Você está na página 1de 2

Ansiedade e Valores

Autor: Rollo May


Cap. 5 “Ansiedade e Valores”

Ansiedade é uma apreensão sugerida por uma ameaça a algum valor que o indivíduo reputa
essencial à sua existência como EU. A ameaça pode ser dirigida à própria vida física, isto é,
a morte; ou a vida psicológica, isto é, a perda da liberdade. Ou pode ser a algum valor que a
pessoa identifica com a sua existência como EU: patriotismo, amor a uma pessoa especial,
prestígio entre os pares, devoção à verdade científica ou as crenças religiosas.

Assim como mostra alguns exemplos em que o marido necessita garantir o emprego para
manter o papel de provedor. Outros que se sentem muito ansiosos com uma rejeição sexual
e quase a maioria das pessoas sentem-se muito ansiosos com a possibilidade da morte.

Qual é a origem desses valore que, quando ameaçados, resulta em ansiedade?


Obviamente, o primeiro valor do bebê são os cuidados, alimento e amor que recebe de sua
mão; uma ameaça a esse valor, de fato, uma ameaça à própria existência da criança, dá
origem a uma profunda ansiedade.

Com o amadurecimento, os valores são transformados e convertem-se em desejo de


aprovação da mãe, depois em êxito aos olhos dos pais ou pares e, mais tarde, de status em
termos culturais e finalmente, no adulto maduro, os valores poderão se converter em
devoção à liberdade, a uma crença religiosa ou à verdade científica.

Não se trata de uma escala exata de amadurecimento, mas apenas uma ilustração em
termos gerais do como o amadurecimento envolve uma transformação contínua dos valores
originais identificados com a existência de cada um e que, se ameaçados, geram ansiedade.

Para compreender a ansiedade faz-se necessário entender que os valores de um indivíduo e


sua ansiedade estão relacionados com o fato dele viver numa determinada cultura, num
particular momento do desenvolvimento histórico dessa cultura. Isso não ocorre apenas
porque a pessoa cresceu entre outras pessoas e reflete as opiniões delas, mas porque é da
própria condição humana interpretar os seus valores no contexto da sua relação com outras
pessoas e das expectativas destas. O marido que acredita ter-que-ser o provedor da
família está se validando pelos valores que têm sido dominantes na sociedade ocidental
desde o Renascimento. Assim como o prestígio competitivo em termos de trabalho e êxito
financeiro, se isso é conseguido, a pessoa sente-se realizada como pessoa e a ansiedade é
aliviada; caso contrário, está sujeita a uma poderosa ansiedade e perde sentido de ser um
EU.
A pessoa valida-se quando está ajustada ao rebanho; o que a torna presa da ansiedade é
ser diferente, é destacar-se.

A perspectiva de sair do rebanho pode ser o caminho da solidão, do sentir-se sozinho.


Não podemos compreender a ansiedade do homem ocidental moderno senão o virmos em sua
vinculação histórica, como herdeiros de muitos séculos de radical divisão de sujeito e
objeto, com sua conseqüente relação desintegrada com a natureza.

Como a ansiedade é a reação a uma ameaça aos valores que o indivíduo identificou com a sua
existência, ninguém pode escapar à ansiedade. Esta é a inevitável ansiedade normal. Além
disso, os valores estão sempre em processo de mudança e reforma. A única saída para a
ansiedade que ocorre numa era de transformação de valores é cristalizarmos os nossos
valores em dogmas. E o dogma, seja da variedade religiosa ou científica, é uma segurança
temporária adquirida à custa da nossa renúncia à oportunidade de nova aprendizagem e novo
progresso. O dogma conduz à ansiedade neurótica.

A ansiedade normal é uma ansiedade proporcional à ameaça e pode ser enfrentada


construtivamente. A ansiedade neurótica é uma reação desproporcional à ameaça e é
governada por várias espécies de bloqueios da atividade e da consciência.

A ansiedade neurótica desenvolve-se quando uma pessoa foi incapaz de enfrentar a


ansiedade normal, numa época de crise real em seu crescimento e de ameaças aos seus
valores. A ansiedade neurótica é o resultado final da ansiedade normal previamente evitada.
Daí que Paul Tillich tenha insistido, eloqüentemente, em seu livro A coragem de ser, que a
ansiedade normal é sinônimo de finitude do homem ( morte física e as mortes do dia-a-dia)

A transformação de valores e o fazer frente à ansiedade concomitante constituem um


aspecto da criatividade.

Três implicações para a terapia:


1º) A meta da terapia não é libertar o paciente da ansiedade. É ajudá-lo a libertar-se da
ansiedade neurótica, a fim de que possa fazer frente, construtivamente, à ansiedade
normal. Daí a famosa declaração de Kierkegaard “Eu diria que aprender a conhecer a
ansiedade é uma aventura que todo e qualquer homem tem de enfrentar se não quiser cair
na perdição, por não conhecer a ansiedade ou por afundar-se nela. Portanto, aquele que
aprendeu corretamente como ser ansioso aprendeu a coisa mais importante”.
2º) A compreensão do uso das drogas para aliviar a ansiedade - o efeito nocivo do uso das
drogas é óbvio, pois eliminar a ansiedade é, em princípio, eliminar a oportunidade de
crescimento.
3º) A importância de compreender que quanto mais firmes e mais flexíveis forem os seus
valores, mais o indivíduo estará apto p enfrentar construtivamente a ansiedade.

Você também pode gostar