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Editorial

BENJAMIN
RIBEIRO DA SILVA

CRIANÇAS: PAGANDO UM PREÇO Presidente do Sieeesp


benjamin@einstein24h.com.br

MUITO ALTO, QUE NÃO É DELAS

D
epois de um ano de pandemia, a re- Mesmo agora, as autoridades estaduais tiveram
tomada das aulas vinha sendo feita o bom senso de preservar as escolas abertas das
de forma gradativa e segura. Havia três redes, graças ao correto entendimento cientí-
(e há) o entendimento por parte da Secretaria fico, de que escola é serviço essencial, e o vírus
Estadual da Educação - Seduc - de que a edu- não está lá.
cação é essencial, importantíssima, para o de- Mas, a politicagem voltou a interferir na vida dos
senvolvimento das crianças. Não só do ponto de alunos, com vários prefeitos decretando o lockdown
vista educacional, mas também de todas as escolas, atropelando
pelo fundamental acolhimento o direito constitucional à educa-
e socialização que nelas acon- ção. Ocorre que há tempos já foi
tece, principalmente para os devidamente comprovado que
pequenos. Não houve nenhuma as crianças não são vetores de
Não obstante, a Seduc criou disseminação da Covid-19, pois
um sistema de rastreamento de contaminação pouco contraem e transmitem a
possíveis casos de Covid-19 e, até gerada no próprio doença, muito menos ainda na
o fechamento desta edição, não escola, um local controlado.
houve nenhuma contaminação ambiente escolar, Além disso, não há nenhuma
gerada no próprio ambiente esco- ou em decorrência prova científica de que o lockdown
lar, ou em decorrência exclusiva é eficiente para conter a doença,
dele: todos os casos informados exclusiva dele: todos ainda porque mais confinamento
de suspeita ou de Covid-19 acon- os casos informados combinado com restrições de
teceram fora da escola. atendimento a outras doenças
E essa constatação não nos de suspeita ou pode levar à morte outras pessoas
surpreende, pois o ambiente nas de Covid-19 com comorbidades. É o que afir-
escolas particulares é controlado, ma Michael Levitt, professor da
obedece aos rígidos padrões de aconteceram fora Universidade de Stanford e vence-
segurança e higiene estabeleci- da escola dor do prêmio Nobel de Química
dos pelo Plano São Paulo e pelo em 2013, para quem o lockdown
próprio protocolo do Sieeesp, como estratégia é perda de tempo.
elaborado por cientistas, médicos E pode custar mais vidas.
e especialistas. É evidente que não será apri-
As famílias se sentiram aliviadas com o retorno, sionando novamente os pequenos em casa que se
mesmo parcial, pois isso representava crianças conterá o coronavírus. Esse grave erro só causará
menos ansiosas, estressadas e tristes, e menos mais sofrimento, com as crianças pagando um
doentes, principalmente para os pequenos, e preço que não é seu, mas da politicagem em que
aqueles com algum transtorno. transformaram a pandemia.

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 3


Expediente / Índice

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DIRETORIA
Presidente
ÍNDICE
Benjamin Ribeiro da Silva
Colégio Albert Einstein
1º Vice-presidente

3 34
José Augusto de Mattos Lourenço
Colégio São João Gualberto
2º Vice-presidente
Waldman Biolcati
Curso Cidade de Araçatuba
Crianças: pagando um Jornada Online
1º Tesoureiro
José Antônio Figueiredo Antiório
Colégio Padre Anchieta
preço muito alto, que Bett Educar:
2º Tesoureiro não é delas transformação digital
Antônio Batista Grosso
Colégio Átomo e humana na educação
5
1º Secretário
Antônio Francisco dos Santos

38
Sistema Educacional São João
2º Secretário
Itamar Heráclio Góes Silva
Educ Empreendimentos Educacionais Como planejar as
incertezas? Transtorno do
DIRETORES DE REGIONAIS Espectro Autista
6
ABCDMR
Oswana M. F. Fameli - (11) 4437-1008

40
Araçatuba
Waldman Biolcati - (18) 3623-1168
Bauru
Gerson Trevizani Filho - (14) 3227-8503
Pedagogia tratada à
Campinas luz da Neurociência: O autismo na
Antonio F. dos Santos - (19) 3236-6333
Guarulhos
Programa A.M.I.G.A. realidade da sala
Wilson José Lourenço Júnior - (11) 4963-6842
Marília
de aula
Eledir Leonardo - (14) 3413-2437
Ribeirão Preto 16
João A. A.Velloso - (16) 3610-0217
Osasco
José Antonio F. Antiório - (11) 3681-4327 Informe de 44
Presidente Prudente
Antonio Batista Grosso - (18) 3223-2510
rendimentos: Imposto Autismo e inclusão:
Santos de Renda uma emergência real!
Ermenegildo P. C. Miranda - (13) 3234-4349
São José dos Campos

20 48
Maria Helena Bitelli Baeza Sezaretto
(12) 3931-0086
São José do Rio Preto
Cenira Blanco Fernandes Lujan - (17) 3222-6545
Sorocaba Introdução aos erros Síndrome de Down e
Edgar Delbem - (15) 3231-8459
de leitura e escrita em sua importância no
ABRIL DE 2021 - Edição 277 surdos e ouvintes contexto da vida
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4 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Planejamento

Como planejar na
incerteza?
E
cá estamos novamente que faremos se...?” que consiste em que inclua os principais executores,
diante de um ano todo construir caminhos para os cenários os professores. É essencial que os
pela frente. Época de ava- possíveis. Com relação ao funcio- docentes reflitam e se comrometam
liações e planejamentos que em namento das escolas em 2021, três com uma realidade redimensioná-
2021 ganha contornos de incertezas possibilidades se afiguram: o ensino vel a cada instante, que continuará a
e falta de referenciais para que pos- 100% remoto, o ensino híbrido e o exigir de cada um a autossuperação
samos cravar metas convictas. Pa- ensino presencial, que só se revela diária. Planejar na incerteza exige,
rece que a única meta do ano é tomar viável após a vacinação de mais da obrigatoriamente, a prática da par-
a vacina que nos fará imunes a esse metade da população brasileira. ticipação coletiva. •
vírus que roubou nossa sensação de Precisamos, no mínimo, dos planos
certeza sobre o futuro. Diante desse A, B e C com suas estratégias, recur-
JÚLIO FURTADO
cenário, os profissionais da educa- sos e objetivos específicos.
ção perguntam-se como planejar Por fim, planejar num mar de Consultor
diante desse contexto. dúvidas exige adaptação contínua de educacional,
professor, pedagogo,
Em primeiro lugar, lembre- estratégias diante das possibilidades psicopedagogo.
mos de que todo planejamento é de mudança. Essa adaptação deve Mestre em Educação e Doutor em
Ciências da Educação.
feito a partir de incertezas e que ser fruto de uma discussão coletiva
sua principal função é exatamente
minimizá-las. Todo planejamento,
por natureza, visa aumentar a con-
vicção a respeito das ações a serem
implementadas. Planejamos para
saber o que faremos depois. É exata-
mente nesse ponto que planejar em
O principal
meio ao caos parece impossível em requisito
função da fragilidade das certezas
sobre o amanhã. para planejar
Lembremos pois que, subjeti-
vamente, o planejamento é filho da
qualquer coisa
esperança e sem esse pressuposto é acreditar que
não há motivação para planejar.
Não se planeja o que não se acredi- é possível
ta: logo, o principal requisito para
planejar qualquer coisa é acreditar
que é possível. Daí surge o primeiro
pressuposto para se planejar num
cenário educacional de incerteza:
reforçar nossa convicção de que
conseguiremos promover apren-
dizagens mesmo através da modali-
dade remota ou híbrida, e de que é
possível construir um currículo de
transição que resgate as aprendiza-
gens que não ocorreram em 2020.
O segundo pressuposto de um
planejamento em meio a um contex-
to de incertezas é usar o princípio “o

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 5


Entrevista

VISTA
ENTRE

Célia Godoy

Ângela Mathylde

6 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Pedagogia tratada
à luz da Neurociência:
Programa A.M.I.G.A.

• • • • •
O SIEEESP apresentou, no dia 28 de janeiro, a aula inaugural do Programa A.M.I.G.A. -
Programa de Assessoria, Mentoria e Intervenção na Gestão da Aula: Neurociência e Pedagogia
aplicadas na prática escolar-, com a Profª Ms. Célia Godoy em parceria com a Profª Drª Ângela
Mathylde, sendo transmitida pelo Instagram e o canal oficial do SIEEESP no YouTube.

Os encontros gratuitos, e com certificação, acontecem em duas quintas-feiras de cada mês às


19h, ao decorrer do ano. O Programa A.M.I.G.A. apresenta temas de grande relevância para
a gestão da aula, aliados com exemplos práticos e em sintonia com as reais necessidades do
professor e da comunidade escolar. “Este é um programa de acolhimento, de muito amor, onde
nós vamos ouvir, acolher e trazer soluções para grandes mudanças”, ressalta Regina Stéfano,


coordenadora de Cursos do SIEEESP.

• • • •

Q uem são a s parcei-


ras do Programa
A.M.I.G.A.?
Célia Godoy - Sou professora, mes-
Pensem em um lugar que faz
parte da sua vida? Em um lugar
que se faz amigos? Lugar de par-
ticipantes que me compõem? Lugar
de respeito aos seus associados,
edificado e construído por muitas
mãos, por palestrantes queridos e
competentes que buscam interagir,
tre em Psicologia Social e pedagoga. de trocas e de escutas? Sim! É disto integrar e fundamentalmente aco-
Atualmente estou doutorando em que estamos falando! Trabalho e lher pessoas!
Ciências da Educação... amor caminham juntos, amo ser E é neste tecer de relações, algu-
Bem, sou da casa e pertenço a professora e o SIEEESP, ou seja, mas passageiras e outras tão pro-
essa família há 27 anos! Foi nos amo cada pessoa que durante todo fundamente solidificadas entre as
idos de 1995, quando realizava esse tempo, estiveram presentes em pessoas e eu, que sigo cumprindo a
uma palestra em um Congresso, nossas salas, preencheram espaços minha missão: potencializar os va-
sobre a importância da literatura com tanto amor e dedicação, ensi- lores inerentes de cada ser humano,
no cotidiano escolar, pela antiga naram e aprenderam! onde meu propósito cria vida que é
Consultoria ECOPLAN, que fui O meu apreço ao SIEEESP ser professora, espalhando semen-
apresentada à querida e compe- se configura primeiramente por tes do bem, do conhecimento e da
tente Regina Stéfano, que fez uma considerá-lo como um lugar de troca, para que possam florescer no
pergunta tão mágica que mudou a gente, em um espaço de entrega coração das pessoas que também
minha vida: Você quer trabalhar (hoje consolidado por meio das amam o que faz, transformando
junto ao SIEEESP? tecnologias), de conhecimento, certas dúvidas em provisórias

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 7


Entrevista

certezas, construindo pilares para


a ação, vivendo a pedagogia da
A compreensão
presença! Nestes anos todos, fiz do fenômeno
amigos, evoluí, aprendi, inovei e
sigo crescendo e aprendendo. educativo e sua
Tempos em que trabalhamos
exaustivamente com a formação
intervenção
de professores, coordenadores intencional fez
pedagógicos, diretores e man-
tenedores! Cursos inéditos como: surgir um saber
Paredes a pontes, Raízes e asas,
Gestão da sala de aula, Avaliação,
específico que
Pedagogia de Projetos, PPP, Visão modernamente
Estratégica, Alfabetização, BNCC,
ensino híbrido entre outros, e o associa-se ao
mais incrível: sempre em sintonia
com “nossa” coordenadora de Cur-
termo Pedagogia
sos, professora Regina Stéfano e
sua equipe tão dedicada: Isabel, Ju- uma parceria comprometida com
liana e Elielson! Meu sentimento? a excelência e com a verdade em
Gratidão! primeiro lugar teria que acontecer
Drª Ângela Mathylde - Fui em um lugar!
convidada pelo SIEEESP para Em 2020, surgiu a ideia do
estar em dois momentos muito Programa A.M.I.G.A., ainda sem
impor tantes para a educação, esse nome definido. Mas, com a pre-
ambos com foco nos professores sença e parceria da Drª Ângela, que
e na qualidade de ensino. Fui con- é neurocientista e psicopedagoga, o
vidada com o objetivo de trazer ao Programa foi se reorganizando pela
chão de sala de aula a excelência da aliança entre duas ciências: am-
Ciência e da prática. pliamos o nosso olhar, e podemos
A coordenadora de formação de dizer que a Pedagogia tratada à luz
cursos, professora Regina Stéfano, da Neurociência já está sendo um
incansável em seus objetivos, viu sucesso!
em mim a possibilidade de somar,
agregar e realizar todas as ações O que significa a parceria de
realizadas por este sindicato. Por- duas ciências?
tanto, quando recebi o convite, A Pedagogia é uma ciência social
fiquei muito honrada de fazer parte e pode ser entendida como um con-
desse time. Espero contribuir de junto de técnicas, métodos, estra-
forma expressiva e retribuir a con- tégias, concepções e princípios da
fiança que estão depositando em educação e do processo de ensino e
mim. Agradeço à família SIEEESP aprendizagem. A Pedagogia estuda
pela acolhida. os ideais de educação, segundo uma
determinada concepção de vida,
Te m o s d u a s p e s s o a s e m e dos processos e técnicas mais
tempos de estada diferentes no eficientes para realizá-los, para,
SIEEESP. Como se deu a par- assim, aperfeiçoar e estimular a
ceria? Por quê? E de que forma capacidade das pessoas no ambien-
essa parceria de vocês tem acon- te escolar.
tecido? Está relacionada com os aspec-
Nos conhecemos virtualmente tos da sociedade e também com as
no 1º Congresso sobre Dificuldades normas educacionais do País. Há
de Aprendizagem, realizado em muitos campos de atuação, sendo
2020. Assistimos às palestras mi- de grande relevância a área do
nistradas separadamente e assim Magistério e da Administração.
nos sintonizamos! Acreditamos que O pedagogo pode tanto gerenciar

