Você está na página 1de 14

Potenciais dificuldades e facilidades na educação de

alunos com deficiência intelectual*

Daísy Cléia Oliveira dos Santos


Universidade Federal de Goiás,

Resumo

Quando o assunto é o ensino escolar dos alunos com deficiência


intelectual, não é raro o questionamento sobre o modo de trabalhar com
tais alunos. Para tanto, este artigo procura apresentar uma descrição e
uma compreensão acerca das características da deficiência intelectual
em relação ao quadro principal de prejuízo cognitivo (as funções
intelectuais) e adaptativo (as funções sociais, emocionais e práticas),
para, então, definir as possibilidades da prática pedagógica no contexto
escolar. O estudo foi construído a partir de uma pesquisa bibliográfica
sobre a área da deficiência intelectual, dos transtornos da aprendizagem
e do desenvolvimento, da inclusão escolar e do ensino especializado.
Embora a deficiência intelectual seja um desafio no ensino escolar em
face de seu objetivo curricular, tanto na sala de aula comum quanto
no atendimento educacional especializado, é possível estabelecer um
contexto pedagógico prolífico tendo em vista os objetivos educacionais
de desenvolvimento pessoal e formação acadêmico-profissional,
cultural e cidadã. Portanto, fato é que a didática no ensino do aluno
com deficiência intelectual precisa ser específica não só em relação
às peculiaridades do quadro da deficiência, como também em relação
à individualidade de cada sujeito. De qualquer modo, mesmo que a
deficiência intelectual não permita sua reversão completa, uma vez
que consiste em um desenvolvimento neurológico deficitário, avanços
escolares são possíveis.

Palavras-chave

Deficiência intelectual – Deficiência mental – Educação


especializada – Inclusão.
Contato:
Daísy Cléia Oliveira dos Santos
daisygyn7@gmail.com

* Este artigo é parte do traba-


lho final apresentado ao curso
de Pós-Graduação em Educação
para a Diversidade e Cidadania da
Faculdade de Direito da Universidade
Federal de Goiás (UFG), concluído
em fevereiro de 2012.

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 935
Potential downsides and upsides of the education of
pupils with intellectual handicap*

Daísy Cléia Oliveira dos Santos


Universidade Federal de Goiás

Abstract

When the subject is the teaching of pupils with intellectual handicap,


it is not unusual to question the way of working with them. The
present article seeks to show a description and an understanding
of the features of intellectual handicap in relation to the wider
picture of cognitive (the intellectual functions) and adaptive (the
social, emotional, and practical functions) handicap, so as to then
define the possibilities of the pedagogical practice within the school
context. The study was built based on a bibliographical survey of
the field of intellectual handicap, of learning and development
disorders, of social inclusion, and of special teaching. Although
intellectual handicap poses a challenge to school teaching in view
of its curricular objective, both in an ordinary classroom and in
specialized educational service, it is possible to establish a fruitful
pedagogical context keeping in mind the educational objectives of
personal development and academic-professional, cultural and
citizenship training. Therefore, it is a fact that the didactics of the
teaching of pupils with intellectual handicap needs to be specific,
not just with respect to the peculiarities of a handicap situation, but
also in respect to the individuality of each subject. At any rate, even
if intellectual handicap may not allow its complete reversal, since
it consists in a deficient neurological development, school progress
is still possible.

Keywords

Intellectual handicap – Mental deficiency – Special education –


Inclusion.

Contact:
Daísy Cléia Oliveira dos Santos
daisygyn7@gmail.com

* This article is part of the final


work presented to the graduate
course in Education for Diversity and
Citizenship of the Law School of the
Federal University of Goiás (UFG),
concluded in February 2012.

936 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 4, p. 935-948, out./dez. 2012.


A educação escolar é mais do que um a aprendizagem. Nessa perspectiva, o presente
processo e um contexto para a promoção da estudo buscou elencar o máximo possível de in-
aprendizagem de conteúdos técnico-teóricos, formações que definem a deficiência intelectual
devendo também promover a convivência hu- – em seus âmbitos cognitivo, comportamental,
mana. Das interações próprias ao contexto es- emocional e social –, a fim de traçar direciona-
colar, acaba sendo evidenciada a diversidade mentos pedagógicos que promovam a efetiva
humana, uma vez que tais interações fazem educação escolar.
emergir a singularidade de cada sujeito e a ne- A apresentação de uma síntese biblio-
cessidade de práticas de ensino e de interação gráfica de um tema tão específico como a ca-
que sejam tanto pluralizadas como individuais. racterização da deficiência intelectual, por si
Tal aspecto, além de ser fascinante por desve- só, já é importante, bem como sua associação
lar a especificidade humana, torna a educação a práticas educacionais que viabilizem ações
escolar um desafio perante a promoção integral efetivas e evitem ações com forte potencial de
do desenvolvimento e da formação do aluno, prejuízo ou com efeitos insuficientes. A título
considerando sua singularidade. de exemplo da importância de uma pesquisa
A educação inclusiva assumiu fortemen- bibliográfica, toma-se o desenvolvimento das
te essa responsabilidade de abarcar métodos e atualizações semânticas, como no caso da ter-
reflexões que possam garantir a todo e qualquer minologia da deficiência intelectual, que ex-
aluno o direito à educação formal (escolar). Com cluiu o uso do termo deficiência mental com o
o aluno que possui deficiência intelectual não é propósito de evidenciar o déficit no nível cog-
diferente, mesmo que as características próprias nitivo e minimizar a associação errônea com as
desse quadro impeçam a aquisição suficien- doenças mentais (SASSAKI, 2005). Assim, com
te dos conteúdos propostos pelos programas este estudo, pretendeu-se detalhar aspectos da
curriculares. A pessoa com deficiência intelec- deficiência intelectual que influenciam os pro-
tual possui condições estruturais e funcionais cessos de desenvolvimento e aprendizagem no
que comprometem a adaptação ao ambiente e contexto escolar, via descrições técnicas, teóri-
a ampla aquisição de informações. Nesse caso, cas, científicas e reflexivas. Além disso, visou-
o processo de ensino-aprendizagem tradicio- -se propor sugestões teóricas, técnicas e críticas
nal das escolas passa a ser insuficiente para a (análises reflexivas) que possam potencializar o
promoção educacional do aluno, de modo que trabalho educacional geral junto ao aluno com
estratégias especializadas se fazem altamente deficiência intelectual.
necessárias (BATISTA; ENUMO, 2004; BRASIL,
2006, 2007, 2010; MANTOAN, 2006; RIBEIRO, A caracterização da deficiência
2009; SÁNCHEZ, 2005; SASSAKI, 2005). intelectual
Uma limitação, seja ela estrutural ou
funcional, não elimina a possibilidade de A terminologia da área dos transtornos
aprendizagens e de adaptações ao meio. Como da aprendizagem e do desenvolvimento define
aponta Banaco (1997), as potencialidades hu- deficiência como uma condição resultante de um
manas não podem ser tomadas como cristaliza- impedimento, ou seja, como uma limitação em al-
das (ou fixas), uma vez considerado o poder da gum nível que compromete determinados desem-
influência externa na determinação do compor- penhos (OMS, 1995; AMERICAN PSYCHIATRIC
tamento. Em face da possibilidade da aquisição ASSOCIATION, 1995; SASSAKI, 2005). Assim,
de competências, torna-se importante a elabo- deficiência corresponde a uma habilidade em dé-
ração de definições claras referentes aos qua- ficit, uma perda ou uma anormalidade (no senti-
dros específicos das dificuldades, para que es- do estrutural, estatístico, e não cultural, como nas
tratégias de ação especializadas potencializem noções pejorativas de bom e ruim). A deficiência

