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PSICODIAGNÓSTICO

Aula
CONTRIBUIÇÕES DAS ABORDAGENS
PARA O PSICODIAGNÓSTICO
PSICANÁLISE
• Freud demonstrava certa ambiguidade em relação ao diagnóstico
psicanalítico: em alguns momentos entendia oportuno poder
estabelecer precocemente um diagnóstico para determinar o
tratamento, de outro, não deixa de precisar que a pertinência de tal
diagnóstico não pode jamais encontrar confirmação senão após uma
análise aprofundada.

• Em termos psicanalíticos clássicos (excluindo-se a presença da


psicanálise no campo da psicologia), existe apenas um instrumento que
o analista possui: a escuta.
• Prescrições apressadas perpassam por problemas transferenciais (como
o exemplo da paciente que procurou Freud por questões de ansiedade,
após ir a um médico que lhe fez uma interpretação muito rápida de
que “lhe faltava homem” e piorou o quadro dela).

• No exemplo acima, o erro "técnico" principal consiste, antes de tudo,


em supor o ato analítico como um ato médico.

• Em psicanálise se fala de um caráter potencial do diagnóstico, ou seja,


um ato deliberadamente posto em suspenso e destinado a uma
mudança.
• Temos a noção de potencialidade diagnóstica, fadada à mudança de
uma confirmação, suspende então por um tempo toda atualização de
intervenção de valor terapêutico.

• Também a importância do tempo necessário a observar, no início de


toda decisão ou proposição de tratamento. Esse tempo é aquele que é
habitualmente concedido ao que Freud designava inicialmente como
tratamento de ensaio (hoje chamada de entrevistas preliminares).
• Temos a noção de potencialidade diagnóstica, fadada à mudança de
uma confirmação, suspende então por um tempo toda atualização de
intervenção de valor terapêutico.

• Também a importância do tempo necessário a observar, no início de


toda decisão ou proposição de tratamento. Esse tempo é aquele que é
habitualmente concedido ao que Freud designava inicialmente como
tratamento de ensaio (hoje chamada de entrevistas preliminares).
• O sintoma é algo estranho ao ego, algo que a pessoa quer se livrar e por
isso chamamos de “ego distônico”.

• O caráter é algo que se confunde com o próprio ego e a pessoa sente


que aquilo é ela… apesar de ser uma construção defensiva, e por isso é
“ego sintônico”.

• O caráter é a base onde “repousam" os sintomas, ele que nos mostra o


estilo de cada pessoa, e por isso julgo de fundamental importância na
clínica.
• No DSM encontramos o estilo de cada pessoa no capítulo "Transtornos
da Personalidade".

• É interessante não pensar como patologias, mas como modos de


estruturação da personalidade, e que não existe uma possibilidade de
“cura”.

• Ninguém deixa um caráter por outro, ou um transtorno de


personalidade por outro, mas sim pode flexibilizar, não “responder”
automaticamente de modo “borderline”, “obsessivo”, “narcisista”.
• Usaremos “transtornos da personalidade” aqui como orientação do
estilo mais “universal" de cada pessoa, vamos do universal para o
particular de cada um.

• O universal é aquilo que está nos livros, aquilo que podemos aprender
previamente e que nos ajuda numa compreensão geral, e o particular é
a parte mais profunda e que varia de pessoa a pessoa.
• É como a montagem de um personagem, como se cada transtorno fosse
um “super poder” dos heróis dos filmes: um consegue ler a mente;
outro consegue imitar a imagem do outro; outra controla o tempo; etc.

• Mas a história de cada um, como lidou com esses “poderes” ao longo
da vida, ou como é seu dia a dia para além dos enfrentamentos dos
inimigos, tudo isso são detalhes subjetivos e caberá ao psicoterapeuta
ser a escuta única nessas áreas.

