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e Alexander Lowen
Posted on Equipe Psicanálise ClínicaPosted in Conceitos e Significados
Hoje falaremos sobre os conflitos de personalidade. Todo ser humano ao longo da vida psíquica
experimenta diversos traumas que se fixam no corpo como couraças musculares que amarram o
indivíduo em diferentes traços de caráter e da personalidade: esquizóide, oral, masoquista, psicópata
e rígida.
Através de um estudo de caso acadêmico, Marco Bonatti, Psicanalista Clinico no IBPC, desenvolve
o conceito dos traumas nas diferentes fases do desenvolvimento psicossexual: fase intrauterina, fase
oral, fase anal e fase genital.
Índice de Conteúdos
• Entendendo sobre os conflitos de personalidade
• Hipóteses analisadas
• O mito da caverna, entre luz e sombra
• Desdobramento de personalidade e os conflitos de personalidade
• Os conflitos de personalidade e a Psicanálise
• Fundamentos teóricos: Wilhelm Reich e Alexander Lowen
• Tseórico do trabalho de Alexander Lowen
• Conhecer a mente
• A energia do organismo e os conflitos de personalidade
• Um lado obscuro
• CONCENTRA-SE! Talvez, o caso de LOLA, tem algo a ver com aquilo que
aconteceu com VOCÊ!
• Os conflitos de personalidade e os pacientes
• Hipócrates e os conflitos de personalidade
• Fase oral
• Uma carência afetiva
• Fase pré oral
• Personalidade esquizóide e os conflitos de personalidade
• A tarefa do Psicanalista Clínico e os conflitos de personalidade
• Fase genital
• Um recurso da competitividade
• Fase anal
• Auto estima e auto expressão
• Segurança psíquica e os conflitos de personalidade
• Um amor vinculado
• Luto e Melancolia
• O caso depressivo do ego
• Trauma X queixa
• Um lado espiritual e aventuroso
• A falha e o inconsciente
• Os conflitos de personalidade e os conflitos da personalidade
• Sensação de desgosto
• Hipótese diagnóstica
• O complexo de Electra
• O inconsciente e a sexualidade
• Os conflitos de personalidade e a personalidade de Lola
• Conclusão
• Assim é a alma humana!
• Os conflitos de personalidade e as necessidades orais
• A família de origem
• O caso clínico de conflitos de personalidade
• Bibliográfia sobre os conflitos de personalidade
Entendendo sobre os conflitos de personalidade
A pergunta de partida é a seguinte: o trauma principal é aquilo externo (máscara) apontado pela
paciente como sintoma, como dor e ponta do iceberg e/ou é aquilo interno que é escondido e que
ainda está oculto para a consciência, porquê inconsciente e submerso no lado sombra da
personalidade? A resposta é simples, mas o processo é complexo.
É necessário dar espaço e tempo a energia criativa inconsciente que permite ao homem de superar-
se, de ir além da máscara, de dissolver as couraças, de olhar a própria sombra acima da maquiagem,
de enxergar acima da visão, de “bailar acima de si”, de pensar acima do pensamento, de falar
acima da linguagem, de sentir-se livre acima da liberdade para poder libertar a alma e amar
acima da dor.
Para Friedrich Nietzsche (1844 – 1900) “Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que
precisarás passar, para atravessar o rio da vida – ninguém, exceto tu, só tu. Existem, por certo,
atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te
custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho
por onde só tu podes passar. Onde leva? Não perguntes, segue-o!”
Hipóteses analisadas
Portanto, é necessário um largo caminho de introspecção e uma profunda análise para encontrar a
linha mestra que sustenta o homem, “além do bem e do mal”, que dá forma ao pensamento livre da
psique, ao agir além dos modelos de opressão, alicerce da palavra audaciosa, que liberta a alma
humana e permite abraçar a cura através o reencontro consigo mesmo e com a verdadeira
essência do Ser.
Neste estudo de caso serão analisadas hipóteses “práticas” mecanismos de defesas “concretos”,
resistências e dinâmicas que produzem dores psíquicas e sintomas, que você pode ter
inconscientemente sofrido, recalcado e escondido para si mesmo e para o mundo e que o analista
tem a missão de desvendar, desmistificar e fazer aflorar para a consciência, sem enrolação
nenhuma. A conclusão, o Autor mostra que o trauma principal, que sofreu a sua paciente Lola,
nome de fantasia, já esconde a própria cura.
Se VOCÊ FICOU INTERESSADO em descobrir o possível trauma da personalidade (que você, um
conhecido ou um familiar sofreu na infância) que atrapalha no seu dia dia e que impede a sua vida
de florescer, mas sobretudo o que seu Psicanalista e Psicoterapeuta deveria saber, como deveria
proceder no setting analítico, para curar este trauma, CONTINUE a LEITURA. Neste ARTIGO
você encontrará tudo aquilo que precisa SABER para VENCER os conflitos psíquicos e os
DESAFIOS da sua VIDA. LEIA e REFLITA com ATENÇÃO até o FIM!
