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Jarina Pena da Mata

Luciana Souza de Oliveira

IMUNOBIOLOGIA

CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
5º PERÍODO
Jarina Pena da Mata
Luciana Souza de Oliveira

IMUNOBIOLOGIA

Montes Claros - MG, 2011


Copyright ©: Universidade Estadual de Montes Claros

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES

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REVISÃO TÉCNICA
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2011
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Diretor do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde - CCBS


Maria das Mercês Borém Correa Machado

Chefe do Departamento de Ciências Biológicas


Maria Orminda dos Santos Oliveira

Coordenador do Curso de Ciências Biológicas a Distância


Afrânio Farias de Melo Júnior
AUTORES

JARINA PENA DA MATA


Graduação em Ciências Biológicas (UFMG)Mestrado concluído em Bioquímica e Imunologia (UFMG)
Doutorado em andamento em Bioquímica e Imunologia (UFMG), com Imunologia de doenças para-
sitárias, estudando a relação Leishmania/hospedeiro

LUCIANA SOUZA DE OLIVEIRA


Graduação em Bioquímica (UFV)
Mestrado em Bioquímica Agrícola (UFV)
Doutorado em andamento em Bioquímica e Imunologia (UFMG), com Imunidade inata, estudando os
mecanismos efetores de fagócitos
SUMÁRIO

Apresentação.................................................................................................................................09
Unidade I: Apresentação e conceitos gerais de imunologia............................................................11
1.1 Breve história da imunologia e do pensamento imunológico............................................11
1.2 Propriedades gerais da resposta imune.............................................................................15
1.3 Características chaves da resposta imunológica adquirida.................................................18
Referências............................................................................................................................20
Unidade II: Organização do sistema imunológico..........................................................................21
2.1 Células do sistema imunológico.......................................................................................21.
2.2 Órgãos linfoides...............................................................................................................28
2.3 Circulação dos linfócitos..................................................................................................33
Referências............................................................................................................................34
Unidade III: Imunidade inata ou natural........................................................................................35
3.1 Reonhecimento pelo sistema imune inato........................................................................35
3.2 Constituintes do sistema imune inato...............................................................................39
Referências............................................................................................................................44
Unidade IV: Sistema do complemento...........................................................................................45
4.1 Vias de ativação do complemento...................................................................................45 .
4.2 Regulação do sistema do complemento .........................................................................50
Referências............................................................................................................................52
Unidade V: Citocinas e inflamação................................................................................................53
5.1 Receptores de citocinas...................................................................................................54
5.2 Citocinas que atuam na imunidade inata........................................................................54
5.3 Quimiocinas...................................................................................................................60
5.4 Citocinas que atuam na imunidade adaptativa................................................................62
5.5 Inflamação......................................................................................................................68
Referências............................................................................................................................70
Unidade VI: A resposta humoral....................................................................................................71
6.1 Teoria dos dois sinais na ativação dos linfócitos................................................................71
6.2 O Anticorpo...................................................................................................................72
6.3 Reconhecimento de antígenos pelos linfócitos B.............................................................78
Referências............................................................................................................................82
Unidade VII: Resposta imune mediada por linfócitos T..................................................................83
7.1 Apresentação de antígenos pelas APCs para os linfócitos T...............................................83
7.2 Reconhecimento do antígeno pelo linfócito T ................................................................90
7.3 Mecanismos efetores dos linfócitos T ..............................................................................96
Referências............................................................................................................................99
Unidade VIII: Regulação da resposta imune pela tolerância.........................................................100
8.1 Formas de induzir a tolerância......................................................................................100 ..
8.2 Tolerância oral..............................................................................................................103
8.3 Relação materno-fetal e materno-recém nascido..........................................................103
8.4 Autoimunidade.............................................................................................................105
Referências..........................................................................................................................108
Unidade IX: Reações do sistema imune: hipersensibilidade e rejeição a transplantes....................109
9.1 Hipersensibilidade imediata ou tipo I............................................................................109 ..
9.2 Hipersensibilidade mediada por anticorpos ou tipo II...................................................113
9.4 Hipersensibilidade tardia ou mediada por células T ou tipo IV......................................115
9.5 Resposta imune aos transplantes..................................................................................116
Referências..........................................................................................................................118
Resumo...............................................................................................................................119
Referências básicas e complementares.................................................................................127
Aividades de Aprendizagem - AA.........................................................................................129
APRESENTAÇÃO

Prezados Acadêmicos:

Olá! Sejam bem-vindos à disciplina Imunobiologia do curso de


Licenciatura em Ciências Biológicas pela Universidade Aberta do Brasil -
UAB/Unimontes.
A imunologia é a área de conhecimento que estuda a resposta
do corpo contra agentes estranhos (como os microorganismos) e suas
consequências (resolução de doenças, alergias, entre outras). Esta
disciplina tem por objetivo apresentar conceitos chaves de como a resposta
imunológica funciona. Nossa ênfase será em mamíferos, especialmente
camundongos e seres humanos, pois é onde o conhecimento se concentra.
A ementa da disciplina é ampla, permitindo análise de diversos
aspectos da imunologia. Iniciaremos o curso apresentando uma breve
história da área, juntamente com conceitos gerais essenciais para o
desenvolvimento do curso. Em seguida, analisaremos como o sistema
imunológico é organizado e estruturado, e como ele consegue reconhecer
e distinguir as moléculas e microorganismos estranhos que entramos em
contato constantemente. Nosso próximo passo será discutir sua atividade
durante a resposta imunológica, e entender como eliminamos estes agentes
estranhos. Por fim, veremos aspectos do bom e mau funcionamento do
sistema imunológico, como a tolerância imunológica, a relação entre mãe
e feto, doenças autoimunes e transplantação.
O caderno está estruturado a partir do desenvolvimento de
unidades e subunidades. Você poderá notar questões propostas ao longo
do texto (Atividades, Dicas, Glossário e Para Refletir), que chamam para
a reflexão e discussão. Elas são de extrema importância para uma real
compreensão da Imunologia. As sugestões e dicas estão acompanhando o
texto, na forma dos seguintes ícones:

A bibliografia complementar e os textos sugeridos na bibliografia


suplementar também têm sua importância, pois indicam formas de ampliar
o estudo e a discussão. Utilize o máximo de recursos, pois eles podem
promover uma melhor observação e compreensão do sistema imunológico,
compreendendo aspectos teóricos e aplicando-os no dia-a-dia. Utilize
a internet para descobrir como é rico o mundo da Imunobiologia, mas

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Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

atenção para as fontes de informação! Não podemos confiar em muitas das


informações contidas na rede, então prefira sites de fontes confiáveis, como
órgãos do governo e instituições de ensino e pesquisa bem estabelecidas.
Esperamos que você aproveite bastante o curso, fazendo do
aprendizado uma aventura.
Bons estudos!

As autoras.

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UNIDADE 1
APRESENTAÇÃO E CONCEITOS GERAIS DE IMUNOLOGIA

Nesta unidade apresentaremos a disciplina imunologia com uma


breve introdução da história de seu desenvolvimento, desde os primeiros
registros até os dias atuais. Com este breve olhar, esperamos que você
compreenda como a imunologia cresceu rapidamente, principalmente no
último século, e nos proporcionou um conhecimento fundamental para o
avanço da medicina. Graças à vacina, a Organização Mundial da Saúde
conseguiu em 1980 declarar erradicada a varíola em todo o mundo; e o
Brasil, em meados de 2010, declarou que o nosso país erradicou o sarampo.
Após olharmos a história da imunologia, abordaremos os conceitos
básicos para compreendermos como o sistema imunológico funciona para,
então, iniciarmos oficialmente nossa jornada no curso.

1.1 Breve História da Imunologia e do Pensamento Imuno-


lógico

Com uma breve apresentação dos principais eventos nesta dis-


ciplina, podemos começar a compreender o pensamento imunológico e
como chegamos até ele. Este pensamento vem se modificando constante-
mente e, assim como em qualquer área da ciência, com cada resposta que
obtemos, surgem muitas novas perguntas.
O termo “imunidade” foi utilizado pela primeira vez no século
V a.C. pelo historiador Tucídides na Grécia Antiga. Nesta época, Atenas
estava sendo assolada por uma peste, da qual o agente causador, até hoje,
motiva dúvidas entre os estudiosos. Tucídides descreve que as pessoas que
se recuperavam desta peste se tornavam resistentes, ou imunes, a ela. Ele
associou esta proteção com a palavra do latim “immunitas”, que se refere
à isenção de taxas e proteção contra processos que os senadores romanos
possuíam durante o mandato. Entretanto, apenas na China no século X,
onde a varíola era endêmica, que se tem a primeira tentativa descrita de
induzir ativamente a imunidade. O processo de expor pessoas saudáveis ao
material das lesões causadas pela doença, principalmente através de inala-
ção, foi denominada “variolização”. A variolização era ainda utilizada no
final do século XVII no Império Otomano, mas através da inserção por furos
do material debaixo da pele da pessoa saudável. Contudo, por falta de
padronização de como era realizado, havia muitos casos do procedimento
causar a doença e/ou levar a morte, limitando sua aceitação.
A primeira vacina segura foi feita em 1796, por Edward Jenner,
contra a varíola, doença que afligia grande parte da população. Ele
percebeu que ordenhadeiras entravam em contato com lesões em vacas
muito similares às lesões geradas pela varíola em humanos e que, após este
contato, elas ficavam resistentes à varíola. Com isto, ele inoculou o material

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Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

obtido de lesões da doença bovina (figura 01), proveniente do braço de


uma ordenhadeira, em um jovem. Após certo tempo, ele inoculou o
vírus da varíola no mesmo jovem e, felizmente, comprovou a resistência
adquirida.

Figura 01: Jenner testando a primeira vacina contra varíola. Autor: Ernest
Board (1877 - 1934).
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Jenner_phipps_01.jpg. Acesso
dia 21/08/2010

Quase cem anos depois, no final do século XIX, Louis Pasteur (figura
02) e Robert Koch trabalharam de maneira independente no que seriam os
alicerces da microbiologia. Ambos seriam responsáveis pelo isolamento e
cultivo de diversos microorganismos patogênicos, desenvolvendo a Teoria
dos Germes (Koch) e vacinas atenuadas para cólera e antrax em animais
(Pasteur). Estes estudos determinaram a associação de microorganismos
com doenças, permitindo uma abordagem mais científica nos estudos das
causas e tratamentos.
Na mesma época, surgiram as primeiras observações relacionadas
à resposta imunológica. O primeiro a observar a ação de fagócitos (do
grego, células que comem) foi Elie Metchnikoff (figura 02), ao estudar
o desenvolvimento em larvas de estrela-do-mar. Ele estabeleceu que os
fagócitos são células da primeira linha de defesa, isto é, chegam no início
da resposta imunológica. Com estas observações foi iniciado o movimento
dos “Celularistas”, que acreditavam na importância das células na resposta
imune. Ainda nesta época, Emil Von Behring (Figura 02) e Shibasaburo
Kitasato demonstraram que era possível transferir imunidade contra difteria,
através de uma “antitoxina” solúvel, presente no sangue de animais que
já estiveram doentes para animais que ainda não tiveram contato com a
doença. Estes resultados iniciaram o movimento dos “Humoralistas”.
Com essas demonstrações, iniciou-se uma disputa entre os
“Celularistas” e os “Humoralistas”, com Pasteur e Metchnicoff como
principais representantes do primeiro grupo e Ehrlich (figura 02) e Von

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Imunobiologia UAB/Unimontes

Behring do segundo. Cada grupo considerava que os resultados obtidos


excluíam ou desvalidavam os resultados obtidos pelo outro. Esta disputa
dividiu os estudiosos da época, causando discussões acirradas.

Figura 02: Grandes cientistas que influenciaram o nascimento da imunologia. Louis


Pasteur (1822-1895), Ilya Metchnikoff (1854-1916), Emil von Behring (1854-1917), Paul
Ehrlich (1854-1915), da esquerda para a direita. Destes, apenas Louis Pasteur não ganhou
prêmio Nobel em Medicina.
Fonte: Modificado de figuras encontradas em http://commons.wikimedia.org/ Acesso
21/08/2010w

No início dos anos 1900 foi demonstrado que, além de toxinas,


substâncias antibacterianas e microorganismos, eram capazes de iniciar uma
resposta imunológica. Com isso, passou-se a utilizar o nome “anticorpo”,
por ser mais genérico que antitoxina.
Paul Ehrlich, um dos principais cientistas do final do século XIX,
formulou a Teoria da Cadeia Lateral. Esta teoria sugere que, uma vez dentro
do hospedeiro, um microrganismo invasor se ligaria a receptores pré-
formados em determinadas células, levando então essa célula a produzir
mais receptores (anticorpos). Com esta teoria, portanto, a especificidade
era determinada antes do encontro com o patógeno (microorganismo),
e não depois como se acreditava na época. Vários experimentos foram
realizados por diversos grupos e esta teoria foi confirmada, dando força ao
movimento dos humoralistas.
Entre 1900 e 1942, os “humoralistas” tiveram um papel dominante
na imunologia e com a ascendência da imunoquímica esta força se
solidificou ainda mais. A imunoquímica descreveu vários aspectos químicos
das reações antígeno-anticorpo, inclusive a elucidação da estrutura do
anticorpo.
Em 1942, Landsteiner e Chase demonstraram que a transferência
de células sanguíneas, mas não de soro, gerava uma resposta específica
contra Mycobacterium tuberculosis em cobaias. Os resultados obtidos por
Landsteiner e Chase, juntamente com experimentos realizados por Koch
(1883) descrevendo uma resposta imunológica do tipo tardia dependente
de célula, desafiaram a visão de que os anticorpos eram os únicos a
conferirem imunidade específica. Nestes experimentos, foi demonstrada
uma dependência de células e ausência de anticorpos. Vários outros

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Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

estudos começaram a surgir, mostrando que nem sempre os anticorpos


eram importantes em uma resposta específica.
Na primeira metade do século XX, a pesquisa em imunologia
começou a focar mais em transplantes e tumores. Na II Guerra Mundial
havia muitas vítimas com queimaduras graves e nem sempre se podia
utilizar da pele do próprio paciente para ajudar na cicatrização, tornando
frequente o uso de enxertos (transferência de pele de um indivíduo ou local
para outro) de outros indivíduos. Contudo, estes aloenxertos resultavam
na maioria das vezes em rejeição, dificultando a recuperação das vítimas.
Em 1943, Sir Peter Medawar, um zoologista, foi estudar a rejeição de
aloenxertos em vítimas de queimadura. Medawar também observou que
os responsáveis por esta rejeição eram células, e não componentes do
soro. Estes dados permitiram a comprovação de um fenômeno dependente
de células chamado hipersensibilidade do tipo tardia, que veremos mais
adiante.
Com esses resultados indubitáveis, o final da década de 1940
terminou com uma dicotomia: havia respostas de hipersensibilidade do
Transplante: tipo imediata (mediada por anticorpos) e do tipo tardia (mediada por
é a transferência de células,
células). Ora a resposta específica precisava de anticorpo, ora de células.
tecidos ou órgãos de um
indivíduo ou local para outro. Quem estaria certo afinal? Os humoralistas que reinaram por tanto tempo?
Podem ser “alogênicos”, em
que há a transferência entre Ou os celularistas, com todas essas novas evidências?
indivíduos geneticamente Hoje sabemos que ambos estavam certos, pois a resposta imune
diferentes, como nos
transplantes de coração utiliza os dois meios para combater antígenos estranhos. A importância
ou rim; “autólogos”, em de anticorpos ou células na resposta específica depende de vários fatores,
que a transferência ocorre
dentro do mesmo indivíduo; entre eles a localização do microorganismo ou macromolécula. A discórdia
“singênicos”, quando os
entre os dois grupos promoveu um grande avanço na imunologia, pois
indivíduos são geneticamente
idênticos; ou “xenogênico”, havia sempre o estímulo do desafio em mostrar seu ponto de vista.
quando o doador é de outra
espécie. Ainda na década de 1950, Ray Owen, um geneticista estudando
antígenos sanguíneos em gado, observa que há mistura sanguínea em
bezerros dizigóticos sem gerar resposta imune entre eles. Esta e outras
observações levaram à hipótese da tolerância imunológica e o conceito de
antígenos “próprios” e “não-próprios”.
Nas décadas de 1950 e 1960, vários estudos deram a base genética
e ontogênica do sistema imune. No final da década de 1960, Jerne,
Talmage e Burnet, independentemente, desenvolveram a Teoria da Seleção
Clonal. Nesta, os anticorpos seriam, de alguma maneira, produzidos antes
Quais as semelhanças e do contato com o antígeno. Ao entrar em contato com um determinado
diferenças entre a Teoria da antígeno, o linfócito específico seria selecionado e estimularia a produção
Seleção Clonal e a Teoria da
Cadeia Lateral? de mais células e anticorpos. Cada linfócito possui receptores para apenas
um antígeno. Sendo assim, a produção de mais células seria de células
filhas idênticas ao linfócito que reconheceu o antígeno, isto é, clones. A
produção de mais clones é chamada de expansão clonal.

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Imunobiologia UAB/Unimontes

Juntamente com esta hipótese, outras observações de como o


sistema imune é capaz de responder a vários antígenos foram acrescentadas
à imunologia.
A tecnologia e o acúmulo de conhecimento na imunologia e em
outras áreas permitiram que nas décadas de 1980 e 1990 fosse descrito
como as células são capazes de perceber sinais extracelulares através de vias
de sinalização bastante específicas, principalmente pelos linfócitos. Foram
descritas inúmeras moléculas e mecanismos de como as células do sistema
imune comunicam entre si e com outras células, como elas sobrevivem ou
morrem e como o sistema imune opera em um ponto de vista molecular.
Nos últimos anos, a imunologia começou a focalizar menos os
mecanismos moleculares e mais o universo imunológico como um todo.
Perguntas de como poderíamos manipular a intensidade ou o tipo de
resposta contra determinados patógenos começaram a ser vasculhadas e
várias perguntas permanecem sem respostas.
A imunologia é uma disciplina basicamente experimental, ou seja,
grande parte de nosso conhecimento foi gerado através da experimentação
em laboratórios de pesquisa, determinando causas e efeitos. É uma área de
estudo que surgiu e cresceu durante muito tempo como uma subárea da
medicina. Seu início se baseou em problemas na área médica, tais como
resistência a doenças, transplantação e transfusão sanguínea. Contudo, isso
vem se modificando cada vez mais com estudos evolutivos e comparativos.

1.2 Propriedades gerais da Resposta Imune

O sistema imunológico é formado por células e moléculas Como o pensamento da


responsáveis pela resposta imunológica (ou imune), que é a maneira sociedade influencia a
pesquisa? Como a ética e
conjunta e coordenada destas contra um determinado agente estranho. as linhas filosóficas de um
Este agente pode ser um microorganismo infeccioso (como um vírus), ou determinado momento podem
influenciar o desenvolvimento
também ser uma macromolécula (como proteínas ou polissacarídeos). A da ciência?
defesa contra estes agentes é realizada pela resposta da imunidade inata ou
natural e pela resposta da imunidade adquirida ou adaptativa (Tabela 01).
Os compostos reconhecidos pelo sistema imunológico capazes de induzir
uma resposta são chamados de “antígenos”.
A “imunidade natural” ou “inata” consiste na defesa presente
desde o nascimento do indivíduo e programada para iniciar de maneira
rápida uma resposta, tentando bloquear a infecção. Sua resposta é
imediata e basicamente a mesma após sucessivas infecções. Os principais
componentes são: a) barreiras físicas (pele, mucosas); b) barreiras químicas
(antibióticos naturais) presentes nas superfícies epiteliais; c) fagócitos
(macrófagos e neutrófilos) e células NK (Natural Killers, do inglês “assassinas
naturais”); d) proteínas do plasma e moléculas do sistema do complemento.

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Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

A “imunidade adquirida” ou “adaptativa” é assim chamada por


que é estimulada apenas após o contato com o agente infeccioso e sua
eficiência vai melhorando, ou adaptando, com as sucessivas infecções. É
composta por linfócitos e seus produtos (como os anticorpos) e são capazes
de reconhecer uma infinidade de compostos, bem como distingui-los.
Enquanto os componentes na imunidade inata estão sempre prontos para
agir como sentinelas, os componentes da imunidade adquirida precisam ser
ativados, e o são apenas após a entrada do agente. Sua ativação geralmente
é dependente de células apresentadoras de antígenos (APCs, do inglês
Antigen Presenting Cells), que são muitas vezes células da imunidade inata,
auxiliando na ativação dos linfócitos específicos para o antígeno.

Fonte: Adaptado de Abbas, A. K., Litchman, A. H., Pillai, S. Imunologia Celular e Molecu-
lar. 6a Edição. Editora Saunders Elsevier (2008)

A imunidade adquirida possui mecanismos diferentes para


combater os diferentes antígenos que podem entrar no corpo. Estes
mecanismos podem ser divididos em dois tipos: a “imunidade humoral” e
a “imunidade celular”.
O termo imunidade humoral é uma referência a teorias médicas
desde o tempo de Hipócrates, onde se acreditava que o equilíbrio do corpo
era mantido por fluidos corporais denominados “humores”. A imunidade
humoral é mediada por moléculas produzidas por linfócitos B chamadas
“anticorpos” presentes no sangue e nas secreções. Os anticorpos possuem
diversas funções, se ligando a antígenos, auxiliando em sua eliminação ou
neutralizando-os. Por estarem presentes na circulação e em alguns tecidos,
os antígenos que eles reconhecem são microrganismos extracelulares ou
toxinas.

16
Imunobiologia UAB/Unimontes

A imunidade celular é mediada por linfócitos T (ou células T) e é a


principal resposta contra patógenos como vírus e bactérias que sobrevivem
e proliferam no interior das células. Estes microorganismos intracelulares
estão inacessíveis à ação dos anticorpos. Os linfócitos T estimulam os
fagócitos a eliminar os microorganismos ingeridos, bem como eliminar
células infectadas ou tumorais.
A imunidade adaptativa pode ser induzida em um indivíduo
por duas maneiras: pela exposição ao antígeno ou pela transferência
de anticorpos ou linfócitos antígenos-específicos. A “imunidade ativa”
ocorre quando há a exposição a antígenos estranhos. Esta exposição gera
uma resposta no organismo do indivíduo, ativando linfócitos específicos
contra aqueles antígenos. Os linfócitos que ainda não foram ativados são
chamados de naïve ou virgens e quando são ativados são chamados de
linfócitos efetores. Estes linfócitos efetores são assim chamados porque
efetuam a resposta imunológica e geram uma proteção posterior para o
indivíduo, tornando-o imune contra aquele antígeno. Um exemplo natural
da imunidade ativa é a infecção de microorganismos, enquanto que um
exemplo induzido é a vacinação.
Outra forma de gerar imunidade é através da “imunidade passiva”,
onde ocorre a transferência de anticorpos ou linfócitos contra antígenos
estranhos. Para tal finalidade, o plasma ou linfócitos de um indivíduo
previamente imunizado é transferido para um indivíduo não imunizado
(recipiente), processo chamado de transferência adotiva. O indivíduo não
entra em contato com o antígeno nem produz uma resposta imune, sendo
então uma forma rápida do indivíduo se tornar protegido. Um exemplo de
como isto ocorre naturalmente é através do leite materno, que transfere
anticorpos e células para o recém-nascido. O soro antiofídico também é
um exemplo de imunidade passiva, pois ele é constituído de anticorpos
contra o veneno da cobra que mordeu o indivíduo.
Uma diferença essencial entre as imunidades ativa e passiva é que
a ativa é duradoura, enquanto a passiva é efêmera. Esta ação duradoura
da imunidade ativa se deve à ativação do sistema imune do indivíduo,
gerando linfócitos de memória que possibilitam “lembrar” e melhorar a
resposta imune a cada novo contato com aquele antígeno. Isto não ocorre
na imunidade passiva, pois a resposta já vem “pronta”, sem gerar as células
de memória no indivíduo.
Um esquema representativo das diferentes classificações da
imunidade está esquematizado na FIG. 03.

17
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 03: Principais classificações da imunidade.


Fonte: DaMata, JP, 2010

1.3 Características chaveS da Resposta Imunológica Ad-


quirida

Tanto a resposta humoral quanto a resposta celular possuem


características cruciais que permitem sua eficiência na resposta adquirida.
Estas características são consequências das propriedades de funcionamento
dos linfócitos (Tabela 02). Algumas destas características são compartilhadas
pela imunidade inata e serão discutidas mais adiante. Quando há falhas em
pelo menos uma destas características, há um desequilíbrio na resposta,
podendo gerar doenças no indivíduo.
A primeira característica é a “especificidade” da resposta adquirida,
que se dá pelo fato dos linfócitos responderem contra antígenos específicos,
pois são capazes de distinguir diferenças extremamente pequenas entre os
antígenos. Estas partes do antígeno que são reconhecidas pelos linfócitos são
denominadas “epitopos” ou “determinantes”. Os antígenos reconhecidos
podem ser qualquer tipo de macromolécula, seja ela proteína, carboidrato,
lipídio, etc., e cada antígeno é capaz de gerar uma resposta também
específica do linfócito.
Para reconhecer o antígeno, o linfócito tem receptores que se
encaixam nos epitopos específicos. Cada receptor reconhece um único
epitopo e cada linfócito só possui um tipo de receptor. Isto quer dizer que
mesmo tendo milhares de receptores contra antígenos em cada linfócito,
todos são específicos para um tipo de antígeno. Esse conceito gerou a
teoria clonal.
Como cada linfócito é específico para apenas um antígeno, cada
indivíduo teria um número muito grande de linfócitos diferentes, isto é,
uma alta “diversidade”. O número total de linfócitos específicos de um
indivíduo é denominado “repertório de linfócitos”, no qual é estimado que
varie em torno de 107 a 109 linfócitos diferentes nos seres humanos.
Com esta alta diversidade, como o corpo é capaz de não gerar
uma resposta imunológica contra si? Isto se deve à “tolerância”, outra
característica fundamental da resposta imune. O sistema imune é capaz

18
Imunobiologia UAB/Unimontes

de distinguir entre antígenos “próprios”, isto é, comum no indivíduo,


dos “não próprios”, que não são encontrados normalmente, como de
um microorganismo patogênico. Esta tolerância é mantida por vários
mecanismos diferentes e tem sido o foco de vários estudos. Quando
esta tolerância falha, geralmente o resultado é o surgimento de “doenças
autoimunes”.
Após a ativação do linfócito, ele passa por uma “expansão clonal”.
Esta expansão é uma grande proliferação da célula ativada, gerando
várias células, ou clones, que reconhecem o mesmo antígeno. Com esta
proliferação há um número de linfócitos apropriado para eliminar o
antígeno. Já mencionamos que a resposta imune é capaz de responder de
maneira específica para um determinado antígeno. Os mecanismos efetores
são específicos para microorganismos intra e extracelulares, tornando sua
eliminação mais eficiente. Esta característica, a “especialização”, pode ser
tanto no que diz resposta humoral e celular, quanto na especificidade do
reconhecimento.
Após a eliminação do antígeno, os linfócitos se tornam
desnecessários e também precisam ser eliminados. Essa eliminação
levaria o sistema imune de volta à homeostasia, ou estado de equilíbrio.
A eliminação destas células “sobressalentes” é um processo continuo da
resposta imune, uma característica importante da resposta adquirida, e se
chama “autorregulação” ou “autolimitação”. Sem o estímulo da presença
do antígeno, as células morrem por apoptose, uma forma de morte celular
programada. Junto com esse declínio da resposta imune há o início da
reconstituição do tecido, também chamada cicatrização.
A exposição ao antígeno é capaz de aumentar a habilidade de
resposta do sistema imune a cada contato. A primeira exposição ao antígeno
gera a resposta primária, que após a eliminação do antígeno permanecem
linfócitos de “memória”. Estes linfócitos permitirão uma resposta mais
rápida e eficiente na próxima exposição ao antígeno. Cada vez que há
uma exposição, a resposta é melhorada. Estes contatos subsequentes com
os antígenos geram respostas secundárias.

19
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Fonte: Adaptado de Abbas, A. K., Litchman, A. H., Pillai, S. Imunologia Celular e Mole-
cular. 6a Edição. Editora Saunders Elsevier (2008)

Cada uma das características citadas acima está correlacionada


uma com a outra e com o bom desempenho da resposta adquirida. Sem
a memória e especificidade, por exemplo, a resposta contra infecções
repetidas seria prejudicada, pois com essas características o sistema
imunológico “aprende” como combater um antígeno específico.
Com esta primeira parte do caderno já podemos começar a
entender como funciona o sistema imunológico para ajudar a combater
agentes estranhos que entram no organismo.

ABBAS, A. K.; LITCHMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e


Molecular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

JANEWAY, C. A.; TRAVERS, P.; WALPORT, M.; SHLOMCHIK, M.


Imunobiologia. O sistema imune na saúde e na doença. 5. ed. Porto
Alegre: Editora Artmed, 2002.

20
UNIDADE 2
ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA IMUNOLÓGICO

As células do sistema imunológico estão normalmente circulando


nos vasos sanguíneos e linfáticos, nos tecidos e em órgãos linfoides. A
circulação das células do sistema imune em virtualmente todo o corpo
é de maneira organizada e estruturada e essencial para uma resposta
eficiente, pois uma infecção é possível de ocorrer em qualquer local
do organismo. Os componentes do sistema imunológico muitas vezes
trabalham em conjunto, proporcionando uma resposta mais eficiente. As
células e moléculas do sistema imunológico muitas vezes exercem funções
redundantes (várias células ou moléculas realizam a mesma função) e/ou
pleiotrópicas (uma única célula ou molécula realiza várias funções).

2.1 Células do Sistema Imunológico

Podemos dividir as células sanguíneas em dois grandes grupos,


que aprendemos ainda na escola, - os glóbulos brancos ou leucócitos, e os
glóbulos vermelhos ou eritrócitos. Os eritrócitos também são conhecidos
como hemácias e constituem a maioria das células do sangue. Os
leucócitos são as células do sistema imunológico que se encontram na
circulação sanguínea, e são divididos em vários tipos de células. Além de
encontradas no sangue, as células do sistema imune são encontradas em
praticamente todas as partes do corpo, pois antígenos estranhos podem
estar em qualquer lugar do organismo.
Todas as células do sistema imunológico, juntamente com as
hemácias e plaquetas, são formadas na medula óssea em um processo
chamado “hematopoese” (Figura 01). Este processo ocorre a partir de células
tronco que se dividem e se diferenciam nas diversas células sanguíneas e
plaquetas. Este processo ocorre durante toda a vida do indivíduo, uma vez
que é necessário repor constantemente várias células circulantes, como
hemácias e neutrófilos.

