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Título original:
SI PARLA ITALIANO
Publicado no Brasil pela Editora Monterrey
Digitalização: JVS 450113/450113
CAPÍTULO PRIMEIRO
O encontro marcado e a carta misteriosa
Convite à morte ou convite ao pecado?
Mulher que a brisa balança.
CAPÍTULO SEGUNDO
Em num aeroporto também se pode comprar passagem para o inferno
Malícia contra esperteza para um final cheio de boas conclusões
Mais vale uma meia rasgada do que duas mortalhas perfeitas.
1
ABWRHR: serviço secreto militar alemão. NA
no Norte da África, e posteriormente em toda a Europa.
Meus inimigos me conheciam por “Alexandria”.
Brigitte estava completamente perturbada com aquelas
revelações.
— “Alexandria”! — exclamou.
— Ouviu falar de mim? — indagou ele.
— Vi um relatório do MI.5 britânico, certa vez, com
algo sobre “Alexandria” — disse a moça. — Li que
dominava todo o Norte da África, onde o próprio declarante
servira durante a Guerra. No entanto... Bem, vou acreditar,
Herr von Steinheil.
O barão acariciou-lhe a mão que segurava a taça.
Ambos sorriram, francos.
— É maravilhosamente amável, senhorita Montfort —
agradeceu Von Steinheil. — Penso que foi graças a esse
mesmo agente do MI.5, o do seu relatório, que o nome
“Alexandria” ficou conhecido no Ocidente. Este inglês foi o
adversário mais inteligente que enfrentei em toda a minha
carreira. Hoje vive em Londres, e de vez em quando nos
vemos. Já não há ódio, apesar das diferenças. A admiração
entre nós é mútua, embora queiramos sempre dissimular.
Mike é, realmente, um grande sujeito. Devido a certos fatos,
porém, nunca pudemos conversar como amigos.
— Mike? — fez Brigitte. — Mike do quê?
— Somente Mike — sorriu “Alexandria”. — Mas,
estamos falando de outros tempos, de outras pessoas. A
senhorita confia mesmo em mim?
— Não posso deixar de confiar, diante de sua franqueza
— confessou ela.
— Sim, sim. Não estamos em guerra. Se estivéssemos,
já lhe teria cortado a linda garganta. — Houve um brilho
nos olhos do barão, que a olhava como se lhe adivinhasse os
pensamentos. — Mas estamos em paz. A Alemanha perdeu
a guerra. Os vencedores ajudaram imediatamente a reerguer
tudo. Não posso esquecê-lo, senhorita Montfort: o “milagre
alemão” não teria acontecido, não fosse o auxílio
americano.
— Compreendo-o Herr Von Stein...
— Chame-me “Alexandria” cortou ele, sorridente.
— Entendo o que sente, “Alexandria” — tornou ela. —
Mas, aqui, não teme represálias? Afinal, foi um espião...
— ... que prejudicou os aliados — completou
“Alexandria”. — Sim, é possível que alguém queira vingar-
se. Mas os meus antigos inimigos são poucos; a maioria foi
vítima da própria guerra ou então desapareceu depois.
Entretanto, creio que ninguém mais me conhece como
“Alexandria”, e menos ainda na América. Quanto à
senhorita, estou certo do que nada fará contra mim.
Primeiro, porque tenho algo de que foi encarregada de
apossar-se. Segundo, porque lhe dei oportunidade de sair do
dia-a-dia nova-iorquino, acenando-lhe com a aventura, da
qual sei que gosta muito. Logo, afirmará que nunca viu
“Alexandrina” em parte alguma, e muito menos em Miami.
— Estou mesmo convencendo-me de que você faz
amizade com seus inimigos, se eles a merecem —
confessou Brigitte.
— Não somos inimigos, senhorita Montfort — retrucou
ele.
— Gostaria que me chamasse Brigitte, simplesmente,
“Alexandria”.
— Obrigado... Brigitte — o nome pareceu tomar um
significado especial, tão profunda era a voz que o
pronunciava. Havia qualquer tom de veneração na voz de
“Alexandria”, ao dizê-lo.
Brigitte sorriu-lhe com mais cordialidade; estava
totalmente conquistada por aquele homem incomum.