Em outras palavras, as queixas apresentadas pelos pacientes são como as folhas de uma árvore, na
maioria das vezes expressam uma dor, um desconforto ou um sintoma externo e superficial, mas a
origem e a causa do trauma vem de longe, das profundezas, ou é enraizado, como no ditado
popular, na escuridão da terra. Daqui a pouco vamos DESENTERRAR EXUMAR e TIRAR da
SEPULTURA todos os possíveis TRAUMAS da PERSONALIDADE! Mas primeiro é preciso
estudar o alicerce teórico e a fundamentação científica do caráter e da personalidade e a sua
conexão com o trauma!
Os conflitos de personalidade e o TRAUMA é como um MORTO QUE FALA através da linguagem
do corpo, da dor, do sintoma e da doença. Não adianta fazer de conta que ele não existe ou que está
morto no passado, porque ele continuará falando, gritando e sacudindo sua alma e sua paz de
espírito no presente, até que você o ouça!
Conhecer a mente
Conhecer realmente a sua mente significa saber o que você quer e o que você sente (no corpo)”.
(Lowen, 1983, p. 56). Wilhelm Reich (1897-1957) descobriu que o caráter psicológico de um
indivíduo é expresso pelas atitudes do seu corpo. Como a pessoa se mantém erguida, se move, fala,
irradia sentimentos, interpreta e reage diante de um trauma nos mostra quem ela é, sua atitude e
personalidade e o caminho que precisa fazer para encontrar a cura da sua dor. Em definitiva,
o corpo é espírito e alma encarnada que cresce, plasma, evolui e se defende de um trauma que a
ameaça em uma determinada fase de evolução psicossexual. Assim que na fase intrauterina, nos
conflitos de personalidade o trauma da criança origina o traço de caráter esquizóide.
Na fase oral o trauma origina o traço de caráter oral. Na fase anal o trauma pode originar o traço de
caráter masoquista e/ou o traço de caráter psicopata. E na fase genital o trauma origina o traço de
caráter rígido. Todavia, se tudo isso fosse linear e lógico, se existisse uma relação binária de causa-
efeito, seria simples entender e associar para cada fase de evolução um trauma
correspondente descobrindo e curando a dor do paciente. De fato, o organismo psíquico é
dinâmico, não estático e linear. E a subjetividade do indivíduo pode dar respostas completamente
diferentes em situações parecidas.
A análise do caráter é uma ferramenta indispensável que se apoia na tese que “O corpo
frequentemente é mais revelador do que as declarações verbais do paciente porque essas refletem o
que há conscientemente na mente do indivíduo enquanto que a expressão corporal demonstra as
atitudes inconscientes da pessoa em relação ao mundo e a si mesma, como se mexe, o grau de
mobilidade no corpo, a quantidade de sentimentos nos olhos, a profundidade da sua respiração,
o calor e a cor da pele.” (Lowen, 1983, p. 74). Detalhes, não insignificantes que constituem a
realidade psíquica do paciente, sua vida interna que precisa ser relacionada com a fala através da
associação livres e interpretação dos sonhos. Lowen “Notou uma tendência comum a todos os seus
pacientes de reter a respiração e inibir a exalação, correspondendo a um controle dos seus
sentimentos e sensações.
Um lado obscuro
Nos conflitos de personalidade este lado obscuro da personalidade encerra todas as fantasias
destroçadas da alma, fala através de sonhos, nos envia recados através da ansiedades, depressão e
dores, quer ser ouvido, escutado e acolhido, porque ele pensa, sente e age completamente diferente
de nosso lado consciente. “A vida do corpo é sentimento: sentir-se vivo, vibrante, bem, excitado,
furioso, triste, alegre e, finalmente, contente. É a falta de sentimentos ou a confusão acerca deles
que traz as pessoas à terapia.” (Lowen, 1983, p. 61).
Neste trabalho sobre os conflitos de personalidade vamos analisar e desvendar as emoções
recalcadas de uma paciente, o trauma que ela recalcou como consequência de uma dor insuportável
e a queixa que traz Lola para o consultório na entrevista preliminar. Traumas e queixas, máscaras e
sombras representam a realidade psíquica do paciente, seu presente (mas também seu passado
engessado e sua precária projeção futura), sua dor e sua couraça. Em esta investigação vamos
atravessar o passado remoto de Lola (nome de fantasia) e analisar o que ficou enterrado e sufocado
no inconsciente e o que precisa aflorar e ser ressignificado para sua consciência.
Agora chegou o momento de ANALISAR UM CASO CONCRETO e de responder às seguintes
perguntas: O que a paciente pode ter sofrido na infância? Quais fatos, palavras, gestos e atitudes
provocaram as feridas que Lola está carregando? Quais defesas permitiram que ela conseguisse
lidar com a dor? Como o sintoma que acusa hoje tem a ver com os traumas do passado? O que
Lola pode fazer para cuidar da sua saúde mental e recuperar a qualidade de vida? Como encontrar o
Sentido de vida, sua missão e lugar no mundo?
CONCENTRA-SE! Talvez, o caso de LOLA, tem algo a ver com aquilo que
aconteceu com VOCÊ!
Este estudo sobre os conflitos de personalidade de caso fictício pode ajudar a esclarecer melhor o
arquétipo da máscara e da sombra na dinâmica do trauma do paciente para ser analisado e tratado
com a Psicanálise Clínica. O caso é inspirado em uma palestra do Corpo com Ciências do
renomado médico Fernando Freitas, na tentativa de melhor descrever e esclarecer todos os
possíveis traumas da personalidade e os mecanismos de defesas que podem acontecer na vida de
uma criança que passou por abalos e perturbações na infância e que continuam interferindo na sua
vida de adulto, com conteúdo atualizado.
