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Copyright

2009© Katherine Smith


Copyright 2019© Cherish Books

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Wildes, Emma
Uma proposta Indecente (An indecent Proposal) / Cherish Books; Rio de Janeiro; 2019
Edição Digital

1.Romance de Época 2. Literatura Estrangeira 3.Ficção


Uma Proposta Indecente © Copyright 2019 — Cherish Books

______________________________________

Texto revisado segundo novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.


Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, através de quaisquer meios,
sem a prévia autorização do autor.

Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, locais ou fatos, terá sido mera
coincidência.

Preparação de Texto: Elimar Souza e Bianca Carvalho


Tradução: A.J Ventura
Revisão: Luciane Rangel
Capa: Letícia Kartalian

Diagramação: A.J Ventura


SUMÁRIO

Capa
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Epílogo
Notas
O s cavalos galoparam desenfreados, atravessando o trecho em meio aos
rugidos da multidão até a linha final e, momentos depois, Nicholas
Manning, o sexto duque de Rothay, vencia novamente com seu espetacular
garanhão negro. Os cavalos de seu estábulo, na verdade, permaneciam invictos
até aquele momento.
Não era uma surpresa.
Não havia dúvida sobre isso, o homem tinha um toque mágico quando se
tratava de cavalos, e os rumores davam conta de que sua habilidade era ainda
maior quando se tratava de mulheres.
Era fácil acreditar, Caroline Wynn pensou, observando-o caminhar pelas
arquibancadas em direção a seu camarote privado, com seu lendário sorriso
brilhando diante da admiração dos amigos. O duque tinha uma marca particular
de beleza evidente que combinava a masculinidade absoluta de sua esplêndida
estrutura óssea clássica com a dramática coloração bronzeada de sua pele. Ele
também era alto, atleticamente constituído e se movia com graça natural
enquanto subia as escadas, sem dúvida ansioso por comemorar suas vitórias.
Vestido com elegância casual em um casaco de alfaiataria, calça de bainha alta e
botas polidas, seus cabelos, que mais pareciam seda negra, contrastavam com o
branco ofuscante de sua gravata com um nó perfeito.
— Rothay certamente parece satisfeito consigo mesmo — Melinda Cassat
murmurou, abanando-se vigorosamente contra o calor da tarde. Pequenos cachos
castanhos escuros se moviam ao redor de seu rosto em sincronia com cada
movimento de seu pulso. A área onde estavam sentadas era sombreada por um
pequeno toldo listrado, mas não havia uma brisa. O céu sem nuvens era de um
claro e profundo azul cobalto.
— Ele ganhou, então por que não estaria satisfeito? — Caroline observou a
forma alta do duque desaparecer no camarote com um leve tremor na boca do
estômago.
O que estou fazendo?
— Não é como se ele precisasse do dinheiro. O homem é rico como Creso 1.
— Melinda empurrou uma mecha de cabelo rebelde do pescoço e franziu a boca.
— Claro, apostar em uma corrida de cavalos é muito menos escandaloso do que
o mais recente rumor de suas escapadas. Você já ouviu falar sobre isso?
Agradecida por ter o calor do sol para culpar pelo rubor em suas faces,
Caroline mentiu descaradamente.
— Não. Do que você está falando?
Fofoqueira ávida, Melinda ficou encantada com a pergunta. Ela se inclinou
para frente, e seus olhos castanhos se estreitaram conspiratóriamente. Seu peito
rechonchudo estufou-se quando ela inspirou rápido.
— Bem, parece... ou então dizem por aí, você sabe... que o belo duque e seu
amigo lorde Manderville que, como se ouviu dizer, herdou a reputação de seu
pai como um libertino de primeira ordem, fizeram uma aposta ultrajante sobre
qual deles seria o melhor amante.
— Sério? — Caroline usava o que ela esperava que fosse uma expressão
muito branda.
O rosto de sua amiga estava iluminado de excitação e intriga.
— Você acredita nisso?
— Você tem certeza de que é verdade? Quer dizer, minha querida, esta é
Londres, e esta é a alta-sociedade. Nem todo rumor é verdadeiro. Você sabe tão
bem quanto eu que a maioria deles é falso ou, pelo menos, uma verdade
exagerada.
— Sim, mas até onde eu sei eles não negaram. A aposta está devidamente
registrada nos livros da White 2, e os palpites sobre quem vai ganhar estão se
acumulando em quantidade recorde. Aqueles dois estão sempre protagonizando
escândalos, mas realmente se superaram desta vez.
Caroline observou os jóqueis se levantarem para a última corrida.
— Como alguém poderia provar uma coisa tão absurda? No mínimo, o
resultado deve ser subjetivo. Afinal, se estão apostando qual deles é o melhor
amante, quem será o juiz em tudo isso?
— Bem, minha querida, essa é a parte verdadeiramente escandalosa. Eles
precisam de um crítico imparcial. Toda a sociedade está especulando sobre quem
será ela.
— Isso é um pouco bárbaro, não é? Ela teria que concordar em ter
intimidade com... bem, os dois, suponho. Deus do céu!
Melinda olhou para Caroline com uma evidente expressão divertida.
— Eu esperaria que você dissesse isso, já que é tão pudica. Não posso
precisar se é bárbaro, mas certamente está além dos limites, mesmo para esses
célebres libertinos. No entanto, ainda mais apostas estão sendo feitas sobre a
rapidez com que eles conseguirão encontrar alguém adequado para consentir em
provar o que cada um tem a oferecer. É loucamente perverso, mas dois dos
homens mais bonitos da Inglaterra farão o possível para dar prazer à escolhida.
Imagine o que está reservado para a dama que concordar.
Bem, ela era bastante consciente de sua reputação fria e impassível, mas,
ainda assim, ser chamada de pudica fazia Caroline se sentir na defensiva.
— Eu não sou exatamente uma velha matrona mimada. Posso entender por
que uma mulher sucumbiria a um homem bonito e encantador, capaz de seduzir
sem esforço. Certamente esses dois se qualificariam, já que supostamente
praticaram o suficiente.
— É verdade, mas eu nunca dei a entender que você seja velha ou definhada,
muito pelo contrário. — Sua amiga suspirou com ênfase dramática. — Mas você
não é muito acessível, Caroline. Sei que se protege desde o seu casamento e da
morte de Edward, mas, sendo honesta, você precisa se deixar viver novamente.
Se quisesse, metade de Londres estaria prostrada a seus pés, querida. É jovem e
bonita.
— Obrigada.
— É verdade. Homens fariam filas com flores e sonetos. Não há motivo para
definhar em solidão eterna.
— Eu não desejo me casar de novo. — Era completamente verdade. Uma
vez fora o bastante.
Uma vez fora mais do que suficiente.
— Nem todo homem é como Edward.
Tentando abstrair o assunto, Caroline observou os cavalos se alinharem e
ouviu a pistola responder antes que eles se adiantassem. Certamente esperava
que nem todo homem fosse como seu falecido marido — pensou, enquanto os
animais magníficos instintivamente disparavam para frente —, pois logo o
duque libertino estaria lendo seu bilhete.
— I sso é interessante — Nicholas murmurou as palavras e pegou o decantador
de conhaque, despejando uma grande quantidade no copo de cristal à sua frente.
Ele guardou a garrafa no armário de baixo e observou novamente o pedaço de
pergaminho em sua mão. Um retorno a Londres, depois de um dia exaustivo,
mas triunfante, do esporte dos reis o deixara de bom humor, animado pela vitória
e pela celebração resultante. Um retiro para seu escritório parecia vir a calhar.
Era, de muitas maneiras, seu santuário, mesmo que ele trabalhasse lá apenas
esporadicamente. Isso o lembrava de seu pai e talvez fosse um lado sentimental
que não admitiria para ninguém, mas não fizera qualquer alteração no local. Um
tapete cobria o chão polido, desbotado de um lado pelo sol que se inclinava pela
janela, e a escrivaninha era igualmente gasta. Livros em prateleiras de carvalho,
dispostos ao lado da lareira, produziam o familiar odor de mofo, couro
suavemente decadente e papel amarelado.
— O que é interessante? Algo a ver com as corridas? — Em frente a ele,
Derek Drake, o conde de Manderville, ergueu uma sobrancelha loira e se
acomodou em seu assento de maneira confortável. Como de costume, Derek
estava vestido na última moda, e as roupas feitas sob medida encaixavam seu
corpo esguio à perfeição; o tecido de juta polida se enrugava enquanto ele
descansava em sua cadeira. Seu rosto de ossos finos refletia apenas uma leve
curiosidade. — Nick, seus cavalos se superaram hoje. Certamente isso não é
uma surpresa. Não que eu me importe. Fiz uma boa soma na última corrida
acreditando em sua palavra de que Satanás estava em forma. Obrigado pela dica.
— Não há de quê, mas não é isso. — A atitude desdenhosa não era por que
Nicholas não se importava com as corridas. Seus cavalos eram sua paixão, e ele
era competitivo a ponto de ser um defeito, mas a caligrafia elegante no bilhete à
sua frente o intrigava. Ergueu os olhos e estendeu o pedaço de pergaminho
usando dois dedos. — Veja isto, Derek.
Seu companheiro pegou o papel dobrado, seu interesse obviamente tornando-
se mais aguçado enquanto lia as palavras. Como Nicholas, Derek leu duas vezes
o bilhete e olhou para cima.
— Bem, isso parece promissor, não é?
— Não é a nossa primeira oferta. — Nicholas tomou um gole, e o conhaque
francês desceu como seda aquecida em sua boca. Havia desembolsado uma
pequena fortuna pela garrafa, mas aquela bebida só era encontrada por
intermédio de contrabando, e ele considerava que o custo valera a pena. — Mas
admito que gosto da abordagem direta dessa senhora. Um desafio para um
desafio. Sim, muito criativo. Eu já a admiro. Seria bom, no entanto, saber quem
ela é.
A boca de Derek se curvou, e ele leu em voz alta:
— Se os senhores prometerem total discrição e desejarem um juiz imparcial
para sua ridícula aposta, eu irei ajudá-los. Estejam avisados de que minha
experiência até agora nos assuntos entre homens e mulheres não me deixou
impressionada. Se estiverem interessados em uma reunião para discutir este
assunto, tenho interesse em dar prosseguimento.
Era inteligente, pensou Nicholas, usar uma insinuação de decepção sexual
anterior para despertar seu interesse. A dama estava certa, se ele se permitisse
admitir; a aposta era ridícula, feita quando ambos estavam mais do que um
pouco embriagados.
— Um pouco insultuoso, reparei — comentou Nicholas, divertido. — Uma
proposta com um desafio. Nossa dama misteriosa tem coragem. Isso me atrai.
Derek lançou-lhe um olhar especulativo.
Eles tendiam a ver as mulheres com o mesmo interesse carnal, temperado
por uma tendência ao distanciamento emocional. A conquista sexual era um
jogo, e ambos eram jogadores experientes.
Nicholas não elaborou. A pressão para que se casasse, tanto da sociedade
quanto de sua família, era constante. Era esperado, ele sempre soube disso, mas
admitir sua relutância em encontrar uma esposa significava reconhecer algumas
verdades sobre si mesmo que ele ainda não estava pronto para enfrentar.
Todos os homens cometem erros. O mais memorável dos seus era de
natureza catastrófica, mas, novamente, somente ele tinha ciência de tal tragédia,
causada por juventude e inexperiência, e ele a compensara de todas as formas
possíveis. Tais compensações, aparentemente, incluíam apostas selvagens do
pior tipo. Ele observou o amigo com casualidade estudada:
— Claro. Uma mulher aventureira é sempre atraente na cama, não concorda?
— Eu concordo que, se continuarmos com isso, nossas reputações
dificilmente sofrerão mais do que já sofreram, então, por que não?
A palavra “envergonhado” não existia no vocabulário de Nicholas. Percebera
há muito tempo que a fofoca era uma parte inevitável da sociedade de Londres e
ficar fora do círculo de escândalos custava muito esforço para pouco ganho. No
entanto, ele e Derek concordaram que teria sido melhor se não tivessem de fato
registrado a disputa nem feito uma aposta tão grande no fim das contas. Agora
toda a sociedade estava atenta.
Ele lançou a Manderville um sorriso preguiçoso.
— Não há como não mordermos a isca, não é? Até agora, as ofertas de
candidatas à nossa aposta e nossas camas foram feitas principalmente por
senhoras de reputação duvidosa, que desejam compartilhar nossa notoriedade.
Esta parece um pouco diferente. Ela quer anonimato, aparentemente.
— Eu não tenho objeção a uma mulher experiente, mas concordo que o
segredo que ela pede é um diferencial. — Derek bateu no pedaço de papel com
um dedo, suas longas pernas estendidas. — Ela pode ser perfeita, desde que não
seja pouco atraente ou uma jovem casadoura em busca de fortuna e título.
— Deus me livre. — Pensar em uma jovem ingênua se envolvendo na
situação estava fora de questão. A aposta fora apenas uma ideia divertida, mas
acabara saindo um pouco do controle. Em retrospecto, a terceira garrafa de vinho
tinto fora uma má ideia naquela noite, mas Derek, em especial, parecia inclinado
a beber até ter amnésia.
Agora Nicholas considerava seu comportamento muito ilógico. Ele não
conseguia definir por que, mas tinha a sensação de que algo estava errado. O
bom humor habitual de Derek parecia forçado ultimamente. Seu charme
descontraído e despreocupado era uma das razões pelas quais as mulheres o
achavam tão atraente, mas parecera ao mesmo tempo subjugado e distraído nos
últimos meses.
— Nós não temos que fazer isso, você sabe — Nicholas lembrou ao seu
companheiro, observando seu rosto para avaliar a reação, percebendo que o
conhaque lhe trouxera um brilho ao rosto que o fazia parecer maduro e
introspectivo. — Foi uma brincadeira impulsiva entre dois amigos e nós
tendemos a ser um pouco competitivos um com o outro, o que não é segredo.
— Estamos nos acovardando, Nick? — Derek perguntou em reprovação
sardônica. Loiro, alto, com olhos da cor de um céu azul e de uma beleza quase
angelical, ele era a antítese da aparência mais sombria de Nicholas. — Quem
poderia culpá-lo, já que você vai perder. — Lá estava de novo, a inquietude tão
pouco característica.
Funcionou. Nicholas bufou diante do olhar presunçoso no rosto do amigo.
— O que te faz pensar isso? O bando de senhoras insípidas que leva
constantemente para cama? Deixe-me lembrá-lo de que quantidade não substitui
qualidade, Manderville.
— Se você está querendo fingir ser menos promíscuo, Rothay, tente
convencer outra pessoa. — Ele não estava, e, na verdade, teve que reprimir uma
resposta irritada. Era promíscuo, de fato, e não importavam quais fossem os
rumores sobre sua vida privada. Nicholas gostava de mulheres, mas, apesar de
sua reputação, ele era seletivo e tentava ser discreto. Por falar nisso, sabia que as
fofocas sobre Derek também o pintavam de uma forma mais severa, e suas
inclinações eram as mesmas. Fazia tempo que não ouvia sobre Derek
perseguindo alguém. Se ele não se tornara um celibatário, certamente estava
mantendo um comportamento discreto sobre o assunto.
Talvez este tivesse sido o motivo para a aposta impulsiva. O desafio de
Derek e sua própria resposta, ambas devidas a uma inquietação mútua causada
por... bem, ele não tinha certeza. Tantas reflexões não era algo bom para a alma.
Não uma manchada como a dele.
Em sua defesa, pelo menos a maioria dos assuntos íntimos e casuais baseava-
se em um entendimento agradável entre duas partes e não envolviam
sentimentos mais profundos. Embora Nicholas duvidasse que a sociedade
concordasse, achava que o casamento não deveria ter a ver apenas com a
linhagem de sangue de uma mulher e em sua capacidade de ter um filho de
estirpe apropriada. O fato de ser romântico era algo que guardava para si mesmo.
Não por ser uma atitude antiquada, embora realmente fosse, mas porque era
particular. Deus sabia que ele tivera pouca privacidade em sua vida devido à sua
educação aristocrática e à proeminência de sua família e título.
Então ele só piorou as coisas aceitando a aposta estranha e se tornando ainda
mais o foco de atenção pública.
Nicholas esfregou o queixo.
— Eu devo estar mais entediado do que pensava — admitiu — para
considerar a ideia de me deitar com uma mulher que vai ter um cartão de
pontuação na mão.
— Nós dois sofremos do mesmo mal, então. — Manderville lançou lhe um
olhar cínico. — Mas nós embarcamos nisso. Vamos analisar desta forma: se o
bilhete for genuíno, podemos fazer um favor a esta mulher, mudando sua opinião
sobre o prazer sexual.
— Como um ato de caridade? Esta é uma maneira interessante de justificar a
situação.
— Lembre-se, nós não a contatamos, ela veio até nós.
Bem, isso era verdade.
— Então eu acho que você deveria responder afirmativamente e marcar a
reunião que ela deseja. — Ele gesticulou, erguendo o copo vazio.
Derek assentiu.
— Mal posso esperar para conhecer a moça.
— O que faz você pensar que ela é jovem? Aliás, talvez precisemos decidir o
que vamos dizer se nenhum de nós a achar atraente. Isso pode ser um ponto
complicado.
O desejo era um componente necessário para ser um amante competente,
afinal.
— É verdade, meu caro. Eu duvido que conseguisse me enredar com uma
mulher velha e feia. Se há uma coisa que um homem não pode fingir é a
excitação sexual.
Nicholas teve que concordar com esse ponto. Embora não acreditasse que
uma mulher precisava ser uma beldade estonteante para atrair seu interesse, parte
da química sexual era atração mútua.
A noite se estabeleceu em um padrão de estrelas brilhantes e algumas nuvens
altas e vivas, e o luar obscuro tornou-se visível do lado de fora da janela. Em um
movimento preguiçoso, ele reabasteceu sua bebida e colocou o decantador perto
o suficiente para que seu convidado fizesse o mesmo. Lentamente, disse:
— Acho que nossas preocupações com essa questão são infundadas. Eu
especulo que ela seja linda, pois o tom do bilhete demonstra certa confiança de
que a aprovaremos.
Derek pegou a missiva mais uma vez e tornou a olhá-la.
— Eu acho que você está certo. — Olhos azuis mostraram o usual tom
provocante de seu humor, mas sua boca franziu-se. — Agora eu realmente mal
posso esperar para conhecê-la. Você vai escrever a resposta ou eu escrevo?
Precisamos descobrir um lugar apropriado para encontrá-la também, já que ela
exige total sigilo.
— Vamos deixar a moça decidir. Ela é quem quer impedir que sua identidade
seja conhecida.
— Acho justo — Derek concordou com um sorriso preguiçoso.
— Devemos ter regras, se ela provar ser a pessoa certa.
— Suponho que devamos, apesar de nossa aposta nos ter elevado a um nível
diferente de libertinagem, como você deve perceber, Nick.
Sim, Nicholas percebia. O que estavam fazendo? Ambos postulando,
fingindo que a aposta era séria. Em seu coração, imune ou não aos sentimentos,
como diziam os rumores, ele não acreditava que nenhum dos dois fosse vaidoso
ou superficial o suficiente para entrar em uma competição tão ridícula, mas por
alguma razão Derek estava decididamente mais despreocupado com isso.
Costumava tratar a sedução como tratava de assuntos imobiliários, questões
políticas e situações sociais.
Com avaliação fria e calculista.
A emoção não tinha lugar nos negócios, na política ou nos assuntos sexuais
de um homem. Certa parte dele desejava que fosse diferente, mas esta já tinha
sido escaldada uma vez pela dura realidade.
Bem, é claro que havia certo encanto. Ele era Rothay. Gostava de mulheres.
Gostava da suave anuência, de seus corpos fascinantes, a melodia do riso
feminino, as palavras acaloradas sussurradas, trocadas na cama durante um
interlúdio apaixonado, o resultado preguiçoso da culminação carnal. Em sua
opinião, não havia nada parecido com aquele suspiro particular que uma mulher
liberava quando se estava dentro dela, sentindo a força de suas unhas em seus
ombros nus.
Mas amor, não. Satisfazer seu corpo era uma coisa; seu coração, outra.
Ele simplesmente não era um homem capaz de cometer o mesmo erro duas
vezes. Destreza sexual não era um problema. Desde a morte de seu pai, quando
tinha dezessete anos, começara a buscar notoriedade e conseguira conquistá-la.
Sem pensar, murmurou:
— Tudo é efêmero. A fama e os famosos também.
Derek lançou-lhe um olhar e o analisou.
— Estamos citando Marco Aurélio, agora? Posso perguntar o porquê do
humor introspectivo?
— Não — a resposta foi firme. Seu velho amigo o conhecia muito bem. A
última coisa que queria era desenterrar fantasmas do passado. Tomou um longo
gole de seu copo, reclinou-se em sua cadeira e emendou: — Estou ansioso para
isso, quaisquer que sejam nossos motivos.
— E u repito a pergunta, por que a senhora estava lá, Madame?
O questionamento frio fez a boca de Caroline se franzir em aborrecimento.
Para seu desalento, o primo de seu falecido marido, o atual lorde Wynn, a
visitara e, embora tivesse evitado vê-lo durante semanas, não parecia ter outra
escolha a não ser finalmente recebê-lo. Como a semelhança familiar era forte,
era sempre um pequeno choque ficar cara a cara com Franklin, como se um
fantasma se materializasse diante dela.
Um espectro muito indesejado.
Eles estavam sentados em sua sala formal de visitas, as altas janelas abertas
para o ar quente da manhã, a elegante combinação de móveis marfim e dourados
refletindo seu próprio gosto; uma redecoração que ela fizera depois da morte de
Edward. Canapés de brocado, duas cadeiras graciosas — importadas da Itália —,
próximas à lareira, várias pinturas pitorescas de aquarela nas paredes cobertas de
seda. Uma urna preciosa e muito cara que encomendara segurava um buquê de
várias flores do jardim dos fundos. O cheiro era uma onda de prazer floral,
especialmente em um dia tão lindo. Erradicar qualquer coisa que a lembrasse da
presença de Edward fora um prazer. Seu marido teria detestado a feminilidade
dos pequenos e delicados toques pessoais, mas, até onde ela sabia, ele odiava
muitas coisas que não atendessem a seus gostos específicos.
Franklin absorveu a nova decoração com uma torção de boca e um brilho
frio em seus olhos pálidos. Aquele olhar dizia que a casa deveria lhe pertencer e
que o custo da reforma viera da fortuna que planejava herdar. Não que Caroline
se importasse, pois o dinheiro era dela, e se quisesse modificar a casa cômodo
por cômodo, livrando-se do gosto do marido, ela o faria.
— Fui ver as corridas de cavalos, naturalmente, meu senhor. Felizmente foi
um dia adorável, que eu apreciei muito — Caroline manteve o tom frio e
distante, tentando desviar o interesse do homem por suas atividades sociais. —
Sinto muito por ter estado fora quando o senhor veio na semana passada. Ando
bastante ocupada ultimamente, receio.
— Na semana passada, na semana anterior, sim, eu percebi. Espero que
perceba que ir sem escolta para um lugar como as corridas não é aconselhável.
Sempre há uma multidão dominada por homens. Senhoras decentes não vagam
por aí sem um acompanhante. Da próxima vez que desejar participar de um
evento público, entre em contato comigo e eu me programarei para acompanhá-
la.
Santo Deus, ele parecia tanto com Edward, com aqueles mesmos olhos azuis
frios...
Ele tinha o rosto como o de um falcão, todos os ângulos agudos, com um
nariz em forma de gancho, e seu cabelo era grosso e escuro. Maçãs do rosto
proeminentes, combinadas a uma boca de lábios finos que raramente sorriam.
Em seus trinta e poucos anos, e agora intitulado, Franklin era considerado muito
elegível. Ela supunha que ele era bonito, mas sua semelhança com Edward, tanto
física quanto em seu comportamento, era muito perturbadora. Os olhos de
pálpebras pesadas olhavam para ela com sua habitual avaliação fria.
Era como ser cobiçada por uma ave de rapina, pensou com desgosto. Não,
um abutre, pronto para pegar a carne de seus ossos se ela não se protegesse. Ela
se empertigou ao ouvir seu tom de posse e pela presunção de que ele poderia
ditar qualquer coisa sobre sua vida, quanto mais ensiná-la sobre decoro.
— Fui com Melinda Cassat e seu marido, então, não estava sozinha. O
senhor não precisa se preocupar com o meu bem-estar em nenhum caso.
Franklin inclinou-se um pouquinho para frente, com roupas que pareciam
mais adequadas a um cortesão do que a um cavalheiro fazendo uma visita
matinal. Renda se amontoava em sua garganta e nas bordas de suas mangas.
— Ah, mas não vamos esquecer que a senhora é minha prima viúva, então,
eu preciso me preocupar.
— Por favor, não se preocupe. — Ela não queria nada mais do que afastar
definitivamente qualquer associação com a família Wynn. Franklin sempre a
deixava desconfortável. Se pudesse apostar, o interesse dele em seu bem-estar
tinha pouco a ver com sua pessoa e tudo a ver com quanto dinheiro Edward lhe
deixara. Por sorte, o testamento conseguiu resistir aos protestos. O caso todo fora
apenas mais uma lição de como sua independência lhe custara caro.
— Sua reentrada na sociedade é de infinita preocupação para mim. — Seu
olhar sem emoção parecia atravessá-la.
— Eu não consigo pensar nos motivos para isso. Vivo uma vida tranquila na
maior parte do tempo. Estou gradualmente começando a aceitar alguns convites,
mas...
— Talvez eu deva ser consultado sobre quais eventos participa.
O aborrecimento se aprofundou, tornando-se algo mais.
— Eu sou uma viúva — ela lembrou a ele em dura reprovação. Então, como
fora ele quem a visitara e insistia em fazer presunções, acrescentou
imprudentemente: — Com minha própria fortuna.
Era a vez dele de ficar irritado, com o assunto incômodo. Levou um
momento, mas visivelmente a labareda da raiva fora acesa novamente.
— Eu percebo muito bem, minha cara, o estado de suas finanças. Eu também
sei que a senhora é jovem e ainda muito casável. Homens inescrupulosos
existem e é meu dever protegê-la.
O que quer que ela dissesse em seguida provavelmente seria imprudente,
mas por sorte foi capaz de morder a língua. Em vez disso, Caroline olhou em
volta, para as paredes pálidas e tecidos luxuriantes, indicativos de sua
independência. Queria não estar segurando a resposta de Rothay em sua mão um
tanto úmida. Poderia ter mantido mais autocontrole na companhia de Franklin,
se a maldita peça de pergaminho não estivesse queimando um buraco na palma
da sua mão. Seu mordomo a trouxera ao mesmo tempo em que anunciara seu
visitante indesejado, e Caroline sentia-se desesperadamente curiosa para se livrar
de Franklin e ler a resposta de Rothay. Parecia um carvão quente e brilhante que
ela deveria jogar o mais longe possível de sua pessoa.
Se Franklin soubesse o que era, ele com grande prazer mancharia o seu
nome, e ela não nutria ilusões sobre o que seria capaz de fazer se tivesse a
chance.
— Melinda e seu marido eram acompanhantes bastante adequados, e
ninguém se aproximou de mim. Não tendo participado das corridas antes, eu não
tinha certeza do que esperar. Achei tudo muito emocionante.
Realmente fora. Os aplausos exuberantes da multidão bem vestida, a glória
trovejante dos cavalos elegantes, até o momento em que respirara fundo ao ver o
duque de Rothay e lorde Manderville, um contraste entre as trevas. Uma beleza
satânica masculina e um Apollo dourado de boa aparência. Parecidos, mas muito
diferentes fisicamente, tão à vontade com sua notoriedade, tão confortavelmente
indiferentes aos sussurros e olhares furtivos, como se seguissem uma lei
particular e simplesmente não notassem o giro das cabeças ou os sussurros
furtivos por trás das mãos enluvadas.
O que Melinda faria se soubesse que ela recebera a resposta de Rothay,
embora ainda não a tivesse lido? Ou pior, o que ela diria se percebesse que
Caroline, de todas as pessoas, tinha se aproximado do infame duque e seu
igualmente infame amigo?
Era uma pergunta fácil de responder. Melinda não acreditaria. Ninguém
acreditaria.
Não estava certa de que ela mesma acreditava nisso.
— Estou feliz que a senhora tenha gostado, minha querida, mas saiba que
estou sempre à sua disposição. — Franklin se recostou na cadeira, como se
pretendesse ficar por ainda mais tempo, cruzando as pernas — elegantemente
vestidas — sobre os tornozelos.
O ligeiro tom sugestivo de sua voz a fez reprimir um arrepio. Disposição.
Dificilmente uma palavra sexual, mas algo no modo como a enunciara
concedeu-lhe uma insinuação obscena. Era difícil não pensar se ele não era
como Edward em mais aspectos do que apenas na aparência física. Não que ele
se importasse em cortejá-la. Ela não tinha ilusões naquela área. O homem queria
o controle da herança que achava que deveria ser sua, e ela era um obstáculo ao
seu objetivo, daí seu interesse solícito.
Caroline assentiu, mas foi apenas uma inclinação duvidosa de sua cabeça
para cobrir sua repulsa. Em sua experiência amarga, a família Wynn tinha uma
tenacidade que era difícil ignorar, então, um confronto direto não era uma boa
ideia.
— Eu agradeço a oferta.
— Ainda estou ansioso por uma estada sua na casa de campo para que
possamos discutir assuntos como este em nosso tempo livre. Minha mãe vai me
acompanhar, naturalmente.
Embora Franklin tivesse dito que ela poderia usar a casa se quisesse,
recusava-se a aceitar qualquer coisa dele, até mesmo sua hospitalidade.
— Talvez um dia. — Ela estava bem ciente da missiva posicionada ao seu
lado, sobre o assento da cadeira, tanto que usava sua mão, colocada de maneira
casual, para cobri-la o máximo possível.
O que será que está escrito?
Quão difícil era manter-se ali, composta, com total calma e a serenidade que
a fazia parecer tão inacessível para os mais impiedosos senhores.
A imagem exterior estava bem.
A verdade interior era um pouco mais difícil de enfrentar.
Franklin insistiu:
— Quanto a Londres, atrevo-me a dizer modestamente que posso aconselhá-
la sobre quais convites aceitar ou recusar. Afinal, tenho mais experiência.
O cômodo estava quente demais ou era apenas ela? Caroline lutou contra o
desejo de se abanar e sorriu em vez de fazê-lo.
— Eu admiro muito seus conhecimentos sobre nossa sociedade, meu senhor.
— Outro casamento vantajoso também a ajudaria. — Ele levantou uma
sobrancelha pesada, a arrogância de sua implicação como o espetar de uma
agulha.
Ele queria o dinheiro dela. Caroline tinha uma sensação repugnante de que
ele também desejava seu corpo, mas, nem sob ameaça de morte ela concordaria
com essa ideia.
Ele não precisava saber da reticência que sentia ao se apresentar em público
e muito menos de suas hesitações em relação a intimidades, mas isto era algo
que vinha tentando superar. Com a ajuda de um duque muito bonito e um jovem
conde igualmente atraente.
Talvez.
Pareceu passar uma eternidade até que ele olhasse para o relógio ormolu e se
levantasse.
— Minhas desculpas, mas eu tenho um compromisso. Venho visitá-la de
novo na próxima semana. Se o tempo estiver agradável, talvez possamos
planejar um pequeno passeio.
Ela preferia ser atropelada por uma manada de elefantes em fuga, mas de
alguma forma conseguiu formar um sorriso banal.
— Possivelmente.
Caroline esperou até ouvir o estrépito da carruagem, para só então pegar
cuidadosamente o envelope entregue.
Até a caligrafia do duque era arrogante, ela pensou, olhando para a missiva
por um momento antes de respirar fundo e abri-la. Tirou a única folha de papel
com dedos que tremiam de uma forma traidora enquanto lia a resposta para sua
imprudente proposta.

E LE PROVAVELMENTE IRIA PERDER A INFAME APOSTA , MAS A MELHOR MANEIRA DE


esconder um coração partido era com bravatas masculinas tolas. Ou, pelo menos,
era assim que ele preferia lidar com isso. A carruagem retumbou pela Upper
Brook Street, e Derek Drake olhou pela janela, sem ver a vista, mas, ao invés
disso, absorveu seus pensamentos.
Não eram os mais agradáveis, infelizmente. A maioria envolvia visões de
Annabel – não, uma correção era necessária: em breve Lady Hyatt – com seu
novo marido. Nua em seus braços, lábios nos lábios, seu cabelo dourado
brilhando sobre os lençóis enquanto eles se moviam juntos em um ritmo
cadenciado, suas pernas finas estendidas enquanto seu amante penetrava seu
corpo disposto...
Bem, certamente era produtivo imaginar algo assim, ele se repreendeu
morosamente, afundando-se contra as almofadas e deixando escapar uma
respiração frustrada. Torturar-se não estava ajudando. Fora isso que o colocara
em sua situação atual. O fato de ter bebido tanto na noite em que ele e Rothay
começaram o debate imprudente não o surpreendia, e talvez até mesmo a aposta
pública tivesse sido uma maneira de se vingar de Annie pelo anúncio que
aparecera no jornal.
O honorável Thomas Drake deseja anunciar o compromisso formal da Srta.
Annabel Reid com Lord Alfred Hyatt. As núpcias acontecerão daqui a quatro
meses...
Derek não fora capaz de ler mais.
Doera. Diabos, ler isso em tinta impressa o ferira. Mais do que ele esperava,
embora seu tio Thomas já tivesse lhe contado sobre a proposta de casamento e
sobre o sim, e também dera sua opinião sobre o enlace, comentando que se
tratava de uma união adequada.
Mesmo assim, a pontada de dor que acometera Derek ao olhar para as letras
em negrito do anúncio público, enquanto sentia as implicações da situação se
instalarem em sua alma, abrira um ferimento em carne viva que ainda sangrava.
Então, para melhorar as coisas, pensou com um estremecimento interior, ele
ficou completamente louco e decidiu piorar a reputação que Annabel já achava
repugnante, fazendo um desafio que agora tinha Londres fervilhando de
especulação. Não ajudava em nada que ele e Nicholas tivessem uma história
passada de competição em tudo, desde assuntos acadêmicos até atletismo e, é
claro, mulheres. Parte disso era apenas um aspecto inato de ambas as
personalidades, parte do resultado de origens semelhantes. Eles herdaram a
riqueza e seus títulos jovens e, juntamente com eles, a liberdade e as restrições
que acompanhavam os legados. A amizade fora imediata e natural, como dois
irmãos se encontrando cara a cara pela primeira vez e se reconhecendo.
Isso estimulou o debate absurdo da outra noite. Nicholas tinha seus próprios
demônios a rondá-lo. Derek estava bem ciente de que seu amigo tivera uma
experiência infeliz que fazia com que mantivesse a guarda alta, por mais
encantador que tentasse parecer. Nick não falava sobre isso e ele não fazia
perguntas sobre o arremedo de romance que se revelou como avareza calculada,
em vez de um sentimento profundo por parte da mulher com quem Nicholas
pensara que iria se casar. Era um acordo tácito entre eles de não discutir o
assunto, não violado durante os dez anos de amizade.
Afinal, eles eram muito parecidos.
Agora, parecia ser a vez de Derek queimar no inferno.
Sem dúvida, Annabel gostava menos dele agora do que nunca. Se isso fosse
possível. Por que ele nunca percebeu que estava apaixonado por ela até que fosse
tarde demais?
Porque ele era um idiota, claro. A jovem amava outra pessoa. Lorde Alfred
Hyatt era um tipo decente, até onde ele sabia, o que só piorava as coisas. Se
Annabel estivesse se casando com um biltre, ele poderia razoavelmente
expressar uma objeção, mas o homem não era isso, então não poderia objetar, e
ela nunca ouviria seu conselho de qualquer maneira.
Por que deveria? Ele era um especialista em fugacidade, não em casamento.
— Meu Senhor?
A voz despertou-o de sua abstração e ele percebeu que o veículo havia
parado e seu motorista estava ali esperando, a porta entreaberta. O jovem tossiu
discretamente.
— Desculpe. — Derek saiu, com um sorriso triste no rosto. — Bebi um
pouco esta tarde — disse ele desnecessariamente, perguntando-se por que estava
oferecendo explicação para um criado. Provavelmente porque não tinha ideia de
quanto tempo poderia ter ficado sentado ali, em contemplação sombria. Subiu os
degraus até sua casa, assentiu em agradecimento ao lacaio que abriu a porta e foi
direto para o escritório.
Ao contrário da sala desordenada da extensa mansão Mayfair, que os duques
de Rothay chamavam de lar há vários séculos, o santuário de Derek era limpo e
organizado. Todos os seus papéis estavam empilhados em um canto de sua mesa,
a nova correspondência no meio do mata-borrão, seu uísque favorito em uma
garrafa sobre uma bandeja ao lado. A sala cheirava a cera de abelha e levemente
a tabaco, e normalmente ele encontrava conforto nas paredes revestidas de
painéis e na pintura a óleo do interior de Berkshire acima da lareira, que era uma
de suas favoritas. Em seu atual estado de inquietação emocional, até mesmo a
impressão bucólica dos antepassados era incapaz de fazer algo por seu espírito
inquieto.
Ele afundou na cadeira atrás de sua mesa e olhou suas cartas não abertas com
um olhar cansado.
No topo, havia um envelope simples sem selo, apenas com seu nome escrito
em uma caligrafia precisa na frente.
Curioso, ele arrancou-o da pilha e abriu-a.
Meu senhor Manderville:
Encontre-me no Flower and Swine em Holborn às dez da noite. O salão
privado será reservado para nossa discussão.
Ah, sim, a maldita aposta.
Nenhuma assinatura, mas ele reconheceu a escrita do bilhete que havia lido
antes. Bem, a senhora fora rápida, ele precisava admitir. Era uma suposição fácil
adivinhar que Nicholas tinha recebido uma missiva semelhante.
Pegou o abridor de cartas com o brasão de sua família estampado na alça de
metal e girou-o entre os dedos.
Tudo bem, pensou com resignação feroz. Por que não comparecer, por que
não fazer o melhor para provar sua proeza sexual? No mínimo, teria uma
distração de seu estado atual de autopiedade apática, além de poder se divertir
com uma mulher calorosa e disposta.
Se ele fechasse os olhos, talvez pudesse fingir que estava fazendo amor com
Annabel.
Com essa estratégia, ele podia ganhar, no fim das contas.
O estabelecimento era pequeno, escondido em um bairro no extremo leste da
cidade, região que Caroline não tinha visitado antes. O desonroso exterior
a chocara a princípio, mas era perfeito para os seus propósitos: os poucos débeis
clientes da taverna úmida e esfumaçada prestaram-lhe pouca atenção. O
estalajadeiro levara-a a uma sala de estar que ficava a um passo do piso pegajoso
e das mesas bambas da área principal, e trouxe uma garrafa de vinho que sem
dúvida não era nada do que o imponente duque de Rothay e o lorde Manderville
estavam acostumados a beber, mas teria que servir.
Discrição era a ordem do dia.
As palmas das mãos dela estavam úmidas debaixo das luvas enquanto ela
afundava em uma cadeira, e o véu parecia sufocá-la. Caroline chegou cedo —
pois não tinha intenção de fazer uma grande entrada caso os dois homens já
estivessem ali — e tentou ignorar alguns tremores internos.
Bela sedutora sensual que você é, ela zombou de si mesma, nem um pouco
certa de que, mesmo que tivesse chegado tão longe, não quisesse sair correndo
da sala. As vigas enegrecidas no teto baixo pareciam muito próximas, e uma
risada estridente de algum cliente bêbado ecoou com clareza. O cheiro de
cerveja velha derramada pendia como um manto.
Eu deveria sair agora.
Não. Ela endureceu a coluna e ergueu o véu para tomar um gole rápido do
copo. Vivera até aquele momento a sufocante existência de uma mulher que
nunca se arriscava. Nunca tivera a oportunidade de fazê-lo. Era uma chance
imoral e escandalosa de realizar algo tão ousado e completamente fora de suas
características, que ela simplesmente não conseguia deixar passar. Uma
oportunidade para mudar o dano irrevogável causado à sua vida, se as coisas
funcionassem como esperava.
Isto é, a menos que o duque e o conde declinassem assim que percebessem
quem ela era. Supunha que isso era possível, mas, francamente, achava que era a
pessoa perfeita para resolver a disputa masculina absurda. Avaliara o fato mais
de uma vez.
Era uma viúva, então, eles não estariam roubando sua inocência.
Ela não queria nada deles, exceto a sensual promessa implícita na própria
natureza de sua aposta, o que pretendia deixar claro.
Era a última pessoa que a sociedade imaginaria que os ajudaria, então,
certamente isso poderia intrigá-los um pouco. A reputação de ser uma mulher
fria por si só deveria torná-los curiosos a seu respeito e aumentar o desejo de
provar suas ideias arrogantes a respeito de competência sexual.
Não deveria?
Pronto. Esses pontos seriam seu argumento.
Ela teria que argumentar? Com dois libertinos tão experientes, seu palpite era
de que tudo que eles exigissem fosse consentimento. Suas reputações já estavam
solidificadas.
— Minha senhora, você tem um convidado. — O estalajadeiro obsequioso
apareceu na porta irregular e então correu para longe, para ser substituído por
uma figura alta e sombria, um homem que parou por um segundo antes de entrar
com sua graça predatória habitual.
Rothay.
O lendário duque usava roupas de noite escuras, obviamente com a intenção
de ir a algum lugar muito mais elegante depois desse compromisso,
provavelmente o mesmo baile do qual ela iria participar mais tarde. Nicholas
Manning parecia, como sempre, urbano, sofisticado e um pouco arrogante.
Cabelos negros brilhantes com apenas um toque cacheado enfatizavam a
beleza esculpida de suas feições; sobrancelhas arqueadas, um nariz reto, a linha
da mandíbula e queixo limpos e apenas ligeiramente quadrado. Sua boca, infame
por aquele sorriso malicioso, curvou-se levemente ao ver seu rosto velado. Olhos
escuros examinaram seu traje em avaliação aberta, e ela podia ver o brilho de
curiosidade ali.
Ele estava tão bonito como sempre, tão imponente quanto cada sussurro, e o
sedutor levantar de sua boca era apenas parte de sua persona célebre. Seu olhar
inspecionou seu decote e o sorriso se alargou lentamente.
Bom, ele estava intrigado. Contanto que ela não perdesse a coragem e
recebesse as garantias de que precisava, essa barganha seria selada em breve.
Caroline disse com uma entonação deliberada:
— Boa noite, Sua Graça.
Algo brilhou em seus olhos, talvez uma percepção de que reconheceu sua
voz. Ele se curvou educadamente, o movimento fluido e natural. Quando se
reergueu, parecia que sua cabeça estava menos de trinta centímetros abaixo do
teto afundado.
— Boa noite.
— Vamos esperar pelo Senhor Manderville? Tomei a liberdade de pedir um
pouco de vinho. Por favor, sirva-se. Também pedi que não tenhamos um servo.
Pareceu... prudente.
Que escolha irônica de palavras. Nada sobre o que ela estava fazendo era
prudente.
— Claro. O que a senhora quiser. — Ele deu um olhar superficial ao pequeno
aposento e escolheu uma cadeira, acomodando-se em um suave movimento e
estendendo suas longas pernas. — Esta é uma excelente escolha para o nosso
pequeno encontro, com certeza. Acredito que não encontraremos alguém que
conhecemos neste lugar. Por favor, me diga que não veio aqui sem escolta.
Ele estava perfeitamente certo. A vizinhança era questionável, mas seu
motorista era um jovem corpulento, puro galês, grato por ter escapado do destino
de trabalhar nas minas como gerações de sua família e, portanto, firmemente
leal. Huw a guiara em segurança até lá dentro, e iria levá-la de volta para casa
com o mesmo cuidado. Ela balançou a cabeça, o véu movendo-se ligeiramente,
enquanto considerava aquela preocupação por sua segurança um pouco
inesperada.
— Eu não sou tola, Sua Graça.
— Eu nunca diria uma coisa dessas. Mas admito livremente estar mais
curioso sobre você. O que a levou a nos contatar, se me é permitido perguntar?
A garrafa de vinho estava na mesa junto com os copos, e ele chegou a tomar
um gole, mas ela tinha a sensação de que estava intensamente interessado em sua
resposta, apesar da aparente indiferença de seu gesto.
O que ele achava? Que ela era uma mulher desesperada e solitária, tão
carente de atenção masculina que se deitaria com dois homens só para ter um
pouco de carinho? Bem, provavelmente era algo lógico, ela supunha, mas não o
caso. Se quisesse companhia masculina, poderia encontrá-la facilmente. Mesmo
com sua reputação de ser uma mulher fria, cansara de afastar potenciais
pretendentes. Quanto à solidão, certamente preferia ser viúva do que esposa,
então, tudo vinha com um preço.
Pagou o suficiente e era por isso que estava ali. Sentia-se insatisfeita? Sim,
porque havia algo faltando em sua vida, como uma parte gritante de um quebra-
cabeça inacabado que arruinava a imagem. Encontrar aquela peça e encaixá-la
em seu espaço era importante. Afetava todo o seu futuro de todas as maneiras
concebíveis.
A paixão física era um mistério elusivo. Ela não via uma forma de
permanecer respeitável e resolver isto.
Exceto dessa forma.
Fora enganada pela inadequação de um casamento que não queria, e a
insensibilidade de seu marido no quarto era apenas parte disso. Agora que ele
partira, não havia nada que ela pudesse fazer sobre sua negligência de outras
maneiras, mas poderia descobrir se fora culpa sua que não gostasse de relações
conjugais, como Edward afirmara. Era uma suposição lógica que, se ela não se
satisfizesse nos braços dos dois amantes mais celebrados de Londres, a culpa
seria dela. Até onde sabia, era improvável que se envolvesse com qualquer
homem novamente. Ser uma amarga decepção para um marido já fora mais do
que suficiente. Não tinha certeza se sequer desejava um relacionamento íntimo
com qualquer homem novamente, mas queria a chance de fazer a escolha sem
que as garras de seu passado se apertassem em torno do seu presente.
— Eu suponho que seja natural para o senhor se perguntar sobre a minha
motivação em me oferecer para dar opinião sobre a sua competição não
convencional — disse ela sem inflexão, olhando, através do véu, para o homem
à sua frente. — Eu acho que está implícito na minha comunicação inicial.
As sobrancelhas de ébano se ergueram ligeiramente.
— Ah, sim, a implicação de que os amantes que teve até agora a
desapontaram. É uma pena que qualquer mulher se sinta assim.
A carícia de sua voz rica era tangível, como se ele realmente a alcançasse e a
tocasse. Havia algo no modo como se comportava também. Não podia estar
alheio ao fato de que sua aparência afetava as mulheres, mas não era a arma que
usava para conquistá-las. Não era de se admirar que se apaixonassem por ele
com a entrega de quem se atira de um penhasco, ela pensou, olhando-o através
da mesa gasta e lascada. Se ele personificava o pecado, era do tipo mais
delicioso. De alguma forma, cercado pelo ambiente insípido, seu poder era
potencializado.
Sobrepor-se à exibição de assoalhos estriados, paredes manchadas e uma
cadeira inadequada à sua altura impressionante enfatizava como ele era
masculino e aristocrático em todos os aspectos.
— Amante — ela corrigiu. — Não há plural.
E o que aconteceu em seu leito conjugal certamente não parecia ter nada a
ver com amor, então, ela não tinha certeza se o termo se aplicava. Mas a
compaixão não lhe interessava. Sua ajuda, sim.
— Apenas um homem? Entendo.
Apenas um. Certamente um conceito estranho para um homem como o duque
libertino, que contava dezenas de amantes em seu passado promíscuo.
Ele continuou com o mesmo sorriso conquistador e devastador:
— Não julgue a todos nós com muita severidade a partir dos fracassos de um
único exemplo de nosso gênero.
— Não deveria? — Seria bom se ela soasse como quem está flertando, mas
temia não conseguir.
— Na verdade, não. — Seu olhar mais uma vez voltou-se para o volume de
carne pálida acima de seu corpete. — Assim como toda mulher é única, imagino
que também sejamos todos diferentes. Por natureza, acho que os homens são
mais egoístas no geral. Sinto muito pela sua experiência anterior, mas, mais uma
vez, nem todos nós somos iguais.
Caroline sentiu o calor tentador dos olhos dele sobre ela como se tivesse
passado um dedo pela sua pele. Então, novamente, seu carisma não estava em
questão. Eles eram muito desiguais, mas ela não tinha intenção de deixá-lo saber
disso. Com equilíbrio frio, disse:
— Talvez o senhor tenha a chance de provar seu ponto de vista, Sua Graça.
— Eu tenho a impressão de que não vou ter objeções a isso, minha
misteriosa senhora.
Beber o vinho era impossível sem levantar o véu, então ela tocou a haste de
seu copo, hesitantemente, observando o homem do outro lado do mesa com
contemplação cautelosa.
— Desculpe, estou um pouco atrasado.
A chegada de Lorde Manderville a impediu de ter que dizer mais alguma
coisa. Ela não queria dar muitas pistas quanto à sua identidade até que ambos lhe
dessem a palavra de cavalheiros de que nunca a revelariam.
O conde entrou na sala e deu-lhe a mesma avaliação que seu amigo fizera,
um olhar que se prolongou por um momento no decote de seu vestido da moda e
terminou no pano que escondia suas feições. Um sorriso travesso revelava dentes
retos brancos.
— Eu vejo que estamos realmente jogando um jogo de intrigas aqui. É um
prazer conhecer-lhe.
— O senhor já me conhece — disse Caroline o mais calmamente possível.
Ter ambos na sala era um pouco desconcertante, ela descobriu. Os dois eram
muito altos e tinham aquele formidável ar de autoconfiança masculina que
parecia preencher o pequeno espaço. A boa aparência do louro Derek Drake lhe
valera o epíteto de O Anjo. Rothay, em contraste, foi batizado de uma maneira
debochada como o Duque Diabólico.
Eles formavam um par poderoso, embora dicotômico, o Anjo e o Diabo, e
ela sentiu o estômago revirar-se com uma tensão nervosa.
Aquilo dificilmente daria certo. Ali estava ela, corajosamente oferecendo-
lhes uma proposta sexual. Uma mulher que viajara para uma hospedaria obscura,
a fim de se encontrar com libertinos da estirpe dos dois homens em sua presença,
não deveria sucumbir a um ataque de nervos.
As costas de Derek se retesaram quando a resolução ressurgiu.
— Conheço a senhora? — Manderville aceitou o copo de vinho que o duque
lhe servia, com um aceno de agradecimento, o olhar ainda fixo no rosto dela, e
sentou-se em uma cadeira bamba, que gemeu em protesto.
— Os dois conhecem.
— Ah, achei que sua voz parecia culta e talvez familiar. Não podemos ser
conhecidos próximos, ou eu a teria reconhecido com mais certeza. Tenho bons
ouvidos para esse tipo de coisa. — Seu sorriso era tão angelical quanto o do
duque era maliciosamente atraente. Enquanto Nicholas Manning exalava um ar
quase perigoso de intensidade, o conde era de uma graça masculina preguiçosa e
despreocupada.
Tão diferentes, mas com a mesma oferta de um suposto paraíso em seus
braços.
Em seguida vinha a parte complicada. Caroline não podia culpá-los por
quererem saber quem ela era, nem por quererem contemplá-la antes de
concordarem com a proposta, mas tampouco removeria o véu antes que tivesse a
garantia de seu silêncio. Se não recebesse, iria embora imediatamente. Até
mesmo os mensageiros que contratara para entregar os bilhetes tiveram que
passar por um processo complicado para garantir que não houvesse uma conexão
direta entre ela e eles.
Isso deveria salvá-la, não destruir sua reputação.
Eles podiam ter fama de seduzirem e desaparecerem no dia seguinte,
dormindo com um bando de beldades da sociedade, mas ela nunca ouvira uma
palavra contra a honra deles em relação a qualquer outra coisa, então, estava
preparada para aceitar sua palavra. Com sua vasta riqueza, certamente Rothay
precisava administrar grandes propriedades financeiras com eficiência, e
Manderville também era um homem rico com as mesmas responsabilidades.
Eles ocupavam cadeiras na Câmara dos Lordes e eram ativos, se o que ela lia no
jornal fosse verdade. Era quase cômico ver os esforços de todas as mães
tentando chamar a atenção para suas filhas elegíveis, mas ambos supostamente
evitavam moças solteiras como se carregassem uma terrível doença.
Em suma, eram honrosos à sua maneira, ou ela certamente esperava que sim.
Estava prestes a arriscar sua reputação nessa suposição. O véu fora uma medida
de segurança, para o caso de se recusarem por qualquer motivo.
Caroline disse com firmeza:
— Antes mesmo de discutirmos essa situação incomum, preciso da sua
palavra solene de que meu nome nunca será ligado a isso de maneira alguma.
Mesmo que não cheguemos a um acordo esta noite, quero que ninguém saiba
que alguma vez sequer o considerei. — Sem pensar, ela citou baixinho: — A
cada palavra, uma reputação morre.
— Alexander Pope, eu acredito — disse o duque, parecendo divertido com
aquelas sobrancelhas elevadas. — Estou curioso demais para recusar. Não direi a
ninguém.
— Dou minha palavra sobre isso também. — Derek Drake acenou com a
cabeça loira, e seus olhos apenas se estreitaram um pouco, enquanto ele olhava
para o rosto protegido. — Seu segredo está seguro aqui.
— Muito bem. — Caroline levantou o chapéu e o véu e os colocou de lado,
alisando os cabelos com os dedos que tremiam levemente. Ela era a única
relaxada na sala quando viu o choque em ambos os rostos. A sala ficou em
silêncio.
Era um testemunho de sua reputação. Ela deveria ser friamente formal e
inatingível, não uma mulher que organizava reuniões em tavernas de má
reputação.
Quantas vezes, ela se perguntou, algum deles havia ficado sem palavras?
Raramente, se tivesse que adivinhar.
— Lady Wynn. — Foi Rothay quem se recuperou primeiro, mas, ainda
assim, ele a encarou, seu copo de vinho pendendo de seus dedos longos. — Eu
admito que estou surpreso.
Ela sentiu um pequeno sorriso nervoso contrair seus lábios.
— De um jeito bom, Sua Graça, ou de uma forma desagradável?
I sso sim era um desenvolvimento inesperado.
De todos os rostos que ele esperava ver por trás daquele véu, Caroline
Wynn não era um deles. Nicholas considerara demoradamente qual das damas de
seu conhecimento poderia contemplar a participação em sua pequena rivalidade
ultrajante, mas a mulher sentada do outro lado da mesa nunca lhe ocorreu.
No entanto, lá estava ela, com um leve arquear de uma de suas sobrancelhas
castanho-avermelhadas em uma expressão de surpresa, apenas uma sugestão de
diversão naqueles magníficos olhos prateados. O local decadente que escolhera
para o encontro provava que estava levando o assunto a sério, mas ele ainda
achava difícil acreditar que fora ela a responsável por aquele bilhete provocativo.
A bela jovem viúva do falecido lorde Wynn tinha a reputação de ser
indiferente a ponto de desencorajar até mesmo os mais determinados
pretendentes. Ele só a conhecia de passagem, mas, sim, ela estava certa, tanto ele
quanto Derek foram apresentados a ela em algum momento. Seu frio exterior
reservado enviava uma mensagem óbvia a qualquer homem predador de que não
estava interessada em um relacionamento, por isso, Nicholas apenas admirara
sua indiscutível beleza e descartara qualquer ideia de maior familiaridade. Além
disso, ela era mais jovem do que as senhoras sofisticadas que costumava levar
para a cama e ainda muito casável. Se não lhe falhava a memória, estivera
casada com o visconde durante vários anos antes que este morresse de repente, e
depois permanecera de luto por mais tempo do que o necessário, mas, ainda
assim, provavelmente estava com no máximo vinte e três anos, se não um pouco
mais nova.
Definitivamente, ainda casável. Além de exuberantemente atraente. Porém,
perigosa para qualquer homem que valorizasse sua independência.
Este era exatamente o seu caso. Talvez independência tivesse sido a escolha
errada da palavra. O que ele valorizava era um pouco mais complexo.
Nicholas sentiu-se um pouco alarmado. Procurou algo diplomático para
dizer.
— Minha senhora, você é muito adorável, é claro, então a surpresa não é
ruim, mas isso parece um pouco imprudente na sua situação.
Derek tinha a mesma expressão confusa no rosto. Nicholas só podia imaginar
os mesmos pensamentos percorrendo a mente de seu amigo em um ritmo
igualmente rápido. Derek disse:
— Er… eu concordo. Não tenho objeção, acredite em mim, mas a senhora
não deveria...
— Desperdiçar a minha virtude? — ela interrompeu, baixando
demoradamente seus longos cílios. Seus olhos eram realmente de uma cor
notável, não azul pálido, mas, na verdade, um cinza puro. O cabelo ruivo, rico e
brilhante, reluzia contra a pele pálida e impecável. Sua beleza impressionante fez
o quarto esquálido parecer ainda mais monótono, mais deplorável. Dedos finos
seguravam a haste de um copo de vinho. — Por favor, lembrem-se, senhores, eu
sou uma viúva. Minha virtude já foi desperdiçada.
Uma maneira interessante de descrever o casamento de alguém, Nicholas
não pôde deixar de pensar. Ele bebeu de seu próprio copo e tentou analisar como
se sentia sobre essa reviravolta na situação.
— Você é muito jovem. Provavelmente vai se casar novamente. Duvido que
seu futuro marido aprovasse seu envolvimento nessa pequena aposta.
— Sua Graça, não tenho intenção de me casar de novo. Eu não preciso, pois
sou autossuficiente financeiramente. E ainda que algum dia me case novamente,
não seria da conta de meu marido o que fiz ou com quem fiz alguma coisa, de
qualquer maneira. — Ela deu a ambos um olhar desafiador.
Até parece que não seria, Nicholas pensou, mas admirou a maneira como ela
ergueu o queixo e os desafiou a dizer o contrário. Eram dois pesos e duas
medidas, ele sabia disso.
Os homens gostavam de mulheres promíscuas, mas raramente se casavam
com elas.
Ela continuou em um tom razoável, como se eles não estivessem sentados
em um estabelecimento de mau gosto discutindo um encontro ilícito planejado
com base em uma aposta de bêbados.
— Desde que fiquei viúva, tenho mais liberdade. Ninguém jamais pensaria
que eu faria uma coisa dessas, de qualquer maneira.
— Eu não pensaria — Nicholas concordou ironicamente, especulando sobre
o quão ineficaz seu falecido marido devia ter sido no desempenho de seu dever
marital. Ele conhecia o ex-lorde Wynn apenas de passagem, e este parecia
bastante agradável como um conhecido. Mas, novamente, como os homens
tratavam seus amigos casuais e como consideravam suas esposas eram
frequentemente dois assuntos diferentes.
— Talvez o senhor realmente não saiba nada sobre mim, Sua Graça.
Ela poderia ter a aparência deliciosa de uma Vênus encarnada, mas nunca lhe
ocorrera que a sensualidade pudesse ferver sob aquele exterior tentador. Diziam
as más línguas que as montanhas de gelo do Norte eram mais calorosas que Lady
Wynn.
— Eu admito que não. — Seu olhar sustentou o dela.
Seus olhos singulares refletiam um lampejo de incerteza enquanto olhavam
um para o outro, e o momento durou por um longo instante. E depois outro.
Ah, sim, ele estava intrigado.
— Obrigado por reconhecer isso — disse ela sem qualquer inflexão.
Mas aqueles olhos expressivos eram algo completamente diferente. Ele sabia
quando afetava uma mulher, e aquela parecia ser uma daquelas situações.
Com a reservada Lady Wynn? Isto era incrivelmente interessante.
Derek interveio:
— Se decidirmos nunca revelar sua identidade, minha senhora, me explique
como vai resolver a aposta.
Ela deu um pequeno aceno de cabeça, como se esperasse a pergunta.
— Tenho tudo pensado. Com o seu apoio, publicarei os resultados na coluna
da sociedade do jornal, sob o manto do anonimato, é claro. Já que meu nome
será deixado de fora, ficarei à vontade escrevendo meus pensamentos francos.
Essa declaração foi o suficiente para evocar o mesmo espírito de
combatividade que os colocou em apuros em um primeiro momento, mas já que
Derek não piscou um único olho, Nicholas também conseguiu parecer
indiferente.
— Tudo bem — disseram em uníssono e depois olharam um para o outro
com aborrecimento mútuo. Ela riu com espontaneidade deliciosa, iluminando
seu rosto já muito adorável e adicionando animação àqueles olhos assombrosos.
Diabos, ela era uma perspectiva muito tentadora. Se eles realmente iriam
passar por isso, Lady Wynn era uma candidata cativante. Era opinião comum
que ela tinha uma verdadeira beleza, com aquele cabelo pesado e lustroso
emoldurando um rosto delicado com maçãs do rosto altas, um nariz pequeno e
reto, uma boca rosada e macia e seus olhos incomuns, de cílios longos e largos.
O fato de ela ser de uma graciosidade esbelta e ter um corpo curvilíneo e esguio,
era algo que muitos homens notavam e comentavam. A plenitude de seus seios
sob o corpete de seu vestido elegante atraiu o olhar de Nicholas.
Derek aparentemente não era cego também. Seu amigo murmurou:
— Você parece ter decidido, Lady Wynn.
— Isso depende. — Ela ajustou uma dobra de sua saia de seda esmeralda, e
aquela cor de vestido tornava-se um complemento à sua coloração vívida. —
Como poderíamos fazer isso funcionar? Teremos que ser extremamente
discretos.
Ela realmente era sincera, Nicholas decidiu, e sua resistência inicial à ideia
desapareceu.
E ele estava muito interessado.
Já fazia um tempo desde se sentira desta forma, mas Lady Wynn era uma
jovem fascinante. Como sua personalidade sempre fora distante e fria, algo que
jamais procurara em uma amante, nunca a considerara em nenhum contexto,
especialmente o que estavam discutindo atualmente. Ele falou sem pensar.
— Dê-nos a cada um uma semana do seu tempo.
Derek se virou para olhá-lo, com um lampejo de surpresa nos olhos pelo
período sugerido.
Uma semana?
De onde vinha a sugestão impulsiva, Nicholas não tinha certeza, mas sentia
que uma noite com a bela mulher sentada à sua frente não seria suficiente. O
mistério do porquê de ela ter feito algo tão inesperado mexia com ele e o atraía
ainda mais.
Nicholas deu de ombros e sorriu.
— Tenho certeza de que você concordará que fazer amor é um mundo vasto.
Conhecer o seu parceiro também é benéfico. Uma semana na companhia um do
outro, dentro e fora da cama, parece lógico para uma conclusão justa.
O que quer que Lady Wynn esperasse, obviamente não era aquilo. Ela
pareceu desconcertada por um momento, mas depois assentiu devagar. Um
cacho solto de seus cabelos acobreados roçou a coluna de marfim de seu pescoço
e ele observou-o deslizar ao longo de sua pele macia com uma fascinação quase
involuntária. Ela disse:
— Suponho que, se cheguei até aqui, posso concordar com isso. Vou dar uma
desculpa para desaparecer por esse tempo todo.
Excelente.
Uma explosão de uma pequena briga entre alguns dos clientes extremamente
questionáveis na taverna ecoou pela sala, junto com algumas palavras ásperas
que não eram para os ouvidos de uma senhora, mas ela sequer piscou.
Sim, seu porte era notável.
— Eu tenho uma pequena propriedade rural em Essex. — Nicholas tentou se
lembrar da última vez em que estivera lá e falhou. Quando se retirava para o
campo, ia para a sede familiar muito maior em Kent. A propriedade menor era
parte de sua herança e ficava vazia, a não ser pela equipe mínima para mantê-la.
— Fica na zona rural, longe de qualquer cidade em particular, mas bastante
bonita e tranquila, se bem me lembro, e perto o suficiente de Londres, não
teríamos que viajar por dias. Deve ser perfeito para um retiro discreto.
Uma semana com uma mulher que ele nem conhecia era mais do que
impulsivo, era absolutamente irracional. Normalmente, uma noite aqui e ali era
demais, em seu distanciamento lendário, porque suas relações transitórias não
exigiam nada além de diversão passageira. Ele não mantinha uma amante,
porque não precisava de uma. A maioria das damas costumava entediá-lo em
prazo muito curto e ele dava como certo que se desejasse companhia feminina,
poderia tê-la sempre que quisesse.
No entanto, uma voz insidiosa sussurrou em sua cabeça, dizendo que o status
inexperiente de Lady Wynn na arte do prazer sexual a tornava mais cativante do
que a maioria. Ele não estava interessado em deflorar uma virgem, mas ela não
era uma, e sua beleza deslumbrante e feminilidade delicada anulavam seu senso
de cautela sobre o conhecimento de que ela ainda era jovem e muito desejável no
mercado de casamentos.
Ela afirmara claramente que não queria se casar novamente, e ele acreditou,
pois a convicção em seu tom inconfundível.
Uma semana para iniciá-la nos prazeres da carne parecia uma distração
bastante agradável de sua agenda lotada. O Parlamento estava em recesso, e ele
poderia deixar seu administrador ciente de como encontrá-lo, caso fosse
necessário...
Sim, ele pensou, estudando a sensual plenitude de seu lábio inferior, a
ondulação da carne marfim acima do corpete de seu vestido de noite decotado, a
cor tênue em suas bochechas enquanto corava com sua avaliação evidente. Uma
semana provavelmente seria fácil. O suficiente para manter-se em sua
companhia.
Ela corou. Que notável. Palavras grosseiras não tinham o mesmo efeito de
um olhar.
— Nós estamos de acordo? — Ele colocou de lado seu copo de vinho e
levantou uma sobrancelha em questionamento.
— Suponho que posso encontrar um lugar semelhante. — Derek assentiu.
Ele relaxou em sua cadeira, também olhando para sua bela companheira, como
se a aprovasse por inteiro. — Desde que Lady Wynn entenda as implicações do
que aconteceria com sua reputação, caso sejamos descobertos. Nenhum de nós
jamais dirá uma palavra, mas a tentativa de discrição não é infalível.
Caroline Wynn desviou o olhar por um momento, e sua boca se contraiu.
Então ela olhou para eles novamente e endireitou os ombros delgados.
— Naturalmente, não estou ansiosa por um escândalo, mas se acontecer, será
de minha própria responsabilidade e espero que o risco se prove… Bem, espero
que valha a pena.
Lá estava um tom de desafio, se ele não estava enganado.
Nicholas sorriu preguiçosamente.
— Vai valer, minha senhora.
Ela não sorriu de volta, mas simplesmente olhou para ele com aqueles olhos
notáveis, a única traição de qualquer emoção era demonstrada no leve tremor de
seus lábios.
— Você parece muito confiante, Sua Graça.
Parecia? Talvez, mas esta confiança era alimentada pelo pouco que sabia
sobre ela. Talvez tivesse sido por isso que sugerira uma semana inteira. Ela era
um enigma em um mundo que ele considerava muito previsível.
— Nós dois estamos, tenho certeza, ou não teríamos feito a aposta em
primeiro lugar, não é verdade?
— Eu acredito que isso esteja resolvido, então — disse ela, ficando de pé. —
Sinta-se à vontade para entrar em contato comigo com as especificidades dos
arranjos. Podemos nos comunicar da mesma maneira de antes. Envie o bilhete
para o mesmo endereço, que chegará até mim. — Nicholas e Derek se
levantaram educadamente. — Meu motorista está na taverna, esperando. Ele vai
me acompanhar.
Nicholas sentiu um arremedo de protesto avolumar-se, preocupado com a
multidão rude no outro cômodo.
— Eu vou acompanhá-la até a carruagem.
— Não, obrigada, Sua Graça. Mesmo aqui, prefiro não ser vista com o
senhor.
Aquela declaração calma e contida deixou-o em silêncio. Durante a maior
parte de sua vida adulta, ele esteve cercado por mulheres mais do que ansiosas
por serem vistas em seus braços. Isso era novo. O incômodo provocado o
surpreendeu um pouco. Por que ele se importaria, de um jeito ou de outro? Ela
pegou o chapéu e colocou-o, ajustou o véu sobre o rosto e partiu em um
redemoinho de verde esmeralda e um toque delicado de perfume floral.
— U ma festa tão linda, você não concorda, meu senhor?
Distraidamente, Derek Drake olhou para a mulher em seus braços. Bom
Deus, por um momento ele não conseguiu lembrar o nome dela. Muito
perturbador!
Amelia. Sim, irmã de um amigo, e era por isso que estava dançando com ela
em primeiro lugar. Horace a empurrara para ele, que concordou em levá-la para
o salão, principalmente porque se alguém comparecia a um baile, deveria pelo
menos fingir que estava se divertindo.
Não era o caso de Derek, mas, novamente, ele também não esperava divertir-
se.
O que ele queria não tinha nada a ver com entretenimento. Seus motivos
eram mais parecidos com autoflagelação.
Isso era muito produtivo, ele pensou em auto zombaria, enquanto rodopiava
pelo salão. Sua parceira era muito baixa, e como Derek era um homem alto,
acreditava que parecessem um pouco ridículos juntos. Em voz alta, ele disse:
— Sim, adorável.
Esse tipo de conversa banal certamente lhe renderia a incrível fama de ser
um amante maravilhoso, não é verdade? Para sua sorte, Amélia pareceu achar
sua resposta gratificante, pois sorriu como se ele tivesse dito algo inteligente.
— Bastante.
Como prosseguiria com a conversa? Nada parecia se encaixar. Sua famosa
língua ferina estava revestida de chumbo esta noite. Ele sentiu imensa gratidão
quando a música terminou e ele a conduziu para fora do salão, curvando-se sobre
a mão arredondada e fugindo em seguida.
O baile era um desastre anunciado, Derek pensou enquanto atravessava a
multidão. A sala estava abarrotada de pessoas, as janelas abertas proporcionando
um pouco de alívio ao calor. O murmúrio de vozes rivalizava com a orquestra
por proeminência. Felizmente, graças à sua altura, foi possível manter seu
objetivo à vista. Finalmente chegou a Nicholas. Seu amigo estava encostado em
um pilar de estilo grego e bebia champanhe.
Sem preâmbulo, Derek disse:
— Uma semana? Você está louco, Nick?
Eles estavam cercados de pessoas, mas entre a música e a ressonância de
centenas de vozes, a conversa era relativamente privada, como se estivessem
isolados em algum lugar. O duque de Rothay lançou-lhe um dos seus
indecifráveis olhares pelos quais era tão bem conhecido.
— Parece razoável.
Derek bufou com escárnio deselegante.
— Você nunca passou em sua vida uma quantidade de tempo similar a essa
com uma mulher, além de, talvez, sua mãe.
A duquesa viúva era uma figura formidável, apesar do fato de que mal
chegava ao ombro do filho. Uma beleza de renome no seu tempo, ela ainda
exercia uma grande quantidade de poder social em todos os círculos certos. Sua
desaprovação à abordagem desapegada de seu filho a qualquer jovem casadoura
era de conhecimento público.
Nicholas riu, divertindo-se abertamente com a referência.
— E nem mesmo ela, uma vez que passei a ter idade suficiente para evitá-la.
Eu gosto da minha mãe, mas pensar em uma semana com seus conselhos
constantes me faz estremecer.
— Por isso fiquei surpreso com sua sugestão. Você não conhece Lady Wynn.
— Para Derek, era muito mais fácil se concentrar na aposta frívola do que em
seu próprio estado miserável.
— Está me dizendo que se oporia a ter alguém tão adorável em sua cama por
tanto tempo?
— Ela é muito bonita. — Derek obliquamente não respondeu à pergunta,
olhando para onde Caroline Wynn estava sentada em um canto, com várias
senhoras mais velhas, como de costume, parecendo remota e inacessível. Ela
raramente aceitava um convite para dançar, mas os homens ainda tentavam.
Mesmo à distância, a pálida perfeição de sua pele em constraste a cor brilhante
de seu cabelo ruivo era impressionante. Ela tinha uma beleza inteiramente
feminina, e ele deveria estar ansioso pela a perspectiva de se deitar com ela.
Por que não estava?
— Eu não sou mais propenso a complicações duradouras do que você —
comentou Derek em tom de voz baixa.
Exceto uma vez. Ele poderia estar propenso a um determinado compromisso
a longo prazo, mas arruinara tudo.
Foi uma atitude idiota, mas ele examinou a sala com um olhar inquieto e
perscrutador.
E a encontrou.
Claro que Annabel estaria lá, droga! Derek vislumbrou na multidão de
cabelos e corpos bem vestidos um certo tom de ouro, um lampejo de perfil de
porcelana que ele conhecia tão bem quanto conhecia seu próprio rosto, e seu
peito se apertou.
Bem, ele lembrou a si mesmo com o máximo de distanciamento pragmático
possível, você esperava vê-la. Não era surpresa que a protegida de seu tio
estivesse presente. Metade de Londres estava espremida naquele salão de baile.
Era natural que Annabel comparecesse, e não era muito difícil presumir que ela
surgiria de braços dados com seu noivo.
Maldito fosse aquele homem.
— Como vamos decidir quem terá o privilégio de tê-la primeiro?
A pergunta de Nicholas trouxe sua atenção de volta ao assunto em questão e
Derek se forçou a desviar o olhar. Uma vez que a mera visão de Annabel beirava
a tortura, naquele momento, concentrar-se em outra coisa tinha seu mérito. Um
interlúdio apaixonado com a deliciosa Lady Wynn, por exemplo. Já havia
perdido Annabel. Precisava se transformar em monge por causa disso?
Não, claro que não.
Ainda assim, ele se protegeu.
— Suponho que depende de quão rápido a dama pode se ausentar. Minha
programação na próxima semana inclui vários compromissos que não posso
perder e, além disso, preciso encontrar um local isolado semelhante ao seu.
— Eu acho que posso resolver as coisas para partir em um dia ou dois.
Vamos dizer que está resolvido? — Eles eram amigos há muito tempo. Uma
década, desde que se conheceram em Cambridge em seu primeiro ano na
universidade, e havia uma nota desconhecida na voz de Nick. Derek relembrou a
versão mais jovem do duque de Rothay, ainda sofrendo por sua malfadada
primeira incursão no que percebia como amor, determinado de uma forma que só
Nicholas poderia ficar para evitar a experiência. Derek gesticulou a um criado
que passava, tirou um copo da bandeja e lançou a seu companheiro um olhar
divertido.
— Ela o intriga.
— Um pouco.
Já era hora, com todas as mulheres que tinham ido e voltado da vida de
Nicholas, que alguém o fizesse.
Derek riu.
— Muito. Talvez você possa enganar outra pessoa, mas não a mim.
— Ela é muito atraente.
— Isso é verdade, mas todas as mulheres com quem se enredou eram lindas.
— Eu gostaria que você não usasse o termo enredar. Isso me faz pensar na
armadilha de um caçador ilegal e em um animal ferido.
Na avaliação de Derek, essa era uma descrição adequada. Só Deus sabia que
ele se sentia dolorosamente pressionado contra uma limitação de vocabulário por
muito menos do que isso. Com inflexão neutra, respondeu:
— Justo. Diga-me como você chamaria.
— Escapadas luxuriosas — Nicholas forneceu a frase com um sorriso que
mitigou a feição séria.
— Eu suponho que se encaixa. Mas desde que nossa adorável juíza
obviamente não esteja tentando prendê-lo, pelo menos você pode relaxar e
satisfazer seu interesse.
— Talvez. — Rothay tomou um gole de seu copo e parecia sem graça. — Ela
não o intriga? — Com mil demônios, Annabel e Hyatt estavam no salão agora,
rodopiando entre os dançarinos ao som de uma música popular. Seu rosto estava
corado como uma rosa, a luz brilhando em seu cabelo pálido, e em um vestido
de seda cor de rosa ela parecia... Arrebatadora. Cativante. Tão bonita que o peito
dele doía. Hyatt também parecia feliz e, infelizmente, embora não fosse
particularmente bom em julgar a aparência de outros homens, Derek sabia que o
homem era considerado atraente pelas mulheres.
Sem dúvidas não era um pensamento encorajador, mas ele de fato não
conseguia se lembrar de já ter estado tão desanimado em sua vida, de qualquer
maneira.
— Derek?
Oh, inferno, ele fez uma pergunta, não foi? Removido abruptamente de sua
abstração, Derek se virou.
— Eu sinto muito.
Nicholas deve ter notado algo estranho em seus modos, mas felizmente não
mencionou isso.
— Acabei de perguntar se a nossa inesperada voluntária o intrigou.
— Claro — Derek respondeu rápido demais e tomou um gole de champanhe
para cobrir o erro.
Nicholas, precisava se lembrar, não era facilmente enganado. Os olhos
escuros estreitaram-se ligeiramente enquanto o observavam.
O único consolo era que eles tinham uma regra não oficial, mas inviolável
entre eles: nada de perguntas intrusivas. Um acordo de cavalheiros entre dois
homens que respeitavam a privacidade um do outro.
O acordo foi respeitado mais uma vez. Depois de um momento, Nicholas
apenas disse:
— Então você não se importa que eu a tenha primeiro.
Tê-la. Muito apropriado. Uma risada ficou presa em sua garganta.
Derek realmente precisava recuperar a compostura. O champanhe podia estar
quente demais, mas funcionou, pois tomou outro gole e conseguiu esboçar o que
esperava que parecesse um sorriso fácil.
— Não. Eu tenho certeza de que você vai se sair muito bem também. Mas
lembre-se, é de mim que ela vai lembrar.
— Sinta-se livre para pensar assim, Manderville. Eu planejo deixar uma
impressão indelével agora que nós três temos um acordo. Duvido que teria
escolhido a moça em questão, mas já que ela deu um passo à frente, estou...
ansioso.
Era curioso, pois o duque de Rothay sempre a epítome da sedução
descuidada. A impaciência era mais do que incomum.
— A situação certamente tomou um rumo que não esperávamos, não foi? —
perguntou Derek, mas como sabia que sua ânsia era temperada por sua atual
infelicidade pessoal, era difícil dizer se Nicholas estava mais interessado do que
o esperado na oferta incomum de Lady Wynn de participar ou se Derek sentia-se
tão desequilibrado que isso estava afetando seu julgamento. Como alguém que
não conseguia discernir seus próprios sentimentos, talvez ele não devesse
presumir entender os de outras pessoas.
Se Nicholas ficou tão entusiasmado em acompanhar a moça para a reclusão
no campo, que ele a levasse para lá imediatamente e exercesse seu infame
encanto ao seduzi-la. No momento, o coração de Derek simplesmente não estava
voltado para isso.
Ele disse em um tom ocioso:
— Avise-me quando vocês dois voltarem para a cidade.
A S RA . H AROLDSON INCLINOU - SE PARA FRENTE COM UM AR CONSPIRATÓRIO
definido, seu considerável busto fazendo parecer que ela poderia cair no chão.
— Não é — ela disse em um sussurro sibilante — algo com que uma pessoa
deveria se surpreender, eu suponho.
Caroline se esforçou para parecer reservada e fria quando, na verdade, o
salão lotado estava insuportavelmente abafado. Um fio de suor correu de
maneira deselegante entre seus seios.
— Surpreender com o quê?
— A maneira como Sua Graça e o conde estão conversando sobre isso,
orgulhosos como pavões, os dois.
Eles estavam discutindo a aposta? Pareciam, ao menos, absortos na conversa.
Como não se passou mais de uma hora ou duas desde que os três deixaram a
hospedaria, era provável que pudessem estar falando sobre isso.
Sobre ela.
Ela tinha feito isso. Ofereceu-se a dois patifes desonrosos, concordou com
uma aposta perversa que a arruinaria aos olhos de toda a sociedade, se fosse
descoberta, e a colocaria diretamente no caminho da desgraça e do escândalo.
Tudo por uma boa causa, uma pequena voz interior lembrou a ela com
inabalável praticidade.
Sua sanidade.
Sua vida, na verdade, se ela quisesse ser melodramática a respeito.
— Tenho certeza de que eles conversam com frequência. Eu os vi. — Ela
fingiu seu melhor tom desdenhoso, lançando um olhar desinteressado para os
dois homens altos do outro lado da sala. — Eles não são amigos?
— Com certeza, Lady Wynn, você já ouviu falar sobre a mais recente
aventura deles.
— Você quer dizer aquela tediosa aposta?
Deus do céu, estava quente e não ajudava em nada ter uma falange de
mulheres mais velhas e matronas por todo lado, encurralando-a figurativamente.
Precisou reprimir a vontade de pular e sair correndo da sala como se todos os
diabos do inferno estivessem em seus calcanhares.
Um diabo de cabelos escuros em particular, equilibrado por um anjo
dourado.
Debaixo da sombra de seus cílios, ela os observou, finalmente recebendo
permissão, pelo curso da conversa, de fazer o que queria desde que chegara.
Nicholas Manning, tão gloriosamente atraente, com o cabelo de alguma forma
conseguindo parecer elegante e ao mesmo tempo um pouco desgrenhado e suas
roupas de noite adaptadas à sua compleição masculina. Manderville também,
como um deus grego, era tão bonito que parecia aquecer a sala com sua
presença, seus brilhos mútuos fazendo deles o centro das atenções com ou sem
sua infâmia atual.
— Sim, na verdade a aposta. É mais do que desnecessária, você não
concorda?
Oito pares de olhos se fixaram nela. O círculo das viúvas, a maioria delas
pelo menos duas décadas mais velhas do que Caroline, era seu bastião atual
contra qualquer homem que se aproximasse. Era seguro se acomodar em um
canto com elas em vez de aceitar qualquer oferta de dança ou, ainda menos
atraente, desfrutar de um flerte.
Ela não tinha a menor ideia de como fazer o último.
Caroline murmurou:
— Tenho certeza de que minha opinião não importaria para nenhum deles.
Sua impertinência mútua é lendária. Acho o assunto totalmente desagradável.
— Bem dito. — A condessa viúva Langtry assentiu em concordância.
— Está além dos limites, sem dúvida. Você está certa.
Outras vozes murmuraram, todas concordando com ela. Mas, por mais que o
grupo pudesse protestar contra o comportamento dos dois senhores em questão,
elas certamente não pareciam ter muita dificuldade em observá-los de longe.
Ela era, é claro, a inalcançável e distante Lady Wynn. Era natural que
desprezasse uma conversa sobre algo tão discordante com sua própria existência
plácida e reclusa.
Se elas soubessem a verdade...
Deus me livre, ela pensou com um pequeno estremecimento.
No final das contas, não conseguia mais fingir que o tópico do belo duque
era monótono e a entediava. Desculpou-se e saiu para os jardins atrás da
imponente mansão, respirando fundo como se isso pudesse curá-la e consertar
todas as coisas quebradas em sua vida.
Não, só ela poderia fazer isso.
Havia alguns outros convidados no terraço, então ela se esgueirou para onde
os canteiros e arbustos formais estavam dispostos. Vagando por um caminho
escuro, sob um punhado de estrelas acima de um cobertor de diamantes no céu
noturno, ela tentou avaliar suas emoções agora agitadas.
Isso era realmente algo que ela poderia fazer? Uma atribuição secreta para
liquidar uma aposta feita entre dois senhores que admitiram estar sob a
influência de uma grande quantidade de vinho na época?
Seu rosto se aqueceu e ela ficou grata por não haver ninguém para
testemunhar. A avaliação masculina descarada que o duque lhe reservara na
hospedaria não era algo pelo qual não tivesse passado antes, mas sua própria
reação foi muito inesperada.
Geralmente ela se sentia infundida por uma indesejável mistura de
constrangimento e trepidação.
Por alguma razão, ele não a afetara dessa maneira. Talvez sua parte na aposta
tivesse definido a dinâmica de sua interação desde o começo. A reunião fora uma
escolha sua. Que conceito novo, ter uma escolha.
Sua saia roçou nas folhas lustrosas de algum arbusto conforme ela passava, e
uma flor branca espalhou pétalas sobre o tecido em uma enxurrada, como uma
explosão em uma tempestade de neve. A fragrância era doce, inocente e
sedutora. Ela as afastou distraidamente, virando o rosto na direção de uma brisa
muito bem-vinda.
Pelo menos seus pretensos amantes pareciam capazes de honrar seu pedido
para manter sua identidade em segredo. Nenhum deles tinha sequer olhado para
ela no decorrer da noite.
Isso vai funcionar, ela se assegurou.
E rezou para que fosse verdade.
N inguém em Londres tinha outra coisa para conversar a não ser aquela
aposta infernal? A xícara tremulou no pires quando ela a colocou de lado e
uma pequena porção de chá derramou sobre a borda. Annabel Reid rangeu os
dentes e esperou que ninguém notasse, fazendo o seu melhor para parecer o mais
composta possível.
Parte da atual onda de interesse surgira, ela sabia, pelo aparecimento de
ambas as partes envolvidas no baile de Branscum na noite anterior. Eles ficaram
conversando por um bom tempo e, como de costume, aparentemente indiferentes
aos sussurros crescentes. Juntos, eram como sempre impressionantes; o duque
com sua boa aparência sombria e impressionante, além do ar natural de poder
que emanava dele tão facilmente, e Derek Drake, a quem ela conhecia desde que
podia andar, com sua devastadora beleza e charme sem esforço.
Só que ela não ficava encantada.
Ele poderia ser esmagadoramente atraente em todos os sentidos que um
homem podia ser, mas ela o odiava. Aquele sorriso fácil e ar de superioridade
apenas encobriam as falhas sob a superfície.
Sim, ela o desprezava.
Profundamente.
Completamente.
— Sinto muito, minha querida senhorita Reid, mas você não é parente de
Manderville?
Annabel olhou para cima, percebendo com pesar que o assunto era com ela.
Um grupo de oito senhoras a olhava com expectativa, entre elas sua futura sogra.
O resto eram tias e primas de Alfred. Limpou a garganta, inexplicavelmente
horrorizada com a pergunta.
— Não, não. De modo algum. Seu tio é meu guardião. Esta é a extensão do
parentesco.
Era a verdade. Não havia laços de sangue. Thomas Drake e seu pai tinham
sido amigos íntimos por toda a vida, e este vínculo fora profundo o suficiente
para que providências fossem tomadas para no caso de o pior acontecer — e
acontecera —, que seu cuidado fosse confiado a seu velho amigo. Ela ficara
completamente desnorteada quando, aos oito anos, seus pais morreram em um
acidente de barco. Mas não importavam seus pensamentos sobre o infame
sobrinho dele, Derek, porque Sir Thomas era um homem maravilhoso, e ele e
sua esposa Margaret a tinham tratado como sua própria filha. De certa forma,
uma vez que nunca foram capazes de terem seus próprios filhos, Annabel se
perguntou se ela não fora uma bênção para eles como eram para ela. De qualquer
forma, embora amasse Thomas e Margaret, Derek era outra história
completamente diferente.
— Mas você cresceu na propriedade da família, correto? — Lady Henderson
a olhou com discreta curiosidade.
— Eu… bem… sim, eu cresci. Em... Berkshire.
Por que ela gaguejou a resposta, especialmente com tantas pessoas a
olhando? O assunto indesejado era a última coisa que queria discutir. Detestava
fofoca. Se toda a questão escandalosa fosse esquecida, ficaria mais do que feliz.
Estava sentada na sala de visitas da casa de Londres de seu noivo, toda
mobiliada de maneira formal e cheia demais para o seu gosto, e isso já era ruim
o bastante sem relembrar um assunto tão desconfortável.
Annabel gostava de livros e solidão muito mais do que reuniões
extravagantes. Uma boa cópia de Voltaire e um assento ensolarado sob a janela
eram mais do seu gosto do que a situação atual.
— Eu imagino que você o encontrasse com bastante frequência. — Os olhos
pálidos de Lady Henderson continham curiosidade maliciosa.
Todas olharam para ela com expectativa. Claro, porque estavam falando
sobre Derek Drake e quando seu nome era mencionado em uma sala cheia de
mulheres ele não passava despercebido.
Maldito fosse.
Sim, era um pouco irritante saber que ele realmente possuía a casa que ela
considerava como seu lar. Seu guardião era o irmão mais novo do conde
falecido, pai de Derek. Sobre esse assunto, ela tinha a desconfortável impressão
de que fora Derek a fornecer seu dote. Quando Annabel perguntou a Margaret
abertamente, ela foi evasiva sobre o assunto e Margaret não era de mentir, então
isso fora resposta suficiente. Thomas ia bem financeiramente, mas Derek detinha
a verdadeira riqueza da família.
Isso era uma ironia. O homem que ela amara no passado dando dinheiro
como um incentivo para outro homem se casar com ela.
— Ele é uma década mais velho — Annabel apontou —, então não o via
com tanta frequência. Quando eu tinha oito anos, ele foi para Cambridge e
parece preferir Londres a Berkshire. Nós raramente o vemos. Mesmo quando
estamos na cidade, ele tem sua própria casa.
Outra dama, ela tinha quase certeza de que seu noivo a chamara de tia Ida,
murmurou:
— Eu posso adivinhar o porquê. Londres é muito mais… habitada.
O que significava mais mulheres disponíveis. A implicação era clara, e
embora a última coisa que ela quisesse fazer fosse defender um libertino sem
esperança como o conde de Manderville, Annabel inexplicavelmente o fez.
— Ele na verdade tem muitos interesses comerciais e é mais fácil ter acesso
a seus advogados e administradores enquanto estiver na cidade. Manderville
Hall é um inconveniente. Ele é um homem ocupado.
— Eu acho que sim. — Uma mulher diferente, magra e com o cabelo
estranhamente escuro para a idade, deu uma risada aguda. — Embora duvide que
os negócios sejam a primeira coisa em mente. No entanto, é fácil perdoá-lo por
suas indiscrições, já que é um jovem tão bonito.
— Mais do que Rothay? — alguém perguntou.
— Impossível — outra protestou.
Sim, o coração traidor de Annabel respondeu. Mais do que qualquer homem
vivo.
Ela o adorara quando era criança. Com seu sorriso travesso e humor fácil, ele
fora um herói para uma garota que de repente ficou órfã. Em retrospecto,
reconhecia sua gentileza em suportá-la, uma vez que o seguia por toda parte.
Que um jovem de dezoito anos tivesse tido tempo para dar um pônei a uma
criança e ensiná-la a cavalgar era um ponto a seu favor, mas ainda assim... o
homem era um patife desprezível. A aparência angelical que a natureza lhe
conferira era o pior tipo possível de fraude. Ele deveria ter vários chifres e um
rabo bifurcado para combinar com seus olhos hipnotizantes e aquelas feições
bem esculpidas.
— Como na terra alguém poderia decidir qual deles é mais bonito? — Uma
das primas de Alfred riu, seu rosto jovem mostrando um leve rubor. — Ambos
são divinos.
— Silêncio, Eugenia — sua mãe disse em reprovação.
— Ele está sempre cercado por escândalos — disse a tia magra novamente,
mas havia um brilho malicioso em seus olhos. — Não foi há alguns meses que
Lorde Tanner ameaçou nomear Manderville em seu processo de divórcio contra
a esposa por motivos de adultério?
Precisamente quatro meses desde que o rumor desagradável emergiu, mas
Annabel não fez absolutamente nenhum comentário, sentindo-se mal toda vez
que pensava sobre o assunto. Era melhor manter seus sentimentos pelo conde
imoral em segredo, para não ter que explicar o motivo de sua intensa antipatia.
Não achava possível, mas a acusação pública de que Derek participara do
término de um casamento fizera com que sua opinião sobre ele despencasse
ainda mais.
— E agora essa competição indecente. Embora seja indelicado pensar nisso,
é preciso imaginar como eles vão resolver sua pequena disputa. — A matrona
Ida, que acabara de declarar o assunto como sendo indelicado, certamente
parecia determinada a discuti-lo.
— Ouvi dizer que a atriz russa, que interpretou Ophelia tão bem, mesmo
com seu sotaque terrível, vai declarar o vencedor. — Lady Henderson, que não
precisava aumentar a circunferência de sua cintura já ampla, arrancou outro doce
do carrinho.
— Mesmo? Bem, eu ouvi...
Annabel bloqueou os sons da conversa concentrando-se nisso com
desespero. Seus esforços foram ineficazes, e ela provavelmente passou a imagem
de estar entediada e excessivamente quieta, mas conseguiu decidir que roupa
usaria mais tarde naquela noite.
Então a tarde não foi uma perda completa de tempo.
Depois que o interminável chá terminou, ela ficou grata por ser entregue à
carruagem que a aguardava. Logo estaria casada e sua associação com Derek
Drake seria cortada de uma vez por todas. Bem, não completamente, porque sua
tia e tio o tinham em alta conta, e considerava Thomas e Margaret como seus
pais, mas pelo menos não teria mais que suportar sua companhia com muita
frequência. Além disso, quando o fizesse, Alfred estaria ao seu lado e isso
ajudaria.
Ajudar com o quê? A pergunta silenciosa a fez olhar pela janela enquanto o
veículo se movia.
Era melhor não pensar sobre isso.
Sobre ele.