21
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 04: Hematopoese (formação das células sanguíneas).


Adaptado de imagem disponível em: http://en.wikipedia.org/wiki/
File:Hematopoiesis_simple.svg Acesso 23/08/2010

Analisaremos agora as principais células da imunidade inata:


• A. Macrófagos ou fagócitos mononucleares: encontrados em praticamente
todos os tecidos e órgãos, são responsáveis pela identificação, fagocitose
e destruição de microorganismos e macromoléculas. Assim como todas
as células do sistema imune, produz citocinas para interagirem entre si,
gerando uma resposta estruturada. Ao sair da medula óssea e caírem
na circulação, as células ainda não estão completamente diferenciadas
e são chamadas de “monócitos” (Figura 02). Estas células possuem um
núcleo em forma de feijão com citoplasma granuloso, devido à grande
quantidade de lisossomos e vacúolos fagocíticos. Os macrófagos podem
apresentar diversas formas e nomes, de acordo com o contato com
microorganismos ou com o local em que se encontram. Exemplos disso
são as células de Küpffer, presentes no fígado, as micróglias, presentes no
sistema nervoso central, e os osteoclastos (macrófagos multinucleados),
presentes nos ossos.
Células chamadas hemócitos com funções semelhantes às do
macrófago são encontradas em insetos, fazendo com que os imunologistas
considerem os macrófagos as células da imunidade inata mais
filogeneticamente antigas.

22
Imunobiologia UAB/Unimontes

Figura 05: Micrografias ópticas de esfregaços sanguíneo mostrando a morfologia do A)


macrófago e do B) neutrófilo.
Fonte: Modificado de http://commons.wikimedia.org/ Acesso 24/08/2010

• Neutrófilos ou leucócitos polimorfonucleares (PMNs): também


são fagócitos, isto é, também reconhecem, englobam e destroem
microorganismos e macromoléculas. É a população de leucócitos
mais abundante na circulação sanguínea. São chamados de
polimorfonucleares justamente por apresentarem diversas formas de
núcleos, segmentados em três a cinco lóbulos (Figura 02). Às vezes
pode parecer que a célula possui mais de um núcleo, mas os lóbulos
são conectados. É considerado um tipo de granulócito pela riqueza de
grânulos em seu citoplasma. Há dois tipos de grânulos nestas células,
chamados de específicos e azurofílicos. A maioria consiste no primeiro
tipo e são ricos em enzimas como lisozima, elastase e colagenase.
Estes grânulos não se coram nem com corantes ácidos, nem com
corantes básicos, sendo então responsáveis pelo nome neutrófilo. O
segundo tipo de grânulo são lisossomos, ricos em enzimas e substâncias
microbicidas, tais como defensinas e catelicidinas. Os PMNs são as
primeiras células a chegarem ao sítio de infecção, poucas horas após
a entrada do microorganismo, tentando eliminar o antígeno até a
chegada dos macrófagos, dois a três dias depois. Possuem uma meia
vida extremamente curta, cerca de 6 a 18 horas. Se as células não
forem recrutadas para um local de inflamação dentro deste período,
elas são eliminadas por apoptose. Por causa desta curta meia vida, a sua
produção é extremamente alta. Estima-se que um ser humano adulto
produza cerca de 1011 neutrófilos por dia.

• Células dendríticas: encontradas nos tecidos linfoides, epitélio mucoso


e parênquima dos órgãos, são células extremamente importantes na
ativação da imunidade adquirida durante a resposta imunológica
primária. Possuem projeções semelhantes aos dendritos das células
nervosas, que lhes conferem seu nome (Figura 03). Estas projeções
aumentam a superfície celular, aumentando sua capacidade de

23
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

alcançar e interiorizar antígenos que se encontram nos locais citados.


Após interiorizar os microorganismos ou macromoléculas, as células
dendríticas recolhem estas projeções e caem na circulação para
apresentar o antígeno aos linfócitos. As células dendríticas encontradas
nos tecidos são chamadas de células de Langerhans e após entrarem
na circulação sanguínea passam por um processo de maturação até
alcançarem os linfócitos.

Figura 06: Micrografia óptica mostrando a morfologia de uma


célula de Langerhans, célula dendrítica encontrada no tecido
epitelial.
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Dendritic_cell.JPG
Acesso 21/08/2010. Autores: Judith Behnsen, Priyanka Narang,
Mike Hasenberg, Frank Gunzer, Ursula Bilitewski, Nina Klippel,
Manfred Rohde, Matthias Brock, Axel A. Brakhage, Matthias
Gunzer.

• Basófilos e mastócitos: assim como os neutrófilos, são chamados de


granulócitos pela grande quantidade de grânulos no citoplasma. Ambos
são importantes na resposta alérgica e contra infecções extracelulares
como vermes, liberando o conteúdo de seus grânulos no meio
extracelular. Esta liberação do conteúdo dos grânulos é um processo
denominado degranulação. Os grânulos possuem várias enzimas e
componentes microbicidas, além de histamina e outros compostos.
Os basófilos são encontrados na circulação (Figura 04), enquanto os
mastócitos são encontrados nos tecidos.

24
Imunobiologia UAB/Unimontes

A eosinofilia, ou alto número


de eosinófilos, geralmente
está associada a alergias e
parasitoses, asma, algumas
doenças autoimune, eczema
ou leucemia. Ao mesmo
tempo, quando há baixas
taxas da mesma célula, pode
ser devido à intoxicação por
álcool ou excesso de certos
esteróides no corpo (como
cortisol). Como a contagem
Figura 07: Micrografias ópticas de esfregaços sanguíneo mostrando um basófil o.(A) e de outros leucócitos pode
um eosinófilo (B). indicar doenças nos exames de
Fonte: http://commons.wikimedia.org/ Acesso dia 21/08/2010 sangue? Quais são as principais
doenças que os médicos
procuram com cada célula?
• Eosinófilos: sabemos que são células de extrema importância contra
parasitoses (verminoses) e tumores, pois são capazes de eliminar estes
alvos por um processo chamado citotoxicidade celular dependente de
anticorpos (ADCC), que estudaremos mais adiante. Além de importante
contra parasitoses, esta célula também está fortemente relacionada com
a fase tardia da resposta alérgica, sendo um importante componente na
asma alérgica. Os eosinófilos são granulócitos cujos grânulos possuem
proteínas com pH muito básico, tornando-as tóxicas. O pH alto destas
proteínas faz com que os grânulos tenham alta afinidade com corantes
ácidos, como a eosina Y, que deu nome a esta célula (Figura 04).

As células da imunidade adquirida são os “linfócitos”, classificados


de acordo com a função, grau de ativação e local de maturação, as células
apresentadoras de antígenos (APCs) e as células efetoras. Os linfócitos
(Figura 05) reconhecem e respondem de maneira específica contra
antígenos estranhos, gerando uma resposta humoral ou celular. Quando o
linfócito ainda não foi ativado por um antígeno ele é chamado de linfócito
“virgem” ou “naïve”. Ao encontrar com um antígeno e ser ativado, ele
passa por modificações na expressão gênica e se torna um “linfócito
efetor”, capaz de responder e eliminar um antígeno. Existem diversas
populações e subpopulações de linfócitos, cada uma com características e
funções próprias. Apesar da diversidade de funções, elas raramente podem
ser distinguidas morfologicamente, pois suas características particulares
geralmente são apenas no nível molecular. Das populações, apenas o
“linfócito B” é capaz de produzir e secretar anticorpos, sendo assim o
responsável pela imunidade humoral. Linfócitos B que reconheceram
antígenos e secretam anticorpos passam a ser chamados de “plasmócitos”.
Sua resposta é eficiente contra antígenos extracelulares, onde os anticorpos
são capazes de ligar e gerar uma resposta apropriada. Os “linfócitos T” são

25
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

responsáveis pela imunidade celular, reconhecendo e respondendo contra


antígenos intracelulares. Seus receptores de reconhecimento são restritos a
antígenos proteicos carregados por receptores das “células apresentadoras
de antígenos” (APC, do inglês antigen presenting cell). Apenas através das
APCs os linfócitos são capazes de enxergar o antígeno e responder contra
ele. Estas células podem ser uma célula da imunidade inata, ou qualquer
célula infectada ou tumoral. Há diversas subpopulações ou classes de
linfócitos T, mas as melhores descritas são dos linfócitos helpers ou auxiliares
(TH), e dos linfócitos citolíticos ou citotóxicos (CTLs).

Figura 08: Linfócito observado em micrografia


óptica de esfregaço sanguíneo.
Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/
File:Lymphocyte2.jpg Acesso 21/08/2010

Os “linfócitos T helpers” ou “auxiliares” (TH) são responsáveis


por coordenar a resposta imunológica, secretando moléculas peptídicas
chamadas de “citocinas”. Estas citocinas são uma forma de comunicação
das células do sistema imunológico e serão abordadas adiante com mais
detalhes. Os TH produzem citocinas capazes de melhorar a resposta da
imunidade inata e modificar a resposta adquirida (Figura 06) de acordo
com o tipo de antígeno.
Os “linfócitos citotóxicos” ou “citolíticos” (CTL, do inglês “cytolytic
lymphocytes”) são assim designados porque liberam substâncias tóxicas
para outras células, eliminando-as através da apoptose ou lise celular
(Figura 06). São eficientes principalmente contra células infectadas por
vírus e tumorais. Ao eliminar estas células, o linfócito está limitando a
proliferação de mais células perigosas.
Como os linfócitos são indistinguíveis morfologicamente, a maneira
encontrada para caracterizar os linfócitos foi através da marcação molecular.
Foram encontradas moléculas na membrana celular que são expressas
especificamente em cada população de células do sistema imunológico.
A molécula encontrada em linfócitos T auxiliares é a CD4 (CD, do inglês

26
Imunobiologia UAB/Unimontes

cluster of differentiation, ou aglomerados de diferenciação), enquanto


que a molécula presente preferencialmente em linfócitos citotóxicos é a
CD8. Com isso, também podemos definir os linfócitos T auxiliares como
linfócitos T CD4+ e os linfócitos T citotóxicos como T CD8+. Já foram
descritas várias outras moléculas que também foram designadas como CD.
Essas moléculas possuem funções diversas, e essa nomenclatura determina
apenas que são encontradas na membrana celular. Outros exemplos dessa
nomenclatura são: CD95, presentes em diversos tipos de células, se liga
a um receptor induzindo a morte por apoptose da célula alvo; e CD11b,
presentes principalmente em monócitos/macrófagos e granulócitos,
são receptores que auxiliam na fagocitose e na adesão destas células no
endotélio durante a migração.
As “células NK” (NK, do inglês natural killers) são consideradas
células da imunidade inata, mas são originadas pela mesma progenitora
dos linfócitos B e T. Sua função é bem similar à dos CTLs, mas como não
precisa ser ativada como os linfócitos, é considerada um componente da
imunidade inata. Está sempre pronta para eliminar células infectadas, assim
como os CTLs (Figura 06). Sua morfologia também é bastante similar à dos
linfócitos, não sendo distinguíveis morfologicamente.
Entre as populações de linfócitos T que ainda não estão
completamente descritas, podemos ressaltar as “T reguladoras” (Treg)
e os “linfócitos Tγδ”. A primeira população produz citocinas inibitórias,
isto é, que inibem a resposta imune, e são capazes de eliminar células da
imunidade por apoptose (Figura 06). Com estas características, as células
Treg são consideradas importantes na tolerância imunológica. Os linfócitos
Tγδ possuem este nome por causa dos receptores para antígenos que eles
possuem. Eles são encontrados principalmente na região intraepitelial,
sendo assim importantes nas respostas imunológicas neste local. Sua função
ainda não é totalmente esclarecida, mas sabe-se que é capaz de secretar
algumas citocinas e lisar células-alvo. Estas duas populações de linfócitos
serão abordadas com mais detalhes adiante.

27
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

O linfócito B é assim chamado


porque foi identificado pela
primeira vez na bursa de
Fabricius, órgão linfóide
encontrado nas aves,
localizado perto da cloaca.

Figura 09: Diferentes populações (classes) de linfócitos e suas principais funções.


A) Linfócito B reconhece antígenos solúveis e é responsável pela produção de
anticorpos, que forma a imunidade humoral. B) Linfócito T auxiliar (TH) reconhece
antígenos presentes na superfície das APCs e secretam citocinas que coordenam a
resposta imunológica. C) Linfócitos T citotóxicos (CTLs) reconhecem antígenos na
superfície de células infectadas, eliminando-as. D) Linfócitos T reguladores (Treg)
inibem a resposta imunológica contra, por exemplo, antígenos próprios. E) Células
natural killers (NK) são classificadas como células da imunidade inata e reconhecem
as células-alvo, eliminando-as de maneira semelhante aos CTLs. Fonte: DaMata, JP
& de Oliveira, LS, 2010

2.2 Órgãos Linfoides

Os órgãos linfoides são tecidos organizados que possuem grande


quantidade de linfócitos em um ambiente de células não-linfoides. A
interação dos linfócitos com as células não-linfoides nesses órgãos é
importante em vários aspectos da resposta imunológica. Podem ser divididos
em órgãos linfoides “primários” ou “geradores”, ou ainda, “centrais”, onde
há a produção e maturação dos linfócitos, e órgãos linfoides “secundários”
ou “periféricos”, onde se inicia a resposta adaptativa e onde os linfócitos
são mantidos.

2.2.1 Órgãos Linfoides Primários ou Centrais

Os órgãos linfoides primários são a medula óssea e o timo.


A medula óssea é a região com aspecto esponjoso presente no interior
dos ossos, popularmente conhecida como tutano. É o local onde ocorre
a hematopoese (Figura 01) e nos adultos está presente dentro de ossos
chatos, como os ossos ilíacos, costelas, vértebras e esterno. Como todas
as células sanguíneas, tanto os linfócitos B quanto os linfócito T surgem na

28
Imunobiologia UAB/Unimontes

medula óssea, mas os linfócitos T não terminam o processo de maturação


lá. Em um determinado passo de sua maturação, o linfócito T se dirige para
o timo, onde termina o processo.
Descubra como a linfa
O timo é um órgão capsular bilobado de coloração esbranquiçada é formada e qual a sua
e aspecto lustroso presente no mediastino anterior (Figura 07), acima importância para o bom
funcionamento do corpo.
do coração. Os linfócitos presentes no timo são chamados de timócitos
e apresentam diversos estágios de maturação. As células chegam pela
região do córtex do timo e à medida que se dirigem para a medula vão
completando o processo onde, por fim, saem para a circulação. O timo
se encontra mais ativo na infância, quando há uma produção maior de
linfócitos. Após a puberdade este órgão vai atrofiando, ficando com um
aspecto mais amarelado e pálido devido à substituição de tecido funcional
por tecido adiposo.

Figura 10: Morfologia (A) e localização (B) do timo no corpo humano.


Adaptação de figuras disponíveis em: http://commons.wikimedia.org/ Acesso:
21/08/2010

2.2.2 Orgãos Linfoides Secundários ou Periféricos

Ao terminarem seu processo de maturação, tanto o linfócito


T quanto o B entram na circulação sanguínea, migrando para os órgãos
linfoides periféricos. Os órgãos linfoides periféricos são responsáveis por
filtrar a linfa e o sangue, capturando antígenos, além de ser o local em que
as APCs apresentam os antígenos para os linfócitos, iniciando a resposta
adaptativa.
A linfa é derivada do líquido extracelular (líquido intersticial)
drenado por inúmeros capilares linfáticos presentes na pele, epitélios e

29
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

órgãos parenquimatosos (Figura 08). Estes capilares vão se convergindo


em vasos cada vez maiores que, por fim, formam o ducto torácico que é
esvaziado na veia cava superior, misturando a linfa ao sangue (Figura 09C).
Quando a drenagem da linfa não funciona corretamente, rapidamente
são formados edemas nos locais. Ao longo de todo o sistema linfático, há
“linfonodos”, que são os órgãos linfoides responsáveis por filtrar a linfa.
Os linfonodos são pequenos órgãos nodulares, podendo variar de poucos
milímetros a poucos centímetros de diâmetro.

Figura 11: Capilares linfáticos no espaço intersticial. Capilares linfáticos (em verde) pos-
suem circulação aberta, enquanto as artérias (vermelho) e veias (azul) são conectadas
pelos capilares. Autor: SEER, EUA.
Fonte: Adaptado de http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Illu_lymph_capillary.png
Acesso 21/08/2010

A linfa entra no linfonodo por vasos linfáticos aferentes e se dirige


para a região do córtex. A parte mais externa do córtex contém aglomera-
dos de células chamados folículos primários. No centro de alguns folículos
pode ser encontrado o centro germinativo, que se apresenta mais claro em
colorações histológicas (Figuras 09A e B). Quando o centro germinativo
está presente, o folículo passa a ser definido como folículo secundário. Ao
redor dos folículos está o paracórtex ou córtex parafolicular, organizado
como espaços chamados cordões ricos em células dendríticas, fagócitos
mononucleares, linfócitos e fibras reticulares. A região mais interna do lin-
fonodo é a medula, que também é uma estrutura fibrosa, rica em macró-
fagos e plasmócitos. Da medula saem os vasos eferentes, por onde a linfa
sai do linfonodo.
As diferentes regiões nos linfonodos segregam as diferentes classes
de linfócitos. O folículo é a zona de células B. Os folículos primários contêm
linfócitos B virgens, isto é, que ainda não encontraram antígenos e foram
ativados. Os centros germinativos dos folículos secundários são locais onde
os linfócitos B foram ativados e estão passando pelo processo de expansão
clonal, isto é, proliferação celular. Os linfócitos T são encontrados na
região do paracórtex, onde a grande maioria é composta por linfócitos T
helper. Essa segregação é importante para organizar a ativação da resposta
adquirida. Os fagócitos e as células dendríticas presentes no linfonodo

30
Imunobiologia UAB/Unimontes

capturam o antígeno para apresentar aos linfócitos T. Os linfócitos B são


capazes de reconhecer antígenos solúveis, isto é, não precisam de APCs.
Esta organização do órgão linfóide pode facilitar o reconhecimento do
antígeno pelos linfócitos.

Figura 12: Desenho esquemático da morfologia do linfonodo. (A). Micrografia óptica


de um linfonodo ilustrando suas regiões principais (B). Distribuição dos principais vasos
linfáticos e linfonodos na região torácica (C).
Adaptação de imagens disponíveis em: http://commons.wikimedia.org Acesso 21/08/2010

O órgão responsável por filtrar o sangue é o baço (Figura 10),


alojado no lado esquerdo do abdômen, atrás do estômago. A artéria
esplênica perfura o órgão subdividindo-se em arteríolas e, por fim, em
capilares. É divido em duas grandes regiões: a polpa vermelha e a polpa
branca. Na polpa vermelha, a maior região, ocorre a filtração do sangue,
onde macrófagos e células dendríticas são responsáveis por eliminar
hemácias velhas e células danificadas. A polpa branca é rica em linfócitos
e é organizada em torno das ramificações das arteríolas. Sua organização é
semelhante à do linfonodo, onde a região mais interna é rica em linfócitos T
e chamada de bainha linfóide periarteriolar (PALS, do inglês periartheriolar
lymphoid sheath). Ao redor desta camada encontram-se as regiões ricas em
linfócitos B, ou coroa de células B, também contendo um grande número
de macrófagos especializados.

31
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 13: Localização e morfologia (detalhe) do baço mostrando as regiões da polpa


branca e polpa vermelha. Autor: SEER, EUA.
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Illu_spleen.jpg Acesso 21/08/2010

O tecido epitelial das mucosas também possui aglomerados de


linfócitos e APCs em estruturas organizadas semelhantes a linfonodos
denominados “tecidos linfoides associados às mucosas” (MALT, do inglês
mucosal-associated lymphoid tissue). As mucosas entram constantemente
em contato com microrganismos e macromoléculas estranhas, pois, como
a pele, é a barreira entre o meio externo e interno. O tecido linfóide
encontrado na mucosa gastrointestinal é denominado “GALT” (GALT, do
inglês gut-associated lymphoid tissue) e ocorre nas tonsilas, adenóides e
no apêndice cecal, mas os melhores descritos e mais organizados são as
“Placas de Peyer” presentes ao longo da mucosa intestinal. A maior parte
do que se sabe a respeito do GALT veio de estudos da mucosa intestinal,
mas acredita-se que as características dos tecidos linfoides sejam muito
semelhantes na mucosa digestiva e respiratória, onde é chamado de “BALT”
(BALT, do inglês bronchial-associated lymphoid tissue).
As placas de Peyer coletam antígenos presentes na superfície
epitelial (lúmen) do trato gastrointestinal. Estes antígenos são capturados
pelas células M e transportados para o interior da Placa de Peyer, que
contém um folículo central repleto de linfócitos B. Ao redor deste folículo
há um número menor de linfócitos T espalhados. Lá o antígeno será
apresentado para os linfócitos, onde poderá ou não ocorrer a ativação da
resposta imune adquirida. O fato de apenas uma minoria de antígenos
que entra pelas mucosas gerar uma resposta imunológica é devido ao
fenômeno da tolerância oral, que permite que não geremos uma resposta

32
Imunobiologia UAB/Unimontes

contra o que ingerimos, respiramos e afins. Coletivamente, acredita-se que


o sistema imune de mucosa contenha metade dos linfócitos presentes em
todo o corpo, formando um grupo especial de células que seguem regras
próprias.

2.3 Circulação dos linfócitos

Os linfócitos virgens ficam circulando entre os vasos linfáticos e


sanguíneos, passando várias vezes entre os linfonodos e o baço em busca de
ativação por um antígeno. Este padrão de movimento dos linfócitos virgens
é chamado de “recirculação linfocitária” e ocorre devido a moléculas de
adesão presentes nas células endoteliais. Estas moléculas de adesão são
reconhecidas por receptores específicos presentes nos linfócitos virgens.
Os tecidos linfoides periféricos fornecem sinais de sobrevivência para os
linfócitos virgens, mantendo um número correto de linfócitos circulando.
Após a ativação do linfócito nos órgãos linfoides periféricos, ele passa pelo
processo de expansão clonal e diferenciação. O processo de diferenciação
se dá pela expressão de genes que produzem proteínas, como citocinas
e moléculas responsáveis por gerar apoptose e lise de células alvo, que
ajudarão o linfócito a eliminar o antígeno. Após esta ativação, os linfócitos
saem do órgão linfóide e se dirigem para o local em que se encontra o
antígeno. Para isto, ele conta com moléculas de adesão diferentes presentes
ao longo dos vasos sanguíneos e nos tecidos que indicam a localização.
Depois da migração, o linfócito se encontra com o antígeno e tenta
eliminá-lo, fase da resposta imune chamada de fase efetora. A eliminação
do antígeno acarreta o fim da fase efetora e o início da fase de declínio
da resposta, onde as células imunológicas que estavam participando da
resposta imune são eliminadas para o organismo voltar à homeostase, ou
equilíbrio. Se os sinais de sobrevivência dos linfócitos virgens são fornecidos
pelos linfonodos e baço, o sinal de sobrevivência do linfócito efetor é o
antígeno. Após a eliminação do antígeno, restam apenas os “linfócitos de
memória” que ficarão “guardados” por tempo indefinido, esperando por
outro contato com o mesmo tipo de antígeno. Estas células de memória
vão gerar uma reposta melhor e mais eficiente no próximo contato com
o antígeno. A resposta imune contra um antígeno pela primeira vez é
denominada “resposta primária”, enquanto que sucessivas respostas imune
contra este antígeno são chamadas de “resposta secundária”. Apenas na
resposta secundária encontramos linfócitos de memória.

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Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

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34
UNIDADE 3
Imunidade Inata ou Natural

A imunidade inata ou natural é a primeira linha de defesa do


organismo. Os mecanismos da imunidade inata atuam imediatamente após
a infecção e são seguidas pelas respostas iniciais induzidas. A imunidade
inata não é específica e não produz uma imunidade protetora duradoura.
Essa resposta é composta pelas superfícies epiteliais, tais como a pele e as
mucosas que revestem os tratos gastrointestinal, respiratório e geniturinário, PAMPs: Os Padrões
por células fagocitárias e células Natural Killer (NK). Moleculares Associados a
Patógenos são moléculas
Quando um microrganismo atravessa a barreira epitelial, ele associadas com um
começa a se multiplicar nos tecidos do hospedeiro e, de modo geral, é determinado grupo de
patógenos como, por exemplo,
rapidamente reconhecido por macrófagos residentes no tecido. A expansão o lipopolissacarídeo (LPS)
do microrganismo é frequentemente controlada pela resposta inflamatória presente na membrana de
bactérias gram-negativas que
que recruta os neutrófilos ao sítio da infecção. podem ser reconhecidas pelo
sistema imune.

3.1 Reconhecimento pelo Sistema Imune Inato

Os componentes da imunidade inata reconhecem estruturas


que são características dos patógenos. Estas estruturas são chamadas de
“Padrões Moleculares Associados a Patógenos” (PAMPs, do inglês pathogen-
associated molecular patterns) e são reconhecidos pelos “Receptores de
Reconhecimento de Padrões” (PRPs, do inglês pattern recognition receptors)
presentes na superfície de vários tipos celulares. Estes receptores possuem
um menor repertório de especificidade, pois são codificados na linhagem
germinativa diferentemente dos receptores de antígenos dos linfócitos (TCR)
que são gerados por recombinação somática dos genes. Os PAMPs em sua
grande maioria são essenciais para a sobrevivência do microorganismo.
Desta maneira, a imunidade inata é capaz de reconhecer moléculas de
microorganismos que sofrem pouca ou nenhuma modificação.
Os receptores de reconhecimento de padrão desempenham várias
funções. Alguns, ao reconhecerem os patógenos estimulam a fagocitose.
Outros guiam as células para os locais de infecção ou estão associados
a vias de sinalização intracelular que ativam a produção de moléculas
inflamatórias e microbicidas.

3.1.1 Receptores semelhantes a Toll (TLRs)

A proteína Toll foi originalmente descrita como um receptor de


Drosophila essencial ao desenvolvimento da mosca. Posteriormente foi
demonstrado que ela era também essencial para a produção de peptídeos
antimicrobianos em resposta a fungos. A descoberta de Toll na mosca-de-
fruta levou a descoberta de uma família de receptores de reconhecimento
de padrão semelhantes à Toll (TLRs, do inglês Toll like receptors).

35
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Os receptores semelhantes à Toll pertencem à superfamília de


receptores de interleucina-1. Os TLRs são proteínas transmembrânicas
constituídos por um domínio extracelular com um motivo rico em leucina
(domínio de reconhecimento) e por um domínio citoplasmático com
grande homologia com o receptor de IL-1 (IL1R). Devido a essa grande
similaridade, o domínio citoplasmático é denominado de TIR (Toll +
IL-1R) (Figura 1). Atualmente são conhecidos 11 TLRs (TLR1 a TLR 11)
em humanos os quais são diferencialmente expressos em diferentes
subconjuntos celulares e tecidos.

Figura 14: Esquema da estrutura dos TLRs. Os TLRs são proteínas transmembrânicas
formados por um domínio extracelular que tem função de reconhecimento e um
domínio citoplasmático responsável pela transdução do sinal.
Fonte: de Oliveira, LS, 2010

Os TLRs reconhecem componentes únicos de bactérias, fungos


e vírus e sinalizam e ativam respostas inflamatórias. Os ligantes que são
reconhecidos incluem lipopeptídeos (TLR2), lipopolissacarídeos (LPS) por
TLR4, flagelina (TLR5), sequências de DNA ricas em guanina e citosina
(CpG) por TLR9, produtos virais como RNA fita simples (TLR7 ou TLR8 em
humanos) e RNA fita dupla (TLR3). Os TLRs são localizados principalmente
na membrana plasmática, entretanto os TLR3, TLR7, TLR8 e TLR9 estão
localizados nas membranas de endossomos (Quadro 01).

36
Imunobiologia UAB/Unimontes

Fonte: Adaptado de Abbas, A. K., Litchman, A. H., Pillai, S. Imunologia Celular e


Molecular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

A ligação do ligante ao TLR inicia uma cascata de transdução


de sinal que leva a ativação do fator de transcrição NF-kB e aumenta a
expressão de citocinas pró-inflamatórias tais como IL-6 e o fator de necrose
Qual a importância de termos
tumoral (TNF). TLRs presentes nas membra-
nas endossômicas, ou seja, no
interior da célula?
3.1.2 Receptores semelhantes à NOD (NLRs)

Os receptores semelhantes à NOD (NLRs) são proteínas


citoplasmáticas que reconhecem moléculas microbianas ou endógenas.
São conhecidas aproximadamente 20 proteínas pertencentes
a esta família de receptores, incluindo duas principais subfamílias NOD
(abreviação em inglês de Domínio de Oligomerização de Ligação a
nucleotídeos) e NALPs (abreviação em inglês de Proteínas que contêm os
domínios NOD, LRR e pirina), o trans-ativador MHC II (CIITA) e outras
moléculas como IPAF e BIRC1 (Figura 15).

37
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 15: Esquema das estruturas de alguns membros da família dos recep-
tores semelhantes à NOD. Siglas: NOD: Domínio de Oligomerização de
Ligação a nucleotídeos; LRR: região rica em leucina, PYD: domínio pirina;
CARD: domínio de recrutamento de caspase; AD: domínio de ativação-
-transcrição.
Fonte: de Oliveira, LS, 2010

Este grupo de proteínas reconhece peptideoglicanos da parede


celular bacteriana. O NOD1 reconhece peptideoglicano presente na
parede celular de bactérias gram-negativas, enquanto o NOD2 reconhece
os peptideoglicanos tanto de bactérias gram-negativas quanto de gram-
positivas.
Sistema do complemento: é
um sistema formado por um As proteínas NOD são expressas em células epiteliais, macrófagos
conjunto de proteínas plasmá- e células dendríticas. Nas células epiteliais que são deficientes em TLRs, os
ticas que atuam no combate a
patógenos extracelulares. NODs são os principais receptores da resposta inflamatória. Nos macrófagos
e células dendríticas que expressam os TLRs, os receptores NOD trabalham
juntamente com os TLRs.
As ligações do ligante aos receptores semelhantes à NOD ativam
moléculas inflamatórias como a caspase 1, levando à ativação de IL-1
(inflamassomo) e/ou a ativação do NF-kB.