Leia Também: Ansiedade no Amor: como a ansiedade afeta o relacionamento amoroso
Por simplificação acadêmica chamaremos nossa paciente LOLA. Lola, nome de fantasia, é uma
paciente de 38 anos de idade, que se apresenta pela primeira vez no meu consultório, bem vestida,
como se estivesse indo para uma entrevista de trabalho. Sua roupa lembra mais um uniforme, do
que um vestido descontraído com cores. O corpo de Lola parecia carregar muitas tensões
musculares. As pernas finas e rígidas, o quadril largo, peito alto e quadrado pareciam apoiar-se
sobre um pedestal na parte inferior. Os braços eram robustos e a cabeça engessada no pescoço como
uma estátua.
Os olhos grandes, controladores e sedutores ao mesmo tempo mostravam ambivalência (amor e
ódio, paz e tristeza) e todas as privações da sua alma. Lola é concursada e trabalha como
funcionária pública na SEFAZ de Brasília, tem estabilidade financeira, mora sozinha em seu
apartamento, mas no mesmo prédio dos seus pais, não é casada e não quer ter filhos. Nos
conflitos de personalidade a paciente é filha única, foi criada pelo pai e mãe biológicos, o pai
faleceu após a separação. Lola teve uma infância aparentemente tranquila, mas traz como queixa a
tristeza, a ansiedade, o medo de perder o emprego, e, “de fazer e seguir as coisas da vida”.
Fase genital
Agora, vamos supor que na fase genital de Lola, por volta dos 3 e 5 anos de idade, o pai falando
com a própria filha começou a dizer “você é a minha princesinha, a mulher da minha vida, a minha
rainha…etc”. Por outro lado, em caso de uma criança de gênero masculino, vamos supor que a mãe,
que afastou e abandonou o bebê na fase oral, agora acolhe o menino de forma diferente falando “ele
é meu principezinho, é tudo o que quero na minha vida, é meu homenzinho, a coisa mais linda do
mundo”. Portanto, neste exato momento da vida a criança encarna, sente, pensa e age como se fosse
outra pessoa, vestindo outra máscara porque tem um ganho secundário devido a satisfação do
seu desejo de afeto frustrado na fase oral. A partir de agora, Lola sente-se querida, torna-se
importante, visível pelo mundo e preciosa pelo próprio pai, até então ausente.
Lola sente, que quando se torna “a princesinha do papai” (ou no caso do menino “o principezinho
da mamãe”) ele ou ela fica próximo, a abraça, a beija, mas agora acontece uma dinâmica diferente
porque a criança encontra-se em outra fase do seu desenvolvimento psicossexual. Portanto,
Lola que no começo tinha um traço de caráter oral (sombra), mas que escondeu-se por trás de uma
camada esquizóide (máscara), sente que quando se torna querida pelo próprio pai (ou mãe se a
criança for de sexo oposto) assume o traço e os recursos do caráter rígido da fase genital.
Analisando mais em profundidade o desenvolvimento psicossexual da criança, pode-se constatar
que a criança por volta dos 4-5 anos de idade quando chega na fase fálica desenvolve a sua
sexualidade (complexo de Édipo no caso do menino e/ou Electra no caso de Lola) e identidade
(percebe-se um Eu, um Ser diferente do pai e da mãe), podendo também experimentar a dor
da traição e o medo da castração. Isto é, as ambiguidades e ambivalências das relações familiares
produzem na criança um estranho efeito: a criança sente-se traída pelo pai que escolhe a própria
mãe ou vice versa o menino sente-se traído pela própria mãe que escolhe o pai. A menina percebe a
perda do amor do pai-amante e o menino percebe a perda do amor da mãe-amante, vivido até então,
como fantasia sexual.
Um recurso da competitividade
No traço de caráter rígido a pessoa desenvolve o recurso da competitividade (agilidade, execução de
tarefas e capacidade de atingir resultados) por medo da criança experimentar novamente a dor da
traição precisa vencer todos os desafios e se tornar melhor dos outros (perfeita, forte, atrativa
e experiente). Portanto, pode ter acontecido que Lola, por ter vivenciado outra dinâmica, reative e
desenterre seu “sentir” que tinha precedentemente abafado no traço esquizóide, mas que agora está
relacionado com a competitividade e o ganho secundário do amor paterno.
É dizer, se Lola consegue ganhar um lugar no mundo (inclusive no mundo afetivo do seu pai), o
mundo começa a perceber a importância e a existência dela. E ela volta a sentir carinho, amor e
cuidado. Nesta etapa da investigação o Psicanalista Clínico precisa se fazer outra pergunta: o que
aconteceu com o trauma esquizóide da sua paciente? A partir da fase genital, Lola sente-se
querida pelo próprio pai que mostra um afeto “desmedido” por ela, provocando nela outro trauma
inconsciente.