• Aqui está a grande qualidade do Psicólogo/Psicanalista: escutar e


trabalhar com o “particular”.
• Transtornos de Personalidade (As descrições a seguir dos transtornos de
personalidade foram retiradas do DSM-V)

• São três grandes grupos de transtorno de personalidade:


Grupo A: Esquisitos e Persecutórios
Grupo B: Manipuladores e Dramáticos
Grupo C: Inibidos e Ansiosos
T. P. Narcisista

• Um padrão global de grandiosidade (em fantasia ou comportamento), necessidade de admiração e


falta de empatia, que se manifesta no início da idade adulta e está presente em uma variedade de
contextos:

● Sentimento grandioso acerca da própria importância (ex. exagera realizações e talentos, espera ser
reconhecido como superior sem realizações à altura).
● Preocupação com fantasia de ilimitado sucesso, poder, inteligência, beleza e amor ideal.
● Crença de ser “especial” e único e de que somente pode ser compreendido ou deve associar-se a
outras pessoas especiais de condição elevada.
● Exigência de admiração excessiva.
● Presunção, ou seja, possui expectativas irracionais de receber um tratamento especialmente favorável
ou obediência automática às suas expectativas.
● É explorador em relacionamentos interpessoais, isto é, tira vantagem de outros para atingir seus
próprios objetivos.
● Ausência de empatia: reluta em reconhecer ou identificar-se com os sentimentos e as necessidades
alheias.
● Frequentemente sente inveja de outras pessoas ou acredita ser alvo da inveja alheia.
● Comportamentos e atitudes arrogantes e insolentes.
• Freud trata da questão em texto de 1914. Freud aqui inicia abordando um certo tipo
de paciente fascinado por si mesmo e que fazia referência ao mito de Narciso.
Assim como em outros momento, Freud inicia uma temática mostrando seu viés
“patológico” para então depois trazer para a esfera da normalidade e que faz
parte do desenvolvimento normal de qualquer sujeito.

• Freud localiza o narcisismo como uma fase intermediária entre o autoerotismo e o


amor de objeto. Pensando em termos libidinais, inicialmente a libido está
desorganizada ligada a objetos parciais (Disposição Perversa Polimorfa), e que no
narcisismo estaria investida no Ego (antes do narcisismo não podemos considerar a
existência do Ego). Esse investimento libidinal no Ego recebeu o nome de
“Narcisismo Primário”.
• Com o final do Complexo de Édipo, a libido é desinvestida do Ego e investida em
objetos externos. O Ego se torna empobrecido narcisicamente, o que Freud
chamou de “estado amoroso”.

• E quando ocorre a perda desse objeto, existe a retração da libido para o Ego mais
uma vez, caracterizando o “estado de luto”, um retorno narcísico em que o sujeito
se desinteressa pela realidade externa, eis o narcisismo secundário. Esse
narcisismo secundário pode ser pensado em “níveis” de acordo com a quantidade
de libido investida no Ego, em um extremo de investimento temos a “megalomania
da esquizofrenia” e em níveis menos extremos o estado de luto normal.
• Neste sentido a “dor da ferida narcísica”, o sofrimento de perder um lugar narcísico,
é uma grande questão.

• Mas aí vem uma questão fundamental: Todos os sujeitos viveram esse narcisismo?

• E alguns autores dirão: Não!! Nem todos viveram uma experiência narcísica – dirá
Kohut. Não! A psicanálise toma como certo que todas as pessoas são pessoas. Mas
e as pessoas que não chegaram a ser tornar pessoas? Perguntará Winnicott.

• Podemos então dividir em duas teorias:


a) as que consideram a personalidade narcisista como decorrente de uma história
infantil de excessos de gratificações – fixação no lugar de “sua majestade o bebê” e
hipervalorização e b) um histórico de privação de olhar, de valorização – “não como
uma fixação em uma grandiosidade infantil, mas como compensatória de decepções
de relacionamentos primários”
• Para McWillians o que se encontra em todas as teorias é o “senso interno e/ou pavor
da insuficiência, da vergonha, da fraqueza e da inferioridade”.

• McWilliams aborda autores que descrevem aspectos inatos desse tipo de


personalidade, tanto como pessoas “mais sensíveis a mensagens emocionais não
verbalizadas”, quanto uma forte pulsão agressiva inata. Ou ainda, a proposta de Alice
Miller sobre crianças que funcionam como extensão narcísica de seus cuidadores.

