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Escolas da psicologia:

psicanálise e behaviorismo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Conceituar psicanálise com base nos trabalhos de Freud, Melanie


Klein e Lacan.
 Definir behaviorismo.
 Descrever a natureza experimental do behaviorismo.

Introdução
A psicologia é um campo de conhecimento que possui múltiplas
escolas, as quais estão inseridas em diferentes matrizes de
pensamento, cada qual com concepções diferenciadas sobre o ser
humano e seu objeto e método de estudo. Entre as várias escolas que
constituem esse campo, destacam-se a psicanálise e o behaviorismo.
Essas duas escolas desenvolveram-se entre o fim do século XIX e o
início do XX. Contudo, elas possuem compreensões díspares sobre o
objeto da psicologia: enquanto a primeira foca no mundo interno, a
segunda ocupou-se do comportamento observável.
Neste capítulo, você estudará a psicanálise a partir da sua
formação, com Freud, e do seu desdobramento, com Klein e Lacan.
Além disso, estudará sobre o behaviorismo e seus desdobramentos, a
fim de compreender a importância da análise experimental para o
desenvolvimento do estudo do comportamento.
1 Psicanálise: de Freud a Lacan
A psicanálise teve origem no fim do século XIX, a partir do trabalho do
neurologista Freud, que apresentou uma outra concepção de sujeito,
considerando o debate sobre psicologia como ciência realizada nesse período.
À época, a psicanálise era direcionada para compreender o comportamento
patológico de pacientes históricos, a partir da observação clínica. Essa ênfase
possibilitou o desenvolvimento do estudo do inconsciente, ao demonstrar que
os sintomas desses pacientes, bem como suas inibições e hesitações sensoriais
e motoras, não tinham a ver com a biologia, mas sim com o psiquismo
(SCHULTZ; SCHULTZ, 2002).
A partir do desenvolvimento desse conceito, fundamental para essa escola,
houve uma compreensão de que a subjetividade é perpassada pela geração de
símbolos, que podem ser compreendidos a partir de um processo de
interpretação dos fenômenos psíquicos por meio da escuta clínica. Portanto, a
psicanálise possui uma dimensão hermenêutica. De acordo com Figueiredo
(2008), a introdução do inconsciente colocou por terra a ideia de um “eu”
consciente, ao dar destaque a uma vida interior, produzida a partir da
experiência e da história de vida do sujeito.
Freud teve inúmeros seguidores que desenvolveram escolas, entre eles
Melanie Klein e Jacques Lacan, cada um com concepções diferenciadas de
sujeito que se desdobraram a partir do desenvolvimento teórico dado por
Freud. Couto (2017) aponta que a noção de sujeito de Freud está relacionada
com a pulsão sexual e as formas de desenvolvimento infantil, que se dão a
partir da busca por satisfação libidinal por meio das zonas erógenas. Esse
processo ocorre por meio do corpo, que é tomado como referência para a
obtenção do prazer.
Ao caracterizar a vida psíquica infantil, Freud apontou quatro fases do
desenvolvimento: oral, anal, fálica e genital, que culminam na constituição do
sujeito a partir da organização das pulsões, fragmentadas na vida infantil em
um domínio genital na vida adulta. Tal processo resulta na compreensão, na
fase genital, por meio do complexo de Édipo, da diferença sexual e do
complexo de castração a partir do falo enquanto símbolo de completude e
poder. Rubin (1975) destaca que o complexo de Édipo exacerbaria no plano
do inconsciente a diferença sexual, pois é uma etapa em que as crianças
passariam por um reconhecimento da diferença anatômica.
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Se, na fase pré-edipiana, as crianças de ambos os sexos eram