Portanto, neste exato momento da sua vida, a pequena Lola decidiu vestir a sua personalidade com
uma máscara rígida, uma couraça que melhor satisfazia sua necessidade de amor, que melhor a
protegia da dor da rejeição ou do abandono, escondendo na sombra o traço intermediário
esquizóide e deixando bem no fundo da sua alma, o traço de caráter e o trauma oral inicial. A
análise do caso não pode ser concluída e a hipótese do diagnóstico não pode ser elaborada antes de
investigar os possíveis traumas que podem ter acontecido com Lola na fase anal: o trauma
masoquista e o trauma psicopata.
Fase anal
Agora vamos formular outra hipótese. Na fase anal a pequena Lola passou por uma tremenda
humilhação e na fase genital experimentou a “traição do pai” como a própria mãe (caso ela tivesse
fantasiado se tornar a mulher do próprio pai) e/ou a traição do pai com outra mulher. Resumindo a
história clínica da paciente: primeiro aconteceu que Lola não se sentiu amada e atendida na fase oral
pela própria mãe, refugiou-se e protegeu-se na fase anterior (intrauterina) que produziu o trauma
esquizóide, mas em seguida sentiu-se amada na fase genital pelo próprio pai e logo sentiu-se
traída por ele. Quando Lola experimentou a traição do próprio pai, o mecanismo inconsciente de
defesa do ego, em vez de fixar Lola completamente na fase genital (porque o carater rigido não lhe
deu suficiente proteção a sua dor) a fez regredir para fase anal anterior.
É dizer, Lola não desenvolveu completamente um caráter rígido e competitivo, nem todos os
desafios foram enfrentados forjando uma couraça indissolúvel, querendo prevalecer sobre os outros
para conquistar espaços de afetividade, mas com a traição ela fez uma parcial regressão,
encerrando-se também em si mesma. O que aconteceu com Lola na fase anal? Na análise do caráter,
Wilhelm Reich (2019) mostra como na fase anal a criança desenvolve a capacidade de
controlar os esfíncteres (xixi e cocô), mas pode também experimentar a dor da humilhação
(deboche do tipo “ele fez cocô nas calças”) e forjar o traço de caráter masoquista que implica
segurar o cocô; a persona fecha-se em si mesma, interiorizando situações difíceis e ficando
introversa. “Em muitas pessoas há ansiedade ligadas às funções urinárias e anais que também
devem ser resolvidas.
Muitos de nós aprendemos a lição de que essas funções podem nos causar muita dor, vergonha e
humilhação se não forem rigorosamente controladas. Fomos elogiados por controlarmos e punidos
quando falhamos. Fomos ensinados que é errado deixar a natureza seguir seu curso, de que se deve
manter o controle todo o tempo. Agora não conseguimos relaxar nossos ânus fechados e assoalhos
pélvicos tensos. Temos medo de que os fundilhos caiam se soltarmos.” (Lowen, 1983, p. 41). A
retenção dos esfíncteres por causa da humilhação pode se transformar futuramente na busca por
dinheiro, sucesso e fama, tornando uma pessoa egoísta, avara e amarga, incapaz de se soltar e de
vivenciar o desapego dos bens materiais, presa ao ter e a posse (títulos, diplomas, dinheiro e
reconhecimentos) em vez ao ser e a essência (que visa tornar uma pessoa aquilo que realmente é).
Luto e Melancolia
Nossa investigação poderia estar encerrada, mas precisamos abrir um parêntese sobre a morte
inesperada do pai da paciente. Lola, primeiro sentiu-se amada, logo foi traída e em seguida
abandonada pelo pai que a deixou sozinha no mundo após a morte. Pode ter ocorrido que Lola, com
a morte do pai, tenha desenvolvido um quadro neurótico de melancolia que, diversamente do Luto,
produziu um menosprezo do ego e da personalidade. É dizer, o ego de Lola, no processo de
identificação com o pai, sofreu uma perda incalculável (a perda de si mesma), vivenciou um
rebaixamento, uma amputação onde a paciente se viu e percebeu perdida, experimentando
sentimentos ambivalentes e ambíguo com o pai de amor (objeto do desejo) e ódio (a causa da
formação reativa, adoptou uma posição oposta, para encobrir algo inaceitável e insuportável por ser
muito doloroso).
Ora, não cabe nesta investigação explorar esta nova hipótese, com o risco de fugir do tema, mas é
necessário fazer uma pequena digressão visto que a paciente Lola, além de ter um evidente
transtorno de personalidade, acusava sintomas depressivos talvez devidos a perda dolorosa do pai.
Esta neurose foi tratada por Freud em 1917 no célebre texto “Luto e Melancolia”, hoje conhecida
como depressão “maníaco depressivo”. No estado melancólico Sigmund Freud (1836-1938)
afirma que “à sombra do objeto cai sobre o ego” do paciente. De fato, pode ter acontecido que
Lola tenha investido bastante energia na relação com o pai (objeto externo de desejo) que é
incorporado como se fosse parte de si e no momento do luto, uma parte dela morreu juntos, o ego
ficou enfraquecido e refém no conflito com o ideal do ego.
Ocorre lembrar que o ideal do ego é uma vertente do superego, se constitui a partir do complexo de
Édipo ou de Electra como consequência da castração da criança com os pais, onde a criança
introjeta por medo da castração, expectativas e sobretudo os ideais deles, incluindo o ideal de como
o indivíduo deve ser (que é bem diferente daquilo que o indivíduo realmente é ‘Self’ que responde
a sua essência, a sua raiz e a verdadeira natureza intrínseca). É dizer, a criança se transforma
em um projeto jogado (ideal) do seus pais, negando as próprias aspirações, essência e desejos. A
dinâmica do conflito entre o ego e o ideal do ego (padrões e modelos ideais) pode originar dois
traumas (IBPC, mod.3, p. 63).