T ENTERDEN M ANOR NÃO ERA EXATAMENTE A IDEIA QUE C AROLINE TINHA DE UMA
pequena propriedade rural, pensou com um nervosismo, mas o duque estava
certo sobre uma coisa: era isolada.
Localizada em uma área arborizada, consistia em uma suave estrutura de
pedras banhada pelo sol do fim da tarde. Uma elegante fachada mostrava
influência elisabetana nas alas abertas, deixando óbvio que alguns detalhes
tinham sido modificados ao longo dos anos. Mesmo que o duque raramente
ficasse naquela casa, os terrenos intensamente verdes eram tratados com esmero,
e o limpo cascalho da entrada se curvava em direção à porta da frente. Fileiras de
janelas reluzentes gradeadas eram emolduradas por hera, dando à casa um efeito
encantador, quase de conto de fadas, apesar de seu tamanho imponente. Árvores
maduras estendiam galhos frondosos sobre a maior parte do terreno, deixando a
luz do sol atravessar a grama cortada.
Era linda e muito reservada. Exatamente o que eles precisavam para o seu
pequeno interlúdio.
Oh, Deus. O nervosismo reverberou em sua garganta, tornando difícil
engolir.
Não era muito tarde, lembrou a si mesma, para pedir a Huw que desse a volta
para levá-la de volta a Londres e esquecer essa louca escapada. Além do risco
que estava assumindo, depois que as próximas semanas terminassem, como se
sentiria?
Como uma prostituta por oferecer-se a dois dos mais célebres patifes da
sociedade?
Possivelmente. Mas, novamente, talvez ela finalmente se sentisse como uma
mulher e seu comportamento inadequado lhe trouxesse alguma recompensa. O
passo que estava dando para mudar sua vida era realmente drástico, mas talvez
fossem necessárias medidas drásticas.
Quão humilhante seria, porém, caso se provasse uma decepção para o
notório duque de Rothay.
Pelo contrário, ela disse a si mesma com firmeza quando o veículo parou e
seu estômago revirou, era parte da aposta entre ele e o conde que ambos
provassem suas habilidades no quarto. Ela deveria meramente votar em qual
deles tinha o melhor desempenho.
Parecia bem simples.
O corpulento Huw estava na porta da carruagem, estendendo a mão para
ajudá-la a descer. Seu rosto largo não mostrava nenhuma curiosidade ou censura,
tão impassível como quando a levara para a pequena hospedaria decadente. Ela
não podia deixar de imaginar o que ele iria pensar quando descobrisse que o
propósito de sua jornada era um encontro amoroso. Trabalhava para ela há vários
anos e seu relacionamento como servo e empregador era muito confortável. Mais
coisas poderiam mudar a partir daquela empreitada imprudente do que apenas
sua percepção de si mesma como uma mulher, ela percebeu, perguntando-se o
quanto deveria se preocupar com a opinião de um servo. A maior parte da alta
sociedade garantiria que não deveria se importar, mas Caroline não tinha certeza
se poderia ser tão blasé.
— Obrigada — ela murmurou, saltando, esperando que sua apreensão não
fosse óbvia.
— O prazer é meu, minha senhora. — Huw inclinou a cabeça com uma
expressão neutra.
A porta da frente se abriu, e o próprio duque apareceu conforme ela subia os
degraus de tijolos incrustados. No breve bilhete que enviou com as direções,
Nicholas mencionou que haveria pouquíssimos funcionários na casa, tendo em
vista que ele realmente não a usava, mas ela certamente não esperava que
alguém de sua posição fizesse papel de lacaio. Foi surpreendente. Ele também
estava vestido muito informalmente, com uma camisa branca de mangas soltas,
calções pretos e botas polidas. Isso o fazia parecer mais jovem, mas não menos
formidável, muito pelo contrário. A roupa casual enfatizava sua altura, a
impressionante largura de seus ombros e definia o poder muscular de suas longas
pernas. O lustroso cabelo escuro caía sobre seus ombros, brilhando ao sol da
tarde e emoldurando aquelas feições masculinas pecaminosamente belas. Ela
finalmente parecia conseguir enxergar o homem, não apenas o aristocrata rico e
bonito com aquele sorriso de tirar o fôlego e uma confiança cativante. O modo
mais casual de vestir também sinalizava uma intimidade em seu relacionamento
que evidenciava a situação real: ela ia passar a próxima semana em sua cama.
Sentiu um leve arrepio quando ele estendeu a mão educadamente para pegar
a dela, inclinando-se e deixando a boca roçar levemente sua pele.
Ele se endireitou e murmurou:
— Bem-vinda, minha senhora.
— Olá, Sua Graça. — Caroline conseguiu manter o tom de voz, embora seu
pulso estivesse acelerado. O duque se elevou sobre ela e seus ombros pareciam
assustadoramente largos.
Seus olhos escuros olhavam para ela com um leve resquício de humor.
— Espero que você esteja preparada para uma semana de vida rústica. Como
eu avisei, há apenas uma equipe mínima de criados. Minha chegada deixou a
governanta um tanto abalada. Venha, vamos entrar. Vou pedir chá e podemos nos
familiarizar...
Tão rápido? Caroline não tinha certeza do que ele quis dizer com essa
observação e uma habitual incerteza a dominou. Invocando cada grama de
bravura, murmurou em um tom frio.
— Isso seria aceitável, suponho.
Agora ele definitivamente parecia divertido, a julgar pela forma como sua
boca finamente modelada se contorceu.
— Falou como a famosa e fria Lady Wynn. Por favor, tenha em mente que só
mencionei chá.
Ela estava bem ciente de sua reputação de ser distante e fria. Foi por isso que
embarcara naquela aventura.
— Nós dois sabemos por que estou aqui, Rothay.
— Sim, nós sabemos. — Ele ainda segurava a mão dela, seus longos dedos
envolvendo-a de forma leve. Era uma liberdade, mas dadas as circunstâncias,
como ela poderia objetar?
Ele se inclinou para frente, perto o suficiente para que seu hálito quente
roçasse a orelha de Caroline.
— Não vai ser fácil descongelá-la, vai?
Aquelas palavras faladas com tanta suavidade a fizeram recuar e observá-lo
por um momento, sem saber como responder e sentindo um formigamento
estranho na boca do estômago. Talvez a honestidade fosse melhor.
— Não — ela admitiu finalmente.
Para seu alívio, ele não disse mais nada e soltou sua mão.
— Vamos entrar?
Ela passou por ele e entrou na sala de estar, mais do que um pouco abalada
pela breve intimidade de seu contato. Não importava o quanto os arredores
fossem campestres — ela notou, agradecendo pela distração bem-vinda —, com
seus painéis de madeira polida, belos pisos e tetos altos, o lugar era cálido e
agradável, com o ar de uma beleza envelhecida. Havia uma aura de suavidade
em seu exterior, um sentimento de lar por conta do ambiente bucólico, o cheiro
de cera e pão no ar…
— Este lugar é agradável — ela conseguiu dizer com desenvoltura, embora o
fato de ele tê-la chamado de fria houvesse trazido antigas e persistentes
inseguranças à tona.
E se ela realmente fosse uma mulher sem paixão e incapaz de responder a
um homem?
Nicholas Manning olhou ao redor. O corredor levava a uma área aberta com
uma lareira muito grande, com cadeiras e sofás reunidos em círculos. Do outro
lado, uma escadaria esculpida e graciosa se curvava para cima.
— Mais do que me lembrava — ele admitiu. — Venho negligenciando
minhas visitas a este lugar há um bom tempo. Tenho oito casas espalhadas por
várias partes da Inglaterra graças aos meus ilustres ancestrais. Parece que toda
vez que um herdeiro Rothay se casa, nós colecionamos propriedades como
crianças coletam doces. É impossível viver em todas elas e, além disso, minha
presença em Londres é requisitada com bastante frequência, o que me impede de
passar muito tempo no campo.
O tom seco de sua voz demonstrou a Caroline que sua referência à herança
era autodepreciativa, e ela deu uma risadinha, apreciando sua falta de presunção.
— Eu duvido que a maioria das pessoas sentiria pena de você por causa de
um excesso de riqueza, Sua Graça.
— Talvez não. — Ele a segurou pelo cotovelo e a guiou pelo corredor. —
Mas, assim como qualquer outra coisa, também possui suas desvantagens. A Sra.
Sims irá mostrar-lhe o seu quarto e, quando estiver pronta, por favor, junte-se a
mim para um refresco.
A governanta era idosa. Sua voz suave exibia um leve sotaque escocês, e ela
escoltou Caroline até um belo quarto com uma vista gloriosa do jardins dos
fundos, com janelas abertas que deixavam entrar o doce aroma de rosas que
desabrochavam. Para uma casa de campo, os móveis eram certamente ricos,
embora datados, e a cama grande era revestida de seda azul-claro; o tapete
luxuriante e estampado de marfim, rosa e índigo. O efeito geral fazia com que
ela se sentisse como uma convidada de honra, mas não podia deixar de se
perguntar se aquela suíte elegante não deveria pertencer à dona da casa.
Especialmente quando notou a porta que obviamente levava a outro conjunto de
quartos.
Convidada de honra? Bem, ela supôs que sim. Nicholas Manning queria que
ela pensasse que ele era um amante excelente.
No entanto, seria necessário mais do que um belo quarto para atingir este
objetivo. Ela olhou para a porta ao lado e sentiu mais um tremor de antecipação.
S ombras longas e suaves caíam sobre a grama, uma brisa perfumada
percorria os jardins, ondulando as folhas lustrosas, e parecia que todos os
pássaros da Inglaterra estavam reunidos para cantar e encantar com seus sons.
Um coelho saltou por um dos caminhos de cascalho, mordiscou a grama e
levantou uma orelha, despreocupado com a presença do homem e da mulher no
terraço de lajotas a poucos passos de distância. Era como um daqueles cenários
dos quais se lembrava dos livros de infância, onde o mundo era feito de um sol
perpétuo e de um céu sem nuvens.
Ou talvez sua alma cansada já tivesse passado muito tempo na cidade.
Um conto de fadas que se preze não estava completo sem uma linda donzela.
Nicholas, acomodado em uma cadeira confortável, bebia conhaque, não chá,
e observava sua linda convidada com o que ele esperava que parecesse uma
atenção casual e não o interesse voraz que realmente sentia.
A noite em que ele e Derek se embriagaram em demasia estava embaçada em
sua mente, e quando percebera, à luz do dia seguinte, que fizera uma aposta
pública colocando-a no livro da White's, o arrependimento o fez praguejar
consigo mesmo. A melhor maneira de lidar com o furor resultante de sussurros e
interesse pareceu ser o máximo de senso de humor possível. No entanto, sentado
agora em frente à encantadora Lady Wynn, ele não tinha certeza se fora um erro
tão grande, no fim das contas.
Até mesmo o jeito como ela tomava um gole de chá, com um suave levantar
das mãos, os lábios mal tocando a borda da xícara, era reservada e contida. Seu
olhar parecia focado em algum objeto distante não identificável, como se não
quisesse olhar diretamente para ele.
Embora Nicholas já a tivesse encontrado de passagem uma ou duas vezes,
primeiro por causa do seu primeiro status de solteira, depois por sua posição
como uma jovem esposa que não gerara um herdeiro e, por fim, por seu
afastamento da sociedade após a morte do marido. Porém, ele realmente não
tinha prestado muita atenção. Sim, achava que ela era deliciosa de uma maneira
exuberante e opulenta, com seu cabelo rico e a pele impecável fazendo aqueles
incríveis olhos prateados se destacarem, mas ela simplesmente não era alguém
que teria perseguido. Era mais como admirar uma pintura em um museu. Atraía
os olhos e agradava em um sentido estético, mas você sabia que nunca poderia
possuí-la, então, não perdia tempo pensando muito sobre isso.
Só que tudo isso havia mudado.
Ele a possuiria de um modo muito carnal e estava ansioso por isso em um
grau que o surpreendia. Talvez fosse a situação incomum, talvez fosse aquela
estúpida aposta arrogante, mas não conseguia se lembrar da última vez em que
sentira um interesse tão intenso por uma mulher em tão pouco tempo.
— Conte-me sobre você. — Ele segurou seu copo de conhaque e observou-a
saborear novamente a delicada xícara de chá. A luz do sol mostrava os gloriosos
detalhes avermelhados de seu cabelo ruivo. Ela usava um vestido elegante cinza,
que combinava exatamente com seus olhos. Em qualquer outra mulher a cor
poderia parecer desleixada, mas ela a carregava perfeitamente porque enfatizava
tanto sua coloração vibrante quanto a delgada voluptuosidade de sua figura.
Ele mal podia esperar para arrancá-lo de seu corpo, decidiu com impaciência
incomum. O volume sob o decote modesto atraía seu olhar, provocando
especulações nada cavalheirescas sobre como seria tocar e saborear aqueles seios
tentadores.
Caroline pareceu um pouco surpresa.
— O que é que o senhor quer saber, Sua Graça?
— Chame-me de Nicholas.
— Se o senhor quiser.
Mas ela parecia insegura, especialmente quando apressou-se em tomar outro
gole do chá. A xícara tremeu um pouco —mas o suficiente, ele notou — contra
sua boca.
Uma boca convidativa, aliás. Lábios rosados suaves, o inferior um pouco
mais cheio, com uma curva sensual perfeita. Linda.
— De onde você é? — incentivou.
— York — ela respondeu prontamente, entretanto, sua expressão manteve
aquele olhar solene destacado que a fazia parecer tão distante. — Minha mãe
morreu quando eu era criança, e meu pai era um homem ocupado, então, passei
muito tempo em Londres com minha tia, quando não estava na escola. Foi ela
quem providenciou meu debut e meu casamento.
Duas frases não resumem exatamente a vida de ninguém.
— Irmãos ou irmãs?
— Não.
Extrair conversa de uma mulher não costumava ser uma tarefa tão difícil. Ele
arqueou uma sobrancelha e tentou novamente.
— Quais são seus interesses? Teatro, ópera, moda?
Ela hesitou e então disse, simplesmente:
— Eu adoro ler. Toda e qualquer coisa. Romances, a primeira página do
jornal, até mesmo trabalhos científicos, se eu puder encontrá-los. Sempre foi
uma paixão minha. Minha preceptora era progressista. Ela encorajou minha
curiosidade e me emprestou livros que certamente minha tia teria desaprovado.
O pai de Miss Dunsworth era um famoso antiquário e colecionava obras de todo
o mundo. Ele a deixou empobrecida quando morreu, mas poderia ser
considerada rica em outros aspectos, para quem valoriza o conhecimento. Tudo
teve que ser vendido, mas ela manteve sua biblioteca.
Mulheres com intelecto não o incomodavam como acontecia com alguns dos
outros homens de seu convívio. Ele também gostou da forma apaixonada como
ela lhe contou tudo isso.
— Diga-me seu autor favorito.
— Voltaire, se você me forçar a escolher um. — Sua expressão tornou-se
animada, o que iluminou seu rosto adorável.
— Quem mais?
Ela gostava dos antigos gregos, de Shakespeare, Pope, os trabalhos mais
modernos de alguns dos autores populares, alguns dos quais ele ainda não tinha
lido nada.
O sol o aquecia, o conhaque era suave e delicioso, e ele estava... encantado.
Ela tinha tendências intelectuais? Era uma revelação. As mulheres geralmente
serviam apenas a um propósito casual em sua vida, mas havia uma faísca nos
olhos de Caroline que o atraíra desde a ida à hospedaria, e isto o deixara
fascinado.
Até que ele dirigiu a conversa de volta para sua família. O entusiasmo
desapareceu de sua expressão e ela voltou a prestar mais atenção à sua xícara de
chá.
— Como disse antes, eu morava com minha tia. Ela morreu apenas um mês
depois de Edward.
Ele esperou. Não parecia haver mais informações a serem compartilhadas,
mas ele estava realmente curioso sobre o casamento dela depois do seu bilhete.
— Eu conheci seu marido, mas apenas vagamente.
— Dê graças por isso.
Ele não pôde evitar que suas sobrancelhas se arqueassem com o tom cortante
que ela usou.
— Entendo.
Ela o olhou por cima da borda da xícara e depois colocou-a de lado com o
que parecia ser um cuidado deliberado. Aqueles luminosos olhos cinzentos, tão
adoráveis, enquadrados por grossos cílios que mais pareciam rendas, eram muito
diretos.
— Perdoe-me, mas, não, você não entende. Nunca foi casado com um
homem de quem não gosta muito. Nunca foi subserviente aos caprichos de outra
pessoa e, por favor, admita que percebe a diferença entre os gêneros em nossa
sociedade, que permite que os cavalheiros com títulos façam apostas
extravagantes que enaltecem sua falta de virtude, enquanto as mulheres são
julgadas mais severamente por manterem as suas.
Por um momento, Nicholas não soube o que dizer. Lady Wynn não flertava,
ele já havia percebido isso, e aparentemente tinha a capacidade de ir direto ao
ponto e ser agradavelmente honesta. Depois de uma pequena pausa, ele inclinou
a cabeça.
— Entendo seu ponto de vista. Abster-me-ei, a partir de agora, de fazer
suposições presunçosas.
Sua fácil aquiescência pareceu desconcertá-la. Ela franziu a boca, atraindo a
atenção de Nicholas para os lábios macios novamente.
— Eu... me desculpe — disse ela com um pequeno suspiro depois de um
momento. — Sou um pouco sensível com o assunto do meu casamento. É por
isso que não tenho intenção de entrar em compromisso semelhante novamente.
— Não há necessidade de pedir desculpas por expressar sua opinião,
asseguro-lhe.
Um olhar irônico cintilou no rosto dela.
— Acho que acabei de repreender o duque de Rothay.
— Que, sem dúvida, merece isso de vez em quando. — Ele sorriu. — Talvez
até com mais frequência.
— Você é muito — Ela pareceu procurar por uma palavra e finalmente a
encontrou — cortês. A maioria dos homens quer que uma mulher concorde com
tudo o que eles dizem. Acho cansativo.
— Por isso a atitude desanimadora em relação a todos aqueles cavalheiros
ansiosos reunidos em torno da senhora em eventos? — Nicholas se espreguiçou
na cadeira, desfrutando não só da brisa amena do fim da tarde, mas também da
atitude alheia ao flerte. Ele estava acostumado a mulheres bajulando-o, não
repreendendo sua má compreensão de sua posição no mundo.
— Vamos apenas dizer que eu valorizo minha independência.
Eles podiam não se conhecer muito bem, mas tinham isso em comum.
— Assim como eu. Pelo menos os rumores dizem isso.
Seus lábios se curvaram em um sorriso encantador que fez seu corpo, já em
alerta total, ficar ainda mais atento.
A mudança era notável. Aquele gesto a transformava de uma figura distante
de mármore em uma mulher suave e atraente.
Nicholas se mexeu na cadeira, sentindo-se inchar por conta da excitação, de
modo que o tecido de suas calças se contraiu. Que estranho. A moça não
dissimulava, ela nem fingia, e ele gostava da franqueza dela. Então, disse
suavemente:
— Não acredite em todos os rumores sobre mim, mas esse está correto.
— Há rumores suficientes. Sua reputação é infame como nenhuma outra na
sociedade londrina.
— Eu não consigo entender por quê.
— Não consegue? As histórias são abundantes.
— Imagino que sim. Mas a verdade e a fofoca raramente andam de mãos
dadas, minha senhora.
Ela o olhou gravemente.
— Está tentando me dizer que o senhor, e eu quero lembrá-lo de que
recentemente fez uma aposta muito presunçosa sobre seus supostos talentos na
mesma área que estamos discutindo, é mais virtuoso do que os rumores
implicam?
Virtuoso? Nicholas tinha certeza de que o termo nunca fora aplicado a ele,
mas, de uma maneira abstrata, talvez fosse. Em sua defesa, ele não se envolvera
com ninguém que pudesse levar o jogo da sedução de maneira séria. Ele sorriu
com indolente preguiça despreocupada.
— Possivelmente. Admito que parei de me defender anos atrás.
— Mas você quer ter parceiras sem assumir um compromisso?
— É claro que sim. — Desde Helena, ele achava que os casos amorosos
eram mais fáceis de serem mantidos simples e puramente por prazer físico.
Um tempo atrás — antes de entender que os sonhos românticos eram nada
mais do que isso —, ele cometera um erro de proporções colossais. Um que
provavelmente nunca cometeria novamente. A lição fora dura, mas ele era
jovem, tolo e tinha expectativas idealistas. A experiência pode ser uma pílula
amarga e deixar um sabor que não se esquece facilmente.
Aparentemente, Caroline interpretou sua expressão corretamente.
— Bem, ninguém sabe que estou aqui, Sua Graça. Estamos sozinhos,
anônimos e livres para fazermos o que quisermos.
— Nicholas — ele a lembrou com um sorriso lento, observando a maneira
como a luz brilhava através das frágeis feições de seu rosto, ao longo das curvas
esbeltas de seus ombros, proporcionando uma sombra deliciosa à fissura
tentadora entre seus seios fartos, apenas sugeridos pelo decote de seu vestido.
— Você quer entrar?
Ela não entendeu mal a sugestão, e suas bochechas assumiram um tom
rosado.
— Agora? É de tarde.
Nicholas reprimiu uma risada com a ingênua insinuação de que as pessoas só
faziam amor depois do pôr do sol. Para uma viúva, ela certamente era reservada.
Ele murmurou:
— Por que esperar? Nós poderíamos conversar mais confortavelmente.
— Conversar?
— Entre outras coisas.
Suas bochechas assumiram um tom mais profundo de rosa.
Na cama, ele quis dizer. Embora normalmente não gostasse exatamente de
falar naquele ambiente, estava disposto a fazê-lo se isso a deixasse mais à
vontade. Nunca iniciara virgens. Criado como um herdeiro ducal, ele aprendera
sobre as armadilhas da inocência perdida desde a época em que tinha idade
suficiente para entender o conceito, mas, no momento, tinha a impressão de que
estava tão perto de uma quanto chegaria até se casar. Era evidente que, apesar de
sua compostura, ela mostrava-se muito nervosa, mas também consciente dele
como homem.
Isso aumentava seu interesse em um grau surpreendente.
Nicholas levantou-se e estendeu a mão para pegar a dela, puxando-a
gentilmente para que ficasse de pé. Ele olhou para o rosto erguido em sua
direção, concentrando-se em sua boca.
— Eu acho que você é muito bonita, Lady Wynn.
Os olhos cinzentos brilhavam, e seu tom de voz soou abafado quando ela
respondeu:
— Você diria isso, é claro.
— Não, se eu não quisesse dizê-lo. — Ele era sincero. Seduzir mulheres para
levá-las para a cama não incluía falsos elogios. Não precisava de coerção, e se
ela não concordava com seu comentário, era mais inocente do que ele imaginara.
Certamente alguém com sua beleza extraordinária deveria ter recebido
homenagens poéticas suficientes para durarem por uma vida inteira. — Já que
não é a primeira vez que ouve algo assim, por que não confiar na minha
sinceridade?
Com muita delicadeza, ele tocou o cabelo dela, apenas um roçar das costas
de seus dedos sobre aqueles fios vibrantes e sedosos. A cor fazia com que se
lembrasse do outono pelo rico tom de marrom com reflexos de vermelho.
Algumas mechas soltas emolduravam seu rosto oval e brincavam ao redor da
esbelta coluna de marfim de seu pescoço. A cor quente combinava com ela,
apesar de sua reputação fria e distante.
Estava prestes a fazer outra aposta imprudente de que ela não era fria de fato.
Seu marido obviamente fora um imbecil entre quatro paredes, mas seria um
deleite para Nicholas mostrar-lhe os benefícios do prazer mútuo entre um
homem e uma mulher.
Caroline lançou-lhe um sorriso quixotesco.
— Eu mal o conheço, Nicholas.
Ele gostou do som de seu nome nos lábios dela.
— Certamente já sabia disso antes de me enviar o bilhete. Que melhor
maneira de se familiarizar?
Qualquer resposta que ela pudesse lhe dar foi silenciada quando ele inclinou-
se e tomou seus lábios. Suas mãos se posicionaram na cintura fina, em um aperto
firme, mas não insistente, conforme ele suavemente moldava suas bocas juntas.
Quando se tratava de mulheres, costumava confiar em seus instintos. Ele já havia
percebido que, naquele caso, a persuasão seria mais eficaz do que a paixão
impetuosa. Muitas mulheres gostavam de ser arrastadas, queriam que seu amante
não apenas as possuísse, mas as dominasse, porém, ele soube que Caroline não
era uma delas antes mesmo de tocá-la.
Ela tinha um gosto doce, e a sensação de tê-la em seus braços era incrível,
com os seios macios tocando seu peito suavemente. Mas quando tentou
introduzir a língua em sua boca, ela se sobressaltou, no que só poderia ser o
resultado de uma surpresa.
Que diabos?
Por um momento ele parou, preso por uma percepção surpreendente.
Parecia impossível que uma mulher casada há vários anos nunca tivesse sido
beijada de maneira íntima, mas ele pôde sentir uma reação hesitante à
exploração de sua língua, como se ela não tivesse a menor ideia do que fazer.
Aquela era uma reviravolta interessante em seu arranjo. Nicholas continuou,
mantendo o beijo pouco exigente, mas sutilmente puxando-a para si, para que
seus corpos se tocassem ainda mais. Normalmente ele teria considerado aquele
grau particular de inexperiência como algo desalentador, mas talvez fosse a
peculiaridade da situação, sua beleza irresistível ou apenas a forma como ela
parecia se encaixar perfeitamente em seus braços — ele não tinha certeza —,
porém, descobriu-se mais intrigado do que nunca.
Ele murmurou contra seus lábios:
— Posso mais uma vez te convidar para entrar?
Àquela altura, ela estava aninhada contra a crescente ereção dele, de modo
que não havia dúvidas sobre o que sua sugestão implicava. Mas, novamente, não
era para isso que estava lá? Caroline assentiu. Nicholas se afastou, pegou a mão
dela e sorriu.
Ela não sorriu de volta, mas olhou para ele por um momento, com seus olhos
incríveis arregalados e suas bochechas coradas. Não era um mal sinal, ele notou
quando ela permitiu que ele a levasse para dentro e subisse as escadas para o
quarto. A casa estava quieta no final da tarde, a Sra. Sims, sem dúvida, ocupada
em organizar os preparativos para a inesperada visita. Não havia tempo para
convocar mais funcionários, e já que sabia que Caroline valorizava o anonimato,
não levou nenhum dos seus, exceto o motorista. Até mesmo seu valete
permanecera em Londres, então, o quarto estava vazio e, quando fechou a porta,
soube que permaneceriam em total privacidade por quanto tempo quisessem. A
governanta tinha instruções para não perturbá-los, a menos que fosse convocada.
— Temos portas de conexão. — Caroline olhou para a parede que separava
seus quartos.
— Conveniente, não é?
Nicholas sorriu, seu olhar cálido admirando o quanto ela parecia graciosa e
feminina no ambiente masculino de seu quarto. Os móveis eram exagerados em
tamanho, a cama grande estava em um estrado, as proporções enormes e a
madeira esculpida escura tinham séculos de idade. Um de seus augustos
antepassados posava com roupas aristocráticas em um retrato sobre a lareira.
Em contraste, ela estava ali, curvilínea, sedutora e tão convenientemente
disponível.
Sua ereção pulsava desde aquele beijo, forçando o material justo de suas
calças.
— Vamos fazer isso do jeito certo.
Ela não resistiu quando ele soltou seu longo cabelo para que caísse pelas
costas. Parecia uma seda quente enquanto se derramava sobre suas mãos, e a
fragrância veranil era doce e feminina. Depois de desabotoar o vestido, ele a
beijou suavemente de forma tranquila, tomando cuidado para não apressá-la ou
alarmá-la. Levantando-a em seus braços, levou-a para a cama e tirou os calçados
e as meias com a mesma habilidade, admirando sua nudez com puro apreço
masculino enquanto se sentava para tirar as próprias botas.
Era surpreendente, mas ele estava realmente com pressa.
Vestida apenas com seu chemise, ela era perfeita, uma Vênus de cabelos
castanho-avermelhados sob o sol poente do fim da tarde que entrava pelas
janelas altas, com seus membros macios e a pele pálida e impecável, emoldurada
por uma torrente de madeixas brilhantes. Os seios fartos tremiam a cada
respiração, e seus belos olhos pareciam mais escuros, dilatados, a singular cor
prateada temperada pela paixão.
Ou medo.
Nicholas reparou, em uma onda de consternação, enquanto seus dedos
pararam no ato de desabotoar sua própria camisa.
Sim, ele pensou enquanto lutava contra a descrença. Medo. O tremor da
mulher em sua cama não tinha nada a ver com desejo.
Em vez do rubor da excitação, seu rosto estava agora um pouco pálido. Ele
baixou as mãos, a camisa aberta até a cintura, sem saber como lidar com essa
inesperada reviravolta.
— Nós não temos que fazer isso, você sabe. É só dizer. Podemos beber vinho
ao sol, e você pode partir amanhã, se quiser.
Por um momento ela hesitou, e então sussurrou:
— É tão óbvio assim?
Ele não estava acostumado a nada menos do que uma total ansiedade de suas
parceiras, então, a resposta era um retumbante sim. No entanto, agir com
diplomacia parecia a melhor opção. Nicholas disse devagar:
— Acho bem óbvio que você não está totalmente à vontade, minha senhora.
A aposta foi feita em um momento estúpido entre dois cavalheiros que
terminaram com ressacas pesadas na manhã seguinte. Por mais que sua presença
na minha cama seja atraente para mim, você não precisa continuar com a sua
oferta.
Deliciosamente seminua, sobreposta à fina roupa de cama, Caroline deu a ele
um leve sorriso.
— Não admira que o seu charme seja lendário, Rothay, mas você acha que
eu me voluntariei levianamente? Das damas de seu conhecimento, devo ser a
menos provável de ser encontrada em sua cama, mas estou aqui, e cabe a você
me seduzir, correto?
Ela tinha razão. Uma mulher temerosa e nervosa não era o que ele ou Derek
tinham em mente, é claro, mas ela se apresentou, eles concordaram, e Nicholas
estava ansioso para ficar sozinho com ela.
— Só se você quiser.
— Se eu não quisesse, não estaria aqui.
Por que diabos ela estava lá, se a ideia de compartilhar sua cama a fazia ficar
pálida e tremer de medo?
Ela afirmou com apenas um toque de desespero:
— É o que eu quero.
Seria verdade? Seu corpo indisciplinado o incitava a continuar, mas ainda
não se mexia. Todo caso amoroso tinha seus parâmetros e toda mulher era
diferente, mas aquela situação era especial. Ele tinha a sensação de ela estava
fazendo uma quantidade enorme de esforço para continuar ali.
Era assustador.
Que diabos Wynn tinha feito — ou deixado de fazer — com ela?
— Você é virgem? — ele fez a pergunta em voz baixa, sem saber como
agiria se ela dissesse sim. Não iria fingir que não notara a reação dela ao seu
beijo. Aquilo não tinha mais nada a ver com a aposta ridícula. Para ela, ele
começava a perceber, nunca fora, na verdade.
Ela desviou o olhar e engoliu em seco, os músculos em sua garganta fina se
movendo.
— Não.
Essa pequena palavra continha um enorme significado.
Mais do que um pouco perdido, Nicholas continuou parado ali. Ele sabia
tudo sobre os jogos sexuais que homens e mulheres jogavam juntos, mas não era
o caso. Aquilo não tinha nada a ver com sedução despreocupada. Ele sentou-se e
tocou-a, apenas uma leve pressão no queixo, de modo a fazer com que o rosto
dela se virasse na direção dele. Lágrimas brilhavam em seus cílios, o que ele
percebeu com um pequeno choque de desânimo.
— Seduza-me — ela sussurrou no silêncio pungente. — Por favor.
S e as coisas continuassem como estavam, ela seria a única mulher em todo o
mundo que ficaria quase nua na cama do perverso e sensual Duque de
Rothay e o faria recusar-se a fazer amor com ela.
Ela praticamente teve que implorar.
Por mais humilhante que fosse, deixou-a surpresa o fato de um libertino
notável ter a sensibilidade de perceber que estava com medo. Ele parecia tão
inquieto quanto ela se sentia, e isso queria dizer alguma coisa.
Sob circunstâncias diferentes, ela poderia ter se divertido.
— Eu quero, obviamente — ele finalmente murmurou, um pequeno sorriso
torto curvando sua boca finamente modelada enquanto apontava para a
impressionante protuberância em seus calções.
Santo Deus, ele parecia... enorme.
Mas as viúvas chorosas, frias e inexperientes não eram suas vítimas
habituais. Ele não precisava explicar. Quem poderia culpá-lo? Não importava o
que ela pudesse parecer, sensualidade não era seu forte.
Mas aqui estava ela, quase sem roupa, com os cabelos soltos, na cama dele.
Caso se acovardasse agora, a oportunidade escaparia.
— Beije-me novamente — ela pediu, olhando em seus olhos da cor da noite.
Através da abertura em sua camisa desabotoada, podia ver a rigidez muscular de
seu peito nu, e isso causou um estranho nó na boca de seu estômago. O cabelo de
ébano, elegante e um pouco desgrenhado, roçava o pescoço forte, na altura da
abertura da camisa. Sua beleza masculina era atraente, mas, novamente, seu
marido também era um homem bonito. Talvez não tão magnífico como o infame
Rothay, mas, ainda assim...
Não. Ela não pensaria em Edward. Não agora.
Nicholas inclinou-se para frente e, para sua surpresa, em vez de tomar sua
boca em outro beijo devastadoramente perverso, ele levou os lábios aos seus
traidores cílios molhados. Beijou suas lágrimas com suavidade e, ao mesmo
tempo, alguns de seus medos. Quando se deitou ao lado dela e a puxou para si,
ela fez o melhor que pôde para relaxar, mesmo dentro do círculo forte de seus
braços.
Ele cheirava maravilhosamente bem, de um modo peculiar e sedutor. Todos
os homens tinham aquele aroma picante e intrigante ou era só ele?
— Você é muito adorável — Nicholas sussurrou, acariciando suas costas,
avançando tão sutilmente por baixo de seu chemise que ela quase não percebeu o
que ele estava fazendo até que seus dedos alisaram sobre a curva de uma coxa
nua.
Ela começou a se mostrar tensa, e ele imediatamente retirou a mão.
— Relaxe — ele murmurou em seu ouvido, sua respiração quente, sedutora.
— Estou me esforçando. — Um esforço vergonhoso, ela pensou em uma
autocrítica, de modo incerto e amargo. Talvez Edward estivesse certo o tempo
todo, pois se estar ao lado de um dos homens mais charmosos e bonitos da
Inglaterra não a ajudasse, talvez ela fosse irrevogavelmente falha.
Bem, talvez não fosse nada.
A respiração calma e estável de Nicholas e a batida constante de seu coração
pareceram amenizar a sensação do quanto o corpo dele, enorme, fazia com que o
dela parecesse muito menor. Para sua surpresa, sentiu os seios apertarem, e
quando ele roçou os lábios em sua bochecha, ela suspirou e virou a cabeça para
oferecer sua boca.
— Talvez devêssemos começar devagar.
Ela desejava ter alguma ideia do que ele queria dizer, mas não podia nem
arriscar um palpite.
— O que você quiser.
Quão desesperadamente ela desejava poder fazer jus a essa oferta.
Um sorriso hipnotizante curvou os lábios de Nicholas.
— Beijar é uma arte. Você gostaria de alguma instrução?
— Por que mais eu estaria aqui?
Em sua propriedade isolada, em sua cama, presa em seus braços. Por que
mais, de fato, exceto pelos esclarecimentos que ela esperava que ele lhe
trouxesse?
— Então será um prazer, minha senhora.
Muito lentamente, ele inclinou a cabeça mais uma vez. Seus lábios se
tocaram, se uniram.
Foi longo, luxuoso, tentador, proibido. Foi um beijo de verdade.
Sua língua suavemente duelou com a dela, provocando uma resposta
enquanto explorava sua boca, e Caroline começou a relaxar no beijo,
especialmente porque ele apenas a segurou e não fez mais nada. Ele também
estava ainda completamente vestido, embora ela pudesse sentir o calor de sua
pele nua através da abertura em sua camisa desabotoada. Seus lábios deixaram
os dela, desceram novamente, e desta vez ele desceu pelo pescoço, demorando-
se no vão de sua garganta.
A intempestividade de mandar aquele bilhete — não, não fora intempestivo
de verdade, já que ela praticamente agonizara antes de decidir —, de repente
parecera que iria valer muito a pena.
Isso era exatamente o que ela esperava sentir.
Era agradável. Não, esta não era uma palavra boa o suficiente. Era mais que
agradável. A pressão provocante de sua boca a fazia estremecer.
— Tudo o que vou fazer é provar você. — Sua voz continha uma nota rouca
e leve enquanto sussurrava contra sua pele. — Nada mais. Posso?
Ela percebeu que os dedos dele seguravam a fita que amarrava o corpete de
seu chemise, e ele estava pedindo permissão para abri-la.
Pedindo permissão. Isso era certamente novo em sua experiência. Pensar que
sua vontade seria considerada era reconfortante.
Mas a ideia de que ele queria vê-la nua era decididamente inquietante. Era
um dilema. Por mais que a última coisa que quisesse fosse que Nicholas
simplesmente erguesse sua saia e seguisse em frente, sentia-se constrangida com
a ideia de ficar nua diante dele, ou qualquer outra pessoa, à luz do dia, ainda por
cima. Sabia que nada seria fácil, mas, enquanto ele esperava educadamente em
silêncio, sentiu um estranho lampejo de confiança.
Um bom começo, pelo menos.
Caroline assentiu e sentiu-o puxar o nó, acompanhando por uma onda de
calor que aqueceu seu rosto, enquanto seu chemise se abria, expondo seus seios.
Nicholas olhou para a carne exposta e, lentamente, estendeu a mão entre o pano
entreaberto para tocar levemente um dos mamilos com a ponta de um dedo.
Ela deu um pequeno suspiro.
— Da cor de uma rosa de verão, delicada e perfeita.
Caroline, de alguma forma, conseguiu falar.
— Um elogio muito lisonjeiro, Sua Graça.
Uma sobrancelha escura se arqueou em uma expressão divertida.
— Mas, neste caso, é a mais pura verdade. Tenha em mente também,
Caroline, que quando você está na minha cama, eu sou um homem, e você é a
mulher que desejo. Use o meu nome.
Ela não pôde deixar de fechar os olhos ao sentir o deslizar de seus dedos por
sua pele sensível. A palma quente acomodava completamente um de seus seios
e, para sua surpresa, o olhar cálido aliviava algumas de suas apreensões.
Aqueles olhos. Escuros como a meia-noite, sedutores como o pecado,
emoldurados por cílios longos e grossos em contraste com as linhas cinzeladas
de suas feições. Quando permitiu que suas pálpebras se erguessem, Caroline o
fitou, percebendo de súbito que ele estava esperando, parado, apoiado em um
cotovelo e observando sua expressão enquanto mantinha a mão em seu seio.
Esperando pelo quê? Caroline não fazia ideia. Era humilhante, e ela
desprezava Edward ainda mais por sua ignorância.
— Eu deveria fazer alguma coisa?
Um sorriso quixotesco curvou a boca de Nicholas.
— Fazer alguma coisa?
Já que era óbvio que ele fora capaz de enxergar através do disfarce de viúva
equilibrada a partir do momento em que a beijara no terraço, parecia inútil
disfarçar.
— Por favor, não ria de mim. Tenho certeza de que já percebeu...
— Eu não estou rindo de você — a interrupção foi suave e calma. — Estou
admirando uma visão agradável e também planejando minha estratégia. Afinal,
preciso me sair admiravelmente bem e, certamente, a primeira vez é a mais
crucial, não é?
— Você não está acostumado com mulheres como eu — ela respondeu com
o máximo de dignidade possível, apesar das circunstâncias — e,
consequentemente, não está acostumado a perder.
Porque ela era um fracasso total na cama. Ele estava acostumado com as
senhoras urbanas e sofisticadas que usualmente conquistava. A distância entre
aquelas senhoras habilidosas e sua inépcia era imensa.
— A perder? — Ele sorriu, então, como um menino, mas a conotação da
curva inebriante de seus lábios era puramente a de um homem adulto. Mesmo
em sua situação delicada, ela sentiu a promessa com um leve arrepio de
antecipação. — Definitivamente, não — Nicholas disse a ela, dando à carne que
segurava um aperto suave. — Estou apenas tentando decidir por onde começar.
Você é como uma tela em branco, minha querida, e essa primeira pincelada é a
mais importante.
A referência poética era apenas parte de seu charme irresistível, lembrou a si
mesma.
— Tenho certeza de que você é o artista supremo, Rothay.
— Supremo? Já ganhei tão facilmente?
— Isso foi sarcasmo a respeito de sua arrogância. — Era um pouco difícil
parecer composta e fria quando seus dedos hábeis agora massageavam seu
formigante mamilo.
— Sinto escárnio?
Ela gostou de seu tom de provocação leve, e isso começava a aliviar sua
apreensão. Não era de se admirar que dezenas de mulheres tivessem sucumbido,
ela pensou, conforme uma estranha onda de calor se avolumava por entre suas
coxas. Apesar de sua altura impressionante e força óbvia, ele lhe transmitia a
impressão de poder sem ameaça, de carisma masculino sem dominação. Até
mesmo seu sorriso carregava uma promessa quente e sensual.
Talvez sua ideia escandalosa e impulsiva não tivesse sido tão ruim, afinal.
Ah, sim, ela estaria arruinada para sempre se alguém descobrisse, mas podia
valer a pena.
Quando ele abaixou a cabeça e levou o bico do mamilo à boca, ela reprimiu
um frágil suspiro com esforço, embora tivesse a impressão de que ele o havia
sentido. A ideia de um homem adulto querer sugar seus mamilos era
surpreendente, mas enquanto ele cuidava de um seio e depois do outro, Caroline
percebeu que era maravilhoso. Uma luxuriosa sensação de prazer começou
lentamente a cativar seu corpo enquanto ele provava e acariciava. Sua boca
quente traçava os contornos do vale entre eles, deslizando para baixo e
retornando para os bicos, agora rígidos e reluzentes.
Mas tudo o que ela fazia era ficar parada, deitada, e tinha certeza de que
deveria haver mais do que isso.
Ou assim Edward lhe dissera, da maneira mais contundente possível.
Uma das mãos de dedos longos do duque deslizou pela lateral da perna de
Caroline, acariciando a parte de baixo de seu joelho. De alguma forma, era
delicioso. Caroline nunca pensara que aquele lugar fosse tão sensível.
Lentamente, ele ergueu a perna dela, deixando-a inclinada e então colocou o pé
de volta sobre a cama. Quando ele tomou seus lábios em outro daqueles beijos
demorados e íntimos, sua boca se demorou na dela, e ele fez o mesmo com a
outra perna, até que ela ficasse com as duas ligeiramente separadas, e embora o
chemise ainda cobrisse seu sexo, a posição sugestiva fez a bainha deslizar para o
topo de suas coxas.
A percepção de sua situação foi como um relâmpago. Ela estava na cama do
infame Duque de Rothay, quase nua, as pernas afastadas o suficiente para lhe dar
acesso, se ele quisesse.
E ele queria, ela descobriu um momento depois, quando com a delicadeza de
um toque tão leve que era quase imperceptível, a mão de Nicholas deslizou sob o
tecido que a cobria e acariciou o triângulo de pelos entre suas coxas. Caroline
estremeceu, e isso foi tudo o pôde fazer para não juntar as pernas, o que
prenderia a mão dele exatamente onde ela queria que estivesse.
Respirou fundo e conseguiu ficar parada.
Completamente imóvel. Imóvel demais, porque ele disse:
— Isso deveria derretê-la, linda Caroline, não transformá-la em pedra. Vejo
que terei de ser muito persuasivo, de fato. Seria deselegante da minha parte não
aceitar o desafio que você jogou diante de mim e Manderville.
Ele já a havia chamado de fria, e isso não ficava muito longe de frígida. Este
fora o motivo do desprezo de Edward, então, ela abriu a boca para se defender,
mas nenhuma palavra saiu.
Em vez disso, soltou algo entre um suspiro e um grito de protesto indignado
quando seu belo amante mudou de posição, colocando as mãos insistentes em
suas coxas trêmulas para abri-las ainda mais, e depois abaixou a cabeça.
Ela ficou rígida, em estado de choque total, tão atordoada que nem se opôs à
maneira como ele ergueu sua camisa, expondo-a da cintura para baixo. A boca
de Nicholas roçou seu ponto mais íntimo, acomodando-se nele por completo. A
sensação resultante, enquanto a língua mergulhava entre suas dobras femininas
era... uma revelação.
O diabólico duque tinha a boca entre suas pernas, a seda escura de seu cabelo
roçava a parte interna das coxas e sua língua atrevida começava a fazer algumas
coisas muito interessantes.
Pequenos choques de prazer inundaram seu corpo, e ela torceu as mãos nos
lençóis, como se a ideia de segurar em algo pudesse impedi-la de voar para
longe. Suas sensibilidades afrontadas dominaram sua mente por apenas um
momento e a levaram para longe em um delírio arrebatador.
Oh, Deus!
Nicholas riu, um som breve, que vibrou contra o sexo latejante de Caroline, e
ela percebeu que dissera as palavras em voz alta. Em circunstâncias normais,
teria sido o suficiente para fazê-la corar, mas nada daquilo era normal. Ele
segurou seu corpo, mantendo-a escrava de sua posse erótica, e ela afastou ainda
mais suas coxas, erguendo um pouco os quadris enquanto uma estranha
antecipação se construía.
Era isso. Era por isso que as mulheres sussurravam por trás de suas mãos,
agitavam seus leques e falavam do belo duque de cabelos escuros com
insinuações reverentes e astutas, além de suspiros ardentes. Quando o prazer
erótico tomou conta dela, Caroline estremeceu em uma reação involuntária.
Não havia nenhuma maneira de silenciar um gemido e uma vez que este
escapou, descobriu que nenhum outro som importava, apenas a misteriosa
necessidade que crescia dentro dela. Foi mágico, indescritível, cativante. Seu
sangue aqueceu, seu pulso disparou e ela se arqueou em um movimento
involuntário para aumentar a pressão daquela boca sedutora.
Parecia maravilhoso demais, algo entre a agonia e a felicidade, como se o
corpo rebelde ansiasse por algo... alguma coisa...
Algo que encontrou ou talvez ela mesma tivesse sido encontrada. Uma alegre
explosão, como se estivesse despencando de uma grande altura, tendo o ar
arrancado de seus pulmões, fazendo-a soltar um pequeno grito quando a alegria
física a percorreu, fazendo-a arquear-se e estremecer.
Foi, para resumir em uma palavra, glorioso.
A realidade retornou em pedaços nebulosos. O sol banhava a tradicional
elegância do quarto ducal, a descompostura de seu chemise desabotoado e do
tecido fino amontoado sobre seus quadris, e ele, o homem que acabara de fazer
com ela a coisa mais escandalosa que poderia imaginar. Na verdade, algo que ela
sequer imaginara.
Nicholas Manning estava deitado ao lado dela, esguio e imponente, a
protuberância em seus calções proeminentes, embora ele não fizesse nenhum
movimento para tocá-la enquanto esperava que se recuperasse. Exceto por suas
botas e a camisa desabotoada, ele permanecia completamente vestido.
Uma parte dela queria arrancar o sorriso de satisfação de seu rosto, mas
outra, a parte que a colocara naquela situação exatamente por aquele motivo,
queria agradecer-lhe do fundo do coração.
Ele disse, então, com o descarado erguer de uma sobrancelha de ébano:
— E então?

A MULHER TÃO DELICIOSAMENTE ESPARRAMADA SOBRE SUA CAMA ERA UM


enigma. Exuberante, mas formal; inexperiente, mas obviamente consciente de
uma sensualidade interior que queria descobrir; reprimida, mas não ansiosa por
permanecer assim. Sua beleza, também, era gloriosa, o contraste entre os
impecáveis lençóis de linho branco e seu lustroso cabelo ruivo era atraente, os
seios cheios e perfeitamente moldados, as pernas delgadas e pálidas. Aqueles
lábios carnudos e macios que ele beijara eram da mesma cor dos mamilos,
ambos escurecidos até um tom rosado por causa de seus beijos. Tudo, desde o
delicado arco de suas sobrancelhas, à linha reta de seu nariz pequeno, passando
pelo formato de seu queixo, sustentava uma feminilidade quase frágil. Ele tinha
que admitir, estava cativado por sua aparência física.
Havia algo muito intrigante em saber que tinha acabado de dar-lhe o
primeiro clímax sexual de sua vida. O que quer que tivesse acontecido entre ela
e o falecido marido, não fora agradável, ele podia apostar, porque a timidez
certamente não era de sua natureza. A raiva que sentia em relação a um homem
já morto era vã, mas, ainda assim, existia. O que Wynn fizera com ela? A
percepção de que ela o temia era surpreendente, mas explicava muitas coisas.
Se Lorde Wynn já não estivesse em seu túmulo, acabaria dentro de um de
qualquer maneira, pois a violência contra mulheres ou crianças era algo que
particularmente lhe embrulhava o estômago e instigava a precisão de seu tiro
com uma pistola de duelo. Ele certamente se levantara bem cedo ao amanhecer
para lutar por causas menos dignas.
Isso mostrava que a oferta de Caroline para julgar sua aposta imatura não era
apenas o capricho de uma viúva entediada, mas uma lição de coragem. Ela dera
um grande passo para libertar-se daquele medo inato que a mantinha tão fria e
distante.
Caroline o olhou com aqueles olhos prateados marcantes. Repetiu suas
palavras como se ainda estivesse um pouco aturdida:
— E então?
Ele ainda sentia o gosto dela, o resíduo doce do gozo em seus lábios.
Nicholas sorriu apesar de sua ereção rígida e desconfortável.
— Acho que é injusto da minha parte perguntar como estou indo até agora,
então, vou me expressar de outra maneira. Gostaria de se vestir e dar um passeio
nos jardins? Eles ficam muito bonitos nesta época do ano. Eu tinha me esquecido
disso, porque faz muito tempo que não venho para cá, mas dei um passeio
enquanto a esperava chegar e foi um momento adorável.
— Mas você não... isso é... — Um rubor vívido inundou suas bochechas e
sua mão deslizou para a bainha da chemise, mas não a puxou para baixo para se
cobrir, embora fosse fácil adivinhar que queria fazê-lo... Seu olhar desviou-se
para a evidente excitação de Nicholas, visível através do tecido.
— Eu posso esperar.
— Você não parece querer esperar, Sua Gra... Nicholas.
Seu pênis ereto concordava com ela de todo o coração, mas se quisesse
conquistar sua confiança, era melhor ir com calma. Ele estendeu a mão, ajeitou o
chemise por cima das coxas e segurou o laço de seu corpete, arrependendo-se
imediatamente ao cobrir o que era, sem dúvida, o melhor par de seios que ele já
havia tocado e provado.
— Temos toda a semana.
Sua testa suave franziu.
— Fiz algo de errado?
A pergunta divertiu-o e o deixou perplexo ao mesmo tempo.
— O que faz você pensar assim, se é que posso perguntar?
Enquanto fazia a pergunta, deu-se conta que ela ainda não tinha feito uma
coisa. Mesmo que a tivesse beijado, provado seus deliciosos seios e a levado ao
clímax com sua boca, Caroline não o tocara, nem uma única vez. Nada dos
dedos dela em seu cabelo, nem aquele aperto revelador em seus ombros, nem
mesmo uma mão descansando em suas costas.
Nicholas fez um voto silencioso de que antes que aquela semana terminasse,
conseguiria mudar isso. Tinha a sensação de que ganhar sua confiança em um
nível intelectual era tão importante quanto conquistar seu lindo corpo.
Este era um desafio inesperado.
Ela respondeu sua pergunta de maneira oblíqua.
— Eu não quero… desapontar você. — A ideia era tão ridícula que ele sentiu
sua boca se contorcer.
Ele olhou nos olhos dela.
— Eu juro que não fez nada de errado. Estou intrigado por você de muitas
maneiras, minha senhora. Agora, então, vamos dar um passeio no jardim e talvez
nos conheçamos um pouco melhor? Os amantes devem ter mais em comum do
que o ato sexual, não acha? Apesar do que dizem, eu não valorizo uma mulher
apenas pelo prazer físico que ela pode me proporcionar.
Era verdade, mas com uma pequena licença poética. A proximidade
emocional também não era o objetivo de Nicholas. Esse era um caminho
desastroso que ele escolheu não trilhar. Gostava de ser amigo de suas amantes,
não mais do que isso. Pelo menos abria caminho para uma separação mais
amigável.
Caroline sentou-se, fazendo seus lustrosos cabelos ruivos ondularem, e um
leve sorriso enfeitou sua boca muito beijável.
— Vejo que você está determinado a ganhar essa aposta. Quem poderia
adivinhar que o duque diabólico teria essa sensibilidade romântica?
— Qualquer um que me conheça bem — disse ele em uma réplica suave. —
Quando estou com uma mulher bonita, quero conhecer tudo dela, não apenas seu
corpo.
— Quanto à última parte — ela disse ironicamente —, eu acho que nós
cuidamos disso no meu caso. Pareço ser a única despida.
Ele mal começara a apresentá-la às alegrias da carne. Nicholas sorriu.
— É um bom lugar para começar, devo admitir. Não se preocupe, estarei
despido mais tarde.
S e ele socasse a parede com seus punhos, alguém poderia notar, então talvez
fosse melhor que não o fizesse.
Mas, pelo diabo, era o que ele queria. Derek consumiu meio copo de vinho
em um único gole. A ideia de suportar o resto da noite o fazia querer sair
correndo pela porta. No entanto, se fizesse isso, seu segredo humilhante seria
exposto ao mundo, e era um que ele precisava guardar a todo custo. Se não
pudesse ter o que queria, pelo menos gostaria de manter algum vestígio de
orgulho masculino.
Mas, maldito inferno, por que Annabel tinha que parecer tão bonita? Claro
que sim, lembrou a si mesmo com honestidade sardônica. Sem dúvida, ela era a
mulher mais adorável da sala e, usando um vestido decotado de seda azul-claro,
que destacava seus olhos e os cabelos dourados, bem... ela estava deslumbrante.
Embora ele fizesse o possível para se mostrar indiferente em sua pose casual,
com um ombro encostado na parede, Derek a observava, seu olhar pensativo
acompanhando-a pela sala enquanto ela se misturava com os convidados,
aceitava parabéns e, o pior de tudo, agraciava os seus interlocutores com um
daqueles sorrisos deslumbrantes...
— Acho que tudo deu certo no final das contas, não é?
Thomas Drake, o irmão mais novo de seu pai, tomou um gole de sua taça de
vinho enquanto se juntava a Derek no canto da elegante sala de visitas.
Derek assentiu educadamente.
— Esplêndida festa, tio.
— Annabel está muito bonita, você não acha?
Derek rangeu os dentes.
— Sim.
— Lorde Hyatt está claramente encantado.
Isso era um eufemismo. O maldito homem estava babando em cima dela.
Derek preferiu não comentar. Hyatt não era o único idiota encantando naquela
sala.
— Sua tia Margaret pensou que uma festa familiar tranquila antes do grande
baile de noivado seria melhor. Eu concordo que é muito bom estarmos todos
juntos. Quando a celebração formal acontecer, haverá uma grande comoção.
Estou feliz que tenha podido vir.
Já que ele preferia ser arrastado nu através de um campo lamacento cheio de
arbustos e pedras por um cavalo fugitivo, Derek apenas conseguiu abrir um
sorriso frágil.
— Como eu poderia perder?
— A comida estava deliciosa, não estava?
Alto e magro, com um ar erudito, Thomas arqueou levemente as
sobrancelhas.
Derek mal conseguia discernir o que fora servido, poderia até ter sido cola.
Ele bebera muito durante todo o jantar e não deu mais do que algumas mordidas.
Soltou um grunhido que poderia ter significado qualquer coisa e procurou por
mais vinho. Era verdade que uma reunião familiar com trinta pessoas da família
era melhor do que um salão de festas cheio de convidados, mas apenas
superficialmente. Ainda precisou apresentar uma performance confiável de
indiferença ou, pior ainda, alegria pelo casal feliz, além de dedicar-se à
conversinha apropriada com tias-avós e primos distantes. Isso explicava sua
posição em um canto da sala, tão fora de vista quanto possível. Se pudesse ter se
escondido atrás de um dos sofás elegantes ou escalado a chaminé de uma das
várias lareiras de mármore italiano, ele teria feito.
Mas ele era o conde, sua presença fora solicitada por sua tia Margaret, a
quem era genuinamente afeiçoado, e o melhor que podia fazer era aguentar com
a maior imparcialidade possível, dadas as circunstâncias.
— Em um primeiro momento eu não tive certeza se Hyatt era o certo para
Annabel. Ela pode ser bem obstinada de vez em quando, e o homem é um pouco
manso. — Thomas riu. — Por que estou lhe contando isso? Você a conhece
desde pequena. Viu sua evolução de uma criança curiosa e travessa para uma
jovem que conhece muito bem sua própria mente. Acho que podemos concordar
que ela precisa de uma mão firme.
O que ela precisava, Derek pensou com uma reflexão nada bem-vinda, era
das mãos dele. Sobre ela, tocando cada centímetro delicioso, causando prazer
inesquecível e intenso...
Ele limpou a garganta.
— Tenho certeza de que Hyatt pode dominá-la.
— Ela vai dominá-lo, essa é a minha previsão.
Ter que participar do jantar já era ruim o suficiente, mas discutir como a
mulher que ele amava lidaria com seu casamento com outra pessoa era
infinitamente pior. Derek olhou para o outro lado da sala, notando a maneira
como a luz da vela proporcionava ricos reflexos dourados ao cabelo pálido e
empertigou-se. Ela era teimosa. Também brilhante, bonita e estava perto demais,
mesmo em uma sala lotada. Ele disse:
— Eu preciso de mais vinho. Por favor, dê-me licença.
— Sim, não posso deixar de notar que você parece um pouco infeliz. Mas o
vinho é a solução? — a pergunta tranquila de Thomas impediu Derek de fugir.
Ele congelou e se virou.
Infeliz era um eufemismo, mas ele achara que tinha feito um bom trabalho ao
esconder como se sentia.
Thomas continuou:
— Eu tentei ficar imparcial, mas decidi que não farei bem a ninguém com
isso. Já pensou em dizer como se sente?
Derek sentiu-se desesperado por um momento, porque queria agir como se
não tivesse entendido, mas tio Thomas o conhecia bem demais. Ele estava
presente quando Derek assumiu suas responsabilidades como Conde; fora como
um pai de muitas maneiras, desde que Derek havia perdido o seu tão jovem.
Então, soltou uma respiração irregular, passou os dedos pelo cabelo e foi
honesto.
— Ela me despreza.
— Você acha? — Thomas indagou suavemente.
— Ela já deixou claro o suficiente. — Derek ouviu a nota defensiva em sua
voz e fez o melhor que pôde para amenizá-la. — É minha culpa, e estou
sofrendo por isso, mas as coisas são o que são.
— Importa-se em me dizer o que aconteceu? Eu perguntei a Annabel sobre
seu afastamento, e ela se recusa a explicar.
Ele se importava? Inferno, sim, ele se importava. Isso traria de volta a
lembrança do rosto de Annabel naquela noite infeliz. Derek fez o seu melhor
para parecer indiferente, mas seu estômago se revirou.
— Receio que ela tenha me pegado em uma indiscrição bastante escandalosa
com Lady Bellvue. Tenho certeza de que você se lembra de quando foi nossa
hóspede em Manderville Hall no ano passado.
Para seu crédito, Thomas não o olhou com desaprovação. Nem surpresa.
— Supus que poderia ser algo assim. Lembro-me que a senhora em questão
o perseguiu durante toda a sua estada. Não fico surpreso ao descobrir que você
acabou sucumbindo.
Não, ele não deveria ter sucumbido. Poderia ter sido a maior fraqueza de sua
vida. Derek disse de forma explosiva:
— Diabos, tio, não me desculpe. Eu não deveria ter tocado em Isabelle, e eu
não teria, só que...
— Sim?
Só que ele entrou na biblioteca naquela tarde fatídica. Ainda se lembrava da
maneira como a luz do sol caía em blocos sobre o tapete oriental, como o ar
estava pesado com o cheiro de papel e couro amarelados, como ele não ficara
surpreso ao encontrar o quarto já ocupado, porque Annabel frequentemente
mantinha seu lindo nariz enterrado em um livro. Ela estava lá, parecendo
invulgarmente adorável em um vestido de musselina branca bordada com
pequenas flores amarelas, seu cabelo brilhante preso simplesmente por uma fita
de cetim em sua nuca. Quando ele entrou, ela olhou para cima e sorriu, e ele foi
mais do que um pouco pego de surpresa com a profundidade de sua própria
reação.
A um sorriso.
Sim, ele sabia que ela nutria uma paixonite por ele. No começo, divertiu-se
ao perceber isso, porque estava bem acostumado com mulheres a persegui-lo, e
era um jogo do qual gostava, mas não estava familiarizado com o fato de ser o
objeto de adoração de uma adolescente inocente. Depois, passaram-se vários
anos, e ela passou a não mais parecer a criança cativante que costumava segui-lo
por toda parte, mas transformara-se em uma jovem muito bonita. Mais do que
apenas sua transformação física de menina para mulher, também era inteligente,
articulada e, como seu tio já havia indicado, mais do que capaz de expressar sua
opinião sobre a maioria dos assuntos. Mesmo quando mais nova, era aventureira,
ansiosa pela vida e determinada a superar a horrenda tragédia de perder os pais
de uma só vez naquele terrível acidente. Provavelmente, ter ficado órfã em tão
tenra idade fosse a explicação para sua natureza resiliente e autoconfiante, ou
talvez este fosse apenas um detalhe inato de sua personalidade, mas o que quer
que fosse, ele gostava de seu ar de independência. Sempre gostara. Para a
menina, fora algo encantador. Para a mulher, era intrigante.
Para sua surpresa, ele passara a pensar nela muitas vezes, mesmo quando
estava em Londres, e ela, em Berkshire. Analisando em retrospecto, percebeu
que visitara Manderville Hall com mais frequência do que o necessário e
Annabel era o motivo. Sua risada, a tendência que ela tinha de se inclinar para
frente quando argumentava, a inteligência antiquada, que ela não fazia nenhum
esforço para esconder... tudo isso o atraía. Como era possível?
Ele, de todas as pessoas, interessado em uma jovem que mal saíra da escola?
Não.
Ou estava?
Naquela tarde fatídica na biblioteca, depois de fingir que procurava por um
livro, teceu alguns comentários provocativos para poder ouvir a melodia de sua
risada, então fez o imperdoável e a beijou. Oh, foi uma manobra bem executada,
porque ele era bastante experiente na arte do flerte, e Annabel não fora sequer
páreo para isso. Ele a atraiu até a janela para admirar a vista do jardim de rosas,
aproximou-se um pouco mais por precaução, pôs a mão nas costas dela, depois
inclinou o corpo e olhou-a. Ainda conseguia se lembrar vividamente da ligeira
ampliação de seus olhos quando percebera suas intenções, e a suave sensação de
tê-la desejosa em seus braços.
O gosto doce de sua boca o remetia a morango, calor e inocência, e o roçar
hesitante dos dedos de Annabel contra seu pescoço fez seu corpo inteiro se
revirar de desejo. Com o instinto infalível de uma mulher, ela se inclinou para
ele, entregando-lhe tudo, e ele aceitou a oferta preciosa, por mais que o
condenasse direto ao inferno.
Fora o primeiro beijo dela, e ele fora o escolhido.
Mais do que isso, ele quisera ser o primeiro.
No entanto, a realidade tinha o péssimo hábito de se fazer presente, e assim
foi, mesmo quando ele ergueu a cabeça e olhou em seus olhos. Eram azuis, um
tom puro que ele podia comparar a um céu de verão sem nuvens, e ela mantinha
um olhar sonhador de felicidade, enquanto um sorriso radiante curvava seus
lábios macios, ainda úmidos por causa do beijo.
Então ela disse: Não pare. Em um sussurro inocente sem fôlego que o trouxe
de volta à fria realidade.
Não pare. Ela estava louca? Claro que ele tinha que parar.
Que diabos acabara de fazer?
Ele tinha vinte e sete anos, e ela ainda não tinha feito dezoito. Ele era um
libertino com uma formidável reputação de devassidão, uma que talvez nem
merecesse, e ela era a inocente protegida de seu tio. A menos que desejasse
desposá-la, não deveria colocar um dedo nela, muito menos encorajar sua
paixão.
Na época, a palavra casamento o apavorava. Ele não saberia dizer se ainda
lhe causava o mesmo efeito, mas era um tipo diferente de perspectiva.
Então, num ato ainda mais covarde do que beijá-la, ele resmungou alguma
desculpa, saiu do cômodo abruptamente e a evitou o resto do dia porque não
tinha ideia de como lidar com os tumultuosos sentimentos de culpa, confusão e
algo um pouco mais difícil de definir. Quando isso acontecera? Quando a criança
se transformara em mulher e quando foi que percebeu a mudança?
Além disso, em que momento começara a se sentir atraído? Não apenas por
sua recém-descoberta maturidade, não apenas pela forma como o olhava e se
movia de maneira diferente, mas por ela. O brilho de sua risada, sua sagacidade
vibrante, o olhar singular ao fitá-lo.
Ele seduziu, encantou e conquistou muitas mulheres. Aquela jovem, pouco
mais que uma garota, não deveria ter efeito sobre sua vida ou suas emoções.
Mas tinha.
Mais tarde naquela noite, quando Isabella Bellvue o encurralou na estufa, ele
não resistiu a seus avanços. Faria qualquer coisa para tirar a imagem do rosto de
Annabel de sua mente. Por sua má sorte, ou talvez destino, Annabel veio
procurá-lo.
O olhar desiludido em seu rosto antes de se virar e fugir da sala ficaria
gravado na memória de Derek para sempre. No dia seguinte, ele fora ainda mais
burro ao agravar seu pecado, indo para Londres sem lhe dizer nada. No ano que
passou, Annabel mal lhe dirigira a palavra, e ele não a culpava. Duas vezes
tentou oferecer algum tipo de desculpa banal, mas em ambas ela apenas se
afastou antes que conseguisse mais do um breve diálogo. Depois da segunda vez,
disse a si mesmo para simplesmente deixar o incidente para trás e esquecê-la,
porque o mundo estava cheio de mulheres bonitas que não o desprezavam.
Palavras inteligentes, mas o fantasma daquele beijo permaneceu.
Ele chegou à conclusão de que não iria arrancá-la tão facilmente de sua vida,
mas isso pouco importava agora. Ela o dispensara ficando noiva de outro
homem.
— Só que eu sou um maldito idiota — disse Derek com certa dificuldade.
— Neste caso, eu concordo. — Thomas sorriu de um jeito afável. — Mas,
novamente, a maioria de nós pode dizer a mesma coisa. A verdadeira questão é o
quanto você quer remediar o dano causado. Na minha opinião, o desdém de
Annabel é um indicativo de suas emoções ocultas. Quando criança, ela adorava
você, e quando se transformou em uma mulher, esse sentimento pareceu se
aprofundar. Encontrá-lo em uma situação comprometedora com outra mulher
provavelmente foi doloroso. Talvez você devesse tentar consertar o estrago.
— Ela mal fala comigo e, além disso, caso tenha escapado à sua atenção,
está prometida a outro.
Thomas olhou para onde ela estava, ao lado de seu noivo, com uma
expressão pensativa.
— O que eu notei, Derek, é que ela não está feliz, não importa o tipo de
fachada que apresente em público. Eu acho que Hyatt é um homem amável, e ela
gosta dele o suficiente, mas não é um caso de amor. Não da parte dela.
— A maioria dos casamentos não é — Derek falou com a autoridade de um
homem que sabia que dizia a verdade. Fazia parte da vida na alta sociedade. O
amor não era requisito para uma união vantajosa.
Thomas não pareceu dissuadido.
— Nós dois sabemos que Annabel merece a felicidade, não um mero
contentamento.
Uma conversa como aquela e um copo vazio? Nenhum dos dois era atraente.
Derek fez um gesto impotente com a mão.
— Parece-me que ela escolheu seu caminho.
— Talvez uma opção diferente lhe desse outra direção. Diga-me, se ela fosse
livre e você pudesse persuadi-la a lhe dar uma segunda chance, estaria disposto a
se casar com ela?
— Sim.
Bom Deus, ele nem sequer hesitou. Precisava de algo mais forte que vinho.
Tinha mesmo acabado de dizer que consideraria casamento?
O tio Thomas lançou-lhe um sorriso radiante e disse secamente:
— Viu? Você não age como um tolo o tempo todo, exceto pela sua recente e
ultrajante aposta com Rothay...
— Não foi a minha melhor ideia — admitiu Derek, sentindo-se estremecer
por dentro. — Mas o anúncio de noivado de Annabel surgiu no jornal naquela
manhã. Ficar bêbado pareceu a coisa certa a fazer.
— Como agora?
— A insensibilidade tem seus méritos de vez em quando.
— A coisa certa — informou Thomas — é fazê-la mudar de ideia. Se
Annabel não fala com você, e tenho certeza de que é porque seus sentimentos
ainda existem, coloque esse talento lendário em prática para convencê-la. Deus
sabe que você o aperfeiçoou passando por uma infinidade de camas ao longo dos
anos. Não deixe que toda essa prática seja desperdiçada quando algo importante
está em jogo.
Derek o olhou desconcertado, enquanto seu tio se afastava para se misturar
com os convidados.
Thomas realmente sugerira que ele seduzisse Annabel?