8 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


e supervisionar o sistema de en- roaprendizagem, para esclarecer o ficas e, assim, por meio de práticas
sino quanto orientar os alunos e funcionamento do sistema nervoso. pedagógicas, promover um desen-
os professores. Ele tem um papel Os circuitos são responsáveis pelas volvimento cerebral adequado e
relevante onde houver uma prática funções mais básicas do sistema eficiente, formando cidadãos mais
educativa e, portanto, onde se ins- nervoso, como comportamento, críticos, humanos e conscientes do
tala uma ação pedagógica. emoções e capacidade de pensar, seu papel, não só na vida acadêmi-
O papel do pedagogo requer inú- lembrar e armazenar informações. ca, como na sociedade.
meras competências relacionadas Ao analisar os circuitos neuronais
ao exercício de suas funções quan- durante o funcionamento, pode-se Por que recebeu o programa
do trabalha nas escolas que, além compreender como são geradas as recebeu o nome de A.M.I.G.A.? O
de estabelecer uma relação dialógica habilidades intelectuais do ser hu- que significa esta sigla?
com quem ensina e aprende, pode mano, como raciocínio, linguagem Significa Programa de Asses-
orientar os estudantes neste proces- e criatividade. soria, Mentoria e Intervenção na
so de aprendizagem, está apto para E é e st a a lia nç a que pro - Gestão da Aula: Neurociência e
acompanhar e promover a melhoria movemos no espaço do Programa Pedagogia aplicadas na prática
da qualidade de ensino, realizar A.M.I.G.A., enfatizando a com- escolar.
pesquisas educacionais, coordenar preensão e relevância do uso de
pedagogicamente as Instituições técnicas e estratégias, entre outros, De que forma foi concebido
Educacionais, promover a formação para estimular o cérebro da crian- o Programa A.M.I.G.A.? Quais
continuada em serviço, escrever ou ça. Entendemos que o processo de são a razão e a essência do pro-
revisitar o PPP, reorganizar o cur- construção do conhecimento não grama?
rículo das escolas, entre outros. De pode ser compreendido por um O Programa A.M.I.G.A. foi de-
acordo com o site 2B educação, a único viés, porque acreditamos finitivamente concebido em 2020,
compreensão do fenômeno educa- que a Pedagogia fornece estratégias após a parceria, para ser um pro-
tivo e sua intervenção intencional de ensino e a Neurociência, que grama que apresentasse um diferen-
fez surgir um saber específico que traz evidências científicas para a cial, como um lugar de reflexões e
modernamente associa-se ao termo aplicação de tais estratégias e ao que pudesse trazer temas relevantes
Pedagogia. relacionarmos as duas ciências e em consonância com as demandas
Assim, a relação inseparável significa trazer, para a sala de aula, do calendário escolar, das possíveis
entre a prática educativa e a sua uma potencialização entre corpo e necessidades dos professores e dian-
teorização elevou o saber peda- meio social, em períodos que são te do cenário atual. Inicialmente
gógico ao nível científico, e isso é propícios para habilidades especí- seria o lugar da Pedagogia!
fundamental para se entender o
que é Pedagogia. Com este caráter,
o pedagogo passa a ser, de fato e de
direito, investido de uma função
reflexiva, investigativa e, portanto,
científica do processo de ensino e
aprendizagem.
Já a Neurociência surgiu das
indagações mais constantes e in-
quietantes da humanidade: afinal,
como o cérebro funciona? As inves-
tigações sobre emoções, percepção
e a relação entre aprendizagem e
memória têm sido fundamentais
para compreender a capacidade
intelectual humana e, inclusive, es-
boçar perspectivas para o futuro da
educação, quando se pensa em um
mundo cada vez mais tecnológico.
A Neurociência estuda as áreas
de conhecimento biológico, sendo
que os circuitos neuronais são as
principais pesquisas para relacionar
neurociência e educação ou neu-

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 9


Entrevista

Pedagogia tão esquecida e que é tencionalidade: quando nomeamos de construção do saber, junto às
a base fundante do nosso trabalho o programa a primeira ideia foi famílias etc.
como professores! Pedagogia que pensar como nossa atuação poderia Para surpresa nossa, o nome
precisa ser resgatada para não ceder Assessorar, Mentorear, Intervir representa a maneira que nos refe-
seu lugar para outras ciências! Não na Gestão da Aula, por meio dos renciamos: AMIGA de profissão,
porque são menos importantes, temas eleitos para a sua realização. de causa, de ideal, amiga que cria
como por exemplo, a Psicologia, a Só então nos demos conta de que vínculos de afeto e que troca des-
Psicopedagogia, a Neuropedagogia esse é o novo papel dos gestores pretenciosamente saberes, modos
e Neurociência são imprescindíveis escolares, educadores e de toda de ser e de pensar. Uma parceria
para complementar, elucidar e nos comunidade educativa, ou seja, que ora se complementa, ora traz
fazer entender como o aluno pensa que todos nós envolvidos com a ex- visões diferenciadas sobre temas e
e aprende; como lidar com “meni- celência da Educação muitas vezes performances.
nos” com dificuldades e transtor- precisamos assessorar, mentorear e
nos, como funciona o nosso cérebro intervir na sala de aula, nos espaços PROGRAMA A.M.I.G.A.:
etc. Porém, precisamos pensar
antes como deve ser a Gestão da ASSESSORAR MENTOREAR INTERVIR
Aula, como planejar com eficácia,
Diagnosticar e escutar; Trocar experiências Possibilitar o acesso
como avaliar de maneira proces- colaborar em parceria; entre duas pessoas; ao conhecimento;
sual, como organizar a turma, revelar caminhos; focar nos desafios; perceber as dificuldades
como criar vínculos de afeto com construir juntos; buscar identificar os objetivos; do processo de
os estudantes. Enfim, o Programa soluções; superar encorajar e sensibilizar; desenvolvimento e
A.M.I.G.A. tem como objetivo cen- fragilidades; promover orientar e estimular aprendizagem dos
tral espalhar sementes… o alcance de resultados; ações; potencializar os estudantes!
comemorar! valores inerentes do ser
O Programa A.M.I.G.A. carrega humano!
em si três formas de ser na sua in-

O Programa A.M.I.G.A.
tem como objetivo central
espalhar sementes

10 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Entrevista

Quais temas serão abordados


pelo programa?
A Neurociência
O Programa A.M.I.G.A. apre- estuda as áreas
senta temas de grande relevância
para a Gestão da Aula, aliados com de conhecimento
exemplos práticos e em sintonia com
as reais necessidades do professor e
biológico, sendo
da comunidade escolar. Os encontros que os circuitos
são gratuitos e com certificação e
acontecem em duas quintas-feiras de neuronais são as
cada mês, sempre às 19h, durante o
decorrer do ano [veja o calendário].
principais pesquisas
Estamos fazendo a “parte que nos para relacionar
cabe”, sempre embasadas teorica-
mente como forma de gerar novos neurociência
processos de reflexão, e alargar a
compreensão sobre os saberes e
e educação ou
fazeres das escolas e de nós mesmas. neuroaprendizagem
É um programa tão inédito que
trará temas relevantes para a ex-
celência da gestão da sala de aula processo de ensino e aprendizagem.
e para toda a comunidade escolar, A importância de cultivarmos a
como, por exemplo: lição de casa, gratidão e sua influência para nossa
autonomia, indisciplina, recreio, humanização. Os temas da aula inau-
organização de materiais, encontro gural que merecem destaque foram:
de pais, os registros, evolução do 1. O cuidado no regresso
desenho, as diferentes faixas etárias, 2. A sala de aula: morada dos
protagonismo, ensino híbrido, res- saberes
ponsabilidade social, pilares da 3. O cuidar das emoções e a
aprendizagem; ludicidade; critérios acolhida
avaliativos; transtornos cognitivos e 4. Caminhos da felicidade
comportamentais; educação integral, 5. O funcionamento do cérebro
violência simbólica, física e verbal,
sequência didática, entre outros. EPISÓDIO 2
Estratégias da avaliação diag-
Sobre os episódios que acon- nóstica inicial baseada em evi-
teceram, o que foi tratado? dências
No dia 18 de fevereiro aconteceu
AULA INAUGURAL o Episódio 2, com ênfase sobre a im-
A aula inaugural e a apresenta- portância da Avaliação Diagnóstica
ção do Programa aconteceram em Inicial, entendida como um movi-
28 de janeiro, sendo que o tema mento que gera descobertas em re-
tratado foi muito inspirador para lação ao que o estudante já aprendeu
os educadores que estavam retor- ou que ainda está em processo. Que
nando presencialmente para as o tempo para sua aplicação precisa ir
escolas. O título foi "Feliz regresso além do convencional: atividades no
para quem ama o que faz!" sulfite ou em plataformas…
Sobre o regresso dos professo- Interessante destacar que a
res e estudantes presencialmente própria acolhida dos estudantes
(35%) nas escolas, exaltamos que que envolvem atividades de escuta,
por amar o que faz, o coração não de afetos e sintonia, podem se tor-
regressa, porque jamais saiu do nar dados observáveis. Prestar
lócus da escola, embora tenha sido atenção nas próprias emoções e
compartilhada por meio do ensino nas emoções dos “meninos” é uma
remoto, transbordado pela alegria, das maneiras de avaliar para além
felicidade e pelo compromisso com o dos conteúdos. Exemplificamos

12 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


algumas atividades, como por
exemplo: solicitar no primeiro dia
um desenho, para “ler” pedagogi-
camente seu estágio de evolução, a
fase em que se encontra, se houve
ou não uma evolução.
Enfatizamos a eleição dos cri-
térios que irão compor os dados
observáveis da Avaliação Diag-
nóstica Inicial, sobre a maneira
que contribuem para a construção
de um PDI referenciando a BNCC,
exemplificando a importância da
ZPD, destacando que ela pode
ocorrer nas três formas atuais que
acontece o processo de construção
do conhecimento: ensino presen-
cial, remoto e híbrido.
1. O papel e funções da Avalia-
ção Diagnóstica como contribuição
para o PEI ou PDI;
2. De que forma mentorear o
conhecimento prévio e ZDP;
3. Aplicação em diferentes es-
paços de aprendizagem: ensino
presencial, remoto ou híbrido;
4. Detecção das possíveis cau-
sas e os tipos de dificuldades de
aprendizagem;
5. Critérios para elaboração
da avaliação em consonância com
a BNCC e exemplos de atividades
avaliativas.

EPISÓDIO 3
Dia 4 de março o tema referia-
se à Avaliação Diagnóstica Inicial,
com foco na construção de pilares e
critérios de observação, abordando
alguns transtornos no processo de
ensino e de aprendizagem.

