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Os Conceitos de EPM, Potencial e

Interferência, Inseridos Numa Proposta


de Mapeamento de Estudos Sobre
Performance Musical

SONIA RAY

Introdução

A definição de conceitos é comumente associada ao trabalho de


pesquisadores de áreas teórico-reflexivas como a filosofia e algumas sub-
áreas da comunicação, e geralmente dissociadas da prática musical. Tal
dissociação tem sido minimizada em parte pelo crescente número de traba-
lhos sobre composição (ressaltando-se pesquisas sobre música e engenharia
de som), musicoterapia e educação. Estas sub-áreas da música se valem
de quadros teóricos consolidados como base para suas pesquisas, quadros
estes que estão em fase de desenvolvimento na performance musical. Neste
contexto, a presente proposta de mapeamento vem contribuir para ampliar
as ofertas de referências para pesquisas que possibilitem novas reflexões
sobre o fazer musical.
Quase todos os instrumentistas, cantores e regentes brasileiros são
também professores, atuando academicamente ou não. Transmitir o conhe-
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cimento adquirido ao longo de uma vida de experiência como performer não


é só uma necessidade da realidade econômica nacional, mas também uma
forma de continuar refletindo sobre sua própria atuação. Porém, a trans-
missão do conhecimento precisa de ferramentas teóricas e práticas para que
o aprendizado seja estimulado. O problema maior está na pouca tradição que
os performers em geral têm em documentar suas práticas. Como lembrado
por Borém (2000), na conferência de abertura do I Seminário Nacional de
Pesquisa em Performance Musical, é preciso que os professores de perfor-
mance musical reflitam sobre o fazer musical e registrem suas reflexões. Este
parece ser um caminho fértil na busca pela consolidação de um quadro
teórico de estudos sobre performance musical.
Em discussões na 1a semana da Performance Musical – realizada
em abril de 2003, na Escola de Música de Brasília, por iniciativa do Grupo
de Estudos em Práticas Musicais (GEPM) – discorri sobre a necessidade de
se conceituar “interferência“ na Performance Musical. O tema já estava
sendo discutido informalmente com pesquisadores dos grupos de estudos
da EMB (Escola de Música de Brasília) e da EMAC-UFG (Escola de Música e
Artes Cênica da Universidade Federal de Goiás. Assim, partindo da fórmula
proposta for Barry Green (1993) onde P = (performance musical) = p
(potencial) + i (interferência), propus uma proposta preliminar sobre um
conceito de “interferência“ na Performance Musical. Apresentei também
caminhos viáveis para estudos com enfoque em Performance Musical
através de um mapeamento que auxilie na identificação do item a ser estu-
dado dentro dos EPM – Elementos da Performance Musical (Ray, 2000). Ao
final das discussões, sugeri que um momento fosse selecionado dentro do
processo de preparação, execução ou avaliação da performance musical,
inspirada pela organização que Gabrielsson (1999) dá ao estudo da perfor-
mance, para que finalmente se discuta um dado tipo de interferência na
performance musical.
Neste capítulo, desenvolvo a idéia apresentada na EMB. Apresento os
conceitos de EPM, de interferência e de potencial na performance musical,
bem como uma proposta de mapeamento da performance musical.

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1. EPM - Elementos da Performance Musical

Este trabalho entende que a performance musical como o momento


em que o músico (instrumentista, cantor ou regente) executa uma obra
musical exposto à crítica de outro ou outros. Podemos estar falando de
um recital, um concerto solista (ou camerista), um concerto com grandes
conjuntos (como coral ou orquestra), uma prova com banca (em escola,
concurso ou audição para emprego) ou até mesmo uma aula (onde freqüen-
temente se ‘simula’ uma apresentação). O fato aparentemente simples de
estar sendo observado muda a atitude do performer diante da música que ele
executa. Toda performance musical envolve pelo menos um agente (instru-
mentista, cantor ou regente) e quatro fundamentos: 1) o domínio da mani-
pulação física do instrumento; 2) o amplo conhecimento do texto musical a
ser interpretado, bem como as considerações estéticas a ele relacionadas; 3)
condições de interagir com os aspectos psicológicos envolvidos no exercer
da profissão e 4) condições de reconhecer os limites do seu corpo constan-
temente e prioritariamente no contato como o instrumento.
Em um estudo preliminar, constatei que “são poucos os estudos dispo-
níveis que focalizam os vários elementos que interagem durante uma perfor-
mance musical, ou seja, os elementos que compõem uma performance
musical. Estes elementos, que chamo EPM - Elementos da Performance
Musical, compreendem aspectos [anato-] fisiológicos, conhecimento do
conteúdo (que inclui o texto musical e suas múltiplas abordagens), aspectos
técnicos, psicológicos e neurológicos” (Ray, 2002. p.72). É no processo de
interação destes elementos que a musicalidade pode ser trabalhada.
Um outro estudo (Ray, Vieira e Dias, 2002) foi realizado com a partici-
pação de estudantes voluntários de performance musical, os quais respon-
deram a questionários e participaram de um ciclo de palestras e workshops
ministrados por membros do Gepem - Grupo de Estudos em Performance
Musical da EMAC-UFG. Os questionários mostraram que mais de 90% dos
voluntários não tinham uma noção clara dos seus limites técnicos para
escolha de repertório, não tinham um critério para estudar um novo
elemento técnico na execução do instrumento (ou uma nova peça no reper-

