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História
Contemporânea II
2012
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Campus Universitário Professor Darcy Ribeiro
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Diretor do Centro de Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Coordenadora do Curso a Distância de Letras/Português
Paulo Cesar Mendes Barbosa Ana Cristina Santos Peixoto
Sumário
Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
UNIDADE 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
A era da catástrofe . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
UNIDADE 2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
O Mundo Bipolar e a Guerra Fria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
2.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
UNIDADE 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
Da nova ordem mundial à era das incertezas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113
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História - História Contemporânea II
Apresentação
Olá, acadêmico!
O período sobre o qual falaremos, neste caderno, é um momento fundamental para a com-
preensão da história da sociedade do mundo ocidental. O “Breve” Século XX, que assinalou im-
portantes transformações na vida do povo, em todas as suas dimensões, assentou boa parte dos
valores que ainda balizam a contemporaneidade. O objetivo do texto é mostrar para você a di-
nâmica desse período, compreendendo as duas Guerras Mundiais e a Guerra Fria, que mudou as
instituições políticas e econômicas, estruturando as da forma como as conhecemos. Além disso,
ao longo desse recorte temporal, ocorrem revoluções que alteram os padrões morais, éticos, cul-
turais e sociais. O período pelo qual propomos nossa jornada compreende o século XX embora
os processos que culminaram nos grandes eventos econômicos, políticos e sociais tenham ante-
cedentes que são encontrados, ainda, em fins do século XIX.
Esta disciplina foi organizada em três unidades: a primeira trata do período que vai do início
da Primeira Guerra Mundial (1914) ao final da Segunda Guerra Mundial (1945), passando pela Re-
volução Russa, Crise de 1929 e Regimes Totalitários. Esse período é denominado, pelo historiador
Eric Hobsbawm, como a “Era da Catástrofe, denominação adotada aqui, na primeira parte deste
caderno. A segunda unidade compreende o tema Guerra Fria, destacando, também, os conflitos
chamados de “Guerras Quentes”, na Ásia e África, e o desmoronamento do socialismo na década
de 1980. A terceira e última parte, por fim, trata do mundo globalizado, que emerge com o fim
da Guerra Fria, e seus problemas atuais.
Essas unidades são subdivididas em subunidades para facilitar a leitura e a discussão, con-
forme você verá, em seguida. Você deverá ficar atento e não desprezar o desafio das questões
para discussão e reflexão. Elas são importantes e acompanham o texto. Outro aspecto importan-
te são as sugestões para transitar do ambiente de aprendizagem aos chats, fóruns e acesso às
bibliotecas virtuais na Web. As sugestões e dicas estão localizadas junto aos textos.
Os autores.
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História - História Contemporânea II
UNIDADE 1
A era da catástrofe
César Henrique de Queiroz Porto
1.1 Introdução
Eric Hobsbawm, historiador inglês, analisa a história do século XX, em sua obra Era dos Extremos
(1995, p. 15), propondo uma estrutura que divide boa parte do período compreendido entre 1914 e
1991, em três partes: uma “Era da Catástrofe”, uma “Era de Ouro” e a última parte, que traz, novamente,
crises, incertezas e catástrofes (esta, principalmente, para algumas regiões do globo).
▲
A “Era da Catástrofe” se inicia com o ad- do século XX. Esse foi, também, um momen- Figura 1: Imagens do
vento da Primeira Grande Guerra Mundial que, to marcado por ironias, como, por exemplo, século XX.
entre outras coisas, assinala o colapso da civi- a estranha aliança entre o comunismo e o ca- Fonte: Disponível em:
<http://diretodeplutao.
lização ocidental que emergiu no século XIX a pitalismo na guerra, possibilitando a derrota blogspot.com/2010/12/
partir do continente europeu e que, por isso, é do fascismo, o que, para Hobsbawm, consti- quinze-pessoas-imortais-
o marco inicial do chamado “Breve Século” – tuiu o ponto decisivo da história contemporâ- -do-seculo-xx.html>. Acesso
em 25 set. 2011.
como ele denomina o século XX. Esse período, nea (HOBSBAWM, 1995, p. 17). A tese central
que durou mais de trinta anos, é marcado por de Hobsbawm em A Era dos Extremos, para
uma série de calamidades que se abateram esse período, é que as duas primeiras guerras
sobre o mundo, destacando-se, dentre elas, equivalem-se a apenas um conflito, nascido de
a guerra generalizada e a crise econômica, uma conjuntura em que as nações não mais
cujos impactos configurariam todo o restante poderiam evitá-lo e mediado por interesses
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UAB/Unimontes - 8º Período
ilimitados. Ou seja, as duas mais avassalado- vras, de 1815 até a eclosão da Primeira Grande
ras guerras do século XX são compreendidas Guerra, nenhuma grande potência combateu
como uma “guerra de 31 anos”, em meio a outra, fora de sua região imediata (HOBSBA-
qual uma série de fatos históricos foi impres- WM, 1995, p. 31).
cindível para definir a sua memória. A partir de 1914, as guerras foram, inques-
Esta unidade contempla o período que vai tionavelmente, “guerras de massa”, envolven-
da Primeira Guerra Mundial (1914) até o final da do um grande nível de mobilização humana.
Segunda Grande Guerra, em 1945. Você vai per- Tais guerras fortaleceram a força de trabalho
ceber que, acima de tudo, trata-se de uma época e favoreceram a ascensão das mulheres ao tra-
de catástrofes, daí a periodização proposta por balho (HOBSBAWM, 1995, p. 51), pois exigiam
Hobsbawm se revelar uma referência interes- uma produção em massa de armamentos e
sante para esta parte do caderno, pois abarca a equipamentos. A guerra se torna um comple-
guerra como o traço fundamental deste século xo industrial que movimenta enormes quanti-
de grandes transformações. dades de recursos, tornando-se, muitas vezes,
O período pós 1914, Primeira Guerra Mun- uma atividade econômica lucrativa. Os gover-
dial, não apresentou continuidade com o an- nos passam a investir no planejamento eco-
terior, pois a época compreendida entre 1871- nômico, como forma de preparação das eco-
1914 é caracterizada pela ausência de grandes nomias para travar as guerras. Por outro lado,
conflitos internacionais (HOBSBAWM, 1995, p. o preço cobrado em vítimas era enorme. As
30). A maioria das guerras que envolveram as duas grandes guerras produziram o extermí-
grandes potências foi rápida e restrita a de- nio de milhões de pessoas, entre civis e com-
terminadas áreas localizadas. Em outras pala- batentes, inaugurando a era do massacre.
Figura 2: artilharia ►
belga contra forças
alemãs no início da
guerra.
Fonte: Disponível em:
<http://veja.abril.com.br/
historia/primeira-grande-
-guerra-mundial/1914-
-agosto-comeca-guerra/
explosao-guerra-assas-
sinato-arquiduque-fran-
cisco-ferdinando.shtml>
acesso em 23 ago. 2011.
12
História - História Contemporânea II
A partir do final do século XIX, tem início petição” (HOBSBAWM, 2005, p. 427) desenfre-
uma corrida armamentista que se expande, ada que empurrou o mundo à Grande Guerra.
particularmente, nos anos anteriores à guerra. A conjuntura internacional se deteriorava,
Esse esforço de produção de material bélico progressivamente, escapando, cada vez mais, do
foi seguido pelo aumento dos gastos das na- controle dos governantes de uma Europa dividi-
ções europeias, o que, inevitavelmente, acarre- da em dois blocos, que, de início, eram destina-
tou o aumento de impostos. No entanto, como dos à manutenção de um frágil equilíbrio de paz.
Hobsbawm argumenta, a Primeira Grande O problema é que os dois sistemas de aliança se
Guerra não foi produto, pura e simplesmente, tornavam permanentes e divididos por disputas,
da corrida armamentista, apesar do acúmulo que se transformaram em confrontos sem ne-
de armamentos dos principais países da Euro- nhuma possibilidade de administração. A grande
pa. Foi, acima de tudo, a evolução da “situação questão é: por que as disputas evoluíram para
internacional que levou as nações a essa com- confrontos inadministráveis?
França e Alemanha eram separadas pela ça, Inglaterra, Áustria) Estados Nacionais, à
questão da Alsácia-Lorena, decorrente da expansão imperialista, ao conflito e à guerra”
derrota da França para a Prússia – futura Ale- (HOBSBAWM, 2095, p. 437). Assim sendo, à me-
manha, em 1871, na Guerra Franco-Prussiana, dida que a Alemanha recém-unificada experi-
e palco de disputa das duas potências pela mentou um notável crescimento econômico,
grande quantidade de carvão mineral. Em tor- um crescente antagonismo anglo-germânico
no dessas duas potências foram construídas tomou forma, o que, inevitavelmente, empur-
as alianças. Os russos, que tinham interesse rou a Grã-Bretanha para o bloco Franco-Russo,
nos Bálcãs, foram forçados a se aproximar dos formando, então, a “Tríplice Entente”, em 1907.
franceses, principalmente porque a Áustria, a Para piorar o quadro dessa realidade, ain-
nação mais envolvida nos territórios balcâni- da em fins do século XIX, os alemães decidi-
cos – tendo conquistado a Bósnia-Herzegovi- ram construir uma grande esquadra de guer-
na, em 1878 – tinha assinado com o Império ra, reforçando suas pretensões a uma futura
Alemão e a Itália a “Tríplice Aliança”, em 1882. hegemonia imperial. Da perspectiva inglesa,
Por outro lado, como Hobsbawm cha- uma Alemanha que já era uma potência global
mou a atenção, “o desenvolvimento do capi- poderia ameaçar a tradicional hegemonia bri-
talismo empurrou o mundo inevitavelmente tânica nos mares. Não podemos nos esquecer
em direção a uma rivalidade entre os Novos disto: os ingleses, desde o século XVIII, haviam
(Itália, Alemanha, Américas) e os Velhos (Fran- consolidado a base de seu poderio na mari-
13
UAB/Unimontes - 8º Período
Para saber mais nha, cuja armada era o principal instrumento dessa potência era, visivelmente, dependente
Em 1871, a França, ao do expansionismo inglês, sendo, diretamente, de seus territórios e possessões coloniais. Por-
tentar conter o expan- responsável pela formação do poderoso Impé- tanto, não é de se espantar que a Inglaterra
sionismo germânico, rio Britânico, que incluía vastos territórios em considerasse a Alemanha o mais provável epo-
é derrotada na guerra três continentes. Esse Império era vital para o têncial perigoso adversário.
Franco-Prussiana, abastecimento da Inglaterra, pois a economia
sendo obrigada a ceder
à Alemanha a região
da Alsácia-Lorena,
área rica em carvão e
minério de ferro. Desde
então, cresce, entre os
franceses, um movi-
mento revanchista para
recuperar o território
cedido e “se vingar” da
Alemanha.
Fonte: http://www.
professoronline.ac.mz/
historia/primeirag.htm
◄ Figura 4: Caricatura
francesa do Kaiser
Wilhelm II [em língua
portuguesa, Imperador
Guilherme II], da
Glossário Alemanha, tentando
Imperialismo: Forma comer o mundo.
política, ou prática Fonte: Disponível em:
exercida por um <http://novahistorianet.
Estado, que visa à blogspot.com/2009/01/
expansão, ou pela primeira-guerra-mun-
submissão econômi- dial-1914-1918.html>
acesso em 23 ago. 2011.
ca, política e cultural
de outros Estados ou
pelo domínio terri-
torial, estendendo
seus domínios e/ou
autoridade aos países
estrangeiros. (Para
saber mais sobre
imperialismo, veja:
HOBSBAW, Eric. A Era
dos Impérios: 1875 –
1914. São Paulo: Paz
e Terra, 2009).
14
◄ Figura 5: Gravura
da representação
do assassinato do
Arquiduque Francisco
Ferdinando, utilizada
nos jornais.
Fonte: Disponível em:
<http://www.curso-obje-
tivo.br/vestibular/roteiro_
estudos/seculo_20.aspx >
acesso em 25 set. 2011.
◄ Figura 6: Charge
representando o mapa
europeu em 1914.
Fonte: Disponível em:
<http://blog-giana.blogs-
pot.com/2010/04/charge-
-primeira-guerra-mundial.
html> acesso em 23 ago.
2011.
15
UAB/Unimontes - 8º Período
Para saber mais Ambos os lados tentaram vencer a guerra -se de recursos, praticamente, ilimitados em
Na Primeira Guerra pelo uso da tecnologia. Tanques, aeroplanos armas, matérias-primas e homens, garantiu
Mundial, novos arma- e dirigíveis, bem como a guerra química, fize- a vitória da Entente (HOBSBAWM, 1995, p. 36).
mentos, como a metra- ram a sua entrada no cenário bélico. Aparece, As potências centrais, além de derrotadas, so-
lhadora, o tanque e o também, a guerra submarina, recurso levado freram com a ameaça de revolução social por
submarino, surgiram, adiante pelos alemães e que vai forçar a entra- parte das massas.
e novas técnicas de
combate, como o uso da dos E. U. A. na guerra. Esse país, utilizando-
das trincheiras, foram
empregadas; cerca de
13 milhões de pessoas Figura 7: Tropas em movimento, na fase de
foram mortas e outras guerra de movimentação.
20 milhões foram feri- Fonte: Disponível em: <http://primeira-guer-
das. Ela foi anunciada ramundial.blogspot.com/2011/05/causas-da-
como a “Guerra para -primeira-guerra-mundial.html> acesso em: 23
terminar com as guer- ago. 2011.
ras”, entretanto, vinte e
um anos depois, surgia
a 2ª Guerra Mundial.
A batalha de Verdun,
ocorrida entre 21
de Fevereiro a 18 de
Dezembro de 1916, em
Verdun, na França, foi
a mais longa batalha
da Primeira Guerra
Mundial e, também, a Esse conflito teve sérias implicações para que incorporou territórios da Hungria (Tran-
segunda mais sangren- o imaginário europeu, tendo, como resultado silvânia); e os novos Estados multinacionais da
ta, após a batalha do mais dramático, um grande número de mor- Iugoslávia e da Tchecoslováquia foram criados.
Somme, fazendo cerca
de 260 000 mortos tos, o que acarretou um trauma profundo na Os Estados Unidos se retiraram das nego-
entre os beligerantes mentalidade geral europeia. O Tratado de Ver- ciações de Versalhes, e as potências vitoriosas
(França e Alemanha). salhes, que se seguiu ao final da guerra, reor- isolaram a Rússia Bolchevique. Foi criada, ain-
denou o mapa europeu: uma paz punitiva foi da, uma Liga das Nações, com a finalidade de
Fote: Disponível em: imposta ao povo germânico, pois a Alemanha, tentar manter a paz mundial. Entretanto, esse
<http://primeira-guer-
ramundial.blogspot. tendo sido responsabilizada pela guerra, so- organismo nasceu esvaziado, pois não contava
com/search?updated- freu as maiores punições, sendo duramente com a participação dos Estados Unidos nem
min=2011-01- enfraquecida; a Áustria foi separada de seus da União Soviética e, muito menos, da derrota-
01T00%3A00%3A00- domínios imperiais e reduzida a um pequeno da Alemanha. Diante disso, a Liga das Nações
08%3A00&updated- Estado, sem saída para o mar; surge uma Hun- fracassará em seu intento de manutenção da
max=2012-01-
01T00%3A00%3A00- gria independente, porém, bastante limitada paz. Para Hobsbawm, “Qualquer chance que
08%3A00&max-re- em termos de extensão territorial, pois per- tivesse a paz, foi torpedeada pela recusa das
sults=20> acesso em 23 deu, praticamente, dois terços de seu território potências vitoriosas a reintegrar as vencidas”
ago. 2011. e de população; surgiu, também, a Romênia, (HOBSBAWM, 1995, p. 42).
16
História - História Contemporânea II
◄ Figura 8: Mapa da
Europa, após a Primeira
Guerra Mundial.
Fonte: Disponível em:
<http://www.culturabrasil.
pro.br/primeiraguerra-
mundial.htm> acesso em
23 ago. 2011.
BOX 1
Antes que a Primeira Guerra Mundial acontecesse, as várias nações envolvidas nesse conflito
se preparavam com uma opulenta tecnologia militar. Assim, quando a “Grande Guerra” eclodiu,
em 1914, o tempo de movimentação das tropas durou muito pouco tempo. Estava claro que am-
bos os lados eram, belicamente, poderosos e que o menor avanço territorial só aconteceria ao
custo de milhares de vidas.
Dessa forma, os soldados de ambos os lados passaram a cavar trincheiras de onde tenta-
vam, ao mesmo tempo, se proteger e atacar. Geralmente, uma trincheira era aberta pela tropa e
contava com cerca de 2,30 metros de profundidade, por dois metros de largura. No ponto mais
alto, eram colocados sacos de areia e arames farpados que protegeriam os soldados das balas e
dos estilhaços das bombas. Além disso, um degrau interno chamado fire step permitia a observa-
ção dos inimigos.
17
UAB/Unimontes - 8º Período
Para que as tropas inimigas não conseguissem conquistar uma trincheira em um único
ataque, os soldados tinham o cuidado de não construí-las em linha reta. Trincheiras auxiliares e
perpendiculares também eram construídas para que o tempo de reação a um ataque fosse am-
pliado. Apesar da proteção, uma bomba certeira ou uma rajada de tiros oportuna poderia deixar
vários soldados feridos. As mortes repentinas e os ataques inesperados eram constantes.
Além do poder das armas, a própria trincheira era outra inimiga para os soldados que se
amotinavam naquele espaço insalubre. Os mortos que se acumulavam nas trincheiras eram um
grande chamariz para os ratos que se alimentavam da carne pútrida dos corpos. Entre as doen-
Glossário ças, usualmente, contraídas nas trincheiras se destacavam a “febre de trincheira”, reconhecida por
Trincheira: Escavação fortes dores no corpo e febre alta, e o “pé de trincheira”, uma espécie de micose que poderia re-
feita no solo de forma sultar em gangrena e amputação.
irregular, no sentido Entre duas trincheiras inimigas ficava a chamada “terra de ninguém”, onde arame farpado e
longitudinal, que corpos em decomposição eram bastante recorrentes. A presença naquele território era bastante
permitia aos soldados
beligerantes a movi- arriscada e só acontecia pelo uso de frentes muito bem armadas. Geralmente, um soldado assu-
mentação da tropa e mia várias funções no campo de batalha, tendo suas forças utilizadas para o combate, a manu-
o tiro ao inimigo de tenção das tropas, o apoio reserva e nos terríveis dias que passavam na própria trincheira.
forma protegida. As Mais que uma simples estratégia militar, as trincheiras representavam intensamente os hor-
trincheiras possuíam rores vividos ao longo da Primeira Guerra Mundial. Submetidos a condições de vidas extremas,
várias curvas e níveis
para dificultar a con- milhares de soldados morreram em prol de um conflito em que a competição imperialista era
quista das mesmas sua razão maior. Pela primeira vez, a capacidade dos homens matarem atingiu patamares que
por tropas inimigas. abalavam aquela imagem de razão e prosperidade que justificava o capitalismo monopolista.