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 937
intelectual é um tipo singular de deficiência, com além de limitações adaptativas em pelo menos
suas características e distinções em relação às de- duas das seguintes habilidades: comunicação,
mais deficiências; por isso não se fala em pesso- autocuidado, vida no lar, interação social, saú-
as com deficiências intelectuais, mas em pessoas de e segurança, uso de recursos da comunidade,
com deficiência intelectual. autodeterminação, funções acadêmicas, lazer e
Quanto a essas peculiaridades termino- trabalho. Outro critério para sua identificação é
lógicas, ainda, faz-se necessária a distinção a manifestação antes dos 18 anos de idade.
relativa à substituição do ultrapassado termo A deficiência intelectual não significa,
deficiência mental para o atual deficiência in- necessariamente, uma incapacidade, já que
telectual. O termo deficiência mental gera con- esta se refere à impossibilidade, mesmo que
fusão com a doença mental, sendo que esta momentânea, de atuação específica (AAIDD,
consiste em um transtorno do tipo psicopato- 2011; OMS, 1995; AMERICAN PSYCHIATRIC
lógico. Segundo Sassaki (2005), cada vez mais ASSOCIATION, 1995). Por exemplo, para a ati-
se tem firmado a rejeição pelo termo mental vidade de gerência em determinada empresa,
em comparação ao termo intelectual, tal como uma pessoa cadeirante tem condição de execu-
estabelecem a Organização Pan-Americana da tar suas tarefas laborais, diferentemente de uma
Saúde e a Organização Mundial da Saúde, na pessoa depressiva que sequer consegue sair de
Declaração de Montreal sobre deficiência inte- casa e, assim, encontra-se incapaz. Como evi-
lectual, de outubro de 2004. denciado no exemplo, em deficiência intelectual
De acordo com a CID-10 (OMS, 1995), não se considera a pessoa como incapaz, pois,
a Classificação estatística internacional de do- de pessoa para pessoa, as limitações podem va-
enças e problemas relacionadas à saúde, dos riar quanto à forma e ao grau de comprometi-
tipos diagnósticos em F70-F79, a deficiência mento (OMS, 1995; AMERICAN PSYCHIATRIC
intelectual corresponde a um desenvolvimento ASSOCIATION, 1995; BRASIL, 2010; RIBEIRO,
incompleto do funcionamento intelectual, ca- 2009); nesse mesmo sentido, as possibilidades
racterizada, essencialmente, por um comprome- de adaptação e aprendizagem não são extre-
timento das faculdades que determinam o nível madas, mas justificadas pela peculiaridade de
global de inteligência, ou seja, das funções cog- cada sujeito. Assim, as pessoas com deficiência
nitivas. As funções cognitivas correspondem à intelectual possuem tantas diferenças entre si
capacidade de aprender e compreender, sendo como todos os demais. Nesse sentido, conside-
funções superiores que se estabelecem a partir ra-se que a deficiência intelectual pode até ser
do sistema nervoso central. Elas englobam as estrutural, mas não deve ser construída – ainda
capacidades de linguagem, aquisição da infor- mais pela falta de estimulação adequada, pois,
mação, percepção, memória, raciocínio, pensa- por mais severo que seja o comprometimento, a
mento etc., as quais permitem a realização de capacidade de aprender é intrínseca.
tarefas como leitura, escrita, cálculos, concep- Analogamente à mudança semântica de
tualização, sequência de movimentos, dentre deficiência mental para deficiência intelectual,
outras (MALLOY-DINIZ et al., 2010). as noções de incapacidade e anormalidade, que
Assim, a característica fundamental da advêm do modelo médico, refletem uma sinto-
deficiência intelectual é o significativo prejuízo matologia fixa. Contudo, a determinação de in-
cognitivo. Além disso, a Associação Americana capacidade do sujeito dependerá da impossibili-
de Deficiência Intelectual e do Desenvolvimento dade a que essa incapacidade se refere, sendo ela
(AAIDD, 2011) define deficiência intelectual uma condição e, portanto, passível de alteração.
como um funcionamento intelectual (QI) infe- Como o ambiente é dinâmico e o ser hu-
rior à média, havendo limitações significativas mano possui potencial de adaptação e mudan-
das competências práticas, sociais e emocionais, ça, o desenvolvimento humano pode variar.

