostos sociais e ideológicos,
reveladora de um artificial esforço teorizador imbuído de um impressionismo
fácil, privilégio de formadores ideológicos.60
Ambos, estruturalismo e formalismo russo, se uniram numa mesma
teoria que procurava definir as funções da linguagem, sendo mais relevante a
distinção entre a função referencial e a poética. A primeira faz uso da
linguagem denotativa, e a outra da conotativa. Qual é a diferença? A
linguagem denotativa está diretamente ligada à significação, ou seja, ao seu
sentido real, o sentido do verbete de dicionário. Já a linguagem conotativa
trabalha com figuras de linguagem, com uma extensão do sentido literal. Veja
os exemplos:
1. Colhi uma flor do jardim. (denotativo)
2. Sua filha é mesmo uma flor! (conotativo)
▶ Criticismo retórico
Este é um movimento inspirado na expressão usada por James Muilenburg
num discurso pronunciado em 1968 quando era presidente da Society of
Biblical Literature.
Vários acadêmicos (tanto liberais quanto conservadores) têm se filiado
ao movimento. Nomes como Robert Alter, James Kugel, Meir Stenberg,
Adele Berlin, Richard Patterson e Tremper Longman são alguns dos que
engrossam a fileira do criticismo retórico. Mas em que consiste essa
abordagem? Trata-se de um estudo do texto bíblico que visa determinar os
padrões estruturais que o autor usou a fim de comunicar sua mensagem.66
Estes padrões incluem paralelismos, quiasmos, desenvolvimento temático,
palavras-gancho etc.
É um exercício com muitos elementos positivos, embora alguns o
objetem por usar ferramentas convencionais do criticismo literário. Uma de
suas vantagens é tentar descobrir os parâmetros de compreensão dos
remetentes originais a fim de entender por que o autor muitas vezes escreve
numa sequência ou concatenação de ideias estranha à nossa argumentação
ocidental. Mas existe o problema do artificialismo onde, por exemplo,
quiasmos forçados são encontrados no texto, demonstrando ser mais
estruturas imaginadas pelo exegeta moderno que intenção original do autor
inspirado.
▶ Análise do discurso
▶ Criticismo narrativo
▶ Criticismo redacional
Uma vez que as origens desse método estão fortemente ligadas ao criticismo
liberal, muitos autores ainda nutrem sérias reservas ao seu uso e eficácia. Ao
ouvirem seu nome é quase inevitável a associação com as antigas fórmulas
alemãs do Redaktionsgeschichte, Kompositionsgeschichte ou
Redaktionstheologie. Afinal, esse método foi fortemente utilizado por
acadêmicos do Novo Testamento com o objetivo de negar a historicidade dos
evangelhos e dos principais elementos confessionais sobre a divindade de
Jesus de Nazaré.
Contudo, o termo “redacional” neste contexto refere-se apenas ao
processo de edição feito pelo próprio autor bíblico ou a certos acréscimos e
compilações maiores feitas, possivelmente, por algum editor. Exemplos de
edição aceitos nesta abordagem: atualizações simples como as de Gênesis
11:31;70 Êxodo 1:11; Deuteronômio 34; anotações titulares como Daniel
10:1; a reunião de duas ou três fases proféticas de Isaías num único livro etc.
O criticismo redacional, portanto, é o estudo das escolhas editoriais feita
pelos autores bíblicos a partir de todo o conjunto de informações que tinham
à sua disposição. Isso inclui detalhes como a ordem evangélica dos
acontecimentos, a ênfase num aspecto e não em outro etc. Estudos recentes
de comparação entre os sinóticos têm sido enriquecidos por esse tipo de
ferramenta exegética.71 Novamente, porém, é importante alertar contra o
perigo da especulação sobre reconstruções editoriais que estão além do nosso
alcance hermenêutico. O melhor, neste caso, é trabalhar com o texto como
produto final.72
▶ Criticismo cultural
52 Helen Gardner. The Business of Criticism. Oxford: Oxford University Press, 1959, p. 97.
53 Ferdinand de Saussure. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 2002, p. 96.
55 Apud R. Selden e P. Widdowson, A. Eds. Reader’s Guide to Contemporary Literary Theory. 4. ed.
Londres: Harvester, 1997. p. 52.
56 Brice R. Wachterhauser. Hermeneutics and Modern Philosophy. Nova Iorque: Nova Iorque
University Press, 1991, p. 31.
57 Idem.
58 Wimsatt, William e Monroe C. Beardsley. “The Intentional Fallacy” in The Verbal Icon: Studies in
the Meaning of Poetry. Lexington: University of Kentucky, 1954, 3-18. Este artigo está reproduzido no
livro de Nigel Warburton, Ed., Philosophy Basic Readings. Nova Iorque: Routledge, 2004, p. 480-492.
59 Veja mais sobre esta abordagem no trabalho de Northrop Frye, The Great Code: the Bible and
Literature. Nova Iorque : Harcourt Brace, 1982.
61 Embora, a bem da verdade, um dos grandes impasses dos teóricos literários é a definição uniforme
de “estrutura”. V. M. Aguiar e Silva, Teoria da literatura. Coimbra: Livraria Almedina, 1973 8ª. Ed.,
23.
62 Fernando Canale, “Desconstrución y Teología: Una propuesta Metodológica” in DavarLogos 1.1
(2002): p. 3-26.
63 Kevin J. Vanhoozer. “The Reader in the New Testament Interpretation” in Hearing the New
Testament [Ed. Joel B. Green]. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1995, p. 313-314.
64 M. Peters. Pós-estruturalismo e filosofia da diferença. Belo Horizonte, MG: Ed. Autêntica, 2000, p.
43.
65 Embora aplicados ao Antigo Testamento, veja exemplos desta abordagem em J. Cheryl Exum e
David J. A. Clines (eds.), The New Literary Criticism and the Hebrew Bible JSOTSup, 143. Sheffield:
JSOT Press, 1993.
67 E. Porter e J. T. Reed (eds), Discourse Analysis and the New Testament: Approaches and Result.
Sheffield: Sheffield Academic Press, 1999; D. A. Carson [ed] Discourse Analysis and Other Topics in
Biblical Greek. Sheffield: JSOT Press, 1995.
68 Gerald Prince. “Narratology”, in Johns Hopkins Guide to Literary Theory and Criticism (ed.)
Michael Groden e Martin Kreiswirth. Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press, 1994, p. 524.
69 Grant R. Osborne. The Hermeneutical Spiral. Downers Grove: InterVarsity Press, 1991, p. 154
71 Johannes C. De Klerk. “Situating Biblical Narrative Studies in Literary Theory and Literary
Approaches” Religion & Theology 4/3 (1997) in http://www.unisa.ac.za/default.asp?
Cmd=ViewContent&ContentID=7379&P_ForPrint=1.
72 Sobre a cautela com que se deve empregar esta ferramenta crítico-narrativa veja D. A. Carson,
“Redaction Criticism: On the Legitimacy and Illegitimacy of a Literary Tool” in Scripture and Truth D.
A. Carson e John Woodbridge [Eds] Grand Rapids, MI: Zondervan, 1983, p. 119-142.
73 Richard N. Soulen e R. Kendall Soulen, Handbook of Biblical Criticism, 3th ed. revised and
expanded. Atlanta, Ga, John Knox, 1981, p. 23.
74 Para um posicionamento dos fatores positivos e negativos do criticismo cultural para uma
hermenêutica conservadora das Escrituras veja: Gerald A. Klingbeil. “Cultural Criticism and Biblical
Hermeneutics: Definition, Origins, Benefits, and Challenges”. Bulletin for Biblical Research 15 (2005):
261-77.
75 Como disse H. R. Elam: “Texts are fragments without closure or resolution. No text is self-
sufficient; each text is fraught with explicit or invisible quotation marks that dispel the illusion of its
autonomy and refer endlessly to other texts…”. “Intertextuality” in The New Princeton Handbook of
Poetic Terms Princeton, NJ: Princeton University Press, 1994, p. 141-143.
CONHECIMENTO
QUE LIBERTA
Enquanto isso, no
Brasil…
79 Catherine Hezser. Jewish Literacy in Roman Palestine. Tübingen: Mohr Siebeck, 2001, p. 496.
80 Meir Bar-Ilan. “Literacy among the Jews in antiquity”, Hebrew Studies, 44, 1 (2003): 217-222.
81 PEREZ, Luana Castro Alves. “Analfabetismo funcional”. Brasil Escola. Disponível em:
<https://brasilescola.uol.com.br/gramatica/analfabetismo-funcional.htm>. Acesso em: 19/04/2019.
83 Guthrie, G. Read the Bible for Life: your Guide to Understanding and Living God’s Word.
Nashville, TN: B&H, 2011, p. 4.
84 Crosby, Cindy. “Not Your Mother’s Bible”. Publisher’s Weekly, 27 Oct. 2006.
86 Robert P, Lightner. The Savior and the Scriptures. Grand Rapids: Baker Book House, 1966, p. 30..
87 R. T. France. Jesus and the Old Testament. Vancouver: Regent College Publishing, 1998, p. 83ss.
90 Sobre esse assunto veja A. Evans. “The Scriptures of Jesus and His Earliest Followers” in L. M.
McDonald and J. A. Sanders (eds). The Canon Debate. Peabody MA: Hendrickson, 2002, p. 191-194.
CAPÍTULO QUINZE
O MÉTODO
A FUNÇÃO DA EXEGESE
O termo exegese é uma palavra-chave nesta discussão. Mas ela também pode
ter múltiplos significados, dependendo de quem a utiliza e de quando é
empregada. Tal situação demanda que o estudante tenha muito claro em sua
mente o que entende por exegese e se o seu pensamento coincide com o
pensamento do intérprete bíblico que está consultando.
Parte da ambiguidade do termo se deve à acirrada distinção que se faz
entre ele e os termos “interpretação” e “hermenêutica”.105 Pior ainda quando
a investigação se traduz numa “eisegese” que, como definem Patzia e
Petrotta,106 seria a tentativa errônea de “introduzir” em vez de “extrair” um
significado autêntico do texto. Por isso, autores como Ebeling e Evans
preferem assumir que hermenêutica, exegese e interpretação são sinônimos
que podem perfeitamente ser usados de modo intercambiável.107
De modo geral, tanto a exegese como a hermenêutica e a interpretação
bíblica fazem parte da heurística que é a tentativa intelectual de se encontrar
o significado de algo através da análise, reflexão, investigação. É claro que,
para os que se aproximam da Bíblia com o pressuposto de estarem
investigando a Palavra de Deus, a iluminação deve estar presente no topo da
lista, mesmo que para outros ela esteja fora dos mecanismos convencionais
da heurística, que é o nome que se dá ao método ou processo criado com o
objetivo de encontrar soluções para um problema.
