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MULHERES ARQUITET[AS]: UMA INVISIBILIDADE A SER REPARADA

Soares, Caroline¹. Rahim, Emilly¹. Contiero, Julia¹. Ishiyama, Larissa¹.


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1.INTRODUÇÃO
O estudo do fazer arquitetônico, muito além de tecnicidades, tem - por dever-
ser fundamentado em uma análise social uma vez que se projeta para a sociedade.
Assim, nota-se o papel da mulher como protagonista, uma vez que, no Brasil, 61%
das arquitetas em atividade são mulheres e - embora sejam maioria - suas produções
não têm tanta relevância na história e na contemporaneidade.
Nesse sentido, ressalta-se a ausência de personagens femininas e suas
produções no cânone arquitetônico como referência para o ensino de arquitetura e
urbanismo, reforçando o modelo que supervaloriza a produção arquitetônica
masculina em detrimento da feminina. Dessa forma, é de suma importância a
introdução da mulher como arquiteta no ensino da Arquitetura e Urbanismo, o que
reflete na relevância feminina e seu impacto no campo desta profissão, contribuindo
para a valorização da mulher de maneira que possibilite o desenvolvimento de todo
o seu potencial.² Dessa forma, o presente artigo visa refletir a respeito da invisibilidade
do gênero feminino no que tange ao campo arquitetônico, destacando suas
implicações e a necessidade de mudanças.

2. A TRAJETÓRIA DE UMA ARQUITET[A]


A mulher enfrenta desafios diariamente por conta de seu gênero e em
situações nas quais os homens são predominantes - como no ramo da construção
civil - isso se intensifica, o que contribui para a árdua jornada das arquitetas ao longo
do tempo. Tal fato é reflexo da permissão tardia da entrada de mulheres no ensino
superior, tendo em vista que a primeira mulher a ter o registro de arquiteta foi Julia
Morgan no século XX, ainda que a ciência da construção seja um dos ofícios mais
antigos da humanidade.

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[1] Graduandas no curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Uberlândia (FAUeD /UFU).
História da Arquitetura e da Cidade no Brasil I.
[2] Referência à frase: “Se eu tenho a oportunidade de ter a vida que eu tenho; é óbvio que vou alcançar o
máximo do meu potencial” [EMICIDA, 2020].
Essa invisibilidade do gênero feminino contribui para a sociologia das
ausências a partir do ponto em que a produção arquitetônica de mulheres não é
creditada e não é vista como relevante, acarretando a perpetuação de uma
perspectiva restrita e machista. A exemplo, tem-se as obras da arquiteta e designer
Margaret Macdonald Mackintosh que foram creditadas, em sua maioria, ao seu
marido Charles Rennie Mackintosh. Até os dias atuais, pode-se perceber a
inferiorização do trabalho da mulher em relação ao do homem, o que é evidenciado
em uma simples busca bibliográfica no meio virtual: enquanto na dele há três páginas
(figura 1), a dela há apenas algumas linhas (Figura 2).

3. INVISIBILIDADE [ MATERIALIZADA ]
Tal invisibilidade da mulher no meio arquitetônico é materializada em diversos
exemplos que acabam por escancarar a ausência de importância que a sociedade
atribui ao gênero feminino. Isso pode ser visto seja pela falta de credibilidade da
arquitetura produzida por mulheres seja pela exclusão delas no uso e na apropriação
das obras, característica que é reflexo da sociedade androcêntrica atual.
A sociologia das ausências, citada anteriormente, é materializada no Senado
brasileiro que apenas em 2016 realizou reformas no banheiro do Plenário - que era
apenas masculino - para dividi-lo com as mulheres. Essa reforma foi realizada 55
anos após a inauguração da obra, obrigando as mulheres a deixarem o plenário para
usar o banheiro de outros cômodos, como o do restaurante ao lado. Isso parece
inimaginável para uma construção pública mas, ao se considerar que as mulheres
foram incluídas no cenário político brasileiro há pouco mais de 40 anos, com a
primeira senadora (Eunice Michiles) tomando posse no ano de 1979, escancara-se a
exclusão social e política de gênero e, consequentemente, a exclusão na própria
arquitetura.
Outro ponto a se ressaltar é a equivocada percepção que a sociedade como
um todo apresenta a respeito do papel da mulher na arquitetura, associando-o à
simples decoração e não a construção de grandes obras. Assim, vê-se a redução e a
inferiorização do exercício profissional das arquitetas, contribuindo para a afirmação
equivocada da inferioridade frente ao gênero masculino e supervalorizando a
produção projetual masculina.
Desse modo, ao ignorar a contribuição feminina para a Arquitetura, a
sociedade despreza também as soluções, as técnicas e os materiais que seriam mais
pertinentes para a produção arquitetônica. Assim, a arquitetura que deveria ser feita
para as pessoas e estar à serviço do usuário, mostra-se falha e excludente uma vez
que não atribui a devida importância às mulheres, evidenciando as ausências e a não
arquitetura.