psiquicamente indistintas, sua diferenciação deveria ser explicada, e não dada
como preexistente. As crianças pré-edipianas apresentam toda a gama de
atitudes libidinais, ativas e passivas, sendo a mãe o objeto de desejo. Do
mesmo modo, a sexualidade da mulher tornava-se uma questão em pauta,
visto que sua atividade libidinal era orientada para a mãe de forma ativa e
agressiva (RUBIN, 1975).
De acordo com Rubin (1975), na fase edipiana, a criança encerra todas as
possibilidades sexuais passíveis de expressão. Ao alcançar a resolução do
complexo, a libido e a identidade de gênero da criança estarão organizadas,
de acordo com as regras da cultura a que pertence. Ou seja, ao longo desse
período, a criança passará por um processo de compreensão do sistema sexual
no qual está inserida e da importância da diferença sexual para o lugar que
ocupará nas relações. Portanto, como aponta Couto (2017), o complexo de
Édipo seria um mecanismo para a produção da personalidade.
Se Freud realizou suas teorizações a partir da análise de adultos, Melanie
Klein o fez a partir da observação do atendimento de crianças na clínica. Essa
psicanalista constituiu um corpus teórico sobre as relações objetais,
transformando a perspectiva freudiana ao demonstrar um mundo interno
infantil, marcado por fantasias, ansiedades, figuras boas e más que expunham
a criança à pulsão de vida e de morte, isto é, impulsos agressivos e libidinais.
Segundo Couto (2017, p. 4):

De acordo com a teoria metapsicológica kleiniana, portanto, há que se


considerar que cada criança nasce com um “dote pulsional”, um quantum de
pulsão de vida e de morte, cujo equilíbrio se mantém quando o bebê está livre
de tensões internas e/ou externas. Dessa forma, as experiências gratificadoras
– como o carinho da mãe – reforçam a pulsão de vida e as experiências
frustradoras – como a ausência da mãe – intensificam a pulsão de morte. No
primeiro ano de vida, as vivências entre mãe e bebê são marcadas por uma
modificação importante no que diz respeito às relações de objeto: a relação
com o objeto parcial dá lugar à relação com o objeto total.

Nessa perspectiva, as fases do desenvolvimento seriam descritas nos


primeiros meses de vida da criança como esquizoparanoide e depressiva. A
fase esquizoparanoide diz respeito ao processo de relação com o seio
materno entre gratificação e frustração, dado o aspecto inicial da
amamentação e a relação amorosa e de cuidado inicial dispensada à criança.
Essa posição emerge como preservação diante ao medo de desintegração do
eu. Por isso, a cisão entre um objeto mau em oposição ao objeto bom (no caso,
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o seio) contribui para que haja um equilíbrio entre os impulsos libidinais,


protegendo o ego (COUTO, 2017).
Com o desenvolvimento do ego, afirma Couto (2017), há uma mudança
para a fase depressiva, em que a criança passa a introjetar o objeto em sua
totalidade, diminuindo as ansiedades e sintetizando as emoções geradas
anteriormente, quando emerge a culpa aos ataques dirigidos a esse objeto. A
ansiedade anteriormente dirigida ao ego passa a ser direcionada ao objeto,
possibilitando o desenvolvimento emocional e a capacidade de comunicar-se
com as pessoas.
Desse modo, a diferença entre Freud e Klein é a possibilidade de se teorizar
sobre o desenvolvimento libidinal desde o primeiro ano de vida, como propõe
Klein. A psicanalista, ao desenvolver uma teoria sobre o desenvolvimento da
criança, também formulou uma nova abordagem sobre o complexo de Édipo.
Este surgiria no primeiro ano de vida da criança, a partir da posição
depressiva, relacionado ao medo de perda do objeto amado em virtude de seus
sentimentos agressivos em relação a ele. Com isso, foi possível que se
constituísse um campo de atenção às crianças na clínica, na medida em que
demonstra que a escuta ativa permitia que elas expressassem seus sentimentos
e sofrimentos, trabalhando as ansiedades decorrentes do processo de
desenvolvimento e constituição do ego.
Lacan, por sua vez, propõe outro caminho para pensar o sujeito e um
retorno a Freud, acrescentando a linguística, a lógica e a antropologia
estrutural para a sua construção teórica. Para o psicanalista, o inconsciente é
estruturado como a linguagem. O sujeito não é o indivíduo, pois seria dividido
entre sujeito do enunciado e sujeito da enunciação. Ou seja, há o sujeito que
fala e o sujeito do inconsciente, e ambos aparecem em todo o processo de
comunicação (COUTO, 2017).
Lacan, ao contrário dos psicanalistas anteriores, não focava no
desenvolvimento infantil, mas abordava a emergência do sujeito do
inconsciente (COUTO, 2017). Para que esse processo ocorra, é preciso a
constituição de um eu corporal de forma imaginária, que ofereceria uma
síntese a uma imagem fragmentada. É a partir dos cuidados iniciais da vida
infantil que esse processo se realiza, inscrevendo marcas que constituirão esse
sujeito. Tal processo ocorre a partir de duas operações, a alienação e a
separação, que possibilitam adentrar no campo do simbólico a partir do
assujeitamento ao outro, que se aliena e se constitui dividido, ou seja,
enquanto sujeito.
A partir disso, a criança entra no mundo da linguagem enquanto sujeito, e
pode separar-se para constituir-se sujeito desejante. Conforme Couto (2017),
para que esse processo continue e leve a uma resolução edipiana, será preciso
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que a mãe, ao seguir desejando em outras direções, introduza um terceiro


