Você está na página 1de 21

Sobre a prática:

Um manual para estudantes de violão

Ricardo Iznaola

Tradução Lauro Santos


Sumário

PREFÁCIO ................................................................................................................................. 2
I - BASE DE BOAS PRÁTICAS ................................................................................................. 3
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 3
2. EQUILÍBRIO INTERIOR .................................................................................................... 3
3.EQUILÍBRIO EXTERIOR .................................................................................................... 4
II - FATORES NEGATIVOS QUE AFETAM A PRÁTICA ......................................................... 5
1. FATOR MATERIAL OU TANGÍVEL .................................................................................. 5
2. FATORES INTANGÍVEIS OU PSICOLÓGICOS............................................................... 6
IV - PRÁTICA DE LIMPEZA: O SISTEMA DE PRÁTICA ......................................................... 9
1. MATERIAIS ........................................................................................................................ 9
2. ATRIBUIÇÃO DE TEMPO DO MATERIAL ....................................................................... 9
V - A ESSÊNCIA DA BOA PRÁTICA: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS ............................... 11
VI - MEMÓRIA E LEITURA CORRETA: A QUESTÃO DA PRECISÃO NA PRÁTICA E O
PAPEL DA VISUALIZAÇÃO .................................................................................................... 13
EXPERIMENTO NO.1.......................................................................................................... 14
EXPERIMENTO NO.2.......................................................................................................... 15
EXPERIMENTO NO.3.......................................................................................................... 16
VII - O COMBUSTÍVEL PARA A BOA PRÁTICA: A INTERAÇÃO ENTRE A MOTIVAÇÃO
INTERNA E A MOTIVAÇÃO EXTERNA ................................................................................. 18
1. MOTIVAÇÃO INTERNA: DISCIPLINA ............................................................................ 18
2. MOTIVAÇÃO EXTERNA: DEVER ................................................................................... 18
SUGESTÕES PARA LEITURA ADICIONAL .......................................................................... 20

1
PREFÁCIO
Este breve manual responde a algumas das perguntas mais comuns sobre como praticar
com eficácia. Ele também aborda algumas questões frequentemente deixadas sem
explicação nas discussões sobre o assunto.

O leitor curioso pode querer explorar os escritos de outros autores como Matthay,
Bonpensiere, Havas, Galamian, Leimer, Stanislavski - todos os quais foram influentes na
formação da abordagem prática e da filosofia descritas neste livreto. Consulte também as
"Sugestões para leituras adicionais" no final do livreto.

2
I - BASE DE BOAS PRÁTICAS
1. INTRODUÇÃO
O que acontece no palco do concerto é uma consequência direta do que acontece na sala
de prática. Não há mágica nem mistério: boas práticas resultam em bons desempenhos. A
prática ruim produzirá desempenhos ruins.

Para aprender a praticar com eficácia, o performer deve primeiro compreender a natureza
do desafio peculiar apresentado por uma apresentação pública e sua capacidade de
enfrentá-la com sucesso, mas de fato gostar de fazê-la. Amar música, e mesmo amar tocar
música [por exemplo], não são garantias de sucesso como intérprete. É preciso sentir a
necessidade de compartilhar com os outros a própria forma de fazer música para se tornar
um músico de sucesso.

A abordagem prática descrita aqui é focada no objetivo final de uma atuação pública bem-
sucedida. Praticar bem, neste contexto, significa atingir o objetivo de tocar bem em público.

2. EQUILÍBRIO INTERIOR
A base da boa prática é a obtenção e manutenção do equilíbrio interior. O equilíbrio interior
pode ser definido como um estado mental / espiritual de alerta e prontidão para a atividade
intelectual, sem tensão emocional. É caracterizada pela ausência de atitudes de julgamento
sobre nós mesmos e por um grande senso de curiosidade. O equilíbrio interior só pode ser
alcançado quando as seguintes condições são satisfeitas:

a) Desapego emocional do material que está sendo praticado. Somos imparciais,


portanto, emocionalmente não afetados pelos altos e baixos naturais que acontecem
no decorrer da prática. Não nos condenamos pelos erros, embora os percebamos de
forma realista. Nós nos comportamos e nos sentimos como cientistas em um
laboratório. Observamos, desapaixonadamente, os resultados de nossos
experimentos.

b) Observação objetiva do que estamos fazendo e dos resultados que estamos


obtendo. Não encobrimos as falhas. Não paramos de ouvir atentamente tudo o que
fazemos. Não paramos de observar as sensações físicas produzidas em nosso
mecanismo de tocar pelo ato de tocar.

c) Facilidade de ação no que fazemos. Desenvolvemos um senso apurado para a


quantidade de esforço necessária para realizar os movimentos de tocar e
continuamente nos esforçamos para diminuí-lo. Não permitimos que a dificuldade,
muito menos a fadiga ou a dor, se tornem parte de nossa abordagem ao tocar o
instrumento. A facilidade de ação é o resultado direto do desenvolvimento de um
sentido muscular refinado para o equilíbrio externo (descrito mais adiante).

Quando nosso equilíbrio interior é perturbado, nossa prática não pode ser a ideal.
Frequentemente, isso acontece quando as coisas não vão bem e cometemos erros.
Ficamos frustrados com nossa própria incompetência e começamos a nos condenar. A
ansiedade começa a surgir. A tensão emocional aumenta e produz tensão física que torna
as coisas ainda mais difíceis, e perdemos a facilidade de ação. Como consequência desse
processo, também paramos de ouvir objetivamente, em parte porque subconscientemente
tentamos nos proteger dos sentimentos dolorosos de inadequação e frustração.