O JANTAR FOI SIMPLES , MAS DELICIOSO DO JEITO QUE APENAS UMA REFEIÇÃO
campestre poderia ser. A manteiga estava fresca, os legumes recém-colhidos e
cozidos até ficarem macios, a carne saborosa e banhada em um rico molho
marrom. Para sobremesa, a Sra. Sims preparara uma torta de frutas com peras
dos jardins da propriedade, e Caroline saboreara cada mordida.
Ela também, surpreendentemente, saboreou a conversa. Eles se sentaram em
uma sala pequena e charmosa, geralmente usada para o café da manhã, com teto
baixo e janelas altas, a mesa intimista, o espaço nada grandioso, mas ainda muito
atraente. Os candelabros de luz bruxuleavam sobre uma mesa que fora bastante
usada ao longo dos anos, mas, como todo o resto, cada detalhe era bem cuidado,
do piso de madeira escura polida ao mural de um jardim de primavera na parede.
Era delicioso e informal, e nada do que ela esperara de um duque com uma vasta
fortuna na ponta dos dedos.
A falta de pretensão era bem-vinda e também a surpreendeu.
Ele a surpreendeu.
Não que ainda não se sentisse nervosa por causa da noite que os aguardava,
mas Nicholas Manning tinha uma habilidade singular de conseguir carregar a
maior parte da conversa sem monopolizá-la, e ela já notara que ele pertencia a
uma espécime rara de homem que não desejava falar mais sobre si mesmo do
que qualquer outra coisa.
Seus cavalos eram outra história. Ficou claro que seu passatempo era como
uma obsessão, e ela vira em primeira mão em Ascot o quão bem sucedido ele
era.
— Norfolk ganhou naquele dia — ele disse a ela, com um leve sorriso
extravagante e nostálgico, ao final de uma história, tocando seu copo de vinho
após o jantar. — Com um osso lacerado. Ele não queria sair do círculo dos
vencedores. Nunca vi tanta coragem. Meu treinador chorou. Admito que também
verti uma lágrima ou duas.
O duque diabólico chorando por um cavalo ferido quando poderia comprar
outro — ou centenas de outros — com sua fortuna?
Caroline olhou para ele do outro lado da mesa.
— Você sempre foi louco por cavalos?
Ele riu em um lampejo de dentes brancos.
— Acho que sim. Quando menino, eu fugia do meu tutor, mas ele sabia que
poderia me encontrar nos estábulos, se eu, misteriosamente, não aparecesse para
minhas aulas. Eu ainda considero o livro de puro-sangues mais interessante do
que o latim e antigo Grego.
Imaginá-lo como criança a intrigou. O motivo, ela não tinha certeza, talvez
porque sua própria infância tivesse sido tão sombria.
— Você tem irmãos e irmãs? — Caroline podia sentir o cheiro fresco e limpo
de grama e flores cortadas na brisa que penetrava pelas janelas abertas, a
serenidade da noite reconfortante.
— Uma irmã mais velha — ele respondeu prontamente. — Ela é casada com
um barão e tem três filhas. Charles trabalha para o Departamento de Guerra em
uma área que ninguém realmente menciona.
Tendo passado a infância desprovida de calor familiar, Caroline sentiu uma
pontada de inveja pelo carinho em sua voz.
— E a sua mãe?
— Geralmente reside em Kent, em Rothay House, mas ocasionalmente vem
para Londres. — Ele arqueou uma sobrancelha. — Ela possui uma força
formidável, e eu admito que faço o meu melhor para evitar um exagero em nosso
contato. Eu a respeito e adoro, mas ela nunca para de tentar arranjar minha vida
ao seu gosto.
Seu pai e sua tia tinham organizado as coisas em sua vida, e, definitivamente,
nada saíra ao seu gosto, então, Caroline podia simpatizar com aquele tipo de
cautela. Ela murmurou:
— Pelo menos você é o duque, e ninguém pode forçá-lo a nada.
Nicholas a olhou com uma expressão impassível.
— Eu entendo seu sentimento, mas não se engane. Todos nós temos
obrigações que não apreciamos. Títulos não são uma carta branca para fazermos
o que quisermos, acredite em mim. — Ele se mexeu, apenas melhor
acomodando seu corpo esguio, como uma pantera se esticando depois de uma
soneca no calor de uma tarde quente. — Você disse antes que sua tia faleceu. E o
seu pai?
Era justo. Ela perguntara a ele sobre sua família. Caroline balançou a cabeça.
— Ele ainda está em York e, sem discussões, chegamos a um acordo mútuo
para nos ignorarmos. Não nasci homem.
— Ah. — Como herdeiro de um ducado, aquela palavra demonstrava que ele
provavelmente a entendia muito bem.
A memória da recente visita de Franklin veio à mente, e ela suprimiu um
tremor de desconforto.
— O primo do meu marido, o atual lorde Wynn, é tudo o que posso chamar
de família e, no caso dele, prefiro não fazer isso.
A expressão no rosto de Caroline deveria ser a causa do cenho franzido de
Nicholas. Esparramado na cadeira, com toda sua insolência masculina, havia
uma arrogância inconsciente, mas definida, em seu comportamento, como se ele
fosse capaz de mudar as coisas.
— Ele é inconveniente?
— Ele quer ser — ela admitiu.
— Posso ajudar?
Ela era a dona de sua própria vida, e isto fora algo duramente conquistado.
— Por que oferece? — ela desafiou. — E por que eu aceitaria?
Depois de um momento em que eles apenas se olharam, Nicholas sorriu.
— Eu não tenho resposta para nenhuma das duas perguntas — ele
acrescentou calmamente. — Exceto que gosto de estar aqui com você. Isto —
Ele indicou a sala aconchegante, a mesa ainda cheia de pratos — é bom.
Que declaração simples. Mesmo assim, tão poderosa. Também não era parte
do flerte, não de uma maneira suave, como ela esperava, mas infinitamente mais
persuasivo porque evocava a possibilidade de sinceridade e não apenas de
sedução.
— Bom? — Ela arqueou uma sobrancelha e sorriu de volta.
O duque de Rothay recuou em seu assento, as longas pernas estendidas, a
taça de vinho na mão.
— Eu achei a palavra apropriada. Devo corrigir?
— Não — a resposta foi dada antes que ela pensasse.
A lembrança da gloriosa explosão de prazer que ele lhe proporcionou
naquela tarde surgiu. Várias vezes, pegou-se olhando-o do outro lado da mesa
pequena com uma sensação de descrença. Não apenas por estar ali, em sua
companhia, fazendo uma das coisas mais chocantes de sua vida, mas por
Nicholas não ser nada parecido com o que esperava. Parte da persona era
verdadeira; o carisma do aristocrata libertino estava lá, mas apenas na superfície,
pois o homem por baixo não parecia nada calculista nem simplesmente
interessado em um prazer egoísta. Mais cedo, ele soube que ela teria permitido
que fosse mais longe na cama, mas optou por não fazê-lo, mesmo que estivesse
mais do que pronto, algo que pôde facilmente notar. O fato de ele ter sido capaz
de perceber tão facilmente que ela estava nervosa e com medo poderia ter sido
humilhante, mas a sensibilidade demonstrada foi inesperada.
Um libertino perceptivo. Humm. Essa era uma faceta interessante pela qual
ela não esperava.
Mas, novamente, nunca soubera o que poderia esperar.
Entre seu pai indiferente e seu marido cruel e dominador, ela não tinha uma
opinião elevada sobre os homens em geral. Talvez uma revelação sexual não
fosse tudo o que levaria daquela semana luxuriosa.
— De manhã podemos cavalgar ao longo do rio, se você quiser.
Caroline voltou-lhe a atenção, sentindo um leve rubor nas bochechas por
causa de sua introspecção.
— Estou à sua disposição.
Os olhos de Nicholas se enrugaram nos cantos, de uma forma atraente,
quando ele sorriu.
— Eu gosto de como isso soa, minha senhora.
A nota rouca em sua voz a inquietou.
— Eu quis dizer... — Caroline começou a falar, bem lentamente, mas logo
parou. Na verdade, ela quis dizer exatamente o que havia dito. Nicholas ergueu
as sobrancelhas. Ele continuou sentado, confortável e relaxado. — Tudo tem
uma conotação sexual para você, Rothay?
Ela recuperou sua postura fria como quem se envolve em um manto. Com a
intimidade da refeição e a caminhada romântica no jardim mais cedo — onde ele
a presenteara com algumas rosas, chegando a colocar uma atrás de sua orelha —,
deixar as palavras escaparem foi mais fácil do que ela imaginou.
— Quando eu estou com uma mulher tão bonita quanto você,
provavelmente, sim. — Um movimento ergueu seus ombros largos, em uma
reação impenitente.
— Alguém resiste a você? — Ela teve que admitir que estava curiosa. Sua
reputação era formidável, mas fofocas nem sempre eram confiáveis.
Ele brincou com a haste de sua taça de vinho. A luz bruxuleante das velas
incidia sobre suas feições refinadas, destacando a perfeição de sua elegante
estrutura óssea e fazendo seu cabelo negro brilhar.
— Sou cuidadoso nas minhas escolhas.
— Em outras palavras, uma vez que você escolhe uma mulher em meio à sua
multidão de admiradoras ansiosas, ela se torna sua?
Ela ouvira os rumores, testemunhara o impacto que ele causava quando
entrava em um salão de baile ou quando passava pelo Hyde Park.
A risada dele foi baixa e suave.
— Você faz com que isso soe muito ridículo. Como escolher uma égua de
uma cavalaria.
Ela não era boa com brincadeiras espirituosas. Houve muito pouca prática
em sua vida.
— Às vezes sou honesta de mais — ela admitiu. — Minha tia alertou-me,
durante a maior parte da minha vida, que isso é pouco atraente e feminino,
embora minha governanta encorajasse o pensamento livre. Suponho que, até
certo ponto, seja por isso que fico tão quieta quando estou na sociedade. Deus
sabe que posso muito bem dizer algo bastante direto. Deve ser porque passei
tanto tempo sozinha quando criança. Não havia necessidade de mentir para mim
mesma.
Nicholas reclinou-se em sua cadeira, com toda a sua lânguida graça
masculina. Sua expressão era difícil de ler.
— Eu invejo isso, acredite ou não.
— Inveja o quê?
— A noção de que você tinha alguma privacidade em sua juventude e sua
capacidade de ser franca com suas opiniões. Desde o berço, sempre fui
lembrado, a todo momento, do fato de ser o herdeiro ducal e, acredite em mim,
ensinaram-me a ser político em meu discurso a partir do instante em que
pronunciei minha primeira palavra. Um título vem com certo nível de
responsabilidade e inevitável crítica social.
— Nunca pensei por este lado. — Caroline inclinou a cabeça para um lado,
estudando-o. — É difícil sentir pena de alguém bonito, rico e com um título, mas
há desvantagens em tudo, suponho.
— É difícil sentir pena de uma mulher que é primorosamente bonita, uma
herdeira e que poderia escolher qualquer homem em Londres, mas é possível
que ela ainda tenha seus demônios. — Sua percepção era muito próxima da
verdade.
Sim, Edward era um demônio, assombrando sua capacidade de viver uma
vida plena.
— Touché — ela disse friamente. — Espero exorcizar um dos meus esta
semana.
— Tendo experimentado o gosto da sua paixão, posso dizer com toda a
honestidade que será meu prazer ajudá-la.
Ele respondeu com uma veemência tão suave que ela lutou contra o vívido
rubor que a ênfase na palavra “prazer” lhe provocou, tentando, pelo menos,
reagir com igual sofisticação.
— E na próxima semana você terá esquecido de mim, não é assim que
funciona? Não se cansa de relações passageiras?
As críticas implícitas não perturbaram a autoconfiança de Nicholas.
— Eu pensei que você não estava interessada em permanência.
— Não estou — ela se apressou em concordar.
— Então estamos de acordo e podemos desfrutar um do outro sem reservas.
Acho que os sete dias serão muito agradáveis. — Ele olhou para a janela onde as
estrelas eram visíveis no céu de veludo negro, as cortinas e a janela abertas para
deixarem entrar a brisa deliciosa. — E noites.
Ela começava a concordar, embora ele não tivesse respondido sua pergunta.
Caroline cruzou as mãos no colo.
— Eu não esperava gostar de você.
Nicholas riu.
— Você é certamente direta, minha cara. Por favor, não me diga que tenho a
reputação de ser um sujeito desagradável.
— Não, você é considerado muito charmoso. Só tive minhas dúvidas se o
encanto era real.
— Ah, uma artimanha para atrair jovens donzelas para a minha cama, é isso?
— Algo brilhou em seus olhos escuros.
Aborrecimento, talvez? Não, ela não o conhecia bem o suficiente para julgar.
— Bem, sim.
— No entanto, você concordou em passar uma semana inteira na minha
companhia.
— Nós dois sabemos que tenho minhas razões.
Nicholas olhou para ela, com seu corpo alto e magro paralisado e uma
expressão enigmática.
— Vejo que estamos sendo muito honestos um com o outro. Acho
refrescante dizer a verdade. Muitas vezes os casos de amor são cheios de intrigas
e fingimentos. Já que estamos seguindo este espírito, direi que geralmente não
sou a favor de mulheres com pouca experiência na cama, nem durmo com jovens
viúvas que obviamente foram tratadas com rudeza no passado.
Talvez ela tivesse sido franca demais. Caroline sentiu um lampejo de alarme
de que a próxima coisa que ele faria seria cancelar a aposta. Para seu alívio, ele
continuou:
— Mas você é muito tentadora, minha senhora, e agora que entendo suas
razões para estar aqui, sinto-me mais do que honrado. — Ele acrescentou em um
tom quase informal: — Se o seu marido desprezível ainda estivesse vivo, eu
acabaria com sua vida sem valor em um único segundo.
Caroline registrou sua sinceridade com surpresa, porque a expressão sombria
em seus olhos desmentia o tom casual de sua voz.
Ela nunca tivera um defensor. Quando criança, fora protegida por sua tia
solteira autocrática, e ela mal tinha dezoito anos quando se casou. O arranjo fora
completamente negociado sem o seu consentimento, mas não percebera a
realidade devastadora até a noite de núpcias. Quando descobriu quão cruel e
insensível era o homem com quem fora forçada a se casar, ela o deixou e foi para
sua casa em York. Seu pai a enviou de volta, e Deus foi testemunha do quanto
sofrera por esse lapso de julgamento. As contusões levaram semanas para
desaparecer.
— Eu o odiava. — Era difícil manter a voz casual, mas ela fez o melhor que
pôde. — A lógica me faz supor que nem todos os homens são como ele, mas a
experiência às vezes supera o bom senso.
— Então, você precisa de algumas boas experiências para compensar as
ruins.
A leve nota de rouquidão da bela voz do duque causou-lhe um arrepio na
espinha.
— Concordo. É por isso que estou aqui. — Caroline endireitou os ombros.
— Então talvez seja hora de nos retirarmos. — Nicholas levantou-se em um
movimento gracioso e estendeu-lhe a mão.

S EU CORPO INSATISFEITO QUERIA PRESSA , MAS SE HAVIA UMA COISA QUE


Nicholas aprendera nos últimos anos, enquanto experimentava algumas das mais
belas damas da sociedade, era a contenção sexual. As mulheres demoravam mais
para despertar, algumas eram aventureiras na cama, outras recatadas, algumas
francamente insaciáveis. Obedecer suas amantes em qualquer uma de suas
necessidades nunca fora um problema, mas Caroline era completamente
diferente. Sob aquele exterior primorosamente belo, ela estava machucada e,
embora tivessem estabelecido um frágil vínculo de confiança, ainda era um
grande desafio.
Ele queria carregá-la pelas escadas em um gesto romântico dramático, mas
rejeitou a ideia, porque iria lembrá-la de seu tamanho e força superiores. Em vez
disso, escoltou-a educadamente, segurando a dobra de seu braço, como se a
levasse a uma sala formal ou a uma noite na ópera.
A verdade era que ele ainda estava muito desconfortável.
E ela também.
Por que isso o intrigava?
Talvez devesse estar entediado, mas realmente não era o caso. Caroline era
forte, sincera, distante... e ainda vulnerável, completamente feminina, e, em sua
opinião, corajosa de uma maneira singular.
Muito diferente de uma lembrança de seu passado. Esta senhora em
particular era tudo menos indefesa, e fora ele quem perdera a cabeça. Desde
então, Nicholas fizera questão de ter a vantagem.
Sempre.
Quando chegaram ao corredor do andar de cima, Nicholas decidiu pelo
quarto dela, pensando que, se usassem o dele novamente, Caroline se sentiria
mais uma vez dominada e em terreno incerto.
— Aqui — ele murmurou, abrindo a porta. — Peço desculpas pela falta de
aia para uma dama, mas eu esperava que você quisesse mais privacidade do que
conveniência.
— O quarto é lindo — ela murmurou, hesitando apenas um momento antes
de entrar. — E você está certo. Eu posso viver sem uma aia.
Ele deu uma olhada superficial no mobiliário, não tendo certeza se já havia
prestado atenção. Não sendo casado, nunca se preocupara em observar o quarto
adjacente.
— Estou feliz que o quarto lhe agrade e que eu possa ser gentil e servi-la.
Deixe-me despir-te.
— Sua reputação de ser gentil é lendária.
Maldita fosse a sua reputação, Nicholas pensou irritado, consciente do que as
fofocas diziam sobre ele e ainda admirado, aos vinte e oito anos, que alguém
estivesse tão interessado em sua vida. Então, respondeu quase bruscamente:
— Eu só quis dizer que se você precisar de alguma coisa durante a nossa
estada, por favor, peça-me.
— Acabei de ofendê-lo?
Ele pegou os ombros dela e a segurou com uma suave pressão de suas mãos
para que se virasse.
— O fato de eu ter uma reputação me ofende. Eu preferiria que minha vida
pessoal não servisse de alimento para a fábrica de fofocas.
— Então talvez não devesse fazer apostas públicas ultrajantes a respeito de
suas proezas sexuais. — Ela falou em um tom seco, mas Nicholas sentiu uma
leve apreensão em sua voz quando ele afastou seu cabelo e começou a
desabotoar seu pálido e reluzente vestido de noite verde. Com uma facilidade de
anos de prática, ele abriu os botões, deslizou a peça de seus ombros delgados e
puxou os grampos de seu coque simples. A massa de seda caiu em cascata por
entre os dedos e pelas costas graciosas, e ele sentiu o cheiro do perfume dela, um
aroma profundo de lírio do vale. Sustentando o peso cálido de suas madeixas, ele
beijou sua nuca com uma pressão lenta e tentadora, permitindo que sua boca se
demorasse um pouco mais quando sentiu que ela estremecia em resposta.
— Eu prestaria atenção ao seu conselho, linda Caroline, mas se eu não
aceitasse o desafio de Manderville, você não estaria aqui, estaria? Talvez eu deva
fazer apostas deste tipo com mais frequência. — Ele deslizou o braço ao redor
de sua cintura e começou a acariciar seu pescoço, beijando, provando sua suave
e exuberante pele até que ela se inclinou contra ele, permitindo-o ver o rápido
erguer de seus seios cheios sob o laço do chemise, seus mamilos contra o tecido
puro.
— Você consegue sentir como eu a quero? — Ele sabia que ela conseguia,
pois seu braço a segurava em frouxa mas insistente persuasão contra sua já
rígida ereção. — Faz alguma ideia de quanto controle uma mulher possui sobre
um homem quando ele a deseja?
— Não — o sussurro era pungente e suave.
Infelizmente, ele tinha certeza de que ela acabara de contar a verdade. Não
diminuiu em nada seu ardor, mas amenizou seu comportamento.
— Você tem toda a minha atenção, acredite em mim — ele prometeu. —
Deixe-me mostrar-lhe.
Ele a ergueu nos braços, afinal, com cuidado, como se ela fosse uma peça de
vidro, e a levou para a cama de dossel. Daquela vez, removeu tudo, incluindo
seu chemise, de modo que Caroline se repousava nua e exuberante sob o brilho
das velas, acesas para sua conveniência ao se recolher. Nicholas despiu-se
deliberadamente, retirando o paletó, a gravata, a camisa e as botas enquanto a
observava, dando-lhe todas as oportunidades para dizer-lhe para parar ou pedir
que cobrisse seu corpo exposto.
Ela não fez nenhum dos dois.
Graças a Deus, pois ele estava em chamas.
Quando abriu as calças e as deslizou por seus quadris, os adoráveis olhos
cinzentos se arregalaram, e ela não fez segredo ao estudar sua ereção, enquanto
os lábios macios se separavam em evidente surpresa.
O fato de ela nunca ter visto um homem excitado era inquietante.
Inferno, outro obstáculo para superar.
Era fácil adivinhar que o marido a procurava à noite, no escuro, para exercer
seus direitos de uma maneira que Nicholas imaginava que tinha mais a ver com
uma brutalidade egoísta do que qualquer outra coisa. Todos concordavam que
era impossível que um homem violasse sua esposa, pois esta era essencialmente
sua propriedade, mas ele discordava. Se uma mulher estivesse relutante e
despreparada, era um crime pegar o que não era dado livremente.
Ele subiu na cama ao lado dela e não fez nada mais do que tocar seu lábio
inferior, traçando a curva encantadora com um dedo exploratório.
— Eu mencionei que você é incrivelmente linda?
— Você tem sido muito prolixo com seus elogios, Nicholas. — Os cílios de
Caroline baixaram uma fração, mas ela não se afastou e parecia muito menos
tensa do que estivera no encontro deles durante a tarde.
— Todo homem na Inglaterra me invejaria se soubesse onde estou agora.
— E sem dúvidas toda mulher sentiria o mesmo por mim. Especialmente as
legiões que me precederam e sabem o que estão perdendo.
Discutir as amantes do passado nunca era inteligente sob nenhuma
circunstância, e ele não pretendia começar agora, não com a necessidade carnal
que descaradamente controlava seus sentidos. O que Nicholas cobiçava estava a
poucos centímetros de distância, com uma boca cálida e convidativa, e um corpo
voluptuoso que estava pronto para lhe pertencer. Só precisava ter certeza de que
ela estava igualmente envolvida.
— Beije-me — disse ele com um forte incentivo.
Deixe-a assumir a liderança. Parecia uma ideia melhor, porque ele não
queria assustá-la ou apressá-la.
Por um momento, ela hesitou, mas depois se inclinou e roçou os lábios
contra os dele. Foi preciso força de vontade para não puxá-la para si com força e
devorá-la, mas Nicholas ficou imóvel enquanto Caroline timidamente
pressionava sua boca contra a dele, afastando-se quase que imediatamente.
Foi um começo singelo, mas promissor.
— Isso é um beijo? — Ele ergueu uma sobrancelha provocativamente. —
Esta tarde eu a beijei, lembra? Gostaria de vê-la se esforçar um pouco mais,
Lady Wynn.
Por um momento, ela apenas o olhou, com o cabelo vibrante derramando-se
sobre os ombros magros, os olhos em um tom desafiador. Então ela se inclinou
novamente, daquela vez pousando as pequenas mãos em seus ombros e abrindo
os lábios. Nicholas inclinou um pouco a cabeça para aprofundar o beijo e a
tentativa dela de deslizar a língua para dentro da sua boca fez com que Nicholas
sorrisse por dentro.
Apesar de seu passado, ele tinha a sensação de que ela seria uma boa aluna.
Os seios nus e macios roçaram seu peito, e ele reprimiu um gemido, sentindo
o longo cabelo cair sobre os dois. Sem fazer nada além de tocá-la nas costas, ele
traçou a curva de sua espinha, deixando-a controlar o ato. Seus dedos se
emaranharam em suas madeixas, e um baixo som de aprovação escapou da
garganta de Caroline enquanto continuava a beijá-lo com crescente confiança.
Ambos estavam sem fôlego quando ela finalmente se recostou.
— Melhor?
— Muito.
Sua ereção pulsava com cada batida de seu coração, e Nicholas não podia
esperar para estar dentro de Caroline, mas se sentiu relutantemente divertido
quando o olhar dela foi direto para o membro duro e inchado contra seu
estômago. Ela parecia cautelosa, mas ele foi encorajado por um vislumbre de
interesse em seus olhos.
Em um movimento deliberadamente lento, Nicholas pegou a mão dela e a
colocou sobre sua ereção.
— Eu não quero ser um mistério para você, de forma alguma.
Dedos finos timidamente envolveram a circunferência, e ela mordeu o lábio
inferior.
— Minha ignorância é mortificante.
Ele respirou fundo quando ela o apertou com delicadeza.
— Fique tranquila, você pode me perguntar qualquer coisa e eu responderei
se puder. Nunca entendi por que a sociedade prefere manter as mulheres no
escuro quando se trata de questões sexuais. Os homens discutem isso à vontade.
Tende a ser um tópico popular em conversas.
— Caso você não tenha notado, seu gênero tem direitos que nos são negados.
Ela tinha um bom argumento, mas era difícil falar enquanto seus dedos
exploravam seu membro rígido por inteiro.
— Eu notei — ele conseguiu admitir, reprimindo um gemido quando ela
limpou uma gota de líquido da ponta de seu membro e olhou para o dedo. —
Mas tenha em mente que parte da razão é possessividade. Como queremos
manter nossas filhas castas e nossas esposas apenas para nós, acho que a ideia
geral é que quanto menos vocês souberem sobre o prazer que homens e mulheres
podem dar um ao outro, melhor.
— Vamos começar um debate intelectual sobre este assunto? Acho que você
não vai gostar das minhas opiniões sobre ele. — Ela o acariciou, olhando para
baixo, entre as pernas dele, enquanto segurava seus testículos. — Eles são
pesados.
Para alguém com total falta de experiência, ela certamente estava fazendo
um bom trabalho em despertá-lo para um estado quase febril. Pesado? Ele estava
prestes a explodir apenas pelo toque inocente, e isso o assustava. Queria ir
devagar, pelo menos até que ela entendesse o jogo que ele sabia tão bem como
jogar.
— Estou gostando da sua curiosidade — ele explicou com um esforço
monumental para parecer relaxado enquanto ela o acariciava —, mas talvez seja
melhor se for a minha vez.
Toda deliciosa com cabelos lustrosos e pele pálida, Caroline parecia um
pouco confusa.
— De tocar em você. — Ele se mexeu para tomá-la em seus braços e se
moveu para colocá-la costas e apoiar-se sobre ela, seu peso descansando nos
cotovelos. Eles deveriam simplesmente começar, Nicholas decidiu, enquanto
acariciava primeiro seu quadril, passando para a parte interna da coxa, e então
encontrando o calor de seu sexo. Seus dedos separaram as suaves dobras
femininas, e Caroline imediatamente desviou o olhar, ficando tensa.
Maldição.
— Eu não vou te machucar — ele sussurrou, traçando uma linha através de
sua mandíbula com a boca. — Quero que se sinta bem, linda Caroline. Se estiver
bem excitada, vai se divertir, dou a minha palavra. Você já está um pouco
molhada, o que significa que seu corpo entende o que sua mente quer rejeitar.
Relaxe, e eu vou provar para você.
Ele a tocou então. Em toda parte. Cada toque, cada carícia, pontuada por
doces beijos suaves e palavras sussurradas. O ponto de pulsação logo acima do
mergulho da clavícula. A delicada curvatura de seu cotovelo. Sua língua
passando rapidamente pelo punho. O seu dedo mindinho em sua boca, tomado
com ternura provocativa, enquanto acariciava seu ombro nu e a segurava contra
si. Era uma exploração, uma jornada de conhecimento e persuasão. Ambos nus,
peles quentes se tocando, conforme ele lhe fazia amor sem realmente penetrá-la.
O primeiro suspiro ofegante fez com que Nicholas compreendesse que sua
paciência estava sendo recompensada, o seguinte gemido o encorajou ainda
mais, e quando a mão dele escorregou por entre suas coxas e ele a estimulou
com uma leve pressão, ela o agarrou com urgência.
Os dedos de Nicholas ficaram molhados, e a reação do corpo dela ao seu
toque não podia ser questionada.
E ele considerou esta resposta muito poderosa, porque sabia que envolvia
risco, confiança e uma dúzia de coisas que ele abandonara, quando se tratava de
paixão, há pelo menos uma década.
O impacto foi extraordinário. Ela não confiava facilmente. Bem, nem ele,
então tinham isso em comum, embora suas reservas fossem diferentes. No
entanto, se o erguer de seus quadris em súplica significasse alguma coisa, era um
sinal de que ela estava superando esse problema. Nicholas, por sua vez, pensou
ter fechado a porta com firmeza na cara dos seus fantasmas.
Talvez, no entanto, estivesse errado.
O passado se chocou com o presente, e embora não entendesse
completamente as motivações de Caroline para estar ali, sentiu uma conexão
com sua adorável companheira de cama que era mais do que incomum.
Era como a situação deles, tão original quanto o próprio pecado.
Seu cuidado foi recompensado quando ele finalmente a levou a um clímax
estremecido. E depois outro. Logo quando ela começou a relaxar, ele repetiu,
deslizando os dedos profundamente pelo calor úmido e tentador, sentindo
aquelas contrações traidoras enquanto ela ofegava e fechava os olhos.
A delicada estreiteza de sua passagem fez com que ele hesitasse por um
momento em uma vertiginosa onda de necessidade. Os músculos internos do
sexo de Caroline se apertaram ao redor de seus dedos invasores enquanto tentava
começar a explorar a promessa do paraíso.
A expressão em seu rosto dizia tudo o que ele precisava saber, e ele se sentiu
aliviado, mesmo quando o suor começou a fazer sua pele formigar por conta do
esforço para não se mover para colocar entre aquelas adoráveis coxas − e possuí-
la. Caroline parecia saciada, até mesmo atordoada, com a boca entreaberta, os
olhos arregalados, um leve rubor nas bochechas por causa da liberação sexual.
— Nicholas — ela sussurrou maravilhada e baixou os cílios.
Foi toda a permissão que ele precisava para se mover. Para ajustar-se no
lugar certo, usar seu novo poder sobre ela para abrir ainda mais suas pernas e,
em seguida, alcançar o próprio prazer.
Ele não fez isso.
Uma vozinha — uma que ele queria banir para o inferno —disse-lhe que não
era a hora certa.
Ainda não.
Sentindo-a lânguida, ele a ajustou em seus braços, tentando acalmar a
necessidade traiçoeira de possuí-la. Ela não falou nada, mas ele pôde sentir as
batidas apressadas de seu coração, a suavidade de sua pele sedosa, o movimento
suave em seu peito enquanto ela respirava e finalmente levantava a cabeça.
— Eu... eu... — ela vacilou, e então engoliu em seco audivelmente.
Ele estava deitado ao lado dela, sentindo uma tensão sexual tão forte quanto
resignada, por isso, sorriu. Quando acontecesse, ele tentaria garantir que
chegassem ao clímax juntos.
— Você o quê?
— Eu gostei daquilo.
— Imaginei que gostaria. — Ele lutou contra um sorriso que provavelmente
a enfureceria e acrescentou suavemente: — E fico feliz com isso.
Ela sacudiu o cabelo reluzente, e a visão de sua nudez voluptuosa sob o
brilho da luz baixa era um desafio à sua decisão de esperar.
— Você não entende a profundidade desse elogio, Nicholas.
— Ao contrário, querida, tenho a sensação de que sim.
— Você disse antes que não faria presunções.
A coragem em sua voz o fez rir.
— Você não pode ter as duas coisas. Ou eu entendo de mulheres, e foi por
isso que você decidiu participar desta aposta em primeiro lugar, ou eu não sei de
nada. Qual dos dois?
— Você não me conhece. — Olhos magníficos exibiram um tom prateado,
mas era difícil para ela se livrar da arrogante e distante Lady Wynn mesmo
quando estava em um delicioso momento descontraído ao lado dele.
Sua ereção latejava quase dolorosamente. Jesus, a restrição tinha um custo.
Quando finalmente fizessem amor, teria que valer a pena.
E talvez ele realmente fosse um pouco convencido.
Ele capturou seus ombros delgados e puxou-a para um beijo lento. Quando a
sentiu derreter contra seu corpo, sentiu um lampejo de triunfo. Movendo a boca
para o ouvido dela, Nicholas disse, com um tom rouco:
— Tudo bem, eu admito que não a conheço tão bem quanto gostaria. Temos
toda a semana pela frente e mal começamos a nos familiarizar. Melhor assim?
Um suspiro resultante flutuou em sua garganta.
— Sim.
O som de uma voz profunda a deteve em uma onda de desânimo.
Impregnando-se em cada poro, em cada terminação nervosa, desde o
couro cabeludo até a ponta dos dedos dos pés. Por isso, Annabel ficou parada de
pé do lado de fora da porta da sala informal e respirou fundo.
Ninguém lhe informara que Derek estaria lá para o chá.
Ele nunca vinha para o chá. Nunca.
Deus no céu, vê-lo na noite anterior já não fora ruim o suficiente? Seu rosto
ainda doía pelo esforço de sorrir durante a pequena festa que Margaret
organizara. A comemoração fora um gesto carinhoso, e ela sabia que Thomas e
Margaret não queriam mais do que apoiar sua decisão de se casar com Alfred.
Todos os Drake sempre a trataram como parte da família e estavam
maravilhosamente entusiasmados com o casamento, mas, infelizmente, era
esperado que Derek fosse convidado para tudo. Ele sempre fora, mas geralmente
recusava os entretenimentos mundanos. Exceto pela noite anterior, quando
apareceu inesperadamente, pecaminosamente bonito e extremamente entediado.
Ele também saiu cedo, escapando não muito depois do jantar. Annabel
conseguiu ser educada durante sua breve troca de amabilidades, mas precisava
mesmo passar por tal provação novamente tão cedo?
— Esqueceu alguma coisa, criança?
Ela girou ao ouvir o som da voz de seu guardião. Encontrou Thomas
sorrindo para ela, seu rosto bem-humorado enrugado com seu sorriso habitual.
Ele disse:
— Parece que estamos um pouco atrasados, não estamos? Estou morrendo de
sede, e um bolinho não me cairia nada mal agora. Vamos entrar?
Que escolha havia? Ela deveria ter corrido para o seu quarto e alegado uma
dor de cabeça quando tivera a chance, em vez de hesitar na porta. Poderia ter
mandado sua aia descer com a notícia de que não se juntaria a eles para o chá,
porque estava indisposta. Só não pensou rápido o suficiente.
— Sim — ela murmurou em uma mentira descarada, porque seu estômago
de repente se contorceu em nós —, parece ótimo.
Eles entraram juntos, e embora ela desejasse não ter que reconhecer a
presença do Conde de Manderville, quando ele educadamente se levantou,
rangeu os dentes e deu um firme meneio de cabeça. Tudo era tão familiar; o
movimento das cadeiras azuis cobertas de brocado, o velho piano no canto, o
tapete creme e índigo em um padrão oriental, até o carrinho de chá estacionado
próximo à polida mesa antiga, mas tudo parecia diferente com ele ali.
Sempre fora assim. Se ele estivesse no ambiente, ela não notava mais nada e
sentia um feroz ressentimento pela própria aflição.
Margaret, corpulenta, bonita e elegante, sorria serenamente, com a xícara na
mão.
— Derek passou por aqui no momento certo, e eu insisti que ficasse para o
chá.
Annabel não disse nada, desviando o olhar, sabendo que não havia
possibilidade de Thomas e Margaret não terem notado o estado atual de
animosidade entre o sobrinho e ela mesma. Uma vez, Thomas chegou a tentar
investigar, mas ela não pretendia contar a ninguém sobre o fatídico beijo ou
sobre o que tinha testemunhado pouco depois.
Ainda estava vívido o bastante em sua memória, queimando com clareza
dolorosa. Derek debruçado sobre Lady Bellvue — que por acaso tinha a
coragem de ser sofisticada e bonita —, cujo corpete encontrava-se aberto, e a
boca...
Naquele momento, as lágrimas embaçaram sua visão, e Annabel correra para
fora da estufa o mais rápido possível, antes que desmoronasse em soluços bem
na frente de ambos. Não, ela guardou esta reação para mais tarde. Quando
chegou ao quarto, chorou até não restarem mais lágrimas. Era irônico que o
terno beijo na biblioteca tivesse sido o ápice de todas as suas fantasias
românticas, mas que, no mesmo dia, seus sonhos idealistas tivessem sido
destruídos.
Ela amadurecera naquele exato segundo ao perceber que a aparência do
jovem com o sorriso fácil e a natureza generosa eram fachadas para esconder sua
superficialidade e indiferença aos sentimentos dos outros. Ela sempre pensou em
sua inteligência bem-humorada inata como uma forma de analisá-lo como ser
humano, mas agora entendia que suas falhas excediam em muito suas virtudes.
Os rumores eram todos verdadeiros. Tudo o que ele queria era uma voluntária
inocente. Tamanha insensibilidade revirava seu estômago. Quantos corações ele
tinha partido além do dela? O que ela achava ser amor fora uma ilusão, nada
mais do que isso.
— …torta?
Annabel ergueu os olhos e piscou.
— O quê?
O objeto de seus pensamentos gesticulou em direção ao prato no carrinho de
chá. Seus vívidos olhos azuis estavam velados, mas havia apenas um leve
lampejo de sorriso em sua boca bem feita.
— Posso comer uma?
— Eu tenho certeza de que você comeu muitas. — As palavras sair sem
querer, e para piorar a situação, a doce malícia em sua própria voz era uma
traição à sua antipatia.
Deus do céu, ela realmente disse isso em voz alta?
Margaret murmurou:
— Oh, querida.
As sobrancelhas escuras de Derek se ergueram. Sentado preguiçosamente em
sua cadeira, suas pernas infinitas estendidas e uma mão de dedos longos
segurando a xícara, ele parecia irritantemente divertido. Estava, como de
costume, incrivelmente bonito em uma jaqueta azul escura, calça marrom e botas
polidas; sua gravata, como sempre, atada à perfeição. A luz de uma das janelas
altas realçava os reflexos dourados de seu cabelo e acentuava a linha perfeita de
maxilar e suas sobrancelhas. Ele disse pausadamente:
— Admito gostar de tortas de todos os tipos, mas com chá, prefiro a de
limão.
Envergonhada, porque se prometia a cada dia que deixaria de se importar
com o que acontecera entre eles, Annabel pegou o prato de doces e empurrou-o
para ele. Os confeitos deslizaram perigosamente em direção à borda, mas,
felizmente, nenhum deles caiu sobre o caro tapete floral estampado. Já tinha
feito papel de tola o suficiente sem precisar fazer bagunça também.
Maldito fosse, pois ele demorou a escolher um, fazendo-a segurar o prato
como uma serviçal submissa. Sem dúvidas deveria dormir com elas também,
refletiu calorosamente, sem ter certeza se estava mais brava consigo mesma por
perder seu autocontrole tão rápido ou com ele por achar a situação cômica.
Sua confiança e elegância sempre pareciam enfatizar a falta de sofisticação
dela, mas Annabel estava aprendendo. Evitá-lo tornou-se uma forma de arte,
desde aquela noite horrível, e se perguntou mais de uma vez se ele não estaria
fazendo um esforço consciente para recusar convites para eventos onde ela
também estivesse presente. Naturalmente, em ocasiões familiares, eles
precisavam interagir um pouco, mas nenhum dos dois fazia mais do que
reconhecer a presença um do outro.
Derek nunca aparecia para o chá. Especialmente quando sabia que ela estaria
presente.
— Obrigado. — Ele arrancou um doce da bandeja e o colocou em seu prato.
O movimento foi gracioso e elegante de um modo completamente masculino,
assim como tudo em relação a ele, inclusive aquele sorriso irritante em seu rosto.
— Por nada — ela disse, odiando o tom rouco de sua voz.
— Creio que não tive ainda a chance de parabenizá-la por seu compromisso
formal, Annie. Ontem à noite você estava muito ocupada, e eu tive que sair mais
cedo.
Santo Deus, não me chame de Annie.
Ele era o único que usava o apelido. Sempre o fizera, desde que ela era uma
criança. Mas não era mais uma menina, era uma mulher, e o som familiar e a
maneira suave como soou, provocou-lhe memórias que seria melhor rejeitar.
Ela se empertigou, mas conseguiu assentir.
— Vou dizer a Alfred que você deseja o nosso bem.
— Ele é um sujeito bastante agradável.
Ela sentiu um lampejo de irritação no tom de voz dele. Apenas o menor
indício de menosprezo, como se agradável significasse maçante e indigesto.
Não, Alfred não era arrojado ou excitante, mas era seguro. Em defensiva, ela
apontou:
— Ele é um verdadeiro cavalheiro.
A implicação de que Derek não pertencia a essa categoria fora clara. Ou ela
certamente esperava que soasse assim, porque era exatamente o que queria dizer.
— Eu concordo com Derek, Lorde Hyatt é bastante amável. — Thomas
parecia sem graça enquanto tomava um gole de seu chá. — Um bom sujeito.
Confiável e tudo o mais.
— Nada mal para um marido — disse Margaret em acordo.
— Nem para um cavalo. — Derek afundou um pouco mais em sua cadeira, a
elegância musculosa de seu corpo alto em contraste com o esquema de cores em
tons pastéis da sala. Se por acaso o comentário fora insultuoso, ele, como de
costume, não demonstrou.
— Um cavalo? — Indignada com a comparação de seu noivo a um equino,
Annabel voltou-se para Derek.
Ele parecia tão inocente quanto um libertino depravado poderia parecer.
— Sim, de fato. Você não concorda? Qual prefere montar, um animal plácido
e confiável, que vai te levar aonde quer ir de uma maneira segura, ou uma fera
mais intrépida?
Annabel podia ser muito menos experiente do que ele, mas não perdeu a
insinuação sexual. Para sua completa e total mortificação, chegou a corar.
Apenas Derek poderia dizer uma coisa dessas e sair impune. Estava
acostumado a usar sua aparência e facilidade de se desculpar por qualquer tipo
de pecado. Funcionava com todas as outras pessoas, maldito fosse. Mas não com
ela. Não mais.
O problema era que ela o conhecia. Sabia da sagacidade seca, do brilho
provocador em seus olhos, e, no passado, poderia até ter rido. No entanto, eles
estavam falando sobre seu casamento com outro homem e o fato de ele ser capaz
de brincar sobre isso... bem, era doloroso.
Não, não era, ela argumentou internamente, empertigando as costas. Derek
não tinha mais esse poder sobre ela. Abdicara disso no dia em que a beijara e
depois partira seu coração com uma traição casual que zombara de seus
sentimentos.
Annabel olhou-o nos olhos.
— Há muito a ser dito sobre confiança.
Seu sorriso desapareceu, e ele respondeu suavemente:
— Até mesmo a mais selvagem das criaturas pode ser domada quando feito
da forma correta.
— Nem todos valem o esforço — ela disparou de volta.
— É difícil dizer se alguém não tentar.
Margaret interrompeu com um esforço para mudar de assunto:
— A festa correu bem ontem, não foi?
Annabel assentiu, mas foi um gesto ausente, sem emoção.
— Foi linda.
— Você estava muito bonita — Derek murmurou como se comentasse sobre
o tempo.
Não, ele não apenas falou. O elogio fora tão suave, tão sincero na inflexão
em seu tom, que ela ficou momentaneamente surpresa. Olhou-a de um jeito que
somente ele conseguia olhá-la e, por um único momento, ela esqueceu que
Thomas e Margaret estavam lá.
Como uma tola idiota.
Mesmo que tivesse sido sincero, o que importava? Por que ela se preocupava
com o que um homem tão imoral e de má reputação pensava a seu respeito? Por
que escolhera o vestido com tanto cuidado na noite anterior só porque sabia que
ele estaria lá?
Simplesmente não era possível ficar tão perto dele por mais um minuto. A
percepção a inundou e fez um surto de pânico sufocá-la. Certamente era mais
confortável quando os dois se evitavam, embora não estivesse convencida de que
ele chegara a este ponto. Um beijo insignificante não seria tão importante para
um libertino de seu status. Era ela quem estava dando muita ênfase ao assunto.
Mas ainda assim... aquele beijo. O toque suave, mas firme de seus lábios,
enquanto possuíam os dela, o deslizar da língua, a sensação tentadora de seus
braços segurando-a com força. Seu perfume, seu gosto, o suspiro baixo e
ressonante em sua boca, tão inebriante quanto qualquer bebida...
Não. Ela não devia se lembrar. Era irritante que ainda estivesse gravado em
sua mente.
— Por favor, me desculpem. — Annabel se levantou e olhou para o relógio
no canto, vendo que os ponteiros de metal ornamentados estavam empoleirados
em algum ângulo, nem mesmo registrando o tempo. — Eu tenho um monte de
cartas para escrever e estou com uma ligeira dor de cabeça. Acho que vou me
recolher até o jantar.

A TARDE ESTAVA TÃO QUENTE QUE C AROLINE TIRARA A JAQUETA DE SEU TRAJE DE
montar e pairava sobre o pomo de sua sela enquanto seu cavalo passeava pelo
estreito caminho ao longo da margem de um rio. Acima, o céu estava limpo, de
azul profundo, não marcado por uma única nuvem, e o ar cheirava a prados
perfumados enquanto a mais leve brisa roçava seu rosto.
O dia idílico combinava perfeitamente com seu humor.
Caroline estava bem ciente de que era alvo das atenções e do charme de
Rothay por uma razão deliberada — a aposta escandalosa —, mas sentia-se mais
do que disposta a aceitar a fantasia.
Depois de uma noite de descobertas e de um prazer abandonado em seus
braços, eles dormiram tarde, tomaram um leve café da manhã juntos e passaram
o resto do dia em companhia um do outro, de forma casual e descontraída,
exatamente como estava acontecendo o passeio daquele final de tarde.
Era uma mudança agradável em sua rotina mundana e nem todo o seu prazer
tinha a ver com seu despertar sexual recém-descoberto. Um homem atraente
prestando atenção nela era algo ao qual poderia se acostumar, especialmente
porque se sentia surpreendentemente confortável em sua presença. Talvez fosse
apenas a intimidade sexual, mas talvez fosse outra coisa.
Embora eles ainda não tivessem consumado o ato sexual em si, sentia-se
cada vez menos apreensiva e mais curiosa. Até aquele momento ele lhe
concedera toda a atenção, o prazer luxuriante de seu toque era esclarecedor, mas
ele não exigira nada para si mesmo.
Claro. Tudo porque queria ganhar a aposta.
Como se pudesse ler seus pensamentos, Nicholas disse:
— Eu deveria fazer isso com mais frequência.
Ela o olhou de relance. Também não usava paletó, o linho fino de sua camisa
cobrindo os ombros largos, a roupa aberta no pescoço, revelando a pele
bronzeada, sua postura na sela, ereta e graciosa. Ele cavalgava todos os dias e
pedira que os cavalos fossem enviados com antecedência, já que não mantinha
nenhum em Essex. Sua montaria era um garanhão magnífico que combinava
com seu cavaleiro, elegante e poderoso, e a égua cinza malhada na qual ela
cavalgava era o animal mais bem-educado que já havia montado.
— Fazer o quê com mais frequência? — Caroline ergueu uma sobrancelha.
— Levar uma estranha para o campo como pupila sexual?
Sua risada fácil soou.
— Bem, não. Não era exatamente isso o que eu estava pensando, mas já que
mencionou, até agora as coisas correram muito bem.
Lembrando-se da revelação da noite anterior, ela mal podia discordar.
Pensava no prazer pecaminoso, em cada toque, gosto e nos movimentos
singulares do homem experiente. A reputação de Nicholas era bem merecida, se
é que ele era sempre tão altruísta com suas amantes. O excesso de sensações a
deixou tão exausta que ela, de fato, adormeceu deitada em seus braços, e se
alguém tivesse previsto isso alguns dias atrás, ela teria zombado da ideia.
Um prazer desenfreado e uma crescente sensação de liberdade, mesmo que
fosse uma experiência nascida de uma disputa masculina provocada pelo excesso
de bebida alcoólica, era exatamente o que procurava quando fez sua proposta
escandalosa. Quando tudo acabasse, ficaria eternamente em dívida com ele, pois
Nicholas Manning, pelo menos, mostrara a ela como as coisas poderiam ser.
— No que você estava pensando, então? — Ela afastou uma mecha solta de
cabelo de sua bochecha e avaliou o rosto dele curiosamente.
Nunca em sua vida perguntara a um homem o que ele tinha em mente. Com
Edward jamais teria ousado. Nem ela provavelmente teria querido saber. Com
Nicholas, já sentia que poderia perguntar qualquer coisa, livremente, com
impunidade.
— Passo muito tempo na cidade. Muito tempo acordado até tarde nas festas e
saraus, muito tempo no meu clube, muito tempo no meu escritório e com meus
advogados. — Ele deu de ombros, seu cabelo preto lustroso, quase azulado,
como o de um corvo com a asa inclinada ao sol. — Sempre digo a mim mesmo
que saberei quando for a hora de amenizar a minha vida para um padrão menos
agitado.
Inevitavelmente, ele quis dizer encontrar uma esposa e gerar um herdeiro.
Ela sentiu uma inesperada pontada de compreensão. Aquela aposta tinha a ver
apenas com uma conquista casual e suas próprias descobertas. O que aconteceria
depois que aqueles dias terminassem dificilmente importava.
Ela se esforçou para parecer indiferente.
— Você ainda é jovem, embora eu imagine que sua família espere que
cumpra seu dever.
Seu semblante tornou-se aristocrático e um pouco austero. Por um momento,
ele não pareceu em nada com o libertino sofisticado, mas, ao invés disso,
mostrou-se quase sombrio. Sua voz até pareceu mais seca.
— Realmente eles esperam.
Não era da sua conta, mas, de alguma forma, ela se ouviu dizendo:
— Mas você está relutante?
— Eu estou claramente desinteressado em escolher uma esposa
simplesmente para procriar — havia uma nota inquietante em seu tom.
Uma declaração curiosa, já que ele provavelmente deveria saber, desde a
infância, que teria que fazer exatamente isso.
— Você tem uma alma romântica.
— Não.
— Se interpretei o que acabou de dizer corretamente, você quer se apaixonar.
Sua boca se contorceu em um sorriso cínico.
— Receio que tenha interpretado mal o que eu disse, minha querida.
Apaixonar-se não é algo que eu espero que aconteça comigo, nem iria querer
isso. Acho que nem acredito que seja possível.
Se ela sabia bem diferenciar um tom de convicção em alguém, aquelas
palavras ecoavam exatamente isso. A afirmação era um pouco incongruente,
especialmente vinda do mesmo homem que ela agora sabia ser capaz de
demonstrar ternura infinita e altruísta.
— Todos nós queremos ser amados — ela se aventurou, embora fosse
provavelmente a última pessoa na terra a ser considerada uma autoridade no
assunto.
— Ser amado não é o mesmo que amar alguém.
Seu cavalo desviou, andando em torno de um pequeno arbusto, e ela
distraidamente o guiou de volta ao caminho.
— Imagino que seja verdade.
Caroline não sabia muito sobre os homens, mas havia uma severidade atípica
no tom de voz de Nicholas que nem mesmo ela pôde ignorar.
Aquela discussão era íntima demais, em um nível desconhecido para ela.
Ele sorriu novamente e, então, moveu rapidamente a cabeça, dando-lhe um
vislumbre de seu charme convincente, atraente, que cativava toda mulher em seu
campo de visão.
— Se você contar a alguém que conversou sobre questões sentimentais com
o Duque Diabólico, eu vou negar, minha querida, então, por favor, guarde o
segredo.
Se ela contasse a alguém, ele seria mais perseguido do que nunca por jovens
ansiosas para conquistarem não apenas seu título e sua fortuna, mas seu coração.
No entanto, não faria isso. Então, Caroline apontou, com verdade infalível:
— Ninguém pode imaginar que eu o conheço, a não ser de um modo mais
casual e distante, lembra-se? Eu dificilmente poderia reivindicar saber qualquer
coisa sobre seus sentimentos pessoais em qualquer assunto, muito menos sobre
casamento.
Ele a olhou, seus cavalos andando lentamente, passando por um bosque de
salgueiros delgados, com longos galhos que se arrastavam em direção à água
límpida e vagarosa. O sol parecia muito quente em suas costas.
— Eu tenho a sensação de que será um pouco difícil fingir que não nos
conhecemos depois que esta semana acabar. Disseram-me que uma mulher não
esquece seu primeiro amante.
Não havia dúvida de que ele estava absolutamente correto, porque o que
Edward fizera com ela o desqualificava para aquele rótulo.
Nicholas não poderia ser mais diferente, e embora o corpo de Caroline não
fosse virginal, ele estava certo sobre ser seu primeiro amante.
Era maravilhoso perceber, mas ela estava perdendo seus medos, sentindo-se
ansiosa por isso.
Talvez ansiosa demais.
Caroline pigarreou.
— Tenho certeza de que é verdade, pois você está certo, não vou esquecer
sua... bondade.
A boca de Nicholas curvou-se em puro divertimento.
— Bondade? Uma palavra estranha para descrever o desejo carnal, minha
querida. Já que está aqui como pupila sexual, como você mesma proclamou,
deixe-me continuar no meu papel de instrutor, informando-a de que seu
entusiasmo quando estamos juntos será fundamental para mim. Dar prazer a uma
mulher é um poderoso afrodisíaco para qualquer homem.
Infelizmente, ela sabia, por experiência própria, que ele estava errado. Era
como um banho de água fria. Silenciosamente, disse:
— Nem todos eles, Nicholas. Eu gostaria de poder dizer isso com menos
segurança.
No silêncio constrangedor resultante entre eles, o baque surdo dos cascos dos
cavalos e o trinado de um pássaro cantor eram os únicos sons ao redor. Ele disse
finalmente:
— Agi com presunção novamente. Desculpe-me.
Ela não queria pensar em seu casamento sombrio, não em um dia tão
glorioso, não quando estava com o homem mais atraente da Inglaterra e eles
tinham o resto do que prometia ser uma semana muito memorável pela frente.
Lançou-lhe, então, um sorriso travesso.
— Eu acredito, Sua Graça, que já nasceu presunçoso. Felizmente para você,
acho que isso é parte do seu charme.
— Você me acha charmoso? Talvez tenha causado uma impressão na noite
passada, afinal de contas. — Ele parecia mais do que disposto a fugir da direção
séria da conversa e voltar à provocação despreocupada habitual. — Se importa
em me dizer qual parte você achou mais esclarecedora?
Isso não era difícil de responder, e ela devia muito a ele.
— Tudo.
Era verdade. Aqueles beijos devastadoramente suaves e persuasivos, a
delicadeza de seu toque íntimo, o presente de um prazer que ela não imaginava
existir.
Quase instantaneamente, a expressão de Nicholas mudou. Suavemente, ele
disse:
— Acho que posso aprender com você, minha fria Lady Wynn, tanto quanto
aprenderá comigo esta semana.
A luz do sol filtrada pelas árvores caía sobre a grama verde na pequena
clareira; o som tranquilo do rio proporcionava um efeito calmante.
Nicholas desmontou e virou-se para tirar Caroline da sela, com as mãos
demorando-se na cintura fina enquanto a abaixava. Ele sorriu preguiçosamente
para o rosto erguido.
— Este é um local bastante agradável, não é? Privado também.
Suas delicadas sobrancelhas se arquearam.
— Isso é importante?
Era muito importante, porque desde o momento em que eles tinham saído da
cama naquela manhã, Nicholas passara a avaliar seu desejo irresistível de possuí-
la mais uma vez. No entanto, uma cama não era necessária, não com um local
romântico isolado disponível, e ele não queria esperar até que se recolhessem
para fazer amor com ela.
Conter-se era necessário, mas por quanto tempo mais ele precisaria se
segurar?
Infelizmente, a resposta era simples. Até que Caroline estivesse pronta.
Havia uma enorme diferença entre o que permitia que ele fizesse e o que queria
que fizesse. A qualquer momento, desde sua chegada, ela teria permitido. Mas
certamente na tarde e na noite anteriores ela não sentira o desejo que ele
imaginara que sentiria, apenas rendição.
Mas se as coisas fossem do jeito que ele queria e pretendia, ela iria aprender.
Não sabia exatamente por que estava tão fascinado pela adorável, mas
inexperiente, Lady Wynn, porém, era um fato. Parte disso tinha a ver com a
franqueza dela; parte, com sua beleza, e, para sua surpresa, ele se perguntava se
parte não tinha também a ver com a sugestão de vulnerabilidade quando ela o
olhava com aqueles gloriosos olhos prateados.
Normalmente, só isso o faria fugir o mais rápido possível. Jovens damas
vulneráveis faziam sua guarda subir imediatamente.
— Eu pensei que nós poderíamos nos sentar um pouco à sombra. —
Nicholas baixou os cílios, e seu olhar recaiu em direção à boca de Caroline. — E
admirar a vista. Poderíamos discutir literatura, já que é uma das suas paixões.
— De alguma forma, nunca imaginei o Duque Diabólico como alguém que
se empoleira em um riacho e contempla a beleza da natureza ou a estrutura de
um poema. A sociedade acreditaria ainda menos que ele fosse capaz de opinar
sobre os assuntos do amor.
— Você será capaz de atestar que eles estão errados.
— Serei? — Uma sobrancelha arqueou, e ela riu. — Estou tentando imaginar
qual seria sua opinião sobre Homero ou Rousseau.
Seu sorriso era muito raro e o fascinava. Assim como a mulher, era uma
mistura de reserva e sensualidade subjacente, ele pensou, olhando para ela.
Preguiçosamente, falou devagar:
— Você está insinuando que sou um filisteu, Lady Wynn?
— Prazeres mundanos parecem mais o seu domínio, Sua Graça.
— Permita-me mudar a sua opinião sobre o meu caráter.
A resposta dela foi quase graciosa.
— Pode tentar.
Assim desafiado, como ele poderia recuar? Nicholas escolheu um lugar
calmo com vista para o meandro do rio, a grama maleável e perfumada, a terra
nivelada. Eles se sentaram e conversaram enquanto seus cavalos pastavam. Mais
uma vez, Nicholas se viu cativado pela maneira como os olhos de Caroline se
iluminaram quando ela se fixou em um ponto importante para debater com ele.
As visões independentes de sua velha governanta tinham sido variadas,
descobriu, enquanto discutiam tudo, desde arquitetura a religião. Caroline disse
que a Srta. Dunsworth, de quem ela se lembrava com uma expressão sentimental
em seus olhos extraordinários, encorajara sua educação de todas as maneiras
possíveis, não apenas os interesses comuns das jovens damas refinadas.
— Ela morreu de uma infecção no pulmão — disse ela, com um baixo tom
de voz —, perto do fim do meu décimo sexto ano de vida. Ainda sinto falta dela.
Isso deu a Nicholas uma abertura para que conduzisse o assunto, com
intenção deliberada, de volta para sua família.
Ele enrolou uma longa folha de grama entre os dedos, observando o rosto
dela sob os cílios ligeiramente abaixados.
— Você não tem vontade de voltar para York, eu presumo.
Sem hesitar, Caroline balançou a cabeça. Estava belíssima em uma blusa
simples, saia de montaria e botas de cano curto. Embora se sentasse com um
decoro elegante e feminino, com as pernas dobradas para o lado, ainda conseguia
parecer adoravelmente desejável.
— Eu nunca mais vou voltar.
— Isso parece definitivo.
— E é. — Um breve lampejo de melancolia cruzou o rosto dela. — Meu pai
não me quer lá também.
— Então ele é um tolo. — Nicholas estendeu a mão e tocou a dela.
Suas restrições anteriores, ele descobriu, estavam desaparecendo. A
intimidade que começava a ser construída aumentava seu nível de interesse.
Geralmente, sentar-se e conversar sobre temas intelectuais com uma mulher não
era algo que lhe apetecesse, e certamente nunca esperava que isso causasse
excitação sexual, mas com ela era diferente. Que curioso.
Ela o olhou.
— Que bom que você tem uma irmã.
Nicholas raramente pensava nisso, mas o olhar melancólico no rosto de
Caroline deixava-o consciente de sua sorte com sua própria família. Queria
consolá-la, prometer que ela encontraria contentamento e aceitação, mas como
diabos faria isso?
O único tipo de consolo real que sabia como lhe oferecer era físico, e seu
corpo, no momento, o instigava a prosseguir.
A sedução lhe era muito mais familiar do que a indecisão emocional.
Inclinando-se para frente, Nicholas roçou a boca contra a dela, ignorando o
sobressalto de surpresa. Além de tirá-la de seu cavalo, não fizera nenhum
movimento para tocá-la. Ele sussurrou:
— Há algo estimulante em fazer amor ao ar livre. É mais primitivo.
— Aqui?
Ele a beijou em resposta àquela pergunta arfante, divertindo-se com a reação
chocada, as mãos já ocupadas. Soltou o cabelo dela primeiro, porque queria
sentir o peso dos fios de cetim quando aquecidos pelo sol, sua fragrância
tentadora enquanto aprofundava o beijo. Para sua satisfação, os braços de
Caroline deslizaram ao redor de seu pescoço e, mesmo não tendo se agarrado a
ele, ela descansou em obediência voluntária em seu abraço.
Aceitação novamente, ele percebeu com uma máscara de resignação interior.
Isso certamente exigiria algum esforço. A parte estranha era que estava gostando
do desafio, apesar de sentir certo nível compreensível de frustração.
O inchaço de sua ereção foi imediato, e seu coração já batia mais rápido
enquanto admirava a glória elegante de sua beleza. Seu prazer era reforçado pelo
som do movimento suave da água, quase inaudível acima de sua própria
respiração acelerada. Nicholas murmurou:
— Dispa-se para mim. Eu quero assistir. Não há nada mais excitante do que
o corpo de uma mulher sendo revelado pouco a pouco.
Bem, isso não era exatamente verdade. Assistir a uma mulher beijar seu
corpo e tomar seu pênis rígido em sua boca podia ser ainda melhor, mas Caroline
não estava pronta para tal. Aquela semana deveria ser dedicada ao prazer dela, e
não apenas por causa daquela maldita aposta. Nenhuma mulher tão bonita e
inatamente sensual deveria ter medo da intimidade sexual.
Ele esperou, um braço apoiado sobre o joelho dobrado, a pose
propositalmente casual, exceto pela protuberância de sua crescente ereção
preenchendo suas calças justas.
Houve apenas um momento de hesitação antes de Caroline se levantar e
começar a desabotoar sua blusa. Através das pálpebras pesadas, Nicholas
observou cada botão ser aberto antes que a blusa fosse puxada para fora da saia
de montaria para tirá-la. Botas, meias e saia saíram em seguida, suas bochechas
ficando cada vez mais rosadas enquanto ela se despia. Finalmente, afrouxou o
laço do chemise e ergueu o queixo, mas não deixou o tecido rendado escorregar
por seus ombros.
— Não pare agora — ele disse persuasivamente. — O melhor está por vir.
— Você está completamente vestido.
Lá estava ela, uma bela sedutora, usando a mão para manter o corpete
fechado.
— Você quer que eu me dispa? — Ele manteve o olhar fixo no dela.
Queria ter certeza de que Caroline soubesse que, com ele, sempre teria
escolha. Geralmente preferia assumir a liderança em jogos sexuais, mas estava
disposto a fazer concessões para se certificar de que ela nunca se sentisse
oprimida.
— Tenho certeza de que você está ciente de que é considerado muito bonito.
Existe alguma razão pela qual não posso admirá-lo da mesma maneira?
Sua resposta foi direta o suficiente. Mais uma vez, não havia truques.
— Tudo o que minha dama desejar. — Ele sorriu e puxou o calcanhar de
uma bota, ainda mantendo seu olhar fixo nela.
Com um sorriso astuto e trêmulo, ela soltou o chemise, e este se acumulou
em torno de seus pés.
Por um momento ele parou, com a bota na mão, inebriado pela pura glória do
corpo nu de Caroline, sentindo sua admiração aumentar por saber que ela era sua
para ser possuída.
Não conseguia tirar as roupas rápido o suficiente.
Havia algo sobre o cenário do bosque, a maneira como a luz do sol tocava
sua pele acetinada com um brilho dourado, o som musical dos pássaros nas
árvores... tudo isso elevava a excitação a um novo nível. Era primitivo,
elementar e, quando conseguiu livrar-se de suas calças, descobriu, surpreso, que
suas mãos tremiam.
Isso nunca acontecera antes.
Teria que analisar a situação. Mais tarde. Depois.
— Venha deitar-se comigo. — Nicholas reclinou-se na grama, a sensação
tátil em seu corpo fazendo um contraste interessante com seu desejo ardente.
Acima do dossel de ramos, o céu era azul-celeste.
— É o que eu quero. — As palavras sussurradas foram ditas com um toque
de surpresa quando Caroline deu um passo em sua direção.
Nicholas com certeza esperava que sim, porque estava mais do que pronto.
Quando ela se ajoelhou ao seu lado, ele segurou sua cintura e puxou-a para cima
de seu corpo faminto, desejando um beijo cálido. Foi menos contido do que na
noite anterior, mas ela não pareceu se importar, respondendo de forma não tão
hesitante daquela vez. Ao senti-la enroscar os dedos em seu cabelo, um lampejo
de triunfo manifestou-se através de sua excitação, e a rigidez dos mamilos de
Caroline contra seu peito falava muito sobre o quão longe ela chegara em um
tempo muito curto.
Se ele fosse um juiz − e sentia-se qualificado para isso −, poderia apostar que
ela se tornaria uma amante muito apaixonada para algum homem de sorte
quando a semana acabasse.
Claro, então ela teria seu tempo com Derek. Um tremor de insatisfação se
agitou dentro de Nicholas quando imaginou seu amigo segurando aquele corpo
delicioso como ele estava fazendo.
Reprimir tal pensamento era um reflexo emocional. Ele não era um homem
ciumento. Ou nunca fora antes, pelo menos. Considerando sua aposta ilícita,
aquele parecia ser um mau momento para adquirir o hábito.
Ele girou de lado para que o cabelo dela se derramasse contra a grama em
uma massa luxuriante e reluzente. Roçou a boca em sua mandíbula e lambeu um
caminho ao longo de sua clavícula, acariciando a elegante curva de sua garganta.
Caroline arqueou-se embaixo dele com a respiração acelerando.
Nicholas acariciou seu quadril nu.
— Fale comigo.
Cílios rendados se ergueram, e sua boca se abriu quando um leve franzir de
cenho marcou sua testa suave.
— Já não conversamos muito?
— Sim, mas vamos mudar de assunto.
— Eu poderia jurar, Rothay, que você gostaria de fazer outra coisa além de
conversar, ou seu corpo reage assim o tempo todo? — Ela se moveu
sugestivamente contra seu pênis rígido. — Parece que sim.
Se seu sorriso não pareceu malicioso, ele certamente pretendia que fosse.
— Oh, eu vou fazer amor com você, eventualmente, isso não está em
questão, mas há uma grande variedade de maneiras para isso. Eu só me pergunto
se você percebe o quão excitante pode ser quando os amantes dizem um ao outro
como estão se sentindo e, ainda mais importante, o que querem.
Os cachos castanho avermelhados se moveram quando ela balançou a
cabeça, e seus olhos se iluminaram enquanto o observavam.
— Eu não tenho ideia do que você quer dizer, mas suspeito que já saiba
disso, de qualquer maneira.
Ele sabia. O jogo de sedução era tão estranho para ela quanto um beijo
romântico.
Seria um prazer mudar isso.
— Posso começar. — Apoiado acima dela, seu peso equilibrado em um
cotovelo, ele moveu a boca para seu ouvido enquanto acariciava um seio cheio e
glorioso. — Eu amo o jeito como você se molda a mim; sua pele é como seda
sob meus dedos. Você tem os seios mais bonitos que já vi, cheios e firmes, mas
também macios e feitos para as minhas mãos.
Um pequeno tremor percorreu-a quando ele apertou gentilmente o peso
flexível da carne amontoada e hesitou, enquanto seu polegar preguiçosamente
estimulava um mamilo rosado em círculos lentos, sentindo-se gratificado por sua
reação física. Ele sabia que Caroline era sagaz, ainda que um pouco tímida. Com
um pouco de instrução na arte do flerte, ela poderia escolher qualquer homem da
alta sociedade.
Havia alguns canalhas por aí, e ela não era apenas bonita, mas uma herdeira.
Nicholas esperava que escolhesse sabiamente.
Perceber que se importava com o que aconteceria com ela depois da semana
designada o surpreendeu. Talvez estivesse simplesmente tentando redimir o sexo
masculino aos olhos de Caroline, pois desde o início da conversa percebera que
sua figura paterna não fora muito melhor do que o falecido Lorde Wynn. Ela não
dissera isso em tantas palavras, mas pôde perceber a dor subjacente em sua voz.
Sim, era isso. Havia algum resquício de cavalheirismo, apesar do que
acontecera com Helena.
Mas agora não era hora de pensar naquele erro terrível.
— Sua vez — ele pediu, mordiscando o lóbulo da orelha dela. — Confie em
mim.
— Eu... eu — ela hesitou e então sussurrou: — Estou começando a pensar
que você é mais do que apenas um amante competente, Nicholas, mas também
um homem muito bom.
Ele paralisou o ato de acariciar seu mamilo, perplexo e confuso.
Não se tratava de uma insinuação sexual, nem algo dito com um bater de
cílios ou um sorriso sedutor, mas Nicholas sentiu-se inesperadamente tocado,
não apenas pela simples afirmação, mas pelo próprio sentimento. Era conhecido
por ser um monte de coisas, ele sabia bem disso, mas duvidava que bondoso
estivesse entre elas. As pessoas não se importavam se ele era um ser humano
decente. Riqueza, aparência e uma abundância de charme superficial eram
geralmente mais do que suficientes. O homem real não era o foco da maioria das
mulheres que conhecia.
Descobriu que não sabia exatamente o que dizer, e isso o deixou inquieto.
Ela o colocara naquela posição mais de uma vez. Finalmente, murmurou:
— Obrigado.
O suspiro de Caroline roçou a bochecha de Nicholas.
— Esse não era o tipo de coisa que você queria ouvir, não é? Não sou boa
nisso.
Ela estava encantadora e descontraída, ele pensou, enquanto afastava um
cacho de cabelo que roçava seu ombro pálido e conforme se equilibrava sobre
ela com o membro rijo pressionado contra sua coxa.
— Foi perfeito.
— Você nunca é deselegante? — Suaves lábios rosados se curvaram em um
sorriso quase melancólico.
Ele sorriu.
— Só quando meus cavalos perdem.
— O que raramente acontece.
— Tenho um excelente treinador e os melhores jóqueis da Inglaterra… mas,
querida Caroline, por mais que eu ame o assunto das corridas, podemos guardar
o tópico para quando você não estiver nua em meus braços?
A risada suave de Caroline roçou sua bochecha.
— Você é o especialista no que deve ser feito neste tipo de situação, não eu.
Talvez ele realmente pudesse se gabar por possuir algum modesto
conhecimento no que dizia respeito a ter damas nuas em seus braços. No
entanto, com relação a senhoras inexperientes e medrosas... nesta categoria ele
não era tão habilidoso, mas estava aprendendo. Nicholas se aninhou no pescoço
dela.
— Nós faremos o que você quiser que façamos. Nada mais.
— Beije-me.
Isso certamente não era uma dificuldade. Ele reivindicou sua boca, imitando
escandalosamente o que adoraria fazer em seu corpo com pequenos impulsos de
sua língua. Ela respondeu lindamente, com dedos entrelaçados em seus cabelos e
o seu calor sedutoramente insinuante contra ele.
— Agora me toque. — A ordem ofegante foi dada em um exalar gentil
contra seu rosto, enquanto um par de braços finos se entrelaçou ao redor de seu
pescoço. — Como ontem à noite.
Uma preguiçosa tarde de verão, árvores por todos os lados e uma amante
deitada sobre a grama perfumada. Era como viver em um sonho passado na
antiguidade grega, e se ele fosse o sátiro, o papel provavelmente se encaixaria.
Apenas um pouquinho depravado, mas essa experiência só beneficiaria sua
companheira. Nicholas movimentou-se levemente, puxando-a para mais perto.
— Tudo o que minha dama quiser.
Seus dedos vagaram, encontrando o que procuravam, e ela estremeceu.
Quando arqueou o corpo o suficiente para pressionar os seios tensos contra o
peito dele, Nicholas pensou, divertido, em todos aqueles pretendentes
desanimados que murmuravam sobre a civilidade indiferente e o desprezo gélido
de Caroline.
Fria, aquela dama não era.

