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Há cerca de 1000 anos, em plena Idade Média, a História da Europa era marcada
por sucessivas experiências monásticas, numa busca constante de um
cristianismo mais autêntico. A Ordem de Cluny foi uma das mais marcantes.
Partindo da Regra de São Bento, a Ordem cluniacense construiu uma gigantesca
rede de mosteiros filiados, sempre em obediência à Abadia de Cluny.
Para a maior parte dos leigos, o mundo dos religiosos é hoje um terreno
desconhecido. Há cerca de meio século, era um terreno exótico ou pitoresco: a
variedade dos hábitos masculinos e femininos, com os seus cortes, padrões e
cores, quase todos de forma austera, mas tão diferente do vestuário civil,
contribuía para transmitir a ideia de que os religiosos eram uma espécie de tropas
especiais, encarregadas de certas funções, sem que se soubesse, porém –
porque o secularismo já avançava a passos largos – qual era o seu combate. Mas,
na actualidade, a maioria dos religiosos deixou de usar hábito, o que quer dizer
que as diferenças se tornaram mais vagas ou misteriosas e, para a maioria dos
leigos, crentes ou não, pormenores sem grande importância.
Se, desde o Concílio de Trento, esse papel se foi restringindo a áreas específicas,
na Idade Média pode-se dizer que quase não existia nenhum aspecto de vida
corrente em que eles não estivessem presentes. A ignorância deste facto e o
desconhecimento dos dados referentes às ordens religiosas medievais conduziu a
erros gravíssimos, à deturpação de fenómenos e acontecimentos decisivos, a não
saber aproveitar informações da maior importância ou a não compreender,
simplesmente, aquilo de que estavam a falar. Para se conhecer o ambiente
histórico no qual nos movemos e do qual somos depositários, para se dar “poder”
ao lugar é forçoso, antes de tudo, colocar-se múltiplas questões. Eis, pois, que
traçamos o quadro enformador das perguntas a partir das quais se formula o
presente projecto:
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A VIDA MONÁSTICA
A vida monástica cristã, pode dizer-se, só apareceu na Igreja no século IV, com as
primeiras experiências de fuga para o «deserto» dos que são considerados o
fundador da vida eremítica, Santo Antão, e o fundador da vida cenobítica, São
Pacómio, embora antes disso fosse muito frequente por toda a parte a adopção de
formas de vida ascética individual ou em pequeno grupo. Ao longo do tempo,
foram surgindo várias regras; concomitantemente, foi-se difundindo uma certa
tendência para a uniformização. A este sistema chamaram os historiadores regula
mixta, a fim de o distinguir do posteriormente adoptado com a Regra de São
Bento, Regra cujo prestígio se ficou a dever, não apenas ao seu carácter simples e
moderado, mas também ao elogio que dela fez São Gregório Magno; não
obstante, só começou a adquirir o carácter de norma exclusiva de outras
observâncias quando foi recomendada a todos os monges do império carolíngio
nos capitularia monastica dos sínodos de Aix-la-Chapelle de 816 e de 818-819,
inspirados por São Bento de Aniano. Fora do Império, nomeadamente no Noroeste
peninsular, continuou a prevalecer o sistema da regula mixta, baseado nas regras
peninsulares de Santo Isidoro (Sevilha), São Frutuoso (Montélios) e São Leandro
(Sevilha) A concepção da vida monástica, como uma forma de vida religiosa
própria foi introduzida no Noroeste Peninsular e em Portugal por intermédio dos
monges cluniacenses de origem francesa ou daqueles que imitavam as suas
observâncias, embora sem se sujeitarem à observância directa do abade de
Cluny.
O ROMÂNICO
O estilo românico surge, em Portugal, nos finais do século XI no âmbito de um
fenómeno mais vasto de europeização da cultura, que trouxe para a Península
Ibérica a reforma monástica cluniacense e a liturgia romana. A chegada das
ordens religiosas de Cluny, Cister, dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho e
das Ordens Militares – Templários e Hospitalários – também deve ser enquadrada
no processo da Reconquista e da organização do território.
São Bento (c. 480 – c. 547) fundador e abade do Mosteiro de Monte Cassino, aí
compôs a Regra que recebeu o seu nome. Apesar da influência desta Regula
Monachorum ser já nítida no monaquismo carolíngio, é a partir da época românica
que se torna o documento fundamental da vida monástica, servindo de modelo a
um grande número de ordens religiosas que a adopta ou que nela se inspira.
Cluny atinge o seu apogeu em meados do século XII quando tem, sob a sua
dependência, 1184 mosteiros submetidos a uma uniformidade de observância e de
costumes monásticos. Tendo características próprias, apesar de seguir a Regra de
São Bento, a Ordem de Cluny desenvolve uma liturgia muito rica, sustentada pela
imensa quantidade de ofícios litúrgicos que desempenha, plena de simbolismo e
de magnificência. Segundo o espírito cluniacense nenhuma realização era
demasiado bela para honrar a Deus, o que irá favorecer uma estética de riqueza e
de profusão ornamental.
Na verdade foi o factor religioso, mais do que qualquer outro, que contribuiu para a
europeização e difusão dos elementos que permitem definir o conceito de
românico, embora haja edificações de carácter civil, profano e militar de grande
importância no desenvolvimento e afirmação da arquitectura românica. No
entanto, esta constituiu-se e desenvolveu-se em função de modelos e de
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arquétipos de conteúdo religioso, e é nesse âmbito que produz as suas
manifestações mais características.
No território que é hoje Portugal, foi a conquista de Coimbra (1064) aos mouros,
por Fernando Magno de Leão, deu uma maior segurança às regiões do norte,
propiciando importantes transformações sociais e económicas. Esta época é
marcada por um crescimento demográfico, por uma muito mais densa ocupação
do território e por um habitat mais estruturado.