938 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais dificuldades e facilidades na educação de alunos com deficiência...
O enfoque educacional e de aprendizagem Sobre o desenvolvimento da linguagem
transpõe o modelo médico para uma ênfa- na deficiência intelectual, merece destaque o
se na funcionalidade (AAIDD, 2011; CASTRO; fato de ser comum um déficit na produção da
ALMEIDA; FERREIRA, 2010; MALLOY-DINIZ linguagem, como problemas com a morfologia
et al., 2010; PALANGANA, 2001; VYGOTSKY, e, em decorrência disso, a construção de frases
1998). Um ambiente escolar que trabalhe as curtas e simples. Devido à limitada capacidade
necessidades de cada aluno tem potencial para expressiva, ocorrem poucas interações diárias
superar dificuldades, ou ao menos para ame- que favoreçam o aperfeiçoamento, o que acaba
nizá-las. Na deficiência intelectual, mesmo gerando uma realimentação: como as pesso-
que um maior desenvolvimento e uma maior as não entendem muito bem o relato daquele
evolução sejam possíveis, a completa reversão com deficiência intelectual, então ele acaba por
do quadro não o é (AAIDD, 2011; AMERICAN não insistir na fala. Entretanto, a fala é o ele-
PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 1995; FLETCHER mento primordial para o maior desenvolvimen-
et al., 2009; MALLOY-DINIZ et al., 2010). to dos demais processos cognitivos (CASTRO;
Vale destacar, ainda, que o quadro da ALMEIDA; FERREIRA, 2010; FLETCHER et al.,
deficiência intelectual é fundamentalmen- 2009; MALLOY-DINIZ et al., 2010).
te marcado por uma inteligência geral com-
prometida, ou seja, o prejuízo cognitivo é a O ensino escolar do aluno com
principal característica diagnóstica, corres- deficiência intelectual
pondendo a: restrito raciocínio lógico, restrita
capacidade de planejamento, solução de pro- A educação escolar tem por fundamento
blemas deficitária, fraco pensamento abstrato, atender a todos, mesmo quando há necessidade
baixa fluidez da aprendizagem, memorização de adaptar a estrutura escolar e as práticas de
restrita, baixa coordenação visuoespacial e ensino a cada criança, uma vez que as diferen-
lateralidade, esquema corporal dificultado, ças humanas são naturais. Seguindo esse prin-
limitada atenção, limitada generalização, cípio, num processo histórico surgiu a educação
prejuízo da capacidade expressiva (princi- inclusiva, com o objetivo central de fortalecer,
palmente a verbal), deficitária capacidade de nas instituições escolares, equipes de trabalho
percepção, ausência de autodirecionamento que se preocupem em atuar eficazmente peran-
etc. Além disso, tal quadro também é marca- te uma variada gama de situações envolvendo
do por uma restrição e por um comprometi- alunos com necessidades educacionais especiais
mento dos seguintes aspectos: capacidade de (singulares), de modo que eles, em sua singula-
responsabilidade, autonomia, observância das ridade, tenham a possibilidade de desenvolver
regras sociais, iniciativa ocupacional, inter- tanto suas capacidades cognitivas quanto as so-
dependência, segurança pessoa (presença de ciais. A perspectiva da inclusão escolar não se
ingenuidade), controle emocional (manifesta- restringe à superação das dificuldades do aluno
do tanto com agressividade quanto com pas- ou à socialização, mas tem como proposta fa-
sividade), desenvolvimento neuro-psicomotor, vorecer a emancipação intelectual por meio da
assumência de papeis sociais (heteronomia incorporação de novos conhecimentos, de acor-
social), interação interpessoal, autocuidado re- do com a possibilidade de ampliar o que já se
ferente à saúde e higiene, estruturação da ex- conhece e de favorecer o desenvolvimento geral
periência (AAIDD, 2011; CASTRO; ALMEIDA; (BATISTA; ENUMO, 2004; BRASIL, 2010; LIMA,
FERREIRA, 2010; AMERICAN PSYCHIATRIC 2009; MANTOAN, 2006; SÁNCHEZ, 2005).
ASSOCIATION, 1995; FLETCHER et al., 2009; Um estudo desenvolvido por Lima (2009)
MALLOY-DINIZ et al., 2010; SÁNCHEZ, 2008; avaliou que, para 63% dos pais de filhos com
TAVARES; ALARCÃO, 2005). deficiência intelectual, a aprendizagem e o