P EQUENAS RAJADAS DE ALEGRIA VARRERAM SEU CORPO , E C AROLINE NÃO PÔDE


reprimir um som baixo, sentindo o prazer ainda em guerra com uma sombra de
descrença por seu comportamento devasso. Bem, ela estava nua nos braços do
deliciosamente malicioso Nicholas Manning. Que mulher não agiria com
sensualidade?
Ela realmente tinha pedido que ele a tocasse?
Sim, ela pedira.
Era empoderador, e por mais que a razão para eles estarem juntos em
primeiro lugar fosse, ao mesmo tempo, frívola e um potencial caldeirão de
desgraças, com os braços de Nicholas ao redor dela e seus hábeis dedos fazendo
mágica, ela decidiu que valia a pena.
Podia sentir a pressão quente de sua ereção, a longa e rígida extensão entre
eles enquanto Nicholas a segurava e acariciava. Duas vezes antes ele negara o
prazer a si mesmo, e Caroline tinha a sensação de que faria isso novamente se
não fosse ela a iniciar a consumação real.
Para sua surpresa, ela desejava que acontecesse. Não para testar se as
acusações de Edward, suportadas com dentes cerrados e medo de fracasso, eram
ou não verdadeiras. Não, de forma alguma. Ela queria porque sofria, sentia-se
incompleta e sabia intuitivamente que o homem que a segurava contra si tinha o
poder de curá-la.
Seu toque era mágico. Como seria experimentar uma parte mais potente
dele?
Ela se mexeu. Não foi realmente consciente, apenas um sinal sutil desse
novo anseio. Nicholas entendeu perfeitamente. Aqueles dedos questionadores
deslizaram de sua intimidade, e ele murmurou em seu ouvido:
— Tem certeza?
Uma vez que não estava disposta a levar seu atual estado de imprudência em
consideração, assentiu. Lá estava ela, no meio do dia, em um vale isolado, sem
uma roupa sequer, aninhada nos braços de um notório libertino depois de
concordar em entregar seu corpo a dois homens que ela mal conhecia... Então,
sim, por que não apenas dar o próximo passo, mas aproveitá-lo o máximo
possível?
— Eu quero que você…
Ele mordiscou o pescoço dela, enviando um arrepio por sua espinha.
— Sim. Diga.
— Eu quero você.
— Nós temos mais em comum, então, Lady Wynn, além do que descobrimos
anteriormente. Eu também quero você.
Era neste ponto que o pesadelo poderia ressurgir. Enquanto ele se movia
acima dela e afastava suas coxas com os joelhos, Caroline esperou que o pavor a
atingisse. A investida de seu membro rígido entre suas pernas deveria ter lhe
causado um sobressalto de repulsa e resignação, mas, em vez disso, o que a
acometeu foi uma surpreendente onda crescente de antecipação.
— Sim — ela sussurrou, olhando em seus olhos escuros. — Sim, por favor.
— Como eu iria recusar? — Nicholas não sorriu, mas em vez disso prendeu
seu olhar enquanto forçava apenas o suficiente para que a ponta inchada de seu
pênis a penetrasse.
E depois mais.
Muito mais. Profundamente, incrivelmente fundo. Tudo dele.
Ela foi esticada, possuída, tomada. Os quadris esguios de Nicholas
descansavam contra a parte interna de suas coxas, os braços foram apoiados por
seus ombros e sua boca roçou a dela em um leve gesto de reafirmação. Era algo
que Caroline nunca imaginara e certamente nada semelhante ao que
experimentara antes.
Dedos gentis tocaram seu rosto, e ele não se moveu. Havia rubor da
excitação em seu rosto, e seus olhos escuros pareciam mais intensos.
— Caroline?
Ela sabia o que ele iria perguntar.
— Estou bem — ela sussurrou, incapaz de esconder a nota de felicidade
exultante de sua voz. — Mais do que bem.
— Eu vou devagar.
— Não acho que seja necessário. — Ela usou o pé para tocar a parte de trás
da panturrilha dele, esfregando-a sugestivamente. — Eu não sou frágil.
— Se você...
— Nicholas — ela interrompeu sem fôlego, as unhas afundando levemente
em seus braços.
A mensagem era aparentemente clara, pois ele deslizou seu membro para
fora, em uma fricção tentadora, apenas para investir novamente, de tal forma que
a sensação provocou arrepios em cada terminação nervosa de seu corpo.
Foi uma revelação perceber como um mesmo ato poderia ser doloroso e
degradante com um homem e nada menos do que arrebatador com outro.
Nicholas a tocava com uma persuasão tão suave, encorajando-a a retribuir sua
paixão em vez de usá-la como um recipiente para saciar rapidamente sua luxúria.
Seus dedos se flexionaram contra seus ombros firmes. O tamanho e força de
Nicholas não a intimidavam, mas a inebriavam tanto quanto a fricção de seu
sexo contra o dela.
Era incrivelmente bom, e ela soltou outro pequeno gemido.
Valia o risco... cada momento...
O cabelo escuro e sedoso roçou seu pescoço enquanto ele se movia naquele
ritmo erótico, mantendo uma intensidade peculiar em seu rosto.
— Junte-se a mim, Caroline.
A maneira como ele disse seu nome, com uma entonação rouca, enquanto se
movia em ritmo erótico dentro dela, aumentava o prazer sensual. O calor da
antecipação chamuscou sua pele, acariciada pela brisa quente da tarde.
— Nicholas — ela respondeu em um suspiro, arqueando sua pélvis,
querendo-o ainda mais fundo.
Era tudo impossível. Impossível desejar tanto algo quanto ansiava pela
deliciosa explosão de êxtase; impossível acreditar que estava ali, à margem de
um rio em uma tarde ensolarada, nua e abandonada com seu amante; impossível
sentir uma alegria tão tumultuosa.
Nicholas colocou a mão entre eles, acariciando-a, e, de repente, seu mundo
explodiu em chamas. Ela gritou, um som desenfreado, e a resposta a isso foi o
corpo dele tornando-se mais firme entre suas coxas, a força de sua ejaculação a
preenchendo. Ambos ficaram parados naquele momento devastador, até que ele
se esvaiu e rolou para o lado, mantendo-a perto. Sentindo-se completa,
confortável e tranquila, ela descansou a cabeça em seu peito úmido e se
perguntou em contemplação quantas mulheres o duque havia atraído para o
paraíso com sua habilidade ao consumar o ato.
Muitas. Não era apenas um boato, pois ele nunca negara.
O desempenho ao fazer amor não significava amor de verdade, lembrou a si
mesma, ouvindo a forte batida de seu coração. O fato de ele ser quem era, um
dos libertinos mais perdulários de Londres, confiante o suficiente para colocar
seus talentos como amante à prova em uma aposta pública, tornava-o capaz de
fazê-la sentir-se sensual e desejada em seus braços.
Era algo deliberado e impessoal, e ela precisava lembrar-se disso para não
ser atraída para uma falsa percepção de suas intenções.
Ela não apenas parecia mais uma conquista fácil, como pedira
descaradamente por isso.
— Esta foi uma das minhas ideias mais inspiradas. — Nicholas interrompeu
seus pensamentos com um de seus sorrisos desarmantes, seus olhos escuros
sombreados por pálpebras semicerradas. A luz solar dourava os contornos de seu
corpo musculoso. Aquelas altas maçãs do rosto aristocráticas sombreavam
levemente suas bochechas. — Devemos dar uma volta como esta todas as tardes
enquanto estivermos aqui.
— Você faz esse tipo de coisa com frequência? — Caroline encontrou força
suficiente para erguer a cabeça e observar sua expressão. O doce aroma da
grama se elevava ao redor deles, misturado com a fragrância ainda mais terrosa
da relação sexual.
Havia uma sugestão de cautela em seus olhos escuros.
— Você pode definir a verdadeira pergunta?
— Não percebi que não estava sendo clara. — Ela tentou um sorriso. — Não
é nada complicado. Eu quis dizer... de forma espontânea... e do lado de fora...
— Fazer amor? Não. As manchas verdes nos meus joelhos são únicas para
você. — Ele roçou o lábio inferior de Caroline com um leve toque de seu dedo.
— Eu não desejava esperar até mais tarde para tocá-la novamente, e por que
perder este lindo dia neste lugar isolado?
Ele fora sincero? Ela não tinha certeza.
— É adorável — ela admitiu, com seus corpos ainda entrelaçados e sentindo-
se segura em seus braços fortes. — Sempre gostei do campo muito mais do que
da cidade, mas nossa casa de campo foi vinculada ao espólio, então, depois que
Edward morreu, foi seu primo quem a herdou. Felizmente, tenho a casa na
cidade livre e desimpedida.
A única coisa decente que Edward fizera fora deixá-la bem o bastante para
ser autossuficiente, e ela suspeitava que isso fora feito para intimidar
deliberadamente Franklin, já que os dois nunca gostaram um do outro. Ficou
chocada quando ouviu a quantia de sua herança, mas não tão surpresa quanto o
novo Lorde Wynn. Felizmente, Edward fora tão implacável em seus negócios
como era em todos os outros aspectos, e amarrou tudo muito bem, de modo que
contestar a herança se mostrou infrutífero. No fim da disputa, Franklin a tratou,
como no outro dia em que a visitara após a corrida, com uma condescendência
irritante, e ela não gostava da maneira calculada como a olhava. Evitá-lo parecia
melhor, então, fazia o máximo possível para isso.
— Soube que seu marido morreu de febre.
Caroline olhou distraidamente para um galho baixo de folhas verdes pouco
acima da água. A brisa acariciou sua pele aquecida.
— Não se sabe ao certo o que foi. Edward começou a sentir dores no
estômago e ficou violentamente doente. Não melhorou. Em dois dias ele se foi.
— Eu diria que sinto muito, mas, de alguma forma, não acho que você deseje
simpatia pela perda.
— Seria hipócrita da minha parte aceitar quaisquer condolências. Não queria
que ele estivesse morto, mas também não lamentei quando isso aconteceu.
— Você percebe que, desta vez, se decidir se casar novamente, pode ser à sua
escolha.
O tom brando de sua voz a fez inclinar a cabeça para trás e olhar para o rosto
dele.
— Eu tenho medo disso, não vou negar. Quem pode dizer o que um homem
se tornará depois que os votos forem ditos? Edward pareceu encantador o
suficiente no primeiro contato, mas você está certo, ele não era a minha escolha.
Minha tia e meu pai arranjaram o casamento, e eu não fui consultada.
O homem que a abraçava não teceu comentários. Era uma prática bastante
comum organizar uma união sem a contribuição da noiva.
Caroline murmurou:
— Além disso... eu não concebi uma criança.
Por mais que tentasse soar imparcial e pragmática, ela ainda se lembrava do
desdém de Edward por seu fracasso em lhe dar um herdeiro. Sempre esperou um
também. Alguém para amar e que, por sua vez, pudesse amá-la. Também tinha a
esperança que seu marido fosse menos cruel caso lhe desse um filho, tendo em
vista que era algo que queria tanto. Talvez a deixasse em paz, ao menos
enquanto estivesse grávida.
Os braços de Nicholas se estreitaram um pouco ao redor dela.
— A fertilidade da mulher precisa ser levada em consideração — ele
reconheceu em uma voz calma, finalmente —, uma vez que gerar herdeiros é o
dever de alguns. Mas há muitos homens que ignorariam isso por causa de sua
beleza extraordinária, Caroline.
Que maneira diplomática de dizer que um homem como ele não poderia
arriscar ter uma esposa estéril. Não quando era sua responsabilidade continuar a
linhagem direta de sua família e posição. Ela entendia. Desde o seu casamento,
passara a conhecer muito melhor como o mundo funcionava.
Ainda assim, doía um pouco.
Mas a dor foi esquecida no momento seguinte, quando Nicholas habilmente
ajustou sua posição e a beijou. Murmurou contra os lábios dela:
— Temos algumas horas antes de voltarmos e nos vestirmos para o jantar.
Caroline passou os braços ao redor do pescoço dele.
— Me parece maravilhoso.
Ele sorriu de uma maneira que fez algo derreter dentro dela.
— Eu adoro seu entusiasmo, querida.
O carinho veio com tanta facilidade, e era usado com a confiança fácil de um
homem que sabia exatamente o que as mulheres queriam ouvir de seus lábios.
Aqueles lábios gloriosamente talentosos. Por impulso, Caroline inclinou-se o
suficiente para lamber a curva inferior de sua boca. De canto a canto, lento e
provocante. Um lampejo de aprovação e surpresa surgiu nos olhos de Nicholas, e
ele riu, deixando sua respiração cálida roçar a boca de Caroline.
— Vejo que a senhora aprende rápido.
Seria mesmo verdade? Talvez a tarde quente e o cenário a fizessem se sentir
tão ousada. Talvez fosse a liberdade de saber que todos os comentários
desagradáveis e piadas cruéis recebidos quando Edward terminava e vestia o
roupão para sair de seu quarto eram falsos. Talvez aquele duque, belo e
indiscutivelmente viril, fosse realmente irresistível, não apenas para suas
inúmeras amantes experientes, mas até mesmo para alguém tão sexualmente
ignorante quanto ela.
Fosse como fosse, Caroline sabia que o desejava novamente; queria sentir
sua paixão, seu toque cuidadoso, saber que o agradava como mulher.
Mesmo que tudo fosse uma ilusão.
— E ntão, como vai o plano? Eu diria que vimos mais de você nos últimos dias
do que em vários anos.
Derek lançou ao seu tio um olhar cansado de reprovação.
— O senhor está bem ciente de que não está indo bem, porque tem sido
testemunha da maior parte. Hoje à noite, no jantar, foi um exemplo perfeito.
Acredito que ela não tenha dirigido mais do que uma dúzia de palavras a mim e,
em seguida, alegou uma dor de cabeça novamente, deixando a mesa mais cedo.
Jogado em uma cadeira no escritório, pousando uma taça de vinho do porto
na beirada de uma mesa marroquina incrustada com pedras polidas brilhantes,
ele fez o que acreditava ser uma pergunta infrutífera:
— Ela falou alguma coisa?
— Para sua tia Margaret, você quer dizer? — Thomas se inclinou para trás e
balançou a cabeça. — Não que eu saiba, mas descobri que há uma conspiração
feminina interessante que consiste em manter silêncio sobre confissões
românticas, o que é incrível em criaturas que não concebem bem a ideia de
segredo, em nenhum outro aspecto.
Derek queria rir da observação seca, mas estava um pouco frustrado e
desanimado.
— Não posso acreditar que Annabel não tenha comentado sobre a minha
presença repentina aqui tantas vezes.
Bom Deus, ele parecia um adolescente apaixonado e patético. Sentia-se
inquieto, desapontado consigo mesmo e simplesmente aborrecido em geral. A
situação com Annabel já era ruim o suficiente, mas a aposta fazia com que
julgamentos recaíssem sobre ele, especialmente com Nicholas visivelmente
ausente. A sociedade de Londres notara seu desaparecimento. As perguntas
provocadoras a respeito de seu paradeiro eram um aborrecimento do qual Derek
não precisava.
— Eu ainda digo que você deve se esforçar para conversar com ela a sós.
— Eu tentei, em várias ocasiões. É muito óbvio que ela não está interessada.
— Ele fez um gesto desesperado com a mão, lembrando-se daquelas tentativas
com um pesar que não era característico nem desejado. — Sabe, o furor sobre
Phoebe Tanner coincidiu exatamente com a minha percepção de que eu
precisava tentar mudar a opinião de Annabel sobre o meu caráter. Embora a
decisão radical do marido de Phoebe de pedir o divórcio não tivesse nada a ver
comigo, as fofocas não ajudaram. Tenho certeza de que apenas confirmaram a
péssima opinião que Annabel alimenta de mim sobre eu ser um canalha. Não há
nada pior do que estar envolvido em uma petição de divórcio. Por sorte, eu não
só sou totalmente inocente das acusações de ter tocado na moça, como Lorde
Tanner, pelo menos, desistiu de suas acusações. Muito tarde, no entanto, creio
eu.
Thomas meramente lançou-lhe um olhar divertido de empatia.
— A opinião que Annabel tem de mim faz o fundo do mar parecer um topo
de montanha.
Derek se remexeu na cadeira com um suspiro frustrado.
— Ah...
Bem, o que diabos aquilo significava? Mesmo se Derek não tivesse sido
mencionado no imbróglio da adorável Sra. Tanner, o momento não poderia ter
sido pior. O escândalo do divórcio dos Tanner acontecera quando ele finalmente
admitiu sua incapacidade de ignorar o incidente com Annabel e continuar sua
vida. Não poderia deixar Annabel de lado. E ver seu nome ser mencionado como
a provável fonte da indignação do Lorde Tanner, embora o rumor fosse falso,
não ajudara em nada à sua causa. Phoebe Tanner protegera seu verdadeiro
amante, que devia se assemelhar a Derek em altura e cor, pois o infeliz
cavalheiro escapara pela janela quando foram descobertos por seu marido
enfurecido, daí o erro. Ter um sólido álibi para a noite em questão ajudou a
provar que suas negações de culpabilidade eram verdadeiras, mas o que ficava
na mente das pessoas não era sua inocência comprovada, mas o calor do
escândalo.
Escrevera para Annabel há alguns meses, esforçando-se na carta como um
adolescente, sentado à sua mesa por horas tentando pensar em como explicar
suas ações naquela fatídica tarde na biblioteca, mas, para sua consternação, não
obteve resposta alguma. Tinha bastante certeza de que Annabel nem se dera ao
trabalho de ler.
Derek disse:
— Uma sutil sedução é bem diferente… disto.
A boca do tio se curvou em diversão.
— Você pode tentar usar a palavra.
— Que palavra? — Ele resistiu servindo-se de outra taça. Beber demais não
iria resolver seus problemas, embora tivesse testado severamente aquele método.
— Amor — disse Thomas, suavemente. — Eu acho que você vai ter que
praticar proferi-la.
Acima da lareira havia uma pintura de um cão com uma raposa sem vida aos
seus pés, e Derek concentrou sua atenção nela para se distrair. A razão que
levava um artista a escolher representar animais mortos em uma pintura era um
mistério para ele.
Amor. Não, ele não tinha certeza se poderia falar com eloquência sobre o
assunto. A carta continha um pedido de desculpas e a súplica por uma chance de
falar com ela, mas sem declarações floridas. Sabia como agradar uma mulher
com um elogio bem feito, como sussurrar as palavras certas em seu ouvido
quando ela estava em sua cama, como fazê-la suspirar apenas com o toque
correto, mas não sabia nada sobre dizer aquelas três palavras simples.
Eu te amo.
Thomas continuou.
— Você tem que dizer isso. As mulheres precisam ouvir. Elas gostam de
ouvir e é importante construir um vínculo forte. Admitir de má vontade que você
se casaria com ela é muito diferente de explicar como se sente.
— Não foi de má vontade — objetou Derek.
— Demorou um ano.
Bem, esse era um argumento sólido. Ele tomara a decisão, mas atrasado em
doze cruciais meses.
— Como me sinto? — ele murmurou. — Isso é bem fácil. Sinto-me
miserável.
Um sorriso benigno iluminou o rosto de seu tio.
— Seu estado atual de desconforto me diz que você está sendo sincero,
Derek. Mas não irá progredir muito se simplesmente aparecer e encará-la com
fúria nos olhos cada vez que ela mencionar o nome de Lorde Hyatt.
— Eu não a encaro com fúria nos olhos. — Derek tentou conscientemente
limpar a expressão feroz do rosto.
— Não. — Uma risada ecoou. — De modo algum.
— Seu deboche pela minha atual aflição é um pouco antiesportivo, não é?
Achei que os homens tinham um pacto tácito de tornar obrigatória a compaixão
por um camarada decadente. — Derek se levantou e caminhou impaciente até a
janela. Estava completamente escuro lá fora, e sua imagem refletida no vidro
mostrava lábios franzidos em uma expressão infeliz e tensa.
— Confie em mim, eu estou realmente compadecido pelo seu dilema, Derek.
Amo Annabel como se fosse minha própria filha. Sou seu pai desde que ela tinha
oito anos de idade, e sua felicidade é muito importante para mim. Também
gostaria de vê-lo resolvido e satisfeito com a mulher certa, em vez de dividir seu
tempo entre obrigações de negócios maçantes e casos de amor frívolos. Duvido
que essas coisas te tornem um homem realizado.
A observação foi muito pertinente. Derek fez uma pequena careta e se virou.
— No ano passado, fiz o melhor que pude para me convencer de que era uma
paixonite que passaria como qualquer outra.
— Eu acredito que Annabel tem estado ocupada fazendo a mesma coisa.
— E se você estiver errado? E se seus sentimentos por Hyatt forem
genuínos? Afinal, ela concordou em ser sua esposa. — A última palavra saiu um
pouco embargada. Sua gravata pareceu, de repente, muito apertada, então, ele a
soltou com um puxão descuidado.
Thomas cruzou as mãos e sacudiu a cabeça.
— Onde está agora o jovem confiante que só precisa olhar para o lado para
que as damas aristocráticas desmaiem em seus braços? Certamente você sabe
muito mais sobre mulheres do que eu. Tive uma existência bem mais sadia na
minha juventude, portanto, minha experiência é limitada principalmente aos
meus anos de vida de casado. Mas posso dizer com confiança que a maneira
como Annabel age em sua presença é bem diferente da pessoa mais submissa
que vejo quando você não está lá para testemunhar sua suposta felicidade.
— O senhor acha que ela está tentando me deixar com ciúmes? — Sentiu-se
ridículo só de perguntar, mas realmente queria saber.
— Na outra noite, na festa da família, ela certamente estava mais
paqueradora e atenta ao seu prometido do que de costume. Quando você saiu,
mostrou-se visivelmente mais deprimida. Para ser honesto, acho que Hyatt
percebeu e talvez até mesmo tenha feito a conexão entre a sua partida e a
mudança de comportamento dela. Da parte de Annabel, não acho que seja
consciente, porque ela não é uma pessoa vingativa. Mas creio que queira que
você acredite que não nutre mais sentimentos em relação à sua pessoa.
— Ela está tendo sucesso. — Derek exalou de forma irregular. — Sinto-me
ciumento e inseguro, e detesto ambos os estados, para sua informação.
— Sinto muito por isso, mas, francamente, eu estava começando a me
perguntar se você nunca teria mais do que um interesse passageiro por alguma
mulher. — Thomas calmamente se serviu de mais uma taça. — Você parecia
muito determinado a evitar qualquer envolvimento que pudesse se tornar
permanente. Suponho que seja por isso que não me preocupei quando percebi os
sentimentos românticos da adolescente Annabel. Seja o que for que as fofocas
dizem, eu te conheço bem e você tem honra demais para comprometê-la.
Percebo que algo aconteceu, mas não vou perguntar o quê. Confio em você.
Se Thomas conhecesse algumas das fantasias menos que honradas que Derek
tivera sobre sua bela protegida, poderia não agir com tanta calma, mas, no final
das contas, Thomas estava certo, ele nunca teria se aproveitado da paixão da
moça.
Na época.
O jogo era um pouco diferente agora.
— Um único beijo — admitiu Derek.
— Ah.
— Um que me assustou até a morte. — Ainda podia se lembrar com clareza
vívida não apenas do doce e sedutor sabor de sua boca, mas também do brilho de
esperança em seus lindos olhos que o fizeram perceber que ele caíra de algum
precipício figurativo diretamente para um abismo.
Talvez o beijo o tivesse assustado não apenas porque temia prender-se a uma
única mulher, mas por um medo interior de que não merecia confiança e
emoção.
As sobrancelhas de Thomas se arquearam, e ele riu.
— Duvido que haja pessoas na sociedade capazes de acreditarem que o
escandaloso conde de Manderville tenha ficado assustado com um simples beijo
concedido a uma jovem inocente.
— Eles estariam errados. — A coisa toda era difícil de articular de uma
maneira que fizesse sentido. Derek explicou lentamente: — Foi mais a forma
como ela me olhou depois. De repente, percebi que era um ponto de virada na
minha vida. Eu poderia ir embora o mais rápido possível e fingir que nunca
havia acontecido ou poderia considerar uma opção na qual nunca havia pensado
antes, que era o casamento. Optei pela primeira, mas não deu certo. A última
parece ser, agora, a minha única escolha.
Como poderia propor casamento a uma mulher comprometida, que mostrava
de forma muito convincente e intensa não gostar dele?
A realidade deprimente era que ele não fazia ideia.

N ICHOLAS SORRIU AO CONTEMPLAR O OLHAR SATISFEITO DA MULHER À SUA


frente.
— Pensei que isto seria mais agradável do que jantar dentro da casa. Está
uma noite linda, não acha?
Caroline aceitou a cadeira que lhe era oferecida, acomodando-se com graça,
as saias de seda esvoaçando enquanto ela se sentava e as ajustava com uma mão
delicada. Sua expressão era um pouco confusa enquanto olhava para os
gigantescos arranjos florais espalhados em vasos por toda parte, enquanto o
perfume das flores preenchia o ar. A mesa também fora bem feita. Um pano
branco imaculado, coberto de porcelana e prata reluzente, fora colocado sobre
ela, que estava localizada na borda do terraço, perto dos degraus, onde podiam
contemplar os jardins. Como se a natureza estivesse em total cooperação com
seu capricho, a lua pairava baixa sobre o topo das árvores, o ar era quente e a
brisa não passava de um sussurro agradável. As dezenas de velas em candelabros
estrategicamente posicionados mal tremeluziam.
A Sra. Sims − responsável por tudo, exceto a lua e a perfeição estrelada da
noite − merecia um aumento considerável; ele decidiu enquanto acomodava-se
em uma cadeira e pegava uma garrafa de vinho para servir uma taça a cada um.
Não visitava Essex com frequência, mas talvez, depois daquele interlúdio,
passasse a usar a propriedade com mais constância. Para sua surpresa, gostou do
silêncio. Quando jovem, irritava-se por ver-se tão isolado. Como um homem de
quase trinta anos, sua perspectiva estava mudando.
— Sim, está adorável. Que ideia maravilhosa. — Caroline o olhou do outro
lado da pequena mesa íntima. — Estou muito impressionada com a sua
inspiração.
Ele era o mais impressionado. Ela costumava preferir vestidos em tons de
verde ou cinza, mas naquela noite estava mais do que deslumbrante em um
vestido azul índigo, a pureza de sua pele marcada pela cor escura, a massa
pesada de seu cabelo ruivo erguida em um coque de estilo simples que se
adequava à sua beleza clássica. Havia uma única safira aninhada no tentador
vale entre seus seios deliciosos, com um tamanho de gema não opulento, mas
cortada em uma forma oval perfeita e sustentada por uma fina corrente de ouro
em volta do pescoço delgado.
Nicholas se perguntou, com uma pontada de emoção desconhecida, se o
marido teria dado o colar a ela. Por que diabos ele se importava, não tinha
certeza, mas sentia uma necessidade sem precedentes de dar-lhe algo ainda mais
deslumbrante. Talvez brincos de rubi, já que as pedras enfatizariam os destaques
sutis de seu lindo cabelo. Quando voltassem para Londres, poderia enviar como
um presente. Afinal, estava se divertindo plenamente. Ele disse:
— Você está deslumbrante. Gosto dessa cor em você.
— Você está bastante bonito também, mas obrigada. — Um sorriso enorme
curvou sua boca. — Lorde Manderville terá dificuldade de competir com uma
noite perfeita de luar, jantar e vinho no terraço.
Se o colar o incomodava, pensar em Derek ocupando seu lugar, em frente a
ela em uma mesa, proporcionava-lhe um inquietante lampejo de desagrado.
Tentou disfarçar o melhor que pôde e sorriu.
— Se você está disposta a me dar crédito pelo clima, eu aceito. Encomendei
esta linda noite só para você.
— Se alguém é capaz de forçar até mesmo a natureza a conceder seus
desejos, este alguém é você, Rothay. — Caroline riu, aceitando uma taça de
vinho, posicionando seus dedos finos ao redor da haste. — Receio estar ficando
mimada.
— É assim que tem que ser. Senhoras tão adoráveis como você devem fazer
pouco mais do que decorar o mundo ao seu redor.
Ela o olhou, seus cílios ligeiramente abaixados, o brilho da chama das velas
competindo com a luz das estrelas para iluminar seu rosto e graciosos ombros
nus.
— Você é muito galante.
— Com você é muito fácil. — Negligentemente ele ergueu o copo à boca e
tomou um gole de vinho.
— Eu queria... — Ela parou e mordeu o lábio; em seguida, desviou o olhar
por um momento, parecendo repentinamente distante.
Nicholas esperou, curioso com o que ela quase disse, contando com a
habitual falta de rodeios de Caroline para descobrir do que se tratava. Quando
ela não prosseguiu, perguntou suavemente:
— Você queria o quê?
Ela apenas balançou a cabeça, mechas de cabelo brilhante acariciando seu
pescoço.
— Eu estava prestes a dizer algo que tenho certeza de que você acharia
alarmante e ingênuo, então, não vou ser tão franca.
Ele colocou o copo de volta sobre a mesa com cuidado deliberado.
— Estou começando a descobrir que gosto da sua falta de hipocrisia. Diga-
me.
Ela o olhou do outro lado da mesa íntima, seus lábios macios separando-se
por uma fração de milímetro.
Então ela disse calmamente:
— Eu ia dizer que gostaria que isso fosse real.
Ela estava certa. Uma onda de alarme o atingiu. O problema não era o desejo
de imediatamente descartar qualquer sugestão de envolvimento romântico, mas
uma reação muito mais perturbadora: uma pequena parte de Nicholas, uma que
ele julgava estar morta depois de sua experiência com Helena, concordava com
aquela divagação.
Para piorar a situação, ela prosseguiu, baixando os cílios suavemente.
— Quero dizer, se a ilusão é tão agradável, quanto melhor seria se fôssemos
realmente… — Para seu alívio, a chegada da governanta escocesa com o
primeiro prato a impediu de terminar e o dispensou de ter que fazer um
comentário. Enquanto provava a sopa, Nicholas deixou de lado o desconforto em
compreender o que ela quisera dizer. Afinal, fora o responsável por projetar o
ambiente romântico e o clima sedutor. Pensou que estivesse imune, mas talvez o
feitiço pudesse se voltar contra ele.
Eles comeram, conversaram em voz baixa e beberam vinho enquanto o céu
se enchia de estrelas e o som dos insetos se assentava em um padrão narcótico
sobre as árvores. A comida era, como de costume, simples, mas tão fresca e bem
preparada que não importava que não fosse composta por molhos extravagantes
ou ingredientes invulgares. Com a sobremesa, Nicholas encontrou-se, de alguma
forma, discutindo suas opiniões políticas, sua família, seus cavalos novamente.
Por ser tão bem educada, Caroline tinha uma capacidade fascinante de envolvê-
lo em uma conversa que não girava em torno de fofocas sem sentido ou algo
ainda mais tedioso.
O intelecto, na verdade, podia ser tão atraente quanto todas as outras partes
deliciosas de uma mulher; ele decidiu, ainda sentado em frente a ela, observando
a luz do luar dourar seus cabelos.
Sua mãe a apreciaria.
Bom Deus, de onde veio tal pensamento?
— Você realmente esteve em Roma? — ela perguntou, trazendo-o de volta
ao tópico atual de conversa, que eram suas viagens depois de terminar a
universidade. — Viu o Coliseu, os aquedutos, as grandes igrejas?
— Eu preferi Florença — ele respondeu, apreciando a maneira como seu
rosto se iluminou com interesse, dando-lhe uma animação que era até mais
atraente do que seus traços perfeitos e femininos. — Você deveria ir algum dia.
E a Grécia também é fascinante e incrivelmente primitiva para um país com tal
cultura e rica história. Creta, em particular, tem uma atmosfera selvagem, apesar
de sua complexa civilização antiga ter a fama de ter sido destruída. Além disso,
possivelmente foi o modelo para a Atlântida de Platão.
Naquele momento, Caroline apoiou os cotovelos na mesa e olhou para ele.
— Você acha que a teoria tem alguma validade? Um artigo foi apresentado
recentemente à Royal Society, que sugeriu a mesma coisa. Na época, achei a
suposição intrigante. Acredita-se que uma onda catastrófica de uma erupção
vulcânica a quilômetros de distância tenha engolido a grande cidade e a
devastado.
Era ele quem estava devastado por seu interesse sincero.
— Eu não sou um arqueólogo, de maneira alguma, mas a hipótese é
interessante, não é?
— Invejo intensamente suas experiências. — Por um momento seu rosto se
fechou, mas então ela sorriu e sacudiu a cabeça tristemente. — Como se você já
não tivesse reparado... Eu não tenho muito acesso a discussões como esta. A
senhorita Dunsmore e eu costumávamos nos sentar por horas, e ela me contava
as teorias de seu pai e suas viagens. Sinceramente não acho que ela sequer se
importava por ele abandoná-la em troca das histórias que contava e artefatos que
trazia ao voltar. Ela me proporcionou uma grande sede por um mundo mais
amplo. Temo que esteja lhe fazendo perguntas como uma criança curiosa.
Não havia nada de infantil nela, ele pensou, enquanto deixava o olhar vagar
por sua forma flexível e sedutora.
— Acredito que eu já lhe disse que responderia a qualquer pergunta que
fizesse.
Mas isso fora na cama, quando ele sentira sua ignorância e incerteza. Ela se
lembrou da mesma coisa, pois um olhar confuso atravessou seu rosto.
— Disse, de fato.
Ele ergueu uma sobrancelha em um arco sugestivo e vagaroso.
— Há mais alguma coisa que você gostaria de saber? — A conotação sexual
da questão era inconfundível. A boca de Caroline — aquela boca deliciosamente
beijável — curvou-se. Ela disse asperamente:
— Tenho certeza de que, se houvesse, você seria a pessoa a quem perguntar.
— Alguma objeção às minhas especialidades? — Ele manteve a pergunta
leve e provocante.
Uma expressão indefinível cruzou seu rosto, quase melancólica.
— Não.
— Venha — disse ele, levantando-se e estendendo a mão. — Dance comigo.
— Nós não temos música — ela se opôs, mas levantou-se obedientemente, e
seus dedos se entrelaçaram aos dele. A seda do vestido roçou suas pernas.
— Precisamos de uma? — Ele passou um braço pela cintura dela e a
aproximou, perto demais para um salão lotado de Londres, mas adequado para
uma valsa isolada em um terraço estrelado na escuridão quente da bucólica zona
rural.
Ela se movimentou conforme ele conduzia, os seios roçando seu paletó, a
sensação de seu corpo tão inebriante quanto qualquer espírito.
— Só não me peça para cantar — disse ela de maneira branda — ou
tropeçaremos por todo lado. Receio que meus talentos não sigam esta direção.
A risada dele atingiu os fios do cabelo de Caroline.
— Vou imaginar a música na minha cabeça.
— Seria melhor, confie na minha palavra sobre isso.
— Para uma mulher bonita, você tem uma notável falta de presunção.
Ela o olhou com uma incerteza pungente, seus olhos adquirindo uma cor
luminosa impressionante.
— Acho que não tive muita prática com a vaidade.
Ele concordou. Também não achava que ela tivesse. Algo muito
surpreendente quando se considerava o quanto era fascinante, mas talvez um
pouco menos assombroso se fosse considerado seu passado. Nicholas moveu-se
devagar, em passos curtos, enquanto se viravam, giravam, e ele apreciava a
sensação suave e deliciosa de seu corpo contra o dela.
A dança continuou, e o momento adquiriu uma qualidade idílica que ele não
tinha oportunidade de experimentar com muita frequência em sua vida
atribulada. Mas que homem, ele filosofou, não iria gostar de desfrutar de uma
noite tão requintada, tendo uma mulher desejável em seus braços e sabendo que
aquela valsa silenciosa e íntima era apenas o prelúdio de outro tipo de dança que
aconteceria quando ele a levasse para sua cama. Sua ereção já aumentava,
enrijecendo-se constrangedoramente contra o tecido das calças justas.
Quando pararam de dançar, finalmente, Nicholas se inclinou para sussurrar
em seu ouvido:
— Eu quero você.
— Eu posso perceber — ela também sussurrou, deixando uma risada
ofegante escapar. — Você está me segurando escandalosamente perto, sua graça,
e seu entusiasmo é bem evidente.
— Gostaria de estar ainda mais perto. — Ele a ergueu em seus braços em um
movimento teatral, notando que suas faces estavam coradas e não podia ser pelo
movimento lento e oscilante de dançar pelo terraço. — Vamos ver se consigo
providenciar isso.
Em poucos passos ele cruzou as lajes e abriu caminho através das portas
francesas, abertas à agradável noite. A Sra. Sims estava no corredor principal e
pareceu surpresa quando eles apareceram, seu olhar preocupado fixando-se em
Caroline.
— Sua Graça... está tudo bem?
Caroline fez um pequeno som que Nicholas interpretou como embaraço. Ele
disse, então, em serenidade tranquilizadora:
— Tudo ótimo. O jantar estava excelente. Por favor, diga ao cozinheiro.
— Sim, claro. — Sra. Sims conseguiu recompor sua expressão ligeiramente
chocada.
— Minha senhora está cansada. Eu sugeri que ela se recolhesse.
Era quase uma verdade. Ela poderia dormir depois.

S UA MORTIFICAÇÃO POR TER A GOVERNANTA TESTEMUNHANDO A IMPULSIVIDADE


impetuosa de seu amante ao carregá-la pelas escadas foi temperada pela
excitação que fluía em suas veias como vinho adocicado.
Seu amante.
Não importava como acontecera nem quão curto seria seu tempo juntos, o
carismático Nicholas Manning era seu amante, mesmo que por apenas uma
semana.
O grande gesto que culminou na refeição romântica era parte do que
Caroline imaginaria como algum tipo de sonho idealizado. Ser carregada para o
quarto dele foi a conclusão natural de uma valsa lenta e sedutora.
— Ela não acreditou nem por um minuto que eu esteja apenas cansada — ela
murmurou, descansando a cabeça em um ombro largo. Caroline sabia que suas
bochechas estavam rosadas, mas não tinha certeza do quanto se importava.
Nicholas cheirava maravilhosamente bem, de um jeito másculo, e isso lhe
causava um efeito intoxicante que fazia seus mamilos formigarem e calor pulsar
entre suas pernas.
— A opinião da governanta não me interessa, embora eu planeje
recompensá-la e fazer uma ou duas observações sobre o quanto eu apreciaria seu
silêncio durante a minha visita. — Ele parecia carregá-la com tanta facilidade
que sua respiração sequer se alterava enquanto caminhava num ritmo atlético e
suave.
Ela desejou poder compartilhar sua indiferença com a opinião dos outros,
mas, novamente, Nicholas já estava muito acostumado a ser examinado a cada
passo. O esplendor de sua boa aparência sombria, a extensão de sua fortuna e a
posição exaltada de seu título o tornavam um alvo natural de interesse. Se a
sociedade descobrisse sua participação na aposta perversa, ela ganharia uma
reputação tão duvidosa quanto a dele, e este era um reconhecimento que preferia
evitar.
Não, Caroline se assegurou rapidamente enquanto ele empurrava a porta do
quarto com o pé. Ninguém iria descobrir.
Ele a colocou na cama e em seguida levou os longos dedos à gravata.
— Eu preciso de você nua. — As palavras não foram ditas com ternura, mas,
sim, com uma urgência convincente.
— Isso é uma sugestão ou uma ordem? — Era incrível como as coisas
tinham mudado em apenas alguns dias.
Se Edward lhe dissesse aquelas mesmas palavras, sua vontade seria sair
correndo do quarto. Com o duque diabólico, ela apenas sentou-se e descalçou os
sapatos, levantando audaciosamente as saias para tirar as meias. O olhar sombrio
de Nicholas observava cada um de seus movimentos, enquanto ele tirava o
próprio paletó.
— Depressa — ele disse suavemente.
E de alguma forma aquela palavra a excitou. Caroline fechou os olhos num
breve lampejo de sensações e depois ergueu as saias, ajeitando-as acima da
cintura. Abriu as pernas descaradamente.
— Isso é rápido o suficiente?
Nicholas praguejou baixinho e quase silenciosamente, deixando seus
sentimentos claros o suficiente sem precisar de palavras.
Ele abriu as próprias calças.
— Está perfeito.
Por que ela não estava com medo?
Porque ele não iria machucá-la. Sabia disso. Medo era a última coisa em sua
mente quando ele puxou as calças pelos quadris magros e colocou-se por cima
dela. Não seria do feitio dele forçá-la a algo, e ela definitivamente o queria de
todas as formas possíveis. Sua investida foi impetuosa, mas, mesmo durante o
momento de urgência impaciente e completa, ele fez uma pausa, interrompendo
a penetração na metade do ato carnal, perguntando com voz rouca:
— Você está bem?
— Eu preciso de você.
Caroline podia sentir o calor do corpo poderoso através do tecido de sua
camisa. Seus dedos se espalharam pelo peito dele, testando os contornos
musculares.
Em resposta ao protesto diante da hesitação de Nicholas, ele a penetrou por
completo, até o fundo, para que ela pudesse sentir toda a extensão rígida de seu
desejo, a extensão de como ela o excitava.
Esta é a sensação de ser mulher.
Oh, Deus.
Seus quadris se ergueram a um comando que ela nem sabia que dera quando
Nicholas começou a se mover. Ele deslizou para trás e, em seguida, investiu em
posse total novamente, com tanta força que ela arfou. Uma sensação delirante
saturou seus sentidos, assumiu seu corpo faminto, e ela se banhou em sua glória,
no ostensivo apelo carnal como uma droga. Sob o tecido fino da camisa, os
músculos dele estavam rígidos de tensão.
Na primeira noite, ela ficara assustada, apesar de sua determinação, mas ele
se conteve e a tranquilizou. Na tarde anterior, enquanto faziam amor na clareira
ensolarada, Caroline sentiu-se um pouco mais livre, menos inibida pelo seu
passado, curiosa e ainda cautelosa.
Agora ela estava... ansiosa. Molhada. Desejando.
Desejando a ele. Sua generosidade e habilidosa entrega de prazer
arrebatador. Cada estocada proporcionava um gemido baixo e revelador, e ela
arqueava de volta em resposta às suas investidas. De alguma forma, o fato de
eles mal poderem esperar para se despirem inflamava seus sentidos.
Ela se sentiu devassa. Era maravilhoso.
Nicholas a tornara uma devassa.
E ela se glorificava nisso.
O ritmo aumentou, o fluxo de seu corpo contra o dela tornou-se mais
frenético, mais selvagem, e ela se agarrou a ele com crescente urgência. Caroline
deixou a cabeça cair para trás enquanto gemia de prazer, e ele murmurou algo
incompreensível.
Então Nicholas chegou ao clímax. Ela registrou o enrijecimento de seu corpo
alto, a erupção de ar de seu peito, seus cílios escuros abaixando abruptamente
quando ele ficou completamente paralisado, exceto pelo pulsar profundo de sua
libertação. A explosão contra seu útero foi forte e tão arrojada quanto a maneira
como ele a arrebatou do terraço, carregando-a pelas escadas.
O calor da respiração de Nicholas roçou sua bochecha quando, momentos
depois, ele deu uma risadinha.
— Desculpe-me. Dê-me um minuto ou dois e prometo que vou compensá-la.
Aparentemente, danças ao luar com lindas damas de cabelos ruivos despertam
minhas paixões em um grau embaraçoso. Não me lembro de já ter terminado tão
rápido.
Embora duvidasse que ele pudesse se dar conta disso, a ideia de fazer o
Duque de Rothay, seguro, experiente e diabólico, perder o controle era
empoderadora, inebriante. Caroline fechou os olhos para que ele não pudesse ver
o brilho repentino de suas lágrimas. Elas eram de alegria, uma suave evidência
de sua percepção de que todos os golpes dolorosos e o escárnio que
experimentara nas mãos de seu marido estavam sendo apagados com cada toque
carinhoso, cada sorriso verdadeiro e cada beijo selvagem e luxurioso.
Ela desejou que aquela semana nunca terminasse.
Nicholas saiu de dentro dela, e Caroline reprimiu um suspiro de
desapontamento por ele não ter problema para interpretá-la. Seu sorriso era um
lampejo de dentes brancos. Deitado ao lado dela, apoiado em um cotovelo, suas
calças desabotoadas, seu cabelo escuro um pouco desgrenhado, ele era a imagem
de uma promessa erótica interessante. Um dedo traçou um caminho por seu rosto
e por seu lábio inferior.
— Não se preocupe. No meu atual estado de mortificação masculina, estou
determinado a me redimir de todas as formas possíveis. Deixe-me te despir e
vamos começar de novo, minha querida Caroline.
Ela gostou da ideia de ser querida por ele.
Um pequeno sorriso curvou seus lábios. Desalinhada, com as saias ainda
amontoadas ao redor da cintura, sentia-se languidamente insatisfeita, embora
duvidasse que fosse durar.
— Você ainda não me desapontou.
— O voto de confiança é apreciado. — Seus dedos desabotoaram o vestido
habilmente, enquanto ele a tomava nos braços. — Eu lhe disse que uma mulher
tem um grande controle sobre um homem quando ele a deseja da forma como eu
a desejo.
— Pena que é só por causa da competição entre você e Manderville.
Ele fez uma pausa, ficando muito quieto.
Caroline, por sua vez, ficou horrorizada.
Lá estava ela, pela segunda vez em uma noite, dizendo o que se passava por
sua mente. O que esperava? Uma declaração de afeto de um homem que mal a
conhecia? Ele poderia ter explorado cada centímetro de seu corpo, mas poucos
dias na companhia um do outro dificilmente constituíam um relacionamento
profundo, e suas circunstâncias incomuns tinham que ser levadas em
consideração.
Suas faces se aqueceram diante da própria audácia e da capacidade
desajeitada de dizer a coisa errada na hora errada. Era por isso que costumava
ficar tão quieta, tão rigidamente reprimida, quando se tratava de conversas em
público. Ela poderia, como acabara de provar, deixar escapar algo embaraçoso.
Felizmente, ele era muito mais experiente nas complexidades dos contatos
casuais entre homens e mulheres e deu de ombros, parecendo ignorar as
implicações de sua observação inoportuna. O último botão de seu vestido se
soltou, e ele sorriu de maneira quixotesca.
— Essa aposta infernal nos uniu, então não vou me arrepender. Neste
momento, você está aqui... — ele deslizou seu vestido para baixo e expôs seus
seios rijos sob a fina camisola — e tão carnalmente disponível.
Beijou-a enquanto continuava a retirar vagarosamente sua roupa. Beijos
longos, lentos e sensuais, que seduziam, enganavam e eram um testemunho de
sua merecida reputação. Nas horas seguintes, ele mais do que compensou sua
pequena falha sexual, levando-a ao clímax uma e outra vez, altruísta, provando
que seu vigor lendário não era um mito, mas baseado em fatos.
Mais tarde, satisfeita e sonolenta, ela ponderou o futuro com uma sensação
surreal de introspecção fatalista. Aninhada em seus braços, era fácil sentir-se
desejada, sentindo sua presença imponente como um símbolo da mudança
monumental em sua vida.
Precisava, porém, se perguntar, embora pudesse estar curada de sua
insegurança incapacitante, se também poderia ser condenada. Com seu nível de
inexperiência, ela ingenuamente presumira que a intimidade de fazer amor
poderia ser desconsiderada. Afinal, Nicholas e Derek Drake tinham a reputação
de serem capazes de seduzir e abandonar com facilidade, sendo o prazer
transitório seu único objetivo.
E se ela não conseguisse ser tão desapegada?
Ao lado dela, Nicholas tinha adormecido, em toda a gloriosa beleza
masculina, sua respiração regular erguendo seu peito em um ritmo constante. Ele
era o problema, ela percebeu, olhando para onde a brisa da noite gentilmente
erguia as cortinas. Uma vez que tudo era tão novo, tão glorioso, ficava difícil
separar a realidade da fantasia.
Ele conversava com ela. Isto era mais atraente do que sua inegável
habilidade em despertar seu corpo. Se tivesse simplesmente feito o que ela
esperava e a tivesse arrastado para o quarto durante toda a semana, talvez ela não
se sentisse tão perturbada. Em vez disso, fora cuidadoso, gentil e atencioso em
todos os sentidos.
Agora ela sentia um medo angustiante de não conseguir se afastar com
facilidade.
Nicholas mudou de posição, puxando-a para mais perto, mesmo durante o
sono profundo, como se tivesse feito a mesma coisa mil vezes com outras
amantes.
Ele provavelmente tinha mesmo feito isso mil vezes. O que não deveria
incomodá-la.
Mas incomodava.
A nnabel se virou obedientemente, o tecido de seu elaborado vestido de
noiva caindo em camadas ao seu redor e alfinetes por toda parte, enquanto
a costureira se ajoelhava no chão e mexia na bainha. Margaret observava com
um olhar crítico, ocasionalmente fazendo um comentário ou dois.
Seria muito óbvio, Annabel se perguntou, o quanto estava distraída e
indiferente a algo que deveria significar muito para ela?
Esperava que não, mas sentia medo de que a verdade estivesse escrita em
todo o seu rosto.
Esse medo foi confirmado quando elas deixaram o estabelecimento da
modista uma hora depois e foram para casa. Margaret Drake ainda era adorável,
com cabelos castanhos suaves ficando grisalhos de uma forma graciosa, sua pele
mostrando linhas minúsculas que não diminuíam a beleza da boa estrutura óssea.
Seus lindos e brilhantes olhos fitavam Annabel do outro lado do assento da
carruagem. A mais velha foi direto ao ponto:
— Algo está errado?
Algo está certo?
Annabel tentou se fazer de desentendida.
— Eu não tenho certeza do que a senhora quer dizer.
— Você parece cansada, minha filha querida, quase apática, e não tem se
alimentado bem. Agora mesmo, ao provar seu vestido de noiva, mal ofereceu
uma opinião, mesmo quando lhe perguntaram diretamente.
Era tudo verdade, e como Margaret era como uma mãe para ela, Annabel
achava difícil não confessar o que realmente a incomodava. Exceto que não
podia. Se dissesse em voz alta, teria que realmente pensar sobre o assunto, e isso
estava fora de questão.
— Eu nunca soube que planejar um casamento era tão... exaustivo —
explicou ela, com uma verdadeira pontada de culpa. Não se tratava de uma
mentira. Os detalhes eram realmente um pouco esmagadores, mas também não
representavam o verdadeiro motivo de sua abstração.
Margaret inclinou a cabeça um pouco, estudando-a, os olhos ligeiramente
estreitados.
— Lorde Hyatt concordou com qualquer tamanho de cerimônia que você
desejasse. Não precisa ser tão grande se você preferir algo um pouco mais
privado.
Isso também constituía parte do problema. Alfred era um homem muito
agradável e simpático. Diferente da outra pessoa que ela não queria nomear; um
certo conde que na superfície parecia muito educado e absolutamente
encantador, mas que por baixo do bonito exterior escondia egoísmo e
insensibilidade.
— Eu quero uma grande festa. — As palavras saíram muito ríspidas, então,
com esforço, ela modificou seu tom. — O que quero dizer é que o casamento é
um grande passo, e quero compartilhar minha felicidade com meus amigos e, é
claro, com minha família.
Margaret ergueu as sobrancelhas.
— Tudo bem, então, mas você pode mostrar mais entusiasmo pelos detalhes.
E, sim, o vestido de noiva é um desses detalhes.
Ela mordeu o lábio e suspirou.
— Sinto muito por ser uma companhia desagradável esta tarde.
— Minha querida criança, não estou lhe repreendendo, é apenas
preocupação. Se você se arrependeu desse compromisso, agora é a hora...
— Não — Annabel interrompeu rapidamente. — Não me arrependo de nada.
Que mentira terrível para alguém que ela amava.
Houve uma longa pausa, enquanto o único ruído era o som das rodas sobre
as pedras e o chamado do vendedor ocasional vendendo mercadorias em uma
esquina. Então Margaret assentiu com o rosto sério.
— Se tem certeza de que deseja continuar com isso, sabe que farei o meu
melhor para torná-lo um evento maravilhoso do qual você lembrará para sempre.
Annabel nunca duvidara disso e se sentia duplamente culpada por estar
mentindo.
— Alfred é carinhoso, generoso e gentil. Além disso, é possível que seja fiel,
que não é algo que a maioria das esposas pode esperar. Por que eu não iria
querer continuar com o compromisso?
— Você está realmente me fazendo uma pergunta? Se assim for, tenha
cuidado, eu posso responder.
Foi a vez de Annabel estreitar os olhos e encará-la.
— O que isso significa?
— Significa que estou preocupada. Acho que, por qualquer motivo, você não
está realmente feliz com o casamento, tanto quanto finge o contrário. Thomas até
disse alguma coisa, e, minha querida, quando um homem percebe e observa o
que uma mulher está sentindo, é porque é bem óbvio. Eles não são as criaturas
mais observadoras.
Ela não ficaria tão abalada, tão abertamente infeliz, se Derek, de repente, não
surgisse em todos os lugares para onde olhava. No ano anterior, mal o vira, mas
nos últimos cinco dias ele fora jantar três vezes, tomar chá duas vezes e até
aparecera em uma pequena apresentação musical da filha de um dos amigos de
Margaret. Seu comportamento sem precedentes gerara mexericos por toda a sala,
e a pobre jovem ficara tão nervosa por ter o infame conde na plateia que
praticamente destruíra todas as interpretações de Bach e Mozart de uma maneira
que teria feito os dois compositores estremecerem. Annabel suportara tudo com
os dentes cerrados, e não foram as notas dissonantes que a incomodaram, mas a
presença magnética de Derek em um evento tão pouco importante. Os olhares
cobiçosos que as mulheres lançavam a ele eram inconfundíveis. Trajando uma
elegante roupa de noite, seu cabelo loiro brilhando à luz das velas, ele mantinha
uma expressão inescrutável em seu rosto enquanto escutava a música, parecendo
ignorar a incredulidade de todos na sala por causa de sua presença.
Ninguém ficou tão surpreso ou desconfortável quanto Annabel. Temia que
até Alfred pudesse ter notado.
A ausência de Derek em sua vida tornava tudo mais fácil, mas o repentino
ressurgimento abalara seu mundo. Abalara também sua decisão de esquecê-lo, e
ela desprezava a si mesma e ainda mais a ele por fazê-la nutrir uma dúvida
sequer.
Em parte, era aquela maldita carta que ele lhe escrevera. Estava guardada em
uma gaveta no fundo do armário, o conteúdo inviolado, um símbolo de sua
indiferença.
Mas todo dia, sem falta, ela se perguntava o que a carta poderia dizer e
tornava-se mais tentador do que nunca abri-la e lê-la.
— Certamente eu tenho direito a um pouco de nervosismo por causa do
casamento. — Ela arrumou suas saias com uma mão, tendo o cuidado de parecer
indiferente. — Estou certa de que a maioria das noivas em potencial tem
algumas dúvidas de vez em quando.
— Provavelmente, e eu concordarei com isso, desde que seja tudo. Nós
queremos que você seja feliz.
Feliz? Quando fora a última vez que ela se sentira feliz?
A carruagem virou uma esquina, e Annabel agarrou a alça para se firmar
contra o balanço do veículo. Uma lembrança surgira em sua mente, espontânea e
indesejada, de uma tarde de verão quente e gloriosa, a biblioteca silenciosa em
Manderville Hall, que ela quase considerava seu próprio retiro privado, e um
beijo mágico. Derek, tão incrivelmente atraente com seu cabelo loiro
ligeiramente despenteado e um olhar em seus olhos azuis que ela nunca vira
antes, virando-se para ela, olhando para baixo e abaixando a cabeça com uma
intenção inconfundível...
E então o toque de seus lábios nos dela. Suave, terno, cedendo e exigindo,
roubando o ar de seus pulmões.
Mas então outra memória a invadiu, uma do mesmo homem que a tomara tão
gentilmente em seus braços abraçando outra mulher.
Annabel baniu ambas com uma determinação implacável e disse a Margaret:
— Estou feliz.
Sua mãe adotiva apenas a olhou por um momento e depois murmurou:
— Se você diz, vou acreditar.

A RUA ESTAVA LOTADA NO FIM DA TARDE , E D EREK SAIU DE SUA TABACARIA


favorita na Bond Street, quase colidindo com um dos pedestres que passava pela
porta. Ele murmurou:
— Perdoe-me.
— Manderville. Que bom que nos esbarramos. Não em um sentido literal, é
claro. — A boca do homem se contraiu em uma tentativa de leveza.
Bom Deus, pensou Derek com irônica compreensão, de todas as malditas
pessoas a quem ele poderia praticamente atropelar em uma calçada, por que
tinha que ser o homem que ele menos queria ver em toda a cidade?
— Sim, de fato.
Alfred Hyatt também carregava um pacote.
— Venho do meu fornecedor de luvas. É um negócio tedioso resolver esses
assuntos, mas devo fazê-lo de vez em quando, suponho.
— Não há como fugir — Derek concordou com uma educação severa. —
Bem, suponho que eu...
— Junte-se a mim para uma bebida. Há uma pequena taverna no fim da rua
que serve um uísque decente.
Amigável e urbano, o noivo de Annabel o olhou com expectativa. Pessoas e
carruagens passavam por ali, e talvez fosse o barulho e a distração, ou talvez ele
simplesmente se sentisse um idiota naquele momento, diante da irônica ideia de
tomar uma bebida de forma amigável com seu adversário, mas Derek não
conseguiu inventar uma desculpa rápida sem parecer rude.
Mas que inferno! Hyatt provavelmente nem sabia que eles eram adversários.
— Um uísque me parece uma boa ideia — ele murmurou, e isso não era
mentira. Talvez tomasse uma garrafa inteira, pensou enquanto começavam a
andar.
A taberna mostrou-se apinhada. Os fregueses eram uma mistura de homens
bem vestidos como eles, lojistas e comerciantes. Conseguiram encontrar um
canto sossegado, sentaram-se, e uma garçonete eficiente, com um sotaque
irlandês, chegou para anotar o pedido.
Hyatt sorria da maneira habitual e agradável do outro lado da superfície
desgastada da mesa. Tudo sobre o homem, maldito fosse, era agradável. Ele era
bonito, mas não de uma maneira impressionante; vestia-se elegantemente, mas
sem afetação; seu comportamento não era carente nem enfatuado, então os
homens gostavam dele; e, obviamente, se Annabel concordara em se casar com o
bastardo, ele era interessante para as mulheres também.
Maldição.
— Na verdade, nosso encontro hoje é fortuito — disse Hyatt, cruzando as
mãos sobre a mesa enquanto esperavam por suas bebidas. — Eu tenho pensado
em pedir seu conselho em um assunto importante para mim.
Isso não era o que ele esperava ouvir. Derek ergueu uma sobrancelha.
— Sim?
— Em uma área em que você é um pouco mais experiente do que eu. —
Hyatt deu uma risada com muita naturalidade. — Eu disse um pouco? Eu deveria
ter omitido este detalhe da minha sentença anterior. Digamos que estou
razoavelmente certo, por várias razões, de que você poderá me ajudar com esse
dilema.
— Que dilema?
— Bem… tem a ver com mulheres, é claro. Eu vou adivinhar que no curso
de seus... er... muitos relacionamentos do passado, você tenha descoberto
exatamente o que as agrada quando se trata de presentes. Acrescente a isso o
simples fato de você conhecer bem Annabel, então, perguntei-me se poderia me
orientar sobre o que comprar para ela como um presente de casamento.
Derek ficou observando-o, imaginando que ato ruim poderia ter cometido
para que o destino desejasse puni-lo, colocando o próprio homem que estava
prometido à mulher que amava a pedir-lhe conselhos sobre o que a agradaria
para celebrar suas núpcias. Relembrando rapidamente sua vida inteira, decidiu
que, mesmo em seus momentos menos angelicais, nada vinha à mente que fosse
ruim o suficiente para justificar essa tortura em particular.
Quando ele não respondeu imediatamente, Hyatt acrescentou:
— Estou perdido, mas quero acertar, e tenho certeza de que você entende.
Onde diabos está aquele uísque?
Derek pigarreou.
— O que se compra para uma amante e para uma esposa são duas coisas
diferentes, tenho certeza. Duvido que possa ajudar muito. Annabel não é vaidosa
o suficiente para cobiçar joias ou perfumes caros, receio.
— Viu? Você a conhece — apontou Hyatt com segurança. — Isso já é útil.
Continue.
A garçonete chegou com suas bebidas como um presente do céu. Mesmo que
ela tivesse a pele marcada e fosse provavelmente duas décadas mais velha,
Derek poderia tê-la beijado. Ele pegou o copo e bebeu um bocado tão grande
que quase engasgou, saboreando a ardência da bebida conforme esta descia.
Quanto mais rápido terminasse, mais rápido poderia dar uma desculpa
plausível e sair.
— Eu a conhecia melhor quando criança — ele disse, o que não era
exatamente a verdade, mas perto o suficiente. A criança aberta e inquisitiva dera
lugar a uma mulher, com os sonhos de uma mulher e a capacidade de uma
mulher de seduzir e fascinar. Se ele tivesse entendido a transformação dela um
pouco melhor, talvez não tivesse estragado tudo. — Nós realmente não nos
falamos com frequência.
— Sim, eu percebi isso. — Hyatt tomou um gole razoável de seu próprio
copo.
Pela primeira vez, Derek tomou nota da vigilância nos olhos do outro
homem.
Talvez uma reavaliação da situação estivesse acontecendo, ele percebeu com
um sobressalto.
Tio Thomas dissera que achara que lorde Hyatt havia notado o
comportamento de Annabel na reunião de noivado. Talvez o homem fosse
perceptivo de outras maneiras também. Thomas percebera, afinal. Talvez Hyatt
também tivesse identificado um rival.
Tão desprovido de emoção quanto possível, Derek disse:
— Nós não nos vemos com frequência.
— Ela mencionou isso para mim uma vez. — Hyatt recostou-se um pouco
em sua cadeira, com um olhar atento, e, embora não fosse abertamente hostil,
uma nova expressão se estabeleceu. — Preciso dizer que ela fica bastante tensa
quando seu nome surge.
Maravilhoso. O casal havia discutido sobre ele. Embora Derek duvidasse que
Annabel diria alguma coisa sobre o beijo, estava certo de que ela teria poucos
elogios a fazer em relação à sua pessoa. Não tinha certeza de como explicar seu
escárnio, mas deu o melhor de si.
— Acho que a partir do momento em ela teve idade suficiente para entender
todas as fofocas, decidiu que eu era muito menos heroico do que pensava quando
mais nova. — Ele tomou outro gole de seu copo. — Ela está absolutamente
certa, é claro.
— Entendo. — Hyatt parecia sem graça. — Quem sabe como uma mulher
vai reagir às coisas?
Era difícil saber como responder, então Derek se recusou a fazê-lo. Em vez
disso, terminou sua bebida e pousou o copo fazendo um barulho agudo.
— Desculpe não poder ajudá-lo com uma ideia brilhante para um presente.
— Não. — Hyatt gesticulou com a mão de forma descuidada, mas o
escrutínio guardado em seus olhos não vacilou. — Foi bom conversar, mesmo
assim. Afinal, em breve faremos parte da mesma família e nos veremos com
frequência.
E como diabos ele iria suportar isso, Derek não tinha certeza. Pior do que
imaginar aquele homem e Annabel na cama, era imaginá-la grávida do filho de
outro. Isso o incomodava de uma maneira que ele nunca pensara ser possível.
— Bem — continuou Hyatt no mesmo tom de conversa leve que mal se
elevava acima da multidão barulhenta —, pensei em levá-la em uma viagem
depois do casamento. Itália, talvez. Você acha que ela iria gostar?
Não. Ele não iria discutir sobre a viagem de lua de mel. A palavra “gostar”,
em particular, irritava seus nervos. Derek se levantou, evocando um sorriso
falso.
— Annabel sempre teve um senso de aventura. Tenho certeza de que ela vai
adorar. Agora, se você me der licença...
— Esse senso de aventura já se estendeu a você, Manderville?
Derek ficou muito quieto. Ele estreitou os olhos.
— O quê?
— Qualquer homem perguntaria a mesma coisa, a menos que fosse cego. Eu
— o homem acrescentou sucintamente — não sou. Ela reage a você. Suponho
que a maioria das mulheres o faça, então, talvez não seja algo incomum. Mas
talvez signifique alguma coisa.
Este era o ponto em que Derek deveria ser capaz de declarar que nunca a
tocara. Mas ele a tocara, provara-a, e por mais que um beijo dificilmente
significasse que ele a havia comprometido, ainda não se sentia livre de culpa.
Olhando o outro homem nos olhos, Derek disse secamente:
— Fique certo de que a honra de Annabel está intacta. Obrigado pela bebida.
Ele deu a volta e saiu da taverna, abrindo caminho entre os ocupantes, um
leve resquício de suor em sua testa.
Uma vez fora, andou pela rua com propósito claro, fazendo as pessoas
saírem de seu caminho.
Então, lorde Hyatt tinha suas dúvidas, não é?
Era um bom ou um mau sinal? Annabel poderia odiá-lo ainda mais se ele
fosse uma causa de disputa entre ela e seu futuro marido. Mas Hyatt mencionara
o comportamento dela, não o dele.
Ele precisava falar com Annabel. Não havia uma única dúvida sobre isso.
E ra surpreendente para Nicholas perceber que gostava da suavidade da
aurora. Não que fosse preguiçoso − ele normalmente tinha muitas coisas a
fazer −, mas geralmente ficava acordado até tarde e raramente se levantava
assim que o sol surgia no horizonte. Depois de algumas manhãs deitado na cama
e vendo o céu clarear, ele percebeu que gostava disso.
É claro que não doía ter uma mulher encantadora ao seu lado também, ele
decidiu, e talvez essa fosse a razão pela qual de repente desenvolvera um apego
sentimental pelo nascer do sol depois de vinte e oito anos ignorando-o
completamente.
Caroline dormia como uma criança, de lado, com uma mão sob a bochecha, a
respiração suave e lenta. Contudo, ela certamente não era infantil de nenhuma
outra forma, com aquele corpo voluptuoso nu, parcialmente coberto pelos
lençóis de seda, os seios cheios e rosados expostos e muito tentadores. Seu
cabelo rico caía sobre os ombros pálidos e decorava o cobertor em um lustroso
conjunto de cachos desordenados. Em repouso, ela se parecia com o que ele
supunha ser o ideal da mulher perfeita, toda sensualidade graciosa e o charme
evidente.
Além da vulnerabilidade feminina delicada, juntamente com uma força
interior admirável que o comovia.
Nicholas se levantou e se apoiou nos travesseiros, contemplando sua forma
graciosa com um leve franzido entre as sobrancelhas. Tratava-se apenas de um
arranjo sexual, nada mais do que isso, lembrou-se bruscamente. Sempre fora um
homem prático nos assuntos do coração.
Mas ela acordava cedo, e ele descobriu que gostava de acordar com ela.
Certamente, assim que a sala se iluminou o suficiente para que a mobília não
se parecesse apenas com formas vagas, e para que a luz contra as cortinas
fechadas lançasse um brilho cálido ao tapete oriental, ela se mexeu. Tremulando
os longos cílios, suspirou, espreguiçou-se um pouco e abriu os olhos.
— Bom dia.
Caroline sorriu e girou para lhe dar um sorriso sonolento. Com uma modéstia
um pouco tardia e desnecessária, ela puxou o lençol por sobre os seios nus
enquanto piscava, despertando.
— Bom dia.
— Sempre é um bom dia quando eu acordo com você.
— É muito cedo para me encantar com seu charme, Rothay. — Ela riu e se
alongou preguiçosamente mais uma vez.
— E se eu estiver sendo sincero?
— Não nos conhecemos há tempo suficiente para este tipo de sinceridade.
— É sempre uma possibilidade, de qualquer maneira.
Deleitável e desgrenhada, Caroline era a imagem da sedutora feminilidade.
Íntima, quente e atraente. Ele teve que fechar as mãos para impedir a si mesmo
de tocá-la.
Ele queria explicar que normalmente não acordava ao lado de mulheres. Se
bebesse mais do que o normal, ou se chovesse muito, ele às vezes dormia na
cama da moça com quem se divertia, mas isso era mera praticidade, não porque
queria despertar ao lado de alguém.
Mas não disse nada. Articular seus verdadeiros sentimentos era mais difícil
do que imaginava. Com isso, ele tinha pouca prática. Normalmente era mais
fácil simplesmente ir embora.
Seu caso com Helena lhe ensinara muitas coisas. Manter o apego ao mínimo,
porque isso não poderia trazer nada além de tristeza em sua vida. Confiança era
algo frágil e facilmente quebrável.
Caroline sentou-se e jogou o cabelo para trás, deslizando as longas pernas
nuas para a lateral da cama. Nicholas agarrou seu pulso.
— Não se levante ainda, minha querida.
Com uma risada, ela soltou-se dele.
— Perdoe-me, mas eu preciso...
Ele sorriu quando ela gesticulou para a tela que discretamente escondia o
sanitário do resto do quarto.
— Claro. Quão deselegante da minha parte. Volte depressa.
Caroline arqueou uma sobrancelha delicada.
— Você está em seu estado habitual, percebo.
O nível atual de excitação de Nicholas era uma declaração visível do porquê
de ele querer que ela retornasse o mais rápido possível. O contorno de seu
membro ereto erguia o lençol que pairava sobre sua cintura. Sua boca se
contraiu.
— É um elogio ao seu incomparável fascínio. Ação e reação. No momento
em que você acordou, certa parte da minha anatomia também despertou.
Que sedutora!, ele pensou enquanto a observava atravessar a sala para cuidar
de uma necessidade humana básica, com sua pálida pele orvalhada e as curvas
perfeitamente arredondadas. Quando voltou alguns instantes depois, gozou do
privilégio de observar o balanço de seus seios a cada passo, a carne luxuriante
clamando por sua boca e suas mãos.
Ela deitou-se de volta ao lado de Nicholas, um olhar expectante em seu rosto
adorável. Ele podia sentir o cheiro característico de seu sabonete de violetas.
Nicholas apenas a observou e esperou, vendo seus cílios baixarem por uma
fração enquanto ele descansava contra os travesseiros.
Conforme sua timidez e hesitação diminuíam a cada dia que passava,
Caroline começava a explorar seu lado apaixonado. Era fascinante ver a
evolução, e ele se sentia afortunado por participar da jornada. Ela chegara a ele
virgem em todos os sentidos, exceto no físico, e cada vez que faziam amor
tornava-se um pouco mais ousada.
Quando tudo terminasse, ele se perguntava se ela acabaria mudando de ideia
sobre o casamento. No mínimo, suspeitava que aceitaria um amante.
Tal ideia fez com que ele estreitasse os olhos, sentindo uma onda de
aborrecida possessividade abrandar seu desejo por um momento. Caroline,
deitada de lado, com aqueles cachos ruivos e sedosos se derramando sobre os
ombros e costas, mordeu o lábio inferior, arregalando um pouco os olhos.
— Algo está errado?
Ele não podia ficar com Caroline. Deveria ser luxúria passageira, nada mais.
Sempre passara com qualquer outra mulher e passaria com ela também. Além
disso, ela era muito jovem e casável para ser sua amante, e a possibilidade de
que fosse infértil era um risco muito grande para considerar um tipo diferente de
arranjo.
Na verdade, ele mal podia acreditar que a opção tivesse lhe ocorrido, mesmo
de improviso.
O momento passou. Nicholas sorriu, imaginando se alguns dias no cenário
rural tinham perturbado o equilíbrio de duas decisões. Talvez tivesse respirado
muito ar fresco ou abusado da manteiga caseira. Ou, quem sabe, sua impetuosa
libido estivesse no controle de seu cérebro, tendo uma bela moça nua e
disponível ao seu lado e nada para fazer o dia todo, além de desfrutar de seu
corpo caloroso e disposto. Na semana seguinte o Parlamento estaria em sessão, e
ele voltaria à sua rotina normal. Por enquanto, não devia complicar as coisas e
apenas viver o momento. Aqueles dias de relaxamento em sua vida eram uma
anomalia.
— Nada está errado, muito pelo contrário. — Ele estendeu a mão e tocou
primeiro seu rosto; em seguida, deslizou seus dedos levemente pelo arco de seu
pescoço. — A manhã está gloriosa, e eu a tenho nua ao meu lado. O que poderia
estar errado, minha querida?
— Eu não sei. Por um momento você pareceu um pouco... feroz.
— A única coisa feroz ao meu respeito é o quanto quero você.
O momento passou quando ele se inclinou para frente e a beijou, provando
seus lábios. Ela respondeu como sempre, depois daquela breve hesitação que
indicava que estava progredindo no mundo do deleite carnal, mas ainda
iniciando sua jornada.
Sentia-se mais do que satisfeito em ser seu guia, então, a ideia de passar uma
manhã entre os lençóis proporcionou um brilho rosado ao seu mundo, banindo
sua breve introspecção incomum sobre a hipótese de permanência.