O caso depressivo do ego
O primeiro é “o caso depressivo do ego que se subjuga ao ideal do ego, e deixa o sujeito com baixa
autoestima, sentimentos de culpa e frustração, alto nível de exigência consigo próprio, sentimentos
de perda de amor e de que seus desejos são inalcançáveis”. O segundo, é o caso contrário “quando o
ideal do ego se subjuga ao ego, há uma supervalorização egóica como se o sujeito fosse superior a
tudo e a todos. Busca, portanto, aceitação, prestígio e necessidade de grandeza”.
A primeira situação poderia refletir o caso de Lola e do paciente “maníaco depressivo” que alterna
estados de humor a estados de excessiva tristeza (transtorno bipolar); vice versa, o segundo caso
origina a frustração narcisista, um desvio de personalidade já objeto de estudo e de publicação por
este autor (veja o link na bibliografia).
Em definitiva, para elaborar uma hipótese diagnóstica foi necessário considerar todas as dinâmicas
na história de vida da paciente, ressaltando também que adoecemos pelas palavras e nós curamos
pelas palavras, pelas imagens e pelos elementos significantes.
Trauma X queixa
Neste capítulo vamos desvendar as conexões entre o trauma na infância de Lola e a queixa adulta
que traz a paciente para terapia. Lola por dentro é uma criança ferida, e por fora é um adulto com
queixas. A análise do caso evidenciou que a paciente Lola continuava em forma inconsciente a
alimentar seus traumas passados, de um lado estava presa e fixada ao medo e a insegurança e do
outro lado a falta de autonomia e independência de um ego frágil e enfraquecido fazia com que ela
negasse para si mesma o prazer, o gozo e a liberdade de se tornar o que realmente é (princípio de
Individuação e realização), para ser algo diferente, reconhecível e aceito pelos outros, mas
incompressível e irreconhecível para sua própria alma.
Lola, por causa de um sentimento inconsciente de culpa, abortou e reprimiu o gozo pessoal e a
realização do desejo, abandonado a fé em si mesma. “Um pássaro sentado em uma árvore nunca
tem medo que o galho quebre, porque sua confiança não está no galho (ou no seu pai ou na sua
mãe), mas nas suas próprias asas!”. Ele confia, antes de mais nada, em si mesmo. Talvez Lola
precisasse voltar a acreditar em si mesma, pois era a única pessoa que podia gerar mudanças
significativas em sua vida! De fato, Lola tornou-se o maior carrasco de si mesma. Sua mente ficou
encarcerada e presa no passado, escrava da culpa e da impossibilidade de implicar-se como sujeito
do desejo. Lola precisava ressignificar o processo para poder se libertar do trauma e da culpa. ”
A questão básica no relacionamento mãe-filho(a) não é a amamentação no seio, mas a fé e
confiança, apesar dos três estarem muito relacionados. Através deste relacionamento a criança ou
ganha um senso básico de confiança em seu mundo ou entrará em um conflito com dúvidas,
ansiedades e culpas sobre seu direito de pegar o que precisa ou quer. Uma pessoa incerta, sua
procura no mundo é hesitante, tem suas ações dificultadas pela prudência e nunca se
compromete totalmente. Procura e foge ao mesmo tempo. (Lowen, 1983, p. 157). É curioso, mas o
desconforto e o trauma de Lola adquiriu a forma dos desejos que excluiu na sua alma e daquilo que
sentiu falta e não conseguiu expressar e satisfazer.
A falha e o inconsciente
Lola precisava se libertar do passado e encontrar uma nova energia para recomeçar: <“Todos nós,
mais cedo ou mais tarde, em pequenas ou grandes coisas, nos deparamos com um fracasso
emocional, uma dificuldade que nos joga no chão. Podemos reagir a uma derrota de maneiras
opostas: podemos vê-la como uma injustiça e não nos dar a paz, como o sinal inequívoco de que
nunca estaremos à altura, mas também como a passagem necessária para novas aventuras, ou novas
possibilidades. A derrota nos ensina quem somos, do que temos medo, nos coloca na frente dos
nossos fantasmas e nos permite olhar para eles e fazer as pazes com eles. Falhar às vezes é a
melhor maneira que o inconsciente tem de nos avisar que estamos em um caminho que não é para
nós. Iludir-se, insistir ou reclamar é inútil. Muito pelo contrário: precisávamos mesmo “bater a
cara” para olhar a realidade nos olhos”>. (Fonte: Riza Psicosomatica, Abril, 2022, p. 108).
