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UNESULBAHIA FACULDADES INTEGRADAS | REDE UNIFTC

BEATRIZ OLIVEIRA LUZ


ELTON JOSÉ FALCÃO DE SOUZA
NAIARA SALES CARDOSO

ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE JULGADO


DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Eunápolis/BA
Setembro de 2021
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UNESULBAHIA FACULDADES INTEGRADAS | REDE UNIFTC


BEATRIZ OLIVEIRA LUZ
ELTON JOSÉ FALCÃO DE SOUZA
NAIARA SALES CARDOSO

ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE JULGADO


DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Estudo de Caso com análise de Julgado do Supremo


Tribunal Federal realizado pelos alunos Beatriz Oliveira
Luz (Matrícula 10.354), Elton José Falcão de Souza
(Matrícula 9848) e Naiara Sales Cardoso (Matrícula
9861) do 10º Período Noturno do Curso de Direito da
Unesulbahia Faculdades Integradas, apresentada ao Prof.
Edson Branco Medeiros Branco Luiz da disciplina Direito
Internacional Público e Privado.

Eunápolis/BA
Setembro de 2021
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1. Disposições iniciais: o Direito Internacional e as relações sociais

A reflexão sobre a juridicidade do Direito Internacional Privado apresenta grandes


desafios e é de grande interesse para o operador do direito compreender as relações jurídicas
que geram conflitos entre Estados soberanos e seus indivíduos de outra nacionalidade.
Diante disto, esse estudo tem como propósito analisar um caso concreto de um
julgado do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre extradição, a fim de contribuir para o
desenvolvimento do conhecimento de pontos problemáticos na norma e interpretação do direito
nas diversas e variadas opções regulatórias, na juridicidade e soberania do Estado, bem como
na relação do direito internacional com o direito interno. Dessa forma, busca demonstrar a
importância das discussões sobre questões relevantes no âmbito do direito internacional.
As comunidades humanas nunca ficaram paradas em um mesmo lugar. A história é
marcada por fluxos de pessoas e seus bens entre diversas comunidades, migração e relações
entre os povos sempre foi uma realidade. Hoje, não é diferente - esses fluxos estão mais
intensos, graças à globalização da comunicação, que apresenta diversas oportunidades e
incentivos à mobilidade das pessoas a diversos Estados, que, por sua vez, também são
numerosos.
No entanto, as normas jurídicas que conduzem as ocorrências sociais são, em regra,
nacionais, ou seja, são limitadas pelo território de cada Estado e possuem diversas variações de
opções regulatórias, de Estado para Estado, e além disso, possuem também diversidade
normativa interna, que pode ocorrer ao longo do tempo, pois o direito de cada Estado não é
imutável.
Dito isso, tem-se que, as relações jurídicas que revestem esses fluxos transnacionais
de povos que podem pertencer a qualquer um dos ordenamentos jurídicos nacionais existentes,
que possuem pontos a elas vinculados, o que gera um concurso de normas divergentes e
jurisdições diferentes com potencial para regulação, geram também uma dúvida básica: qual
das normas e qual das jurisdições devem ser escolhidas para reger tais situações? A dúvida
quanto a essa regulação gera percalços aos fluxos de povos, pois podem causar insegurança
jurídica, tratamentos discriminatórios, violação da igualdade e outros direitos. Surge, então, a
necessidade de coordenação da regulação sobre essas situações transnacionais, o que explica a
consolidação e importância do Direito Internacional.