— A SSIM .
As palavras, murmuradas contra sua boca, foram acompanhadas pelo
impulso de suas mãos.
Caroline obedeceu. Era assustador admitir, mas ela provavelmente faria
qualquer coisa que ele pedisse. Especialmente depois do beijo de derreter ossos
que tinham acabado de compartilhar. Tinha vaga ciência dos pássaros cantando
lá fora, o cheiro agradável da brisa da manhã entrando pela janela aberta, as
elegantes cortinas de seda pendendo sobre a cama e a luz que penetrava o quarto
conforme o dia ganhava vida...
Mas, naquele momento, ele era seu mundo inteiro.
E o que ele queria, ao que parecia, era que ela se sentasse sobre seus quadris
esguios.
Nicholas parecia um príncipe medieval depravado, com o cabelo escuro
desgrenhado contra o travesseiro branco e suas feições clássicas e marcantes.
Havia apenas um leve rubor sobre sua pele, e seu peito musculoso se erguia com
um ritmo ligeiramente acelerado.
— Pegue-o em sua mão e o guie.
Sua confusão deve ter sido aparente.
— Para dentro de você — ele esclareceu. Uma pequena contração de sua
boca traía a diversão dele sobre sua ignorância. Mas seu sorriso era terno e
perversamente convincente. — O homem nem sempre tem que ficar por cima.
A ideia de que pudesse haver mais de uma posição era um pouco
surpreendente. Até aquele momento, fora completamente diferente, de todas as
maneiras possíveis — e ela agradecia sinceramente a Deus por isso —, mas a
mecânica da questão fora exatamente como se lembrava com Edward. Ela
deitada de costas, pernas abertas, Nicholas por cima.
— Algumas mulheres gostam muito. Vamos ver se você será uma delas. —
Sua voz continha um tom de rouquidão que ela já conseguia associar à
necessidade sexual.
Algumas mulheres. Claro − ela pensou com um ressentimento involuntário e
irracional − que ele sabia muito bem disso. O duque diabólico provavelmente
poderia desenhar gráficos e escrever dissertações sobre as preferências sexuais
da maioria das mulheres da alta sociedade, incluindo suas posições preferidas.
Seu pênis ereto ergueu-se com força contra o abdome plano, a ponta
brilhando com evidências líquidas de seu desejo. Caroline se balançou um pouco
para frente, enquanto as mãos dele ainda a guiavam, e colocou os dedos ao redor
da carne inchada, conforme se levantava e posicionava o membro em sua
entrada feminina.
Ele fez um pequeno som inarticulado, apertando os quadris de Caroline
suavemente conforme ela mergulhava, deixando que o membro deslizasse
lentamente até que a ponta repousasse contra seu útero. Ela se viu mais uma vez
na habitual e frustrante posição de não saber exatamente como proceder, mas
Nicholas a ajudou, com pequenas frases sussurradas e palavras de encorajamento
para que começasse a se mover. Sob as palmas de suas mãos, o peito másculo
estava quente e rijo, conforme ela subia e descia, finalmente estabelecendo um
ritmo, substituindo a falta de jeito por prazer.
Ela só precisava inclinar um pouco o corpo para que a sensação fosse divina
ao ponto de fazê-la estremecer em resposta. O atrito era deliciosamente
escorregadio e quente, e eles se observavam enquanto seus corpos alcançavam o
ápice ao mesmo tempo. Para cima, para baixo, para cima de novo... Santo Deus,
ela não aguentou, especialmente quando ele encaixou a mão entre eles e fez algo
muito perverso com o polegar no lugar certo.
— Eu acho que agora seria um bom momento, minha querida — as palavras
foram ditas em um silvo por entre seus dentes cerrados. Os quadris dele se
arquearam ao mesmo tempo em que ela descia ainda mais.
O mundo de Caroline desmoronou. O mesmo aconteceu com seu corpo
trêmulo quando ela soltou um pequeno grito e apertou os ombros dele,
pressionando o rosto contra seu pescoço largo enquanto ondas de prazer
explodiam até que ela foi deixada mole e relaxada, em destroços, após o
orgasmo.
Nicholas, segurando-a com força, gemeu e ficou imóvel, empalando-a
incrivelmente fundo, e ela pôde sentir a onda de sua ejaculação, mesmo ainda
tão inebriada.
Ofegantes, lânguidos e em silêncio, eles se aninharam em um momento
preguiçoso pós-coito. Finalmente, ele deu uma risada baixa.
— Acho que você gostou de ser um pouco mais aventureira. Há mais para
aprender, você sabe, e ainda temos três dias.
Uma parte rebelde de seu cérebro traduzia isso. Apenas três dias?
— Sinto-me confiante de que você sabe tudo o que há para saber, Rothay. —
Ela conseguiu erguer a cabeça e esperou que sua expressão parecesse tão suave
quanto ela pretendia demonstrar. Queria soar desapegada, indiferente, mais
parecida com as mulheres a quem ele estava acostumado, porque se pudesse
efetivamente personificar uma daquelas sofisticadas beldades da sociedade,
então talvez pudesse assumir sua atitude blasé sobre relações sexuais
superficiais. Uma parte perversa de Caroline era intensamente curiosa e a
obrigou a fazer a pergunta que estava no fundo de sua mente desde o momento
em que o conhecera.
— Diga-me, depois de tantas mulheres, nunca houve alguém especial?
Provavelmente era uma pergunta imprudente e, apesar de sua relação íntima,
não era algo da sua conta, mas ela queria saber.
— Todas elas — o charme irreverente e provocante em sua voz era familiar,
mas um músculo se contraiu em sua mandíbula.
Lá estava de novo, um flash de algo em seu rosto; algo que ela não entendia
muito bem.
Caroline lançou a ele um olhar tão cético quanto era capaz em seu estado de
felicidade lânguida, seu corpo ainda cantarolando e o sexo de Nicholas ainda
dentro dela.
— Este não é o meu assunto favorito — ele admitiu em tom morno um
momento depois, suas belas feições expressando o que ela interpretou como uma
sugestão de arrependimento. Era difícil interpretar a expressão de seus olhos
escuros.
Uma vez que ele já havia confessado que não estava interessado em
casamento, algo que ela compreendia, Caroline precisava tentar ignorar o
lampejo irracional de tristeza por se sentir aparentemente incluída naqueles
incontáveis números de amantes do passado. Isso não deveria importar, lembrou
a si mesma com uma lógica implacável, porque ela entendia o jogo ao qual se
juntara, e ele certamente cumprira sua parte no trato.
Ele era gentil, ardente, habilidoso e generoso.
Aquela era a semana mais adorável de sua vida, mas ele a esqueceria, e uma
forte sensação de tristeza a preencheu por conta de tal verdade indiscutível. Ele
não era um amante constante, e certamente nunca prometera ser, então, ela não
tinha nenhum direito a expectativas de qualquer tipo.
Havia uma pequena gota de suor na têmpora de Nicholas, e Caroline limpou-
a com a ponta do dedo, num gesto brincalhão, determinada a saborear cada
segundo e afastar quaisquer pensamentos que pudessem interferir.
— Você percebe, Sua Graça, que vai ser duramente pressionado para superar
o seu gesto romântico da noite passada.
Mesmo que ela saísse daquele arranjo sem nada, guardaria eternamente as
memórias de terraços iluminados pela lua e braços fortes ao seu redor enquanto
se moviam em uma dança silenciosa e bonita.
Uma sobrancelha de ébano se ergueu, e um sorriso se formou, lento e
infinitamente diabólico; um verdadeiro tributo ao seu apelido.
— Isso é um desafio, Lady Wynn?
— Eu suponho que poderia ser interpretado dessa maneira.
— Humm. — Os dedos dele traçaram sua espinha, as curvas de uma nádega
nua, que sua mão apertou suavemente. — Vou ter que ser inventivo, não vou?
— Para ser melhor que Lorde Manderville? Você o conhece melhor do que
eu, mas imagino que, como ele faz parte da aposta, dará um braço para superá-
lo.
Lá estava novamente, para sua surpresa, certo lampejo sombrio de uma
expressão no rosto de Nicholas que ela só pôde descrever como irritação.
Quando pensava sobre isso, percebia que só mencionara o conde uma ou duas
vezes e não nos últimos dias. A aposta em si não era um tema de conversa. Ele
murmurou:
— Não é o braço dele que me preocupa.
Isso provocou uma gargalhada que ela não conseguiu reprimir, mas tinha a
sensação de que seu riso soava um pouco trêmulo.
— Não que eu queira alimentar sua arrogância, mas duvido que precise se
preocupar, de qualquer forma.
— Eu te impressionei? — Seu dedo ergueu o queixo dela suavemente,
enquanto sua boca se curvava de uma forma instigante e familiar. Caroline tinha
a sensação de que aquele sorriso iria assombrar seus sonhos.
Teria sido melhor se ela fosse uma boa mentirosa. Em vez disso, disse
simplesmente:
— Sim.
Ele colocou-se sobre ela e a impressionou novamente.
O desespero era uma força poderosa quando se tratava de métodos criativos,
Derek decidiu conforme içava seu corpo no parapeito e recuperava o
fôlego. O que ele estava fazendo era indigno e imprudente, mas tinha esperança
de que demonstraria tanto sua determinação quanto a profundidade de seus
sentimentos.
Tudo o que ele queria era ter uma breve conversa civilizada.
Bem, isso não era tudo o que queria, mas se contentaria com a chance de se
declarar.
A janela estava entreaberta por causa da noite quente, e ele contara com isso.
Empoleirou-se pela fresta e ouviu o murmúrio de vozes lá dentro, esperando a
empregada de Annabel sair. Quando o som suave da porta se fechou, preparou-
se, esperando que o objeto de sua visita não gritasse até acordar a casa inteira.
Para sua sorte, suas costas estavam viradas enquanto ele afastava as cortinas
e entrava no quarto. Sentada à sua penteadeira, ela não notou sua entrada
precipitada até que o viu através do espelho e seus olhos se arregalaram.
Rapidamente, ele disse:
— Não. Se você gritar, todos nesta casa saberão que estou no seu quarto.
Sua boca, que estava aberta, se fechou. Annabel se virou na cadeira com
tanta violência que quase caiu no chão. Ela recuperou seu equilíbrio e nivelou
um olhar indignado para ele. Suas bochechas coraram em um tom rosado.
— Saia daqui.
Como Derek não esperava uma recepção calorosa, não se incomodou.
— Não. Não até conversarmos por alguns momentos.
— Você está louco? Acabou de se esgueirar pela minha janela. Se quiser
falar comigo, faça-o de maneira convencional. — Ela acrescentou rigidamente:
— Meu senhor.
Ele quase riu da tentativa de tratamento formal. Desde que Annabel era uma
criança, ela sempre o chamara pelo primeiro nome, mas, em seu atual estado de
tristeza, Derek não conseguia achar nada engraçado, então, simplesmente lançou
a ela o que esperava ser um olhar neutro.
— Eu tentei. Caso você não tenha notado, bebi mais xícaras de chá insípido
esta semana do que em todo o ano passado. Fui a festas das quais nunca
consideraria participar quando estava perfeitamente são e me convidei para
jantar aqui em várias noites. Com você, minha querida, é impossível ficar
sozinho por um minuto. Esta é minha solução. A menos que queira um
escândalo, é melhor não anunciar minha presença.
Ela o olhou como se ele realmente fosse louco, e Derek não poderia culpá-la.
Maldição! Aquela era a casa de seu tio, e ele podia entrar pela porta da frente a
qualquer hora, sendo muito bem-vindo. No entanto, até mesmo Thomas, que era
tão maleável, não permitiria sua entrada no quarto de Annabel.
Ele expôs, então, com evidente cinismo e amargura:
— Você esqueceu minha carta? Por favor, não me diga que não a recebeu,
Annie.
— Eu não li. Joguei fora.
A confirmação das suspeitas só prejudicou sua confiança. A voz de Derek
adquiriu um toque vazio.
— Entendo. Estou feliz por ter me dado ao trabalho de escrevê-la.
— Por que escreveu? Por que está fazendo isso? — Como se de repente ela
notasse que não usava nada mais do que uma camisola, ergueu a mão até o
corpete e a prendeu ali. — Alfred não iria apreciar sua presença em meus
aposentos.
— Eu não pedi a permissão dele, pedi?
Que Lorde Hyatt se danasse. Derek a amava.
— Peço-lhe mais uma vez que saia.
Com mil diabos, ela parecia deliciosa vestindo nada além de algodão e renda
branca, seus cabelos dourados soltos em volta dos ombros, o rosto desviado,
permitindo que ele estudasse a perfeição de seu perfil. Cílios longos desenhavam
sombras sobre suas bochechas.
— Não até eu dizer algumas coisas. — Derek não se moveu de onde estava,
perto da janela, mas apoiou um ombro contra o parapeito. Se ele se aproximasse,
não tinha certeza se poderia prometer uma conduta cavalheiresca. — Posso
falar?
— Posso impedi-lo? — sua voz estava cheia de ressentimento. — Você já
entrou e me ameaçou. Não tenho escolha.
— Eu escalei a parede da casa do meu tio e arrisquei quebrar meu pescoço.
— Ele cruzou os braços sobre o peito. — Não acha que o assunto é de suma
importância?
Annabel ergueu o queixo, ainda segurando a camisola no pescoço, como se
esta fosse um escudo e pudesse protegê-la de Derek.
— Eu não posso imaginar o que temos a dizer um ao outro. Estou noiva e
você... é você.
Doeu, especialmente quando ela pronunciou a constatação em um tom tão
contundente.
Você é você.
Em uma voz letal, ele rebateu:
— Sim, eu sou eu. Um homem. Aquele que tem as falhas normais de todos
os outros homens.
— Normal? Nem todos os homens fornicam indiscriminadamente com todas
as mulheres nas quais possam esbarrar. — Ela se levantou, caminhando até o
canto oposto do quarto, onde se virou para encará-lo. Seus olhos, tão lindos e
azuis, estavam cheios de acusação e indignação. — Seja lá o que veio procurar
aqui, não vai encontrar. Perdi toda a fé em você há um ano e percebo, para
começar, que a fé era indevida. Agora sei o quão ingênua e tola eu fui de me
apaixonar por você, mas não sou a mesma menina inocente que era.
Não é inocente?
Derek sentiu o peito se apertar, rejeitando aquela ideia. Involuntariamente
deu um passo à frente.
— Ele comprometeu você?
Ela corou em um tom carmesim diante da acusação em sua voz.
— Claro que não. Se está se referindo a Alfred, ele nunca faria isso. Nem
todo mundo é como você.
Havia aquela palavra novamente, lançada contra ele como uma flecha
farpada. Sentiu-se aliviado, de qualquer maneira. Não, Hyatt não tocara nela, o
que explicava o ressentimento do homem e sua interpelação no encontro nada
amigável na taberna. Derek não tinha perspectiva quando se tratava dela, não
tinha distanciamento.
O desprezo de Annabel o fez se encolher por dentro, embora ele esperasse
não demonstrar. Respondeu por entre dentes:
— Não sou santo. Jamais reivindiquei ser um. Mas também não sou
irresponsável. É por isso que estou aqui agora. Nunca tive a oportunidade de me
desculpar pelo que aconteceu, exceto no papel, e aparentemente não é o
suficiente para você.
— O que aconteceu? — Ela ergueu as sobrancelhas loiras.
— Na biblioteca — ele esclareceu de forma brusca.
— Oh — a resposta de apenas uma palavra soou fria como uma pedra no
inverno.
Uma brisa suave agitava as cortinas atrás das costas de Derek. Ele disse, com
entonação de sussurro:
— Eu a beijei. Você se lembra?
Ele sabia que ela lembrava. Ela sabia que ele sabia disso. Os olhos de
Annabel brilharam.
— De fato, eu me lembro daquele dia. De todo ele.
— Eu te magoei — foi uma observação suave.
— Não se iluda, meu senhor.
Ela estaria mentindo se negasse. Da mesma forma como percebera a
felicidade em seus olhos arregalados após o beijo, lembrava-se perfeitamente da
expressão horrorizada no rosto pálido de Annabel quando esta saiu da estufa
onde o encontrara com Isabella. Realmente não importava, ele supôs, que não
tivesse feito nada naquele momento além de pedir desculpas à moça e ir embora.
O dano já havia sido causado. Não fora uma noite auspiciosa. Isabella reclamara
bastante, demonstrando uma decepção fervorosa em sua retirada depois que
Annabel saíra correndo da sala chorando. Se fosse possível se sentir mais como
um inútil, ele não sabia como. Levara uma garrafa de conhaque para a cama
naquela noite, mas não a Lady Bellvue.
Lutando por uma calma que realmente não sentia, ele disse:
— É isso que precisamos discutir, Annie. Tanto o beijo como o que
aconteceu depois, pois eles estão diretamente relacionados entre si.
— Não posso ver como um simples beijo pode estar relacionado ao seu
comportamento sórdido e repugnante.
O cabelo de Annabel brilhou sob a iluminação de uma única lâmpada, os fios
louros emoldurando suas feições frágeis. Olhos azuis escuros olhavam para ele
com acusação evidente.
— Eu sei que te desiludi, mas não foi intencional. Além disso, aquele beijo
foi tudo, menos simples, e nós dois sabemos disso.
Os lábios de Annabel tremeram levemente.
— Apenas um em mil para você, tenho certeza. Por favor, não tente me dizer
que foi significativo de alguma forma. Eu te vi com outra mulher logo depois,
Derek. E certamente você não viveu em celibato desde então. Maridos irados por
toda parte poderiam corroborar com esta afirmação; Lorde Tanner por exemplo.
Quando essa história veio à tona, admito que não fiquei surpresa.
— Eu nunca quis ser canonizado. Tudo o que posso dizer é que o caso
Tanner não me envolvia. Não tive nada a ver com isso. Não sei o que mais você
ouviu, mas, acredite em mim, o que mais fiz no ano passado foi pensar em você.
— Tudo por causa de um beijo? Perdoe meu ceticismo, mas saiba que é
difícil de acreditar.
Esperando que ela pudesse ouvir a sinceridade em sua voz, ele disse a
verdade.
— Esse beijo mudou a minha vida.

C OMO ELE PODERIA FAZER AQUILO COM ELA ? A SEMANA ANTERIOR FORA UMA
tortura, porque Derek de repente parecia estar em toda parte, impossível de
ignorar, e agora aquilo? Ele estava certo. Annabel deliberadamente o evitava o
máximo possível, porque a última coisa que queria era ser lembrada de sua
malfadada paixão pelo infame e notório Conde de Manderville.
Mas certamente não havia mais como evitá-lo. Não quando ele estava ali, em
seu maldito quarto, com toda a beleza masculina de seu rosto parecendo sombria
e esculpida sob a luz fraca, seu cabelo loiro espesso roçando a gola de uma fina
camisa de linho que enfatizava a impressionante largura de seus ombros. Calções
pretos e botas chamavam atenção para o longo comprimento de suas pernas, mas
ele não usara casaco nem gravata para sua escalada arriscada.
O fato de ele ter feito isso era desconcertante, e sua última declaração a
deixou sem palavras. Derek repetiu, no mesmo tom rouco:
— Aquele beijo que nunca deveria ter acontecido mudou minha vida, Annie.
Por minha honra, juro que é verdade.
Ele tinha usado a palavra honra?
A memória era ainda muito dolorosa, como uma ferida aberta que se
recusava a sarar adequadamente, então, ela disse, com amarga convicção:
— Tenho certeza de que você poderia dizer qualquer tipo de inverdade
usando sua honra como prova de sua convicção, uma vez que ela não existe.
Ele contraiu os lábios, e ela soube que tinha ido longe demais.
— Confesso que não estou surpreso que você tenha uma opinião baixa sobre
mim, porque deixou isso claro o suficiente. Mas nós também nos conhecemos há
muito tempo, então você não pode me conceder a gentileza de me ouvir? —
Seus olhos, tão vividamente azuis, exibiam um olhar de súplica que não lhe era
característico. — Com certeza está curiosa para saber o que pode haver de tão
importante a ser dito que me fez até arriscar meu pescoço para podermos
conversar.
Ela estava, mas admiti-lo seria sinal de fraqueza. A capacidade dele de
seduzir não deveria ser posta em questão.
Além disso, ela mentira abertamente sobre a carta.
Só não estava certa de que seria capaz de resistir. Talvez não chegasse nem
perto do grau de sofisticação e experiência dele, mas pelo menos era inteligente
o bastante para admitir e sabia que seria imprudente baixar a guarda até mesmo
por um momento. Derek Drake era perigoso para seu grau atual de insatisfação
em relação ao seu casamento.
— Não — ela mentiu. — Eu não estou nem um pouco curiosa.
Um músculo da mandíbula de Derek se contraiu.
— Minha família e eu provemos para você durante todos esses anos, e isso
deve valer para alguma coisa.
— Isso não é justo. — Ela se empertigou, olhando para ele. — É minha
culpa ter ficado órfã?
— Não, claro que não. — Sua expressão implacável não mudou. — Mas
acho que estou sendo bastante razoável. Você pelo menos me deve a chance de
me defender. Podemos conversar?
Ele era o conde, seu título o tornava responsável em termos financeiros pela
propriedade que ela considerava sua casa, e, sim, sua família era mais do que
generosa com ela, Annabel sabia disso. Ela realmente lhe devia alguma coisa,
nem que fosse em respeito a Thomas e Margaret.
De forma pouco graciosa, ela inclinou a cabeça.
— Tudo bem.
Uma expressão que era quase um fantasma do lindo sorriso habitual de
Derek pairou em sua boca.
— Primeiro eu fui reduzido a implorar e agora venço por meio de
chantagem.
— Apenas diga o que você acha que é tão incrivelmente importante e saia.
Se alguém te encontrasse no meu quarto a qualquer hora, mesmo completamente
vestido, eu estaria arruinada.
Infelizmente, esta era a mais pura verdade. Por mais complacente que Alfred
fosse, ela duvidava que até mesmo ele entendesse.
Embora tivesse recebido permissão, Derek pareceu hesitar. Depois de um
momento, disse simplesmente:
— Nada do que aconteceu naquele dia foi previsto. Eu não pretendia beijar
você e, mais tarde, não pretendia sequer tocar em Isabella Bellvue, e não fui
mais longe do que isso. Se você bem se lembra, eu a evitei por dias.
Ela se lembrava da insistência da condessa, porque assistira, de forma
enciumada, como Lady Bellvue perseguira Derek descaradamente, com um
propósito tão óbvio que mesmo uma ingênua garota de dezessete anos
conseguira compreender.
— Você certamente não a estava evitando naquela noite na estufa — disse
ela acidamente.
— Isso foi porque te beijei mais cedo.
— Eu nunca ouvi nada tão absurdo na minha vida.
— Não? Bem, escute. — Sua voz continha uma espécie de diversão sombria.
— Se você quer ouvir algo absurdo, posso elucidar. Naquela tarde, quando a
segurei em meus braços, percebi que só tinha uma escolha quando se tratava de
você, e era recuar ou prosseguir com intenções honradas. Não vou negar que a
segunda ideia me abalou completamente. Quando Isabella se aproximou de mim
mais tarde, eu ainda estava tentando negar que precisava tomar uma decisão. A
noção de que minha vida mudaria tão drasticamente não era fácil de reconhecer.
Não sou o primeiro homem a fugir da ideia de amor, muito menos de casamento.
Ele — Derek Drake, famoso por jamais se apaixonar — tinha realmente
usado as palavras amor e casamento na mesma frase?
Além disso, ela se lembrava bem da expressão em seu rosto antes que ele
deixasse a biblioteca tão abruptamente. Havia a possibilidade de Derek estar
dizendo a verdade.
Ele continuou.
— Suponho que pensei que um interlúdio com uma mulher disposta poderia
curar minha loucura momentânea.
A percepção de que seu coração tinha começado a bater mais rápido era
irritante.
— E curou? — Annabel perguntou num tom tão frio quanto possível, mas as
palmas das mãos estavam úmidas. Havia uma expressão no rosto de Derek que
ela nunca vira antes e embora ele ainda parecesse imponente e muito masculino,
existia uma sugestão de vulnerabilidade para um homem que ela sempre vira
como invencível.
Era a última coisa de que precisava.
Ele confessou baixinho:
— Não. Como acabei de dizer, não aconteceu nada além do que você viu.
Quando saiu da sala, eu também o fiz. Isabella ficou furiosa, acredite em mim.
Annabel retrucou:
— Perdoe-me por não ter muita simpatia por ela. Ainda assim, o que
aconteceu já pareceu mais do que suficiente para mim. Ela estava meio despida e
você estava... — Annabel parou, envergonhada. Sem dúvida, Derek havia tocado
seios de tantas mulheres que o evento não tivera sequer significado.
Para sua decepção, ele entendeu exatamente o significado da hesitação em
seu discurso.
— Isso é porque você ainda é muito inocente, o que faz parte do nosso
problema. Confie em mim, há muito mais.
— Confiar em você? Por favor. Além disso, não temos um problema mútuo.
Não há nada que compartilhemos — ela cuspiu cada palavra deliberadamente.
— Vamos lá, Annie, isso não é verdade. — A expressão em seu rosto era
dura, quase acusadora. — Você me evita. Deus sabe que tentei ficar longe de
você. Não está funcionando. Para nenhum de nós. Outras pessoas notaram. Seu
noivo notou, pelo amor de Deus.
— Deixe Alfred fora desta… desta discussão ridícula. Não sei por que
estamos debatendo, em primeiro lugar. — Suas mãos se fecharam em punhos, e
seu estômago parecia estranho, como se tivesse engolido algo indigesto. —
Como você poderia saber o que ele acha?
— Os homens têm uma maneira mais direta de se comunicar do que as
mulheres. — Seu sorriso era fraco e irônico. — Normalmente, se há algo em
nossas mentes, simplesmente perguntamos e resolvemos o assunto. Se a resposta
não é do nosso agrado, às vezes usamos nossos punhos ou pistolas ao
amanhecer. Bárbaro, eu sei, mas a nossa tendência é sermos mais diretos em
nossos assuntos e com o mundo ao nosso redor.
Annabel olhou para ele.
— Ele perguntou a você sobre mim? Sobre…
— Nós? — ele completou. — Receio que sim.
Sim, ela estava definitivamente enjoada.
— O que você disse para ele?
Derek ergueu uma sobrancelha em um arco irritante.
— Nada. Eu sou um cavalheiro, apesar de você não concordar com isso.
— Você realmente espera que eu acredite nisso?
— O que mais posso oferecer senão a verdade? É por isso que estou aqui.
Derek continuou parado, ainda incrivelmente belo, mesmo sem seu charme
notável em evidência. Em vez disso, a expressão em seu rosto estava exposta,
aberta, nada como seu habitual fascínio carismático e misterioso.
Os joelhos de Annabel começaram a tremer. Ela fez o seu melhor para
parecer composta, mas, na realidade, sua mente estava girando.
— Deixe-me ver se eu entendi o que veio de tão longe para me dizer. Depois
que me beijou naquela tarde, você se preocupou que, se fôssemos mais longe,
isto o colocaria em perigo de ter que fazer o impensável e se casar comigo,
então, ao invés disso, insensivelmente usou outra mulher para aplacar a sua
luxúria. Estou correta?
Derek suspirou e passou os dedos pelos cabelos espessos. Ela não fazia ideia
de como ele conseguia se tornar ainda mais atraente quando despenteado, mas,
de alguma forma, era exatamente isso que acontecia.
— Dito assim, certamente parece ruim o suficiente. Você não vai facilitar
para mim, vai? E como eu disse, não aplaquei nada.
— Existe alguma razão pela qual eu facilitaria as coisas para você?
— Eu me comportei de maneira abominável, então, suponho que não.
Totalmente consciente de que estava parcamente vestida, ela cruzou os
braços sobre o peito.
— Finalmente, eis um ponto no qual concordamos.
— Annie, eu te amo.
O que ele tinha acabado de dizer?
Ela perdeu o ar.
Maldito, ele não deveria ser capaz de provocar aquele tipo de reação nela.
Mas era. Deus a ajudasse, ele era capaz.
— Eu te amo — ele repetiu suavemente. — É tudo em que penso e,
francamente, está me enlouquecendo. Levei um ano e seu maldito compromisso
para perceber as profundezas do sentimento, mas juro para você que é verdade.
Cambaleante, ela se aproximou da penteadeira e sentou-se. Respirando
profundamente, perguntou:
— Foi por isso que fez uma aposta na frente de toda a alta sociedade para
descobrir quem é o amante mais talentoso da Inglaterra? Esse tipo de ostentação
não vem de um homem que seria fiel a uma única mulher.
— Pelo contrário, é exatamente o tipo de comportamento idiota produzido
pela emoção infame que acabei de declarar para você, minha querida. — Seu
sorriso foi pesaroso. — Este caso em específico foi inspirado pelo anúncio do
seu compromisso no jornal. Por muito tempo tentei lidar não apenas com os
meus sentimentos, mas com a ideia de que a tinha afastado por completo, e lá
estava, no papel impresso, a prova de que nunca teria a chance de resolver
qualquer um dos problemas. Junte a isso algumas boas doses de vinho, e um
homem pode simplesmente fazer algo muito estúpido.
Ele não podia estar falando sério.
Por favor, eu não posso acreditar que ele está falando sério.
— Foi estúpido — ela murmurou.
Ele deu um passo à frente.
— Assim como escalar uma parede no escuro e subir por uma janela
encarnando um personagem de um conto romântico.
Mesmo rejeitando a ideia de que ele pudesse tocá-la, uma parte traidora de
Annabel desejava que fizesse isso.
Mais três passos... talvez quatro, e ele poderia tomá-la em seus braços
novamente e...
Ela empertigou-se. Lembrou-se daquela terrível traição um ano antes e do
consequente sofrimento.
— Não chegue mais perto. Por favor, apenas... saia.
Ele ficou imóvel, com os braços presos às laterais do corpo. Os ângulos de
seu rosto pareciam esculpidos sob a luz incerta.
— Annie...
Ignorar a súplica rouca em sua voz foi a coisa mais difícil que ela fez em sua
vida.
— Por favor.
Se ele a tocasse uma vez, apenas uma vez, ela poderia desmoronar.
Para seu horror absoluto, uma lágrima correu por sua face em um deslize
lento e quente, pingando em suas mãos que estavam fechadas com tanta força
em seu colo que as juntas doíam.
E pensar que prometera nunca derramar outra lágrima por Derek. Como ele
se atrevia a mentir para ela depois de uma miríade de ofensas?
Por um momento ele apenas ficou ali, parado, e então, para sua surpresa,
assentiu e fez o que ela pediu sem dizer mais uma palavra, saindo pela janela e
desaparecendo de vista.
Deixando-a sozinha.
S E ELE TIVESSE CAÍDO E QUEBRADO O PESCOÇO , ESTARIA , PELO MENOS , LIVRE DE
seu desespero, Derek decidiu enquanto andava os dois quarteirões até sua
própria casa, mas não acontecera. Além disso, seu brilhante plano havia falhado
por causa de uma única lágrima.
Ele não suportava fazê-la chorar.
De suas falhas − tantas que mal conseguia contar —, crueldade não era uma
delas. A expressão no rosto de Annabel lhe dissera tudo o que precisava saber
sobre o que já tinha feito e se tivesse seguido em frente e tentado seduzi-la, teria
odiado a si mesmo.
Pior, ela podia odiá-lo também.
A única parte alegre da coisa toda, ele pensou enquanto entrava e ia em
direção ao seu escritório, era que poderia tê-la seduzido. Podia ler em seus olhos
enquanto ela o olhava, na reação de pânico depois do único passo que dera em
sua direção, na tensão de seu corpo tão desejável.
Então o jogo não estava perdido, ele só precisava repensar sua estratégia.
Servindo-se de um copo de conhaque, sentou-se atrás de sua escrivaninha e
meditou diante da lareira vazia.
Para começar, admitiria a derrota naquela aposta ridícula. Não iria passar
uma semana com a deliciosa Lady Wynn. Poderia aceitar isso. E se houvesse a
menor chance de Annabel mudar de ideia e ele arruinasse todas as suas chances,
reforçando ainda mais sua reputação já não tão pura? Esperava que Nicholas
estivesse se divertindo, mas Derek duvidava seriamente que pudesse agir com
igual entusiasmo. Não com toda a sua felicidade futura pesando na balança.
A única mulher que ele queria era Annabel. Com ou sem ela, tinha a
sensação de que seus dias de libertino tinham acabado.
B ilhete pela segunda vez e depois colocou-o de lado, pesando suas opções.
Realmente havia apenas uma.
— Más notícias? — Caroline o olhou do outro lado da mesa, preocupada e
franzindo a testa.
Ele estava ansioso por outro passeio ao longo do rio e, talvez, persuadi-la a
nadar no final da tarde. Ela confessara que sempre quisera aprender. Pensar em
Caroline nua dentro d'água oferecia algumas possibilidades tentadoras.
— Receio que precise retornar a Londres.
— Oh, entendo. — Por um momento, ela olhou para longe, como se
fascinada por algo fora da janela, mas então virou-se, com uma expressão
resignada em seu rosto. — Espero que não seja nenhum problema.
Embora normalmente não se explicasse, especialmente para as amantes
casuais, ele se viu reagindo à súbita distância nos olhos de Caroline.
— O primeiro-ministro quer se encontrar comigo. Eu dirijo um comitê e
aparentemente há um problema que ele gostaria de abordar com os outros
membros antes de nos reunirmos na próxima semana.
O sorriso dela adquiriu uma nota de melancolia.
— Imaginei que uma semana longe seria algo bastante ambicioso de se
conceder a outra pessoa, sendo você um homem com tantas responsabilidades.
Começava a me perguntar como iria administrar isto.
Ela realmente sentia que fora ele a lhe dar alguma coisa? Nicholas a olhou,
percebendo como o quanto era confortável sentar-se e desfrutar de algo tão
mundano quanto um simples almoço apenas porque gostava de sua companhia.
Deixando de lado a extravagância de sua beleza, ela era incomum e não jogava
os jogos femininos. Tanto quanto ele poderia dizer depois de passar cinco dias
agradáveis em sua companhia, Caroline Wynn era completamente
despretensiosa. Sua fortuna e título não a impressionavam demais, e, talvez, pela
primeira vez, sentia que uma mulher realmente não queria nada além do que já
compartilhavam.
— Volte comigo — ele sugeriu, estendendo a mão para pegar a dela. — Este
assunto é urgente, mas deve demorar pouco mais do que algumas horas. Você
ainda me deve dois dias.
— E como é que vamos conseguir fazer isso com alguma medida de
discrição, Nicholas? — Dedos finos repousavam frios contra a palma de sua
mão. — Não que eu não goste da ideia, mas parece imprudente.
Lá estava outra vez aquela honestidade refrescante que ele achava tão
encantadora.
— Podemos dar um jeito. Nada é impossível.
Ela ergueu uma sobrancelha.
— Falou com a certeza de um duque. Lamento discordar, mas algumas
coisas são impossíveis. O que você vai fazer, me contrabandear para seu quarto
dentro de seu bolso?
Ela estava certa, claro, criados costumavam fofocar. Sua casa estava fora de
questão.
— Nós poderíamos nos encontrar em algum lugar.
— Não em Londres, não com discrição. Você tem muito pouco a perder se
formos ligados de maneira escandalosa. Eu tenho muito. Então, receio que terei
que recusar.
A luz do sol que entrava pela janela comprida iluminava seu brilhante cabelo
ruivo como se aquecido pelo fogo. Ela usava um vestido de dia amarelo pálido
de musselina que a fazia parecer muito jovem, como uma estudante inocente.
Mas Nicholas poderia atestar, depois dos recentes e satisfatórios dias de
edificação sexual, que havia uma mulher apaixonada sob aquele exterior
recatado. Os homens iriam sentir isso, pois o que antes era uma atitude
indiferente agora fora substituído por uma confiança feminina. Eles já se
aglomeravam em torno dela quando a consideravam fria e distante. Agora eles a
sitiariam.
Era irritante que qualquer homem pudesse se aproximar dela, mas a própria
natureza dos últimos dias que passaram juntos e a infame aposta o obrigariam a
manter distância em público.
Inferno.
Um dilema, com certeza. Especialmente levando-se em consideração que ela
passaria a mesma quantidade de tempo com Derek.
Maldição, aquela realidade começava a deixá-lo totalmente infeliz.
Talvez essa separação fosse benéfica. Ele estava desapontado, mas ter seu
interlúdio interrompido poderia pelo menos abafar as pontadas irracionais do que
acabaria sendo interpretado como ciúme. Quem era ele para pedir-lhe que não
seguisse com a segunda metade da aposta? Não tinha nenhum direito sobre ela, e
Caroline simplesmente recusaria educadamente qualquer outro tipo de
envolvimento.
Não havia como negar a linha tênue sobre a qual uma mulher precisava
andar em uma sociedade julgadora, não importando que lado ela escolhesse,
virtude ou não. Se preferisse manter a fachada fria, que assim fosse. Ele
certamente era capaz, e mais experiente do que ela, de se desprender dos
envolvimentos sexuais.
Nicholas soltou a mão de Caroline e tirou o relógio do bolso.
— Assim que meu motorista puder preparar a carruagem, eu partirei. Por
favor, sinta-se à vontade para ficar mais alguns dias como minha convidada, se
desejar.
Ela assentiu com a cabeça, com uma expressão ilegível naqueles olhos
cinzentos de cílios longos.
— Foram dias adoráveis. Acho que deveria me sentir promíscua...
— Na verdade, não deveria — ele a interrompeu. — Você é uma mulher
linda e sensual. Não há nada de errado com isso. Apenas o oposto.
— Nós vivemos vidas muito diferentes, não é?
Um eufemismo. Ele tinha a liberdade de seu título e riqueza, e embora ela
também fosse da alta classe, não havia similaridade em suas circunstâncias.
— De muitas maneiras — ele admitiu, pensando em como imediatamente
argumentara que queria ser o primeiro a cumprir sua parte na aposta, a rapidez
com que organizara seus negócios para que isso fosse possível, e sentiu outro
daqueles vislumbres estranhos de discernimento.
Ele ia se arrepender de deixá-la.
O fascínio inesperado que ela exercia sobre ele estava longe de acabar.
Era inquietante, agravado pelo fato de Caroline se recusar a tentar um
relacionamento clandestino quando voltassem a Londres. Ele entendia suas
razões, porém. Especialmente se ela voltasse a considerar o casamento, sua
reputação era importante.
De repente, ele se levantou e curvou-se numa pequena saudação, sabendo
que precisava se afastar imediatamente.
— Por favor, com sua licença.

C AROLINE OBSERVAVA O ESPAÇO VERDE AO REDOR DA CASA ATRAVÉS DA JANELA .


Já havia feito as malas e, assim que Huw trouxesse a carruagem, ela partiria.
Fora uma boa decisão ir embora, porque no minuto seguinte em que Nicholas,
com sua vibrante presença, partira, a casa parecera insuportavelmente vazia.
Percebeu, com um mísero passeio no jardim, que não suportaria ficar.
Provavelmente era um pouco imprudente voltar a Londres logo após o retorno de
Nicholas, porque poderia chamar a atenção para sua ausência mútua, mas
simplesmente não conseguia aceitar seu convite para permanecer como hóspede.
Era uma questão de melancolia, algo que já tivera muito em sua vida, e de
prudência, o que era bem melhor.
O duque de Rothay exercera um profundo efeito em seu bom senso.
De onde ela estava, podia ver o terraço onde haviam se sentado e tomado chá
− bem, na verdade, ele bebera seu conhaque habitual −, e onde depois valsaram
ao som de uma melodia silenciosa. Talvez ela devesse ter concordado em
encontrá-lo novamente. Será que se tivesse feito isso não estaria se sentindo
tão... desolada?
Sua mão apertou o tecido fino da cortina. A complicação de se apaixonar
pelo duque diabolicamente bonito e sensualmente talentoso não era algo que
tivesse previsto. Não era a primeira, e dificilmente poderia supor que seria a
última, mas não havia como negar que ele seria difícil de esquecer.
Nada a respeito dele fora como ela esperava, exceto por suas habilidades
sexuais lendárias. O homem justificara sua reputação no quesito com facilidade.
O que ela não previra fora o olhar pensativo em seu rosto enquanto eles
discutiam sua visita às mesquitas bizantinas, sobre as quais ela apenas lera, a
indulgência às suas perguntas incessantes, sua atitude agradável em relação à
abordagem mundana e cautelosa à sociedade de Caroline...
Ele não era esnobe, e com sua linhagem e fortuna, certamente poderia ser.
Ela até o pegara um dia nos estábulos, conversando com seu cocheiro, Huw, e
sentado sobre um fardo de feno, a camisa parcialmente desabotoada, o cano sujo
de suas botas mostrando que ele ajudara a limpar a baia de seu garanhão. Nobre
e criado riram ao mesmo tempo, e Caroline sentiu algo pelo homem que nada
tinha a ver com sua persuasiva perícia sexual.
Se fosse honesta consigo mesma, e não era algo fácil, ela sabia muito pouco
sobre o amor. Seu pai frio certamente não inspirava essa emoção, sua tia não era
nem cálida nem maternal, e Edward fora um pesadelo. Talvez o problema fosse
que, pela primeira vez em sua vida, alguém a tratara com cortesia, ternura e,
acima de tudo, como se fosse uma pessoa com pensamentos e sentimentos
próprios. Dentro e fora da cama eles discutiram tudo, desde política até História,
e se ela discordasse de sua opinião, ele se interessava em saber o porquê. O
conceito de uma discussão amigável era novo, e Nicholas, com sua confiança
formidável e inteligência apurada, não era de modo algum o malandro
egocêntrico que imaginara. Isso a confundia, e ela sabia que era
lamentavelmente suscetível, o que não ajudava em nada. O jogo, no qual
Nicholas era tão experiente, era novo para ela, e, sendo uma principiante,
Caroline fez o impensável e se apaixonou.
Pelo menos suspeitava que este era o verdadeiro problema. Apaixonara-se
em poucos dias. Mesmo quando sabia que ele estava deliberadamente se
esforçando para cativá-la.
Isso a fez se sentir tola, desajeitada e nada sofisticada. Mesmo que ele
quisesse se envolver em um caso, isso provavelmente significava que ela não
passaria de um desvio incomum de sua rotina regular de amantes experientes, e
Caroline era suficientemente pragmática para saber disso.
— Minha senhora, acho que tudo está pronto.
Caroline se virou, assustada, saindo de seu devaneio.
— Ah, sim. Obrigada, senhora Sims.
A empregada assentiu. Como de costume, ela estava bem vestida, com um
avental impecável sobre o vestido escuro simples, o cabelo grisalho em um
coque severo.
— Foi muito bom ter Sua Graça por aqui, devo dizer.
Foi fácil responder com total honestidade.
— Ele é um homem muito charmoso.
— É sim, concordo. Sempre tão educado e simpático, apesar de sua posição.
— Sim.
— Espero que tenha gostado da sua estada, minha senhora.
Como a Sra. Sims administrava a casa, certamente sabia que ela e Nicholas
dormiam juntos a cada noite, pois apenas uma cama fora usada. Caroline lutou
contra um rubor, sem muito sucesso.
— Foi adorável, obrigada.
— Eu sempre quis que Sua Graça desenvolvesse um gosto por este lugar. É
muito agradável aqui, embora eu suponha que não seja muito emocionante para
um homem jovem. Lembro-me dele quando menino, e sempre foi um pouco
precoce, capaz de conseguir doces extras com o cozinheiro e enganar seu
professor. Puxou à mãe, sem dúvidas, mas acabou se tornando um bom homem,
não importa o que digam sobre ele.
Não tinha certeza se estava mais surpresa pela mulher ter ousado falar sobre
isso com ela ou por saber tanto, mas Caroline não pôde deixar de perguntar:
— Você o conhece desde que era criança? — Ela conseguia imaginar um
menino de cabelos escuros, exuberante e brincalhão, e seu coração se apertou um
pouco.
— Ah, sim. Fiquei na Rothay House por anos. — A empregada alisou seu já
perfeito avental com um maneirismo inconsciente. — Quando quis algo menos
cansativo, ele me ofereceu esta posição. Minhas articulações doem terrivelmente
às vezes e é calmo o suficiente aqui.
Isso era verdade. Tinha a beleza pacífica que Caroline preferia, e mais de
uma vez ela pensara em vender a casa em Londres e comprar um lugar lindo e
isolado como aquele.
— Sua Graça pediu que eu lhe dissesse que se a senhora quiser usar a
Tenterden Manor a qualquer momento, será sempre bem-vinda.
Mais do que um pouco surpresa, Caroline não soube o que dizer.
A Sra. Sims acenou suavemente com a cabeça.
— Disse-me que a senhora sente falta do campo e que pode vir para cá
sempre que lhe convier. Espero que considere isso, quando a cidade lhe
incomodar.
O gesto atencioso fez brotar lágrimas em seus olhos. Se já não estivesse com
vontade de chorar estupidamente pela partida de Nicholas, isso aconteceria
naquele momento. Fora apenas uma observação casual, mas ele se lembrara.
Deixando virtuosismo na cama de lado, aquilo era o que verdadeiramente a
desarmava. Se era parte da aposta ou não, ele agia como se os sentimentos dela
fossem importantes.
Se não se sentia condenada antes, certamente estava agora.
Caroline piscou e limpou a garganta.
— Obrigada, senhora Sims. Isso é muito generoso do duque. Outra visita
parece uma ideia maravilhosa.
E LE TEVE UMA JORNADA INQUIETA PARA CASA . A REUNIÃO À QUAL PRECISOU
participar foi a primeira tarefa da manhã e, realmente, a última coisa da qual
precisava era a notícia de que sua mãe o esperava em visita. Nicholas a adorava,
mas ela também não tinha escrúpulos em tentar interferir em sua vida. Cansado
da viagem e um pouco descontente, entrou na sala de estar informal e exibiu um
sorriso.
— Boa noite, mãe.
— Nicholas. — Ela se levantou de um sofá bordado e atravessou a sala para
oferecer sua bochecha com movimentos graciosos. Era um cômodo ricamente
mobiliado, com tapetes turcos, uma série de cadeiras confortáveis no estilo Luís
XIV e algumas obras de arte que podiam agraciar adequadamente uma parede de
museu. Sua mãe se adaptava ao ambiente, sempre nobre, polida e perfeita, com o
cabelo escuro penteado para cima, capaz de chamar a atenção com sua beleza e
seu equilíbrio. Seu porte elegante continha uma mente sagaz, e ela muitas vezes
o surpreendia e desconcertava com sua percepção. Ele já passara da idade de
precisar de orientação materna em certas áreas de sua vida. Infelizmente, essas
eram exatamente as áreas pelas quais ela mais se interessava.
Ela queria vê-lo casado e estabelecido, e, embora eles não discutissem
precisamente sobre isso, o ponto surgia com frequência suficiente para exasperá-
lo.
Com afeto obediente, ele a beijou e depois se empertigou.
— Esta é uma agradável surpresa.
— Eu cheguei esta tarde. Althea está comigo. As crianças ficaram em Kent
com a babá. Ela está lá em cima se arrumando para o jantar, e Charles vai se
juntar a nós. Ele chegou em Londres há três semanas, e ela sentiu falta dele. É
por isso que estamos aqui.
Então, teria que lidar com sua mãe, sua irmã mais velha e seu cunhado.
Parecia que agora ele teria que jantar em família. Olhou para o relógio, com uma
expressão que esperava que não fosse de óbvio desalento. Uma noite calma,
jantando em seu clube, estava fora de questão agora.
— Parece ótimo.
— Sim, você parece entusiasmado, querido. — A duquesa de Rothay
inclinou a cabeça um pouco, em divertida reprovação. — Creio que estamos
interferindo em seus planos. Você não precisa ficar e comer conosco, se não
quiser. Não informamos sobre nossa chegada iminente.
A inquietação dele nada tinha a ver com qualquer plano, mas, sim, com uma
jovem muito adorável que ocupara seus pensamentos durante todas as últimas
horas. Será que Caroline teria escolhido ficar? Seus sentimentos estavam
decididamente misturados. Ele podia claramente imaginá-la dormindo na cama
onde compartilharam tantas horas de prazer, e isso o deixou inquieto.
Por quê? Ele não tinha certeza. Normalmente costumava sair sem olhar para
trás.
— Não tenho planos específicos, mas também cheguei hoje. Estive fora da
cidade.
— Compreendo. — Com perspicácia, sua mãe lhe lançou um olhar
interrogativo. — Quem é ela?
— O que lhe faz pensar que há uma mulher? Eu tenho uma dúzia de razões
para deixar a cidade e faço isso com bastante frequência.
Silenciosamente, ela o observou com uma inspeção cuidadosa.
Bom Deus, isso era exatamente o que ele não precisava. Todas as mulheres
eram tão perspicazes ou apenas mães com seus filhos? Ele sorriu e balançou a
sua cabeça. Era um homem adulto e pouco inclinado a discutir sobre tal assunto,
especialmente porque Caroline era o problema.
— Eu não vou comentar. Como foi sua viagem?
— Correu bem.
Pelo menos ela aceitou a dispensa, embora Nicholas sentisse que a discussão
estava longe de terminar. Trocaram apenas mais alguns gracejos.
— Terei prazer em jantar com duas das minhas mulheres favoritas, e você
sabe que eu gosto de Charles. Apenas me deixe trocar de roupa. Estou um pouco
empoeirado. A carruagem não me atraiu esta tarde, então, escolhi caminhar.
Ele se curvou educadamente e subiu as escadas, acalmando-se dentro do
confinamento familiar de seu quarto. Seu criado, alertado de sua chegada, agiu
com sua usual eficiência e já o esperava, dizendo:
— Boa noite, Sua Graça. A água quente subirá em breve.
Nicholas assentiu.
— Obrigado, Thomas.
Tímido e sério, com cabelos ruivos e uma pele sardenta, o jovem apressou-se
em pegar cada peça de roupa que era descartada.
— Espero que tenha feito uma viagem agradável.
Mais do que agradável, na verdade.
— Foi... satisfatória.
Satisfatória. Parecia uma escolha de palavras apropriada.
A verdadeira questão era: estaria ele satisfeito?
Caroline claramente recusara novos encontros, então, ele não tinha escolha.
Precisava admitir que não estava acostumado a tal, e isso o irritava. No
entanto, era um homem experiente e percebeu que ela se enredara sob sua pele
de uma maneira incomum. A conclusão se tornou clara como cristal quando ele
se afastou de Essex, e a imagem vívida de como ela o beijara docemente antes de
partir surgira em sua mente, como os braços delgados envolveram seu pescoço,
como a boca macia e quente parecera receptiva.
Fora um beijo de despedida e tanto. Seria sua imaginação ou ela tinha
mesmo se agarrado a ele por uma fração de segundo antes que se separassem?
Afastando a memória, ele rapidamente se banhou e se vestiu, descendo as
escadas para descobrir que seu cunhado já havia chegado. Charles Peyton era
dez anos mais velho, com uma disposição afável e uma mente apurada. Nicholas
não sabia exatamente o que ele fazia para o Ministério da Guerra, mas sabia que
era altamente respeitado em todos os círculos, e suspeitava que seu trabalho
tivesse algo a ver com inteligência militar.
— Nicholas... que bom ver você. — Peyton se aproximou com um copo de
Claret e lançou-lhe um olhar agradável sobre a borda. — Fiquei sabendo que
esteve fora da cidade.
— Por um tempo — ele confirmou, já que aparentemente era de
conhecimento comum. Então, enquanto a imagem sedutora de Caroline se
elevava em sua mente, ele murmurou: — Não o suficiente.
— Isso tem alguma coisa a ver com a sua pequena competição com
Manderville?
Não tinha muita certeza do porquê de ter ficado tão surpreso que alguém
tivesse conseguido adivinhar tão facilmente. Ainda mais Charles, que era tão
afiado quanto um florete.
— As pessoas ainda estão discutindo esta aposta idiota?
Charles riu, seus olhos azuis pálidos cheios de humor simpático.
— Oh, de fato. Sua ausência precipitada, sem explicação, não ajudou a
conter os rumores.
— Eu me ausentei por cinco dias e não devo a ninguém uma explicação, por
Deus. — Muito raramente sentia que seu status o tornava imune às mesmas
regras que governavam homens de posição menos privilegiada, mas aquele não
era o caso. Por que deveria explicar a alguém sobre o seu paradeiro? A Inglaterra
já exigia muito de seu tempo.
— Eu não disse que é verdade. Mas todo mundo quer conhecer o resultado.
— Estou feliz que você ache tudo muito divertido.
— Até certo ponto — seu cunhado admitiu com um torcer de lábios. —
Permita que nós, homens casados, vivamos por intermédio suas façanhas, sim?
Há mais especulações sobre quem pode julgar sua contestação heterodoxa do
que sobre o resultado. Uma quantia razoável de dinheiro está sendo apostada em
sua pequena disputa.
— Mas que merda! — Nicholas murmurou, com cuidado para se certificar
de que sua mãe não ouvisse o palavrão.
— Ah. Muita, sem dúvidas.
Com Charles, isso poderia significar qualquer coisa, e a chegada de Althea,
em um rodopiar de seda violeta, pérolas brilhantes e perfume caro interrompeu a
conversa.
Nicholas fez uma prece silenciosa de agradecimento pela interrupção,
esperando que ninguém notasse que a ausência de Caroline coincidira com sua
própria viagem inexplicável e suspeitasse da verdade. Eles não suspeitariam, ele
rapidamente se tranquilizou. Não da supostamente fria e desdenhosa Lady
Wynn.
Ela estava segura o suficiente.
A nnabel contemplou a vista da rua através do vidro molhado de chuva. O
barulho ocasional de um veículo passando sobrepunha-se ao som
persistente do aguaceiro. Um céu furioso se manifestava logo acima dos
telhados.
— Receio ter ficado mimada. Nosso tempo tem estado tão bom que quase
esqueci como ele pode ficar horrível.
— Você parece mais quieta do que de costume esta tarde, minha querida. —
Alfred sorriu para ela. — Fico feliz em saber que é o tempo e que nada mais está
errado.
Se ele soubesse. Tudo estava errado.
Tudo.
Segundo Derek, Alfred notara a tensão. Pior ainda, ele havia confrontado
Derek sobre isso.
Ela olhou para o noivo e se perguntou o porquê de tantas dúvidas. Parecia o
mesmo de sempre, elegantemente vestido na última moda, com as botas polidas
até brilharem, o cabelo castanho penteado para trás de um rosto que, embora não
fosse precisamente bonito, era certamente muito atraente. Os mesmos olhos
castanhos, o mesmo nariz, a mesma boca, mas em vez de se sentir tranquilizada
por sua presença, por alguma razão insana, Annabel começava a duvidar se
aquele casamento era mesmo o que queria.
Era culpa de Derek. Ela o culpava inteiramente, e quando pensava na outra
noite, quando ele subira em seu quarto pela janela, ficava completamente
furiosa.
Como ele se atrevia a arruinar sua felicidade?
Eu te amo.
Desnecessário seria dizer que ela não acreditou nele, e mesmo se o fizesse,
não importaria. Ele não era o tipo de homem que seria fiel, e ela não era o tipo
de mulher que poderia se casar com alguém que não fosse. Fim da discussão.
Não que ele tivesse proposto casamento, de qualquer maneira. Derek Drake
não era do tipo que oferecia compromisso honesto a qualquer mulher. Tudo o
que ele queria era o uso transitório de seus corpos. A partir daquele beijo
devastador de um ano atrás, Annabel soube que ele estava atraído por ela e
suspeitava que sua invasão impetuosa ao seu quarto e subsequente declaração se
originava da noção que não poderia tê-la.
Porque não havia nenhuma maneira de ela ser tão tola a ponto de acreditar
que seus sentimentos eram sinceros.
— …mal atravessou a rua antes de tropeçar e cair de cabeça aos pés dela.
Quais são as chances disso? — Alfred riu, o pesado anel de sinete no dedo
brilhando enquanto ele levava a xícara à boca.
Annabel piscou, percebendo que não estava ouvindo a anedota, e um
sentimento de culpa agravou suas emoções já agitadas.
— Isso foi divertido — ela disse em uma tentativa sombria de fingir que
tinha ouvido o que ele dissera.
— Realmente, foi engraçado na hora. — Alfred pôs de lado seu chá e a
observou com um olhar firme que ela achou desconcertante. — Mas posso dizer
que você não está com humor para pequenas histórias frívolas. Seria melhor se
eu a visitasse em outro momento?
— Não — ela protestou. Então, depois de um instante, suspirou. — Talvez,
sim, meu senhor. Posso pedir desculpas por ser uma companhia tão pouco
interessante?
— Não precisa, minha querida, você sabe disso. Ficaremos casados por
muitos, muitos anos, e eu imagino que teremos nossos dias de humores adversos.
Muitos, muitos anos. De alguma forma, isso não ajudava em seu dilema. Lá
estava ela, antes mesmo de se casar, pensando em outro homem. Droga, ela não
queria que as coisas fossem assim.
Alfred se levantou.
— Venho visitá-la amanhã de manhã, e, se o tempo melhorar, talvez
possamos fazer um pequeno passeio.
O clima sombrio correspondia exatamente ao seu humor atual. Annabel
assentiu.
Seu noivo se aproximou e pegou a mão dela, levando-a aos lábios, apenas
roçando as costas de seus dedos com a boca antes de soltá-la. Ele disse:
— Até amanhã, minha querida, e espero que o que quer que esteja
entristecendo-a seja resolvido. Se houver algo que eu possa fazer, você sabe que
tudo o que precisa é me pedir.
Aquele momento muito fatídico na biblioteca era certamente parte do
problema. Então, uma ideia se apoderou de Annabel. Ela levantou-se de repente.
— Beije-me.
Alfred parecia inexplicavelmente surpreso.
— Annabel, estamos na sala de estar. Eu não acredito que...
Ela inclinou o rosto para cima e perguntou, no que esperava que fosse um
tom suave e persuasivo:
— Você não quer?
— Sim... bem, sim, é claro, mas o único motivo de estarmos relativamente a
sós é porque Thomas confia no fato de que continuarei sendo um cavalheiro.
Ele estava certo, e a porta mantinha-se aberta, assim qualquer criado poderia
vê-los, além de Margaret poder passar apressada a qualquer momento, mas
Annabel não se importava. Se houvesse alguma coisa que pudesse fazer para
apagar aquela memória perturbadora, estava disposta a assumir o risco. Além
disso, eles iriam se casar em poucos meses. Certamente ninguém ficaria tão
escandalizado.
— Um beijo dificilmente é uma violação horrível de conduta. Não quando a
mulher vai ser sua esposa. — Desde seu debut na sociedade, ela aprendera um
pouco sobre a arte do flerte e o olhou sob o véu de seus cílios com o máximo de
provocação que podia convocar.
Por sua vez, ele olhou para sua boca e, em seguida, colocou a mão levemente
em sua cintura.
— Eu suponho que você esteja certa.
Beije-me. Faça-me esquecer daquele primeiro beijo. Faça-me esquecer
dele...
Quando ele abaixou a cabeça, ela fechou os olhos e esperou, sentindo a
respiração flutuar em sua garganta.
Infelizmente, tudo acabou muito rapidamente. Tudo o que ele fez foi
pressionar os lábios fechados contra os dela pelo espaço de dois, talvez três
batimentos cardíacos, e então recuou.
Daquela vez a terra não se despedaçou. Daquela vez, com o homem com
quem concordara em se casar, o beijo fora uma experiência bastante realista. Ele
sorria da maneira habitual, parecendo vagamente triunfante. Annabel fez o seu
melhor para esconder sua decepção esmagadora. Uma coisa era pedir um beijo,
outra bem diferente era dizer que ele se saíra mal. Naturalmente, era um jovem
muito apropriado, de modo que nunca iria persuadi-la a abrir a boca com sua
língua de uma maneira pecaminosa e sedutora que a deixaria debilitada. No que
estava pensando?
Tão animada quanto possível, ela disse:
— Eu o verei amanhã de manhã, meu senhor.
Depois que ele se foi, ela sentou-se, extremamente desanimada, e olhou para
um vaso de cristal com rosas de estufa que ficava em cima de uma mesa polida
de parquet do outro lado da sala. Alfred as trouxera alguns dias antes e várias das
flores amarelas tinham começado a murchar, ficando marrom nas bordas, as
pétalas começando a cair.
Ele era realmente um homem muito atencioso. Atencioso, educado e muito
qualificado. Daria um bom marido obediente e a trataria com respeito e afeição.
Estaria apaixonado? Nunca dissera isso, e Annabel duvidava que houvesse
verdadeiros sentimentos por trás de sua proposta de casamento. Ela era de uma
boa família, com bom dote e sabia que ele admirava sua aparência. Em suma, era
muito adequada, e era isso que ele procurava em uma esposa.
Bom Deus! Adequada. Ela repentinamente passou a detestar esta palavra.

D EREK OUVIU O ZUMBIDO FAMILIAR DE VOZES MASCULINAS PONTUADAS POR


risadas ocasionais e acenou para o mordomo.
— O duque está aqui, Frederick?
Tão imaculadamente vestido quanto qualquer dos patronos do clube, o jovem
inclinou a cabeça.
— Boa noite, meu senhor. Sim, de fato ele está. Na mesa de sempre.
— Obrigado.
O ar recendia a tabaco misturado a um leve cheiro de conhaque, e ele passou
por várias mesas de conhecidos que o saudaram, atrasando seu progresso.
Quando finalmente chegou ao canto da sala, viu Nicholas esparramado em sua
habitual pose descuidada, uma leve carranca no rosto. Encheu um copo de
bebida, envolvendo a garrafa com seus dedos longos.
Sem preâmbulos, Derek acomodou-se na cadeira oposta e pegou um copo. O
uísque que ele preferia já havia sido servido, um testemunho da eficiência dos
funcionários.
— Eu recebi seu bilhete. Você voltou cedo, percebo.
— A pedido do primeiro-ministro.
— Ah. Sempre difícil de recusar. O Lorde Liverpool chama, e nós
respondemos.
— De fato.
Na verdade, o tom da missiva fora um pouco brusco, e Derek estava
compreensivelmente curioso sobre a semana de seu amigo no campo e nos
braços de Lady Wynn.
— Diga-me, foi um alívio sair? Você estava lá... há o quê? Cinco dias? Ainda
digo que é muito tempo na companhia de uma mulher.
— Depende da mulher.
Este era um sentimento novo para um notório libertino.
— Ah, é?
Nicholas finalmente ergueu o copo e tomou um gole antes de responder.
— Na verdade, fiquei desapontado por ter sido interrompido.
Com um interesse aguçado, Derek disse:
— Acho que nossa deliciosa Caroline faz jus à sua beleza.
— Mais do que isso. — Nicholas deu a ele o que só poderia ser descrito
como um olhar reprovador.
— Isso é um pouco surpreendente. Embora ela seja muito atraente, é claro,
eu não esperava que se tornasse uma coisinha quente entre os lençóis.
— Não pense que vou lhe oferecer detalhes, Derek.
O tom curto de aviso não era o que ele esperava de um homem que levara
uma mulher adorável para uma semana de prazer sexual. Ele recostou-se um
pouco na cadeira.
— Eu não pedi detalhes, Nick. Está um pouco sensível hoje, não é?
A resposta foi um pequeno grunhido que não lhe ofereceu muita coisa em
termos de informação, mas fez Derek imaginar que algo incomum estava
acontecendo. Ele ficou surpreso o suficiente com a ansiedade de seu amigo em
conseguir que a dama chegasse ao campo, e agora Nicholas parecia francamente
mal-humorado por estar de volta.
Derek também vinha agindo de forma intratável nos últimos tempos, mas
isso era devido à sua situação insustentável com Annabel.
Eles estavam bem acostumados a serem honestos um com o outro, então,
Derek disse sem rodeios:
— Você está com um mau humor dos diabos.
— Olha quem está falando. Se eu recebesse uma moeda para cada vez que
você tem estado de péssimo humor nos últimos meses, minha fortuna aumentaria
significativamente.
Bem, isso era difícil de negar; em vez disso, Derek tomou uma boa golada de
seu copo. Ainda não estava pronto para contar ao amigo sobre o desastre de um
ano atrás e os erros que se seguiram, que pareciam piorar tudo. Thomas sabia, e
isso era o suficiente.
Annabel sabia, e isso não era suficiente.
Com veemência desnecessária, Nicholas disse subitamente:
— O marido dela deveria ter sido açoitado.
Derek piscou antes de perguntar, cautelosamente:
— Lorde Wynn? O que ela disse a você?
— Ela não precisou me dizer nada. Digamos apenas que a resposta de
Caroline à nossa aposta infantil envolveu alguma medida de coragem. Eu a
admiro por isso.
Nos fundos, alguém riu com vontade, e o som rouco sobrepôs-se à conversa
murmurada. Derek se sentiu confuso.
— Correndo o risco de parecer obtuso, embora não seja a primeira fez que
faço isso, você pode elaborar?
— Ele era um bastardo cruel.
— Oh, entendo. — O tom do bilhete de Lady Wynn assumiu um novo
significado.
O que quer que tivesse acontecido em Essex, fora mais que um simples
arranjo sexual. Derek tentou parecer descompromissado e terminou seu primeiro
copo de uísque enquanto assimilava esse novo desenvolvimento. Fez um gesto
para que a dose fosse reabastecida.
— Suponho, agora que ela está de volta em Londres, você... Bem, eu
suponho que você vá tomar providências.
Nicholas esfregou seu queixo esguio, sustentando uma expressão irritada no
rosto bonito que tantas mulheres admiravam. Por conta de seu encontro com o
primeiro-ministro, ele usava uma jaqueta de veludo verde ajustada; o bordado
em seu colete em um tom esmeralda, calças bege e botas altamente polidas. Seu
cabelo de ébano era um contraste com a gravata branca imaculada, levemente
rendada, mas a débil carranca minimizava a aparência de um cortesão elegante.
Pelo diabo, o infame Rothay estava com ciúmes! Derek percebeu isso com
uma leve nota de surpresa.
Mesmo que não tivesse mais a intenção de tocar a dama em questão, não
poderia deixar passar esta oportunidade de verificar se estava certo.
— Mal posso esperar — ele gracejou, inclinando-se em sua cadeira em um
movimento lânguido e tocando o copo enquanto o garçom se afastava
apressadamente. — Ando entediado ultimamente, e uma boa foda viria a calhar.
Com certeza, algo brilhou nos olhos escuros de seu amigo; algo como uma
selvageria deliberada. Nicholas rosnou:
— Recorra a este linguajar novamente, e eu vou...
Derek esperou com uma sobrancelha levantada.
Ah, sim! Definitivamente possessivo com a outrora reservada Lady Wynn.
Nicholas murmurou:
— Enviei-lhe o bilhete para que me encontrasse, porque queria dizer-lhe para
ter cuidado com ela. Isso é tudo.
— Cuidado?
— Sim, cuidado. Seja gentil. Não apresse as coisas.
— Você está realmente me instruindo sobre como tratá-la na cama? — Sua
incredulidade foi temperada por uma diversão simpática.
— Eu só estou dizendo... — Pela segunda vez Nicholas parou, seus dedos
apertando seu copo. Então ele acrescentou ferozmente: — Maldito inferno!
Ele se levantou de repente e saiu sem nem mesmo dizer adeus.
Derek franziu os lábios em um assovio silencioso enquanto observava a
silhueta longilínea do duque sair do recinto.
Uma vez que Derek cometera o imperdoável pecado de resistir aos seus
próprios sentimentos, ele entendia muito bem como isso poderia afetar a vida de
um homem. Mas também sabia que velhos hábitos demoravam a morrer. Talvez
Nicholas não estivesse pronto para admitir que estava, pelo menos, encantado,
possivelmente algo mais.
Bem, Derek podia não ser capaz de resolver seu próprio problema com
Annabel, mas talvez pudesse ajudar Nicholas. Enquanto permaneceu sentado
naquele local, o germe de uma ideia lhe ocorreu, e ele refletiu, pairando sobre o
copo de uísque, mas sem bebê-lo.
As mulheres caíam aos pés de Nicholas como folhas de outono flutuando de
uma árvore. Se a linda viúva vivera um casamento horrível, como teria reagido
aos poderes de sedução de um dos amantes mais talentosos da Inglaterra? A
julgar pelo modo como o duque de Rothay acabara de agir, algo importante
devia ter acontecido.
Lá estava uma coisa realmente interessante.
Sim, talvez ele devesse fazer os preparativos para seu encontro com a dama,
mas não com o propósito insinuado por Nicholas.
J á era tarde, ela estava cansada e o visitante se recusara a dar seu nome ao
mordomo. Caroline franziu a testa para as letras enigmáticas rabiscadas no
cartão simples, e então percebeu quem devia ser com um lampejo de
consternação.
— Sim, Norman, vou ver o cavalheiro. Por favor, leve-o ao escritório de
Edward.
O homem mais velho, vestido com roupão, inclinou a cabeça, não
demonstrando curiosidade pelo evento muito incomum em uma casa
normalmente tranquila, mas ela podia adivinhar o que ele estava pensando. Sua
recente ausência também não fora algo comum.
As iniciais eram CdM. Elas só podiam representar o conde de Manderville.
Caroline havia pedido discrição e tinha certeza de que uma visita à noite em sua
casa não se qualificava como tal. O homem devia ter ouvido de Nicholas que
eles já estavam de volta.
Ele certamente não perdera tempo em procurá-la. Era difícil decidir se ficava
lisonjeada ou irritada. Por sorte, ainda se encontrava vestida, porque tinha
cochilado na sala enquanto lia depois do jantar. Levar uma bandeja para seu
quarto era mais fácil do que passar pelo ritual formal na sala de jantar sozinha.
Os criados também não esperavam que ela voltasse a fazê-lo, então, frango frio,
queijo e pão fresco podiam ser comidos facilmente no andar de cima. Ela fazia
isso com bastante frequência. Sentar-se à mesa longa, sozinha, era melhor do que
jantar com Edward, mas, ainda assim, fazia com que se sentisse melancólica e
enfatizava sua solidão.
Como se ela precisasse disso. Talvez o encontro idílico com o belo Rothay
tivesse tornado sua vida mais difícil, em vez de funcionar como uma cura para
sua melancolia.
Caroline olhou-se no espelho, alisou o cabelo e depois desceu para ver o que
Derek Drake queria discutir com ela que não podia esperar até uma hora mais
civilizada.
À primeira vista, no escritório, ela ficou um pouco surpresa, depois aliviada
e depois divertida. Entrou no cômodo e fechou a porta silenciosamente.
— Boa noite, meu senhor.
Ele se virou, notou a risada estremecendo em seus lábios, e um sorriso triste
tocou sua boca bem formada.
— Boa noite. Como a senhora deve perceber, eu posso ser tão inventivo
quanto vós, minha senhora. Também vim caminhando, só para ter certeza de que
ninguém prestaria atenção em cavalos ou carruagens.
Era verdade. Ele estava vestido como um comerciante, em trajes simples, um
casaco pesado pendurado em seus ombros largos, calças folgadas cobrindo suas
longas pernas, e em algum lugar ele havia encontrado velhas botas gastas. Um
chapéu surrado encontrava-se sobre uma cadeira. Estava perto da janela, alto e
imponente, apesar de suas vestimentas, e, embora, à primeira vista, alguém
pudesse acreditar no disfarce, ela supôs que se passassem muito tempo em sua
companhia a imagem plebeia seria desmentida. Ele se comportava com
confiança de Nicholas, o que era muito mais difícil de ocultar do que a aparência
física.
Ela murmurou:
— Fico feliz, naturalmente, que o senhor tenha tomado o cuidado de se
certificar de que ninguém iria reconhecê-lo, mas estou um pouco confusa sobre o
motivo de sua visita, especialmente a esta hora.
Ela não estava ansiosa para dizer a Derek Drake que havia mudado de ideia
sobre sua parte na aposta. Ele iria querer saber o porquê. Um patife sofisticado
como o conde provavelmente se divertiria com sua ingenuidade se ela lhe
contasse a verdade. Embora tivesse certeza de que não era a primeira mulher a se
apaixonar tão rapidamente pelo Duque de Rothay, ainda tentava entender seus
sentimentos e ser o mais objetiva possível sobre a situação. Outra parte infeliz de
sua decisão era que, se Derek e Nicholas decidissem que a aposta ainda existia e
ainda quisessem resolvê-la, isso significaria que Nicholas entreteria outra mulher
com seu charme luxuoso e suas habilidades gloriosas na cama.
Doeu pensar nisso, o que a tornava ainda mais tola.
O que ela esperava? Que depois dela ele se tornaria um celibatário? Ele
pedira para vê-la novamente e ela negara. Aquilo era o fim.
— Eu poderia ter esperado até amanhã — Derek disse abruptamente —, mas
visitá-la à noite faz com que ser reconhecido seja um problema a menos, e o que
eu preciso discutir com você será muito melhor se estivermos cara a cara. Não
pude esperar. Demorei demais para fazer uma coisa e não funcionou muito bem.
Um pouco confusa, Caroline escolheu uma cadeira e sentou-se, cruzando as
mãos no colo. Apesar de sua vontade de ficar indiferente, ela corou.
— Eu sei que precisamos planejar nossa… bem, semana, mas...
— Desculpe a interrupção imperdoável, mas não é sobre isso. — Ele fez um
movimento inquieto com a mão. — Bem, indiretamente, suponho. O que
aconteceu entre você e Nick?
Que pergunta. Ela o encarou, seu rosto aquecendo ainda mais.
— Perdão?
Qualquer que fosse sua expressão, Derek conseguia lê-la. Claro que
conseguia, ele era experiente com as mulheres e estava familiarizado com o seu
humor em todos os aspectos. Ele deu uma risada curta.
— Não estou pedindo detalhes, acredite em mim. Entendo como tudo
funciona. Não quero saber o que aconteceu entre vocês no quarto, mas e fora
dele? Eu o encontrei mais cedo, e ele está diferente. Agitado. Mais do que isso,
acho que queria... cancelar nosso desafio.
Ele queria?
O ambiente em torno dela, com seu cheiro vago de couro e uísque, pareceu
desvanecer-se. Caroline olhou para o homem alto do outro lado da sala e sentiu
uma pontada de... O quê? Esperança? Felicidade?
— Eu não posso continuar com isso, de qualquer maneira — ela fez sua
confissão em voz baixa enquanto tentava compreender o que ele queria lhe dizer.
— Estava decidida a enviar um recado ao senhor. Lamento a desistência, mas
devo...
Para sua surpresa, a expressão de Derek pareceu transformar-se em alívio
diante de suas palavras murmuradas, mesmo que ela não tivesse respondido
diretamente à sua pergunta.
— Por que a senhora cancelaria?
Não, se dissesse isso em voz alta, ela se envolveria emocionalmente. Um
reconhecimento verbal tornaria tudo dolorosamente verdadeiro. Ele poderia até
contar a Nicholas que ela achava que havia se apaixonado por ele.
Não.
— Razões pessoais — ela respondeu com o que esperava que fosse uma
rejeição sucinta do assunto. — Mais uma vez, peço desculpas por recuar.
— Essas razões pessoais giram em torno de um duque muito teimoso e
independente?
Havia uma astúcia desconcertante em seus olhos azuis.
Durante anos ela enganou a todos acreditando ser fria e insensível. Agora
parecia que havia perdido essa habilidade. Caroline pigarreou.
— Por favor, não me pergunte isso.
— Isso me soa como um retumbante sim. Excelente.
Foi um comentário desconcertante. Caroline se sentiu mais perdida do que
nunca com o propósito de sua visita. Será que entendera mal ou ele acabara de
insinuar que aprovava o fato de ela ter se apaixonado perdidamente por um
homem conhecido por seu distanciamento emocional quando se tratava de casos
amorosos?
Ele continuou.
— Não se desculpe pela perda do nosso tempo juntos, Lady Wynn. Isso não
ia acontecer de qualquer maneira, com ou sem o que quer que exista entre a
senhora e Nick. Desisti de ligações sem sentido com mulheres que valorizam
apenas prazer passageiro. Deixe-me ser brutalmente honesto com você. A aposta
foi o resultado direto de um momento frustrado devido ao anúncio de que a
mulher que amo com todo meu coração e minha alma vai se casar com outro
homem.
O relógio preso à parede sempre fizera tanto barulho? Ela lidava com suas
contas naquela sala e nunca percebera isso antes. Era o único som a se
intrometer no silêncio mortal que se estabelecera enquanto ela olhava para seu
visitante com uma surpresa indisfarçada.
Lorde Manderville acabara de dizer que estava apaixonado? Espontâneo, o
riso de Caroline se espalhou, e uma alegria imensurável quebrou o momento. Em
parte tratava-se de diversão genuína, em parte, a liberação de um estoque de
apreensão que fora construída nos últimos dias.
As sobrancelhas loiras de Derek se arquearam.
— Acha divertido? Fico feliz que pense assim, mas, da minha parte, sinto-
me o homem mais miserável de Londres.
Ela conseguiu balançar a cabeça e recuperar o fôlego, usando a mão para
pressionar o estômago.
— Não, meu senhor, não estou rindo dessa parte infeliz do seu discurso. Mas
deve admitir que tudo isso é muito cômico de certa forma. Nicholas
essencialmente me disse, enquanto estávamos em Essex, que ele só quer se casar
por amor. E aqui está você, me dizendo que seu coração supostamente inviolado
foi partido. Ninguém na alta sociedade acreditaria.
O conde parecia desconcertado, mas teve a bondade de sorrir.
— Eu suponho que a senhora esteja certa.
Caroline teve que admitir, ela estava curiosa.
— Quem é ela?
— Annabel Reid, protegida do meu tio.
Ela registrou a informação com descrença. Miss Reid era muito jovem e
completamente ingênua, de rosto inocente. Fora ela a responsável por capturar o
coração do anjo perverso? Uma jovem mal saída da infância e protegida de seu
tio, ainda por cima? Não que a jovem não fosse muito bonita, mas ele não se
divertia com moças de família. Era de conhecimento comum.
— Você está surpresa — disse ele, interpretando corretamente sua expressão.
— Bem, eu também estou, mas é a verdade. Estou surpreso com a reação de
Nicholas à senhora também. No entanto, talvez tudo isso estivesse destinado a
acontecer. Espero que possamos unir forças. Isso é, se a senhora estiver tão
interessada em Nicholas como ele parece estar pela senhora.
Ela estava mais do que interessada, esse era o problema, mas temia se
equivocar.
— Eu não acho que o duque e eu nos conheçamos há tempo suficiente para
avaliar a profundidade de nossos sentimentos.
Lorde Manderville bufou suavemente.
— Ele ficou com ciúmes esta tarde quando falou comigo. Reconheço a
emoção muito bem. Estava preocupado com a senhora, inquieto, infeliz, irritado
consigo mesmo, confuso...
— Desta forma está fazendo soar como uma doença terrível, meu senhor. —
Caroline reprimiu outra risada ao olhar para a expressão dolorosa de Derek e
lutou contra um surto de otimismo irracional.
— E é, escute o que eu digo. — Sua boca se contorceu, e ele hesitou por um
momento. — Veja bem, minha senhora, eu conheço Nick há muito tempo. Desde
aquele primeiro momento na sala de visitas da hospedaria houve uma faísca
entre vocês dois. Notei naquele dia, mas pensei que poderiam ser apenas as
circunstâncias incomuns que o intrigavam. Agora eu me pergunto se não era
mais do que apenas isso.
Ele poderia estar certo? Era irracional esperar que sim. Apesar disso,
Caroline lançou-lhe um olhar desamparado e confuso.
— Como podemos nos ajudar mutuamente?
— Talvez, se trabalharmos juntos, isso ajude a ambos. Meu tio está
convencido de que Annabel sente o mesmo por mim, e eu rezo para que esteja
certo. No entanto, ela está noiva de Lorde Hyatt e minha última tentativa de me
explicar foi um desastre. Comecei a me perguntar se você, pela inclinação de sua
própria experiência, poderia persuadi-la a ver que um casamento sem amor é um
caminho para a infelicidade.
Ela realmente estava sentindo pena de um dos homens mais bonitos, ricos e
charmosos da Inglaterra?
Bem, sim. Ele parecia desesperadamente sincero e, afinal de contas, vestira
um disfarce ridículo e fora vê-la no meio da noite. Sem mencionar que declarara
que não tinha intenção de continuar com a aposta, mesmo que ela ainda estivesse
disposta a tal. Caroline disse:
— Eu só posso falar da minha própria experiência. Conheço Lorde Hyatt e
duvido que ele pudesse vir a ser um marido cruel. Mas você tem razão, meu
senhor, eu acredito que um casamento sem amor seja capaz de desperdiçar uma
parte preciosa da vida de alguém e é duplamente injusto se uma das partes
envolvidas estiver apaixonada por outra pessoa. Suponho que estou disposta a
tentar.
— Excelente. — Seu sorriso foi genuíno pela primeira vez; um hipnotizante
curvar de sua boca que, sem dúvida, deixava os joelhos de muitas mulheres
bambos como líquido. Ele arqueou uma sobrancelha e o sorriso se transformou
em algo diabólico. — Eu, por outro lado, vou ter grande prazer em fazer com
que Nick reconheça para si mesmo e para a senhora que o coração dele pode
estar finalmente comprometido. Não quero que ele cometa o mesmo erro que eu.
Se achasse que uma simples conversa funcionaria, ousaria tentar, mas os homens
são mais obtusos do que as mulheres.
— Se o senhor acha que vou questionar isso, Lorde Manderville, está
enganado.
— Duvidava que a senhora o fizesse — disse ele secamente. — Minha ideia
é que algo que mexa com sua cabeça funcionará melhor do que a sutileza. Eu
tenho um plano.
Caroline começava a perceber por que Nicholas era tão amigo de seu
famigerado companheiro.
— Eu imagino que seja muito criativo, mas há um problema muito grande.
Se o senhor não tivesse sido tão honesto, eu nunca discutiria tal coisa, mas...
Mesmo tendo dito isso, sua voz falhou, e ela tentou engolir o nó em sua
garganta. Olhou para os dedos entrelaçados no colo por um momento e depois
endireitou os ombros.
— Apesar de minha oferta para julgar a aposta e os últimos dias que passei
com o duque, não estou interessada em um caso de amor casual. Como há todas
as chances de eu ser estéril, nada além disso será possível entre nós. Ademais,
ele e eu nos conhecemos há tão pouco tempo. Menos de uma semana na
companhia um do outro certamente não é suficiente para julgar verdadeiros
sentimentos.
Manderville encostou um ombro largo na parede e cruzou os braços.
— Eu acho que senhora está completamente errada, Lady Wynn. Conheço
Annabel há mais de uma década e demorei a entender o que acontecia entre nós.
Não há um padrão de tempo para medir a chegada do amor. Acho que acontece
com algumas pessoas no instante em que elas se encontram, mas pode levar anos
para crescer gradualmente, permitindo todos os tipos de cenários. Quanto à
possibilidade de nunca conceber um filho, reconheço que ter um herdeiro seja
uma consideração importante para qualquer um que tenha um título a repassar,
mas mesmo que Nicholas se casasse com alguma dama virginal, ele ainda estaria
assumindo o risco.
Isso era verdade. Ela certamente nunca pensou que não seria capaz de
conceber antes de se casar.
— Comigo, ele tem a evidência do meu fracasso anterior.
— Então seu argumento é que seria melhor se Nicholas se casasse com
alguma jovem inexperiente e insípida? Pensei tê-la ouvido dizer que ele quer se
casar por amor.
Ela estava mesmo tendo uma discussão profunda com um famoso libertino
sobre o assunto de romance e casamento?
Nicholas e Derek Drake eram homens muito diferentes do que diziam os
boatos. Caroline salientou:
— Não sabemos se ele tem algum sentimento por mim além da atração
física.
— Pelo contrário, você não o viu esta tarde. — Derek se empertigou. —
Diga-me, minha senhora. Se houvesse uma única palavra para descrever seu
tempo com ele em Essex, qual seria?
Uma palavra? Seria impossível resumir clareiras ensolaradas, um prazer
indescritível, sorrisos de tirar o fôlego e valsas silenciosas com uma palavra.
Mas ela poderia tentar.
Ela disse, finalmente, em uma voz quase inaudível:
— Mágico.
Ele assentiu com a cabeça, com um brilho nos olhos que dizia a Caroline que
sua tentativa de esconder seus sentimentos fora falha.
— Então, gostaria de ouvir o que tenho em mente?
D ois dias. As palavras entoavam em sua cabeça, mesmo enquanto ele
exercia o simples ato de passar marmelada em um pedaço de torrada. Ao
contrário da simples sala de café da manhã ensolarada da propriedade em Essex,
onde ele jantara com Caroline, os altos tetos, a enorme mesa reluzente e o bando
de servos movendo-se discretamente ao fundo em sua casa em Londres o
lembravam de que nada era feito em pequena escala. Nicholas estava
acostumado com isso − embora fosse algo em que raramente pensara −, mas a
pompa ducal passara a se destacar por causa de sua preocupação com uma viúva
adorável e inatingível.
Caroline preferira a torrada simples. Ela bebia leite com seu chá, mas não o
tomava com açúcar. Quando o sol batia em seu cabelo, a cor cintilante tornava-
se única, como…
— Você certamente está em outro mundo, querido. O que tanto o distrai esta
manhã?
Nicholas olhou para cima com um sobressalto, a xícara a meio caminho da
boca. Bom Deus, ele estava sonhando como um idiota apaixonado.
O que deveria fazer? Dizer à sua mãe que encontrava-se absorvido pela
noção de que Lady Wynn lhe devia mais dois dias de prazeres carnais para
liquidar sua aposta? Ele não tinha ilusões; sua mãe devia ter ouvido falar sobre a
aposta, mas até o momento não dissera nada. Não que ele não estivesse grato por
ela não ter mencionado um desafio masculino tão indelicado, pois tinha certeza
de que o desaprovava. Ela devia desaprová-lo, na verdade. No entanto, o que
aconteceu não podia ser alterado. Não uma aposta devidamente listada nos livros
de Londres sobre a qual todos fofocavam, muito menos aqueles cinco dias
passados com Caroline.
Aqueles que ele não mudaria, mas sete dias fora o combinado.
Sim, Caroline lhe devia mais dois. Ela recusara, mas talvez ele pudesse fazê-
la mudar de ideia. Estava ficando obcecado com o pensamento.
— Tem sido uma semana agitada. — Ele colocou sua xícara ao lado de seu
prato com cuidado exagerado e levou o guardanapo à boca. — Sinto muito se
estou ignorando a senhora. Por favor, me perdoe.
— Eu te perdoo, querido, mas prefiro saber o que colocou essa expressão em
seu rosto.
Do outro lado da mesa, ela franziu a testa para ele, mexendo ociosamente o
chocolate na xícara.
— Que expressão?
Ele suspirou com resignação. No final das contas, era sua culpa estar sentado
ali, pensando em Caroline. Se iam começar um interrogatório, ele só podia
responsabilizar a si mesmo.
Mas não conseguia tirá-la da cabeça.
Sua mãe graciosamente pegou o belo bule de porcelana à sua frente e
acrescentou um pouco mais de bebida em sua xícara, mas sua atenção estava
toda voltada para ele.
— Você parecia estar se lembrando de algo bastante agradável. Algo que te
fez sorrir.
A Duquesa de Rothay sempre fora perspicaz. Mas Nicholas não estava com
vontade de responder a perguntas e, mesmo que estivesse, duvidava que ela
gostasse das respostas.
Talvez nem acreditasse. Ele nunca se preocupara com as mulheres.
Até agora.
Ela continuou, e seus lindos olhos escuros refletiam sua curiosidade.
— Parece que sua mente estava em outro local. E você ficou quieto a semana
toda, recusando-se a nos acompanhar a qualquer lugar.
Ela estava certa. Ele parara de frequentar a ronda habitual de saraus e vários
tipos de entretenimentos, principalmente porque queria evitar Caroline.
E, ao mesmo tempo, ele tinha um desejo perverso e desconfortável de vê-la.
Geralmente conhecia sua própria mente. Seu atual estado de inquietação o
incomodava da mesma forma como se sentira em relação a Helena uma década
atrás. Só que naquela época o interesse fora estimulado por uma paixão infantil,
e ele não era mais um menino.
— Ando extremamente ocupado — disse ele com o mínimo de inflexão em
sua voz.
Sua mãe não podia ser facilmente enganada. Uma sobrancelha se arqueou, e
suas feições aristocráticas tornaram-se uma caricatura de ceticismo.
— Você está sempre terrivelmente ocupado, Nicholas. Esse não pode ser o
motivo. Althea também notou. Você parece um pouco… não sei… distante.
Era exatamente disso que um homem precisava — ele pensou em resignado
divertimento sardônico: ser analisado por cada mulher de sua casa.
— Se me distraí, culpo o estado atual do conflito político. Estamos
debatendo sobre tudo, desde o pedido de Wellington por mais soldados a sanções
agrícolas.
— Isso faz com que você vá para a cama em uma hora razoável e se levante
ao amanhecer? — Sua mãe olhou para ele com um escrutínio atento que o fez
sentir como se tivesse cinco anos de idade novamente, sendo pego em uma
mentira descarada. — Você geralmente tem uma rotina bem diferente. Os
debates no Parlamento sempre aconteceram. Com muita frequência, na verdade.
Acho que você está sendo evasivo e me pergunto por quê.
Desde seu retorno de Essex, ele não vinha dormindo muito bem. Adaptara-se
rapidamente à sua nova predileção por assistir ao amanhecer, mas não era tão
satisfatório como quando tinha Caroline calorosa e disposta ao seu lado para
celebrar a chegada do sol da maneira mais prazerosa possível.
— Você está planejando comparecer ao baile dos Harrison esta noite, não é?
Acredito que Charles e Althea irão para a ópera, e eu apreciaria sua companhia.
Perguntado assim, como ele poderia recusar?
— Eu ficaria honrado em acompanhá-la. E, por favor, pare de se preocupar
comigo.
Ele se levantou da mesa do café da manhã, beijou a bochecha da mãe com
uma afeição que não era de todo fingida, embora não estivesse interessado em
ficar para mais interrogatórios, e saiu da sala.
Ele não mentira. Não de todo. Não havia nada de errado, o problema era que
algo não estava certo. A preocupação ridícula não se limitava a pensamentos
errantes durante o café da manhã. Na noite anterior, ele sonhara com uma pele
macia e acetinada ao lado da dele, cabelos ruivos lustrosos se derramando sobre
seios perfeitos e um prazer incandescente misturado ao cheiro elusivo de lírios
do vale. Para a sua mortificação, acordou suado, enrolado nos lençóis, isso sem
mencionar o membro duro e ereto. Sonhos não o deixavam naquele estado desde
a adolescência.
A visão tinha um rosto delicado, belo e intimamente familiar, emoldurado
por aquela massa sedosa de cabelos e dominado por grandes e incríveis olhos
prateados.
Ele lidou com sua excitação sozinho, pensando nela. Não era algo que
fizesse com frequência. Não tinha necessidade. Quando se tratava de sexo, havia
mulheres dispostas a resolverem o problema por ele.
Um ponto que poderia lembrar mais tarde. No momento, porém, queria
checar seus cavalos. Fazia dias que não via seu garanhão, a semana seguinte
prometia ser cheia de reuniões, e a agitada agenda não lhe concederia muito
tempo para refletir sobre o que a incomparável Lady Wynn era capaz de fazer.
Com Derek.
Não, felizmente, não. Era perversamente satisfatório saber que Derek não
poderia desaparecer imediatamente. Estaria ocupado com questões políticas.
Quaisquer arranjos que pudesse fazer com Caroline teriam que ser adiados por
um tempo curto.
Enquanto aguardava seu cavalo, Nicholas descobriu que cerrava os dentes ao
pensar nos encontros entre aqueles dois, e uma ligeira dor em sua mandíbula foi
a consequência. Com uma sacudidela de sua cabeça, ele conscientemente
dispensou o pensamento. A lembrança de como ela o recusara ainda mantinha-se
fresca em sua mente. Não havia dúvida de que queria vê-lo. Nem ele poderia
culpá-la por não desejar um escândalo em sua vida, então... tudo estava
resolvido. Não necessariamente para sua satisfação, mas resolvido.
Não era verdade?
O passeio até a periferia da cidade não foi tão agradável por causa das ruas
molhadas de toda a chuva dos últimos dias, mas foi bom sair, no entanto. Passara
tempo suficiente em salas de reuniões abafadas e confinado em seu escritório. O
responsável pelo estábulo cumprimentou-o com um sorriso largo e um tapinha
informal nas costas com sua mão corpulenta. A posição que ele ocupava não
importava em nada, assim como sua linhagem de sangue, pois, no estábulo,
O'Brien era tratado como um rei, suas decisões eram invioláveis, e Nicholas —
vencendo ou não — confiava nele implicitamente.
Os estábulos eram meticulosamente mantidos, construídos de pedra e
madeira polida, as barracas ordenadas em longas filas, todas acentuadas pelo
cheiro de feno, aveia e pelo mais leve tom inevitável de adubo. Era sofisticado
para qualquer padrão, digno de alguns dos melhores cavalos da Grã-Bretanha, e
Nicholas sempre sentia certa paz entre os animais que tratava quase como se
fossem crianças.
— Como está a perna dianteira de Satanás? — ele perguntou. Seu atual
favorito sempre era o primeiro sobre o qual queria saber.
— Aquele rapaz está em ponto de bala. Vamos vê-lo, senhor?
Ruivo e barulhento, O’Brien era um bruxo com seus animais preciosos.
— E Baikal?
Uma de suas aquisições mais jovens ainda não tivera seus talentos postos a
prova, mas o irlandês insistira que ele deveria comprar o potro por um preço
exorbitante, e Nicholas não hesitou nem por um minuto.
— Posso dizer honestamente que o senhor ficará impressionado. Fez uma
milha em dois minutos e é jovem ainda.
— É verdade?
A próxima hora foi passada vistoriando as instalações, recebendo
atualizações sobre o bem-estar de cada animal, baia por baia. Foi agradável
esquecer a vida lá fora por um tempo e mergulhar em sua paixão.
Ele quase − quase − se esqueceu, por um breve momento, de sua outra
paixão, até que foi bruscamente lembrado quando algo pequeno, peludo e
extraordinariamente desajeitado galopou à sua frente e quase tropeçou nele.
— Desculpe, sua graça. — Uma jovem mão estável pegou o intruso ofensivo
e segurou o animal balançando-o na dobra de seu braço. — Este aqui é o
indisciplinado da matilha.
Nicholas olhou para o cachorrinho que se contorcia, mas em vez de ver uma
língua rosa tentando lamber furiosamente o rosto do menino e um canino peludo,
imaginou um vale arborizado e uma linda mulher nua em seus braços, deitada,
aproveitando a languidez proporcionada pelo intenso prazer, enquanto tentava
mais uma vez extrair informações sobre a vida dela.
“Meu pai nunca se importou em ‘perder tempo’ com qualquer coisa que
considerasse um incômodo. Quando criança, eu queria desesperadamente um
filhote, mas ele sempre dizia não, e minha tia não podia nem ouvir falar disso...
Não importa agora, é claro...”
Mas mesmo assim − mesmo inebriado após toda atividade carnal −, ele
ouviu na voz de Caroline que era importante. Ele também discerniu outra coisa.
O pai dela incluía sua única filha na categoria de incômodo. Viajar até York e
torcer o pescoço do homem insensível poderia ser fascinante.
Mas talvez Nicholas pudesse restaurar esse sonho de infância.
Afinal, ela o desafiara a ser ainda mais romântico do que um jantar
improvisado no terraço. Por impulso, perguntou:
— Há uma matilha, então?
O jovem assentiu.
— Seis deles.
— Idade suficiente para serem desmamados?
— Acabaram de desmamar, Sua Graça.
Agradavelmente, Nicholas disse:
— Eu gostaria de vê-los, se for possível. Tenho um amigo que sempre quis
um cachorro.
No final, ele escolheu o selvagem que literalmente atravessara o seu caminho
e, embora parecesse mais uma bola de pelo do que um cão de verdade, tinha de
admitir que a criatura era afetuosa e entusiasta. Sabia disso, porque fora forçado
a caminhar por Londres segurando a maldita coisa, e no momento em que ele
urinou em calças anteriormente imaculadas, Nicholas se perguntou se não estaria
agindo como um tolo sentimental.
Confirmou suas suspeitas quando sentiu o desejo de poder estar presente
para ver o rosto de Caroline quando o presente fosse entregue. Mas isso era
impossível, e esta vontade o fez sentir-se mais idiota do que o ato de carregar um
vira-latas ao outro lado da cidade. Precisava dar crédito ao desafortunado lacaio
que abrira a porta e mantivera sua expressão educada enquanto Nicholas
depositava o cachorro em seus braços com gratidão e dizia:
— Cuide para que seja alimentado e banhado, e eu lhe darei um endereço
para entregá-lo.
— Muito bem, Sua Graça.
Ele parou por um momento, pensando na necessidade de Lady Wynn por
discrição. O brasão ducal ao lado de sua carruagem estava fora de questão.
— Pegue uma carruagem de aluguel, se quiser, e deixe meu nome fora disso.
A senhora vai adivinhar que vem de mim.
— Claro.
Sorrindo, ele subiu para se banhar e trocar de roupa. Podia sentir o cheiro de
cavalos e urina de cachorro, sentindo-se com humor sarcástico, mas na verdade
fora uma tarde satisfatória.