Pilares e critérios de obser-


vação da avaliação diagnóstica
inicial, percepções do professor
X intervenções:
1. Pilares e critérios de observa-
ção e estratégias interventivas
2. Professor: Relação Interpes-
soal X Saúde Mental
3. Transtornos de personalidade
X aprendizagem
4. Transtornos mentais X apren-
dizagem
5. Transtornos do neurodesen-
volvimento X aprendizagem

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 13


Entrevista

8. Como fazer para partici- Abril


par?
O SIEEESP apresenta o Pro- O SIEEESP Episódio 5 Episódio 6
Dia 15 Dia 29
grama A.M.I.G.A. por acreditar que
será um grande divisor de águas,
apresenta o Maio
em que o participante pode optar Programa Episódio 7 Episódio 8
pela maneira que quer efetivar sua
participação; um lugar autêntico, A.M.I.G.A. por Dia 13
Junho
Dia 27

preparado com cuidado, um lugar


onde duas ciências se fundem para
acreditar que será Episódio 9 Episódio 11

construir novos olhares e novos um grande Dia 10


Julho
Dia 24

saberes.
Aproveitamos, para solicitar divisor de águas Episódio 12 Episódio 13
aos gestores que divulguem para Dia 14 Dia 28
suas equipes docentes: entendemos Agosto
que é um programa de formação interessados podem entrar no site
Episódio 14 Episódio 15
em serviço, que não se esgota ao www.sieeesp.org.br.
Dia 12 Dia 26
final da nossa apresentação. Ao
contrário, abre possibilidades de Participação: Setembro
revisitar suas ações, para solidifi- 1. Você pode participar de todos Episódio 16 Episódio 17
car novas ações: assessorar suas os encontros ou eleger os que fazem Dia 16 Dia 30
equipes e o professor seus alunos, sentido para você. Outubro
mentorear outras e intervir quando 2. Ao fazer sua inscrição pelo
Episódio 18 Episódio 19
necessário! Sympla e ao assinar a lista de pre-
Dia 07 Dia 21
O programa é gratuito, median- sença (chat) no dia dos encontros,
te retirada de ingressos no Sympla. você recebe certificado. Novembro
Conforme disse anteriormente, 3. Sem inscrição você pode par- Episódio 20 Episódio 21
são aulas gratuitas que acontecem ticipar da mesma forma, mas não Dia 11 Dia 25
duas quintas-feiras por mês, no recebe o certificado. Dezembro
Canal do SIEEESP no YouTube, Segue o calendário dos próximos
Episódio 22
por videochamada, sempre às 19 episódios do Programa A.M.I.G.A.
Dia 16
horas. Para mais informações, os para você se programar! •

14 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Jurídico

INFORME DE RENDIMENTOS:

Imposto de Renda

M
ais um mês de abril (1) A regra de apuração mensal, imposto já recolhido mensalmente
chegou e com ele o aplicável à retenção na fonte do utilizando os critérios de retenção
tão temido leão volta Imposto de Renda a pagamentos de imposto utilizando a regra nº1.
a bater em nossas portas. A decla- recebidos dentro do próprio no mês Sendo essa diferença anual
ração de ajuste anual do Imposto pela mesma fonte pagadora que positiva, deverá então ser recolhida
de Renda da Pessoa Física (DIPF) superem o valor de R$ 1.903,99: a diferença do imposto em quotas
já não é mais nenhuma novidade e, (2) A regra de apuração anual, ou a vista; sendo ela negativa, será
assim como o próprio nome já diz, aplicável na declaração de ajuste processada e efetuada a restituição
o principal objetivo da Declaração do Imposto de Renda a pagamento do imposto conforme calendário,
é realizar um ajuste no cálculo recebidos dentro do ano-calendário que respeitará a data de entrega da
do Imposto de Renda devido no de incidência e que superem o valor declaração.
ano-calendário de sua incidência, de R$ 22.847,77: Entendido o objetivo da declara-
isso por que, quando falamos de Ou seja, “o ajuste” assim por ção, para o correto preenchimento
pagamentos efetuados a pessoa chamá-lo nada mais é do que: das fichas nela existentes e para
física, temos duas regras de base efetuar o cálculo do imposto devido prestar as informações necessárias
de cálculo de pagamento a serem sobre a renda auferida anualmente e requeridas pelo fisco, é impor-
aplicadas: (regra nº 2), subtraindo todo o tante que a pessoa física efetue

16 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


a guarda dos documentos ne- pessoa jurídica à pessoa física, com
cessários, que comprovarão todos indicações da natureza e montante
O principal os valores declarados, sejam eles a do pagamento, das deduções e do
objetivo da título de rendimento ou para fins
de dedução do imposto.
Imposto de Renda retido.
Este documento fornecido pela
Declaração é Nesse aspecto, uma das informa- fonte pagadora dos rendimentos
ções mais importantes para a pessoa nada mais é que um espelho das
realizar um ajuste física que teve pagamentos rece- informações por ele também já
no cálculo do bidos por pessoa jurídica mensal-
mente, e por consequência, a tam-
prestadas através da Declaração de
Imposto de Renda retido na Fonte
Imposto de Renda bém retenção do imposto na fonte, (DIRF), Isso por que, ao passo que
é o documento instituído pelo art. a Pessoa Física precisa declarar os
devido no ano 19 da Lei 8.134/1990 – denominado seus rendimentos recebidos para o
calendário de Informe de Rendimentos. Neste, que
deve ser fornecido até o dia 28 de fe-
fisco, a pessoa jurídica que originou
estes pagamentos também faz a
sua incidência vereiro de cada ano, deverá constar sua parte de fornecer estas infor-
todos os pagamentos efetuados pela mações à Receita Federal que, após

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 17


Jurídico

recepcioná-las, efetua o cruzamento


para validação das informações
É sempre válido resultará na confecção do informe
de rendimentos.
prestadas por ambas as partes. garantir a Portanto, em se tratando do
No entanto, o simples fato de Imposto de Renda na Fonte é
os pagamentos recebidos pela pes- conformidade evidentemente claro que a Receita
soa física não houver incorrido
em retenção na fonte pela regra 1
das informações Federal segue, através do crono-
grama de entrega de declarações,
explicada anteriormente (mensal) contidas nos uma ordem de coleta de informa-
isso não dispensará a fonte paga- ções, ora pela fonte pagadora, ora
dora (Pessoa Jurídica) de ainda informes antes pela fonte recebedora e, indepen-
assim prestar estas informações à
Receita Federal. Isso porque estão
do envio dente de qual dessas posições você
esteja, é sempre válido garantir
obrigados a serem declarados na a conformidade das informações
DIRF pela Pessoa Jurídica também ponibilização e envio do informe contidas nos informes antes do en-
os pagamentos de trabalho sem de rendimento pelos pagamentos vio, para evitar assim desencontro
vínculo empregatício, de aluguéis e efetuados para a pessoa física. de informações que podem trans-
de royalties, acima de R$ 6.000,00 Em ambos os casos, é de ex- formar a declaração de imposto
pagos durante o ano-calendário. trema importância que a instituição retido na fonte em declaração
No cenário das instituições de efetue estas contratações sempre retida na malha. •
ensino, é muito comum a contrata- de maneira formal, e com um
ção de profissionais autônomos documento hábil que contenha de
PAULO ROBERTO
(trabalhadores sem vínculo empre- maneira clara a discriminação do LEITE DANTAS JÚNIOR
gatício), assim como de pagamentos objeto do contrato e dos valores
Supervisor Fiscal na
de aluguéis de imóvel a pessoa pagos e que, por ocasião de cada Meira Fernandes.
física, o que gera nesse vínculo de pagamento, este sempre seja acom- Contador com 10 anos
de experiência na
negócio, além da responsabilidade panhado de recibo que contenha a área tributária, bacharel em Ciências
solidária em relação à retenção e informação sobre a retenção ou não Contábeis pela Universidade São
Judas Tadeu, com especializações em
recolhimento do imposto de renda do imposto de renda, uma vez que, Business Process Management (BPM)
retido na fonte (quando aplicável), todos estes recibos juntos, serão a e Gerência de Projetos, ambas pela
Fundação Bradesco.
também a obrigatoriedade da dis- principal fonte de informação que

18 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Matéria de Capa

O surdo congênito
sinalizador pensa
em sinais, mas
precisa escrever
em Português

20 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


INTRODUÇÃO AOS ERROS
DE LEITURA E ESCRITA EM
SURDOS E OUVINTES

A
o escrever, frequente- língua materna (L1), seja ela fala
mente tomamos ditado ou sinal.
da fala de locutores. Problemas de nomeação podem
Frequentemente também toma- decorrer de pobre vocabulário de
mos ditado de nossa própria fala, fala ou sinalização para denominar
seja audível ou apenas audibi- os objetos. Podem ocorrer também
lizada mentalmente, como quando em quadros de anomia, disnomia,
fazemos redação livre ou relato. ou dislexia. Uma das características
Nesse caso, primeiro formulamos centrais da dislexia é nomeação
mentalmente os pensamentos em serial pobre. Os erros também po-
fala interna. Em seguida, conver- dem refletir problemas de cifragem
temos o fluxo da fala interna no da fala em sinal, como também é
corres-pondente fluxo da escrita. típico da dislexia do desenvolvi-
Por isso, mesmo tarefas de nomea- mento. Outro problema é a descon-
ção escrita são essencialmente tare- tinuidade entre a fala e o sinal, que
fas de escrita sob ditado de nossa constitui a dificuldade principal dos
própria fala interna audibilizada surdos sinalizadores. O surdo con-
(no caso dos ouvintes) ou visuali- gênito sinalizador pensa em sinais,
zada (no caso de videntes com mas precisa escrever em Português.
deficiência auditiva), ou de nossa Um dos pontos mais importantes
própria sinalização interna (no é o de aprender a como indexar as
caso dos surdos). Por isso os erros palavras do Português nos sinais
de escrita podem refletir diversos da Libras, de modo a poder usar os
problemas em diversas etapas, a sinais da Libras para evocar e re-
começar pela inicial de nomeação cuperar as palavras do Português.
do objeto com um item lexical da Falha em qualquer desses estágios

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 21


Matéria de Capa

acarreta erros de leitura (parale-


xias) e de escrita (paragrafias), que
Primeiro a criança aprende a revela os processos cognitivos usa-
dos para ler e escrever ao escrever
codificar a fala em escrita com sob ditado externo ou interno.

atividades de escrita sob ditado, Fala interna e sinalização interna


e aprende a decodificar a escrita Pessoas ouvintes ouvem seus
interlocutores e respondem a eles,
em fala com atividades de leitura seja de modo audível na conver-
sação, ou apenas audibilizado
em voz alta. Depois a criança mentalmente, como num diálogo
aprende sobre morfologia e imaginário. Com sua fala interna
essas pessoas falam a si próprias;
sobre sintaxe com seu ouvido interno, ouvem-se
a si mesmas. O Pinóquio ouvinte
tem seu “grilo falante” e sua “voz
da consciência audibilizável men-
talmente”.
Pessoas com deficiência auditiva
fazem leitura orofacial visual e res-
pondem aos seus interlocutores.
Falam internamente e imaginam
a fala visualmente por meio de seu
olho interno. Com sua fala interna,
falam a si próprias; com seu olho
interno, assistem a si mesmas fa-
lando consigo mesmas. O Pinóquio
vidente com deficiência auditiva
também tem seu “grilo falante” e
sua “fala da consciência visuali-
zável mentalmente”.
Pessoas surdas interagem com
seus interlocutores em sinais, e o
fazem tanto de maneira conspícua
e aberta quanto de maneira mental
interna. Têm sinalização interna
para sinalizar a si próprias e olho
interno para assistir a si mesmas. O
Pinóquio sinalizante também tem
seu “grilo sinalizante” e sua “sinali-
zação da consciência visualizável
mentalmente”.
Embora todas essas pessoas
possam ler e escrever, os processos
cognitivos empregados variam nas
ouvintes, surdas videntes, surdoce-
gas, e com deficiência auditiva.
Os processos distintos refletem
diversos fatores, a começar pela lín-
gua primária natural com que essas
pessoas pensam e se expressam.
Essa língua primária natural pode
ser a fala ou o sinal. Esses proces-
sos diferem, também, dependendo
da modalidade sensorial em que a

22 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Matéria de Capa

sinalização, a fala e a escrita são


recebidos. A fala pode ser recebida
por audição (como na compreensão
auditiva usual do ouvinte, ainda
que cego), visão (como na leitura
orofacial visual feita pelo vidente,
ainda que surdo), ou tato (como
na leitura orofacial tátil feito pelo
surdocego, feita com sistemas como
o Tadoma). O sinal, por sua vez,
pode ser recebido por visão (como
na língua de sinais visual) ou tato
(como na língua de sinais tátil do
surdocego). Igualmente a escrita
pode se dar de maneira visual ou
tátil (como no sistema Braille).