Dica
Conforme já apontamos, caro acadêmi- foi devolvida. A região da Renânia foi desmili-
Acesse a seção “Veja
na História”, na Veja co, a Alemanha foi punida pelos vencedores, tarizada. A marinha de guerra alemã foi afun-
On-line 1ª Guerra sendo responsabilizada pela guerra e arcando dada pelos próprios alemães, que preferiram
Mundial, disponível com pesadas indenizações. Entretanto, em sua se desfazer de sua armada a ter que entregá-la
em: <http://veja.abril. essência, o Tratado de Versalhes era composto aos vitoriosos. O exército alemão foi limitado
com.br/historia/pri-
por 14 pontos propostos pelo presidente esta- a uma força restrita de cem mil homens. Seu
meira-grande-guerra-
-mundial/1914-agosto- dunidense Wilson. Ele se baseava na ideia da império colonial, que se restringia a poucos
-comeca-guerra/ paz sem vencedores, logo se esse princípio ti- territórios, foi dividido entre a França e a Ingla-
indice.shtml> Fatos vesse sido respeitado, teria produzido um tra- terra. Portanto, como se pode ver, não é de se
de 1914; <http://veja. tado sem uma característica, intrinsecamente, estranhar que as sementes da futura Segunda
abril.com.br/historia/
punitiva. Isso foi inviabilizado pelos acordos Grande Guerra já tivessem sido plantadas, ain-
primeira-grande-
-guerra-mundial/1915- paralelos e pelas pressões francesas e inglesas, da sob os auspícios dos acordos de paz que fi-
-abril-batalha-galipoli/ que levaram os Estados Unidos a se retirarem nalizaram a Primeira.
indice.shtml> Fatos das negociações. Essas duas potências temiam Diante dessas punições e do quadro de
de 1915; <http://veja. uma Alemanha forte e estavam comprometi- crise econômico-social instalado no início da
abril.com.br/historia/
das com um ideal revanchista, que visava en- década de 1930, os setores dominantes e as
primeira-grande-
-guerra-mundial/1916- fraquecer os alemães. Esse tratado considerou classes médias da Alemanha vão se inclinar
-julho-batalha-somme/ a Alemanha culpada pela guerra e criou uma para o radicalismo da extrema direita, teme-
indice.shtml> Fatos série de determinações que visavam enfraque- rosos da ascensão de uma esquerda radical
de 1916; <http://veja. cer e desmilitarizar esse país. inspirada pela Revolução Socialista na Rússia.
abril.com.br/historia/
A nação germânica, além de perder ter- O resultado dessa opção vai ser a emergência
primeira-grande-guer-
ra-mundial/1917-abril- ritórios, cedeu parte do seu país para a explo- de um governo comprometido com o totalita-
-americanos-guerra/ ração francesa, como forma de compensação rismo e que, em última instância, mergulha o
indice.shtml> Fatos de pelo fato dos alemães terem usufruído as ri- mundo na barbárie da guerra total e no exter-
1917. quezas da Alsácia-Lorena, que, logicamente, mínio de milhões de pessoas.
Periódicos, assim como
documentos oficiais de
governos e exércitos,
18
História - História Contemporânea II
ideal socialista, na prática, devem ser lembra- moldes feudais. Nem mesmo uma burguesia
dos sob a denominação de “socialismo real”. industrial existia no país, para que se pudesse
Deve-se ter em mente que a Rússia de 1917 operar uma “revolução burguesa”, no sentido
não estava preparada para uma transformação de preparar o país para o advento do socia-
que possibilitasse o advento da sociedade so- lismo. Assim sendo, o que emergiu na Rússia
cialista. Não existia um proletariado forte, mas, pós 1917, foi um modelo de Estado que, apesar
principalmente, uma grande massa campone- da retórica socialista, configurou-se como um
sa, que ainda se encontrava muito ligada aos modelo de Estado doutrinário, militarizado e
princípios da servidão e a uma produção nos burocratizado.
BOX 2
No dia 9 de janeiro de 1905, o czar Nicolau 2º recebeu uma petição, em tom desesperado:
“Estamos em situação miserável, somos oprimidos, sobrecarregados com excesso de trabalho, in-
sultados, não nos reconhecem como seres humanos, somos tratados como escravos. Para nós,
chegou aquele momento terrível em que a morte é melhor do que a continuidade do sofrimento
insuportável”.
O país estava afundado numa enorme crise, as pessoas passavam fome, em todas as classes
da sociedade havia insatisfação. Os nobres não queriam aceitar a industrialização da Rússia, por
acreditar que isso os empobreceria. Os camponeses sentiam-se oprimidos e enganados: apesar
da abolição do regime feudal, em 1856, toda a terra continuava pertencendo, exclusivamente,
aos nobres. E não havia perspectiva de mudança.
De sua parte, os intelectuais exigiam uma participação na vida política. O czar Nicolau 2º,
absolutista, ainda podia administrar e agir no seu imenso reino como bem entendesse. Às véspe-
ras da primeira revolução russa, o soberano ainda não tomava conhecimento dos problemas dos
trabalhadores, da fome, da miséria e das arbitrariedades dos proprietários de fábricas.
19
UAB/Unimontes - 8º Período
Numa situação tão tensa, um fato insignificante transformou-se, de repente, numa catástro-
fe. Quatro operários da maior fábrica de São Petersburgo foram demitidos, narra Jutta Petersdorf,
historiadora do Instituto da Europa Oriental da Universidade Livre de Berlim. “Eles foram demiti-
dos porque exigiram a punição de um feitor que era injusto e tratava mal os operários.”
Início da revolta
Os quatro revoltosos estavam dispostos a lutar. O protesto foi apoiado pelos sindicatos fi-
éis ao regime, os chamados “sindicatos amarelos”, criados pelas autoridades estatais nas regiões
industriais russas, no início do século, para canalizar e controlar a crescente insatisfação popu-
lar. Tais associações sindicais eram dirigidas e administradas pela polícia local. O sindicato de São
Petersburgo, que contava 11 mil filiados em janeiro de 1905, tentou manter a paz social, procu-
rando fazer com que o diretor da fábrica anulasse a demissão dos quatro operários. Em vão. O
industrial permaneceu irredutível.
Marcha de protesto
20
História - História Contemporânea II
Na manhã gelada do domingo, 9 de janeiro, uma multidão de 100 mil pessoas dirigiu-se en-
tão para a residência do czar, o Palácio de Inverno de São Petersburgo. A residência estava pro-
tegida pelos militares, com o apoio da cavalaria dos cossacos. Mas a multidão era pacífica. Não
eram os aspectos revolucionários que predominavam na marcha, mas sim os ícones de santos da
Igreja Ortodoxa, os estandartes eclesiásticos, as ladainhas rezadas. Por onde passava o cortejo,
nas ruas de São Petersburgo, as pessoas faziam o sinal da cruz, e muitas se juntavam a ele.
Quando a multidão aproximou-se do palácio, ouviram-se os primeiros disparos. Sobre o
massacre que se seguiu, existem divergências de interpretação. Algumas fontes falam de um ato
espontâneo e inconsequente. Jutta Petersdorf e muitos outros historiadores acreditam, porém,
que o banho de sangue foi premeditado.
Duzentas pessoas foram assassinadas e cerca de 800 ficaram, gravemente, feridas. A san-
grenta repressão da marcha de protesto, diante do palácio do czar, em São Petersburgo, foi o
ponto de partida para as rebeliões que se seguiram. Poucos dias mais tarde, a população de Var-
sóvia – na época, administrada pela Rússia – saiu às ruas para protestar. Novamente, o regime
czarista mandou abrir fogo contra os manifestantes.
Mas o povo, insatisfeito, não podia mais ser contido. Os protestos eclodiram em toda a Rús-
sia. Em outubro do turbulento ano de 1905, após uma greve geral, o czar Nicolau 2º assinou um
decreto conhecido como Manifesto de Outubro. Ele abriu caminho para as primeiras eleições
parlamentares livres. Isso marcou, ao mesmo tempo, o fim da primeira revolução russa, que co-
meçara de maneira sangrenta em São Petersburgo.
Segundo Jutta Petersdorf, “por um lado, a classe política foi pacificada através da formação
de partidos e a possibilidade de concretizar eventualmente as suas esperanças através do tra-
balho parlamentar. De outro lado estava o movimento socialista, com a sua conclamação a uma
rebelião armada, a qual fracassou então estrondosamente”.
Nas cidades russas mais importantes, gica e Inglaterra. Apesar dessa modernização
uma burguesia incipiente se beneficiava da superficial, a burguesia, politicamente era
industrialização que vinha se desenvolvendo inexpressiva. Emergia, também, em meio a
sob o encorajamento dos últimos Romanov. esse cenário de industrialização, um operaria-
Esse processo de desenvolvimento industrial do explorado e que sofria uma forte repressão,
era baseado, também, em capitais estrangei- juntamente com uma fraca oposição liberal
ros, provenientes da França, Alemanha, Bél- dos grupos médios urbanos.
21
UAB/Unimontes - 8º Período
Politicamente falando, pode-se definir a greves, levantes e terminaram por forçar Nico-
Rússia como um modelo de despotismo, ligado lau II a prometer reformas liberalizantes. Uma
à dinastia Romanov, que governava o grande das consequências dessa onda de protestos,
país desde 1613. Alguns desses soberanos, como manifestações e revolta foi a formação de “so-
o Czar Pedro, o Grande (1682-1725), vinham ado- vietes”, conselhos de trabalhadores, em várias
tando reformas na administração, educação e no cidades russas, que canalizavam a participação
exército, com o intuito de promover a moderni- popular. Outra consequência relevante desses
zação da nação. Tais reformas eram imitações do acontecimentos foi a formação de um parlamen-
ocidente, mas a despeito do avanço nesses cam- to (Duma) que chegou a se reunir, em 1906, po-
pos, não conseguiram transformar a essência da rém, foi, posteriormente, dissolvido pelo czar.
sociedade russa, que permaneceu agrária, auto- A frustração em relação ao não cumpri-
ritária e bastante desigual. mento, por parte do governo, da maior parte
Nicolau II, que governou entre 1894-1917, das promessas de reforma, levou ao acirra-
portanto, foi o último dos czares. Ele conti- mento dos grupos oposicionistas, que compu-
nuou com essa tendência de governo autoritá- nham um variado quadro político-ideológico.
rio, mas de cunho modernizador. Seu governo Existiam os niilistas, partidários das ideias
foi marcado pela derrota na Guerra Russo-Ja- anarquistas, e os narodnikis, com um discurso
ponesa, conflito travado entre 1904 e 1905, em populista. Havia, também, dois grupos her-
torno da disputa da Coréia e da Manchúria. deiros da tradição social-democrata marxis-
Esse processo contribuiu para a crise políti- ta que, desde 1903, estavam divididos em uma
ca que desembocou no episódio conhecido facção menchevique (minoritária) que advogava
como o “Domingo Sangrento”, que apresenta- o amadurecimento da estrutura capitalista para,
mos no Box anterior. posteriormente, implantar o socialismo. Esses
Esse episódio foi caracterizado pela vio- mencheviques eram defensores de uma “Revolu-
lenta repressão governamental desfechada ção Burguesa” como o caminho para a transfor-
contra uma manifestação pacífica, na qual mação gradual da sociedade russa. Seus líderes
as pessoas procuravam reivindicar ao czar eram Plekhanov e Martov. A outra facção, bol-
melhorias de suas condições de vida. A san- chevique (majoritária), defendia a revolução para
grenta repressão matou centenas de pessoas a instalação de um governo socialista, sob a lide-
e desencadeou uma onda de revoltas, pro- rança do proletariado e com o apoio do campe-
testos e manifestações que resultaram em sinato. Seu principal líder era Lênin.
22
História - História Contemporânea II
1.3.2 A Revolução
Lênin apostava em uma revolução eu- civil que matou milhões de pessoas. De um
ropeia, como início de um movimento de su- lado, as tropas estrangeiras apoiavam o exér-
blevação do proletariado mundial (muitos bol- cito “branco”, formado por mencheviques e
cheviques acreditavam que a Rússia não estava czaristas. De outro, o exército “vermelho”, re-
preparada para uma revolução socialista), que presentante dos bolcheviques, formado por
se espalharia para várias partes do continente, soldados e camponeses.
atingindo a própria Rússia. Por isso, para ele, O conflito se estendeu até 1921, com a vi-
era necessário que os bolcheviques se aguen- tória do exército vermelho, que contou com o
tassem no poder. Tropas francesas, inglesas, importante apoio de oficiais patriotas russos
japonesas e norte-americanas desembarcaram que queriam preservar a unidade territorial
no país para tentar socorrer o governo derru- do país multinacional. Os bolcheviques aguen-
bado, mergulhando a Rússia em uma guerra taram a guerra civil, mas tiveram que tomar
23
UAB/Unimontes - 8º Período
24
História - História Contemporânea II
Stálin abandonou a NEP, em 1928, implan- dos sovkhozes (fazendas estatais) e dos kolkho-
tando a socialização total da economia. O pla- zes (cooperativas).
nejamento foi instaurado a partir dos planos Os primeiros planos quinquenais geraram
quinquenais elaborados pela Gosplan, insti- uma rápida industrialização. Esse esforço foi
tuição encarregada da planificação econômi- obtido ao custo de grandes sacrifícios suporta-
ca. Os planos econômicos - ao desenvolveram dos pelo povo. A economia soviética era uma
a indústria pesada, os setores de transporte e economia de comando, dirigida. Isso implica-
energia, bem como a indústria bélica - asse- va em uma política de comando, altamente,
guraram a transformação da União Soviética burocratizada, que exigia um severo controle
em uma moderna nação industrializada. No centralizado. Na agricultura, a coletivização
entanto, caro acadêmico, essa modernização forçada produziu uma agricultura coletiva ine-
econômica foi obtida à custa da economia ficiente que espremeu o campesinato russo
camponesa. A coletivização forçada, angaria- nas unidades de produção. Como afirma Da-
da no meio rural, foi seguida pela implantação niel Aarão Reis Filho,
[...] nas unidades coletivas de produção, seria possível exercer o controle eco-
nômico e policial com mais precisão e eficiência, determinando o que e quanto
iriam produzir os camponeses e a proporção da produção que caberia ao Esta-
do. O agrupamento de milhões de camponeses em algumas dezenas de milha-
res de unidades de produção viabilizou a extração e a cobrança das entregas
obrigatórias, sempre ascendentes, mesmo que a produção estivesse estagnada
ou em declínio (2003, p. 90).
25
UAB/Unimontes - 8º Período
Conforme vimos, após o final da Primeira homem, afirma que a crise de 29 é paradoxal,
Guerra, o número de Estados aumentou, com pois a pobreza se instaurou em meio à abun-
o surgimento da Romênia, Hungria, Tchecoslo- dância. Para esse autor, essa crise, ao contrário
váquia e Iugoslávia. Assim, era de se esperar um das crises econômicas anteriores, principal-
aumento do volume do comércio mundial, po- mente antes do capitalismo, caracterizou-se
rém, o que se viu foi, exatamente, o contrário, pela superprodução, não pela escassez de
pois, no período entre - guerras, a integração da alimentos e de outros artigos necessários.
economia mundial estacionou. Essa tendência Outra diferença apontada por Huberman é
foi observada, também, em relação aos países que a crise de 29 levou à queda dos preços, di-
que possuíam grande importância no comércio ferentemente das crises anteriores, marcadas
internacional – Hobsbawm nos fala que até o flu- pela elevação de preços (HUBERMAN, 1981).
xo de imigrantes diminuiu muito (HOBSBAWM, Para Hobsbawm, os Estados começaram
1995, p. 91). Por que essa tendência de estagna- a fazer restrições para protegerem as suas
ção do fluxo do comércio mundial? economias. Na Alemanha, a inflação reduziu
Leo Huberman, em seu texto o “Elo mais o poder de compra da moeda, acarretando a
fraco”, publicado no livro História da riqueza do liquidação das poupanças privadas e arruinan-
26
História - História Contemporânea II
do a classe média. Conforme já apontado, esse Não se pode esquecer que inexistiam
foi o quadro que permitiu a ascensão de Hitler políticas efetivas para os trabalhadores. O de-
ao poder no país, na década de 1930. O curto semprego impactou, seriamente, na esfera
período de boom, na Alemanha, durou apenas política. Pode-se falar que, em longo prazo, a
alguns anos (1924-1929). A fragilidade da recu- implicação mais profunda foi o fim do libera-
peração alemã residia em sua dependência de lismo político, na medida em que os governos
capitais externos. Quando a crise se instaurou foram obrigados a priorizar as questões sociais
nos Estados Unidos, levou a economia alemã sobre outras políticas. Um capitalismo refor-
junto com ela. Na Europa, o exemplo alemão, mado, baseado em uma legislação trabalhista
apesar de mais dramático, foi paradigmático que incluía um moderno sistema previdenciá-
do quadro geral no continente: A depressão se rio, foi um dos principais legados da crise de 29
espalhou e o desemprego atingiu toda a Eu- para a humanidade. O planejamento econômi-
ropa. Até nos países da periferia da economia co passou a ser levado em consideração pelos
global, a crise fez sentir seus reflexos. Estados governos, na maioria dos países capitalistas. Na
dependentes da exportação de produtos pri- agricultura, emerge uma política baseada em
mários registraram brusca queda na atividade subsídios para a proteção dos produtores.
econômica.
BOX 3
27
UAB/Unimontes - 8º Período
Na década de 1920, período chamado por alguns como “Loucos Anos 20”, verificaram-se al-
terações nos comportamentos sociais e nos valores morais, sendo o vestuário, a moda e as for-
mas de lazer, os aspectos mais visíveis dessas alterações. A moda passou a ser, cada vez mais,
determinada por considerações de ordem prática, abandonando o aspecto formal e sóbrio ante-
rior. A par da moda, também os movimentos de luta das mulheres, pela igualdade de direitos em
relação aos homens, contribuíram para uma nova imagem da mulher na sociedade. A defesa da
igualdade e o desejo de afirmação das mulheres eram visíveis nas transformações da moda. As
roupas tornaram-se mais práticas, as saias subiram até ao joelho e os cabelos ficaram curtos. As
mulheres passaram a trabalhar fora de casa e a frequentar locais públicos.
A economia dos Estados Unidos regis- evolução técnica. Contudo, com a recuperação
trou um boom, na década de 1920, no período europeia no pós-guerra, o excedente agrícola
que antecedeu a crise de 1929. Nesse período, não encontrou mercado consumidor, mergu-
Para saber mais destaca-se uma verdadeira euforia econômica lhando o setor rural dos Estados Unidos na
Na década de 1920, o nos Estados Unidos. Com a Europa destruí- depressão. Pode-se falar que ocorreu uma sig-
povo mer, na euforia da da pela guerra, os EUA tornaram-se o centro nificativa retirada dos EUA da economia inter-
prosperidade aparen- econômico do mundo, passando a custear a nacional, no período pós Primeira Guerra. Esse
te, comprou ações de
diversas empresas.
reconstrução da Europa, exportando bens e país não atuou como um estabilizador global
Essas ações atingi- capitais para o velho continente. De fato, a (HOBSBAWM, 1995, p. 103). Esse quadro inter-
ram preços elevados, Primeira Guerra Mundial já tinha beneficia- no afetou, também, o setor industrial do país,
muito maiores do que do, enormemente, a economia norte-ameri- pois os produtores agrícolas, sem conseguir
o valor real do capital cana. Após o conflito, o país havia se tornado o vender seus excedentes, não podiam consu-
das empresas. Com a
falência de algumas
maior produtor industrial do mundo. Também mir os produtos industrializados. Diante disso,
indústrias, ocorreram era o maior credor e exportador do globo. Sua muitos industriais faliram, gerando a amplia-
tentativas desenfreadas importância, no volume do comércio mundial, ção do número de desempregados. Não se
de venda das ações – aumentava mais ainda, porque tinha se tornado pode esquecer que uma expressiva parcela da
muitos investidores se o segundo maior importador, comprando ma- população dos Estados Unidos, formada por
deram conta de que
tinham pagado valores
térias-primas de dezenas de países, entre eles o negros, brancos pobres, no sul, e imigrantes
muito mais altos pelos Brasil; era o maior comprador do café brasileiro. procedentes de várias partes do mundo, não
papéis. A tentativa dos Em função de seu enorme alcance no co- desfrutava do “Big Boom” – como era conheci-
acionistas para vender mércio internacional, quando a crise se instau- do o crescimento econômico norte-americano
suas ações levou a rou, além de se tornar a principal vítima da de- pós 1ª Guerra – portanto, não tinha condições
uma baixa no valor das
mesmas, culminando
pressão, foi o responsável por sua ampliação, de consumir a enorme demanda industrial.
com o Crack a Bolsa de pois era um dos principais compradores dos Na medida em que a crise se generaliza, espa-
Nova Iorque. O medo produtos primários de várias nações. A restri- lhando para outras partes do globo, a desor-
se instalou no universo ção de suas importações de produtos primá- ganização econômica e o desemprego se glo-
financeiro. Em pou- rios arruinou várias economias, na periferia do balizam. A confiança no futuro fica abalada e
co tempo, a falência
generalizada tomou
sistema capitalista. o pessimismo se instaura na mentalidade das
conta do setor bancá- A superprodução agrícola norte-america- pessoas sofrendo os efeitos da depressão eco-
rio norte-americano. na foi estimulada pela guerra na Europa e pela nômica.
Durante a década de
1920, sinais da crise já
apareciam em distintos
países. A quebra da
bolsa de valores de
Nova Iorque, no dia 24 ◄ Figura 20: Charge
de outubro de 1929, foi questionando a crise
o ápice. de 29: se sobravam
produtos, porque havia
fome e miséria?
Fonte: Disponível em:
<http://ahistoriaapar-
tirde1905.blogspot.
com/2010/04/periodo-
-entre-guerras-e-crise-
-de-1929.html> acesso em:
23 ago. 2011.