N ÃO HAVIA DÚVIDAS DE QUE ELE ESTAVA ESPERANDO .


Não, ela poderia ajustar essa observação. Espiando.
Caroline não teve escolha a não ser deixar que Franklin a segurasse pelo
braço enquanto subia os degraus, pois ele chegara como uma aparição vinda do
nada. Se não tivesse certeza de que a ideia era ridícula, poderia acusá-lo de ficar
vagando no beco perto da casa, antecipando seu retorno.
— Que fortuito termos chegado ao mesmo tempo — Franklin murmurou,
acompanhando-a até a porta. — Visitei-a em diversas ocasiões, mas presumo
que tenha estado de visita a algum amigo no campo.
Visões daquele amigo vieram à mente. Cabelos escuros embaraçados pelo
vento, um sorriso pecaminoso que tanto deslumbrava quanto cativava, um corpo
forte que cobria o dela enquanto se moviam juntos na mais antiga comunhão
possível entre um homem e uma mulher. Nicholas era um amigo? Na verdade,
sim, ela o considerava assim, sempre que conseguia deixar suas proezas sexuais
de lado. Poderia considerar que conversara com ele naqueles cinco dias mais do
que com qualquer outra pessoa durante toda a vida. Só podia culpá-lo, porque
sempre parecia interessado no que ela tinha a dizer.
— Sim, eu estava com um amigo.
Se o tom da resposta incomodou o novo visconde, ele não demonstrou.
Aquelas familiares feições da família Wynn, angulosas e definidas, não
revelavam nada sobre seus sentimentos. Ela associava a mesma característica ao
seu falecido marido. Depois que ela entendeu o que Edward realmente era, sua
aparência física perdeu todos os atrativos.
Um monstro era um monstro, não importava o rosto que tivesse.
Embora a necessidade de oferecer polidez a fizesse sentir um lampejo muito
real de irritação, ela disse:
— O senhor vai entrar?
— Eu não teria vindo se não tivesse esta intenção.
A suave presunção em seu tom a incomodava mais do que nunca, mas vários
anos de casamento com seu primo ainda mais arrogante haviam lhe ensinado a
nutrir uma grande dose de autocontrole. Ela esperava que seu sorriso parecesse
tão remoto quanto gostaria que fosse.
— Claro. Por aqui, meu senhor.
— Eu conheço o caminho. Especialmente porque imaginei que esta
residência seria minha.
Suas palavras foram ditas em uma tentativa de bom humor, mas Caroline
lembrava-se bem da quantia que precisara pagar aos advogados para que estes
provassem que seu legado era legítimo.
Não havia ilusões. Ele não era um amigo, mas pelo menos sua capacidade de
vingança era muito menos evidente que a de Edward. Quando ela se instalou em
frente a ele na sala de visitas formal e pediu refrescos, ficou em silêncio,
esperando que ele declarasse o propósito de sua visita. Deveria haver um, disso
ela não tinha dúvida.
Franklin olhou para trás, com olhos pálidos e ilegíveis.
— Você está linda, Caroline. A viagem lhe fez bem.
— Obrigada.
— Eu sempre apreciei sua beleza, você sabe disso.
Aquela demonstração de interesse não fez nada além de arrepiar-lhe a pele.
Seu tempo com Edward lhe ensinara que um homem poderia desejar uma mulher
de uma forma carnal e não ter absolutamente nenhum afeto ou bondade para
com ela.
Quando ela não respondeu ao comentário, um leve sorriso curvou a boca de
Franklin. Ele se acomodou de forma casual, como de costume, elegantemente
vestido a ponto de parecer afetado em um casaco azul-pavão, uma gravata
imaculada ostentando um alfinete de diamante, calças marrons enfiadas em botas
polidas.
— Vamos ser francos. Você desconfia de mim depois do desacordo sobre a
disposição da propriedade de meu primo. Acho que deixei claro que gostaria de
resolver isso entre nós.
— Nós não precisamos discutir isso novamente.
Era uma coisa neutra para dizer. A verdade era que ela suspeitava que
Edward não gostava de Franklin porque eles eram um pouco parecidos demais.
O homem abriu as mãos em um gesto suplicante.
— Realmente precisamos, se é uma fonte de discórdia entre nós. Afinal,
somos uma família e não quero me esquivar de minhas responsabilidades para
com você. Como apontei antes, sou seu parente masculino mais próximo e tenho
o direito de dar algumas opiniões em sua vida.
Este também não era um tema do qual ela quisesse falar.
— Somos apenas primos pelo casamento. Não é um laço próximo e não é de
sangue. Além disso, tenho meu pai.
— Eu falei com ele.
Ela o olhou, chocada com a presunção.
— O quê?
Franklin retribuiu o olhar, o rosto impassível.
— Claro. Você já sabe que estou preocupado com você. Ele alega que desde
o dia em que você se casou com Edward e se tornou uma Wynn, não tem mais
obrigações de pai.
Obrigações. Ficou chocada ao pensar que seu pai havia colocado dessa
forma, mas infelizmente podia imaginá-lo dizendo exatamente isso. Caroline
cerrou as mãos no tecido do vestido, amassando a seda frágil. Conscientemente
tentou relaxá-las.
— Sou uma mulher adulta e uma viúva. Não preciso de ajuda financeira nem
da proteção de ninguém.
Ele parecia divertido com seu jeito frio.
— Toda mulher precisa de proteção. Desde que seu luto acabou, mais de um
homem se aproximou de mim oferecendo-lhe casamento.
Caroline sentia-se furiosa não apenas por pensar que ele arrogantemente
supunha que podia interferir em seus assuntos matrimoniais, mas porque outros
faziam o mesmo.
— Que gentileza sua cuidar dos meus pretendentes.
Ele nem sequer piscou diante do sarcasmo evidente em seu tom.
— Seu futuro me preocupa. Você é jovem demais para continuar solteira.
— Só na sua opinião, meu senhor. Na minha, a idade que tenho me dá a
liberdade de esperar e decidir se algum dia vou querer me casar de novo.
— Sua posição sobre o assunto é bastante moderna, minha querida, mas...
— Minha senhora?
A interrupção da discussão crescente fez com que ambos olhassem para a
porta. Norman, meticuloso e elegante, estava ali, parecendo comicamente
horrorizado. Em suas mãos, ele segurava o que parecia ser uma bola de pelo
marrom.
— Perdoe-me, mas isso acabou de ser entregue. O homem que o trouxe disse
que não havia bilhete, mas que a senhora reconheceria a fonte do... er... presente.
O que devo fazer com isso?
Por um momento, Caroline ficou sem palavras, olhando para o filhote nas
mãos do mordomo, o corpinho peludo remexendo-se contra o colete. Mal
começou a se perguntar quem poderia lhe enviar um presente tão incomum
quando a verdade surgiu num piscar de olhos, como um relâmpago numa
tempestade de verão.
Nicholas. Durante uma daquelas tardes preguiçosas e divinas, com a cabeça
apoiada no ombro nu e musculoso, sentindo o aroma da água, da grama e da
terra ao seu redor, ela se lembrara de quando, ainda criança, pedira um cachorro,
mas fora recusada. Nunca gostara de falar do passado, mas ele conseguira
arrancar dela mais detalhes do que já contara a alguém. Talvez fosse o seu
charme rebelde, talvez fosse a catarse de finalmente conversar com alguém que
demonstrava um interesse genuíno, mas ela se viu confessando pequenas coisas
como o desejo frustrado de ter um animal de estimação.
Ela queria rir com prazer por causa do gesto.
Ao mesmo tempo, queria chorar, porque se sentia plenamente comovida.
Caroline se levantou e foi até Norman, pegando a pequena criatura, que
pareceu grata por isso. Dois olhos escuros cheios de alma olharam para ela e o
que era uma cauda atarracada começou a balançar-se freneticamente. Uma
pequena língua rosa começou a lamber sua mão.
Ela se apaixonou pela segunda vez em sua vida.
— Oh, meu Deus, ele não é adorável?
Norman, que gostava que a rotina da casa corresse de uma maneira calma e
organizada, parecia duvidar da nova adição.
— Se é sua opinião, minha senhora.
Franklin disse, em um tom impertinente:
— Quem diabos poderia enviar-lhe um vira-lata?
Como a verdade não poderia ser dita, ela não respondeu. Em vez disso,
inclinou-se e colocou no chão seu mais novo amigo, que rapidamente pulou
sobre um sofá bordado, pulando dele logo em seguida, só para correr de volta
para ela e pisar em seus pés. Deu um latido curto, como se pedisse aprovação
por esse feito maravilhoso. Ela o fez, curvando-se para acariciar uma orelha
felpuda.
— Eu nunca tive um animal de estimação.
— Se me perguntasse, eu diria que é um presente muito presunçoso.
Caroline riu da escolha apropriada de palavras. Não pôde sequer evitar. O
lindo e sensual Duque de Rothay era presunçoso, de fato, mas, naquele caso, o
gesto tocara seu coração com inexplicável e profunda emoção. Se ele tivesse
enviado diamantes, ela teria pensado que ele era generoso e romântico, mas
aquele era realmente um presente esplêndido, pois significava que ele ouvira
mais do que apenas as palavras dela quando lhe contara sobre sua decepção na
infância. Ouvira o que estava intrínseco à fala isolada e o pequeno encolher de
ombros. Rezou para que Derek estivesse certo, e se houvesse uma maneira de
persuadir Nicholas a pensar em um relacionamento permanente, ela queria ao
menos tentar.
Mesmo com o risco de ter seu coração partido se não funcionasse.
— Se eu soubesse o que era necessário para trazer um sorriso desses para os
seus lábios, minha querida, eu mesmo teria surrupiado um cachorro sujo e de
alguma sarjeta desagradável. Não consigo ver uma mulher fazendo isso, então
me pergunto quem mais poderia inventar uma ideia não ortodoxa para dar tal
presente.
Seu tom suave e quase ameaçador a fez olhar para cima e endireitar-se, um
lampejo de alarme fazendo seu estômago se contorcer. Nicholas não poderia
saber que Lorde Wynn estaria lá quando o filhote fosse entregue, mas o
momento fora terrível. Franklin a olhava com os olhos apertados, a boca
franzida.
— É de Melinda, tenho certeza — ela improvisou, sabendo que não era uma
boa mentirosa, esperando que ele não notasse o rubor em suas bochechas. — Eu
acredito que ela mencionou que um dos spaniels de seu marido era uma cadela
prestes a ter uma ninhada.
— Esse dificilmente é o filhote de um cão de caça de raça pura.
Ele estava indubitavelmente certo. Ela murmurou:
— Talvez seja uma mistura?
Franklin ficou de pé.
— Já que você parece ocupada, vou me despedir. Pense no que eu disse.
A alegria foi substituída instantaneamente pelo ressentimento.
— Se o senhor está se referindo ao casamento, me desculpe, mas não está
nos meus planos futuros neste momento.
Com deliberada afetação, ele ajustou o punho do paletó.
— Isso vai mudar.
Ela olhou para a porta depois que ele saiu, imaginando o que poderia
significar aquele comentário enigmático. Isso a deixava inquieta, porque
enquanto jurava a si mesma que ele não poderia forçá-la a fazer qualquer coisa
que não quisesse, Franklin parecia ter uma opinião diferente.
Um puxão agudo na bainha de seu vestido atraiu sua atenção para baixo, e
ela pegou o presente de Nicholas, segurando a exuberante bola de pelos contra o
peito. Um pouco de amor incondicional em sua vida seria bom, pensou ela,
incapaz de reprimir um sorriso ao afastar Lorde Wynn de sua mente.
A sala de jogos como sempre mantinha uma aura de fumaça de tabaco
encoberta pelo cheiro de conhaque e Claret, e as janelas abertas para a
noite quente não eram capazes de purificar o ar. As conversas eram
ocasionalmente estridentes, pontuadas por gargalhadas, mas à mesa deles a
atmosfera era contida. Derek assistiu em silêncio quando o homem à sua frente
jogou suas cartas e recolheu os ganhos com outra mão.
Aparentemente, o duque de Rothay estava tendo uma noite de sorte.
Só que, para um homem que tinha a fortuna do diabo a sorrir para si, ele não
parecia particularmente feliz. Nicholas exibia uma curva singular em seus lábios,
e qualquer um que o conhecesse além de um contato casual reconheceria como
irritação. Derek supunha saber o motivo.
— Eu digo, Rothay — resmungou o jovem Lorde Renquist —, é melhor que
se afaste por uma rodada ou duas para que o resto de nós tenha uma chance.
Os olhos escuros de Nicholas exibiam um leve brilho de embriaguez, e este
não seria um palpite infundado, se fosse julgado o número de vezes em que
enchera o próprio copo desde que se sentara. Ele falou pausadamente:
— Não sou eu que estou dando as cartas. Você está insinuando alguma
coisa?
O jovem podia estar um pouco alcoolizado também, mas não tanto a ponto
de não reconhecer o sinal de advertência na voz de Nicholas.
— Eu não estava insinuando nada. Foi só uma piada.
— Foi?
O rosto de Renquist empalideceu um pouco.
— Não foi uma piada boa.
— Vamos jogar, certo?
Nicholas pegou as cartas, embaralhando-as habilmente com os dedos longos,
e sua expressão exibia aquele indício incaracterístico de mau-humor rabugento.
Derek viu dois dos outros jogadores olharem um para o outro em um acordo
implícito de não irritar o sempre tranquilo e gentil Duque de Rothay naquela
noite. Se até mesmo uma observação tão inócua o tinha ofendido, talvez fosse
melhor ficar quieto.
Depois de mais duas mãos desastrosas, Renquist se desculpou com polidez e
passou para um jogo de dados. Derek nem se importou em perder um pouco, já
que estava determinado a desempenhar o papel de cão de guarda naquela noite.
Em circunstâncias normais, confiava em Nicholas para se comportar, mas a
situação não era comum.
Caroline estava presente no salão de baile enquanto jogavam cartas. A
conselho de Derek, ela até dançava, algo que raramente fazia. Naquela noite,
parecia mais linda do que nunca, trajando um vestido de renda creme com uma
sobressaia em um tom de verde que deixava seu cabelo brilhante e a pele de
marfim em destaque. Algo não identificável mudara a respeito dela desde que
voltara de sua estada com Nicholas e, embora parecesse tão serena, sustentava
um ar diferente.
Os homens notaram. Não apenas a dança, embora tivesse gerado
comentários, mas a diferença mais sutil era a suavidade em seu habitual
comportamento indiferente.
Daí o mau humor instável do duque, porque ninguém sabia melhor do que
Derek como era estar perto da mulher que você deseja e não conseguir se
aproximar dela. Caroline estava lá, Nicholas sabia disso, e ele precisava ficar
longe enquanto outros homens valsavam e flertavam com ela. Uma postura de
contenção até então desconhecida para um homem que normalmente poderia ter
o que queria, especialmente quando se tratava do sexo mais justo.
Não que ele estivesse em uma situação melhor, pensou Derek, pois Annabel
também estava lá, linda, vestida em tule rosa pálido, os cabelos claros erguidos
para mostrar a linha graciosa de seu pescoço e os ombros de cetim. Ele poderia,
é claro, chamá-la para dançar, já que ninguém pensaria muito sobre isso, dada a
sua conexão familiar com seu tutor, mas ele imaginava que ela iria negá-lo se
tentasse se aproximar. Ser desprezado em público causaria fofoca, e, embora não
se importasse tanto consigo próprio, duvidava que ser alvo de sussurros indiretos
a deixaria feliz. Ele não tinha ilusões de que ela não fosse culpá-lo.
Então, como Nicholas, ele tinha que manter distância.
Um de seus amigos pegou a cadeira vaga de Renquist à mesa e pediu para
entrar no jogo. Derek disse em tom neutro:
— Só uma palavra de advertência, George, hoje à noite Nick está com tanta
sorte quanto o próprio Satanás. Ele não pegou uma única mão ruim.
— Obrigado pelo aviso. Não vou apostar muito alto, então.
George Winston, encorpado e sociável, sentou-se e sorriu.
— Por falar em sorte, como vai a disputa entre vocês dois? Quando
ouviremos o grande anúncio?
Um músculo visivelmente cerrado surgiu no maxilar de Nicholas, mas sua
voz era bastante agradável.
— Ainda não está resolvido.
— Deve acontecer nas próximas semanas — disse Derek com um sorriso
preguiçoso deliberado. — Não queremos apressar o assunto.
Podia ser um erro incomodar Nicholas em seu atual estado de ânimo, mas
fazê-lo reconhecer seu ciúme era parte do plano.
Bem-humorado, mas sempre muito falador, Winston deu uma piscadela.
— Não apressar a senhora, você quer dizer. Saiba que todo mundo está
interessado em tentar descobrir quem ela é. Dê-nos uma dica agora.
Nicholas olhou para a mão como se fosse a coisa mais fascinante do mundo.
— Não.
— Ela é linda?
George não estava interessado no adiamento do assunto. De fato, todos os
homens à mesa pareciam ao mesmo tempo divertidos e curiosos.
— O que você acha? — Derek ergueu uma sobrancelha.
— Presumo que sim. Grandes seios?
Nicholas levantou a cabeça como um lobo farejando sua presa.
Se houvesse uma maneira discreta de dizer a George que especulações como
aquela poderiam colocá-lo em perigo, Derek teria avisado. Do outro lado da
mesa, com uma voz enganosamente casual, Nicholas disse secamente:
— Como cavalheiros, nos recusamos a discutir isso.
Claramente um aviso.
O olhar frio em seus olhos escuros declarou que o assunto estava encerrado.
Então ele jogou suas cartas na mesa e se levantou.
— Desculpem-me, senhores, mas estou fora.
Houve um breve silêncio após sua partida abrupta. Ele saiu da sala com
passos determinados, como se tivesse um destino definido em mente. Um dos
outros jogadores murmurou:
— Eu digo, ele não se encontra em seu estado normal esta noite, não é?
Um sinal muito promissor. Derek respondeu apenas:
— Ele teve reuniões com o Primeiro-Ministro todos os dias na semana
passada e sua família está na cidade. Pode ser que esteja apenas cansado.
George bufou.
— O duque diabólico? Já o vi ficar até o amanhecer bebendo e não fazer
nada mais do que trocar de roupa, sair para uma corrida e fazer a mesma coisa na
noite seguinte. Nick não se cansa.
Derek apostaria as fichas empilhadas à sua frente e mais algumas que George
estava errado. No momento, ele achava que o lendário Rothay estava muito
cansado de ficar tão perto de Lady Wynn, mas não poder sequer tocar sua mão.

A PORTA DA CARRUAGEM SE ABRIU , E N ICHOLAS FICOU IMÓVEL , ESPERANDO QUE


não tivesse acabado de cometer o erro impulsivo de ouvir seu pênis
indisciplinado. Caroline começou a subir, mas parou quando o viu, sua boca
macia se abrindo em choque.
Ele disse baixinho:
— Por favor, entre e eu vou explicar.
— Nicholas, o que você está fazendo? — Ela ficou parada ali, sem entrar
completamente na carruagem, transformando a pergunta em um sussurro
ultrajado.
— Eu falei com o seu cocheiro. Ele nos levará por um caminho mais longo
até sua casa. Então, por favor, entre antes que alguém comece a especular.
Isso finalmente a fez entrar, e o jovem galês que a levou até Essex fechou a
porta. Ela se sentou no banco com um gracioso farfalhar de saias de seda e, um
momento depois, o veículo começou a se mover. Luminosos olhos prateados
olhavam para ele, mas estava escuro e ele não conseguia avaliar o quanto ela se
opunha à sua presença. Caroline finalmente disse:
— Eu certamente espero que ninguém tenha te visto conversando com Huw
ou, pior ainda, entrando na minha carruagem.
— Fui cuidadoso.
Ele realmente sentia-se muito feliz por ter tido tempo de falar com o jovem.
Durante o período em que Caroline ficara com ele em Essex, ele e seu cocheiro
discutiram sobre cavalos, um amor mútuo natural. Ali, aristocrata e servo
ficavam nivelados com facilidade.
Além disso, Huw obviamente sabia exatamente onde sua patroa passara as
noites, então, ele não hesitara quando Nicholas fez seu pedido.
— Eu não tenho certeza se você sabe ser discreto, Rothay — ela comentou
em um tom ácido, mas um pequeno sorriso curvou sua boca.
— Por você, estou disposto a dar o meu melhor. — Ele relaxou um pouco,
familiarizado com aquela expressão suave no rosto de uma mulher.
Não que saber que uma mulher desejava sua companhia tivesse sido tão
importante para ele antes, mas com ela, era. Muito importante. Por mais incrível
que pudesse parecer, ele queria saber que ela sentira falta dele da mesma forma
como ele sentia a dela.
Ela ainda o repreendeu primorosamente.
— Se bem me lembro, eu te disse não. Percebo que você não está
familiarizado com a palavra, mas, neste caso, receio ter sido sincera. Não quero
correr o risco de tentar um caso clandestino com você. Há uma longa lista de
pessoas que sabem sobre a minha viagem e permanência em sua propriedade,
além dos motivos que me levaram até lá. Além de Huw, há a senhora Sims, os
outros criados de lá, sem mencionar Lorde Manderville.
— Derek não dirá nada, ninguém em Essex foi informado do seu sobrenome
e só você pode falar pelo seu cocheiro, mas ele parece ser leal o suficiente. Nós
não seremos descobertos.
Seus cílios rendados baixaram minuciosamente.
— Deve ser bom ter sempre essa garantia de que a vida seguirá conforme
seus desejos.
Nascer rico e com um título provavelmente dava a alguém uma certa
confiança que era não só inata como imposta, mas ele realmente não queria
debater o assunto, não com ela tão deliciosamente próxima. A leve fragrância do
perfume dela colocava seu corpo em alerta total, e ele podia ver as curvas
deliciosas de seus seios emoldurados pelo decote de seu vestido. Eram grandes,
como George perguntara? Não. Eram femininos, firmes, perfeitos, que se
encaixam em suas mãos e boca? Sim. Quando Winston começou a especular
sobre sua aparência física, uma imagem muito vívida de seu corpo nu embaixo
do dele veio à sua mente, e, naquele momento, tomou uma decisão, incapaz de
resistir, sobre a qual teria que pensar com mais cuidado quando estivesse em um
estado de espírito mais calmo.
Ou quando não estivesse tão excitado, uma voz irônica e mais civilizada em
sua mente observou. Sua crescente ereção apenas por estar perto dela era uma
prova irrefutável de que seu corpo concordava com isso.
— Eu estou esperando que esta noite melhore, na verdade. — Ele prendeu
seu olhar e deu um tapinha no assento ao lado dele. — Venha se sentar aqui.
— Eu não deveria — sua resposta foi tranquila. — Você não deveria estar
aqui.
— Deveria, sim. Estamos sozinhos. Seu motorista adiará nossa chegada até
eu lhe dar um sinal. Quero apresentar-lhe as alegrias de fazer amor em uma
carruagem. É um pouco apertado, tenho que admitir, mas pode ter resultados
deliciosos.
— De alguma forma, tenho certeza de que é uma arte que você já praticou
com frequência. — Apesar de seu tom seco, ela fez o que ele pediu e mudou-se
para ocupar o assento oferecido. Um suspiro suave escapou quando ele mudou
de ideia e a ergueu nos braços, colocando-a em seu colo. Seu traseiro tentador
aninhou-se contra sua virilha, e ele endureceu ainda mais.
Nicholas se aninhou no pescoço dela.
— Você dançou esta noite. Não costuma fazer isso.
— Você me observou? — Sua garganta arqueou para trás para lhe dar maior
acesso, fazendo a pergunta soar suave como uma nuvem.
Admitir que ele não fora capaz de evitar parecia tão imprudente quanto
entrar em sua carruagem. Sua ideia de retirar-se para a sala de jogos também não
ajudara em nada. Então, murmurou:
— Eu notei.
— Eu notei você também.
A admissão foi feita em voz baixa e seus olhos brilhavam como joias sob a
luz fraca.
Então, eles tinham notado um ao outro. Nicholas não queria pensar muito
sobre isso. Caroline estava se tornando uma distração em sua vida e o que
deveria fazer era ficar longe dela até que a febre passasse. Mas, em vez disso, lá
estava ele, roubando alguns momentos de seu tempo como um ladrão vagabundo
que não tinha para onde fugir.
Aquilo era ridículo. Ele tinha dezenas de lugares para onde poderia fugir.
Lady Whitmore emitira um convite bastante óbvio enquanto dançavam, mas ele
só valsara porque queria estar perto de Caroline.
Então, ele a recusou da maneira mais educada possível.
E em vez disso passou quase uma hora sentado em uma carruagem escura.
Esperando.
Por ela.
— Você cheira a flores — ele disse, deixando a boca traçar a cavidade
sensível sob sua orelha, tentando descartar seus pensamentos inquietantes. —
Humm.
— Nicholas...
— Shh...
Ele tomou sua boca em um beijo ardente, porque não queria conversar, nem
analisar os motivos de sua presença. Então, sua língua abriu passagem,
encontrando e roçando a dela. Os braços de Caroline se entrelaçaram em seu
pescoço, e ela se inclinou para o abraço, apoiando seu peso delicado e flexível à
estrutura muito maior de Nicholas. Pelo menos o medo desaparecera
completamente, ele pensou enquanto explorava sua boca vagarosamente com um
prazer incandescente, e pelo modo como ela o beijava de volta, não havia
dúvidas de que estava muito disposta.
A carruagem sacudiu, balançando-se levemente quando pegaram uma curva.
Com corpos e bocas unidos, eles se moveram contra o movimento. Nicholas
percebeu-se ofegante quando levantou a cabeça, sentindo sua ereção mais
parecer um pedaço de ferro que protestava contra o confinamento de suas calças.
Acalme-se.
Primeiro desamarrou o vestido, afastando-o de um ombro magro e feminino,
abaixando-o cada vez mais até que um seio farto, firme e excitado se libertou.
Ele inclinou a cabeça e lambeu o bico maduro, provando o mamilo, provocando-
a, fazendo Caroline mudar de posição em seus braços.
— Oh... — um gemido rouco escapou.
Era um prazer secreto sentir os dedos suaves de Caroline embolarem em seu
cabelo e testemunhar o arquear de sua coluna enquanto ele sugava seu seio,
proporcionando a si mesmo uma profunda e pura satisfação masculina. Seria
muito melhor se estivessem em uma cama, ele pensou enquanto sutilmente a
excitava, enfiando uma mão sob seu vestido e deslizando os dedos ao longo da
parte interna de uma coxa quente e macia para encontrá-la quente e úmida, mas
ele aceitaria aquela condição, pois era tudo o que poderiam ter.
Talvez ela estivesse certa. Talvez ele estivesse acostumado a encontros
fortuitos com suas amantes passadas, talvez ele assumisse o risco de ela ser
comprometida por causa de sua notoriedade amaldiçoada.
E talvez ele não devesse tomá-la em uma carruagem em movimento,
simplesmente porque não tinha autocontrole suficiente para aceitar uma recusa.
Enquanto erguia as saias do vestido, segurando o tecido macio agrupado em
suas mãos e sentindo seu corpo implorar para ir mais rápido, ele hesitou. Era um
péssimo momento para ter um ataque de consciência, mas parecia que era o que
estava acontecendo. Nicholas respirou profundamente.
— Quantas vezes em nosso conhecimento eu vou ter que pedir perdão por
minha arrogância? Você quer isso, Caroline?
Ela soltou um suspiro, acompanhado de uma suave risada, que soprou um ar
quente contra sua bochecha.
— Não pareço entusiasmada?
— Não estava quando subiu na carruagem.
— Isso foi uma objeção às implicações da sua presença, não à sua pessoa. —
Ela se inclinou mais perto e beijou-o, seus lábios úmidos, seu corpo meio nu se
esfregando contra ele. Quando ela recuou, sussurrou: — Já aceitei o risco, então,
por favor, não o desperdice. Pensei muito em você, Nicholas.
— Eu sou um idiota egoísta. O risco é todo seu, e eu não lhe dei uma
escolha.
A mão dela deslizou para baixo e tocou a protuberância entre as pernas dele.
— Podemos debater isso em alguns minutos, por favor?
— Você tem certeza?
— Meu Deus, sim, Nicholas... Depressa.

A AURA DE PODER QUE O HOMEM QUE A SEGURAVA NOS BRAÇOS EMANAVA


poderia tê-la feito sentir-se intimidada e vulnerável, mas agora Caroline se
deleitava com isso quando ele a ergueu facilmente, colocando-a de pé para
desabotoar as próprias calças com destreza considerável, libertando seu membro
ereto, e a agarrou pela cintura.
— Levante suas saias. — O grunhido do comando indicava sua necessidade,
e ela se vangloriava na ideia de que ele a queria, mesmo que fosse apenas a um
nível físico. Caroline obedeceu, puxando-a acima de sua cintura e abrindo as
pernas enquanto ele novamente a erguia para colocá-la posicionada acima de
seus quadris magros. Eles se uniram devagar, conforme a mão dela guiava seu
membro rígido enquanto ele a abaixava, proporcionando a sensação espetacular
e pecaminosa, mesmo dentro de uma carruagem, cercados pelas ruas da cidade.
Ela se sentia perversa, mas também sentia uma liberdade estranha enquanto
embainhava a ereção dentro de seu corpo necessitado. Montada sobre o colo
dele, começou a se mover ao ouvir os sons de seus movimentos para cima e para
baixo. Mãos fortes seguravam seus quadris, e ele investia dentro dela arqueando
o corpo, obviamente impaciente, mas ainda controlado, trocando olhares
enquanto se moviam em direção a um objetivo erótico comum.
O desejo atingiu novos patamares, saturando seus sentidos, conforme o
movimento do veículo fazia parte do ritmo de seu amor. Nicholas a segurava
com uma combinação de força e delicadeza, oferecendo-lhe o brilho do desejo
feroz em seus olhos escuros e sedutores. Seu perfume masculino inebriante
adicionava combustível ao fogo familiar que já açoitava seu corpo, evocando
lembranças do mesmo prazer sedutor e inesquecível.
Seus lábios se abriram quando ela começou a ofegar, tentando abafar um
gemido aberto, mas alcançando um estado de êxtase onde já não mais se
importava se Huw os ouvia, ou mesmo se toda Londres fosse testemunha de seu
arrebatamento. O clímax surgiu de súbito, forte, quente, brilhante e pulsante. Ela
se agarrou a ele quando as primeiras ondulações orgásticas a tornaram
prisioneira e a seguraram em um aperto firme, obrigando-a a abafar um grito
contra o fino casaco de veludo de Nicholas.
Em contrapartida, as mãos dele se apertaram quase dolorosamente em seus
quadris, movendo-a para cima com uma onda turbulenta, e ela pôde sentir seu
corpo estremecer. Uma vez, duas vezes, e uma terceira mais forte quando ele
ejaculou e ficaram suspensos, fundidos em mútuo e avassalador êxtase.
Meio insensível, Caroline se viu mole contra ele, apenas parcialmente
consciente de sua boca contra seu cabelo e do suave aperto de seus braços. Eles
continuaram assim, ainda unidos, conforme a respiração gradualmente
desacelerava. Uma risada baixa acabou saindo do peito dele e soou contra o
ouvido dela.
— Acho que eu gostaria de não fazer mais nada além de andar de carruagem
pelo resto da minha vida.
— Sinta-se livre para me convidar a me juntar a você — as palavras soaram
como um murmúrio baixo, seu corpo tão relaxado contra ele que ela se sentia
desossada.
— Não me tente. Como deve ter notado, o autocontrole não é meu atributo
mais forte quando se trata de você. Sugestões como esta apenas me incentivarão.
Havia um nervosismo em seu tom suave, e ele se movimentou, apenas um
ligeiro remexer, mas ela o sentiu de forma aguda.
Até aquele momento, ela tinha o pressentimento de que a ideia de Derek de
abalar as estruturas de Nicholas com ciúme parecia estar funcionando, mas e se
fosse apenas luxúria? Um momento atrás parecia que sim, mas a maneira como
ele a segurava, embalada contra ele, sugeria o contrário.
— Você conhece as minhas razões para querer manter a sugestão de um
romance passageiro em segredo — disse ela, ouvindo o forte pulsar de seu
coração através das camadas de roupa.
— Sim.
— Mas você não concorda.
— Compreendo. Ainda que não fique feliz com isso. Obviamente.
— Ou você não teria inventado de se esconder na minha carruagem. — O
fato de ele ter tomado tal atitude a fazia sorrir, embora fosse algo irresponsável e
imprudente.
— Não é minha maneira habitual de me aproximar de uma dama, eu admito.
Ouvi-lo dizer “habitual” foi como uma lufada de fria realidade. Lembrava-a
de quem ele era, e ela desejou ter força suficiente em seu corpo para sair de seu
colo. Ainda estava de pernas abertas sobre Nicholas, com o sexo dele dentro
dela, a protuberância de suas saias ao redor de ambos. Podia sentir o tecido das
calças contra a parte interna das suas coxas.
— Eu sou muito grata a você, mas... tenho medo.
Na escuridão silenciosa, suas feições esculpidas pareciam um pouco
misteriosas e sua expressão poderia significar qualquer coisa.
— De escândalo. Porque eu sou o Rothay.
Por que mentir?
— Sim.
— Eu também tenho muito medo de você, minha fria Lady Wynn.
Caroline ergueu as sobrancelhas uma fração, a esperança queimando, as
palmas das mãos de repente úmidas contra o casaco dele.
— Como assim?
Houve uma hesitação palpável.
— Bem, este meu impulso de me esconder em carruagens sem ser convidado
é um indício, para começar. — Seus dentes brilhavam brancos em um sorriso
lento e indolente. — Minha grande reputação seria comprometida se alguém
descobrisse. Então, você vê, seu segredo está muito seguro comigo.
E ela percebeu naquele momento que ele descartava qualquer tom sério na
conversa.
Ele era muito, muito, bom nisso também.
Caroline sufocou sua decepção, lembrando-se, com uma praticidade firme,
de que ele era o homem mais improvável do mundo a cair de joelhos e fazer
declarações poéticas de amor com facilidade. Ela dera a ele o que ele queria e
fora mais do que suficiente. Sua luxúria incipiente fora aplacada, Nicholas
estava contente, e ela era uma distração que poderia ser esquecida. Seu ciúme
deveria ser algo passageiro, como uma criança que vê alguém brincando com
seu brinquedo favorito.
Caroline murmurou:
— Acredito que devo agradecer a você pelo presente inusitado. Meu
mordomo não está tão encantado em ter um cachorrinho, mas devo admitir que
acho isso muito divertido.
— Por nada. Parecia uma criatura bastante simpática e você mencionou que
queria um.
— Foi muito atencioso. — Ela tocou sua bochecha, apenas um leve encostar
de dedos. — Ou um suborno calculado, para me manter em suas boas graças,
talvez. — O canto da boca de Nicholas se contorceu em diversão.
Com a mesma facilidade atlética que ele usou para colocá-la lá, Nicholas a
ergueu de seu colo. Galantemente, ofereceu-lhe o lenço para que enxugasse as
coxas, ajeitou as calças e bateu três vezes no teto da carruagem. Em tom neutro,
disse:
— Pedi ao seu motorista que me deixasse a vários quarteirões da sua casa.
Vou encontrar um transporte para me levar de volta ao baile. Ninguém jamais
saberá que estivemos juntos.
Exceto que ela saberia, Caroline pensou em desespero pragmático.
E seria melhor enfrentar a realidade de que Lorde Manderville poderia estar
terrivelmente errado. Quando Nicholas chegara mais cedo, ele conduzia uma
linda mulher mais velha em seu braço; a semelhança era tão forte que ela soube,
antes mesmo de serem anunciados, que eram mãe e filho. A chegada da duquesa
viúva abalou a coragem de Caroline de prosseguir com o plano de Derek.
Melinda Cassat sempre fora uma fonte de fofoca e não fora preciso muito
estímulo para que sua amiga revelasse os detalhes da linhagem da família
Manning. Com Nicholas como filho único, o próximo da linha de sucessão era
um primo distante que residia nas colônias. Era importante para sua família que
ele tivesse um herdeiro e, de acordo com Melinda, quanto mais próximo ele
chegasse dos trinta anos, mais as esperançosas mães e jovens debutantes se
tornariam implacáveis, e ele poderia fazer um casamento dinástico.
Uma viúva estéril provavelmente não era nada do que a elegante duquesa
tinha em mente para seu lindo e extremamente qualificado filho.
Caroline terminou de ajustar a roupa e assentiu, incapaz de falar.
Isso se ela pudesse levá-lo a considerar o casamento em primeiro lugar. A
aposta tinha valores altos e grandes consequências. Mas quando ele a beijou
como uma despedida antes de sair da carruagem, Caroline decidiu que, uma vez
que seu arranjo com o Duque Diabólico se saíra tão bem, o resto também
merecia uma tentativa.
O nome no cartão a fez sentir uma surpresa muito real. Annabel franziu a
testa, sem saber como interpretar a inesperada visita de uma mulher que
mal conhecia, mas assentiu, pois não conseguia pensar em nenhuma razão na
terra para não receber Lady Wynn.
Por outro lado, não conseguia pensar em uma única razão para a jovem viúva
visitá-la. Ela disse ao criado que trouxe o cartão:
— Por favor, leve-a para a sala de visitas. Já estou indo para lá.
Thomas saíra em alguma missão e Margaret fora à modista, então coube a
ela ser a anfitriã. Ela deixou de lado o livro que lia e levantou-se, esperando que
sua saia de musselina não estivesse muito amassada porque ficara sentada por
horas, imersa em um romance no qual os problemas de outra pessoa a fizeram
esquecer os seus próprios.
Alguns instantes depois, ela entrou na sala formal, vendo sua hóspede
sentada em uma das cadeiras cobertas de seda verde-clara, que contrastavam
com o colorido de seu vestido vibrante. Linda de uma forma extremamente
delicada, usando em um vestido de dia creme, bordado com minúsculas flores
azuis, seu cabelo brilhante preso em um coque simples e pesado, Lady Wynn a
observava com aqueles olhos cinzentos de cílios longos, que eram sua verdadeira
assinatura.
— Boa tarde, senhorita Reid.
— Boa tarde, minha senhora.
— Obrigada por me receber.
— Claro. Muito agradável de sua parte passar por aqui.
Se Annabel pudesse se lembrar, elas tinham sido apresentadas uma vez, mas
em muitas outras seus caminhos se cruzaram em eventos sociais. No entanto,
mal tinham se cumprimentado formalmente, e Annabel ficou perplexa com o
propósito da visita de Lady Wynn.
— Eu não estava de passagem. Vim lhe ver com um propósito específico.
Espero que não o considere questionável.
Aquilo estava se tornando mais intrigante a cada momento. Annabel sentou-
se em frente à sua convidada inesperada, alisando conscientemente a saia
amarrotada. Caroline Wynn era apenas alguns anos mais velha, mas, mesmo
assim, exalava uma espécie de compostura suave e desinteressada que fez
Annabel se sentir uma colegial. Ela não pôde deixar de perguntar:
— É questionável?
— Eu apreciaria se o que estamos prestes a discutir permanecesse entre nós.
Aquela era uma declaração interessante.
— Se deseja compartilhar algo em segredo, vou honrar o seu pedido —
Annabel falou lentamente, sem tentar esconder sua surpresa. — Embora, admito,
esteja intrigada. Não somos estranhas, mas quase isso.
O que só poderia ser descrito como um sorriso melancólico curvou a boca de
sua visitante.
— Ninguém tem amigos suficiente, e às vezes acho que tenho poucos. Quem
pode dizer, talvez nos surpreendamos. Acho que temos muito em comum, afinal
de contas.
— Nós temos? Como assim?
— Bem, por um lado, não somos distantes em idade. Além disso, ambas
estamos virtualmente sozinhas no mundo de algumas maneiras. Você, devido à
morte de seus pais, e eu, porque meu pai ignora minha existência. Não vamos
esquecer que eu me casei com um homem a quem não amava, e você, até onde
sei, está prestes a fazer a mesma coisa.
Colocado daquela forma soava horrível. Annabel reagiu a tal observação
contundente com um enrijecer de coluna e um franzir de boca.
— Como pode saber o que sinto por Lorde Hyatt?
Caroline Wynn parecia não se incomodar com a acidez em seu tom.
— Eu não sei. Foi por isso que vim falar com você.
Dizer que Annabel estava confusa era um eufemismo.
— Peço desculpas, minha senhora, mas não consigo entender por que se
preocuparia.
Uma sobrancelha ruiva se arqueou.
— Eu vivi um casamento terrível. Não desejaria o mesmo a ninguém.
— Nada sobre Alfred é terrível.
Exceto aquele beijo sem paixão, é claro, uma voz insidiosa sussurrou.
— Concordo. Ele é um homem correto, até onde eu sei. — Lady Wynn deu
um pequeno suspiro, pouco mais que um respirar superficial. — Mas você o
ama?
Ninguém lhe perguntara isso. Ninguém. Nem seu tutor, nem Margaret, nem o
próprio Alfred. Isso a afetou, e Annabel já se sentia bastante abalada quando
pensava em suas núpcias, graças a Derek. Em sua vida, não conseguia pensar em
como responder à pergunta que nunca esperava que fosse feita a ela.
Belos olhos prateados brilhavam com o que parecia ser compreensão
enquanto o silêncio se prolongava. Finalmente, Lady Wynn murmurou:
— Entendo.
Annabel engoliu em seco.
— Ele é gentil.
— Parece ser mesmo.
Ela odiava perceber que a concordância fora feita com um toque de simpatia.
— E generoso.
— Tenho certeza que sim.
— E adequado.
Oh, diabos, ela estava realmente usando aquela palavra horrível,
arremessando-a na conversa como se fosse algo admirável?
— Ele é. — Caroline Wynn sorriu sem emoção.
Por que aquilo estava acontecendo? Por que uma mulher que ela nem
conhecia de repente surgia, respondendo às suas maiores dúvidas? Era o pior
momento possível.
Ou talvez o mais fortuito, considerando seu dilema persistente.
Não havia como ela continuar sentada por mais tempo. Annabel se levantou
e atravessou a sala. Apoiou o braço no piano e respirou longa e calmamente.
— Por favor, me diga por que você acha que isso é da sua conta?
Lady Wynn hesitou e depois endireitou os ombros.
— Senhor Manderville me pediu para falar com você em seu nome.
Derek.
Maldito fosse ele.
Annabel virou-se em um movimento lento, como se fosse uma marionete de
madeira, e olhou para a convidada. Claro. Lady Wynn podia parecer requintada
com todo aquele cabelo castanho-avermelhado cintilante e sua voluptuosa figura
esbelta, mas curvilínea, mas devia ser uma tentação para um homem lascivo
como o conde de Manderville. Ela cuspiu:
— Ele enviou você aqui para implorar clemência em seu nome?
— Eu implorei?
Bem, Lady Wynn tinha razão, ela não implorara, mas, ainda assim, Annabel
se sentia indignada. E com ciúme. Um ciúme que, de uma forma, envolvia sua
alma, sua mente e definitivamente a boca do estômago. Neste havia uma
pequena bola preta, pesada como chumbo. Ela se empertigou.
— Eu nunca ouvi nenhuma fofoca ligada ao seu nome, Madame, mas só
posso presumir que tipo de amigo Derek Drake pode ser para a senhora. É
atraente e feminina, e isso diz tudo.
Composta e ainda olhando para ela daquele enervante jeito empático, Lady
Wynn sacudiu a cabeça.
— Ele nunca tocou mais do que em minha mão. Mais do que isso, nem
tentou.
A situação estava ficando mais desconcertante a cada momento.
— Então, como poderia ser amiga dele?
Um ligeiro rubor tomou a face perfeita da mulher do outro lado da sala.
— É uma história bastante complicada, mas a versão curta é que eu acho que
ele é realmente um homem muito decente e, sem sombra de dúvida, mais do que
um pouco apaixonado por você. Daí minha presença aqui. Sim, ele desejou que
eu falasse com você, porque, segundo ele mesmo, seu charme habitual não tem
efeito sobre a senhorita.
— A senhora está errada. Ele é um cafajeste terrível com a moral de um gato
vira-lata.
Mas o protesto não foi dito com convicção suficiente. Annabel ainda podia
vê-lo, ali em seu quarto e ouvir aquela declaração pungente. Eu te amo…
Ela queria acreditar, e era o céu e o inferno sentir aquele lampejo de
esperança de que pudesse ser verdade. De qualquer maneira, suas dúvidas sobre
se casar com Alfred agora eram muito reais, mesmo sem as observações de sua
convidada inesperada.
— Eu entendo que a reputação do conde lhe faz hesitar. Isso me diz que você
não está apenas interessada em sua aparência, título e riqueza. Ele não é perfeito,
mas às vezes esses são os libertinos pelos quais nos apaixonamos.
Annabel perguntou em uma voz que não era muito firme:
— Você fala por experiência, Lady Wynn?
A JOVEM DE PÉ A POUCOS PASSOS DE DISTÂNCIA TINHA UM OLHAR QUASE
acusador em seu rostinho bonito, seus olhos azuis escuros e arregalados, suas
pequenas mãos cerradas em punhos ao lado do corpo.
Foi preciso muita coragem para atravessar a porta do sobrado dos Drake, e
seria ainda mais difícil admitir seu atual estado de paixão por Nicholas Manning.
No entanto, Caroline prometera a Derek ajudá-lo e, pela expressão no rosto de
Annabel Reid, o conde estava completamente certo sobre os sentimentos dela
por ele. A postura de seu corpo indicava certa vulnerabilidade, além de uma
angústia pungente, algo que ela transformara em raiva defensiva apenas com a
menção do nome de Lorde Manderville.
Ele estava certo. Miss Reid não era de todo indiferente. A julgar pelo rubor
em suas faces, ela era exatamente o oposto.
— Falo sim. — Caroline fingiu uma indiferença que não sentia. — Mas não
vim aqui para falar sobre a minha loucura, mas sobre a sua. Diga-me, acha que
pode se casar com Lorde Hyatt e não se arrepender da decisão?
— Se eu não achasse que ele era uma escolha sensata, não teria aceitado sua
proposta.
— Perdoe-me, mas a palavra sensata não tem qualquer semelhança com um
ideal romântico.
Lábios fartos se comprimiram em uma linha dura.
— Eu tive um ideal romântico uma vez, Lady Wynn, e descobri que era
baseado em uma fábula, um mito que criei em minha própria mente tola. Já que
é óbvio que Derek falou com você sobre mim, já deve saber que me apaixonei
por ele no passado. Sua aparência e charme viraram minha cabeça, e eu ainda
não tinha sido apresentada à sociedade, então, estava particularmente suscetível.
Sonhava que um dia ele poderia retribuir meus sentimentos. Sabia de sua
reputação, mas de alguma forma isso não importava. Como uma tola, fantasiei
que, por mim, ele mudaria.
Caroline não pôde deixar de murmurar:
— Acredito que entendo perfeitamente.
Annabel balançou a cabeça, e alguma memória distante fez seus olhos
brilharem. Ela os piscou rapidamente algumas vezes.
— Eu estava muito errada.
— Ele me contou sua versão da história e devo admitir que acredito que seu
pesar, tanto por prejudicar você quanto por perder sua consideração, é sincero.
Lorde Manderville não poupara a si mesmo no breve recital, citando seu
próprio comportamento como insensível e egoísta. Caroline só podia adivinhar o
que custara ao seu orgulho masculino ser tão franco sobre seus sentimentos para
uma quase estranha, mas ela sentira que ele fora sincero, porque se encontrava
realmente desesperado por sua ajuda. O incidente na carruagem com Nicholas
parecia provar que o conde estava fazendo sua parte, então, Caroline queria
retribuir o favor. Mesmo se não tivesse prometido nada, o olhar sombrio no rosto
de Annabel Reid teria mudado suas ideias. Sabia muito bem como Annabel se
sentia.
A jovem de pé junto ao piano polido alisou a saia com a mão trêmula, num
gesto inconsciente, mantendo o olhar muito direto.
— Sim, ele me machucou, e, sim, ele perdeu o meu respeito.
— E você acredita que Lorde Hyatt pode consertar seu coração partido?
A pergunta pairou no silêncio da sala.
O silêncio foi a resposta.
Com dignidade, Annabel finalmente disse:
— Acredito que ele me tratará bem, teremos filhos e nos daremos bem
juntos. Ele não está apaixonado por mim, tanto quanto eu posso dizer, e, na
verdade, é um alívio. Isso significa que queremos exatamente a mesma coisa do
nosso casamento. Companheirismo e uma família.
— E paixão? E se não houver crianças? Eu posso dizer com conhecimento
de causa que não há garantias. Então serão apenas vocês dois... para sempre.
— Seremos amigos — a resposta foi rápida, mas algo reluziu nos olhos da
outra mulher.
Dúvida? Podia ser.
— O que é agradável, eu concordo, mas dificilmente o suficiente. — Ela não
estava nada acostumada a discutir seus sentimentos, muito menos algo tão
particular quanto o que compartilhara com Nicholas, no entanto, Caroline se
preparou para ser franca. Afinal, chegara sem ser convidada e começara discutir
algo muito pessoal. — Embora eu nunca tenha contado a ninguém a verdade
sobre meu próprio casamento, estou disposta a fazê-lo com você. Sei que eu
estava lamentavelmente desinformada sobre o que esperar, e os resultados foram
desastrosos. Nossas circunstâncias não são idênticas, mas há semelhança
suficiente para que eu sinta que posso ajudá-la, independentemente da decisão
que você tome a respeito de Lorde Manderville. No entanto, se a sua mente
estiver decidida, vou me despedir.
Por um momento, Annabel pareceu ter um debate interior, mas então virou-
se e se sentou de novo em frente a Caroline em um sofá de brocado.
— Eu não tenho certeza — ela confessou em uma voz que continha uma leve
oscilação — exatamente de qual pode ser motivo pelo qual quero ouvir o que
você tem a dizer, mas eu quero.
Talvez fosse por covardia, mas Caroline meio que esperara ser rejeitada para
não precisar falar sobre algo que fizera o possível para esquecer. Assentiu e
desviou o olhar, tomando um momento para recuperar a compostura.
Pigarreando, olhou para trás e sorriu em um reconhecimento irônico.
— Isso pode ser embaraçoso para nós duas, mas farei o meu melhor. Deixe-
me começar com a simples afirmação de que a intimidade entre um homem e
uma mulher pode ser muitas coisas. O homem errado pode proporcionar uma
experiência chocante e terrível, e o homem certo pode oferecer mais prazer do
que você jamais poderia imaginar. Espero que não me julgue com muita
severidade quando eu lhe disser que vivi os dois, já que é de conhecimento
comum que fui casada apenas uma vez.
Annabel a olhou com aqueles lindos olhos azuis escuros.
— Se seu marido era o homem errado, eu dificilmente a culparia por
procurar consolo em outro lugar, minha senhora.
— Meu marido, francamente, era um homem terrível, e uma mulher se torna
completamente vulnerável quando se submete às necessidades sexuais de um
homem. Sim, sabemos que eles tendem a ser maiores do que nós e são
construídos de maneira diferente, mas, como moças protegidas, não temos
consciência de quão mais fortes eles são. Nós também não estamos cientes, ao
menos eu não estava, da mecânica real do ato em si. Se você for como eu era, já
deve ter se perguntado, mas este grande mistério é mantido em segredo de nós
porque é indelicado discutir.
Um rubor suave surgira nas bochechas lisas de Annabel.
— Nem Margaret conversa muito sobre isso comigo. Ela promete explicar
antes do casamento.
Embora fosse apenas alguns anos mais velha, Caroline se sentia muito mais
sofisticada, embora o custo de sua educação tivesse sido muito caro.
— Faça-a falar ou sinta-se à vontade para me perguntar. Um pouco de
conhecimento pode ajudar bastante quando se trata de algo tão… pessoal. Meu
ponto agora não é explicar o processo em detalhes anatômicos, mas ilustrar a
confiança emocional envolvida. É um enorme salto de fé. Você pode se imaginar
deitando-se nua ao lado do Senhor Hyatt para o resto da vida? Pode imaginá-lo
tocando-a em todos os lugares, até mesmo nos mais íntimos? Quer que ele a
segure em seus braços, provar seu beijo, ou suas imaginações são sempre a
respeito dele comendo torradas na mesa do café da manhã?
— Já considerei o meus deveres de esposa, é claro. — Annabel parecia mais
corada a cada momento que passava.
— Dever? — A habilidosa experiência do toque de Nicholas veio à mente,
além do poder que ele evocava. O jeito que a fazia estremecer, a sensação de tê-
lo dentro dela, o prazer impetuoso de sua boca contra sua pele. Caroline ergueu
as sobrancelhas. — Não pode pensar nisso como uma obrigação ou estará se
enganando.
De alguma forma, Caroline acertou um ponto sensível, pois Annabel disse
defensivamente:
— A maioria dos casamentos na sociedade não é baseada no amor, mas na
praticidade.
— De fato, eles são. E olhe os resultados. Ambos, maridos e esposas, se
perdem, tentando encontrar o que não têm dentro das paredes do quarto. Como
você acha que o senhor Manderville e o duque de Rothay construíram suas
reputações nada respeitáveis? Não foi seduzindo jovens mulheres elegíveis. Isso
é certo, ou eles teriam sido arrastados para o altar há muito tempo. Eles foram
até capazes de criar uma aposta ultrajante e fazer com que a alta-sociedade a
achasse divertida e intrigante.
A mulher à sua frente baixou os olhos para o tapete estampado, com uma
expressão fechada.
— Derek afirma que a aposta foi feita em um momento de embriaguez por
causa do meu noivado.
— Eu tenho a confirmação de que ele está dizendo a verdade.
Quase imediatamente depois de dizer as palavras, ela se arrependeu. Annabel
não era boba e seu olhar se aguçou quando olhou para cima.
— Pelo duque?
Sim, ela definitivamente dissera demais. Esperava que a senhorita Reid fosse
confiável, mas Caroline acabara de se associar aos dois homens. Sufocou a
vontade de franzir o cenho e tentou imitar sua melhor imagem da viúva fria e
inacessível.
— A fonte não importa. Eu acredito nele. A questão é, você acredita? Derek
Drake afirma amar você, e com seu título e fortuna ele dificilmente seria um
homem inelegível, isso sem mencionar que você acabou de me dizer que não
tem sentimentos profundos por Lorde Hyatt.
Annabel fez um gesto impotente com a mão.
— Eu deveria romper meu noivado por causa da remota chance de Derek
estar falando sério? Não esqueçamos minha convicção de que ele nunca seria
fiel, mesmo se estiver sendo sincero. O que um homem como ele sabe sobre o
amor?
— Eu acho — Caroline escolheu suas palavras cuidadosamente,
considerando sua própria inquietação sobre o assunto — que ele definitivamente
sabe o que sente. Levando em consideração seu desapego habitual e sua vasta
experiência, ele certamente saberia reconhecer que tem sentimentos diferentes
por você.
— A vasta experiência é verdadeira — murmurou Annabel, embora seu rosto
já não estivesse exposto em uma expressão militante de raiva e negação, porém,
sustentava um olhar pensativo de quase desespero. — Diga-me, Lady Wynn, se
você estivesse no meu lugar, acreditaria nele? Arriscaria todo o seu futuro e
jogaria fora uma chance de um casamento seguro com um homem correto para
confiar suas esperanças a um libertino conhecido? Recentemente, toda a cidade
de Londres ficou ciente de que o nome dele foi citado junto ao de uma adúltera
em um divórcio extremamente escandaloso. Sua reivindicação de inocência pode
ou não ser verdade.
Nicholas também desprezava sua reputação e mencionara quantos boatos
foram produzidos do nada. Caroline balançou a cabeça.
— A fofoca não é confiável e não há provas de que a alegação seja
verdadeira.
Annabel parecia imóvel, exceto pelo tremor de sua boca.
— Tudo bem, eu admito isso, mas mesmo que ele esteja sendo sincero sobre
seus sentimentos por mim, quem pode dizer se vai durar?
O argumento era válido, Caroline não podia negar.
Annabel continuou, quase como se estivesse falando sozinha.
— Ele se sente culpado. Admitiu isso. Então agora inventou uma maneira de
consertar e se desculpar pelo que aconteceu antes. Bem, não tenho certeza se
estou disposta a perdoar ou esquecer, e sua capacidade de amar de forma
duradoura ainda é uma dúvida muito real em minha mente.
Pelo menos havia um vislumbre de especulação na voz encantadora da
senhorita Reid.
— Eu sei.
Caroline entendia muito bem. Ela tinha plena consciência das implicações de
estar apaixonada por alguém com uma reputação como a de Manderville. O
duque de Rothay não tinha sequer declarado sentimentos mais profundos por ela,
então, estava um passo atrás.
Por um momento, elas apenas olharam uma para a outra no que parecia uma
promessa comum de irmandade.
Annabel sorriu, uma oferta hesitante.
— Embora eu não tenha certeza sobre como me sinto a respeito de sua visita,
Lady Wynn, gostaria de um copo de xerez?
— Eu adoraria. E, por favor, chame-me de Caroline.

Q UERIDA A NNIE :
Será que tenho o direito de lhe pedir que me perdoe pelas minhas ações em
Manderville Hall há alguns meses? Ponderei a questão longamente e não posso
sequer responder a mim mesmo. Tudo o que sei é que gostaria de poder apagar
a memória de suas expressões quando saiu da estufa naquela noite. Se eu
pudesse erradicar o ato, tenha certeza de que o faria. Eu assumo total
responsabilidade. Afinal de contas, sou mais velho, mas aparentemente nenhuma
sabedoria veio com esses anos a mais.
Ainda mais convincente é a lembrança do nosso beijo. Talvez eu deva pedir
desculpas por isso, mas, com toda honestidade, não posso. Não sinto pelo que
aconteceu, só peço perdão por minha conduta não cavalheiresca depois. Por
favor, aceite meu mais profundo pesar.
Não posso te dizer como anseio por vê-la sorrir para mim mais uma vez.
Sinceramente,
Derek Drake, o sexto conde de Manderville
Data deste dia, 21 de novembro de 1811
Annabel deixou o pedaço de pergaminho escorregar por entre os dedos e as
mãos trêmulas. Observou a carta cair no chão e se acomodar enquanto engolia o
nó em sua garganta.
O que poderia ter acontecido se ela tivesse lido isso quando lhe fora
entregue? O ponto era discutível, porque ainda estava chocada e desiludida, mas
certamente fora significativo que não a tivesse jogado fora. Poderia parte de tudo
ser culpa dela? Afinal, Derek não pedira para se tornar seu cavaleiro mítico, o
galante príncipe de seus sonhos, o belo herói de suas fantasias de menina. Ele era
apenas um homem e, portanto, falível.
Ele não é perfeito, mas às vezes esses são os libertinos pelos quais nos
apaixonamos...
Annabel construíra uma imagem dele que não era real, e quando esta não se
confirmou, seu mundo foi destruído. Ele não se eximira de culpa, ela se lembrou,
pensando na condessa em seus braços, mas, novamente, talvez não fosse
inteiramente culpa dele também.
A diferença era que ele havia se desculpado.
Ela não.
A sala de reuniões abafada não era a escolha ideal. Derek sentiu-se inquieto
e se remexeu na cadeira. A sessão parecia interminável, e ele começava a
sentir dor de cabeça. Só quando os bocejos na câmara assumiram proporções
epidêmicas, Lorde Norton pareceu perceber há quanto tempo vinha falando e
finalmente se calou, sem nunca ter chegado a um argumento válido.
Se o entusiasmo com que os colegas saíram da Câmara dos Lordes fosse uma
indicação, Derek não fora o único entediado até às lágrimas. Foi um alívio sair
sob o sol da tarde.
Recebera um pequeno bilhete de Lady Wynn a respeito de sua conversa com
Annabel há alguns dias, expressando sua esperança de que tudo tivesse corrido
bem e alertando que fizera o melhor possível. Como um jovem inexperiente,
Derek ficara andando em círculos, em torno de seu escritório naquela tarde, e,
depois, sentou-se impaciente para assistir a uma ópera muito terrível na qual não
tinha interesse. A única parte redentora da noite fora que a mulher que amava
não aparecera de braços dados com seu noivo. Pelo menos não fora forçado a
evitar encará-los. Uma pequena bênção em uma situação que parecia totalmente
contra ele.
Então agora restava a Derek duas escolhas. Ele poderia vestir sua fantasia
ridícula e visitar Caroline na madrugada para pedir detalhes sobre a conversa, ou
poderia entrar no quarto de Annabel novamente e perguntar a ela.
Nenhuma das duas parecia muito boa. Ambas as ideias foram precipitadas
nas primeiras ocasiões.
Derek nunca fora impulsivo. Isto é, a menos que estivesse beijando jovens
inocentes em bibliotecas ou invadindo seus quartos para declarações de amor
indesejadas e não correspondidas.
Bem, talvez ele fosse impulsivo de vez em quando.
Droga.
Estava claro que teria que presumir que tudo correra bem. Mas por que
deveria pensar que sim? Não havia razão para isso. Annabel o dispensara de
forma completamente fria.
Bem, não exatamente. Não friamente. Ela o dispensara com uma lágrima
indesejada deslizando por sua bochecha, e sua voz não continha o tom usual.
Isso lhe dava uma esperança que talvez fosse falsa, mas ele não queria desistir.
Se falhasse, se o que Caroline dissera a Annabel não causasse nenhuma
impressão, seria porque ele arruinara as coisas a um ponto sem volta, mas ainda
pretendia ajudar Nicholas.
Não podia andar sobre o fogo sem esperar se queimar um pouco.
A Rothay House era uma impressionante mansão em Mayfair, na Grosvenor
Square, com todas as galerias necessárias, portas palacianas e uma fachada de
pedra digna de uma residência real. Instruíra seu cocheiro a esperar e subiu as
escadas, esperançoso de que Nicholas tivesse estado tão ansioso para chegar em
casa depois da palestra quanto ele próprio. O duque estava lá dentro, ele foi
informado pelo mordomo rigidamente formal, e ele foi instruído a esperar no
escritório, como de costume...
Sim, Derek fez isso. Servira-se de uma bebida também, antes de se acomodar
na cadeira de sempre junto à lareira. A sala cheirava familiar, a uísque e livros
antigos.
— Não que não seja sempre agradável ver você, mas não passamos uma
tarde excruciante juntos? — Nicholas entrou e fechou a porta atrás de si. — Se
veio aqui para reclamar do argumento de Lorde Norton, vou ter que confessar
que parei de prestar atenção na metade do seu discurso.
Derek riu e balançou a cabeça.
— Não, não vim por isso. Não me pergunte também. Quando o primeiro-
ministro se afastou e começou a roncar, vamos ser francos, ele perdeu o público.
— É verdade. — Nicholas se acomodou atrás da escrivaninha, com as longas
pernas estendidas casualmente, seu rosto ilegível. — Então eu acho que a
política não desempenha um papel nesta visita.
— Não. Caroline e eu vamos sair na segunda-feira. Consegui um quarto em
uma pousada isolada perto de Aylesbury. Não muito longe, mas não muito perto,
perfeito para um encontro discreto. Tudo foi acertado.
Havia motivos para que o duque de Rothay fosse considerado uma lenda. Ele
permaneceu relaxado em sua cadeira, mas seus olhos escuros exibiram um certo
brilho que Derek podia reconhecer. Uma pequena pausa quase infinitesimal foi
feita.
— Então que vença o melhor.
— Essa é nossa intenção desde o princípio, não é?
Derek ouviu o choque de uma espada imaginária, o som de metal contra
metal quase audível no silêncio da sala venerável.
— Exatamente a nossa intenção. — Nicholas parecia tão frio como sempre.
— Você não tem objeção?
— Por que teria, já que não possuo nenhum compromisso com a dama?
Por que, de fato? Era a pergunta mais correta. Derek não se deixaria enganar.
Ou, pelo menos, esperava que não.
— Você parecia um pouco envolvido após o seu retorno.
Foi uma declaração neutra. Nicholas lançou um olhar para a janela.
— Como você sabe, o termo envolvimento é ambíguo. Eu me senti um pouco
envolvido. Passou.
Seria verdade? Não, não era. Se assim fosse, seu amigo não se mostraria tão
cuidadosamente indiferente. A perfídia de Helena deixara algumas cicatrizes
permanentes. Derek entendia, mas lembrou-se do olhar no rosto de Caroline
quando ele perguntou se seus sentimentos estavam comprometidos. Também se
recordou da instrução lacônica de Nick naquela tarde no White's.
Tenha cuidado com ela...
— Quando isso acabar, pelo menos não teremos mais que lidar com essa
ridícula aposta — disse Derek em uma voz introspectiva. — Para começar, foi
uma ideia estúpida, mas a atenção que recebemos deixou a sociedade bastante
desconfortável.
— Creio que sim.
— Depois desta próxima semana, tudo estará resolvido.
— Você vai achá-la encantadora. — Nicholas mudou de posição novamente,
como se não conseguisse se sentir confortável.
Idiota teimoso.
— Eu imagino que sim. — Derek tomou um gole causal de seu copo.
Nicholas abriu a boca para dizer algo mais, mas fechou-a e permaneceu em
silêncio. Tamborilou os dedos na mesa em um gesto inquieto, e depois parou
também, como se percebesse que o movimento traía seus sentimentos.
Uma objeção? Um pedido para cancelar tudo? Derek podia compreender a
guerra interior que Nicholas travava consigo mesmo. Era uma equação simples.
Se Nick cancelasse a aposta, seria uma declaração de seus sentimentos mais
profundos por Caroline Wynn.
Satisfeito que tudo tivesse corrido de acordo com o plano, Derek ficou de pé.
— Só pensei em aparecer e avisar que fizemos nossos preparativos. Vocês
dois voltaram há quase duas semanas, certo?
— Onze dias. — Nicholas percebeu a precisão de sua resposta. — Mais ou
menos — emendou.
Derek mal conseguiu reprimir uma risada. Não que gostasse da tortura que
seu amigo estava infligindo a si mesmo, mas sentia empatia por saber que
Nicholas nunca ficaria em paz até que chegasse à conclusão sozinho.
— Então, suponho que veremos o que a moça terá a dizer quando tudo isso
acabar.
A intenção era mergulhar a adaga mais profundamente.
— Suponho que sim.
— É melhor tomar cuidado, Nick, ela vai se esquecer de você na primeira
noite.
Seu amigo nem sequer piscou. Mas também não lançou suas rápidas réplicas
habituais. Derek saiu, refletindo que pelo menos as sementes tinham sido
plantadas. A questão era: dariam frutos?

