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GOMES, Nilma Lino.

Alguns termos e conceitos presentes no debate sobre relações


raciais no Brasil: uma breve discussão. Acãoeducativa.org.br, 2012.

RESUMO

A diversidade de termos e conceitos presentes no debate das relações raciais do


Brasil causa muita discordância entre os autores, por conta de suas perspectivas diferentes,
de conhecimento, ideológica e política. O Movimento Negro tem papel importante nesse
contexto, pois ele dá dimensão e interpretação política da questão social e racial. A autora,
Nilma Lino Gomes, traz neste artigo o diálogo entre as produções acadêmicas e os
movimentos sociais, esclarecendo que o termo “negros” se refere a pretos e pardos, de
acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O conceito de identidade ainda não tem uma resposta satisfatória, por conta de seu
significado ser cada vez mais difuso e se aproximar de clichês. A identidade está ligada a
um sentido de igualdade, ou seja, se apresenta no “nós”, sendo ligada ao nível cultural,
sócio-político e histórico em cada sociedade. A ênfase na identidade revela a ênfase na
diferença, pois esse processo pode ser notado em grupos socialmente segregados. A
identidade é traduzida, também, através do outro, pois ela pressupõe uma interação para se
constituir como realidade.

O processo da identidade se constroi na vida social, portanto as dimensões sociais e


pessoais não podem ser separadas. Tem a ver com pertencimento a um grupo social de
referência, sendo as identidades sociais instáveis, históricas e plurais. É o que acontece
com a identidade negra, que se constrói gradativamente e geralmente este processo
começa na família. É importante que consideremos a identidade negra no Brasil não só no
seu sentido subjetivo e simbólico, mas no seu sentido político, para se entender sua
construção. Também é preciso compreender o significado de “raça”, por conta dos entido
assumido e ressignificado pelos próprios sujeitos negros.

O termo “raça” também gerou muita discussão no âmbito das Ciências Sociais. A
reação diversa em relação ao usar este termo se dá pelo fato de “raça” nos remeter ao
racismo, à escravidão e à construção do que é “ser negro” e “ser branco” no Brasil. A raça é
um termo muito usado nas relações cotidianas porque consegue dar dimensão próxima do
que é racismo. A autora explicita que não se refere ao conceito biológico de raças humanas,
como foi no caso do nazismo. O Movimento Negro e alguns sociólogos usam o termo raça
com uma interpretação que se baseia na dimesão social e política. O racismo em nossa
sociedade se afirma através de sua própria negação, fazendo com que o racismo existente
no país se propague cada vez mais. A atribuição política se dá pelo tipo de racismo
existente no contexto brasileiro, considerando a dimensão histórico-cultural. Outros
estudiosos usam o termo raça social, pois a raça denota como uma forma de classificação
social. O uso do termo “etnia” seria mais abrangente aqui no Brasil, porém na prática a
discriminação recai sobre o negro. Se raça não tivesse um peso tão significativo na
sociedade brasileira, as características físicas não seriam usadas para identificar uma
pessoa negra e uma pessoa branca. No Brasil, o preconceito se dá pelas características
físicas. As raças são construções sociais, políticas e culturais, produzidas ao longo da
história através das relações de poder.

Muitos estudiosos preferem usar o termo etnia para se referir a negros e outro
grupos sociais, pois discordem do termo raça por acreditarem estar ligado ao determinismo
biológico. Por muito tempo, o termo “raça” esteve ligado à dominação político-cultural de um
povo em detrimento de outro, porém após a Segunda Guerra Mundial, a ideia de raça no
sentido biológico foi considerada inaceitável e o termo “etnia” ganhou força. Sendo um outro
termo usado para se referir ao pertencimento ancestral e étnico-racial, que tem relação
com origens e interesses em comum, a etnia é um grupo social que se identifica pela língua,
cultura, tradições, monumentos históricos e territórios. A diversidade cultural é a construção
social, política, histórica e cultural das diferenças.

A questão do racismo é extremamente complexa. É uma ação resultante da


aversão, mas também é conjunto de ideias e imagens referente aos grupos humanos que
acreditam em raça superior. Se apresenta de forma individual e institucional, sendo o
primeiro manifestado por atos discriminatórios por indivíduos contra outros indivíduos e o
segundo se implica práticas discriminatórias sistemáticas fomentadas pelo Estado ou com o
seu apoio direto.

Racismo não se confunde com etnocentrismo, que designa o sentimento de


superioridade de cultura em relação à outra. O etnocêntrico acredita que sua cultura é
melhor e mais correta, não necessariamente alimentando o desejo de aniquilar o outro, que
é o que acontece no racismo.

O preconceito se trata de conceito ou opinião formados antecipadamente, sem maior


ponderação ou conhecimento dos fatos contra membros de um grupo racial de pertença, de
uma etnia ou de uma religião. Faz-se necessário discutirmos a superação do preconceito
porque impede os indivíduos de se abrir ao conhecimento mais aprofundado da questão.

A discriminação racial pode ser considerada como a prática do racismo e a


efetivação do preconceito. Pode ser originada de outros processos sociais, políticos e
psicológicos que vão além do preconceito desenvolvido pelo indivíduo. A discriminação
racial direta se refere a atos concretos de discriminação, a discriminação indireta redunda
em uma desigualdade não oriunda de atos concretos, dotada de grande potencial
discriminatório. A indireta é a forma mais perversa da discriminação.

Os dados estatísticos sobre as desigualdades raciais revelam que a democracia


racial nunca existiu. Este mito é um corrente ideológica que nega a desigualdade racial
entre brancos e negros no Brasil como fruto do racismo. O sociólogo Gilberto Freyre, por
meio do seu livro Casa-Grande e Senzala (1933) propagou esse ideário. Durante o regime
ditatorial era conveniente para o poder e para o Estado autoritário divulgar para o Brasil e
para o mundo uma visão romântica das relações raciais aqui existentes, para camuflar a
profunda desigualdade histórica.

A ideia de “paraíso racial”, tão reforçada em nosso país, foi forjada ideologicamente
para esconder todos os traços do racismo oriundo da carga histórica que trazemos. A
atuação do Movimento Negro é muito importante apar quebrar essa falácia, trazendo
debates políticos sobre a população negra no Brasil. A escola tem um papel importante
nesse debate, para superar e romper com o mito da democracia racial, atuando juntamente
com as diretrizes curriculares para a educação das relações étnico-raciais e para o ensino
de história e cultura afro-brasileira e africana.

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