• A vergonha é uma característica essencial desse tipo de personalidade, mas muitas


vezes é confundida com culpa, “A culpa é uma convicção de ter pecado ou cometido
erros; ela é com facilidade conceitualizada como um parente crítico interno, ou
superego. A vergonha é a sensação de ter sido visto como mau ou incorreto; a
audiência está, então, fora do self. A culpa traz consigo uma sensação de potencial
ativo para o mal, enquanto a vergonha tem conotações de desamparo, feiura e
impotência.” (McWillians)
• A presença da inveja ao invés do ciúme deixa claro o quanto problemáticas narcisistas
se refere a uma díade ao invés de uma tríade edípica. No ciúme existe a intenção de
superar um segundo para conquistar o terceiro. Na inveja é uma relação dual, e a
presença do outro (seu sucesso por exemplo) causa uma ameaça tamanha que o
sujeito só tem uma única alternativa: destruí-lo.

Processos defensivos

• Pessoas organizadas narcisicamente podem usar diversos tipos de defesa, mas algumas
delas são bem características como a desvalorização e a idealização. Defesas
complementares que partem de uma cisão do objeto em duas porções que não se
articulam, ou uma coisa ou outro. Ou o objeto é valorizado ou desvalorizado.
McWilliams também traz a busca pelo perfeccionismo e muitas vezes é com esse tipo
de demanda que procuram análise: se aperfeiçoar. Isso decorre muito da sua
percepção de que está constantemente sendo avaliada e julgada.
• Kohut é um dos autores que se destaca pelos estudos, descobertas e propostas de
intervenção, quando tratamos de pacientes narcisistas.

• Kohut é o grande expoente da Psicologia do Self, “enquanto a teoria das relações


objetais enfatiza as relações internalizadas entre representações do self e do objeto, a
psicologia do self enfatiza como as relações externas ajudam a manter a autoestima e a
coesão do self” (Gabbard, 2016 – p. 50)

• Kohut parte das ideias de Freud, porém não considera que sua teoria sobre o
narcisismo esteja completa. Assim ele propõe a Teoria do Duplo Eixo, que consiste no
seguinte: Primeiramente retoma o modelo freudiano do texto Introdução ao
narcisismo, em que Freud faz a seguinte divisão:

Autoerotismo ---------------------- Narcisismo ---------------------- Amor de Objeto


• Kohut é um dos autores que se destaca pelos estudos, descobertas e propostas de
intervenção, quando tratamos de pacientes narcisistas.

• Kohut é o grande expoente da Psicologia do Self, “enquanto a teoria das relações


objetais enfatiza as relações internalizadas entre representações do self e do objeto, a
psicologia do self enfatiza como as relações externas ajudam a manter a autoestima e a
coesão do self” (Gabbard, 2016 – p. 50)

• Kohut parte das ideias de Freud, porém não considera que sua teoria sobre o
narcisismo esteja completa. Assim ele propõe a Teoria do Duplo Eixo, que consiste no
seguinte: Primeiramente retoma o modelo freudiano do texto Introdução ao
narcisismo, em que Freud faz a seguinte divisão:

Autoerotismo ---------------------- Narcisismo ---------------------- Amor de Objeto


• E faz 2 considerações:

a) Nem todos os sujeitos conseguem se estruturar narcisicamente para então vivenciar a


ferida narcísica (questão neurótica clássica).
b) Mesmo aqueles que tiveram a experiência narcísica satisfatória, precisam de tempos
em tempos de gratificações narcísicas para manutenção o senso de self (si mesmo)

• Essa “manutenção envolve dois aspectos”


1- Atribuir perfeição ao self grandioso: Ser o brilho nos olhos de alguém – Transferência
Especular
2- Atribui perfeição ao imago parental idealizado: Ter alguém para admirar e se inspirar –
Transferência Idealizadora
Narcisistas distraídos e hipervigilantes

• Num extremo temos um tipo descrito por Kernberg “um indivíduo invejoso e
ganancioso, que exige atenção e aplauso de outras pessoas” (Gabbard, 2016 – p. 484) e
no outro extremo um tipo descrito por Kohut que é “vulnerável a desprezos e à auto
fragmentação”.

