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Relato de um Certo Oriente, de Milton Hautom, conquistou o prêmio Jabuti de melhor

Romance

Tema Central
A temática principal da obra gira no eixo da relação familiar e seus conflitos (uma família de
origem libanesa que vem para o Brasil e que tem sua história narrada por meio de relatos
de amigos e familiares).

A Obra
Relato de um certo Oriente tem como fio condutor a história de uma moça (a narradora
principal, que não tem nome) que retorna à casa de sua infância vinte anos depois.
Sua intenção é recuperar a sua própria identidade. Assim, volta a Manaus, cidade em que
nasceu, após ter sido internada por um longo tempo em uma casa de repouso em São
Paulo.
A narrativa faz um retorno ao passado por intermédio das suas recordações e de outros
relatos que vão contribuindo para "montar" a história e, finalmente, poder escrever uma
carta ao irmão que está em Barcelona - Espanha.

A estrutura da obra
Relato de um certo Oriente possui uma estrutura fragmentada e uma história formada por
diversos relatos autônomos que se integram e se alternam ao longo de oito capítulos,
dando-lhes elementos de narrativa oral.

A estrutura da obra - inspiração


De acordo com o próprio autor, ele se inspirou na estrutura do livro As mil e uma noites, em
que a personagem Sherazade deixa propositalmente as histórias inacabadas, para que elas
tenham continuidade na narrativa seguinte.
É interessante verificar que entre um capítulo e outro não existe um fechamento, uma vez
que o capítulo anterior está sempre dialogando com o próximo sem deixar muito claro quem
será o próximo narrador (certamente, existem algumas pistas que nos levam ao dono da
voz narrativa, mas é preciso estar bem atento a isso). Temos que observar que a passagem
de um narrador para o outro ocorre por meio do discurso indireto livre' (e esse tipo de
discurso torna mais próximo narrador e personagem).

O autor
*Nasceu em Manaus (Amazonas) no ano de 1952.
*É professor de literatura na Universidade Federal do Amazonas.
*Foi professor visitante da Universidade da Califórnia em Berkeley.
*Escreveu três romances: Relato de um Certo Oriente, Dois Irmãos e Cinzas do Norte
* Atualmente mora em São Paulo

Personagens
Emile
matriarca da família;
mãe adotiva da narradora-protagonista,
toda a história da família gira tendo essa personagem como eixo.

Narradora-protagonista
mulher responsável por montar um documento com relatos da história e de recordações da
família e enviá-lo ao irmão que morava em Barcelona - Espanha.
Quando inicia a história, a moça acabara de sair de uma clínica de repouso em São Paulo.

Samara Délia
filha de Emilie;
teve uma menina quando ainda era adolescente e, por isso, foi rejeitada por toda a família.

Soraya Ângela
filha de Samara e neta de Emilie;
a menina nasceu surda-muda,
era desprezada pela maioria das pessoas e morre ainda criança.

Hakim
filho de Emilie
sai de casa por não suportar algumas atitudes dos pais, tais como, maltratar os empregados.

Emílio e Emir
irmãos de Emile
Emir comete o suicídio em Manaus.

Marido de Emilie
o pai da família que não é nominado pelo autor
vive sempre quieto, solitário e lendo o Alcorão.

Hindié Conceição
amiga, vizinha e confidente de Emilie.

Anastácia Socorro
empregada e lavadeira de Emilie.

Dorner
Fotógrafo

Contexto histórico
Segunda metade do século XX > inúmeras guerras, pela xenofobia, pelo crescimento de
grupos de extrema direita nos moldes nazistas e pelos extremismos religiosos que ainda
geram conflitos com milhares de mortes.
No Brasil, nos anos 60 (cujo governo era JK), uma grande euforia política e econômica, com
amplos reflexos culturais: Bossa Nova, Cinema Novo, teatro de Arena, as Vanguardas e a
Televisão.
Com a crise após a renúncia de Jânio Quadros e o Golpe Militar que derrubou João Goulart,
diminuiu muito essa empolgação, e um clima de censura é estabelecido no país (fechamento do
Congresso; jornais censurados, revistas, filmes, músicas; perseguição e exílio de intelectuais,
artistas e políticos).

Uma mulher visita a cidade de sua infância depois de ter passado quase 20 anos fora, e a
partir dos acontecimentos que se desenrolam após sua chegada, ela vai relembrando e
descobrindo histórias do seu passado e da família que a criou. Ao retornar a Manaus, após
ter permanecido internada em uma clínica de repouso em São Paulo, a narradora chega
justamente na noite que precede o dia da morte de Emilie, sua mãe adotiva. Inicia-se,
então, um outro trabalho, o de recuperar Emilie através da memória, não apenas a sua, mas
também a de outros personagens que entrelaçaram seu percurso de forma significativa ao
daquela família: o filho mais velho, o único a aprender o árabe e que também irá se
distanciar de todos, ao mudar-se para o sul; o alemão Dorner, amigo da família e fotógrafo;
o marido de Emilie, recuperado, mesmo depois de morto, através da memória de Dorner, e
Hindié Conceição, amiga sempre presente, a partilhar com a conterrânea a solidão da
velhice. Muitas vozes a compor um mosaico, nem sempre ordenado, nem sempre claro
naquilo que revela, mas sobre tudo rico em pequenos detalhes de extrema significação. No
intuito de enviar uma carta ao irmão, que se encontra em Barcelona, a fim de lhe revelar a
morte de Emilie, acaba escrevendo um relato com depoimento de membros da família e de
amigos, conforme o irmão lhe pedira na última correspondência que lhe enviara. Esses
testemunhos proporcionam uma verdadeira viagem à memória, com regresso à infância e
aos fatos marcantes da vida familiar.
Logo no primeiro capítulo, a narradora nos descreve uma parte da casa na qual acabara de
acordar, em Manaus. A descrição das duas salas contíguas é repleta de marcas
identificatórias do Oriente, indicando uma representação estilizada desse território: tapete
de Isfahan, elefante indiano e reproduções de ideogramas chineses são alguns dos objetos
de consumo dos ocidentais, tomados como símbolos, que estão presentes nos cômodos.
As histórias falam das possibilidades e das dificuldades do trabalho com a memória, das
tensões e da convivência de culturas, religiões, línguas, lugares, sentimentos e sentidos
diferentes das personagens em relação ao mundo. A casa de Emilie, matriarca da família na
narrativa do Relato, é um microcosmo onde estas tensões aparecem e são vividas
cotidianamente. O que mantêm a tensão no romance é a narrativa centrada em incidentes –
o atropelamento de Soraya Ângela, o afogamento de Emir. A obra, em sua estrutura e
estratégia de composição, parece transitar e oscilar entre a narração, em que a figura do
narrador é extremamente importante e o relato é feito principalmente com base nas
tradições orais, como uma tentativa de rememoração das experiências coletivas do
passado, e o romance, que apareceria como um gênero literário decorrente das
transformações da sociedade capitalista, que destrói cada vez mais a possibilidade que a
experiência comum viva e se revele no relato dos narradores.

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