O Direito Internacional Privado (DIPr) estuda as normas jurídicas que visam à


regulação – tanto normativa quanto de julgamento e implementação de
decisões – de fatos sociais que se relacionam com mais de uma comunidade
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humana. Esses fatos sociais (denominados de fatos transnacionais) são


multiconectados ou plurilocalizados, podendo ser regulados por mais de um
ordenamento jurídico. Cabe ao Direito Internacional Privado (DIPr) coordenar
justamente essa potencialidade \\ de aplicação em um determinado território de
mais de um ordenamento jurídico, evitando sobreposição espacial ou mesmo
omissão (ausência de normas). (RAMOS, 2021, pag.11)

O principal objetivo do Direito Internacional Privado é dispor a aplicação de


normas incidentes sobre fatos que ultrapassam, por qualquer motivo, as fronteiras de um Estado
e que envolvam a vida social do indivíduo no intuito de protegê-lo nos fluxos das fronteiras de
forma a coibir situações como a xenofobia e o chauvinismo jurídicos que violem a igualdade e
a justiça material.

2. O Brasil e o Direito Internacional


2.1. Aspectos constitucionais da extradição

No território brasileiro, temos que a Constituição Federal é fonte do Direito


Internacional Privado, devido a genérica disposição do art. 4º, IX, o qual determina que a
República Federativa do Brasil se rege nas suas relações internacionais pelo princípio da
cooperação entre os povos para o progresso da humanidade. Ademais, contém regras
específicas sobre cooperação jurídica internacional, ao regular a carta rogatória, a homologação
de sentença estrangeira, bem como a extradição.
A extradição no Brasil está prevista no artigo 5º, incisos LI e LII da Constituição
de 1988, sendo detalhada no capítulo VIII, das medidas de cooperação, da lei nº 13.445, de 24
de maio de 2017 (lei de migração). Em síntese, o pedido de extradição é feito por vias
diplomáticas pelo Estado requerente, cabendo a análise ao Supremo Tribunal Federal, o
legitimado para processar e julgar o pedido, conforme o art. 102 da Constituição de 1988. A
própria lei de migração, em seu artigo 81, define a extradição como medida de cooperação
internacional entre o Estado brasileiro e outro Estado pela qual se concede ou solicita a entrega
de pessoa sobre quem recaia condenação criminal definitiva ou para fins de instrução de
processo penal em curso.

3. Estudo de caso em espécie: objeto do estudo

Dentre vários pedidos de extradição, tem-se um julgado, cuja decisão final ocorreu
em 30/06/2015, sendo publicado em 23/10/2015 tendo como órgão julgador a Segunda Turma
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com o Relator Ministro Teori Zavascki, acerca de uma situação de extradição sobre um
indivíduo de nacionalidade sueca.

EMENTA: EXTRADIÇÃO. DIREITO PENAL. 2. FATO


SUPOSTAMENTE CORRESPONDENTE AO CRIME DE SUBTRAÇÃO
DE INCAPAZES – ART. 249, CP. IMPOSSIBILIDADE DE O PAI, QUE
TEM A GUARDA DO FILHO, PRATICAR O CRIME – ART. 249, § 1º, CP.
NO MOMENTO DA VINDA PARA O BRASIL, O EXTRADITANDO
COMPARTILHAVA COM A MÃE DA CRIANÇA A GUARDA DA FILHA.
OU O FATO NÃO É CONSIDERADO CRIME NO BRASIL, VEDADA
A EXTRADIÇÃO (ART. 77, II, LEI 6.815/80); OU O CRIME OCORREU
NO BRASIL, SUJEITANDO-SE À APLICAÇÃO DA NOSSA LEI, NÃO
CABENDO A EXTRADIÇÃO (ART. 78, I, LEI 6.815/80).
3. EXTRADIÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. MAIORIA. CESSADAS
AS MEDIDAS CAUTELARES. 4. FEITA RESSALVA DE QUE O
INDEFERIMENTO DA EXTRADIÇÃO NÃO PREJUDICA A AÇÃO DE
BUSCA E APREENSÃO DA CRIANÇA