3.1.3 Receptor de manose

O receptor de manose está presente na superfície de macrófagos


e células dendríticas. Esse receptor pertence a uma família de lectinas
tipo C ligadoras de carboidratos dependente de cálcio. Ele reconhece e
liga a unidades repetidas de manose na superfície de patógenos, e essa
ligação ativa a endocitose e fagocitose do agente infeccioso via “sistema do
complemento”.
A lectina ligadora de manose (MBL, do inglês mannose binding
lectin) é uma proteína livre presente no plasma sanguíneo que reconhece
estruturas dos patógenos de forma semelhante ao receptor de manose.
Ao reconhecer estas estruturas, as MBLs formam um complexo com o
patógeno. Este complexo se liga aos fagócitos facilitando a fagocitose e
morte do patógeno. O processo de ligação de moléculas a um patógeno

38
Imunobiologia UAB/Unimontes

que facilite a sua fagocitose é chamado de “opsonização” e será discutido


mais detalhadamente na unidade seguinte.

3.1.4 Outros receptores

Os “receptores de varredura” compreendem moléculas


estruturalmente distintas. Esses receptores de varredura estão envolvidos
na endocitose mediada por receptor e reconhecem macromoléculas
carregadas negativamente como lipoproteínas de baixa densidade (LDL)
oxidadas ou acetiladas. Vários destes receptores estão também envolvidos
na fagocitose de células apoptóticas e bactérias.
Os formil peptídeos são produtos da degradação de bactérias,
já que geralmente as proteínas bacterianas iniciam com um resíduo de
metionina formilado. Esses peptídeos formilados são quimioatraentes
e induzem aderência, degranulação e produção de espécies reativas de
oxigênio nos fagócitos. Os “receptores de formil peptídeos”, os quais
reconhecem estes peptídeos, são expressos em leucócitos e macrófagos e
direcionam os leucócitos para o sítio da infecção.

3.2 Constituintes do sistema imune inato

O sistema imune inato é formado pelas barreiras epiteliais,


diversos tipos celulares e pelos produtos dessas células. A seguir temos uma
descrição mais detalhada de cada um dos componentes deste sistema que
forma a primeira linha de defesa do organismo.

3.2.1 Barreiras epiteliais

As superfícies epiteliais fornecem uma barreira física entre o meio


externo e interno. Na ausência de ferimento ou rupturas, os patógenos
atravessam a superfície epitelial, ligando-se a moléculas das superfícies
epiteliais dos órgãos internos, ou estabelecendo uma infecção pela adesão
e colonização dessas superfícies.
As superfícies epiteliais são mais que uma simples barreira
física para a entrada de patógeno. Elas também secretam substâncias
químicas microbicidas ou que inibem o crescimento microbiano. Dentre
estas substâncias podemos citar as “defensinas” que são peptídeos
antibacterianos produzidos pelas células epiteliais de superfícies mucosas
e por leucócitos que contêm grânulos, incluindo neutrófilos, células NK e
linfócitos T citotóxicos.
São conhecidas três famílias de defensinas: α (alfa), ß (beta) e ɸ
(fi). Um importante produtor de defensinas α são as “células de Paneth”
presentes no interior das criptas do intestino delgado. Essas defensinas são

39
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

também chamadas de cripticidinas e servem para limitar a quantidade


de micróbios no lúmen. O mecanismo de ação das defensinas pode ser
toxicidade direta ao patógeno ou ativação de células envolvidas na resposta
inflamatória aos micróbios. Além deste tipo de defesa, os tecidos epiteliais e
as cavidades serosas contêm, respectivamente, “linfócitos T intra-epiteliais”
e as “células B-1” (Figura 16).

Figura 16: Componentes da barreira epitelial: denfensinas,


linfócitos T intra-epitelial, células B-1 e anticorpos naturais.
Fonte: de Oliveira LS & DaMata JP, 2010

Os “linfócitos T intra-epiteliais” estão presentes na epiderme


da pele e nos epitélios das mucosas. Alguns linfócitos T intra-epiteliais
expressam a forma convencional do receptor das células T, TCR αß (alfa
beta). Entretanto, outros linfócitos T presentes no epitélio expressam o TCR
gδ (gama delta) capaz de reconhecer antígenos peptídicos e não peptídicos.
Os linfócitos T intraperitoneais atuam na defesa do hospedeiro mediante
secreção de citocinas, ativação de fagócitos e morte de células infectadas.
Os “linfócitos B-1” estão presentes na cavidade peritoneal. Muitas
células B-1 produzem IgM específicos para antígenos polissacarídicos e
lipídicos que são comuns para muitos tipos de bactérias. Estes anticorpos são
chamados de anticorpos naturais. Os “anticorpos naturais” possuem baixa
afinidade a muitos patógenos e apresentam grande reatividade cruzada.
Ainda não se sabe o que leva a produção dos anticorpos naturais, se é uma
resposta à flora bacteriana normal da superfície epitelial ou uma resposta
ao que é próprio. Entretanto, eles podem servir como um mecanismo de
defesa pré-formado contra microrganismos que conseguirem vencer as
barreiras epiteliais.
Descreva as principais
diferenças entre os linfócitos
T intraepiteliais e linfócitos 3.2.2 Fagócitos
B-1 dos linfócitos T e B que
participam da resposta imune
adquirida. As principais células efetoras da imunidade inata são as células
fagocíticas, que incluem os neutrófilos, macrófagos, células dendríticas
e mastócitos. A maioria destas células efetoras é produzida na medula

40
Imunobiologia UAB/Unimontes

óssea, circulam no sangue e, então, migram para os tecidos. As funções


dos fagócitos incluem reconhecimento, fagocitose e destruição dos
microrganismos. Além disso, os fagócitos produzem citocinas que agem
tanto na imunidade natural quanto na imunidade adquirida.
Quando um patógeno consegue atravessar a barreira epitelial,
rapidamente ele é reconhecido por células residentes no tecido, como os
macrófagos. Sinais químicos vindos do próprio patógeno ou das células
residentes atraem outros fagócitos ao local da infecção por quimiotaxia. Se
o reconhecimento do patógeno for por receptores de superfície que levam
à fagocitose (Figura 04, passo A), o patógeno é circundado pela membrana
celular e então endocitado em uma vesícula conhecida como fagossomo
(Figura 04, passo B). O fagossomo funde-se ao lisossomo formando o
fagolisossomo (Figura 04, passo C). O lisossomo é uma organela celular
cujo interior possui o pH ácido e é rico em proteínas e enzimas hidrolíticas
que promovem a degradação das partículas vindas do meio extracelular ou
de organelas intracelulares. Dentro do fagolisossomo, o patógeno é então
morto e degradado. Alguns microrganismos conseguem escapar do sistema
imune inato expressando moléculas que inibem a fusão do fagossomo com
o lisossomo.

Figura 17: Mecanismo da fagocitose. A) Ligação do patógeno a


um receptor de superfície; B) Formação do fagossomo; C) Fusão
do fagossomo com lisossomo; D) Apresentação dos antígenos
provenientes da degradação do patógeno.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata,JP, 2010

Os fagócitos podem também matar os patógenos ingeridos por


meio da produção de substâncias tóxicas ao microrganismo como peptídeos
antimicrobianos, espécies reativas de oxigênio (ROS) e óxido nítrico (NO).
Os ROS são produzidos pela NADPH oxidase localizada principalmente
na membrana do fagolisossomo em um processo chamado de “explosão
respiratória”.

41
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Os macrófagos e células dendríticas podem apresentar os antígenos


gerados pela degradação do patógeno na sua superfície celular, os quais
serão reconhecidos por outras células do sistema imune como os linfócitos
funcionando como células apresentadoras de antígenos (APCs) (Figura 4,
passo D).
Os macrófagos e leucócitos ativados pelo reconhecimento do
patógeno secretam citocinas como IL-12, TNF, IL-1 e quimiocinas que
induzem a formação de uma resposta inflamatória. A inflamação e o papel
de cada citocina serão discutidos mais adiante.

3.2.3 Células Natural Killer (NK)

As células NK são um tipo de linfócito citotóxico e derivadas a


partir de um progenitor linfóide comum. Elas participam no combate à
infecção por vírus e têm um papel importante na rejeição a tumores. São
chamadas de natural killer, pois inicialmente pensava-se que elas não
precisavam sofrer nenhuma ativação para matar as células alvo. Embora
hoje seja conhecido que essas células possuem receptores de ativação e de
inibição, o termo “natural” permanEWeceu, já que essas células circulam no
estado maduro apresentando morfologia de linfócitos citotóxicos ativados.
Devido à forte atividade citolítica e ao potencial de autorreatividade,
a atividade das células NK deve ser finamente regulada. Os sinais de
ativação para as células NK são:

• Citocinas: IL-12, IL-15, IL-2, IFN e CCL5. Essas citocinas são


liberadas após uma infecção viral e sinalizam para as NK a presença de
patógenos virais.
• Receptor Fc: assim como os macrófagos, as células NK expressam
uma molécula que é um receptor de Fc (FcR). Esse receptor se liga à porção
Fc dos anticorpos (a estrutura dos anticorpos será discutida na Unidade VI).
As células NK podem matar células que estejam marcadas com anticorpos
para a lise em um mecanismo conhecido como Citotoxicidade celular
mediada por anticorpos (ADCC) (Figura 05A).
• Receptores de ativação e inibição: as células NK expressam
receptores que, quando associados aos seus ligantes, ativam ou inibem a
atividade citolítica das NKs.

Não se - sabe exatamente como as células NK diferenciam as


células que estão infectadas das que não estão infectadas. Parece que os
receptores de inibição reconhecem o MHC classe I e, de acordo com o
nível de expressão das moléculas de MHC classe I, a célula é marcada ou
não para a morte. As células NK matariam as células que apresentassem
baixo nível de expressão do MHC classe I (Figura 18B).

42
Imunobiologia UAB/Unimontes

Figura 18: Quando a célula NK reconhece uma célula marcada com antígeno (A)
ou por meio do MHC classe I (B) ela libera granzimas e perforinas que causarão a
morte da célula alvo.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

Os receptores das células NK podem ser classificados de acordo


com a sua função. Os receptores da citotoxicidade natural induzem a
apoptose após a ligação de ligantes que indicam uma célula infectada. Os
receptores dependentes de MHC usam uma via alternativa para induzir a
apoptose das células infectadas.
O mecanismo de morte utilizado pelas NK é a liberação de
grânulos citoplasmáticos chamados de perforinas ou granzimas que causam
a lise celular ou a apoptose das células alvo (Figura 05).
As perforinas formam poros na membrana das células alvo criando
um canal no qual as granzimas e outras moléculas entram, induzindo a
apoptose ou a lise osmótica da célula. Apoptose: é um tipo de morte
As células NK estimuladas com IL-12 e TNF são produtoras de celular programada onde uma
via de sinalização é ativada na
IFN-γ, que atua no controle da infecção antes da chegada das células T célula, levando a um programa
CD8 citotóxicas e influencia na ativação das células T CD4 , diferenciando- interno de morte.

-as em Th1. O papel dos linfócitos T CD4 Th1 será discutido em outras
unidades. Além disso, o IFN-γ induz o aumento da expressão de moléculas
do MHC classe I, o que ajudaria as células não infectadas a se protegerem
da ação das células NK.
Como podemos perceber, a imunidade inata utiliza uma varieda-
de de mecanismos efetores para combater uma infecção. Somente se os Diferencie a morte celular por
agentes infecciosos conseguirem escapar desta primeira linha de defesa apoptose e por lise osmótica.

é que se iniciará a resposta imune adaptativa, com a geração de células


antígeno-específicas e células de memória. Nas unidades seguintes serão
descritos com mais detalhes a inflamação e o sistema do complemento,
que também fazem parte do sistema imune inato.

43
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

ABBAS, A. K.; LITCHMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e


Molecular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

44
UNIDADE 4
Sistema do Complemento

O sistema do complemento é uma parte importante da imunidade


inata e ajuda também na resposta dos anticorpos na limpeza dos patógenos.
O termo complemento foi dado para denominar um componente
termolábel do sangue que “complementava” a atividade das células do
sistema imune. As funções do sistema do complemento são opsonização,
quimiotaxia e lise das células estranhas.
As proteínas que constituem o sistema do complemento são
sintetizadas principalmente no fígado. Apenas uma pequena quantidade
é produzida por macrófagos residentes nos tecidos, monócitos sanguíneos Opsonização: é o processo
e células epiteliais. no qual algumas moléculas,
conhecidas como opsoninas,
O sistema do complemento é composto por mais de 35 proteínas, alteram a superfície de um
incluindo proteínas circulantes no sangue e alguns receptores e reguladores patógeno ou outra célula de
modo a facilitar a fagocitose
ligados à membrana para interação com vários mediadores imunes. Essas dos mesmos.
proteínas normalmente circulam no sangue como precursores inativos até
Termolábel: consiste em algo
serem clivadas por proteases. Uma cascata de clivagens é então formada já que perde a função ou a forma
que um componente do sistema serve como um substrato ao componente após aquecimento.

anterior e como uma enzima que ativa o componente subsequente.


Além de reconhecer certas moléculas microbianas, como os
PAMPs, o complemento é capaz de reconhecer tecido próprio alterado
ou danificado, promovendo a limpeza de células apoptóticas e de
imunocomplexos. Para alguns tipos de sinais, o sistema do complemento
inicia uma forte resposta inflamatória, enquanto que para outros ele marca
a molécula e/ou célula facilitando a sua fagocitose.

4.1 Vias de ativação do complemento

A cascata do complemento é ativada por três vias distintas: “via


clássica”, que recebe este nome por ter sido a primeira via descoberta, “via
da lectina” e “via alternativa”. Essas três vias se convergem na ativação do
componente C3. A ativação de C3 pela C3 convertase específica de cada
via leva a produção de moléculas efetoras envolvidas no recrutamento e
ativação de células inflamatórias, opsonização e consequente fagocitose e
lise direta do patógeno pelo “complexo de ataque a membrana” (MAC, do
inglês membrane attack complex).
A via clássica é iniciada pela ligação de C1q a imunocomplexos
ou ligação direta à superfície do patógeno. A via da lectina é marcada
pelo reconhecimento de sacarídeos pela lectina ligadora de manose ou
ficolinas. A via alternativa é iniciada pela autoativação do fator C3.
A C3 é a proteína do complemento mais abundante no sangue.
Devido a sua abundância e por ser relativamente instável, sofrendo

45
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

autoativação, ela é capaz de aumentar a magnitude da resposta imune.


O complexo C3 convertase, gerado em cada via após a ativação inicial,
cliva e ativa o componente C3 liberando dois fragmentos, um menor que
é liberado do sítio da reação e um maior que é uma serino protease ativa.
Essa serino protease geralmente fica fixada a membrana do patógeno, onde
o próximo componente da via também será clivado.
A nomenclatura dos componentes do sistema do complemento
pode causar um pouco de confusão. As moléculas inativas são chamadas
de C seguida por um numeral que foi dado de acordo com a ordem em
que as proteínas foram descobertas: C1, C2, C3, C4, C5, C6, C7, C8 e
C9. Infelizmente, a ordem de descobrimento não coincidiu com a ordem
de participação dessas proteínas na cascata de ativação de forma que a
ordem de ativação é: C1, C4, C2, C3, C5, C6, C7, C8 e C9. Além disso,
foi convencionado que o fragmento menor gerado a partir da clivagem
de alguma molécula C é chamado de “a”, enquanto o fragmento maior é
chamado de “b”.
Na via alternativa, não há participação de C4 e de C2 e sim do
fator B e D. O fator D é a protease que cliva o fator B em dois fragmentos.
Esses fragmentos são nomeados da mesma forma que os componentes
A padronização da “C”, Ba é o menor fragmento e Bb é o maior fragmento.
nomenclatura dos Como a ativação do complemento gera uma forte resposta
componentes do complemento
exigiu a mudança da inflamatória, ela deve ser finamente regulada. Discutiremos a regulação
nomenclatura existente para deste sistema no final da unidade. Agora entraremos em detalhes de cada
C2 já que o fragmento maior
era chamado de “a” e o uma das vias de ativação.
fragmento menor era chamado
de “b”. Entretanto, utilizaremos
a nomenclatura clássica de C2 4.1.1 Via clássica
já que ela ainda é utilizada
pela maioria das bibliografias.
Portanto, C2b é o fragmento O C1 é um grande complexo dependente de Ca+2, que consiste
maior com atividade de cinase de uma molécula de C1q (subunidade de reconhecimento) e duas
e C2a é o fragmento menor.
moléculas de cada uma das subunidades catalíticas C1r e C1s (Figura 19).

Figura 19: Estrutura do complexo C1. O complexo C1 é formado por


C1q que é a subunidade de reconhecimento associado a duas moléculas
de C1r e duas moléculas de C1s que possuem atividade proteolítica.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

46
Imunobiologia UAB/Unimontes

O complexo C1 é ativado por ligações simultâneas de ligantes


a C1q. Esses ligantes podem ser os anticorpos naturais que, como falado
anteriormente, pertencem principalmente à classe de IgM. Além disso, C1q
é capaz de se ligar diretamente à superfície de patógenos.
A ligação dos ligantes a C1q provoca uma mudança conformacional
no complexo C1 que leva a ativação das moléculas de C1r que então
clivam C1s. Tanto C1r quanto C1s são serino proteases.
C1s ativa cliva C4 e depois C2 produzindo C4a, C4b, C2a e C2b.
C4b é capaz de se ligar covalentemente a moléculas presentes na superfície
do patógeno. A ligação de C2 a C4b permite a clivagem de C2. C4b e C2a
ficam fixados à membrana formando a C3 convertase da via clássica (Figura
2). Esse complexo é responsável pela quebra de C3 em C3a e C3b. O C3b
gerado é capaz de se ligar covalentemente a moléculas da superfície do
patógeno marcando-o para a fagocitose. A opsonização se dá por meio
do reconhecimento de C3b por receptores presentes na membrana de
fagócitos. O receptor melhor caracterizado é o CR1, que é expresso nas
membranas de macrófago e de leucócitos polimorfonucleados.
Dando continuidade à cascata de ativação do complemento, C3b
se une ao complexo C4bC2a formam a C5 convertase. A C5 convertase
associada à membrana do patógeno captura o componente C5 clivando-o
em C5a e C5b (Figura 20).

Figura 20: Esquema da via clássica de ativação do complemento.


Adaptação de http://commons.wikimedia.org/wiki/
File:Complement-pathways.png Acesso: 01/09/2010

47
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

O C5b inicia a via do ataque à membrana, que resulta na formação


do MAC que consiste de C5b, C6, C7, C8 e C9 (Figura 02). Aqui a ordem
numérica dos componentes C coincide com a ordem de ligação para a
formação do complexo. A ligação de um componente permite a ligação do
componente seguinte, seja por provocar uma mudança conformacional ou
por expor sítios de ligação. A inserção do complexo na bicamada lipídica
ocorre após a ligação do C7 ao complexo C5bC6, já que essa ligação expõe
resíduos hidrofóbicos de C7 permitindo interagir com a membrana lipídica.
Várias unidades de C9 são capazes de se associar ao complexo após a
ligação de C8 (Figura 03). Entre 10 a 16 moléculas de C9 se polimerizam
na membrana formando uma estrutura em forma de poro, atravessando a
membrana plasmática da célula. O interior deste poro é um canal hidrofílico
que permite a passagem de íons e de água que, consequentemente, levará
à lise osmótica na célula alvo.

Figura 21: Esquema das etapas de formação do complexo de ataque a membrana


(MAC). Os componentes C6, C7, C8 e C9 vão, nesta ordem, se ligando a C5b.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

Durante a ativação e amplificação da cascata do complemento, C5a


e C3a são constantemente liberados e sinalizam uma resposta inflamatória
local após ligarem a seus receptores correspondentes, C5aR e C3aR. Essa
resposta, quando exacerbada, é semelhante ao choque tóxico que ocorre
nas reações alérgicas envolvendo IgE e recebe o nome de choque anafilático.
Por isso, essas moléculas são chamadas de anafilatoxinas. C5a, C3a e em
menor intensidade C4a promovem a degranulação dos mastócitos, bem
como aumento da permeabilidade vascular e contração do músculo liso.
Além disso, C3a e C5a são fortes quimioatraentes que guiam os neutrófilos,
macrófagos e monócitos aos sítios de ativação do sistema do complemento.

4.1.2 Via alternativa

A via alternativa ocorre na ausência de anticorpos e é iniciada pela


hidrólise espontânea de uma pequena fração de C3 formando C3a e C3b.

48
Imunobiologia UAB/Unimontes

Como já falado anteriormente, C3b se liga covalentemente à superfície do


patógeno.
Se não há uma patógeno, C3a e C3b se ligam novamente no
sangue, formando novamente uma C3 inativa.
Uma vez ligado à membrana, C3b liga-se ao fator B formando
C3bB que, na presença do fator D, será clivado em Ba e Bb. O complexo C3
convertase da via alternativa é então formado por C3bBb. Esse complexo
cliva C3 no sangue formando mais uma vez C3a e C3b. Essa amplificação
da geração de C3b pela via alternativa contribui para a amplificação da
ativação do complemento iniciado pela via clássica.
O complexo C5 convertase da via alternativa é formado pela
ligação de C3b ao complexo C3 convertase C3bBb. A partir daí, o processo
é o mesmo que acontece na via clássica (Figura 22).

Figura 22: Esquema da via alternativa de ativação do complemento. A via alternativa


inicia-se com a clivagem espontânea de C3.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

Um fato interessante é que o fator D é a única proteína do sistema


do complemento que já circula no sangue na sua forma ativa. Isso parece
ser necessário para o início da via alternativa.

4.1.3 - Via da lectina

A via da lectina é homóloga à via clássica. Ela começa com a ati-


vação da lectina ligadora de manose (MBL) ou ficolinas ao invés de C1q.
As ficolinas são proteínas homólogas à MBL que possuem um domínio
homólogo ao fibrinogênio e se ligam a oligossacarídeos que contêm N-
-acetilglicosamina. Tanto a MBL quanto a ficolina são muito similares à C1q
(Figura 05).

49
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Como já discutido na unidade sobre reconhecimento da imunida-


de inata, a lectina reconhece resíduos de manose da superfície do patóge-
no. Como o arranjo das estruturas de manose e outros açúcares é diferente
entre as células do hospedeiro e do patógeno, a MBL não é capaz de ativar
a cascata do complemento nas células do hospedeiro.
A ligação da MBL aos seus ligantes ativa as serino proteases as-
sociadas à MBL, MASP-1 e MASP-2, que são similares à C1r e C1s. Assim
como C1s, MASP-2 cliva o C4 e C2 cujos fragmentos C4b e C2a formarão
a C3 convertase. Todo o restante da cascata é idêntico à cascata da via
clássica (Figura 23).

Figura 23: Esquema da via da lectina de ativação do complemento. A via


da lectina é muito semelhante à via clássica. A principal diferença está na
primeira molécula de reconhecimento que, na via clássica, é o complexo
C1, e na via da lectina é a lectina ligadora de manose ou ficolinas.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

4.2 Regulação do Sistema do Complemento

Classifique os componentes O sistema do complemento pode ser extremamente perigoso aos


do sistema do complemento tecidos, por isso sua ativação deve ser finamente regulada.
quanto a sua função: sinal
inflamatório, opsonina e A regulação é feita principalmente por proteínas controles do
lise celular, descrevendo as complemento que estão presentes em alta concentração no sangue.
propriedades gerais de cada
uma. Algumas dessas proteínas estão presentes na membrana das células do
hospedeiro impedindo-as de serem alvos do complemento. Essas proteínas,
portanto permitem que o hospedeiro diferencie o próprio do não próprio.

50
Imunobiologia UAB/Unimontes

Um exemplo disso é CD59, também chamado de protectina,


que é expressa nas células do hospedeiro e inibe a polimerização de C9
durante a formação do MAC (Figura 06A).
A ativação de C1 é controlada pelo inibidor de C1 (C1NH). Este
inibidor se liga ao complexo C1 ativo fazendo com que C1r e C1s se
dissociem de C1q que está ligado à membrana do patógeno (Figura 06B).
O inibidor de C1 é importante para controlar o tempo no qual o complexo
C1 fica ativo e também para inibir a ativação espontânea de C1.
O “Fator de aceleração do decaimento” (DAF ou CD55) é uma
proteína capaz de se ligar a C3b. Este fator compete com o fator Bb
gerado na via alternativa pela ligação ao C3b. Além disso, DAF consegue
desestabilizar o complexo C3 convertase formado por deslocar o fator Bb
deste complexo. O receptor de complemento 1 (CR1) e o fator de proteólise
da membrana (MCP ou CD46) são proteínas expressas pelas células do
hospedeiro. Quando C3b liga-se a uma dessas proteínas ou ao DAF, ele é
clivado pelo Fator I, uma proteinase presente no sangue, produzindo iC3b
que é uma molécula inativa. Como os patógenos não expressam CR1 e
MCP, o fator I não consegue inativar o C3b que está ligado à membrana
desses organismos (Figura 24 C e D).

Figura 24: Esquema das vias de regulação da cascata do complemento. A protecti-


na, presente nas células do hospedeiro, impede a formação do MAC (A). O Inibidor
de C1 interage com o complexo C1 desestabilizando-o (B). O Fator I é capaz de
inativar C3b pela formação de iC3b quando o C3b está ligado a CR1, MCP ou
DAF (C e D). O Fator H se liga a moléculas de ácido siálico, presente na membrana
de células hospedeiras, e a C3b permitindo que o fator I iniba o C3b (E).
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

O fator H é outra proteína presente no sangue capaz de competir


pela ligação do C3b. Este fator tem afinidade por resíduos de ácido siálico
que estão presentes na membrana de células de vertebrados (hospedeiro),
mas ausente nas células de patógenos. Ele também atua como catalisador
da reação do fator I favorecendo a produção de iC3b (Figura 06E).
Essas proteínas e fatores que acabamos de descrever atuam como
reguladores negativos, inibindo a ativação do complemento. A properdina,
também conhecida como fator P, é um regulador positivo, pois aumenta a
estabilidade da C3 convertase da via alternativa (C3bBb).

51
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

MURPHY, K.; TRAVERS, P.; WALPORT, M. Imunobiologia de Janeway. 7.


ed. São Paulo: Editora Artmed, 2010.

52
UNIDADE 5
Citocinas e Inflamação

As citocinas são proteínas pequenas secretadas por células do


sistema imune que atuam principalmente como moléculas sinalizadoras.
Geralmente essas moléculas circulam no sangue em concentrações
baixíssimas, mas têm a expressão aumentada durante uma infecção ou
trauma. As citocinas podem ser classificadas de acordo com o seu local de
atuação. As citocinas podem sinalizar para a própria célula produtora (ação
autócrina), para células vizinhas ao seu local de produção (ação parácrina)
ou ter um efeito sistêmico, atuando em locais distantes da sua produção,
como os pirógenos endógenos.
Cada citocina é capaz de ligar-se a um receptor específico. Essa
ligação desencadeia eventos subsequentes capazes de alterar a função
celular, inibindo ou ativando a expressão de determinados genes, tais como Pirógenos: são substâncias
outras citocinas e receptores de superfície, e até mesmo suprimindo o seu indutoras da febre. Os
pirógenos endógenos são as
próprio efeito por um mecanismo de feedback negativo. citocinas que possuem ação
As citocinas podem ser classificadas em linfocinas, interleucinas e sistêmica induzindo a um
aumento da temperatura
quimiocinas de acordo com a sua função, célula que a produz e seu alvo corporal. Já os pirógenos
de ação, entretanto, como as citocinas podem ser redundantes, isto é, uma exógenos são substâncias
provenientes de algum outro
citocina pode exercer a mesma função de outra, essa classificação pode organismo.
não ser apropriada.
O termo interleucina (IL) foi inicialmente usado para denominar as
citocinas cujos alvos são os leucócitos. Cada citocina que atuava sobre os
leucócitos era denominada de interleucina seguido por um número, como,
por exemplo, interleucina 1 (IL-1), interleucina 2 (IL-2), etc. Entretanto,
várias citocinas foram descobertas e denominadas de interleucina sem que
sua função e mecanismo de ação fossem esclarecidos. Assim, é possível
que algumas dessas moléculas, atualmente chamadas de interleucina, não
Qual a justificativa para o
atuem sobre os leucócitos. corpo produzir citocinas
diferentes, mas com funções
As citocinas podem ser classificadas de acordo com a sua similares?
característica estrutural, mas a classificação mais utilizada é de acordo o
tipo de resposta imune adaptativa da qual ela participa: Th1 ou Th2. A
resposta Th1 é caracterizada pela predominância de linfócitos T auxiliares
do tipo 1 e de citocinas produzidas por estas células, como interferons
(IFN), TGF-β e IL-12, que aumentam a resposta imune celular. Já a resposta
Th2 favorece a resposta dos anticorpos, sendo que predomina os linfócitos
T auxiliares do tipo 2 que secretam principalmente IL-4, IL-13 e IL-10,
entre outras. Uma característica interessante dessa classificação é que
geralmente uma citocina pertencente a um grupo inibe os efeitos daquelas
pertencentes ao outro grupo.

53
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

5.1 Receptores de citocinas

Os receptores de citocinas são proteínas transmembrânicas que


possuem um domínio extracelular, que é o domínio de ligação à citocina,
e um domínio intracelular, que transmite a sinalização desencadeada
pela citocina ao interior da célula. Os receptores de citocinas podem
ser classificados e divididos em grupos de acordo com sua estrutura
tridimensional (Quadro 01).

Fonte: Adaptado de Abbas, A. K., Litchman, A. H., Pillai, S. Imunologia Celular e Molecu-
lar. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

5.2 Citocinas que atuam na imunidade inata

Várias citocinas atuam ativando ou inibindo células que participam


da resposta imune inata. Como vocês poderão perceber algumas citocinas
fazem uma ligação entre a resposta imune inata e a resposta imune
adquirida. A seguir descreveremos as características e funções das citocinas
que têm um papel essencial na imunidade inata.

