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ANÁLISE
ESTRATÉGICA
Transformações Emergentes nos Conflitos Contemporâneos: Implicações Éticas e
Desafios para a Capacitação dos Militares
Maj Daniela Schmitz Wortmeyer
ANÁLISE
ESTRATÉGICA
subordinado ao Estado-Maior do Exército e foi criado Centro de Estudos Estratégicos do Exército dedicada
pela Portaria n º 051-EME, de 14 Jul 03, para estudar e aos temas que impactam a preparação da Força
EQUIPE
CONSELHO EDITORIAL
CHEFE
Cel Inf Andrelúcio Ricardo Couto
Cel Inf Andrelúcio Ricardo Couto
Cel Inf Marcelo Ambrósio
ceeex@eme.eb.mil.br
FOTO DA CAPA: Quartel General do Exército, por Disponível em PDF na página eletrônica:
5 EDITORIAL
O CENTRO DE ESTUDOS
7
Conflitos Contemporâneos: ESTRATÉGICOS DO EXÉRCITO
Implicações Éticas e Desafios para a
Capacitação dos Militares (CEEEX) FOI CRIADO EM 2003,
Major Daniela Schmitz Wortmeyer ORIGINALMENTE JUNTO À
VICE-CHEFIA DO EME.
ASSUNTOS DE POLÍTICA E
ESTRATÉGIA DO EXÉRCITO.
ENTRETANTO, COM A
Estratégias da Presença e da
EXTINÇÃO DAQUELA
43
Dissuasão face às demandas da SUBCHEFIA, O CENTRO
Defesa Nacional PASSOU A INTEGRAR A 3ª SCH
Coronel Wellington Costa Prates et
al. DO EME.
COM O PROJETO DE
REATIVAÇÃO DA 7ª SCH,
93 PUBLICADO NA PORTARIA Nº
ideacionais e reconfiguração do
tabuleiro internacional: entre a 653, DE 17 DE FEVEREIRO DE
ideologia e o pragmatismo 2022 (BOLETIM DE EXÉRCITO
Coronel R1 Guilherme Otávio N° 7-A, DE 18 FEV 2022), O
Godinho de Carvalho CEEEX VOLTOU FAZER PARTE
DA 7ª SUBCHEFIA DO EME.
Fotografado por
Felix Martins
WWW.CEEEX.EB.MIL.BR
Os textos publicados pelo Centro de Estudos Estratégicos do
Exército (CEEEx) são de caráter acadêmico e abordam
questões relevantes da conjuntura nacional e internacional de
interesse do Exército.
Os trabalhos são produzidos por analistas civis e militares e
estudiosos de diversas áreas.
As opiniões emitidas são de exclusiva responsabilidade dos
autores e não representam a posição oficial do Exército. O
objetivo é contribuir para o debate de grandes temas
nacionais e internacionais, com ênfase àqueles que impactam
a Defesa.
É permitida a reprodução dos textos e dos dados nele contidos,
desde que citada a fonte.
Reproduções para fins comerciais são proibidas.
EDITORIAL
Prezados leitores,
militares convidados.
militares.
estadunidense.
e-mail: ceeex2015@gmail.com.
Boa leitura!
Conselho Editorial
O CEEEx produz estudos de
temas de interesse e faz
análise de cenários que
servem como suporte ao
planejamento da Força.
Assim, procura responder
com eficácia e efetividade
aos desafios ditados pela
evolução da conjuntura e pela
mutação dos ambientes.
Igualmente, objetiva orientar
as decisões presentes, com
vistas à construção de
trajetórias para o Exército na
direção do futuro desejado.
A presença de pesquisadores
civis no CEEEx possibilita uma
visão mais abrangente das
questões de Defesa,
proporcionando outros
pontos de vista e enfoques da
sociedade.
Fonte: https://www.theguardian.com/science/2021/jan/26/us-has-moral-imperative-to-develop-ai-weapons-says-
panel
comunicações estratégicas elaborada com o não raro, entram em conflito mútuo, uma vez
objetivo de alterar a visão que seus inimigos que tenham alcançado seu objetivo em
têm do mundo” (p. 17, tradução nossa). comum. Torna-se frequente a associação de
Portanto, a meta é alterar a grupos insurgentes de motivações ideológicas
percepção, canalizando processos afetivos e com grupos criminosos, inclusive como
cognitivos e, em última análise, modificando fontes de financiamento de suas atividades. A
a visão de mundo do outro, de maneira a lealdade a causas, cuja divulgação se
reduzir ou eliminar a resistência a potencializa por meio da Internet, tem tomado
determinadas linhas de ação. Tal foco o lugar da lealdade a nações, por vezes
psicológico dos conflitos, por vezes contribuindo para a configuração de grupos
denominado guerra de informação, guerra de dispostos a ações extremas em prol de seus
narrativas ou guerra cultural, tem recebido objetivos (HAMMES, 2007; MONTEIRO,
maior atenção recentemente. Entretanto, 2017).