28
História - História Contemporânea II
Eric Hobsbawm nos aponta cinco consequências da crise para a sociedade ocidental:
• fim do liberalismo econômico;
• fim do padrão ouro;
• ascensão de regimes de ultradireita;
• o modelo soviético ganha destaque;
• desemprego.
Com a eclosão da crise generalizada, a mocráticos em frear a crise possibilitava duas
intervenção do Estado na economia se fez ne- vias, a socialista (esquerda) ou a ultradireita, que
cessária, pois as tradicionais medidas ortodo- gerou regimes totalitários ou, no mínimo, dita-
xas se revelaram ineficazes. Somente após a toriais, os quais a burguesia via com melhores
tomada de medidas estatais, a crise se estag- olhos que a saída revolucionária socialista.
nou, e iniciou-se um processo de recuperação. A União Soviética ganhou destaque e for-
O padrão ouro, no qual o país deveria possuir, ça, uma vez que a crise pouco abalou o seu
em seus cofres, o valor em ouro da moeda crescimento econômico. Seu desenvolvimen-
circulante, e que era a forma de controle da to, em tempos de crise, espantou até os mais
economia no período, foi substituído por um desacreditados naquele sistema. Por último,
novo padrão, que não dependia do ouro nos o desemprego era, ao mesmo tempo, conse-
cofres do Estado. O medo de revoluções socia- quência e fator da crise. A crise levou ao de-
listas, em alguns países europeus, propiciou a semprego que a perpetuava, uma vez que a
ascensão dos regimes de ultradireita, como o economia não era aquecida, e o capital não
nazismo e o fascismo. A falha dos regimes de- circulava.
◄ Figura 21: Do
sonho ao pesadelo
estadunidense.
Desemprego, miséria e
fome assolam a nação
americana.
Fonte: Disponível em:
<http://melhorpesquisa.
blogspot.com/2011/05/
Em 1932, Franklin Roosevelt foi eleito presidente dos Estados Unidos da América e propôs o entre-guerras-era-dos-
-contrastes.html> acesso
“New Deal” (Novo Acordo) para superar a crise que assolava o país. Entre outros pontos, podemos em: 23 ago. 2011.
destacar como os principais:
• construção de grandes obras públicas;
• empréstimos a fazendeiros;
• controle de produção agrícola;
• controle de preços.
29
O plano do presidente norte-americano empregos à população, atuando como instru-
levou os EUA a superar a crise e a sair mais mento fundamental da recuperação. Estradas,
forte do que antes, ao mesmo tempo em que pontes, escolas, hospitais e diversos outros
proporcionou o desenvolvimento da infraes- edifícios públicos foram erguidos, e esses tra-
trutura nacional. Com a construção de grandes balhadores moveram a economia e frearam a
obras públicas, o governo proporcionou mais crise.
Para o meio agrícola, empréstimos aos sidiava aqueles com dificuldades, ou surpre-
fazendeiros e controle da produção foram endidos por crises naturais, como furacões,
as medidas mais importantes tomadas para enchentes e secas.
a estabilização do setor e para contornar A última medida destacada é a de contro-
o problema relacionado à superprodução. le de preços para que a população pudesse ter
O governo pagava para os fazendeiros não acesso a mercadorias e para evitar uma crise
produzirem, ao mesmo tempo em que sub- por elevação de preços.
das principais características da dinâmica do me- conhecimento de alguns aspectos de seu funcio-
canismo que levou à formação e à implantação namento, teremos condições de entender algu-
do fenômeno totalitário, bem como através do mas características da modernidade.
31
e a Revolução Industrial (séc. XVIII e XIX), o pe- cionários do século XVIII. Para ela:
UAB/Unimontes - 8º Período
A perspectiva totalitária persegue o ideal de uma sociedade uniforme, coesa, sem divisões,
ou seja, uma sociedade, inteiramente, homogênea. Segundo Ricardo Benzaquen de Araújo, o to-
talitarismo possui três grandes dimensões: uma dimensão democratizante, uma dimensão mobi-
lizadora e, ainda, uma dimensão homogeneizante (ARAUJO, 1988, pp.77-104). Assim sendo, sua
perspectiva de totalitarismo
[...] antes de mais nada, refere-se a uma ideologia que prega a construção de
uma ordem mais justa e fraterna através da eliminação de todas as diferenças
sociais, num processo que, para homogeneizar a sociedade, exige a participa-
ção de todos e que, por isso mesmo, desloca a soberania para o povo, e nunca
para o Estado (ARAÚJO, 1988, p. 97).
32
História - História Contemporânea II
A respeito desse homem das massas sur- Gentile e Marinetti, e no período em que ele
gido no século XX, Hannah Arendt diz que “A era basicamente um “movimento”, isto é, antes
principal característica do homem das massas de 1922 (ARAÚJO, 1988, p. 94).
não é a brutalidade nem a rudeza, mas o seu Quando esses movimentos totalitários se
isolamento e a sua falta de relações sociais instalam, efetivamente, no poder, temos go-
normais” (ARENDT, 1989, p. 366). A autora mos- vernos totalitários ou regimes totalitários. Na
tra, ainda, como Stálin liquida com as classes sua versão de esquerda, temos o Stalinismo
na Rússia dos anos 30: Primeiro, as classes pro- Soviético. Na sua corrente de direita, temos o
prietárias, os Kulacs, depois, os operários e, logo Fascismo Alemão ou o Nacional-Socialismo,
em seguida, a burocracia. Por isso Stálin, efetiva- mais conhecido como Nazismo. Na sua luta
mente, vai conseguir produzir uma massa atomi- pelo domínio global, os Totalitarismos, quan-
zada e amorfa (ARENDT, pp. 370-371). do se instalam no poder, precisam e buscam,
Benzaquen de Araújo chama atenção incessantemente, moldar suas sociedades de
para o fato que, na Itália, quando o movimen- acordo com a conformidade, a homogeneida-
to fascista liderado por Mussolini alcança o de, eliminando, assim, tudo que possa repre-
poder e implanta a estrutura corporativista, o sentar o diferente para conseguir o ideal da
fascismo acaba por consagrar a diferença, em representação do “Povo - Uno”. Dessa manei-
vez de eliminá-la e que a dimensão totalitária ra, esses regimes recorrem, constantemente,
do fascismo italiano não deve ser procurada à fabricação de inimigos. Na Alemanha, esses
no regime chefiado por Mussolini, mas nas inimigos são julgados pelo critério da impure-
obras de alguns dos seus ideológicos, como za racial. Por isso, judeus principalmente, mas
33
UAB/Unimontes - 8º Período
também mestiços, estrangeiros, enfim não forma de autoritarismo. Contudo, nas tiranias,
-alemães/arianos, eram perseguidos. Na Rússia os aparelhos de polícia perseguem os suspei-
Bolchevista, os grandes expurgos de Stálin se tos, enquanto nos Totalitarismos, persegue-se
encarregavam de transformar e inventar su- o chamado “inimigo objetivo” (claro que, após
postos adversários e inimigos da nação. essas polícias terem eliminado os suspeitos de
Nos chamados Estados Totalitários, a fazer oposição ao regime), que pode ser qual-
polícia é condição indispensável para o fun- quer categoria da população que o governo
cionamento, para a dinâmica do movimento decide aprisionar ou liquidar (ARENDT, 1989,
totalitário em direção à conquista global, e os p.476). Hannah Arendt enfatiza a peculiaridade
aparelhos de polícia constituem poderosos e do Totalitarismo, ao chamar a atenção para a
eficientes tentáculos da organização totalitá- ideia do “oponente objetivo”, e quando afirma
ria. Nesse aspecto, pode-se afirmar que todo que o governo totalitário “não é um governo
regime autoritário dispõe de poderosas forças no sentido tradicional, mas um movimento,
policiais, usadas para perseguir e eliminar os cuja marcha constantemente esbarra contra
inimigos do regime. Portanto, sob esse pris- novos obstáculos que tem de ser eliminados”
ma, o Totalitarismo não passa de uma nova (ARENDT, 1989, p. 475).
Por isso, a necessidade constante de ini- do poder dos totalitarismos, na perfeita orga-
migos, a perseguição ao “inimigo objetivo”, nização e relação com que as partes consti-
que poder vir a ser qualquer indivíduo, inde- tuintes da sociedade se entrecruzam e se en-
pendentemente, do cargo que ocupe na bu- caixam.
rocracia do Estado ou Partido. Existe, portanto, O funcionamento da representação da
uma confusão entre a vida privada e a vida pú- estrutura totalitária que constitui o todo orga-
blica das pessoas, pois o Estado consegue in- nizado do sistema foi comparado por Claude
vadir o mundo privado. Já afirmamos que, no Lefort ao funcionamento de um mecanismo:
Totalitarismo, o Estado mobiliza o povo, inte- “direi que a imagem do corpo se combina
grando o indivíduo ao todo, por isso, o poder com a da máquina” (LEFORT, 1983, p.115). As-
não se põe de cima para baixo, mas está den- sim, nesse conjunto de imagens que procu-
tro da sociedade. Claude Lefort, em relação ao ram simbolizar a representação da sociedade
totalitarismo, afirma que o poder se destaca totalitária una, coesa, homogênea, cada ser,
do conjunto da sociedade dominando o todo, cada indivíduo corresponderia a uma peça
“mas se confunde com o Partido, se confun- fundamental de uma estrutura que, por sua
de com o povo, com o proletariado” (LEFORT, vez, estaria integrada em um todo maior, uma
1983, p. 114). Então, tem-se a verdadeira fonte verdadeira máquina composta pela somatória
34
História - História Contemporânea II
dos indivíduos, o Partido, mais as lideranças. poder, ou seja, a multiplicação de órgãos se-
No imaginário totalitário, a máquina, em perfei- ria útil para a transferência do poder (ARENDT,
to andamento/funcionamento, representaria a 1989, p. 451). Então, com a constante transfe-
ideia da sociedade harmoniosa, do “Povo - Uno”. rência do centro de liderança e poder, como
A respeito da organização da estrutura se fosse uma “correia de transmissão”, fica cla-
totalitária, Hannah Arendt, também, identifica ro que o desejo do líder, do chefe, do Führer,
essa mesma relação entre o poder e a orga- pode encarnar-se em qualquer parte da estru-
nização, afirmando que a existência de várias tura, a qualquer momento, sem que, necessa-
organizações, com suas respectivas lideranças, riamente, o líder esteja ligado a qualquer hie-
transferem, permanentemente, o centro do rarquia (ARENDT, 1989, pp. 454-455).
Outro instrumento que se revela eficien- canismos de informação de massa estão, dire-
tíssimo para a organização dos movimentos tamente, relacionados à evolução nas técnicas
totalitários (e depois, para a organização dos propagandísticas. Então, a propaganda mo-
próprios regimes totalitários) é o uso, em larga derna pode fabricar ou manipular uma grande
escala, de modernas técnicas de propaganda. infinidade de informações, ou necessidades
Desde o começo do século XX, novos veículos para o consumo das massas, pois, com a am-
de comunicação surgiram, como por exemplo, pliação dos conhecimentos referentes à “psi-
o cinema e o rádio que se acrescentaram à im- cologia das massas”, ficou, comprovadamente,
prensa escrita jornalística, contribuindo, em mais fácil manipular e influenciar o imaginário
muito, para a criação e veiculação da chamada dessas massas, por meio de uma bem elabora-
“cultura de massa”, pois sabemos que os me- da publicidade.
35
UAB/Unimontes - 8º Período
[...] poderíamos definir os sistemas totalitários como sendo aquele onde o Es-
tado, graças ao monopólio dos meios de comunicação, exerce uma censura
rigorosa sobre o conjunto das informações e a conjuga com a contaminação
e manipulação das informações admitidas na circulação pela propaganda po-
lítica e ideológica onipresente. O objetivo visado seria o de garantir ao Estado
o controle total sobre as mentalidades e designadamente, sobre a imaginação
social. Por outras palavras, trata-se de bloquear eficazmente qualquer ativida-
de espontânea, não controlada, da imaginação social (BACZKO, 1985, p. 314).
por fim a conspiração da raça judaica era, com frequência, o objetivo declara-
do de Hitler e do movimento nacional-socialista. Desde os primeiros dias do
movimento, tinha encontrado expressão popular em slogans tais como “Morra
Judeu!” (Judá Verrecke!), ou nos versos que prenunciavam a grande reviravolta:
“Quando o sangue judeu esguichar da faca” (Wenn das Jundenblut von messer
spritz) (ELIAS, 1971, p. 277).
36
História - História Contemporânea II
37
UAB/Unimontes - 8º Período
Dentro desse aspecto, que enfatiza a percepção de uma dimensão totalitária na democracia
moderna, precisamos recorrer novamente a Claude Lefort. Para ele, a democracia recobre a do-
minação e a espoliação de uma classe por outra, traduzindo certa uniformização da vida coletiva
(LEFORT, 1991, p.24). Na “invenção democrática”, o mesmo autor procura captar as relações entre
o totalitarismo e democracia:
38
História - História Contemporânea II
BOX 4
Na Alemanha, após o desastre da Primeira passasse para 250 marcos, em janeiro de 1923.
Guerra, o governo dos Kaisers foi substituído As esquerdas lutavam entre si, com disputas
pela República de Weimar (1918-1933), que já entre sociais-democratas e socialistas. Entre
nasceu marcada pela humilhação dos trata- 1918 e 1919, acontece o levante espartaquista,
dos de paz e pela crise econômica. A hiperin- conhecido como Revolução Alemã, liderado
flação chegou a atingir 32.400% ao mês, em por Rosa de Luxemburgo e Karl Liebknecht,
1923, o que fazia com que uma fatia de pão, que tentou levar a Alemanha à revolução, mas
por exemplo, que custava 63 marcos em 1918, é desbaratado, e seus lideres são assassinados.
40
◄ Figura 30: Movimento
Espartaquista, em
Berlim.
Fonte: Disponível em:
<http://www.claseshisto-
ria.com/movimientosso-
ciales/org-partidosobre-
ros-spd.htm>. Acesso em:
15 de setembro 2011.
41
UAB/Unimontes - 8º Período
42
História - História Contemporânea II
No próximo tópico, analisaremos a eclosão da Segunda Grande Guerra, a partir de uma Para saber mais
ideologia cujas ambições eram ilimitadas. A classificação do Sta-
linismo como regime
totalitário é tema de
BOX 5
De certa forma, pode-se afirmar que a Guerra Civil Espanhola, travada entre 1936 e 1939, ante-
cipa a luta global que se seguirá. Antes da guerra, ao longo do início da década de 1930, a Espanha
atravessava um período de crise político-econômica, agravada pela agitação social. A esquerda espa-
nhola se agrupou em torno de uma Frente Popular. A vitória apertada da Frente nas cortes, não signi-
ficou um governo efetivo de esquerda. Diante disso, aumenta a insatisfação social no país. Grupos de
direita apóiam generais conservadores que conseguem, através de um golpe, o controle de algumas
cidades. Essas forças reacionárias evoluem para a formação de um conglomerado de direita, denomi-
nado de “Falange”. Os socialistas, anarquistas e comunistas articulam a resistência aos golpistas, em
nome da República. Os dois grupos buscam apoio internacional ao longo da luta. As potências do
Eixo, Itália e Alemanha, apóiam, maciçamente, os golpistas liderados pelo general Franco. Do lado da
Frente, os governos hesitam em apoiar. Os britânicos adotam uma política de não-intervenção. Ape-
nas a União Soviética presta importante apoio aos republicanos. Apesar disso, milhares de voluntários
de várias nações, inclusive do Brasil, atenderam ao chamado da República. Entretanto, a República
não possuía um comando militar unificado. Divergências entre os vários grupos que se engajaram na
luta contribuíram para a derrota republicana. A vitória do general Franco vai manter a Espanha isolada
do resto do mundo, por mais de trinta anos.
43
UAB/Unimontes - 8º Período
Para Hobsbawm, a Guerra Civil Espanhola antecipou e moldou as forças que iriam, poucos
anos depois da vitória de Franco, destruir o Fascismo. Essa mobilização antecipa a Segunda Gran-
de Guerra, no sentido de que foi uma frente de união contra as forças fascistas. E mais importan-
te ainda, essa frente, ao contrário da que lutou a favor da República na Espanha, triunfou!
______________________________________________________________
44
História - História Contemporânea II
Na conferência de Munique, Hitler con- alemãs. Conforme Hobsbawm, os dois paí- Para saber mais
quistou os Sudetos, em troca da promessa ses relutavam em ir à guerra, devido a triste Lebensraun: tese do
de paz, quebrada em março de 1939, com memória da primeira Grande Guerra (HOBS- espaço vital defendida
a invasão da Boêmia, na Tchecoslováquia. BAWM, 1995, p. 153). De fato, a grande quan- pelos alemães, na qual
Em abril do mesmo ano, Mussolini ordena tidade de mortos nas trincheiras da frente o Estado alemão tinha
a invasão e anexação da Albânia. Ingleses e ocidental trazia a incômoda lembrança de o direito de anexar
regiões habitadas por
franceses, frente ao expansionismo alemão, que uma guerra com os alemães significaria populações germânicas
adotaram uma política de apaziguamento. mais um massacre de uma geração inteira. ou que absorvessem
França e Inglaterra estavam, ainda, em uma Para esses países de tradição democrática, seu excedente produ-
posição bastante enfraquecida para pode- prevalecia a crença de que o eleitorado não tivo.
rem enfrentar, efetivamente, as pretensões toleraria um novo banho de sangue.
Ainda em 1939, a Alemanha invadiu a No- do derrotada e, ainda nesse ano, foi dividida
ruega e a Dinamarca. Em maio de 1940, ocu- em duas, uma sob ocupação alemã e outra de
pou os Países Baixos (Holanda) e penetrou na administração francesa pró-fascista, com capital
Bélgica para atacar a França que acabou sen- em Vichy, sob o comando do marechal Petain.
45
UAB/Unimontes - 8º Período
Em 1940, os gregos fazem os italianos re- mentos aos ingleses. No dia 7 de dezembro do
cuarem para a Albânia, e os alemães têm de in- mesmo ano, os japoneses atacaram a base na-
vadir a Iugoslávia para chegar à Grécia, enfren- val norte-americana de Pearl Harbor, no Havaí.
tando forte resistência nesse front. O Japão ambicionava os mercados do Pacífico
Em 22 de junho de 1941, os alemães que- e queria destruir a hegemonia dos Estados
bram o pacto de não-agressão Germano-So- Unidos na região. No dia seguinte ao ataque,
viético, lançando uma forte ofensiva sobre os Estados Unidos declaram guerra aos japo-
Moscou, Leningrado (atual São Petesburgo) e neses, e Itália e Alemanha declaram guerra ao
Stalingrado. Leningrado resistiu a um cerco de tio Sam.
900 dias, onde morreram mais de um milhão O ataque japonês, seguido pela entrada
de pessoas. A batalha de Stalingrado (1942- norte-americana no conflito, dá ao mesmo
1943) foi um ponto decisivo na resistência dos um caráter mundial. Agora a guerra era global
aliados. Após quase um ano de conflito e mais e seu cenário se estendia até o Oceano Pacífi-
de 1,5 milhão de mortos, os soviéticos saíram co. Em uma época que o rádio era o principal
vitoriosos sobre os alemães e iniciaram seu meio de comunicação das massas, a Segun-
avanço sobre o Reich, marcando o início da da Guerra, praticamente, forneceu uma aula de
derrocada nazista. geografia para o mundo. Pelo menos três conti-
Em agosto de 1941, Churchill (Primeiro nentes, Ásia, África e Europa, estavam envolvi-
Ministro inglês) e Roosevelt (Presidente es- dos, com duas forças beligerantes: as forças do
tadunidense) assinam a Carta do Atlântico, o Eixo (Alemanha, Itália e Japão) e as forças aliadas
que permitiu o fornecimento maciço de arma- (EUA, França, Inglaterra e URSS, além da China).
A guerra, que havia começado com a in- exército ao norte da África, sob o comando
vasão da Polônia pela Alemanha, chegava do general Rommel, em 1941, mas o avanço
agora a três continentes. Os alemães não con- alemão naquela região foi detido pelo gene-
seguiram ocupar a Inglaterra. Hitler enviou um ral britânico Montgomery, na batalha de El-
46
História - História Contemporânea II
◄ Figura 38:
Desembarque na
Normandia.
Fonte: Disponível em:
<http://www.zun.com.
br/o-dia-d-resumo> acesso
em: 25 set. 2011.