5.2.1 Fator de Necrose Tumoral (TNF)

O Fator de Necrose Tumoral (TNF) é um potente modulador


da resposta inflamatória a uma variedade de estímulos imunológicos e
infecção. Algumas vezes podemos encontrar o TNF sendo chamado de
TNF-α para distingui-lo da linfotoxina, que também é chamada de TNF-β.
O TNF é produzido como uma proteína transmembrânica do tipo
II homotrimérica, sendo secretada após a sua clivagem por metaloproteases
ligadas à membrana. As principais células produtoras de TNF são os
fagócitos mononucleares. Outras células como células T ativadas, células
NK e mastócitos também secretam essa citocina.

54
Imunobiologia UAB/Unimontes

A produção de TNF é estimulada principalmente após a infecção


por bactérias gram-negativas, mais especificamente pelo LPS dessas
bactérias. A interleucina-1 também é um forte estimulador da produção
de TNF.
Existem dois tipos de receptores para o TNF: o TNFR1 e o TNFR2.
O TNFR1 esta presente em praticamente todos os tipos celulares, já o
TNFR2 é encontrado principalmente nas células do sistema imune. Ambos
os receptores sinalizam sinais pró-inflamatórios e antiapoptóticos pela
ativação do NF-KB ou das MAP cinases. Entretanto, o TNFR1 também pode
transduzir sinais apoptótico e anti-inflamatório quando recruta o domínio
de morte associado ao Fas (FADD) e consequente ativação da caspase
8. Assim, o TNF pode ter um papel duplo na sobrevivência das células:
ele pode promover a sobrevivência pela ativação do NF-KB ou induzir a
apoptose pela ativação da cascata de caspases. Alguns fatores como tipo
celular, coestimulação com outras citocinas e a concentração de espécies
reativas de oxigênio podem interferir em qual via de sinalização será
utilizada (Figura 25).

Figura 25: Esquema da sinalização ativada pela


ligação de TNF ao seu receptor TNFR. O TNF
pode induzir uma resposta inflamatória pela
ativação de IKK (IK cinase) e NF-kB e de MAPK
(MAP cinases) ou uma resposta apoptótica
quando recruta o domínio de morte FADD.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

O TNF efetua várias ações biológicas, sendo que a mais importante


seria o recrutamento dos leucócitos ao local da inflamação. O TNF é

55
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

capaz de aumentar a permeabilidade vascular. Nas células endoteliais ele


induz à expressão de novos receptores de membrana como receptores de
integrinas. Além disso, o TNF estimula algumas células a produzir outras
citocinas ou quimiocinas: os fagócitos mononucleares, por exemplo,
produzem IL-1 após serem estimulados pelo TNF.
Se o TNF é produzido em grande quantidade, ele vai para a
circulação sanguínea passando a ter ação sistêmica. No hipotálamo, essa
citocina induz a febre, por isso o TNF é considerado como um pirógeno
endógeno. A produção excessiva de TNF provoca a síndrome do choque
séptico, uma complicação da infecção por bactérias gram-negativas que
pode levar à morte.

5.2.2 Interleucina 1 (IL-1)

A superfamília de IL-1 é formada por três proteínas: IL-1α, IL-1β


e o agonista do receptor de IL-1 (IL-1Ra). Algumas bibliografias sugerem
a inclusão de outras moléculas na superfamília da IL-1 como é o caso da
IL-18 e IL-33.
A IL-1α e IL-1β são citocinas pró-inflamatórias com funções similares
às do TNF. Essas moléculas são produzidas na forma de precursores por
diversos tipos celulares como macrófagos, monócitos, fibroblastos, células
endoteliais e células dendríticas. A IL-1α pode atuar como precursor ou
na forma clivada, entretanto a IL-1β só atua na forma clivada. A produção
e ativação da IL-1β ocorrem em duas etapas. Primeiro, a pró-IL1β que é
o precursor da IL-1β é produzida em resposta a um estímulo inflamatório
como, por exemplo, um ligante de TLR ou alguma citocina. O segundo passo
é a clivagem proteolítica deste precursor por meio da caspase-1. A caspase
1 é ativada pelo complexo multiproteico chamado de “inflamassomo”. O
inflamassomo é montado após a célula receber um segundo sinal como
toxinas, produtos microbianos ou sinais de perigo endógeno. A IL-18 é
sintetizada na mesma forma que a IL-1β, a partir da pró- IL-18 (Figura 26).

Inflamassomo: é um
complexo macromolecular
formado em algumas células
inflamatórias que regula
e induz a liberação de
interleucinas, principalmente
IL-1 e IL-18.

56
Imunobiologia UAB/Unimontes

Figura 26: Formação e ativação do inflamassomo. A formação e


ativação do infamassomo requerem dois sinais. O primeiro sinal é
ativação de TLR pela ligação de algum ligante como o LPS. O se-
gundo sinal pode ser algum sinal de perigo endógeno ou toxinas
produzidas por microrganismos. O inflamassomo ativa a caspase
1, que cliva os precursores de IL-1β ou IL-18.
Fonte: de Oliviera, 2010.

IL-1α e IL-1β se ligam ao mesmo receptor celular (receptor de


IL-1, IL-1R). Esse receptor possui um domínio citoplasmático semelhante
ao TLR e sinaliza para ativação dos fatores de transcrição NF-KB e AP-1.
Essas citocinas aumentam a expressão de moléculas de adesão nas células
endoteliais favorecendo a migração dos leucócitos ao sítio de infecção.
Assim como o TNF, IL-1 é um pirógeno endógeno se produzido em grande
quantidade. Embora atue de forma muito semelhante ao TNF, IL-1 não
induz a apoptose e nem provoca o choque séptico.
IL-1α é produzido constitutivamente por queratinócitos. Essa
produção constitutiva na epiderme pode ser importante para a manutenção
da barreira epitelial.
O outro membro da superfamília da IL-1 é o agonista do receptor
de IL-1 (IL-1ra). Como o próprio nome diz, essa molécula é capaz de ligar
ao receptor de IL-1 atuando como um inibidor competitivo da IL-1. O IL-
1ra é produzido por fagócitos mononucleares e não desencadeia nenhuma
resposta ao se ligar ao receptor de IL-1, podendo ser considerado como um
regulador da atividade de IL-1.

5.2.3 Interleucina 12 (IL-12)

A IL-12 é produzida por células inflamatórias ativadas incluindo


macrófagos, neutrófilos, microglia e células dendríticas quando estimuladas
por bactérias intracelulares, LPS ou outra citocina.

57
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

A IL-12 é formada por duas subunidades: a IL12p35 e IL12p40.


Vários tipos celulares expressam a subunidade p35, mas somente as
células imunes citadas acima expressam além da p35 a subunidade p40 e,
portanto, produzem a IL-12.
A sinalização por IL-12 ocorre principalmente por meio da via JAK/
STAT após a sua ligação ao seu receptor específico.
Esta citocina atua na diferenciação das células Th0 em células Th1.
Além disso, IL-12 estimula a produção de IFN-g pelas células NK, linfócitos
T auxiliares do tipo 1 e linfócitos T CD8+. O IFN-g produzido ativa os
macrófagos para matarem os microrganismos fagocitados (Figura 3). A IL-
12 aumenta também a atividade citotóxica das células NK e dos linfócitos
T CD8+.

Figura 27: Ação da IL-12. A IL-12 produzida por macrófagos


infectados estimula a diferenciação dos linfócitos T Th1 que por
sua vez produz IFN-g, que aumenta a ativação dos macrófagos.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

Como podemos observar, a IL-12 faz uma ligação entre a resposta


imune inata e a resposta imune adaptativa, aumentando a capacidade
efetora das células da imunidade natural e ativando a formação da
imunidade adaptativa.

5.2.4 Interferons do tipo I

Os interferons do tipo I compreendem um grupo de diversas


proteínas interferon que se ligam ao mesmo receptor, o receptor de IFN-α
(IFNAR) formado pelas subunidades IFNAR1 e IFNAR2.
Várias espécies, incluindo todos os mamíferos e alguns pássaros,
répteis, anfíbios e peixes, possuem moléculas homólogas a IFN do tipo I.
Nos humanos, a família de IFN di tipo 1 é formada por IFN-α (alpha), IFN-β
(beta), IFN-k (kappa), IFN-ε (epsilon) e IFN-ω (omega).
Como todos IFN, os IFN do tipo I atuam principalmente na
resposta contra infecções virais. O IFN-α é produzido principalmente por
leucócitos e células dendríticas plasmocitóide. O IFN-β é produzido em
maior quantidade pelos fibroblastos. Outros tipos celulares como linfócitos,

58
Imunobiologia UAB/Unimontes

macrófagos e células endoteliais também secretam IFN-α e IFN-β. IFN-ω é


produzido por leucócitos no sítio da infecção viral ou de tumores.
A produção de IFN do tipo I é estimulada principalmente por
ácidos nucléicos virais após a ligação ao TLR como discutido nas unidades
anteriores. Os IFN do tipo I induzem a via de JAK/STAT, ativando a expressão
de enzimas que bloqueiam a replicação viral ou de moléculas do MHC
classe I nas células infectadas de forma que estas células se tornam mais
susceptíveis à morte mediada pelos linfócitos T citotóxicos.

5.2.5 Interleucina 10
Alguns IFN do tipo I estão
A IL-10 foi inicialmente descrita como uma citocina Th2, mas sendo usados no tratamento
de determinadas infecções
atualmente sabemos que a IL-10 pode ser produzida por células T, virais e de tumores. Pesquise
macrófagos, células dendríticas e epiteliais. Essa citocina atua como anti- e exemplifique uma aplicação
de IFN do tipo I como
inflamatório protegendo os tecidos dos danos causados por uma resposta medicamento.
inflamatória excessiva.
O receptor de IL-10 (IL-10R) é um receptor do tipo II que sinaliza
pela via JAK/STAT. Para inibir as patologias inflamatórias, a IL-10 funciona
em diferentes estágios de uma resposta imune e possivelmente em
diferentes lugares.
Nos macrófagos e em células dendríticas ativadas, a IL-10 inibe
a produção de IL-12 e a expressão de moléculas MHC II. Este é um
mecanismo para finalizar a resposta inflamatória já que IL-12 estimula a
produção de IFN-g e o MHC II está envolvido na ativação dos linfócitos.
Além disso, IL-10 inibe o desenvolvimento da resposta Th1 e suprime a
resposta Th2 nas respostas alérgicas.

5.2.6 Outras interleucinas

A IL-6 é uma citocina que pode agir tanto como pró-inflamatória


como anti-inflamatória. Ela é produzida principalmente por células T e
macrófagos e é um importante mediador da febre e da resposta de fase
aguda. Nos músculos e no tecido adiposo, a IL-6 estimula a mobilização
de energia provocando um aumento na temperatura corporal. Além disso,
IL-6 é essencial para o crescimento de hibridomas, como os produtores de
anticorpos monoclonais. O receptor de IL-6 pertence à classe de receptores
do tipo I.
A IL-15 é estruturalmente semelhante a IL-2. Essa citocina é
secretada por fagócitos mononucleares após a infecção por vírus e regula
a atividade e proliferação de células T e NK. O receptor de IL-15 pertence
à classe de receptores do tipo I. Algumas subunidades desse receptor são
semelhantes às subunidades do receptor de IL-2 de forma que ambas as
citocinas podem competir e regular a atividade da outra.

59
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Algumas outras citocinas também são constituídas pela subunidade


p40 da IL-12 como, por exemplo, a IL-23 e IL-27. A IL-23, juntamente
com IL-6 e TGF-β, estimula as células T CD4+ virgens a diferenciarem
em células Th17. Essa população celular produz IL-17, uma citocina pró-
inflamatória que aumenta a ativação de células T e estimula a produção de
outras citocinas e moléculas inflamatórias.
A Figura 04 mostra de forma resumida as principais funções dessas
citocinas que acabamos de descrever.

Figura 28: Esquema da ação das principais citocinas que medeiam a imunidade inata.
Algumas citocinas atuam ativando próprias células da imunidade inata, enquanto ou-
tras fazem uma ligação com células da imunidade adaptativa. A IL-10 é uma citocina
que atua inibindo tanto a diferenciação das células Th1 quanto a produção de IL-12
pelos macrófagos.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

5.3 Quimiocinas

O termo quimiocina refere-se a uma classe específica de


citocinas que medeiam a quimioatração entre as células. As quimiocinas
são proteínas pequenas que apresentam resíduos de cisteína ligados por
ligações dissulfeto em regiões conservadas.
Algumas quimiocinas são consideradas pró-inflamatórias e são
induzidas durante a resposta imune para atrair células do sistema imune
para o sítio da infecção. Outras citocinas são homeostáticas e controlam a
migração celular durante o processo normal de manutenção dos tecidos.

60
Imunobiologia UAB/Unimontes

As quimiocinas que são liberadas por células danificadas ou


infectadas formam um gradiente de concentração. As células atraídas
movem através do gradiente em direção a uma maior concentração da
quimiocina.
As quimiocinas homeostáticas são produzidas sem a necessidade
de um estímulo, fazendo que os linfócitos sejam direcionados aos
linfonodos. Nos linfonodos, os linfócitos procurarão patógenos por interagir
com APCs residentes neste tecido.
As quimiocinas inflamatórias são liberadas em resposta a infecções
por bactérias ou vírus, ou por sinais de dano endógeno como cristais de urato
ou sílica. A IL-1 e outras citocinas pró-inflamatórias estimulam a liberação
dessas quimiocinas. As quimiocinas inflamatórias recrutam leucócitos ao
sítio da infecção para iniciar a formação de uma resposta imune. Algumas
quimiocinas promovem a angiogênese, isto é, o crescimento de novos
vasos sanguíneos, ou guiam células ao tecido onde ele deve amadurecer.
As quimiocinas são divididas em quatro grupos de acordo com sua
característica estrutural: quimiocina C, quimiocina CC, quimiocina CXC e
quimiocinas CX3C.

5.3.1 Quimiocina C

Esse grupo de quimiocina, também conhecido como quimiocina


g, é o mais diferente de todas as outras quimiocinas já que possuem apenas
dois resíduos de cisteínas (figura 05.A).
As quimiocinas XCL1, também conhecidas como linfoactina-α e
XCL2 ou linfoactina-β, pertencem a este grupo e atraem precursores de
linfócitos T ao timo.

5.3.2 Quimiocina CC

As quimiocinas CC são também chamadas de β-quimiocinas. Essas A nomenclatura das


quimiocinas possuem dois resíduos de cisteínas adjacentes localizadas quimiocinas é padronizada.
Por exemplo: CCL1 é o ligante
próximas à região N-terminal. A maioria dos membros dessa família contém 1 da família de quimiocina
quatro cisteínas, mas algumas quimiocinas CC possuem seis cisteínas (figura CC e CCR1 é o receptor dessa
quimiocina.
05.B).
São conhecidos 27 quimiocinas que pertencem ao grupo de
quimiocinas CC, chamadas de CCL 1 a 28 (CCL9 e CCL10 são a mesma
molécula, por isso a numeração vai até 28 e temos apenas 27 membros).
A proteína quimioatraente de monócitos 1 (MCP-1 ou CCL2)
pertence a esse grupo de quimiocinas e induz os monócitos a deixar o
sangue e ir para os tecidos onde se transformará em macrófagos. Outro
exemplo é a CCL5 ou RANTES que atrai células T, eosinófilos e basófilos
que expressam o receptor CCR5.

61
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 29: Estrutura geral das quimiocinas. A) Quimiciocinas C; B) Quimiocinas


CC; C) Quimiocinas CXC; D) Quimiocinas CX3C.
Fonte: adaptado de http://commons.wikimedia.org/wiki/
File:ChtxChemokineStruct_Dutchtxt.png Acesso: 01/09/2010

5.3.3 Quimiocina CXC

Nas quimiocinas CXC as duas cisteínas N-terminal são separadas


por um aminoácido representado pela letra X (figura 05.C).
São conhecidos 17 membros dessa classe de citocinas em
mamíferos. Um exemplo é a IL-8, que atua da mesma forma que a MCP-1
só que induzindo os neutrófilos a migrarem do sangue para os tecidos.

5.3.4 Quimiocina CX3C

O ultimo grupo de quimiocinas possui três aminoácidos entre as


duas cisteínas e é chamado de quimiocina CX3C (figura 05.C).
A fractalina (CX3CL1) é a única representante desse grupo. Ela
pode ser secretada ou mantida na superfície da célula que a produz
atuando como quimioatrante ou molécula de adesão.
Os receptores de quimiocina são receptores acoplados à proteína
G e são expressos principalmente na superfície de leucócitos. A ativação da
proteína G, pela ligação da quimiocina ao seu receptor, ativa a fosfolipase
C e consequente produção dos mensageiros secundários inositol trifosfato
e diacilglicerol. Essa via de sinalização leva a quimiotaxia, degranulação,
produção de ânions superóxidos e mudança na avidez das integrinas.

5.4 Citocinas que atuam na imunidade adaptativa

A resposta imune adaptativa é caracterizada principalmente pela


ativação de linfócitos T após o reconhecimento do antígeno. As citocinas
são essenciais no controle da proliferação e diferenciação desses linfócitos.

62
Imunobiologia UAB/Unimontes

5.4.1 Interleucina 2 (IL-2)

A IL-2 faz parte de uma família de citocinas que inclui IL-4, IL-7,
IL-9, IL-15 e IL-21. O receptor de IL-2 é um complexo proteico formado
por três proteínas, sendo que a cadeia g (gc) é comum a todos os receptores
que reconhecem essa família de citocinas. O receptor de IL-2 é expresso
principalmente nos linfócitos.
As principais células produtoras de IL-2 são os linfócitos T CD4+,
ativadas pela ligação ao antígeno. A ligação do antígeno ao receptor das
células T (TCR) induz tanto a liberação de IL-2 quanto a expressão do
receptor de IL-2 (IL-2R). Assim, a IL-2 atua principalmente nas células que a
produz ou em células próximas. A ligação de IL-2 ao seu receptor estimula
o crescimento, diferenciação e sobrevivência das células T citotóxicas
ativadas por antígeno. A IL-2 também participa no desenvolvimento das
células T de memória.
No timo, a IL-2 atua na maturação das células T reguladoras
(T-regs). As T-regs agem impedindo as células T de reconhecer os antígenos
próprios. Dessa forma, a IL-2 tem um importante papel na discriminação
do próprio e do não próprio.
A IL-2, de forma similar a IL-15, atua nos linfócitos B, facilitando a
produção de imunoglobulinas, e também induz a proliferação das células
NK.

5.4.2 Interleucina 4 (IL-4) e Interleucina 13 (IL-13)

A IL-4 está envolvida na diferenciação das células T virgens (Th0)


em células Th2. As células Th2 são as principais produtoras de IL-4. Os
mastócitos ativados também produzem essa citocina. A resposta Th2 é a
principal resposta imune contra infecções helmínticas.
A IL-13 é uma citocina que apresenta grande similaridade
estrutural e funcional com a IL-4. A IL-13 é produzida pelas células T CD4+
Th2 e também por células T CD8+ citotóxicas, basófilos e eosinófilos. O
seu receptor apresenta uma subunidade comum com o receptor de IL-4.
Grande parte das funções da IL-13 se sobrepõe às ações da IL-4.
O receptor de IL-4 é pertence à família de receptor de citocina do
tipo I e sinaliza pela via JAK/STAT e ativação de STAT6. A IL-4 e IL-13 são
as únicas citocinas capazes de ativar a STAT-6, que induz a expressão dos
genes envolvidos na resposta dessas citocinas.
Além de participar da diferenciação dos linfócitos Th2, a IL-4 e
IL-13 atuam estimulando os linfócitos B a produzirem IgE. Por isso, essas
citocinas estão associadas a processos alérgicos onde são encontradas altas
concentrações de IgE e também na resposta dos eosinófilos na infecção
por helmintos. Outra ação dessas citocinas é a ativação alternativa dos

63
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

macrófagos. Essa ativação alternativa é caracterizada pela indução de


alguns genes que podem promover a fagocitose dos patógenos.
Em adição às ações compartilhadas com IL-4, a IL-13, também
promove a fibrose, observada em algumas doenças como a asma e
infecções parasitárias, e estimula a produção de muco pelas células
epiteliais pulmonares.

5.4.3 Interleucina 5 (IL-5)

A IL-5 é uma citocina produzida por linfócitos Th2, mastócitos e


eosinófilos. Essa citocina é um mediador chave da eosinofilia, ativando os
eosinófilos maduros e estimulando o crescimento e diferenciação dessas
células. A IL-5 também estimula os linfócitos B a crescerem e aumentarem
a produção de imunoglobulinas.
O receptor de IL-5 (IL-5R) pertence à classe de receptores do tipo
I. Ele é formado pela subunidade α que contem o domínio de ligação a
IL-5 e pela subunidade β que contém o domínio de transdução de sinal. A
subunidade α é exclusivamente expressa pelos eosinófilos, ao passo que a
subunidade β é expressa por todos os leucócitos. A subunidade β também
faz parte do receptor de IL-3.
Os eosinófilos atuam na eliminação de helmintos cobertos com
anticorpos por meio da liberação dos seus grânulos citotóxicos. Como os
eosinófilos são as únicas células que expressam o receptor completo de IL-
5, a IL-5 é o principal regulador da acumulação dessas células nos tecidos.
Algumas doenças alérgicas como rinite alérgica e asma são caracterizadas
pelo grande número de eosinófilos na circulação e nas vias aéreas.

5.4.4 Interferon-γ (IFN-γ)

O IFN-γ é uma citocina fundamental para a imunidade inata e


adaptativa contra infecções bacterianas intracelulares ou virais e para o
controle de tumores.
O IFN-γ é o único representante da classe de interferons do tipo
II. São conhecidos dois receptores para esta citocina, o receptor de IFN-γ I
(IFNGR1) e o receptor de IFN-γ II (IFNGR2), que sinalizam principalmente
para ativação de moléculas STAT1. Os genes induzidos por STAT-1 são
principalmente moléculas envolvidas em aumentar a resposta imune
adquirida e a capacidade efetora dos macrófagos.
Diferentemente dos IFN-α e IFN-β, que são expressos por quase
todos os tipos celulares, IFN-γ é produzido por células T CD4+ Th1,
células dendríticas, linfócito T citotóxico e células NK. A IL-12 é a principal
citocina indutora da produção de IFN-γ.

64
Imunobiologia UAB/Unimontes

O IFN-γ tem atividade antiviral e propriedades antitumorais,


entretanto seus principais efeitos são como imunomoduladores. O IFN-γ
promove ativação e aumento da capacidade de apresentação de antígenos
dos macrófagos, além de aumentar a produção de ROS e NO nessas
células. Em células não infectadas, o IFN-γ aumenta a expressão de MHC
classe I protegendo-as da ação das células NK. O IFN-γ é fundamental na
diferenciação dos linfócitos T virgens em Th1, bem como na inibição das
células Th2.
Nos linfócitos B, o IFN-γ atua aumentando a produção de
anticorpos IgG que participam da opsonização de patógenos e ativação do
sistema do complemento.

5.4.5 Fator de crescimento transformante β (TGF-β)

O TGF-β é uma importante citocina reguladora das respostas


imunes e das funções de outras células, inibindo a proliferação e a ativação
de linfócitos e outros leucócitos.
As células produtoras de TGF-β são as células T ativadas pelo
reconhecimento do antígeno, macrófagos e outros fagócitos ativados pelo
LPS bacteriano.
Um dos papéis do TGF-β na regulação do sistema imune é a
ativação de células T CD25+ reguladoras e células Th17. O TGF-β inibe a
diferenciação dos linfócitos T CD4+ virgens em Th1 ou Th2. Nos linfócitos
B, o TGF-β estimula a produção de IgA, importante na imunidade das
mucosas.
A FIG. 30 mostra de forma geral o papel das citocinas que
acabamos de descrever.

65
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 30: Esquema da ação das principais citocinas que atuam na imunidade
adaptativa. As setas sinalizam que a citocina ativa a célula. As retas finalizadas
com barra indicam inibição da via.
Fonte: de Oliveira, LA & DaMata, JP, 2010

5.4.6 Outras citocinas

A família da IL-17 é composta por cinco citocinas estruturalmente


semelhantes. Essas citocinas induzem a produção de outras citocinas
como IL-6, IL-1, TGF, TNF e quimiocinas por diversos tipos celulares. O
principal estímulo para a produção de IL-17 é a IL-23 que atua nas células
T CD4+ de memória. Células epiteliais também produzem IL-17, que agirá
sobre essas células induzindo a expressão de fatores de recrutamento dos
neutrófilos para o sítio da infecção. A IL-25 faz parte da família da IL-17 e
é produzida principalmente por células Th2 estimulando a produção de
outras citocinas envolvidas neste tipo de resposta.
A IL-21 é um citocina com forte efeito regulatório nas células do
sistema imune incluindo células NK, células T citotóxicas. Essa citocina
induz a divisão e proliferação de células alvo. Os linfócitos T CD4+ ativados
são os principais produtores de IL-21. O receptor de IL-21 é expresso na
superfície dos linfócitos T e B e das células NK. Nos linfócitos B ela atua
promovendo o aumento da produção de imunoglobulinas.
Ao longo das descrições do papel das citocinas da imunidade
adquirida falamos muito em resposta Th1 e Th2. A maioria dos
microrganismos intracelulares induz uma resposta Th1 caracterizada pela
alta produção de IFN-g. Na resposta Th1, os fagócitos ativados destroem os
microrganismos intracelulares e há um aumento na produção de anticorpos

66
Imunobiologia UAB/Unimontes

que opsonizam os patógenos. A resposta Th2, por outro lado, é formada


principalmente contra helmintos. Nesta resposta há uma maior produção
de IL-4, que aumenta a produção de IgE específicos contra helmintos, e
de IL-5, que ativa os eosinófilos. Esses mecanismos atuam em conjunto
promovendo a morte dos helmintos.
O Quadro 2 resume as principais características das citocinas
discutidas até agora nesta unidade.

Analisando o Quadro 02,


classifique cada citocina
quanto à sua participação
na imunidade inata ou na
imunidade adquirida.

Fonte: Adaptado de Abbas, A. K., Litchman, A. H., Pillai, S. Imunologia Celular e Molecu-
lar. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

67
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

5.5 Inflamação

A inflamação faz parte de uma resposta fisiológica contra estímulos


tais como patógenos ou células danificadas. A inflamação aguda é uma
resposta inicial do corpo a estímulos perigosos, caracterizada pelo aumento
do movimento de leucócitos e plasma do sangue ao tecido danificado. Esta
resposta envolve o sistema vascular local, o sistema imune e várias células
do tecido danificado.
A inflamação aguda é uma resposta de curto prazo caracterizada
por quatro sinais: vermelhidão, aquecimento local, inchaço e dor. A
vermelhidão e o aquecimento ocorrem pelo aumento do fluxo sanguíneo
no local da inflamação. O inchaço é causado pela acumulação de fluidos,
enquanto a dor é devido à liberação de substâncias que estimulam as
terminações nervosas do local.
A resposta inflamatória requer constante estimulação para ser
sustentada. Os mediadores inflamatórios têm curto tempo de vida e são
facilmente degradados no tecido, assim a inflamação cessa uma vez que o
estímulo for removido.
O componente celular da inflamação é formado por leucócitos que
residem no sangue e devem chegar ao tecido inflamado via recrutamento
e extravasamento dos leucócitos. Este processo (representado na Figura 31)
pode ser dividido em quatro passos, que iremos descrever de forma mais
detalhada a seguir.

Figura 31: Recrutamento dos leucócitos.


Fonte: adaptado de http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Leukozytenmigration_01.
png Acesso: 09/09/2010

• Recrutamento e rolagem dos leucócitos ao sítio de infecção: o


recrutamento dos leucócitos é um processo mediado por receptor. Alguns
produtos da inflamação como a histamina e outras citocinas induzem a
expressão das selectinas P e E na superfície das células endoteliais, que
formam as vênulas pós-capilares no local da infecção. As citocinas mais
importantes para a indução da expressão de selectinas no endotélio são
TNF e IL-1. Os leucócitos expressam outro tipo de selectina, a selectina
L, que serve para que os leucócitos se liguem ao endotélio juntamente
com carboidratos ligantes de selectinas, que também estão presentes na
membrana dos leucócitos. A interação entre os leucócitos e endotélio via

68
Imunobiologia UAB/Unimontes

selectina-ligante é fraca. A força exercida pelo movimento do sangue no


endotélio faz com que os leucócitos rolem ao longo da superfície endotelial
já que as ligações entre os leucócitos e o endotélio são repetidamente feitas
e desfeitas.
• Ativação dos leucócitos e aumento da afinidade dos receptores:
os leucócitos fracamente ligados podem se soltar se não forem ativados
por quimiocinas produzidas no local da inflamação. No local da infecção, Selectinas: são moléculas
as quimiocinas são transportadas para a superfície das células endoteliais de adesão presentes
nos leucócitos e células
ficando então expostas aos leucócitos. A ativação dos leucócitos ocorre no endoteliais. Os seus ligantes
momento em que as quimiocinas se ligam aos seus receptores presentes são os grupamentos de açúcar
presente nas glicoproteínas.
na superfície dessas células. Essa ativação é caracterizada pelo aumento da
afinidade das integrinas dos leucócitos por seus ligantes e agregação dessas Integrinas: são proteínas
presentes na membrana celular
moléculas na membrana. que participam das interações
• Interação forte entre os leucócitos e endotélio: Paralelamente entre células e entre células e
matriz extracelular.
à indução da expressão de selectinas, as citocinas também aumentam a
expressão dos ligantes de integrina nas células endoteliais. Os principais
tipos de ligantes de integrina são VCAM-1 (molécula de adesão da célula
vascular 1), que se liga à integrina VLA-4 e ICAM-1 (molécula de adesão
intercelular 1), que se liga às integrinas LFA-1 e Mac-1. A ligação entre
as integrinas e seus ligantes permite então que os leucócitos fiquem
firmemente aderidos ao endotélio.
Migração dos leucócitos para os tecidos: como dito anteriormente,
os leucócitos migram para o tecido segundo o gradiente de concentração
das quimiocinas. Os leucócitos podem atravessar a barreira endotelial
passando por entre as células, caracterizando a rota paracelular ou
atravessar as células endoteliais pela rota transcelular. A rota dominante é a
paracelular. A rota transcelular é favorecida quando a expressão de ICAM-1
é alta.
Nos tecidos, os leucócitos se acumulam no local da infecção e
fagocitam o microrganismo. A terminação da inflamação é um processo
essencial na manutenção da homeostase. Uma classe de moléculas que O rolamento dos leucócitos
participam deste processo é chamada de resolvinas. As “resolvinas” são seria possível se eles
interagissem fortemente com
mediadores locais que agem como anti-inflamatórios e imunoreguladores. as células endoteliais?
Estas moléculas atuam reduzindo o tráfego de leucócitos, regulando as
citocinas e a produção das espécies reativas de oxigênio.