• Esses tipos são rotulados como narcisistas distraídos e hipervigilantes:


“Tipos distraídos parecem não ter qualquer consciência de seu impacto sobre os outros. Eles falam como se estivem se
dirigindo a uma grande audiência, raramente estabelecendo contato visual e em geral olhando por sobre as cabeças
daqueles que estão à sua volta. Eles falam “para” os outros e não “com” os outros. Pessoas desse tipo são alheias ao
fato de que elas são enfadonhas e de que alguns indivíduos, portanto, deixarão a conversa e procurarão companhia em
outro lugar. Sua conversa é repleta de referências às próprias realizações, e eles evidentemente precisam ser o centro
das atenções. Eles são insensíveis às necessidades alheias, chegando ao ponto de não permitirem que os outros
contribuam com a conversa. Essas pessoas são muitas vezes percebidas como “tendo um remetente, mas não um
destinatário”. O tipo distraído do TPN corresponde muito proximamente ao quadro clínico descrito pelos critérios do
DSM-5. As questões narcisistas do tipo hipervigilante, por sua vez, são manifestadas de maneiras totalmente diferentes.
Essas pessoas são sensíveis à forma como os outros reagem a elas. De fato, sua atenção é continuamente direcionada
aos outros, em contraste com a autoabsorção do narcisista alheio. Como o paciente paranoide, eles escutam os outros
atentamente para obterem evidências de qualquer reação crítica e tendem a se sentirem frequentemente
menosprezados. Um paciente narcisista estava tão atento às reações de seu terapeuta que todas as vezes que o
terapeuta mudava de posição em sua cadeira ou pigarreava, o paciente via nisso um sinal de enfado. Quando esse
mesmo terapeuta removeu uma folha morta de uma planta que estava sobre a mesa de seu escritório, o paciente se
sentiu humilhado e exigiu um novo terapeuta. Os pacientes desse tipo são tímidos e inibidos a ponto de serem
apagados. Eles evitam os holofotes porque estão convencidos de que serão rejeitados e humilhado. No centro do seu
mundo interior está um profundo senso de vergonha relacionado ao desejo secreto de se exibirem de uma maneira
grandiosa” (Gabbard, p. 485).
Diagnóstico diferencial

• Personalidade narcisista vs reações narcisistas: Qualquer pessoa não narcisista pode


soar arrogante, vazia ou idealizadora sob condições que ameacem sua identidade e
confiança.
• Personalidade narcisista vs personalidade depressiva: Pessoas narcisicamente
deprimidas são subjetivamente vazias, enquanto pessoas depressivas com um
funcionamento introjetivo são subjetivamente plenas, de internalizações iradas e
críticas.
• Personalidade narcisista vs obsessivo-compulsiva: A busca de perfeição pode causar
confusão. Porém, nos o.c. existe uma luta por controle e culpa relacionada a raiva e
agressões fantasiadas. Pacientes narcisistas são mais vazios do que raivosos.
• Personalidade narcisista vs personalidade histérica: A confusão do item anterior
ocorre principalmente com pacientes homens. Com as mulheres é comum a confusão
com o tipo histérico, pois este utiliza defesas narcísicas, como exibicionismo, padrões
relacionais eróticos com o movimento valorização-desvalorização, etc.
TCC e ESQUEMA
• Vamos focar no Transtorno Bipolar.

• O que varia bastante entre os pacientes é o caráter dos seus humores, as ações que
tomam em resposta aos sintomas e a sequência na qual estes aparecem. Nos
mesmos indivíduos, os sintomas de mania e depressão podem mudar de um episódio
para o outro. Por exemplo, alguém tem dificuldade para dormir em um episódio de
depressão e no outro tem hipersonia.

• Para estabelecer o diagnóstico de transtorno bipolar I ou II, os clínicos deveriam estar


treinados e experientes em reconhecer e diagnosticar as condições psiquiátricas,
assim como as condições médicas gerais causadoras de um transtorno de humor.
• É melhor que se obtenha esse histórico do paciente e também de um familiar ou
amigo próximo que o conheça bem há vários anos.

• São pacientes que não costumam buscar na fase maníaca, mas na depressiva e a
natureza do episódio de depressão por si só não distingue o transtorno bipolar I e II
do transtorno de depressão maior.

• Os diagnósticos equivocados têm consequências sérias. Prescreve-se medicação


errada, equivoca-se no prognóstico, e o gerenciamento total do paciente sofre.

• 3 erros comuns: confundir sofrimento comum com depressão maior, não conseguir
identificar episódios maníacos ou hipomaníacos (sintomas menos extremados que da
mania) e confundir esquizofrenia com bipolaridade.
• Um recurso interessante está disponível em
https://www.dbsalliance.org/education/mental-health-screening-center/ do grupo
Depression and Bipolar Support Alliance.