conforme analisa Ugleva (2021), sua Em relação aos atores não estatais
priorização como objeto de estudo e presentes na dinâmica dos conflitos
intervenção sistemática por determinados contemporâneos, é importante mencionar,
atores tem ocorrido, pelo menos, desde a além dos grupos insurgentes, a proliferação de
Primeira Guerra Mundial. companhias militares privadas por todo o
Ao lado dessa mudança estratégica, mundo, cujo emprego não se enquadra nas
verifica-se uma mudança organizacional disposições normativas que regulam a atuação
contínua e global, com a substituição das de forças armadas convencionais (HAMMES,
organizações hierárquicas por organizações 2007).
em rede. Na esteira da transformação das Além disso, a tendência de concentração dos
estruturas sociais como um todo, grupos combates atuais em ambientes urbanos
insurgentes por todo o mundo organizam-se acrescenta complicadores adicionais ao
em redes transnacionais e mesmo emprego militar, considerando a presença de
transdimensionais, combinando ligações infraestruturas críticas e, principalmente, os
físicas e virtuais entre seus integrantes riscos que representam às populações civis, as
(HAMMES, 2007). quais podem ser envolvidas de diferentes
As características de tais grupos formas nas conflitualidades (KASHNIKOV;
também vêm se alterando de modo cada vez ZEITH; KILPATRICK, 2021), como
mais complexo, envolvendo motivações evidencia a dramática situação humanitária
diversificadas e eventual formação de em torno dos continuados conflitos na Síria,
coalizões de interesses, que se dissolvem e, conforme figura 2.
Fonte: https://www.cartacapital.com.br/mundo/guerra-na-siria-completa-10-anos-e-acumula-mais-de-
388-mil-mortos/.
Transformações emergentes nos conflitos contemporâneos Vol 23 (1) Dez/Fev 2022
17
Fonte: https://asiatimes.com/2020/12/australias-elite-troops-face-war-crimes-trials/
https://www.euroisme.eu/images/Documents/pdf_cahie
rs/Le%20soldat%20augment%C3%A9%2019-06-
2020-web%20VFinal.pdf. Acesso em: 1º set. 20.
O tema liderança tem sido alvo de também, uma mudança no modelo mental de
várias pesquisas na atualidade. Isso decorre seus dirigentes e gestores, tornando-os vetores
exemplares pela sua solidez e modelos questão. Como exemplo, podem ser citadas: a
graves dificuldades, mudanças de direção, anos de 1980 e início dos anos de 1990, e o
consideradas modelares têm tido a sua própria Brasileiro), nos anos 2000. Como em outras
(2018, p. 7), são tempos assustadores para os organizacionais em difusão. Assim, o estudo
e legitimar a sua existência, a maioria dessas privados, destacando o seu aspecto estratégico
(2) pela referência à interação entre o líder e o que esses homens possuíam qualidades
subordinado (ou seguidores); (3) pela dinâmicas e carismáticas capazes de modelar
incidência no cumprimento dos objetivos dos os acontecimentos da História. Por essa
grupos; (4) pela diferenciação entre algo teoria, considera Tolfo (2000 apud
designado como funções e, enfim; (5) pela SANTIAGO 2007, p. 33) que o líder é
ênfase do exercício do poder e influência. possuidor de certas características que o
Para compreender cada uma dessas categorias tornariam mais apto a conduzir os demais à
de definições, torna-se indispensável conhecer execução de tarefas, ao passo que aos demais
o contexto em que elas se inserem. caberia o papel de seguidores.