4. MULHERES ONDE DEVEM ESTAR [ EM DESTAQUE ]

4.1 [A] gênese da metamorfose e sua anunciadoras


A história naturalmente excludente começa a ter vislumbres de mudança a
partir da luta de algumas mulheres, como a chilena Sophia Bennet (1868 - 1953) e a
norte-americana Julia Morgan (1872 - 1957), primeiras mulheres licenciadas em
arquitetura e que enfrentaram um sistema profundamente androcêntrico e limitador a
respeito do ato de projetar e ao reconhecimento de seus trabalhos. Nesse sentido, a
visibilidade, a remuneração justa e o crédito que lhes são devidos foram negados a
essas projetistas, visto a continuidade do apagamento de suas histórias - pouco
comentadas no ensino de arquitetura - até os dias atuais.
Avançando na história, destacamos a atuação da arquiteta Margarete Schütte-
Lihotzky (1897 - 2000), a qual teve sua imagem associada ao design da Cozinha de
Frankfurt, projeto que transformou a concepção do espaço da cozinha dado ao olhar
atento de Margarete às ações ali desempenhadas - quase exclusivamente por
mulheres - para desenhar soluções que as atendessem melhor. Destaca-se, no
entanto, que o reconhecimento à Margarete por esse projeto ainda é parcial, e que
outros projetos desenvolvidos por ela como o Alojamento para Mulheres Solteiras,
têm muito a colaborar para a construção de um entendimento sobre arquitetura, o
qual necessita da contribuição de arquitetas mulheres a fim de que possa caminhar
para deixar de ser parcial, excludente e machista.
Finalmente, mas não exaustivamente, pois se poderia discorrer sobre muitas
outras arquitetas mulheres - evidencia-se Margaret Macdonald Mackintosh (1864 -
1933) como designer e artista que desenhou inúmeros espaços, seus componentes
e mobiliários, fundamentais nas obras de Charles Mackintosh, mas que, assim como
muitas projetistas, não foi reconhecida por seu trabalho. Todavia, a esperança
nascente não pode ser olvidada, tendo como consequência a inspiração provocada
por essas e outras mulheres nas jovens arquitetas contemporâneas a elas, e em
inúmeras gerações posteriores, como a atual, e que certamente influenciará e dará
frutos nas gerações seguintes, contribuindo para a reversão da produção da não
existência.

4.2 Arquitet[A]s de hoje


Em contrapartida, em uma análise moderna e contemporânea, vale explicitar
a trajetória de algumas arquitetas que obtiveram destaque mundial por sua produção
arquitetônica, para assim, compreender a importância do papel feminino neste campo
de atuação e refletir sobre os impasses que as mulheres ainda enfrentam.
Como destaque na produção brasileira, Lina Bo Bardi (1914-1992) firmou seu
nome por uma arquitetura inclusiva, atenta ao usuário e às necessidades locais.
Entretanto, por estes fatores, muitas vezes a arquiteta é descrita como sensível, de
uma forma que sua obra arquitetônica é reduzida apenas a uma característica
atrelada ao sentimentalismo equivocadamente associado ao gênero feminino, ao
passo que a sensibilidade ao meio em que a arquitetura está inserida é atributo
essencial de qualquer arquiteto para a concepção de um bom projeto.
Outra arquiteta a ser destacada é Rosa Kliass (1932 - ), responsável pela
difusão do paisagismo no Brasil. Segundo Kliass, antes de sua atuação, o paisagismo
era apenas realizado no Rio de Janeiro pelo expoente Burle Marx. Nisso, nota-se que
apesar de não ser comentado e discutido, o trabalho desta mulher fez que o
paisagismo se tornasse mais acessível e adequado à realidade da arquitetura
brasileira à medida que incluía espécies nativas, trazendo brasilidade ao design
paisagístico.
Zaha Hadid (1950-2016) é conhecida e premiada mundialmente por seu
trabalho como arquiteta, sendo a primeira mulher a ganhar o Prêmio Pritzker,
entretanto ainda é alvo de diversos questionamentos insignificantes. Tal fato é
percebido em um comentário que a arquiteta faz em uma entrevista quando
questionada sobre o Estádio Al Wakrah, o qual é diversas vezes comparado ao órgão
reprodutor feminino em seu formato, e sobre tal ela diz: “É ridículo. Se um cara tivesse
assinado este projeto, não teriam surgido comparações desse tipo.” (TIME, novembro
de 2013). Nisso, percebe-se que mesmo que a mulher arquiteta obtenha renome, sua
obra é submetida a comentários sexistas.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS: TORNAR PRESENÇA
Nesta perspectiva, faz-se necessário reforçar a importância da abordagem da
mulher arquiteta no ensino da Arquitetura e Urbanismo nas instituições não só
brasileiras, mas também latino-americanas. Visto que figura feminina é mais presente
nas universidades e forma-se cada vez mais mulheres arquitetas, deve-se combater
as ausências impostas pela perspectiva androcêntrica e tornar presença a relevância
feminina e seu impacto no campo da Arquitetura, contribuindo para a valorização da
mulher de maneira que possibilite o pleno desenvolvimento e reconhecimento de suas
potencialidades.
A reversão deste discurso da não existência só será possível a partir do ensino
e da ressignificação do fazer arquitetura. Esta ciência social aplicada deve ser plural
e não excludente; as referências arquitetônicas devem ser repensadas a partir da
inclusão da arquitet[A] na história e na atualidade visando a equidade de gênero.
Desta maneira, as arquitetas perdidas na história poderão ser - de fato - encontradas
no hoje.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MOASSAB, A. Os desafios de introduzir a categoria gênero no ensino de arquitetura e


urbanismo. Maloca, PPGPD/UNILA. Acesso em 28 de março de 2022.