• É capaz de detectar aproximadamente 70% dos pacientes bipolares e excluir cerca de


90% daqueles que não têm o transtorno (ou seja, dos 100% que possuem transtorno,
70% são identificados e dentre 100% dos que não possuem o transtorno, consegue-se
excluir 90% deles).

• O problema é que existe apenas na língua inglesa, obrigando uma tradução, e que
não pode ser oficialmente utilizado como fonte diagnóstica por não constar no
SATEPSI.
SATEPSI
O QUE OS PACIENTES
PRECISAM SABER SOBRE O
GERENCIAMENTO DA MEDICAÇÃO

• Os objetivos do tratamento medicamentoso são, em primeiro lugar, controlar os


sintomas e, em segundo, manter o estado assintomático por períodos prolongados
de tempo. Tais objetivos normalmente requerem ajustes do tipo de medicação,
dosagem ou ambos.

• A fim de obterem um ótimo benefício, os pacientes deveriam seguir com rigor o


tratamento prescrito, monitorar com atenção seus sintomas e efeitos colaterais, e
informar a quem prescreve a medicação os sintomas e efeitos colaterais a cada
consulta, e como eles possam ter modificado as recomendações quanto às dosagens
ou aos tipos de medicamento tomados
O QUE OS PACIENTES
PRECISAM SABER SOBRE O
GERENCIAMENTO DA MEDICAÇÃO

• Se desenvolverem efeitos colaterais, os pacientes e seus familiares, que


frequentemente são as primeiras pessoas a perceber os problemas, deveriam relatá-
los ao médico o mais cedo possível, para evitar um desconforto prolongado. A maior
parte dos indivíduos não toma os medicamentos que causam efeitos colaterais
significativos por muito tempo. Portanto, se os efeitos colaterais forem significativos,
mesmo os pacientes com uma grave doença recorrente, como o transtorno bipolar,
têm probabilidade de interromper a medicação ou de alterar a dose. Nesse ponto se
encontra o maior risco: os episódios maníacos ou depressivos retornarão, e pode
haver necessidade de hospitalização. Claramente, os pacientes deveriam ser bastante
estimulados a relatar os efeitos colaterais desde o início, para que os médicos lidem
com os mesmos de maneira agressiva e previnam uma adesão ao tratamento
insatisfatória da parte do paciente.
O QUE OS PACIENTES
PRECISAM SABER SOBRE O
GERENCIAMENTO DA MEDICAÇÃO

• Outros medicamentos prescritos, assim como as drogas de abuso (i.e., álcool,


cocaína, anfetaminas, alucinógenos e narcóticos), são conhecidos por afetar direta e
significativamente a eficácia dos medicamentos prescritos e é bem possível que
também intensifiquem os efeitos colaterais. Para um controle ideal do transtorno
bipolar, os pacientes deveriam informar sobre todos os outros medicamentos que
estejam tomando para doenças médicas comuns e psiquiátricas a fim de garantir que
nenhuma delas seja contraindicada ou interaja adversamente com os medicamentos
prescritos para o transtorno bipolar. Em essência, os medicamentos podem interagir
(os prescritos e os ilícitos) de modo a perderem sua eficácia ou doses normais podem
se tornar tóxicas se associadas a outros medicamentos.
O QUE OS PACIENTES
PRECISAM SABER SOBRE O
GERENCIAMENTO DA MEDICAÇÃO

• Medicamentos antimaníacos (lítio e anticonvulsivos especialmente) podem afetar


adversamente o desenvolvimento do feto. O lítio deve ser o menos teratogênico
desses medicamentos. Sempre que possível, as mulheres que desejam engravidar
devem examinar seus planos com o auxílio de um médico a fim de que o
medicamento mais seguro seja escolhido antes que ela engravide.

• Às vezes, medicamentos associados (como remédio para dormir ou ansiolíticos) são


usados para aumentar o efeito de medicamentos antimaníacos ou antidepressivos.

• Ademais, os medicamentos associados são usados com frequência por breves


períodos, a fim de controlar um novo ataque de sintomas de mania ou de depressão.
Mesmo seguros, os medicamentos associados não são frequentemente necessários
por longos períodos de tempo.
O QUE OS PACIENTES
PRECISAM SABER SOBRE O
GERENCIAMENTO DA MEDICAÇÃO

• Os pacientes deveriam ser informados da razão para o uso de cada medicamento


específico e dos efeitos colaterais comuns para ajudarem a determinar se o
medicamento está funcionando corretamente e, assim, vigiar e relatar os efeitos
colaterais importantes em tempo oportuno.