Se entendemos este processo, podemos transformar a dor em uma experiência preciosa e positiva,
indispensável para encontrar nossas raízes e o caminho certo e verdadeiro para seguir. Contudo, a
recusa de acolher seus medos e o pedido da sua alma, afastou nossa paciente dos seus desejos
primários ao ponto de não se reconhecer mais. Ela precisava se tornar a melhor companhia de si
mesma e recuperar a fé e a esperança para encontrar seu novo lugar no mundo e descobrir quem
realmente é. “A rosa não tem porquê, floresce porque floresce; ela não pensa em como deve ser,
ela não se pergunta se você a vê ou não.” Angelus Silesius (poeta e mistico). Lola sublimou a
falta afetiva da fase oral e a necessidade de segurança com a transferência para o trabalho público
considerado como uma “grande mãe”, amparo e solução, aparente panaceia de todos os males, mas
privou sua alma do alimento espiritual, do inesperado e do desconhecido, do sonho e do desejo de
aventura no mar da vida.
O trabalho público representou para Lola uma gaiola com as grades de ouro, uma prisão segura que
protege e ao mesmo tempo tira a liberdade e pode ser vista como consequência do medo de
abandono da mãe biológica na fase oral. Pois, um passarinho criado na gaiola desconfia da sua
capacidade natural de voar e quando ganhar a libertade pode pensar que voar é uma doença.
Ademais, o medo da água pode ser pensado como o medo de voltar no útero materno onde
Lola experimentou a rejeição da própria mãe. A água é a vida, é o líquido amniótico que
alimenta o bebê na fase intrauterina onde Lola experimentou o trauma. O medo de viajar
(hodofobia) é associado com a ideia constante de se perder, com o medo de se soltar, de ficar
desamparado e sem proteção, ou seja, sem referência, sem segurança “materna”.
Sensação de desgosto
O que Lola tinha era amargura e uma sensação de desgosto (boca) com a vida; o que ela precisava
era amor, prazer e proteção, aceitação verdadeira e incondicional de si mesma, mas o medo de
abandono e do desamparo a deixavam desorientadas, insegura e presa, incapaz e de soltar e de
salpar para novos mares. A observação clínica demonstra amplamente que os medos mais intensos e
patológicos são realmente relacionados com a própria mãe ou com quem exerce a função materna;
enquanto os problemas de relacionamentos são relacionados com o próprio pai ou com quem
exerce a função paterna. Para completar a investigação é necessário fazer uma análise corporal da
paciente e entender quais as possíveis repercussões no corpo de Lola pelo trauma oral.
“Os braços podem se mover pela frente, mas os ombros estão encolhidos e as mãos pendem
flacidamente dos pulsos como flores murchas. A procura geralmente tem uma qualidade apática que
o paciente sente como “para quê?” ou “Ela não estava lá”, referindo-se a mãe. A uma perda de
sensações nos braços devido a contração dos músculos na articulação dos ombros. O movimento
para frente dos lábios é, similarmente, inibido pela espasticidade dos músculos faciais. Muitos
pacientes têm o lábio superior contraído, que reconhecemos como uma indicação de repressão de
sentimentos (mandíbula presa e rígida). […] A repressão é um “não vou” inconsciente que por um
lado é uma defesa contra a possibilidade de ser desapontado e machucado, por outro é uma reação
de ressentimento. (Lowen, 1983, p. 104).
Em concreto, o conflito de personalidade de Lola é o resultado das dinâmicas vivenciadas na
infância onde os sintomas e a simbolização (trabalho público, medo do mar, etc.) evidenciados na
queixa adulta apontam as conexões com o trauma passado; mostram que Lola perseguiu objetivos
irreais, que não estão assentados na realidade profunda da sua psique, a primeira que
experimentou a traição do seu desejo original. “É o colapso de uma ilusão, não uma ilusão
consciente, mas sim, uma ilusão que foi operante no comportamento de uma pessoa.” (Lowen,
1983, p. 57). Os distúrbios da personalidade de Lola são caracterizados não apenas por alguma
perda da função, mas também por uma perda da percepção associada à função. Por exemplo: “Uma
pessoa com miopia tem um problema visual e uma dificuldade de ver relacionamento”.
Hipótese diagnóstica
Da mesma forma, nossa paciente que tem medo da água, tem medo de mergulhar no imenso mar do
amor. Em definitiva, o medo de nadar expressa seu medo de amar, de se sentir traída ou abandonada
novamente, primeiro é a perda de confiança no corpo, ou seja, a fé em si mesma, segundo é a
sensação de desesperança e por último é a terrível lei do eterno retorno (retorno do recalcado), um
conflito passado não solucionado se representa sempre inúmeras vezes no presente (sintoma),
com conteúdo atualizado. A mais de dois séculos, o pai da medicina moderna, Hipócrates (460
a.C. a 370 a.C.) disse: “É mais importante conhecer a pessoa que tem a doença do que a doença que
a pessoa tem.”
É dizer, cada sujeito é diferente dos outros, não é um sujeito qualquer, é um mundo dentro de si
mesmo, uma subjetividade que precisa ser explorada e entendida com o maior cuidado, porque cada
caso é um caso especial. Em outras palavras, para a psicanálise clínica é mais importante entender o
paciente do que sua doença, já que o sujeito é um universo em si e não pode simplesmente ser
catalogado por uma nomenclatura simplificada da OMS tipo CID 10 (Código internacional de
doença). Portanto, a identificação das doenças, dos sintomas e o relativo tratamento do trauma não
é o mesmo em duas pessoas, na medida em que cada uma delas percebe-se como ser único, singular
e complexo onde sua individualidade e subjetividade é uma forma de auto expressão que depende
da sua capacidade de lidar, reagir e interpretar os fatos da própria vida.