De acordo com Jorge e Silva (2011, p. Outra teoria é a do Poder e da
47), antes da 2ª Grande Guerra, a liderança Influência. Fundamenta-se na premissa de que
era definida em termos das características de todos os caminhos levam ao líder, negando o
personalidades do Líder - Teoria dos Magos. papel dos seguidores e a força da cultura
Considerava-se que a solução para resolver o organizacional.
problema da eficácia era a seleção natural dos A Teoria Behaviorista ressalta o que
líderes. Mais tarde, a abordagem fazem os líderes e não as suas características.
comportamental definiu a liderança em Autores que defendem essa linha são: Blake e
termos dos comportamentos capazes de Mouton, criadores da Grade Gerencial e
distinguir os líderes dos não líderes. Assim, o Rensis Likert. De acordo com essa visão, de
problema da eficácia da liderança podia ser acordo com Tolfo (2000 apud SANTIAGO
resolvido por meio da formação dos líderes. 2007, p. 35), “em vez de traços, a liderança
Várias são as categorizações teóricas passou a ser investigada para a identificação
sobre a liderança. Serão apresentadas, a dos padrões de comportamento adotados
seguir, as principais delas segundo a visão de pelos líderes e suas funções”.
Crainer (2000 apud STROUGO 2007, p. 5). Segundo Marquis e Houston (1999,
A primeira delas é a Teoria do Grande apud SANTIAGO 2007, p. 35), na medida em
Homem. Predominante, no final do século que se desenvolveu, a pesquisa sobre
XIX até o início do século XX, fundamentou- liderança afastou-se do estudo das
se na premissa de que o líder nasce com características do líder para dar ênfase às
habilidades de liderança inatas, inexplicáveis coisas que ele fazia – o estilo de liderança do
e incompreensíveis para a maioria dos seres líder. A habilidade de liderança é configurada
humanos, sendo, portanto exaltado como com base em conjuntos de comportamentos
heróis. Thomas Carlyle (1841 apud VIEIRA que possibilitam aumentar a eficácia na
1998, p. 11-14) defendia essa tese, afirmando condução dos liderados.
Fonte: o autor.
Fonte: o autor.
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Fonte: os autores.
aumentar a capacidade operacional, o estado país, desdobrados desde o tempo de paz, face
de prontidão das tropas de pronto emprego e a ao seu principal competidor no Ocidente, a
projeção de força, bem como estimulam a Organização do Tratado do Atlântico Norte
realização de ações no campo informacional, (OTAN), como ferramenta de dissuasão
utilizando a comunicação estratégica para convencional, conforme pode ser visualizado
incrementar aspectos intangíveis da presença na figura 5.
e da dissuasão.
onde o Estado se faz menos presente. Tudo fronteiriça pelo Peru, na Corte Internacional
isso sem desconsiderar a capacidade de de Justiça, haja vista que a dissuasão não foi
mobilidade estratégica, reforçando as zonas suficiente para evitá-la, ficando ainda a
extremas a partir do centro do país. sensação de que dissuasão e cooperação
Em situações de catástrofes e desastres internacional não andavam juntas. Para tanto,
naturais como terremotos, tsunamis, secas, na Política de Defesa, a verdadeira dimensão
inundações e incêndios florestais, as Forças da dissuasão deveria ficar bem clara,
Armadas também estão presentes. No Plano evitando má interpretação por parte dos
de Desenvolvimento Estratégico do Exército países vizinhos, assim como a relevância
do Chile, AZIMUT 2026, ressalta-se a para salvaguardar e promover os interesses
preocupação em reorganizar a Força do Chile.
Terrestre e incorporar maior tecnologia para Assim como apresentado na estratégia
incrementar o poder de combate, aumentar as da Presença, os Comandos Conjuntos Norte e
competências e potencialidades, a fim de Austral contribuem para uma dissuasão
atender emergências e catástrofes, prevendo- efetiva dentro do que preceitua a Política de
se, inclusive, o desenvolvimento de uma Defesa. A reação imediata e a sustentação
força de reação rápida para tal (CHILE, interoperável e independente das forças,
2017a). presentes no Teatro de Operações Norte e
Segundo a Política de Defensa Austral, demonstram o valor dissuasivo,
Nacional de Chile (2021c), a dissuasão salientando-se a presença de tropas blindadas
considera a presença e a articulação como parte integrante de sua organização.
territorial da força efetiva nos locais de A Armada do Chile vê-se como uma
relevância estratégica para proteger áreas força polivalente, capaz de navegar sob
terrestres, zonas marítimas e espaços aéreos, qualquer condição climática, defender suas
para uma capacidade de resposta rápida e águas contra ameaças, projetar poder sobre
efetiva frente a uma agressão externa, o que é terra e realizar transporte marítimo
complementado por meio de uma resposta estratégico (Correa et al., 2019).
rápida na recuperação de danos às A relação estreita com os países da
infraestruturas críticas, diante de ataques OTAN, por exemplo, gera altos níveis de
cibernéticos ou físicos, bem como na interoperabilidade, usando padrões OTAN,
atribuição da origem de tais agressões. com doutrina e procedimentos operacionais
Para Castro B. (2014), o conceito de comuns, o que permite ao Chile integrar, de
dissuasão foi questionado pela sociedade, forma eficaz, seus meios às forças
principalmente na submissão de questão multinacionais para cooperar com a
Em contraste com os Estados Unidos, a doutrina nuclear, sobre a qual sua estratégia
segurança. Não publica uma estratégia de não deixou de adotar medidas efetivas
Fonte: os autores.