Estudar a Bíblia, portanto, envolve um procedimento simplificador,
embora não simplista, que, em face de questões difíceis que o texto apresenta,
envolve a busca por uma solução que pode não ser a mais fácil, nem a ideal,
mas será a que mais se aproxima de encontrar respostas viáveis às perguntas
da fé, ainda que não sejam as mais satisfatórias.
Esse procedimento requer tempo, disposição para o aprendizado e
compromisso com as verdades de Deus. Ele pode ser tanto uma técnica
deliberada de solução de problemas, como uma operação automática fruto de
uma união espiritual entre o estudante da Bíblia e o Espírito Santo, ambiente
que só existe numa relação íntima com Deus e com outros irmãos de fé.
Afinal de contas, ao mesmo tempo em que a Bíblia apela para uma
decisão pessoal do indivíduo para com Deus, também demanda uma
interpretação em conjunto. Ou seja, Deus não incentiva ninguém a ser um
cristão avulso. A Igreja, corpo místico de Cristo, é o lugar onde a
interpretação conjunta da Palavra de Deus terá maior resultado efetivo.
▶ Pressuposições
Conhecer os pressupostos teológicos de um biblista é essencial para avaliar e
compreender sua interpretação do texto. Uma listagem mais conservadora de
entendimento da Bíblia partiria dos seguintes pressupostos:
▷ 1. Escolha do texto
Não se limite a ler apenas um ou dois versos, procure ler todo o capítulo no
qual a passagem está inserida, embora a atenção evidentemente deva estar
direcionada para aquela porção textual propriamente dita. Leituras, releituras,
memorização e meditação na passagem serão importantes tarefas nesta etapa
preliminar.
Os que trabalham com línguas bíblicas (hebraico, aramaico e grego),
deveriam ainda fazer uma tradução pessoal do texto que querem analisar.
Esse é um esforço muito importante e recompensador. A seguir, podemos
comparar nossa tradução com outras já existentes. Assim conheceremos as
várias compreensões possíveis do mesmo original e verificaremos a
existência ou não de possíveis impasses.
Caso não tenhamos domínio suficiente das línguas originais, podemos
recorrer a textos interlineares ou nos limitarmos à comparação entre
traduções disponíveis. De modo limitado, essa alternativa também ajudará a
perceber as dificuldades do texto original. Mas na escolha de traduções,
cuidado com os textos que são paráfrases (Bíblia Viva) ou textos que foram
traduzidos não a partir dos originais, mas de outras versões modernas,
especialmente em inglês (é o caso da Nova Versão Internacional).
Geralmente, há três tipos de tradução: a) formal ou literal; (b) funcional
ou dinâmica; e (c) a paráfrase. A primeira (formal) procura respeitar a forma
linguística do original. Ela renuncia à compreensão imediata para preservar o
pensamento original (incluindo as expressões idiomáticas). Esse tipo de
tradução aparece também nas versões interlineares. A segunda (dinâmica)
visa diminuir as dificuldades que o leitor moderno tem ao se deparar com um
texto tão antigo e geograficamente tão distante de nós. Já a paráfrase
reescreve o texto em linguagem moderna, aplicando muitos conceitos e ideias
do próprio tradutor. Veja alguns exemplos:
Gênesis 29:14
Hebraico: “Você é meu osso e minha carne.”
Nova Versão Internacional (NVI): “Você é sangue do meu sangue.”
Nova Tradução na Linguagem de Hoje (NTLH): “Sim, de fato você é da
minha própria carne e sangue.”
A mensagem: “Verdadeiramente és tu o meu osso e a minha carne.”
1Samuel 25:22
Hebraico: “[…] se eu deixar permanecer ao menos um que urine no
muro […].”
NVI: “[…] caso eu deixe vivo um só do sexo masculino […].”
NTLH: “[…] se eu não matar até o último daqueles homens […].”
João 9:24
Grego: “Dá glória a Deus.”
NVI: “Para a glória de Deus, diga a verdade.”
NTLH: “Jure por Deus que você vai dizer a verdade.”
A mensagem: “Dá glória a Deus.”
Este é um passo sério que não pode ser negligenciado, pois uma
diferença de tradução pode gerar grande diferença de interpretação.
1. Cuidado para não ser traído pela moderna divisão em capítulos e títulos,
pois ela é, em muitos momentos, defeituosa. Por exemplo: João 10:1-18
tem como título “Jesus, o bom pastor”, mas esse título ignora o verso 7,
no qual ele diz ser a porta das ovelhas. Igualmente os vv. 19-21 não
deveriam vir à parte, pois pertencem ao contexto do capítulo 9.
2. Tempo e local: estes são elementos muito importantes, principalmente
se estivermos trabalhando textos históricos, como é o caso dos
evangelhos. O tempo pode indicar o início, a continuação, a conclusão
ou a repetição de um episódio. O local é o espaço físico onde se
processa a situação (exemplos: Marcos 16:1; Lucas 1:5).
3. Argumento: há algumas partículas que podem indicar mudança de
assunto ou de argumentação. Por exemplo: “por esta razão”,
“finalmente”, “a propósito de” (1Coríntios 12:1; 2Timóteo 4:6). Note
que, às vezes, não haverá mudança de argumentação, mas de
perspectiva. Paulo, por exemplo, gosta de usar a chamada diatribe
(criação de uma discussão fictícia), veja R. 7:13; 11:1). Veja também
Lucas 1:26 e depois o verso 39.
4. Anúncio de tema: alguns textos trazem, às vezes, a antecipação de
assuntos que tratarão a seguir. Exemplo: Hebreus 2:17,18 anuncia o
próximo tema, Jesus Cristo como sumo sacerdote fiel e misericordioso,
que será tratado em 3:1―5:10.
5. Estrutura: perceba a organização física da unidade, se ela tem algum tipo
de estrutura definida (isso pode indicar inclusive subestruturas). É o caso
do Quiasmo109 (Mateus 7:6), o paralelismo (Mateus 7:7), a retórica que
usa recursos como metáfora (João 15:1; 10:9; Mateus 5:13), sinédoque
([toma a parte pelo todo ou vice-versa], 1Coríntios 11:26; Atos 24:5),
ironia (2Coríntios 11:5; 12:11, comp. com 11:13), tipologia (Mateus
12:40; João 3:14).
6. Composição: veja se há leitmotiv110 ou palavra-chave costurando o
texto. Aqui, a palavra-chave pode vir por repetição ou por sinônimos.
Ex: circuncisão, judeu, Lei em Romanos.
7. Fórmulas específicas: expressões que indicam o estilo da argumentação
ou do texto. Ex: execração (“ai”), humor/charada (“qual dentre vós”).
Uma vez feita a delimitação, procure ver o que aquela unidade está
dizendo. Qual é sua principal tese? Se for histórica, o que ela está contando
afinal? Assim, em relação ao contexto imediato, procure ver como essa
passagem participa das temáticas expressas nos capítulos que a antecedem e
nos que seguem seu fechamento. As passagens anteriores afetam a
compreensão do texto? Sem elas, que impressões errôneas poderíamos ter?
▷ 6. Análise gramatical
Com o contexto histórico bem definido, podemos voltar ao texto e fazer uma
análise gramatical dele. Aqui daremos atenção às frases e à sintaxe, bem
como às palavras e à semântica. Alguns lembretes do gênio da língua grega
como aparece na Bíblia (koiné), serão úteis:
92 W. Kasper. Unidad y pluralidad en teología. Los métodos dogmáticos. Salamanca: Sigueme, 1969,
p. 15-16.
94 Stanley Grenz. Revisioning Evangelical Theology. Downers Grove, IL.: InterVarsity Press, 1993, p.
31..
95 Clark Pinnock e Delwin Brown. Theological Crossfire, an Evangelical Liberal Dialogue. Grand
Rapids, MI.: Zondervan Publishing House, 1990, p. 37..
97 Millard Erickson. Christian Theology. Grand Rapids, MI: Baker, 1998, p. 70.
98 Sandra Harding é uma filósofa feminista, mas sua definição pode ser aplicada indistintamente em
outras abordagens cognitivas. Sandra Harding. “Introduction” in Feminism and Methodology, [ed.
Sandra Harding] Bloomington: Indiana University Press, 1987, p. 2, 6-8..
100 Bernard Ramm. Protestant Biblical Interpretation. Grand Rapids, Mi: Baker Book House, 1970, p.
1.
101 Anthony C. Thiselton. The Two Horizons. New Testament Hermeneutics and Philosophical
Description with Special Reference to Heidegger, Bultmann, Gadamer, and Wittgenstein. Grand
Rapids, MI: Eerdmans/Exeter Paternoster, 1980, p. 11.
102 APUD. “A Bible Hermeneutics Definition how Bible Interpretations, or Hermeneutics of the Bible,
Affect the Way we Read the Scriptures”. Disponível em:
<http://www.biblicalarchaeology.org/daily/biblical-topics/bible-interpretation/a-bible-hermeneutics-
definition/>.
103 Walter C. Kaiser Jr. Toward an Exegetical Theology. Grand Rapids: Baker, 1981, p. 47; David
Stacey. Interpreting the Bible. Nova Iorque : Seabury, 1977.
104 Cf. Richard M. Davidson. “Biblical Interpretation” in Raoul Dederen (Ed.) Handbook of Seventh-
day Adventist Theology. Hargestown, MD: Review and Herald, 2000, p. 60.
105 Veja uma tentativa de distinção em: Stanley E. Porter. Handbook to Exegesis of the New
Testament. Leiden: Brill, 1997, p. 5-8.
106 Arthr G. Patzia e Anthony J. Petrott. Dictionary of Biblical Studies. Downers Grove, Il:
InterVarsity Press, 2002, p. 40.
107 G. Ebeling. Word and Faith. Londres: SCM Press, 1963, p. 321; C. F. Evans. Is “Holy Scripture”
Christian? Londres: SCM Press, 1971, p. 31.