Leia Também: Crise da Meia Idade: um olhar da psicologia
Contudo, queremos chegar a uma hipótese diagnóstica. Em definitiva, Lola queria a própria mãe na
fase da simbiose oral que foi negada, tive que recorrer e regredir ao recurso esquizóide da fase
anterior intrauterina para se isolar, não sentir e não sofrer a dor do abandono e quando cresceu e
obtive a satisfação do seu desejo inicial ficou presa na fase genital do traço de caráter rígido
(fálico narcisista) que é mais progredido dos outros, porque é posterior e também ficou presa e
regrediu no masoquismo da fase anal, prendendo seu sentir e sufocando as emoções dentro do seu
corpo.
O complexo de Electra
O medo de rejeição da fase pré oral; a manipulação e humilhação da fase anal, mas sobretudo o
medo de traição pelos pais que escolhem outro parceiro externo ao casamento e não permitiram o
desenvolvimento de uma relação triangular afetiva sadia (pai, mãe e filha), impediram a Lola de
alcançar a indipendencia emocional e de ficar sobre seus próprios pés (eu estou, eu posso, eu
sou) originou-se das experiências, dos traumas e das dinâmicas da infância. A última máscara
do caráter que aparentemente permitiu a criança de obter a satisfação do desejo original da fase oral
fixou Lola a uma máscara rígida e engessada (competitiva com a mãe pela menina que visa a
atenção e domínio do próprio pai, complexo de Electra e/ou competitiva com o pai para o menino
que visa o domínio e a atenção da própria mãe, complexo de Édipo).
Portanto, Lola desenvolveu um traço de caráter em parte masoquista e em parte rígido e competitivo
quando sentiu-se querida, aceita pelo próprio pai. De um lado Lola vestiu e encarnou uma máscara
rígida para esconder sua fragilidade para o mundo, mostrando somente o lado externo da sua
personalidade, a sua dureza, imperturbabilidade, focando na carreira e querendo controlar tudo
para inibir os sentimentos de culpa que carregava. Do outro lado, quando todos os sucessos no
trabalho não produziram gratificação ou quando apareceram seus medos e dúvidas escondia e
afogava sua fragilidade dentro seu masoquismo.
Assim que Lola ao se tornar adulta buscou relacionamentos com homens mais velhos visando a
busca inconsciente do próprio pai (paizinho) objeto do desejo negado e frustrado pela traição. Por
outro lado, a criança de gênero masculino buscará um relacionamento com um perfil de
mulher madura (não pela sexualidade) mas para achar (reencontrar) a própria mãe
(afetividade e contato, busca a mãezinha, mulheres mais velhas). Por isso que o homem ou a
mulher com traço de caráter rígido (e com trauma na fase oral) é atraente e competitivo, mas na
hora do relacionamento torna-se o bebezão da própria mulher ou do próprio homem, demonstrando
a necessidade da oralidade, queixa e choro (afeto negado, sentimento de abandono, medo de ficar
sozinho) nunca satisfeito pela própria mãe na fase oral, querendo fazer todas as vontades do
parceiro(a), quase sempre sem sucesso.
O inconsciente e a sexualidade
Em concreto, as crianças que vivenciaram um trauma na fase oral utilizaram a sexualidade para
obter a satisfação da oralidade-afetividade. Na análise do caso de Lola todas estas características
eram evidentes já a partir da análise do seu corpo. A parte superior do corpo de Lola expressava a
relação com a mãe (peito inflado) e a parte inferior com o pai (pedestal engessado, negação do
prazer). “A parte superior do corpo é identificada com a consciência e o ego, a parte inferior
com o inconsciente e a sexualidade. Na mitologia o diafragma é identificado com a superfície da
Terra. Abaixo do diafragma estão as regiões inferiores, a residência das forças da escuridão, as
paixões que não estão totalmente sujeitas ao controle racional da mente. Os sentimentos da parte
superior do corpo estão mais perto da consciência e portanto mais sujeitos a autoridade do ego.”
(Lowen, 1983, p. 121).
Em definitiva, Lola assumiu, vestiu e encarnou uma máscara social rígida com uma declinação
masoquista, expressando ansiedade, medo de solidão e abandono, ao tempo que deixou seu trauma
profundo (oral e esquizóide) na sombra impedindo de realizar sua verdadeira essência e missão na
vida (Self). “… há ansiedade, que acompanha o estar erguido em seus próprios pés. Não é que
tenhamos medo disso, mas a verdadeira independência significa ficar só. O medo de ficar só, eu
diria, é provavelmente a maior ansiedade de nossos tempos. Ninguém quer ficar só. Somos
gregários (animais sociais diria Platão) por nossa própria natureza, mas em muitas pessoas o medo
de ficar só alcança alturas irracionais. Por causa deste medo farão qualquer coisa (até de ser
manipulados).
Nos conflitos de personalidade abandonarão sua individualidade por causa dele, assumindo,
erroneamente, que a pessoa que é um verdadeiro indivíduo, que ousa ser ela mesma em oposição a
outros, será rejeitada ou cairá no ostracismo (exclusão). Este medo alimenta a sociedade de massa
com seus meios de comunicação de massa, entretenimento de massa, etc.” (Lowen, 1983, p. 41).