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 939
desenvolvimento são o principal motivo para os com a prática social. Desse modo, a partir das
filhos estudarem na rede regular de ensino, en- considerações de Batista e Enumo (2004), Brasil
quanto 21% tiveram a socialização como moti- (2006, 2007, 2010), Castro, Almeida e Ferreira
vador. Tal estudo enfatiza a importância que a (2010), Fletcher et al. (2009), Malloy-Diniz et al.
educação escolar vem tomando em relação ao (2010), Sánchez (2008), Smith e Strick (2008) e
trabalho junto a alunos com deficiência intelec- Vygotsky (1998), o currículo e o planejamento
tual, bem como o avanço histórico e técnico da propostos ao aluno com deficiência intelectual
inclusão escolar. deve gerar experiências em um ambiente:
Tendo em vista que o comportamento do • em que seja possível definir ou reforçar
indivíduo está intimamente ligado ao processo a identidade do aluno (quem ele é, seu valor
de aprendizagem, é fundamental que o ensino pessoal, sua cultura);
escolar não privilegie a mera aquisição formal • sem discriminações e que promova
de informações, na qual se adota a estratégia segurança, relação interpessoal, contingências
de transmissão ou explicação de conteúdos. O positivas e bem-estar pessoal;
professor deve criar condições para que o alu- • que permita a acessibilidade ao am-
no não aceite depressa demais as informações biente físico e a acessibilidade instrumental
sem que estas sejam consistentemente recebi- (materiais e recursos que minimizem as dificul-
das, assimiladas e aplicadas a alguma situação dades sensoriais e motoras);
prática (real), seja via experiência ou associação • em que, assim como em relação aos
com situações vivenciadas (BATISTA; ENUMO, demais alunos sem deficiência, as práticas de
2004; CASTRO; ALMEIDA; FERREIRA, 2010). ensino considerem as fases de desenvolvimento
Devido ao grau de limitação imposto do aluno, as quais podem prolongar-se por um
pela determinação neurológica, mesmo que o tempo maior;
professor possa fazer muito no ensino escolar • com práticas motivadoras, alegres e
junto a alunos com deficiência intelectual, al- afirmativas; com estratégias ricas em estimu-
guns conteúdos e objetivos educativos especí- lação e diversificadas quando necessário (por
ficos serão inatingíveis, inclusive nos casos em exemplo, recursos audiovisuais, objetos de di-
que há um nível moderado de limitações. Mais ferentes materiais, cores e texturas). Vale desta-
do que destrinchar o conteúdo curricular, deve- car que as contingências de ensino devem partir
-se priorizar aquilo que pode ser assimilado pelo de habilidades que o aluno já possui para, en-
aluno, afinal, caso não ocorra a assimilação, tão, evoluir gradualmente naquilo que ainda é
não haverá a aquisição (aprendizagem), a me- preciso desenvolver ou adquirir. Desse modo, é
morização e, consequentemente, a recuperação possível gerar condições para que o aluno acer-
e a aplicação (CASTRO; ALMEIDA; FERREIRA, te mais do que erre, receba mais reforço imedia-
2010; FLETCHER et al., 2009; MALLOY-DINIZ to e feedback. Assim, promove-se a motivação,
et al., 2010; SÁNCHEZ, 2008; SMITH; STRICK, a autoconfiança e o aumento de comportamen-
2008; TAVARES; ALARCÃO, 2005). tos almejados pelos objetivos escolares;
Mesmo que a apreensão de todo o con- • com atividades mais tranquilas nos
teúdo curricular pelo aluno com deficiência momentos de maior enfoque nos conteúdos
intelectual seja significativamente limitada, há curriculares, uma vez que o estado emocional
a possibilidade de um efetivo desenvolvimen- livre de tensão, estresse, medo, irritabilida-
to de suas potencialidades, tal como propõe a de e ansiedade pode permitir maior atenção e
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional concentração;
(Lei nº 9.394, de 1996) em relação aos objetivos • que utilize momentos – os quais con-
educacionais centrados nos processos formati- sistirão em minutos – de descanso predefinidos
vos e no vínculo com o mundo do trabalho e e com duração de tempo necessária de acordo

940 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais dificuldades e facilidades na educação de alunos com deficiência...
com as particularidades do aluno, de modo a generalização de um nível muito inferior de
permitir uma maior tranquilidade e, consequen- dotação intelectual na deficiência intelectual;
temente, uma maior possibilidade de aquisição. • que utilize estratégias para o aperfei-
Nessa linha estratégica também pode ser utili- çoamento da capacidade expressiva oral, do
zado o cantinho do sossego, um lugar na escola repertório verbal e da organização do pensa-
ou na própria casa do aluno para ele ir sempre mento, por meio de apresentação de relatos
que precisar relaxar, e onde pode haver objetos subjetivos, contação de histórias, apresentação
por ele preferidos; de perguntas durante a aula, descrição de ima-
• que, devido ao prejuízo da atenção, gens, uso de linguagem variadas etc.;
utilize de comandos para chamar a atenção do • que selecione conteúdos curriculares
aluno apenas nos momentos em que isso se fi- mais importantes e passíveis de efetiva compre-
zer necessário, evitando a apresentação dos co- ensão – é a denominada adaptação curricular;
mandos a todo momento; • que reconheça interesses que o aluno
• em que o professor leve o aluno a pen- já possui, a fim de favorecer a valorização, a
sar e verbalizar sobre aquilo que está sendo motivação e o vínculo com o professor, o qual
transmitido, uma vez que, na deficiência inte- está partilhando de aspectos pessoais do aluno;
lectual, o processamento da informação ocorre • que valorize a prática do brincar, a qual
mais por recepção do que por ativação (ação) consiste em uma abordagem natural para o desen-
– o raciocínio lógico é possível desde que es- volvimento humano, favorece o pensar e o fanta-
timulado para tal. Além disso, tal estratégia siar – até porque tal clientela apresenta déficit de
gera consciência perante aquilo que está em abstração e contato com a realidade objetiva;
aprendizagem; • que utilize recursos frequentes para o
• que trabalhe a memória associativa, incentivo e a evolução da escrita (por exemplo,
via informações contextualizadas. Logo, o uso canetas coloridas, folhas de papel – reduzidas
de conhecimentos a partir do concreto não se gradativamente de tamanho –, pinceis durante
restringe à dimensão física; as atividades de pintura etc.). O treino da escri-
• em que, mesmo sendo utilizadas es- ta, ainda, deve ser organizado de tal modo que
tratégias que favoreçam a transferência de a atividade seja reconhecida como necessária
um conteúdo para que a compreensão seja para a vida diária;
consistente e permanente e para que ocorram • que estabeleça instruções diretas so-
generalizações, certas repetições (num senti- bre comportamentos considerados adequados
do quantitativo) de um conteúdo deverão ser no ambiente escolar e social, possibilitando a
estabelecidas para que a memorização ocorra; aprendizagem de regras comuns para o con-
quanto maior é o comprometimento (déficit), vívio coletivo (por exemplo, conservação de
maior é a necessidade de repetições. A estimu- objetos e do ambiente; silêncio em atividades
lação adequada/precisa também será necessária comuns que o requerem). Algumas evidências
em certos momentos para a evocação1; sobre problemas de comportamento de crianças
• que estimule a curiosidade e desafie o que possuem certo tipo de transtorno ou defici-
aluno, a fim de gerar um repertório permanente ência intelectual indicam a permissividade e até
de iniciativa e exploração ativa; a indiferença de professores e pais em relação
• que não superestime as potenciali- aos comportamentos considerados socialmen-
dades do aluno, tendo em vista a frequente te inadequados (sejam eles de aprendizagem
ou psicológicos), o que geralmente ocorre por
complacência (BANACO, 1997; SMITH; STRICK,
1- Evocação significa a recuperação de um conteúdo memorizado a partir
de estímulos relacionados à situação original ou por meio de tempo e esforço 2008). Nos casos de deficiência intelectual, ob-
novos para reaprender e atingir um desempenho semelhante ao original. serva-se alta possibilidade e importância do

