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Remixes de mapas: possibilidades de outras abordagens cartográficas na escola

Mesa 80 - Cartografías críticas e historia territorial. Las nuevas representaciones del espacio
Tipo de presentación: PONENCIA
Coelho, Ana Flávia Zambon1
Coelho, Patrícia Silva Leal2
Girardi, Gisele3
Resumo
A forma em que os mapas se apresentam em nossa sociedade podem afetar, de forma
poderosa, nossos modos de pensar e agir no mundo. Glasze e Perkins (2014) argumentam que
os estudos da cartografia crítica colaboram para o reconhecimento do impacto cada vez maior
dos mapas na produção e reprodução do mundo. Nestes estudos da cartografia crítica, que
tomam fôlego a partir de meados dos anos 1980 com os estudos de John Brian Harley, David
Woodward e Denis Wood, dentre outros, há um reconhecimento progressivo na forma de ver
o que mapas significavam e simbolizavam (CRAMPTON; KRYGIER, 2008). Mapas passam
a ser entendidos como construções sociais, fortemente influenciados pelas estruturas de poder,
sendo agentes efetivamente produtores e reprodutores de estruturas hierarquizadas. A atenção
a esta potência dos mapas não pode deixar de se fazer presente no entendimento de novas
formas de mapear, principalmente aquelas atravessadas e viabilizadas pelas Tecnologias de
Comunicação e Informação.
A grande mudança produzida nos modos de fazer mapas com a ampla disseminação da
informática na vida social, que fez surgir os Sistemas de Informação Geográfica (SIG),
acarretou também questões de natureza teórica e epistemológica no campo da Cartografia.
Glasze e Perkins (2014) sintetizam três principais eixos de preocupações neste contexto: 1) os
SIG foram elaborados, principalmente, por interesses econômicos e militares; 2) a
complexidade envolvida no funcionamento do SIG dificulta sua popularização; 3) o SIG é
focado em análises quantificáveis e métricas, deixando de lado as informações “qualitativas”.
Entretanto, com o desenvolvimento da Web 2.0, numa era de internet interativa, informações
e ferramentas de geoinformação passaram a ser mais disponíveis e acessadas. Esta grande