47
UAB/Unimontes - 8º Período
Como já apontado no início desta unida- lação civil. A guerra aérea tem por finalidade
de, a guerra de massa exigia total mobiliza- não apenas a destruição material, mas é, tam-
ção de homens e recursos. Em fins de 1943, a bém, usada como meio de aterrorização de ci-
capacidade germânica de reposição de seu vis, matando e destruindo suas vidas (PORTO,
material de guerra estava, irremediavelmente, 2009, p. 193). A experiência da guerra para a
comprometida. Principalmente em função dos população civil fica cada vez mais insuportá-
bombardeios maciços, várias fábricas alemãs vel. No início da guerra, os alemães tentaram
de armamento foram destruídas. As forças usar esse expediente praticando bombardeios
aéreas anglo-americanas desfrutavam de con- na Inglaterra, atingindo, especialmente, a cida-
siderável superioridade aérea, e o historiador de de Londres. Contudo, após a entrada dos
Paul Kennedy afirma que a superioridade dos Estados Unidos na guerra, a vantagem passa
aliados, na produção de aviões, era inquestio- para os aliados. Então é a vez da Alemanha
nável. Em especial, os norte-americanos, que sentir o peso e a destruição acarretada pelos
estavam produzindo muitos tipos novos de bombardeios estratégicos dos Estados Unidos
armas, incluindo caças, bombardeiros pesados e da Inglaterra. Após o “dia D”, então, a derrota
DICA quadrimotores, porta-aviões e outros. É por era uma questão de pouco tempo.
Assista ao vídeo isso que “[...] apesar dos extraordinários esfor- Enquanto a Alemanha sofria pesa-
documentário “O ços dos alemães para conservar o domínio do dos bombardeios, nos países ocupados pelos
Caçador da Noite”, ar, suas cidades, fábricas e linhas ferroviárias nazistas, a resistência se ampliava ao inimigo.
produzido pelo Núcleo foram cada vez mais devastadas...” (KENNE- Os comunistas se transformaram nos mais sis-
de História e Cultura DY, 1980, p. 339). Portanto, na medida em que temáticos defensores de frentes e guerrilhas
Regional – NUHICRE, da
Universidade Estadual o poderio aéreo aliado aumentava, decrescia a antifascistas. Polônia, Thecoslováquia, Hungria
de Montes Claros – capacidade de reposição das perdas alemãs, em e Iugoslávia conhecem forças de resistência
UNIMONTES, no ano função dos devastadores bombardeios que des- capitaneadas pela esquerda comunista. Após
de 2008. Após, elabore truíam, gradativamente, as fábricas, pontes, es- a guerra, muitos desses movimentos resultaram
um pequeno texto, no tradas, enfim, a infra-estrutura geral do país. na formação de partidos que levaram à forma-
fórum de discussões,
versando sobre a visão A Segunda Guerra Mundial caracterizou o ção de governos comprometidos com reformas
da população alemã tipo clássico de “guerra total”, na qual a bruta- sociais e com o socialismo, bastante influencia-
sobre o conflito. lidade impõe uma experiência crucial à popu- dos pela incrível vitória da União Soviética.
48 -guerra-mundial> acesso
em: 25 ago. 2011.
História - História Contemporânea II
BOX 6
O Holocausto
“Holocausto” é uma palavra de origem grega que significa “sacrifício pelo fogo”. O significa-
do moderno do Holocausto é o da perseguição e extermínio sistemático, apoiado pelo governo
nazista, de cerca de seis milhões de judeus. Os nazistas, que chegaram ao poder na Alemanha
em janeiro de 1933, acreditavam que os alemães eram “racialmente superiores” e que os judeus
eram “inferiores”, sendo uma ameaça à auto-entitulada “comunidade racial alemã”.
Durante o Holocausto, as autoridades alemãs também destruíram grandes partes de outros
grupos considerados “racialmente inferiores”: os ciganos, os deficientes físicos e mentais, e esla-
vos (poloneses, russos e de outros países do leste europeu). Outros grupos eram perseguidos por
seu comportamento político, ideológico ou comportamental, tais como os comunistas, os socia-
listas, as Testemunhas de Jeová e os homossexuais.
Em 1933, a população judaica europeia era de mais de nove milhões de pessoas. A maioria
dos judeus europeus vivia em países que a Alemanha nazista ocuparia ou viria a influenciar du-
rante a Segunda Guerra Mundial. Em 1945, os alemães e seus colaboradores já haviam assassina-
do dois entre cada três judeus europeus, em uma operação por eles denominada “Solução Final”,
que era a política nazista para matar todos os judeus. Embora os judeus fossem as principais víti-
mas do racismo nazista, existiam também outras vítimas, incluindo duzentos mil ciganos, e pelo
menos 200.000 pessoas com deficiências físicas ou mentais, em sua maioria alemães, que viviam
em instituições próprias e foram assassinados no chamado Programa Eutanásia.
Conforme a tirania alemã se espalhava pela Europa, os nazistas e seus colaboradores perse-
guiram e mataram milhões de pessoas de outros povos. Entre dois a três milhões de soviéticos
prisioneiros de guerra foram assassinados, ou morreram de inanição, enfermidades, negligência,
ou maltratos. Os alemães queriam aniquilar a elite intelectual polonesa, judia e não judia, bem
como levar cidadãos poloneses e soviéticos para o trabalho forçado na Alemanha e na Polônia
ocupada, onde eles trabalhavam como escravos e muitas vezes morriam sob terríveis condições.
Desde o início do regime nazista, as autoridades alemãs perseguiram os homossexuais e outros
grupos que se comportavam diferentemente das normas sociais vigentes, mesmo que fossem
pacíficos. Os oficias da polícia alemã focalizaram seu trabalho de destruição contra oponentes
políticos do nazismo--comunistas, socialistas e sindicalistas—e também contra dissidentes reli-
giosos, tais como as Testemunhas de Jeová. Muitas dessas pessoas morreram como resultado de
encarceramento e maus tratos.
49
UAB/Unimontes - 8º Período
50
História - História Contemporânea II
Após o Holocausto, muitos sobreviven- Estados Unidos e para outras nações, tais
tes encontraram abrigo nos campos para como o Brasil. O último campo para deslo-
deslocados de guerra (DP) administrados cados de guerra foi fechado em 1957. Os cri-
pelos poderes aliados. Entre 1948 e 1951, mes cometidos durante o Holocausto devas-
cerca de 700.000 sobreviventes emigraram taram a maiorias das comunidades judaicas
da Europa para Israel. Muitos outros judeus da Europa, eliminando totalmente centenas
deslocados de guerra emigraram para os destas comunidades centenárias.
No Pacífico, entre maio e junho de 1942, os cas e culminaram com pesados bombardeios so-
norte-americanos passaram à ofensiva, após as bre o território japonês. A rendição japonesa foi
importantes vitórias obtidas sobre os japoneses obtida em 1945, depois da explosão de bombas
nas batalhas navais de Mar de Coral e Midway, atômicas lançadas pelos Estados Unidos, sobre
que foram seguidas por novas derrotas nipôni- as cidades de Hiroxima e Nagasaki.
◄ Figura 42:
Desembarque de tropas
no Pacífico.
Fonte: Disponível em:
<http://www.historianet.
com.br/conteudo/default.
aspx?codigo=303> acesso
em: 25 ago. 2011.
As conferências de Teerã, Ialta e Potsdan, vantes da Segunda Grande Guerra foi o en-
decidiram os rumos do futuro. Os Estados fraquecimento do Velho Mundo. As antigas
derrotados foram totalmente ocupados pelos potências coloniais, França e Inglaterra, ape-
vencedores. O impacto humano da Segunda sar de vitoriosas na luta contra o Eixo, saíram
Guerra foi avassalador. O conflito foi muito profundamente enfraquecidas e incapazes de
mais brutal e devastador do que o anterior. manterem qualquer hegemonia. Inversamen-
Hobsbawm chega a falar em aumento da bru- te, ocorreu a ascensão dos Estados Unidos ao
talidade e da desumanização no mundo. A Se- posto de super-potência mundial, passando
gunda Grande Guerra produziu genocídios e esse país a desempenhar um papel deter-
um grande número de refugiados. minante nas relações internacionais do pós-
Por outro lado, enquanto a Primeira Gran- guerra. A hegemonia norte-americana só era
de Guerra não resolveu nada, a Segunda trou- contrabalançada pela União Soviética, a outra
xe modificações importantes (HOBSBAWM, superpotência egressa da Segunda Guerra.
1995, p. 59). Uma das implicações mais rele- Esses dois países vão protagonizar a chamada
51
UAB/Unimontes - 8º Período
“Guerra Fria”, ou seja, uma divisão do mundo ou, em alguns casos, através de sangrentas
em áreas de influência que vão gravitar em guerras, conseguem romper com as antigas
torno de ambos Estados, representantes do nações colonizadoras, apesar de, na maioria
capitalismo (Estados Unidos) e do socialismo dos casos, persistirem algum tipo de laço com
(União Soviética). a Europa.
Reflexo da decadência das potências eu- Outra consequência importante da Se-
ropeias que definirá um dos palcos da Guerra gunda Grande Guerra foi a criação da Orga-
Fria foi a emergência do movimento de des- nização das Nações Unidas, a ONU. Com sede
colonização Afro-asiática. Pouco a pouco, vão em Nova Iorque, a ONU foi criada com o obje-
surgindo, nos antigos territórios coloniais, uma tivo de tentar promover a segurança mundial
infinidade de Estados que, de forma pacífica e a cooperação entre as nações.
Referências
ARAÚJO, Ricardo Benzaquen de. Totalitarismo e Revolução. O integralismo de Plínio Salgado.
Rio de Janeiro: Joge Zahar Editor, 1988.
ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo. São Paulo: Cia das Letras, 1989.
ELIAS, Norbert. Os Alemães. A Luta pelo poder e a evolução do hábitus os séculos XIX e XX.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1997.
HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: O breve século XX – 1914-1991. São Paulo: Cia das Letras,
1995.
KENNEDY, Paul. Ascensão e Queda das grandes Potências. Rio de Janeiro: Campus, 1989.
PORTO, César Henrique de Queiroz; DIAS, Igor Gustavo; ANTUNES, Júlio César Guedes. A Segun-
da Grande Guerra sob o olhar do Major Martin Drewes. In: OLIVEIRA, Marcos Fábio Martins de; et
al. Caminhos da História. v. 14. n. 2. Montes Claros: Editora Unimontes, 2009.
REIS FILHO, Daniel Aarão. As Revoluções Russas e o Socialismo Soviético. São Paulo: Editora
UNESP, 2003.
52
História - História Contemporânea II
UNIDADE 2
O Mundo Bipolar e a Guerra Fria
Simone Narciso Lessa
2.1 Introdução
Você já deve ter ouvido o ditado que chamadas “guerras quentes”, Coréia, Vietnã
diz que sabemos como uma guerra começa, e Laos, assim como as revoluções chinesa e
mas, não sabemos como ela vai acabar. Esse cubana. Nesses conflitos, e outros que se ins-
é o caso das guerras no século XX. As guerras tauraram no final do século XX, como as guer-
contemporâneas transformaram o mundo e ras no Oriente Médio e África, veremos que a
tiveram uma ambrangência planetária, mun- oposição das duas potências está presente.
dial. Vamos tratar do período após a Segunda Interesses geopolíticos e econômicos se
Guerra Mundial. O mundo que saiu da Segun- misturam nesse contexto da segunda meta-
da Guerra Mundial era muito diferente daque- de do século XX, que atingiram, inclusive, a
le que começou o conflito. A crise dos anos América Latina, fazendo emergir ditaduras mi-
1920 e 1930, a ascensão do totalitarismo, o ho- litares, com o apoio dos EUA. Paralelamente, a
locausto e as bombas atômicas detonadas em crescente instabilidade leva a um conjunto de
Hiroxima e Nagasaki mudaram não somente a guerras no Oriente Médio, deflagradas pela
configuração geopolítica internacional, mas, descolonização e criação do Estado de Israel e
também, os valores e as relações econômicas, mantidas pelo expansionismo israelense, nas
políticas, sociais e culturais. quais o domínio territorial e dos recursos na-
A Europa, teatro da Primeira e Segunda turais, em particular a água e o petróleo, estão
Guerra Mundial, estava arrasada. Apesar da vi- no centro.
tória sobre o Eixo e do fim do totalitarismo, um O Capitalismo se reinventa, mesmo nas
novo esforço de guerra deveria empreender crises, sempre buscando incrementar epo-
sua reconstrução. A reconstrução da Europa têncializar a criação de mais-valia. A partir das
se constituiu num rico momento no qual des- crises do petróleo, na década de 1970, e da
de as técnicas urbanísticas até novos modelos crise econômica dos anos de 1980, o contexto
de gestão pública e econômica emergem do vai mudar. No lugar da mecânica, a eletrônica
processo, assim como novos comportamentos e a cibernética; no lugar da válvula, o chip. O
socioculturais, que trouxeram transformações habitat humano deixa de ser o campo e, pela
revolucionárias. primeira vez na história da humanidade, tere-
Duas potências vitoriosas vão, gradati- mos mais gente nas cidades. Um novo modelo
vamente, acirrar seu antagonismo: Os EUA de produção e consumo, o “Just in time,” virá
(Estados Unidos da América) e a URSS (União substituir ou incrementar o modelo do início
das Repúblicas Socialistas Soviéticas). Ambas do século XX, a produção taylorista-fordista.
representarão modelos antagonizando o Ca- A questão ambiental, cada vez mais, atinge
pitalismo com o Socialismo. Dominaram o todas as áreas da vida: na produção, o fim do
mundo por décadas, mantendo um equilíbrio desperdício, do estoque, os 3 Rs – reciclar, re-
baseado na “dissuasão” (equilíbrio de forças), duzir, reaproveitar, novos comportamentos,
através da corrida armamentista e espacial e novos “desenhos produtivos”. A terra rural e
da ação de ambas em outros países, tanto de urbana deve produzir cada vez maior valor –
suas áreas de influência quanto em fronteiras mais-valia fundiária.
em disputas, acionadas pela descolonização e Mudanças profundas nos costumes se-
pelo avanço do socialismo. rão tão significativas quanto radicais. Grupos
O fim do imperialismo europeu, com que antes eram “invisíveis”, obliterados, vão,
o processo de descolonização, num primei- ao longo do século XX e, em particular, na sua
ro momento, parece um contexto à parte da segunda metade, assumir uma posição de
Guerra Fria, mas, rapidamente, novos alinha- protagonistas sociais e as questões de gênero
mentos, alianças se formarão dando lugar às (mulheres, homossexuais, transexuais, entre
53
UAB/Unimontes - 8º Período
54
◄ Figura 44: 1945, em
Potsdam, Truman
assume no lugar de
Roosevelt e Attlee
assume no lugar de
Churchill, mas, Stalin
permanece.
Fonte: <http://
postmodernpraetorians.
wordpress.com/category/
us-foreign-policy>. Acesso
em: 01 set. 2011.
Abaixo, algumas charges mostram o mo- to tratada como aliada na vitória. Na primeira Glossário
mento dos acordos do pós-Segunda Guerra, charge, a Inglaterra aparece de costas, os EUA
Muro de Berlim:
nos quais EUA, Inglaterra e URSS celebraram estão com os olhos tapados, e os soviéticos le- Foi construído no
a vitória e partilharam os louros. Nestas char- vando tudo. Na segunda, a luta do anti-fascis- processo de consoli-
ges, o lugar de coadjuvante da Grã-Bretanha mo traz um “cavalo de Tróia” com os soviéticos dação da República
ficou claro, assim como a displicência dos EUA dentro. Muitas outras charges fazem referência à Democrática Alemã
em relação aos que se tornariam, logo depois, situação dos acordos de final da guerra e à ame- (Alemanha Oriental),
durante a Guerra
seus grandes rivais, a URSS, naquele momen- aça soviética ignorada pelas outras potências. Fria. Ele cercava toda
Berlim Ocidental,
separando-a da Ale-
manha Oriental. Além
de dividir a cidade
de Berlim ao meio,
tornou-se o simbolo
da divisão do mundo
em dois blocos: um
socialista o outro ca-
pitalista. Construído
na madrugada de 13
de agosto de 1961,
dele faziam parte
Figura 45: O jogo da nova ordem internacional. Figura 46: O Cavalo de Tróia da aliança dos aliados. 66,5 km de gradea-
Fonte: <http://thepeoplescube.com/peoples-tools/red- Fonte: <http://thepeoplescube.com/peoples-tools/ mento metálico, 302
primer-for-children-and-diplomats-t2223.html>. Acesso red-primer-for-children-and-diplomats-t2223.html>. torres de observação,
em: 30 ago. 2011. Acesso em: 30 ago. 2011. 127 redes metálicas
eletrificadas com
Gradativamente, a divisão bipolar vai se ins- em uma parte oriental e central e outra ocidental, alarme e 255 pistas
taurando. Churchill, chanceler britânico, tentou de “Cortina de Ferro”. Entre 1945 e 1949, a rivalidade de corrida para fero-
alertar Roosevelt sobre o perigo soviético, sendo o dos dois blocos se acirrou. O epicentro dessa rivali- zes cães de guarda.
Fonte: <http://www.
primeiro a chamar a divisão imaginária da Europa, dade era o território da cidade de Berlim. historiadomundo.
com.br/idade-con-
temporanea/acons-
trucao-do-muro-de-
-berlim.htm>. Acesso
em: 01 set. 2011.
Figuras 47: A construção do Muro de Berlim. Figura 48: Uma vista do centro de Berlim: os
Fonte: <http://www.diariodocentrodomundo.com. Portões de Brandenburgo cercados pelo muro.
br/?tag=muro-de-berlim>. Acesso em: 02 set. 2011. Fonte: <http://noticias.terra.com.br/mundo/
noticias/0,,OI3919882-EI8142,00-Ha+anos+comecava+constr
ucao+do+Muro+de+Berlim.html>. Acesso em: 02 set. 2011.
55
UAB/Unimontes - 8º Período
A Guerra Fria, apesar de momentos de tensão entre as duas potências, como a própria
construção do muro, entre outros, não se degenerou num conflito armado direto entre as duas
potências. Uma forma de guerra de nervos, chamada “Guerra de Dissuasão”, ou como coloca Paul
Virílio & Lotringer (1984), uma “Guerra Pura”, baseada na corrida armamentista, na corrida espa-
cial e no apoio e/ou participação direta em guerras localizadas, como o Vietnã, foram as formas
assumidas pelo conflito.
56
História - História Contemporânea II
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UAB/Unimontes - 8º Período
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História - História Contemporânea II
◄ Figura 54:
Neocolonialismo no
Oriente
Fonte: <http://conver-
secomagente.blogspot.
com/p/9-ano-turmas-901-
-e-902-historia.html>.
Acesso em: 11 set. 2011.
Quando analisamos aquele momento Além das disputas com as potências colo-
após a Segunda Guerra, com a Europa arra- niais, com o tempo, as guerras de descolonização,
sada, podemos inferir que o processo de des- como o caso da Coréia e Vietnã, acabaram por se
colonização da África e da Ásia foi uma de- tornarem palcos sangrentos da Guerra Fria. O caso
corrência do enfraquecimento das potências da guerra da Coréia é paradigmático, pois, começa
colonizadoras. Entretanto, a resistência come- com uma guerra de descolonização contra a Fran-
çou desde o início do século XX, na maior par- ça e, aos poucos, torna-se uma guerra civil do Nor-
te desses territórios ocupados. De acordo com te contra o Sul. Essa guerra foi o primeiro palco do
Moraes & Franco, “com o enfraquecimento confronto entre os socialistas, do norte, contra os
econômico e político das potências europeias capitalistas, do sul. Depois, o conflito se expandiu
no pós-guerra, seu poder sobre as colônias para outros países, Vietnã e Laos, e tornou-se um
também se tornou frágil. As rebeliões pela dos principais teatros de guerra entre as potências
independência multiplicaram-se” (2009, p. 33) do mundo bipolar.
Um dos principais legados da guerra da Coréia foi a do Vietnã. Os EUA viram, nessa vitória
socialista, uma derrota particular e exigiram a divisão do Vietnã, nos moldes coreanos, parte so-
cialista e parte capitalista.