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tório), não adotavam nenhuma técnica de ensaio, não tinham passado por
nenhum programa de reeducação corporal e não conheciam os principais
periódicos nacionais que constantemente publicam artigos sobre perfor-
mance musical e música em geral. Tal constatação me levou a intensificar
os estudos já iniciados no sentido de promover uma discussão mais apro-
fundada sobre os Elementos da Performance Musical e seus fundamentos.
Os EPM foram então organizados em seis: 1) Conhecimento do
Conteúdo, 2) Aspectos Técnicos; 3) Aspectos músculo-esqueléticos; 4)
Aspectos Psicológicos; 5) Aspectos Neurológicos e 6) Musicalidade e Expres-
sividade. Cabe ressaltar que, apesar de estarem sendo aqui abordados indi-
vidualmente, não se pode perder a noção de que os EPM ocorrem simulta-
neamente durante a performance musical, e que a divisão e categorização
na presente proposta têm apenas a função de facilitar a discussão.

1.1 Conhecimento do Conteúdo

Por conteúdo dos EPM entendo o texto musical, a noção estético-


-musical e a formação do performer. O conteúdo do texto musical e suas
múltiplas abordagens na performance musical estão diretamente ligados à
estrutura de ensino no Brasil, seja na formação de base, seja na formação
musical do performer. A não obrigatoriedade do ensino de arte na formação
básica (ensinos fundamental e médio) do brasileiro é responsável pela quase
inexistente exposição do estudante ao conteúdo estético da música e das
artes em geral. Exceções são detectadas em instituições privadas e inicia-
tivas isoladas, e não suprem a demanda nacional.
O contato do performer com o conteúdo estético-musical se dá prati-
camente junto com o contato físico com o instrumento e junto com sua
preparação para a exposição ao público. Entretanto, se este contato com
o instrumento se intensifica à medida que o músico percebe seu próprio
crescimento e desenvolvimento, o estudo do texto musical passa a ser um
elemento de segundo plano, isto é, um item a ser estudado em uma disci-
plina específica (história, estética ou estruturação musical) cada vez mais

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dissociados do momento da performance ou de sua preparação. No ensino


universitário, a predisposição para a manutenção da rigidez de estrutura e
funcionamento afasta cada vez mais os estudantes das associações teórico-
práticas na assimilação deste conteúdo.
Com isso, a execução de música contextualizada, em particular obras
contemporâneas compostas por compositores ainda ativos, torna-se ainda
mais rara. Nestas obras, o estudo do contexto estético-musical é funda-
mental e por vezes indispensável – vistas as limitações da grafia conven-
cional, por exemplo – demandando um trabalho de pesquisa para o qual
o estudante de música não foi treinado em sua formação como performer.
Em geral, a busca por datas de autores e de composição das obras só ocorre
no momento da montagem do programa, quando o repertório está na reta
final de preparação para a performance. Em casos raros, uma consulta um
pouco mais ampla é feita para confecção de notas de programa, mas esta
geralmente é feita em cima da hora por uma exigência de avaliação acadê-
mica. A cobrança da atitude de pesquisa fica dependente da consciência do
professor de instrumento (voz ou regência), o qual nem sempre atua como
pesquisador, além de raramente terem passado por uma formação peda-
gógica sólida em sua formação. Assim, acredito que a “nossa maior tarefa
agora [como educadores musicais que somos] seja atualizar nossa prática
de ensino e trabalhar nos sentido de reorganizá-la” (Ray, 2001. p. 126).

1.2 Aspectos Técnicos

Os aspectos técnicos da performance musical compreendem, além


do domínio do instrumento, a produção musical, a qualidade do material
de estudo e a orientação adequada. Como já foi salientado pelo professor
Guerchfeld (1997), são extremamente comuns os equívocos cometidos pela
confusão entre estes dois termos, “técnica” e “metodologia”, em pesquisas na
área de música. Cientificamente dizemos que técnicas, em uma dada área
(ou sub-área), são os meios corretos de executar as operações de interesse
de tal área, e que o conjunto destas técnicas constitui o método (Cervo e