108 Gordon D. Fee e Douglas Stuart. São Paulo: Vida Nova, 1986, p. 281-282.
109 John W. Welch (ed.). Chiasmus in Antiquity: Structures, Analyses, Exegesis. Hildesheim:
Gerstenberg Verlag, 1981; idem, “Criteria for Identifying the Presence of Chiasmus.” Journal of Book
of Mormon Studies 4:2 (1995): 1-14.
110 Leitmotiv é uma palavra alemã para indicar uma imagem, qualidade, ação ou objeto que ocorre em
toda a narrativa, poema ou oráculo, é o que costura o tema. Também se refere a um tema que se repete
em diferentes textos de um mesmo autor. Esta palavra é muito usada num sentido mais filosófico que
técnico. Palavra-chave cabe melhor ao nosso intento.
CAPÍTULO DEZESSEIS
QUE TRADUÇÃO
DEVO USAR?
TRADUTORES OU TRAIDORES?
É interessante como as teorias da conspiração tomam conta de páginas e mais
páginas da Internet. A religião e a Bíblia não estão imunes a ataques de
pessoas, muitas vezes sem treinamento acadêmico ou frustradas por terem
perdido um emprego, que lançam toda dúvida possível para desacreditar o
trabalho dos tradutores bíblicos. É claro que imprecisões existem e correções
precisam ser feitas. Deus, no entanto, preservou aquilo que o seu Espírito
inspirou aos homens escreverem e as traduções são uma forma legítima de
divulgar a mensagem de Deus.
É uma pena que nem todos valorizam o árduo trabalho de um tradutor,
principalmente considerando as dificuldades que passaram para transmitir o
conteúdo bíblico a um povo de língua estrangeira. Existe um ditado vindo por
vias tortas desde o italiano até nossos dias que afirma: “Traduttore,
traditore”, isto é, o tradutor é um traidor.
Ainda que haja realmente tradutores desonestos (nenhuma profissão está
isenta de incompetentes), nada estaria mais longe da verdade do que dizer
que os tradutores são traidores da versão original. Tal acusação refere-se à
prática dos dragomanos, que eram os intérpretes do governo Otomano, desde
o século 17 até a revolução grega de 1821. Eles não eram necessariamente
enganadores na arte da tradução, mas reconheciam que havia termos
impossíveis de se traduzir para outro idioma.
A expressão que os italianos e europeus usavam não era tanto no aspecto
ético, mas na dificuldade do ofício, pois, por mais que o tradutor seja
competente e honesto, estará sujeito às limitações no processo de tradução.
Havia também o elemento da diplomacia que obrigava os tradutores, muitas
vezes, a usar eufemismos ou mudar ligeiramente o que os monarcas diziam,
principalmente quando a declaração poderia resultar num conflito militar.
Sabedores que os líderes otomanos, além de não falarem nenhuma
língua europeia, eram em grande parte cruéis, caprichosos e de linguajar
obsceno, os dragomanos desenvolveram a astúcia de amenizar as traduções
que levavam dos sultões para os monarcas, e vice-versa. Assim, foram
evitadas muitas guerras e execuções, porém, ao custo de não traduzirem a
mensagem exatamente como foi dita.
Um caso curioso foi aquele que evitou um incidente diplomático entre o
sultão e a rainha da Inglaterra:111
[…] quando o sultão Murad II
concedeu permissão para os
mercadores ingleses fazerem
comércio nas terras otomanas, a
carta original em turco dizia que a
rainha Elizabeth “demonstrou sua
subserviência e devoção e declarou
sua servidão e afeto” ao sultão.
Para a comunicação posterior com a
corte inglesa, a carta foi traduzida
pelo grande dragomano para o
italiano, que ainda era a língua
original do império otomano. Em
italiano, no entanto, a carta não diz
o mesmo: expressa a fórmula turca
elaborada de forma econômica
como sincera amicizia. […] Ele (o
dragomano) sabe que seu mestre
nunca considerará a rainha da
Inglaterra como uma monarca de
igual poder; e, como diplomata
experiente, ele também sabe que
Elizabeth I possivelmente não
aceitaria a expressão de “servidão”
ao sultão, mesmo em um floreio
convencional.
ANTIGO TESTAMENTO
Talvez a mais antiga tradução feita do Antigo Testamento foi, na verdade,
uma paráfrase explicativa que os judeus normalmente chamaram de Targum.
Suas origens remontam aos tempos em que Judá foi atacada pelos babilônios
e seu povo levado em cativeiro.
Nesta mesma época, em que Nabucodonosor levou os habitantes de
Jerusalém e Judá para morarem às margens do rio Tigre e Eufrates, a
linguagem da vida cotidiana na Assíria e na Babilónia havia deixado de ser
aquela que conhecemos pelas inscrições cuneiformes para tornar-se o
aramaico, adotado como língua diplomática e comercial em todo o território.
Era a língua franca da época.
Morando por décadas ali, os judeus também assimilaram esse idioma e
seus filhos nascidos na Babilônia passaram a ter o aramaico, e não mais o
hebraico, como língua materna. Eles até tentavam manter em casa
conversações em hebraico, mas a pressão externa era maior e em pouco
tempo os mais jovens já não falavam mais o idioma de seus pais. Perdeu-se
quase toda a fluência da língua falada pelos hebreus antes do cativeiro.
Uma prova disso é que após o cativeiro, quando Esdras e os levitas leem
em voz alta a lei de Moisés para o povo, foi necessário o trabalho de
interpretação para que pudessem entender o conteúdo. A maioria dos que
voltaram do exílio já não entendiam o hebraico, uma vez que o seu idioma
era agora o aramaico. Por isso, quando as Escrituras eram lidas em hebraico,
um grupo de homens dedicados fazia a interpretação para o aramaico, de tal
maneira que os fiéis pudessem compreendê-las e aplicá-las à sua vida. Desse
modo, as pessoas do povo se regozijaram “porque entenderam as palavras
que lhes fizeram saber” (Neemias 8:8,12)
O culto sabático parece ter sido o único momento para preservar o
idioma hebraico. No dia a dia, seja no comércio ou nas conversações comuns,
as pessoas se expressavam em aramaico. Nem o povo que permenceu em
Judá sem ir para o cativeiro ficou isento da influência aramaica em seu
idioma. Estrangeiros que já haviam adotado o aramaico pressionavam a
região para morar nela e ali estabelecer-se na lacuna deixada pelos que foram
levados ao exílio. Comerciantes, construtores e políticos viam ali a
oportunidade de fazer prosperar seus negócios.
Embora não seja registrado, não é inverossímil que Nabucodonosor,
seguindo o exemplo dos assírios, tenha enviado para a Judeia colonos vindos
de outras partes de seu império. A linguagem comum a todos esses, além de
seu dialeto nativo, era o aramaico, o que reforçava o uso da língua naquela
região. O hebraico ficou cada vez mais esquecido.
Paralelo a isso, há quem pense que foi nesse contexto que tiveram início
as primeiras sinagogas judaicas ou, pelo menos, a inauguração de casas de
ensino que pudessem fixar a lei na mente dos mais jovens. Longe do templo,
agora destruído, não tinham outro lugar apropriado para oferecer sacrifícios e
cultos ao seu Deus. Sua alternativa de adoração passou a se resumir ao estudo
da Lei, ao cântico dos salmos e às orações em comunidade. Esse estudo,
ponto áureo da adoração, precisava ser num idioma compreensível. Sendo
assim, criaram-se as paráfrases e explicações do Antigo Testamento a que
deram o nome de Targuns.
Em síntese, os targuns eram explicações das escrituras hebraicas em
aramaico para o benefício daqueles judeus que tinham parcial ou
completamente deixado de compreender a língua sagrada de seus pais.
Assim, os Targuns Aramaicos tornaram-se as primeiras traduções
“oficiais” do Antigo Testamento, ou da Bíblia hebraica, para o aramaico,
pelos judeus, e, por isso, foram aprovados para uso no judaísmo. Alguns
adquiriram status de autoridade. Os Targuns Aramaicos não são uma única
tradução da Bíblia hebraica. Antes, consistiram de várias traduções ou
paráfrases individuais de livros ou grupos de livros, que surgiram ao longo do
tempo, de acordo com a necessidade.
A SEPTUAGINTA
NOVO TESTAMENTO
Diatessaron — por volta de 160 d.C. foi traduzida do grego para o
siríaco. Trata-se de uma harmonia dos evangelhos de autoria de Taciano.
Gótica — esta versão já estava em uso por volta de 330-20 anos antes
de o Vaticanus e o Sinaítico serem copiados. A tradução foi feita por Ulfilas,
provavelmente no ano 250 d.C. É extremamente literal, a ponto de usar a
ordem das palavras em grego, mesmo contra a lógica do idioma gótico.
Siríaco antigo — traz esse nome para não ser confundida com a versão
Peshitta posterior, que era a versão popular em siríaco. Essa versão existe nos
manuscritos sinaítico e curetoniano.
Peshitta — é uma tradução para o siríaco, do fim do século 4 d.C. Seu
cânon é composto por apenas 22 livros, não trazendo 2Pedro, 3João, Judas e
Apocalipse.
Copta — são conhecidas cinco versões do Novo Testamento em copta
ou egípcio. A versão saídica é a mais antiga e apareceu no sul do Egito no
século 2 d.C. Do norte do Egito veio a versão boárica e tornou-se a versão
dominante, pois é representada por um número maior de manuscritos. As
outras versões são a fayúmica, a akhmímica e a do Egito Médio.
Armênia — é do fim do século 5 d.C. e tem sua base numa fonte cujo
texto tinha similaridade com os manuscritos gregos Theta, 565 e 700. Afasta-
se muito dos melhores manuscritos gregos, aproximando-se do Textus
Receptus. Há 1.244 cópias dessa versão.
Geórgia — seu manuscrito mais antigo é o Adysh, de 897 d.C. É
possível que essa tradução tenha sua origem do texto armênio. Era a Bíblia da
Geórgia.
Versões secundárias — destacamos a etíope, a eslavônica, a árabe e a
persa.
VERSÕES MODERNAS
Mesmo antes da Reforma Protestante houve muitas traduções da Bíblia para
as diversas línguas faladas. Em 1382, com John Wycliffe, teve início a Bíblia
inglesa, com base na Vulgata Latina, por isso ela inclui também os livros
apócrifos. Em 1280 e 1400, surgiram porções da Bíblia em português.