A presente ementa faz referência a um pedido de extradição, com pretensão de


prisão cautelar, de Goran Qvarfordt, de nacionalidade sueca, apresentado ao Ministério da
Justiça pelo Governo da Suécia, com base nos arts. 76 e 80 da Lei 6.815/1980, na época, lei do
estrangeiro, que atualmente se trata da Lei 13.445, de 24 de maio de 2017, lei do migrante, com
redação conferida, pela Lei 12.878/2013, em razão do mandado de detenção emitido em
30/11/2012 pelo Tribunal de Göteborg por suposta prática de “conduta arbitrária com menor,
crime agravado”, pois segundo o governo sueco, o extraditando teria supostamente sequestrado
sem qualquer razão aparente, sua filha Johanna Qvarfordt, nascida em 2004, no momento que
viajou com a mesma para o Brasil em junho de 2012, sem a autorização de sua mãe, Amanda
Qvarfordt, ainda que, o referido, detinha a época dos fatos, a tutela compartilhada da menor.
No que diz respeito à prisão cautelar, o pedido foi regularmente encaminhado pelo
Ministro de Estado da Justiça, por meio do Aviso 875/MJ, de 16 de julho de 2014 e a cautelar
foi decretada em 03/09/2014, efetivada em 10/10/2014, em Salvador/BA. No entanto, em
novembro de 2014, o extraditando noticiou que a União propôs, em março daquele ano, perante
a 1ª Vara Federal do Estado da Bahia/BA, ação de busca, apreensão e restituição de sua filha,
Johanna Qvarfordt, com fundamento na “Convenção sobre aspectos civis do sequestro
internacional de crianças – Convenção de Haia”, visando o retorno da menor à Suécia. No
entanto, o pai contestou o pedido, alegando que a menor sofrera abusos sexuais perpetrados
pelo atual padrasto, do que decorreu abertura de inquérito na Suécia. Por conseguinte, o
Ministério Público apresentou manifestação “desaconselhando o retorno da criança à Suécia
até que seja esclarecida a situação dos possíveis abusos sexuais.” Com essas informações, o
juízo determinou, em novembro de 2014, a realização de perícia psicológica e em dezembro de
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2014, deferiu a revogação da prisão cautelar do extraditando, mediante o cumprimento de


medidas cautelares.
A respeito da situação do pedido de extradição, o relator do processo, o Ministro
Teori Zavascki, votou monocraticamente pelo deferimento do pedido de extradição, ao
considerar o preenchimento regular dos requisitos legais para tal. No entanto, é válido destacar,
que o que chama a atenção neste caso refere-se ao requisito da dupla tipicidade previsto no art.
77, II, da Lei 6.815/1980, que embora, para o ministro relator, também fora plenamente
atendido, já que o crime denominado “conduta arbitrária com menor”, previsto na legislação
do Estado requerente Suécia:
“quem separa uma criança com idade inferior a 15 anos de outra pessoa que
tem a guarda da criança é condenado por conduta arbitrária com menor a multa
ou prisão não superior a um ano, a não ser que o crime seja uma violação da
liberdade. O mesmo se aplica a uma pessoa com guarda conjunta de uma
criança com idade inferior a 15 anos, que sem qualquer razão substancial,
arbitrariamente rapta a criança ou se a pessoa que deve ter a custódia
ilegalmente usurpar o menor, fazendo-a assim como sua “.

encontra, segundo ele, correlação na lei brasileira com a conduta típica prevista no art. 249 do
Código Penal “Subtrair, menor de 18 (dezoito) anos ou interdito ao poder de quem o tem sob
sua guarda em virtude de lei ou de ordem judicial. Pena - detenção, de 2 (dois) meses a 2 (dois)
anos, se o fato não constitui elemento de outro crime.
Na mesma baia, a princípio, assim foi também o entendimento da Min. Carmem
Lucia, que pediu vistas do processo e fez observações. De outra forma, para o Min. Gilmar
Mendes, o fato foi atípico, pois o pai até poderia ser autor do crime de subtração de incapaz,
mas apenas se estivesse destituído, ou temporariamente privado, do pátrio poder, da tutela, da
curatela ou da guarda, conforme diz o art. 249, § 1º do Código Penal Brasileiro “O fato de ser
o agente pai ou tutor do menor ou curador do interdito não o exime de pena, se destituído ou
temporariamente privado do pátrio poder, tutela, curatela ou guarda”.
Tendo em vista que no momento da viagem o pai possuía a guarda da filha, o
referido Ministro, argumentou que não há que se falar em dupla tipicidade e que ainda que o
pai não tivesse a guarda da menor, não existia nenhum processo onde ele perdeu o pátrio poder
sobre sua filha, conforme defende a doutrina a respeito da perda do pátrio poder, que é
irrevogável.
Por fim, o argumento e fundamento utilizado pelo Min. Gilmar Mendes, serviu de
convencimento para maioria da turma e acabou julgando IMPROCEDENTE o pedido de
extradição por falta do pressuposto da dupla tipicidade penal, característica está, fundamental
para deferir uma extradição.
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4. Análise do caso