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 941
ensino e da aprendizagem de comportamentos maior dificuldade em executar as atividades
socialmente considerados adequados; escolares e a possibilidade de baixa autoestima
• que utilize atividades em blocos para pode gerar uma maior ocorrência de estresse
que o aluno siga uma única instrução (aquela e sua respectiva manifestação comportamen-
própria da atividade em questão), de modo que tal. A intervenção imediata é importante por
ele não tenha outros elementos que desviem a não possibilitar a emissão de comportamentos
atenção e, assim, conclua toda a atividade, possa mais extravagantes e desvantajosos em rela-
prosseguir com as demais (tendo em vista que ção ao que é desejado num ambiente escolar
tal aluno demonstra baixa consistência no de- e social, bem como por evitar que tais com-
senvolvimento das atividades) e receba o reforço portamentos sejam reforçados (por exemplo,
imediato; quando o professor retira o aluno da sala para
• que promova não só a minimização se acalmar apenas depois de ele ter emitido
das dificuldades, como o desenvolvimento de comportamentos mais drásticos, como jogar
novas habilidades e o aperfeiçoamento de ha- objetos, gritar, levantar-se);
bilidades positivas que o aluno já possui. Vale • que articule informações fornecidas
destacar que comportamentos desejados (por pelos familiares para, por exemplo, utilizá-las
exemplo, atenção, escrita, leitura, uso dos ma- a fim de exemplificar conteúdos curriculares
teriais escolares, participação nas brincadeiras) e promover o reconhecimento (valorização) e
dos alunos com deficiência intelectual são fa- a motivação;
vorecidos pelo convívio com modelos de com- • que gere no aluno e na família o in-
portamentos de alunos sem a deficiência. Esse teresse permanente pela aprendizagem e pelo
é um dos principais aspectos que justificam a crescimento pessoal, uma vez que é caracterís-
educação inclusiva, em contraposição ao argu- tica do ser humano a possibilidade da mudança
mento de ser mais favorável o aprendizado de e da vivência de aprendizagens e experiências
alunos com deficiência intelectual em salas de variadas por toda a vida;
ensino especializado (e dedicado a eles) do que • que leve em conta as características
em salas de ensino regular; peculiares de cada aluno, já que o quadro da
• que compartilhe decisões e objetivos deficiência intelectual pode variar de aspectos e
escolares com a família, inclusive para incen- intensidade; além disso, há as particularidades
tivar a responsabilidade e o envolvimento dos que a personalidade impõe até mesmo no pro-
pais em práticas de ensino fora do ambiente es- cesso de aprendizagem;
colar. Além disso, é necessário trabalhar com a • que promova interações sociais, pois o
família as competências almejadas na escola, a ser humano tem necessidade intrínseca do ou-
fim de reforçar a memorização; tro para seu desenvolvimento potencial e como
• que apresente comandos de alerta para ser relacional e dialógico. As interações inter-
aquilo que deve ser aprendido. Enquanto alunos pessoais também são positivas por permitirem
sem deficiência aprendem facilmente por obser- que o aluno se reconheça como parte integrante
vação e imitação, os alunos com deficiência in- de um grupo, tendo favorecidas sua autoestima
telectual precisam de direcionamento frequente; e sua afetividade;
• em que conflitos sejam reconhecidos e • em que, nas atividades coletivas e grupais,
resolvidos pacífica e imediatamente, tendo em o educador atue sistematicamente como mediador
vista os iniciais sinais de estresse e irritabilida- a fim de compensar as limitações cognitivas supe-
de, uma vez que alguns indivíduos com defici- riores dos alunos com deficiência intelectual;
ência intelectual podem apresentar uma mar- • que tenha o mínimo possível de alte-
cada impulsividade e um fraco autocontrole ração nas atividades básicas (disciplinas, aten-
emocional. Além disso, tais alunos podem ter dimento educacional especializado, esportes),

