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NO CENÁRIO ESCATOLÓGICO
RESUMO
ABSTRACT
This work deals with the "beatitudes", which compose the introduction of the "Sermon
on the Mount" in the Gospel of Matthew and the Gospel of Luke collection entitled
"Sermon on the Plain." In order to do so, we will examine the use of the term "blessed"
in its original text in order to verify the preliminary approach to discourse. The proposal,
therefore, consists in answering to the various questions and inquiries, now
questioned, which are: "Would the contemporary 'beatitudes' be at the same time part
of an eschatological scenario?" "What extent can we verify their performance in
modern believers and what aspects would they understand the future promise?"
"Would the readers of the Gospels have any evidence or model with such
characteristics?" In addition, the objective is to identify elements that prove the duality
of the" beatitudes" and to analyze their modus operandi: in present security and in
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Pastor batista da Convenção Batista Brasileira (CBB/MG), filiado à Ordem dos Pastores Batistas do Brasil
(OPBB). É pós-graduando em Teologia do Novo Testamento Aplicada pela Faculdades Batista do Paraná
(FABAPAR), bacharel em Ciências Econômicas pela Faculdade de Ciências Econômicas do Triângulo Mineiro
(FCETM) e bacharelando em Teologia pela Faculdade Batista de Minas Gerais (FBMG).
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future hope. Here we record the methodology adopted based on the bibliographical
research, with a theoretical-qualitative but pragmatic approach. Renowned authors
deals with the theme in question like: Ladd, Brown, Ryle, Stott, Stern, Bailey, among
others. It follows, therefore, that the "beatitudes" comprise a rich introduction, which
fits in with the Sermon of Jesus, focusing on the safety of believers as well as future
hope. Indeed, Jesus is the model of "blessed"!
1 INTRODUÇÃO
O mundo dos dias terrenos de Cristo, era marcado pelo domínio do poderoso
Império Romano, cujos imperadores, impunham aos arraiais judaicos, uma condição
de vida penuriosa. A desesperança e apatia, eram as características predominantes
nos sofridos judeus, em meados do século I. Não seria exagero dizer que a única
expectativa de libertação, era a do Messias restaurar o reino a Israel, o que foi
admitido pelos próprios discípulos, em Atos 1.6. Em resposta, Jesus reitera não caber
a eles saber os tempos e épocas reservados exclusivamente ao Pai (Atos 1.7).
Noutras palavras, o Reino tem aspectos terrenos, no entanto, possui outro conjunto
de valores e um viés espiritual inegável.
O público que se punha a ouvir o ensino do Senhor era, portanto, desvalido de
recursos materiais, sem uma estrutura de poder imperial favorável e sem qualquer
expectativa de melhora, por parte daquele governo. É neste cenário controverso que
Jesus apresenta um Reino, no qual os crentes gozarão segurança advinda do próprio
Deus. Desta feita, Ladd bem afirma não ser fácil decidir se “o Reino é futuro ou
presente. As bem-aventuranças têm um aspecto escatológico” (2003, P.103). A
parênese de Cristo, denominada “Sermão do Monte” ou “Sermão da Planície”,
retratados pelos evangelistas Mateus e Lucas, é de suma importância para
compreender a ética do Reino de Deus. O Senhor preconiza alguns traços que devem
estar presentes naqueles que hão de herdar o Reino escatológico, que deverão se
fazer notados no agora.
A extensão da parênese, especialmente no evangelho de Mateus, levar-nos-á
a enfocarmos apenas num dos tópicos essenciais e, que inaugura a alocução: as
“bem-aventuranças”. O conceito de “bem-aventurança”, do qual Jesus se utiliza, já
fora antes empregado na literatura grega, desde o poeta jônico Homero, no século IX
a.C. e possui um realce importante nas perícopes que serão analisadas, em
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Shedd (2011, P.13) traduz μακάριος como feliz, e, alega ainda, “não por causa
das circunstâncias externas, mas por causa da fé mediante a qual o crente recebe
antecipadamente os benefícios que Deus lhe prometeu (Hb 11.1)”. Coaduna com este
pensamento Stott (1989, P.22) quando alude que o vocábulo não se constitui de
deveres éticos, mas sim uma “fórmula básica para a saúde mental”, na qual “todos os
cristãos podem testemunhar da experiência de que há uma relação íntima entre a
santidade e a felicidade”. Neste quesito, Ryle (2002, P.28) assevera que o cristianismo
é uma religião prática, cujo padrão de santidade não pode ser inferior ao fomentado
no “Sermão da Montanha”. A afirmação de Ryle, portanto, aponta para o sentido ético
do cristão, em oposição à felicidade proporcionada pela santidade, defendida por
Shedd e Stott.
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Conforme BROWN (1989) descreve: “‘No seu conteúdo, as bem-aventuranças, que são comuns tanto na poesia
como na prosa, no decurso dos séculos, refletem as tristezas e aflições, as aspirações e os ideais dos gregos’ (F.