MENTALIDADE DE
DEFESA
Fonte: os autores.
INFRAESTRUTURA
NACIONAL DE
TRANSPORTES
Fonte: os autores.
DESENVOLVIMENTO
TECNOLÓGICO
Fonte: os autores.
Brasileiro deve estar preparado para atuar em aspectos está ligada à articulação do poder de
guerra e de não guerra), que têm como distribuição de meios, intimamente ligada à
de cooperação e coordenação com agências. ocorre, por exemplo: com a presença das
Para isso, a Força Terrestre, sustentada por tropas na fronteira, que produzem
sua organização em estruturas com as sobretudo, perante ameaças não estatais; com
emprego do poder militar de forma gradual e impede que as Unidades possam ser
Terrestre estabeleceu as Forças de Emprego para assegurar uma estrutura militar com
Fonte: os autores.
Fonte: os autores.
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2001. Administração do Exército (CPEAEx) – Escola de
Segunda Guerra Mundial (II GM), baseada efetividade operativa da sua política exterior,
norte-americana tem sido colocada à prova, governança global vem à tona, correndo em
deslocamento de poder. A emergência de uma Diante dos (não tão claros) sinais
versus Oriente e pelo afloramento de outros hegemônica dos EUA para a China tem
capacidades dos EUA parece ter se tornado incidência de variáveis estruturais, dentre as
reagido de forma contida, por vezes não climáticas, ciclotímicas crises econômicas
alcance espraiado. Ao parecer não demonstrar de impacto para a estabilidade global, tais
despontantes, os EUA enviam, mesmo que contemporâneo quadro de disputa por poder,
superpotências1, acende-se a luz amarela para estratégicas do mundo, dentre elas a porção
o futuro da segurança global. territorial que passaremos a chamar de Ásia
O mainstream dos analistas Indo-Pacífico (AIP), observa-se uma mudança
considera a China a única rival geopolítica nas estruturas de alianças. Ao pesquisar o
realmente capaz de ameaçar a posição dos perfil desse movimento, o International
EUA no topo da ordem global. Allison (2020) Institute for Security Studies (IISS) argumenta,
argumenta que a fulminante ascensão da por meio do research paper intitulado
China tem potencial de provocar uma Changing Alliance Structures 2 , que uma
mudança sísmica no equilíbrio de poder característica específica é a transfiguração do
relativo. Para além das relações bilaterais modelo multilateral tradicional. A formação
entre as duas potências, inevitáveis impactos de pequenos grupos internacionais,
nos campos econômico e científico- tencionando alcançar objetivos estratégicos
tecnológico afligem variados segmentos das limitados, embora significativos, em oposição
relações internacionais (r.i.). A emergência de a alianças ou instituições bilaterais ou
tensões com potencialidade de provocar multilaterais mais amplas, maiores ou mais
transbordamentos na esfera geopolítica formais, é apontada como uma tendência.
impele os Estados a movimentar seus recursos Dessa forma, o contemporâneo fenômeno do
de poder, inclusive a expressão militar. minilateralismo assume centralidade no
Nesse contexto, nas principais regiões dinâmico processo de remodelagem das
relações de segurança.
1
O documento National Security Strategy of United States of
America, divulgado em 2017, apresentou, de forma explícita, Na perspectiva geoestratégica do atual
China e Rússia como rivais que ameaçavam a prosperidade e
os valores norte-americanos. “A estratégia é realista porque é jogo das grandes potências, a
clara sobre a competição global: reconhece o papel central do
poder nos assuntos mundiais; afirma que os estados expansão/consolidação de áreas de influência
soberanos são a melhor esperança para um mundo pacífico e
define claramente nossos interesses nacionais”. De forma e a recomposição de parcerias e alianças
ainda mais clara, descreve que “[…] Após ter sido descartada
como um fenômeno do século passado, a competição entre estratégicas parecem imprimir padrões
grandes potências voltou” (tradução nossa). Sobre o assunto,
consultar https://trumpwhitehouse.archives.gov/wp-
2
content/uploads/2017/12/NSS-Final-12-18-2017-0905- Sobre o assunto, consultar
2.pdf?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt- https://www.iiss.org/blogs/research-paper/2021/12/changing-
BR&_x_tr_pto=sc. alliance-structures.