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Bervian, 1996). Ao aplicarmos esta teoria em performance musical, que é


uma sub-área da música, podemos dizer que técnicas são os meios pelos
quais performers tornam-se aptos a dominarem seus instrumentos e que, o
conjunto destes meios, constituem o método. Porém, na maioria dos casos,
não podemos afirmar se uma técnica é certa ou errada. No máximo ela será
adequada ou inadequada.
Assim, com relação ao domínio do instrumento, encontramos um
problema: como a técnica musical é normalmente dissociada do estudo das
implicações de ordem psicológicas inseridas no aprendizado musical, no
meio musical a palavra método faz referência apenas a um livro de estudos
progressivos e de caráter predominantemente de treinamento físico-motor,
e não ao processo global de aprendizado do performer. Este problema é agra-
vado pela tradição (herdado dos conservatórios europeus) dos professores de
adotar um único método para todos os alunos, geralmente sem considerar
as individualidades inerentes ao artista. Os resultados mais freqüentes são
os sucessos e os fracassos musicais, equivocadamente atribuídos a “falta de
talento” do aluno fracassado ou ao “talento nato” do aluno bem sucedido.
Partindo-se da premissa que existe sempre uma forma de explicar para que
um indivíduo são possa compreender, a escolha do material adequado e a
orientação no uso deste material passam a ser de extrema relevância para
que o aluno adquira domínio do instrumento. Obviamente, não se pode
eximir o aluno de fazer sua parte, qual seja, estudar!
A produção musical tem reflexos diretos na execução do instru-
mento, pois uma falha de produção ou a inexistência dela pode impedir
que o domínio que o músico tem de seu instrumento possa ser demons-
trado. Portanto, quando se treina a aplicação de uma técnica recém domi-
nada, por exemplo, é fundamental que se considere a situação real em que
ela será executada. A roupa a ser vestida, a luz que estará disponibilizada,
as condições de coxia para concentração, a ordem do programa e o plane-
jamento do espaço físico são algumas das questões a serem consideradas
pelo performer (a menos que ele tenha um produtor! Ainda assim terá que
instruí-lo a respeito destes detalhes). Ainda não se aprende isto em cursos de
música, porém, os congressos da área têm apresentado trabalhos abordando

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a questões como a montagem do programa (Carlson, 2001) e a produção


pré-recital (Cardassi, 2000).

1.3 Aspectos músculo-esqueléticos

A estrutura do corpo humano é estudada pela anatomia e as funções


de cada órgão pela fisiologia. Mais especificamente, a anatomia é a ciência
que estuda a constituição do corpo do ser humano enquanto a fisiologia
é a ciência que estuda “...a atribuição de cada função ao seu órgão apro-
priado e o estudo das condições que determinam cada função” (Davson
apud Mendes, 2004. p.1).
Na atividade diária do performer musical o uso de corpo é exigido de
forma particular, fazendo de associações que combinem a constituição física
de cada parte do corpo com suas funções específicas. O uso bastante adverso
do cotidiano dos braços dos violinistas e violistas ou o uso das pernas do
organista, são exemplos clássicos. Assim, performers “freqüentemente ficam
sujeitos a situações que exigem maior esforço físico do que estão habitu-
ados, como a necessidade de se preparar para uma nova prática, ou teste
de seleção, apresentações em recitais, festivais e outros. Nestes contextos, as
aulas práticas e ensaios se realizam em grande número e num curto espaço
de tempo. Estes exemplos corriqueiros de sobrecarga de trabalho geram,
sem dúvidas, o desconforto, as dores localizadas, as tensões musculares,
fadiga, stress físico e distúrbios que fogem do equilíbrio natural do orga-
nismo” (Deotti, Broseghini e Ray, 2004. p.174).
Pesquisas recentes associando a performance musical à performance
atlética (Andrade e Fonseca, 2002; Ray, 2002; Cintra e Barrenechea, 2004;
Gannett,1997 e Pederiva, 2004), levantam semelhanças e indicam que a
música pode se beneficiar de conquistas obtidas na medicina do esporte, em
particular nas prevenções de doenças advindas de movimentos repetitivos e
no desenvolvimento de estrutura física adequada ao longo tempo despen-
dido diariamente em atividade. Clarke e Davidson (1998) ressaltam a impor-
tância da interação do corpo na performance, evidenciando a necessidade

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deste estar em boa forma. Aspectos nutricionais também são relevantes e


são incluídos nas questões músculo-esqueléticas (Greco e Ray, 2004), como
fator a ser considerado para o funcionamento adequado do corpo, prepa-
rando o performer para suas atividades.
Em suma, o preparo do corpo é fundamental para que se possa
cumprir as tarefas técnicas de domínio do instrumento (voz ou regência).
É possível que o performer musical se prepare com consciência do processo
à medida que se informa sobre como adquirir resistência muscular, como
treinar seqüências de movimentos usando mínimo esforço, como se
alimentar mais adequadamente para períodos de maior e de menor inten-
sidade de trabalho e, principalmente, como se prevenir de lesões quando
em atividade. Um preparo inadequado pode impedir o desenvolvimento
pleno do performer tanto em sua preparação quanto em sua execução. Nas
palavras das pesquisadoras Gerling e Souza.

o corpo não é somente um organismo recebedor da informação


sensorial e um mecanismo que efetua a execução, o corpo está muito
mais intimamente ligado com o todo da resposta musical, perceptiva,
motórica e afetiva, precisando ser reconhecido como tendo um papel
muito mais central do que este simples modelo generativo sugeriria
(2000. p. 118).