Hauck, TDNT IV 363). Os pais são parabenizados por causa dos seus filhos (Aristóf., Vespas, 1512), os ricos por
causa das suas riquezas (Baquíl., 5, 50), os são pela sua saúde (Bacchyl., 5, 50), os sábios por causa do seu
conhecimento (Platão, Leis, 2, 660e), os piedosos por causa do seu bem-estar interior (Eur., Frag. 256, ed. Nauck
434), iniciados por causa da sua experiência com Deus (Hino homérico a Deméter 480) e (nas inscrições
funerárias) os mortos por terem escapado à vaidade das coisas (Ésqu. Persas 712).”
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Os quatro últimos pares de Lucas (ai dos ricos, dos satisfeitos, dos que riem e
dos respeitados) contrastam com os quatro primeiros pares (bem-aventurados os
pobres, os que têm fome, os que choram e os que forem odiados). Lucas se vale do
estilo conhecido como quiasmo. Michaelis (2018) define quiasmo como “figura de
estilo que consiste na repetição de duas frases do texto, invertendo-se sua ordem, de
maneira que se forme uma antítese ou um paralelo”. No contexto lucano a “bem-
aventurança” dos pobres é equilibrada com a “mal-aventurança” dos ricos. “O clímax
no meio é a única referência cristológica de toda a passagem” (BAILEY, 2016, P.67).
Percebe-se a importância da ênfase cristológica conforme Bailey (2016, P.68):
Strong (2018) atesta que a expressão βασιλεία τῶν οὐρανῶν quer dizer: “um
reino sempre exige um rei – como o reino de Deus faz com o Rei Jesus! βασιλεία
especialmente refere ao governo de Cristo no coração dos crentes” (tradução própria).
Corrobora com este argumento, Dunnett (2015), ao afirmar da ocorrência da sentença
“reino dos céus”, exclusiva do Evangelho de Mateus (DUNNETT, 2015).
Isto posto, passemos à segunda “bem-aventurança” em Mateus 5.4 (NVI):
“Bem-aventurados os que choram, pois serão consolados”. Ryle (2002, P.26) ratifica
que Jesus estava se referindo àqueles “que se entristecem por causa do pecado, e
que também se lamentam diariamente por causa das suas próprias falhas”. Stott
(1989, P.30) reitera que “nós deveríamos chorar mais pela maldade do mundo, como
os homens piedosos dos tempos bíblicos”. Coaduna com esses conceitos, Bailey
(2016, P.73):
Esta bem-aventurança também apela para que os fiéis chorem por causa do
mal na própria vida deles, quando perceberem sua incapacidade de derrotá-
lo sem ajuda. A incapacidade de amar a Deus e ao nosso próximo deve
produzir tristeza em nós. Os bem-aventurados são aqueles que vivenciam
essa tristeza. [...] E o que acontece com as pessoas que choram por seu
próprio sofrimento e, ao mesmo tempo são insensíveis à dor dos outros? Não
há qualquer indício de que tais pessoas estejam entre os bem-aventurados.
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Até mesmo os filhos de Israel tiveram de lutar por sua herança, embora o
Senhor seu Deus lhes desse a terra prometida. Mas a condição pela qual
tomamos posse de nossa herança espiritual em Cristo não é a força, mas a
mansidão, pois, conforme já vimos, tudo é nosso se somos de Cristo.
algo que alguém tem em si mesmo; ao contrário, é algo que a pessoa tem no veredicto
do ‘fórum’ perante o qual ela presta contas”. Justiça, portanto, é imputada e não
meritória. Se obtém através de Cristo, como destaca Paulo: “Deus tornou pecado por
nós aquele que não tinha pecado, para que nele nos tornássemos justiça de Deus” (2
Coríntios 5.21 NVI). Vejamos como diz Bailey (2016, P.83):
A justiça de Deus são seus atos salvíficos na história. Essa salvação concede
a seu povo o dom de aceitação diante dele. Por sua vez, esse povo busca
incansavelmente o estilo de vida adequado ao relacionamento que lhe é
concedido como dom. Molda sua resposta segundo o modo que Deus lidou
com ele com seus poderosos atos em seu favor. Essa resposta inclui justiça
e compaixão para com os fracos.
de Deus jamais lhes faltará” (BAILEY, 2016). Assim, “os misericordiosos” “se mostram
compassivos com seus semelhantes” (RYLE, 2002). Daí a promessa para os que
agirem com misericórdia: o perdão de seus pecados por Deus.
A sexta “bem-aventurança” está escrita em Mateus 5.8 (NVI): “Bem-
aventurados os puros de coração, pois verão a Deus”. Para Bailey (2016, P.86):
5.10). “Mansidão” é qualidade dos “mansos”, bem como “domínio próprio” (Mateus
5.5). Os “pobres em espírito” e os que “choram”, só o fazem por obra do Espírito Santo,
convencendo o homem do pecado, da justiça e do juízo (João 16.8). Shedd (2011,
P.125) corrobora dizendo que “seria fácil concluir que esse fruto crescerá de modo
natural, independentemente de qualquer iniciativa nossa”.