• A maioria dos pacientes com transtorno bipolar está tomando medicamentos


múltiplos, seja para o transtorno bipolar, seja para outros problemas de saúde
comuns. Consequentemente, o médico prescritor deve estar ciente das potenciais
interações medicamentosas.
O QUE OS PACIENTES
PRECISAM SABER SOBRE O
GERENCIAMENTO DA MEDICAÇÃO

• É essencial que os pacientes entendam as razões pelas quais se usa o medicamento


ou combinação de medicamentos, qual é o resultado esperado (caso seja bem-
sucedido), quando se pode obter êxito, quais são os efeitos colaterais prováveis e,
principalmente, por que e quando testes laboratoriais específicos são necessários,
seja para guiar a dosagem correta dos medicamentos, seja para monitorar as
situações adversas.

• Os pacientes e seus familiares deveriam ser ensinados a como monitorar, medir e


registrar os sintomas maníacos e depressivos, para que, quando chegar o momento
de ver o profissional que prescreve a medicação, ele tenha uma ideia clara de como
os efeitos da medicação eram e, deste modo, estarem mais aptos a fazer os ajustes
apropriados.
O QUE OS PACIENTES
PRECISAM SABER SOBRE O
GERENCIAMENTO DA MEDICAÇÃO

• Para ambas as fases do tratamento, a aguda e a de manutenção, os pacientes devem


tomar o medicamento (ou medicamentos) prescrito diariamente, nos bons e maus
dias, na mesma dosagem.

• Os pacientes desempenham um papel crucial para otimizar os resultados, por manter


escolhas de estilo de vida saudáveis e apropriadas, ao antecipar e estar preparado
para questões em potencial que poderiam afetar o gerenciamento adequado do
transtorno bipolar (fazendo uma cirurgia, engravidando, etc.).
Questionário básico de adesão
Questionário básico de adesão
FENOMENOLOGIA
• A psicopatologia fenomenológica tem como característica fundamental a busca da
compreensão do vivido psicopatológico e de suas condições de possibilidade, tendo
como principais representantes Minkowski, Binswanger, Strauss, Tellenbach,
Blankenburg, Kimura Bin, entre outros.

• A distinção entre sintoma e fenômeno está no bojo da imersão da fenomenologia no


campo psicopatológico e representa uma via de construção e delimitação de um
modelo de clínica fenomenológica que se sustenta sobre e na experiência.

• Um dos principais representantes deste pensamento na contemporaneidade é Arthur


Tatossian (psiquiatra francês).
• A noção de sintoma é central principalmente na medicina e representa muitas vezes a
única via de compreensão quantitativa de um sujeito em sofrimento e de referência
para um diagnóstico.

• Um sintoma, considerado somático, sinaliza para um processo somático patológico


ligado por uma cadeia causal com o qual é possível inferir a existência de uma
doença. Já no sintoma psiquiátrico ou psicopatológico, esta função de remeter a
outra coisa é ainda mais exercida.

• Diferentemente do somático, o sintoma psiquiátrico não permite sair do plano


descritivo, pois o vivido do paciente é o objeto por excelência da experiência
psiquiátrica, somente atingida pela mediação de aspectos exteriores, vias de
expressão desses vividos.
• Outro traço diferencial é que o sintoma somático, por remeter-se ao soma, pode
significar apenas uma parte da realidade, ou seja, pode significar a independência
entre um ou vários sintomas somáticos.

• Tal independência não se admite no sintoma psiquiátrico ou psicopatológico por


sempre atingir seu valor em relação com os outros, ou seja, advém da dificuldade de
comunicação e, a partir de referenciais, padrões de normalidade.

• A dificuldade de comunicação, por exemplo, ou mesmo a ausência, constitui a noção


de sintoma psicopatológico, ele “nasce com a falta de comunicação e as rubricas da
semiologia psiquiátrica lhe cataloga diversas formas: se o maníaco apresenta uma
fuga de ideias pode-se dizer que sua velocidade ‘normal’ (para ele) de pensar não é
aquela do psiquiatra”.
• Situar o sintoma apenas no campo anatomofisiológico é problemático por
configurar-se como algo que não é produzido pelo sujeito, impondo-se de modo
heteronômico, no qual ele é simples portador e vítima.