942 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais dificuldades e facilidades na educação de alunos com deficiência...
obedecendo a horários regulares. Isso não sig- mento; a aquisição dos conteúdos que foram se-
nifica, porém, que alterações repentinas da ro- lecionados no planejamento; o desenvolvimento
tina sejam prejudiciais, mas elas devem ser bem atual; a forma como o aluno se porta e usa re-
dosadas e planejadas, principalmente quando cursos nas situações de aprendizagem; o que ele
envolverem atividades de conteúdos curricula- é capaz de fazer mesmo com a mediação de ter-
res, pois as mudanças poderão gerar indeseja- ceiros; a autonomia; a relação grupal. A avalia-
da ansiedade e insegurança. Castro, Almeida e ção não precisa ser necessariamente escrita, mas
Ferreira (2010) destacam que, nas aulas e ativi- pode ser realizada por meio do uso de indicado-
dades improvisadas, os alunos com deficiência res de avaliação; além disso, é importante que as
intelectual tendem a ficar alheios às explica- potencialidades do aluno sejam comparadas com
ções, a causar maior agitação e a demonstrar seus próprios parâmetros, e não com os resulta-
maiores reações emocionais, colocando também dos dos demais alunos da turma.
o professor em estado de tensão e angústia;
• que faça uso de tecnologias assistivas Considerações sobre o ensino
(TAs) e tecnologias de informação (TIs) para especializado do aluno com
integrar as estratégias de estimulação dos pro- deficiência intelectual
cessos cognitivos. As TAs são recursos, equi-
pamentos e serviços utilizados para ampliar as O Ministério da Educação, por meio da
habilidades funcionais das pessoas com defici- Secretaria de Educação Especial, especifica que
ência e promover maior independência e inclu- o ensino especializado (políticas públicas, servi-
são (BERSCH, 2008). O uso de jogos favorece ços de apoio, atendimento educacional especia-
o raciocínio lógico, a função psicomotora, a lizado etc.) deve ser destinado ao aluno quando
concentração, o seguimento de regras, o levan- houver ao menos um dos seguintes prejuízos:
tamento de hipóteses, a curiosidade, os interes- no desenvolvimento cognitivo, na motricidade,
ses, a noção temporal e o reforço dos acertos na comunicação, na competência socioemocio-
por possibilitar um feedback rápido do próprio nal, na aprendizagem, ou na capacidade adap-
desempenho, estimulando a memória, a capaci- tativa (BRASIL, 2006).
dade perceptiva, a motivação, a solução de pro- O ensino especializado junto aos alunos
blemas, o seguimento do ritmo próprio na exe- com deficiência intelectual deve envolver bene-
cução da atividade, o reconhecimento e o treino fícios que vão além do acréscimo dos conteúdos
da intencionalidade, a consciência da ação etc.; curriculares, tendo em vista ganhos educacio-
• que demande o cumprimento das tarefas nais; a maximização do desenvolvimento; a
a fim de estabelecer o repertório de persistência; redução do isolamento, do estresse e da frus-
• que integre o desenvolvimento das tração que podem ser vivenciados pelo aluno
inteligências múltiplas nas áreas: da comuni- e pela família; a independência e autonomia;
cação, musical, lógico-matemática, espacial, ci- a maior produtividade pessoal; e competências
nestésica, interpessoal e intrapessoal2; permanentes que reduzam futuras necessidades
• que avalie criteriosamente os progres- relativas a educação especial, cuidados com a
sos específicos (por exemplo, leitura, escrita, saúde e reabilitação (BRASIL, 2006, 2007, 2010).
verbalização, coordenação motora fina) e que Uma importante marca do ensino es-
tenha um registro deles a fim de que objetivos pecializado é o atendimento educacional es-
apropriados sejam progressivamente traçados; pecializado (AEE), uma abordagem de ensino
• em que a avaliação seja capaz de de- sustentada legalmente e caracterizada por uma
monstrar a evolução progressiva do desenvolvi- prática de ensino simultânea ao ensino que
2- Para maior detalhamento, consultar sobre a teoria das inteligências ocorre na sala de aula comum. No AEE, objeti-
múltiplas, de Howard Gardner. va-se um aprendizado diferente dos conteúdos

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 943
curriculares estabelecidos no ensino comum, que não significa que este deva ser construído
procurando criar condições para o aluno ultra- em conjunto (BRASIL, 2010). Ao professor do
passar as barreiras impostas pela deficiência. AEE cabe, ainda,
A partir da concepção estabelecida em
Atendimento educacional especializado em de- preparar material específico para uso na
ficiência mental, de Batista e Mantoan (2007), sala de recursos; orientar a elaboração
o processo de conhecimento deve dar-se na de materiais didático-pedagógicos que
dimensão subjetiva. Enquanto o conhecimento possam ser utilizados pelos alunos nas
acadêmico refere-se à aprendizagem do conteú- classes comuns do ensino regular; indi-
do curricular, o AEE trabalha “a forma pela qual car e orientar o uso de equipamentos e
o aluno trata todo e qualquer conteúdo que lhe materiais específicos e de outros recursos
é apresentado e como consegue significá-lo” existentes na família e na comunidade.
(p.20). Assim, o AEE do aluno com deficiência (ALVES; GOTTI, 2006, p. 270)
intelectual deve priorizar o desenvolvimento de
habilidades necessárias a cada momento; tal Muitos professores, principalmente do
atendimento não se trata de um período extra ensino fundamental, alegam não se senti-
de reforço dos conteúdos acadêmicos ensinados rem preparados e motivados para a docência
na sala de aula comum. A perspectiva é de uma de grupos tão diversificados como no caso
construção particular de conhecimento impor- da deficiência intelectual (CARVALHO, 2004;
tante para a vida acadêmica e geral do aluno. ROSSATO; LEONARDO, 2011). Entretanto,
Para desenvolver o AEE, é imprescindível como bem apontado por Dias (2010), tanto o
que o professor conheça o aluno e suas particu- ensino regular em sala de aula comum quan-
laridades (para além de sua condição cognitiva). to o AEE do aluno com deficiência intelectual
Ele então atua de modo a desenvolver compe- não requerem uma abordagem pedagógica in-
tências que ajudem o aluno a ter autonomia in- teiramente nova e diferenciada. Por se tratar de
telectual e adaptativa (de convívio na comuni- um campo considerado distintivo, costuma-se
dade). O trabalho deve enfocar as competências supor o uso de procedimentos didáticos ditos
deficitárias e o aperfeiçoamento de competências especiais, o que de certa forma se deve a uma
consideradas adequadas (BRASIL, 2007, 2010). necessidade de caracterizá-los também pela
Em face de dificuldades muito individu- diferença. A ideia de procedimentos didáticos
ais, o professor do AEE deve intervir imediata e especiais torna complexa a prática pedagógi-
consistentemente, objetivando não só a rápida ca junto ao aluno com deficiência, sendo que aí
aquisição de determinada competência, como estão envolvidos os mesmos processos de apren-
também a capacidade funcional (que é mais dizagem – porém, em ritmo e grau inferiores. A
permanente). Mesmo que os conteúdos do AEE inclusão escolar, nesse sentido, tem carecido mais
não precisem ser relacionados diretamente com de uma abordagem técnica do que de uma pers-
o ensino da sala de aula comum, é importante a pectiva reflexiva.
interação entre os professores do AEE e da sala
de ensino comum para uma maior efetividade Considerações finais
do trabalho de ambos. Por consequência, o pro-
fessor do ensino regular tem a possibilidade de O constante desenvolvimento e a apren-
conhecer mais peculiaridades do aluno, ao pas- dizagem são possíveis em casos de deficiência
so que o professor do AEE pode ter acesso ao intelectual, e a capacidade humana tem como
modo como o aluno se comporta na sala de aula característica intrínseca a possibilidade da mu-
comum. Essa relação cooperativa deve ocorrer dança. Com práticas de ensino e estimulação pró-
inclusive com o compartilhamento do plano, o prias a cada limitação e a cada potencialidade do