significante, o nome-do-pai, que tem a função de interdição da fusão entre a
mãe e a criança, indicando para a criança qual o seu lugar no desejo do outro.
É a resposta a essa questão que estrutura o psiquismo.
Ao compreender a concepção de sujeito e sua constituição na psicanálise,
é possível pensar a transferência e o processo terapêutico. Bezerra e Rinaldi
(2009) afirmam que a transferência emerge como uma questão no tratamento
dos pacientes que insistiam em não ser encaixados nos modelos de tratamento
ditados pela medicina da época. Ela opera, então, como impulsionadora ou
não do processo terapêutico, e ocorre não apenas no espaço do consultório,
mas também nas instituições de atenção à saúde.
Considerando-se a relação transferencial, tendo em mente o efeito do
inconsciente nas relações, seria possível dar atenção à singularidade dos
casos, pois o afeto direcionado ao profissional possibilitaria o manejo para o
tratamento.

O cuidado em saúde não se resume ao organismo e à doença, mas também à


produção de espaços onde as condições de cuidado possam acontecer. A pesquisa
publicada no artigo “Saberes e fazeres no cuidado de enfermagem em saúde
mental” apresentou entrevistas com enfermeiros que atuam no campo da saúde
mental e trabalham com a perspectiva lacaniana do sujeito. Os participantes foram
estimulados a contar sobre o cuidado em enfermagem realizado aos sujeitos
psicóticos, a partir do relato de cenas do cotidiano do trabalho. Constatou-se que o
cuidado em saúde, para além de um corpo biológico, implica nos significados e seus
usos, demonstrando complexidade e dificuldade, “[...] no sentido de que há nesse
campo a marca de um resto não nomeável, o qual, por meio da repetição, resiste à
qualquer tentativa de significação e traz sofrimento [...]” (KURIMOTO; PENNA;
NITKIN, 2017, p. 1028). Trata-se de atentar para a singularidade das experiências e
os modos como o corpo aparece como um significante importante, possibilitando
um outro olhar sobre o cuidado e para as práticas de saúde que considerem a
totalidade dos sujeitos enquanto seres biopsicossociais.

2 Behaviorismo
O behaviorismo, por se tratar de um campo múltiplo, formado por diversas
perspectivas, recebeu diferentes avaliações, como reducionista, mecanicista,
positivista, entre outros. Contudo, considerando-se que os diferentes
pesquisadores que compuseram esse campo construíram diferentes corpus
teórico-metodológicos, é preciso considerar qual behaviorismo se está
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analisando e quais as características dele. Por esse motivo, embora se encontre


um consenso sobre o objeto de estudo, o mesmo não se pode dizer sobre o que
significa comportamento e ciência (BAUM, 2006).
Conforme Schultz e Schultz (2002), essa corrente objetivava construir a
psicologia como uma ciência do comportamento, a qual teria como objeto atos
que fossem observáveis, descritos mediante observação a partir da
apresentação do estímulo e da resposta. Nesse sentido, seria uma objetiva
mensurável e experimental. No entanto, dada a diversidade de compreensões
de como se constitui o comportamento humano e animal, também se observa
diversidades entre os diferentes pesquisadores.
Por isso, o behaviorismo costuma ser apresentado a partir de dois
importantes autores na constituição desse campo diverso: Watson e Skinner.
Ambos propuseram perspectivas diferentes para a formação teórico-
metodológica do estudo do comportamento. Contudo, é a John Watson, em
1913, tributada a formação do behaviorismo como uma ciência psicológica, a
partir da publicação da obra Psychology as the behaviorist views it (A
psicologia como o behaviorista a vê) (BAUM, 2006).
Para o desenvolvimento dessa corrente, era preciso abandonar as
perspectivas mentalistas, que, na visão de Watson, definiriam a psicologia
como ciência da consciência e a articulariam a métodos pouco fidedignos e
confiáveis, dificultando a constituição da psicologia como uma ciência. Essa
proposta de libertação de abordagens idealistas que tinham a consciência ou a
mente como objeto vincula esse projeto de psicologia às ciências naturais,
próximas aos estudos de fisiologistas (BAUM, 2006).
Conforme Baum (2006), o abandono de termos como consciência, mente,
estados mentais e percepção implicava na libertação da psicologia para
estudar tanto o comportamento animal quanto o humano.