1.4 Aspectos Psicológicos

A referência a aspectos psicológicos é evidente na citação acima. No


mesmo artigo, as autoras fazem uma preciosa revisão da literatura nacional
e estrangeira sobre psicologia da performance, partindo do pioneiro Carl
Seashore (1967) – que ainda é referência para estudos de psicologia da música
– passando pelas mudanças de pensamento na área (do puro behaviorismo
a considerações no campo cognitivo), e chegando a pesquisas mais recentes,
a exemplo de Gabrielsson (1997) – mapeamento do estudo da performance
e Clarke (1995) investiga performance via semiótica. Dada a abrangência do
trabalho de Gerling e Souza (2000), não cabe aqui repeti-lo, mas sim indicá-
-lo como leitura obrigatória para os interessados em se aprofundar no tema.

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Entretanto, é relevante destacar no presente trabalho que nos aspectos


psicológicos estão inseridas condições fundamentais para a preparação e
execução musical, bem como para a avaliação (pedagógica ou de auto-
desempenho) do performer. A estrutura emocional de um músico precisa
ser trabalhada tanto quanto suas habilidades motoras e aprofundadas
juntamente com o crescimento do seu conhecimento do contexto musical
das obras que ele executa. Podem-se considerar também possibilidades de
estudo da percepção e da comunicação em grupo – essencialmente objetos
de estudo da psicologia – em pesquisas sobre performance musical, como já
o fazem Schneirderman (1992), Kaplan (1987), Clarke e Davison (1998), Ray
(2002b), Barry e Hallam (2002) e Williamon e Davidson (2002), dentre outros.
Tido com um certo preconceito por profissionais da área que
entendem que o estado psicológico seria uma “desculpa dos não-talentosos”,
os estudos nesta área demoraram muito a serem considerados na prepa-
ração do músico. Um novo paralelo com os atletas pode ser feito aqui: os
atletas há muito se beneficiam de uma das áreas mais importantes da medi-
cina aplicada, a medicina do esporte, enquanto que a medicina da música
começa a se destacar em congressos europeus e norte-americanos (Pede-
riva, 2004). Hoje ninguém questiona a importância do acompanhamento
de um psicólogo em equipes de esporte, já os grupos de câmara e grandes
grupos orquestrais e coral ainda estão longe de usufruir de tal benefício.
Propostas como a da Técnica de Alexander (Conable, 1992) e de técnicas de
concentração (Gannett, 1997) direcionadas também para a busca de equi-
líbrio emocional do performer musical, são estimuladoras e apontam para
a formação de uma geração de profissionais mais humanizados e melhor
preparados para a atividade diária do performer musical.

1.5 Aspectos Neurológicos

Aspectos neurológicos estão diretamente ligados a tudo que o corpo


faz, uma vez que seu grande comandante, o cérebro, está por traz de todas
as nossas ações voluntárias e involuntárias (Houzel, 2003). Não poderia ser

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diferente na atividade do performer musical. Porém, até poucas décadas,


nos faltavam estudos que abordassem o performer como foco principal.
Borém (2000) nos chama a atenção de todos para a proximidade da
arte, particularmente da performance musical, com a ciência. Em suas pala-
vras, “uma reintegração entre ciência e arte parece ser uma das promessas
do século XXI e sua busca aponta para uma maior humanização de seus
elementos constituintes” (p.147). Neste sentido, estudos de neurologia apli-
cados à realidade do performer musical nos últimos anos têm se expandido
e são cada vez mais bem vindos.
O Center for the Study of Music Performance (Londres), coordenado
pelo psicólogo e trompetista Aaron Williamon, desenvolveu entre 2000 e 2002
um projeto multidisciplinar incluindo dois neurocientistas, um cientista do
esporte, um psicólogo especialista em Técnica de Alexander e um violista e
um pianista, todo doutores. O projeto, chamado Zoning In: motivating the
musical mind, teve o objetivo principal de “ajudar performers a desenvolver
uma compreensão natural das pressões sofridas em suas performances a fim
de ganhar experiência para lidar com a performance com mais confiança e
controle”. (Williamon, 2002. p.1). Os relatos dos resultados apontam, entre
vários aspectos, para a importância do uso de instrumentos de medição do
funcionamento do cérebro no decorrer da atividade musical. Respostas deta-
lhadas, como reações à correção de notas desafinadas ou ritmos levemente
fora do padrão desejado, apontaram possíveis atuações do neurocientista no
processo de otimização do trabalho do performer. Segundo o neurocientista
responsável por esta parte do projeto, John Gruzelier, a resposta neurológica
faz com que o indivíduo fique ciente da forma como o seu cérebro processa
as informações na atividade musical e, com isso, ele pode aprender a usar
este ‘feedback’ para guiá-lo pelos estados do cérebro a fim de alcançar o
máximo dentro de suas habilidades pessoais.
Outros experimentos com objetivo de desvendar o comportamento
do cérebro no momento da performance musical são relatados por Critchley
(1977) e Gannett (1997). Apesar da pouca formalidade na apresentação
dos resultados das pesquisas desenvolvidas por Gannett (as publicações se
limitam a relatos de experiência em congressos), ela desenvolveu exercí-

