Ao longo do documentário, uma série de graves riscos ergonômicos
podem ser observados nos ambientes de trabalho retratados, de empresas do tipo frigorífico. Esses riscos são provenientes, em sua maioria, do modelo produtivo adotado por esses frigoríficos investigados, e também por muitos outros espalhados pelo Brasil; bastante baseado nas ideias da Administração Cientifica de Frederick Taylor (ou Taylorismo), que possui forte ênfase nas tarefas e na eficiência, com um rígido controle dos movimentos realizados e do tempo de execução da tarefa. O taylorismo é um modelo produtivo que sofreu duras críticas ao longo dos anos devido à sua produtividade acelerada, com jornadas de trabalho intensas e prolongadas, um dos aspectos que levou o modelo a cair em desuso. Uma das críticas mais relevantes está presente no clássico filme “Tempos Modernos” de Charlie Chaplin. Em uma cena icônica o ator parece travar, sem sucesso, uma briga com a esteira transportadora (um dos marcos da produção em massa) e, como sequela, começa a realizar movimentos de maneira involuntária mesmo depois de acabar a atividade. É exatamente por causa dessas características tão presentes no taylorismo que surgem os riscos ergonômicos mostrados no documentário. Fica claro, durante as imagens e os relatos dos trabalhadores, riscos enfrentados no ambiente de trabalho dos frigoríficos, como: metas rígidas, baixa remuneração, intenso e repetitivo ritmo de trabalho ditado por esteiras com velocidade elevada, membros inferiores na mesma posição (sentado ou em pé) durante longos períodos, exposição a baixas temperaturas, poucas e curtas pausas para descanso e necessidades fisiológicas, quantidade insuficiente de funcionários para uma alta produção, cobrança e pressão excessiva por parte da gerência, e sobrecarga de trabalho. Outro risco ergonômico constatado foi a força excessiva aplicada pelos trabalhadores para deslocar as carcaças de boi. Além disso, observamos que as plataformas de corte são altas para os funcionários, obrigando-os a curvar o troco para realizar a tarefa. Elas também não possuem guarda corpo, aumentando o risco de acidente dos funcionários, que por estarem operando uma serra elétrica, tem o perigo de ferimentos graves. O acúmulo de sangue e resíduos no piso também são potenciais riscos de queda. Notamos que o espaço reduzido entre os funcionários, que estão manuseando objetos cortantes, configura-se também como um risco de acidente. Um retrato da exigência e repetitividade a qual esses trabalhadores de frigoríficos são submetidos é observado quando relatam que para desossar uma peça de coxa com sobrecoxa são necessários 12 cortes precisos distribuídos em 18 movimentos e que em 1 minuto eles precisam desossar, em média, 7 peças para atingir a meta. Ou seja, em 1 minuto são executados 126 movimentos, enquanto que estudos médicos recomendam não ultrapassar a quantidade de 35 por minuto para manter a integridade do trabalhador. Em uma jornada de 8 horas/dia, são realizados mais de 60 mil movimentos, apenas com os membros superiores. Todas as situações levantadas acima já são, separadamente, graves riscos ergonômicos que podem afetar a saúde e o bem-estar dos trabalhadores. Porém, quando eles são combinados, como é o caso nesses postos de trabalho; seus efeitos são mais severos e podem ser percebidos em intervalos de tempo menores. Um ambiente de trabalho como esse pode proporcionar aos funcionários sequelas, como aquela do personagem de Chaplin no filme citado. Dentre essas sequelas, podemos destacar: esgotamento físico devido ao ritmo intenso de trabalho; problemas osteomusculares nos membros superiores, como atrofias, tendinites e ler/dort, decorrentes dos movimentos repetitivos; nervosismo e insatisfação com o trabalho em virtude da cobrança e baixa remuneração; depressão e transtornos mentais causados pelo alto nível de estresse mental, podendo até evoluir para um quadro de síndrome de Burnout. Além disso, condições de trabalho como essas observadas são propicias à ocorrência de acidentes do trabalho, como cortes, queimaduras e até amputações. A influência dessas condições na saúde e qualidade de vida do trabalhador fica evidente com alguns dados apresentados no documentário. Por exemplo, trabalhadores do setor de abate de aves e suínos possuem quase 7,5 vezes mais risco de desenvolver plexos nervosos no punho e aproximadamente 3,5 vezes mais risco de adquirir transtornos mentais se comparados com as demais atividades. Já no setor de abate de bovinos, os funcionários estão sujeitos a um risco de sofrer queimaduras 6 vezes maior do que em outras atividades. Enquanto que as empresas de frigorífico fecham os olhos e parecem não se importar com os altos índices de problemas de saúde de seus trabalhadores, que quando adoecem são tratados como objetos descartáveis e rapidamente são substituídos; deixando-os à mercê da sorte e aumentando as filas do INSS. Medidas urgentes devem ser tomadas pelos órgãos competentes (tal como o ministério do trabalho, sindicatos e previdência social) para mudar as características desse processo produtivo e melhorar as condições do ambiente de trabalho. Como medidas importantes destacamos: atuação mais efetiva dos órgãos mencionados; aumento da fiscalização; multas e punições mais rígidas para diminuir a sensação de impunidade das empresas; criação de leis que determinem limites para a carga e o ritmo de trabalho e que estabeleça pausas para descanso e alongamento a cada hora trabalhada. Já por parte das empresas, algumas medidas corretivas com foco no funcionário podem ser adotadas de forma espontânea para aumentar a qualidade do ambiente de trabalho, são elas: contratação de mais funcionários para diminuir a quantidade de peças por pessoa e, consequentemente, a sobrecarga de trabalho; delimitar e aumentar o espaço do posto de trabalho de cada funcionário, promovendo um distanciamento seguro para o manuseio de utensílios cortantes; adequar as plataformas de corte de acordo com a altura dos trabalhadores e inserir dispositivo de segurança (como guarda corpo); instalar sistema de drenagem eficiente, impedindo o acúmulo de sangue e outros líquidos no piso do posto de trabalho; realizar a automatização do sistema de transporte das carcaças de boi, evitando a aplicação de força excessiva pelos trabalhadores.