— Estamos de acordo — disse. — Não vi nenhum
“Alexandria” em Miami, nem você viu Brigitte Montfort.
Esqueceremos tudo, tão logo tenhamos chegado ao fim de
nossa negociação. Ou não se trata de negociar,
“Alexandria”?
— Deixemos para depois, Brigitte — respondeu ele. —
Teremos tempo. Além do mais, preciso aproveitar ao
máximo estes momentos. Estou conhecendo a famosa filha
de Giselle Montfort, a belíssima e inteligente Brigitte.
A jovem repórter fez um doce ar encabulado que
enterneceu “Alexandria”. Num gesto muito sincero ele
tomou-lhe as duas pequenas mãos entre as suas, fortes e
quentes, para um carinho melhor.
Naquele momento, entrava no hotel o agente Minello.
Enquanto seguia os movimentos do companheiro, que
assinava o livro de hóspedes e desaparecia num elevador,
no hall, Brigitte sentiu-se estremecer: “Alexandria” lhe
beijava as mãos de moradamente.
Ele notou o estremecimento, e sorriu:
— Aceita outro coquetel, Brigitte?
— Não, obrigada — ela retirou as mãos um tanto
confusa. Fez uma pausa, indagando depois,
inesperadamente: — Quando conheceu minha mãe,
“Alexandria”?
— Em Paris, Rue du Bac — explicou ele. — Ela não me
conheceu, se é o que quer saber. Himmler requisitou meus
serviços, tirando-me do Oriente por algum tempo. É claro
que a Gestapo nada tinha a ver com a Abwehr, mas não
pude deixar de atender à chamada. Fui a Paris e recebi
ordens de vigiar uma mulher chamada Giselle Montfort, na
Rue du Bac. Era suspeita de cumplicidade com o maquis
francês Paul Zing. Uma espiã. Descobri o que fazia: reunia
oficiais alemães e mulheres francesas. Desprezei os oficiais
da Gestapo que ali compareciam, tão arrogantes e
poderosos. Quase me convenci de que Giselle praticava a
espionagem. Não gostei nada de seus modos que... perdoe-
me se a ofendo, não me pareceram corretos.
— Que fez, então? — indagou Brigitte, séria.
— Fui falar com Himmler.
— Delatou minha mãe? — Brigitte impacientou-se.
Ele moveu negativamente a cabeça:
— Não tinha certeza — disse. — E mesmo que a tivesse,
creio que só chegaria mesmo a fazer o que fiz: pedi a
Himmler que me transferisse imediatamente para meu
antigo campo de operações. E vi minha solicitação atendida.
O general não lhe exigiu explicações?
— Nenhuma — respondeu “Alexandria”. — Meu nome
já significava alguma coisa. Meus pedidos não eram
contestados. — Fez uma careta, suspirou: — Daí a algum
tempo, soube que havia sido fuzilada em Cherche Midi.
Lamentei o fato, de certo modo. Mas sua mãe parecia viver
buscando aquilo. Fez tudo por uma causa. Por sua pátria.
Arriscou-se, era natural.
Brigitte permaneceu em silencio, olhando para o terraço
que a noite invadira de todo. Séria e meditativa, quando se
voltou novamente para o companheiro do mesa conseguiu
sorrir:
— E como me encontrou, “Alexandria”?
— Bem, hoje em dia não me dedico à espionagem,
oficialmente — explicou. — Mas um homem como eu se
aborrece em viver apenas da sua riqueza. Dedico-me a
percorrer a Europa, descobrindo agentes de todo tipo,
presenciando suas lutas, vitórias, fracassos. Gasto meu
dinheiro, faço investimentos neste tipo de atividade. Mas,
não se esqueça de que tudo que lhe conto é absolutamente
confidencial, querida.
— É assombroso, na verdade! — exclamou ela. — E,
que acha dos espiões da atualidade?
— Trabalham bem, especialmente Brigitte Montfort —
disse “Alexandria”.
— Isso vai me deixar pretensiosa, mas agradeço- lhe o
elogio.
