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Trecho extraído do relatório final do estágio em processos clínicos

Acadêmica: Vanessa Katherine Laval Versa

Matriz de Identidade

Sobre a Matriz de Identidade, Gonçalves (1988) apresenta que, no contexto de


nascimento de um bebê, ou seja, no que Moreno chamou de locus nascendi, há, além de
um espaço físico que a criança irá ocupar, um espaço virtual, referente a um conjunto de
fatores envolvendo as expectativas sobre o ser que está chegando ao mundo, lançadas
sobre o papel ou tarefa que irá desempenhar.
Fonseca (2008), elucida especialmente sobre cada fase do desenvolvimento da
Matriz de Identidade, esclarecendo que, para Moreno:
Constitui o primeiro processo de aprendizagem emocional da criança. A
primeira etapa corresponde à completa identidade. A segunda se caracteriza
pelo fato de a criança concentrar a atenção no “outro” (Tu, mãe) e estranhar
parte dele. A terceira separa o “outro” da continuidade da experiência. Na
quarta, já consegue representar o papel do “outro”. Na quinta etapa, a
inversão da identidade é completa: a criança consegue representar o papel do
“outro” diante de uma terceira pessoa, que, por sua vez, desempenha o seu.
As duas últimas etapas, evidentemente, não se produzem nos primeiros
meses. Esses estágios do desenvolvimento infantil fundamentam as bases
psicológicas para todos os processos de desempenho de papéis. Do extremo
de indiferenciação, confusão, unidade, passará, com o tempo, a concentrar-se
no extremo oposto e a inverter papéis com o outro. Simplificando e
resumindo em três as cinco fases descritas, temos: a de identidade do Eu com
o Tu, do indivíduo com tudo ao seu redor; a de reconhecimento do Eu, de
suas peculiaridades como pessoa, e, finalmente, a fase do reconhecimento do
Tu, do conhecimento dos outros e do mundo. (FONSECA, 2008, s/p.).

Fonseca (2008), desenvolve este modelo em dez partes. A primeira delas, a


Indiferenciação, é quando não há distinção do Eu e do Tu, e a mãe atua como ego-
auxiliar, realizando todas as necessidades do bebê, na função do Duplo, como se fosse
uma extensão dele mesmo. Na segunda fase, a Simbiose, ocorre o início da
discriminação do que é o outro e o Eu (bebê) e o Tu (mãe), e a forma como se
desenvolve esta fase refletirá nos relacionamentos futuros desta criança, dependendo de
como foi esse desligamento. O autor compara como se fosse um cordão umbilical,
equivalente à dimensão psicológica.
O autor também apresenta a terceira fase, a do Reconhecimento do Eu, quando a
criança passa a existir como individualidade, reconhece a si mesmo, suas necessidades,
sensações, e reconhece sua própria imagem diante do espelho. A quarta fase,
reconhecimento do Tu, está agrupada junto à terceira, porém, Fonseca (2008) as
distingue por razões didáticas, considerando que enquanto ocorre o reconhecimento do
Eu, ocorre de maneira concomitante o reconhecimento do Tu, e define-se com maior
clareza a distinção entre um e outro.
O mesmo autor também nos diz sobre a quinta fase, Relacionamentos em
Corredor, e leva este nome pois, apesar de já ter definido o seu Eu e o Tu, ainda
relaciona-se de forma exclusivista, em corredor, pois ainda traz esse modelo das fases
anteriores, porém aqui o Tu não é somente a mãe, mas sim os outros, um de cada vez.
Além disso, nesta fase é estabelecida a capacidade de discernir entre fantasia e
realidade, o que Moreno chamou de “brecha “.
A sexta fase é chamada de Pré-inversão, e conta como um treinamento para a
inversão plena dos papéis. Aqui, a criança é capaz de assumir outros papéis, mas ainda
não há reciprocidade. Fonseca (2008) considera que, após esta etapa, a criança será
capaz de executar a inversão de forma completa, porém, que a inversão propriamente
dita ocorrerá somente após passar por outras fases, portanto, esta etapa será concluída,
para o autor, somente na fase adulta (FONSECA, 2008).
Seguindo na matriz de desenvolvimento da identidade, conforme nos aponta
Fonseca (2008) têm-se a sétima fase, a de Triangulação, equivalente à fase edípica da
psicanálise Freudiana, a criança sai das relações em corredor e percebe que há um
terceiro que também relaciona-se com o seu Tu. Ao sentir-se desamparada em meio a
essa dinâmica, a comunicação entre estes três elementos determinará a resolução deste
conflito, pois, se ocorrer de forma saudável, a criança perceberá que apesar desta
relação existente entre os outros dois elementos não a incluir, não há necessariamente
uma perda afetiva.
Ainda, a oitava fase se trata da Circularização e ocorre em decorrência da
sétima, a partir da qual será capaz de relacionar-se com mais de três pessoas, atingindo
cada vez maior complexidade, considerando que quanto maior o grupo, mais relações há
nele contidas. Esta fase “representa a entrada do ser humano na vivência sociométrica
dos grupos” (FONSECA, 2008, s/p.). Superando esta fase, chega-se à nona fase, a de
Inversão dos Papéis, na qual alcança, após muito treinamento em relações de diferentes
enquadres, a habilidade de relacionar-se com reciprocidade e mutualidade. Finalmente,
após a Inversão dos Papéis, há a fase do Encontro, que “acontece ex abrupto e de forma
tão intensa que a espontaneidade-criatividade presente é liberada no ato de entrega
mútua (princípio de entrega)” (FONSECA, 2008, p. 131). Portanto, a saúde, para Buber
e Moreno, é a capacidade de experienciação do outro através da inversão de papéis e do
encontro, e o desenvolvimento insuficiente destas capacidades implica em um encontro
fracassado, o que representa o aspecto de doença.

REFERÊNCIAS:

FONSECA FILHO, José de Souza. Psicodrama da loucura: Correlações entre Buber e


Moreno. 7ª ed. rev. São Paulo: Ágora, 2008.

GONÇALVES, Camila Salles; WOLFF, José Roberto; DE ALMEIDA, Wilson


Castello. Lições de psicodrama: introdução ao pensamento de J. L. Moreno. São
Paulo: Ágora, 1988.

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