Fazendo analise do mérito e todos os argumentos trazidos ao inteiro teor do julgado


em questão, de fato, entende-se que não houve a prática do crime no momento da viagem, pois
quando a mãe moveu ação judicial na Corte sueca, a qual levou à cassação da guarda pelo
extraditando, a criança já estava no Brasil e ainda que tenha havido irregularidade quanto à não
autorização da saída ou entrada deles no Brasil, o que segundo o processo, não consta nenhum
obstáculo à época, tendo o pai a guarda, só caberia dois desfechos da história: ou o fato não é
considerado crime no Brasil, vedando então a extradição pelo art. 77, inciso II; ou que o crime
de cuidar, sem ter a guarda, ou o de não devolver a criança ao país de origem, ambas situações
ocorreram no território brasileiro, logo, sujeita-se à aplicação da lei brasileira, não cabendo a
extradição por força do art. 78, I, da Lei 6.815.
Analisando de forma filosófica este fato, percebe-se quão vivo é o direito, em
especial, o direito internacional, seja aqui, seja do outro lado do continente, as relações
acontecem, os destinos se deparam e será sempre assim, como no caso em comento onde
verifica-se a história de indivíduos suecos, em território brasileiro, submetidos a nossa
jurisdição, a qual foi legitimada por um momento, a dizer a respeito da liberdade de ir e vir de
um pai, cidadão sueco, resguardado no Brasil por suas motivações pessoais e de uma criança,
que precisa de proteção e preservação de seus direitos, supostamente violados, mas que não
muda o fato de sua vulnerabilidade, seja neste País ou no seu de origem, ou em qualquer outro
lugar e de uma mãe, do outro lado do mundo almejando ter sua filha de volta.
Este julgado, que traz um xxxx da vida real, extem outras e existirão muitas outras,
iguais ou parecidas, caberá ao direito, embora a diversidade de normas, culturas e princípios,
prezar sempre pela proteção da dignidade da pessoa humana em qualquer canto da terra.
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REFERÊNCIAS

_______. Congresso Nacional. Lei no 6.815 de 19 de agosto de 1980. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6815.htm. Acesso em: 20 set. 2021 (LEI DO
ESTRANGEIRO QUE FOI REVOGADA PELA DO MIGRANTE)

MANOLE, E.J.D. E. Constituição Federal 11a ed.. Editora Manole, 2019. 9788520460245.
Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788520460245/. Acesso
em: 20 set. 2021.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado: Grupo GEN, 2021. 9788530993443.
Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530993443/. Acesso
em: 20 set. 2021.

RAMOS, A.D. C. CURSO DE DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. Editora Saraiva,


2021. 9786555595352. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786555595352/. Acesso em: 20 set. 2021.

_________. Senado Federal. Lei 13.445, de 24 de maio de 2017. Brasília, 2017. Disponível em:
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2017/lei-13445-24-maio-2017-784925-
publicacaooriginal-152812-pl.html. Acesso em: 18 setembro de 2021.

STF – Ext: 1354 DF – Distrito Federal 9960901-70.2014.1.00.0000, Relator: Min. TEORI


ZAVASCKI, Data de Julgamento: 30/06/2015. Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-212
23-10-2015

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