• Tal perspectiva também acaba orientando para o tratamento de um sujeito


puramente receptor e passivo.

• A doença se anuncia no sintoma, sem se mostrar; sinaliza apenas que algo está
presente, obrigando a inferências diagnósticas. Se a doença realmente se mostrasse,
não haveria necessidade de inferências.

• Neste modelo, infere-se por comparação com configurações presentes na memória e


em manuais. Então, o diagnóstico psiquiátrico se faz a partir dos sintomas e o mais
preocupante é que se apreende no sintoma mais do que o próprio sintoma ou do
que o paciente poderia verbalizar, funcionando muitas vezes por ensaio e erro.
• Os sintomas são uma parte minoritária da massa de informações percebidas pelo
clínico no contato com o paciente e o modelo inferencial gera limitações à prática
clínica por realizar muitas vezes uma filtração drástica daquilo apresentado pelo
paciente, sendo o sintoma apenas um índice deste problema.

• Tatossian (1994) questiona o modelo inferencial, critica sua utilização única, pautada
sempre em parâmetros probabilísticos e puramente sintomáticos, e procura outro
modelo que possa dar conta do processo diagnóstico e seja realizável: o modelo
perceptivo.

• Tatossian (1994) propõe a saída de um modelo de diagnóstico clínico


inferencial/sintomático para um modelo perceptivo/tipológico. As entidades
diagnósticas não seriam mais inferidas a partir do sintoma, mas percebidas
globalmente a partir da compreensão de um diagnóstico que está sempre em statu
nascendi no sintoma e com o sintoma.
• Trata-se de um modelo em que a atividade clínica aparece como “uma atividade
propriamente perceptiva e o reconhecimento das entidades psiquiátricas como um
fenômeno fundamentalmente expressivo”.

• Segundo Tatossian (1989), o “conteúdo material do sintoma importa menos que a


forma que ele assume, ou seja, o modo do vivido global, o estilo de vida essencial,
cuja percepção direta assegura o diagnóstico”.

• Então, não se diagnostica, por exemplo, a esquizofrenia ou a depressão, mas antes a


esquizofrenicidade ou a depressividade como modos de vida global que se
apresenta ao clínico e que podem ter um sintoma incorporado a este estilo global de
ser: “o distúrbio do paciente é percebido não depois e a partir do sintoma, mas com e
no sintoma”.
• No diagnóstico perceptivo, os tipos de doentes mentais são reconhecidos antes
mesmos das próprias doenças, estabelecendo, dessa forma, um quadro tipológico.
Então, se o reconhecimento de entidades diagnósticas é de natureza originalmente
perceptiva e expressiva, o número destas entidades é necessariamente baixo, pois
dificilmente se poderiam conceber centenas de estilos de vida diferentes.

• Diante da questão do diagnóstico, Tatossian assume um posicionamento crítico de


questionar a rapidez e a precocidade do diagnóstico e a postura muitas vezes estática
da psiquiatria.

• Sendo assim, a fenomenologia se definiria como “deixar e fazer ver por si mesmo
aquilo que se mostra, tal como se mostra a partir de si mesmo”.
• A descrição ocupa um lugar fundamental por se estabelecer “a partir da própria
coisa” (Heidegger, 1927/1997, p. 65), em uma determinação a partir do modo em
que os fenômenos se dão, sobrepondo a ideia de um simples procedimento
metodológico.

• Como ser dos entes, não há nada “atrás” do fenômeno sobre o qual a
fenomenologia se interessa.

• Então, a psicopatologia fenomenológica de Arthur Tatossian evidencia um fenômeno


que se apresenta na clínica como modo de ser global do sujeito, como
funcionamento (...). A ênfase sobre o fenômeno significa um olhar sobre a
experiência, que se apresenta fenomenologicamente e no contexto clínico.
• A fenomenologia não se fecha em elementos pré-dados, ela vai se compondo com a
experiência, vai “aprendendo” com a experiência, e o fenômeno se mostra em uma
experiência fenomenológica clínica.