Houve uma pausa. Ambos estavam satisfeitos um com o
outro: Brigitte porque encontrara um homem extraordinário,
varonil. “Alexandria”, porque conseguia viver o momento
esperado: um quarto de hora de eternidade com Brigitte!
— Não quer ainda falar de negócios, “Alexandria”? —
perguntou ela, depois. — Que é que desejava vender?
— Não falei em vender, precisamente.. Usei a palavra
ceder, na carta. E se fossem úteis, os planos, para a
Alemanha, não os cederia aos americanos. Além disso, não
depende inteiramente de mim a cessão.
— De quem depende? — quis saber Brigitte.
— De um amigo meu; alemão oriental. Seu nome é
Gürtner.
— E os planos estão lá, na Alemanha Comunista?
— Não me entendeu, Brigitte — explicou ele. — Quis
dizer que Otto ficou na parte oriental. Mas jamais esqueço
os amigos. Otto me fez chegar uma carta, pedindo que o
ajudasse a sair de lá.
— Sabia que você...?
— Sim, ele sabia que servi na Abwehr e tudo o mais.
Confiou em mim tanto quanto confio nele, em nome de uma
velha amizade. E agora, Otto está aqui, neste hotel.
Brigitte estava surpresa:
— Não houve contratempo, em tudo isso? — perguntou.
— Até que não foi difícil — disse “Alexandria”,
pensativo. — Otto está na suíte 828. A minha fica em
frente... 817, exatamente, para o caso de interessar-lhe.
— E... quem está com os planos?
— Ele, naturalmente, pois é o dono — sorriu
“Alexandria”. — Foi Otto quem desenhou e inventou tudo.
É proprietário exclusivo.
— De que se trata?
— Engenho espacial — respondeu ele. — Otto trabalhou
na Alemanha, na Romênia, na Rússia. Ficou de lá para cá
durante alguns anos, sempre dedicado ao projeto.
Brigitte pareceu decepcionada. Não era o que esperava:
— Não me diga que pode chegar à Lua! — disse.
— Ao contrário — replicou “Alexandria”, sério.
— O engenho de Otto pode ficar descrevendo órbitas
por muito tempo. Mas, a importância dele reside numa
particularidade: é capaz de localizar qualquer satélite, segui-
lo e... derrubá-lo no momento que se quiser. Seu nome é
Kamikaze.
— Voilà! Parece mais interessante, agora! — exclamou
ela.
— Se Otto afirma, rode acreditá-lo — tornou
“Alexandria”.
Brigitte pensou um pouco. O sorriso desapareceu de seu
lindo rosto; uma leve ruga transtornou a testa sedosa:
— Se... se algum país quiser, com isto... — disse,
pensativa. — Sim, qualquer satélite tripulado estaria em
perigo!
Um tanto nervosa, Brigitte levou um cigarro aos lábios.
Depois de “Alexandria” tê-lo acendido, ela perscrutou-lhe
os olhos:
— Isso não é uma farsa, é?
— Não é, e você sabe — respondeu o barão, incisivo. —
O invento é segredo, saiba também disso. Até agora, só
Otto, você e eu tomamos conhecimento dele. Em mãos
inescrupulosas, será uma arma terrível. O possuidor abriria
caminho para dominar o espaço. Se, por exemplo, os
Estados Unidos começassem a perder homens e cápsulas,
no esforço para chegar à Lua e a Marte, quem poderia saber
que estariam sendo destruídos em órbita? Em poucos anos,
então, um dono do Kamikaze de Otto Gürtner, se no tivesse
escrúpulos, dominaria o cosmo. E creio que você já
entendeu, não?
Brigitte assentiu com a cabeça, pálida, quase não crendo
no que ouvia. E pensar que Grogan havia ironizado,
perguntando se Von Steinheil não lhes estaria querendo
vender os planos das obsoletas V-2?
Aquilo se mostrava particularmente sério. Quase
incrível, até que Otto Gürtner demonstrasse o contrário.
— Bem, “Alexandria”. . — começou Brigitte, depois de
um suspiro prolongado. — De quem foi a idéia de ceder os
planos à América?
— Minha — confessou ele. — Foi a condição que impus
para trazer Otto para o lado de cá da Cortina, e depois para
fora da Europa, onde o perigo começou a ser maior.