Victor Delaqua. "Dia do Arquiteto: As Arquitetas Brasileiras" 15 Dez 2014. ArchDaily


Brasil. Acessado 27 Mar 2022. <https://www.archdaily.com.br/br/759075/dia-do-
arquiteto-as-arquitetas-brasileiras> ISSN 0719-8906

Julia Daudén. "Gênero e acesso à profissão: as mulheres na arquitetura" 22 Ago


2019. ArchDaily Brasil. Acessado 28 Mar 2022.
<https://www.archdaily.com.br/br/923054/genero-e-acesso-a-profissao-as-mulheres-
na-arquitetura> ISSN 0719-8906

Marília Matoso. "Onde estão as arquitetas mulheres?" 28 Mar 2022. ArchDaily Brasil.
Acessado 28 Mar 2022. <https://www.archdaily.com.br/br/979033/onde-estao-as-
arquitetas-mulheres> ISSN 0719-8906
Maiztegui, Belén. "Carmen Espegel sobre seu livro Heroínas do Espaço: "A história
deve ser relida, ela ainda contém informações ocultas"" [Carmen Espegel sobre
Heroínas del Espacio: “La historia debe releerse, todavía contiene información oculta”]
12 Mar 2021. ArchDaily Brasil. (Trad. Sbeghen Ghisleni, Camila) Acessado 30 Mar
2022. <https://www.archdaily.com.br/br/958388/carmen-espegel-sobre-seu-livro-
heroinas-do-espaco-a-historia-deve-ser-relida-ela-ainda-contem-informacoes-
ocultas> ISSN 0719-8906

LEON, Ethel. Grette (Margarethe) Schütte-Lihotzky (1897-2000). A mulher na história


do design. Drops, São Paulo, ano 20, n. 145.08, Vitruvius, out. 2019
<https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/20.145/7510>.

Walsh, Niall. "Julia Morgan: a fascinante história de pioneirismo de uma arquiteta


muito à frente de seu tempo" [Julia Morgan: The Trailblazing Female Architect
Overlooked No More by The New York Times] 11 Mar 2019. ArchDaily Brasil. (Trad.
Libardoni, Vinicius) Acessado 30 Mar 2022.
<https://www.archdaily.com.br/br/912916/julia-morgan-a-fascinante-historia-de-
pioneirismo-de-uma-arquiteta-muito-a-frente-de-seu-tempo> ISSN 0719-8906

MULHERES NA ARQUITETURA: CONHEÇA OS PRINCIPAIS NOMES E SUAS OBRAS


MAIS FAMOSAS. [S. l.], 12 jul. 2021. Disponível em:
https://www.rocaceramica.com.br/blog/mulheres-na-arquitetura-conheca-os-
principais-nomes-e-suas-obras-mais-famosas/. Acesso em: 30 mar. 2022.

MULHERES NA ARQUITETURA.[S. l.], 8 de março de 2014. Disponível em:


https://www.caubr.gov.br/mulheres-da-
arquitetura/#:~:text=LINA%20BO%20BARDI,a%20ic%C3%B4nica%20Casa%20de
%20Vidro. Acesso em: 30 mar. 2022.

MARGARET Macdonald. [S. l.], 2012. Disponível em: https://www.mackintosh-


architecture.gla.ac.uk/catalogue/name/?nid=MMM&xml=int. Acesso em: 30 mar.
2022.
MARION Mahony Griffin:: primeira arquiteta do mundo foi encoberta pela sombra de
um homem. [S. l.], 2021. Disponível em:
https://www.hypeness.com.br/2021/04/marion-mahony-griffin-primeira-arquiteta-
do-mundo-foi-encoberta-pela-sombra-de-um-homem/#:~:text=Arte-
,Marion%20Mahony%20Griffin%3A%20primeira%20arquiteta%20do%20mundo%20foi
,pela%20sombra%20de%20um%20homem&text=A%20arquiteta%20Marion%20Maho
ny%20Griffin,recebeu%20a%20atenção%20que%20merecia. Acesso em: 30 mar.
2022.

PLENÁRIO do Senado terá banheiro feminino 55 anos após inauguração. [S. l.], 2016.
Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2016/01/plenario-do-senado-
tera-banheiro-feminino-55-anos-apos-inauguracao.html. Acesso em: 30 mar. 2022.

8. FIGURAS

Figura 1 - Biografia de Charles Mackintosh Figura 2 - Biografia de Margaret Macdonald Mackintosh


Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Rennie_Mackintosh Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Margaret_Macdonald_Mackintosh

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