3
Assim, entramos em um círculo vicioso que só piora à medida que nos tornamos mais
persistentes em nossa pseudoprática. Também perdemos gradualmente nossa motivação e
nosso desejo de praticar.

Devemos aprender a identificar o processo descrito acima para podermos interrompê-lo no


início, antes que ele assuma o controle de nossa prática.

3.EQUILÍBRIO EXTERIOR

O equivalente físico do equilíbrio interior é o equilíbrio exterior. O equilíbrio externo pode ser
definido como o estado de alerta e prontidão para a ação de um membro, sem tensão
disfuncional. É caracterizada por sensações de falta de peso e sem esforço. É uma atitude
do membro aproximadamente a meio caminho entre o colapso (relaxamento total) e a
rigidez (tensão máxima).

Aprender a identificar e usar o equilíbrio como norma para a atividade física no instrumento
é a chave para alcançar a facilidade de ação. Para isso, devemos distinguir entre
sensações de peso e sensações de esforço.

Sensações de peso (queda) são produzidas quando permitimos que a gravidade atue sobre
nossos membros. Sensações de esforço (levantamento; superação de uma resistência) são
produzidas quando superamos a atração da gravidade, ou alguma outra resistência, por
meio da atividade muscular.

O membro equilibrado parece estar flutuando devido à oposição equilibrada entre a atração
da gravidade e o esforço muscular necessário apenas para superá-la. Deve ficar claro que o
equilíbrio é uma norma, uma referência que nos ajuda a controlar a quantidade de esforço
necessária para um determinado movimento. Todo um espectro de graus de esforço é
necessário para tocar o instrumento corretamente.

Quando e quanto esforço usar em um determinado momento é o problema.

Controlar o equilíbrio à vontade é a chave do problema.

4
II - FATORES NEGATIVOS QUE AFETAM A PRÁTICA
Existem vários fatores que, na maioria das vezes de forma inconsciente e involuntária,
podem afetar a qualidade de nossa prática.

1. FATOR MATERIAL OU TANGÍVEL


a) Nível de dificuldade - a tendência de lidar com materiais que são muito difíceis para
nosso nível atual de desenvolvimento. A dificuldade pode ser técnica, musical ou
uma combinação de ambas.

b) Quantidade de material - a tendência de lidar com muitas coisas ao mesmo tempo.


Isso se mostra na quantidade de peças a serem estudadas e na forma como são
tratadas áreas específicas de cada peça. A tendência é trabalhar em fragmentos
muito longos ao lidar com problemas específicos dentro da peça.

c) Falta de tempo - tendência a apressar a abordagem da prática porque não há tempo


suficiente. A sensação de que não temos tempo suficiente é sempre produzida pelo
“b” acima e por certas expectativas implícitas.

d) A inércia do fluxo rítmico - a tendência de tocar uma peça do começo ao fim,


causada por nossa inclinação natural para seguir o “groove” rítmico da peça.
Quando tocamos, não estamos praticando, mas atuando. Lembre-se destes
princípios básicos:

• Se alguém está atuando, o fluxo rítmico não deve ser interrompido,


não importa quais incidentes (erros) ocorram. Uma performance é
uma declaração completa e ininterrupta.

• Se alguém estiver praticando, não continuará tocando a peça até que


tenha alcançado os objetivos específicos predefinidos para aquele
fragmento particular. Praticar é, fundamentalmente, um processo de
correção e experimentação orientado para objetivos e focado em
detalhes para melhorar o que foi feito antes. Embora também se
pratique a execução, como veremos mais tarde, este é o estágio
culminante da prática e nunca pode substituir o trabalho preliminar e
detalhado que é o verdadeiro núcleo da boa prática.

e) Tempo - intimamente associado a “d”. A tendência de praticar prematuramente no


tempo de execução, antes que nosso mecanismo esteja realmente pronto para fazê-
lo. O tempo é um dos últimos fatores a ser incorporado em nossa prática.

Uma boa regra prática é a seguinte programação de estágios de aprendizagem para uma
nova peça (aplica-se igualmente a estudos, exercícios, solos, partes de conjunto, etc.):

1) Prática pré-rítmica - preocupada apenas em identificar e alcançar notas corretas por


meio de movimentos fluidos e fáceis. Sem ritmo, sem medidor, sem tempo.

2) Padrões de identificação de prática rítmica pré-métrica, "gestos", grupos rítmicos e


trabalhar em sua conexão sem uma continuidade métrica rigorosa. A importância
primordial de alcançar facilidade de ação.

5
3) Prática métrica pré-tempo (manipulação de tempo) - tocando através da peça (ou
grandes partes dela) mantendo a sensação métrica, mas carregando tempos
conforme necessário para garantir a execução perfeita das passagens mais difíceis.
Este é o primeiro passo para a integração. A ideia é tocar sem parar e manipular seu
tempo para que tudo seja tocado sem erros e sem excesso de tensão.

4) Prática métrica lenta - tocando no tempo, mas com o tempo lento consistente. A
facilidade física é sempre uma prioridade. Alternância com estágios anteriores de
prática, para uma maior melhoria dos detalhes.

5) Pratica de tempo - o objetivo culminante. Se levado para a peça como um todo, é


idêntica à realização prática do tempo (descrito mais tarde). ele também deve ser
usado para fragmentário, prática de spotting (ver Capítulo V).