Este conflito começou com a luta do povo vietnamita contra a presença colo-
nial francesa no país. A disputa foi comandada por Ho Chi Minh, líder do Par-
tido Comunista, e culminou, depois da longa luta armada, na expulsão das
tropas francesas em 1954. [...] Inconformados com a divisão, as forças da resis-
tência do sul organizaram uma Frente Nacional de Libertação (FNL), conhecida
também como vietcongue (MORAES & FRANCO, 2009, p. 49).
A guerra contra os EUA aconteceu en- nã do Norte empreenderam uma guerra con-
tre 1959 e 1975, com a derrota americana. Em vencional contra as tropas norte-americanas
1965, os EUA mandaram suas primeiras tropas e sul-vietnamitas, enquanto as milícias da FNL
para o Vietnã. As tropas do exército do Viet- lutaram uma guerra de guerrilha na região,
59
UAB/Unimontes - 8º Período
DICA usando o melhor conhecimento da selva e o da guerra fria, a guerra do Vietnã interferiu na
Veja o filme: elemento surpresa. Com a estratégia de guer- relação entre as gerações americanas, sendo
Parte superior rilha e apoio da China e URSS, os vietcongues um dos fatores que levaram a um conflito de
do formulário derrotaram os EUA, numa guerra sangrenta e gerações que atingiu todo o ocidente, com
____________________ desigual. Em 1973, os americanos admitiram o questionamento pelos jovens dos valores
a derrota e fizeram uma retirada dramática, das gerações anteriores, dentre eles o alista-
Parte inferior
do formulário deixando seus aliados vietnamitas para trás à mento obrigatório. Passeatas, desobediência
Corações e Mentes mercê do revanchismo vietcongue. Em 1975, o civil de jovens, que rasgavam seus cartões de
2010-05-22 Vietnã se unificou, novamente, sob a égide do convocação, corpos dos americanos mortos e
Francisco socialismo. imagens e relatos chocantes, atingiram de forma
Título original: Um fator que devemos considerar, nes- definitiva os EUA e o mundo. A TV, o cinema e,
(Hearts and Minds)
Lançamento: sa guerra, foi o crescente descrédito do povo mesmo o teatro, com a peça Hair, tiveram uma
1974 (EUA) americano em relação à mesma, fazendo com participação decisiva na formação da opinião
Direção: que o governo perdesse legitimidade para pública. A Guerra Fria tinha, enfim, seu derrama-
Peter Davis mantê-la. Além de um dos principais palcos mento de sangue estampado para todos verem.
Atores:
Georges Bidault, Clark
Clifford, George Coker,
Kay Dvorshock.
Duração:
112 min
Gênero: Documentário
Sinopse
Uma investigação sobre
a Guerra do Vietnã,
através de imagens da
guerra e entrevistas
com ex-combatentes
americanos e sobre-
viventes vietnamitas,
analisando assuntos
como a duração do
conflito, o militarismo e
o racismo entranhado
na cultura dos Estados
Unidos.
Fonte: <http://www.
adorocinema.com/
filmes/coracoes-e-
-mentes>. Acesso em:
21 set. 2011.
60 Fonte: <http://www.grupoescolar.com/
pesquisa/a-guerra-do-vietna.html>.
Acesso em: 11 set. 2011.
◄ Figura 57: Jovem
soldado americano
ferido.
Fonte: <http://vitri-
nedaweb.blogspot.
com/2010/11/fotos-
-emblematicas-da-guerra-
-do-vietnam.html>. Acesso
em: 11 set. 2011.
Como escreve Rogério Haesbaert (1994), a China atual somente pode ser entendida se bus-
carmos entender a complexidade histórica e geopolítica desse país. Escreve o autor:
62
História - História Contemporânea II
Nessa revolução, as imagens ganharam -Estado. Marcado, também, pelo culto à perso-
muita importância junto as massas chinesas. nalidade de Mao Tsé-Tung. Em várias inicitivas,
Vamos buscar nas imagens a força desse pro- o partido investiu em políticas intervencionis-
cesso chinês. Destacamos a presença das mu- tas de controle da população e promoção do
lheres, nas fileiras revolucionárias. Devemos crescimento econômico: a repressão do “Desa-
observar, também, que as forças maoistas têm brochar de Cem Flores” e o fracasso do “Salto
suas raízes no campo. O período maoista foi Adiante”, até os tormentos da Revolução Cul-
marcado pelo poder na mão de um Partido- tural, na década de 1970.
63
UAB/Unimontes - 8º Período
Assim como Mao tinha escrito suas ideias no “Livro Vermelho”, Fidel escreveu, no exílio, Glossário
seu livro “A História me Absolverá”, onde defende suas ideias, constituindo-se o principal opositor A Grande Revolução
ao governo de Batista. Fidel descreveu o ideal revolucionário, enfatizando a figura de um herói, o Cultural Proletária ou
revolucionário. Revolução Cultural
Chinesa:
foi uma profunda
Um homem que se conforma em obedecer às leis injustas, e permite que o campanha político-
país em que nasceu seja pisoteado pelos homens que o ofendem, não é um -ideológica levada a
homem honrado. [...] No mundo deve haver certa dose de decência como deve cabo a partir de 1966,
haver certa quantidade de luz. Quando há muitos homens desonestos, há sem- na República Popular
pre outros que são portadores da dignidade da maioria.São esses os que se da China, por Mao
rebelam com força terrível contra os que roubam a liberdade ao povo, que é Tsé-Tung. Seu obje-
o mesmo que roubar dos homens sua dignidade. Esses homens são intérpre- tivo era neutralizar a
tes de milhares de outros homens, de um povo inteiro, da dignidade humana crescente oposição
que lhe faziam alguns
(RUIZ, 2008, p. 91). setores menos radicais
do partido, em de-
Após a vitória, Fidel assumiu como pri- corrência do fracasso
do plano econômico
meiro ministro, prometendo eleições que não Grande Salto Adiante
aconteceram. Promoveu a reforma agrária, na- (1958-1960). Os alvos
cionalizou empresas estrangeiras e fuzilou os da Revolução eram
membros do partido
opositores. A tentativa de retomada, por parte mais alinhados com
dos EUA, com a frustrada invasão da Baia dos o Ocidente ou com a
Porcos por cubanos exilados treinados pela União Soviética, sobre-
tudo, intelectuais. Foi
CIA (EUA), em 1961, e a instalação de mísseis um moviento anti-inte-
soviéticos em Cuba coloca a ilha na linha de lectualista. Especialis-
frente da Guerra Fria. A adoção da vertente tas afirmam que esse
processo, apesar de
socialista em Cuba, praticamente nas costas ter sido encerrado por
americanas, levou, em 1962, ao rompimento Mao em 1969, durou,
com os EUA, ao embargo contra o país e à ex- de fato, até à morte
Figura 66: Fidel em Sierra Maestra. de Mao, em 1976, e
pulsão de Cuba da OEA. Fonte: <http://cenasecoisasdavida.blogspot. a subida ao poder de
com/2011/05/artigos-revolucao-cubana-uma-revolucao. Deng Xiaoping, então
html>. Acesso em: 13 set. 2011 Secretário-Geral do
Partido, o qual, gradu-
almente, deu início às
O fracasso da ação contra a expansão do socialismo teve em Cuba um de seus epsódios mudanças nos rumos
mais críticos. Foi o clímax da Guerra Fria. A instalação dos mísseis em Cuba teria levado o mundo políticos e econômicos
à beira da ruptura da dissuasão entre as duas potência nucleares. A retirada das armas pela URSS do país.
Fonte: <http://
fez o mundo respirar, novamente aliviado. Entretanto, a influência soviética sobre a ilha se forta- guinevereuniver-
leceu e perdurou até a queda da URSS. Essa relação com a URSS salvaguardava cuba do embargo sidade.blogspot.
ocidental. Seu final e a senilidade de Fidel Castro deflagrou um novo momento. com/2012/01/o-que-
-foi-revolta-das-cem-
-flores-como.html>.
Acesso em: 13 set.
2011.
OEA - Organização
dos Estados Ameri-
canos:
é uma organização
internacional, criada
em 1948, com sede em
Washington (Estados
Unidos), cujos mem-
bros são as 35 nações
independentes do
continente americano.
A tensão da Guerra Fria se alastra pela América Latina, principalmente após a Revolução
Cubana. O crescimento das esquerdas e a ameaça socialista fez com que os EUA resolvessem in-
tervir na América Latina, tanto com meios diplomáticos quanto com meios militares. As ideias
socialistas se manifestavam em vários países latinoamericanos, mas, de acordo com Emir Sader
(1985, p. 6) o único exemplo efetivo de revolução foi a cubana. Escreve o autor: “Após 1945, a for-
ma básica de luta revolucionária no terceiro mundo, ou seja, em qualquer parte do mundo, pare-
cia ser a guerra de guerrilha.” Para Florestam Fernandes (2007), a guerrilha foi fundamental para a
construção do socialismo em Cuba. Sader (1985) continua dizendo que:
Foi com base nas premissas acima que golpes militares foram empreendidos em grande
parte da América Latina, com o suporte norte-americano. Os EUA deram suporte para a implan-
tação das ditaduras, em parceria com as elites locais, fortalecendo o tripé que sustentava o mo-
delo de industrialização (substituição de importações) com o investimento do capital internacio-
nal na região. O tripé que será sustentado é a aliança entre o capital nacional, o internacional e o
Estado.
Os golpes militares puseram fim às reformas sociais e à democratização da América Latina,
em particular no Brasil, Chile, Uruguai, Paraguai e Argentina. Em alguns países, como no Brasil, os
governos militares duraram 30 anos, com tortura, censura e sérias limitações dos direitos civis. O
Brasil é o exemplo mais próximo desse processo para você entender. As crises da Guerra Fria es-
tavam no auge quando Jânio Quadros, presidente eleito com larga maioria, renunciou, alegando
66
História - História Contemporânea II
pressão de “forças ocultas”. João Goulart, o vice, estava em viagem à China comunista. Ambos se Glossário
mostravam favoráveis a Cuba e, após um processo conturbado para ter acesso ao cargo de pre- Macartismo:
sidente, João Goulart assumiu e propôs, juntamente com seu Ministro do Planejamento, Celso movimento político
Furtado, reformas de base, nas quais estava incluída a reforma agrária. reacionário, anti-
-comunista, liderado
pelo senador ameri-
cano Joseph MacCar-
thy, que criou uma
comissão parlamentar
que empreendeu uma
verdadeira persegui-
ção a possíveis comu-
nistas nos EUA, entre
os fins da década de
◄ Figura 69: Encontro de 40 e parte da década
Jânio e Che Guevara, de 50. Vários artistas,
revolucionário cubano. cientistas e sindicalis-
tas foram intimados e
Fonte: <http://sul21.com. persseguidos. Chales
br/jornal/2011/04/janio- Chaplim, que era
-quadros-carismatico-e- inglês e vivia nos EUA,
-contraditorio-abandona- foi o caso paradigmáti-
-o-poder/>. Acesso em: 18 co de perseguição. Ele
set. 2011. foi expulso dos EUA.
Para a elite e a classe média, entre outros setores conservadores nacionais ou internacio-
nais, o golpe (chamado pelos militares de revolução) era inevitável para que o comunismo não
tomasse o Brasil de assalto. O golpe acontece em 1964, e, em 1968, com o AI-5 (Ato Institucional
no. 5) são cassados os direitos civis, e a ditadura se instaura (censura, tortura, fim do Habeas
Corpus, plenos poderes aos setores repressivos policiais: polícia militar, civil, polícias da mari-
nha, do exécito e da aeronáutica).
67
para entendermos melhor a crise que se seguirá.
UAB/Unimontes - 8º Período
Argentina – 1976-1983
Brasil - 1964-1985
Bolívia – 1971-1985
Chile – 1973-1989
Equador – 1972-1979
Guatemala – 1970-1985
Nicarágua - 1967 - 1989
Paraguai – 1954-1989
Peru – 1968-1980
Uruguai – 1973-1984
Fonte: LESSA, 2011
Você sabia que a década de 1980 marcou ação, e as dívidas externas passaram a ser co-
o fim desse período ditatorial na América La- bradas levando a região à hiper-inflação e à
tina? Esse processo coincide com o período recessão. Esse quadro foi alterado na década
de desgaste da Guerra Fria, em particular com de 1990, com a queda da URSS e a nova ordem
a crise econômica capitalista e o desgaste do social, com a globalização, o neoliberalismo e
bloco socialista. A crise econômica leva o Fun- a instauração de uma ordem democrática que
do Monetário Internacional – FMI a entrar em trataremos na próxima unidade.
ra Fria nesta primeira década do século XXI. tão. Esses três conflitos geraram outros subse-
Dentre eles, vamos tratar de quatro blocos: quentes em sua quente e estratégica periferia,
a Palestina e o Estado de Israel; os persas e a com a participação dos egípicios, libios, sírios,
islamização da política; o Iraque e o Afeganis- jordanianos e libaneses.
69
UAB/Unimontes - 8º Período
Entre os árabes, também dominados, an- se tornou possessão inglesa. A França recebeu
tes pelos turcos otomanos e, posteriormente, a Síria e o Líbano.
pela Inglaterra e França, crescia o nacionalis- Para ter o apoio dos judeus e árabes na
mo. Não demorou muito para que o sionis- Primeira Guerra Mundial, a Inglaterra elaborou
mo entrasse em confronto com o crescente a “Declaração Belfour”, negociada por Arthur
nacionalismo árabe. Apesar das esperanças James Balfour, prometendo aos dois povos res-
dos povos do Oriente Médio na independên- peitar suas reivindicações nacionalistas. Dava,
cia diante das perdas otomanas da Primeira principalmente, aos judeus, garantias da criação
Guerra Mundial, em 1920, dois anos depois de um estado para esta nação. Houve uma forte
de a Grã-Bretanha conquistar a Palestina dos oposição palestina, que se opusera ao plano de
otomanos, que a haviam ocupado desde 1517, criação de um estado judeu independente. Essa
a área foi alocada ao Reino Unido. A área que, resistência conduziu a revoltas em ambas as par-
presentemente, constitui a Jordânia, a área en- tes. De acordo com Moraes & Franco:
tre o Jordão e o mar Mediterrâneo e o Iraque
70
História - História Contemporânea II
No início dos anos 60, ocorreu a retomada das tensões no oriente médio. Em
1964, os lideres do Egito, Argélia e Tunísia patrocinaram o surgimento da OLP
[Organização Para a Libertação da Palestina] que passou a utilizar a Al Fatah or-
ganização político-militar como braço armado para fustigar os israelenses por
meio de ações terroristas.
No Egito, Abdel Nasser rearmava seu exército com material e assessoria soviéti-
ca. Ao mesmo tempo, formava com a Síria uma confederação, a República Ára-
be Unida (RAU). Enquanto isso, os EUA e seus aliados armavam Israel. Os fatores
conjunturais que conduziram ao conflito de 1967 foram os seguintes:
a. Pressionado por setores radicais do governo egípcio, Nasser solicitou a re-
tirada dos “capacetes azuis”, força de paz da ONU, instalados desde 1957
na fronteira israelense–egípcia;
b. O Banco Mundial e o FMI pressionaram o governo egípcio a submeter-se a
um programa de redução de gastos e privatização das indústrias.
A recusa de Nasser em dobrar-se a essas exigências levou ao bloqueio de em-
préstimos e financiamentos e isso comprometia o desenvolvimento egípcio;
diante desse quadro, Nasser resolveu decretar o fechamento do golfo de Áca-
ba à navegação israelense. Sem dúvida este último ato serviu como principal
pretexto para a guerra. E, assim, na manhã de 05/06/1967, Israel desfechou um
ataque aéreo fulminante que pegou de surpresa os árabes e o mundo todo
(MORAES & FRANCO, 2009, p. 36 e 37).
Os conflitos continuam. O fracasso dos Estados Árabes na guerra de 1967 levou ao surgi-
mento de um movimento que leva o nacionalismo árabe a um novo patamar. A Organização de
Libertação da Palestina (OLP), concebida como vetor armado de libertação, nas décadas seguin-
tes, lançava ataques contra alvos israelenses, sendo o mais conhecido e polêmico desses ataques
o massacre de atletas israelitas nos Jogos Olímpicos de Verão de 1972, em Munique, na Alema-
nha. Israel reagiu com a Operação Cólera de Deus, na qual os responsáveis pelo massacre de Mu-
nique foram encontrados e executados. Escreve Haroub, apud Collares,
Em 1973, tropas egípcias e sírias efetuaram um ataque de surpresa contra Israel, querendo
dar o “troco”. Israel enfrentou, pela primeira vez, a possibilidade de uma derrota, mas, muito bem
armados e com o suporte dos EUA, os israelenses contiveram a ofensiva com um contra-ataque.
O contexto egípcio aponta mudanças do papel desse país na Guerra Fria. Escrevem Moraes &
Franco:
Prosseguiu o avanço do exército egíp- no, mas logo Israel reagiu à altura. Apesar de
cio no Sinai, que apenas foi detido quando as um cessar-fogo conseguido em negociações na
tropas de Israel abriram uma brecha entre os ONU, Israel não respeitou o acordo e suas tropas
dois exércitos egípcios. Esse foi um enfrenta- cercaram o 3° Exército egípcio. Os israelenses só
mento que se deu principalmente entre Israel se detiveram quando a ONU enviou tropas de in-
e Egito, nas colinas de Golan e no deserto do tervenção para vigiar o cumprimento do acordo
Sinai. Os árabes começaram ganhando terre- de cessar-fogo. De acordo com Moraes & Franco:
72
História - História Contemporânea II
Uma aliança formada entre Egito e Síria atacou Israel de surpresa. A resposta
israelense foi devastadora. O massacre só não foi maior em razão da intervesão
das superpotências que exigiram a assinatura de um cessar-fogo.
Os árabes, derrotados militarmente, passaram a utilizar o petróleo como arma
nas relações internacionais. O preço do petróleo ultrapassou patamares estra-
tosféricos, atingindo a economia capitalista dependente desta matéia prima
como principal fonte de energia; como se não bastasse o aumento, foram es-
tabelecidas cotas de produção, que significaram uma diminuição da produção
(Moraes & Franco, 2009, p. 38).
73
UAB/Unimontes - 8º Período
Data Fatos
Camp David não conduziu à paz no Oriente Mé- do Sinai e os dois países reconheceram as fron-
dio, mas sim entre Israel e Egito, que assinaram teiras. Reconheceram, também, o estatuto da
o tratado de paz em março de 1979. O Estado faixa de Gaza e Cisjordânia.
judaico retirou, progressivamente, suas tropas
74
História - História Contemporânea II
75
UAB/Unimontes - 8º Período
Através da Antifada, a causa palestina conquistou a simpatia em todo o mundo. Escreve Gil-
les Kepel:
A Estratégia foi tão danosa para o Estado judeu, para sua imagem internacio-
nal e para sua identidade moral que seus dirigentes foram obrigados a encarar
a necessidade de um processo de reconhecimento da OLP. Este tomou forma
após a Guerra do Golfo de 1990-91, resultando na declaração de princípio de
setembro de 1993, assinado por Israel e pelos palestinos, que instalou na Faixa
de Gaza, em julho de 1994, a Autoridade Palestina autônoma liderada por Yas-
ser Arafat (2003, p. 232).
76
História - História Contemporânea II
As condições do povo palestino têm se deteriorado em todos os sentidos. A pobreza, a des- DICA
truição, a violência e o isolamento marcam a vida de gerações em Gaza, na Cisjordânia e nos as- <http://oglobo.
sentamentos ou campos de refugiados. A principal fonte de recursos é a ajuda internacional. Em globo.com/mundo/
2004, morre Yasser Arafat. A Autoridade Palestina passou ao eleito Mahmud Abbas. O desgaste mat/2011/04/27/
dos grupos laicos principalmente do Fatah é grande. A Autoridade Palestina é vista como mais grupos-palestinos-
alinhada com as forças ocidentais. -fatah-hamas-se-
-reconciliam-con-
Diante desse quadro, em 2006, o Hamas, partido político de bases islâmicas é eleito, democrati- cordam-em-formar-
camente, através de voto popular, e obtém a maioria das cadeiras no Parlamento Palestino. No final -governo-interino-ate-
de dezembro de 2008, o cessar-fogo entre o Hamas e Israel acabou, após foguetes serem disparados a -eleicoes-924330177.
partir da Faixa de Gaza, controlada pelo Hamas. Israel respondeu com uma série de intensos ataques asp#ixzz1alXk5hQ4>.
aéreos. Em 3 de Janeiro de 2009, tropas israelenses entraram em Gaza, marcando o início de uma Acesso: 30 de setembro
de 2011.
ofensiva terrestre. A guerra continua, com grande tensão entre as duas partes. Escreve Collares: © 1996 - 2011. Todos os
direitos reservados a In-
No imaginário das pessoas que vivem nos território ocupados da Palestima, de- foglobo Comunicação e
pois de longos acordos de paz que no fim nunca responderam aos anseios da Participações S.A.
população de uma maneira satisfatória, o Hamas com sua carga de trabalhos
sociais, de lutas das quais muitas de forma violenta, um símbolo da resistência
palestina parecia poder naquele momento dar a solução ao menos em parte
para aqueles que já não tinham muita esperança por mais de meio século. Nes-
sa medida, o Hamas soube ao que parece, usar o imaginário social em seu be-
nefício [...] (2012, p. 113).