A SALA ESTAVA CHEIA DE TECIDOS , CRIADOS FALANTES E CHEIRAVA DE FORMA


irresistível como o perfume de jasmim da modista. Uma garota de cabelos
escuros se ajoelhou a seus pés, ajustando a bainha de seu vestido.
Annabel permaneceu rígida, as costas retas, as mãos entrelaçadas, a tristeza
pesando como um nó na garganta.
— Está glorioso, Madame DuShane. — Margaret lançou à mulher um sorriso
de aprovação.
— Você vai parecer um anjo, Annabel.
Ela precisava usar a palavra anjo? Evocava imagens de um homem de
cabelos dourados escuros que fora batizado com esse apelido, embora o motivo
dificilmente fossem seus passatempos angelicais. Um homem com olhos tão
azuis que olhar para eles era como admirar um mar cristalino, e um sorriso tão
hipnotizante que nenhuma dama dentro de seu alcance seria imune ao seu poder.
Como poderia continuar provando seu vestido de noiva enquanto pensasse
em Derek Drake?
Mas que escolha ela tinha? Annabel finalmente se forçou a virar e olhar no
espelho comprido. Sim, era uma criação adorável, a saia azul-gelo de cetim, uma
sobreposição de renda dando um efeito etéreo. Era justo perto da cintura e depois
se transformava em um corpete modesto, mostrando apenas uma sugestão da
curva superior de seus seios. Pequenas pérolas foram bordadas ao longo das
mangas e do decote, o brilho refletido na luz.
O vestido era deslumbrante.
Ela, no entanto, parecia horrível em comparação. Estava pálida como um
fantasma, com indício de olheiras sob seus olhos por falta de sono e sua boca
tremia enquanto lutava contra um desejo insuportável de explodir em lágrimas.
Por que ela lera aquela carta?
Margaret surgiu atrás dela, refletida no vidro.
— Annabel?
— Eu não posso fazer isso.
As palavras saíram como um sussurro frágil. A boca de Margaret se abriu, e
um lampejo de alarme cruzou seu rosto.
— Minha filha querida, eu...
— Eu não posso me casar com Alfred. — Annabel virou-se. — Me
desculpe... eu sinto muito...
Madame DuShane era uma mulher de aparência desgrenhada com um queixo
afiado e pequenos olhos negros. Suas mãos se agitaram em um gesto dramático.
— É natural ficar nervosa, não? Todas as noivas se sentem assim. Vai passar.
Você está uma visão neste vestido. Ele vai cair de joelhos, tomado de amor.
A lógica equivocada de que uma peça de roupa poderia inspirar uma emoção
que ela tinha certeza de que Alfred não sentia por ela deu a Annabel o desejo
macabro de rir, mas ela não o fez. Em vez disso, suas mãos se fecharam nas
laterais do corpo, e ela sacudiu a cabeça.
— Não é nervosismo, Madame. O vestido é muito bonito, mas duvido que vá
precisar dele.
Margaret, percebendo que elas estavam em um local público, disse
rapidamente:
— Querida, por que não pedimos que uma das garotas te ajude a se trocar?
Podemos discutir isso em casa e depois voltarmos para uma última adaptação em
algum outro momento.
Com rápida eficiência, Annabel se despiu, substituindo o vestido de noiva
por um amarelo − que escolhera porque esperava que a cor alegre aliviasse seus
ânimos −, e seguiu Margaret para fora da loja até a carruagem que as aguardava.
Elas haviam planejado fazer várias outras paradas, mas Margaret deu ao
cocheiro instruções para levá-las de volta para casa.
Annabel preparou-se para um sermão bem merecido, dada a maneira discreta
e elegante de Margaret. Mas, em vez disso, a mulher que a criou como se ela
fosse uma filha simplesmente ergueu as sobrancelhas assim que a carruagem se
pôs em movimento.
— Madame DuShane é uma costureira maravilhosa, mas também uma
fofoqueira terrível. Eu acho que assim que chegarmos em casa você precisa falar
com Thomas imediatamente, então Lorde Hyatt pode ser informado antes de
ouvir de outra pessoa. Ele é um bom homem e está prestes a ser abandonado.
Quanto menos humilhante você tornar isso para ele, melhor.
Margaret estava certa, claro. Deus, por que isso tinha que ser tão
complicado? Por que ela não podia simplesmente amar a ele, ao invés de outra
pessoa?
— A senhora não está surpresa?
— Querida Annabel, tenho olhos. Não lhe perguntei depois do último ajuste
se você ainda desejava continuar com o casamento?
— Sim — ela admitiu em um suspiro.
As lágrimas ainda estavam lá, ardendo atrás de suas pálpebras. O que mais
Margaret notara? A bondosa simpatia nos olhos da mulher mais velha a
confundiu ainda mais.
— Além disso, quando o rosto de uma noiva em potencial atinge certo tom
de verde toda vez que experimenta seu vestido de casamento, algo está
definitivamente errado.
— Eu sei.
— Estou muito feliz que você tenha chegado a essa conclusão antes do
casamento e não no dia seguinte.
— Graças a Lady Wynn.
Annabel podia recordar claramente a firme convicção na voz da jovem viúva
enquanto falava da armadilha de um casamento sem amor. Podia ser uma visão
romântica, especialmente na classe alta, onde os casamentos arranjados eram
comuns, mas a moça parecera falar de uma experiência amarga.
— Lady Wynn? Uma mentora estranha. Eu não sabia que vocês eram
amigas.
Se ela não estivesse tão desequilibrada devido à sua indecisão e posterior
decisão de romper seu noivado, Annabel nunca teria deixado escapar, mas ela
disse:
— Nós não éramos particularmente próximas, não até outro dia. Ela é amiga
de Derek.
Elas moveram junto com a carruagem, e a expressão de Margaret refletiu
algum ceticismo.
— Eu normalmente não discutiria esse assunto com você, mas duvido que
seja verdade. Não ouvi nenhuma fofoca a respeito.
— Não sua amante. — Annabel não estava nem um pouco preocupada se o
assunto era ou não apropriado para seus ouvidos. Ela envelhecera uma década
nas últimas semanas. — Ela afirmou francamente que ele nunca se aproximou
dela de uma forma amorosa.
— Graças a Deus — murmurou Margaret. — Que conversa interessante que
deve ter sido. Estou intrigada com suas motivações, ainda que também seja
grata. Tenho andado preocupada com você. Thomas também.
Com as mãos cerradas no colo, Annabel olhou para o chão.
— Vocês são, como sempre, bons demais para mim.
— Bobagem. Em todos os sentidos da palavra, exceto pelo seu nascimento
real, você é nossa filha. — Então Margaret acrescentou em um tom hesitante: —
Somos igualmente afeiçoados a Derek. É sempre complicado julgar até quando
podemos interferir na vida dos outros. Tenho tentado deixar vocês dois
descobrirem isso por si mesmos. Não foi fácil fazê-lo, devo admitir.
Então… eles sabiam. De sua paixão, de seus supostos sentimentos e parecia
lógico supor que também estavam cientes da desilusão que sentia.
Eles sabiam de seu coração despedaçado. Como ela julgava ter sido capaz de
esconder isso?
— Como alguém confia em um homem com a reputação de Derek? —
Annabel perguntou com um horrível tremor em sua voz. — E eu rogo neste
momento para que não me dê um discurso usual sobre libertinos, pois não
poderei dar uma resposta elegante. Este é o mesmo homem que recentemente fez
uma aposta ultrajante baseada em sua… bem…
Ela corou. Mesmo que pudesse ter algumas — bem, uma quantidade
embaraçosa, de fantasias sobre como seria estar em seus braços − era uma coisa
bem diferente falar sobre isso.
Margaret pareceu entender.
— Rapazes, ou, no caso, homens, nem sempre são as criaturas mais
prudentes.
— Um eufemismo — Annabel resmungou.
Sua acompanhante lançou-lhe um olhar aguçado.
— Assim como jovens mulheres precipitadas que concordam em se casar
com alguém por quem não nutrem sentimentos profundos só para provarem um
ponto absurdo?
— Não é a mesma coisa.
— Diga-me a diferença.
Dado seu comportamento na modista, como ela poderia argumentar?
Annabel sussurrou:
— O que eu faço agora?
Margaret se inclinou para frente e deu um tapinha nas mãos, ainda
entrelaçadas no colo de Annabel.
— O amor é uma coisa milagrosa, minha filha querida. Não subestime isso.
U
trás.
ma unha comprida percorreu seu peito nu, fazendo-o abrir os olhos.
Nicholas piscou, começando a se sentar, depois gemeu e se jogou para

— Bom Deus, que horas são?


— Onze, querido.
— Maldição! Tem certeza?
Elaine Fields riu em um som baixo e melódico.
— Sim, com certeza. Diga-me, o quanto você se lembra da noite passada?
Ele olhou para a mulher sentada na beira da cama − na cama, pelo amor de
Deus −, com os olhos apertados. O quarto era de um rosa resplandecente.
Cortinas cor-de-rosa, papel de parede cor-de-rosa e cheirava a rosas, se tal coisa
fosse possível. O dia devia estar ensolarado porque blocos quentes de luz
incidiam sobre o tapete. Sua cabeça doía, e sua boca parecia seca e desagradável.
Depois de um momento, ele admitiu:
— Não muito.
Elaine arqueou uma delicada sobrancelha. Ela era uma ruiva luxuriosa com
curvas opulentas, uma década mais velha do que ele, e, embora tivessem tido um
caso breve e muito casual anos atrás, conseguiram permanecer amigos. Quando
seu marido idoso morreu e a deixou em uma batalha financeira com os credores,
Nicholas usou sua influência para ajudar a livrá-la de táticas mesquinhas e
ambiciosas. Ser o Duque de Rothay tinha suas compensações de vez em quando.
Havia dificuldades também, se você considerasse como Caroline nem sequer
podia ser vista falando com ele.
Elaine murmurou:
— Não estou surpresa. Eu raramente o vi tão bêbado, Nicky. Deveria ter
percebido quando você chegou e me esqueci de lhe oferecer mais aguardente.
Suspeito que vá sentir as consequências durante todo o dia.
Ele tinha a sensação sinistra de que ela estava certa. O que diabos acontecera
na noite anterior? Como acabara com sua ex-amante? Ele fora a uma pequena
reunião, ouvira uma fedelha terrível profanar Bach ao piano, e então... fora
Manderville quem sugerira que jogassem um de seus jogos de azar favoritos?
Poderia ter sido, mas ele simplesmente não conseguia se lembrar.
Já não tinha aprendido a não exagerar na companhia de Derek?
— Eu só posso rezar para que esteja errada — disse ele em cínica
resignação. — Por favor, me diga que eu não fui muito grosseiro.
— De modo algum. Eu nunca tive uma conversa tão interessante na minha
vida.
— Conversa? — Ao dizer isso, ele percebeu duas coisas. A primeira era que
estava sem camisa, mas ainda usava as calças. Alguém atencioso havia tirado
suas botas, graças a Deus, já que ele duvidava que tivesse sido sensato o
suficiente para fazê-lo. A segunda era que ela trouxera chá, e Nicholas nunca se
sentira tão grato por ver uma bandeja e uma chaleira fumegante quanto com
qualquer outra coisa em sua vida.
Elaine percebeu para onde ele estava olhando e moveu-se com um pequeno
sorriso para lhe servir uma xícara.
— Você foi muito filosófico, querido.
Com esforço, ele se ergueu para uma posição meio sentada e aceitou sua
oferta com gratidão. Depois de um gole feliz, ele murmurou:
— Tudo bem, vá em frente, o que eu disse?
Em um vestido de seda cor de bronze com renda branca no corpete e nos
punhos, com apenas um punhado de sardas no nariz, Elaine sentou-se. Recuou
um pouco e olhou-o com uma clara diversão que lhe provocou certa
preocupação.
— Você queria ter uma discussão profunda e significativa sobre um assunto
que nunca pensei que discutiríamos.
Amor.
Ela nem precisava dizê-lo.
— Eu estava bêbado. — Sua desculpa soou como o protesto de uma criança
petulante.
— Sim, de fato, você estava. Deve ter sido por isso me disse o nome dela.
Admito que tive muita dificuldade em acreditar no início.
Com mil diabos, ele quebrara sua palavra para Caroline. Sua cabeça doía
mais do que nunca, embora soubesse que podia confiar que Elaine seria discreta.
Ela continuou com uma risada serena.
— Você não precisa parecer tão alarmado. Não vou dizer nada sobre o seu
envolvimento incomum com Lady Wynn.
Ele era um idiota. Um bêbado idiota que traía confidências. Perceber isso
não melhorou em nada seu humor.
— Obrigado. E suponho que também devo agradecê-la por tolerar minhas
divagações induzidas por bebidas alcoólicas. Desculpe-me.
— Não há necessidade. E foram mesmo? — Elaine deu um tapinha no joelho
dele.
— O quê?
Ele bebeu mais chá, sentindo-se um pouco menos enjoado.
— Apenas as divagações de um homem que exagerou na bebida? Você
parecia chocantemente sincero.
— Sincero de que maneira? — Sua pergunta foi cautelosa. Quem poderia
imaginar o que ele dissera? Como acabara no infernal quarto cor de rosa de
Elaine ainda era um mistério.
— Que você acha que se apaixonou pela bela viúva fria do falecido Lorde
Wynn.
Ele realmente estava bêbado.
— Eu disse isso?
Elaine assentiu com a cabeça, um leve sorriso pairando em sua boca.
— Mais do que isso, você pareceu sincero.
— O álcool é um catalisador para a estupidez.
— Sim, de fato, mas também é um soro da verdade. — Ela sentou-se um
pouco mais para trás e olhou para ele com evidente especulação. — Realmente
vai permitir que ela saia com Manderville por uma semana se você é tão
contrário à ideia? Por que simplesmente não diz a ela a verdade?
A perfídia estava completa. Ele não só revelara a verdade sobre seu tempo
juntos em Essex, mas também sobre a aposta em si e a participação de Caroline
nela. Maldito inferno.
Mesmo que o chá estivesse escaldante, ele tomou uma grande quantidade.
Queimou a garganta inteira até atingir seu estômago instável.
— Se eu pudesse descobrir a verdade, talvez fizesse exatamente isso.
— A verdade? Esse é o seu problema, querido Nicky. Você descobriu.
Antigas amantes convertidas em confidentes e transformadas em filósofos
não eram fáceis de manipular quando sua cabeça parecia feita de chumbo. Ele
bebeu mais do líquido fumegante de sua xícara e lutou para reparar qualquer
dano que já tivesse causado.
— Por favor, Elaine, estou fora da minha sanidade. Ela é diferente, eu
admito. Capturou minha atenção, para não mencionar que temos compatibilidade
na cama. No entanto, ela não quer ser abertamente associada a mim e destruir
sua respeitabilidade, e quem pode culpá-la? A menos que eu ofereça casamento,
estamos terminados.
Silêncio.
Elaine simplesmente olhou para ele.
Ele realmente acabara de falar sobre casamento?
Sim, ele falara.
Maldição.
Sua boca se contraiu.
— Ela não está interessada em se casar novamente. Deixou isso bem claro.
— A mulher em questão é jovem e protegida. Suas divagações sobre o
marido me dizem que ela teve uma experiência horrível, mas sua concordância
em acompanhá-lo até Essex, em primeiro lugar, mostra que não pretende evitar
os homens para sempre. Pelo que me disse, você mudou os pensamentos dela de
uma maneira que só você poderia mudar, querido. Não disse que se deram bem
de uma forma... absurda?
— Será absurda se alguém descobrir. — Sua têmpora latejava, e ele a
esfregava.
— E quem sabe, talvez, ela também goste de Derek.
Era uma tortura imaginá-los juntos, e ele pôde sentir seu rosto se contrair
numa carranca involuntária.
Elaine não deixou passar. Perguntou gentilmente:
— Gostaria de ouvir os conselhos que lhe dei ontem à noite, agora que você
está em condições de lembrar?
O sorriso de Nicholas era triste e sincero.
— Desde que tive a descortesia de invadir sua casa sem ser convidado, beber
em um estupor e dormir em sua cama, suponho que seria rude recusar.
— Você precisa esquecer Helena de uma vez por todas.
O sorriso desapareceu.
Aquele nome era algo que ele dificilmente gostaria de ouvir enquanto sua
cabeça estivesse latejando como um tambor de um pelotão francês.
— Você — ele disse com o que esperava soar como calma — coloca muita
ênfase em algo que eu já esqueci.
— De alguma forma eu duvido disso. Fui testemunha, lembra? Foi por isso
que você acabou na minha cama, por um curto tempo. Depois que terminamos,
de repente você se tornou o Duque Diabólico, e a sedução casual tomou o lugar
do que sei de memória que era uma abordagem muito mais aberta e menos cínica
da vida.
— Eu fui idiota e, aparentemente, não melhorei tanto assim.
Ele esvaziou a xícara e considerou comer um dos bolinhos na bandeja, mas
decidiu não o fazer. Só a menção do nome de Helena já tinha esse efeito sobre
ele. A sensação de enjoo em seu estômago não era inteiramente devida ao
excesso da noite anterior.
— Ela traiu você.
Sim, de fato, esta era a verdade. Helena capturara sua paixão juvenil e depois
destruíra sua fé no amor. Ela também era uma viúva − muito atraente − e atraiu-o
com provocação sexual e por sua situação como uma mulher indefesa e sozinha.
Só que ela não estava sozinha. Ele descobriu isso de uma maneira que abalou
seu mundo.
Foi uma lição valiosa. Senhoras bonitas e vulneráveis provavelmente lhe
proporcionariam apenas tristeza. Então… surgiu outra viúva tentadora com um
potencial inexplorado de paixão e confiança ferida, e lá estava ele de novo,
agindo como um menino inocente, apesar de sua experiência.
Não. Caroline não era nada como Helena. Ele estava certo disso.
Quase.
— Não precisamos discutir isso. — Nicholas se levantou e lançou as pernas
para a lateral da cama. — Onde diabos estão minhas botas?
— Talvez não precisemos discutir o assunto, mas talvez você devesse
conversar com ela.
— Eu a conheço há menos de um mês.
O fantasma de um sorriso tocou a boca de Elaine. Com sua habitual graça
lânguida, ela moveu-se para recuperar os itens que ele procurava, arrancando as
botas descartadas do chão.
— Eu acho que é um bom sinal que tenha levado tão pouco tempo para ter
seus sentimentos tão envolvidos. Ela parece perfeita para você, se quer minha
opinião.
— Eu não quero — ele grunhiu e aceitou uma bota.
Bom Deus, sua cabeça doía.
— Você quis ontem à noite.
Ele olhou para cima enquanto calçava a bota.
— Quando eu me casar, será estritamente por dever. Dificilmente poderei
escolher uma mulher que não apenas deixou claro que não tem interesse em um
segundo arranjo como esse, mas que também pode ser infértil. O que sinto é
apenas um obsessão luxuriosa, mas vai passar. Sempre passa.
Elaine olhou para ele com olhos preocupados e uma expressão solene. Ela
disse suavemente:
— Temo muito que você esteja deixando Helena te fazer de bobo pela
segunda vez.

A QUILO TINHA QUE FUNCIONAR .


Caroline desceu da carruagem e, conscienciosamente, olhou ao redor, sem
ver nada além de uma rua longa e tranquila e telhados de colmo, o ambiente
doméstico contrastando com a natureza do local de encontro. Podia não ser a
reunião mais notória de toda a história da Inglaterra, mas tinha a ver com a
fofoca atual da sociedade com certeza.
A hospedaria em si era pequena e despretensiosa, com uma fachada simples
e uma placa um pouco torta, desbotada pela luz do sol e pelo tempo. Não parecia
o lugar onde um dos amantes mais renomados da sociedade planejaria uma
sedução.
Huw, como de costume, não disse nada, apenas a escoltou para o
estabelecimento, com seu comportamento reservado de sempre. Quando ele se
virou para sair, no entanto, parou e se virou de novo.
— Minha senhora?
Caroline estivera examinando a modesta taberna, nada além de pisos de
madeira e mesas simples. Era atraente, porque, embora fosse simples, tinha uma
qualidade singular e, felizmente, estava limpa. Ela ergueu as sobrancelhas.
— Sim?
— Tem certeza de que deseja fazer isso?
Seu olhar tornou-se mais atento ao olhar para o jovem. Sua pele tinha
assumido uma cor mais escura.
Claro. Huw sabia sobre a aposta e sua participação nela. Havia permanecido
nos aposentos dos criados em Tenterton Manor durante seus cinco dias com
Nicholas. Provavelmente tinha adivinhado. E lá estava ele, com o chapéu na
mão, uma leve camada de poeira no uniforme devido ao caminho que
percorreram. Seu cabelo era escuro e encaracolado, e emoldurava um rosto com
uma expressão que era uma mistura de constrangimento e preocupação.
Era comovente.
Ainda assim, ela tentou prevaricar. Fracamente, perguntou:
— Fazer o quê?
— Não estou em posição de me intrometer, senhora, mas o Duque... bem, ele
não ficaria satisfeito, se me perguntar.
Como aquele era o mesmo jovem que os guiara por Londres enquanto faziam
amor em sua carruagem, ela não pôde deixar de corar. Mas, ainda assim, se
irritou um pouco com a suposição de que Rothay podia ter alguma opinião sobre
o que ela fazia ou deixava de fazer. Afinal, o homem não se declarara para ela
em nenhum momento.
Ele a desejava, o que era outra coisa.
Ela queria mais. Sim, ela queria, ou não estaria naquele momento se
encontrando com Lorde Manderville em uma hospedaria campestre pouco
atraente.
Os criados sabiam tudo. Era um detalhe do qual muitas vezes se esquecia,
porque, no passado, nunca fizera nada de ultrajante.
Caroline sorriu com tristeza.
— Em primeiro lugar, por que acha que estou aqui? Realmente espero que
Vossa Graça não goste do que vou fazer.
O rosto de Huw se abriu em um sorriso hesitante.
— Entendo.
O homem pareceu aliviado. Lá estava o charme irresistível de Rothay. Ela se
lembrou dos dois homens conversando sobre cavalos uma ou duas vezes na
propriedade rural. Impressionou-a o fato de que Nicholas se dirigira ao rapaz
galês com a mesma camaradagem que nutria por qualquer outra pessoa.
Huw gostava dele. Caroline também. Ela gostava demais dele para sua
própria paz de espírito. Nicholas era infinitamente agradável. Isso não estava em
questão. Muitas mulheres podiam atestar seu fascínio magnético.
O que quer que ela pudesse dizer em seguida foi silenciado pela entrada do
homem por quem esperava. Ou melhor, não era bem isso. Ela podia estar
esperando por Lorde Manderville. Mas suas esperanças – e desejos − estavam
em Nicholas.
Derek parecia arrojado como nunca. Vestia-se menos formalmente do que
seu estilo habitual, uma gravata simples de linho branco, o casaco sobre o braço
em vez de cobrir os ombros. Seu cabelo estava desgrenhado e seus olhos azuis
brilhavam. Um sorriso enfeitava suas feições aristocráticas. Ele inclinou a
cabeça educadamente para Huw e depois fez o mesmo para ela.
— Minha senhora.
Ela acenou com a cabeça para seu jovem cocheiro em despedida,
verdadeiramente tocada por contar com sua proteção.
— Obrigada, Huw.
Ele hesitou por um momento e depois saiu.
Ela se virou para o conde.
— Vejo que chegamos mais ou menos na mesma hora, meu senhor.
O estalajadeiro não deixou passar o aspecto do cocheiro nem o modo como
os dois se dirigiram um ao outro. Era um homem rechonchudo, com uma cabeça
careca, rosto corado, e seu nariz era de um tom avermelhado que indicava que
ele próprio bebera um pouco de cerveja. Apressou-se, então, em recebê-los.
Derek pegou a mão dela e apertou-lhe os dedos suavemente. Uma
sobrancelha se ergueu em um arco arrogante enquanto ele se dirigia ao
proprietário.
— Vamos ficar alguns dias. Minha correspondência deve ter chegado a você
na semana passada.
— Nosso melhor quarto. Sim, milorde.
O homem enxugou o rosto suado com um lenço, enfiou o pano no bolso e
acompanhou-os a um pequeno lance de escadas.
Eles o seguiram. Caroline consciente do aperto da mão do conde na sua,
ciente de que algo sobre ele estava diferente. Não o conhecia bem, mas até ela
podia sentir a mudança.
Entraram em um atraente quarto com paredes de madeira, uma cama grande
com uma colcha padronizada em vários tons de azul e verde, e duas pequenas
janelas que davam para um riacho cercado por uma campina cheia de ovelhas
pastando. Um pequeno quintal com uma horta que parecia promissora, pelo
menos, tanto quanto o menu poderia oferecer.
Claro, esperava não ficar por muito tempo.
Será que Nicholas se importaria o suficiente para surgir e impedir o que ele
pensava que iria acontecer?
A teoria de Derek era de que ele faria isso. Caroline não tinha a mesma
confiança, mas, ao mesmo tempo, não conhecia Nicholas como seu amigo
conhecia. Mas queria conhecê-lo. Deus do céu, como ela ansiava por outra dança
sob o luar ou, melhor ainda, acordar de forma preguiçosa ao lado dele
novamente, sentindo seus braços ao redor dela, o sopro de sua respiração contra
sua bochecha enquanto ele dormia...
— Annie desfez o noivado.
Caroline, que olhava pela janela para uma ovelha com dois cordeirinhos que
a seguiam lado a lado, virou-se e sorriu.
— Eu achei que você parecia despreocupado quando chegou. Agora eu sei
por quê.
— O que você precisa saber é que tem minha gratidão eterna. Tudo o que
disse a ela teve o efeito desejado.
Caroline sentou-se na cadeira junto à pequena lareira.
— Eu simplesmente lhe disse a verdade. Que seria um desserviço para
ambos se ela se casasse com Lorde Hyatt estando apaixonada por você.
Derek escolheu a cama, acomodando-se com causalidade.
Caroline pensou em sua naturalidade com uma pontada de observação
irônica. Ele não era um novato em dividir quartos pequenos em estalagens com
mulheres. Para ela, os riscos eram muito maiores. Estava colocando sua
reputação em perigo tanto quanto quando fora para Essex. Mas daquela vez não
era por paixão, mas como um ardil.
Ela se sentia insegura, mas Derek jurara que seria um sucesso.
— Ela admitiu que estava apaixonada por mim?
— Não.
O homem ficou desanimado. Sim, um libertino de primeiro calibre com a
reputação de fazer qualquer donzela ruborizar, parecia uma criança de quem
acabaram de tirar o doce.
— Entendo. Eu esperava...
— Você honestamente acha que ela diria a mim, uma mera conhecida, algo
tão pessoal? Eu falei muito mais do que ela, mas, para ser sincera, milorde, acho
que a moça já estava inclinada a romper com Lorde Hyatt. — Caroline levantou
uma sobrancelha. — Eu duvido, mesmo com o noivado terminado, que vá ser
fácil reconquistá-la. O amor que sente por você não está em questão; mas, sim,
sua confiança. Esta é uma mercadoria que, uma vez danificada, não é tão
facilmente substituída.
— Eu entendo. — Ele se mexeu um pouco sobre a cama, fazendo suas botas
rasparem o chão. — Agonizo com isso, acredite em mim.
Ele agonizava. Annabel tinha sorte.
— As mulheres têm noções românticas sobre como devemos ser cortejadas e
conquistadas.
Havia um vislumbre de sorriso em seu rosto.
— Você vai me dar uma lição sobre mulheres, minha senhora? Os rumores
dizem que sou um especialista, devo avisar-lhe.
Seu charme certamente era palpável. Não era de admirar que Annabel Reid
tivesse se apaixonado por ele. Se Caroline não estivesse tão envolvida com
Nicholas Manning, provavelmente teria sido suscetível. Ela sorriu.
— Se não fosse pela sua reputação e a de Nicholas, não estaríamos sentados
aqui, não é?
Ele olhou para ela do outro lado da sala.
— Se não fosse pela aposta, você e Nick ainda seriam apenas conhecidos que
se cumprimentam com um mero movimento de cabeça; Annabel ainda estaria
planejando o casamento dela e eu ainda me consideraria impotente para mudar
as coisas. Acho que não posso me arrepender da aposta agora.
— Ele virá? — sua pergunta saiu de forma involuntária, e ela imediatamente
desviou o olhar.
Derek riu.
— Ah, virá.
Sua confiança era reconfortante, mas ela não tinha certeza se compartilhava
da mesma opinião.
— Por que está tão certo?
— Por vários motivos, mas principalmente por causa dos onze dias.
Caroline franziu a sobrancelha.
— Onze dias?
— Ele sabia exatamente quantos dias se passaram desde que vocês dois
retornaram de Essex. Talvez eu não saiba muito sobre pessoas em geral, mas sei
sobre a espécie masculina, já que sou eu mesmo um representante. Ter noção
exata de uma contagem do tipo não é algo de nossa natureza. Ele contou os dias.
Isso diz tudo.
Caroline ainda era ingênua quando se tratava de intrigas desse tipo.
— Isso significa alguma coisa?
— Sim. Acredite na minha palavra.
— Eu acredito, de muitas formas. Se não tivesse fé em sua integridade, não
estaria sentada aqui agora.
— Suponho que não.
Olhos azuis a observaram com o que parecia um humor resignado.
— Nicholas acha que suas opiniões sobre os julgamentos da sociedade são
um aborrecimento.
— Um aborrecimento para seus propósitos, você quer dizer.
— Ele gosta de manter relações sem compromisso, eu admito.
— E a maioria das mulheres se curva aos seus caprichos. — Ela empertigou-
se.
Derek lançou-lhe um olhar nivelado.
— O que você não fez. Veja como o deixou de joelhos.
— Não tenho evidências disso.
— Em se tratando de Nick, mostrar-se tão distraído e irritado são evidências
por si só. Sei disso porque nunca o tinha visto assim. Bem — ele parou e hesitou
—, digamos que já vi, mas apenas uma vez. E se mostrou desastroso na época.
Ele tem motivos para ser cauteloso.
Ela ficou intrigada e lembrou-se de quando perguntou se alguma vez houvera
alguém especial e da reação de Nicholas à pergunta.
— Quem era ela?
— Se ele quiser te dizer, dirá.
Homens, Caroline pensou com irritação. Quando queriam ser leais, era
impossível coletar informações.
Lorde Manderville sorriu, sua boca bem formada era uma curva juvenil.
Era angelicamente contagiante. Caroline não pôde evitar. Sorriu de volta.
— Então o que fazemos agora?
Ele disse sucintamente:
— Esperamos pela grande entrada.
E le esperou muito tempo. Nicholas puxou o cavalo e praguejou em voz
baixa. Sim, ele tinha se controlado e procrastinado, tentando negar sua
vontade esmagadora de seguir seus instintos, mas finalmente sucumbiu.
Bom Deus. Ele os seguira.
Durante todo o caminho para Ayleshire. Depois de fazer perguntas
meramente informativas a vários moradores locais, descobriu que havia
localizado a hospedaria correta.
Inferno, ele estava fazendo papel de bobo.
Era modesta e pequena, situada na periferia da cidade, com um telhado
inclinado e flores em caixas sob as janelas. Não era bem o que ele escolheria,
mas não era seu direito decidir nada. Derek tentava ser discreto a pedido de
Caroline, sem dúvida.
Derek e Caroline. Juntos.
Desmontando, Nicholas jogou as rédeas para um rapaz que saía dos
estábulos e seguiu para a porta. Por dentro, o lugar era adequado, de um jeito
modesto, para um encontro romântico.
O que poderia ser exatamente o que Caroline queria, ele lembrou a si
mesmo.
Ela nunca lhe dera indicações de que desejava algo mais.
Na carruagem, na outra noite, quando ele foi reduzido a pedir favores de
servos e se esconder como um ladrão só para vê-la, ele a desapontara. Caroline
não era conseguira esconder sua expressão quando ele confessou ser cauteloso
com ela, que perguntara por quê.
A resposta fora clara, ele pensou com severa auto repreensão: porque estava
desconfiado de que ela o obrigaria a fazer coisas ridículas como cavalgar em alta
velocidade por horas até uma pequena hospedaria para impedi-la de resolver
uma aposta juvenil muito imprudente.
Ele amava Derek como um irmão. Essa interferência era tanto para salvar
sua amizade quanto qualquer outra coisa.
Não, não era, ele disse a si mesmo com honestidade. Era egoísta, porque ele
não podia suportar pensar nos dois juntos.
Na cama. Se tocando, se beijando...
Ele esperava como o inferno que não fosse tarde demais.
Um pequeno homem gorducho parou de limpar uma das mesas em sua
entrada, reagindo ao indício de impaciência e propósito na expressão de
Nicholas, que disse em voz baixa:
— Estou procurando dois convidados. Uma mulher bonita com cabelos
ruivos e um homem alto e loiro. Onde eles estão?
O proprietário olhou sua roupa cara e julgou corretamente seu status social.
— Meu senhor, eu não posso...
— Você pode me chamar de sua Graça — corrigiu Nicholas, com um tom
letal em sua voz. Se seu título tivesse peso para obter respostas mais rápido, ele
o usaria. — E, por favor, responda à minha pergunta ou vou simplesmente bater
em todas as portas até descobrir onde estão.
— Primeiro quarto à direita, no alto da escada.
O hospedeiro entendeu muito bem a impaciência em seu tom. Uma toalha
pendia frouxa da mão gorducha.
Nicholas assentiu e se virou, mas depois se virou de novo.
— Há quanto tempo eles estão aqui?
— Várias horas, sua Graça — a confissão terminou em um gemido.
Com um suspiro, Nicholas murmurou um xingamento. Por que diabos ele
tinha esperado? Por que ficara andando em círculos em seu maldito escritório
por tanto tempo? Já começava a escurecer do lado de fora e...
Ele subiu as escadas de dois em dois degraus, como se a pressa àquela hora
tardia pudesse fazer a diferença. Na porta correta, ele parou, rígido e detido,
quando ouviu uma pequena risada ofegante. Feminina e familiar. Em Essex, ele
a ouvira com frequência, geralmente sussurrada em seu ouvido enquanto eles
estavam juntos na cama. Espontânea, livre e tão adorável quanto o resto daquela
mulher quando não continha todo seu bom humor em uma fachada gelada de
desapego.
Nicholas ergueu a mão para bater e pausou, outra cena retornando à sua
mente, como um fantasma passando à luz fraca do corredor.
Helena havia desaparecido. Ele sabia, porque tinha ciência de todos os seus
movimentos, a graça fluida de seu corpo enquanto ela dançava, a curva de seu
sorriso, o balanço de seus quadris enquanto caminhava.
Onde ela estava?
Saíra para um pouco de ar fresco? Certamente estava quente o suficiente,
certamente a falta de ventilação do salão era um bom motivo.
Por que fora procurá-la?
Porque sabia. Acontecera com ele, afinal de contas. Aquele olhar sensual, a
breve pressão em seu braço, a delicada e sutil cena de sedução.
Sim, ele sabia.
Então, em vez de olhar para o terraço ou para os jardins, foi
silenciosamente para o andar de cima. E ficou ali, do lado errado da porta de
um quarto fechado e ouviu-os.
Santo Deus, ele os ouviu. Ela dissera estar apaixonada por ele, mas, ainda
assim, vivia um momento de paixão com outro homem. Ele nem precisava entrar
no quarto para saber que era verdade.
Reconhecia aquele leve suspirar de prazer... então soube. Estava marcado
em seu cérebro, em suas terminações nervosas, em seu coração...
Sentindo-se duplamente amaldiçoado por ser um idiota, ele abriu a porta,
então, com mais força do que pretendia, lançando-a contra a parede com um
estrondo alto.
Com o coração acelerado e a mandíbula cerrada, esperando o pior cenário
possível, ele encontrou a mulher por quem estava obcecado, sentada
recatadamente numa cadeira perto de uma lareira de tijolos, um copo de xerez
próximo aos lábios e os olhos arregalados com a chegada abrupta.
Totalmente vestida, todos os ornamentos femininos no lugar, o cabelo ainda
penteado em um coque simples. Derek, empoleirado na cama, também estava
completamente vestido, usando inclusive o lenço de pescoço.
Não, não era a mesma cena que ele invadira há uma década.
Deus fosse louvado.
O alívio o deixou sem palavras. Ou talvez fosse outra coisa, algo parecido
com mortificação. No silêncio resultante, ele conseguiu dizer com brilhantismo:
— Olá.
Foi Derek quem respondeu. Seu velho amigo se levantou em um movimento
ágil, sustentando um leve sorriso presunçoso em sua boca. Com precisão
meticulosa, puxou um relógio do bolso de seu colete, olhou para ele e o colocou
de volta.
— Você demorou mais do que eu pensava, Nick.
O quê?
Nicholas queria fingir indiferença, mas não conseguiu, mesmo depois de
anos de prática no controle de suas emoções. Ele disse friamente:
— Importa-se de explicar essa observação?
— Importa-se de explicar sua presença aqui? — Derek dirigiu-se à porta. —
Não para mim, claro, uma vez que estou saindo. Tenho certeza de que Lady
Wynn gostaria de ouvir o que você tem a dizer. Entre em contato comigo quando
voltar para Londres.
O que diabos está acontecendo?
Nicholas saiu do caminho quando seu amigo passou por ele. Derek tinha um
sorriso débil, mas de inconfundível diversão, aberto no rosto.
Sim, como se Nicholas já não estivesse zombando de si mesmo. Era
exatamente disto que precisava: alguém rindo dele.
Mas era difícil ficar muito irritado ao ser deixado sozinho com Caroline.
Sozinho. Com ela. Em uma hospedaria remota.
Um sonho tornado realidade. Não, era uma fantasia masculina tornada
realidade. Ou talvez uma combinação de ambos.
Ela parecia encantadora trajando um vestido simples de musselina rosa
pálido, amarrotado de sua jornada, aqueles olhos prateados luminosos enquanto
olhava para ele do outro lado do pequeno quarto.
A cama, ele notou, parecia bastante confortável.
Ele agradeceria a Derek por sua escolha de acomodações mais tarde.
— Você estava me esperando?
A voz dela soou sussurrada:
— Estava.
Ela estava. Santo Deus, Nicholas se sentia fora de si.
— Eu não sei por que estou aqui, na verdade. — Ele passou a mão pelos
cabelos, nervoso, e respirou irregularmente. — Exceto que eu realmente não
poderia aceitar a ideia de você seguir com a segunda parte desta aposta.
— Então veio para me salvar?
Caroline se manteve sentada, segurando um copo pequeno entre os dedos,
rosto ilegível. Normalmente, ele entendia o que as mulheres pensavam. Não, isso
estava errado, ele podia adivinhar o que as mulheres pensavam, mas entender era
outra coisa.
Agora, ele realmente não fazia ideia.
Nicholas entrou no quarto e fechou a porta atrás dele.
Naquele momento, ele baniu o fantasma de Helena não apenas para o
corredor, mas para o passado, para sempre.
— Eu vim por você — disse ele com simples honestidade. — O que isso
significa exatamente, você será obrigada a me ajudar a entender.
— Obrigada? — Sobrancelhas ruivas se arquearam, mas Caroline parecia
corada. — Rothay, você entende que não é só porque você é um amante
habilidoso, bonito em todos os sentidos e poderia encantar uma cobra em uma
cesta, que sou necessariamente uma de suas conquistas.
— Não é? — Ele sorriu.
Por que ele hesitava?
— Bem — ela disse com a mesma voz pragmática, primitiva, típica de Lady
Wynn, embora a ansiedade em seus olhos desmentisse o comportamento —, eu
não estou convencida disso.
Ninguém sabia propor um desafio como ela. Ninguém. Com um único
bilhete, ela conseguira virar sua vida de cabeça para baixo. Exatamente o que
fazia com ele naquele momento. Ela ainda se encontrava do outro lado da sala,
porém, ele podia sentir sua ereção crescer, apenas pela promessa de estar perto
dela.
Não era simplesmente desejo. Desejo era algo que ele conhecia bem. Já
sentira muitas e muitas vezes. Era o combustível que alimentava a fábrica de
fofocas e o que o impedira de pensar em Helena no passado.
Aquilo era diferente. Fora diferente desde o momento em que ele a beijou
naquela tarde quente no terraço em Essex e teve o primeiro sabor de sua
hesitante, mas ávida, paixão.
Ou talvez quando ela tirou o chapéu e se revelou naquela pequena
hospedaria...
Oh, inferno, quem diabos se importava quando? Acontecera.
Apenas isso.

E LE PARECIA MAGNÍFICO .
Surpreendentemente, um pouco desalinhado, irritado, mas, ainda assim, o
brilho em seus belos olhos escuros era o que ela reconhecia com uma clareza
vívida.
Desejo.
O escandalosamente delicioso duque de Rothay a queria.
Era demais esperar que este desejo não tivesse sido a única coisa que o
levara até ali?
A julgar pela protuberância em suas calças, enquanto ele se livrava de seu
paletó, era difícil ter certeza. Mas, como Lorde Manderville havia apontado, se o
duque diabólico quisesse uma mulher para fins mundanos, ele não precisaria ir
tão longe para encontrá-la.
Mas ele fora.
O risco valera a pena.
Ele propositadamente começou a avançar em sua direção. Caroline tomou
um gole compulsivo de xerez, nunca tirando os olhos de sua silhueta esguia. Ele
era tão alto, tão masculino e poderoso quanto ela se lembrava, e tão intimidador
quanto na última vez em que trocaram olhares em um salão de baile lotado.
Porém ele parou diante de sua cadeira e estendeu a mão em vez de fazer algo
mais presunçoso como arrebatá-la em seus braços.
Só isso. Uma mão estendida.
Era um símbolo do que ela esperava que ele oferecesse. Não apenas prazer
passageiro, mas uma união mais significativa. Nicholas fora de Londres para
impedi-la de cumprir sua oferta de julgamento, e Lorde Manderville saíra, como
planejado, deixando-os em paz. Tudo estava indo bem até aquele momento.
O firme pulsar de seu coração latejava em seu pulso e garganta.
Caroline aceitou a mão, entrelaçando seus dedos nos dele enquanto permitia
que ele a puxasse gentilmente, colocando-a de pé.
— Como disse, eu esperava...
Ela parou, vacilando, sem ter certeza do quanto deveria oferecer. Nicholas
tinha um leve sorriso no rosto. Uma mecha escura de cabelo pairava sobre uma
sobrancelha. Suas calças e botas carregavam poeira da estrada. Ele pegou o copo
de xerez da mão dela e colocou-o de lado.
— Você esperava o quê?
Afinal, qual seria o problema de dizê-lo? Bem, talvez fosse um risco, mas
Nicholas viajara por uma boa distância para interferir e, embora Derek jurasse
que isso aconteceria, ainda assim, a surpreendera e a emocionara.
— Eu esperava que você viesse.
Uma sobrancelha de ébano se ergueu.
— Eu esperava que não — disse ele em um murmúrio baixo antes de
esmagar a boca na dela.
Foi um beijo nada gentil. Foi intenso, exigente, mas, de alguma forma,
generoso. Caroline se inclinou para ele, deixando-o fazer o que queria com a
língua e os lábios, colocando as mãos na lapela do paletó e encostando os contra
o peito dele. Uma vez que o tinha ali, ela podia perdoar até mesmo aquele tom
áspero de voz.
O duque diabólico não era apenas charme naquele momento... e ela adorava
isso. Amava a necessidade ardente em seu abraço, amava a falta de finesse. Ele
era capaz de fascinar de forma planejada e persuasiva, de seduzir
tentadoramente, mas o que acontecia ali era algo totalmente diferente. Suas mãos
percorreram seu corpo, e eles se entregaram.
Uma mecha de ébano roçou sua bochecha. Uma boca quente e exigente
possuía a dela, e Caroline sentiu o comprimento rígido de sua ereção mesmo
através das camadas de suas roupas. Não importava que estivessem em um
quarto pequeno, o céu escuro não tinha significado, todo o seu mundo era um
único homem.
Isso dizia tudo.
Um único homem.
— Nicholas — ela murmurou contra seus lábios.
Ele sussurrou de volta:
— Estou aqui. Que Deus me ajude, mas não pude me afastar.
Sim, ele estava lá. Isso deixava o corpo de Caroline tenso e necessitado.
— Estou feliz.
— Deixe-me demonstrar o quanto quis estar aqui.
Ele a guiou em direção à cama.
Suas mãos eram mágicas. Ela não tinha chance, mas não queria uma. Seu
vestido foi retirado e afastado de seus ombros tão rapidamente que ela mal
percebeu que o tecido escorregava e se acumulava no chão. Chemise, meias e
sapatos foram descartados com a mesma rapidez, e ele a ergueu, depositando seu
corpo nu sobre a colcha.
— Isso sim faz valer a pena ter percorrido todo o caminho de Londres até
aqui — disse ele, enquanto começava a se despir deliberadamente, seu olhar
vagando pelo corpo dela.
Como ela sentira falta daquilo. A evidente audácia em seu olhar e a onda de
excitação profunda revirando seu estômago. Ele tirou a roupa e, por um
momento, ficou parado ali, como se percebesse, com a mesma força frenética de
necessidade, quão importante era o momento para os dois.
Então ele subiu na cama e a tomou em seus braços, pairando totalmente em
cima de Caroline, sua boca reivindicando a dela novamente. Daquela vez o beijo
foi lento e perverso, seu membro ereto entre eles. Caroline se esfregou naquele
longo comprimento, ganhando um pequeno grunhido de aprovação do fundo do
peito dele.
Caroline adorava o modo hábil com que as mãos dele se moviam sobre seu
corpo, a sensação quente da boca em seu pescoço enquanto ela se arqueava em
seu abraço, o cheiro de sua pele. Já estava molhada e receptiva, ansiosa para
senti-lo dentro dela. Foi natural abrir as pernas, um convite que ele não
recusaria. Nicholas apoiou o peso em seus antebraços e aceitou a oferta, seus
joelhos afastando suas coxas um pouco mais, enquanto se preparava para
penetrá-la.
Por um momento ele fez uma pausa, deixando evidente sua hesitação por
conta da tensão em sua forma musculosa.
— Eu nunca sou possessivo.
Não era uma surpresa perceber que ele ainda estivesse tendo problemas para
compreender suas próprias ações.
Caroline olhou para cima, conforme um prazer lânguido assaltava seus
sentidos enquanto a antecipação zumbia através de todas as suas terminações
nervosas.
— Eu sei.
A ponta de sua ereção descansou contra a abertura dela, mas ele não se
mexeu.
— Imaginar você com Derek… Ah, inferno, você com qualquer um... foi
mais do que eu pude suportar. Estava me torturando.
Mais do que quaisquer palavras sentimentais, o olhar sombrio em seu rosto
lindo a fez sorrir. Caroline tocou seu rosto.
— Eu não teria feito nada, de qualquer maneira.
— Por que não? Diga-me.
Ela captou o tom rouco e profundo de sua voz. Que Nicholas Manning, o
amante diabólico de tantas mulheres, com seu carisma suave e experiente, que
era comentado em sussurros por onde quer que ele fosse, estivesse incentivando-
a a fazer algum tipo de declaração primeiro, era comovente e divertido. Ele era
bom em todos os aspectos de fazer amor, mas o amor em si parecia ser algo que
abalava sua serenidade.
Ela também não era boa nisso, mas tentou.
— Eu não posso imaginar estar com ninguém além de você.
— Por que não se deitaria com Derek? Esse era o acordo. As mulheres o
acham infinitamente atraente.
Será que Nicholas − Nicholas − estava verdadeiramente inseguro sobre os
sentimentos dela?
Tal ideia a deixou eufórica.
— O acordo foi antes — ela disse a ele, com um tom calmo e direto.
— Antes do quê? — Seus olhos se estreitaram apenas uma fração. Ela podia
sentir o calor dele, a evidência de seu desejo pressionando sua pele arrepiada, o
ligeiro tremor em seus braços mostrando a quantidade de controle que lhe
custava não completar o ato que ambos queriam tão desesperadamente.
— Antes de você, Nicholas.
— Continue — o tom inquietante exigia alguma coisa. O olhar em seu rosto
dizia que como ele fora atrás dela, Caroline precisava de uma declaração firme
para apoiá-lo.
Caroline nunca dissera eu te amo a ninguém em sua vida, mas também não
achava que tivesse amado alguém antes. Sua mãe, talvez, quando criança, mas
realmente não se lembrava dela. Seu pai, frio, severo e distante, sua tia
indiferente e obediente, e muito menos Edward, que ela detestava, nunca lhe
inspiravam sentimentos calorosos. Nicholas cortejara não apenas seu corpo, mas
também sua alma com seu toque gentil, hábil e um sorriso irresistível.
Fora necessária apenas uma silenciosa dança ao luar no terraço para que ela
se perdesse.
Esforçou-se para dizer a coisa certa.
— Desde que você me tocou... Desde Essex... eu entendi que não poderia ir
adiante. Eu disse a Derek, assim que voltamos, que retirava minha oferta.
— Então isso foi um truque?
A última coisa que queria era que ele se sentisse assim. Ela estendeu a mão e
tocou os lábios dele com a ponta do dedo.
— Não. Eu não sei como chamar, mas não foi assim. Derek especulou que
poderia fazer você rever seus sentimentos se pensasse que eu pretendia ir adiante
com minha parte na aposta.
— Ocorreu a ele que eu não desejava rever meus sentimentos?
Ela não pôde deixar de rir do seu tom de repulsa, mas ainda se sentia
envergonhada quando disse:
— Estou feliz que tenha acontecido, porque... — os quadris dela se
arquearam um pouco para enfatizar o ponto — estamos aqui agora. Assim. Você
se importaria...?
Sua declaração ousada pareceu satisfazê-lo, pois seu sorriso tinha uma
qualidade lupina.
Ele rosnou:
— Eu não me importo de jeito nenhum.
Sua investida foi rápida, impetuosa, forte o suficiente para fazê-la ofegar. Ele
embainhou seu membro rígido inteiro profundamente, e a sensação de felicidade
a fez tremer. Seus olhos se fecharam.
— Sim.
Eles se moveram juntos, em sincronia, seus corpos comunicando o que eles
aparentemente não podiam dizer com palavras. O ritmo era descontrolado,
selvagem, e Caroline se refestelou nas sensações enquanto se elevava em direção
àquele paraíso erótico.
Não, ela não podia se imaginar fazendo algo tão íntimo, tão maravilhoso,
com ninguém além do homem que se movia com ela naquele momento, ambos
buscando... encontrando...
A conclusão foi arrebatadora, o prazer tão agudo que ela sentiu como se o
mundo parasse e o céu caísse. Eles estremeceram juntos, envoltos pela sensação,
exaustos e satisfeitos enquanto se esparramavam em um emaranhado de braços e
pernas, ambos relutantes em falar até mesmo quando suas respirações
começaram a diminuir para um ritmo normal.
Nicholas seguiu o ritmo dela. Mesmo nua em seus braços, seu corpo úmido
após a paixão tempestuosa, uma parte dela ficou atônita com a descrença do que
realmente havia acontecido. Um longo dedo traçou um caminho desde sua
mandíbula e acariciou seu lábio inferior. Olhos escuros a observavam sob o véu
de cílios semicerrados. Nicholas sorriu, mas não era o habitual curvar calculado
e preguiçoso de seus lábios. Em vez disso, parecia quase melancólico, que era
uma palavra que ela jamais teria associado ao duque de Rothay.
— Você ainda está com medo?
Caroline se mexeu, o que exigiu algum esforço, porque ela se sentia
maravilhosamente plena e satisfeita.
— O quê?
— Naquela noite, em sua carruagem, você me disse que estava receosa a
meu respeito.
Ela balançou a cabeça, o cabelo se movendo sobre seus ombros e costas
nuas.
— Eu disse que tinha medo de um escândalo.
— Não tem mais?
Isso significava que ele nunca iria oferecer mais do que o que eles tinham
acabado de compartilhar? Não sabendo como responder, Caroline se aninhou
contra ele, silenciosa, incerta, sentindo sua felicidade desaparecer aos poucos.
— Caroline?
Lentamente, ela admitiu:
— Se sua intenção é me convencer a entrar em um caso com você, espero
que não tenha sido este o motivo que o fez vir até aqui. Aqueles dias que
passamos juntos foram uma revelação para mim. Isso não é um segredo para
você. Ao menos sexualmente. Mas não estou falando apenas dos esclarecimentos
que encontrei em sua cama. Lembra quando estávamos na clareira e fizemos
amor pela primeira vez? Percebo que não fiz o comentário sugestivo que você
desejava, mas lhe contei a verdade. Você é um homem muito bom, Nicholas.
Deixando as armadilhas do título, nascimento, riqueza e habilidade sexual à
parte, você é... você.
Suavemente, ele tocou o queixo dela, forçando seu rosto a se inclinar para
que eles olhassem um para o outro.
— E o que isso significa?
Como ela desejou que pudesse ser indiferente. Mas não podia. Sussurrou,
então:
— Eu me apaixonei por você. Por aquele homem, não pelo duque diabólico,
mas pelo verdadeiro.
T rês dias. Fazia três dias desde que ele retornara a Londres daquela pequena
hospedaria onde deixara Nicholas e Caroline se divertindo imensamente.
Derek, por outro lado, não estava se divertindo nada. Ficar longe da casa do tio
fora uma tortura, mas ele dificilmente queria surgir à sua porta como um abutre
espreitando uma corça logo depois que a dissolução do noivado de Annabel se
tornasse pública, então, ele esperou.
Três dias muito longos.
O crepúsculo surgiu com um propósito insidioso, trazendo depois a
escuridão, e ele continuou sentado, sombrio e incerto. Sua mesa normalmente
organizada, encontrava-se cheia de papéis para os quais ele mal olhara por falta
de capacidade de se concentrar. Um sopro da brisa da noite trazia aromas da rua
e do jardim. O cheiro era uma mistura eclética de fumaça de chaminé e rosas
exageradas.
Era tarde. Talvez ele devesse ir a White ou ao Brook's, sentar-se num canto
com uma garrafa de uísque e…
E o quê? Ficar sentado lá, pensando nela ao invés de fazer o mesmo em
casa? Sim, seria muito produtivo. Um leve som de algo raspando a parede o
despertou de sua abstração, e ele franziu a testa, assustado quando se virou para
olhar para a janela aberta em seu escritório. O farfalhar de tecido lhe avisou que
não estava imaginando coisas, então ele permaneceu sentado, mortificado ao ver
uma perna esbelta deslizar sobre o peitoril.
Ele poderia ter ficado alarmado, mas era muito difícil, se tivesse que
adivinhar, que invasores tivessem pernas tão bem torneadas. Nem usavam
vestidos de noite de seda em tons de marfim. Surpreendido, Derek congelou em
sua cadeira.
Mas seu coração começou a bater mais forte.
Annabel pousou no chão, com uma respiração audivelmente agitada, e então
se endireitou, ajeitando as saias. As cortinas atrás dela se moveram com fluidez,
emoldurando seu corpo esbelto. Como se fosse a coisa mais natural do mundo
que se esgueirasse pela janela de seu escritório, ela disse apenas:
— Eu vi sua luz acesa.
Tardiamente — porque ainda se sentia atordoado —, Derek levantou-se,
quase tombando novamente sobre a cadeira.
— Annie, o que você está fazendo?
Ela estava ali, com seus cabelos dourados e pele de marfim, o queixo
inclinado para cima em um ângulo suave, um olhar desafiador em seus olhos
azuis.
— Não é este o nosso método atual de visitarmos um ao outro?
Ele olhou para trás, perguntando se era algum tipo de alucinação absurda.
— O diabo que é. Se você quiser me visitar — embora senhoritas não
visitem senhores —, venha com um batalhão de acompanhantes e passe pela
porta da frente.
Seu queixo se ergueu um pouco mais.
— Entendo. Um conjunto de regras para você e outro inteiramente diferente
para mim. É perfeitamente aceitável que você rasteje pela janela do meu quarto
quando tiver algo a dizer, mas eu não posso ter a mesma atitude?
Derek passou a mão pelos cabelos.
— Bom Deus, Annie, você sabe que não. Thomas e Margaret sabem que está
aqui?
— Claro que não.
Ele se sentiu empalidecer.
— Por favor, me diga que não veio caminhando.
— Eu não poderia chamar uma carruagem, poderia? Não é longe, e eu não
sou aleijada.
Uma jovem sozinha nas ruas — ele olhou para o relógio e viu que já passava
da meia-noite —, àquela hora, por mais que a vizinhança fosse elegante e quieta,
era imprudente o suficiente para fazê-lo sentir-se fraco.
— Jesus — ele murmurou. — Sua tola.
— Eu preciso falar com você.
Decidida era um termo muito fraco para ela.
— Eu vou te levar em segurança para casa — ele falou asperamente, porque
ainda estava se recuperando do medo pelo risco que ela tinha corrido; não
apenas por sua reputação, mas por sua segurança.
— Não. — Ela respirou, estremecendo, e balançou a cabeça. — Estou
sentindo coragem para fazer isso agora. De manhã posso mudar de ideia. Além
disso, quero avançar e não gastar mais um minuto imersa nessa batalha interna
que parece impossível de resolver. Você não está interessado no que me trouxe
aqui?
Foi a mesma pergunta que ele fez para ela na noite em que se viu
desesperado o suficiente para invadir seu quarto.
Ela lhe dissera não.
Mas não era verdade. Ele pôde perceber pela vulnerabilidade em seus olhos.
Houve bastante mal-entendido entre eles sem acrescentar mais mentiras à
mistura. Derek disse simplesmente:
— Você deve imaginar que estou.
Assim, dada a permissão, ela hesitou, tão linda sob o brilho fraco da
lamparina, a cor marfim de seu vestido fazendo-a parecer mais inocente e jovem
do que nunca. Exceto que era decotado o suficiente para mostrar modestamente
as curvas superiores de seus seios fartos e não havia nada de infantil a respeito
dela. Era uma mulher sedutora em todos os sentidos, incluindo seu espírito
independente.
E era cativante, embora ele não precisasse disso. Já era um cativo.
Ele ajudou-a dizendo:
— Fiquei sabendo.
Ela não tentou fingir que não sabia do que ele estava falando.
— Sim, imagino que todo mundo já deva saber que rompi meu compromisso
com Alfred. Eu me senti péssima fazendo isso, mas não tão terrível quanto lhe
teria feito se nos casássemos. Ele não ficou particularmente surpreso, eu acho,
assim como você previu.
Derek apenas a olhou. Lentamente, ergueu uma sobrancelha.
— Não seja presunçoso — ela alertou.
Teria sido mais eficaz se a voz dela não tivesse falhado. Não muito, apenas
um único engate em seu discurso, mas foi o suficiente.
Para lhe dar esperança.
— Vou tentar não ser — ele murmurou. — Nem estou certo se tenho algum
motivo para ser presunçoso. Tenho? Exceto, talvez, sua chegada e presença não
convencionais aqui a esta hora.
— Eu ainda estou com raiva de você. — Ela não respondeu à pergunta.
— Eu percebi — ele admitiu com humor sombrio. — Nunca paguei tão caro
por um erro.
Ela o olhou com olhos luminosos, a boca tremendo um pouco.
— Eu nem sei por que deveria falar com você. O ano passado tentei
reconciliar o homem que eu achava que conhecia com quem você realmente é, e
não gostei do exercício. Me dê uma razão lógica para confiar em você.
Nenhuma parte dele pensou que seria fácil. Havia certa vantagem, e uma
desvantagem, em conhecer alguém muito bem. Ela amava totalmente, mas sofria
pela traição com a mesma quantidade de paixão. Derek hesitou um pouco e disse
baixinho:
— Annie, entendo que fui insensível e idiota no ano passado. Por favor, não
faço objeção a nenhum dos dois rótulos. Mas, colocando-se no meu lugar, você
não consegue entender que o que estava acontecendo entre nós era proibido e
estranho? Você era tão jovem, e lá estava eu, com essa reputação da qual não
consigo me livrar e que posso ter herdado do meu pai. Vamos adicionar um
interesse imprudente na protegida do meu tio. Senti-me muito pressionado sobre
como agir.
— Então você caiu direto nos braços ansiosos da condessa.
A acusação em seus olhos era inconfundível. Ela ainda sentia raiva.
Mas também estava ali. Fora até ele.
— Eu expliquei por que e me desculpei. — Ele procurou as palavras certas,
algo para aliviar a tensão visível em seus ombros delgados. — Permanência não
era algo que eu já tivesse considerado antes.
— Antes?
A pergunta feita delicadamente o desafiou. Muito bem. Ela precisava ouvir.
Ele forneceu:
— Antes de você.
— Mas considera agora?
— Ajustar-me à ideia de permanência?
— Sim. — Ela engoliu em seco, os músculos ondulando visivelmente em sua
garganta. — Eu preciso de provas.
Bem, aquele não era um requisito fácil de preencher, mas ela merecia pelo
menos o que Hyatt lhe dera e ainda mais. Ele disse com voz rouca:
— Case-se comigo, Annie.
Ela deu um passo em direção a ele, a expressão em seu rosto difícil de
interpretar.
— Você quer que eu me case com você?
— Foi o que acabei de pedir — Derek não podia acreditar que tinha dito
aquilo tão facilmente, abandonando sua liberdade sem hesitação ou
arrependimento. — Sim, quero que você se case comigo. Que seja minha esposa.
— Se está sendo sincero, vamos resolver isso. — Seu rosto sustentava um
olhar determinado, suas sobrancelhas finas apenas ligeiramente arqueadas, seus
lábios fartos comprimidos. — Então, faça-me sua.
Ele ficou imóvel, cada músculo em seu corpo ficando tenso. Atordoado e
abalado, ele olhou para ela.
— O quê?
— Desenvolveu uma deficiência auditiva? — Ela se aproximou, e ele não
deixou de perceber o balanço suave de seus quadris; era provocante, embora ele
não soubesse se Annabel tinha consciência disso ou não. — Me leve para sua
cama. Temos até o amanhecer.
Sem palavras, ele sentiu seu corpo reagir, embora emocionalmente fosse
resistente à sugestão. Depois de um momento, conseguiu falar:
— Não tenho intenção de tratá-la com desonra.
O sorriso de Annabel era inesperadamente provocativo para uma jovem
inexperiente.
— Você é conhecido por ser um dos amantes mais habilidosos da Inglaterra,
correto? Até porque foi o que você colocou à prova diante de toda a sociedade.
Até apostou o que é considerado como uma pequena fortuna nesta reivindicação.
— Eu estava...
— Sim, eu sei — ela interrompeu, olhando para ele, seu semblante coberto
por delicadas sombras e curvas sob a luz bruxuleante. — Você estava
embriagado na época, mas, ainda assim, a ideia deve ter vindo de alguma forte
convicção e quero que prove isso. Para mim.
— Annabel — a reprovação perdeu seu efeito quando seu olhar, contra a
vontade, recaiu sobre os lábios entreabertos. — Não me tente, por favor.
— Por que não?
— Thomas vai pedir a minha cabeça, para começar.
— Não vamos contar a ele. — Ela chegou perto o suficiente para colocar a
mão em seu peito. Através do linho fino de sua camisa, ele pôde sentir a leve
pressão. — Eu quero. Sem dúvidas, sem chance de você mudar de ideia, sem
volta para nenhum de nós. Se há uma coisa que eu sei sobre você é que não
seduz jovens mulheres inocentes. Mesmo quando disse a mim mesma que odiava
você, não contava esse como um dos seus pecados.
Era a mais pura verdade.
— Então — ela continuou, como se o que estava sugerindo fosse lógico e
fizesse perfeito sentido —, se você fizer isso... se você me comprometer, saberei
que suas intenções são genuínas.
— São genuínas — ele protestou, sem saber como proceder, porque receber
uma proposta sexual de uma jovem normalmente comportada estava fora dos
limites de suas experiências. Sua dúvida era insultante até certo ponto, mas ele
também não lhe dera muitos motivos para confiar nele.
— Então você concorda?
— Podemos esperar até a nossa noite de núpcias. — O desespero de agir
como um cavalheiro competia com seu pênis inchado. Ela estava tão perto, tão
tentadora, o foco de todos os seus desejos...
— Eu não quero esperar. Isso é importante para mim.
A convicção em sua voz o desfez. Maldito inferno, o que ele deveria fazer?
Candidatar-se à santidade? A mulher que ele queria mais que tudo na terra pedia
que ele a levasse para cama. Além disso, uma voz traidora sussurrava em seu
cérebro de que havia bastante fofoca sobre o rompimento de seu noivado, então,
não poderiam formalizar seu relacionamento imediatamente sem que os
sussurros aumentassem em proporções ensurdecedoras, por isso, um casamento
rápido e discreto estava fora de questão.
Derek tentou mais uma vez.
— Eu vou te levar para casa.
— Não. Você alega que me ama. Prove. — A boca de Annabel estremeceu.
Não muito, mas o suficiente para que ele notasse.
Ele disse com a voz embargada:
— Não é uma alegação. Eu a amo.
— Então me beije.
Ele queria tocá-la, beijar aqueles lábios rosados e suaves, segurá-la contra ele
e fazê-la imaginar tudo que poderia fazer com ela.
O que ele faria. Sabia como dar prazer a uma mulher, como provocar aqueles
suspiros e movimentos sutis, como levá-la à beira do êxtase e lançá-la ao abismo
no momento exato.
Annabel o olhou, tão bonita que fez sua respiração ficar presa na garganta.
— Você entende o quanto isso é importante para mim? — Sua voz estava
baixa, seus olhos embaçados.
— No ano passado — ele lhe informou, um pouco à flor da pele — eu passei
a entender muito sobre amor platônico, Annie.
— Mostre-me. Acho que entendo também.
Ele não aguentou. O desejo de tocá-la era intenso. Assim como o brilho azul
nos olhos dela. Derek a segurou contra ele. Deslizou os polegares pelas laterais
de suas faces, agora úmidas de lágrimas traidoras, encostando seus lábios sobre
as sobrancelhas dela.
— Deixe-me definir para você. Podemos comparar sentimentos. É tortura,
mas também é a maior felicidade. É mágoa, mas também alegria. É maravilha e
desespero ao mesmo tempo. Eu estou perto?
Um aceno de cabeça, quase imperceptível, moveu-se contra o calor de suas
mãos.
— Annie.
Ele baixou a boca.
— Sim.
Seus lábios se encontraram, tocaram, separaram-se e encontraram-se
novamente. Apesar de todas as legiões de mulheres, através de todos os
relacionamentos despreocupados e momentos roubados em quartos proibidos,
ele nunca se sentira daquela forma. Nunca experimentara tal ternura, tal
necessidade angustiante, tal desejo doloroso.
Normalmente, ele se orgulhava de sua delicadeza, e isso era de conhecimento
público, mas quando Annabel se movimentou contra ele, com seu corpo esguio e
trêmulo, ele perdeu todo o sentido real do que estava fazendo. Tudo no que
conseguia pensar era o quão quente e macia era sua boca contra a dele, como o
movimento tímido e delicado de sua língua enviava uma onda de puro desejo
direto para sua virilha, em como ela tinha gosto de céu.
O planeta poderia ter parado de girar em seu eixo, cada pássaro na terra se
calado, os oceanos se esvaído, mas nada disso faria seu mundo mudar tanto.
Ele prolongou o momento, provando, provocando, sussurrando o nome dela
em seu ouvido, segurando-a contra ele com a mão firme na parte mais baixa de
suas costas.
Mas, finalmente, não pôde mais se conter, precisou levantar a cabeça e
observá-la. Olhar nos olhos dela, esperando, rezando para ver a mesma luz
brilhante que estivera lá há um ano, antes de esta desaparecer e destruí-lo.

S EUS OLHOS ERAM DE UM AZUL TÃO VÍVIDO , COM AQUELES CÍLIOS


absurdamente longos, o nariz reto, a linha da mandíbula, masculina e perfeita. E
sua boca, capaz tanto daquele sorriso devastador, do qual as mulheres
fofocavam, quanto de beijos tão ternos e persuasivos. Seus joelhos estavam
fracos, e ela nem podia começar a descrever a sensação.
No entanto, naquele momento, Derek não estava sorrindo. Ele a olhava como
se fizesse uma pergunta silenciosa.
Eu te amo.
Quando ele disse isso daquela vez, não houve hesitação. Nenhuma ideia de
que ele se sentia como se estivesse saltando de um precipício para uma morte
dolorosa, não houve eco de incerteza.
Derek a amava. Quando ela refletia sobre todas as fantasias infantis − e
outras não tão infantis, de quando ficou um pouco mais velha −, não pôde evitar
o sorriso que curvou seus lábios.
— Sempre achei que minha imaginação era excelente, mas agora você me
convenceu do contrário.
O braço forte ao redor da cintura dela a estreitou ainda mais, quase
imperceptivelmente.
— Como assim?
— Esse foi um beijo muito romântico, e eu não achei que você conseguiria
superar o primeiro. Quero mais.
— Desta vez não vai ser nada como o que aconteceu no ano passado, eu
prometo a você — o tom alterado de sua voz fez com que ela sentisse um arrepio
de antecipação.
— Eu preciso dessa promessa. — Os dedos de Annabel desceram pelo braço
dele. Através da camisa, ela podia sentir a tensão em seus músculos.
— Eu sei que precisa. — Ele a beijou novamente, mas com suavidade
daquela vez, apenas um roçar de seus lábios nos dela. — Diga-me o que mais
você quer. Conte-me todos os seus sonhos.
O homem não pedia pouco. Queria sua confiança, queria-a entregue aos seus
braços e em sua cama, mas também todos os seus sonhos? Annabel hesitou até
que ele disse com voz rouca:
— Ajude-me. Não estou interessado em cometer mais erros que demorem
um ano para serem corrigidos.
Ela podia não ser experiente como as mulheres com as quais ele geralmente
se envolvia, mas estava aninhada em seus braços e podia sentir a protuberância
na frente de suas calças. Um calor aqueceu suas bochechas e ela pressionou o
rosto em chamas contra o peito dele.
Ele não permitiu. Longos dedos seguraram seu queixo e o inclinaram para
que seus olhares se encontrassem.
— Annabel?
— Eu quero você — ela confessou.
— Oh, você me tem — ele respondeu, seu abraço apertando-a, a respiração
quente contra sua têmpora.
O custo fora alto, mas como ela ansiara ouvi-lo dizer aquelas palavras.
Talvez até um ano de desespero, negação e desilusão tivesse valido a pena para
viver aquele momento.
Ele sorriu. Geralmente aquele sorriso fazia os corações de todas as mulher
flutuarem, mas, daquela vez, era só para ela, e ela era a única a contemplá-lo.
Ela queria tudo. Desejava-o.
— Não pare — pediu ela. Foram as mesmas duas palavras que proferira um
ano antes, mas agora tinham muito mais significado.
— Não vou parar — ele assegurou. Seus olhos estavam escurecidos, seus
cílios abaixados. — Eu não poderia nem se tentasse. Se você está sendo sincera,
venha comigo.
Derek gentilmente a puxou pela mão e levou-a
ao quarto, seguindo pelo corredor escuro até chegarem a uma escada. O
silêncio profundo da casa alimentava o senso de proibido, mas, novamente, o
que ela estava fazendo era muito proibido. Mesmo assim, era o que queria.
Nós podemos esperar até a nossa noite de núpcias...
Seu marido.
Ela ia se casar com o perverso conde de Manderville. O furor que
aconteceria depois que a sociedade soubesse do matrimônio era desanimador,
mas não tão assustador quanto a perspectiva de segurar sua mão e permitir que
ele a conduzisse até seu quarto.
Porque ela pedira isso como prova de fogo.
Não havia como voltar atrás, ela pensou enquanto dava cada passo, sentindo
o aperto firme e quente de seus longos dedos ao redor dos dela. Bem, isso não
era exatamente verdade, porque mesmo que sentisse o estado de excitação de
Derek quando a beijara, sabia que ele a deixaria partir se sua coragem falhasse.
— Você ainda tem certeza? — ele perguntou como se estivesse lendo seus
pensamentos, com a mão na maçaneta ornamentada da primeira porta no
corredor superior. — Eu ainda posso te levar para casa e espero que possa entrar
sem ser detectada, mas, de qualquer forma...
Realmente não havia como voltar atrás. Ela rompera o compromisso com
Alfred, arriscara sua reputação escapando da casa, despira sua alma e fizera
aquela oferta ultrajante.
— Derek, eu tenho certeza.
Ele a beijou então. Beijou-a enquanto a conduzia para dentro, beijou-a
enquanto a empurrava em direção à cama, até que a parte de trás de seus joelhos
atingiram a cama, e beijou-a conforme começava a soltar seu vestido. Annabel
sentiu o tecido afrouxar sutilmente, e a única coisa que importava no mundo era
a urgência quente e faminta de sua boca contra a dela. Enfiou os dedos nos
cabelos sedosos dele, sentiu o calor da pele dele contra a palma da mão e se
regozijou-se ao perceber o quanto ele a queria. O forte pulsar de seu coração fez
as pontas de seus seios formigarem e se enrijecerem. Cada baque reverberava
através de sua alma.
— Annie... Annie — ele murmurou contra sua boca, suas mãos livrando-a de
suas vestes, movendo-se através de sua carne.
Não houve tempo para ficar envergonhada ou tímida, pois ele apenas a
despiu e a ergueu do chão, colocando-a na cama. Era larga, macia e espaçosa o
suficiente para que, mesmo quando ele tirou a camisa e as calças do corpo,
juntando-se a ela, todo másculo, grande, imponente e excitado, ainda houvesse
espaço.
Ele era magnífico. Firme, esculpido, lindo.
— Eu preciso de você. — Seu olhar a queimou, e ela sabia que ele falava a
verdade, sentindo o calor latejante de sua ereção contra seu quadril. Braços
fortes a puxaram para si, e, por mais que ela devesse estar com medo,
simplesmente... não estava.
— Vou te dar prazer até você gritar. — Ele prometeu, mordiscando ao longo
de seu pescoço. — Até você chamar meu nome.
Annabel arqueou, incrédula por estar prestes a entregar-se a Derek,
finalmente. Ela arfou:
— Faça isso.
— Porque você quer ser comprometida. Porque você não quer voltar atrás.
A respiração dele fez cócegas em sua orelha.
— Sim.
— Porque você quer... a mim? — Sua língua girou em um arco interessante
ao longo de seu pescoço. — O suficiente para entregar sua virgindade como uma
oferta para selar nosso pacto? É uma estratégia eficaz, se me permite dizer, meu
amor.
Meu amor…
Ela poderia ter se oposto, em outras circunstâncias, à implicação de ter
planejado algo quando, na verdade, andara de um lado para o outro no quarto,
pensara, ficara zangada, depois reflexiva e depois zangada de novo. Só quando o
relógio bateu meia-noite ela ganhou coragem e saiu de casa como um ladrão
durante a noite, descendo a escada dos fundos e saindo pela entrada dos criados,
correndo pela rua para alcançá-lo. A luz na janela do andar de baixo de sua
residência fora uma benção, um presente. Ela imaginou que teria que bater e
perguntar por ele, acordando metade da casa.
Daquela forma era melhor.
Daquela forma, era como um sonho se tornando realidade.
A boca de Derek encontrou um seio nu. Um calor úmido se fechou sobre o
mamilo, e ela engasgou, arqueando de volta para a suavidade dos travesseiros,
sentindo seu corpo de repente em chamas. Derek sugou suavemente, girando a
língua ao redor da ponta tensa até que ela sentiu como se lhe faltasse o ar, e
percebeu que isso realmente acontecia. Eles estavam nus nos braços um do
outro, sua cabeça loira inclinada sobre ela, sua boca fazendo coisas incríveis e
mágicas.
— Oh. — Annabel agarrou-se a ele, seu corpo tenso, sentindo os efeitos de
suas sensações na boca do estômago e profundamente entre suas pernas.
Era assim que acontecia? Era sobre isso que as mulheres sussurravam?
— Deus, Annie, eu te quero tanto. — Os pelos ralos em seu rosto roçaram a
pele dela. Suas mãos agarraram a plenitude de um de seus seios, apertando-o, e
seu polegar roçou a ponta ereta do seio oposto.
— Derek — sua voz soava tensa, desigual.
— Eu preciso provar cada centímetro de você.
O grunhido áspero na voz de Derek aumentou sua reação trêmula ao toque
sedutor. Ele explorou vagarosamente o outro seio com os lábios e a língua, e
depois acariciou o vale entre a carne com as mãos em concha.
Ela queria soltar um grito de prazer e mal conseguiu sufocá-lo. Pegando o
lábio inferior entre os dentes, sufocou um gemido. Era para ser assim? Ela se
perguntou. Aqueles beijos alucinantes, quentes e maliciosos, o toque da boca em
sua pele, a sensação de abandono e rendição.
Sim, ela decidiu um momento depois, quando ele lambeu um caminho
quente através de sua clavícula e deixou escapar um som baixo vindo da
garganta. Era exatamente por isso que ele e o pecador duque de Rothay haviam
feito aquela aposta. Porque ele sabia exatamente o que fazer. Devia saber, pois
ela não fazia ideia, mas ali estava, debaixo dele, seu corpo disponível para o seu
prazer carnal... ou seria uma impressão dela? As bordas da sanidade estavam
turvas, indistintas, seus sentidos cativados. Quando ele se moveu mais para
baixo, depositando beijos em sua barriga, ela não entendeu até...
Oh, Deus, até ela perceber que sua boca estava em um lugar que ela nunca
sonhou que alguém iria querer provar, e ele realmente falara sério quando
prometeu que a beijaria em todos os lugares. O arrebatamento incandescente
produzido pelo beijo escandaloso entre suas coxas abertas fez sua mente girar.
Derek afastou as pernas para ter melhor acesso, abaixou a cabeça novamente e
ganhou um grito revelador que ela não pôde evitar.
— Perfeito — ele murmurou, sua boca ainda se movendo contra sua carne
sensível. — Relaxe, Annie. Deixe acontecer. Nós vamos fazer isso da maneira
correta. Quero você ligada a mim para sempre.
Deixar o quê acontecer? Oh, Deus, ela estremeceu em resposta à invasão de
sua língua, choramingou com o movimento hábil no ponto exato, e sua mão
tremia quando agarrou a cabeça dele para afastá-lo.
Ou para puxá-lo para mais perto. Já não sabia dizer ao certo, uma vez que
seu corpo fora completamente escravizado.
E então aconteceu. Como uma onda alta, movendo-se para a frente,
suspendendo-a e depois fazendo-a mergulhar em um choque transbordante. Ela
se retorceu, lutou por ar e estremeceu quando o prazer ondulou através dela em
pulsações arrebatadoras.
Foi incrível.
Tão esmagador que ela mal percebeu quando ele a ajustou sobre a cama,
colocando-se sobre ela, investindo dentro de seu corpo. Seu sexo a penetrou, a
princípio apenas uma pressão brusca, e depois mais plenamente, tomando posse
real de seu corpo.
— Se você quer que eu prove minha devoção, certamente irá senti-la, Annie.
— Ele a beijou, um breve e firme contato de suas bocas e fechou os olhos. Ele
parecia mais bonito do que o David de Michelangelo, todo musculoso e
esculpido em mármore, sua expressão indicando um controle supremo. — Eu
aceito o presente que me deu e pretendo retribuir de todas as formas. Abra-se
para mim um pouco mais. Serei tão gentil quanto possível.
Ainda abalada pela profundidade do prazer que ele lhe dera, Annabel não
resistiu, ainda flutuando no relaxamento pós-clímax, deixando-o separar as
coxas dela ainda mais
— Eu nunca fiz isso antes — ele sussurrou contra seus lábios, afundando um
pouco mais, esticando sua passagem feminina com uma investida inexorável. —
Se eu cometer um erro, me perdoe.
Annabel lutou contra o desejo de rir, inadequado para o momento.
— Mas você... — Ela parou de falar com um curto arfar, no momento em
que sentiu a pressão pungente de sua virgindade sendo tomada, e então ele se
acomodou totalmente dentro dela.
Ele inteiro. Ela inteira. Juntos. Era desconfortável, mas a dor era
insignificante comparada à maravilha de estarem tão unidos, tão perto.
— Sinto muito — ele sussurrou, beijando sua bochecha, a ponta do nariz, o
canto da boca. Então ele murmurou contra os lábios dela: — Você é minha
agora... para sempre.
— Eu sempre quis ser — ela disse a ele, ferozmente triunfante, suas unhas
marcando seus ombros musculosos levemente. — Para sempre.
Ele ficou parado, dentro dela, mas sem se mover. O rosto de Derek exibia
uma expressão intensa e atípica, em desacordo com seu habitual charme
preguiçoso.
— Você ainda não disse o que quero ouvir. Este parece o momento perfeito.
Sei que sou egoísta, mas mesmo que você tenha me dado a coisa mais preciosa
que uma mulher pode dar a um homem, eu quero mais do que sua inocência,
Annie. Por favor, diga.
Ela olhou em seus olhos azuis, movida pelo apelo em sua voz.
— Eu te amo. Sempre amei. Isso era parte do problema. Mesmo quando
disse a mim mesma que te odiava, sabia que no fundo ainda amava você.
— Neste momento — ele disse suavemente, e seus olhos apresentavam um
brilho suspeito e estavam molhados. — Sinto-me como o homem mais sortudo
da terra. — Ele mudou seu peso para um cotovelo e deslizou os dedos pelo rosto
dela. — Eu sou o homem mais sortudo da terra.
O notório Conde de Manderville estava chorando?
Ele estava, ela notou, erguendo a mão para tocar o canto de seu olho,
sentindo a umidade da lágrima.
— Derek.
Os dedos longos de Derek deslizaram por seu ombro em uma carícia
persuasiva.
— Conversamos depois. De acordo?
Annabel ergueu os quadris um pouco, sem pensar, feliz que o desconforto
estivesse diminuindo, enquanto seu corpo se ajustava à sensação de plenitude e
posse.
— Acabou? — ela perguntou, sua voz sem fôlego por um motivo que ela não
entendia muito bem, uma estranha excitação substituindo qualquer sensação de
medo.
— Não. — Seu sorriso familiar surgiu, um do qual ela sentira tanto falta,
impudente e infantil, a curva de seus lábios tão inebriante quanto o copo de um
bom vinho. — Agora que a declaração mútua de nossos sentimentos está
concluída, vamos selar o compromisso como você pediu. Acredite, nós não
estamos perto de terminar. Deixe-me te mostrar.
Derek começou a se mover, fluido, poderoso, contra ela, dentro dela. Seu
membro deslizou para trás e depois investiu novamente. Para a surpresa de
Annabel, a fricção foi, a princípio, uma sensação interessante, mas logo se
transformou em algo totalmente diferente.
Maravilhosa, ela decidiu enquanto seu corpo começava a aceitar e a
responder ao ritmo dos impulsos. A mão de Derek escorregou por entre eles,
tocando-a, esfregando-a enquanto ele continuava a se mover, e ela sentiu
lampejos de prazer a cada toque, a cada golpe.
— Mais uma vez, Annie — insistiu ele, com os olhos pesados. — Para mim.
De novo.
O que ele poderia querer?, ela se perguntou freneticamente até que sentiu
aquela tensão interessante que a levava a arquear a coluna. Suas coxas se
apertaram em torno dos quadris dela, que emitiu um som muito pouco delicado,
um gemido rasgado vindo de sua garganta.
Era tão... bom. Muito bom.
Incrível.
Inacreditável.
Suas mãos se fecharam na colcha, ela parou de respirar e o mundo
desapareceu. Annabel estremeceu e se agarrou a ele, pele úmida contra pele
úmida, seu corpo tremendo de prazer. Derek gemeu e ficou imóvel, com os
músculos duros e rígidos, e ela sentiu um fluido quente pulsar dentro dela.
O quarto estava silencioso, exceto pela respiração severa de ambos. Annabel,
por qualquer motivo, começou a rir, um som fraco, porque ainda não tinha
certeza se conseguia respirar. Apertou os braços em volta do pescoço de Derek e
murmurou contra a garganta dele:
— Eu acredito em você agora. Você quer se casar comigo.
Os lábios dele tocaram sua testa.
— Eu nunca fui tão sincero sobre qualquer coisa na minha vida.
T odo Éden deve possuir sua própria serpente.
O cartão de visitas chegou em uma bandeja de prata, e Caroline o olhou
com desinteresse no início, mas quando reconheceu o nome gravado, uma
sensação de mau pressentimento fez seu estômago se contorcer. Embora
normalmente pudesse tê-lo recusado, naquele dia esta não parecia ser uma
opção, de acordo com seu mordomo.
— Ele é muito insistente, minha senhora, e afirma saber em primeira mão
que está em casa.
Como isso era possível, ela não tinha certeza, mas na última vez em que eles
haviam se falado, Franklin aparecera do nada no momento certo. Ou errado,
dependendo do ponto de vista.
Norman, longe da sua juventude, não tinha força suficiente para expulsar
Franklin Wynn, que era duas décadas mais jovem e infinitamente mais
determinado. Caroline praguejou silenciosamente, de forma muito pouco
feminina, e murmurou:
— Muito bem, traga-o.
— Não é necessário. Bom dia, minha senhora.
Assustada com a audácia de Franklin de seguir o mordomo sem esperar por
uma resposta à sua visita, Caroline olhou para o homem que passou por um
ultrajado Norman, surgindo na sala.
Seu primo – não que ela aceitasse o relacionamento de bom grado – usava
um tom de ameixa daquela vez, algo que Caroline notou enquanto ele entrava na
sala. Era impossível não vê-lo. Um casaco púrpura escuro, um colete bordado
mais claro, calça lavanda e até os sapatos eram do mesmo tom sobre as meias
brancas de seda. Seus olhos pálidos brilhavam com o gelo habitual, e sua boca se
curvou de um jeito que a fez prender a respiração em apreensão. O cabelo escuro
ondulou para longe de suas feições friamente atraentes e um lábio se abriu
levemente.
Ela não gostava de absolutamente nada na expressão dele.
— Você está de volta do campo, eu vejo. — Sem convite ou mais do que
uma breve e insignificante reverência, ele tirou sua capa e sentou-se. Muito
confortavelmente. Como se a sala pertencesse a ele, não a ela. — Essa é a
segunda viagem em um mês, não é? Incomum. Eu não sabia que você viajava
com tanta frequência.
Como diabos ele sabia para onde ela tinha ido?
— Sim — ela disse com muito pouca inflexão.
Suas próximas palavras a gelaram até os ossos.
— Como estão Rothay e Manderville?
Oh. Santo. Deus.
Sua mente tornou-se vazia por um momento. Vazia.
Pense…
Ela estava repassando sua correspondência na sala e cuidadosamente deixou
de lado a carta que lia para que ele não detectasse o tremor em sua mão.
— O senhor pode repetir?
— Os dois libertinos lascivos que são o assunto da cidade agora. Como
estão?
Franklin recostou-se triunfalmente em uma das cadeiras, com um sorriso
arrogante no rosto. Ele realmente sabia de alguma coisa ou estava blefando?
Caroline sentiu um calafrio, apesar do sol quente da manhã que entrava pelas
janelas e dava à sala arejada um brilho suave.
— Estou confusa, meu senhor. Como eu deveria saber?
— Minha especulação seria, é claro, que você, apesar de todas as aparências
que fariam qualquer pessoa duvidar, é a juíza daquela aposta arrogante. Por que
outro motivo você os encontraria em uma pequena pousada rústica e sombria?
Seu estômago revirou.
— Isso, senhor, é uma mentira.
Ele se inclinou para frente com as mãos nos joelhos.
— É mesmo?
— Claro. De onde o senhor tirou uma ideia tão absurda?
— Onde, de fato?
Seria muito difícil manter algum jogo de gato e rato enquanto seu coração
batia como os cascos de um dos cavalos fabulosos de Nicholas no páreo.
— Parece uma pergunta muito simples.
No entanto, ele não respondeu.
— Estou muito interessado em saber o resultado. Diga-me, Manderville não
conseguiu executar adequadamente? Entendo que ele chegou primeiro, mas não
ficou muito tempo. Por outro lado, você e o duque passaram várias noites juntos.
Posso supor que Rothay venceu?
Ela se sentiu fraca com a percepção horrível de que ele realmente sabia. De
todas as pessoas, Franklin era a última que ela gostaria de ter como adversário.
Tentou desesperadamente manter a compostura. Fora sua única defesa contra
Edward, e Caroline certamente precisava dela naquele momento terrível.
Em uma voz controlada, ela disse:
— Você tem alguma razão para vir aqui e lançar esta acusação escandalosa
sobre mim?
Franklin estalou a língua.
— Querida, você parece pálida de repente. Posso pegar algo para você?
Saia, sua mente gritou. Desapareça. Mas, por outro lado, ela não queria que
ele se fosse até que entendesse o propósito de sua visita em primeiro lugar.
— Estou bem, obrigada.
— De fato. A senhora está adorável. Gosto dessa cor, mas sua beleza é
inegável, não importa o que esteja usando. Ou quando não está usando nada,
tenho certeza. Suspeito que vou achá-la ainda mais atraente quando estiver nua
na minha cama, com as pernas abertas como a bela prostituta que provou ser.
A bile subiu em sua garganta. As mãos trêmulas de Caroline estavam
cerradas com tanta força que suas juntas doíam. Por um momento, não pôde
fazer mais do que olhar para o sádico e alegre rosto dele. A semelhança com
Edward fazia com que revivesse um pesadelo. Vira aquele mesmo brilho lascivo
naqueles mesmos olhos pálidos antes, e experimentou o que isso significava.
— Não importa que coisas sujas você diga sobre mim, não serei sua amante
— afirmou ela com total convicção.
— Nem eu quero que seja. — Seu tom continha algo de zombaria, e ele
sorriu de uma maneira que faria um réptil parecer atraente. — Estou propondo
casamento. Sua moral duvidosa é algo que posso ignorar quando considero a
fortuna que ganharei.
Um segundo casamento com um homem que a fazia lembrar tanto de seu
marido brutal e insensível, e cuja mera visão a fazia sentir-se mal? A ideia era
tão repugnante que ela teve que abafar uma risada histérica. A ruína social era
preferível.
Caroline olhou-o nos olhos.
— Nunca.
Seus olhos pálidos se estreitaram e suas faces assumiram um tom escarlate.
— Acho que não está compreendendo. Você não tem escolha.
— Eu tenho toda a escolha. — Ela se levantou e indicou a porta. — Por
favor, saia da minha casa.
A ênfase teve o efeito desejado, e os lábios dele se contraíram. Ele ficou de
pé também, mas não fez nenhum movimento em direção à porta. Em vez disso,
aproximou-se.
— Eu vou destruir você. Apagarei seu nome para que nenhuma anfitriã lhe
receba. Assim, nenhum homem decente olhará na sua direção a menos que
queira um caso rápido com uma prostituta infame.
— Ninguém acreditará em suas mentiras maliciosas, meu senhor. Minha
reputação virtuosa é bem conhecida.
Era um blefe, mas ela não se importava. Tudo o que queria era tê-lo longe.
— Tenho a prova dos homens que contratei para vigiarem você, minha
querida Caroline. Além de uma declaração por escrito do estalajadeiro. Ele diz
que você chegou com um homem e saiu com outro. Achou que ninguém iria
notar? Se isso faz com que se sinta melhor, a esposa do estalajadeiro achou a
chegada dramática do duque bastante romântica, mas, novamente, eu entendo
que a maioria das mulheres caia sob o feitiço de Rothay. Ela foi capaz de
descrever todos vocês três perfeitamente.
— Por que você me seguiria? — A última coisa que ela queria era continuar
aquela conversa, mas ele era claramente um inimigo, e lidar com Edward lhe
ensinara que era bom ser capaz de avaliar suas táticas. Isso a ajudou a sobreviver
com o mínimo possível de danos, ou ela esperava que sim.
— Você tem algo que eu quero.
— O dinheiro.
Ela deveria comprá-lo? Por um momento, perguntou-se se valeria a pena
entregar a fortuna que herdara para se livrar dele.
Então ele avaliou seu corpo de forma deliberadamente insultante.
— Duas coisas que eu quero — ele corrigiu suavemente.
Isso estava fora de questão.
— Saia — ela ordenou, orgulhosa por sua voz soar era firme e definitiva. —
E seus protestos de laço familiar não significam nada para mim, então, por favor,
sinta-se livre para nunca mais aparecer.
Ele deu outro passo à frente e ficou perto o suficiente para tocá-la. Ameaça
brilhava em seus olhos.
— Esta casa deveria ser minha. Assim como você. Tudo o que foi de Edward
deve ser meu. O título significa pouco sem a fortuna que ele deixou para você.
Estou determinado a ganhá-la de uma forma ou de outra.
Seu tom frio enviou um arrepio por sua espinha. Alarmada, ela ainda se
recusou a recuar.
— Eu vou chamar alguém para acompanhá-lo, meu senhor.
— Não, você não vai.
A investida repentina a pegou desprevenida. Não que ela confiasse nele, mas
senhores distintos de calças cor de lavanda, com renda nos punhos e cartões em
relevo não costumavam agarrar suas anfitriãs nem cobrir suas bocas com mãos
implacáveis.
Indignada, ela começou a lutar, tendo a terrível constatação de quão
diferentes eram seus tamanhos, e isto a inundava com lembranças horríveis de
uma situação muito similar, onde se sentia oprimida e impotente. Quando ele a
arrastou para um pequeno sofá no canto e a forçou a se deitar, ela ficou quase
lânguida, seus membros congelados, sua mente tomada pela inevitabilidade do
que poderia acontecer.
Franklin aproximou o rosto e sussurrou:
— Sua puta fria. O tempo todo olhando para mim como se eu fosse um
parasita, evitando minhas visitas, fingindo não estar em casa quando eu sabia
muito bem que estava. Meu primo devia gostar muito de você para lhe deixar
toda a fortuna, então também quero ter um gostinho. Vou insistir nisso, não
importa o quanto tente negar. Depois, você será obrigada a me aceitar ou banir a
ideia de uma vida respeitável.
Não.
Não. Ela suportara muitas humilhações para permitir que acontecesse
novamente. A delicadeza do toque de Nicholas, seu sorriso atraente e perverso, a
paixão em seus olhos escuros invadiram sua memória. Ele não propusera
casamento, mas com a extração de uma promessa de amor dela, Caroline
esperava que talvez — talvez — ele o fizesse, apesar da incapacidade de seu
corpo defeituoso em produzir um filho.
Ela mordeu, conseguindo pegar a palma da mão de seu agressor com os
dentes até provar o amargor do ferro de seu sangue. Por um momento, Franklin
afrouxou a pressão e proferiu uma maldição, e ela soltou um pequeno grito
abafado.
— Sua pequena bruxa. — O rosto de Franklin estava contorcido de raiva,
apenas alguns centímetros acima do dela, e Caroline tinha certeza de que ele
teria batido nela se não estivesse mais preocupado em mantê-la quieta. Ela se
contorceu, lutando contra o peso do seu corpo, tentando se libertar. A mão
acariciou sua coxa quando ele ergueu sua saia.
Não, não isso. Isso não. Por favor.
Ele realmente a violaria em sua própria casa? Na pequena e aconchegante
sala que ela usava como santuário para uma xícara de chá matinal e alguma
introspecção para verificar sua correspondência diária?
Não.
De repente, ela ouviu um som estridente e Franklin gemeu, soltando-a, então
ele ficou relaxado, seu peso tornando-se um fardo sufocante, sua cabeça
pendendo para o lado. Para sua surpresa, Caroline se viu encharcada de água e
pétalas de rosa.
O rosto de Annabel Reid apareceu à vista, preocupado e sombrio, seus olhos
azuis exibindo um indício assassino de indignação. Ela disse de forma sucinta:
— Desculpe pela bagunça, mas espero tê-lo matado.