Dois princípios da escrita: semio-


tático e fonotático
A escrita alfabética é regida por
dois princípios: o fonotático e o se-
miotático. O fonotático explica como
a escrita mapeia a fala. O semio-
tático explica como a escrita mapeia
o significado, seja ele codificado por
meio de palavras ou por meio de
sinais. No princípio semiotático, a
escrita é analisada nas menores uni-
dades de significado, que são mor-
femas, tanto os lexicais (lexemas)
quanto os gramaticais (gramemas).
Nesse caso a língua de sinais é
usada como metalinguagem para
aprender o significado da palavra,
decompor a palavra em suas uni- do princípio semiotático ter sido conversão da fala em escrita é feita
dades de significado, e estabelecer explorada ao máximo para explicar pelo processo de codificação (isto é,
correspondências. Correspondência como a escrita mapeia o significado, conversão segundo um código) das
entre a estrutura morfêmica do sinal Portanto, como vimos, a escrita unidades da fala (fones) nas suas
e da palavra escrita. é regida por dois princípios: o se- respectivas unidades de escrita
O princípio fonotático estabele- miotático e o fonotático. (grafemas). O processo é chamado
ce a continuidade entre a fala e (1) O princípio semiotático de cifragem fonografêmica. Apren-
a escrita, seja a fala recebida por estabelece que a escrita codifica der a ler é aprender a reconverter a
audição, visão ou tato. A mesma significado por meio de unidades escrita em fala, recuperando a fala
continuidade inexiste entre o sinal de significado, os morfemas lexi- original que deu origem à escrita
e a escrita. Por isso a fala é o elo cais (lexemas) e os gramaticais por meio de conversão, e que se
para alcançar precisão de leitura e (gramemas). encontra “enlatada” nessa escrita.
de escrita (composição ortográfica) (2) O princípio fonotático es- Tal reconversão da escrita em fala é
das palavras, e para erradicar erros tabelece que a escrita mapeia a feita pelo processo de decodificação
decorrentes da dificuldade em fixar voz, a fala ouvida. As unidades das unidades de escrita (grafemas)
a ordem das letras nas palavras, e de escrita (grafemas) mapeiam nas respectivas unidades de fala
das palavras na frase. Quando o as unidades audíveis da fala, que (fones). O processo é chamado de
surdo aprende a usar a fala como são as unidades de voz (fonemas). decifragem grafofonêmica.
elo de ligação intermediário entre A escrita é a fala audível cifrada,
o sinal e a escrita, sua leitura e depois de codificada ou enlatada. Ordem nos princípios da escrita
escrita melhoram fortemente. Mas Aprender a escrever é aprender a (1) Quando alfabetizamos crian-
isso apenas depois que a primazia converter a fala em escrita. Essa ças cuja língua materna (L1) é

24 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


O princípio
fonotático
estabelece a
continuidade entre
a fala e a escrita,
seja a fala recebida
por audição, visão
ou tato. A mesma
continuidade
inexiste entre o
sinal e a escrita
A unidade da fala audível (da voz)
é o fonema. Porque usualmente
trata de alfabetização de ouvintes
o princípio lalotático é usualmente
chamado de princípio fonotático.
Mas essa terminologia não é sufi-
cientemente inclusiva. Precisamos
de taxonomia e nomenclatura que
trata da alfabetização não só de
ouvintes, como, também, de surdos
e de cegos. O princípio fonotático
é um caso do princípio lalotático,
que é denominador comum para
ouvintes cegos, videntes surdos, e
Português, o principio fonotático acontece, especialmente, no caso surdocegos.
precede o semiotático. Por isso, de crianças surdas. Nesse caso, a Um modelo mais preciso con-
para essas crianças, as atividades língua de sinais é L1; o Português, sidera que a fala pode ser recebida
metafonológicas e fônicas de cifra- L2. No caso de crianças indígenas nas três modalidades sensoriais:
gem e decifragem precedem as de surdas, cuja comunidade tem lín- audição para ouvintes (videntes
morfologia e sintaxe. Assim, pri- gua escrita, além do Português, o ou cegos); visão para videntes
meiro a criança aprende a codificar Português passa a L3. Assim, a lín- (ouvintes ou surdos), como na
a fala em escrita com atividades gua de sinais indígena é L1, a língua leitura orofacial visual por surdos
de escrita sob ditado, e aprende a escrita indígena é L2, e Português videntes; e tato para sencientes
decodificar a escrita em fala com escrito é L3. (ouvintes ou surdos; videntes ou
atividades de leitura em voz alta. cegos), como na leitura orofacial
Depois a criança aprende sobre O princípio lalotático: como se dá a tátil empregada por surdocegos
morfologia e sobre sintaxe. tomada de ditado por ouvintes ce- usuários de sistemas como o Tado-
(2) Por outro lado, quando alfa- gos, videntes surdos, e surdocegos ma, por exemplo. A fala audível é
betizamos crianças estrangeiras ou O princípio fonotático é, mais otolalia; a fala visível é optolalia; a
indígenas cuja L1 não é Português, propriamente, o princípio lalotáti- fala tateável é tatolalia.
o principio semiotático precede o co, já que a fala pode ser recebida
fonotático. Assim, na alfabetização não apenas por audição como, tam- A fala produz otolalemas, optolale-
de indígenas e estrangeiros, o léxico bém, por visão e tato. O princípio mas, tatolalemas
e a morfologia precedem as ativi- lalotático estabelece que a escrita Surdos não ouvem. Mas a fala
dades metafonológicas e fônicas de mapeia a fala. A fala recebida por não é recebida só por audição. Ela
cifragem e decifragem. O mesmo audição é voz que, em grego é foné. produz sinais nas modalidades

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 25


Matéria de Capa

misto do input auditivo (otolale-


mas) com o input visual (optola-
Os míopes lemas).
O efeito McGurk (1976) é prova
relatam que de que a percepção da fala pelo neu-
não “ouvem” rotípico é um misto de otolalemas
e optolalemas. Na demonstração
bem sem desse efeito, um espectador assiste
à emissão da fala de um ator, e deve
os óculos identificar que unidade de fala é
aquela. Um ator aparece no vídeo
articulando fala com unidades
consonantais velares (como /gaga/,
/kaka/); mas o áudio simultâneo é
de fala com unidades consonantais
bilabiais (como /baba/, /papa/).
Ou vice-versa. Nos dois casos, o
espectador relata que o ator está
articulando outra unidade, que
usualmente tem ponto de articula-
ção medial entre o bilabial e o velar
(como o labiodental /dada/, /tata/).
Isso explica porque os míopes re-
latam que não “ouvem” bem sem
os óculos.

Como neurotípicos, surdos, cegos,


e surdocegos tomam ditado da fala
Surdos videntes recebem a fala
por leitura orofacial visual. Eles de-
auditiva (fonemas), visuais e táteis. {\m\}, {\n\}, {\p\}, {\b\}, {\m\}. pendem de as unidades visíveis da
Fala em grego é laleo. Audição é • Unidades da fala tateáveis, ou fala (optolalemas) serem bastante
designada pelo radical grego otos tatolalemas, são representadas en- distintas umas das outras para
(e.g. otologista, otite). Visão, pelo tre barras invertidas contidas entre compreender bem a fala, bem como
radical optos (e.g., óptica, opto- carets, como: <\f\>, <\k\>, <\d\>, para tomar ditado de modo preciso.
metria). Tato, pelo radical tato. A <\g\>, <\v\>, <\t\>, <\∫\>, <\3\>, Assim, para surdos videntes, a
unidade da fala audível é otolalema <\m\>, <\n\>, <\p\>, <\b\>, <\m\>. compreensão da fala recebida por
(ou fonema); visível é optolalema; leitura orofacial visual, bem como
tateável é tatolalema. Em termos Para compreender a fala, recep- a escrita por cifragem de optola-
de representação: tores diferentes processam diferen- lemas em grafemas na tomada de
• Unidades de fala, ou lalemas, tes unidades da fala: ditado da fala recebida por leitura
são representadas entre barras • Ouvintes cegos processam as orofacial visual, são vulneráveis
invertidas, como: \f\, \k\, \d\, \g\, unidades da fala audível, os otola- à presença de homoscopia entre
\v\, \t\, \∫\, \3\, \m\, \n\, \p\, \b\, lemas (ou fonemas). os optolalemas. Como os surdos
\m\. • Videntes surdos processam as videntes são incapazes de tirar
• Unidades da fala audíveis, ou unidades da fala visível, os opto- vantagem da heterofonia entre
otolalemas, são representadas en- lalemas. as unidades audíveis da fala (os
tre barras invertidas contidas entre • Surdocegos processam as otolalemas), a compreensão da
colchetes, como: [\f\], [\k\], [\d\], unidades da fala tateável, os tato- fala por leitura orofacial visual e a
[\g\], [\v\], [\t\], [\∫\], [\3\], [\m\], lalemas. tomada de ditado por leitura orofa-
[\n\], [\p\], [\b\], [\m\]. • Neurotípicos, que são ouvintes cial visual dependem estritamente
• Unidades da fala visíveis, ou e videntes, processam tanto as da heteroscopia entre as unidades
optolalemas, são representadas en- unidades audíveis da fala (os otola- visíveis da fala (os optolalemas). Por
tre barras invertidas contidas entre lemas), quanto as unidades visíveis isso é importante mapear os opto-
chaves, como: {\f\}, {\k\}, {\d\}, de fala visível (os optolalemas). lalemas homoscópicos pois é entre
{\g\}, {\v\}, {\t\}, {\∫\}, {\3\}, Para eles, a percepção da fala é um os optolalemas homoscópicos (que

26 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


são usualmente mais distintos à (indiscriminabilidade optolálica), na escrita (i.e., paragrafias) que se
audição que à visão) que ocorrerão são chamados de paragrafias opto- devem à impossibilidade de fazer
as trocas. lalêmicas. Nessas trocas na escrita, discriminação visual entre lalemas
Consideremos os fones ou oto- como os optolalemas {\f\} e {\v\} são visualmente semelhantes é chama-
lalemas [\f\], [\k\], [\d\], [\g\], idênticos à visão (i.e., {\f\ = \v\}), ao da de Paragrafia Optolalêmica.
[\v\], [\t\], [\∫\], [\3\], [\p\], [\b\], fazer leitura orofacial, as palavras Por isso, ao tomar ditado da fala, a
[\m\]. Eles são distintos entre si {\’f\i\l\ \} e {\’v\i\l\ \} parecem criança surda vidente escreve “foto”
à audição (i.e., são heterófonos). idênticas à visão, daí as trocas entre em vez de “voto”, “calo” em vez de
Contudo, videntes com surdez ou os grafemas “f” e “v”. Igualmente, nas “galo”, “dedo” em vez de “teto”,
perda auditiva têm dificuldade em trocas na escrita, como os optolale- “chato” em vez de “jato”, “bico”
fazer discriminação fonêmica (i.e., mas {\p\}, {\b\} e {\m\}.são idênticos em vez de “pico”, “mico” em vez de
discriminação auditiva dos otolale- à visão (i.e., {\p\ = \b\ = \m\}, ao “bico”. Essa tomada de ditado não
mas). Por isso, tendem a recorrer à fazer leitura orofacial, as palavras ocorre apenas da fala visível na face
visão, procurando fazer discrimi- {\’p\i\k\ \}, {\’b\i\k\ \}, e {\’m\i\k\ da professora como, também, da
nação visual entre os optolalemas \} parecem a mesma palavra. Essa fala visualizada mentalmente.
correspondentes. Ou seja, tentam mesma representação visual da Cegos ouvintes recebem a fala
discriminar entre {\f\}, {\k\}, palavra falada poderia ser assim por audição apenas. Eles dependem
{\d\}, {\g\}, {\v\}, {\t\}, {\∫\}, representada: {{\’p\=\’b\=\’m\}\i\ de as unidades audíveis da fala (oto-
{\3\}, {\p\}, {\b\}, {\m\}. Contudo, {\k\=\g\}\ \}. Ela pode ser escrita lalemas) serem bastante distintas
certos Lalemas são idênticos à visão sob ditado como “pico”, “bico”, ou umas das outras para compreender
({\f\} = {\v\}, {\k\} = {\g\}, {\t\} = “mico”, já que as três palavras escri- bem a fala por audição, bem como
{\d\}, {\∫\} = {\3\}, {\p\} = {\b\} tas se aplicam a ela. O mesmo vale para tomar ditado de modo pre-
= {\m\}). Esses lalemas idênticos para {\k\} = {\g\}, {\t\} = {\d\}, ciso. Assim, para cegos ouvintes, a
à visão (i.e., homoscópicos) cons- {\∫\} = {\3\}. A homoscopia entre compreensão da fala recebida por
tituem conjuntos de OptoLalemas esses pares de lalemas impede a audição, bem como a escrita por ci-
HomoScópicos ({\f\ = \v\}, {\k\ discriminação visual. As trocas fragem de otolalemas em grafemas
= \g\}, {\t\ = \d\}, {\∫\ = \3\},
{\p\ = \b\ = \m\}) no interior dos
quais os lalemas não são passíveis
de discriminação visual. Para os
ouvintes, esses lalemas são pas-
síveis de discriminação auditiva,
mas não para os surdos videntes,
que precisam fazer discriminação
visual. Esses mesmos lalemas
são diferentes à audição (i.e., são
OtoLalemas heterofônicos: [\f\]
≠ [\v\], [\k\] ≠ [\g\], [\t\] ≠ [\d\],
[\∫\] ≠ [\3\], [\p\] ≠ [\b\] ≠ [\m\]),
mas são idênticos à visão (i.e., são
OptoLalemas HomoScópicos: {\f\}
= {\v\}, {\k\} = {\g\}, {\t\} = {\d\},
{\∫\} = {\3\}, {\p\} = {\b\} = {\m\}.
O aluno surdo ou com deficiên-
cia auditiva depende da neces-
sidade (nem sempre possível) de
fazer discriminação visual entre
os lalemas. Quando lalemas dife-
rentes são idênticos à visão (i.e.,
são homoscópicos) essa baixa dis-
criminabilidade optolálica tende
a se refletir na escrita ocasionan-
do uma série de trocas de escrita
(paragrafias). Esses erros de es-
crita, que se devem à indiscrimi-
nabilidade visual entre os lalemas