Tenha duas coisas em mente:

Ler à primeira vista não é praticar. Os objetivos e processos de uma boa leitura à primeira
vista são certamente complementares e indispensáveis, mas estão fora do âmbito da
prática, conforme discutido aqui. Trataremos dessa questão com mais detalhes
posteriormente.

A chamada "prática lenta" é apenas uma das etapas da prática adequada. Como nosso
plano sugere, há estágios preliminares que precisam ser assimilados antes que a prática
lenta se torne efetiva.

Além disso, lembre-se de que não importa o quão bem conheçamos uma peça, todas as
abordagens acima serão úteis para manter nosso mecanismo funcionando com facilidade
efetiva. Não hesite em empregar todas essas estratégias, mesmo com materiais que você
conhece muito bem. A recompensa será tremenda.

2. FATORES INTANGÍVEIS OU PSICOLÓGICOS


a. Expectativas - todos nós temos expectativas explícitas e implícitas, tanto de longo quanto
de curto prazo, sobre o que devemos fazer, alcançar ou realizar. Algumas dessas
expectativas são saudáveis e necessárias para manter viva a nossa motivação. Outros,
entretanto, devem ser entendidos como negativos e prejudiciais ao nosso desenvolvimento
orgânico como artistas performáticos.

Em termos gerais, o problema começa quando temos uma visão não objetiva de nossas
próprias capacidades que nos faz confundir o que desejamos ou queremos com o que a
realidade é.

Exemplos típicos de expectativas negativas são:

- "Eu tenho tocado por 3 anos eu deveria ser capaz de tocar a, b ou c.”

- “Eu vou estar pronto para tocar x, y ou z no próximo mês.”

Nós devemos entender que o processo de aprender a tocar bem um instrumento (em geral,
treinamento de habilidades de qualquer tipo) é essencialmente um processo de crescimento
que varia individualmente.

Não podemos acelerar o crescimento de uma árvore puxando seus galhos. O realismo
honesto é uma virtude fundamental para todos os artistas.

6
Respeite seu ritmo de crescimento individual.

Não permita que suas (falsas) expectativas [o futuro] atrapalhem o desenvolvimento natural
de sua prática [o presente].

Aborde sua prática seguindo os conselhos do grande diretor de teatro russo Stanislavski:
"hoje, aqui, agora".

b. Memórias - o lado oposto da moeda. Todos nós carregamos o fardo de nossas


experiências passadas, boas e más. As boas servem como combustível para realizações
futuras. As más devem ser deixadas do lado de fora da porta de nossa sala de prática.

Não permita que suas memórias (negativas) [do passado] interrompam o desenvolvimento
natural de sua prática [o presente].

"Hoje, aqui, agora.”

c. Comparações - as realizações de outras pessoas podem ser uma influência positiva e


inspiradora. Mais frequentemente do que não, eles se tornam um obstáculo ao nosso
autodesenvolvimento se fizermos julgamentos de valor com base em comparações com os
outros.

A tendência de nos compararmos com os outros é natural em todos nós. É baseada


naquele componente atlético da personalidade humana que nos torna competitivo. Devido à
própria natureza física do desempenho, é fácil cair na armadilha de ver a destreza como o
objetivo final e a medida de nossas realizações.

Um dos segredos para uma prática bem-sucedida é aprender a controlar esses sentimentos
sem negá-los. Precisamos de um certo grau de habilidade técnica para nos tornarmos
artistas de sucesso. As pessoas esperam agilidade, volume e velocidade na apresentação
musical.

O público não vai a concertos para comparar apresentações anteriores com as atuais. Em
muitos aspectos, um concerto se assemelha a muitos aspectos de um relacionamento
amoroso: é a atratividade única de sua mensagem artística e personalidade que o tornará
bem-sucedido. O público é, neste contexto, "promíscuo"; eles têm uma capacidade ilimitada
de "se apaixonar" por todas as mensagens artísticas e personalidades únicas possíveis.

O velho truísmo ainda se aplica: você está apenas competindo consigo mesmo.

Devemos alterar o nosso lema de, "hoje, aqui, agora", para:

"Eu, hoje, aqui, agora."

7
III - OBJETIVO E MÉTODO DE BOAS PRÁTICAS

O objetivo das boas práticas é atingir objetivos específicos, com foco na melhoria contínua
da qualidade e facilidade de execução.

As áreas em que esse processo ocorre são: técnica, musicalidade e performance.

O grande pedagogo do violino Galamian propôs a distribuição metódica do tempo de prática


em três intervalos de tempo:

a) Tempo de construção - em que questões puramente técnicas são tratadas


(detalhes técnicos)

b) Tempo interpretativo - em que os elementos de expressão musicalmente são


experimentados e incorporados à peça (detalhe musical)

c) Tempo de apresentação - em que ocorre a integração da técnica e da


musicalidade, tocando peças ou seções completas, prestando atenção às
circunstâncias imaginadas de uma performance real e lidando com
problemas de etiqueta de concerto, medo do palco, etc.

Normalmente, “a” e “b" trata da prática detalhada, fragmentária e seccional, enquanto “c"
atua na peça como um todo, como um evento esteticamente relevante, que não deve ser
interrompido ou interrompido.

É claro que nem todas as sessões de prática devem ser rigorosamente divididas dessa
forma. Em diferentes estágios de desenvolvimento, mais ou menos ênfase será dada a uma
ou outra etapa. No entanto, deve-se estar sempre consciente do tipo de prática em vigor.
Não se permita uma pseudoprática aleatória e cega, realizando-a para ser a verdadeira
prática.