77
UAB/Unimontes - 8º Período
No final dos anos 70, uma série de protestos violentos contra o regime do Xá tomou as ruas do
Irã. Uma onda de greves gerais aumentou a instabilidade e abalou também a economia iraniana. Em
1978, os opositores esquerdistas, liberais e xiitas uniram-se para desencadear o processo revolucioná-
rio e depuseram o Xá, assumindo o controle do governo, enquanto Reza Pahlevi fugia do país. Em 1º
de abril de 1979, o Irã foi declarado, oficialmente, uma República Islâmica, cuja autoridade suprema
era o chefe e guia religioso, o aiatolá Khomeini.
Para Meihy, a Revolução Islâmica coincidiu com a decadência dos projetos nacionalistas e
pan-arabistas que predominaram no Oriente Médio dos anos 50 aos 70. A revolução permitiu ao
islamismo tornar-se uma força. Essa força política mudou a concepção do islã político, do Mar-
rocos à Malásia. Não concordamos com a tese do fim do nacionalismo entendemos que ele ga-
nhou uma outra forma islâmica com a politização do islamismo durante a revolução contra o Xá.
[...] um exame conclusivo da ação política islâmica no Irã entre 1978 e 1988. As
polêmicas que envolvem a história política iraniana nas últimas três décadas
impedem que qualquer leitura dessa sociedade seja definitiva. Quando o aia-
tolá Khomeini ascendeu ao poder, muitos acreditaram (inclusive o Xá deposto)
que a Revolução Islâmica não sobreviveria. Em seguida, no momento em que
uma série de ações militantes aumentou as hostilidades entre o Irã e os Esta-
dos Unidos logo no primeiro ano da República, a queda da nova ordem política
parecia certa, mas não aconteceu. Mesmo quando o Iraque declarou guerra à
nação vizinha e arrastou ambos os países a um conflito sangrento ao longo de
quase dez anos de combate, a destruição do legado de Khomeini também não
veio. A única conclusão possível à análise da política iraniana é que ao longo de
todo o século XX, a coesão política dessa nação dependeu da força social dos
religiosos do xiismo duodécimo. O conceito de nação parece manter-se como
elemento central dos debates
[...] O Irã desde 1979 não repudia a modernidade em reverência ao tradiciona-
lismo com o qual é representado. Os avanços tecnológicos de sua indústria bé-
lica, além de seu bem sucedido programa nuclear servia como objeto de aná-
lise do vínculo do Estado iraniano a um projeto modernizador que em alguns
pontos específicos recusa o único modelo considerado legítimo pelo Ocidente.
O projeto de construção de um Estado-nacional moderno no Irã após a Revo-
lução Islâmica se fundamentou, originalmente, como uma alternativa anterior
à bipolarização do contexto da Guerra Fria e, principalmente, ao poder hege-
mônico exercido pelos Estados Unidos da América no Mundo Islâmico, desde a
segunda metade do século XX (MEIHY, 2007, pp.176- 177).
NO IRÃ NO MUNDO
78
História - História Contemporânea II
- Adoção de uma nova bandeira com as ins- - Retorno dos indivíduos ao Islã, especialmente à
crições “Allah-o Akbar” (Deus é Grande) que é Escola de Ahlul Bait (A.S.), uma vez que o Íman Kho-
repetida 22 vezes, 11 vezes em cada faixa. O nú- meini era um religioso educado nela;
mero 22 foi escolhido uma vez que a Revolução
Islâmica de 1979 derrubou o regime do Shah no
dia 22 do 11º mês do calendário islâmico;
- Encerramento das bases militares dos EUA no - Desenvolvimento da ideia pela procura de inde-
Irã; pendência e liberdade em todo o mundo.
- Movimento de alfabetização;
79
UAB/Unimontes - 8º Período
BOX 7
A independência do Afeganistão
81
DICA Afeganistão, em janeiro de 2002, onde foram O que está em jogo no contexto de con-
atribuídos 4,5 bilhões de dólares a um fundo flitos afegãos da segunda metade do século
Veja o livro (tem um
filme também) sobre o a ser administrado pelo Banco Mundial. As XX é a logística do ópio e do petróleo. Princi-
Afeganistão, O Caçador áreas prioritárias de reconstrução são: a cons- palmente, o desejo da URSS de construir um
de Pipas, de Kalehd trução de instalações de educação, saúde e gasoduto e um oleoduto que escoasse o pe-
Hosseini. RJ: Nova Fron- saneamento, o aumento das capacidades de tróleo do mar Cáspio. Esta, talvez, tenha sido
teira S. A., 2005. administração, o desenvolvimento de setores a última guerra da Guerra Fria. Os EUA equipa-
agrícolas e o de reconstrução das ligações ro- ram e treinaram os Talibãs contra a URSS. Aca-
doviárias, energéticas e de telecomunicações. baram por treinar grupos que se mostrariam
Dois terços da população vivem com menos hostis aos EUA no contexto que seguiu o fim
de dois dólares por dia. A taxa de mortalidade da Guerra Fria.
infantil é de 160.23 por 1000 nascimentos.
O trabalho de Döpcke (1999), que estuda as fronteiras políticas na África Negra, nas suas
dimensões históricas e atuais, discutiu e criticou as suposições estereotipadas no discurso popu-
lar e acadêmico sobre as fronteiras na África. Ele visava explicar porque elas exibiram, apesar de
todas as suas imperfeições e defeitos, tanta resistência a mudanças.
No século XIX, para resolver o impasse dos interesses imperialistas das potências europeias
na África, foi realizada a conferência de Berlim (1884-85), a princípio para equacionar a questão
da navegação nos rios Níger e Congo. O imperialismo passou a se pautar pelo conceito geopo-
lítico das zonas de influência. Após a guerra, com o esgotamento das potências e a difusão das
ideias democráticas, nasceu uma nova era para a África. De acordo com Moraes & Franco
83
UAB/Unimontes - 8º Período
Glossário A descolonização diferiu, naturalmente, flitos atuais são remanescentes dos anterios.
de país para país. Nos casos em que a potên- Entre os principais conflitos na África estão os
Kuomintang:
A definição para a cia colonial recrudecera suas políticas colo- que acontecem em Ruanda, Mali, Senegal, Bu-
expressão Guerra Fria nialistas, a resistência africana foi compelida rundi, Libéria, Congo e Somália (conflitos ét-
é de um conflito que a recorrer à guerra colonial a fim de mudar e nicos). Outros, por disputas territoriais, como
aconteceu apenas romper a situação vigente. Nesses casos, a Serra Leoa, Somália e Etiópia, e também por
no campo ideológi- transição fez-se a preço de sangue e, muitas questões religiosas, como o que acontece na
co, não ocorrendo
um embate militar vezes, uma desestruturação agravada pelas Argélia e no Sudão.
declarado e direto disputas da Guerra Fria. Grande parte dos con-
entre Estados Unidos
e URSS. Até mesmo
porque estes dois paí-
ses estavam armados 2.3.5 O fim da Guerra Fria e a nova Ordem mundial - diplomacia,
com centenas de
mísseis nucleares.
economia e cultura: a outra face da política internacional
Um conflito armado
direto significaria o
fim dos dois países Como tratamos anteriormente, a Guer- outros povos, cada um de um lado, nas dis-
e, provavelmente, da ra Fria tem início logo após a Segunda Guerra putas como da Coréia do Norte contra a do
vida no planeta Terra. Mundial, quando os Estados Unidos e a União Sul, Vietnã, Afeganistão e Irã contra o Iraque,
Porém, ambos aca- Soviética vão disputar a hegemonia política, como você já viu anteriormente. De acordo
baram alimentando econômica e militar no mundo. Na parte an- com Chomsky (1993, p. 90), as superpotências
conflitos em outros
países como, por terior, tratamos dos contextos de guerras e re- oprimiam seus próprios “aliados” quando es-
exemplo, na Coréia e voluções, em várias regiões do mundo, que se tes buscavam “um grau de independência no
no Vietnã. relacionaram com a Guerra Fria. O período pós- interior dos blocos – apelando à ameaça da
Na verdade, uma ex- -guerra apresenta transformações que, somadas superpotência inimiga, para mobilizar sua pró-
pressão explica muito a esses conflitos, gestarão no interior da Guerra pria população e a de seus aliados.”
bem esse período: a
existência da Paz Ar- Fria suas próprias contradições e que, no final da Essas disputas não ficaram somente no
mada ou Dissuasão. década de 1980, levarão ao seu fim. âmbito externo. Internamente, as duas potên-
As duas potências se Os fatores que levaram ao fim da Guerra cias investiram na chamada “Corrida Arma-
envolveram numa Fria e a instauração da chamada Nova Ordem mentista”, com grandes investimentos em de-
corrida armamentis- Mundial já começavam a surgir desde o início senvolvimento de armamentos cada vez mais
ta, espalhando exérci-
tos e armamentos em desse conflito bipolar. A União Soviética, que avançados, em particular, os nucleares, e leva-
seus territórios e nos nunca foi um Estado liberal, possuía um siste- ram suas disputas até o espaço sideral, com a
países aliados. En- ma socialista, baseado na economia planifica- chamada “Corrida Espacial”. No ano de 1957,
quanto houvesse um da e partido único (Partido Comunista). Já os um foguete soviético colocou o primeiro sa-
equilíbrio bélico entre Estados Unidos defendia a mundialização do télite em órbita, o Sputnik 1. Em 1958, foi lan-
as duas potências, a
paz estaria garantida, sistema capitalista, baseado na economia de çado, pela URSS, o Sputinik 2, com o primeiro
pois haveria o medo mercado, sistema baseado nos princípios de- ser vivo a ir para o espaço, a cachorrinha Laika
do ataque inimigo. mocráticos e propriedade privada. que morreu quando o satélite voltou à Terra.
Na segunda metade da década de 1940 Doze anos depois, em 1969, o mundo todo
Fonte: <http://www. até 1989, essas duas potências disputaram, pôde acompanhar, pela televisão, a chegada
suapesquisa.com/
guerrafria/>. Acesso palmo a palmo, as áreas de influência no do homem à lua, com a missão espacial norte-
em: 11 out. 2011. mundo. Para tanto, atuaram em conflitos de -americana.
84
História - História Contemporânea II
Foi escolhido para a rede um modelo proposto por Paul Baran, em 1962, que lançou a ideia de comunica-
ção digital via comutação de pacotes numa série de estudos sigilosos feitos na RAND Corporation. Esses
estudos foram realizados em função de um contrato com a ARPA, cujo objetivo era a idealização de um
sistema de comunicações que não pudesse ser interrompido por avarias locais.
Nessa época, a Guerra Fria estava no seu auge, e a preocupação dos militares americanos era uma rede
de telecomunicações que não possuísse uma central e que não pudesse ser destruída por nenhum ata-
que localizado. Uma consequência importante dessa escolha e dos desenvolvimentos posteriores é que
a rede Internet herdou essa propriedade. Na verdade, qualquer defeito de equipamentos na rede não
apenas não interrompe o seu funcionamento como, adicionalmente, nem chega a interromper sequer
as comunicações entre processos em curso na hora da avaria, desde que permaneça em funcionamento
alguma conexão física entre os dois processos. Isso resulta na robustez extraordinária da rede Internet.
Para realizar o primeiro experimento com a rede, foram escolhidas quatro universidades que seriam
conectadas, em janeiro de 1970, na rede computacional ARPANET. Eram elas a Universidade da Califórnia,
em Los Angeles (centro do desenvolvimento do “software”), o Stanford Research Institute, a Universidade
da Califórnia, em Santa Bárbara, e a Universidade de Utah, todos beneficiários de contratos com a ARPA.
Além da comunidade acadêmica, a rede original atendia também à comunidade militar americana.
Nessa oportunidade, a rede já dava suporte a um amplo conjunto de serviços regulares, entre os quais
estavam incluídos o login remoto e o correio eletrônico, cujo volume de uso surpreendeu os próprios res-
ponsáveis pela rede. A rede estava se revelando, desde os seus primórdios, como um instrumento muito
efetivo de cooperação.
As ligações da ARPANET usavam linhas telefônicas, com a velocidade de 56 Kbps. Seus elementos ativos,
chamados de Interface Message Processors (IMP), eram constituídos de computadores comercialmente
disponíveis, cuidadosamente escolhidos para esta finalidade. Outro aspecto relevante é que a execução
do projeto foi confiada a empresas particulares, entre as quais deve ser mencionada a BBN (Bolt, Beranek,
and Newman Inc.), de Cambridge, Mass., que era a principal executora.
É curioso notar que as empresas de telecomunicações devotaram, por muito tempo, um amplo
pessimismo à técnica de comutação de pacotes, conforme relatado num artigo do principal realizador da
rede ARPANET, Lawrence G. Roberts. Faz pouco tempo apenas que esse pessimismo foi trocado por uma
participação ativa nas redes de computadores, mas, mesmo hoje, os serviços dessas empresas, do ponto
de vista das redes de computadores, deixam muito a desejar.
Somente com uma convenção realizada no ano de 1987, a rede seria liberada para uso comercial. A partir
de então, a Arpanet passou a se chamar Internet. Em 1990, o físico inglês Tim Berners-Lee criaria o HTML
(Linguagem de Marcação de Hipertexto). Na década de 1990, a Internet passaria por um processo de
expansão gigantesco, tornando-se um grande meio de comunicação da atualidade.
85
Figura 89: Mapa da rede►
ARPANET.
Fonte: Disponível em:
<http://som.csudh.edu/fac/
lpress/history/arpamaps/>.
Acesso em: 15 out. 2011.
86
História - História Contemporânea II
Glossário
A primeira estratégia veio do secretário historia/a-guerra-fria.html).
ONU: A Organização
de Estado, George Marshall, que reforçou a Dois fatores de grande importância das Nações Unidas,
posição norte-americana ao lançar o Plano para as relações internacionais foram a cria- composta por 193
Marshall. Um programa de investimentos e ção da ONU e das chamadas instituições Estados-membros,
de recuperação econômica para os países de Breton Woods – FMI, o BIRD e o BID. Es- está dividida em
europeus em crise e que estivessem sob sua ses organismos nasceram multilaterais num instâncias administra-
tivas, principalmente:
influência após a guerra. Em contrapartida, mundo bilateral, ou seja, nos momentos a Assembleia Geral
a União Soviética criou o Kominform, orga- imediatamente anteriores à Guerra Fria, fo- (assembleia delibera-
nismo encarregado de conseguir a união ram criados esses organismos governamen- tiva principal); o Con-
dos principais Estados socialistas europeus tais, tendo como suporte as representações selho de Segurança
do bloco da “Cortina de Ferro”. Em 1949, a dos Estados Nacionais. Dentre outros orga- (para decidir determi-
nadas resoluções de
URSS criou o Comencon, buscando sua inte- nismos da ONU, com o processo de descolo- paz e segurança); o
gração econômico-financeira entre os países nização, foi criado um orgão de tutela para Conselho Econômico
socialistas (http://www.colegioweb.com.br/ ajudar os países recém emancipados. e Social (para auxiliar
na promoção da co-
operação econômica
e social internacional
A ONU – entre a paz e a guerra e desenvolvimento);
o Secretariado (para
fornecimento de
A Organização das Nações Unidas (ONU), ou simplesmente Nações Unidas (NU), fundada em estudos, informações
1945, após a Segunda Guerra Mundial, teve como princípio de criação, assim como a Liga das Na- e facilidades necessá-
ções anteriormente, as ideias de Kant sobre a manutenção da paz entre as nações, descritas em rias para a ONU); e o
Tribunal Internacional
seu livro “A Paz Perpétua” (1989). Kant escreveu que de Justiça (o órgão
judicial principal),
a razão [...] condena absolutamente a guerra como procedimento de direito e além de órgãos
torna, ao contrário, o estado de paz um dever imediato, que, porém, não pode complementares
ser instituído ou assegurado sem um contrato dos povos entre si [...] (1989, p. de todas as outras
40-41). agências do Sistema
das Nações Unidas,
A ideia de um organismo que congregasse as nações como um fórum de negociações sem, como a Organização
contudo, interferir em seus direitos soberanos é o princípio que norteia a ONU e seus organis- Mundial de Saúde
(OMS), o Programa
mos. É um fórum de negociações que não tem o poder de impedir a guerra, decisão soberana Alimentar Mundial
das nações, mas busca degradar os conflitos e amenizar seus efeitos. A ONU contém várias orga- (PAM) e o Fundo das
nizações subsidiárias para realizar suas missões. Nações Unidas para
a Infância (UNICEF).
Para mais informa-
ções, veja a página da
ONU.
87
UAB/Unimontes - 8º Período
No contexto de criação da ONU como fó- da estavam vivendo, nos processos do pós-
rum político de negociação entre as nações, -guerra. Como dizíamos, investimento em
outros organismos também foram criados mudanças econômicas, que começaram com a
para promover mudanças que impedissem reconstrução dos países atingidos pela guerra,
a volta dos horrores da guerra, ainda muito sejam do bloco americano ou do seviético, ti-
vivos na memória dos que os viveram e ain- nham que ser mais profundos.
A crise do capitalismo em 1930, ainda era época, ganha grande força como a meta e sus-
um fantasma, como coloca Keynes, e a amea- tentação das nações modernas. Uma das fren-
ça do bolchevismo era presente. Daí, entre es- tes de batalha, proposta já em seu discurso de
sas e outras razões, os economistas proporem posse em 1949, por Truman, era a luta contra o
uma nova organização da economia mundial. subdesenvolvimento.
O desenvolvimento, conceito legitimado nessa
A um só tempo, dois campos foram ata- bém, foi atacado. Os dois processos são defla-
cados: dois bilhões de pessoas deixaram sua grados: os programas de “ajuda” aos aliados e
diversidade e foram homegeneizadas, sob a a descolonização. A nova lógica desencadeou
alcunha de subdesenvolvidas; além desse, o grandes transformações. Joseph Starobin
fenômeno do imperialismo (que ainda existia Maio, em seu texto clássico de crítica, chama-
em grande parte do mundo de então), tam- do “ A Doutrina de Truman”, de 1947, escreve:
88
História - História Contemporânea II
89
UAB/Unimontes - 8º Período
O modelo capitalista que vai se espalhar pelo mundo no pós-guerra é urbano, industrial,
tailorista-fordista e transnacional. Ele é a base do que tem sido chamado de desenvolvimentis-
mo, padrão que se define por um estilo de vida com crescimento econômico e o crescimento
do consumo. Em poucas décadas de sua instauração, críticas de diferentes ordens começam a
ser feitas ao modelo desenvolvimentista. As críticas se davam tanto sobre o modelo capitalista
quanto sobre o socialista. Os custos do modelo bipolar, da corrida espacial e armamentista, assim
como o modelo perdulário da produção tailorista-fordista, baseado no alto consumo de insu-
mos (matérias-primas, energia, horas de trabalho, etc.) anunciavam a futura crise. De acordo com
Bresser Pereira:
No período entre o fim da Segunda Grande Guerra e a década de 1970, o Ocidente assiste
uma prosperidade tão grande que será denominado de “os anos dourados”. Homens e mulheres
que nasceram antes da guerra e passaram por seus flagelos e privações sabiam que estavam vi-
vendo um período de prosperidade que não conheciam anteriormente. Este período teve seu
auge nos anos 1950. Essa prosperidade pertenceu ao centro do capitalismo. Um fenômeno im-
portante foi o crescimento de uma classe média consumidora, talvez possamos chamá-la de elite
dos trabalhadores, que com seus proventos dinamiza mercados internos importantes, em parti-
cular nos EUA. De acordo com Hobsbawm, apesar do destacado crescimento no centro do de-
senvolvimento, o mundo todo experimentou reflexos desse fenômeno mundial – a era da pros-
peridade. A produção mundial crescia em taxas inéditas tanto a produção de alimentos quanto
de manufaturados.