Para obter-se uma obra, para que não fosse volumosa, então mais cara,
os tradutores procuravam produzir o texto com economia de palavras,
perdendo em muito o significado das línguas originais. Isso foi corrigido em
tempo e começaram a surgir traduções mais fiéis ao texto original, sem
preocupação com economia de palavras. Dessas novas traduções, destacam-
se a Amplified New Testament; The New Testament, de Charles B. Williams,
e The New Testament, an Expanded Translation, de Kenneth S. Wuest.
Merece destaque neste contexto a Bíblia de Lutero que foi uma tradução
alemã das Escrituras feita por ele e impressa pela primeira vez em 1534. Essa
tradução é considerada como sendo em grande parte responsável pela
evolução moderna da língua alemã.
Outras traduções tornaram-se importantes: A Bíblia de Tyndale,
traduzida em 1525 diretamente do hebraico e do grego. A Versão do Rei
Tiago (King James Version), baseada na Bíblia de Tyndale sob a encomenda
do Rei Tiago, surgiu em 1611 e popularizou-se entre os países de língua
inglesa. The American Standard Revised Bible, lançada por ingleses e
americanos em 1901, sendo uma espécie de revisão da versão do Rei Tiago.
A partir de 1804, com a British and Foreign Bible Society, surgiram as
modernas Sociedades Bíblicas que muito vêm contribuindo para a divulgação
da Bíblia.
▶ Traduções parciais
D. Diniz (1279-1325), rei de Portugal, traduziu da Vulgata os primeiros vinte
capítulos do livro de Gênesis. O rei D. João I (1385-1433) ordenou que
houvesse uma tradução para o português. Alguns padres católicos, a partir da
Vulgata, traduziram os evangelhos, Atos e as epístolas de Paulo. O próprio
rei traduziu o livro de Salmos.
Com esses livros prontos, publicaram a obra. Mais tarde foram
preparadas mais traduções de outras porções bíblicas: os evangelhos, que a
infanta Dona Filipa, neta do rei D. João I, traduziu do francês; o evangelho de
Mateus e porções dos outros evangelhos, da Vulgata, pelo frei Bernardo de
Alcobaça; os evangelhos e as epístolas, pelo jurista Gonçalo Garcia de Santa
Maria; uma harmonia dos evangelhos, por Valentim Fernandes, em 1495; em
1505, por ordem da rainha Leonora, foram publicados o livro de Atos e as
epístolas gerais.
Outras traduções realizadas em Portugal foram: os quatro evangelhos,
traduzidos pelo padre jesuíta Luiz Brandão; e, no início do século 19, os
evangelhos de Mateus e Marcos, pelo padre Antônio Ribeiro dos Santos.
Salienta-se que a dificuldade em se traduzir para os diversos idiomas era a
oposição da Igreja Católica Romana que, ao longo dos séculos, fez
implacável perseguição a estas obras, amaldiçoando quem conservasse
traduções da Bíblia em “idioma vulgar”, como diziam. Por isso, também de
muitas traduções escaparam somente uns dois exemplares.
▶ Traduções completas
Teve como base a Vulgata Latina. Em 1896, ele fez sua primeira tradução em
colunas paralelas da Vulgata e de sua tradução para o português. Essa
tradução foi usada pela igreja de Roma. Por ter sido utilizada a Vulgata como
base, tem a desvantagem de não representar o melhor texto do Novo
Testamento que conhecemos pelos manuscritos unciais mais antigos e pelos
papiros.
▷ A Bíblia de Rahmeyer
Manuscrito do comerciante hamburguês Pedro Rahmeyer, que residiu em
Lisboa, e traduziu em meados do século 18. Esse manuscrito está na
Biblioteca do Senado de Hamburgo, Alemanha.
▷ Comparando versões
1. Equivalência dinâmica:
1. Paráfrase livre:
A linguagem que cada uma das traduções oferece é tão diferente porque
elas apresentam uma variação de interpretações do que o pai disse. Quando o
tradutor realiza o árduo trabalho de interpretar passagens desafiadoras,
leitores cristãos acabam sendo privados da oportunidade de pensar por si
mesmos. A realidade é que os cristãos deveriam estar preparados para lidar
com passagens bíblicas difíceis, uma vez que este é um importante passo para
o crescimento espiritual. A ajuda de bons comentários bíblicos e o estudo em
conjunto com outros irmãos de fé é essencial no momento de decidir por uma
ou outra leitura, considerando que não existe tradução perfeita nem trabalho
que esteja isento de melhorias.
As paráfrases são mais adequadas para os momentos de meditação
pessoal, sem muito rigor doutrinário. Todas, porém, em conjunto devem ser
lidas e comparadas num estudo mais profundo, especialmente se este visar
uma fundamentação doutrinária com base na Bíblia Sagrada.
111 David Bellos, Is That a Fish in Your Ear?: Translation and the Meaning of Everything. London,
Penguin Books, 2011, capítulo 11, versão kindle.
UMA COLETÂNEA
DE HISTÓRIAS
2 Judá (Esdras; Neemias 3—13; Isaías, Jeremias; Lamentações; Joel; Miqueias; Habacuque; Sofonias;
Ageu; Zacarias; Malaquias)
4 Edom (Obadias)
12 Capadócia (1 e 2Pedro)
14 Ásia Menor (Atos 18—21; Efésios; Colossenses; 1 e 2Timóteo; Filemon; 1, 2 e 3João [?])
15 Bitínia e Ponto (1 e 2Pedro; Tiago [?])
19 Creta (Tito)
20 Patmos (Apocalipse)
A Bíblia demorou muitos anos para atingir a forma e o conteúdo que hoje
conhecemos. Ela começou a ser escrita no século 15 a.C. e terminou no final
do primeiro século d.C. Logo, foram mais de 1.400 anos de produção
efetuada por cerca de quarenta diferentes autores.
O Antigo Testamento foi escrito na região de Israel, na Babilônia (onde
o povo judeu ficou exilado), no Egito e na Pérsia. Já o Novo Testamento foi
escrito em Israel, Síria, Ásia Menor, Roma (Itália) e partes da moderna
Grécia e Turquia (que faziam parte do antigo Império Romano).
A maior parte dos livros do Antigo Testamento foi escrita em hebraico,
com algumas poucas seções em aramaico e o Novo Testamento foi todo
escrito em grego koiné — uma versão popular do grego clássico falado na
antiga Grécia.
O Novo Testamento foi organizado mais tarde e dividido geralmente em
quatro partes: Evangelhos, Atos, Epístolas (paulinas e gerais) e Apocalipse.
Listas como a do Cânon Muratoriano dão evidência de que esta ordem já
existia, embora de maneira ainda embrionária, bem antes dos dias de
Constantino.
Uma vez apresentada a organização da Bíblia em livros e a lógica por
trás desta listagem, seria interessante conhecer um pouco de cada livro, sua
origem, seus propósitos, possível data e autoria e o significado de seus títulos.
Algumas autorias e datas serão hipotéticas, pois se baseiam na tradição
judaica. Outras já são mais seguras de serem classificadas. Igualmente, as
datas são aproximadas e remontam a quando o livro começou a ser redigido.
Alguns, no entanto, demoraram décadas para assumir a forma que estão hoje.
É o caso de Isaías e Daniel, que começaram a ser escritos quando os
respectivos profetas ainda eram jovens e terminaram quando já eram
avançados em idade.
ANTIGO TESTAMENTO
▶ Pentateuco ou Torá
Torá, como já foi dito, significa Lei, e refere-se, normalmente, aos cinco
primeiros livros escritos por Moisés. Pentateuco é o nome grego da mesma
coleção e quer dizer “cinco rolos” ou “cinco livros”.
▶ Livros históricos
▶ Livros poéticos
▶ Livros proféticos
Uma coleção de oráculos proféticos emitidos por diferentes homens que
viveram entre o oitavo e o quarto séculos a.C.
▶ Profetas maiores
▶ Profetas menores
São os doze últimos livros do Antigo Testamento, assim conhecidos por seu
pequeno volume literário.
Judite
1Macabeus
2Macabeus
Eclesiástico
Sabedoria
Baruque
NOVO TESTAMENTO
▶ Evangelhos
▶ Atos
▶ Cartas de Paulo
A coleção de cartas ou epístolas chamadas paulinas compreende um total de
treze correspondências que Paulo teria enviado às igrejas por ele fundadas na
Ásia Menor. A ordem que se encontram no Novo Testamento não
correspondem à data em que foram escritas. Elas foram organizadas não
cronologicamente, mas de acordo com sua extensão.
Teólogos liberais têm colocado em dúvida a autoria paulina de várias
cartas atribuídas ao apóstolo. Com base nesta compreensão, eles dividem
assim essa parte do Novo Testamento:
▶ Gênesis
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
▷ Esboço114
Criação (1:1—2:3).
História de Adão e Eva (2:4—5:32).
História de Noé (6:1—11:32).
História de Abraão (12:1—25:18).
História de Isaque (25:19—28:9).
História de Jacó (28:10—36:43).
História de José (37:1—50:26).
▶ Êxodo
▷ Título e conteúdo
O título do livro vem da junção de duas palavras gregas. A preposição
ek quer dizer “movimento de saída”, e hodós, que quer dizer “caminho”.
Êxodo, portanto, significa caminho de saída e se refere à saída do povo
hebreu do Egito. Na Bíblia hebraica recebe o título de Shemôt, isto é,
“nomes”, de acordo com o hábito judaico de intitular os livros a partir das
suas palavras iniciais que em hebraico seriam “We’elleh shemôt” (“E estes
são os nomes”, 1:1). Numa série de fortes intervenções miraculosas, Deus
julga o opressor e liberta o povo de Israel da escravidão, concedendo-lhes leis
e mandamentos que deveriam regê-los como indivíduos e como nação.
▷ Autor
▷ Data
Egito.
▷ Características literárias
Apesar de ser o segundo livro da lei de Moisés, ele tem mais partes
históricas que legislativas. Também escrito majoritariamente em prosa, o
texto possui um longo trecho poético que seria a canção de Moisés no
capítulo 15. Provavelmente, um dos mais antigos hinos litúrgicos do povo de
Israel.
▷ Esboço
▷ Título e conteúdo
O livro leva esse nome por ter sido primariamente escrito para a tribo de
Levi. Só para lembrar, os sacerdotes que trabalhavam no santuário eram
todos membros dessa tribo e, por isso, reconhecidos como levitas. Aqui,
portanto, estão as leis cerimoniais que deveriam reger as ações litúrgicas do
santuário e, posteriormente, do Templo judeu. Na Bíblia hebraica esse livro é
chamado de Vaiicrá = “e ele chamou”.