Quando alguém quer apenas "brincar" com o instrumento, deve-se fazê-lo por todos os
meios. Esteja ciente, porém, de que isso não é prática.

8
IV - PRÁTICA DE LIMPEZA: O SISTEMA DE PRÁTICA
1. MATERIAIS
A boa prática deve incorporar uma mistura equilibrada de materiais que incluirá:

a) Exercícios - cuja finalidade é treinar as capacidades ginásticas do mecanismo de


jogo (fundação ou técnica básica).

b) Estudos - cujo objetivo é apresentar procedimentos técnicos particulares dentro de


um contexto musical de extensão moderada (técnica aplicada).

c) Repertório - que é o objetivo artístico e onde ocorre a verdadeira integração da arte


e do artesanato, da técnica e da musicalidade (técnica expressiva}.

A crença de que a técnica pode ser adquirida apenas pelo trabalho do repertório é uma
falácia comum. Já que a boa técnica depende de um mecanismo de tocar fisicamente
adequado e, uma vez que as obras concebidas artisticamente não têm uma finalidade
técnica formativa predefinida, o equipamento técnico construído apenas no estudo do
repertório terá sempre muitas áreas de fragilidade. A sua componente de aptidão física não
será exaustivamente treinada.

Não se pode treinar o corpo para jogar futebol profissional apenas jogando.

Ao fazê-lo, arrisca uma contusão ou, na melhor das hipóteses, fazer um jogo medíocre.

O mesmo se aplica, pelas mesmas razões, ao desempenho musical.

Uma vez atingido um estágio avançado de técnica desenvolvimento, a manutenção técnica


pode ser mantida isolando-se pontos do repertório e selecionando alguns estudos que
consideramos particularmente úteis, etc. A abordagem, entretanto, só é produtiva quando
os estágios formativos do treinamento técnico são bem assimilados.

2. ATRIBUIÇÃO DE TEMPO DO MATERIAL


Tradicionalmente, a prática é empreendida e seus resultados avaliados no dia-a-dia.
Propõe-se aqui que a unidade de tempo da prática seja considerada como a semana:
distribuir os materiais a serem praticados (exercícios, estudos, repertório) ao longo da
semana, para que no final da semana tudo seja percorrido.

Assim fica mais fácil de controlar a quantidade de tempo dedicado a áreas específicas, o
que precisa mais ou menos trabalho, evitando ao mesmo tempo, a sensação incômoda de
que não há tempo suficiente para trabalhar em tudo. (Discutido em nossa seção anterior
sobre fatores negativos).

A semana deve consistir em apenas seis dias, com um sétimo dia de descanso da prática
(embora você possa tocar o quanto quiser nesse dia!).

Para todos os alunos de profissão de nível universitário, nenhuma abordagem prática


produzirá resultados se feita por menos de 2 a 3 horas por dia. Praticar mais de 5 a 6 horas,
por outro lado, começará a produzir retornos decrescentes.

Idealmente, a prática diária deve ser dividida em três sessões, com tempo de descanso
suficiente entre as sessões (certamente não menos que intervalos de 10 a 15 minutos). Se

9
qualquer sessão em particular ultrapassar 60 minutos, então outras pausas devem ser
feitas, mas de duração mais breve.

Uma abordagem inteligente, flexível e consistente ao tempo alocado para prática irá evitar
um monte de possíveis problemas relacionados com lesões do mecanismo físico, sintomas
de estresse, a deterioração da técnica, condição geral de saúde, de bloqueio de motivação,
etc.

Nada de ruim acontece se alguém não pratica por alguns dias. Nos estágios iniciais de
desenvolvimento, alguma perda momentânea de habilidade pode ser notada, a qual é
rapidamente corrigida assim que os tempos de prática apropriados são retomados.

No que diz respeito à prática técnica, como exercícios e estudos, é aconselhável alternar os
procedimentos técnicos utilizados, para que alguns elementos físicos repousem e se
reconstruam, enquanto outros são trabalhados.

Em conclusão, lembre-se de que ter seis dias por semana como unidade de tempo de
prática significa que nem tudo precisa ser trabalhado todos os dias!

10
V - A ESSÊNCIA DA BOA PRÁTICA: RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS
O propósito da boa prática foi definido no Capítulo III como sendo "atingir objetivos
específicos enquanto se concentra na melhoria contínua da qualidade e facilidade de
execução.”

Esses objetivos específicos podem ser tão detalhados e pequenos quanto uma única,
mudança particular de um traste, ou tão geral e grande quanto decidir sobre como abordar
dinamicamente o primeiro tema em uma seção de recapitulação de um movimento sonata-
allegro.