69
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

ABBAS, A. K.; LITCHMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e


Molecular. 6 ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

70
UNIDADE 6
A RESPOSTA HUMORAL

A imunidade adquirida precisa ser ativada para participar da


resposta imunológica. A forma que os linfócitos B e T reconhecem o
antígeno e são ativados difere um pouco entre eles, mas sempre deve haver
a presença do antígeno. A necessidade do antígeno assegura que a resposta
adquirida será ativada de maneira específica, isto é, garante que apenas os
linfócitos específicos para aquele antígeno serão ativados.
Os linfócitos B são capazes de reconhecer antígenos de qualquer
natureza molecular: proteína, carboidrato, lipídeo, etc. Estes antígenos
podem estar associados à APCs ou livres na circulação ou tecidos. Por
outro lado, o linfócito T reconhece apenas antígenos de natureza proteica
e associados às APCs. Para a APC ser capaz de apresentar o antígeno
proteico, ele precisa ser processado, isto é, fragmentado em pequenos
peptídeos. Apenas peptídeos se encaixam na molécula apresentadora
e são reconhecidos pelo linfócito. Essa diferença no reconhecimento já
torna a resposta adquirida mais especializada, uma vez que os linfócitos
B reconhecem antígenos livres (extracelulares), e que os linfócitos T
reconhecem antígenos intracelulares ou fagocitados.
Nesta unidade, veremos a estrutura e as funções efetoras do
anticorpo. Em seguida, abordaremos como ocorre este reconhecimento
do antígeno pelos linfócitos B e sua ativação para se tornar um plasmócito.
Há aspectos comuns no reconhecimento do antígeno para
linfócitos B e T. A teoria dos sinais será abordada nesta unidade, e a geração
dos receptores dos linfócitos será abordada na próxima unidade, quando
estudarmos os linfócitos T.

6.1 Teoria dos Dois Sinais na Ativação dos Linfócitos

Os linfócitos T e B, principalmente os virgens, precisam de dois


sinais extracelulares distintos para serem ativados e iniciarem a proliferação
e diferenciação em células efetoras. O primeiro sinal é a ligação do
antígeno em receptores específicos nos linfócitos, sendo essencial para
garantir uma resposta imunológica específica. O segundo sinal é dado por
componentes da imunidade inata, como coestimuladores presentes nas
células apresentadoras de antígenos (APCs) e proteínas do complemento,
opsonizando partículas ou microorganismos na circulação. Este segundo
sinal é importante para garantir que a ativação do linfócito se dará de
maneira adequada e necessária. Os linfócitos virgens são os que precisam
de uma maior quantidade de segundo sinal, pois o limiar para ativação
é maior que em linfócitos efetores. A célula capaz de produzir a maior
quantidade de coestimuladores, logo a melhor célula para ativar linfócitos
virgens, é a célula dendrítica.

71
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Quando o linfócito efetor chega ao local de inflamação, ele


precisa novamente que a APC apresente o antígeno. Se a APC apresentar o
antígeno sem coestimulação, o linfócito não responderá contra o antígeno,
se tornando tolerante.
A quantidade de segundo sinal é essencial para o tipo de resposta
que o linfócito terá. Se não houver sinal suficiente, ou a célula pode se
tornar anérgica, isto é, não responder de maneira funcional, ou ela morre
por apoptose. Em ambos os casos, também há o desenvolvimento de
tolerância imunológica.

6.2 O Anticorpo

Os anticorpos são proteínas produzidas por linfócitos B encontrados


tanto na circulação, tecidos e locais mucosos, quanto na membrana celular
do linfócito virgem como receptores. Quando presentes na membrana, são
os receptores que reconhecem o antígeno, ativando o linfócito e iniciando
a resposta humoral. Após a ativação do linfócito B virgem, este se diferencia
em plasmócitos secretores de anticorpos. Quando secretados, os anticorpos
se ligam aos antígenos extracelulares e efetuam a resposta humoral por
vários mecanismos até a eliminação do antígeno. Os mecanismos efetores
da resposta humoral geralmente dependem da interação do anticorpo
com outros componentes da resposta imunológica, como as proteínas do
sistema do complemento, mastócitos e fagócitos.

6.2.1 Estrutura Molecular dos Anticorpos

A elucidação da estrutura do anticorpo foi importante para


compreensão de seu mecanismo de ação e de como é a organização
gênica dos receptores a antígenos dos linfócitos B e T.
Os anticorpos são glicoproteínas e formados de cadeias de
aminoácidos (polipeptídeos) com uma pequena região de carboidrato,
que é adicionada durante seu enovelamento. Os anticorpos secretados são
idênticos aos presentes na membrana de linfócitos B como receptores, com
exceção da região C-terminal. No último, a região é hidrofóbica (isto é,
interage com lipídeos) para ancorar a molécula na membrana da célula.
Na forma secretada, esta região é hidrofílica, facilitando sua secreção. Os
anticorpos foram primeiro identificados como membros de uma família de
proteínas chamadas gamaglobulinas, por isso também são chamados de
“imunoglobulinas” (Ig).
As moléculas de anticorpo possuem uma forma semelhante à
letra Y e são compostas por quatro cadeias polipeptídicas. Destas cadeias,
duas são chamadas de cadeias pesadas (H) e duas são cadeias leves (L) por
causa de seus pesos moleculares (figura 01.A). Cada cadeia leve está ligada

72
Imunobiologia UAB/Unimontes

a uma cadeia pesada por pontes dissulfeto. As cadeias pesadas também


estão ligadas entre si por pontes dissulfeto, estabilizando as moléculas de
anticorpo.
Tanto as cadeias leves quanto as pesadas possuem regiões
homólogas repetidas com aproximadamente 110 aminoácidos, chamadas
“domínios Ig” (figura 32.B), que formam folhas betas enoveladas de
maneira globular. Muitas outras moléculas presentes nas células imunitárias
possuem esse domínio e são classificadas como moléculas da superfamília
das Igs. Trabalhos de análise genômica mostram que estas moléculas têm
uma origem comum e foram se divergindo ao longo da evolução.

Figura 32: Estrutura do anticorpo. A) Desenho esquemático mostrando as cadeias leves


em azul claro e as cadeias pesadas em azul escuro. Sítio de ligação do antígeno está des-
tacado em amarelo. Fonte: DaMata, JP, 2010 B) Diagrama em forma de fita. As cadeias
pesadas estão em vermelho e azul, enquanto as cadeias leves estão em verde e amarelo.
Sítio de ligação do antígeno e um dos domínios Imunoglobulina (Ig) em destaque. C’:
carboxi-terminal.; N’: amino-terminal; V: variável; C: constante; L: leve; H: pesada.
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Antibody_IgG2.png Acesso: 09/09/2010

No final dos braços do anticorpo, as cadeias leves e pesadas


possuem regiões chamadas de variáveis (V) que quando pareadas formam
os sítios de ligação do antígeno (figura 01). Esta variabilidade é importante
na especificidade do anticorpo, pois modificações na região variável levam
à mudanças na afinidade por diferentes moléculas. O restante da molécula
é relativamente conservado, sendo chamada de região constante (C). A
região efetora se encontra na “perna” do anticorpo e é responsável pelas
funções citadas acima. Entre a “perna” e os “braços” do anticorpo existe
uma região chamada de dobradiça que permite abrir ou fechar o ângulo
dos “braços”, facilitando a ligação aos antígenos.
A relação de função e estrutura dos anticorpos foi primeiro
estudada com mais detalhe por Rodney Porter com imunoglobulinas de
coelho purificadas e tratadas com enzimas proteolíticas. A incubação
com as enzimas geraram fragmentos com diferentes propriedades, tanto
estruturais quanto funcionais. Ele observou que, quando tratadas com uma
enzima chamada papaína sob condições controladas, imunoglobulinas são

73
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

quebradas, gerando 3 fragmentos (figura 02.A). Dois destes fragmentos são


idênticos e capazes de se ligarem ao antígeno recebendo o nome de Fab
(do inglês, fragment, antigen binding). O terceiro fragmento consiste no
restante das cadeias pesadas, unidas pela ponte dissulfeto. Estes fragmentos
têm tendência a se autoassociar e cristalizar, por isso foram chamados de
Fc (do inglês, fragment crystallizable). Ao usar outra enzima, chamada
pepsina, a quebra gera um fragmento F(ab’)2, que contém os dois sítios
de ligação de antígenos juntos, mas a região Fc é degradada (figura 33.B).

Figura 33: Tratamentos enzimáticos nos anticorpos. A) Tratamento com papaína gera 3
fragmentos, preservado o sítio de ligação dos antígenos e a região efetora do anticorpo.
B) Tratamento com pepsina fragmenta a região Fc, mas preserva as Fab unidas. Fab - Frag-
mento de ligação do antígeno; Fc - Fragmento cristalizável.
Fonte: DaMata, JP, 2010

Quando determinaram a estrutura dos anticorpos pela cristalografia,


os imunologistas foram capazes de observar em detalhes a organização
da molécula. Eles observaram que a região variável contém regiões que
apresentavam uma variação ainda maior e foram chamadas de regiões
hipervariáveis (HV, do inglês hypervariable) (figura 03). É principalmente por
estas regiões que o anticorpo faz contato mais íntimo com a molécula de
antígeno, por isso também podem ser chamadas de regiões determinantes
de complementaridade (CDR, do inglês complementary determinat
region). As maiores mudanças no sítio de ligação do antígeno se encontram
nas CDRs, pois essa ligação íntima com o antígeno permite aumentar a
especificidade do anticorpo.
Os testes enzimáticos para estudar as estruturas dos anticorpos não
funcionam para qualquer anticorpo, pois as regiões constantes variavam.
Isso mostra que há diferentes tipos de anticorpos. Após alguns estudos,
foram descritas diferentes classes ou tipos de anticorpos.

74
Imunobiologia UAB/Unimontes

Figura 34: Destaque da Fab do anticorpo para ressaltar regiões hiper-


variáveis contidas no sítio de ligação do antígeno. VH - domínio
variável da cadeia pesada; CDR - região de complementariedade ou
hipervariáveis; VL - domínio variável da cadeia leve.
Fonte: Adaptação de commons.wikimedia.org/wiki/File:Antibody_
IgG2.png e http://en.wikipedia.org/wiki/File:Hypervariabledomains.
PNG Acesso: 21/08/2010

6.2.2 Classes ou Isotipos de Anticorpos

As moléculas de anticorpos podem ser divididas em classes ou


isotipos, e subclasses ou subtipos, com base nas diferenças de estrutura nas
regiões C das cadeias pesadas. Nos seres humanos e camundongos existem
5 classes de imunoglobulinas: IgA, IgD, IgE, IgE e IgM. Destas classes, a
IgA e IgG podem ser divididas em subclasses. Em seres humanos a IgA é
subdividida em IgA1 e IgA2, e a IgG é dividida em IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4.
Em camundongos, a subdivisão da IgA é igual a dos seres humanos, mas a
IgG é dividida em IgG1, IgG2a, IgG2b e IgG3. Estas subclasses estão ligadas
umas às outras pela semelhança da sequência dos aminoácidos na região C
e, muitas vezes, as funções se sobrepõem.
Em várias ocasiões, as cadeias pesadas são designadas pela letra do
alfabeto grego correspondente à classe do anticorpo. As cadeias da IgA são
designadas a, da IgD são d, IgE, e, IgG, g e IgM por m.
As cadeias leves também podem ser divididas por classes, mas há
apenas duas descritas até hoje em camundongos e seres humanos, a k e a
l. O anticorpo tem apenas um tipo de cadeia leve de cada vez, isto é, ou
o anticorpo possui cadeias leves k ou cadeias l. Não foram descritas ainda
diferenças de funções entre elas.

6.2.3 Funções Efetoras dos Anticorpos

Estamos constantemente produzindo anticorpos, mesmo sem


estarmos com infecções. Essa produção dos chamados anticorpos naturais
aumenta a proteção contra infecções, principalmente nas mucosas.

75
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Os anticorpos exercem um papel essencial no combate de


microorganismos extracelulares, como fungos e certas bactérias. Defeitos em
sua produção resultam em um aumento da susceptibilidade do indivíduo.
As principais vacinas utilizadas estimulam a produção de anticorpos para o
combate de agentes infecciosos. Ao mesmo tempo, são responsáveis pela
resposta alérgica e por algumas doenças autoimunes, podendo se tornar
nocivos para o indivíduo.
Vejamos agora os principais mecanismos efetores dos anticorpos
resumidos na FIG. 35:

Figura 35: Principais mecanismos efetores dos anticorpos. A) A neutralização


impede toxinas e microorganismos de se ligarem em receptores das células do
hospedeiro. B) Opsonização, facilitando a fagocitose. C) Ativação do complemen-
to promove opsonização ou lise. D) Indução de morte de células infectadas ou
microorganismos por células do sistema imune. E) Degranulação de mastócitos,
eosinófilos ou basófilos, eliminando microorganismos uni- ou multicelulares.
Fonte: DaMata, JP & de Oliveira, LS, 2010

• Neutralização de microorganismos e toxinas microbianas: ocorre


através da ligação do anticorpo ao microorganismo ou toxina, bloqueando
a ligação destes aos receptores das células do hospedeiro. Este bloqueio
impede a infecção por certos microorganismos ou o efeito destrutivo da
toxina em seus alvos.
• Opsonização: recobrimento de partículas (antígenos) por
anticorpos, facilitando a fagocitose. Assim como as proteínas do
complemento, os anticorpos também facilitam o reconhecimento dos
microorganismos pelos fagócitos.
• Ativação do sistema do complemento: como já descrito, a via
clássica do sistema do complemento é dependente de anticorpos. Sua

76
Imunobiologia UAB/Unimontes

ativação pode levar à quebra da proteína C3 em C3a e C3b, mediando


a inflamação e opsonização, respectivamente. Outra consequencia desta
ativação é a lise de microorganismos pelo MAC se a partícula não for
fagocitada antes.
• Citotoxicidade celular dependente de anticorpo (ADCC, do inglês
antibody-dependent cell-mediated cytotoxicity): anticorpos recobrem
células estranhas facilitando a ação de células NK e outros leucócitos. As
células reconhecem os anticorpos ligados e são estimuladas a produzirem
citocinas, como o IFN-g, e destruir estas células. Já foi demonstrada a
importância desse mecanismo em manter baixa a infecção por HIV em
humanos.
• Hipersensibilidade imediata: o reconhecimento de anticorpos
ligados a patógenos pode levar à ativação de mastócitos e eosinófilos,
desencadeando a liberação do conteúdo de seus grânulos. Ela ocorre poucos
minutos depois do contato com o antígeno, daí seu nome. É responsável
pelas respostas alérgicas, em que a degranulação leva à liberação da
histamina e de outras enzimas vasoativas, provocando vasodilatação e
exsudação. Também é importante contra helmintos, que são grandes demais
para serem fagocitados, e seus tegumentos são relativamente resistentes
aos produtos microbicidas liberados por macrófagos e neutrófilos. As
consequências deste tipo de resposta dependem da via de entrada, tipo de
antígeno, e da intensidade da resposta imune.
Um resumo das funções específicas de cada classe está descrita no
QUADRO 01:

Fonte: Adaptado de Abbas, A. K., Litchman, A. H., Pillai, S. Imunologia Celular e


Molecular. 6a Edição. Editora Saunders Elsevier (2008) e R. A. Goldsby, T. J. Kindt, e
B. A. Osborne. Kuby Immunology, 4a Edição, Editora W. H. Freeman and Co.

77
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

6.3 Reconhecimento de Antígenos pelos Linfócitos B

6.3.1 Interação do Antígeno com o Anticorpo

Voltemos um pouco para o antígeno. Antígeno é toda aquela


molécula que gera resposta imune. Pode ser de várias naturezas
moleculares, isto é, pode ser proteína, carboidrato, lipídeo, etc. O
anticorpo é capaz de reconhecer moléculas de todas essas classificações,
enquanto que as moléculas dos linfócitos T reconhecem apenas antígenos
de origem proteica. Os linfócitos podem ligar-se a várias moléculas, mas
apenas alguns antígenos são reconhecidos e capazes de ativar os linfócitos.
Os antígenos que são capazes de gerar uma resposta imune são chamados
de “imunogênicos” ou “imunógenos”.
O linfócito B reconhece macromoléculas de diversas maneiras. Há
situações em que a molécula se liga no receptor, mas não consegue ativar
o linfócito B devido a seu tamanho diminuto. Para induzir uma resposta
contra estas pequenas moléculas, os imunologistas ligam uma proteína a
esta pequena molécula que, então, adquire um tamanho adequado para
ativar a produção de anticorpos. Neste caso, a pequena molécula se chama
hapteno e a proteína é uma carreadora. Esta técnica é muito utilizada para
produção de anticorpos em laboratórios e na criação de vacinas.
Outra forma de aumentar o tamanho do antígeno é transformando-o
em multivalente. Quando o antígeno é grande, como uma macromolécula
ou um microorganismo, apenas uma parte dele se encaixa no receptor. Esta
parte se chama “epitopo” ou “determinante” e apenas ela é reconhecida
no antígeno. Em uma macromolécula ou microorganismo há vários
determinantes possíveis, basta um anticorpo reconhecê-lo. Quando o
antígeno possui vários epitopos idênticos, ele é chamado de polivalente
ou multivalente. Um exemplo deste tipo de antígeno são as moléculas de
DNA.
Os sítios de ligação dos antígenos na maioria dos anticorpos
são planos para melhor acomodar o epitopo de macromoléculas em sua
conformação terciária. Isto permite o reconhecimento do antígeno sem
necessidade de processamento, como ocorre com os linfócitos T.

6.3.2 Resposta do Linfócito B ao Reconhecimento do Antígeno

A forma que o linfócito B reconhece o antígeno indica como


será a resposta humoral. A natureza do antígeno, o envolvimento ou
não de linfócitos T, se já houve exposição prévia do antígeno, o local de
reconhecimento. Todas essas variáveis são importantes para determinar o
tipo e a quantidade de anticorpos secretados pelos plasmócitos.

78
Imunobiologia UAB/Unimontes

Os linfócitos B presentes nas regiões foliculares dos órgãos


linfoides periféricos geram uma resposta imunológica contra antígenos
proteicos e precisam do auxílio de linfócitos TH. Já as células B presentes
na zona marginal destes órgãos reconhecem e respondem contra antígenos
polivalentes de natureza variada, como polissacarídeos, sem a necessidade
do envolvimento dos linfócitos T.
Os linfócitos B podem reconhecer os antígenos solúveis ou
associados às células. Antígenos solúveis, ou livres na circulação sanguínea
ou linfa, podem entrar no folículo e serem reconhecidos pelos linfócitos B.
Geralmente os antígenos são capturados por células dendríticas ou fagócitos,
sendo interiorizadas. As células dendríticas são capazes de processar o
antígeno para apresentação aos linfócitos T ou podem simplesmente
apresentar o antígeno de forma intacta em sua membrana, permitindo o
reconhecimento pelo linfócito B.
As moléculas responsáveis pelo reconhecimento do antígeno
são anticorpos das classes IgM ou IgD ligados à membrana do linfócito B,
chamados individualmente de “receptor da célula B” ou “BCR” (do inglês,
B cell receptor). Próximas ao BCR estão moléculas chamadas de Iga e Igb,
responsáveis por iniciar uma cascata de sinais que seguem para o núcleo,
promovendo a ativação do linfócito após o reconhecimento do antígeno.
A associação do BCR com as cadeias Iga e Igb forma o “complexo BCR”
(figura 36).

Figura 36: Complexo BCR. Composto pelo receptor de antígeno


(BCR) e das cadeias Iga e Igb, que possuem motivos chamados
de ITAM. Estes motivos são responsáveis por iniciar a cascata de
transdução de sinais.
Fonte: DaMata, JP & de Oliveira, LS, 2010

Os sinais de ativação são produzidos apenas quando duas ou


mais moléculas de receptor são reunidas, formando ligações cruzadas com
antígenos multivalentes (figura 06.A). Uma forma de acentuar a ativação é
através da ligação de antígenos opsonizados pela molécula C3b do sistema

79
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

do complemento. O linfócito B possui um receptor que reconhece a


molécula do complemento, chamada CR2 (do inglês, complement receptor
2) ou CD21. Mais duas moléculas estão associadas ao CR2, chamadas CD19
e CD81, que também são capazes de iniciar uma cascata de transdução de
sinais até o núcleo. As três moléculas são muitas vezes referidas como co-
receptores dos linfócitos B. O reconhecimento pelo linfócito B do antígeno
opsonizado induz a aproximação das moléculas do correceptor com a Iga
e Igb, aumentando a cascata de ativação (figura 06.B).
A ativação dos linfócitos B desta maneira acarreta a proliferação
(expansão clonal) e diferenciação em células secretoras de anticorpos
(plasmócitos). Esta forma independente de linfócito T gera plasmócitos
capazes de secretar anticorpos IgM, que já são expressos como receptores
nos linfócitos virgens. A produção de anticorpos d e outras classes só ocorre
quando o linfócito B é ativado com auxílio do linfócito TH.

Figura 37: A) Ligação cruzada de BCR em antígenos polivalentes. B) Papel de proteínas


do complemento na ativação do linfócito B. O receptor CR2 reconhece a proteína do
complemento enquanto o anticorpo reconhece o antígeno.
Fonte: DaMata, JP & de Oliveira, LS, 2010

Uma segunda função descrita do receptor do linfócito B é a


interiorização do antígeno, permitindo seu processamento. No caso
do reconhecimento de antígenos proteicos, eles serão processados em
peptídeos e apresentados para os linfócitos T auxiliares CD4+. Se o linfócito
T reconhecer este antígeno apresentado, ele auxilia na ativação do linfócito
B com consequências bastante diferentes da resposta independente do
linfócito T.
Na resposta dependente de linfócitos T ocorrem os seguintes
eventos:
• Reconhecimento do antígeno proteico pelo linfócito T: as células
dendríticas trazem antígenos dos tecidos ou os capturam nos próprios órgãos
linfoides periféricos e, juntamente com segundos sinais, os apresentam para
linfócitos T auxiliar específicos. O linfócito T ativado é induzido a proliferar,
expressar uma molécula chamada CD40L e secretar citocinas. Eles também

80
Imunobiologia UAB/Unimontes

iniciam uma migração em direção aos folículos, que concentra linfócitos B.


• Reconhecimento do antígeno pelo linfócito B: como descrito
anteriormente, o linfócito B é capaz de reconhecer macromoléculas de
natureza diversa. Ao reconhecer este antígeno através do receptor, ele
pode interiorizar o antígeno e processá-lo. Se o antígeno for composto, pelo
menos em parte, por proteínas, o processamento irá gerar peptídeos que
poderão ser apresentados para os linfócitos T auxiliares CD4+. Enquanto
ocorre o processamento do antígeno, o linfócito B migra em direção da
zona rica em linfócitos T.
• Encontro das células B e T e interações da CD40 e citocinas: Na
região entre os folículos e a zona rica em linfócitos T, os dois linfócitos
ativados anteriormente se encontram e interagem de maneira dependente
de diversas moléculas. Ao ser ativado, o linfócito T começa a expressar
CD40L, que se liga ao CD40 expresso nos linfócitos B e secretar citocinas
que serão reconhecidas pelos linfócitos B. A ligação CD40L-CD40, mais a
comunicação por citocinas, levam o linfócito B a aumentar a proliferação
e estimula a produção de anticorpos de outros isotipos. Esta mudança
da classe de anticorpo é chamada de “troca isotípica” e ocorre apenas
quando o linfócito B interage com a célula T. Este aumento na proliferação
de linfócitos B acarreta na formação dos centros germinativos dos folículos
secundários.
• Troca isotípica dos anticorpos do linfócito B: com o estímulo do
linfócito T, os linfócitos B começam a produzir anticorpos de diferentes
classes, como IgA, IgE e IgG. A classe a ser produzida depende da citocina
secretada pelo linfócito T (figura 07). Essa troca isotípica é extremamente
importante, pois gera mecanismos efetores diferentes para diferentes
tipos de antígenos extracelulares. Esta troca isotípica se dá principalmente
pela mudança no rearranjo dos genes responsáveis pelas regiões efetoras
(constante) das cadeias pesadas (Figura 38).

Figura 38: Influência das citocinas produzidas por linfócitos T auxiliares na


troca isotípica de linfócitos B. A formação da região variável ocorre durante
o processo de maturação. A troca isotípica ocorre após a secreção de citoci-
nas pelo linfócito TH que estiver auxiliando na ativação do linfócito B.
Fonte: DaMata, JP, 2010

81
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Além de produzir outras classes de anticorpos, os linfócitos B


podem passar por um processo denominado “maturação por afinidade”.
Este é um processo que reativa a formação de receptores dos linfócitos B na
tentativa de aumentar a afinidade ao antígeno no sítio de ligação. Ocorre
por mutações somáticas dos genes responsáveis pela formação da região
variável dos anticorpos, seguida pela sobrevivência seletiva dos linfócitos B
que conseguirem produzir anticorpos com a maior afinidade.
• Diferenciação da célula B em plasmócito ou célula de memória:
após todas essas interações e modificações que ocorrem no linfócito,
ele está pronto para se diferenciar. Parte destas células resultantes da
proliferação celular que sobreviveu irão começar a secretar anticorpos,
se tornando então plasmócitos Muitos ficam retidos nos próprios tecidos
linfoides, mas alguns caem na circulação. Outra parte dos linfócitos B se
tornará células de memória e sobreviverão sem a necessidade do antígeno
por vários anos.

ABBAS, A. K.; LITCHMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e


Molecular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

JANEWAY, C. A.; TRAVERS, P.; WALPORT, M.; SHLOMCHIK, M.


Imunobiologia. O sistema imune na saúde e na doença. 5. ed. Porto
Alegre: Editora Artmed, 2002.

82
UNIDADE 7
RESPOSTA IMUNE MEDIADA POR LINFÓCITOS T

Nesta unidade abordaremos como ocorre o reconhecimento do


antígeno pelos linfócitos T. Começaremos abordando o processamento do
antígeno pela APC e como ocorre a apresentação, até como o linfócito
reconhece o antígeno. Veremos também a importância de outras moléculas
no reconhecimento e ativação dos linfócitos, tanto B quanto T. No final
da unidade será discutido como os linfócitos agem após reconhecerem o
antígeno.

7.1 Apresentação de Antígenos pelas APCs para os Linfóci-


tos T

As principais funções dos linfócitos T são: ativação de células e defesa


contra microorganismos intracelulares. No caso do TH, seus mecanismos
efetores são resultado da liberação de citocinas que coordenam a resposta
imune. Os CTLs, por outro lado, interagem de maneira mais íntima com
a célula infectada, reconhecendo-a e eliminando-a. Para que os linfócitos
T sejam capazes de efetuar suas funções, eles precisam interagir com
outras células, sejam células infectadas ou células da imunidade, como os
macrófagos, células dendríticas e linfócitos B.
Os linfócitos T são ativados apenas quando o antígeno está
associado a uma célula apresentadora de antígeno (APC). Nas APCs,
a função de apresentar os antígenos para os linfócitos T é das proteínas
especializadas codificadas por genes em um locus chamado complexo
principal de histocompatibilidade (MHC, do inglês major histocompatibility
complex).

7.1.1 Complexo Principal de Histocompatibilidade (MHC)

A descoberta do complexo principal de histocompatibilidade se


deu através de estudos genéticos para esclarecer a rejeição de transplantes.
Na década de 1940, George Snell e colaboradores realizaram estudos em
diferentes linhagens de camundongos isogênicos e mostraram que a rejeição
de enxertos tinha um fundo genético. Em seus estudos, Snell realizava
enxertos em animais de uma mesma linhagem e observou que eram bem
sucedidos (figura 01, esquerda). Contudo, ao colocar o enxerto vindo de
outra linhagem, havia a rejeição (figura 01, direita). Como a única variação
presente nestes testes era a diferença genética entre os camundongos, Snell
concluiu que a rejeição era dependente da variação gênica. Linhagens isogênicas: são
O próximo passo foi tentar localizar os genes responsáveis por esta camundongos que possuem as
sequencias do DNA idênticas.
rejeição. Foi observado que estes genes estavam localizados num locus
que se descobriu extremamente polimórfico, resultando em uma grande

83
Letras/Português Caderno Didático - 5º Período

variação (diversidade) dos genes entre os indivíduos. Este polimorfismo é


uma adaptação evolutiva, pois aumenta a chance de haver indivíduos que
consigam responder melhor contra uma determinada infecção, garantindo
a sobrevivência da espécie.

Figura 39: Rejeição de enxertos tem fundo genético. Esquema representa


duas linhagens de camundongos idênticos geneticamente, exceto pelos
alelos do MHC (linhagens A e B). Quando o enxerto é em indivíduos da
mesma linhagem, o enxerto é aceito (esquerda). Quando o enxerto é em
indivíduos de linhagens diferentes, ocorre a rejeição do tecido.
Fonte: DaMata, JP, 2010

Durante 20 anos, a única função descrita para o MHC foi


a interferência no sucesso de um transplante, sem os imunologistas
conseguirem encontrar uma função “natural” para ele, já que o transplante
era algo induzido artificialmente. Apenas nas décadas de 1960 e 1970
foram realizados estudos que identificaram a função destes genes. As
APCs apresentariam o antígeno proteico, após processá-los em peptídeos
O que são genes polimórficos e colocá-los na molécula de MHC. Foi demonstrado que o receptor do
e qual a relação das proteínas linfócito T é específico para complexos peptídeo-molécula MHC do
de MHC com a rejeição de
hospedeiro, sendo então essencial para uma resposta celular.
transplantes?
Como então ativar o linfócito T citotóxico (T CD8+) ou o auxiliar
(T CD4+) nas diferentes ocasiões que são preferíveis? Apesar de haver um
polimorfismo muito grande de moléculas de MHC, estas se dividem em
dois grandes grupos: as moléculas de classe I e as moléculas de classe II.
Estes grupos possuem proteínas com estruturas diferentes, mas homólogas.
As moléculas de classe I apresentam peptídeos para linfócitos T CD8+
(CTLs), ao passo que as moléculas de classe II apresentam para linfócitos T
CD4+ (TH).