▷ Autor
▷ Data
Alguns acadêmicos o colocam por volta de 1400 a.C. Outros, 200 anos
mais tarde. Veja o comentário sobre a data do Êxodo.
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
▷ Título e conteúdo
O nome curioso desse livro foi dado por causa dos dois recenseamentos
do povo de Israel mencionados nos capítulos 1—4 e 26. Os judeus o
chamavam de Bemidbar, “no deserto...” Midbar pode ser deserto, pastagem,
como também discurso, fala = “e falou”. A história deveria ser do retorno do
povo hebreu para a Terra Prometida, mas, em vez disso, mostra sua marca até
à fronteira e a espera. Por causa das transgressões, era necessário que toda
aquela geração morresse sem alcançar Canaã, apenas seus descendentes
entrariam ali.
▷ Autor
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
Israel se prepara para a viagem à Terra Prometida (1:1—10:10).
O povo se queixa, Miriã e Aarão se opõem a Moisés, e o povo se recusa
a entrar em Canaã por causa dos relatos dos espiões infiéis (10:11—
14:45).
Durante 40 anos, as pessoas vagam pelo deserto até que a geração sem
fé seja consumida (15:1—21:35).
À medida que as pessoas se aproximam novamente da Terra Prometida,
um rei tenta contratar Balaão, feiticeiro e profeta local, para colocar uma
maldição sobre Israel (22:1—26:1).
Moisés levanta outro recenseamento do povo, para organizar um
exército, e ordena Josué para sucedê-lo (26:1—30:16).
Os israelitas se vingam dos midianitas e acampam nas planícies de
Moabe (31:1―36:13).
▶ Deuteronômio
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
O próprio livro refere-se a Moisés como seu autor (1:5; 31:9,22,24).
Além disso, outras partes da Bíblia se referem a ele como obra de Moisés
(1Reis 2:3; 8:53; 2Reis 14:6; 18:12). Tanto Jesus como Paulo igualmente
reconheceram Moisés como autor dessa parte das Escrituras (Marcos 10:3-5;
João 5:46,47; Romanos 10:19). Alguns especialistas, contudo, acreditam que
se trate de uma obra tardia compilada nos tempos de Josias por volta de 600
a.C. e fraudulentamente atribuída aos tempos de Moisés.
Embora seja verdade que Moisés não poderia ter escrito a última parte
do livro que trata de sua própria morte, não há razões plausíveis para se crer
que o documento não seja autêntico e, em sua maior parte, de autoria
mosaica.
▷ Data
Em cerca de 1450 a.C., ou 200 anos mais tarde. Veja comentário sobre o
Êxodo.
▷ Localização
A leste do Rio Jordão, no que hoje seria a Jordânia, e Canaã, que hoje
seria o Estado de Israel.
▷ Características literárias
Diferentemente dos demais livros do Pentateuco, o Deuteronômio
mistura um estilo de sermão com narrativas, apelos de arrependimento e
repetição das leis de Deus. Juntos, eles formam uma renovação da aliança
feita entre Deus e seu povo, para que os descendentes mais jovens possam
entrar na terra que os adultos não alcançarão. Finalmente, a chamada Canção
de Moisés (cap. 32) e sua bênção final sobre Israel (cap. 33) fecham com
chave de ouro a narrativa antes do capítulo de apêndice que descreve a morte
de Moisés.
▷ Esboço
▶ Josué
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
A conquista de Canaã pode ter se dado por volta de 1400 a.C. ou 1200
a.C. Para mais detalhes, veja a introdução do livro de Êxodo.
▷ Localização
▷ Esboço
▷ Título e conteúdo
O título traduz o hebraico Shoftim, que também pode ser traduzido por
“líderes” ou “libertadores”. Liderar e libertar foram as principais tarefas
desses heróis, enviados por Deus, cujos atos são contados na narrativa. No
período de sua atuação, os hebreus ainda eram uma nação em
desenvolvimento, semiautônomos, num intervalo entre as batalhas de Josué e
a unificação monárquica das tribos promovida por Davi. Não havia governo
central, mas apenas uma confederação de doze tribos unidas pela aliança com
Javé e constantemente ameaçadas por ataques inimigos, especialmente dos
filisteus. Os ataques eram consequência da quebra da aliança com Deus.
▷ Autor
▷ Localização
A maior parte do livro ocorreu nos territórios hoje formados por Israel e
Jordânia.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Rute
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
Rute viveu provavelmente por volta de 1100 a.C. A dedução desta data
se dá pelo fato de ela ter sido a bisavó de Davi e de este ter se tornado rei por
volta do ano 1000 a.C.
▷ Localização
A história se passa entre Moabe, que hoje fica na Jordânia, e Belém, que
atualmente é parte do território palestino.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ 1 e 2Samuel
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
A narrativa começa em Siló, território israelita que na época servia de
“capital” ou “ponto de encontro” das tribos de Israel durante as festas
religiosas antes que houvesse monarquia, e se estende para o chamado reino
unificado de Davi, que compreendia grande parte do atual Estado de Israel,
Líbano, Síria e Jordânia.
▷ Características literárias
1Samuel
I. Renovação sob Samuel (1:1—7:17)
Nascimento e infância de Samuel (1:1—2:36)
2Samuel
I. Os triunfos de Davi (1:1—10:19)
▶ 1 e 2Reis
▷ Título e conteúdo
Como o próprio nome diz, refere-se à história dos reis de Israel, tanto na
época do reino unificado, após a morte de Davi e início do reinado de
Salomão, como após a divisão entre reino do Norte, com a capital em
Samaria, e reino do Sul, com a capital em Jerusalém.
Em algumas versões da Bíblia, os livros de 1 e 2Samuel são
denominados 1 e 2Reis, seguidos por estes dois livros, que são, por esta
forma, denominados 3 e 4Reis. Ou também, em poucos casos, 1 e 2Reis (para
aqueles que chamamos de 1 e 2Samuel), e Reis Hebreus para os que
chamamos de 1 e 2Reis.
▷ Autor
Desconhecido.
▷ Data
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
1Reis
2 Reis
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Localização
▷ Características literárias
Registro das genealogias dos patriarcas e dos filhos de Jacó e Esaú até
ao rei Saul (1—9).
Um resumo do reinado de Davi (10—22).
A ascensão de Salomão ao trono substituindo Davi (23—29).
Um resumo do reinado de Salomão (1—9).
O reinado de Roboão e a divisão do reino do Norte e reino do Sul (10—
35).
O cativeiro babilônico e a chegada dos persas que permitem aos judeus
retornar para casa e reconstruir o templo destruído pelos babilônios (36).
▶ Esdras e Neemias
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
A história se situa entre o Irã, partes da atual Jordânia e Jerusalém.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Esdras
Neemias
▶ Ester
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
Não se tem uma certeza de onde ficava a terra de Uz, cidade de Jó.
Contudo, alguns autores entendem que seria aproximadamente na área da
moderna Jordânia a sudoeste e sul de Israel. A dedução disso se dá por causa
de um texto de Lamentações 4:21, que diz: “Regozija-te e alegra-te, ó filha de
Edom, que habitas na terra de Uz” (grifos nossos). Ora, Edom é a atual
Jordânia.
Contudo, um texto encontrado entre os Manuscritos do Mar Morto, o
chamado Manuscrito da Guerra, fala de Uz como estando além do rio
Eufrates, talvez em algum lugar da Síria. Há também comentaristas que
sugerem sua localização na Arábia ou no Uzbequistão. Deve-se levar em
conta que a Bíblia também traz o nome Uz como nome próprio de pessoas e
que no livro de Jó limita-se a dizer que a Terra de Uz ficava no Oriente, sem
mais detalhes a esse respeito.
▷ Características literárias
▷ Esboço
I. Introdução (1:1—2:13)
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Louvor
▷ Peregrinação ou ascensão
▷ Lamento
▷ Esboço
▶ Provérbios
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
Jerusalém.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Eclesiastes
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
Jerusalém.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Prólogo (1:1-2).
O problema da vaidade (1:3-11).
Tentativas de solução para o problema (1:12—2:26).
Nulidade dos esforços humanos (3:1—6:12).
A sabedoria do dia a dia (7:1—8:9).
Novamente a nulidade da vida (8:10—9:18).
A sabedoria na prática (10:1—11:6).
O temor e a Glória de Deus (11:7—12:7).
A conclusão de todas as coisas (12:8-14).
▶ Cantares
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
De acordo com o próprio livro, seu autor seria o rei Salomão. Este
cântico seria uma das 1005 canções que ele escreveu (1Reis 4:32).
▷ Data
▷ Localização
Jerusalém.
▷ Características literárias
▷ Esboço
A afeição mútua entre o esposo e a esposa (1:1—2:7).
A esposa fala de seu esposo. Seu primeiro sonho sobre ele (2:8—3:5).
O cortejo nupcial. O segundo sonho da esposa. Sua conversa com as
filhas de Jerusalém (3:6—6:3).
O esposo continua louvando a beleza da esposa. O desejo dela é para ele
(6:4—8:4).
Expressões finais de amor mútuo (8:5-14).
▶ Isaías
▷ Título e conteúdo
▷ Data
Isaías viveu entre 765 e 681 a.C. Seu chamado se deu no ano da morte
do rei Uzias, em 740 a.C., e seu ministério profético foi exercido no reino
Judá durante os reinados de Uzias (c. 2Crônicas 26; 22), Jotão, Acaz,
Ezequias e Manassés.
▷ Localização
Jerusalém.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Jeremias
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
Jeremias.
▷ Data
▷ Localização
Jerusalém.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Lamentações
▷ Título e conteúdo
Embora o próprio livro não pareça denominar seu autor, uma antiga
tradição que remonta ao período da LXX o identifica com Jeremias. Nesta
versão grega os judeus acrescentaram a seguinte anotação antes do capítulo
1:1: “Aconteceu que, depois da redução de Israel ao cativeiro e de Jerusalém
ao deserto, o profeta jeremias sentou-se chorando; ele proferiu esta
lamentação sobre Jerusalém e disse.”
▷ Data
▷ Localização
Não sabemos onde Jeremias estava quando escreveu o livro, mas pode
ter sido em Jerusalém ou no Egito (ver Jeremias 43:6-7).
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Ezequiel
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
Ezequiel.
▷ Data
O livro de Ezequiel foi provavelmente escrito entre 593 a.C. e 565 a.C.,
durante o cativeiro babilônico dos judeus.