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 27


Matéria de Capa

na tomada de ditado da fala rece- [\n\] são semi-homófonos. Ou seja, otolálica), são chamadas de para-
bida por audição são vulneráveis à [\m\] ≈ [\n\]. Contudo, ouvintes grafias otolalêmicas. Por exemplo,
presença de homofonia ou semi-ho- naticegos (ou com deficiência vi- como os otolalemas [\m\] e [\n\]
mofonia entre os otolalemas. Como sual mais severa) têm dificuldade são semi-homófonos (i.e., [\m\ ≈
os cegos ouvintes são incapazes em fazer discriminação visual \n\]), pode haver troca entre os
de tirar vantagem da heteroscopia dos lalemas (i.e., discriminação grafemas “m” e “n”.
entre as unidades visíveis da fala optolalêmica). Por isso, tendem Surdocegos recebem a fala por
(os optolalemas), a compreensão a recorrer à audição, procurando leitura orofacial tátil. Eles depen-
auditiva da fala e tomada de ditado fazer discriminação auditiva entre dem de as unidades tateáveis da
dependem estritamente da hetero- os otolalemas correspondentes. O fala (tatolalemas) serem bastante
fonia entre as unidades audíveis problema é que [\m\] e [\n\] são distintas umas das outras para
da fala (os otolalemas). Por isso é semi-homófonos. Ou seja, [\m\] compreender bem a fala, bem
importante mapear os otolalemas ≈ [\n\]. O aluno ouvinte naticego como para tomar ditado de modo
homófonos ou semi-homófonos ou com deficiência visual depende preciso. Assim, para surdocegos, a
pois é entre os otolalemas homó- da necessidade (nem sempre pos- compreensão da fala recebida por
fonos ou semi-homófonos (que são sível) de fazer discriminação au- leitura orofacial tátil, bem como
usualmente mais distintos à visão ditiva entre os lalemas. Quando a escrita por cifragem de tatola-
que à audição) que ocorrerão as lalemas diferentes são idênticos ou lemas em grafemas na tomada de
trocas. quase idênticos à audição (i.e., são ditado da fala recebida por leitura
Consideremos os lalemas \m\ homófonos ou semi-homófonos) orofacial tátil são vulneráveis à
e \n\. À visão, esses lalemas são essa baixa discriminabilidade oto- presença de homoestesia entre os
muito distintos. Ou seja, enquanto lálica tende a se refletir na escrita tatolalemas. Como os surdocegos
optolalemas {\m\} e {\n\} são ocasionando uma série de trocas são incapazes de tirar vantagem
heteroscópicos. Ou seja, {\m\} ≠ de escrita (paragrafias). Esses tanto da heterofonia entre as uni-
{\n\}. À audição, contudo, esses erros de escrita, que se devem à dades audíveis da fala (os otolale-
lalemas são muito semelhantes. Ou indiscriminabilidade auditiva entre mas), quanto da heteroscopia entre
seja, enquanto otolalemas [\m\] e os lalemas (indiscriminabilidade as unidades visíveis da fala (os

Cegos ouvintes
recebem a fala por
audição apenas.
Eles dependem
de as unidades
audíveis da fala
(otolalemas) serem
bastante distintas
umas das outras
para compreender
bem a fala por
audição, bem como
para tomar ditado
de modo preciso

30 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


optolalemas), a compreensão da
fala por leitura orofacial tátil e a
tomada de ditado por leitura oro-
facial tátil dependem estritamente
da heteroestesia entre as unidades
tateáveis da fala (os tatolalemas).
Por isso é importante mapear o
grau de heteroestesia entre os
tatolalemas, pois quanto menos a
esteroestesia entre os tatolalemas
naturais da fala, tanto maior será
a necessidade de usar sistemas de
leitura orofacial tátil como Tadoma,
para diminuir a incidência de tro-
cas entre as unidades tateáveis que
diminuiriam a compreensão da fala
por leitura orofacial tátil.

Paragrafias lalografêmicas em sur- grafema mais comuns). Esses erros Portuguesa (Capovilla, 2018, 2019;
dos e ouvintes de regularização fonografêmica são Capovilla, Coelho, Luz, Graton-
Luria (1980) se referia às trocas mais comuns na grafia das relações Santos, Damazio, 2017). Esse mode-
na leitura e na escrita como erros mais raras presentes na escrita das lo vale tanto para ouvintes quanto
de regularização. Ele chamava de palavras mais incomuns. Por exem- para surdos.
regulares as formas mais canônicas plo, tendo ouvido a palavra [\e\’z\ε\
ou comuns de cifrar e de decifrar. \s\Ι\t\ \], a criança alfabetizanda Paragrafias sematosêmicas em
(1) Erros de regularização ocor- pode escrever “ezérsitu” em vez de surdos, baseadas na similaridade
rem na leitura em voz alta quando “exército” porque a relação [\z\]-“z” do sinal subjacente
se troca pronúncias raras (i.e., é dominante, ao passo que a relação Um último tipo de erro de es-
cujas relações grafema-fonema [\z\]-“x” é recessiva. Isso ocorre, crita ocorre exclusivamente em
são mais incomuns) por pronún- claro, também para o adulto que, surdos sinalizadores nativos. Esse
cias comuns (i.e., cujas relações tendo ouvido a palavra [\e\’k\ε\ erro se deve à similaridade entre
grafema-fonema são mais comuns). \ ja\], escreve incorretamente os sinais subjacentes à figura que
Esses erros de regularização gra- “equéria”, em vez de “hecquéria”. se deve nomear por escrito e o
fofonêmica na leitura tendem a E tendo ouvido [\’k\ \o\m\ \], es- sinal subjacente à palavra que se
ocorrer mais frequentemente na creve incorretamente “croma”, em acaba escrevendo para nomear a
pronúncia daqueles fonemas que vez de “chroma”. Isso ocorre porque figura. Por exemplo. Numa tarefa
são mais raros para seus respec- a relação [\k\]-“qu” é dominante, ao de nomeação de figuras por escrita,
tivos grafemas durante a pronúncia passo que a relação [\k\]-“cqu” é re- a criança primeiro vê uma foto-
de palavras escritas relativamente cessiva; e porque a relação [\k\]-“c” copiadora e, então, a nomeia com
mais incomuns para a criança. Por é dominante, ao passo que a relação o sinal FOTOCÓPIA. Em seguida
exemplo, ao decifrar a escrita “exér- [\k\]-“ch” é recessiva. ela usa o sinal para tentar recuperar
cito” a criança em alfabetização Nós descobr imos um pro - a palavra escrita correspondente.
pode pronunciar [\e\’∫\ε\ \s\Ι\t\ \] cedimento para aferir o grau de Como essa palavra (“fotocopia-
em vez [\e\’z\ε\ \s\Ι\t\ \]. Esse dominância e de recessividade dora”) é rara e desconhecida, ela
erro de regularização grafema- absolutos e relativos de qualquer escreve a palavra que conhece para
fonema consiste em permitir que Grafema e de qualquer Fonema em um sinal o mais parecido possível
uma relação grafema-fonema mais qualquer língua. E demonstramos a com aquele, cuja palavra escrita ela
dominante (comum) se intrometa eficácia desse procedimento de me- conhece. Por isso, acaba escrevendo
numa pronúncia tomando o lugar dida em predizer a distribuição dos “fantasma” para denominar a figura
de uma relação grafema-fonema erros de leitura e escrita na Língua de uma fotocopiadora.
mais recessiva (rara).
(2) Erros de regularização ocor-
rem na escrita quando se troca
grafias raras (i.e., relações fonema-
grafema incomuns) por grafias
comuns (i.e., relações fonema-

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 31


Matéria de Capa

Referências:
FERNANDO CÉSAR
Capovilla, F. C.; Raphael, W. D. (2004-2019). Enciclopédia da Língua de Sinais CAPOVILLA
Brasileira: O Mundo do surdo em Libras. Volumes 1 a 10. São Paulo, SP: Edusp.
PhD Psicologia,
Livre-Docente em
Neuropsicologia,
DHC Educação.
Professor Titular, Universidade de São
Conclusão (2) Erros de vocabulário de Paulo. Membro titular do Conselho
Nacional de Educação. Doutor Honoris
Este breve artigo descreveu uma escrita. Esses erros consistem Causa em Educação. Coordenador
taxonomia original de erros de em problemas de evocação de nacional de Inclusão e Alfabetização
da CAPES. Presidente da Comissão de
escrita (paragrafia) em ouvintes e palavra escrita a partir de sinal Alfabetização do Conselho Nacional de
surdos, cometidos durante a tomada indexador que é usado livremente Alfabetização. Coautor do RENABE:
Relatório Nacional de Alfabetização
de ditado. Os erros foram classifica- para nomeação (paragrafia se- Baseada em Evidências e da PNA:
dos em: matosêmica). Esses erros refletem Política Nacional da Alfabetização
do MEC. Coordenador do Sistema
(1) Erros de recepção da fala a pobre vocabulário de escrita a ser de Avaliação de Escolas de Surdos
ser cifrada. Esses erros de má com- produzida. A pobre indexação, pe- na Prova Brasil em Libras, no
Observatório da Educação (consórcio
preensão da fala a ser cifrada podem los sinais, das palavras escritas, dá Capes-Inep). Autor de mais de 60
ocorrer devido à semelhança entre as origem à confusão na evocação das livros e de 400 trabalhos científicos
publicados, e coautor de 200 sistemas
unidades ouvidas (paragrafia oto- palavras raras indexadas por sinais especialistas de multimídia para
lalêmica) ou devido à semelhança en- semelhantes; diagnóstico, comunicação e reabilitação
cognitiva em distúrbios neuromotores
tre as unidades lidas orofacialmente (3) Erros específicos de cifragem (paralisia cerebral e esclerose lateral
por visão (paragrafia optolalêmica). da fala (paragrafia lalografêmica), amiotrófica), neurolinguísticos
(dislexia e afasia) e neurossensoriais
Assim, esses erros se dividem em: em que as trocas na escrita se devem (surdez congênita profunda).
(1.1) erros de recepção auditiva a relações lalema-grafema domi- Membro da Comissão Internacional
de Especialistas em Alfabetização
(paragrafia otolalêmica) da palavra nantes que se imiscuem nas relações da Câmara dos Deputados. Membro
falada; lalema-grafema recessivas. fundador da Sociedade Brasileira
de Neuropsicologia (SBNp). Diretor
(1.2) erros de recepção visual A taxonomia é de vital im- Científico da Associação Brasileira de
(paragrafia optolalêmica) da pala- portância para prevenir erros de Dislexia (ABD). Research Fellow do
NIMHCD.
vra falada; leitura e escrita em surdos. •

32 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Bett Educar

Jornada Online
Bett Educar:
Transformação Digital
e Humana na
Educação

“Enquanto a tecnologia tem papel fundamental


no suporte ao ensino online, vivemos um
momento em que a empatia é essencial”
(Adriana Martinelli)

O
conceito de Transfor- transformação educacional digital,
mação Digital no mun- o que só acontece na prática, opor-
do corporativo deter- tunizando novas experiências e
mina que os recursos tecnológicos significados que engrandeçam o
não têm o papel apenas de auxiliar ensino e a aprendizagem e, nesse
os processos, mas de catalisar as processo, humanizando-o. “A Transformação Digital vinha
estruturas sob bases digitais, com Ciente do cenário em que se sendo implementada gradativa-
intuito estratégico. Quando essa encontram todos os atores da Edu- mente na maioria das escolas e
Transformação Digital é levada cação neste momento, a Bett Educar instituições de ensino mas, com a
para o ambiente educacional, tam- realiza, entre os dias 11 e 14 de maio, pandemia, essas mudanças foram
bém os horizontes de atuação são a Jornada Online Bett Educar. Sob otimizadas exponencialmente em
ampliados pelo rompimento das o tema central “Transformação todo o setor educacional, tanto do
barreiras físicas. Digital e Humana na Educação”, ponto de vista tecnológico como
Com a pandemia, a Transfor- mais uma vez, o maior evento de humano”, observa Adriana Mar-
mação Digital ganhou tração – seja educação, tecnologia e inovação da tinelli, diretora de Conteúdo da
pelo avanço do nível de maturidade América Latina vem cumprir seu Bett Educar.
digital de escolas já abertas à tecno- papel de ser condutor ao trazer dis- A Jornada Bett Online será
logia, seja pelo start na jornada digi- cussões sobre como a Transforma- gratuita e reunirá durante quatro
tal de escolas ainda muito imersas ção Digital vai impactar a educação dias diversos especialistas do
no analógico. E o momento, agora, nos próximos anos. E, mais ainda: setor e áreas afins, para abordar
é de estimular alunos, professores como poderá afetar as interações no questões que giram em torno do
e gestores a se sentirem parte dessa ensino e na aprendizagem. tema central - Transformação

34 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Enquanto a tecnologia tem papel fundamental
no suporte ao ensino online, vivemos um
momento em que a empatia é essencial