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cios de refinamento da percepção auditiva e da concentração do performer


em seu processo de estudo fundamentados em revisão de literatura a fim.
Uma página muito informativa vem ganhando visitantes diariamente
no Brasil. Trata-se da www.ocerebronossodecadadia.com. Coordenada
pela neurocientista Suzana Houzel, a página é especializada em divulgar
pesquisas de neurocientistas que desvendam o processo de situações coti-
dianas e triviais, como bocejar, chegando a funções mais complexas, como
assimilar uma informação. Muitas das pesquisas divulgadas nos últimos
anos foram organizadas em um livro homônimo, que muito tem apoiado
discussões do Gepem-Grupo de Estudos em Performance Musical da
EMAC-UFG. Entender um pouco mais sobre o funcionamento do cérebro
ajuda o performer a entender também os truques que os neurônios nos
pregam. Por exemplo: quando o aluno está estudando horas a fio tentando
decorar uma passagem para a apresentação que será em dois dias (atra-
sados como sempre!), ele tende a pensar que quanto mais horas seu físico
agüentar tocando, mais perto de decorar a passagem ou dominar determi-
nado movimento ele estará. Isto pode ser um risco muito grande. Segundo
Houzel (2003), o cérebro tem um limite de funcionamento “válido”, isto é,
um limite daquilo que ele realmente assimilará. Se você o privar de sono,
este limite se esgota rapidamente. Se você estudar um pouco menos e
garantir cerca de oito horas de sono por noite, aumentará as chances de
seu cérebro decorar a passagem. Na privação de sono, os neurônios não
funcionam mesmo. Não é mito! Muitos músicos o sabem por experiência
vivida (ou sofrida!), mas será que já não é hora de usarmos os resultados
dos avanços tecnológicos para entender como fazer melhor nossa ativi-
dade vital, qual seja, fazer a música soar como em nossas mentes?

1.6 Musicalidade e Expressividade

No âmbito da performance musical, a musicalidade não tem função


quando não expressa. No presente trabalho, é relevante traçar conside-
rações sobre como musicalidade e expressividade atuam em benefício

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Performance Musical e suas Interfaces

da performance musical no seu sentido mais amplo, no qual interagem


performer, obra, público e contexto. É na articulação entre musicalidade e
expressividade que se encontra grande parte da essência da performance
musical. Entretanto, definir estes aspectos em sua plenitude significaria uma
profunda visita a questões estético-filosóficas, o que certamente me levaria
para longe do meu objetivo imediato, qual seja, localizar as vertentes passí-
veis de objetivação dos termos dentro da atividade do performer musical,
para posterior aplicação no mapeamento a ser proposto neste texto. Assim,
passo apresentar algumas visões contemporâneas sobre musicalidade e
expressividade.
“Para que o músico possa expandir sua capacidade de expressar
musicalidade ele tem que ter uma boa dose de imaginação, bem como
conhecimento do contexto (estilo, forma, métrica, textura...) que lhe nutra”
(Williamon, 2002. p.8). Esta foi a conclusão dos pesquisadores do Centro
de Estudos em Performance Musical do Royal College of Music (Londres).
Eles mediram a musicalidade dos voluntários do projeto Zoning In conside-
rando três aspectos: 1) adequação estilística; 2) imaginação interpretativa e
3) dimensão da expressividade. Certamente sempre haverá níveis distintos
de processamento do contexto baseado na vivência, na experiência indivi-
dual, que é o componente maior a nos distinguir uns dos outros, quando,
por exemplo, executamos a mesma obra.
Além da imaginação e conhecimento do contexto, é importante
que se tenha em mente que musicalidade e expressão não são elementos
a serem adicionados depois que aspectos técnico-estilísticos, motores, etc.
estejam prontos. Como observado por Swanwick, “o caráter expressivo
está implícito em muitos tipos de decisões de performance, na escolha
do andamento, nos níveis de acentuação, nas mudanças de dinâmica e
articulação – como o movimento de um som ao outro som está organi-
zado.” (2003. p.62)
Ser capaz de expressar sua musicalidade em público é desejo de todo
performer. Entretanto, a musicalidade dificilmente se fará notar se o conteúdo
não estiver assimilado, se o corpo não estiver bem preparado e a mente
não estiver bem equilibrada. Para Sloboda, uma performance “madura”

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Performance Musical e suas Interfaces

é caracterizada pela pronta reconstrução de parâmetros performáticos e


pela compreensão da macroestrutura da composição e pelo “resultado da
interação do conhecimento específico da peça com o conhecimento geral
adquirido ao longo de uma trajetória musical consistente” (1989. p.94).
Idéias complementadas por Swanwick, quando este afirma ser fundamental
“olhar para cada performance de maneira holística, em vez de ficar satis-
feito com a necessária, mas insuficiente fragmentação que pode ocorrer
num ensaio” (2003. p.62).
Neste sentido pode-se dizer que, no momento da performance
musical, a reconstrução do que foi estudado, planejado, idealizado e contex-
tualizado durante a preparação da performance é indispensável para que a
musicalidade possa ser percebida e transmitida pelo performer.