▷ Localização
▷ Esboço
▶ Daniel
▷ Título e conteúdo
Título dado após seu autor tradicional. Conta a história de Daniel, que
viveu a maior parte de sua vida como exilado na Babilônia e na Medo-Pérsia
Contém uma parte histórica, narrando a própria vida do profeta, e outra
profética, apresentando sonhos e visões relacionadas ao juízo de Deus e o fim
dos tempos. É o livro do Antigo Testamento que tem mais relações literárias
com o Apocalipse de João.
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
▷ Esboço
O cativeiro (1:1-21).
O sonho, a imagem de ouro e a humilhação do rei da Babilônia (2:1—
4:37).
Juízo sobre o rei da Babilônia (5:1-31).
Daniel na cova dos leões (6:1-28).
Visão dos quatro animais (7:1-28).
Visão do Carneiro e do Bode (8:27).
Oração de Daniel e a profecia das setenta semanas (9:1-27).
Visões na Pérsia (10:1—12:13).
▶ Oseias
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
Samaria, capital do reino de Israel.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Joel
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
De acordo com o livro, o autor seria o próprio Joel que dá nome à obra.
▷ Data
▷ Localização
Judeia.
▷ Características literárias
Conforme dito acima, são duas partes que compõem a obra. Uma fala da
praga de gafanhotos e a outra do juízo de Deus sobre as nações. A prosa e a
poesia profética predominam em toda a narrativa. Contudo, a diferença entre
as duas partes seria apenas em termos sequenciais, pois se a primeira for
entendida como símbolo do juízo de Deus (os gafanhotos seriam exércitos do
juízo divino), pode-se dizer que temos no começo a proclamação dos juízos
históricos de Deus, permitindo a aflição de seu povo e no final a proclamação
do juízo escatológico de Deus, que seria o acerto de contas final com a
humanidade.
Muitos autores percebem no livro os traços iniciais da literatura
apocalíptica. Joel, neste sentido, seria uma ponte entre a profecia clássica e a
literatura apocalíptica que estava nascendo. Daí a linguagem metafórica
baseada na praga de gafanhotos.
▷ Esboço
▶ Amós
▷ Título e conteúdo
Como nos demais livros proféticos, este também leva o nome de seu
principal contribuidor, o profeta Amós. Pouco se sabe sobre sua vida, exceto
alguns excertos presentes no livro. Em 1:1 diz-se que era pastor, e em 7:14
sua profissão (que para alguns seria melhor traduzida por boiadeiro) é
reafirmada, acrescentando que também cultivava sicômoros. Aparentemente,
seu ofício faz dele uma pessoa, a princípio, pobre e sem cultura. Amós,
contudo, se revela um grande escritor. O profeta, ou escriba, que teria escrito
suas sentenças produziu uma exímia peça literária de denúncia à idolatria e
injustiça do povo de Israel, profetizando a destruição do reino do Norte por
causa do pecado.
▷ Autor
Ao que tudo indica, o próprio Amós seria o autor do livro que leva seu
nome, ainda que tenha usado um secretário letrado para escrever suas visões.
▷ Data
▷ Local
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Obadias
▷ Título e conteúdo
O livro que leva o nome de Obadias traz uma mensagem profética dura
acerca da animosidade histórica entre Jacó e Esaú, bem como entre seus
descendentes, e a terrível vinda de Nabucodonosor, rei da Babilônia, para
destruir Jerusalém e o templo de Deus.
Por causa da forte mensagem de dor, devido à opressão trazida pelos
babilônios, o livro de Obadias costuma ser chamado de “A oração indignada
de Obadias” e “Hino da ira”. O tom nacionalista de seu lamento justifica os
codinomes alternativos da obra.
Embora existam outros Obadias mencionados em 1Reis, 1 e 2Crônicas,
Esdras e Neemias, não devemos confundir nenhum desses com o profeta que
produzira este livro. Com exceção do fato de que Obadias era um profeta no
reino do sul (Judá), não sabemos nada sobre seu passado ou ministério
▷ Autor
Há quem afirme que Obadias, que quer dizer “servo do Senhor”, seria
um pseudônimo e não o verdadeiro nome do profeta que escreveu esta obra.
Contudo, esse nome era comum naquele momento e não há razões plausíveis
para se duvidar de sua originalidade. Segundo a tradição judaica, Obadias era
mordomo do rei Acabe. Porém esta afirmação tem incoerência cronológica
com as informações contidas no livro.
▷ Data
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Jonas
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
Israel, porto de Haifa (ou Jope), Nínive, capital da Assíria, atual Iraque.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Jonas opõe-se à vontade de Deus e foge para Társis. Ele é engolido pelo
peixe e vomitado na praia (1:1—2:11).
Jonas prega em Nínive, que se converte, e o profeta se ressente (3:1—
4:11).
▶ Miqueias
▷ Título e conteúdo
O título refere-se à mensagem de um profeta que dirigiu sua mensagem
tanto ao reino do Sul como ao reino do Norte. Por isso, sua profecia
contempla as cidades de Jerusalém, capital do reino de Judá, e Samaria,
capital do reino de Israel. Sua profecia contempla a destruição de Samaria
pelo exército da Assíria, o futuro cativeiro da Babilônia, a revelação do juízo
de Deus sobre os pecados do povo e a restauração que seria iniciada após o
cativeiro, garantindo que a casa de Davi seria erguida mais uma vez e reinaria
sobre o mundo inteiro, trazendo paz para o povo de Deus.
▷ Autor
▷ Data
▷ Local
Judá, Israel.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Naum
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
Tudo leva a crer que o próprio Naum estaria por trás do texto do livro
que leva seu nome.
▷ Data
Por informações internas do próprio livro, Naum pode ter sido escrito
em qualquer período após o cerco assírio de Jerusalém, em 701 a.C., e antes
da queda de Nínive, que ocorreu por volta de 612 a.C.
▷ Localização
▷ Esboço
▶ Habacuque
▷ Título e conteúdo
Habacuque é o relato profético de um mensageiro de Deus que viveu
pouco antes da destruição de Jerusalém causada pelos babilônios. Ele não
esconde sua indignação face às atrocidades e injustiça social cometidas
dentro do território de Judá. A vinda destruidora dos babilônios seria uma
clara consequência dessa apostasia que os afastava da proteção de Deus. Um
destaque literário na obra é a oração de Habacuque.
▷ Autor
Ao que tudo indica seria o próprio Habacuque o autor do livro que leva
o seu nome.
▷ Data
O livro teria sido composto entre o final do reinado de Josias (609 a.C.)
e a queda do Império Assírio (612 a.C.).
▷ Localização
Jerusalém.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Sofonias
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
Judá.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Introdução (1:1).
Uma advertência do juízo iminente (1:2-18.)
Uma exortação ao arrependimento imediato (2:1—3:8).
A promessa da salvação futura (3:9-20).
▶ Ageu
▷ Título e conteúdo
▷ Data
▷ Localização
Judá.
▷ Características literárias
▶ Zacarias
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
O próprio Zacarias.
▷ Data
Em torno de 530 a.C.
▷ Localização
Judá.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Malaquias
▷ Título e conteúdo
Malaquias.
▷ Data
▷ Localização
Judá.
▷ Características literárias
NOVO TESTAMENTO
▶ Mateus
▷ Título e conteúdo
O título desse livro refere-se ao seu autor tradicional, que foi um dos
discípulos de Jesus e escreveu sua vida em forma de anúncio ou kerygma.
▷ Autor
▷ Data
Os críticos assumem que Mateus teria sido composto por volta do ano
90 d.C., contudo, há indicativos fortes o suficiente para estabelecer uma data
mais antiga por volta do ano 60 d.C.
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ Marcos
▷ Título e conteúdo
O evangelho que recebe o nome de Marcos tem por trás de seu texto a
figura do apóstolo Pedro. Marcos seria um redator que escreveu o texto com
base naquilo que Pedro dizia, pois ele mesmo não havia sido apóstolo nem
testemunha ocular da maioria das coisas que escreveu. Por isso, alguns
sugerem Pedro como coautor de Marcos. Esse evangelho traz o anúncio da
vida e obras de Jesus.
▷ Autores
▷ Data
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
Introdução (1:1-13).
Declaração sumária (1:1).
Cumprimento da profecia do Antigo Testamento (1:2-3).
O ministério de João Batista (1:4-8).
O batismo de Jesus (1:9-11).
A tentação de Jesus (1:12-13).
▶ Lucas
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
Lucas.
▷ Data
Em torno de 60 d.C.
▷ Localização
Roma.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Prólogo (1:1-4).
A narrativa da infância (1:5—2:52).
Preparação para o ministério público (3:1—4:13).
O ministério galileu (4:14—9:50).
A narrativa de viagem (no caminho para Jerusalém) (9:51—19:28).
O ministério de Jerusalém (19:29—21:38).
A paixão e glorificação de Jesus (22:1—24:53).
▶ João
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
A tradição da Igreja, de longa data, aponta João, o discípulo amado,
como sendo o autor do evangelho que leva o seu nome. Alguns, no entanto,
tendem a negar essa autoria, falando antes de uma comunidade joanina que
produziu o texto em nome do apóstolo João. Tal hipótese, contudo, carece de
mais evidências que a corroborem.
▷ Data
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
O PRÓLOGO (1:1-18)
O EPÍLOGO (21:1-25)
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
Lucas.
▷ Data
▷ Caraterísticas literárias
▷ Esboço
Em Jerusalém (21:17—23:25).
Em Cesareia (24:1—26:32).
A viagem para Roma (27:1—28:16).
Paulo em Roma (28:17-31).
▶ Romanos
▷ Título e conteúdo
O livro refere-se a uma carta escrita por Paulo aos cristãos de Roma.
Nela, ele trata de alguns assuntos referentes ao andamento da igreja de Roma,
como sua futura visita àquela congregação, a ajuda aos necessitados de
Jerusalém e seu próprio itinerário para Espanha, através da Itália. Mas o
apóstolo também aproveita o ensejo da missiva para esclarecer alguns pontos
doutrinários e defender sua teologia, especialmente no que diz respeito à
relação entre a lei e a justificação pela fé, bem como o bom convívio entre
cristãos gentios e judeus.
▷ Autor
Apóstolo Paulo.
▷ Data
▷ Localização
Acredita-se que esta carta fora enviada para os cristãos de Roma a partir
da cidade de Corinto.
▷ Características literárias
▷ Esboço
▶ 1 e 2Coríntios
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
Apóstolo Paulo.