Disputa Hegemônica, fatores ideacionais e reconfiguração do Vol 23 (1) Dez/Fev 2022
tabuleiro internacional
96
9
países, ideias, valores e percepções serão
Somente uma superpotência hegemônica, dotada de
recursos políticos e econômicos suficientes, e fortalecida por manobrados conforme conveniências
capacidades militares, seria capaz de prover (ou induzir
terceiros a prover) sua parcela de bens públicos globais. Seu conjunturais que, via de regra, induzirão a
papel principal seria estabelecer e fazer cumprir as regras do
jogo inerentes às relações políticas, econômicas e de competição a adquirir uma volatilidade moral
segurança internacional, manobrando os meios do
mecanismo que sustenta a sua própria hegemonia.
10
desafiadora ao ordenamento internacional.
Para Morgenthau, que abordou de forma sistêmica o
conceito de equilíbrio de poder, há dois tipos de modelo: (1) Informação e poder estarão imbricados em
equilíbrio de poder de oposição direta, resultante dos
interesses de cada país no cenário internacional. As principais níveis muito elevados.
funções deste tipo de balanceamento são preservar
estabilidade entre as duas nações e preservar a independência Outro expediente comum aos tempos
de cada uma. E há a (2) equilíbrio de poder competitivo, na
qual se analisa a medição do poder de cada uma das nações da Guerra Fria é a busca pelo estabelecimento
envolvidas sobre uma terceira. O acréscimo de poder da
terceira nação afetada pende a balança para um ou para outro de um quadro de alianças bem estruturado,
(MORGENTHAU, 2003).
capaz de contribuir para a defesa de interesses questões internas. Tal quadro amalgamou o
comuns interestados. Na perspectiva dos desenvolvimento de uma mentalidade
“atores principais”, a reprodução de praxis autônoma de governança, incipiente sinal do
políticas/diplomáticas típicas da Guerra Fria representativo valor da liberdade para aqueles
objetivam (também) desanuviar áreas de pioneiros.
influência regionais/globais. Do emprego dos Moisi (2009) descreve que a história
recursos de poder disponíveis, emergem dos EUA (assim como a de Israel) foi
posturas estratégicas por vezes dissonantes. construída com base na “esperança
Na perspectiva dos “coadjuvantes”, à messiânica e na crença de uma América como
proporção que o espaço de manobra para uma terra da redenção, libertação e de um novo
eventual condição de neutralidade – favorável começo”. A república, fundada como idealista,
à prática da barganha – é constrangido, os vibrante e modesta, em menos de dois séculos
Estados tendem a adotar, sumariamente, dois se expandiu até a condição de império. O
posicionamentos díspares: balancing (aliar-se otimismo, o individualismo, a flexibilidade, o
em oposição à principal fonte de perigo) ou culto à excelência e a convicção de ser “único”
bandwagoning (aliar-se à principal ameaça)11. constituíram os ingredientes-chave do sucesso.
“Os EUA, desde a sua gênese como nação, se
2.1. O peso e o valor e das ideias: viram como um projeto em construção, e não
o pragmatismo e a ideologia no como uma memória ou tradição a ser
jogo das grandes potências protegida ou ultrapassada”.
A crença na vinculação da nação a um
A defesa dos valores fundamentais que
“destino manifesto”, ideia exordial para a
identificam os EUA como nação tem origem
fundamentação da tradição de política exterior
na fundação do país, quando a base estrutural
norte-americana, pode ser sintetizada nas
de suas organizações político-sociais foram
palavras do candidato derrotado (por Obama)
estabelecidas. Diferentemente de seus
Mitt Rommey, em discurso de campanha,
vizinhos, os habitantes do norte do “Novo
proferido em 2012: “Deus não criou este país
Mundo” desfrutavam de relativa liberdade e
para que fosse uma nação de seguidores. Os
autonomia política – incomuns à época –,
EUA não estão destinados a ser apenas um
cabendo-lhes decidir sobre as principais
dos vários poderes globais em equilíbrio. Os
EUA devem conduzir o mundo ou outros o
11
Conceitos componentes da teoria de equilíbrio de ameaças,
segundo a qual estas seriam mensuradas de acordo com a farão”. Kishore Mahbubani (2021) alega que
percepção dos Estados em relação a outros Estados. No
cálculo da medição, quatro elementos são considerados para o maior obstáculo à melhora das relações
a definição da percepção das ameaças: poder agregado,
proximidade geográfica, capacidades ofensivas e intenções EUA x China seria a existência de uma
agressivas (WALT, 1985).