84
Imunobiologia UAB/Unimontes

Todos os mamíferos e a maioria dos vertebrados possuem os genes


de MHC, sendo que os melhores estudos são com camundongos e seres
humanos. Os genes identificados como genes do MHC de classe I em
camundongos (chamados H-2K, H-2D e H-2L) são homólogos aos presentes
nos seres humanos (HLA-A, HLA-B e HLA-C, sendo HLA abreviação do
inglês human leukocytic antigens ou antígenos leucocitários humanos). O
mesmo é observado nos genes do MHC de classe II, com os genes murinos
(I-A e I-E) sendo homólogos aos humanos (HLA-DP, HLA-DQ e HLA-
DR). Outros genes que contribuem em menor escala para a rejeição de
transplantes são chamados de genes secundários de histocompatibilidade.
Eles também são importantes para o reconhecimento do antígeno pelo
linfócito, mas não se encontram no locus do MHC.
Os genes do MHC são expressos de maneira codominate, isto
é, para cada gene do MHC, ambos os alelos herdados são expressos.
O resultado é a expressão do numero máximo de moléculas de MHC
disponíveis para a apresentação dos peptídeos aos linfócitos.

7.1.2 Estrutura Molecular do MHC

As moléculas do MHC de classe I e de classe II possuem algumas


características estruturais em comum, mostrando sua homologia.
A estrutura geral das moléculas de MHC consiste em duas cadeias
polipeptídicas, uma fenda ou sulco onde há o encaixe do peptídeo,
regiões de domínio Ig e regiões hidrofóbicas que ancoram a molécula
na membrana celular da APC. As regiões polimórficas da molécula se
encontram justamente na região da fenda, resultando na apresentação de
diversos peptídeos, reconhecidos pelos linfócitos T. O restante da molécula
é não polimórfica, isto é, conservada em sua sequência e estrutura.
As moléculas de MHC de classe I (figura 02.A) são formadas por
duas cadeias polipeptídicas ligadas de forma não covalente à cadeia a,
codificada pelo MHC, e à cadeia b2- microglobulina, não codificada
pelo MHC. Apenas a cadeia a está ancorada na membrana celular, na
extremidade carboxi-terminal (C’). Na sua extremidade amino-terminal (N’),
os segmentos a1 e a2 interagem para formar a fenda de ligação peptídeo.
Esta fenda é pequena e fechada, permitindo que apenas moléculas com
cerca de 8 a 11aminoácidos se liguem. Mais em direção ao C’ há um
domínio Ig, idêntico em todas as moléculas de classe I, onde a molécula
do CD8 do linfócito se liga. Esta ligação garante que o reconhecimento do
peptídeo se dê por linfócitos citotóxicos.
As moléculas de classe II (figura 02.B) apresentam duas cadeias
polipeptídicas codificadas pelo MHC, a cadeia a e a cadeia b. Elas estão
ligadas de forma não-covalente e ambas possuem, na região C-terminal,
uma região hidrofóbica para se ancorarem na membrana. As cadeias

85
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

possuem estruturas semelhantes, sendo que ambas são responsáveis pela


formação da fenda peptídica. Cada cadeia possui domínios Ig, denominados
segmentos a2 e b2, no último ocorrendo a ligação da molécula CD4,
presente em linfócitos T auxiliares.

Figura 40: Estrutura molecular das moléculas de MHC. A) Molécula de classe I, mostrando
as regiões a1, a2 e a3 da cadeia a, e a cadeia b2-microglobulina. Linha preta representa
ancoragem da molécula. B) Moléculas de classe II, mostrando as regiões a1, a2 da cadeia
a, bem como as regiões b1 e b2 da cadeia b. Linha preta representa ancoragem da
molécula.
Fonte Adaptação de imagens disponíveis em http://commons.wikimedia.org/wiki/
File:MHC_Class_I_v2.png e http://commons.wikimedia.org/wiki/File:MHC_Class_II_
v2.png Acesso: 21/08/2010

As moléculas de MHC possuem uma especificidade ampla para a


ligação de peptídeos. Cada molécula do MHC, classe I ou II, possui apenas
uma fenda peptídica, que acomoda apenas um peptídeo por vez. Contudo,
vários peptídeos podem se ligar na fenda. Os peptídeos que se ligam em
uma determinada fenda possuem características estruturais em comum,
permitindo o encaixe. Esta habilidade mostra que a célula apresentadora
não diferencia um peptídeo estranho de um peptídeo derivado do próprio
corpo, e a especificidade da resposta adquirida é pelo reconhecimento do
Expressão constitutiva: é a antígeno pelo linfócito.
expressão gênica constante A expressão das moléculas de MHC em uma célula determina
para uma determinada
característica, produzindo se antígenos estranhos serão identificados pelos linfócitos. As moléculas
sempre a proteína. de MHC de classe I apresentam peptídeos vindos do citoplasma, como
peptídeos alterados presentes em células tumorais ou infectadas por
bactérias citoplasmáticas e vírus. Como qualquer célula nucleada está
sujeita a se ser infectada por um vírus ou se tornar tumoral, qualquer célula
nucleada expressa constitutivamente moléculas de MHC classe I. Esta
restrição por antígenos presentes no citoplasma está ligada à função do
linfócito T citolítico, que é eliminar células infectadas ou tumorais.

86
Imunobiologia UAB/Unimontes

As moléculas de MHC de classe II geralmente são encontradas


apenas em células dendríticas, macrófagos, linfócitos B e poucos outros
tipos celulares. Estas células são chamadas de “APCs profissionais”, pois são
capazes de interiorizar e processar antígenos. Assim, as moléculas de MHC
de classe II apresentam peptídeos processados no interior de fagossomos.
A principal função dos linfócitos auxiliares CD4+ é auxiliar na fagocitose
e eliminação de antígenos extracelulares por macrófagos e auxiliar na
produção de anticorpos por linfócitos B.
A seguir temos um resumo das propriedades das moléculas de
MHC discutidas (quadro 01).

Fonte: DaMata, JP, 2010

Uma característica do reconhecimento pelos linfócitos T é a


chamada “restrição ao MHC próprio”. Linfócitos T reconhecem antígenos
peptídicos apenas quando estes estão associados às moléculas de MHC
do próprio indivíduo. Esta se mostrou uma das principais razões para a
rejeição de transplantes.

7.1.3 Processamento do Antígeno pelas Células Apresentadoras de


Antígeno

A ligação do peptídeo na fenda da molécula de MHC é dependente


de um processamento do antígeno, permitindo que ele fique no tamanho
correto para a apresentação ao linfócito. Cada classe de molécula do
MHC recebe o peptídeo, uma via de processamento distinta, devido aos
diferentes locais de origem do antígeno.
Começaremos explicando o processamento de antígenos
endocitados para apresentação via MHC de classe II (figura 03).
A endocitose de partículas e microorganismos é realizada por
algumas células, sendo que os macrófagos e células dendríticas são as mais

87
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

eficientes. Após a interiorização, os antígenos se localizam no interior de


vesículas chamadas endossomos ou fagossomos. Estas vesículas se fundem
aos lisossomos, formando os fagolisossomos. Os componentes do lisossomo
permitem a degradação enzimática da partícula ou microorganismo no
interior do fagolisossomo.
Ao mesmo tempo, há a biossíntese das cadeias da molécula
de MHC de classe II no retículo endoplasmático rugoso. Elas passam
pelo processo de enovelamento com a ajuda de proteínas denominadas
“chaperonas”. Para formar o heterodímero com as cadeias a e b, e essa
ligação se manter estável até a associação do peptídeo, uma molécula
chamada cadeia invariante ou Ii se liga ao heterodímero. A Ii é um trímero,
não-polimórfico, que estimula a agregação das cadeias da molécula de
MHC. Uma parte da Ii se liga na fenda do peptídeo, e uma segunda parte
forma uma alça fora da fenda.
Após a formação dos complexos de cadeias do MHC de classe
II com a Ii, estes são levados por vesículas para o aparato de Golgi, que
direciona as moléculas para os fagossomos e fagolisossomos e se fundem.
Juntamente com estes complexos, são carregadas pelas vesículas moléculas
denominadas, nos seres humanos, HLA-DM. Por causa do pH ácido e das
enzimas proteolíticas presentes no fagolisossomo, a parte em forma de
alça da Ii é quebrada, permanecendo apenas a região ligada à fenda da
molécula do MHC, agora denominada CLIP. O HLA-DM funciona como
um trocador de peptídeos, facilitando a remoção do CLIP para a entrada
de peptídeos do antígeno endocitado. A ligação do peptídeo ao complexo
deixa a interação entre as cadeias a e b mais estável.
Após o encaixe do peptídeo na molécula de MHC de classe II,
o complexo está pronto para ser apresentado. O fagolisossomo se funde
à membrana celular e o complexo fica ancorado à membrana. Qualquer
molécula não ancorada à membrana é liberada para o meio extracelular.

88
Imunobiologia UAB/Unimontes

Figura 41: Processamento de antígenos para apresentação via MHC de


classe II. A) Fagocitose da partícula. B) Geração do fagossomo com lisos-
somo se aproximando. C) Fusão do fagolisossomo e liberação de enzimas
proteolíticas. Degradação da partícula. D) Produção da molécula de MHC
classe II (azul) e adição da Ii na fenda peptídica. Molécula em laranja:
HLA-DM. E) Vesícula leva moléculas de MHC ao aparato de Golgi, que
por sua vez dirige as moléculas para o fagolisossomo. F) Fusão da vesícula
com fagolisossomo, Quebra da Ii. G) Troca da CLIP pelo peptídeo facilita-
do pela HLA-DM. H) Fusão do fagolisossomo com membrana plasmática e
exposição do complexo molécula MHC-peptídeo.
Fonte: DaMata, JP, 2010

Os peptídeos que são apresentados por moléculas de MHC de


classe I são derivados de proteínas citoplasmáticas (figura 04). A grande
maioria dessas proteínas é sintetizada de maneira endógena pela célula.
A síntese proteica ocorre no citoplasma, bem como a degradação de
proteínas velhas e defeituosas.
As proteínas são marcadas para a degradação por uma proteína
chamada ubiquitina, que leva a proteína até o “proteassomo”. O
proteassomo é um complexo enzimático em forma de barril formado por
proteínas estruturais e enzimas proteolíticas. Ao chegar ao proteassomo, a
ubiquitina se solta da proteína alvo, que entra no barril para ser degradada. A
ubiquitina é reutilizada para marcar novas proteínas que serão degradadas.
À medida que a proteína passa pelo proteassomo, ela vai sendo degradada,
tornando-se vários peptídeos. Estes saem e se direcionam para o retículo
endoplasmático rugoso.
Na membrana do retículo endoplasmático há duas proteínas,
TAP1 e TAP2 (TAP, do inglês transporter associated with antigen processing,
ou transportador associado a processamento de antígenos) que agem como
portas seletivas para peptídeos originados no proteassomo. No interior
do retículo, as TAPs estão associadas às cadeias a e b2- microglobulina.
Assim, quando o peptídeo entra no retículo, ele tem a associação com as
moléculas de MHC de classe II facilitada.

89
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Após a associação do peptídeo e formação do complexo, ele


é levado por vesículas para o aparato de Golgi, que o direciona para a
membrana plasmática, se fundindo com a mesma.

Peptídeos gerados no
citoplasma podem ser
apresentados por moléculas de
MHC de classe II e peptídeos
gerados no fagolisossomo pode
ser apresentado por moléculas
de MHC de classe I? Justifique.

Figura 42: Processamento de antígenos para apresentação via MHC de


classe I. A) Marcação da proteína pela ubiquitina, encaminhando-a para o
proteassomo. B) Degradação da proteína em peptídeos pelo proteassomo.
Os peptídeos se dirigem para o retículo endoplasmático rugoso (RER). C)
Os peptídeos entram no RER com ajuda de 2 proteínas (TAP 1 e TAP 2). D)
Dentro do RER a molécula de MHC está ligada à TAP. O peptídeo se liga à
molécula de MHC. E) O complexo peptídeo-molécula de MHC é levado
por vesícula ao aparato de Golgi, que o encaminha para a membrana celu-
lar. F) A vesícula se funde à membrana, expondo o complexo.
Fonte: DaMata, JP, 2010

A regulação da expressão de moléculas de MHC está intimamente


ligada a citocinas. Algumas citocinas como o interferon gama (IFN-g) são
capazes de aumentar a produção de moléculas de MHC de classe II.
Este aumento no número de moléculas permite a apresentação de mais
peptídeos para os linfócitos T, aumentando ou melhorando a resposta
imunológica.

7.2 Reconhecimento do Antígeno pelo Linfócito T

A ativação do linfócito T e o início da resposta adquirida


celular requerem o reconhecimento do antígeno pelo linfócito T. Este
reconhecimento é específico tanto para o antígeno quanto para a molécula
de MHC, pois o receptor se liga em ambos (figura 05). O receptor que
reconhece o complexo peptídeo-MHC é chamado de “receptor da célula T”
(TCR, do inglês T cell receptor). Como cada linfócito, ou clone, reconhece
apenas um antígeno, todos os TCRs em uma célula são específicos para o
mesmo antígeno. Cada célula tem sua própria especificidade, e geração
dessa diversidade será discutida mais adiante.

90
Imunobiologia UAB/Unimontes

Figura 43: Ligação do TCR ao complexo peptídeo-molécula do


MHC. A interação do receptor do linfócito T (TCR) se dá tanto
com epitopos do peptídeo, quanto com as regiões variáveis da
molécula de MHC.
Fonte: DaMata, JP, 2010

O linfócito expressa outros receptores em sua membrana que não


reconhecem antígenos, mas também são importantes na resposta contra o
antígeno. Esses receptores são chamados de “moléculas acessórias” e pos-
suem diversas funções, desde ajudar na ativação das células e na adesão
entre os linfócitos e APCs, até na adesão para migração das células T para
o local da inflamação.
Geração dos Receptores dos Linfócitos
A geração das regiões variáveis únicas nos anticorpos e TCRs ocor-
rem por um processo chamado de “recombinação somática”, ou “recombi-
nação V(D)J”. A região variável de cada cadeia pesada e leve das imunoglo-
bulinas e de cada cadeia a e b dos TCRs é codificada em vários pedaços de
genes ou segmentos gênicos na linhagem germinativa. Os segmentos são
definidos como V (de variável), D (de diversidade) e J (de junção), havendo
múltiplas cópias de cada segmento.
A diversidade do repertório é gerada durante a união de segmen-
tos V, D e J de forma aleatória enquanto o linfócito está amadurecendo.
Durante a formação da cadeia pesada do anticorpo ou a cadeia b do TCR Linhagem germinativa: é a
dos linfócitos, enzimas específicas juntam um segmento D com J, eliminan- sequência de DNA transmitida
da célula germinativa para as
do os segmentos entre eles, para em seguida juntar um segmento V com o células somáticas.
DJ da mesma maneira. Apenas durante a transcrição e processamento, isto
é, quando for sintetizar o mRNA, é que os segmentos C da cadeia constan-
te serão unidos ao agrupamento VDJ formado (figura 06). O locus onde se
encontra os genes responsáveis pela geração da cadeia leve do anticorpo
ou a cadeia a do TCR não possui a região D. Assim, durante a recombina-
ção, o segmento V se liga diretamente a um segmento J.

91
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Outro mecanismo que atua junto com a recombinação é a chama-


da “diversidade juncional”, que também aumenta o número de receptores
diferentes possíveis, pois retira ou adiciona de maneira aleatória nucleotí-
deos nos locais de recombinação. Após a produção de um receptor antigê-
nico funcional, ocorre um fenômeno chamado “exclusão alélica”, em que
a célula deixa de expressar o outro alelo herdado que codifica as cadeias
pesada e leve do anticorpo ou a cadeia b do TCR.
Esta recombinação somática gera o alto repertório que observamos
nos repertórios dos linfócitos sem ocupar um espaço enorme no genoma.

Figura 44: Recombinação somática para a formação da cadeia b do TCR em humanos. A)


Recombinação ocorre a partir da linhagem germinativa. B) Junção D-J, com eliminação
dos nucleotídeos entre os segmentos juntados. C) Junção V-DJ, com a retirada da região
entre os segmentos a serem unidos. D) Após a transcrição e processamento do mRNA, a
região constante também se junta aos fragmentos unidos, gerando um mRNA maduro.
Não são representados todos os segmentos V, D, J e C presentes no locus.
Fonte: DaMata, JP, 2010

Como é um processo aleatório, ocorre a produção de receptores


não funcionais ou que reconhecem antígenos próprios com muita afinida-
de. Para evitar que estes linfócitos terminem de amadurecer e que saiam da
medula óssea ou timo, as células passam por processos de seleção negativa.
Linfócitos que formaram seus receptores são testados por APCs presentes
nos órgãos linfoides centrais. Se os receptores se ligarem aos peptídeos

92
Imunobiologia UAB/Unimontes

apresentados com uma afinidade alta, estas células são eliminadas por
apoptose ou passam por edição do receptor (apenas linfócitos B). Para os
linfócitos serem testados com antígenos vindos de vários lugares do corpo
além do timo e da medula, as APCs possuem um fator de transcrição cha-
mado AIRE que as permite produzir proteínas de outros locais do corpo.

7.2.2 O Receptor da Célula T - TCR


O que ocorreria se trocássemos
O TCR presente nas células T CD4+ (auxiliares) e T CD8+ (citolí- o timo de um camundongo
isogênico ainda antes de
ticos) é um heterodímero com duas cadeias polipeptídicas, uma chamada nascer pelo o timo de outro
a e a outra chamada b. camundongo da mesma
idade, mas de outra linhagem
As cadeias a e b possuem semelhanças na estrutura com os an- isogênica?
ticorpos e as moléculas de MHC. Possuem regiões constantes e regiões
variáveis, domínios Ig, e uma região hidrofóbica que ancora a molécula na
membrana (figura 07). As regiões variáveis (V) contêm regiões que concen-
tram polimorfismos entre os diferentes TCR, chamadas regiões determi-
nantes de complementaridade (CDRs), também presentes nos anticorpos.
Cada cadeia possui 3 CDRs, que juntas formam a parte do TCR responsável
pelo reconhecimento do antígeno. Linfócitos com receptores ab só reco-
Não confundir com as cadeias
nhecem peptídeos associados ao MHC, então respondem apenas a esta das moléculas de MHC. Estas
classe de antígenos. cadeias são ligadas por pontes
dissulfetos e estão ancoradas
Há uma classe de linfócitos “não convencionais” que possuem na membrana do linfócito.
receptores com cadeias diferentes, chamadas g e d, e são negativos para
os receptores descritos acima e CD4 ou CD8. Estes linfócitos possuem as
mesmas moléculas acessórias que os linfócitos T ab, mostrando que são
ativados de forma semelhante. As cadeias g e d são semelhantes estrutu-
ralmente aos linfócitos ab, mas possuem uma variabilidade no bem menor
repertório.
São produzidos ao longo do desenvolvimento, com diferentes gru-
pos de regiões V. Não se sabe se esses subgrupos apresentam diferentes
funções, mas acredita-se que as diferentes regiões V reconheçam diferen-
tes antígenos. Já foram descritas várias atividades biológicas, incluindo a
produção e secreção de citocinas e lise de células alvo também caracterís-
ticas dos linfócitos T ab.
Os linfócitos T gd não se ligam aos complexos peptídeo-MHC e
não são restritos ao MHC. Já foi descrito que alguns destes linfócitos re-
conhecem lipídeos comuns em micobactérias e outros microorganismos,
apresentados por moléculas semelhantes às moléculas de MHC chamadas
MHC de classe I “não-clássicas”. Também já foi descrito linfócitos T gd
que reconhecem antígenos proteicos e não-proteicos que não precisam ser
processados por APCs. Por serem comuns em tecidos epiteliais e mucosas,
imunologistas acreditam que estas células seriam importantes para iniciar
uma resposta imunológica contra um pequeno número de microorganis-
mos presentes nestes locais, antes mesmo da ativação e recrutamento de
linfócitos T convencionais.

93
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 45: Complexo TCR. Seus componentes são: o


TCR (receptor da célula T), dois heterodímeros de CD3
e duas cadeias ζ (zeta).
Fonte; DaMata, JP & de Oliveira, LS, 2010.

7.2.3 Moléculas Acessórias dos Linfócitos T

A afinidade do TCR pelo complexo peptídeo-MHC é baixa, isto


é, eles não ficam ligados por muito tempo. Essa baixa afinidade talvez ex-
plique a necessidade de moléculas acessórias que estabilizem a ligação
dos linfócitos T às APCs. Esta estabilidade garante a ativação dos linfócitos,
acionando uma cascata de sinalização que leva sinais ao núcleo para iniciar
o processo de diferenciação e multiplicação dos linfócitos. As moléculas
acessórias e o TCR se movem de maneira coordenada com seus respectivos
ligantes associados, formando uma estrutura denominada “sinapse imuno-
lógica”. Esta sinapse permite a transdução de sinais que ativa o linfócito.
Além de moléculas de adesão, há também moléculas acessórias
responsáveis por traduzirem os sinais que levam à ativação dos linfócitos.
Estas moléculas chamadas CD3 e cadeias z formam, juntamente com o
TCR, o “complexo TCR” (figura 45).

7.2.3.1 CD3 e cadeias ζ

As proteínas CD3 e ζ estão associadas de maneira não covalente


ao heterodímero do TCR e, enquanto o TCR reconhece o complexo pep-
tídeo-MHC, elas são responsáveis por iniciarem a cascata de sinalização
que leva à ativação das células T. Possuem uma região extracelular curta,
uma região hidrofóbica e uma porção intracitoplasmática. Tanto as CD3
quanto as cadeias ζ são idênticas em todos os linfócitos T, independente da
especificidade da célula.

94
Imunobiologia UAB/Unimontes

Cada cadeia polipeptídica do CD3 e ζ possui em sua porção ci-


toplasmática uma região conservada conhecida como “motivo de ativação
do imunorreceptor baseado em tirosina” (ITAM, do inglês immunoreceptor
tyrosine-based activation motif). Este motivo possui tirosinas em sua sequ-
ência e são importantes no início da transdução de sinais.
Estes ITAMs também estão presentes em moléculas chamadas Iga
e Igb, que correspondem à CD3 e ζ nos linfócitos B. Estas duas molécu-
las, juntamente com o anticorpo na membrana do linfócito B, formam o
complexo BCR. O anticorpo ancorado na membrana também é designado
receptor da célula B (BCR).
A expressão do complexo TCR na membrana dos linfócitos só
ocorre se houver a síntese de todos seus componentes. Havendo falha na
síntese de qualquer um de seus componentes, o linfócito não é capaz de
reconhecer antígenos e é eliminado durante o processo de maturação no
timo. O mesmo ocorre com o complexo BCR do linfócito B.

7.2.3.2 Co-receptores CD4 e CD8

As moléculas CD4 e CD8 são proteínas presentes no linfócito T


conhecidas como correceptores. Elas são assim chamadas por se ligarem
às regiões não polimórficas das moléculas do MHC, ao passo que o TCR se
liga ao complexo peptídeo-MHC na APC (figura 46). Esta ligação auxilia na
transdução de sinais pelo complexo TCR durante a ativação do linfócito T.
Além disso, também reforçam a ligação entre as duas células.

Figura 46: Interações dos correceptores CD8 e CD4 com as molécu-


las de MHC. A) Ligação do CD8 presente no linfócito citolítico (CTL)
na molécula de MHC de classe I da célula apresentadora de antíge-
no (APC). Fonte: DaMata, JP, 2010 B) Ligação do CD4 presente no
linfócito auxiliar (TH) na molécula de MHC de classe II na APC. Fonte:
DaMata, JP, 2010 C) Modelo representativo das interações moleculares
do TCR (azul) e correceptor (verde) ao MHC (em rosa e laranja) com
peptídeo (vermelho).
Fonte: Adaptação de imagem disponível em http://commons.wikime-
dia.org/wiki/File:TCR-MHC_bindings.png Acesso 09/09/2010

95
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

O CD4 se liga ao segmento 2 da cadeia da molécula de MHC de


classe II, enquanto o CD8 se liga ao segmento 3 da cadeia da molécula
de MHC de classe I. Desta maneira, a ligação seletiva garante que células
T CD4+ respondam apenas a peptídeos associados ao MHC de classe II,
e células T CD8+ respondam apenas a peptídeos associados ao MHC de
classe I.

7.2.3.3 Receptores de Coestimuladores

Uma propriedade importante dos linfócitos B e T, principalmen-


te os virgens, é que eles precisam de dois sinais para serem ativados. O
primeiro sinal seria o antígeno, e o segundo sinal seria componentes da
imunidade inata, como os coestimuladores.
Os coestimuladores melhor estudados, “B7-1” (ou CD80) e “B7-2”
(ou CD86), são expressos em células dendríticas, macrófagos e linfócitos B,
também conhecidos como APCs profissionais. O primeiro receptor no lin-
fócito T descrito capaz de reconhecer estes coestimuladores foi o “CD28”.
Este receptor é um homodímero com domínios Ig, expresso em linfócitos
virgens e alguns efetores. Quando ligado ao coestimulador, promove sinais
de ativação para o linfócito T, produção de moléculas antiapoptóticas e
produção de fatores de crescimento e outras citocinas. O segundo receptor
descrito capaz de ligar nos coestimuladores B7 é o “CTLA-4” (ou CD152).
Este homólogo ao CD28 é expresso em linfócitos recém ativados, mas pos-
sui funções opostas do CD28. O CTLA-4 está envolvido na finalização da
resposta imunológica, pois inibe os sinais de ativação dos linfócitos. Não
se sabe ainda como os dois receptores liberam sinais opostos, mesmo se
ligando às mesmas moléculas.
Outras moléculas acessórias bem estudadas são:
a) CD40 Ligante (ou CD40L ou CD154): presente em linfócitos T
CD4 , estas moléculas se ligam ao CD40 presentes em macrófagos, linfóci-
+

tos B, células dendríticas e endoteliais. A ligação de CD40L ativa as células


que expressam o CD40.
a) Fas Ligante: presente em linfócitos T efetores, se liga ao Fas
(ou CD95) de células alvo, induzindo a apoptose. É também importante
na eliminação de células T que são estimuladas de maneira repetida por
antígenos.

7.3 Mecanismos efetores dos linfócitos T

Os linfócitos T auxiliares e os linfócitos T citotóxicos diferem no


seu mecanismo de ação. A seguir descreveremos os mecanismos efetores
de cada uma dessas classes de linfócitos.

96
Imunobiologia UAB/Unimontes

7.3.1 Células T auxiliares

As células T auxiliares, ou células TH, estão envolvidas na ativação


e direcionamento de outras células do sistema imune. Essas células não
têm atividade citotóxica ou fagocítica e não são capazes de matar células
infectadas ou patógenos.
As células T auxiliares são essenciais em determinar a mudança de
classe dos anticorpos nas células B, na ativação e crescimento das células T
citotóxicas e no aumento da capacidade bactericida dos fagócitos. Como já
falamos, o principal marcador das células T auxiliares é o CD4 e, por isso,
essas células são chamadas de CD4+.
As células T CD4+ possuem TCR com afinidade pelo MHC classe
II, que estão presentes principalmente nas células apresentadoras de antí-
genos.
Após a ativação, as células T auxiliares se proliferam e produzem
IL-2. Esta atua na própria célula produtora e em células T auxiliares vizi-
nhas, direcionando a proliferação e expansão clonal dessas células. A IL-2
também é necessária para a ativação das células T CD8+ como discutire-
mos adiante. As células T auxiliares em proliferação podem se diferenciar
em células T auxiliares efetoras, células T auxiliares de memória e células
T auxiliares reguladoras. As células T auxiliares efetoras estimulam e in-
teragem com outras células imunes e produzem citocinas, proteínas ou
peptídeos.
As células T CD4+ ativadas podem se diferenciar em TH1 ou TH2,
dependendo do ambiente de citocinas. O IFN-γ induz a diferenciação em
TH1, ao passo que IL-4 e IL-10 direcionam a diferenciação para TH2.
A diferenciação em células TH1 ocorre em resposta à infecção por
microrganismos que ativam macrófagos e células NK. O IFN-γ produzido
pelas células NK e a IL-12 ,produzida pelos macrófagos e células dendríti-
cas, induzem a diferenciação das células TH0 em TH1. As células TH1 estão
envolvidas na imunidade celular aumentando as funções dos macrófagos e
ativando as células T CD8+ (figura 47). Além disso, as células TH1 efetoras
expressam moléculas de adesão e receptores de quimiocinas, que as dire-
cionam para os locais de infecção participando do processo de inflamação.

97
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 47: Esquema de diferenciação das células Th0 em Th1 e Th2 e de ativação das
células T CD8+. Após reconhecimento do antígeno a célula Th0 CD4+ pode se diferen-
ciar em Th1 ou Th2, que participam de respostas diferentes.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

A diferenciação em TH2 ocorre em resposta a alérgenos e infecção


por helmintos. Tanto os alérgenos quanto os helmintos causam uma esti-
mulação persistente das células T com pouca ativação dos macrófagos. O
linfócito B é a principal célula apresentadora de antígeno que induz a dife-
renciação em TH2. A IL-4 produzida em pequena quantidade pelas células
TH0, mas de forma persistente, induz a diferenciação em TH2. Além disso,
outras células como os mastócitos também podem produzir IL-4 e partici-
par da diferenciação das células TH2. As células TH2 estimulam as células B
a se proliferarem e produzirem anticorpos.
Duas novas populações de linfócitos TH que estão na mira dos
imunologistas são as TH17 e Treg. Várias outras populações também já fo-
ram descritas, como a TH9 e TH22, mas pouco se sabe a respeito delas,
então não as abordaremos.
As células TH17 são pró-inflamatórias. Suas principais citocinas são
IL-17, IL-21 e IL-22. Estas citocinas são capazes de promover ações como
aumentar o recrutamento celular para o infiltrado inflamatório, aumentar
a meia vida das células atuando em respostas inflamatórias, promover o
remodelamento do tecido, hematopoiese, angiogênese, entre outros. Sua
função é vista como uma faca de dois gumes, uma vez que já foi observado
que ela facilita metástase e doenças autoimunes. Sua diferenciação é de-
pendente de citocinas como a TGF-ß, IL-21 e IL-6. Tem sido alvo de muitos
estudos para melhor compreender suas funções.
Outra população de células T CD4+ que abordamos inúmeras ve-
zes foi a Treg. Estas células possuem funções apostas à população da TH17,
pois estão ligadas à resposta de imunossupressão. É capaz de produzir ci-
tocinas como IL-10, que inibem a resposta imunológica. Também promove
morte celular de linfócitos e células da imunidade inata, sendo capaz de
liberar perforina e granzima.

