Você está na página 1de 1

DESENVOLVIMENTO DE UMA ESCALA DE AVALIAÇÃO

DO NÍVEL DE ECOANSIEDADE
Inês Morais Vilaça*1, Margarida Teixeira2, Joana Novais3, Patrícia Florindo4
1 USP Gaia; 2 USP Porto Ocidental; 3 ULS Alto Minho; 4 USP Braga

* ivilaca@arsnorte.min-saude.pt

INTRODUÇÃO: MATERIAL E MÉTODOS:


Ecoansiedade, também denominada de ansiedade climática, é a perturbação psicológica 1) Desenvolvimento da escala
resultante da extrema preocupação com as consequências das alterações climáticas1,2. Foi desenvolvida uma escala composta por oito itens, com escala de resposta de
Esta entidade, já reconhecida pela American Psychology Association3, parece apresentar Likert, para avaliação do domínio ecoansiedade, e oito questões sociodemográficas e
uma incidência crescente1,2,4. No entanto, não existe nenhuma escala validada em clínicas.
Português para a avaliação da ecoansiedade, o que dificulta a medição da sua real Após aferição da validade facial, através da consulta de pares, o questionário foi
frequência no nosso país. disponibilizado online.
2) Análise dos dados
Objetivo Após realização do teste de Little, que não rejeitou a hipótese nula da distribuição dos
Construir e analisar a validade de uma escala de avaliação de ecoansiedade. valores omissos ser completamente aleatória, procedeu-se à análise de casos
completos.
Foi realizada a análise das componentes principais (ACP) e avaliação da consistência
interna, da validade convergente e de construto com recurso ao software IBM SPSS
RESULTADOS: Statistics 28.0.

Caraterização da amostra Consistência interna


Foram obtidas 456 respostas de uma amostra não probabilística. A maioria dos O valor do α-Cronbach foi 0,855 (IC95% [0,834-0,875]) e a média de correlação inter-
participantes eram do sexo feminino (90%), detentores de grau de ensino superior item foi de 0,457 (IC95% [0,417-0,499]).
(84%) e não tinham qualquer doença diagnosticada (67%). A mediana de idades foi de
29 anos, com uma amplitude interquartil de oito.
Validade convergente
Quadro 2. Correlação de Spearman entre o score da escala e a autoperceção de ecoansiedade
Score Ecoansiedade
Análise das componentes principais ”Considero-me uma pessoa 0,637
Correlação de Spearman
com ansiedade associada aos IC95% [0,576-0,690]
O teste de Bartlett apresentou um resultado estatisticamente significativo (p<0,001) e o
potenciais impactos das Valor de p <0,001
valor da medida de Kaiser-Meyer-Olkin foi de 0,836. A ACP e a análise visual do gráfico
alterações climáticas.” N 404
de escarpa identificaram apenas uma componente, que explicava 48% da variância.
Validade de construto
Quadro 1 . Itens da escala, análise das componentes
ACP Consistência interna: Quadro 3. Avaliação da validade de construto
principais e consistência interna
Medida de
Nº de Correlação α-Cronbach Hipótese Grupos tendência N Estatística de Teste Valor de p
Itens da escala: Cargas
respostas item-total se item central
Nos últimos seis meses… fatoriais
omissas corrigida excluído H1: O sexo feminino apresenta níveis superiores de ecoansiedade, comparativamente
1. Sinto-me impotente relativamente às com o sexo masculino4,5,6,7.
3 0,665 0,551 0,845
alterações climáticas. Feminino 400 𝑋 : 48,57 Teste U de Mann-
Sexo 0,005
2. Despendo tempo a ver notícias/factos sobre Masculino 46 𝑋: 38,57 Whitney: 6900,0
as consequências das alterações climáticas.
2 0,708 0,595 0,839
H1: A média do nível de ecoansiedade é superior nos grupos etários mais
3. Sinto-me culpado quando faço algo jovens, comparativamente às grupos etárias mais velhos5,6,7.
ecologicamente incorreto.
5 0,802 0,701 0,823
Recolhida como Correlação de
4. Sinto-me desconfortável em situações Idade 447 𝑋: 29,00 0,169
variável contínua Spearman: -0,065
sociais em que outros fazem algo 2 0,809 0,708 0,822
ecologicamente incorreto. H1: Os indivíduos com patologia do foro mental apresentam maiores níveis de
5. Mantenho as minhas atividades sem pensar ecoansiedade, comparativamente com os indivíduos sem patologia mental2,5,7.
nas repercussões das minhas ações no meio 2 -0,266 Item eliminado Diagnóstico Ter Doença
ambiente. 59 𝑋: 57,14 Teste U de Mann-
prévio de mental
6. Entro em conflito com pessoas em Whitney: 0,015
doença Não ter doença
situações sociais em que estas fazem algo 2 0,573 0,449 0,857 391 𝑋: 45,71 8914,5
mental mental
ecologicamente incorreto.
7. Tenho medo que as alterações climáticas
aumentem as desigualdades sociais.
4 0,785 0,684 0,825 Efeito de teto e chão
8. Tenho medo que as alterações climáticas Não foi verificado efeito de teto ou chão (0,9% de participantes obtiveram o score
causem desastres naturais.
2 0,759 0,655 0,829
mínimo possível e 0,0% obtiveram o score máximo possível).