▷ Data
Cerca de 56 d.C.
▷ Localização
▷ Esboço
1Coríntios
Prólogo (1:1-9).
Divisões na igreja de Corinto (1:10—4:21).
Escândalos na igreja (5:1—6:20).
Resposta a questões concretas (7:1—11:1).
A Assembleia Litúrgica (11:2-34).
Os carismas (12:1—14:40).
A ressurreição dos mortos (15:1-58).
Epílogo (16:1-24).
2Coríntios
Prólogo (1:1-11).
Paulo justifica sua postura diante da igreja (1:12—7:16).
Paulo dá instruções (8:1—9:15).
Paulo justifica novamente sua postura diante da igreja (10:1—13:13).
▶ Gálatas
▷ Título e conteúdo
Esta carta foi endereçada a um certo grupo de igrejas que ficaria ao norte
da Galácia ou em suas fronteiras com a Frígia. O fato é que, em se tratando
de comunidades cristãs desta região, o nome Gálatas parece muito
apropriado.
Nela, Paulo apresenta mais uma vez sua preocupação com aqueles que
estavam se afastando da mensagem de Cristo para seguir ensinos dissidentes,
como aqueles que exigiam dos não judeus que se convertiam a necessidade
de circuncidar-se antes de se unir à igreja. Ao mesmo tempo em que corrige
as distorções, Paulo levanta uma apaixonante defesa de seu ministério
apostólico que parecia negado até mesmo por líderes influentes do
cristianismo. Alguns certamente estavam usando essa oposição interna para
minar a credibilidade autoritativa do ensino de Paulo.
▷ Autor
Apóstolo Paulo.
▷ Data
Cerca de 57 d.C.
▷ Localização
Paulo provavelmente escreveu esta carta por ocasião de sua viagem pela
Macedônia.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Introdução (1:1-10).
Origem divina do Evangelho (1:11—2:21).
O Evangelho faz-nos filhos de Deus (3:1—4:7).
O Evangelho faz-nos livres (4:8—5:12).
Vida cristã, caminho de liberdade (5:13—6:10).
Conclusão (6:11-18).
▶ Efésios
▷ Título e conteúdo
O título desta epístola vem da ideia de que ela fora escrita para a
comunidade de crentes que residia em Éfeso, conforme as palavras
introdutórias do autor, aos “santos que estão em Éfeso”. Contudo, as cópias
mais antigas dessa carta não possuem tal expressão, o que leva muitos a
julgarem que se trata de uma mensagem direcionada não especificamente a
uma igreja apenas, mas a diversas comunidades cristãs, incluindo a de Éfeso.
Esta carta tem como tema central o propósito eterno de Deus: Jesus
Cristo é o cabeça da Igreja, que é formada a partir de muitas nações e raças.
▷ Autor
Apóstolo Paulo.
▷ Data
Cerca de 62 d.C.
▷ Localização
▷ Característica literária
▷ Esboço
Apresentação (1:1-2).
▶ Filipenses
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
Paulo.
▷ Data
A data de produção desta carta é disputada entre os especialistas, alguns
a colocam em torno de 55 d.C., enquanto outros a situam num período mais
tardio, entre 60 e 62 d.C.
▷ Localização
Imprecisa.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Introdução (1:1-11).
Prisão de Paulo (1:12-26).
Deveres da comunidade (1:27—2:18).
Solicitude pela comunidade (2:19—3:1).
O apóstolo, modelo da comunidade (3:2—4:1).
Conclusão (4:2-23).
▶ Colossenses
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
Apóstolo Paulo.
▷ Data
Cerca de 62 d.C.
▷ Localização
Roma.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Introdução (1:1-23).
O Evangelho de Paulo (1:24—2:5).
Fidelidade ao Evangelho (2:6-23).
Viver segundo o Evangelho (3:1—4:6).
Conclusão (4:7-18).
▶ 1 e 2Tessalonicenses
▷ Título e conteúdo
As duas cartas que levam esse nome foram endereçadas aos cristãos da
cidade de Tessalônica. São provavelmente os mais antigos escritos do Novo
Testamento, redigidas até mesmo antes dos quatro evangelhos. Elas
abrangem, de modo geral, instruções doutrinárias às comunidades cristãs
recém-formadas pelo trabalho evangelístico de Paulo.
▷ Autor
Apóstolo Paulo.
▷ Data
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
1Tessalonicenses
2Tessalonicentes
Saudação (1:1-2).
Conforto na tribulação (1:3-12).
A volta de Cristo (2:1—3:5).
O perigo da ociosidade cristã (3:6-15).
Despedida (3:16-18).
▶ 1 e 2Timóteo
▷ Título e conteúdo
Apóstolo Paulo.
▷ Data
Cerca de 62 d.C.
▷ Localização
▷ Características literárias
▷ Esboço
1Timóteo
2Timóteo
▶ Tito
▷ Título e conteúdo
Como as epístolas endereçadas a Timóteo, esta breve carta instrui a Tito,
outro discípulo de Paulo e líder no ministério da Igreja Cristã. Tito é
mencionado na Carta aos Gálatas (2:3), na qual se lê que ele não foi obrigado
a ser circuncidado quando se converteu ao cristianismo. Ele também é
mencionado em algumas sentenças de 2Coríntios como um comprometido
colaborador do apóstolo Paulo.
▷ Autor
Apóstolo Paulo.
▷ Data
▷ Localização
▷ Características literárias
É muito parecida com 1Timóteo, talvez porque, à semelhança daquela,
Paulo também vê a necessidade de instruir Tito a como liderar as igrejas
cristãs da Ásia Menor, especialmente a comunidade que ele presidia. A igreja
estava se organizando e logo surgiam os primeiros problemas de doutrina e
unidade dos crentes.
▷ Esboço
Saudação (1:1-4).
Orientações a Tito (1:5-9).
Os falsos mestres (1:10-16).
A moral cristã (2:1-15).
Deveres sociais (3:1-11).
Recomendações finais (3:12-14).
Despedida (3:15).
▶ Filemon
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
Apóstolo Paulo.
▷ Data
Cerca de 60 ou 61 d.C.
▷ Localização
A carta foi escrita de um dos últimos cativeiros de Paulo, que pode ter
sido em Éfeso, Cesareia ou Roma. É destinada a Filemon, que residia na
cidade de Colosso.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Saudação (1-3).
Ação de graças com base na qualidade cristã de Filemon (4-7).
Pedido em favor de Onésimo (8-11).
Saudações da parte de amigos de Paulo (23-24).
Bênção (25).
▶ Hebreus
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Características literárias
▷ Esboço
Prólogo (1:1-4).
A supremacia do Filho de Deus (1:5—2:18).
O sacerdócio do Filho de Deus (3:1—5:10).
O sacerdócio de Cristo (5:11—10:18).
A fé que opera e persevera (10:19—12:29).
Recomendações (13:1-25).
Bênção e saudação final (13:20-25).
▶ Tiago
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
▷ Características literárias
▶ 1 e 2Pedro
▷ Título e conteúdo
▷ Data
▷ Localização
▷ Características literárias
1Pedro
Saudação (1:1-12).
Exortação à santidade (1:13—2:10).
Os cristãos perante o mundo (2:11—3:12).
Os cristãos perante o sofrimento (3:13—4:11).
Últimas exortações (4:12—5:14).
2Pedro
Saudação (1:1-2).
Exortação à perseverança na fé (1:3-21).
Denúncia dos falsos mestres (2:1-22).
A segunda vinda do Senhor (3:1-16).
Despedida (3:17-18).
▶ 1, 2 e 3João
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
Provavelmente, as epístolas foram escritas da cidade de Éfeso.
▷ Características literárias
▷ Esboço
1João
A encarnação (1:1-10).
A vida de justiça (2:1-29).
A vida dos filhos de Deus (3:1—4:6).
A fonte do amor (4:7-21).
O triunfo da justiça (5:1-5).
A garantia da vida eterna (5:6-12).
Certezas cristãs (5:13-21).
2João
Introdução (1-3).
Elogio pela lealdade passada (4).
Exortações (5-11).
Conclusão (12-13).
3João
Saudação (1).
Mensagem a Gaio (2-8).
Condenação à arrogância de Diótrefes (9-11).
Elogio a Demétrio (12).
Conclusão (13-14).
▶ Judas
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Data
▷ Localização
Indefinida.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Saudação (1-2)
I. Advertência contra os falsos mestres dentro da comunidade (3-19)
Manter a fé (20-21).
Resgatar os enganados (22-23).
Doxologia (24-25).
▶ Apocalipse
▷ Título e conteúdo
▷ Autor
▷ Localização
Ilha de Patmos.
▷ Características literárias
▷ Esboço
Introdução (1:1-20).
As sete Igrejas (2:1—3:22).
O Trono de Deus-Pai e do Cordeiro (4:1—5:14).
Os seis primeiros selos (6:1-17).
Os 144 mil selados/multidão (7:1-17).
O sétimo selo: sete trombetas/interlúdio — o anjo com o livrinho e as
duas testemunhas (8:1—11:19).
O dragão e a mulher (12:1-12).
O dragão, a mulher e as bestas (12:13—13:18).
Os 144 mil selados/os seis anjos/multidão (14:1-20).
Um outro sinal: sete pragas/julgamento de Babilônia (15:1—18:24).
As Bodas do Cordeiro/a volta de Cristo/Milênio (19:1—20:15).
A Nova Jerusalém (21:1—22:5).
Conclusão (22:6-21).
113 A palavra “católica”, embora hoje designe o nome do maior ramo eclesiástico do cristianismo,
tinha outro sentido no passado. Ela vem do grego katholikós. É esse o sentido usado em relação às
epístolas não paulinas do Novo Testamento.
114 Os esboços aqui apresentados são adaptados de múltiplas fontes e representam apenas uma
tentativa de delineamento do livro. Não se trata, portanto, de uma sistematização exata ou uniforme em
todas as Bíblias. Variações de esboço são muito comuns neste sentido.
115 Etã, o ezraíta (Salmos 89) — este Etã é associado a um certo Hermã, entre os cantores de Davi
(1Cr 15:17-19), mas também há referências a um Etã entre os sábios de Israel (1Reis 4:31).