• Tatossian (1993/1997d) considera que um distúrbio psicopatológico não pode jamais


ser totalmente heteronômico, há uma parte da autonomia, da liberdade, que
persiste, até mesmo em casos de psicose grave. Segundo ele, “não há jamais a
loucura integral e o louco permanece um sujeito” (p. 217). Trata-se de um vivido que
significa os comportamentos, é o “modo de ser do indivíduo, por trás do qual não há
nada a buscar ou a supor” (p. 132).

• Tatossian possui o mérito de sempre considerar a liberdade como elemento central


no tratamento, como possibilidade do sujeito, como implicação de um lugar
fenomenológico que o clínico deve assumir como quem busca uma compreensão e,
de certa forma, uma facilitação na busca da maior autonomia para o paciente.
• A forma como Tatossian (1984/1997b, 1993/1997d) discute e incorpora a questão do
cuidado tem origem naquilo que Heidegger chamou de Ser-com (Mitsein) e, mais
precisamente, o que ele descreve como Preocupação (Fürsorge). Cuidar ou tratar é
concebido como uma forma de se ocupar do Outro, de estar com, de se preocupar
com o Outro.

• Na compreensão de Tatossian (1984/1997b, 1993/1997d), este termo heideggeriano


pode ser traduzido como solicitude ou mesmo mutualidade, mas ele prefere utilizar a
palavra assistência, por excluir uma possível ressonância afetiva que seria pouco
adequada.
• A partir dessa compreensão, Tatossian (1993/1997d) discute duas formas positivas de
assistência. (obs: positiva aqui deve ser lida como real, realidade)

• Na primeira, o outro é expulso do seu próprio lugar e a assistência se esforça em


retirar do outro suas preocupações. É um modo de assistência substitutivo que pode
ser exemplificado pela hospitalização, pela escolha não criteriosa da medicação e
por uma terapêutica puramente biológica escolhida pelo psiquiatra.

• Em termos de psicoterapia, acontece quando se provoca a perda de mecanismos


supostamente presentes no paciente, impondo-se à revelia de sua vontade. Tal
assistência é chamada por ele de “substituinte-dominante” por colocar o outro em
dependência e sujeição, uma espécie de opressão, um cuidado substitutivo.
• Na segunda forma de assistência, há a possibilidade de uma assistência que busca
restituir autenticamente os poderes da existência do paciente, de ajudar o outro a
tornar-se lúcido e livre, de convidá-lo a se fazer como possibilidade.

• É o que Tatossian (1984/1997b, 1993/1997d) denomina, em francês, de uma


assistência “dévançante-libérante” e que optamos por traduzir, diante da dificuldade
linguística, como um tipo de assistência antecipante-liberante.

• Partimos do sentido posto por Tatossian de um modo de assistência que tem sempre
como objetivo levar o outro adiante, potencializá-lo em um trabalho, que parte da
crença na potencialidade desse outro e na liberdade que, de diferentes formas, está
sempre presente.
• Heidegger (1927/1997) fala de um modo de preocupação que substitui o outro, que
assume suas “ocupações”: “Nessa preocupação, o outro pode tornar-se dependente e
dominado mesmo que esse domínio seja silencioso e permaneça encoberto para o
dominado” (p. 174).

• Sá (2002) compreende que este é um modo comum em diversas formas de terapia


que estão sempre em busca de uma teoria ou de uma técnica que possa dar conta
do existir humano.
• Esta é uma compreensão eminentemente heideggeriana, que discute outro modo de
preocupação que já não visa tanto substituir o outro, mas sim antepor o outro,
colocá-lo diante de suas possibilidades e devolver o cuidado que lhe é próprio
(Heidegger, 1997; Sá, 2002).

• Na concepção de Tatossian (1993/1997d), na verdade, o cuidado com os doentes


mentais se desenvolve entre estes dois modos de assistência e as circunstâncias.

• O estado clínico do paciente direciona para uma combinação sucessiva ou


simultânea, mas, para Tatossian, o essencial é que, minimamente, a liberdade se
mantenha aberta ao paciente para aquilo que ele é, subjetividade ou possibilidade
de subjetividade
• Na psiquiatria do sintoma há uma imposição da cura ao paciente, enquanto a
psiquiatria do fenômeno busca comportar, ao menos em parte e de forma decisiva,
uma espécie de autocura sobre a qual o paciente é o principal agente e parte
integrante do processo de tratamento e da compreensão do que considera como cura.

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