insegurança (por parte das lideranças chinesas) (2021), a “ausência” de ações militares mais
em relação à estratégia de rebalance para a incisivas ou expansionistas seria o reflexo de
Ásia-Pacífico do governo Obama, em um impulso civilizacional e uma visão
particular no tratamento de assuntos militares. profundamente pragmática do poder.
Assim, a partir desse período, garantir a Kissinger (2011) já havia abordado uma visão
prevalência de relações saudáveis15 na região interpretativa teórica, baseada em conceitos
passa a adquirir status de prioridade. filosóficos, de que a política exterior –
Mahbubani (2021) comunga a ideia gradualista e organizada – estava baseada em
que a China, assim como todas as grandes uma “ascensão pacífica” e em um “mundo
potências, à medida que for se tornando mais harmonioso”. Em que pese tal assertiva
poderosa irá impor sua influência. Todavia, o reverberar em alguns ciclos de analistas
diplomata e professor de Cingapura internacionais, deve-se ponderar que o
argumenta que a nação asiática não deverá crescimento da influência militar na política
recorrer ao emprego da expressão militar chinesa e o incremento do processo de
como primeiro recurso para a consecução de modernização do Exército de Libertação
seus interesses. Mahbubani fundamenta-se na Popular (ELP) são fruto do alargamento do
História e na Filosofia para traçar um perfil empenho internacional do país e sua ascensão
mais parcimonioso no trato das questões na hierarquia16 (tácita) dos países.
internacionais por parte da China. Em
3. Geoestratégia e relações de
contraposição ao excepcionalismo norte-
segurança na região da AIP:
americano, o intelectual não credita à China “Quando dois elefantes brigam,
uma “missão universal” destinada a promover quem sofre é a grama.”
uma civilização chinesa, nem um eventual Segundo o Stockholm International
incentivo para que toda humanidade Peace Research Institute (SIPRI)17, em 2020,
reproduza o modelo de vida chinês. “Eles (os a China se manteve na vice-liderança dos
chineses) acreditam que só os chineses podem
16
No seio dos debates teóricos que fundamentalizam a
abraçar sua cultura, valores e estética”. epistemologia e ontologia das RI, especificamente aqueles
que abarcam a corrente realista, a ideia da existência de uma
Ainda segundo Kishore Mahbubani hierarquia entre Estados nacionais está vinculada à
distribuição desigual de capacidades materiais entre os
15
Cui Tiankai, então vice-ministro das Relações Exteriores mesmos, caracterizando uma assimetria no sistema
da China (2012), publicou o artigo “China-USA in China´s internacional. Para Waltz (1979), em decorrência de tal
Overall Diplomacy in the New Era”, destacando a situação, a estrutura sistêmica é perturbada pelas mudanças
necessidade dos países superarem problemas fulcrais para as na distribuição de capacidade entre os atores. Por conseguinte,
suas relações bilaterais, com destaque para a “falta de à medida que o padrão de comportamento é condicionado por
confiança mútua em assuntos estratégicos”. Cui destacou eventuais interesses em sobrepujar uns aos outros, aos
como óbice o movimento norte-americano para fortalecer seu Estados detentores de maiores recursos de poder (mais fortes)
sistema de alianças no Indo-Pacífico, o que prejudicaria, na caberá ocupar posições “hierarquicamente” mais destacadas
visão chinesa, o estabelecimento de relações interestatais no sistema internacional, limitando e constrangendo o
saudáveis. Sobre o assunto, consultar exercício da soberania pelos Estados mais fracos.
17
https://www.mfa.gov.cn/ce/cgsongkhla//eng/xwdt/t953801.ht Sobre o assunto, consultar:
m. https://www.sipri.org/databases/milex.