Lowen aponta, já em forma futurista, o mal do nosso século, o vazio e o fracasso existencial e
emocional de quem está perdido no conformismo e na expectativa social, deixando o princípio
de individuação, de auto realização e missão de vida, longe de ser alcançado. “E também, por mais
estranho que pareça, é o indivíduo de massa que está realmente só, que perde as relações pessoais
íntimas e profundas que unem as pessoas. E é o indivíduo que está erguido sozinho, sobre seus pés,
que sente e conhece a unidade que relaciona homem com homem e homem com mulher.
Conclusão
A caverna das almas perdidas é uma alegoria, um mito xamânico que esconde uma antiga sabedoria.
Um paciente, um índio da tribù Guaranis na Amazônia vai para o xamã para curar uma dor
invisível. Segundo a crença, o xamã é o líder inspirado pelos espíritos e pelos deuses para conduzir
as cerimônias na tribù. É o sacerdote máximo que, durante o ritual xamânico, entra em estado de
transe inconsciente e consegue penetrar os reinos ancestrais, na vida além da morte, curando
as dores de uma pessoa. O índio é conduzido em uma caverna e é convidado pelo xamã a descer
através de trilhas e caminhos estreitos para as profundezas da terra, bem lá no fundo subterrâneo,
invisível e escuro.
Ao entrar na caverna ele começa a fazer um caminho no seu passado. Enquanto desce pela caverna,
o índio volta no tempo através de uma regressão e introspecção, fazendo um percurso por etapa ao
contrário, longo as trilhas da sua vida e infância. No princípio o índio tem medo da escuridão onde
não é possível enxergar com os olhos, mas é conduzido pela voz sábia do xamã e tem fé, pois
somente assim ele poderá voltar a ter um encontro inesperado consigo mesmo. Em cada etapa da
caverna, assim como em cada estação da vida, o paciente índio esbarra em uma ferida da vida
em que ficou preso e deixou um pedaço de alma.
Quando o índio chega no fundo da caverna, esbarra na última etapa e estação, que representa a
parada primordial da vida, o berço, o útero da própria mãe e ele descobre que não têm mais a alma.
– Perdeu a alma? Perguntou o xamã. O índio estava assustado. Como um corpo pode viver sem
alma, perguntou-se, com a palavra morta no canto da boca. – Não pode viver! Respondeu o xamã
lendo o pensamento do índio. Os dois ficaram em silêncio. Somente os olhos se cruzaram. Os
olhos do xamã enxergavam a ausência de vida naqueles do índio. Aí, bem no fundo dos olhos,
escondia-se a sua doença. O xamã, não tinha a resposta que o índio buscava, mas fez um ritual e
uma fumaça se levantou do fogo. – O fogo é alma encarnada.
A família de origem
É dizer, a paciente ainda estava ligada, presa e fixada à imagem ideal do seu pai buscando ele em
todos seus relacionamentos ou nas relações afetivas com a família de origem. É importante lembrar
que a perda do afeto da mãe é irrecuperável. Lola só podia olhar para dentro de si e atingir a
reestruturação do Self, da essência e o enraizamento na realidade presente. Nos conflitos de
personalidade, a criança carente que vive dentro de um adulto deve ser reconhecida e
ressignificada, mas suas demandas antigas não podem ser satisfeitas e atendidas. Somente o
adulto pode legitimar, acolher e atender a demanda da criança ferida que carrega dentro de si. “O
homem ou a mulher deprimidos vivem carregando uma criança ferida que os amarra e fixa no
passado com uma correspondente negação do presente”. (Lowen, 1983, p. 22).
A mente de Lola tentou anular o acontecimento e as feridas do passado, tentou reprimir o
sentimento de desamparo, abandono e rejeição substituindo-os com uma ilusão que, diversamente
da fantasia, não a projetou além do evento traumático, mas ficou presa nele e no sentimento de
culpa “Quando uma pessoa viveu uma perda ou um trauma na infância que corrói seu sentimento de
segurança e auto aceitação, irá projetar numa imagem futura a esperança de que ela anule a
experiência do passado. Assim, nos conflitos de personalidade, um indivíduo, que experimentou a
sensação de rejeição como criança, imaginarà o futuro como uma promissora aceitação e aprovação.
Se ele lutou com um sentimento de desamparo e impotência como criança, sua imagem futura será
de poderoso e controlador…” (Lowen, 1983, p. 23)
O corpo rígido de Lola aprisionava seu lado e ferida masoquista. Lola chorava sem lágrimas em
uma autoflagelação que sabia de expiação de culpa para não ter sido “melhor o bastante ou perfeita
quanto basta…”. “O amor não pode ser separado da liberdade e do prazer. Ninguém ama
verdadeiramente alguém, se limita a liberdade dessa pessoa de ser ela mesma, de se expressar e de
agir por si mesma.” (Lowen, 1983, p.128). Em definitiva, se o paciente não relembra, repete e
ressignifica o que aconteceu nas dinâmicas do trauma, ficará preso nele e nunca curará a sua dor,
vivendo a vida preso no lado disfuncional da personalidade, que lhe serviu de mecanismos de
defesa e proteção, mas que lhe fez perder pedaços de almas, que lhe impediu evoluir e alimentou
seu vazio existencial.
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