Digital e Humana na Educação. psiquiatra e escritor Augusto Cury, cias práticas relacionadas aos
Os assuntos serão pautados por a neurocientista Carla Tieppo e macrotemas do evento”, explicou
quatro macrotemas: Inovação o jornalista e representante na a diretora de Conteúdo da Bett
na educação; Ensino híbrido e América Latina e Caribe do Think Educar.
metodologias ativas; Saúde mental Tank da Unesco, Alexandre Sayad. Ao longo dos últimos anos, a
e habilidades socioemocionais, e Incorporado aos novos tempos Bett Educar se dedicou à experi-
Gestão de mudanças e inovação. virtuais, o evento terá ainda work- mentação real em seus eventos
As inscrições para participar dessa shops técnicos, palcos de lives para e, agora, transfere esse conhe-
jornada já estão abertas - o link masterclass e espaços online para cimento para vivências virtuais,
para efetuar cadastro pode ser expositores. por meio de oficinas e workshops
encontrado no site da Bett Educar "O formato desta Jornada On- práticos. “Enquanto a tecnologia
(www.bettbrasileducar.com.br). line Bett Educar foi desenhado tem papel fundamental no suporte
pensando em deixar os partici- ao ensino online, vivemos um
Workshops a distância pantes em sintonia com o máximo momento em que a empatia é es-
Além dos debates virtuais, o de conhecimento sobre os assuntos sencial. Por isso, a intenção é levar
evento terá palestras inspiradoras mais relevantes para o setor e, educadores, gestores e professores
com nomes de peso, como o médico imperativo, proporcionar vivên- a assumir o lugar do aluno, ter

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 35


Bett Educar

proatividade e participação direta gem. A moderação será de Maria


para construir networking e troca
de experiências, tanto por meio de
Alice Carraturi, consultora de
Tecnologia Educacional no Cen-
A intenção é
chats com os palestrantes como os tro de Inovação para a Educação levar educadores,
demais participantes do evento",
completa Adriana.
Brasileira (Cieb).
A saúde mental e as habilidades gestores e
No primeiro dia de evento, em
11 de maio (às 18h30), a diretora
socioemocionais é o macrotema
que norteará as palestras e demais
professores a
da Bett Educar, Cláudia Valério, atividades do terceiro dia do even- assumir o lugar
fará a abertura da Jornada Online
Bett Educar, que reunirá ainda
to (13 de maio). A partir das 14h,
os participantes poderão acom- do aluno, ter
debatedores-palestrantes em duas
sessões consecutivas, para discutir
panhar temas como "Convivência
ética e valores potencializados
proatividade e
as perspectivas para a educação pela tecnologia" e "Meditação e participação direta
e uma série de provocações in-
telectuais aos participantes sobre
bem-estar na sala de aula". As
palestras serão conduzidas por Le- para construir
inovação e transformação digital
na educação.
ticia Lyle, cofundadora da Camino
Education, Rafael Ávila, do Grupo
networking e troca
No dia seguinte (12 de maio), Ânima, e Cesar Augusto Amaral de experiências
as plenárias online de discussões Nunes, gerente de Desenvolvi-
abrirão mais cedo, às 14 horas. mento de Soluções do Instituto
Será dedicado a assuntos de grande Unibanco. A palestra inspiradora sidades. Janine Rodrigues, fun-
interesse para o momento: ensino do dia será ministrada pela neuro- dadora da Piraporiando, e Cassio
híbrido e metodologias ativas. cientista Carla Tieppo, com o tema França, da Liga das Escolas Antir-
Para fomentar essa discussão, "A educação do futuro para além racistas, são referências no setor
estão confirmados reconhecidos da Revolução Digital". que estarão moderando discussões
especialistas como Lilian Bacich, A Jor nada Bet t E duc a r se com temas como "Inovação com
diretora da Tríade Educacional; encerra no dia 14 de maio, com tecnologias disruptivas", "Como
José Moran, professor da USP; as apresentações relacionadas a as tecnologias podem incluir" e
e Paulo Tomazinho, consultor e Gestão de Mudanças e Inovação, "Por uma educação antirracista e
pesquisador da Meta Aprendiza- mas que também abordam diver- antipreconceito". •

36 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Autismo I

Transtorno
do Espectro
Autista

N
o dia 2 de abril é come- em conta os tempos de cada um, ter nos coloca estrategicamente no
morado Dia Mundial um ambiente acolhedor, divertido mundo, trazendo-nos o conhe-
de Conscientização do e agradável de se estar, para não cimento sobre ele. A corporeidade
Autismo, TEA, no DSM – 5. Ele é gerar frustração, ansiedade, irri- é a linguagem mais primitiva e
um transtorno do neurodesenvolvi- tabilidade e agressividade. acompanha o homem desde a sua
mento, caracterizado por dificul- Os estímulos para esse público fase uterina. Na pessoa com TEA,
dades de interação social, comuni- devem ser dosados, levando em obser vamos a pobreza em seu
cação e comportamentos repetitivos conta as suas características pes- campo de exploração corporal que
e restritos. A pessoa com TEA, como soais, individuais, pois existe uma retarda e limita a sua capacidade de
os neurotípicos, são individuais, dificuldade para processar os es- relacionar-se. A linguagem corpo-
singulares, únicos em sua essên- tímulos sensoriais que aparecem ral precisa ser entendida como uma
cia. Na escola, nos atendimentos para ele como uma experiência forma de expressão comunicativa
multidisciplinares, eles devem ser perturbadora e incômoda, dificul- de fundamental importância.
respeitados em suas singularidades tando as suas percepções do mundo A forma com que cada pessoa
e história de vida. Faz-se necessário e a interação com ele. A pessoa lida com as sensações a torna um
o estudo de caso, respeitando cada com TEA, geralmente, apresenta, ser único. Os estímulos sensoriais
especificidade e enfatizando as po- entre outras características, um do dia a dia trazem irritabilidade
tencialidades de cada um. comportamento aversivo ao toque, e angústia a muitas das pessoas
É preciso ouvir a família, ter são desatentas, impulsivas e com com TEA, uma vez que ainda não
uma escuta sensível e, junto com preferência ao isolamento. sabem lidar com tal situação. É
ela, traçar os objetivos para o aten- Nosso corpo, por meio das sen- preciso e necessária a busca de
dimento adequado. É preciso levar sações produzidas pelos sentidos, conhecimento e, principalmente,

38 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Transtorno do
Espectro Autista
– Oficinas multissensoriais –

Pessoas com Transtorno do


Espectro Autista – TEA, em sua
maioria, apresentam dificuldades
sensoriais. Para elas, essa caracte-
rística é desafiante e esmagadora
na sua relação com o “outro”, no
seu processo de socialização e
inclusão. Este livro foi construído
partindo da prática e da observação
do incômodo que as pessoas com
TEA sentiam aos estímulos a que
elas eram expostas.
Este livro responde se o traba-
lho com oficinas multissensoriais
de corpo/movimento pode contri-
buir para potencializar processos
respeitar as dificuldades sensoriais de sociabilização e aproximação
da pessoa com TEA, levando em com o “outro”.
conta as suas especificidades, a fim A pesquisa, realizada para con-
Os estímulos de promover uma sociedade mais clusão do Curso de Mestrado Profis-
justa e igualitária, e uma melhor
sensoriais do qualidade de vida.
sional em Diversidade e Inclusão/
Universidade Federal Fluminense
dia a dia trazem É a partir da relação com o outro
que a pessoa constrói suas apren-
(CMPDI/UFF) foi desenvolvida na
Clínica – Escola do Autista, tendo
irritabilidade e dizagens; logo, a sociedade deve como objetivo romper barreiras
propiciar momentos e condições
angústia a muitas para tal. •
sensoriais que constituem trans-
tornos comportamentais na vida
das pessoas com dessas pessoas. Estão descritas in-
tervenções (interações), projeto da
TEA, uma vez que
VALÉRIA SALES
oficina multissensorial, anamnese,

ainda não sabem


Mestre em Diversidade protocolos, que conduzem ações
e Inclusão,
Fonoaudiologia; que visam ao “encontro entre cor-
lidar com tal possui Especialização
em Educação Especial Inclusiva,
pos”. São descritas as observações,
os dados colhidos e experimenta-
situação
Transtorno do Espectro Autista,
Gestão Escolar e Atendimento dos e os registros das tentativas e
Educacional Especializado. Autora do
livro “Transtorno do Espectro Autista os resultados adquiridos com as
– Oficinas multissensoriais” (Wak intervenções realizadas.
Editora).

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 39


Autismo II

O Autismo na realidade
da sala de aula
S
e há uma realidade cada
vez mais crescente no âm-
bito escolar, é que é cada
vez mais crescente a prevalência
de crianças com Transtorno do
Espectro Autista (TEA). No mundo,
uma estimativa de 2017 indicava
que uma em cada 160 crianças
era autista1. Em uma estimativa
de 2020 nos Estados Unidos da
América, porém com dados de
2016, apresentou-se uma estima-
tiva da ordem de 1 em cada 54 alu-
nos, número este 10% maior do que
a medição anterior, com dados do
CDC (Centers for Disease Control
and Prevention) americano, que
são compilados desde pelo menos
o ano 20002.
No Brasil, só há dois registros
de estudos, em situações isoladas
específicas, que não podem ser
extrapoladas para o país como um
todo, o que mostra um quadro de
desconhecimento estatístico sobre
o TEA. No entanto, a partir da obri-
gatoriedade de inclusão de dados
sobre o transtorno pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) no próximo Censo De-
mográfico, haverá um quadro mais
realístico em nível nacional, o que
é absolutamente necessário para o
estabelecimento de políticas para o
transtorno, além do planejamento
educacional das redes de ensino.
O que esses números evidenciam
é que há mais crianças com TEA
dentro das escolas, notadamente
nas escolas públicas. Embora não
haja dados precisos sobre o assun-
to, e os existentes sejam dispersos,
há vislumbre claro de aumento na
rede municipal de ensino do Rio de
Janeiro: se, em 2017, os números
eram de ordem de 1.700 alunos3, em
2020 tais números foram de 6.149
alunos 4 . Uma clara tendência de
crescimento para os anos vindouros

40 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


que impacta enormemente no dia
a dia das escolas em relação a as-
pectos variados, como o número de
vagas oferecidas à população, por Procure
exemplo, tendo em vista a redução
das vagas nas turmas quando há
adaptar as
um aluno incluído matriculado, atividades
além da própria dinâmica do tra-
balho docente. e os
Demanda crescente pode exigir
materiais
formação crescente à realidade
Em geral, considera-se que este
aumento de alunos com TEA nas do aluno
salas de aulas, sejam elas públicas
ou privadas, não exige necessaria-
mente uma formação específica no
transtorno. No entanto, essa não
exigência não significa que uma
formação geral ou mínima não
possa acontecer, seja pela própria Incluindo o aluno com TEA na 3 – Planeje – se no processo edu-
escola, seja pelo professor. Atual- escola cativo em geral o planejamento é
mente, há muitos sites na Internet A partir de diferentes fontes so- considerado uma peça-chave para o
que proporcionam um mínimo de bre o tema10 11 12, além das já citadas, sucesso, no planejamento do aluno
informações sobre o transtorno, podemos organizar um conjunto com TEA isso se torna impres-
como o Diversa 5 , ou o Instituto básico de ações necessárias para a cindível. É extremamente difícil
Neurosaber6 7, entre várias alter- inclusão do aluno com TEA na escola. improvisar adaptação de materiais
nativas disponíveis. 1 – Informe-se – aprenda sobre pedagógicos, disposição de mobi-
Livros também estão disponíveis o autismo, suas características e liário e das formas de lidar no dia
na Internet, como os do excelente comportamentos associados. Apren- a dia com o aluno e sua interação
autor Eugênio Cunha, “Autismo na da sobre as características especí- com a turma. Pensar coletivamente
Escola: um jeito diferente de apren- ficas do(s) autista(s) que estão sob nas melhores estratégias, junto com
der, um jeito diferente de ensinar”8 seus cuidados. Cada aluno tem que a coordenação pedagógica, família
ou “Autismo e Inclusão: psicopeda- ser tratado individualmente, pois o e terapeuta(s), formando uma rede
gogia e práticas educativas na escola espectro é muito amplo quando se de apoio, é recomendado. Usar os
e na família”9, entre vários outros trata de autismo. Trata-se de conhe- interesses do aluno é também uma
autores e títulos disponíveis. cer as necessidades e peculiaridades boa estratégia.
Uma formação mínima irá do aluno, para poder atendê-lo den- 4 – Prepare a sala de aula e os
ajudar muito o docente na tarefa tro do processo educativo. materiais pedagógicos – designe
de lidar com o aluno com TEA no 2 – Conheça bem o aluno e sua onde o aluno com TEA irá sentar-
dia a dia da escola. Porém, esse é família – seja a partir da família se, defina áreas de trabalho especí-
apenas um primeiro movimento e de laudos, seja por conversas ficas para determinadas situações,
necessário. Assim como não exis- com terapeuta(s) e mediador(es), determine uma área de escape para
tem alunos iguais, também não seja por observação, ou por qual- eventuais crises, diminua eventuais
há autistas iguais, mesmo que quer outra forma, aproprie-se ao fontes de distrações, mantenha o
tenham o mesmo diagnóstico ou máximo de informações sobre o aluno distante de fontes de sensi-
que sejam gêmeos. Portanto, um tipo de autismo, seus sintomas, bilidades (toque, cheiros, sons, luz).
segundo movimento necessário níveis de gravidade e característi- Tente adaptar a sala de aula para a
é o de estudar cada caso que se cas peculiares apresentadas pelo presença do aluno autista o máxi-
apresente, por meio de conversas aluno. Possivelmente, a família será mo que puder. Da mesma forma,
com a família, laudos médicos e a fonte mais confiável e com infor- procure adaptar as atividades e os
da própria experiência da pessoa. mações mais específicas sobre as materiais à realidade do aluno, para
Ou seja, é necessário um estudo de características e comportamentos que seja possível a ele aprender den-
caso. Quanto mais aprofundado for particulares do aluno com TEA. tro das suas especificidades.
este estudo, tanto mais efetivo será Construa, portanto, uma relação 5 – Adapte as ações – Nem sempre
o trabalho com o aluno. de confiança com a família. as estratégias que são elencadas dão