98
Imunobiologia UAB/Unimontes

7.3.2 Células T citotóxicas ou citolíticas (CTL)

As células T citotóxicas são células CD8+ que são capazes de in-


duzir a morte em células infectadas ou células tumorais. A maioria das cé-
lulas T citotóxicas expressa TCRs que reconhecem antígenos apresentados
pelas moléculas MHC classe I.
A ativação das células T citotóxicas é semelhante à ativação das
células T auxiliares, sendo dependente de interações entre diversas molé-
culas expressas na superfície da APC e da célula T. Como já falado, o CD8
interage com o MHC classe I (primeiro sinal), e o CD28, também presente
na célula T citotóxica, interage com os coestimuladores CD80 e CD86 das
APCs. A IL-2 ativa a expansão clonal da célula T citotóxica que cai na circu-
lação e viaja pelo corpo até encontrar uma célula que esteja apresentando
um antígeno.
O mecanismo efetor da célula T citotóxica é semelhante ao me-
canismo efetor das células NK descrito na unidade sobre imunidade inata.
Ao encontrar a célula apresentando um antígeno, as células T citotóxicas
liberam perforinas e granzimas que matarão a célula alvo por lise ou apop-
tose, tornando-a importante contra células infectadas por vírus e tumorais.
Além disso, é uma importante fonte de IFN-γ.
Um importante mecanismo de ação das células TH1 e CTL é a “hi-
persensibilidade do tipo tardia” (DTH, do inglês delayed-type hypersensibi-
lity), em que a resposta aparece de maneira exacerbada cerca de 48 horas
após o contato com o antígeno. Ela será discutida com mais detalhes na
Unidade IX, quando todos os tipos de hipersensibilidade serão discutidos.

ABBAS, A. K.; LITCHMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e


Molecular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

JANEWAY, C. A.; TRAVERS, P.; WALPORT, M.; SHLOMCHIK, M.


Imunobiologia. O sistema imune na saúde e na doença. 5. ed. Porto
Alegre: Editora Artmed, 2002.

99
UNIDADE 8
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

regulação da resposta imune pela tolerância

Um dos campos mais férteis e de crescente interesse dos imuno-


logistas tem sido esclarecer o funcionamento da tolerância imunológica.
Como o próprio nome já diz, ela remete a uma ausência de resposta imu-
nológica, mesmo na presença de um antígeno. Esta alta de reatividade é
antígeno-específica, resultante de uma exposição prévia deste antígeno.
Ocorre tanto com antígenos do próprio organismo, quanto com antígenos
estranhos e também com os antígenos obtidos na alimentação ou respira-
ção. Quando um antígeno induz tolerância, ele é chamado de “tolerogê-
nico”.
O termo tolerogênico é utili- A autotolerância, isto é, a tolerância a antígenos comuns dentro
zado para distinguir antígenos
que não induzem resposta do organismo, é extremamente importante para o bom funcionamento
imunológica dos que são capa- do sistema imune. Ocorre porque normalmente um linfócito que reco-
zes de induzi-la, os chamados
imunogênicos. nhece um antígeno próprio é destruído, inativado, suprimido ou tem sua
especificidade alterada (este último ocorrendo em linfócitos B durante a
maturação).
A tolerância pode ser induzida de várias maneiras, dependendo
do local no corpo, concentração do antígeno e estado de maturação do
linfócito. Com a elucidação destes conceitos, a indução da tolerância tem
sido explorada para abordagens terapêuticas, tentando prevenir respostas
imunológicas indesejáveis.
Nesta unidade introduziremos os conceitos atuais de tolerância
imunológica, exemplificando com a tolerância oral e as relações materno-
-fetal e materno-recém-nascido. Também discutiremos as doenças autoi-
munes que ocorrem quando a autotolerância falha.

8.1 Formas de Induzir a Tolerância

A tolerância ocorre através do reconhecimento do antígeno por


linfócitos específicos (figura 01). Estes linfócitos podem ser imaturos ou
não. Quando os linfócitos ainda se encontram nos órgãos linfoides primá-
rios (medula óssea e timo), isto é, ainda estão em processo de maturação,
eles passam por um processo chamado “tolerância central”. Nestes locais,
os linfócitos ainda estão gerando seus receptores e, como este processo é
aleatório, podem surgir receptores que reconheçam antígenos próprios.
Para assegurar que os linfócitos não saiam maduros e prontos para agir
contra o próprio organismo, as APCs presentes no timo e na medula óssea
apresentam antígenos próprios para eles. Estas APCs apresentam antígenos
de vários locais do corpo, ubíquos ou amplamente disseminados. Quando
o linfócito reconhece o antígeno apresentado pela APC nos órgãos linfoi-
des periféricos, ele é eliminado por apoptose (processo também conhecido
como “deleção clonal”). No caso do linfócito B, ele pode ainda passar por

100
Imunobiologia UAB/Unimontes

um processo denominado “edição de receptor”, em que a célula reativa


os genes para gerar uma nova molécula de imunoglobulina. Se esta segun-
da chance falhar novamente, o linfócito B é eliminado. Algumas células T
CD4+ podem, após reconhecer o antígeno próprio, se diferenciar em célu-
la T reguladora (Treg), que migra para a periferia e é importante para evitar
respostas contra antígenos do próprio corpo.

Por que antígenos estranhos


não são apresentados para os
linfócitos no timo ou na medu-
la óssea?

Figura 48: Consequências do reconhecimento de antígenos por linfócitos B ou T. Nos


órgãos centrais, a tolerância central pode ser gerada se os linfócitos que interagem
o antígeno com afinidade alta se tornam linfócitos T regulatórios (Treg) ou sofrem
deleção. Os linfócitos B podem passar por edição de receptores. Quando interagem
com baixa afinidade, terminam seu processo de maturação e se dirigem para os órgãos
periféricos para serem ativados. Nos tecidos periféricos, o contato com o antígeno
pode gerar tolerância periférica através da supressão por interação com Tregs, deleção
ou anergia, ou pode gerar a resposta efetora.
Fonte: DaMata, JP, 2010

Após os linfócitos saírem dos órgãos linfoides primários, eles se


dirigem para os órgãos linfoides secundários. Lá eles são ativados por antí-
genos e se dirigem para os tecidos periféricos para combater os antígenos.
A “tolerância periférica” é o processo que torna as células T maduras inca-
pazes de responder contra estes antígenos nos tecidos. Esta tolerância pode
ocorrer tanto contra antígenos próprios quanto com antígenos estranhos.
Há três formas de induzir a tolerância periférica: pela anergia, deleção ou
supressão dos linfócitos.
Como já vimos, para que ocorra a ativação do linfócito, são neces-
sários dois sinais: o antígeno e um componente da imunidade inata (como
os coestimuladores). Esta ativação do linfócito ocorre tanto nos órgãos pe-

101
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

riféricos (linfonodos e baço), quando o linfócito deixa de ser virgem para


se tornar efetor, quanto no tecido onde o antígeno se encontra, iniciando
a resposta efetora do linfócito. Se o antígeno não for reconhecido junta-
mente com ao segundo sinal, ocorre a “anergia”, ou não-responsividade
funcional. Acredita-se que a apresentação de antígenos próprios é realiza-
da sem os coestimuladores, induzindo a tolerância, podendo ocorrer tanto
nos tecidos linfoides periféricos, quanto em outros tecidos. O resultado da
anergia é alteração bioquímica ou genética que diminui a capacidade do
linfócito de responder contra estes antígenos.
Outra forma de induzir a tolerância periférica é pela “supressão”
dos linfócitos reativos pelas Treg. Estas células têm a função de suprimir as
respostas imunológicas de uma maneira geral, secretando citocinas como a
IL-10, eliminando por apoptose ou citólise as APCs e os linfócitos reativos,
entre outros mecanismos imunossupressores. Quando um linfócito é cons-
tantemente estimulado pelo antígeno, ou o reconhece sem o estímulo da
inflamação, ele sofre “deleção”, ou seja, é eliminado por apoptose. A au-
sência dos coestimuladores também é importante na indução de tolerância
por deleção. Um resumo sobre as características da indução de tolerância
estão na FIG. 48 e no QUADRO 01.

Fonte: Adaptado de GHAFFAR, A. & NAGARKATTI, P. Immunology - Chapter sixte-


en. Tolerance and Autoimmunity.
Disponível em: http://pathmicro.med.sc.edu/ghaffar/tolerance2000.htm Acesso:
21/08/2010

Um aspecto da saúde humana que estaria ligado à tolerância, em


especial a periférica, é a associação do contato com antígenos durante a
infância e a incidência de asma e alergias. Dados mostram que o contato
com o antígeno durante a infância, principalmente via tratos respiratório e
digestivo, é essencial para reduzir as chances do indivíduo de apresentar
estas patologias. Estudos epidemiológicos revelaram que a prevalência de
alergia era menor em crianças que cresceram em ambientes rurais quan-
do comparadas com crianças de ambientes urbanos. Outro fator que teve

102
Imunobiologia UAB/Unimontes

correlação com proteção contra alergias na infância era o contato com


animais de estimação. A “hipótese da higiene” explica estas observações
criando uma ligação entre a exposição em um ambiente mais enriquecido
de microorganismos e a proteção a alergias e asma. Acredita-se que esta
relação ocorre por causa da ativação de linfócitos efetores nas mucosas
durante a infância, gerando uma maturação adequada dos linfócitos Treg,
consequentemente um ambiente de tolerância nas mucosas e epitélio.

8.2 Tolerância Oral

A tolerância oral é a supressão específica da imunidade adquirida


contra um antígeno que foi administrado previamente via oral. Acredita-se
que este mecanismo evoluiu para impedir reações do sistema imunológico
contra proteínas da dieta alimentar ou antígenos da microbiota presente
nas mucosas. Ela também é importante por gerar mecanismos que supri-
mem reações contra antígenos próprios que poderiam se tornar patológi-
cas, prevenindo ou tratando doenças autoimunes.
Como discutido acima, para o mecanismo de tolerância, a con-
centração do antígeno também é importante para gerar a tolerância oral.
Uma dose alta do antígeno que entra pela mucosa tende a gerar tolerância,
enquanto uma dosagem pequena do antígeno tende a gerar uma resposta
imunológica. A grande dose de antígenos pode gerar uma produção de
citocinas que induzem as células Treg a inibirem a resposta imunológica
contra os antígenos.
O interessante a respeito da tolerância, particularmente da tole-
rância oral, é que seus efeitos são sistêmicos. Se o antígeno gerar tolerância
na mucosa, o corpo inteiro estará tolerante ao antígeno. Esta característica
tem sido o foco de muitas pesquisas clínicas, tentando induzir tolerância
contra alérgenos, doenças autoimunes e em transplantes. Porém, a maio-
ria dos testes tiveram resultados inesperados, mostrando a necessidade de
mais estudos.

8.3 Relação Materno-Fetal e Materno-Recém Nascido

Durante a gravidez típica dos mamíferos placentários, a mãe pas-


sa por uma relação especial de tolerância contra a placenta e o feto. O
feto é considerado um semialoenxerto, pois possui moléculas da mãe, mas
também possui moléculas herdadas do pai. A mãe deve desenvolver uma
tolerância contra a placenta/feto para não haver rejeição e consequente
aborto. Já foi observado que componentes da imunidade da mãe e do feto
agem em conjunto gerando esse balanço que resulta na tolerância. Ex-
perimentos em camundongos demonstraram que a supressão é específica
contra os aloantígenos de origem paterna e que ela também é passageira,
terminando após o nascimento do feto.

103
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

O feto possui vários mecanismos de driblar a resposta imunológica


da mãe. Podemos citar alguns como: a redução da concentração do ami-
noácido triptofano na região de contato do útero materno com a placenta
em formação; a produção de FasL que, ao se ligar com o Fas presente nos
linfócitos, induz a morte destas células. Um dos mais importantes meca-
nismos de evasão utilizado pelo feto é a ausência de moléculas de MHC
de classe II nas células do trofoblasto e a grande redução de moléculas de
MHC de classe I.
A mãe, por outro lado, desloca uma quantidade grande de células
Treg para a barreira mãe/placenta, mas foi observado que ela fica anérgica
às células do feto, durante toda a gestação, por todo o corpo. Acredita-se
que a presença de células fetais na circulação sanguínea, bem como a pre-
sença de células maternas na criança (mesmo após o nascimento) auxilia
nesta tolerância. Outro fator que poderia ajudar nesta anergia é a apoptose
do feto durante a morfogênese. Ainda há muito a estudar nesta temática,
mas sabemos que este balanço delicado é muito importante para evitar a
rejeição da criança, e ao mesmo tempo prover um ambiente adequado e
seguro para o desenvolvimento da mesma.
Quando não há tolerância suficiente da mãe pelo feto, os resulta-
dos mais frequentes são abortos espontâneos e pré-eclampsia.
Após o nascimento o feto sai de um ambiente de proteção da mãe
e entra em um ambiente repleto de microorganismos. O papel da mãe
agora é protegê-lo enquanto seu sistema imunológico é imaturo.
Durante o parto, a prole se depara com microorganismos já no
canal vaginal, e em uma concentração ainda maior quando entra em con-
tato com a microbiota da região perianal. Estes microoganismos são seguros
para o neonato (recém-nascido), pois possuem baixa virulência, e até aju-
dam na imunossupressão na mãe. Estes microorganismos também auxiliam
na colonização da microbiota da criança, protegendo-a contra eventuais
microorganismos patogênicos.
A imunidade inata do neonato já funciona de maneira apropriada,
mas sua imunidade adquirida ainda está precária. Com isso, o leite mater-
no se torna imprescindível para o bom desenvolvimento da criança. No lei-
te materno, e principalmente no colostro, há uma grande concentração de
Lactoferrina: é uma proteína anticorpos maternos, que protegerão a criança nos primeiros meses. Além
presente no leite que se liga
a moléculas de ferro. Ela é de anticorpos, vários outros fatores importantes para o neonato estão pre-
capaz de entrar nos leucócitos sentes no leite materno. Como exemplo temos: a lactoferrina, componen-
e bloquear a produção de
citocinas pró-inflamatórias. tes de carboidratos que dificultam a infecção de alguns microorganismos
Também é capaz de matar patogênicos, e até mesmo células de defesa da mãe. A imunidade inata no
algumas bactérias, vírus e
Candida. recém-nascido é extremamente eficaz na adaptação ao novo ambiente,
produzindo compostos de várias naturezas na proteção das mucosas, pele
e outras regiões do corpo.

104
Imunobiologia UAB/Unimontes

8.4 Autoimunidade

A resposta autoimune faz parte do sistema imune normal, não


causando doenças devido ao fenômeno de tolerância imunológica aos
autoantígenos. Um baixo nível de autoimunidade pode ser considerado
benéfico como, por exemplo, no reconhecimento de células neoplásicas
pelas células T CD8+, reduzindo a incidência de tumores malignos.
A perda da autotolerância ou tolerância ao próprio ocorre pela
regulação anormal no processo de seleção dos linfócitos autorreativos ou
no modo como os autoantígenos são apresentados. A maior parte dos casos
de perda da autotolerância é decorrência da resposta de autoanticorpos
produzidos pelas células B. Entretanto, tem sido demonstrado o papel da
resposta anormal das células T no desenvolvimento das doenças autoimu-
nes, principalmente pelo fato de que muitas dessas doenças estão geneti-
camente associadas ao MHC e, como sabemos, a principal função do MHC
é apresentar antígenos para as células T.

8.4.1 Fatores genéticos associados a doenças autoimunes

Alguns indivíduos são geneticamente susceptíveis ao desenvolvi-


mento de doenças autoimunes. Essa susceptibilidade está associada a vá-
rios genes e fatores de risco. Vale ressaltar que indivíduos geneticamente
predispostos não necessariamente desenvolverão a doença autoimune.
Os três principais conjuntos de genes associados à susceptibilida-
de a doenças autoimunes são: imunoglobulinas, receptores de células T
e o MHC. Entre esses genes, a associação mais forte ocorre com os genes
do MHC, especialmente MHC classe II. O Quadro 2 mostra as principais
correlações conhecidas entre alguns alelos de MHC e doença autoimune.

Fonte: ABBAS, A. K.; LITCHMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e Mole-


cular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

105
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

8.4.2 Outros fatores associados a doenças autoimunes

Algumas doenças autoimunes, por exemplo o lúpus eritematoso


sistêmico, tem prevalência maior em mulheres. As razões para essa asso-
ciação com o sexo do indivíduo não são claras. Uma hipótese seria a in-
fluência hormonal e da gravidez já que ocorrem trocas de moléculas entre
a mãe e o filho.
Outros fatores que são sugeridos, por estarem envolvidos com o
aparecimento de doenças autoimunes, são: doenças infecciosas, alguns
medicamentos e substâncias químicas e até mesmo o ato de fumar. No
caso das doenças infecciosas, uma explicação seria que a resposta inflama-
tória no tecido infectado poderia promover a exposição de autoantígenos
que anteriormente não ficavam expostos.

8.4.3 Mecanismos de patogênese das doenças autoimunes

Alguns dos possíveis mecanismos de patogênese das doenças au-


toimunes são descritos abaixo:

A. Superantígenos: alguns organismos patogênicos produzem mo-


léculas chamadas de “superantígenos”. Essas moléculas são capazes de
ligar-se à cadeia ß do TCR de uma maneira não específica, ativando as
células T e, consequentemente, as células B para produção de anticorpos
policlonais que podem reagir com antígenos próprios (Figura 50).

Figura 50: Esquema da ligação da ativação de uma célula


T por um superantígeno.
Fonte: Adaptado de http://commons.wikimedia.
org/wiki/File:TCR-MCH-Superantigen.jpg Acesso:
21/09/2010

106
Imunobiologia UAB/Unimontes

B. Mimetismo molecular: quando um antígeno exógeno possui


uma estrutura similar a algum antígeno próprio, o anticorpo produzido
contra o antígeno exógeno pode reagir com o antígeno próprio, amplifi-
cando a resposta imune. Esse parece ser o mecanismo que acontece na
Febre Reumática, em que, após uma infecção estreptcócica, os antígenos
produzidos contra o Streptococcus reagem com antígenos do miocárdio
causando a miocardite.
C. Expressão de coestimuladores induzida por patógenos: Alguns
microrganismos podem induzir a expressão de moléculas coestimulado-
ras nas células apresentadoras de antígeno. Essas APCs podem apresentar
antígenos próprios às células autorreativas, quebrando a tolerância dessas
células e ativando-as.
Os tratamentos para as doenças autoimunes são baseados em imu-
nossupressores e anti-inflamatórios. Entretanto, esses tratamentos tendem
apenas a diminuir as lesões teciduais observadas, ou reduzir a ativação
imunológica. Algumas terapias imunomoduladoras vêm sendo testadas,
por exemplo, a utilização de antagonistas de TNF, agente para depleção
das células B, anticorpo antirreceptor de IL-6 e bloqueadores de coestimu-
ladores para o tratamento de artrite reumatóide.
Como o conhecimento das causas das doenças autoimunes ainda
é incompleto, é difícil inserir terapias mais específicas. O avanço no enten-
dimento destas patologias permitirá, por exemplo, elaborar alguma terapia
que iniba os linfócitos específicos ou que ative linfócitos T reguladores para
os antígenos próprios.

107
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

ABBAS, A. K.; LITCHMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e


Molecular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevie, 2008.

JANEWAY, C. A.; TRAVERS ,P.; WALPORT, M. Imunobiologia. O sistema


imune na saúde e na doença. 5ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.

108
Unidade 9
Reações do sistema imune: hipersensibilidade
e rejeição a transplantes

A hipersensibilidade ou reação de hipersensibilidade é uma res-


posta exagerada ou inapropriada do sistema imune normal. As reações
de hipersensibilidade são divididas em quatro grupos: hipersensibilidade
imediata (tipo I), mediada por anticorpos (tipo II), mediada por complexos
imunes (tipo III) ou mediada pelas células T (tipo IV).
Os mecanismos que causam as lesões nas reações de hipersensi-
bilidade são os mecanismos efetores da resposta imunológica normal, mas
Alérgenos: são antígenos que
não foram corretamente controlados. As reações de hipersensibilidade de- não são derivados de parasitas
senvolvem durante a resposta humoral ou mediada por células. e que estimulam a reação de
hipersensibilidade do tipo I em
Os indivíduos que apresentam este tipo de reação são denomi- indivíduos alérgicos.
nados de “hiper” sensível ao antígeno em particular. As doenças causadas
pelas reações de hipersensibilidade são difíceis de ser tratadas já que os
antígenos causadores dessas respostas são difíceis de ser eliminados.

9.1 Hipersensibilidade imediata ou tipo I

A hipersensibilidade imediata é mediada por anticorpos IgE pro-


duzidos em resposta a uma estimulação das células Th2 por alérgenos. Os
anticorpos IgE ligam aos receptores Fc presentes na superfície dos basófilos
e mastócitos. Uma nova exposição ao alérgeno faz uma reação cruzada
com as moléculas de IgE ligadas à membrana, promovendo a degranulação
e liberação de mediadores pelas células. Esses passos serão descritos com
mais detalhes a seguir (figura 51).
A hipersensibilidade mediada por IgE se desenvolve em três fases
distintas:

109
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 51: Etapas da reação de hipersensibilidade do tipo I. A hiper-


sensibilidade do tipo I começa com o reconhecimento de um antígeno
apresentado por um linfócito B, por um linfócito Th2 e consequente
ativação do linfócito B. O linfócito B produz IgE específica ao antígeno
que se liga a membrana de mastócitos. Uma nova exposição ao antíge-
no induzirá a degranulação do mastócito.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP,2010

• Sensibilização: Uma pequena fração da população produz alta quanti-


dade de IgE específicos para antígenos do ambiente e possui uma maior
quantidade de eosinófilos circulantes no sangue. Isso ocorre devido à
sensibilização que resulta da ativação de células T auxiliares Th2 por
antígenos apresentados e ativação de linfócitos B. As citocinas IL-4 e IL-
13 produzidas pelas células Th2 atuam nos linfócitos B estimulando-os
a produzir IgE. A IgE produzida em resposta ao contato contínuo com os
alérgenos se liga aos receptores Fc dos mastócitos e basófilos.
• Ativação: Reações cruzadas entre receptores de IgE, alérgenos multi-
valentes, anticorpos anti-IgE ou antirreceptor Fc ou agregados de IgE na
membrana dos mastócitos e basófilos estimulam a degranulação. Como
visto na unidade sobre sistema do complemento, C3a e C5a também
promovem a degranulação destes tipos celulares. Para que a degranu-
lação aconteça, os grânulos aumentam de tamanho e diminuem a den-
sidade. Os microfilamentos intracelulares movem os grânulos para a
superfície celular. A exocitose dos mediadores químicos presentes nos
grânulos ocorre com a fusão dos grânulos com a membrana plasmática.
• Fase efetora: Os mecanismos efetores observados na reação de hiper-
sensibilidade imediata são mediados por substâncias denominadas de
mediadores. Os mediadores pré-formados armazenados nos grânulos
citoplasmáticos são chamados de mediadores primários. Os mediado-
res que são sintetizados após a ativação das células para serem liberados

110
Imunobiologia UAB/Unimontes

são chamados de mediadores secundários. Várias classes de moléculas


podem atuar como esses mediadores. A histamina é uma amina vaso-
ativa. Alguns mediadores são proteínas, como as enzimas, a proteína
básica maior, etc. Os derivados do ácido araquidônico, como os leuco-
trienos, prostaglandinas e fator ativador de plaquetas são mediadores
derivados de lipídeos. Por fim, muitos mediadores são citocinas.
O QUADRO 1 resume as principais características dos mediadores
envolvidos na hipersensibilidade do tipo I.

Fonte: MURPHY, K.; TRAVERS, P.; WALPORT, M. Imunobiologia de Janeway. 7. ed.


Editora Artmed (2010) e ABBAS, A. K., LITCHMAN, A. H., PILLAI, S. Imunologia
Celular e Molecular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

A reação de hipersensibilidade imediata ou tipo I pode ser dividi-


da em duas fases: fase imediata e fase tardia.
Na “fase imediata”, a resposta se dá entre cinco a dez minutos
após a administração intradérmica e desaparece após uma hora. É observa-
da a formação de pápula e de um halo eritematoso. A pápula é um edema
mole formado pelo extravasamento do plasma dos vasos presentes no local

111
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

da injeção. O halo eritematoso é formado pela dilatação dos vasos e acú-


mulo das hemácias ao redor do local da administração do alérgeno. Essas
reações são dependentes de IgE e dos mastócitos (Figura 52).

A reação da fase tardia é


diferente da reação de hiper-
sensibilidade tardia (tipo IV)
que, como veremos adiante, é
caracterizada pela presença de
macrófagos e células Th1.

Figura 52: Fase imediata da reação de hipersensibilidade


do tipo I. As setas indicam os locais onde são observados
a pápula e o halo eritematoso.
Fonte: Adaptação de http://commons.wikimedia.org/
wiki/File:Allergies_-_When_nature_attacks.jpg Acesso:
21/08/2010

A “fase tardia” é caracterizada pelas reações que se desenvolvem


dentro de duas a quatros horas após a fase imediata e que podem persistir
por até dois dias. Nessa fase, há um acúmulo de células devido à infiltra-
ção de neutrófilos, eosinófilos, basófilos, macrófagos e células Th2 atraídos
pelas citocinas liberadas pelos mastócitos. Os eosinófilos são as principais
células efetoras da fase tardia. Essas células são ativadas pela ligação do
alérgeno coberto com anticorpos IgE ou IgE via receptores Fc. Os eosinófi-
los ativados liberam mediadores inflamatórios tais como a proteína básica
maior que causa o dano tecidual. O fator quimiotático de neutrófilos atrai
os neutrófilos para o local de degranulação.
A ocorrência das reações de hipersensibilidade do tipo I depende
da natureza e dose do antígeno, modo de apresentação do antígeno e das
características genéticas individuais.
A IL-4 tem um papel central na regulação da hipersensibilidade do
tipo I, pois promove a produção de IgE. Por contraste, células Th1 inibem
o desenvolvimento da hipersensibilidade do tipo I por meio da liberação
de IFN-g.
A asma brônquica, rinite alérgica e alergias alimentares são exem-
plos de doenças que estão relacionadas com o desenvolvimento de rea-
ções de hipersensibilidade do tipo I. A rinite alérgica e a asma são reações
de hipersensibilidade localizadas no trato respiratório. Essas doenças re-
sultam da reação de um alérgeno introduzido pelo trato respiratório na
mucosa nasal e no trato respiratório inferior respectivamente. Na asma, os
pacientes sofrem com broncoconstrição, produção de muco e consequen-
te dificuldade respiratória. Atualmente, tem sido observado um aumen-

112
Imunobiologia UAB/Unimontes

to na incidência da asma, principalmente em países desenvolvidos. Uma


possível explicação para este aumento da incidência da asma é que nos
países desenvolvidos a frequência de infecções por parasitas é muito baixa.
Como já discutido anteriormente, essa explicação faz parte da “hipótese
da higiene”.
Na alergia alimentar, os alérgenos derivados de alimentos induzem
a liberação de mediadores dos mastócitos na mucosa intestinal. Isso faz
com que haja um aumento dos movimentos peristálticos e da produção
de líquidos que levam o indivíduo a ter vômitos e diarréias. Alguns indi-
víduos apresentam também urticária que está associada a uma anafilaxia
sistêmica.
Algumas abordagens terapêuticas vêm sendo utilizadas para dimi-
nuir a quantidade de IgE específicas aos alergénos. A dessensibilização é
uma dessas abordagens em que pequenas doses do alérgenos são adminis-
tradas repetidamente por via subcutânea. Isso levaria à redução nos níveis
de IgE e aumento dos níveis de IgG.

9.2 Hipersensibilidade mediada por anticorpos ou tipo II

A reação de hipersensibilidade do tipo II envolve a destruição das


células ou tecidos mediada pelos anticorpos IgG ou IgM, que se ligam a an-
tígenos presentes na membrana da célula. O reconhecimento desses com-
plexos imunes formados em uma célula leva à ativação do complemento
ou morte da célula pelo mecanismo de ADCC, sobre o qual falamos em
outras unidades (Figura 53).

Figura 53: Mecanismo da reação de hipersensibi-


lidade do tipo II. A reação inicia com a ligação de
anticorpos a antígenos presentes na membrana de
uma célula. O reconhecimento desse complexo de
antígeno-anticorpo pelo sistema do complemento
ou células NK promove a morte da célula.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

As reações de transfusões sanguíneas ou doença hemolítica do


recém-nascido são exemplos de hipersensibilidade do tipo II.

113
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

O tipo sanguíneo é classificado pelo sistema ABO de acordo com


os antígenos expressos nas hemácias. Indivíduos com sangue A expressam
o antígeno A e possuem anticorpos anti-B; os com sangue tipo B expressam
o antígeno B e possuem anticorpos tipo-A; os com sangue AB expressam
os dois antígenos na superfície das hemácias e não possuem nenhum an-
ticorpo anti-A ou anti-B no sangue; já os indivíduos com sangue O não
expressam nenhum desses antígenos, mas possuem anticorpos anti-A e
anti-B. Assim, o sistema imune de um indivíduo reconhece os antígenos
diferentes do que ele expressa e monta uma resposta imune contra ele. Se
um indivíduo receber um tipo sanguíneo incompatível com o seu iniciará
uma processo conhecido como “reação de transfusão”, em que ocorrerá
hemólise intravascular das hemácias recebidas por meio da lise mediada
pelo complemento.
A “doença hemolítica do recém-nascido” é causada quando mo-
léculas de IgG da mãe específicos para antígenos do grupo sanguíneo do
feto (sistema Rh) atravessam a placenta e destroem as hemácias do feto.
Isso acontece quando a mãe não apresenta antígenos Rh (Rh negativo) e o
feto é Rh positivo. A doença hemolítica do recém-nascido é prevenida pela
administração de anticorpos anti-Rh na mãe.