Naquele momento, Frank Minello apareceu no bar.
Estando voltada para a entrada, descortinando o balcão do
bar e o hall, Brigitte viu-o sentar-se e pedir bebida. Através
das folhas da palmeira anã que ficava atrás de “Alexandria”,
seus olhos azuis perceberam a calma que havia no sorriso
do atlético agente, no espelho um pouco inclinado do bar.
— E quanto pedem por esse engenho espacial
“Alexandria”? — indagou ao companheiro de mesa.
O alemão, que fazia balançar um resto de champanha de
sua taça, meditativo, ergueu os olhos. Tinha o cenho
subitamente franzido. Olhou demoradamente para Brigitte,
fazendo por fim o gesto de quem ia levantar-se:
— Lamento havê-la feito perder tempo, senhorita
Montfort — disse.
Brigitte tomou-lhe a mão sobre a mesa. Estava
surpreendida com a reação:
— Espere! — pediu. — Não me entendeu bem e...
Desculpe-me, por favor.
“Alexandria” tornou a sorrir o sorriso franco de antes.
Lentamente, reacomodou-se na cadeira, mas naquele
momento um rapaz do hotel se aproximava:
— Senhor Von Steinheil?
— Sim — respondeu ele — Que há?
— Há um cavalheiro que quer vê-lo no hall — informou
o rapaz.
— Quem é?
— Não me disse o nome, senhor.
“Alexandria” mostrou descontentamento, mas
respondeu:
— Bem, já irei — e despachou o rapaz.
— Tenha cuidado, “Alexandria” — avisou Brigitte. —
Foi assim que começou meu tropeço em La Guardia.
Von Steinheil sorriu amplamente:
— Tomarei cuidado, não se assuste. — disse. — Mas
acontece que, quando alguém me localiza, não costumo
descansar enquanto não o conheço. Sempre tive por norma
essa... conveniência, depois da guerra. Fique aqui: depois
que eu voltar, iremos falar com Otto. Concorda?
Ela fez que sim.
“Alexandria” deixou o bar. Imediatamente, Brigitte
retirou da bolsa uma pequeníssima caneta, pondo-se a
escrever algo em vermelho, no maço de cigarros: “Von
Steinheil é esse. Há outro, Otto Gürtner, no 828, do qual
você deve ocupar-se. Deixe o barão comigo”.
Através dos ramos da palmeira, que Von Steinheil fizera
balançarem-se ao levantar-se, trocou um olhar com Frank
Minello. Este, sem tirar dos lábios o seu wiskey on the
rocks, seguiu o movimento dela, que deixava junto da taça o
maço de cigarros.
Em seguida, Brigitte saiu do bar, atravessou o hall,
procurando Von Steinheil com os olhos. Não o vendo, foi à
porta.
Localizou-o então, à frente de um homem que
conservava uma das mãos metida no bolso do paletó azul-
claro. Tal homem demonstrava certa impaciência, e
terminou entrando num carro com Vou Steinheil.
Imediatamente, o automóvel arrancou, fazendo uma curva e
subindo a Avenida Collins.
Brigitte não perdeu um segundo: fez sinal a um táxi,
entrou e apontou para o carro em que seguia o barão:
— Cem dólares se não o perder de vista, chofer — disse.
— Cem dólares! — exclamou o homem. — Pode deixar,
lindeza. Não o perderemos. Nem que vá até o inferno!
E partiram rápidos, sob os luminosos coloridos,
enquanto Brigitte, com uma apalpadela, verificava se a
pequena pistola estava firme, no devido lugar. Satisfez-se:
sentiu a arma sob os dedos, entre os seios.
CAPÍTULO QUARTO
Há mais coisas entre um saguão de hotel de luxo e seus apartamentos
do que poderia cogitar nossa vã filosofia
Quando se torna importante conhecer o perfume da caça e seguir a sua
trilha
A ordem descumprida talvez provoque uma nova ordem de idéias.
LUTA
CAPÍTULO SËTIMO
Por que dois comparsas não falam ao telefone?
Uma bela mulher vaidosa que se supõe livre dos seus inimigos
é mais ingênua do que um detetive apaixonado
A visita inesperada
VENTANIA