Em todos os casos, a abordagem é a mesma: considerar o objetivo a ser alcançado como


um problema particular apresentado pela peça naquele momento específico. A prática,
então, torna-se um método de resolução de problemas. Nossa abordagem para a resolução
de problemas, neste contexto, tem três etapas:

a) Identificação do fato de que, a) há um problema, b) o que é, c) onde começa e


termina.
É fácil cair na armadilha da sobreposição de problemas (isto é, considerar como um
problema o que na realidade é uma série de problemas diferentes). Seja tão preciso
e detalhado quanto possível determinando os limites de uma área problemática.

b) Compreender as causas exatas de um problema. Esta é uma fase difícil para a


maioria dos iniciantes, pois eles ainda não adquiriram experiência ou conhecimento
suficiente do instrumento para serem capazes de identificar especificamente o que
cria um problema.
A compreensão geralmente traz consigo uma solução apropriada para o problema,
mas também pode exigir a experimentação de várias opções antes que a melhor
solução seja encontrada.
Muito do que os professores fazem no estúdio é ajudar o aluno a identificar e
compreender os problemas apresentados por uma determinada peça.

c) Assimilação - a palavra assimilação significa "tornar-se um com", ser absorvido pela


natureza de algo.
Em nosso contexto, isso significa o processo pelo qual, tendo encontrado uma
solução válida para um problema, nos esforçamos para melhorá-lo por meio da
repetição guiada. Ao fazê-lo, tornamos a solução uma parte de nós, garantindo
assim que, no desempenho, temos uma boa garantia de sucesso ao lidar com
aquela passagem específica.

Este último estágio é o que mais frequentemente se entende como prática. O problema é
que a assimilação por meio da repetição ocorre independentemente de estarmos fazendo
algo certo ou errado. Se o processo anterior de identificação e compreensão ocorreu de
uma maneira menos do que cuidadosa, e nós apenas nos permitimos o que pode ser
chamado de 'repetição cega', os resultados poderiam ser piores que se não tivéssemos
praticado nada!

Mantenha a partitura em mãos durante os treinos, mesmo quando o material for


memorizado. A conexão entre o código escrito da partitura com os eventos auditivos e a
ação física de tocar é de fundamental importância no desenvolvimento da segurança
técnica e da memória, como veremos no Capítulo VI a seguir.

11
Uma forma muito eficaz de resolver problemas técnicos de forma rápida e correta é a
técnica de spotting (detectar, notar), em que as três etapas de identificação, compreensão e
assimilação são claramente diferenciadas e controladas.

a. Você ou o professor identifica um problema, marcando-o na partitura com um


colchete horizontal que começa um pouco antes e termina um pouco depois
do local do problema específico.
Escreva sinais de repetição em ambas as extremidades do colchete:
==== imagem

b. Você encontra / ou seu professor então estuda as causas do problema até


que uma solução válida seja encontrada. Este é o segundo estágio de
compreensão do problema.

c. Uma vez que o problema tenha sido compreendido e sua solução


encontrada, comece a praticar o conteúdo do colchete repetidamente como
um exercício ininterrupto. Devem ser usados tempos diferentes. Este último
estágio (assimilação) será concluído quando hábitos corretos forem formados
na maneira como o local específico é tratado.

Dependendo do nível de dificuldade do problema, a etapa de assimilação levará mais ou


menos tempo. Normalmente, encontrar uma boa solução para um determinado local
permitirá que o instrumentista tocar bem por um momento. Nesse ponto, a compreensão
(ou o que pode ser chamado de reação de clique) ocorre e o terceiro estágio (assimilação
por meio da repetição guiada) pode começar.

Quando o problema estiver prestes a ser resolvido, coloque-o de volta no contexto,


adicionando várias barras antes e depois do ponto específico. Tanto na hora de definir o
local, quanto quando ele é colocado de volta no contexto, deve-se ter o cuidado de criar
fragmentos que façam sentido rítmico.

Ao detectar, certifique-se de não começar a trabalhar no conteúdo do colchete (repetição)


até que você tenha uma ideia precisa de qual deve ser a abordagem correta para o
problema. Lembre-se de que o processo de assimilação - que é, essencialmente, o
condicionamento do sistema nervoso autônomo espinhal - funcionará contra você se sua
abordagem for falha. Se você praticar erros, aprenderá e cometerá erros.

É importante ressaltar que as etapas de identificação e compreensão são as mais difíceis


de serem comandadas por instrumentistas menos experientes. O papel do professor, a este
respeito, é indispensável para assegurar uma definição correta da extensão exata, das
causas e da solução de cada problema particular. Como mencionado anteriormente, a
tendência é considerar como um único problema o que é, na verdade, uma série de
problemas distintos.

Lembre-se de que tudo o que dá errado, parece errado ou é difícil, não importa o quão
pequeno possa parecer, deve ser tratado como um problema isolado e melhorado, ou
corrigido, por meio da prática adequada.

12
VI - MEMÓRIA E LEITURA CORRETA: A QUESTÃO DA PRECISÃO
NA PRÁTICA E O PAPEL DA VISUALIZAÇÃO
Toda a discussão anterior trata, de fato, da questão fundamental de alcançar a exatidão
perfeita em nossa prática. Só então teremos uma base sólida para construir uma
performance verdadeiramente artística.

Existem oito áreas nas quais devemos ser precisos antes que um bom desempenho possa
começar a ocorrer:

a) Obtendo as notas certas (interpretando a notação do tom).

b) Obtendo a duração certa (interpretando a notação do valor da nota).

c) Obtendo a acentuação correta (interpretando notação rítmica / métrica).

d) Obter as velocidades e níveis corretos de volume (interpretando o ritmo e as


marcações de expressão).

e) Obter o dedilhado certo (interpretando notação instrumental / técnica).

f) Obtendo o fraseado certo (estrutura de interpretação).

g) Obtendo as conexões certas nas diferentes seções da peça (forma de


interpretação).

h) Obter a sensação emocional e histórica certa para a peça (interpretando


personagem e estilo).

