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Trecho extraído do relatório final do estágio em processos clínicos

Acadêmica: Vanessa Katherine Laval Versa

Enquadre da Sessão de Psicodrama: modalidade bipessoal e técnicas


clássicas

Psicodrama Bipessoal

Cukier (1992) descreve o enquadre bipessoal como “uma abordagem terapêutica


oriunda do psicodrama, que não faz uso de egos auxiliares e atende apenas a um
paciente de cada vez, configurando uma situação de relação bipessoal, ou seja, um
paciente e um terapeuta” (idem p. 17). A autora afirma que a origem dessa modalidade
terapêutica é incerta, existindo como um “filho bastardo” (idem, p. 17) de Moreno, e
sendo citado por outros autores com nomenclaturas diferentes, como Psicodrama para
dois, Psicodrama Bipessoal e psicoterapia da relação, conforme postulado por Moreno,
Bustos e Fonseca, respectivamente.
Bustos (1992) discorre sobre o psicodrama bipessoal contextualizando uma fala
de Moreno, que indicava que esta modalidade estaria no sentido oposto à
espontaneidade, e ameniza, elucidando que diante do surgimento desta abordagem em
contexto grupal, ao contrário da psicanálise que surgiu em contexto bipessoal, apesar
das diferentes origens não são métodos divergentes: alternativas absolutas
determinariam uma parcialização empobrecedora dos possíveis benefícios que são
oferecidos por uma e outra forma terapêutica”. Ele sinaliza que na modalidade
bipessoal, o foco maior no processo individual “oferece um sistema de
autoconhecimento mais apurado” (idem, p. 71), já nos grupos esta condição deve ser
renunciada, a fim de que se crie “um sistema de múltiplos estímulos, mais semelhante
ao contexto social, oferecendo um campo propício para o trabalho das tensões criadas
pelas relações interpessoais in situ” (idem, p. 72).
Cukier (1992) concorda com Bustos (1990) quanto aos benefícios deste
enquadre, e afirma que, apesar de acreditar não ser esta a posição de Moreno, aponta
que é possível mostrar que o valorizamos ao exercitar a espontaneidade e criar com base
no que ele nos ensinou. A autora aponta também que o Psicodrama Bipessoal, por vezes
é visto como uma alternativa à falta de clientes para a composição de grupos, mas ao
mesmo tempo, a maioria dos psicodramatistas experimentou este enquadre e se
beneficiou, e aponta que talvez a dificuldade em assumir esta prática seja em
decorrência da falta de uma aprovação de Moreno.

Técnicas Clássicas:

Duplo
A técnica do duplo é recomendada quando o terapeuta percebe dificuldade ou
impossibilidade do protagonista em verbalizar o que sente, e demanda muita
sensibilidade do terapeuta para atuar como ego-auxiliar, trazendo à tona conteúdos que
compreendeu como dificultosos para o paciente de admitir ou canalizar
expressivamente. Quando executado de forma satisfatória, o protagonista aceita o
conteúdo enunciado pelo ego-auxiliar, do contrário, poderá ser rejeitado e interpretado
como invasor. Moreno aplicava esta técnica com psicóticos, a fim de proporcionar um
contato tranquilizador e favorável à comunicação (MONTEIRO, 1998).

Espelho
Esta técnica objetiva evidenciar ao cliente uma visão de si mesmo, através da
reprodução de uma cena na qual o ego-auxiliar assume o seu papel e o protagonista fica
como espectador. Nesta técnica, assim como no Duplo e na Inversão de Papéis, a
sensibilidade e o fator télico são extremamente importantes para uma boa execução,
considerando que na ausência deste, diminui consideravelmente a capacidade de captar
os elementos a serem reproduzidos pelo terapeuta (MONTEIRO,1998).

Inversão de papéis
Para que ocorra a inversão a presença se faz elemento primordial, considerando que
há a sobreposição de papéis, e que estes, são representados da maneira como são
percebidos, portanto, a forma como se está disposto a receber a informação irá refletir
no desempenho deste papel. Monteiro (1998) salienta que para alcançar a execução
ideal, não basta reproduzir a técnica, mas que se faz necessária a convocação para a
proximidade: “E quando estiveres perto, eu arrancarei os seus olhos e os colocarei no
lugar dos meus. E tu arrancará os meus olhos e os colocará no lugar dos teus. Então eu
te olharei com teus olhos e tu me olharás com os meus.” (MONTEIRO,1998, p. 22).
A autora ressalta, ainda, que as percepções decorrentes da inversão de papéis não
são suficientes para configurar um Encontro da forma como Moreno preconizava, mas
que podem facilitar a relação com os outros e consigo mesmo. Além disso, as
percepções externas podem indicar para uma atuação melhor ou pior do que a realidade,
mas o que a experiência individual é intransmissível e que o fundamental é este
sentimento ser reconhecido. (MONTEIRO, 1998).

Cadeira Vazia
Conforme indica Cukier (1992), a técnica da cadeira vazia pode ser utilizada a fim
de mobilizar um conteúdo que será abordado em cena aberta, ou como um fim em si,
pois objetiva proporcionar ao paciente a possibilidade de confrontação entre partes
antônimas de seus conflitos. Pode ser utilizada com o jogo de papéis, inicialmente
colocando alguém na cadeira de forma imaginária, e depois realizando a troca de papéis
do paciente com o papel projetado, ou ainda como forma de concretizar metáforas e
sonhos. O terapeuta também pode assumir um papel na cena, ou observar de fora, e
pode utilizar-se da entrevista a fim de favorecer o diálogo.

Concretização
Segundo Cukier (1992), esta técnica consiste na “materialização de objetos
inanimados, emoções e conflitos, partes corporais, doenças orgânicas, através de
imagens, movimentos e falas dramáticos” (idem p. 49). Dessa forma, se trata de um
recurso técnico muito rico, que pode proporcionar o aprofundamento nos diversos
aspectos daquilo que é concretizado.
Bermudez (apud Cukier, 1992, p. 67), aponta que a imagem “é a resultante da
integração entre vários registros mnêmicos, pré-verbais e verbais, além de todas as
experiências emocionais do indivíduo”, portanto, observa-se que a técnica da
concretização ancora-se no recurso ao universo simbólico do indivíduo, e, conforme o
que afirma Cukier, que se opõe ao que disse Bermudez sobre esta técnica favorecer
insights intelectuais, a técnica proporciona a integração entre o intelectual e o simbólico,
como se através da expressão corporal o paciente pudesse integrar ambos os aspectos.

REFERÊNCIAS:

BUSTOS, Dalmiro M. Perigo... Amor a vista! Drama e Psicodrama de Casais. São


Paulo: Aleph, 1990.

CUKIER, Rosa. Psicodrama Bipessoal: Sua técnica, seu terapeuta e seu paciente. São
Paulo: Ágora, 1992.

MONTEIRO, Regina F. (organizadora); Técnicas Fundamentais do Psicodrama- 2ª


Ed. São Paulo: Ágora, 1998.

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