Disputa Hegemônica, fatores ideacionais e reconfiguração do Vol 23 (1) Dez/Fev 2022
tabuleiro internacional
106
gastos militares globais (US$ 252 bilhões), mundo 19 . Segundo o Pentágono, muito em
ficando atrás dos EUA (US$ 778 bilhões), a breve, a força naval chinesa estará em
superpotência militar da era moderna. Da condições de operar além dos limites do Indo-
análise superficial do perfil do destino dos Pacífico.
recursos desembolsados, expressiva parcela No contexto dos espaços geográficos,
foi direcionada à obtenção de equipamentos as tensões geoestratégicas mais significativas
militares com alto valor tecnológico agregado envolvendo EUA e China concentram-se na
(aeronaves, satélites, sistema de navegação região da AIP. Ao se posicionarem em lados
inercial próprio, mísseis, foguetes, opostos quanto ao entendimento legal acerca
interferidores cibernéticos, etc), alguns deles da navegação e da soberania sobre o conjunto
de origem nacional. Ademais, estima-se que o de ilhas situados no Mar do Sul da China20, as
ELP tenha à sua disposição cerca de 200 duas potências elevaram a temperatura
ogivas nucleares em condições de serem daquele pedaço do Globo. Mesmo que a
operadas, o que tem gerado especulações no questão não tenha chegado ao paroxismo,
Pentágono sobre uma eventual mudança na manobras, demonstrações de força e
estratégia nuclear chinesa, preocupação aglutinação de meios militares indicam a
externada no Annual Report to Congress – securitização do objeto de litígio, tensionando
Military and Security Developments Involving as relações e o equilíbrio regional. Outras
the People´s Republic of China18. questões integram a lista de principais pontos
Para além de seus interesses regionais de inquietação na AIP, dentre elas a
e globais, a obtenção/manutenção de ultrassensível questão envolvendo uma
capacidades vocacionadas para o combate a eventual alavancagem do movimento de
eventuais focos de insurgência, independência de Taiwan, disputas territoriais
especificamente aqueles vinculados aos com o Japão (no Mar da China Oriental) e
movimentos separatistas do Tibet e Xinjiang,
19
Numericamente, a marinha do ELP é a maior do mundo,
integram o cálculo do poder militar adequado contando com aproximadamente 355 navios e submarinos,
incluindo aproximadamente 145 grandes embarcações de
aos interesses do Estado chinês. Por óbvio, superfície. Sobre o assunto, consultar
https://media.defense.gov/2021/Nov/03/2002885874/-1/-
em razão das questões que envolvem Taiwan 1/0/2021-CMPR-FINAL.PDF.
20
Discordâncias acerca da delimitação marítima, direitos de
e da fulcral importância estratégica do Mar do navegação e soberania sobre o conjunto de arquipélagos de
Spratley e Paracel contextualizam a área de fricção, cujas
Sul da China, a projeção regional do poder disputas têm origem no século XIX. Atualmente, China,
Vietnan, Taiwan, Brunei, Malásia e Filipinas reivindicam
naval demandará consideráveis investimentos soberania sobre o conjunto de ilhas, evocando, cada qual com
uma interpretação, a Convenção das Nações Unidas sobre o
na marinha do ELP, já considerada a maior do Direito do Mar. Exceto Brunei, todos os demais envolvidos
estabeleceram presença nas ilhas disputadas. Reservas de
petróleo, descobertas nos anos 1970, impulsionaram a
18
Sobre o assunto, consultar rivalidade. Estima-se mais de 5,4 trilhões de metros cúbicos
https://media.defense.gov/2021/Nov/03/2002885874/-1/- em reservas de gás natural e 11 bilhões de barris de petróleo
1/0/2021-CMPR-FINAL.PDF na região.
exerceram papel importante na história Indo-Pacífico (11 Fev 22), classificou a região
recente. A paz liberal foi suficientemente da seguinte forma: “o Indo-Pacífico é a região
crível. Todavia, o crescente desgaste do mais dinâmica do mundo e seu futuro afeta
multilateralismo como modelo de concertação pessoas em todos os lugares” (tradução
parece adquirir resiliência, inferindo a nossa).
incidência de um natural desequilíbrio na Ao destacar o esforço bipartidário
capacidade dos Estados defenderem seus como parte da estratégia, no nível doméstico,
interesses. No grande coral das nações, as o documento do governo dos EUA ressaltou
vozes mais fortes tendem sempre a dissonar. que, simultaneamente, “aliados e parceiros,
Nesse contexto, questões em todo o mundo, estão aumentando, cada
geoestratégicas, inerentes ao emprego de vez mais, o seu próprio envolvimento no
recursos do poder militar para afiançar o Indo-Pacífico” (tradução nossa). O texto
poder político (e por vezes o econômico), dão transmite a ideia de que os EUA pretendem
mostra que volveram à cena política seguir moldando o ambiente estratégico em
internacional. A competição hegemônica ora que a China opera, objetivando construir um
instalada, ao transbordar suas refregas para os equilíbrio de influência que lhe seja mais
diversos tabuleiros internacionais, tensiona as favorável, assim como aos seus aliados e
r.i. e provoca a movimentação de outros parceiros, com os quais compartilham valores
atores, que, a fim de garantir melhores e interesses comuns. Atores locais, por
condições de defender seus interesses, conseguinte, são instados a se enquadrarem e
buscam o melhor e mais vantajoso a participar (mesmo involuntariamente) do
enquadramento nas estruturas concertativas, jogo das grandes potências.