Essa ciência do comportamento idealizada por Watson não usaria qualquer dos
termos tradicionais referentes à mente e consciência, evitaria a subjetividade
da introspecção e as analogias entre o animal e o humano, e estudaria apenas
o comportamento objetivamente observável [...] (BAUM, 2006, p. 24).
Desse modo, Watson propunha uma ciência que emergia em oposição a
duas perspectivas: o estruturalismo e o funcionalismo. Consequentemente, o
método de introspecção também é abandonado, em prol de estudos
experimentais sobre o comportamento observado (VIEGA;
VANDENBERGHE, 2001).
Figueiredo (2008) afirma que, embora se opusesse a algumas correntes da
psicologia, as bases do behaviorismo eram compartilhadas com essas
correntes, mas avançava abandonando a auto-observação como método e o
problema da unidade psíquica, uma vez que não haveria necessidade de
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afirmar que mente e corpo interagem, pelo fato de o objeto ser o


comportamento e sua relação com o ambiente. Essa perspectiva deixa de lado
a experiência imediata, subjetiva do indivíduo. Então:

Nessa medida, o “sujeito” do comportamento não é um sujeito que sente,


pensa, decide, deseja e é responsável por seus atos; é apenas um organismo.
Enquanto organismo, o ser humano se assemelha a qualquer outro animal, e é
por isso que essa forma de conceber a psicologia científica dedica uma grande
atenção aos estudos com seres não humanos, como ratos, pombos e macacos,
entre outros (FIGUEIREDO, 2008, p. 70).

Schultz e Schultz (2002) comentam que as ideias behavioristas já vinham


sendo desenvolvidas na psicologia e na biologia quando Watson fundou essa
ciência. O mérito desse pesquisador foi reunir tendências que compuseram o
debate da psicologia científica, como o mecanicismo e a tradição filosófica
do objetivismo, a psicologia animal e a psicologia funcional. Por isso, o
desenvolvimento do behaviorismo é fortemente influenciado pelo
objetivismo, o mecanicismo e o materialismo, de tal forma que produz uma
psicologia sem mente ou alma, que teria como objeto apenas o que poderia
ser observado. A concepção de humano é associado à máquina, àquilo que
pode ser decomposto e analisado à luz do método científico.
Watson foi influenciado por estudos da psicologia animal, sobretudo pelas
abordagens de Edward Lee Thorndike e Ivan Pavlov, que assumiram o estudo
do comportamento a partir da relação entre estímulo e resposta. Pavlov, a
partir da pesquisa com cães, construiu um modelo de análise do
comportamento, conhecido por condicionamento, que entende que o
indivíduo aprende a partir dos diversos estímulos ambientais, que produzem
respostas. Para o pesquisador, o ser humano seria totalmente condicionado, e
os processos mentais deveriam ser explicados por termos puramente
fisiológicos.
O reflexo seria o sinal que possibilitaria o condicionamento, uma vez que
todos os atos do organismo seriam decompostos em reflexos, condicionados
ou não. Sabe-se que os seres humanos nascem com um número de reflexos
inatos a determinados estímulos. Contudo, eles propiciariam equilíbrio apenas
se o meio exterior permanecesse constante. Por isso, a relação entre estímulo
condicionante (EC) e resposta condicionante (RC) produz generalizações de
valor adaptativo para as variações do ambiente.
Thorndike, por sua vez, criou uma abordagem experimental, chamada de
conexionismo, que tinha o pressuposto de que a mente humana seria marcada
por conexões entre situações e respostas, uma vez que a mente é um sistema
de conexões. Sua concepção de ser humano está relacionado à ideia de
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máquina, que, por meio do condicionamento, é regulada para comportar-se


(SCHULTZ; SCHULTZ, 2002).
Nessa esteira, o programa de Watson diz respeito à relação de causa e
efeito, que constituiu a base do paradigma comportamentalista. Segundo
Viega e Vandenberghe (2001, p. 12):

Até o pensamento é considerado como sendo uma organização hierárquica de


cadeias de estímulo-resposta. Os elementos que constituem o raciocínio mais
elevado são semelhantes àqueles presentes no balbuciar de uma criança, assim
como as rodinhas numa máquina muito complexa podem ser iguais às de um
brinquedo simplíssimo e o funcionamento de ambos pode ser compreendido a
partir da interação entre as funções das suas partes.