1 Graduanda em Geografia e pesquisadora do Programa de Iniciação Científica da Universidade Federal do


Espírito Santo. Membro do Grupo de Pesquisa POESI - Política Espacial das Imagens e Cartografias e da Rede
Internacional de Pesquisa “Imagens, geografias e educação”. E-mail anaf.zambon@gmail.com .
2 Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Espírito Santo.
Membro do Grupo de Pesquisa POESI - Política Espacial das Imagens e Cartografias e da Rede Internacional de
Pesquisa “Imagens, geografias e educação”. E-mail prof.geo.leal@gmail.com .
3 Professora Titular no Departamento de Geografia da Universidade Federal do Espírito Santo. Coordenadora do
Grupo de Pesquisa POESI - Política Espacial das Imagens e Cartografias e da Rede Internacional de Pesquisa
“Imagens, geografias e educação”. E-mail gisele.girardi@ufes.br .
rede de informações geoespaciais que tem circulado na internet interativa tem sido chamada
de “Geoweb”. Novos personagens e procedimentos tornam-se cada vez mais presentes na
sociedade, como os webmap designers, neogeógrafos, mashups de mapas, aplicativos de
localização e apresentação de rotas baseados em informações satelitais (GPS) que facilitam os
deslocamentos, projetos de informação geográfica voluntária (VGI), dentre outros. Neste
contexto, destacam-se as plataformas de mapeamento que disponibilizam base cartográfica
online para aplicações diversas, como é o caso do GoogleMaps (GM) e do OpenStreetMaps
(OSM).
Essas aplicações, que podem também receber a denominação de remixes de mapa,
diferenciam-se tanto da forma tradicional de cartografar quanto dos SIG: a partir da
colaboração dos usuários, diversos tipos de fonte podem ser cruzados, como agendas
telefônicas, vídeos, fotos, comentários e outros, customizando o mapa (LI; GONG, 2008).
É necessário voltar atenção também aos agentes hegemônicos que têm lutado por
influência na Geoweb (DUARTE, 2017; BITTNER; GLASZE, 2018). Estas aplicações, vistas
como novas, têm escapado de uma análise mais minuciosa de suas propostas e
funcionamento, evitando questões cruciais para o entendimento dos remixes de mapa, tais
como: Para onde o dado é carregado? A quem pertence o dado? Quem é beneficiado por essa
inteligência coletiva? E quanto à privacidade do dado? (LI; GONG, 2008; GLASZE;
PERKINS, 2014). Estudos sobre as plataformas OSM e GM têm sido conduzidos para lançar
luzes a estas questões. O OSM, por exemplo, que propõe uma base de dados aberta, onde
qualquer pessoa pode, de forma voluntária, inserir dados e alterar as bases cartográficas,
surgiu no cenário mundial como uma alternativa radical às grandes bases mundiais já
estabelecidas no modo de VGI comercial, como o GM. Glasze e Perkins (2014) apontam que,
embora seja uma comunidade de código e políticas abertas, são claras as influências de grupos
hegemônicos no OMS, como a maior participação de homens, que leva à subnotificação de
locais como creches, maior mapeamento de áreas elitizadas e o apagamento de mesquitas, por
exemplo. Bittner e Glasze (2018) corroboram com estas questões, apontando que, a despeito
de se tratarem de iniciativas colaborativas, há mecanismos de exclusão nestas práticas, o que
deve ser levado em consideração para uma discussão epistemológica mais ampla na
cartografia.
Nosso foco, neste trabalho, é relacionado ao OSM em aplicações escolares.
Observamos que há uma crescente utilização de aplicativos de Geoweb em trabalhos de
cartografia escolar, sendo mais comumente utilizado o GM e, em menor frequência, o OSM.
Contudo, observa-se também que parte significativa das experiências tratam o GM como um
facilitador do entendimento dos elementos da cartografia analógica (escala, sistema de
referência terrestre, orientação), mas não apresentam debates sobre as implicações sociais
mais amplas dos mapeamentos participativos, colaborativos e coletivos, nem das “tecnologias
de ver” (HOLLMAN, 2016; CANTO, 2018). Para avançar no diálogo com algumas destas
questões, apresentaremos e discutiremos alguns resultados parciais de dois projetos de
pesquisa de Iniciação Científica Júnior, com estudantes do Ensino Médio, realizados entre
2016 e 2019 em escola da rede pública do Espírito Santo.
As experimentações realizadas, nas quais os estudantes atuaram como comunidade de
mapeadores da Plataforma OSM e também como agentes de remixes de mapas, possibilitaram
a emergência de questões como as anteriormente citadas, e também sobre possibilidades do
deslocamento da cartografia escolar como focada exclusivamente na leitura dos mapas dos
materiais didáticos, rumo ao entendimento do mapa como direito humano e o mapeamento
colaborativo baseado em Geoweb como um dos modos de realizar este direito,
compreendendo os atravessamentos de renda, grupo social, gênero e faixa etária, entre outros,
que afloram nesses processos de mapeamento colaborativo.

Palavras-chave: mapeamento colaborativo, remixes de mapas, cartografia crítica,


OpenStreetMap, cartografia escolar

Referências:
CANTO, Tânia Seneme do. Os mapas e as tecnologias digitais: novos letramentos em pauta
no ensino de Geografia. Perspectiva, v. 36, p. 1186-1197, 2018.

CRAMPTON, Jeremy W.; KRYGIER, John. Uma introdução à Cartografia Crítica. In:
ACSELRAD, Henri (Org.). Cartografias sociais e território. Rio de Janeiro: IPPUR/UFRJ,
2008, pp. 85-111.

BITTNER, Christian; GLASZE, Georg. Excluding effects of cartographic epistemologies -


Thinking about mapping paradigms in OpenStreetMap and Wikimapia. Kartographische
Nachrichten, n. 3, p. 120-126, 2018.

DUARTE, Rildo Borges. Da Carta Internacional do Mundo ao Google: Cartografias para o


capital. In: XVIII Encontro Nacional de Geógrafos, 2016, São Luís - MA. Anais do XVIII
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GLASZE, Georg; PERKINS, Chris. Social and Political Dimensions of the OpenStreetMap
Project: Towards a Critical Geographical Research Agenda. In: ARSANJANI, Jokar et al.
(Eds.). OpenStreetMap in GIScience, Lecture Notes in Geoinformation and
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HOLLMAN, Veronica. La visión aérea y los imaginarios geográficos: un ensayo de
aproximación a un complejo universo visual. Espaço e Cultura, n. 39, p.11-30, 2016.

LI, Songnian; GONG, Jiansheng. Mashup: a new way of providing web mapping/GIS
services. The International Archives of the Photogrammetry, Remote Sensing and
Spatial Information Sciences. v. XXXVII, part. B4, p. 639-648, 2008.

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