944 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais dificuldades e facilidades na educação de alunos com deficiência...
aluno com deficiência intelectual, torna-se pos- O ensino escolar de alunos com defici-
sível atingir objetivos escolares fundamentais, o ência intelectual ainda é uma problemática de
que não significa que o quadro de deficiência pesquisas e estudos atuais. Entretanto, o pro-
intelectual possa ser completamente revertido, fessor, tanto do ensino regular como do ensino
dada sua determinação neurológica fundamen- especializado, não estará tateando no escuro
tal. Entretanto, a escolarização é positiva por si quando o assunto é a deficiência intelectual,
só, por constituir-se como processo-chave para pois muitos são os estudos e direcionamentos
a máxima formação humana e social, não po- que evidenciam possibilidades educacionais e
dendo ser negada a nenhuma pessoa, mesmo em pedagógicas (ALVES; GOTTI, 2006; BATISTA;
casos de grave comprometimento funcional e/ou ENUMO, 2004; BERSCH, 2008; BRASIL, 2006,
estrutural (como a paralisia cerebral). 2007, 2010; CASTRO; ALMEIDA; FERREIRA,
A educação na área da deficiência inte- 2010; CARVALHO, 2004; DIAS, 2010; FLETCHER
lectual deve atender às necessidades educacio- et al., 2009; LIMA, 2007; MALLOY-DINIZ et al.,
nais especiais sem se desviar dos princípios bá- 2010; RIBEIRO, 2009; ROSSATO; LEONARDO,
sicos da educação proposta às demais pessoas. 2011; SÁNCHEZ, 2005; SÁNCHEZ, 2008;
Para tanto, o aluno é inserido numa abordagem SMITH; STRICK, 2008). Diante das descrições e
educacional que inclui o ensino escolar regular definições referentes a essa temática, ao pro-
(que ocorre na sala de aula comum) e o ensino fessor é possível certa autonomia via experi-
especializado (o qual compõe o AEE e se esta- mentação pedagógica contínua, pois a partir da
belece nas salas multifuncionais). Mesmo que a observação direta (próxima) do aluno são evi-
deficiência intelectual consista em um quadro dentes as necessidades educacionais (sejam elas
clínico distintivo, cada necessidade é única e cognitivas, emocionais, comportamentais ou
gera a necessidade de tratamento subjetivo. sociais) e as tentativas progressivas de trabalho.
A princípio, o professor que atuará junto A angústia sentida em relação ao modo
ao aluno com deficiência intelectual não pre- de trabalhar junto a alunos com deficiência
cisará saber tudo sobre a deficiência, não sen- intelectual, como destacam Carvalho (2004) e
do exigida uma habilidade técnica além de sua Mantoan (2006), não pode exclusivamente se
formação pedagógica. Desse modo, o professor restringir ao quadro clínico dessa clientela, uma
irá atualizando-se e aprendendo conforme cada vez que os próprios alunos sem deficiência não
caso (aluno) específico, uma vez que o aluno conseguem obter uma apreensão de todo o con-
com deficiência intelectual é passível dos mes- teúdo curricular, o que ocorre devido a motivos
mos processos de aprendizagem que os alunos diversos (motivação, história de aprendizagens,
sem a deficiência. condição intrapessoal, saúde, condição social
As limitações e possibilidades educacio- etc.). Além disso, por mais dinâmico que seja
nais do aluno com deficiência intelectual não o processo de ensino-aprendizagem do aluno
requerem intervenções complexas em relação às com deficiência intelectual, o ensino escolar
práticas pedagógicas comuns, mas exigem do não terá potencial de ação suficiente para pro-
professor uma atuação mais próxima, frequente mover determinadas mudanças.
e particular em relação a cada objetivo escolar e Para que o ensino nesses casos seja mais
às habilidades envolvidas para que as metas se efetivo, deve-se, em suma, criar condições para
realizem. Assim, estudos de caso, planejamento a atuação ativa do aluno, o uso de situações
individualizado e materiais de apoio são alguns aplicadas (contextualizadas), o uso de um con-
dos elementos importantes para a atuação do pro- teúdo curricular funcional, o trabalho de ha-
fessor junto ao aluno com deficiência intelectu- bilidades positivas e não só a redução das li-
al, e não diferem dos princípios e das estratégias mitações, o desenvolvimento da capacidade
também utilizados com alunos sem deficiência. de aprender (em contraposição à apreensão

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 945
quantitativa de conteúdos) etc. Também vale ou critérios para o ensino escolar do aluno com
destacar que as intervenções escolares não se deficiência intelectual. O objetivo foi apenas
restringem aos alunos com deficiência intelec- apontar possibilidades de ação em relação ao
tual, mas envolvem os demais alunos, como nas quadro geral e comum da deficiência intelec-
situações em que o professor deverá atuar como tual, além de destacar a importância de estudos
mediador tendo em vista a promoção de intera- que evidenciem dados pormenorizados sobre as
ções coletivas. características peculiares na deficiência intelec-
O presente trabalho não teve a preten- tual e recursos técnicos para o ensino escolar
são de estabelecer um modelo de intervenção efetivo e o bem-estar geral do indivíduo.

946 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais dificuldades e facilidades na educação de alunos com deficiência...
Referências

AAIDD – American Association on Intellectual and Developmental Disabilities. Definition of intellectual disability. Disponível em:
<http://www.aamr.org/content_100.cfm?navID=21>. Acesso em: 14 ago. 2011.