CAPÍTULO DEZOITO
FATOS E CURIOSIDADES
BÍBLICAS
VOCABULÁRIO ORIGINAL
No texto hebraico do Antigo Testamento é possível detectar 8.674 diferentes
palavras. Já o texto grego do Novo Testamento conta com 5.624. O menor
verso da Bíblia varia de acordo com a tradução que se adota. Por exemplo, Jó
3:2 traz “Jó disse” (sete letras), mas algumas versões trazem “E Jó, falando,
disse” — o que o excluiria do ranking de menor versículo. O próximo (e que
se mantém assim em quase todas as traduções) seria Êxodo 20:13: “Não
matarás.” Já no Novo Testamento, o menor verso seria João 11:35: “Jesus
chorou.”
Quanto ao maior versículo da Bíblia, a indicação mais comum vai para
Ester 8:9, que tem 414 letras, conforme a tradução de Almeida, e 368 na
edição pastoral. No original hebraico, ele teria 371 letras. O menor livro da
Bíblia é 2João, com um capítulo e treze versículos. Já o maior é o livro dos
Salmos com 150 diferentes canções — isso se considerarmos cada salmo
equivalente a um capítulo.
O maior capítulo da Bíblia é o Salmo 119, com 176 versículos, e o
menor, o Salmo 117, com apenas dois versículos.
Outras expressões de tempo podem ser vistas em Gênesis 3:8, que relata
que, “por volta da viração do dia” (i.e., à tardinha), o Senhor Deus falou com
Adão e Eva logo após ambos terem pecado. Esse era o momento, na cultura
Oriental, em que o trabalho braçal havia terminado e as famílias se reuniam
para um merecido descanso e descontração. No entanto, o Senhor não deixou
para depois um assunto judicial tão sério.
Por outro lado, o texto de Gênesis 18:1-2 mostra que os anjos foram à
tenda de Abraão em Manre “por volta do calor do dia; depois, o Senhor
apareceu a Abraão junto aos carvalhos “no maior calor do dia”.
Esse era exatamente o meio-dia, período em que o Sol estava a pino,
ardendo sobre as colinas da Judeia. O calor podia ser sufocante, então esse
seria o melhor momento para os trabalhadores comerem alguma coisa e
descansar um pouco de suas atividades debaixo de uma sombra (cf. Gênesis
43:16,25; 2Samuel 4:5).
No tempo do Antigo Testamento, os judeus dividiam a noite em três
vigílias, a saber:
▷ Medidas
I. Medidas de comprimento
Alqueire
Do árabe alkail, medida equivalente ao módio dos romanos. As citações
dos Evangelhos de Mateus 5:15, Marcos 4:21 e Lucas 11:33 referem-se
especialmente à vasilha com tal capacidade, que servia para medir os cereais.
Bato
Uma medida hebreia de capacidade usada para medir líquidos (2Reis
7:26,38; 2Crônicas 2:10; 4:5; Esdras 7:22). A décima parte de um ômer,
correspondendo em volume ao efa, uma medida de capacidade para secos
(Ezequiel 45:10,11,14). Medida padrão equivalente em volume ao efa, ao
almude e à metreta, 32 litros.
Cabo
Uma medida hebreia para sólidos, contendo, de acordo com a tradição
rabínica, um sexto de um módio ou uma centésima octogésima parte de um
ômer (1 litro e 778 mL).
Coro ou ômer
[Um montão]. Uma medida para substâncias líquidas e sólidas. Equivale
a dez batos ou efas (Ezequiel 45:11,14) ou 100 ômeres (320 litros) (Êxodo
16:36).
Efa ou efi
[Derivado talvez de uma antiga medida egípcia denominada oiphi]. Uma
medida de capacidade contendo 10 ômeres (Êxodo 16:36), e usada para
artigos como farinha (Juízes 6:19) ou cevada (Rute 2:17). Era equivalente a
um bato ou uma décima parte de um coro (Ezequiel 45:11,14), e continha
uma metreta ática ou setenta e dois sextários (logues). (Antig. 8. 2, 9; 9.4,5; e
15.9,2, onde leia-se metretas para medimnoi)
Comerciantes desonestos às vezes possuíam um efa de capacidade
insuficiente e usavam-no para fraudar (Amós 8:5). (As medidas efa, bato,
alamude e metreta são da mesma capacidade, 32 litros)
Him ou Hin
Uma medida líquida hebraica, contendo mais ou menos um galão e três
quartos (6 litros e 623 mL, quase 1/5 do efa) (Êxodo 29:40).
Ômer ou Gômer ou Gomor
Uma medida para substâncias secas. Contendo a décima parte do bato
ou efa (3,2 litros) (Êxodo 16:36).
▷ VI. Pesos e moedas
20 geras = 1 shekel.
50 shekeis = 1 mane.
60 manes = 1 talento.
Narrativo/histórico.
Legislativo.
Sapiencial.
Profético.
Cânticos.
Evangelho.
Epistolar.
Apocalíptico.
Prosa.
Poesia.
Parábola.
Hipérbole.
Midrash.
Diatribe.
Alegoria.
É, antes de tudo, presente, e alude a É presente, em parte, mas sua maior concentração está em usar
circunstâncias históricas do momento o hoje para apontar o mundo do amanhã, principalmente o seu
em que o profeta está falando. A trajeto linear rumo ao escaton. É uma mensagem que interessa
iminência de um ataque, por às gerações que nem existem durante os dias do vidente.
exemplo.
Não precisa de intérprete. Tem de ser interpretada por alguém (anjo, Deus, Jesus Cristo).
Trata de fatos reais, sendo que, às É toda enigmática e codificada. A realidade é escondida em
vezes, usa parábolas e gestos figuras e códigos.
simbólicos.
Expressa mais a Palavra de Deus Expressa mais visões dos atos que as Palavras de Deus (Ex. “vi
que uma visão (Ex. “Assim diz o e ouvi”).
Senhor”).
Tem uma visão otimista do mundo. Tem uma visão catastrófica do mundo. É dualista e só acredita
Diz que se o povo for fiel, as bênçãos numa restauração escatológica.
existentes neste planeta serão
derramadas sobre eles sem medida.
116 Baseado no Novo Dicionário da Bíblia de John Davis.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Se você chegou até aqui e está lendo essas palavras conclusivas, certamente o
fez por um dentre dois motivos: porque leu todo o conteúdo ou porque saltou
direto para esta parte final. Se a última opção for a verdadeira, convido
gentilmente que você volte os olhos ao miolo do livro, pois tem muita
informação interessante lá dentro. E, se chegou até aqui porque leu tudo,
certamente entenderá minha vontade contida de querer dizer mais coisas.
Quando João terminou de escrever o seu evangelho, anotou que ainda
havia muita coisa sobre Jesus que ele queria contar e não pôde. Também
falou de forma poeticamente hiperbólica que se tudo o que pudesse ser dito
de Jesus fosse, de fato, escrito, nem mesmo o mundo inteiro seria capaz de
conter os livros que se escreveriam (João 21:25).
Não sou nem de perto comparável a João. Ele andou literalmente com
Jesus e era inspirado, eu não. Contudo, tenho minha relação espiritual com
Deus e, como João, sinto-me um discípulo apaixonado por Cristo. Por isso,
ouso concluir com o mesmo sentimento de “frustração editorial” dele. Não
sei se escrevi tudo que poderia ser dito sobre a Bíblia Sagrada. Mas de uma
coisa tenho certeza: se o que as Escrituras dizem for verdade — e estou certo
de que são ―, minha humilde contribuição poderá ser uma luz para despertar
pessoas para a Bíblia Sagrada. Seja para conhecê-la, seja para se aprofundar
nela.
Compare tudo que escrevi até aqui como um menino apontando para o
pôr do sol no horizonte. Sua atitude singela não tem outro objetivo senão que
os demais olhem para o espetáculo do sol. Enquanto todos comentam
maravilhados sobre a beleza daquele momento vespertino, ele pega sua
bicicleta e volta para casa na certeza do dever cumprido. Certeza, aliás, que
dura até o dia seguinte, quando ele volta para o mesmo lugar, encontra outras
pessoas e, de novo, aponta para o sol no horizonte. Ele não quer ser visto, não
é para o seu dedo que deseja que todos olhem, é para o astro-rei com seus
raios de beleza descendo atrás dos montes.
É assim que me sinto, como esse menino. Não foi meu objetivo iluminar
a Bíblia com meu livro. Isso seria tão estúpido quanto clarear o sol à luz de
uma vela. O que fiz foi apenas apontar para ela, e se você olhou para o
horizonte bíblico com sentimentos de êxtase e emoção, então posso dormir
em paz. Cumpri meu objetivo, pelo menos por hoje, até que amanhã eu
encontre novas pessoas que também precisam ver a luz.
REFERÊNCIAS
Ackroyd, P.R.; Evans, C.F., eds. The Cambridge History of the Bible
[História da Bíblia]. Cambridge University Press, 1970.
Beal, Timothy. The Rise and Fall of the Bible; The Unexpected History of an
Accidental Book [O nascimento e a queda da Bíblia: a História
inesperada de um livro accidental]. Nova Iorque : Houghton
Mifflin Harcourt, 2011.
Green, Joel B., ed. Hearing the New Testament: Strategies for Interpretation
[Ouvindo o Novo Testamento: estratégias para interpretação].
Grand Rapids: Eerdmans, 1995.
Grudem, Wayne; Collins, C. John; Schreiner, Thomas R. Origem,
confiabilidade e significado da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 2013.
Leese, Daniel. Mao Cult: Rhetoric and Ritual in China’s Cultural Revolution
[O culto a Mao: retórica e ritual na Revolução Cultural chinesa].
Cambridge: Cambridge University Press, 2011.
Leuchter, Mark. “The Twelve and ‘The Great Assembly’ in History and
Rabbinic Tradition” [“Os Doze e ‘A grande assembleia’ na História
e tradição rabínica”], conferência apresentada no Methodological
Foundations —Redactional Processes — Historical Insights,
Münster 2011.
Packer, J.I.; Tenney, Merril C.; White Jr., William. Nelson’s Illustrated
Encyclopedia of Bible Facts [Enciclopédia ilustrada Nelson de fatos
bíblicos]. Nashville: Thomas Nelson, 1995.
Sanders, J.A. “The Issue of Closure in the Canonical Process” [“A questão do
fim do debate no processo canônico”]. In: McDonald & Sanders,
The Canon Debate [O debate sobre o cânon]. Peabody:
Hendrickson, 2002.
Schroeder, H.J. The Canons and Decrees of the Council of Trent [Os cânones
e decretos do Concílio de Trento]. Charlotte: TAN Books, 1978.