Dependendo do tipo de material que está sendo praticado, algumas dessas áreas tornam-
se mais relevantes do que outras. Além disso, seu nível relativo de importância mudará à
medida que diferentes estágios de desenvolvimento forem alcançados. As últimas três
áreas entram em cena em um estágio relativamente avançado.

A maioria dos problemas que afetam muitos alunos de execução musical são apenas
imprecisões em uma ou mais das áreas marcadas de “a” a “e” acima, ou seja, erros na
leitura / memorização do material.

Leitura à primeira vista e memorização são as duas faces da mesma moeda. A capacidade
de ler e lembrar com precisão os tons, valores de nota, ritmos, dinâmica (nuances de
volume), agógica (nuances na duração e ritmo) e dedilhado de uma peça musical, é o
objetivo principal sobre o qual todas as outras técnicas e musicais objetivos dependem.

Muitos artistas acreditam erroneamente que são maus leitores ou têm memória ruim,
porque não descobriram os princípios relativamente simples que orientam o
desenvolvimento natural e saudável dessas habilidades.

O seguinte pode ser útil:

a) Se for bastante fácil para você, você pode visualizá-lo.

b) Se você pode visualizá-lo, você pode lê-lo à primeira vista.

c) Se você puder visualizá-lo sem o instrumento e sem a partitura, você pode se


lembrar dele.

13
Visualizar, neste contexto, significa tanto ver suas mãos nos movimentos de tocar
quanto ouvir a música internamente, com os olhos e ouvidos da mente.

d) Se for muito difícil, você não o lerá bem.

O problema com a leitura à primeira vista é que a maioria dos jogadores tenta material além
do alcance de suas capacidades atuais. (Nota: O último ponto (d) deve ser considerado com
um grão de sal - uma precaução geral, ao invés de uma regra rígida e rápida. Expandir suas
capacidades, quando feito com um espírito saudável de 'e se', é um ótimo estímulo
motivador.)

Os experimentos a seguir darão a você oportunidades de desenvolver essas habilidades


enquanto se diverte desafiadoramente.

EXPERIMENTO NO.1
a) Selecione uma pequena peça ou fragmento: não mais do que 2 pautas, não mais do
que 8 barras de comprimento, todas nas posições dos primeiros segundos.

b) Os pitches não devem se estender além da primeira linha do razão em nenhuma


direção.

c) Os valores das notas não devem ser menores que 1/8 de notas.

d) O tempo deve ser simples duplo.

e) A textura deve ser em duas vozes principalmente, com ocasionais acordes de 3


vozes.

f) Não mais do que um sustenido ou bemol na armadura de clave.

g) Tempo moderado

h) As marcações de expressão (dinâmica, agógica) devem ser em número reduzido.


Certifique-se de saber o que cada termo significa.

i) As indicações de dedilhado devem ser poucas e discretas.

Passo 1 - Leia o fragmento sem o instrumento tente ver, mentalmente, onde está a sua mão
esquerda o tempo todo. Não se preocupe com os valores das notas, ritmo, tempo ou
andamento neste momento. Apenas descubra e visualize o que a mão esquerda deve fazer.

Passo 2 - Adicione visualização da atividade da mão direita. Se os dedos da mão direita não
estiverem indicados, marque-os antes de começar. Mais uma vez, concentre-se apenas em
ver (em sua mente) as mãos trabalhando para cada movimento, desconsiderando o ritmo,
andamento, etc.

NOTA: Se a visualização da mão direita for muito exigente, exclua esta etapa.

Passo 3 - Comece a sentir o fluxo rítmico da peça. Apenas cante, em um tom monótono, os
valores das notas enquanto bate o tempo com a mão direita. Faça isso em um ritmo muito
lento. Não visualize a atividade das mãos enquanto executa esta etapa.

Passo 4 - Tente "ver" as mãos em ação enquanto compara o tempo e canta os valores das
batidas das notas em um tom monótono. Provavelmente, você precisará subdividir o
fragmento em pedaços ainda menores para poder fazer isso corretamente. Faça isso

14
devagar. Não pare até conseguir “tocar” mentalmente por meio de todos os fragmentos,
visualizando suas mãos no ato de tocar.

Passo 5 - DESCANSE! O que você fez é exaustivo!

Passo 6 - Pegue seu instrumento e prepare-se para tocar. Agora você está tentando ler à
primeira vista todo o fragmento, do começo ao fim, sem parar. Você provavelmente perderá
muitas coisas: notas, valores, ritmos e, é claro, dedilhados e marcações de expressão. Não
se preocupe. Seu único objetivo é tocar, tentando manter a continuidade rítmica com o
mínimo de interrupção. Comece a tocar.

Passo 7 - Faça uma pausa e tente novamente. Observe o seu ritmo (não se apresse).

Passo 8 - Você pode querer tentar mais uma vez, se suas tentativas anteriores foram muito
hesitantes. Se você se sentir bastante satisfeito, prossiga para a etapa IX.

Passo 9 - Experimente o “Passo 4” novamente - visualização sem o instrumento - mas


desta vez seu objetivo é ouvir a música "internamente", em todos os seus detalhes. Muitas
coisas ficarão "borradas em vermelho". Não se preocupe. Repita algumas vezes e
descanse.

O processo descrito anteriormente pode ser aplicado a todos os níveis de habilidade de


leitura e execução. O exemplo dado assume que o instrumentista é um iniciante com
alguma habilidade de leitura. Se você ainda está encontrando notas no instrumento,
experimente o processo em pequenos fragmentos melódicos, usando principalmente cordas
abertas (com algumas notas de primeira posição), ritmos muito simples e valores de notas
longas (apenas semínimas e semínimas).