90
História - História Contemporânea II
Box 8
91
UAB/Unimontes - 8º Período
92
História - História Contemporânea II
Hobsbawm (1995), ao tratar da trajetória do mundo socialista sob a direção da URSS, mos-
tra-nos que, desde o início, logo após a revolução bolchevique, a unidade territorial do “Socia-
lismo Real”, o “Império Soviético”, foi uma meta importante. A unidade foi mantida, embora o Es-
tado estivesse atrasado e empobrecido. De acordo com o autor, esse território foi imensamente
ampliado após 1945 (p. 345).
93
UAB/Unimontes - 8º Período
DICA Com a morte de Brejnev, em 1982, ins- Foi nesse contexto que Gorbachev as-
taura-se um período sucessório, no qual hou- sumiu o poder. Ele propôs duas diretrizes de
Sobre os impactos, na
população, do fim da ve três governantes: Iúre Andropov, Kostantin mudança do sistema soviético: a Glasnost
Guerra Fria. Tcghernenko (ambos morreram durante o (transparência política e abertura cultural para
Título original: mandato) e, em 1985, assume Michail Gorba- o Ocidente) e a Perestróica (reconstrução eco-
Good Bye, Lênin! chev. Nos EUA, assume Reagan (1980-88), que nômica através da liberalização e eficiência de
Lançamento: proclamou seu antagonismo com a URSS. Esse gestão). O impacto dessas mudanças foi como
2003 (Alemanha)
Direção: antagonismo teve seu auge na proposta da o destampar de uma panela de alta pressão.
Wolfganger Becker chamada “Guerra nas Estrelas”, que propunha Foi avassalador, tanto para a URSS quanto
Atores: a construção de escudos contra mísseis sovié- para o mundo socialista e capitalista. Em 1989,
Katrin Sab, Chulpan ticos, com o uso de satélites. Era uma proposta acontecem eleições livres e criou-se o pluri-
Khamatova, Florian de alta tecnologia que agregava os recursos partidarismo. Mesmo essas medidas não conti-
Lukas, Alexander Beyer.
Duração: tecnológicos da indústria bélica e da aeroes- veram a crise e o desabastecimento.
118 min pacial. “A União Soviética, já com sérios pro- “Os ventos da Glasnost e da Perestróica
Gênero: blemas econômicos, não dispunha de recursos varreram o leste europeu, provocando pro-
Drama para acompanhar esta corrida” (MORAES & fundas mudanças” (MORAES & FRANCO, 2009,
FRANCO, 2009, p. 61). p. 65). Uma tendência social-democrata se
alastra, vencendo as eleições em vários paí-
ses, como a Polônia do Solidariedade, de 1990
a 1995, e Dubcek, que venceu, em 1989, para
presidente da Assembléia Nacional Tcheca. Em
1989, cai o Muro de Berlim, e as duas Alema-
nhas são reunificadas. Era o fim de um período
de embates políticos, ideológicos e militares.
O capitalismo vitorioso, aos poucos, iria sendo
implantado nos países socialistas.
A União Soviética estava com seus dias
contados. Temendo o quadro político que es-
Sinopse tava instalado na URSS, as repúblicas que a
Em 1989, pouco antes compunham começaram a exigir autonomia.
da queda do Muro de
Berlim, a Sra. Kerner Em 1991, quase todos os países que constitu-
(Katrin Sab) passa mal, íam a URSS já estavam independentes. Em 21
entra em coma e fica de dezembro de 1991, foi oficializado o fim
desacordada durante definitivo da URSS e a criação da Comunidade
os dias que marcaram dos Estados Independentes (CEI), organização
o triunfo do regime
capitalista. Quando ela supranacional formada por Rússia, Ucrânia,
desperta, em meados Bielo-Rússia, Cazaquistão e Uzbequistão.
de 1990, sua cidade, ▲
Berlim Oriental, está Figura 97:
sensivelmente modi- Gorbachev, na Como um gigantesco navio-tanque avariado aproximando-se dos recifes, uma
ficada. Seu filho Alexan- revista Time. União Soviética sem leme vagava assim para a destruição. As linhas segundo as
der (Daniel Brühl), te- Fonte: Disponível em: quais ele ia rachar-se já estavam traçadas: de um lado, o sistema de autonomia
mendo que a excitação <http://oficinade- de poder territorial em grande parte corporificado na estrutura federal do Esta-
causada pelas drásticas gerencia.blogspot. do, de outro os complexos econômicos autônomos. Como a teoria oficial sobre
mudanças possa lhe com/2009/03/11-de- a qual a URSS se erguera era de autonomia territorial para os grupos nacionais,
prejudicar a saúde, -marco-gorbachev-as- tanto para as quinze repúblicas da União quanto para as regiões e áreas autô-
decide esconder-lhe sume-o-poder-e.html>. nomas dentro de cada uma delas, a fratura nacionalista estavapotêncialmente
os acontecimentos. Acesso em: 5 out. 2011. embutida no sistema, embora, com exceção dos pequenos Estados bálticos, o
Enquanto a Sra. Kerner separatismo não fosse sequer pensado antes de 1988, quando se fundaram as
permanece acamada, primeiras “frentes” nacionalistas ou organizações de campanha em resposta à
Alex não tem muitos Glasnost (na Estônia, Letônia, Lituânia e Armênia). Contudo, nesta etapa, mes-
problemas, mas quan- mo nos Estados bálticos, elas eram dirigidas não tanto contra o centro quan-
do ela deseja assistir à to contra os partidos comunistas locais insuficientemente gorbachevistas, ou,
televisão, ele precisa como na Armênia contra o vizinho Azerbaijão (HOBSBAWM, 1995, p. 469).
contar com a ajuda de
um amigo, diretor de Com o fim da Guerra Fria e da bipolarida- mam que nunca na história um país teve tan-
vídeos. de do poder no mundo, os EUA, apoiados na to poder como os EUA, no final do século XX”
Fonte: Disponível em:
<http://www.adorocinema.
hegemonia econômica e militar, fortaleceram- (MORAES & FRANCO, 2009, p. 73). Surge então
com/filmes/adeus-lenin>. -se mundialmente como potência. Passaram, uma nova ordem multipolar. Suas marcas são
Acesso em: 16 out. 2011. assim, a exercer influência nos rumos dos con- a globalização e o neoliberalismo.
flitos em todo o mundo. “Muitos analistas afir-
94
História - História Contemporânea II
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96
História - História Contemporânea II
UNIDADE 3
Da nova ordem mundial à era das
incertezas
Simone Narciso Lessa
3.1 Introdução
Neste capítulo, trataremos do mundo após o fim da Guerra Fria, também conhecido como
Nova Ordem Mundial. O mundo, que emergiu da crise da década de 1980 que culminou na que-
da da URSS, festejou, nas palavras de Fukuyama (1989), o triunfo do capitalismo e, como coloca-
va o autor de “The End of History and the Last Man” (1989), o “Fim da História”.
No início desse processo, o chamado bal. Países antes do “Terceiro Mundo” emer-
“Consenso de Washington”, que teve como giram como potências consolidadas, ou em
base o neoliberalismo, instaurou-se como mo- expansão, como nos casos da China, da Índia,
delo econômico e uma referência importante da Rússia e do Brasil. Os momentos que mar-
na expansão do capitalismo como economia- caram a ação do EUA na cena internacional,
-mundo ou sistema-mundo (ANDERSON, como o ataque em Nova Iorque, em 11 de se-
1998). Trataremos do processo de globaliza- tembro de 2001, a recusa em assinar o proto-
ção como um processo que é apontado como colo de Kyoto (de diminuição da emissão de
homogeneizante, mas, que numa contradição gases causadores do efeito estufa), as invasões
dialética, fortaleceu a luta pelo direito à dife- do Iraque e a crise econômica de 2008, estabe-
rença. Momento no qual se anunciava o fim leceram padrões de crises que atingem hoje o
do Estado Nacional, mas que, ao mesmo tem- mundo todo.
po, fez emergir múltiplas nacionalidades, as- A política toma conta das ruas e praças
sim como a divisão do mundo em blocos de do Ocidente ao Oriente Médio. No Oriente, os
países associados econômica e politicamente. movimentos nas praças derrubaram antigas
A informação e as redes tomaram dimensões ditaduras aliadas do Ocidente. A chamada “Pri-
cotidianas inéditas, sejam no âmbito do Esta- mavera Árabe” trouxe uma nova efervescência
do, das empresas ou em nossas vidas domésti- política à cena internacional. Uma forte crise
cas. As questões políticas escamotearam ques- econômica atinge, neste momento, a União
tões econômicas nas novas e velhas guerras Europeia, principalmente na chamada zona
no Oriente Médio, a questão Palestina, o pe- do EURO, e a crise americana está levando, até
tróleo e o terror. mesmo, à diminuição de seus contingentes e
Finalizando, trataremos da urbaniza- investimentos militares. Todo esse cenário co-
ção mundial, das crises do neoliberalismo, da loca o mundo num campo de incertezas im-
questão ambiental e do aquecimento glo- previsíveis.
97
UAB/Unimontes - 8º Período
Glossário
Consenso de Washington:
3.2 A Globalização e a Nova
Ordem mundial – Globalização e
conjunto de dez regras
básicas – formuladas, em
novembro de 1989, por
economistas de institui-
ções financeiras situadas
em Washington D.C., como
o FMI, o Banco Mundial
e o Departamento do Te-
souro dos Estados Unidos,
neoliberalismo
fundamentadas num texto
do economista John Willia-
mson, do International Os acontecimentos que marcaram o fim Esses pensadores do triunfo anunciavam uma
Institute for Economy. O da Guerra Fria desencadearam duas reações nova era capitalista, uma nova ordem mun-
FMI passou a recomendar
a implementação dessas de imediato, primeiramente, dos que ficaram dial, marcada pela globalização, pela volta do
medidas nos países emer- deserdados do socialismo. A pergunta era: se liberalismo e do Estado mínimo, pela degra-
gentes, durante a década
de 1990, como meios para o socialismo fracassou, qual é a possibilidade dação do poderio político, econômico e sim-
acelerar seu desenvol- de superação do capitalismo? A segunda foi bólico do Estado Nacional. Estruturas multila-
vimento econômico. De
início, essas ideias foram o triunfalismo capitalista. O socialismo havia terais e transnacionais dominariam o mundo,
aceitas e adotadas por fracassado, o que significaria, para os arautos num processo suportado pela alta tecnologia
dezenas de países sem
serem muito questionadas. da nova era, o triunfo da única via possível, a e a homogeneização do mercado e do consu-
Estabilizar, privatizar e libe- capitalista. Era o “fim da História”. De agora em mo, em todo o mundo, nos moldes ocidentais.
ralizar tornou-se o mantra
de uma geração de tecno- diante, o mundo seria capitalista para sempre. Nesse contexto, escreveu William Greider:
cratas que estavam tendo
sua primeira experiência A lógica do comércio e do capital superou a inércia da política e desencadeou
no mundo subdesenvolvi-
do e dos líderes políticos uma época de grandes transformações sociais. Fatos estabelecidos da vida ma-
por eles aconselhados. Foi terial estão sendo revistos tanto pelas nações ricas quanto pelas pobres. For-
muito criticado, principal- mas de compreender o fato social que se sedimentaram ao longo das duras
mente, após as crises de lutas políticas do século XX estão sendo postas em dúvida. Velhas verdades so-
países que seguiam suas
regras, tais como a dos “Ti- bre a ordenação das nações em rankings estão sendo revistas e um novo mapa
gres Asiáticos”, em 1997, do mundo está sendo gradualmente desenhado. Essas grandes mudanças vão
da Rússia, e da economia além dos negócios governamentais, meramente, e desestabilizam a ordem po-
Argentina - que recebiam lítica estabelecida nas sociedades primitivas quanto nas adiantadas. Tudo sur-
notas A+ do FMI pelo zelo
com que aplicavam suas ge como novo e estranho. Nada mais está seguro (GREIDER, 1997, p. 11).
sugestões - e de vários
outros desajustes econômi-
cos ocorridos pelo mundo. O anúncio, o debate e a proclamação de No final do século XX, assistimos trans-
O “Consenso” foi adaptado uma sociedade globalizada, com a integra- formações em todo o mundo. As regras do
e, desde 2004, revisto pelo
FMI, que abandonou o ção dos dois lados da “Cortina de Ferro” que comércio internacional passam a ser estabele-
dogmatismo inicial. caíra sob uma mesma condição capitalista, cidas por convenções da Organização Mundial
As dez regras básicas são: saíram dos debates acadêmicos e de especia- do Comércio (OMC), e este fórum ganha novo
• Disciplina fiscal listas para ganhar as manchetes dos veículos destaque nas relações internacionais. O que se
• Redução dos gastos
públicos de comunicação e as ruas. Um mundo só e dizia era que a guerra militar havia dado lugar
• Reforma tributária homogêneo parecia ser inevitável. O Estado à guerra comercial. Um bolha de prosperidade
• Juros de mercado
• Câmbio de mercado Nacional, que antes era o garantidor do “Pleno começa a se formar a partir dos Estados Uni-
• Abertura comercial Emprego”, do planejamento e do desenvol- dos. O novo campo de negócios da informáti-
• Investimento estrangeiro
direto, com eliminação vimento, passou a ser taxado de estorvo que ca e eletrônica se expandiu tão rapidamente,
de restrições deveria ser reduzido ao máximo. A sociedade que uma nova Bolsa de Valores foi criada em
• Privatização das estatais
• Desregulamentação civil e o setor privado deveriam assumir en- Nova Iorque, a Nasdaq, com outras Bolsas de
(afrouxamento das leis cargos que antes cabiam ao Estado, incluindo Valores sendo criadas em todas as chamadas
econômicas e trabalhis-
tas) a seguridade social e a previdência. O libera- cidades globais (grandes capitais do mundo),
• Direito à propriedade lismo, ou o neoliberalismo, como passou a ser inclusive no antigo bloco socialista. Moraes &
intelectual.
conhecido a partir do “Consenso de Washing- Franco definem a globalização como sendo:
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senso.html>. Acesso em: cultural, a evolução e popularização das tecnologias da informação (computa-
12 jan. 2012.
dor, telefone, televisor) são fundamentais para agilizar o comércio, o fluxo de
investimentos e a atuação das transnacionais por permitir uma integração sem
precedentes de pontos distantes do planeta (2009, p. 91).
98
História - História Contemporânea II
99
UAB/Unimontes - 8º Período
Escala espacial dominante: Estado-Nação Escala espacial dominante: região e união econômica
· Estados: atores essenciais da economia · Atores econômicos: capitais, empresas multinacionais,
(dirigismo/centralização) · Unidades territoriais (regiões)
· Centro de decisão: nacional · Centro de decisão: supranacional e local
· Soberania nacional · Soberania dos cidadãos
· Barreiras alfandegárias · Abertura econômica (supressão de fronteiras/ interna-
· Economia centrada na produção e consumo cionalização da economia
nacionais · Economia baseada na informação e na comunicação /
· Iniciativas públicas maior importância da inovação
· Organização do território em âmbito nacio- · Constituição de redes (“sociedade em redes”)
nal e centralizado (“de cima”) (redistribuição) · Organização do território baseada na iniciativa local (
· Estados-Providência “de baixo”)
· Regulação social estável · Regulação social “flexível”
· Lógica econômica majoritariamente fordista · Lógica econômica principalmente pós-fordista
· Crescimento fortalecido · Nova articulação: global/local
· Evoluções lentas · Evoluções rápidas
Como podemos ver no quadro acima, a que as outras formas que lhe antecederam em
questão que se apresentava com grande im- suas formas de governo, desde o absolutista
portância era o destino do Estado Nacional até o socialista, passando pelo liberal. Mes-
diante da globalização e da emergência de mo com a permanência do Estado Nacional,
novos espaços de referências. Mesmo com a outras referências emergem como lugares de
emergência desses novos espaços, o que ve- significação para a contemporaneidade. As
mos é o chamado “deslizamento de escalas”. metrópoles, os lugares de coesão econômica e
O Estado Moderno-Contemporâneo, que não tecnológica, como o Vale do Silício, na Califór-
passou por grandes alterações em sua carac- nia, Los Angeles e Xangai, e novas referências
terização material formal, tem permanecido espaciais agregarão múltiplos elementos que
com os mesmos elementos – território, popu- os colocaram no vértice da conexão de múlti-
lação e poder político (soberania). Entretanto, plas redes e escalas diferentes.
tem variado bastante e bem mais rapidamente
100
História - História Contemporânea II
Outro fator, do qual trataremos adiante, zaram. Apotência norte-americana, que antes Glossário
foi que, diferentente do que se dizia na mídia tinha a União Soviética como inimiga, voltou-se O que são blocos
sobre a nova ordem mundial, os conflitos bé- para um inimigo mais difuso, mas que a possibi- econômicos?
licos não acabaram. Vários antigos conflitos litou manter, e até mesmo reforçar, sua política São associações de
permaneceram, e velhos fantasmas da Euro- de segurança nacional, cuja premissa, indo além países, em geral de
pa, como a guerra da Bósnia, levantaram-se. da ideia do inimigo comunista interno, parte do uma mesma região
geográfica, que
Os nacionalismos árabe, checheno, israelense, princípio de que qualquer um, em qualquer lu- estabelecem relações
palestino e das nações africanas sepotênciali- gar, poderia ser o inimigo – o terrorismo. comerciais privilegia-
das entre si e atuam
de forma conjunta no
mercado internacio-
3.3.1 Os Blocos Econômicos nal. Um dos aspectos
mais importantes na
formação dos blocos
O fim da Guerra Fria desfez os dois grandes blocos, e com eles o mundo bipolar, liderados econômicos é a redu-
por Estados Unidos e União Soviética. Esse processo levou à criação de novos blocos de países, ção ou a eliminação
num processo de multilateralização das relações internacionais. A emergência de relações multi- das alíquotas de im-
laterais levou a um novo processo de regionalização mundial. portação, com vistas
à criação de zonas
de livre comércio. Os
blocos aumentam a
interdependência das
economias dos países
Figura 100:
membros.
Mapa dos blocos
Atualmente, os
econômicos.
mais importantes
Fonte: Disponível são o NAFTA (North
em: <http://edson-
maiap.wordpress.
American Free Trade
com/>. Acesso em: Agreement), a União
10 nov. 2011. Europeia (U.E), o
Mercado Comum do
Sul (MERCOSUL), a
Cooperação Econô-
mica da Ásia e do
Pacífico (APEC) e, em
menor grau, o Pacto
Andino, a Comuni-
dade dos Estados
Independentes (CEI)
e a Comunidade da
Os blocos econômicos ganharam grande Euro. Entretanto, finda a primeira década, vi- África Meridional
importância no final do século XX e início do mos esse formato de coalizão em blocos “fa- Para o Desenvolvi-
XXI. Diante do fim da Guerra Fria e do multi- zendo água”, ou “indo por água a baixo”. A mento (ADC) (Bezerra
lateralismo, buscava-se uma nova ordem, um crise econômica, que começou em 2008 nos Júnior, 2001, p. 7).
novo arranjo na correlação de forças que fosse EUA (talvez até antes disso), atingiu o mun-
expresso por novas formas de territorialização. do, mas particulamente a zona do Euro e a
A crise atingia, naquele momento, os Estados União Europeia.
Nacionais, num processo galopante de trans- Finda a primeira década do século XXI,
nacionalização da economia. O reagrupamen- vemos se aprofundar um quadro de incerte-
to das forças em bolcos era atrativo. A União zas, marcado por várias crises de ordens dife-
Europeia –EU, que vinha num processo de for- rentes, mas que se interrelacionam. Relatare-
mação desde o fim da Segunda Guerra Mun- mos, a seguir, sobre a questão ambiental com
dial, levou a fundo a coalizão dos países, crian- mais destaque, num quadro mais amplo de
do organismos próprios e uma moeda única, o crise mundial: ambiental, econômica e social.
101
UAB/Unimontes - 8º Período
A Guerra do Golfo foi um conflito armado das forças coligadas, em 1991, foi um grande es-
que começou em agosto de 1990, após as tropas petáculo televisivo, transmitido ao vivo pela rede
iraquianas terem invadido o Kuwait. A invasão de TV americana CNN para todo o mundo.
102
jan. 2012.