9.3 Hipersensibilidade mediada por complexos imunes ou


tipo III

Os complexos imunes são os anticorpos associados ligados aos


antígenos. Os antígenos envolvidos nessa reação são antígenos solúveis,
diferente dos antígenos da reação de hipersensibilidade do tipo II que,
geralmente, estão fixados na membrana de alguma célula. A deposição de
complexos imunes nos vasos sanguíneos induz uma resposta inflamatória
mediada pelo complemento e por receptores Fc, causando lesão nos vasos
e tecidos adjacentes (figura 54).

Figura 54: Mecanismo da reação de hipersensibi-


lidade do tipo III. Esse tipo de hipersensibilidade é
semelhante à hipersensibilidade do tipo II, porém
os antígenos são solúveis.
Fonte: de Oliveira, LS & DaMata, JP, 2010

114
Imunobiologia UAB/Unimontes

A gravidade da reação de hipersensibilidade do tipo III depen-


de da quantidade de complexos imunes envolvidos, bem como dos locais
onde esses complexos se depositam no corpo. Os locais mais comuns de
deposição dos complexos imunes são os vasos sanguíneos, sinóvia das arti-
culações e membrana glomerular basal do rim.
Uma doença autoimune que exemplifica bem a ocorrência da re-
ação de hipersensibilidade do tipo III é o lúpus eritematoso sistêmico. Essa
doença atinge predominantemente as mulheres. Indivíduos com o lúpus
eritematoso apresenta autoanticorpos, sendo os mais frequentes anticorpos
anti-DNA, anti-ribonucleoproteínas, anti-histonas e antiantígenos nucleo-
lares. A deposição desses complexos imunes formados pela reação des-
ses autoanticorpos com os antígenos provocam glomerulonefrite, artrite e
vasculite. Alguns pacientes apresentam deficiência de alguma proteína do
complemento que leva a uma remoção defeituosa dos complexos imunes
e de células apoptóticas.

9.4 Hipersensibilidade tardia ou mediada por células T ou


tipo IV Pesquise sobre outras doenças
relacionadas às reações de
hipersensibilidade do tipo III.
As reações de hipersensibilidade tardia demoram de 48 a 72 ho-
ras para acontecer, e a persistência do antígeno pode levar à formação de
granulomas. Assim como nas reações de hipersensibilidade do tipo I, as re-
ações de hipersensibilidade do tipo IV envolvem as fases de sensibilização
e efetora. Na fase de sensibilização há liberação de IL-12 pelos macrófagos
e células dendríticas que induzem o desenvolvimento de células Th1 nos
linfonodos regionais. As citocinas produzidas pelas células Th1 ativam e
atraem mais macrófagos. Os macrófagos ativados são as principais células
efetoras da reação de hipersensibilidade do tipo IV. As espécies reativas de
oxigênio, o óxido nítrico e as enzimas lisossômicas produzidos e liberados
pelos macrófagos causam danos teciduais. Além disso, os linfócitos T CD8+
citotóxicos ativados pelas células Th1 também causam lesão tecidual.
A “diabetes melito tipo I” é uma doença autoimune que pode ser
causada pela infiltração de linfócitos e macrófagos ao redor das ilhotas de
Langherans no pâncreas. Esse infiltrado de células imunes promove a des-
truição das células β produtoras de insulina levando a uma deficiência da
produção de insulina.
Uma aplicação prática da reação de hipersensibilidade do tipo IV
é utilizada no diagnóstico de turbeculose. A prova tuberculínica é utilizada
para diagnóstico de tuberculose em pessoas não vacinadas com a BCG.
O antígeno tuberculina derivado da bactéria causadora da tuberculose é
aplicado por via intradérmica no braço. Após 48 a 72 horas da aplicação
do antígeno é observada a formação de um nódulo (pápula e halo erite-
matoso). De acordo com o tamanho desse nódulo, a pessoa é considerada
infectada ou não com a bactéria causadora da tuberculose (figura 55).

115
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Figura 55: Resultado da prova de tuberculina. O prova


de tuberculina é um método de diagnóstico de tubercu-
lose baseado na reação de hipersensibilidade do tipo IV
ao antígeno tuberculina.
Fonte: Adaptação de http://commons.wikimedia.org/
wiki/File:Mantoux_Test_48h.jpeg Acesso: 21/08/2010

9.5 resposta imune aos transplantes

O transplante é o procedimento em que um órgão ou tecidos de


um indivíduo (doador) é transferido para outro indivíduo (receptor) ou para
A australiana Demi-Lee
Brennan recebeu aos 9 anos outro lugar do mesmo indivíduo. O material transplantado é chamado de
um transplante de fígado. enxerto. Quando o doador e o receptor são a mesma pessoa, o enxerto
O seu tipo sanguíneo era O
positivo e o do seu doador é denominado de “autólogo”. Quando o transplante é feito entre indiví-
era O negativo. Mesmo com a duos diferentes da mesma espécie, o enxerto é chamado de “alogênico”.
incompatibilidade sanguínea,
o procedimento de transplante Quando o enxerto é de um doador de uma espécie diferente do receptor,
foi realizado devido à urgên- ele é chamado de “xenogênico”. Os antígenos provenientes do enxerto
cia do caso. Surpreendente-
mente, nove meses após os alogênico e xenogênico são chamados de aloantígenos e xenoantígenos,
procedimentos de transplante respectivamente.
foi observado que Demi-Lee
Brennam apresentava o tipo Um dos maiores problemas da medicina do transplante é o pro-
sanguíneo do seu doador e
que a maior parte do seu siste- cesso de rejeição no qual o corpo que recebe o enxerto produz uma res-
ma imunológico fora também posta imune contra ele, geralmente levando a uma falha do transplante
substituído pelo sistema do
doador. Este é o único caso que precisa ser então removido.
descrito até o momento em As moléculas do MHC estão diretamente envolvidas com o pro-
que o sistema imune e o tipo
sanguíneo do receptor troca cesso de rejeição por meio da sua apresentação e consequente ativação
pelo do doador. Quais as possí- das células T. A apresentação do MHC a células T se dá por dois modos. O
veis explicações para este caso?
primeiro é chamado de “apresentação direta” e envolve o reconhecimento
de uma molécula de MHC expressa em uma APC do doador presente no
enxerto. Para que ocorra a apresentação direta, a molécula do MHC do
doador (MHC alogênico) deve ser similar às moléculas do MHC do recep-
tor. O segundo modo é chamado de “apresentação indireta”. Nesse tipo de
Esquematize o processo de apresentação o MHC do doador é fagocitado e os peptídeos derivados são
apresentação direta e indire- apresentados pelas APCs do doador.
ta do MHC no processo de
rejeição. Após o reconhecimento do aloantígeno e ativação das células T,
a sequência dos eventos é a mesma que já descrevemos para os demais

116
Imunobiologia UAB/Unimontes

antígenos: produção de citocinas, atração de células inflamatórias para o


enxerto e sua destruição pelos mecanismos citotóxicos de lise ou apoptose.

9.5.1 Tipos de Rejeição

A rejeição ao transplante pode ser dividida em rejeição hiperagu-


da, aguda ou crônica. Cada um desses tipos de rejeição está associado a
uma resposta imune distinta.

• Rejeição hiperaguda
A resposta característica deste tipo de rejeição é mediada pelo
complemento e ocorre quando o indivíduo receptor possui anticorpos pré-
-existentes contra antígenos do doador, por exemplo, anticorpos antiantí-
genos ABO. A rejeição hiperaguda acontece dentro de minutos e, uma vez
iniciada, o enxerto deve ser imediatamente removido.
Um mediador da rejeição hiperaguda são os anticorpos naturais
que já foram discutidos na unidade sobre imunidade natural. A presença
dos anticorpos naturais parece ser o principal limitante do uso de órgãos
animais em transplantes a humanos.
A rejeição hiperaguda é geralmente prevenida pelo transplante de
enxertos compatíveis dentro do sistema ABO.

• Rejeição aguda
A rejeição aguda geralmente inicia dentro de uma semana após o
transplante, sendo o risco maior nos primeiros três meses após o procedi-
mento. Este tipo de rejeição ocorre quando há incompatibilidade no HLA.
Existe um grande número de alelos diferentes para cada HLA, de forma
que uma compatibilidade perfeita entre o HLA do doador e do receptor é
muito raro.
As células T estão envolvidas no mecanismo de patogênese da
rejeição aguda. Elas provocam a lise no tecido transplantado e produzem
citocinas que podem levar a necrose do enxerto.
Um único episódio de rejeição aguda raramente causa a falha do
órgão, entretanto a ocorrência de novos episódios está associada com a
rejeição crônica.

• Rejeição crônica
A rejeição crônica está associada com a ocorrência de fibrose nos
vasos sanguíneos do órgão transplantado e consequente perda de função.
Este tipo de rejeição ocorre devido a uma resposta imune e inflamatória
contra o enxerto.

117
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

9.5.2 Prevenção e tratamento da rejeição

O principal método de prevenção da rejeição é a utilização de


drogas imunossupressoras que inibem ou lisam os linfócitos T. A droga mais
utilizada é a ciclosporina, que inibe a expressão de muitos genes incluindo
IL-2. Drogas anti-inflamatórias como os corticóides são também utilizados
para prevenir a rejeição por meio da inibição da produção de citocinas
como o TNF e IL-1.
A utilização de enxertos provenientes de indivíduos que possuam
mínimas diferenças aloantigênicas do seu receptor é uma estratégia utiliza-
da para diminuir a rejeição. Quando o receptor e o doador compartilham
os antígenos MHC da classe II, a sobrevida do enxerto é aumentada.
Infelizmente, a rejeição crônica não tem tratamento. Quando ela
acontece, o enxerto deve ser imediatamente removido e substituído por
outro.

ABBAS, A. K.; LITCHMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e


Molecular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

MURPHY, K.; TRAVERS, P.; WALPORT, M. Imunobiologia de Janeway. 7.


ed. Porto alegre: Editora Artmed, 2010.

118
RESUMO

Unidade I: Apresentação e Conceitos Gerais de Imunologia

A imunologia se tornou uma disciplina independente no final do


sec. IXX, com o aumento da compreensão da causa de doenças e descrição
de moléculas e células responsáveis pela imunidade.
O sistema imunológico é formado por células e moléculas respon-
sáveis pela resposta imunológica (ou imune), que é a maneira conjunta e
coordenada destas contra um determinado agente estranho A imunidade
em vertebrados mandibulados é dividida em inata ou adquirida. A inata
está presente desde o nascimento, gerando uma resposta rápida para blo-
quear uma infecção. A adquirida, por sua vez, é estimulada apenas após o
contato com o agente infeccioso, gerando uma memória imunológica após
a eliminação do antígeno. A imunidade adquirida é composta por linfócitos
B e T que reconhecem antígenos de origem, tamanho e maneira diferentes.
Os linfócitos T são responsáveis pela resposta celular, capaz de
coordenar a resposta imunológica ou eliminar as células infectadas ou tu-
morais. A imunidade humoral é gerada pelos linfócitos B e seus produtos,
os anticorpos. É importante em resposta contra agentes extracelulares, uma
vez que os anticorpos são secretados e estão presente nos fluidos corporais.
A resposta adquirida possui características essenciais para seu bom
funcionamento, que são especificidade, diversidade, tolerância, expansão
clonal, especialização, auto-limitação e memória.

Unidade II: Organização do sistema imunológico

A células do sistema imune são geradas durante o processo de


hematopoese, juntamente com as hemácias e plaquetas. Ocorre durante
toda a vida do indivíduo, constantemente.
Dentre as principais células da imunidade inata, podemos citar os
fagócitos (monócitos, macrófagos, neutrófilos), as células dendríticas, basó-
filos, mastócitos, eosinófilos e células NK.
Os linfócitos podem ser classificados quanto ao seu estado de ati-
vação e história de encontro com o antígeno (virgem, efetor ou memória).
Linfócitos B são capazes de secretar anticorpos após a ativação, sendo cha-
mados então de plasmócitos. Os linfócitos T precisam de células apresenta-
doras de antígenos (APCs) para reconhecerem antígenos e podem ser clas-
sificadas como T helper (coordenam a resposta imune através das citocinas)
ou T citotóxica ou citolítica (eliminam células infectadas ou tumorais).

119
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

Os órgãos linfóides são divididos em primários e secundários. Os


primários são medula óssea e timo, órgãos responsáveis pela geração e
maturação dos linfócitos. Os linfonodos e o baço são os órgãos linfóides
secundários, com ambientes ricos em linfócitos B ou T. Os linfonodos são
responsáveis por filtrar a linfa e facilitar o reconhecimento de antígenos
por linfócitos B e T, iniciando a resposta imune. No baço também ocorre
o reconhecimento de antígenos e ativação de linfócitos, mas de antígenos
presentes no sangue. Estruturas semelhantes aos linfonodos também po-
dem ser encontradas ao longo das mucosas, facilitando a resposta imune
em um importante portal de entrada de antígenos no corpo.

Unidade III: Imunidade inata ou natural

A imunidade inata é a primeira linha de defesa do organismo. Ela


é composta pelas superfícies epiteliais, por células fagocitárias e células
Natural Killer (NK).
Os componentes da imunidade inata reconhecem estruturas que
são características dos patógenos chamados de “Padrões Moleculares As-
sociados a Patógenos” (PAMPs). Os PAMPs são reconhecidos pelos “Re-
ceptores de Reconhecimento de Padrões” (PRPs) presentes na superfície
de vários tipos celulares. Os Receptores semelhantes a Toll (TLRs) são os
receptores melhores estudados até o momento e reconhecem componen-
tes únicos de bactérias, fungos e vírus sinalizando e ativando uma resposta
inflamatória.
As barreiras epiteliais além de atuarem como barreira física a en-
trada de microrganismos, secretam substâncias químicas microbicidas ou
que inibem o crescimento microbiano. Além disso, nos tecidos epiteliais e
as cavidades serosas contêm, respectivamente, linfócitos T intra-epiteliais e
as células B-1 capazes de secretar citocinas e anticorpos.
As principais células efetoras da imunidade inata são as células
fagocíticas que incluem os neutrófilos, macrófagos, células dendríticas e
mastócitos. Os fagócitos reconhecem, fagocitam e geralmente destroem
os microrganismos. Essas células também são produtoras de citocinas que
agem tanto na imunidade natural quanto na imunidade adquirida.
As células NK participam no combate a infecção por vírus e tem
um papel importante na rejeição a tumores.

Unidade IV: Sistema do Complemento

O sistema do complemento é composto por mais de 35 proteínas


circulantes no sangue ou ligadas a membrana para interação com vários
mediadores imunes. Este sistema é uma parte importante da imunidade
inata ajudando na resposta dos anticorpos e na limpeza dos patógenos.

120
Imunobiologia UAB/Unimontes

O sistema do complemento é também capaz de reconhecer teci-


do próprio alterado ou danificado promovendo a limpeza de células apop-
tóticas e de imunocomplexos. As funções do sistema do complemento in-
cluem a opsonização, quimiotaxia e lise das células estranhas.
Para se tornarem ativas, as proteínas do complemento precisam
passar por uma cascata de ativação. A via clássica é iniciada pela ligação
de C1q a imunocomplexos ou à superfície do patógeno A via da lectina é
marcada pelo reconhecimento de sacarídeos pela MBL (lectina ligadora de
manose). A via alternativa é iniciada pela auto-ativação do fator C3. As três
vias se convergem na ativação do componente C3.
A ativação de C3 pela C3 convertase específica de cada via leva
a produção de moléculas efetoras envolvidas no recrutamento e ativação
de células inflamatórias, opsonização e conseqüente fagocitose e lise direta
do patógeno pelo complexo de ataque a membrana (MAC). A cascata de
ativação do complemento deve ser regulada.
A regulação é feita principalmente por proteínas controles do com-
plemento que estão presentes em alta concentração no sangue. Algumas
dessas proteínas estão presentes na membrana das células do hospedeiro
impedindo-as de serem alvos do complemento.

Unidade V: Citocinas e inflamação

As citocinas são as principais proteínas mediadoras do sistema


imune. Elas agem como moléculas sinalizadoras para as próprias células
produtoras (ação autócrina), para células vizinhas ao seu local de produção
(ação parácrina) ou podem atuar em locais distantes da sua produção.
A ligação de uma citocina ao seu receptor específico desencadeia
eventos subseqüentes capazes de alterar a função celular como inibindo
ou ativando a expressão de determinados genes. Os receptores de citoci-
nas são proteínas transmembrânicas que possuem um domínio extracelular
que é o domínio de ligação à citocina e um domínio intracelular que trans-
mite a sinalização desencadeiada pela citocina ao interior da célula.
As interleucinas são uma classe de citocinas que atuam princi-
palmente sobre os leucócitos, enquanto as quimiocinas são citocinas que
medeiam a quimioatração entre as células.
Algumas citocinas atuam de forma mais expressiva na resposta
imune inata como o TNF, IL-1, IL-12, interferons do tipo 1 e IL-10. Outras
citocinas, no entanto, são mais importantes na resposta imune adaptativa
como a IL-2, IL-4, IL-5, IL-13, interferon-γ e o TGF-ß.
A inflamação é uma resposta normal contra patógenos ou células
danificadas. O componente celular da inflamação é formado por leucócitos
que residem no sangue e devem chegar ao tecido inflamado via recruta-
mento e extravasamento dos leucócitos. O recrutamento e extravasamento

121
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

dos leucócitos ao sítio da infecção requerem uma mudança na afinidade


dessas células com as células endoteliais. Inicialmente é preciso uma baixa
afinidade fazendo com que os leucócitos “rolem” sobre o endotélio até
alcançar o sítio de infecção e depois um aumento da afinidade entre os
leucócitos e células endoteliais que permitindo a migração dos leucócitos
aos tecidos. A terminação da inflamação é um processo essencial na manu-
tenção da homeostase.

Unidade VI: A resposta humoral

Anticorpos, ou imunoglobulinas (Ig) são glicoproteínas produzi-


das por linfócitos B e responsáveis pela imunidade humoral. Sua estrutura
assemelha-se à letra Y, com quatro cadeias polipeptídicas, duas chamadas
de pesadas (H) e duas leves (L). Estas cadeias possuem regiões homólogas
denominadas dominós Ig, também compartilhadas por diversas moléculas
presentes na resposta imune. A interação das quatro cadeias polipeptídicas
forma regiões chamadas variáveis, local bastante heterogêneo onde os an-
tígenos interagem com o anticorpo, e regiões constantes, local de interação
do anticorpo com outros componentes da resposta imunológica.
Existem 5 classes de anticorpos nos seres humanos e camundon-
gos: IgA, IgD, IgE, IgG e IgM. Entre suas funções efetoras podemos citar:
neutralização, opsonização, ativa;cão do complemento, citotoxicidade
celular dependente de anticorpo (ADCC) e hipersensibilidade imediata.
Essas funções podem ser compartilhadas entre as classes e subclasses de
anticorpo (como a ativação do sistema do complemento pela IgG e IgM) ou
exclusivas de uma classe (hipersenbilidade imediata e IgE).
Um antígeno reconhecido que gera resposta imunológica é deno-
minado imunogênico, e a região reconhecida neste antígeno é chamada de
epitopo ou determinante.
A resposta do linfócito B e o tipo e quantidade de anticorpo se-
cretado depende de vários fatores, como a natureza do antígeno e local
de reconhecimento. O antígeno reconhecido pode se apresentar solúvel
ou associado a uma célula. A resposta vai também depender bastante da
ativação, ou não, de linfócitos T.

Unidade VII: Resposta Mediada Por Linfócitos T

Os linfócitos T reconhecem apenas fragmentos de antígenos pro-


téicos apresentados pelas APCs. Assim, o reconhecimento do antígeno se
dá através de uma interação do receptor do linfócito T (TCR) com o peptí-
deo associado à molécula do complexo de histocompatibilidade principal
(MHC) presente na APC.
Há dois tipos de moléculas de MHC, os de classe I e de classe
II, com estruturas e funções distintas. As moléculas de classe I se ligam

122
Imunobiologia UAB/Unimontes

à peptídeos de origem citoplasmática, como proteínas virais e originadas


por células tumorais e são apresentados para linfócitos T CD8+ citotóxicos.
Peptídeos originados em fagolisossomos após a ingestão de microorganis-
mos são associados a moléculas de MHC de classe II e apresentados para
linfócitos T CD4+ helpers.
O TCR é composto por duas cadeias, que podem ser α (alfa) e ß
(beta) ou γ (gama) e δ (delta). Junto com moléculas de CD3 e cadeias ζ
(zeta), eles formam o complexo TCR, responsável pelo reconhecimento do
antígeno e ativação do linfócito T. Os correceptores CD4 e CD8 também
são importantes no reconhecimento e ativação, pois se ligam ao MHC de
classe II ou I, respectivamente, aumento o tempo de contato com o antí-
geno.
Os mecanismos efetores dos linfócitos T helper são dependentes
do perfil de citocinas dos mesmos, que se dividem em populações depen-
dendo deste perfil.
Os receptores dos linfócitos, tanto B quanto T, são originados atra-
vés da recombinação somática. Neste processo segmentos gênicos distintos
e diversos são arranjados de maneira aleatória para formar os receptores,
que precisam passar por processos de seleção para garantir sua boa fun-
cionalidade.

Unidade VIII: Regulação da resposta Imune pela tolerância

Tolerância imunológica ocorre quando há ausência de resposta


imunológica, mesmo na presença de um antígeno. Esta não-reatividade
é antígeno-específica, resultante de uma exposição prévia deste antígeno.
Quando um antígeno induz tolerância, ele é chamado de tolerogênico.
A indução a tolerância pode ser central, se ocorrer nos tecidos linfóides
primários, ou periférica, se ocorrer nos tecidos em geral. Quando a con-
seqüência do reconhecimento é anergia, deleção ou supressão, ocorre a
tolerância.
Exemplos da indução dessa tolerância é pelo contato à antígenos
na infância, reduzindo alergias e asma (hipótese da higiene) e pela relação
entre mãe e embrião/feto durante a gestação. Ambos os casos o contato
com o antígeno (alergeno ou embrião/feto) não causa uma resposta imu-
nológica.
A resposta auto-imune é um mecanismo imune normal que não
causa doenças devido a tolerância imunológica aos auto-antígenos. A per-
da da tolerância aos antígenos próprios geralmente ocorre devido à produ-
ção de auto-anticorpos produzidos pelas células B.
Alguns indivíduos são geneticamente susceptíveis ao desenvolvi-
mento de doenças auto-imunes. Os genes das imunoglobulinas, receptores
de células T e o MHC. Outros fatores podem também estar envolvidos

123
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

com o aparecimento de doenças auto-imunes como o sexo, doenças in-


fecciosas, alguns medicamentos e substâncias químicas e até mesmo a ato
de fumar.
Os possíveis mecanismos envolvidos na patogênese das doenças
auto-imunes são superantígenos, mimetismo molecular que é quando um
antígeno exógeno possui uma estrutura similar a algum antígeno próprio
e expressão de co-estimuladores induzida por patógenos. Os tratamentos
para as doenças auto-imunes são baseados em imunossupressores e anti-
-inflamatórios.
As doenças auto-imunes estão associadas a fatores genéticos e am-
bientais. O conhecimento das causas das doenças auto-imunes ainda é
incompleto é difícil de inserir terapias mais específicas.

Unidade IX: Reações do sistema imune: hipersensibilidade e rejeição


a transplantes

As reações de hipersensibilidade são uma resposta exagerada ou


inapropriada do sistema imune normal.
A hipersensibilidade do tipo I ocorre quando uma segunda ex-
posição a um alérgeno promove uma reação cruzada com as moléculas
de IgE ligadas a membrana celulares de mastócitos, produzidas durante a
primeira exposição ao alérgeno. Essa reação cruzada de IgE na membrana
dos mastócitos promove a degranulação e liberação de mediadores por
essas células. A asma brônquica, rinite alérgica e alergias alimentares são
exemplos de doenças relacionadas com a hipersensibilidade do tipo I.
A reação de hipersensibilidade do tipo II envolve a destruição das
células ou tecidos mediada pelos anticorpos IgG ou IgM. Esses anticorpos
se ligam a antígenos presentes na membrana da célula. O reconhecimen-
to desses complexos imunes formado em uma célula leva a ativação do
complemento ou morte da célula. As reações de transfusões sanguíneas ou
doença hemolítica do recém nascido são exemplos de hipersensibilidade
do tipo II.
A hipersensibilidade do tipo III ocorre devido a formação de com-
plexos imunes que são os anticorpos ligados aos antígenos. A deposição
desses complexos imunes nos vasos sanguíneos induz uma resposta infla-
matória mediada pelo complemento e por receptores Fc causando lesão
nos vasos e tecidos adjacentes. Um exemplo de reação de hipersensibilida-
de do tipo III é o lúpus eritematoso sistêmico.
As reações de hipersensibilidade do tipo IV ou tardia envolve prin-
cipalmente uma resposta inflamatório do tipo Th1. As citocinas produzidas
pelas células Th1 ativam e atraem mais macrófagos. Os macrófagos ativa-
dos são as principais células efetoras da reação de hipersensibilidade do
tipo IV. A diabetes melito tipo I é uma doença auto-imune caracterizada
pela hipersensibilidade do tipo IV.

124
Imunobiologia UAB/Unimontes

O transplante é o procedimento onde um órgão ou tecidos de um


indivíduo (doador) é transferido para outro indivíduo (receptor) ou para
outro lugar do mesmo indivíduo. O tecido transplantado ou enxerto pode
ser autólogo quando o doador e o receptor são a mesma pessoa; alogê-
nico quando o transplante é feito entre indivíduos diferentes da mesma
espécie ou xenogênico quando o enxerto é de um doador de uma espécie
diferente do receptor. O grande problema dos transplantes é o processo
de rejeição. As moléculas do MHC estão diretamente envolvidas com o
processo de rejeição por meio da sua apresentação e consequente ativação
das células T.
O principal método de prevenção da rejeição é a utilização de
drogas imunossupressoras que inibem ou lisam os linfócitos T.

125
REFERÊNCIAS

BÁSICAS

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Molecular. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders Elsevier, 2008.

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ed. São Paulo: Editora Artmed, 2010.

COMPLEMENTARES

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9, pp. 707-744.

CHAPLIN, D. D. Overview of the Immune Response. Journal of Allergy


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CUROTTO DE LAFAILLE, M.A.; LAFAILLE, J.J.; GRAÇA, L. Mechanisms of


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balanced threat to the foetus, turning to protection of the neonate. Acta
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SUPLEMENTARES

Site da Sociedade Brasileira de Imunologia - www.sbi.org.br

128
ATIVIDADES DE
APRENDIZAGEM
AA

UNIDADE I - APRESENTAÇÃO E CONCEITOS GERAIS DE IMUNOLOGIA


01- Sobre o nascimento da imunologia, qual das afirmativas abaixo é falsa?
a) ( ) Um dos primeiros passos para seu nascimento foi a associação de
microorganismos com doenças.
b) ( ) A primeira vacina produzida foi contra a rubéola, por Jenner.
c) ( ) Metchnikoff foi o primeiro a observar a anti-toxina no soro de
animais doentes.
d) ( ) Emille Von Behring foi um dos principais representantes do
movimento Humoralista.

02- A respeito da resposta imunológica, é correto afirmar que:


a) ( ) é a ação conjunta de células e moléculas contra um agente
estranho.
b) ( ) pode ser dividida em resposta celular e acelular.
c) ( ) ocorre apenas em mamíferos.
d) ( ) são capazes de reconhecer apenas alguns tipos de moléculas e
microorganismos.

03- Quais das células citadas abaixo não pertencem à imunidade inata?
a) ( ) Macrófago
b) ( ) Células NK
c) ( ) Eosinófilos
d) ( ) Linfócito B

04- Sobre as imunidades inata e adquirida, é incorreto afirmar:


a) ( ) a imunidade inata está constantemente pronta para agir, não
precisando ser ativada.
b) ( ) as barreiras físicas (pele e mucosas) são componentes da
imunidade inata.
c) ( ) a imunidade adquirida é composta por linfócitos.
d) ( ) a imunidade adquirida está constantemente pronta para ser agir,
não precisando ser ativada.

129
Ciências Biológicas Caderno Didático - 5º Período

05- Ao comparar as imunidades inata e adquirida, é falso afirmar que:


a) ( ) a diversidade da imunidade inata é maior, pois é capaz de
reconhecer vários padrões presentes nos microorganismos.
b) ( ) os linfócitos são observados apenas em vertebrados mandibulados.
c) ( ) a imunidade inata surgiu antes da imunidade adquirida, sendo
observada já nos invertebrados.
d) ( ) a imunidade adquirida é dependente da imunidade inata para sua
ativação.

06- São diferenças entre a imunidade ativa e passiva:


a) ( ) a imunidade passiva é composta por células NK, fagócitos, entre
outros.
b) ( ) ambas podem ser induzidas ou ocorrerem de maneira natural.
c) ( ) um exemplo de imunidade ativa é a transferância de anticorpos
pela mãe durante a amamentação.
d) ( ) na imunidade passiva ocorre a ativação do sistema imunológico.

07- Qual destas não é característica da resposta adquirida?


a) ( ) Diversidade
b) ( ) Tolerância
c) ( ) Inespecificidade
d) ( ) Auto-limitação

08 - Epitopos ou determinantes são:


a) ( ) regiões específicas dos anticorpos que se ligam nos antígenos.
b) ( ) proteínas presentes no soro, pertencentes à imunidade inata.
c) ( ) produtos secretados pelos linfócitos T.
c) ( ) regiões específicas dos antígenos que são reconhecidos pelos
linfócitos.

09 - Sobre a autolimitação é correto afirmar que:


a) ( ) é uma característica da resposta imune inata.
b) ( ) ocorre sempre que o anticorpo é eliminado.
c) ( ) é responsável pela eliminação dos linfócitos que não são mais
necessários.
d) ( ) quando ocorre, é responsável pela indução de respostas
autoimunes.

130
Imunobiologia UAB/Unimontes

10- O que é expansão clonal?


a) ( ) É a multiplicação do linfócito ativado, gerando vários linfócitos
com a mesma especificidade.
b) ( ) Consiste na produção e secreção de anticorpos idênticos pelos
linfócitos B.
c) ( ) É a proliferação de células tumorais.
d) ( ) Geração de vários organismos com todas suas características
idênticas.

131

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