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO:
Nenhum dos itens apresentou 5% ou mais de valores omissos, o que sugere que as questões colocadas foram bem compreendidas pelos respondentes. O item cinco foi eliminado por
apresentar carga fatorial inferior a |-0,4|, tendo-se prosseguido a análise da consistência interna e da validade sem este item. Verificou-se a existência de boa consistência interna
(α-Cronbach entre 0,7 e 0,9 e correlações inter-item e item-total corrigida superiores a 0,4). Relativamente ao item seis, constatou-se que a sua eliminação provocaria um aumento do
α-Cronbach, o que significaria um aumento da fiabilidade da escala. Apesar disso, optou-se por manter o item na escala, já que se considerou que o mesmo abrange um conteúdo não
coberto pelos restantes itens. Foi verificada a existência de validade convergente, uma vez que o score da escala está de acordo com outras medidas referentes aos mesmos domínios
em análise, que, neste caso, funcionam como substitutos de um gold standard. Relativamente à validade de construto, foram encontradas associações estatisticamente significativas
com o sexo e o diagnostico prévio de doença mental, em conformidade com a literatura. Contudo, não foi atingida a correspondência dos resultados em 75%. A aplicação da escala a
populações com diferentes probabilidades de apresentarem ecoansiedade seria importante para aferir a existência de validade de construto. Os resultados expostos permitirão o
aperfeiçoamento da escala, contribuindo para a futura obtenção de uma ferramenta válida de avaliação desta entidade emergente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1- Romeu, D. (2021). Is climate change a mental health crisis? BJPsych Bulletin, 45(4), pp.243–245. doi:10.1192/bjb.2021.30. | 2- Schwartz, S.E.O., Benoit, L., Clayton, S., Parnes, M.F., Swenson, L. and Lowe, S.R. (2022). Climate change anxiety and mental health: Environmental
activism as buffer. Current Psychology, (1-14). doi:10.1007/s12144-022-02735-6.| 3- Clayton, S., Manning, C., Speiser, M. and Krygsman, K. (2017). Mental Health and Our Changing Climate: Impacts, Implications, and Guidance. [online] American Psychological Association, and
ecoAmerica | 4- Soutar, C. and Wand, A.P.F. (2022). Understanding the Spectrum of Anxiety Responses to Climate Change: A Systematic Review of the Qualitative Literature. International Journal of Environmental Research and Public Health, 19(2), p.990.
doi:10.3390/ijerph19020990. | 5- Reyes, M.E.S., Carmen, B.P.B., Luminarias, M.E.P., Mangulabnan, S.A.N.B. and Ogunbode, C.A. (2021). An investigation into the relationship between climate change anxiety and mental health among Gen Z Filipinos. Current Psychology, 15(1-9).
doi:10.1007/s12144-021-02099-3. | 6- Coffey, Y., Bhullar, N., Durkin, J., Islam, M.S. and Usher, K. (2021). Understanding Eco-anxiety: A Systematic Scoping Review of Current Literature and Identified Knowledge Gaps. The Journal of Climate Change and Health, 7(3), p.100047.
doi:10.1016/j.joclim.2021.100047. | 7- Berry, H.L., Bowen, K. and Kjellstrom, T. (2009). Climate change and mental health: a causal pathways framework. International Journal of Public Health, 55(2), pp.123–132. doi:10.1007/s00038-009-0112-0.

Você também pode gostar