A questão é que você deve começar a internalizar a música e a técnica o mais rápido
possível.

À medida que sua experiência musical e conhecimento crescem e amadurecem, o processo


será auxiliado por habilidades analíticas que se desenvolvem por último. Estes irão reforçar
os outros três elementos envolvidos: visual, auditivo e tátil / cinestésico.

EXPERIMENTO NO.2
Um equívoco comum é a crença de que se toca de memória apenas quando toca sem ler a
partitura. Pelo contrário, mesmo a leitura à primeira vista depende da memória para ter
sucesso. Todo bom leitor à primeira vista confirmará o fato de que está sempre lendo antes
do ponto que está sendo reproduzido, mesmo as frases inteiras à frente. O experimento a
seguir ajudará a desenvolver suas habilidades de memória de curto prazo por meio da
visualização.

Passo 1 - Usando o mesmo fragmento do Experimento nº 1, visualize apenas as duas


primeiras barras, sem o instrumento.

Passo 2 - Pegue o instrumento e prepare-se para tocar. Feche os olhos e toque esses dois
compassos.

Passo 3 - Abra os olhos e toque as mesmas notas, olhando apenas para a mão esquerda.

Passo 4 - Faça o mesmo, olhando para sua mão direita.

15
Passo 5 - Repita o processo para o resto do fragmento, trabalhando em apenas duas barras
por vez.

Passo 6 - Após percorrer todo o fragmento (8 compassos) desta maneira, comece a ler a
partir do topo novamente, mas tente olhar um ou dois compassos à frente de onde você
está tocando. Faça isso várias vezes.

Passo 7 - Reproduza todo o fragmento da memória. Não espreite! (Não se preocupe se


você não for totalmente bem-sucedido. Eventualmente, você terá.)

Obviamente, esses procedimentos não são fáceis e levarão muito tempo para serem
dominados.

Não misture sua prática regular com a prática de visualização.

Pratique leitura / memorização independentemente de sua prática regular com novo


material que está bem abaixo do seu verdadeiro nível de desenvolvimento técnico / musical.

Você pode tentar aplicar algumas das técnicas de visualização a um novo material que está
apenas começando a estudar, um material que se equipara às suas verdadeiras habilidades
como jogador. As chances são de que, a menos que você já seja um visualizador
proficiente, não terá muito sucesso devido à complexidade técnica / musical deste material.

Após começar a dedicar regularmente algum tempo à prática da visualização, você notará
com bastante rapidez que o nível geral de precisão na coleta de informações da pontuação
melhorará acentuadamente e levará menos tempo.

O sétimo dia recomendado de descanso da prática regular é uma oportunidade ideal para
dedicar algum tempo (uma hora ou mais) à visualização.

Não subestime os poderes de visualização. Alguns pedagogos distintos (Bonpensiere,


Leimer) acreditavam que, com o treinamento adequado, a capacidade de visualização de
uma pessoa poderia eventualmente se tornar tão forte e vívida a ponto de permitir a
eliminação parcial ou total da prática física. Alguns performers lendários de um passado não
muito distante alcançaram resultados surpreendentes por meio da visualização, por
exemplo Gieseking, Kreisler, Cortot ou, mais recentemente, Rubinstein e Arrau. Esses
indivíduos eram capazes de aprender novas obras longas e complexas durante um trem
prolongado ou uma viagem transatlântica, executando-as de memória na chegada, sem ter
tocado a peça no instrumento uma única vez.

Tudo é possível.

EXPERIMENTO NO.3
Após ter trabalhado por algum tempo nos experimentos 1 e 2, tente este desafio mais
avançado.

Passo 1 - Selecione um fragmento muito fácil e curto (4 a 8 barras). Visualize, sem o


instrumento, conforme descrito nas etapas 1 a 4 do experimento 1.

Passo 2 - Trabalhe nos dois primeiros compassos, ainda sem o instrumento, tentando ouvir
atentamente a música internamente. Não pare até obter uma visualização clara e precisa
dessas duas barras. Descreva em voz alta o conteúdo dessas barras. Cante a melodia em
voz alta.

16
Passo 3 - Pegue um pedaço de papel pautado e anote, de memória, essas duas barras.
Tente ser preciso ao reproduzi-las.

Passo 4 - Repita o processo para todo o fragmento, trabalhando com duas barras por vez.

Passo 5 - Após ter anotado todo o fragmento da memória, sem ter tocado no instrumento
uma vez, pegue o instrumento e prepare-se para tocar. Mais uma vez, visualize o fragmento
enquanto lê seu manuscrito (sem tocar).

Passo 6 - Com os olhos fechados visualize o fragmento mais uma vez.

Passo 7 - Guarde a partitura e reproduza o fragmento do começo ao fim da memória.

As primeiras tentativas provavelmente não serão muito bem-sucedidas. Isso é natural.

Descanse um pouco e tente novamente. Eventualmente, você terá sucesso.

Como no caso da prática física, suas habilidades de visualização se desenvolverão


gradualmente. Não fique impaciente consigo mesmo. Lembre-se do que você aprendeu
sobre a postura interior, sua importância fundamental nas boas práticas e como alcançá-la e
mantê-la.