Apesar dessa vinculação a uma perspectiva mecanicista, o pensamento


watsoniano considerava que havia uma história de adaptação aos ambientes,
considerando o contexto e a interação como fatores para uma análise do
comportamento. Por isso, o meio tinha importância para o desenvolvimento
dos indivíduos, visto que alguns estímulos produziriam determinadas
respostas, que levariam à adaptação dos indivíduos ao contexto (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2002).
Assim, o fenômeno deveria ser estudado no contexto que emerge, para que
pudesse ser analisado teoricamente. O esquema de condicionamento de
Watson (Figura 1) implicava um conjunto de estímulos, que formava uma
situação em um contexto específico, levando às reações (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2002).

Watson acreditava que o comportamento poderia ser estudado a partir de


sua decomposição em unidades elementares. Abandonando a consciência
como objeto de estudo, o pesquisador aproxima-se de um behaviorismo
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metodológico, que rejeita a introspecção em prol da observação metódica dos


atos. Há, então, uma primazia do método ao objeto.
Já para Skinner, o behaviorismo metodológico seria um compromisso da
psicologia enquanto ciência com os atos públicos, com aquilo que é
observável pelo investigador a partir da análise metódica. Estaria, então,
vinculado a uma perspectiva que excluiria os estados mentais, embora a
referência à mente fosse frequente em suas produções (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2002).
Skinner, conhecido por desenvolver um behaviorismo radical, que se
afasta de Watson e outros behavioristas, criou a sua teoria a partir da definição
de seu objeto de estudo — a interação entre os seres vivos e o ambiente —,
baseada em experimentos. O pesquisador discute o comportamento operante
dos atos do indivíduo que não são automáticos e têm efeito sobre o ambiente.
Esse processo propicia o aprendizado de comportamentos, uma vez que se
age sobre o mundo a partir dos efeitos das ações individuais. Desse modo, o
comportamento é tanto efeito do estímulo quando produz efeitos sobre esse
ambiente produtor do estímulo (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002).
Figueiredo (2008) afirma que Skinner não nega a subjetividade, mas
entende a necessidade de compreender em que condições ela se desenvolve.
Contudo, Skinner tem uma concepção de organismo sem sujeito, pois, embora
não considere que os comportamentos seriam inatos ou motivações internas,
também rejeita a referência a estados mentais que determinariam o
comportamento. O ser humano, então, seria produto do meio em que vive,
isto é, seu comportamento é resultado das condições externas e tem efeito
sobre ele.
Por isso, seria preciso olhar para a realidade social, pois é em sociedade
que se aprende os comportamentos, de tal forma que seu projeto é um “[...]
reconhecimento e crítica da noção de experiência imediata a partir de um
ponto de vista social [...]” (FIGUEIREDO, 2008, p. 79). Portanto, essa
abordagem compreendia a possibilidade de modulação e controle do
comportamento humano a partir do reforço.

3 A natureza experimental do behaviorismo


A análise do comportamento se associa aos modelos metodológicos da
pesquisa em ciências naturais, especificamente à pesquisa experimental em
laboratório. Andery (2010) aponta que, dessa natureza da análise do
comportamento, há avaliações sobre se esta seria uma ciência natural, tendo a
pesquisa experimental como único método, ou uma ciência do campo das
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ciências biológicas, visto que apresenta pressupostos que a aproximam destas,


ou, ainda, se ampliaria o escopo metodológico para além da pesquisa em
laboratório.
Segundo a autora, esse debate acompanhou as formas de designação dessa
ciência, como, por exemplo, ciência do comportamento, behaviorismo,
behaviorismo radical, análise do comportamento, análise experimental do
comportamento e análise do comportamento aplicada. Ao longo do tempo,
tornaram-se mais complexos os sistemas teóricos, os problemas de pesquisa,
as possibilidades de aplicação, bem como as possibilidades de interpretação
de fenômenos, processos e modelos utilizados (ANDERY, 2010).
A análise do comportamento tem o comportamento como objeto, o qual é
definido pela relação indivíduo-ambiente, bem como pelos métodos de
pesquisa utilizados para a abordagem desse fenômeno. Dessa forma:

A expressão “análise do comportamento” designa, então, um conjunto de


práticas de uma comunidade (os analistas do comportamento) e seus produtos.
Tais práticas envolvem as maneiras de fazer pesquisa e os seus resultados, ou
seja, envolvem a pesquisa científica que serve de base e fundamento para a
produção de corpo de conhecimento teórico e de explicações (comportamento
verbal) sobre o comportamento e, então, para o desenvolvimento de técnicas,
procedimentos e tecnologias de intervenção que são aplicadas para a solução
de problemas envolvendo comportamentos. O conjunto de práticas que
chamamos de análise do comportamento envolve, portanto, a análise
experimental do comportamento — pesquisa básica e pesquisa aplicada —, a
análise do comportamento aplicada e a filosofia que a elas se vincula —
behaviorismo radical (ANDERY, 2010, p. 319).

Conforme Andery (2010), a pesquisa em análise comportamental não se


reduz à pesquisa experimental ou à pesquisa básica. As pesquisas podem ser
avaliadas conforme a origem dos dados, como as pesquisas de base empírica
e observacional. Desse modo, pode-se encontrar pesquisas experimentais com
manipulação de variáveis, descritivas ou observacionais, em que não há
planejamento de manipulação de variáveis-controle.
Além disso, a análise pode ser baseada conforme a finalidade, se há
descrição de processos comportamentais, e descrever e intervir em
comportamentos, constituindo-se em pesquisa básica, aplicada e reflexiva.
Há, ainda, o local onde é conduzido as pesquisas, como em laboratório, onde
são criadas as condições para estudar o fenômeno, possibilitando o controle
de variáveis. Há também pesquisas em contextos naturais, porém o método
experimental tem uma preponderância por abordagens comportamentais, por
possibilitarem a predição e o controle, além de descrições e explicações.
Desse modo:
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A potência do método experimental fundamenta-se na noção de que


fenômenos são determinados ou se relacionam com outros fenômenos de
maneira regular. No trabalho de pesquisa define-se o fenômeno de interesse e
dimensões (variáveis) características destes fenômenos são mensuradas.
Então, manipula-se um segundo conjunto de fenômenos (variáveis) que,
supostamente, se relacionam/determinam o conjunto de fenômenos
mensurado e, mais uma vez, mensura-se (dimensões) o fenômeno de interesse.
Se manipulações e medidas originam resultados consistentes, assume-se uma
relação de dependência entre as variáveis manipuladas e mensuradas
(ANDERY, 2010, p. 324).

Esse método diz respeito a um conjunto de procedimentos, como


amostragem, distribuição em dois grupos, como experimental e controle,
atribuição randômica dos sujeitos e tratamento estatístico dos resultados. A
perspectiva que subjaz esse processo compreende o comportamento como
natural, regido por leis que são passíveis de descrição, previsão e controle.
Portanto, é um fenômeno que envolve interações ou respostas a estímulos,
bem como a interação indivíduo-ambiente. A pesquisa sobre o
comportamento envolve descrição e explicação dos processos, que possuem
uma regularidade.
Os pressupostos da pesquisa experimental se originam do trabalho de
Skinner a partir do estudo do comportamento operante em laboratórios de
análise do comportamento, em que o experimento poderia ter a manipulação
das condições ambientais para a análise dos efeitos sobre o participante. Essas
pesquisas optaram por experimentos que utilizassem um sujeito, para que se
pudesse colocá-lo em condições experimentais repetidas vezes, medindo o
seu comportamento continuamente em sucessivas condições (ANDERY,
2010).
Nessa abordagem, são realizados estudos longitudinais, recolhidos
múltiplas vezes, para que se possa avaliar o processo comportamental, com
registro cumulativo dos dados do respondedor. Assim, o participante é
estudado por um longo período, em que se escolhe as condições para o
experimento e se manipula as variáveis que possibilitam as recorrências de
respostas ao longo do tempo. Com isso, segundo Andery (2010, p. 327):

[...] respeita-se o caráter processual e de fluxo do comportamento, com


procedimentos que possibilitam a ocorrência e recorrência de repostas
livremente (procedimentos de operante livre), medindo-se dimensões do
responder que seriam afetadas no decorrer do processo de interação
organismo-ambiente: a taxa de respostas, a medida mais paradigmática da
pesquisa operante, tem estas características.
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18, 2001.
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