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Formação de Professores
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Formação de Professores de Matemática
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ou o seu mundo lúdico (Carrasco, conforme proposta pelos construtivis-
1992). tas caracteriza-se por um ambiente em
que os alunos propõem, exploram e in-
vestigam problemas matemáticos. Es-
3. Visão do que constitui a ses problemas provêm tanto de situa-
aprendizagemda matemática ções reais (modelagem) como de situa-
ções lúdicas (jogos e curiosidades ma-
Correntes modernas de aprendiza- temáticas) e de investigações e refuta-
gemprocuram explicar como o indiví- ções dentro da própria Matemática.
duoconstrói o seu conhecimento mate- Para atingir um ambiente de pesqui-
mático. Essa linha baseia-se nas teo- sa matemática onde a curiosidade e o
rias de Piaget em que conflitos cogniti- desafio servem de motivação intrínse-
vos ou dissonâncias cognitivas são a ca aos alunos, é necessário modificar a
essência do processo de aprendizagem. dinâmica da sala de aula. Grupos de
Inúmeros pesquisadores vêm anali- trabalho tornam-se necessários e si-
sando o processo de construção do co- mulam a comunidade de pesquisa ma-
nhecimento matemático em crianças temática. O professor deixa de ser a
(ver,por exemplo, Steffe & Cobb, 1988; autoridade do saber e passa a ser um
Yackelet alü, 1990; Kamii & DeClark, membro integrante dos grupos de tra-
1985;Kamü & Joseph, 1989). A seme- balho. Muito do que surge das investi-
lhança do trabalho desses pesquisado- gações dos alunos será novidade para
res está no uso de situações-problemas oprofessor Acontribuiçãodoprofessor
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para gerar a compreensão de como as para o trabalho será a visão do que vem
crianças interpretam a situação, qual a ser a atividade matemática, em par-
conhecimento elas usam na sua solu- ticular do que vem a ser a proposição e
çãoe quais os conflitos cognitivos cuja resolução dos problemas. Há vezes em
resoluçãoleva à aprendizagem. A dife- que o professor, identificando uma
rença no trabalho dos construtivistas área que necessita ser trabalhada, pro-
está na importância que os diferentes põe os problemas a serem investigados.
pesquisadores dão à interação social no Outras vezes, o professor propõe o con-
processode construção. Não é objetivo texto real, lúdico ou matemático a par-
deste trabalho discutir o processo de tir do qual os problemas serão gerados
construção do conhecimento matemá- e resolvidos.
tico,mas sim enf~tizar a importância O ambiente proposto é um ambiente
da compreensão deste processo por positivo que encoraja os alunos a pro- .
por soluções, explorar possibilidades,
professores de Matemática, já que esta
visãode aprendizagem vem substituir levantar hipóteses, justificar seu racio-
a noção do aluno como recipiente pas-cínio e validar suas próprias conclu-
sivode fatos e idéias. sões. Respostas "incorretas" consti-
tuem a riqueza do processo de aprendi-
zagem e devem ser exploradas e utili-
4. Visão do que constitui um zadas de maneira a gerar novo conhe-
ambiente propício à cimento, novas questões, novas inves-
tigações ou um refinamento das idéias
aprendizagem da Matemática existentes.
Um professor visando criar tal am-
o ambiente necessário para a cons- biente em sua sala de aula tem que
trução de uma visão de Matemática reconsiderar vários parâmetros quevêm
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guiando seu trabalho até este momen- a visão descrita anteriormente há uma
to. Por exemplo, o conteúdo a ser dis- grande necessidade de modificarmos
cutido é um tanto imprevisível e de- nossos programas de formação de pro-
penderá da direção tomada pelos alu- fessores. Dificilmente um professor de
nos na solução dos problemas propos- Matemática formado em um programa
tos. O professor terá que ter uma flexi-
tradicional estará preparado para en-
bilidade ao determinar o conteúdo a frentar os desafios das modernas pro-
ser tratado. Dificilmente o conteúdo postas curriculares. As pesquisas so-
seguirá a ordem arbitrária em que ele bre a ação de professores mostram que
aparece nos livros-textos. Em vez de em geral oprofessor ensina da maneira
resolver muitos problemas, os alunos comolhe foi ensinado. Predomina, por-
investigarão a fundo poucos problemas tanto, um ensino em que o professor
e passarão bastante tempo analisando expõe o conteúdo, mostra como resol-
um único problema. A quantidade de ver alguns exemplos e pede que os alu-
material tratado não poderá ser medi-
da pelo número de problemas resolvi- nos resolvam inúmeros problemas se-
melhantes. Nessa visão de ensino o
dos pelos alunos. Outra noção a ser
considerada pelo professor são os limi-aluno recebe instrução passivamente e
tes das diversas áreas da Matemática imita os passos do professor na resolu-
e das diversas disciplinas. Um proble- ção de problemas ligeiramente diferen-
ma real poderá envolver conceitos de tes dos exemplos. Predomina o sucesso
Matemática e Ciências, Matemática e por memória e repetição. Raramente
Sociologia, Matemática e Geologia, esses alunos geram problemas, resol-
Matemática e Astronomia, de forma vem aqueles que exijam criatividade
que o aluno terá dificuldade em distin-ou que não sejam simplesmente a apli-
cação de passos predeterminados. Ra-
guir a disciplina à qual pertence o pro-
blema. ramente também vemos alunos desen-
O ambiente deve incentivar o uso de volvendo modelos matemáticos para
recursos comolivros, material manipu- interpretar situações reais. Ainda
lativo, calculadoras, computadores e mais difícil é encontrarmos professores
diversos recursos humanos. Esses re- dispostos a criar um ambiente de pes-
cursos devem ser utilizados conforme quisa em sala de aula, onde o trabalho
forem necessários para enriquecer a se baseia nas conjecturas dos alunos e
exploração e investigação do problema. subseqüente tentativa de verificá-Ias e
Também podem servir para dar origem demonstrá-Ias.
a problemas interessantes. Para trabalhar a Matemática de ma-
neira alternativa é necessário acredi-
tar que de fato o processo de aprendi-
Como alinhar a zagem da Matemática se baseia na
ação do aluno em resolução de proble-
formação de mas, em investigações e explorações
dinâmicas de situações que o intrigam.
professores à visão Como acreditar que a Matemática pos-
proposta sa ser aprendida desta forma se o pro-
fessor nunca teve semelhante expe-
riência em sala de aula enquanto alu-
Para que a instrução matemática no? Discutiremos a seguir os tipos de
nas atuais escolas seja compatível com experiências necessárias na formação
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do professor para que ele possa recon- analisando as decisões arbitrárias que
ceituar sua visão do que vem a ser a levam à legitimação de certas formas
Matemática e do que constitui a legíti- matemáticas e ao descarte de outras. A
ma atividade matemática. análise histórico-social e política da gê-
nese do conhecimento matemático é
um campo fértil para se explorar a
Experiências Matemática como uma criação huma-
na e, como tal, entender suas riquezas
matemáticas e suas fraquezas.
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