17
VII - O COMBUSTÍVEL PARA A BOA PRÁTICA: A INTERAÇÃO
ENTRE A MOTIVAÇÃO INTERNA E A MOTIVAÇÃO EXTERNA
1. MOTIVAÇÃO INTERNA: DISCIPLINA
Nenhuma abordagem prática pode ser eficaz se não trabalhar regularmente e de forma
consistente. É preciso, antes de tudo, querer praticar de forma regular e consistente.
Portanto, como se manter motivado para a prática torna-se uma questão fundamental.

O que se chama tradicionalmente de disciplina deve ser entendido como motivação interior,
ou seja, a responsabilidade assumida de atuar de forma predeterminada para atingir
objetivos que nos são importantes espiritualmente como indivíduos.

Disciplina, assim entendida, é a consequência de um desejo de agir de uma forma orientada


para um objetivo, motivado por circunstâncias internas (necessidades não materiais ou
espirituais). Essas necessidades têm a ver com valores importantes, como amor, ambição,
respeito próprio, etc.

Ter um impulso, ou ser dirigido, implica o tipo de atitude que resulta em disciplina. Pessoas
com impulso são, por definição, disciplinadas em relação àquilo para o qual são dirigidas.
Essa é a forma fundamental de motivação e aquela que acabará por levá-lo a atingir seu
maior potencial.

Você não pode aprender a adquirir impulso. Está aí como combustível natural que
desencadeia a combustão interna daquilo a que chamamos a nossa vocação ou chamado.
É o "entheos" (deus interno) dos antigos gregos - de onde deriva a palavra entusiasmo.

Mesmo ao ter um forte senso de impulso, um chamado vocacional indiscutível, a motivação


interior (disciplina) pode vacilar ocasionalmente. Podemos não ter vontade de praticar.
Estamos cansados, ou muito envolvidos com outras coisas - como trabalho acadêmico ou
um relacionamento romântico emocionante - ou nos sentimos “tristes”, por estarmos longe
de casa, desempregados e pobres.

Nada de negativo acontecerá se interrompermos nossa rotina de prática por alguns dias.
Devemos também cuidar de nós mesmos emocionalmente e, às vezes, isso requer um
retiro momentâneo para lamber nossas feridas. Mas o perigo de cair em uma rotina sempre
existe. Devemos aprender a neutralizar a preguiça antes que ela tome o controle de nós.

2. MOTIVAÇÃO EXTERNA: DEVER


Na performance artística, a diferença mais importante entre o profissional e o amador está
na atitude em relação à prática.

Para o profissional, a prática é a atividade mais importante; o amador descansa de outras


atividades para praticar. Para o profissional, a prática é o meio para a meta mais elevada de
uma atuação pública bem-sucedida; para o amador, na maioria das vezes, praticar é um fim
por si só, pois não há apresentações públicas. Para o profissional, desempenhar (e,
portanto, praticar) é o trabalho; para o amador, é um hobby.

Adquirir a atitude profissional em relação à prática é uma questão fundamental no


desenvolvimento do intérprete. Implica aceitar os deveres inerentes à profissão.

18
Um senso de dever difere de disciplina porque é motivado por circunstâncias externas:
respeito pela autoridade de alguém, medo de avaliação crítica negativa, medo de falha
pública ou consciência dos padrões geralmente esperados pela comunidade profissional,
etc.

O aluno de performance tem o dever de obedecer às instruções do professor, de se


preparar bem para as lições, assistir às aulas, ensaios, fazer trabalhos de casa, etc., etc.,
etc ... O intérprete profissional tem o dever de estar pronto para tocar o concerto quando
programado; conhecer seu papel para os ensaios de conjunto; e o dever de atingir os
padrões de qualidade exigidos pela profissão em geral.

Esse senso de dever nunca será uma força motivadora primária, mas é de grande
importância ajudar o estudante de desempenho a iniciar um curso de ação positivo com
relação à prática quando, por qualquer motivo, falta motivação interior.

Caracteristicamente, quando a pessoa não sente vontade de praticar, mas, mesmo assim,
começa a fazê-lo porque deve, o desejo é gradualmente despertado e não demora muito
para que a pessoa esteja genuinamente motivada a praticar. Por meio de nosso senso de
dever, podemos, assim, recuperar a disciplina.

É essa interação entre nossa motivação externa e interna que nos manterá vivos, como
praticantes da arte, durante nossas carreiras profissionais.

19
SUGESTÕES PARA LEITURA ADICIONAL
A seguir está uma pequena lista de livros que podem ser úteis para o leitor interessado:

Bonpensiere, Luigi: New Pathways to Piano Technique - A study of the Relations between
Mind and Body with Special Reference to Piano Playing; (New York: Philosophical Library,
1953)

Galamian, Ivan: Principles of Violin: Playing and Teaching; (Englewood Cliffs, N.J. :
Prentice-Hall, 1 9 6 2)

Havas, Kato: A New Approach to Violin Playing; (London: Bosworth, 1961)


Havas, Kato: Stage Fright: Its Causes and Cures; (London: Bosworth, c.
1973)

Leimer, Karl (with Walter Gieseking) : Piano Technique; (New York : Dover, 1972)

Matthay, Tobias: Musical Interpretation: Its Laws and Principles, and Their Application in
Teaching and Performing; (London: Joseph Williams, c. 1913)

Matthay, Tobias: On Memorizing; (London: Oxford University Press, c.1922)

Matthay, Tobias: The Visible and Invisible in Pianoforte Technique;


(London: Oxford University Press, 1932)

Moore, Sonia: The Stanislavski System; (New York: Penguin Books, 1984)

20

Você também pode gostar