História - História Contemporânea II
A queda da “Cortina de Ferro” com o fim da Guerra Fria afetou, de formas diferentes, os paí-
ses da Europa Central. Nacionalismo e relações identitárias étnicas foram reavivadas, dando mar-
gem a um intenso rearranjo espacial nessa região. A Iugoslávia foi um dos países que começou
a se desintegrar e, nesse processo, principalmente a partir de 1991, com os movimentos de
independência da Croácia e da Eslovênia, conflitos étnicos foram se acirrando.
BOX 10
1992-95 - A Bósnia-Herzegovinia foi palco do mais violento conflito de desintegração da Para saber mais
Iugoslávia, a Guerra da Bósnia. Com o fim do comunismo e a morte de Tito, reacenderam-se as
diferenças étnicas, culturais e religiosas entre as seis repúblicas iugoslavas, impulsionando mo-
vimentos pela independência. Na Bósnia, a emancipação foi aprovada em plebiscito por croatas
(católicos) e bósnios (mulçumanos). Mas a recusa da minoria sérvia (cristã ortodoxa) em acatar a
decisão provocou a guerra, marcada pela disputa de territórios. Nas áreas ocupadas, os sérvios
promoveram a chamada limpeza étnica, expulsão e massacre dos grupos rivais, os mulçumano-
croatas. O conflito terminou em 1995, com o saldo de duzentos mil mortos. O Acordo de Dayton
dividiu o território bósnio em duas entidades semiautônomas: a Federação da Bósnia (mulçuma-
no-croata) e a República Sérvia (MORAES & FRANCO, 2009, p. 132).
▲ Figura 105: O
ex-presidente servo-
bósnio, Radovan
Karadzic.
Fonte: Disponível em:
<http://www.google.com.
br/imgres?q=guerra+da+
bosnia&um=1&hl=ptBR&
sa=N&biw=1619&bih=77
Figura 104: As Forças
3&tbm=isch&tbnid=LUb
de Paz da ONU, 8gpZQt4PxFM:&imgrefu
atuando na Bósnia. rl>. Acesso em 20 de março
Fonte: Disponível de 2012.
em::<http://www.goo-
gle.com.br/imgres?q=g O ex-presidente
uerra+da+bosnia&um servo-bósnio, Radovan
=1&hl=pt-BR&sa=N&bi Karadzic, um dos ho-
w=1619&bih=773&tbm mens mais procurados
=isch&tbnid=O9VH61A
CROFp3M:&imgrefurl>.
do mundo, foi preso
Acesso em 20 de março após 12 anos foragido.
de 2012. Conhecido como “o
Carniceiro de Sarajevo”,
Karadzic foi duplamen-
3º Momento: 11 de Setembro – Começou o século XXI te indiciado de genocí-
dio pelo Tribunal Penal
Internacional para a
Os atentados de 11 de setembro de 2001, foram uma série de ataques suicidas contra os Ex-Iugoslávia, pelo cer-
EUA, coordenados pelo grupo terrorista Al-Qaeda, surgido no contexto da guerra do Afeganistão co de Sarajevo durante
e comandado pelo saudita Osama Bin Laden. Na manhã daquele dia, 19 terroristas da Al-Qae- 43 meses, que deixou
cerca de 12 mil mortos,
da sequestraram quatro aviões comerciais, usando o equipamento civil como armas de guerra, e pelo massacre de oito
numa típica ação de guerrilha. mil muçulmanos, em
Os sequestradores, intencionalmente, bateram dois dos aviões contra as torres gêmeas do Srebrenica, em 1995, na
World Trade Center, em Nova Iorque, matando todos a bordo e muitos dos que trabalhavam nos maior atrocidade regis-
edifícios. Ambos os prédios desmoronaram em duas horas, destruindo construções vizinhas e trada na Europa, desde
a Segunda Guerra Mun-
causando outros danos. O terceiro avião de passageiros foi jogado contra o Pentágono, em Ar- dial. Ele foi acusado de
lington, Virgínia, nos arredores de Washington, D.C., e o quarto avião caiu em um campo próximo promover a limpeza
de Shanksville, na Pensilvânia. Não houve sobreviventes em qualquer um dos vôos. O total de étnica que, além do
mortos nos ataques foi de 2.996 pessoas, incluindo os 19 sequestradores. A esmagadora maioria massacre da população
das vítimas era civil, incluindo cidadãos de mais de 70 países. muçulmana masculi-
na, incluía o estupro
Após os ataques, começaram a se articular a chamada Doutrina Bush, com os Estados Uni- (com a finalidade de
dos aprovando o USA PATRIOT Act., uma legislação antiterrorismo que ampliou os poderes de humilhar e engravidar)
aplicação da lei. Os Estados Unidos responderam aos ataques com o lançamento da Guerra ao de mulheres e meninas
muçulmanas.
103
UAB/Unimontes - 8º Período
Terror: o país reforçou sua presença no Afeganistão para derrubar o Talibã, usando como justifi-
cativa a parceria destes com os terroristas da Al-Qaeda (ver: Guerra do Afeganistão). De acordo
com Moraes & Franco:
Logo após 11 de setembro, George W. Bush lançou as bases de sua guerra contra o ter-
ror e definiu o primeiro alvo: o regime fundamentalista islâmico dotalibã, no Afeganis-
tão.
[...] em 07 de outubro de 2001, os EUA e o Reino Unido bombardearam cidades do
Afeganistão.
[...] Os Estados Unidos só precisaram de duas semanas para massacrar a infraestrutu-
ra do regime, a ponto de o ministro do Exteriortalibã, Muá Wakil Ahmad Muttawakil,
apresentar, no Paquistão, uma proposta de trégua. A intervenção americana no Afe-
ganistão privou os terroristas de seu Quartel General e de seus campos de treina-
mento. Mas apenas dez, dos trinta principais chefes do terror foram mortos ou cap-
turados. [...]
O comando central, sob a liderança de Bin Laden, deu lugar a uma estrutura horizon-
tal, formada por células independentes, distribuidas em vários países, em particular
no Paquistão, no Irã e no Iêmen (2009, p. 148).
A segunda maior operação dos Estados Unidos na guerra global contra o terrorismo fora
dos Estados Unidos e a maior, diretamente, ligada ao terrorismo, a derrubada do governo Talibã
do Afeganistão por uma coalizão liderada pelos EUA deflagou a Guerra ao Terror, ou ao Eixo do
Mal como falava Bush. Os Estados Unidos não foi o único país a aumentar a sua prontidão militar,
sendo outros exemplos as Filipinas e a Indonésia, países que têm os seus próprios conflitos inter-
nos com o terrorismo islâmico.
BOX: 11
Os ataques terroristas que destruíram as torres gêmeas do World Trade Center, em Nova
Iorque, e parte do edifício do Pentágono, em Washington, em 11 de setembro de 2001, pas-
saram a ser interpretados por muitos internacionalistas como um novo marco de referência
para a prática e o estudo das relações internacionais. Houve dois fatores novos nesse epi-
sódio: 1) Pela primeira vez na história, os Estados Unidos foram atacados em seu território
continental (recordemos que o ataque japonês a Pearl Harbor, nos anos de 1940, foi contra
uma base americana no Pacífico); 2) O ataque não foi feito por outro país, mas por uma orga-
nização terrorista, a Al Qaeda.
A reação dos Estados Unidos foi desproporcional: criou uma nova doutrina (Doutrina
Bush) e contaminou todo o planeta. Dela não surgiu um novo paradigma, mas se exarce-
bou o comportamento dos realistas políticos [escola com forte cunho militarista e voltada
para os resultados, que aborda as relações internacionais], apoiadores e executores de uma
política internacional capitaneada pelos Estados Unidos que levou o tema da segurança a
alturas estratosféricas, com a adoção do conceito de ataques preventivos (legítima defesa
preventiva) e de sicuritização das relações internacionais (o tema da segurança passou a de-
finir todas as políticas públicas dos Estados Unidos e dos organismos multilaterais, estes sob
a intensa pressão americana).
O Governo George W. Bush, finalizado em 2009, e o fracasso das políticas adotadas com
base em sua doutrina deixaram sequelas profundas nas relações internacionais. A própria
hegemonia dos Estados Unidos foi abalada pelo efeito devastador que a Doutrina Bush cau-
sou na democracia, nos direitos humanos e na economia, dentro e fora dos Estados Unidos.
A vitória do presidente democrata Barak Obama, em 2008, foi, em grande medida, uma res-
posta do povo americano a esses estragos provocados pela tenebrosa e truculenta Era Bush.
A questão de como lidar com uma realidade internacional, com elevados graus de frag-
mentação, com novos atores não estatais, desterritorializados, permanece um desafio para
todos os paradigmas [das Relações Internacionais] (RODRIGUES, 2009, p. 61-63).
Na Nova Ordem Mundial, os EUA colocaram seus interesses como mundiais. No contexto da
Doutrina Bush de luta contra o terror pós 11 de setembro, um antigo alvo entrou no mira dos
EUA, no Oriente Médio: o Iraque de Saddam Hussein. Alegando que o Iraque tinha armas de des-
104
História - História Contemporânea II
truição em massa, e numa posição irredutível mesmo diante do relatório da ONU que afirmava
não terem sido encontradas tais armas, Washington alertou: “A ONU deve agir, caso contrário os
EUA o farão”. (MORAES & FRANCO, 2009, p. 151) O Iraque já sofria embargo econômico que pena-
lizava toda a população e passava por instabilidades internas, mas era um governo laico e com
um presidente “eleito”. A ONU não autorizou o ataque. Muitos, e o próprio EUA, apontaram a de-
cisão como fraqueza da organização, entretanto, era a primeira vez que a ONU não corroborava
as decisões americanas.
105
Figura 108: O verdadeiro►
terror – o sofrimento dos
inocentes.
Fonte: Disponível em:
<http://www.google.com.
br/imgres?q=guerra+do+g
olfo+II&um=1&hl=ptBR&bi
w=1619&bih=773&tbm=isc
h&tbnid=H0wbL77Ya13Q5
M:&imgrefurl>. Acesso em:
12 nov. 2011.
Sinopse e detalhes:
Bagdá, 2003. Roy Miller
(Matt Damon) lidera 3.4.1 A crise ambiental
uma equipe, a serviço
da inteligência do
exército, em busca de Após a 2ª Guerra, as alterações nos mapas à conservação e controle de matérias-primas
armas de destruição geopolíticos e econômicos, o crescimento po- necessárias à expansão do capitalismo urbano
em massa no Iraque. pulacional e o êxodo da população rural para -industrial.
Depois de algumas as grandes cidades, mudaram, e continuam O avanço avassalador desse novo capita-
tentativas frustradas,
o militar se vê diante
mudando, paulatinamente, o espaço natural lismo, com a rápida urbanização e o aumento
de um cenário caótico do planeta. Os conceitos de desenvolvimento da pobreza, a volta das epidemias, a extinção
entre seus compa- e subdesenvolvimento, conceitos instaurados de espécies, e a esgotabilidade dos recursos
triotas, o que o deixa após o discurso de posse do Presidente Tru- naturais, levou, em 1972, à publicação de um
dividido entre aplacar man, em 1949, segundo Esteva (2000), marca- livro que causou muita polêmica e debate: Os
o anseio do governo
de encontrar algo que
ram um novo momento para o mundo. Esse Limites do Crescimento, resultado do trabalho
justificasse a invasão conceito de desenvolvimento passou a ser di- de investigação realizado por uma equipe do
ou descobrir a verdade fundido, então, como um modelo econômico Massachusetts Institut of Technology (MIT), co-
dos fatos. (RC) e social direcionado ao consumo, porém, ali- ordenada por Donella Meadows, a pedido do
Fonte: Disponível em: cerçado por uma economia de mercado e so- Clube de Roma, uma associação informal de
<http://www.adoro-
cinema.com/filmes/
ciedade especializada, instrumentalizada por empresários, estadistas e cientistas.
filme-129054/>. novos conhecimentos baseados na técnica. Basicamente, afirmou-se naquela altura
Acesso em: 27 de mar- Nesse modelo, o Estado passou a protagoni- que com o ritmo do crescimento da popula-
ço de 2012. zar a gestão dos recursos naturais com vistas ção, da utilização de recursos naturais, da po-
106
História - História Contemporânea II
luição, etc., que vinha acontecendo, ao longo Os “hippes”, na década de 60, implantam
do século XX e fins do séc. XXI, a humanidade as primeiras comunidades sustentáveis, eco-
corria sérios riscos de sobrevivência. Muito vilas, que até hoje são exemplos plenos de
se escreveu para desvalorizar os argumentos como aliar o desenvolvimento sustentável ao
apresentados, frequentemente deturpando- desenvolvimento humano integral, dentro dos
-os, mas, seu alerta e as condições de impac- novos paradigmas ecológicos e sociais.
to ambiental, cada vez mais visíveis, levaram a Em 1987, a Comissão Mundial Sobre Meio
ONU, em suas conferências e estudos, a propa- Ambiente de Desenvolvimento - CMMAD, pre-
gar a questão. sidida pela Primeira-Ministra da Noruega, Gro
Diante do alerta do clube de Roma, um Harlem Brundtland, adotou o conceito de De-
novo conceito de desenvolvimento começa a senvolvimento Sustentável, em seu relatório
ser elaborado: Desenvolvimento Sustentável. Our Common Future (Nosso futuro comum),
Segundo a Comissão Mundial sobre Meio Am- também conhecido como Relatório Brun-
biente e Desenvolvimento (CMMAD) da ONU, dtland.
o Desenvolvimento Sustentável é um conjunto O relatório apontava uma série de crises
de processos e atitudes que atende às necessi- no planeta, tanto energéticas quanto atmosfé-
dades presentes sem comprometer a possibili- ricas, além do problema da erosão, provocada
dade de que as gerações futuras satisfaçam as por várias atividades e pela erradicação de flo-
suas próprias necessidades (RODRIGUES, 2009, restas. Nesse relatório, é oficializado o termo
pp. 99-100). “desenvolvimento sustentável”, conceito que
Em 1962, foi realizada a primeira Confe- foi definido com base nas preocupações sobre
rência Mundial de Parques Nacionais, em Se- a degradação ambiental, a miséria da popula-
attle (EUA), com o objetivo de estabelecer os ção e a degradação dos recursos naturais, pró-
critérios de classificação de áreas protegidas, pria dos grandes conflitos que o estilo de vida
seguindo o sistema americano. A consolida- dos países mais desenvolvidos passou a proje-
ção desse sistema, internacionalizando-o, deu- tar para o resto do mundo. Esse estilo de vida,
-se na Conferência da ONU em Estocolmo, em o sistema, estaria no presente comprometen-
1972, quando foi criado o PNUMA (Programa do o futuro das novas gerações (MONTIBEL-
das Nações Unidas para o Meio Ambiente), LER, 2004, p. 50).
com a finalidade de gerenciamento das ativi- Dando continuidade aos debates suscita-
dades de proteção ambiental e apoio aos paí- dos pelo documento “Estratégia Mundial para
ses em desenvolvimento. a Conservação”, lançado em 1980, através da
Em 70, Maurice Strong e Ignacy Sachs ela- colaboração conjunta dos organismos interna-
boram o conceito de ecodesenvolvimento, cionais UNEP/PNUMA (United Nations Environ-
apresentado durante a Primeira Conferência das mental Program, IUCN/UICN-The World Con-
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desen- servation Union e WWF–World Wild Fund) foi
volvimento (Estocolmo, 1972), a qual deu origem elaborado o documento “Cuidando do Planeta
ao Programa das Nações Unidas para o Meio Terra - Uma estratégia para o Futuro da Vida”,
Ambiente - PNUMA. Escreve Sachs (1986, p. 14): em 1991, que valida os seguintes objetivos bá-
“trata-se de gerir a natureza de forma a assegu- sicos, com ações e estratégias contendo uma
rar aos homens de nossa geração e de gerações nova mensagem:
futuras a possibilidade de se desenvolver.”
107
UAB/Unimontes - 8º Período
PROTOCOLO DE KYOTO
Em 1997, foi assinado o Protocolo de Kyoto, a Convenção sobre Mudança Climática, que
etipula um cronograma de redução de emissões de CO2 na atmosfera, até 2012, levando em
conta os diferentes graus de desenvolvimento dos países. Kyoto criou o mecanismo de desen-
volvimento limpo (MDL): mediante a emissão de bônus de carbono, papéis negociados em bol-
sas de valores, que permitem aos países desenvolvidos (suas empresas) comprarem créditos de
emissão de CO2 dos países menos poluentes (RODRIGUES, 2009, p. 102).
1827 – O cientista francês Jean-Baptiste Fourier estuda pela primeira vez o fe-
nômeno do efeito estufa.
1896 – O químico sueco Svante Arrehnius coloca a culpa pela produção de
dióxido de carbono CO2 na queima de combustíveis fósseis.
1958 – É detectado, pelo cientísta norte-americano Charles Keeling, o
aumento anual de CO2 na atmosfera.
Anos 70 – São identificados, por cientistas norte americanos e europeus, ou-
tros gases que causam o efeito estufa. São eles: clorofluorcaboneto, metano e
óxido nitroso.
1979 – O Relatório da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos atri-
bui o fenômeno às mudanças climáticas.
1988 – Criação do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas
1992 – Convenção da ONU sobre mudanças climáticas reivindica cortes volun-
tários das emissões de gases causadores de efeito estufa.
1997 – Países membros da convenção da ONU assinam o Protocolo de Kyoto.
2001 jan/mar – IPCC [ Painel Internacional da Mudança do Clima] publica três
relatórios, que declaram que a evidência do aquecimento global é indiscutível.
Mar – Estados Unidos Abandonam o Protocolo [Kyoto].
Nov – Os participantes do Protocolo concordam com as normas do tratado.
2002 – Estudos científicos aumentam a preocupação com o aumento do aque-
cimento global e seus efeitos irreversíveis para o clima.
2004 – A Rússia adere ao projeto.
A crise econômica que abateu os Estados Unidos, no final de 2008, contaminou todo o
planeta e abalou a economia internacional. Comparada em magnitude à quebra da Bolsa
de Nova Iorque, de 1929, a crise coincidiu com o fim da presidência de George W. Bush e a
vitória de Barak Obanma, primeiro presidente negro da história americana.
[...]
Muitos afirmam que se trata de uma tragédia anunciada: excesso de liberdade com es-
cassez de controles financeiros gerou papéis podres negociados na bolsa e operações ir-
responsáveis de agentes privados com ausência dos governos... A resposta à crise reconfi-
gurou o mapa do poder econômico internacional (RODRIGUES, 2009, pp. 94-95).
Como podemos ver, passamos por gran- balham e estudam como iguais, em grande
des transformações em poucas décadas. Guer- parte do mundo, e as leis passaram a garantir,
ras frias e quentes assolam o mundo como além das igualdades, o direito à diferença. A
sempre. A tecnologia é uma presença cotidia- primeira década do século XXI terminou com
na na vida de todos. Homens e mulheres tra- promessas, tensão econômica e social.
108
História - História Contemporânea II
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109
História - História Contemporânea II
Resumo
Unidade 1: a era da catástrofe
111
História - História Contemporânea II
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Suplementares
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HOBSBAWM, E. Globalização, Democracia e Terrorismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
___________. Nações e Nacionalismo Desde 1780. São Paulo: Nova Fronteira, 2012.
115
História - História Contemporânea II
Atividades de
Aprendizagem (AA)
1) É característica do Fascismo:
a) O sectarismo.
b) A democracia.
c) O multiculturalismo.
d) As vanguardas artísticas.
3) O Nazismo marcou o conflito da Segunda Guerra Mundial. A intolerância era a sua marca.
Quais eram alguns desses grupos sociais contra os quais o Nazismo se voltou?
a) Judeus, homossexuais, ciganos e comunistas.
b) Judeus, plebeus, evangelistas.
c) Judeus, evangélicos e negros.
d) Judeus, feministas e bolivaristas.
4) São medidas adotadas com o tratado de Breton Woods, de julho de 1944, exceto:
a) Criação de blocos econômicos.
b) Criação do Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento.
c) Fim do padrão ouro.
d) Liberdade de comércio.
◄ Figura 4: O jogo
da nova ordem
internacional.
Fonte: <http://the-
peoplescube.com/
peoples-tools/red-primer-
-for-children-and-diplo-
mats-t2223.html>. Acesso
em: 30 ago. 2011.
a) A Revolução Russa;
b) A Expansão global do Capitalismo.
c) A Guerra Fria.
d) O fim da Segunda Guerra Mundial.
10) Analisando a charge abaixo e o contexto internacional do início deste milênio, aponte a
sentença incorreta.
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