2. Interferência e Potencial na Performance Musical

Em comunicação na mesa de abertura da Primeira Semana da Perfor-


mance Musical, realizada em abril de 2003, na Escola de Música de Brasília,
discorri sobre a necessidade de se conceituar “interferência“ e “potencial”
na performance musical. O assunto surgiu em discussões com pesquisa-
dores dos GEPEM - Grupo de Estudos em Performance Musical da EMAC-
UFG e GEPM - Grupo de Estudos em Práticas Musicais da EMB, e com
outros colegas pesquisadores com os quais tenho discutido informalmente
a questão. Partindo da fórmula sugerida por Green (1983)

P=p–i

onde P = performance musical; p = potencial e i = interferência, propus


conceitos funcionais para os termos interferência e potencial na perfor-
mance musical, no intuito de disponibilizar mais referências para o estudo
formal em performance musical. Assim, passo a apresentar o processo de
obtenção destes conceitos.

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Performance Musical e suas Interfaces

2.1 A fórmula de Green (1983)

A fórmula de Green é herdada de um trabalho similar de Timothy


Gallway sobre performance esportiva intitulado The Inner Game of Tennis.
Em seu livro, Gallway usa de sua experiência como treinador e terapeuta
esportivo, para organizar exercícios com textos informativos e preventivos
sobre estresse emocional, perda de auto-confiança na atuação do atleta
durante períodos de treinamento e de competição. Apesar de classificado
como “auto-ajuda”, ou seja, destina-se a auxiliar psicologicamente a pessoa
no desempenho de uma atividade, mas não traz comprovação científica
da eficácia de suas propostas, o livro foi bem recebido no meio esportivo
mundial. Na adaptação para a área da performance musical, Green aper-
feiçoou o texto em vários aspectos, o principal deles foi um maior embasa-
mento da área de psicologia e a inclusão de resultados de experimentos que
realizou com performers da música. A versão musical foi publicada em 1983
sob o título The Inner Game of Music. Vários vídeos e livros têm sido publi-
cados anualmente com experimentos descritos e propostos no livro. Cerca
de um terço do livro ainda apresenta muito do material original considerado
de “auto-ajuda”, entretanto, os dois terços restantes são de grande utilidade,
em particular pelas propostas de exercícios de concentração e técnicas de
visualização, tão difundidas e recomendadas por psicólogos atualmente.

2.2 A busca pela delimitação das Interferências no estudo do GEPEM

Na idéia de interferência apresentada por Green está implícita a cono-


tação negativa, ou seja, o que interfere na performance obrigatoriamente
diminui o potencial do performer. Com o intuito de verificar se esta visão
negativa de interferência era compartilhada por performers em geral, esta
foi adotada como pressuposto pelo GEPEM. O grupo desenvolveu hipóteses
e as aplicou na elaboração de questionários (primeira etapa). Estes foram
aplicados em 45 alunos voluntários, estudantes de graduação em música na
EMAC - Escola de Música e Artes Cênicas da Universidade Federal de Goiás.

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Performance Musical e suas Interfaces

Em seguida, elaborou-se uma série de palestras para um grupo de 8 alunos


selecionados (pela disponibilidade) com base nas respostas dos questionários.
Na última etapa, os oito alunos responderam um segundo questionário que
revelou ao grupo de pesquisadores novas considerações quanto aos possí-
veis tipos de interferência (Ray, Vieira e Dias, 2002). As etapas do estudo em
detalhes foram como segue:

Primeira etapa: partindo da visão de Green sobre interferência nega-


tiva, foram elaboradas três hipóteses: 1: As interferências que mais freqüen-
temente inibem uma performance são causadas por ansiedade, insegu-
rança quanto ao potencial e pouca experiência de atuação em público por
parte do performer; 2: Interferências na performance musical poderiam ser
minimizadas através de uma abordagem metodológica mais voltada para o
momento do palco ou outra atuação em público (incluindo a concepção e
aplicação do material pedagógico); 3: Interferências na performance musical
poderiam ser minimizadas com uma aproximação mais efetiva dos perfor-
mers com os problemas e as soluções detectados em estudos recentes sobre
performance musical (incluindo estudos em áreas afins). Com base nestas
hipóteses, foram aplicados os questionários elaborados no formato “cafe-
teria” (Mucchieri,1979), onde o consultado tem opções de respostas semi-
direcionadas e também espaço para opinião ou depoimento. As respostas
corroboraram as três hipóteses acima.

Segunda etapa: A equipe preparou palestras para um grupo de oito estu-


dantes, (selecionados pela disponibilidade). As palestras foram concentradas
em 5 tópicos: 1) Limites do Corpo: Aspectos músculo-esqueléticos e psicoló-
gicos; 2) Processos Cognitivos e Comportamentais aplicados à Performance
Musical; 3)Técnicas de Ensaio: ações, intenções e opções; 4)Fundamentos das
Artes Marciais Aplicados à Performance Musical e 5) Fontes de Referência para
Pesquisa em Performance Musical Publicadas em Língua Portuguesa.