A NNABEL NÃO SENTIA REMORSO ENQUANTO OLHAVA PARA O HOMEM TOMBADO NO


chão.
Caroline Wynn esforçou-se para afastá-lo de si. A outra mulher sentou-se,
trêmula. E pensar que Annabel tinha hesitado em fazer uma visita improvisada
porque ainda estava cedo para aparecer, mas sentira-se ansiosa para agradecer a
alguém que considerava uma amiga recém-descoberta e compartilhar a notícia
de seu futuro casamento.
Ela supôs, enquanto examinava os fragmentos quebrados de vidro, as
gotículas de água no carpete floral e o sangue que escorria do corte na cabeça do
homem, que entrar em um rompante e atacar o vilão constituiria um ato de
amizade.
Então, talvez seus agradecimentos tivessem sido ditos, embora de uma
maneira bastante violenta.
Lady Wynn estava horrivelmente pálida, seu rosto geralmente adorável
desenhado em uma máscara fantasmagórica. Fios soltos e úmidos de cabelos
ruivos colados ao pescoço esguio e seu vestido grudado ao corpo, graças ao
impulso impetuoso que Annabel tivera de usar um vaso para golpear seu
agressor na cabeça.
— Você está bem? — Annabel pegou um lenço e entregou-o à outra mulher.
O quadrado de renda era ineficaz em tamanho, mas era melhor que nada.
— Minha senhora! — O mordomo idoso que atendeu à porta surgiu
espantado. — Aquele homem! Aquele vil calhorda... Por Deus. Eu nunca teria
permitido que entrasse se soubesse...
— Definitivamente, não é sua culpa, Norman.
Caroline estremeceu e se movimentou para se sentar em uma parte menos
molhada do sofá, que estava mais distante da forma prostrada de Franklin. Ela
enxugou o rosto com o lenço de Annabel. Era difícil dizer se a umidade vinha de
lágrimas ou da água que mantivera as rosas frescas até ali. Ela olhou para
Annabel com olhos prateados que brilhavam.
— Obrigada.
— De modo nenhum.
Com os cílios cobertos de água, Lady Wynn murmurou:
— Não. Estou falando sério, obrigada.
Sim, definitivamente eram lágrimas. Não que Annabel a culpasse. Ela estaria
chorando baldes em circunstâncias semelhantes. Acomodou-se ao lado de
Caroline, ignorando o tecido úmido do sofá e pegou a mão trêmula da outra
mulher.
— Claro que eu ajudaria. Estava dizendo meu nome ao seu mordomo quando
a ouvi gritar. Normalmente, eu nunca faria uma visita assim de manhã cedo, mas
agora estou feliz por ter chegado.
— Seu timing foi excelente. — A outra mulher sorriu debilmente. —
Suponho que isso seja inegável. Quando percebi as intenções dele, era tarde
demais para pedir ajuda.
Ambas examinaram o homem deitado no chão como se ele fosse uma pilha
desagradável de lixo.
— Suponho — disse Annabel com uma voz questionadora — que
precisaremos fazer algo com ele.
— Eu suponho que sim. — Caroline deu uma risada frágil. — Posso
mencionar novamente como estou feliz que tenha chegado?
— Eu imagino.
Um tremor sacudiu os ombros delgados de Lady Wynn. Ela pareceu perceber
que suas saias estavam desgrenhadas e as ajustou com mais firmeza.
— Minha senhora, o que quer que eu faça? — O mordomo parecia mais do
que apenas um pouco envergonhado com o que quase acontecera com sua
senhora. — Deveríamos chamar um magistrado.
Caroline sacudiu a cabeça.
— Dê-me um momento para pensar. Temo que agora esteja envolvida em um
escândalo, não importa que decisão tome.
Annabel disse com força:
— Por favor, não me diga que vai permitir que ele escape impune. Sou uma
testemunha se ele tentar negar.
Um pequeno gemido anunciou a todos que ele já estava acordando.
— Eu o conheço. — Caroline parecia mais pálida do que nunca. — Ele
tornará tudo mais desagradável do que já é se eu não tiver cuidado. Vou ter que
lidar com isso. — Caroline endireitou os ombros, e seu tom crispado indicou que
havia tomado uma decisão. — Não procuro piorar a situação sem tentar
contornar o dano, mas posso tentar. — Ela olhou para o mordomo que
aguardava. — Por favor, você pode mandar alguém entrar para colocar Lorde
Wynn em sua carruagem e mandá-lo para casa?
— Certamente. Claro. — O homem saiu apressado, parecendo feliz por
receber uma tarefa. Ele também foi eficiente, pois em instantes dois jovens se
apressaram, puxaram o homem semiconsciente do chão e o levaram para fora do
cômodo. Annabel olhou curiosa para a mulher que tinha surgido calmamente em
sua porta menos de uma semana antes e aproveitara seu tempo e o diálogo para
dissuadi-la a fazer o que, em retrospectiva, seria um grande erro. Casar-se com
Alfred a deixaria infeliz e desolada, e talvez até arruinasse a vida de ambos.
Golpear o aparentemente desprezível Lorde Wynn na cabeça com um vaso cheio
de flores foi um bom começo para o pagamento de uma dívida alta, mas ela
estava disposta a fazer mais.
Apesar de estar encharcada com água e parecer quase devastada em seu
próprio sofá, Lady Wynn conseguiu vestir uma armadura ao seu redor. Annabel
disse claramente:
— Não vejo como você pode ficar tranquila se o homem não pagar pela
afronta. Concordo que a acusação perante um magistrado é a melhor saída. Você
não me parece o tipo de mulher que o deixaria escapar depois de fazer tão vil.
Caroline a olhou ela com aqueles notáveis olhos prateados.
— Eu não posso me proteger de qualquer eventualidade. Frank tentou me
chantagear e, quando não deu certo, me atacou. Acho que talvez fosse melhor se
eu lhe desse o dinheiro que ele tanto deseja. Talvez me deixasse em paz.
— Ou talvez a deixaria ainda mais impotente contra ele — apontou Annabel.
— Contrate um segurança. Ou vários. Torne público o jeito como ele acabou de
te tratar.
Lady Wynn sacudiu a cabeça.
— Eu gostaria que fosse assim tão simples.
Por que não era? Annabel franziu a sobrancelha. Depois de um momento,
ela disse devagar:
— Estou confusa. Você mencionou chantagem. Como ele poderia...
— A aposta — Caroline a interrompeu, parecendo resoluta, mas ainda pálida.
A aposta. Por um momento, Annabel não entendeu e então ficou claro o que
a outra mulher poderia estar dizendo.
— Você? — Annabel estava atordoada, então sentiu uma pontada de ciúmes.
— Você disse que Derek nunca a tocou...
— Ele não tocou. — Lady Wynn franziu os lábios trêmulos. — Ele está
apaixonado por você. Confie em mim, jamais me tocaria. Acho que no começo o
conde pensava que conseguiria... mas as coisas mudaram.
— Por que você faria uma coisa dessas? — Considerando as circunstâncias,
e porque Derek estava envolvido, Annabel sentiu que tinha o direito de
perguntar. — Perdoe-me, mas parece um pouco fora de seu comportamento
normal.
O sorriso de Caroline era frágil.
— Eu tive minhas razões. Diga-me, se você quisesse saber se era realmente
uma mulher sem paixão e fria, quem melhor para recorrer do que dois homens
que afirmam serem amantes excepcionais? Eu sabia dos riscos, suponho, então
fui eu que provoquei a atual situação. Ambos me prometeram o anonimato, mas
subestimei o interesse de Franklin pela minha herança. Ele quer se casar comigo
para lucrar, e quando eu recusei sua oferta encantadora, ele tentou me violentar.
Ele ficará mais vingativo do que nunca depois disso.
Annabel compreendia as implicações de ser rotulada como a juíza na aposta
comentada por todos em uma sociedade inclinada a julgar as mulheres com uma
implacável exatidão.
Lorde Wynn, de alguma forma, descobrira a participação secreta da viúva de
seu primo. Mesmo que ela e Derek nunca tivessem se relacionado, seu
envolvimento em qualquer pretexto serviria para lhe garantir uma reputação tão
ruim quanto as de Derek e do duque, se não mais por ser mulher.
Annabel murmurou:
— Eu entendo seu dilema.
Caroline levou a mão trêmula à testa e respirou audivelmente.
— Minha reputação estará em farrapos ao anoitecer. Eu poderia tentar refutá-
lo, suponho, mas não acho que seja forte o bastante para isso. Quando Franklin
começar a espalhar a notícia, todo mundo vai lembrar que eu saí da cidade ao
mesmo tempo em que Nicholas há não muito tempo. A negação seria inútil.
Annabel não pôde deixar de lembrar como a mulher sentada ao lado dela
explicara as diferenças que poderiam haver entre dois amantes em seu encontro
anterior. Se seu ex-marido era um homem horrível — e parecia ser algo genético
—, isso significava que o duque de Rothay era o homem que... Como foi que
Caroline se referira a ele? Tornou o amor mais prazeroso do que se podia
imaginar? Como Annabel agora sabia muito bem o que ela quisera dizer,
começava a se perguntar sobre o relacionamento amoroso de Lady Wynn com o
infame Rothay. Ela perguntou baixinho:
— E o duque? Certamente ele a ajudaria a negar a acusação.
Com o que parecia ser um cansaço infinito, Caroline deixou cair a mão no
colo.
— Não. Eu sou uma mulher adulta e entrei no acordo de livre e espontânea
vontade. Não vou pedir a ele que minta por mim, e, além disso, ele me deu mais
do que você poderia imaginar.
A bela e geralmente distante Lady Wynn havia se apaixonado pelo duque
diabólico, Annabel percebeu com um sobressalto. Isso estava óbvio na expressão
pungente no rosto de Caroline, gravada no curvar de sua boca e na sugestão de
tristeza em seus olhos.
— Ele deu? — ela murmurou, com novas compreensões da situação.
Caroline assentiu.
— Embora eu esperasse que seus sentimentos fossem tão fortes quanto os
meus, mas não parece ser o caso. Para falar a verdade, pensei em me mudar para
o campo. Talvez tudo o que tenha acontecido seja um sinal de que eu deveria
seguir com esse plano.
— Eu não acho que fugir vá resolver qualquer coisa — disse Annabel em
oposição, tentando pensar em uma maneira de ajudar.
Com dignidade, tranquila, Caroline discordou:
— Não acho que tenha muita escolha. Eu respondi à aposta de Lorde
Manderville e do Duque, porque queria mudar minha vida. Funcionou, mas,
como na maioria das coisas, não exatamente como planejado. — Ela se levantou,
graciosa, mas obviamente ainda pálida e abalada. — Eu odeio ser uma anfitriã
indelicada, especialmente depois do que você fez por mim, mas acho que vai
entender que preciso começar a tomar providências. Pode me dar licença?
N icholas lutou contra uma sensação incomum de inquietação e estudou o
famoso mural na parede oposta da sala de estar formal. Quem o havia
pintado? De cabeça, ele não conseguia se lembrar do nome. A cena pacífica,
representando a água e uma floresta, apresentava um ideal reconfortante, sendo
completada por um cupido brincalhão aparecendo por trás de uma coluna grega,
segurando seu arco.
A vida real não era tão simples assim. Não havia ninfas, nem querubins com
flechas bem miradas... ou talvez houvesse. Difícil de dizer. Ele fora atingido,
isso era certo, e embora tivesse chegado à conclusão de que não poderia se
recuperar da ferida, ainda precisava lidar com as consequências.
Levantou uma sobrancelha, ainda observando a figura de aparência travessa
com as folhas de louro e uma auréola em sua pequena cabeça.
— Você queria falar comigo? — Sua mãe entrou na sala, um olhar indagador
em seu rosto, tão adorável como sempre, vestida de seda rosa, seu cabelo escuro
penteado e perfeito. Diamantes brilhavam em seu pescoço e pulso.
Ele se curvou.
— Mãe. Aprecio a sua vinda.
Suas sobrancelhas se ergueram.
— Isso soou assustadoramente formal, Nicholas. Assim como seu bilhete.
Por que enviar um lacaio quando você pode ir me ver a qualquer momento?
Querido, você se importaria de esclarecer? Tem andado um pouco estranho
desde que retornou de viagem.
Quando fizesse o que tinha em mente − quando contasse a ela −, seria oficial
e o pensamento o deixava inquieto. Ela estava certa, ele provavelmente vinha
agindo como um idiota. Não conseguira fazer muitas coisas, exceto pensar na
situação. Pigarreou, preparando-se para simplesmente lhe dizer, e então
murmurou:
— Eu preciso de um conhaque. Gostaria de alguma coisa?
— Se eu gostaria de alguma coisa? — Ela afundou em um sofá de cetim e
encarou-o. — Devo confessar que sua expressão está me deixando
desconfortável.
— Somos dois — respondeu ele sombriamente e despejou um pouco de
brandy em um copo, tomando um gole significante e, em seguida, colocando o
copo de lado. A verdade era melhor.
Ele se virou, encontrou seu olhar e tomou coragem.
— Tenho algo de importante para declarar. Achei melhor que estivéssemos
sozinhos e com essa formalidade — ele apontou para o elegante salão.
— Parece apropriado para o momento. — Ela descansou as mãos no colo, as
sobrancelhas escuras levantadas. — Deve imaginar minha curiosidade. O que
foi?
— Eu estou... Bem... considerando me casar.
A boca de sua mãe se abriu ligeiramente, e seus olhos se arregalaram. Depois
de um longo momento, ela disse:
— Entendo. Devo estar mal informada. Não sabia que você estava
cortejando alguém. De fato, tenho certeza de que teriam me contado se você
estivesse. A sociedade presta muita atenção a cada movimento seu.
— Minha reputação exige discrição. Ela não está interessada em ser
associada a mim.
Sua mãe se arrepiou. Olhos escuros brilharam e seu tom foi gelado.
— Na última vez em que verifiquei, tornar-se a Duquesa de Rothay era uma
das posições mais cobiçadas da Inglaterra.
O espetáculo materno de defesa fez com que ele sorrisse ironicamente.
— O início do nosso relacionamento dificilmente correspondia às minhas
intenções atuais. Deixe-me reformular. A senhora tem uma reputação impecável,
e a minha é exatamente o oposto. Sei que está ciente disso. Sou rotulado como
um libertino e, em parte, talvez seja merecido.
Houve um breve silêncio e depois a mãe suspirou.
— Eu não vou censurar você, embora nem sempre tenha aprovado todas as
fofocas. No entanto, jovens bonitos com títulos e fortunas tendem a ter mais
tentações do que outros. Talvez seja apenas uma desculpa de mãe, mas eu
sempre descarto a maioria dos sussurros como exageros.
Ele sentiu uma pontada de diversão.
— Eu não vou confirmar nem negar nada específico e deixamos assim,
combinado? De qualquer forma, pretendo propor casamento em breve e queria
contar-lhe.
Olhos escuros brilhavam com curiosidade.
— Estou muito feliz, naturalmente. O porquê de terem mantido segredo
ainda me deixa confusa, no entanto. Qualquer família que conheço gostaria de
receber uma corte honesta sua. Há uma diferença entre o que um homem faz em
particular quando é solteiro e quando decide escolher uma esposa. Eu vi como as
matronas da sociedade exibem suas filhas na sua frente, apesar de sua reputação.
Quem é ela?
Essa era a parte complicada. Primeiro de tudo, ele não tinha certeza se
Caroline o aceitaria. Ela disse que não queria se casar novamente, mas também
disse que o amava. Havia também o outro problema a resolver.
Ele disse baixinho:
— Caroline Wynn.
— A jovem viúva do visconde? — Sua mãe ficou muito quieta, e havia
surpresa em suas feições.
— Ela mesma.
Ela digeriu.
— Ela é adorável... Bem, ela é mais do que adorável, então eu posso
entender a atração, mas…
— Mas? — ele perguntou quando ela hesitou.
— Eu não sei. Estou bastante surpresa com isso, Nicholas.
— Não é um jogo vantajoso em alguns aspectos, percebo isso. No entanto,
antes de apontar linhas de sangue, pedigrees e alianças sociais, deixe-me dizer
que nada disso nunca me atraiu de qualquer maneira, e já me manifestei sobre o
assunto antes, creio eu. — Sua voz era ríspida, então ele tentou moderar o tom.
— Já pensei muito nisso, acredite em mim.
Sua mãe balançou a cabeça, a luz do fim da manhã destacando os fios
grisalhos do cabelo dela.
— Eu não ia dizer nada disso.
— Não?
Nicholas levantou uma sobrancelha e se preparou para a objeção. Sim, ele
era Rothay, poderia fazer o que quisesse e sua família pouco poderia influenciar,
mas, ainda assim, ele os amava e queria sua aprovação. Preocupava-se com
Caroline também e queria que eles os apoiassem. Ela suportara negligência
suficiente de sua própria família, pelo que lhe contara. Ter seus parentes contra
ela a machucaria mais, e ele simplesmente não poderia aceitar isso.
— Eu ia perguntar como você a conheceu. Não ouvi uma única insinuação
sobre um relacionamento.
Aquela maldita aposta. Bem, ele não iria confessar a verdade. Disse, em vez
disso:
— Nós frequentamos os mesmos círculos sociais. A senhora a conhece.
— Esse é o meu ponto. Eu a encontrei. Conhecê-la é algo completamente
diferente. Ela é bem distante.
Nicholas balançou a cabeça, lembrando-se do carinho e da franqueza de
Caroline, isso sem mencionar o lado apaixonado que ela escondia do mundo
com tanto cuidado.
— Ela é tudo menos distante quando você a conhece. Além disso, é
inteligente, estudada e articulada. Não há nada de mercenário nela, então minha
fortuna não tem nada a ver com isso, e duvido que meu título seja importante. —
Ele passou a mão pelo rosto e suspirou: — Não tenho nem certeza se ela vai me
aceitar quando eu pedir.
— Por que diabos ela não aceitaria? — Sua mãe parecia indignada.
— Sua primeira experiência com casamento foi um desastre. Ela me disse
que não pretende voltar a se casar. — Ele parou por um momento e depois
acrescentou com uma voz calma: — O que me traz outro problema que eu tenho
certeza de que irá lhe ocorrer, se já não tiver ocorrido. Há a possibilidade de ela
ser estéril. Durante o curso de vários anos de casamento, ela nunca concebeu.
Não houve resposta, apenas silêncio, e Nicholas tomou outro gole de
conhaque. Ele continuou:
— Eu esperava que você aprovasse mesmo assim. Althea vai gostar dela. A
senhora vai gostar dela, tenho certeza. Mais importante, eu gosto dela. Não sou
indiferente ao meu dever, mãe. Percebo que o título e a propriedade iriam para
um primo distante, caso eu não consiga ter um filho. É um diabo de um dilema
ter que decidir se vale a pena sacrificar a felicidade pessoal ao me casar com
alguma jovem que pode ou não me dar um filho do sexo masculino. Nunca achei
a ideia atraente, muito menos agora. Eu só tenho essa vida.
— E ela vai completá-la? — a pergunta foi feita suavemente, o olhar da mãe
fixo em seu rosto.
Nicholas não fizera nada além de ponderar sobre o assunto desde seu retorno
de Aylesbury.
— Acho que sim. Quando me vi contemplando a ideia de poder vê-la todos
os dias, comecei a questionar meu nível de desapego. Nós conversamos. Na
primeira vez em que a encontrei, ela citou Alexander Pope, e fiquei
impressionado com a falta de afetação e de flerte. Nós discutimos as últimas
mecanizações do departamento de guerra, debatemos sobre as obras de Horace e
Virgil, e — ele não pôde evitar, sorriu lembrando a discussão — nós dois
gostamos da obra de Mozart, mas ela acha que Hayden é o maior mestre.
— Eu... entendo. — foi uma declaração tranquila.
Ela entendia? Ele queria que ela entendesse.
— Combinando isso ao nível de entusiasmo que sinto por seu inegável apelo
feminino, foi uma espécie de revelação. Ela me interessa.
Sua mãe empertigou-se, um olhar aguçado no rosto.
— Esse sorriso singular me diz que você fala sério.
— Eu acredito que sim — ele afirmou deliberadamente. — Mas estou
preocupado. Se eu pedir, e tiver sorte o suficiente de ela concordar, quero que ela
seja aceita de maneira plena e calorosa. Não posso sujeitá-la a mais indiferença
ou mágoa.
— E você é protetor. Que sinal promissor. — A duquesa viúva abriu, para
seu alívio, um sorriso radiante, embora um pouco hesitante. — Querido, estou
muito feliz por você, é claro. Qual mãe não quer que seu filho seja feliz?
— Você aprova?
Lá estava ele, um homem crescido, um influente duque, desesperado pela
aprovação de sua mãe. Ainda assim, era importante para ele que sua família
abraçasse o compromisso sem reservas.
Ela ergueu as sobrancelhas de um modo arrogante, como só ela conseguia
fazer, decidida a amenizar o clima da conversa.
— Se ela recusá-lo, deixe-me falar com ela. Ela vai concordar, marque
minha palavra. Quanto a possibilidade de não terem filhos, podemos apenas
esperar e ver. Embora todos geralmente culpem a mulher, pode ser que o marido
dela tenha sido o culpado. Talvez não seja um problema. Neste assunto, a
fertilidade não é uma garantia, de qualquer maneira. O conde de Wexton tem seis
filhas e nenhum filho, pobre homem. Só os casamentos delas vão levá-lo à
falência, tenho certeza.
A ideia de seis mulheres jovens para administrar era um pouco assustadora, e
Nicholas teria dito alguma coisa, se, por trás dele, alguém não tivesse pigarreado
alto. Ele se virou para ver um dos lacaios ali, um olhar constrangido no rosto.
— Imploro seu perdão, sua Graça, mas há um jovem lá fora que insiste em
vê-lo imediatamente. Ele se recusa a declarar qual é o assunto, mas pediu para
informar que o nome dele é Huw. Isso foi tudo o que me disse. Eu o teria
mandado embora, mas ele jura que o senhor desejará falar com ele.
O jovem motorista de Caroline fora vê-lo? Isso não era não convencional o
suficiente para deixá-lo alarmado, e a palavra imediatamente não ajudou em
nada. Nicholas assentiu.
— Por favor, leve-o ao meu escritório e diga que o encontrarei lá.
— Sim, sua graça.
Nicholas lançou à sua mãe um olhar de desculpas, um tipo diferente de
ansiedade substituindo sua apreensão anterior por contar a ela sobre essa nova
reviravolta em sua vida. Ela fora extraordinariamente favorável, então, suas
dúvidas foram amenizadas. Ele se aproximou rapidamente e inclinou-se para
beijá-la na bochecha.
— Perdoe-me, mas tenho a sensação de que é importante. Vejo você no
jantar.
— Há algo errado? — perguntou ela, lendo corretamente a expressão dele,
franzindo a testa em preocupação.
— Eu espero que não — ele respondeu sombriamente. — Desculpe.
Nicholas caminhou rapidamente pelo chão polido do corredor, as botas
tocando em staccato agudo, a sensação de mau presságio. Não deveria ser nada,
ele se tranquilizou. Talvez Caroline quisesse vê-lo, mas não quisesse enviar um
pedido por escrito, então, usou Huw como meio de comunicação. Afinal de
contas, a separação deles depois de Aylesbury deixara caminho aberto. Ele não
propusera casamento, principalmente porque não estava preparado. Não tinha
um anel, nem discurso preparado, nenhuma ideia, mesmo que estivesse
contemplando uma mudança tão permanente em sua vida. Caroline não pedira a
ele uma declaração similar de amor nem mesmo uma promessa de uma união
futura, e como seus sentimentos estavam bem tumultuados, ele aceitou com
gratidão seu silêncio sobre o que aconteceria no futuro.
Mas no caminho de volta para Londres, ele percebeu a profundidade de suas
emoções. Como seria incapaz de vê-la em público e ficar longe? Ansiava
acordar todas as manhãs com ela ao seu lado. Durante todos aqueles quilômetros
ele contemplou a palavra casamento com certeza crescente. Com o problema da
possível desaprovação de sua mãe fora do caminho, tudo o que precisava fazer
era persuadir Caroline de que poderia ser um marido adequado.
Como ele disse à sua mãe, Caroline não estava interessada em seu status
financeiro ou social, mas ele sabia muito bem que não gostava de sua reputação.
Só isso − além de sua oposição a abandonar o controle sobre sua própria vida −
já poderia fazê-la recusá-lo. Infidelidade era um dado à parte, especialmente para
os homens. Certamente ele nunca considerara a lealdade, exceto nos termos mais
abstratos, mas, novamente, nunca a prometera a qualquer mulher.
Ele ofereceria a Caroline, se ela o aceitasse.
Seria amor?
Huw esperava à beira da lareira, segurando o chapéu nervosamente nas
mãos, o cabelo escuro encaracolado despenteado, um olhar infeliz no rosto.
Nicholas entrou em seu escritório, fechou a porta atrás de si e disse sem
preâmbulo:
— O que há de errado?
— Minha... minha senhora não sabe que estou aqui, Sua Graça — o jovem
gaguejou. — Eu tomei a decisão de vir.
Outra pontada de mau presságio o atingiu. Nicholas foi até a escrivaninha e
sentou-se atrás dela, indicando uma cadeira com um movimento da mão.
— Entendido. Isso é entre nós, então. Conte-me.
Huw parecia desconfortável, olhando para a poltrona de veludo coberta
como se tivesse medo de que ele a sujasse, mas então se empoleirou na borda e
limpou a garganta.
— É ele, senhor. Lorde Wynn, o bastardo. Pensei que o senhor deveria saber.
Nicholas lembrou-se de como Caroline mencionara o homem com desgosto.
Ele disse secamente:
— O que tem Lorde Wynn?
— Ele está sempre se esgueirando. Ela não quer vê-lo, então ele espera, ou
manda um de seus lacaios esperarem e verem se ela está em casa. — As mãos do
jovem esmagaram seu chapéu, as juntas visivelmente embranquecendo. — E
nesta manhã, ele entrou, passando por Norman, e então ele... ele... bem, sua
graça, não há uma boa maneira de dizer isso. Ele tentou fazer o que queria com
ela, e fez.
Nicholas sentiu uma chama de raiva explodir em seu cérebro.
— Ela está ferida?
— Não, senhor. Uma jovem dama o atingiu bem na cabeça. Jones e eu o
jogamos em sua carruagem e pedimos ao cocheiro que levasse o lixo para casa.
Imagino que ele esteja lá agora, amargando uma terrível dor de cabeça. Mas logo
estará de volta para importuná-la, marque o que digo. Em roupas extravagantes
ou em trapos, conheço sua espécie. Ele quer o dinheiro dela. Não é segredo.
Como minha senhora não tem interesse, ele queria arruiná-la e forçá-la a se
casar.
Nicholas mal percebeu que se colocara de pé.
— Obrigado por me contar, Huw — acrescentou com promessa letal em sua
voz: — Vou cuidar de Lorde Wynn.

M ARGARET OLHOU PARA D EREK COM CENSURA RESIGNADA SOBRE A BORDA DA


xícara de chá.
— As palavras, quanto mais cedo melhor, me levam a certa conclusão.
Ele ergueu as sobrancelhas, feliz demais para se sentir devidamente
castigado por sua implicação. Até o dia refletia seu humor, ensolarado e quente,
a tarde tão agradável e a sala informal com um brilho dourado. Ele disse de
forma neutra:
— Esperei por Annabel por muito tempo. Você me culpa por querer um
casamento rápido agora que ela concordou?
Sua tia suspirou.
— Suponho que não. Uma licença especial pode ser providenciada. Ainda
assim, seu casamento apressado logo após o noivado rompido vai causar uma
onda de fofocas.
Thomas, que estava em silêncio até agora, riu.
— Não tenho certeza de que Derek esteja preocupado com o que as pessoas
irão dizer, minha querida. Além disso, a felicidade conquista as opiniões das
pessoas que logo verão que se trata de um caso de amor, então, logo perderão o
interesse. As controvérsias mantém a sociedade em polvorosa. Felicidade
conjugal aborrece a todos.
Uma verdade cínica, mas precisa, pensou Derek.
— Estou feliz que não haja objeção, então. Que tal amanhã à tarde?
Margaret pareceu aturdida, e sua xícara de chá chacoalhou no pires.
— Derek! Amanhã?
— Eu conversei com Annabel e ela concordou que desde que eu pudesse
garantir os arranjos, ela queria prosseguir. Amanhã foi o mais cedo possível.
— Quanto custou isso? — Thomas parecia divertido.
— Uma pequena fortuna, aposto.
O preço da conveniência nunca fora pequeno, mas Derek não se importava.
Annabel valia a pena, e ele descobriu que se sentia impaciente para tê-la
vinculada a ele em todos os sentidos, incluindo a legalidade do enlace.
— Eu não me importei — ele admitiu, sem se preocupar em dissimular. —
Quem poderia pensar em algo tão mundano quanto o dinheiro em comparação a
tê-la como minha esposa?
Margaret e Thomas trocaram um olhar. Era uma comunicação silenciosa,
obviamente íntima. Thomas estendeu a mão e pegou a de sua esposa, elevando-a
aos lábios por um momento.
— Eu acredito — ele disse —, porque sei exatamente o que você quer dizer.
E depois dos muitos anos de casamento, Margaret ainda corava.
— Você sempre foi irremediavelmente sentimental.
— Suponho que sim — Thomas respondeu com um pequeno encolher de
ombros impenitente. Ele se virou para Derek. — Você tem minha permissão para
se casar com Annabel, é claro, mas sempre a teve. Era sua própria mente que
precisava aceitar a ideia.
A chegada do objeto de sua conversa, em uma confusão de musselina,
cabelos dourados e agitação sem fôlego interrompeu a discussão, e Derek se
levantou imediatamente. Ele sorriu, mas Annabel não sorriu de volta.
Seu estômago se revirou. Será que ela havia mudado de ideia? Depois da
paixão doce e calorosa que compartilharam...
— Olá — Ela lançou a Margaret e Thomas uma saudação superficial. —
Desculpem, estou atrasada. Estava com uma... amiga. Eu... bem, Derek, posso
falar com você?
Ele fora surpreendido pela ausência dela, mas Margaret dissera que ela saíra
com sua aia para resolver alguns assuntos, e sua tia não parecera preocupada,
então, ele não pensara muito sobre isso.
— Claro — sua voz soou um pouco grossa.
Annabel agarrou sua mão.
— Um passeio pelo jardim, então?
Intrigado, ele assentiu, curvando-se para Thomas e Margaret, que pareciam
igualmente surpresos, e permitiu-se ser conduzido para o pequeno jardim
cercado por muros, atrás do sobrado. Sentindo-se abraçado pelo sol e pelas
árvores floridas, enquanto seguiam pelos caminhos de pedra, reparou que a
expressão da jovem que segurava sua mão era incongruentemente sombria.
Mas era promissor que ainda mantinha seus dedos entrelaçados.
— Longe da casa — ela sugeriu. — Eu não quero ser ouvida.
— O que você quiser, é claro.
— Eu vou explicar, apenas me dê um momento. — Ela franziu o cenho.
Como ele seria capaz de andar de mãos dadas com ela até a beira de um
penhasco, não discutiu. Depois de um momento, quando estavam perto dos
fundos, no canto mais afastado da casa, ela soltou a mão dele e se virou em sua
direção.
Seus olhos azuis, os que ele achava tão adoráveis, com aqueles cílios
dourados- escuros e o profundo tom de cobalto, encaravam-no acusadoramente.
— Precisa admitir que você começou com isso. Precisa ajudá-la agora.
Não tinha sequer se casado, mas já se via em apuros.
Místico, ele perguntou:
— Ajudar quem e começou o quê?
— Eu sei que Lady Wynn foi quem julgou sua aposta.
Maldito inferno. Ele abriu a boca para dizer algo que nem sabia o que era,
mas Annabel o impediu.
— Ela me disse que nada aconteceu entre vocês. Considerando seus
sentimentos pelo Duque e suas razões para entrar na disputa, acredito nela. O
problema é que o que você e Rothay propuseram como um desafio lúdico agora
ameaça destruí-la. De certa forma, você é responsável e, indiretamente, eu
também sou.
Ele era culpado pela aposta, mas não tinha ideia do que ela estava falando.
— Destruí-la como?
— Lorde Wynn sabe que ela se ofereceu para ser sua juíza. Posso dizer em
primeira mão que o homem é um calhorda sem consciência. Ele ameaçou
arruiná-la socialmente, mas não antes de violá-la. — Annabel fez uma pausa e
depois encolheu os ombros magros. — Receio que eu o tenha deixado
inconsciente.
— Pode repetir? — Derek olhou para sua noiva em consternação. —
Annabel, você se importa em esclarecer o que está falando?
Sua história, contada em palavras rápidas e concisas, fez com que sentisse
uma onda de raiva quando ouviu falar sobre o dilema de Caroline e as intenções
nefastas de Wynn. Quando Annabel terminou, Derek ficou furioso e só podia
imaginar como Nicholas se sentiria.
— Se ele seguir com esta ameaça, Wynn vai cometer o último erro de sua
vida miserável — disse ele por entre os dentes. — Nick vai arrancar cada
membro dele. Mais do que isso, ele vai matá-lo.
— Eu certamente espero que sim. — Entre os jardins, com sua figura
feminina cercada por folhas verdes e flores delicadas, Annabel parecia não
apenas indignada, mas feroz. — Ela se recusa a contar a ele, infelizmente. Sugeri
isso, mas ela não quis envolvê-lo.
— Por que não?
Derek entendia as mulheres quando se tratava de seus corpos, sua
suscetibilidade a gestos românticos, sua sensibilidade a um olhar, mas ele nunca
pretendera entender seus pensamentos.
— Ela não quer atraí-lo para ela desse jeito. Quando e se ele for procurá-la,
ela prefere que não seja porque sente a responsabilidade de salvá-la do que ela
chama de sua própria loucura, mas porque a ama e a reconhece de livre e
espontânea vontade. Eu simpatizo com suas ideias.
Um sorriso irônico curvou seus lábios.
— Ainda assim deseja que eu interfira, correto?
— Com certeza.
— V ocê entendeu mal — disse Nicholas em seu tom mais aristocrático, frio e
implacável —, não me importo se Lorde Wynn quer me receber ou não. Eu vou
vê-lo.
O criado registrou corretamente tanto o olhar em seu rosto quanto a
convicção em sua voz. Ele era jovem e quinze centímetros mais baixo do que
Nicholas, e sua expressão consternada mostrava que ele se sentia mal preparado
para lidar com a situação. O lacaio limpou a garganta e disse:
— Ele está indisposto, sua graça.
— Imagino que esteja e sei os motivos. No entanto, anuncie-me e diga a ele
que vou procurar pela casa inteira até encontrá-lo, se ele for muito covarde para
descer.
Diante de tal determinação, o criado concordou, provavelmente porque,
pensou Nicholas quando o jovem recuou e segurou a porta para entrar no
vestíbulo, um homem como Wynn não inspirava muita lealdade.
Ele foi levado para o que parecia ser uma sala de visitas formal, com mobília
sobressalente e não muito pobre, mas bem desgastada. Por saber que Caroline
tinha herdado a casa de Wynn, o lugar provavelmente era alugado. Nicholas não
se sentou, mas ficou em pé junto à lareira e olhou para o relógio no canto. Disse
a si mesmo que daria cinco minutos a Wynn e controlou a vontade de andar de
um lado para o outro.
Muito raramente perdia a paciência. Seu autocontrole era em parte inato, em
parte aprendido, porque sua posição e responsabilidades exigiam isso, mas até
elevar a voz não era uma ocorrência comum. Claro, ele realmente não conseguia
se lembrar de quando se sentira tão cego de raiva anteriormente.
O homem tocara em Caroline. Mais do que isso, ele sem dúvida a assustara.
— Que diabos você quer, Rothay? — a pergunta foi rosnada da porta. —
Como se atreve a forçar sua entrada na minha casa?
Nicholas virou-se, focando o olhar no homem que entrava na sala, notando
com satisfação que sua pele parecia um pouco branca ao redor da boca, como se
estivesse com dor.
Ele disse agradavelmente:
— Estou tentado a te matar.
A expressão de desprezo no rosto pálido do outro homem desapareceu.
Depois de um momento, ele falou:
— Não faço ideia do porquê. Não sei o que aquela puta fria disse a você,
mas...
Nicholas se adiantou ao insulto.
— Eu ainda posso matá-lo — disse ele reflexivamente, estreitando os olhos,
sua postura inegavelmente ameaçadora. —, considerando meu atual estado de
espírito, então, aconselho-o a ajustar sua forma de tratamento quando se referir a
Lady Wynn. Seria um prazer rasgá-lo em pequenos pedaços com minhas
próprias mãos.
Wynn endureceu e cuspiu:
— Por causa de uma mulher? Você?
— Por causa desta mulher, sim.
— Ah, por favor, Rothay, ela não é apenas mais uma das suas parceiras de
cama casuais? Você as muda como troca de camisas. Além disso, acho difícil
acreditar que isso possa afetá-lo. Ela é uma prostituta, oferecendo-se para abrir
as pernas para dois homens diferentes. Por que você se importaria se ela me
oferecesse os mesmos favores?
Nicholas sentiu as mãos se fecharem em punhos, e uma neblina vermelha
momentaneamente obscureceu sua visão.
Ele respirou fundo, sabendo que se tocasse Wynn naquele momento, poderia
simplesmente quebrar-lhe o pescoço.
Por entre dentes, ele disse:
— Se você tivesse a menor noção do quanto estou tentado a desconsiderar o
fato de que assassinato é crime na Inglaterra, fecharia sua boca neste momento.
Porém, eu ainda posso visitá-lo e matá-lo de madrugada amanhã de manhã sem
mais remorso do que se pisasse em um inseto. Agora vai ficar quieto e ouvir o
que tenho a dizer, entendeu?
Por um momento, ele se perguntou se o outro homem, que não se sentara,
viraria-se e fugiria. Lorde Wynn parecia finalmente compreender o perigo que
corria, pois perdeu aquele ar de bravura e adquiriu uma cor doentia.
— Bom, assim é melhor — Nicholas disse suavemente. — Acho que nos
entendemos. Aqui está a barganha. Você vai ficar longe dela. Bem distante. Não
olhe para ela, não entre em contato com ela, se ela comparecer a um baile e você
estiver lá, saia imediatamente. Pelo menos nos próximos meses, sugiro que passe
alguns dias no campo até que meu temperamento esfrie. Se estiver na cidade e
nos depararmos, posso não responder pelo meu autocontrole. Acho que essa
parte é bastante clara.
Wynn abriu a boca como se objetasse, mas sabiamente a fechou. Seus olhos
pálidos haviam se reduzido a fendas e suas mãos tremiam. Os homens que
aterrorizavam as mulheres raramente eram qualquer coisa além de covardes, e
Wynn não era exceção.
— Deixe-me continuar. Se você disser uma palavra vil sobre ela, eu vou te
destruir. Socialmente, financeiramente, de todas as maneiras possíveis. A família
Manning tem influência em todos os cantos da Inglaterra e também no
Continente. O príncipe regente é meu amigo. Você será evitado, destituído e
banido. Se lhe agrada testar minha palavra, espalhe o boato de que Caroline
estava envolvida de alguma forma com essa aposta.
— Se ele o fizer, vai responder a mim também.
A interjeição preguiçosa tinha um tom de aço, e Wynn estremeceu ao som de
outra voz, voltando-se na direção dela.
— Manderville — ele sufocou, parecendo positivamente doente. Havia gotas
de suor em sua testa.
Era Derek. Parado na porta, com um ombro encostado no batente.
— Seu lacaio não parecia inclinado a recusar minha entrada, com Nick já
aqui. Vejo que tudo parece muito civilizado, embora eu admita que, quando ouvi
o duque de Rothay chegar, esperava derramamento de sangue.
— Isso ainda pode acontecer — disse Nicholas, enunciando cada palavra
cuidadosamente — se ele insultar a dama novamente. O que te traz aqui, Derek?
— Minha noiva — Derek fez o anúncio com desenvoltura casual, olhando
para Wynn. — Acho que vocês se conheceram esta manhã, quando ela lançou
um vaso de flores contra sua cabeça dura, Wynn. Foi-me ordenado que também
desiludisse este senhor de qualquer ideia de que poderia incomodar Lady Wynn
e não sofrer por isso. Vejo que você chegou antes.
— Eu poderia apresentar queixa contra sua noiva por agressão — disse
Wynn, mas foi uma tentativa fraca de desafio, desmentida pelo olhar em seus
olhos. — O que a moça viu foi um momento romântico e entendeu mal. Caroline
me seduziu e, quando fomos pegos, ela negou. Eu...
Nicholas moveu-se, então, em dois passos, pegando o homem pela camisa e
batendo-o contra a parede com tanta força que a pintura acima da lareira
estremeceu.
— Acho que você está indo longe demais.
Wynn engasgou quando Nicholas ergueu o antebraço. O rosto do homem
ficou vermelho, e sua respiração sibilou quando Nicholas aplicou pressão
suficiente em sua garganta para garantir que sua sinceridade não fosse mal
interpretada.
Depois de um momento, Derek disse:
— Eu sei que matá-lo tem um apelo definitivo, mas se você pretende deixá-
lo viver sua vida miserável, é aconselhável que o solte agora, Nick.
Seu amigo estava certo, e Nicholas conseguiu afrouxar o aperto com esforço,
recuando. Wynn caiu, sua mão massageando a traqueia, seus olhos pálidos
lacrimejando. Nicholas disse secamente:
— Lembre-se de cada palavra que eu disse. Caroline está sob minha proteção
de todas as maneiras, incluindo meu nome.
— Eu acho que você se fez entender — observou Derek secamente.
Eles saíram juntos rapidamente da casa, passando pelo lacaio nervoso. Na
rua ensolarada, do lado de fora, Nicholas olhou para o amigo.
— Obrigado por querer intervir em nome de Caroline.
— Eu fui lhe contar sobre os eventos desta manhã, mas aparentemente você
já tinha sido informado. — Derek sorriu. — Sinto-me um pouco inútil, afinal,
mas poderia tê-lo ajudado a se livrar do corpo. Duvido que sentissem falta dele.
— O motorista dela foi me contar. Huw parece ter uma afeição genuína por
ela, e sou grato por isso.
— Você também tem afeição por ela, se sua ida a Aylesbury ou seu estado
atual de afronta forem indicações. — Derek fez uma pausa. — Quando disse que
ela estava sob a proteção do seu nome, eu interpretei corretamente?
— Ela ainda não concordou, mas tenho esperanças de que Caroline se case
comigo. — Nicholas arqueou uma sobrancelha. — Falando nisso, ouvi você
falar sobre uma 'noiva'. Quando isso aconteceu e quem diabos ela é?
— Isso aconteceu recentemente e é um resultado direto da aposta, de várias
maneiras. Annabel me fez reexaminar algumas prioridades da minha vida.
Nicholas registrou surpresa.
— A jovem protegida do seu tio?
— Ela mesma. — Derek hesitou e encolheu os ombros. — Eu sou
apaixonado por ela há algum tempo, mas era teimoso demais para admitir isso.
Quase a perdi.
— Entendo. — Nicholas conhecera a srta. Reid, é claro, mas, em vista do
fato de que ela era uma jovem elegível, ele evitara mais associações. Por saber
que ela ficara noiva recentemente, ele agora entendia algumas das preocupações
de Derek nos últimos meses.
Olharam um para o outro enquanto uma carruagem passava por eles na rua, o
calor da tarde tornando-se um casulo, mas havia diversão mútua iluminando seus
rostos. Nicholas disse:
— Estou feliz por você. Ela é uma garota adorável.
— Estou feliz por você também.
— Ainda não está resolvido — Nicholas murmurou —, mas espero que em
breve esteja. Vou mantê-lo informado.
Ele entrou na carruagem e bateu no teto.

Q UE DESASTRE . N ÃO APENAS O DIA , MAS A VIDA DELA .


Caroline olhou no espelho, vendo o resto de lágrimas em suas bochechas, o
estado desordenado de seu cabelo e o olhar vazio em seus olhos. Começara a
resolver algumas coisas, enviando uma carta a um corretor para colocar a casa à
venda. Depois subira para se deitar e acabou caindo em um sono inquieto.
Era difícil definir suas emoções agitadas, ela pensou enquanto arrancava os
grampos de seus cabelos e pegava uma escova. A catástrofe havia acontecido,
lembrou-se disso enquanto estremecia ante a lembrança das mãos contundentes
de Franklin sobre ela. Mas apesar de ter sido resgatada pela desenvoltura de
Annabel, não tinha ilusões de que o primo de seu marido manteria seu
conhecimento sobre seu papel na aposta em segredo.
A inegável verdade sobre seu relacionamento com o Duque Diabólico seria
tornada pública e, mesmo que Derek Drake negasse qualquer envolvimento com
ela, toda a alta-sociedade saberia que ela se oferecera. Seu status passaria de
inatingível para promíscuo no momento em que o rumor começasse, e ela
duvidava que Franklin fosse perder muito tempo.
Uma parte traidora e ilógica de sua mente não se importava com as fofocas.
Quando colocava na balança a possibilidade de nunca se deitar nos braços de
Nicholas, nunca provar seus beijos sedutores, nunca sentir o calor de seu
sorriso... Bem, o custo do ostracismo social era alto, mas ela sabia que valia a
pena. Ela deixara de simplesmente existir para viver.
Ela murmurou em auto zombaria abstraída:
— Querida, maldita, eletrizante cidade, adeus! Teus tolos não mais vou
provocar: Este ano em paz, ó críticos, cidadãos, ó prostitutas, durmam em paz.
O “Adeus a Londres” de Pope assumiu um novo significado cínico, apesar
de ser uma de suas obras favoritas.
O som da batida em sua porta foi superficial, porque esta se abriu antes que
ela pudesse responder. Ao se virar, Nicholas entrou no quarto, parecendo alto e
muito masculino no santuário de cores pastéis e delicadas mobílias.
Ela não pôde evitar um pequeno suspiro de surpresa por sua audácia, embora
já o conhecesse o suficiente para esperar atos tão imprudentes. A situação
tornava-se mais escandalosa a cada instante. Agora o duque diabólico estava em
seu quarto. Toda a criadagem deveria estar curiosa.
E amanhã, sem dúvida, toda Londres estaria falando sobre isso.
Perversamente, ela sentia-se feliz em vê-lo, apesar da arrogância de sua
chegada em seu quarto sem ser convidado. Ele ficou ali parado, com o cabelo de
cor escura levemente embaraçado, os olhos exibindo uma luz sombria. Como
sempre, ela ficou impressionada com o poder magnético de sua presença. Se
tivesse tentado falar, não teria ideia do que dizer. Sua chegada imprudente e
inesperada a deixara completamente sem palavras.
Ele falou primeiro, dando uma explicação simples:
— Eu precisava ver você. Para ter certeza de que estava ilesa.
Quando ela não disse nada, ele acrescentou:
— Huw me contou o que aconteceu.
Caroline encontrou coragem para falar, ainda chocada pela invasão de seu
quarto.
— Ocorreu a você que eu poderia descer se me fosse enviada a notícia de
que desejava me ver?
Nicholas apenas sorriu com a indignação em seu tom de voz.
— Se tivesse pensado nisso, talvez. Eu não queria esperar.
Por que ele tinha que fazer isso com ela? Logo quando estava tão vulnerável
e abalada.
— Você não deveria estar aqui — ela disse, mas não foi com convicção. Sua
mão começou a tremer, e ela rapidamente soltou a escova. — Eu nem estou
vestida.
— Gosto mais de você despida — ele respondeu com um olhar fascinante, e
cálido. Aproximou-se dela. — Aquele desgraçado te machucou? Todo mundo
diz que não, mas achei que você poderia precisar de mim.
Ela precisava dele? Deus, sim. Mais do que imaginara, e todas as objeções
por ele ter simplesmente entrado em sua casa e invadido seu quarto
desapareceram. Se tudo já estava em frangalhos, por que se importaria se todos
soubessem que Nicholas se achava no direito de entrar sem ser anunciado
enquanto ela vestia apenas seu chemise? Independentemente de suas ações, toda
Londres ouviria sobre sua associação em breve, então, o conforto de seus braços
era muito tentador.
— Eu... — ela começou, mas parou, sem ter certeza do que dizer. Um
pequeno soluço escapou.
Ela raramente chorava. Desde a primeira noite de seu casamento, descartara
as lágrimas, considerando-as como inúteis.
— Meu amor — Nicholas estava lá, erguendo-a no colo e acomodando-se no
pequeno banco em frente à sua penteadeira, embalando-a em seus braços como
se ela fosse algo precioso e quebrável. — Acabou. Eu cuidei... dele. Você está
segura. Comigo.
Ele tinha acabado de chamá-la de seu amor? De todas as palavras ternas que
sempre fluíam tão facilmente de seus lábios, Nicholas nunca usara aquelas antes.
Caroline encostou a cabeça no peito dele e se permitiu o luxo de pensar que ele
falava sério. Seu cheiro evocava memórias de interlúdios idílicos e prazeres
luxuriosos.
Um momento depois foi que registrou o resto de sua fala.
— O que você quis dizer com ter cuidado dele?
Nicholas pressionou a boca na sua têmpora em uma carícia suave.
— Há algumas vantagens em ter uma posição social e ser rico. Eu visitei o
senhor Wynn esta tarde. Digamos que chegamos a um entendimento. Ele ainda
está vivo, por enquanto, de qualquer maneira.
Chocada, ela se remexeu, levantando a cabeça para poder olhar para o rosto
dele.
— Nicholas...
Ele realmente quisera dizer o que tinha acabado de dizer? Conseguia
enxergar a raiva em seus olhos, apesar do aperto terno de seus braços.
Seu sorriso não mostrava nenhum traço de humor.
— Estou confiante de que ele foi convencido, especialmente quando pus
minhas mãos em sua garganta. Suponho que minha reação foi bárbara, mas
justificável, considerando meus sentimentos por você. Eu o teria processado e
punido, exceto que tinha certeza de que você não iria querer suportar a
publicidade da provação. O mesmo problema se daria ao expô-lo. Seu nome
ainda seria divulgado, e eu te prometi discrição.
O coração de Caroline iniciou um pulsar lento e forte. As coxas de Nicholas
pareciam feitas ferro sob seu corpo, e os braços dele eram fortes e seguros.
…meus sentimentos por você…
Nicholas sussurrou em seu ouvido, com uma respiração cálida:
— Você não disse que me ama por causa de quem eu sou, não do que sou?
Não o duque, mas o homem de verdade.
Ela podia sentir seus lábios tremerem enquanto tentava sorrir.
— Você sabe que sim. — Ele a estreitou com mais força, seus braços
embalando-a. — Uma vez, há muito tempo, acreditei nas palavras ‘eu te amo’
como sendo fruto de um interesse pelo meu coração, não por meu título e
fortuna. Eu era jovem, impetuoso e estúpido, e ela era mais velha e
extremamente mercenária.
Caroline já havia se perguntado o que poderia tê-lo deixado tão desconfiado
para qualquer envolvimento emocional. Ela descansou em seu abraço,
silenciosamente desejando que ele lhe contasse.
Sua boca se curvou naquele sorriso sem humor, seus olhos escuros
sombreados por aqueles longos e grossos cílios.
— Descobri a verdadeira natureza de Helena da maneira mais difícil, tendo o
privilégio de encontrá-la na cama com outro homem. Descobri mais tarde que
ela planejara tudo isso, desde o nosso primeiro encontro. Ela contou a um de
seus outros amantes que bem antes de nos conhecermos estava interessada em
meu título, na fortuna e no prestígio que vinham com ele. Por isso, ela
deliberadamente pediu a um amigo que me apresentasse a ela, caiu em meus
braços com entusiasmo convincente, mas não interrompeu suas outras
associações. Você pode achar isso um pouco difícil de acreditar, mas aos dezoito
anos eu era ingênuo e romântico.
Ela havia experimentado uma desilusão semelhante na mesma idade, quando
se casou.
— Compreendo.
— A humilhação quando percebi quantas pessoas sabiam exatamente o que
ela estava fazendo e quão facilmente eu fui enganado foi difícil de esquecer.
Então embarquei em uma missão para destruir a imagem de Nicholas Manning,
o jovem duque suscetível.
Era difícil imaginá-lo diferente daquele homem confiante e sofisticado em
todos os sentidos. O encanto despreocupado de Nicholas fora polido como uma
pedra preciosa.
Caroline sorriu e tocou sua mandíbula.
— Eu acho que você conseguiu.
Ele franziu a boca.
— Deus sabe que tentei. Durante a última década, tive amor no sentido
físico, mas mantive minha distância de outra forma. Jurei que nunca mais
cometeria um erro assim. — Ele fez um pequeno e incomum gesto de
impotência com a mão. — Mas, apesar de minha cautela, acredito que você não
esteja mentindo sobre seus sentimentos. Eu não a machucaria para salvar minha
própria pele, e você deixou claro que ser minha amante está fora de questão.
Acho que não temos mais opções a não ser o óbvio. Não ando pensando em mais
nada ultimamente, e isso virou minha vida de cabeça para baixo.
— Eu prometi nunca confiar em qualquer homem o suficiente para me casar
novamente. — Caroline sentiu o horror do dia desaparecer. A frustração e a
perplexidade no tom de voz de Nicholas mostrando-se mais persuasivos do que
qualquer palavra de amor.
— Não vê? Nós compartilhamos as mesmas dúvidas.
Seus olhos mantinham um tom sério.
— E se nós dois quebrarmos nossas promessas? É uma boa maneira de
começar uma vida juntos?
Ela sentiu uma emoção profunda, tão poderosa que mal conseguia falar.
— Eu acho que, considerando a natureza das promessas e por que elas foram
feitas, sim, acredito que seria uma excelente maneira de recomeçar.
Finalmente, lá estava ele. Um erguer do canto da boca primeiro e depois um
brilho malicioso nos olhos. O duque diabólico ressurgiu.
— Como se eu fosse lhe dar uma escolha. Até minha mãe me disse que eu
seria um idiota senão insistisse em um casamento rápido. Ela sempre me dá
muitos conselhos, e eu os aceito com parcimônia, mas neste caso singular,
concordo com ela.
Ele havia discutido com sua família e eles aprovaram?
— Ela sabe que sou estéril? — Doía dizer isso. Deus, como doía.
— Ela comentou que você ainda é jovem, e não há provas sobre o assunto.
Além disso, acredito que esteja aliviada ao extremo por me ver contemplar o
casamento, então, não sente nada além de resignação e desapego. Ela acha que
meus sentimentos superam suas preocupações com o legado de títulos e
dinheiro.
Caroline sentiu uma tontura, mas naquele momento era a felicidade que fazia
sua cabeça girar.
— O que ela vai pensar sobre o escândalo?
— Que escândalo?
Como ele não se preocupava com isso?
— Se Franklin...
— Eu te disse que cuidei disso. Ele não vai dizer uma palavra, confie em
mim.
— Eu confio em você.
As palavras saíram facilmente, porque eram verdadeiras. Nicholas se moveu,
ficando de pé e acomodando-a no pequeno assento enquanto se ajoelhava diante
dela, seu belo rosto imóvel e sério. Ele pegou as mãos frias e as segurou em
gentil persuasão. Seu olhar a buscava, e ela sentiu as profundezas de sua alma.
— Confia? O suficiente para dar uma chance a um homem que tem uma
reputação como a minha?
O duque de Rothay estava realmente ajoelhado a seus pés, oferecendo
casamento? Todas as mulheres em Londres desmaiariam para estar em sua
posição. Talvez toda mulher na Inglaterra... ou no continente inteiro...
— Nicholas... — sua voz não era nada além de um tom rouco.
— Você poderia dizer um “sim” para aliviar um pouco do meu nervosismo,
Caroline.
Nicholas Manning nervoso? Ela podia sentir o leve tremor em seus longos e
bronzeados dedos enquanto seguravam os dela, e havia uma tensão em torno de
sua boca que ela nunca vira antes. O aristocrata arrogante desaparecera e em seu
lugar estava o homem por quem se apaixonara tão facilmente, o amante gentil e
atencioso que negava a si mesmo para tranquilizar uma mulher temerosa, o
homem que se movimentava em noites de luar oníricas com danças românticas
em terraços e oferecia passeios de carruagem sensuais e clandestinos.
— Sim.
A tensão diminuiu, seus dedos apertaram momentaneamente, e o brilho de
seu sorriso demonstrou um triunfo imprudente. Ainda ajoelhado, ele lhe disse:
— Venho atormentando meu débil cérebro tentando pensar na maneira mais
romântica possível para fazer isso. Nenhuma das minhas ideias incluía o fato de
o calhorda do Wynn ser o catalisador. — Ele fez uma pausa e disse com inflexão
irônica: — Receio nunca ter pedido alguém em casamento antes.
— Nunca me pediram em casamento também — admitiu Caroline, com a
garganta cheia de emoção. — Mas no meu julgamento você fez um bom
trabalho.
Nicholas levou uma de suas mãos à boca e deu um beijo nas costas dos
dedos. Uma sobrancelha escura se arqueou.
— Perdoe-me por soar como um marido autocrático mesmo antes de nossos
votos , mas seus dias de juíza estão acabados, meu amor.
O xale de seda escorregou de seus ombros, e Caroline engoliu o nó de
nervosismo que subitamente se instalou em sua garganta. O lacaio se
retirou, e ela sentiu a ligeira pressão da mão do marido em suas costas.
Nicholas olhou para o rosto dela.
— Você tem certeza de que quer fazer isso? Não se sentiu bem esta manhã.
Posso chamar a carruagem para voltarmos.
Ela sorriu, e esperava parecer sincera.
— Isso deve ser feito em algum momento. Agora é um tão bom quanto
qualquer outro.
Era melhor agora, embora ele ainda não soubesse, do que em alguns meses.
A suspeita de que ela poderia estar grávida enchia-a de uma alegria exultante na
qual ainda não podia confiar. Suas regras sempre foram muito pontuais, mas
estava atrasada, e havia algumas outras coisas apontando um dedo nessa direção,
incluindo uma indisposição. Ainda que esvaziar seu estômago em uma bacia a
cada manhã não fosse exatamente uma felicidade, a ideia de estar esperando um
filho dele era o paraíso.
Naquela tarde, no campo em Essex. Fora quando acontecera. De alguma
forma, ela tinha certeza disto.
— Concordo. Vamos acabar com isso o mais rápido possível. Embora eu não
esteja muito ansiosa.
Ao lado dela, Annabel Drake, a nova condessa de Manderville, sorriu
nervosamente. Ela parecia deslumbrante em um vestido cor de pêssego que
destacava sua bela coloração de maneira positiva; seu cabelo dourado preso em
um penteado intrincado.
— Desde o anúncio do jornal, informando que, devido a circunstâncias
imprevistas, vocês dois cancelaram a aposta, Margaret diz que toda a sociedade
londrina está tremendo para saber o motivo. Imagino que esta noite será
interessante, para dizer o mínimo. Todo mundo vai estar falando sobre nós.
Ao lado dela, em um traje noturno marrom e creme, o cabelo loiro
emoldurando as feições que deixavam o coração de tantas mulheres tremulando,
seu marido tinha uma expressão divertida no rosto. Derek, então, falou:
— Garanto-lhe que a preocupação com isso é inútil. Haverá alguns rumores
iniciais e todos se esquecerão de nós quatro.
— Exatamente. — Nicholas ajustou o punho e pareceu sereno. — Tenho
para mim que este é um plano bastante brilhante, se me permitem dizer.
— Claro, porque foi ideia sua — Caroline murmurou e lançou-lhe um olhar
triste. — Pareceu bom no momento em que você propôs, mas agora é assustador.
Foi realmente uma ideia dele. Duas licenças especiais, um casamento duplo
discreto, já que nenhum deles tinha interesse em uma grande cerimônia ou mais
escândalos, e nenhum anúncio público de suas núpcias fora feito na seção da
sociedade do jornal. O subterfúgio poupara mais drama para que pudessem
desfrutar de apenas alguns dias juntos, antes que a alta-sociedade tomasse
conhecimento das notícias excitantes de que os dois mais notórios libertinos de
Londres haviam se casado no mesmo dia.
Um deles com uma viúva que tinha a reputação de ser inatingível, mas fora
atraída para a cama de Rothay, e o outro com uma jovem que terminara o
noivado para ceder aos encantos persuasivos de Lorde Manderville. Ou versões
semelhantes seriam espalhadas, embelezadas por uma nuvem de especulação,
sem dúvida.
Era fácil imaginar os rumores que correriam. Caroline respirou fundo e
apertou o braço do marido. A aposta também apareceria. Claro que sim. Ter os
quatro unidos parecia a melhor opção.
— Pronta? — Nicholas, mais elegante e bonito do que qualquer homem
tinha o direito de ser, vestido com roupas pretas e brancas, lançou-lhe um sorriso
tranquilizador. — Apenas aja como se fôssemos as únicas pessoas na sala.
— Eu vou tentar. — Ela levantou o queixo e ensaiou sua expressão mais
imparcial.
Derek e Annabel foram os primeiros a descerem a escada. O salão de baile lá
embaixo estava apinhado e barulhento, mas quando o mordomo anunciou em
voz estupidamente alta o conde e a condessa de Manderville, houve uma súbita
calmaria nas centenas de conversas.
Caroline se preparou, enquanto seguiam.
— O duque e a duquesa de Rothay.
A sala ficou em silêncio. Até a orquestra parou de tocar.
Ah, sim, completamente livre de qualquer nervosismo, Caroline pensou com
cinismo, na esperança de parecer tão fechada e composta como sempre, mas
estava ruborizada. Ela podia sentir o calor em seu rosto sob os olhares aturdidos
de várias centenas de pessoas.
Como se metade de Londres não estivesse olhando boquiaberta para eles,
Nicholas murmurou em tom descompromissado:
— Espero que o champanhe não esteja muito quente. Detesto beber qualquer
coisa que não esteja devidamente refrigerada.
Era com isso que ele estava preocupado? A temperatura da bebida que
poderia lhe ser servida? Caroline não pôde evitar uma risada. O som flutuou no
silêncio contínuo e algo estalou, o silêncio sobrenatural foi substituído por um
murmúrio de vozes.
Talvez não fosse um plano tão ruim, afinal. Se Caroline pudesse suportar
aquela noite, então, o pior teria passado.
A onda de convidados bem-vestidos, ansiosos para dar os parabéns e, claro, à
espera de algum tipo de detalhe suculento sobre os romances secretos, foi
esmagadora, mas Nicholas permaneceu ao seu lado, afastando as questões óbvias
com seu modo inimitável, geralmente com pouco mais que uma sobrancelha
erguida. Após a exaustiva primeira hora, ele conseguiu puxá-la para a pista de
dança para uma valsa.
— Algumas respostas — disse ele — funcionam melhor com ações do que
com palavras.
No começo, ela não entendeu o que ele quis dizer.
Até que notou o quão próximo ele a segurava. Muito próximo. Parecia a
noite no terraço de sua propriedade em Essex quando estavam sozinhos. Naquele
dia ela achara escandaloso. Naquele cenário, com os olhos de toda a sociedade
sobre eles, era ainda pior.
Eles não o chamavam de Duque Diabólico por nada. Seu primeiro desejo foi
colocar uma distância decente entre eles. As pessoas já comentariam o
suficiente.
— Não. — Ele a segurou com mais força quando ela tentou se afastar. —
Deixe-os ver.
— Ver o quê? — Caroline argumentou em um assobio baixo de protesto. —
Que ser o assunto de todas as fofocas não lhe incomoda? Isso eles já sabem. No
entanto, incomoda a mim.
— Deixe-os ver que eu te amo.
Ela tropeçou na bainha do vestido azul que usara a seu pedido, suas saias
girando em torno de suas pernas enquanto se moviam. Mas o braço dele estava
ao redor de sua cintura, mantendo-a ereta com apoio inflexível, e seus olhos
escuros seguravam os dela, pungentes de emoção. Enquanto a música tocava, ela
perdeu a noção da multidão, das fofocas, dos olhares ávidos. Uma felicidade que
ela não achava possível transformou a noite de julgamento em triunfo.
Nicholas inclinou a cabeça para que sua boca roçasse a têmpora dela,
enquanto se moviam; o gesto parecendo íntimo demais para quem estava diante
de centenas de testemunhas.
Ela não se importava.
Eu te amo.
Ele nunca dissera isso antes, e ela não exigira também.
Talvez ele estivesse certo. Ela tinha certeza de que os fofoqueiros estavam se
perguntando como a distante Lady Wynn havia capturado o belo e diabólico
duque sem que a sociedade jamais tivesse testemunhado mais do que uma troca
de olhares.
Se não fosse por uma proposta muito indecente, nada teria acontecido.
Seus pés ainda estavam no chão? Ela não sabia dizer. Então, murmurou:
— Já mencionei antes como sou grata pela existência das bebidas alcoólicas?
Ele riu, pegando sua referência àquela noite fatídica, quando ele e Derek
fizeram a aposta, mas havia uma expressão séria em seus olhos.
— É tudo o que você tem a dizer?
— Não.
— Então? — ele graciosamente a girou em seus braços.
Sem se importar com o público escandalizado, ela sussurrou:
— Abrace-me com mais força.
NOTAS

Prólogo
1 Creso, último rei da Lídia, foi famoso pela sua riqueza, a qual foi atribuída à exploração das areias
auríferas do Pactolo, rio afluente do Hermo onde, segundo a lenda, se banhara o Rei Midas.
2 Clube de cavalheiros mais exclusivo de Londres durante a regência.

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