regionais e globais. A realidade enfrentada pelos atores
A arquitetura de segurança global está regionais da AIP, alguns constrangidos pelos
em movimento. Ajustes nas relações de interesses estratégicos de Pequim, aponta para
segurança, com impactos nos quadros de o compartilhamento das preocupações
parcerias e alianças militares estão em estratégicas de Washington sobre a China.
andamento. Nesse diapasão, as regiões Nesse contexto, um grupo de países tende a
estratégicas mais importantes são as que ser atraído para a esfera de influência norte-
alojam movimentações mais dinâmicas. No americana, aderindo a arranjos de coalizão
quadro de competição EUA x China, a AIP é com os EUA, muito provavelmente baseados
o espaço geográfico que concentra maior em acordos bilaterais ou trilaterais. É o
tensão. A Casa Branca, ao publicar a mais modelo minilateral sendo colocado à prova na
recente estratégia norte-americana para o AIP. Por outro lado, existe a possibilidade de
outros Estados, na busca por autonomia, Massachusetts: The Belknap Press of Harvard
University Press, 2016.
adotarem uma postura de não alinhamento,
BUZAN, B.; WÆVER, O. Regions and powers: the
formando outros pequenos grupos com structure of international security. New York:
Cambridge University Press, 2003.
objetivo de promoverem seus interesses, sem
a participação dos EUA. À China, as opções CLARK, I. Legitimacy in a global order. Review of
international studies, Vol. 29, Nr S1, 2003. Disponível
parecem se delinear de forma mais restrita. em https://www.cambridge.org/core/journals/review-
of-international-studies/article/abs/legitimacy-in-a-
Em que pese o cenário se configurar global-
order/E7B1BCCDD37347EE88A2D97825EF54F7.
da forma descrita, a complexidade estrutural Acessado em 5 fev. 2022.
das relações locais empresta dramaticidade GRAY, Colin S. Estratégia moderna. Tradução
aos movimentos de alinhamento, ou não. Geraldo Alves Portilho Júnior. Rio de Janeiro:
Biblioteca do Exército, 2016.
Pragmatismo e ideologia, eventualmente, se
HOBSON, J. The eurocentric conception of world
chocam ou se unem. A dependência politics: western international theory. Cambridge:
Cambridge University Press, 2012.
econômica da China, materializada por
CHANGING ALLIANCE STRUCTURES. Research
relações comerciais consistentes, constitui-se paper, 22 Dez 2021. International Institute for Strategic
em óbice para a formação de um grande bloco Studies (IISS). Disponível em https://www.iiss.org/-
/media/files/research-papers/2021/alliances-
militar na AIP. Segurança e economia não report.pdf?la=en&hash=75DD36ECCE2C8396E0A
0B163. Acessado em 6 fev. 2022.
dividem a mesma opção de parceria
KISSINGER, H. World order: reflections on the
estratégica, cada qual apontando para uma character of nations and the course of the history.
New York: Penguin Press, 2014.
potência diferente, o que faz erigir um dilema
quase paradoxal. Dessa forma, o vigor da _____. Sobre a China. Tradução de Cássio de Arantes
Leite. 1ª edição. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.
conformação de alianças multilaterais mais
LAKE, D. A. Relational authority and legitimacy in
amplas, nos moldes da OTAN, parece muito international relations. American behavior scientist,
Vol. 53, Nr 3, 2009. Hierarchy in international
improvável. A abordagem país a país parece relations. Itacha, NY: Cornell University Press, 2009.
indicar o caminho para o futuro da arquitetura LEVITSKY, S.; ZIBLATT, D. Como as democracias
de segurança regional, podendo ser replicada morrem. Rio de Janeiro: Ed Zahar, 2018.
MAHBUBANI, K. A China venceu?: o desafio
para outros tabuleiros, de acordo com as chinês à supremacia americana. Tradução de Bruno
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