Terceira etapa: Um segundo questionário foi aplicado ao final do


semestre, construído nas mesmas bases do primeiro, mas incluindo deta-

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Performance Musical e suas Interfaces

lhamento dos temas abordados nas palestras e considerando que os oito


alunos haviam atuado em performances (individuais ou coletivas) durante
o semestre. O resultado pode ser sintetizado em quatro itens:
1. Os estudantes estão à procura de exemplos práticos que possam
ser copiados;
2. Os estudantes tendem a acreditar que o material disponível para
pesquisa em performance está fora de seu alcance;
3. Existe a expectativa constante de que as soluções devem vir da
sala de aula;
4. O grupo ficou ansioso para iniciar o próximo estágio do estudo
quando as performances de grupos de câmara seriam monito-
radas.

Concluiu-se que, a palavra interferência, por ser sinônimo de inter-


rupção ou corte de uma seqüência, carrega consigo um significado negativo,
pois todos os consultados entenderam o termo como negativo, apesar disso
não ter sido diretamente sugerido. Outro fator relevante para a discussão
dos conceitos funcionais é que as palestras acabaram agindo com interfe-
rência positiva na rotina dos consultados, visto que todos relataram alguma
melhora em sua prática diária e ficaram ansiosos por iniciar a segunda parte
do estudo (um experimento com grupos de câmara).

2.3 Outros conceitos de interferência

Na área artística – teatro, na dança, artes visuais – observamos o uso


consistente do termo interferência como uma intervenção que altera o
esperado. Uma intervenção que muda o desenvolvimento de uma perfor-
mance de forma explícita, sem a pretensão de passar despercebida. Entre-
tanto, o resultado não é necessariamente negativo, visto que o objetivo destas
intervenções é justamente o de alterar, mudar a ordem estabelecida, neste
sentido, contesta a proposta de Green (1983), na qual a variante “interfe-
rência” é sempre negativa (vide item 2.1 acima). Entretanto, ao considerar

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Performance Musical e suas Interfaces

outros conceitos de interferência, não vislumbro a pura contestação da idéia


de Green, mas um novo olhar sobre a variante “interferência.” Um olhar
que contribua para que a fórmula de Green seja ampliada e assim, melhor
aproveitada em estudos sobre performance musical.
Assim, um olhar recente sobre antigos experimentos de Thomas Young
– físico que surpreendeu o mundo ao demonstrar a natureza ondulatória
da luz no século XVIII – chamou-me a atenção. Segundo o físico, as ondas
de luz formam figuras de interferência ou perturbações com padrões carac-
terísticos. Quando duas perturbações se reforçam, elas interferem de modo
construtivo e quando duas perturbações se anulam, elas interferem de modo
destrutivo. (Young apud Mozena, 2005). Na analogia, quando as interferên-
cias atuam de forma construtiva elas se reforçam e têm um sentido positivo;
quando as interferências atuam de forma a mudarem o previsto, têm um
sentido negativo. Assim, se entendermos “figuras” como “tipos”, podemos
aceitar a idéia de que o termo “figuras de interferência” seja pertinente para
aplicação na atividade do performer musical, visto que uma performance
musical não pode existir sem nenhuma interferência, ou perturbação, seja
ela positiva ou negativa. Sempre haverá uma segunda visão – do professor,
da platéia, da banca, dos colegas – que modificará de forma limitadamente
previsível, o decorrer da performance.
Portanto, figuras de interferências são o resultados da somatória das
interferências positivas e negativas atuantes durante uma performance
musical.

2.4 Considerações sobre Potencial

Potência significa a capacidade/habilidade de realizar algo. No


contexto deste trabalho podemos dizer que: quanto mais capacitado o
performer, maior o seu potencial para realizar uma performance musical. Esta
aplicação direta do termo à performance musical, requer alguns cuidados,
viso que os momentos de preparação e avaliação da atuação em público são
partes indispensáveis da construção e otimização do potencial do performer.

53
Performance Musical e suas Interfaces

Também não se pode quantificar aqui as gradações deste potencial, visto


que os EPM podem se apresentar em graus diferentes em cada indivíduo,
criando um universo imenso de possíveis variáveis.
Entretanto, é possível afirmar que potencial é a capacidade do
músico em interagir de forma consciente e equilibrada com os EPMs
(Conhecimento do Conteúdo, Aspectos Técnicos; Aspectos músculo-
esqueléticos; Aspectos Psicológicos; Aspectos Neurológicos; Musicali-
dade e Expessividade) durante a execução da performance musical.