ALVES, Denise de Oliveira; GOTTI, Marlene de Oliveira O. Atendimento educacional especializado: concepção, princípios e aspectos
organizacionais. In: BRASIL. Ministério da Educação. Ensaios pedagógicos. Brasília: MEC/SEESP, 2006. p. 267-272.

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-IV-TR). Porto Alegre:
Artes Médicas, 1995.

BANACO, Roberto (Org.). Sobre comportamento e cognição: aspectos teóricos, metodológicos e de formação em análise do
comportamento e terapia cognitivista. Santo André: ARBytes, 1997.

BATISTA, Cristina A. Mota; MANTOAN, Maria T. Eglér. Atendimento educacional especializado em deficiência mental. In: BRASIL. Ministério
da Educação. Secretaria de Educação Especial. Formação continuada a distância de professores para o atendimento educacional
especializado: deficiência mental. Elaboração de Adriana L. Limaverde Gomes et al. Brasília: MEC/SEED/SEESP, 2007. p. 13-42.

BATISTA, Marcus Welbi; ENUMO, Sônia R. Fiorim. Inclusão escolar e deficiência mental: análise da interação social entre companheiros.
Estudos de Psicologia, Natal, v. 9, n. 1, p. 101-111, 2004.

BERSCH, Rita. Introdução à tecnologia assistiva. Porto Alegre: Centro Especializado em Desenvolvimento Infantil [CEDI], 2008.

BRASIL. Presidência da República. Lei no 9.294, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
Diário Oficial da União, Brasília, 23 dez. 1996.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Educação infantil - saberes e práticas da inclusão:
dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento. Elaboração de Rosana Maria Tristão e Ide
Borges dos Santos. Brasília: MEC/SEESP, 2006.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Formação continuada a distância de professores para o
atendimento educacional especializado: deficiência mental. Elaboração de Adriana L. Limaverde Gomes et al. Brasília: MEC/SEED/
SEESP, 2007.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. A educação especial na perspectiva da inclusão escolar:
o atendimento educacional especializado para alunos com deficiência intelectual. Elaboração de Adriana L. Lima Verde Gomes,
Jean-Robert Poulin e Rita Vieira de Figueiredo. Brasília: MEC/SEESP; Fortaleza: UFCE, 2010.

CARVALHO, Rosita Edler. Dez anos depois da declaração de Salamanca. Relato de experiência. 2004. Disponível em: <cape.
edunet.sp.gov.br/textos/eventos/2.doc>. Acesso em: 5 set. 2012.

CASTRO, José Carlos V.; ALMEIDA, Maria Josilane M.; FERREIRA, Vanessa Queiroz. Os benefícios das intervenções pedagógicas para
o desenvolvimento cognitivo do estudante com déficit intelectual. Anais das Jornadas de Pós-Graduação da Faculdade Integrada
Brasil Amazônia - FIBRA, Belém, n. 3, p. 21-33, set. 2010.

DIAS, Marília Costa. Atendimento educacional especializado complementar e a deficiência intelectual: considerações sobre a
efetivação do direito à educação. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

FLETCHER, Jack M. et al. Transtornos de aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2009.

LIMA, Solange Rodovalho. Escolarização da pessoa com deficiência intelectual: terminalidade específica e expectativas familiares.
Tese (Doutorado) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2009.

LIMA, Telma C. Sasso de; MIOLO, Regina C. Tamaso. Procedimentos metodológicos na construção do conhecimento científico: a
pesquisa bibliográfica. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 10, p. 37-45, 2007.

MALLOY-DINIZ, Leandro F. et al. Avaliação neuropsicológica. Porto Alegre: Artmed, 2010.

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 947
MANTOAN, Maria T. Eglér. Inclusão escolar: O que é? Por quê? Como fazer? São Paulo: Moderna, 2006.

OMS – Organização Mundial da Saúde. Classificação de transtornos mentais e de comportamento (CID-10). Porto Alegre:
Artes Médicas, 1995.

PALANGANA, Isilda Campaner. Desenvolvimento e aprendizagem em Piaget e Vygotsky: a relevância do social. São Paulo:
Summus, 2001.

RIBEIRO, Sara C. Martins. Inclusão social dos jovens com deficiência mental: o papel da formação profissional. Dissertação
(Mestrado) – Escola Superior de Educação de Paula Frassinett, Porto, 2009.

ROSSATO, Solange P. Marques; LEONARDO, Nilza S. Tessaro. A deficiência intelectual na concepção de educadores da educação
especial: contribuições da psicologia histórico cultural. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v. 17, n. 1, p. 71-86,
jan./abr. 2011.

SÁNCHEZ, Jesus-Nicasio Garcia. Dificuldades de aprendizagem e intervenção psicopedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2008.

SÁNCHEZ, Pilar Arnaiz. A educação inclusiva: um meio de construir escolas para todos no século XXI. Inclusão: Revista da
Educação Especial, Brasília, p. 7-18, out. 2005.

SASSAKI, Romeu Kazumi. Atualizações semânticas na inclusão de pessoas: deficiência mental ou intelectual? doença ou transtorno
mental? Revista Nacional de Reabilitação, São Paulo, ano IX, n. 43, p. 9-10, mar./abr. 2005.

SMITH, Corinne; STRICK, Lisa. Dificuldades de aprendizagem de A a Z: um guia para pais e educadores. Porto Alegre: Artmed, 2008.

TAVARES, José; ALARCÃO, Isabel. Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem. Coimbra: Almedina, 2005.

VYGOTSKY, Lev S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

Recebido em: 07.06.2012

Aprovado em: 06.08.2012

Daísy Cléia Oliveira dos Santos é psicóloga e mestre em Processos Clínicos e Psicopatológicos pela Universidade Católica
de Goiás (UCG).

948 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais dificuldades e facilidades na educação de alunos com deficiência...

Você também pode gostar