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 41


Autismo II

certo de pronto ou mesmo dão certo. 8 – Acolha e incentive – o certo esforço e tempo. Mas, além
Saber flexibilizar as ações, e adaptar principal trabalho do educador é, de essencial, o preenchimento de
as condições para um trabalho mais sempre, criar o melhor ambiente um Termo de Acompanhamento
eficaz, podem fazer a diferença entre possível em sala de aula, afetivo, Individualizado, ou qual nome
um trabalho que dará certo ou não. empático, estimulante. Isso tam- tiver, é uma poderosa ferramenta
Manter o diálogo em equipe e buscar bém é necessário com o aluno com para avaliação e reavaliação de
novas abordagens pode ser impor- TEA, pois suas capacidades de todo o processo, além de ser fonte
tante para o sucesso em sala de aula. desenvolvimento dependerão do precisa de informação para outros
É igualmente importante lembrar quanto será acolhido, do quanto docentes, terapeutas e a própria
que adaptar ou personalizar não deve suas ações serão valorizadas e família. •
ser sinônimo de diferenciar as ações do quanto as adaptações serão
em relação ao restante da turma, em realmente efetivas no sentido de
ANDRÉ CODEA
relação a reduções ou acréscimos de proporcionar o melhor ambiente
conteúdos. possível para este aluno. Mestre em Ciência da
6 – Crie rotinas – o trabalho 9 – Registre todo o processo Motricidade Humana,
professor nas áreas
com o aluno com TEA pode exigir – assim como o planejamento, o de Neurociência
rotinas bem reguladas em sala de registro das ações e do progresso do Pedagógica, profissional de Educação
Física.
aula. Isso facilita a adaptação e a aluno com TEA é algo que demanda
manutenção do aluno nas tarefas
regulares em sala. Se necessário,
adapte materiais e até mesmo REFERÊNCIAS
mobiliário, para proporcionar o 1
OPAS – Brasil (Organização Pan-americana da Saúde). Folha Informativa – Transtorno
ambiente o mais rotineiro possível. do Espectro Autista. Disponível em: <https://www.paho.org/bra/index.php?Itemid=10
7 – Consiga o apoio da turma e 98#:~:text=Estima%2Dse%20que%2C%20em%20todo,que%20s%C3%A3o%20signifi-
da comunidade escolar – o traba- cativamente%20mais%20elevados>. Acesso em: 28/02/2021. Atualizado em: 04/2017.
lho com o aluno com TEA pressupõe
2
MAENNER MJ, SHAW KA, BAIO J, et al. Prevalence of Autism Spectrum Disorder
Among Children Aged 8 Years — Autism and Developmental Disabilities Monitoring
a interação deste com a turma, Network, 11 Sites, United States, 2016. MMWR Surveill Summ 2020;69(No. SS-4):1–12.
trabalhos em grupo e a regulação de DOI: http://dx.doi.org/10.15585/mmwr.ss6904a1
sua vida dentro da escola. Trabalhe 3
COSTA, Camila. Hoje é dia mundial da Conscientização do Autismo. Disponível em:
com a turma e os demais elementos <http://bandnewsfmrio.com.br/editorias-detalhes/hoje-e-dia-mundial-da-conscien-
tizacao-do-auti>. Acesso em: 20/02/2021. Postado em: 02/04/2017.
da comunidade escolar a necessi- 4
CASTRO, Debora. Pandemia escancara a realidade da Educação Especial no Rio de
dade do entendimento da condição e Janeiro. Disponível em: <https://www.anf.org.br/pandemia-escancara-a-realidade-
de como podem ajudar no processo. da-educacao-especial-no-rio-de-janeiro/>. Acesso em: 28/02/2021. Postado em:
01/10/2020.
Em geral, explicações sobre o que é o
5
DIVERSA. Inclusão de alunos com autismo na escola: dicas e exemplos para a
TEA e quais são as necessidades do prática. Disponível em: <https://diversa.org.br/inclusao-de-alunos-com-autismo-na-
aluno podem ajudar, mas a gestão escola-dicas-e-exemplos-para-pratica/?gclid=CjwKCAiAm-2BBhANEiwAe7eyFOkvP-
do dia a dia é que fará a diferença k9eQQJLB7tMpy8nheJ2RRZtyL50F_vYtRMbhRAIokYiL8WPqxoCbkwQAvD_BwE>.
Acesso em: 25/02/2021. Publicado em: 27/03/2018.
na aceitação e auxílio com o aluno. 6
INSTITUTO NEUROSABER. Educação inclusiva: como trabalhar o autismo em sala
de aula. Disponível em: <https://institutoneurosaber.com.br/educacao-inclusiva-
como-trabalhar-o-autismo-em-sala-de-aula/>. Acesso em: 28/02/2021. Publicado
em: 20/10/2020.
7
INSTITUTO NEUROSABER. Como realizar a inclusão do autismo em sala de aula?
Disponível em: <https://institutoneurosaber.com.br/como-realizar-a-inclusao-do-
autismo-em-sala-de-aula/>. Acesso em: 28/02/2021. Publicado em: 19/10/2020.
8
CUNHA, Eugênio. Autismo na Escola: um jeito diferente de aprender, um jeito dife-
rente de ensinar. 6.ed. Rio de Janeiro: WAK Editora, 2020.
9
CUNHA, Eugênio. Autismo e Inclusão: psicopedagogia e práticas educativas na escola
e na família. 7.ed. Rio de Janeiro: WAK Editora, 2017.
10
DANYA INTERNATIONAL/ORGANIZATION FOR AUTISM RESEARCH. Life Jour-
ney Through Autism: An Educator’s Guide. Disponível em: <https://researchautism.
org/wp-content/uploads/2016/11/An_Educators_Guide_to_Autism.pdf>. Acesso em
01/03/2021. Publicado em: 11/2016.
11
GANZ, Jeniffer B. Classroom Structuring Methods and Strategies for Children
and Youth with Autism Spectrum Disorders. EXCEPTIONALITY, 15(4), 249–260,
November, 2007.
12
BOLOURIAN, Yasamin; STAVROPOULOS Katherine K.M.; BLACHER, Jan. Autism
in the Classroom: Educational Issues across the Lifespan. In: Advances at the End of the
Second Decade of the 21st Century. IntechOpen, 2019. DOI: 10.5772/intechopen.84790.

42 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Autismo III

Autismo e inclusão:
uma urgência real!

F
alar sobre autismo atual- entendemos que o ambiente a está
mente parece repetitivo; afetando e precisamos estruturá-lo
contudo, percebemos as para isso. Essas alterações podem
dificuldades de alguns profissio- aparecer em nível “master” e são
nais da educação em lidar com este chamadas de HIPER RESPON-
transtorno. Trabalho há anos com SIVIDADE, ou seja, este sujeito
inclusão e é cada vez mais visível recebe a informação em uma escala
que ainda estamos em processo de muito maior do que pessoas típicas.
integração, que a inclusão ainda Exemplos disto são: não gostar de
é algo que está sendo desenhado, toque, colocar as mãos no ouvido
implantado, e que a visão que as com barulhos, não comer qual-
pessoas tem sobre autismo ainda quer tipo de comida, não gostar de
são obsoletas e atrapalham a par- cores escuras, entre outros. E em
ticipação real destes sujeitos em nível “mínimo”, que são chamadas
sociedade. Para começar, vamos HIPO RESPONSIVIDADE, ou seja,
relembrar alguns aspectos sobre nesse caso, a escala é bem abaixo
o Transtorno do Espectro Autista de uma pessoa típica e parecem
(TEA): que estão indiferentes a alguns es-
- O Autismo é fenotípico, ou seja, tímulos, como: não atender quando
você vai encontrar uma diversidade chamado, comer qualquer coisa, in-
de diferenças entre um autista e clusive encontradas no chão, não se
outro: nunca haverá autistas iguais; incomodar com abraços e barulhos,
- É um transtorno do neurode- entre outros.
senvolvimento, ou seja, vai alterar - São pensadores visuais e uti-
algumas fases e algumas aqui- lizam-se de memória visual, muito
sições. Mas como é diferenciado melhor do que escrita e auditiva. - Apresentam alterações em
para cada sujeito, alguns vão falar - Seus níveis são avaliados de planejamento e flexibilidade cogni-
na idade adequada, outros não. acordo com o grau de necessidade tiva, que afetam suas questões
Alguns vão andar e desenvolver de apoio. São eles: cognitivas, mas se trabalhados,
aspectos psicomotores mais do que Nível 1 – quando necessita de aprendem a resolver questões antes
outros; alguns vão desfraldar em pouco apoio; impossíveis, que de certo ponto,
idade adequada, outros não; Nível 2 – quando necessita de podem gerar até certo estresse. Por
- Não existe uma causa cor- apoio substancial; isso, é de extrema importância que
reta para o autismo, mas sabemos Nível 3 – quando necessita de monte-se uma agenda visual, qua-
que sua variante pode ser de 97% muito apoio. dros de rotinas para que se organize
genética ou hereditária. Isso signi- Os níveis podem se modificar, e planeje-se dentro das atividades
fica que alguém da família tem o em alguns casos, quando este sujei- a desenvolver. Para a flexibilidade
diagnóstico. to recebe tratamento adequado e de cognitiva, é importante que o traba-
- Sujeitos com TEA apresentam acordo com suas necessidades, po- lho da equipe terapêutica exercite
alterações sensoriais, que afetam dendo até mesmo ficar tão parecido a tomada de decisão e resolução de
sua troca com o ambiente e com com seus pares que pode parecer problemas, pois o autista apresenta
as pessoas, e isso vai desregulá-lo. não ter autismo. Mas, lembre-se, dificuldade em resolver questões
Quando vemos uma criança com isso não é cura, isso é melhora do novas, como por exemplo, buscar
TEA se jogando no chão, chorando quadro. Uma pessoa com TEA um novo caminho se a rua está em
sem parar ou até mesmo agredindo, nunca deixará de ter TEA. obra e fechada.

44 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Existem muitos
sujeitos com TEA
que aprendem
línguas estrangeiras
sem nem mesmo ir
ao curso; contudo,
não sabem escrever
ou entendem a
língua escrita
- Gostam muito de água e músi-
ca e estas são entradas muito boas
para acalmar e organizar.
- Apresentam habilidades li-
neares, ou seja, podem ser muito
bons em determinados conheci-
mentos e não apresentarem capa-
cidades mínimas para aquisição
deste. Um exemplo disto é um
autista que conheci que fazia cál-
culos mentais do plantão do pai,
utilizando as imagens mentais
que ele criou para tal. Contudo,
não reconhecia os números de 1
a 10 se alguém os solicitasse para
escrevê-los. Existem muitos sujei-
tos com TEA que aprendem línguas
estrangeiras sem nem mesmo ir ao
curso; contudo, não sabem escrever
ou entendem a língua escrita.
- Apresentam hiper focos, e isso não sabe utilizar-se da comunica- Dentre todas estas informações
varia de um para um, que são o ção de forma adequada. é importante reconhecer que o
interesse restrito em determinados - A interação com os demais é diagnóstico de TEA não é fatalista,
assuntos. Há uma crença de que inadequada por causa de vários não é o fim. Um sujeito atípico pode
gostam de dinossauros, mas temos motivos, entre eles: falta de co- melhorar de seu quadro inicial e
autistas com interesse em assuntos municação adequada, dificuldade viver em sociedade com sujeitos
de Geologia, Química, Física e, até em sair do hiper foco e focar em típicos, trabalhar, ter família, pas-
mesmo, em Medicina. Esses inte- outros assuntos para dialogar com sear e adquirir autonomia.
resses afetam sua interação social, os pares mas, principalmente, a O que queremos aqui neste texto
por gostarem de falar muito sobre dificuldade em teorizar a mente é ampliar a postura dos educado-
isso; mas, também, são de extrema e reconhecer a linguagem cor- res em reconhecer as habilidades
valia para que chamem sua atenção poral e não verbal do outro. Isto e minimizar o capacitismo, que é
e foco em atividades escolares, afeta no reconhecimento das um movimento preconceituoso de
quando impressos nas extremi- emoções, de entender metáforas demonstrar que o sujeito com de-
dades das folhas ou utilizados como e ditados populares e isto os tor- ficiência não tem capacidade para
contextos de conteúdos. nam literais. E, com isso, apre- alcançar determinados graus de
- Sua comunicação é alterada, e sentam dificuldade em abstrair autonomia e laboralidade. É visível
esse é o único “sintoma” que você determinadas informações em um este olhar quando um responsável
encontrará igual em todos. Ou seja, diálogo, e até mesmo em textos chega à escola e diz que seu filho é
pode falar em idade adequada, mas interpretativos. autista: há na hora uma segregação