2.5 Conceitos funcionais de interferência e potencial na performance


musical

Voltando à definição de Performance Musical que apresentei no início


deste capítulo, a performance musical é o momento em que o músico (instru-
mentista, cantor ou regente) executa uma obra musical exposto à crítica de
outro ou outros, seja um recital, um concerto uma prova ou até mesmo uma
aula. Daí a importância de não nos fixarmos em conceitos muito restritos
para seu estudo. A complexidade inerente à atividade do performer exige
que a performance musical seja abordada a partir de referenciais específicos
e ao mesmo tempo flexíveis. Assim, como proposta preliminar de referencial
para futuros estudos, e com base no acima exposto, apresento os conceitos
de interferência e potencial na performance musical:

P=p+f

onde P = performance musical; p = potencial e f = figuras de interferência


(interferências positivas + interferências negativas)

Assim, as figuras de interferências se somam ao potencial enrique-


cendo-o e resultando na performance musical. Esta por sua vez, pode ser
otimizada à medida em que o performer utiliza as figuras de interferência
de forma a ampliar seu potencial.

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Performance Musical e suas Interfaces

3. Proposta de Mapeamento de Estudos sobre Performance Musical

Como vimos, o fazer musical é um processo complexo que envolve


profundos detalhamentos sobre música e sobre áreas afins que atuam como
coadjuvantes indispensáveis na construção de uma performance musical.
Assim, ao olharmos para a performance musical como objeto de pesquisa
duas opções preliminares nos ocorrem: 1) um olhar generalizado sobre o
processo e 2) um olhar sobre uma etapa, um momento específico dentro
deste processo. Assim, partindo da sugestão de Gabrielsson (1999) de se
olhar para a performance musical em três momentos (preparação, reali-
zação e avaliação), sugiro que o quadro abaixo seja considerado como um
ponto de partida para aqueles que buscam iniciar (ou ampliar) uma pesquisa
sobre o tema.

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Performance Musical e suas Interfaces

O quadro sugere que o processo de organização de um estudo na


área de performance musical tenha início na escolha de um tópico para se
mapear e estudar, escolha esta feita a partir da localização de um elemento
em um momento específico da performance musical. Da mesma forma, as
figuras de interferência, conforme definidas acima, podem ser focalizadas
em um dado EPM e em um momento específico da performance musical.
Avaliação seria uma espécie de “potenciômetro”, um medidor de
potência. À medida que ela detecta o grau do potencial do performer,
também dá a noção do que precisa ser trabalhado. O aluno que consegue
compreender a necessidade da auto-avaliação pode também ter uma boa
noção dos aspectos que ele mesmo pode melhorar considerando desem-
penhos anteriores, bem como os aspectos em que precisa de ajuda de seu
professor, de um fisiologista ou de um psicólogo.

Conclusão

A busca por uma definição mais aprofundada do conceito de inter-


ferência é objeto de pesquisa contínua do Diretório CNPq Performance
Musical e suas Interfaces. Entretanto, a definição funcional aqui apresen-
tada já nos permitiu traçar reflexões acerca de como otimizar o processo
de preparação, realização e avaliação do fazer musical. Também apresen-
tamos os Elementos da Performance Musical - EPM, e uma fórmula que usa
o conceito de interferência e potencial na performance musical, mostrando
por fim, uma proposta de mapeamento da performance musical.
Foi objetivo deste trabalho apresentar os conceitos de EPM, de interfe-
rência e de potencial na performance musical, bem como uma proposta de
mapeamento da performance musical. Espero que estes conceitos possam
ser utilizados como ferramentas a serviço do performer musical na revisão
de sua atuação pedagógica e de seu próprio processo de aprendizado.
Relembrando a sugestão de Borém (2000), performers precisam refletir
sobre o fazer musical e registrar suas experiências pessoais e profissionais. Relatos
de processos de preparação, realização e avaliação da performance musical são

56
Performance Musical e suas Interfaces

indispensáveis para ampliar a compreensão das relações entre aspectos práticos


e teóricos na performance, os quais são indissociáveis na pesquisa.
Dentre as pesquisas que mais têm colaborado com os estudos em
performance musical, destacam-se aquelas organizadas de forma a isolar
um momento dentro da complexidade que envolve o fazer musical para
melhor estudá-lo. Assim, sugeri que o processo de organização de um estudo
na área de performance musical seja estruturado em um mapeamento onde
EPM são localizados, isolados e analisados.
Finalmente, é importante ressaltar que os conceitos funcionais dos
Elementos da Performance Musical e a proposta de mapeamento da perfor-
mance musical aqui apresentados não têm a pretensão de esgotar o assunto.
A meu ver esta discussão está em pleno desenvolvimento e deve suscitar
novas discussões nos próximos anos.

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Sonia Ray - Sonia tem se apresentado regularmente como solista e camerista em salas de
concerto no Brasil e EUA. É doutora em Performance e Pedagogia do Contrabaixo pela Univer-
sidade de Iowa, EUA. Faz regularmente primeiras audições de obras brasileiras para contra-
baixo. É sócia-fundadora da ABC - Associação Brasileira de Contrabaixistas. Sonia é criadora e
editora da Revista Música Hodie do Programa de Pós-Graduação em Música da Universidade
Federal de Goiás, onde leciona contrabaixo, música de câmara, metodologia de pesquisa e
música contemporânea. Desenvolve projetos de pesquisa com o apoio do CNPq e da FUNAPE
nas áreas de performance musical, pedagogia musical e de catalogação (revisão, edição e
editoração) de música brasileira para contrabaixo.

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