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 45


Autismo III

diagnóstica de que o aluno com


diagnóstico não se enquadra na
escola regular ou em grupos soci-
ais. Para isso, gostaria de elucidar
alguns fatos:
- Todo sujeito com autismo tem
alguma habilidade e o fato de não
“falar” não significa que não se co-
munica ou que não é capaz;
- É preferencial a matrícula
deste sujeito em escola regular, mas
existem casos que o mesmo é in-
dicado para a classe especial e isto
não significa que tenha que ficar lá
o resto da vida: há exceções em que
o aluno volta à classe regular; - desde a Educação Infantil o ou valorize, assim o vínculo será a
- A indicação de um aluno com professor pode perceber diferentes melhor forma de incluir este sujeito.
TEA para a classe especial varia de formas de agir; (JOIA, 2018)
sujeito para sujeito, ou seja, alguns - oferecer contato com todos os Com isso, buscamos validar
se encaixam nela e a sua maioria, outros alunos da escola: a troca é a inclusão, aspecto urgente para
em classe regular; a melhor forma de interação e me- alunos com TEA, a partir da pos-
- Não significa que um aluno com lhora dos comportamentos; tura do professor e dos colegas,
TEA precise de Plano Educacional - trabalhar com pastas, material do acolhimento e da mudança do
Individual e mediador só por ter com velcro/imã nas atividades gera- olhar. Para uma escola realmente
diagnóstico. Lembre-se, isso é um doras do conteúdo escolar, estruturar inclusiva e dedicada na continui-
direito adquirido por lei, mas não o material de acordo com sua neces- dade de ações para estes alunos,
significa que seja obrigatório! Como sidade. O aluno pode ler antes dos assim como outros, público-alvo
dito antes, cada sujeito com TEA é cinco anos, mas não saber escrever da Educação Especial. •
único e sua necessidade de apoio por questões sensoriais. Ofereça,
varia de um para um. Sendo assim, então, em vez de caderno, um tablete
REFERÊNCIAS
há alunos autistas que não neces- ou até mesmo uma folha plastificada
sitam de apoio individualizado e para usar com caneta de quadro; JOIA, Michele. A inclusão de crianças
na escola – o papel do educar diante
diferenciação de grade curricular. - nas atividades que envolvem
das dificuldades de aprendizagem. Rio
- Receba um aluno com TEA coordenação motora fina é impor- de Janeiro: Wak Ed., 2018.
sempre antes de dizer não! Avalie tante colar barbante em volta para JOIA, Michele (Org.). Manual de
suas possibilidades, reconheça que perceba que há espaço para promoção e prevenção de saúde na
suas habilidades e converse com criar e também limitar a escrita; educação. Volume 1 – Na escola. Rio
de Janeiro, Wak Ed., 2019.
terapeutas e familiares. Dê margem - todo dia apresentar-lhe o
ORRÚ, Silvia Ester. Autismo, lin-
à inclusão! calendário, com barbante colado,
guagem e educação: interação social
Diante destas questões, nos per- separando dia por dia e pedir para no cotidiano escolar. 3. Ed. Rio de
guntamos sobre a inclusão destes na pintar o dia que está, assim como Janeiro: Wak Ed., 2012.
escola e informo que há uma série de uma agenda visual, de acordo com ORRÚ, Silvia Ester. Estudantes com
possibilidades para tal. O professor é sua necessidade, para que planeje necessidades especiais: singularidades
e desafios na prática pedagógica inclu-
criativo e aprende com o próprio alu- sua rotina e finalize um tarefa para
siva. Rio de Janeiro: Wak Ed., 2012.
no, assim como os seus colegas. Não entrar em outra;
há a opção de não ter conhecimento O professor do aluno com TEA
sobre autismo: isso já passou! Esta- deve saber mediar entre os alu-
mos em uma sociedade inclusiva, nos, pois suas ações são muito
MICHELE JOIA
que tenta pelo menos, e com pessoas importantes. Com o aluno com
cada vez mais diagnosticadas. É TEA a fala deve ser direta sem Pedagoga,
hora de ampliar acessos, colaborar explicações como: ATENÇÃO! psicopedagoga,
educadora especial
com famílias e modificar a forma de POSTURA!, AGORA NÃO!, ISSO! – especialista em
pensar sobre o autismo, assim como VOCÊ CONSEGUIU!, entre outras. autismo, qualificada ABA. Autora dos
livros “Inclusão de crianças na escola”
sobre o sujeito com autismo. As atividades devem ser iniciadas e “Manual de promoção e prevenção
Seguem algumas dicas de como sempre da esquerda para a direita de saúde na educação – volume 1 – Na
escola” (ambos pela Wak Editora).
incluir alunos com autismo: e reforçadas com algo que goste

46 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


Inclusão

Síndrome de Down A
síndrome de Down não é
progressiva e nem conta-
giosa, possui tendências

e sua importância no para melhoras espontâneas, pois seu


SNC (Sistema Nervoso Central) con-

contexto da vida tinua a amadurecer com o tempo.


É uma disfunção cromossômica e
uma deficiência mental congênita
mais comum, e geralmente pode
ser diagnosticada ao nascimento ou
logo depois por suas características,
que variam entre os portadores,
mas difere pelo seu genótipo. O ser
humano tem como característica
importante a plasticidade do funcio-
namento do cérebro. Isso significa
que conforme as situações ofereci-
das e/ou vivenciadas pelo ambiente,
o cérebro (que é flexível) é capaz de
se adaptar às várias circunstâncias.
Todo sujeito tem o direito à edu-
cação, igualdade de oportunidade.
Cada um tem a sua característica,
capacidade, necessidade e, para isso,
os sistemas educacionais devem se
adequar com planejamentos, pro-
gramas que busquem interesses de
seus alunos e família. O aluno com
Síndrome de Down não deve se
sentir discriminado diante do que
for oferecido a ele para sua apren-
dizagem: precisa ter uma pedagogia
centrada, capaz de ir ao encontro
das necessidades deste aluno. Uma
pessoa com Síndrome de Down
pode alcançar resultados positivos
no processo de ensino e apren-
dizagem. Não podemos esquecer
que uma boa educação é um bem
enorme que traz benefícios, contri-
bui no desenvolvimento psicoafetivo
e no processo de socialização.
Podemos dizer que a escola tem
uma função reguladora e formativa
na vida do aluno com Síndrome de
Down, ela pode ensinar a trocar
ideias, aprender a conviver com as
diferenças, com as limitações, dis-
cutir e lidar com as emoções. A es-
cola tem um papel fundamental na
construção da aprendizagem e da
autonomia deste aluno.
Cada aluno tem a sua história
e a sua relação com esta história
estabelecerá seu conhecimento na
vida. O aluno com a síndrome tem

48 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021


o seu desenvolvimento físico e men-
A escola tem constituição social e cognitiva, a sua
tal mais lento, e existe uma grande um papel inserção no mundo, ensinar valores
variação na capacidade mental e no éticos e morais. A família é o mode-
processo de desenvolvimento motor fundamental na lo, o espelho de referência da vida.
e de linguagem. Como, também,
podemos afirmar que os níveis
construção da É da família que irá se constituir
uma unidade dinâmica das relações
intelectuais, avançados ou não, ne- aprendizagem e afetivas, sociais e cognitivas, dar
cessitam cada vez mais de estímulos significados para as relações inter-
que possibilitem uma inversão do da autonomia pessoais, para a construção indivi-
quadro apresentado.
A psicomotricidade é um meio
deste aluno dual e coletiva. É neste seio familiar
que a pessoa com Síndrome de
extraordinário para esta estimu- Down viverá as maiores sensações
lação, trabalhando a linguagem, de alegria, felicidade, prazer, amor,
esquema corporal, percepção, orien- tristezas, desencontros, brigas,
tação espacial, lateralidade, pos- ciúmes, medos e ódios.
tura, ritmo, equilíbrio, respiração, tornarão indispensáveis para sua Relevante a família junto à es-
entre outras áreas, como também formação. cola, pois é imprescindível conhecer
a música, a dança, a natação entre A convivência e as rotinas diárias o Decreto-Lei nº 3/2008, de 7 de
outras técnicas que levem ao interes- do ensino, junto ao acompanha- janeiro de 2008, Capítulo 1, Artigo
se, prazer, desempenho e aqui- mento profissional com psicomotri- 3, Parágrafo 1º, do Ministério da
sição das habilidades cognitivas. cistas, terapeutas ocupacionais, Educação, que diz: “os pais ou encar-
É importante o acompanhamento fonoaudiólogos, psicopedagogos, regados de educação têm o direito
especializado juntamente com a psicólogos, dentre outros, ajudarão e o dever de participar ativamente,
participação no ensino regular. To- as possibilidades de aprendizagem exercendo o poder paternal nos ter-
das estas possibilidades contribuem e uma melhor forma do educando mos da lei, em tudo o que se relaciona
para o desenvolvimento dos aspec- ser conduzido dentro do contexto com a educação especial a prestar ao
tos físico, cognitivo, social e afetivo escolar. O acompanhamento se faz seu filho, acedendo para tal a toda
da pessoa com Síndrome de Down. necessário pelo processo de matu- informação constante no processo
É muito importante promover a ração e desenvolvimento do sistema educativo”. É no interior da família
eficiência do aluno com Síndrome nervoso central ser bastante com- que se deve encontrar condições ad-
de Down. Lembrando que o desen- plexo, e apresentar anormalidades equadas para se desenvolver com o
volvimento não depende exclusi- funcionais e estruturais, que resul- apoio, cuidados e alimentação.
vamente da condição genética, tam em disfunções neurológicas O Dia Internacional da Sín-
mas sim de fatores tanto biológicos variando quanto às manifestações drome de Down é comemorado a
quanto sociais. As atividades devem e intensidade. 21 de março. Segundo o Movimen-
demonstrar significados e devem O enriquecimento do ambiente to Down, a data tem por finalidade
ser voltadas para a autonomia desse no qual a pessoa com Síndrome de dar visibilidade ao tema, reduzin-
educando, e elas devem estar o Down está inserida, e do incentivo do a origem do preconceito, que é
mais próxima possível da vida real das pessoas que estão à sua volta, a falta de informação correta. Em
e do cotidiano dele. Essas bases se são muito importantes para sua pro- outras palavras, combater o “mito”
gressão, sendo um incentivo para ir que teima em transformar uma
mais além no seu desempenho. Deve diferença num rótulo, numa socie-
haver caminhos alternativos que dade cada vez mais sem tempo,
as façam buscar novos meios para sensibilidade ou paciência para o
atingir um melhor desenvolvimento “diferente”. •
cognitivo e psicomotor. Devemos ter
muito cuidado na superproteção,
pois a mesma pode subestimar FÁTIMA ALVES
a capacidade de realização, não
Fonoaudióloga,
permitindo tomar iniciativas. É psicomotricista,
essencial que se crie atividades que mestre em Ensino de
Ciências da Saúde e do
ampliem a sua possibilidade de Ambiente; coordenadora dos cursos de
autonomia. Pós-graduação em Psicomotricidade,
de Letramento e Alfabetização da AVM
A família tem um papel crucial: Educacional. Entre os livros lançados
é dela a responsabilidade inicial da está “Para Entender a Síndrome de
Down” (Wak Editora).

ABRIL 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 49


Classieeesp

@sieeesp
sieeesp
SIEEESP

AGENDA DE OBRIGAÇÕES
• MAIO • 2021 •
• 07/05/2021
• SALÁRIOS - ref. 04/2021
• E-Social (Doméstica) - ref. 04/2021
• CAGED - ref. 04/2021
• FGTS - ref. 04/2021
• 10/05/2021
• ISS (Capital) - ref. 04/2021
• EFD – Contribuições - ref. 03/2021
• 20/05/2021
• INSS (Empresa) - ref. 04/2021
• PIS – Folha de Pagamentos -
ref. 04/2021
• SIMPLES NACIONAL - ref. 04/2021
• COFINS – Faturamento - ref. 04/2021
• PIS – Faturamento - ref. 04/2021 ANUNCIE
• 28/05/2021
• IRPJ – (Mensal) - ref. 04/2021
NA REVISTA
Escola 5583-5500
• CSLL – (Mensal) - ref. 04/2021
Dados fornecidos pela
11

Particular
HELP – Administração e Contabilidade
helpescola@helpescola.com.br
(11) 3399-5546 / 3399-4385 comercial@sieeesp.com.br

50 REVISTA ESCOLA PARTICULAR • ABRIL 2021

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