Há que se considerar, entretanto, haver um aspecto escatológico nas “bem-
aventuranças”. Mateus elenca as seguintes promessas futuras: “serão consolados”
(Mateus 5.4), “receberão a terra por herança” (Mateus 5.5), “serão satisfeitos” (Mateus
5.6), “obterão misericórdia” (Mateus 5.7), “verão a Deus” (Mateus 5.8), “serão
chamados filhos de Deus” (Mateus 5.9) e “grande é a sua recompensa nos céus”
(Mateus 5.12). Conclui-se, por conseguinte, que as “bem-aventuranças” são um
estado realizado, concreto para o presente muito embora, se manifestará de forma
peremptória no período escatológico, na consumação dos tempos.
Sabemos muito bem que há uma discrepância, pelo menos verbal, entre as
bem-aventuranças do Evangelho de Mateus e as de Lucas. Assim, Lucas diz:
‘Bem-aventurados vós os pobres’, enquanto que Mateus declara: ‘Bem-
aventurados os humildes (pobres) de espírito’. Em Lucas temos: ‘Bem-
aventurados vós os que agora tendes fome’ e, em Mateus: ‘Bem-aventurados
os que têm fome e sede de justiça’. Por causa disto, alguns argumentam que
a versão de Lucas é a verdadeira; que Jesus estava julgando os pobres e os
famintos do ponto de vista social ou sociológico; que ele estava prometendo
alimento aos subnutridos e ao proletariado no reino de Deus; e que Mateus
espiritualizou o que constituía originalmente uma promessa material. Mas
esta interpretação é impossível, a não ser que estejamos prontos a crer que
Jesus se contradisse ou que os evangelhos foram demasiado ineptos para
fazê-lo parecer assim.[...] Com isso não sugerimos que Jesus ficasse
indiferente à pobreza e fome físicas. Pelo contrário, ele sentia compaixão
pelos necessitados e alimentava os famintos, e disse aos seus discípulos que
fizessem o mesmo. Mas a bênção do seu reino não era em primeiro lugar
uma vantagem econômica.
de Lucas 6.20-26 “é possível que elas façam um paralelo com as bênçãos e maldições
da aliança anunciadas nos montes em Deuteronômio 27-28” (KEENER, 2017, P.227).
Sobre as bênçãos e maldições específicas dos escritos lucanos em apreço é
verossímil traçar um paralelo com Isaías 65.13-16 (KEENER, 2017).
Tratar-se-á da ênfase dada por Lucas ao tema perseguição. A tabela mostra o
quiasmo apresentado no “Sermão da Planície”:
Jesus” (Keener, 2017, P.227). De igual modo, “a fome afligia as famílias pobres nos
tempos de carestia (a situação da Palestina rural era melhor que a do Egito, mas pior
que a de Corinto ou da Itália)” (Keener, 2017, P.227). Depreende-se daí a
perseverança, da qual os crentes precisariam dispor nos dias de Jesus, para
sobreviver às chicanas do Império Romano.
O contraponto seria feito em relação aos destinatários dos “ais”. Segundo
Keener (2017, P.228) “a maioria dos ouvintes de Jesus era pobre, mas os leitores
greco-romanos urbanos de Lucas provavelmente vivam em melhores condições [...]
Lucas não poupa o próprio público”. O riso estava associado ao escárnio (KEENER,
2017). Com relação aos “respeitados” Keener (2017, P.228) afirma:
Desta feita, Jesus é o elo de ligação entre a salvação (em seu estado final e
definitivo) e o Reino de Deus que se manifestará em sua vinda (παρουσία). Vivemos
no interregno “entre a inauguração do domínio (reino) de Deus, na vinda de Jesus
Cristo, e sua conclusão, no final da história” (Bailey, 2016, P.71). Não tendo a história
chegado ao seu desfecho, é oportuno valer-se de um modelo de “bem-aventurado”, a
saber, Jesus. O clímax se dá na nona “bem-aventurança” trazida por Mateus e a
quarta de Lucas, tornando-se indissociável à pessoa de Jesus (BAILEY, 2016).
Duas passagens caracterizam Jesus como modelo de “bem-aventurado”, quais
sejam: Filipenses 2.5-11 e Isaías 53. Enquanto o Imperador Nero ambicionava tornar-
se divino, Jesus renuncia voluntariamente à sua alta posição (KEENER, 2017). “O
‘servo’ de Isaías 53 também foi ‘derramado’ ou ‘esvaziou-se’, ainda que não na
encarnação, mas na morte (Is 53.12; cf. Fp 2.8).” (Keener, 2017, P.669). O ápice da
humilhação de Cristo é a sua morte na cruz. Keener (2017, P.669) afirma:
Para isso vocês foram chamados, pois também Cristo sofreu no lugar de
vocês, deixando exemplo, para que sigam os seus passos. Ele não cometeu
pecado algum, e nenhum engano foi encontrado em sua boca. Quando
insultado, não revidava; quando sofria, não fazia ameaças, mas entregava-
se àquele que julga com justiça. Ele mesmo levou em seu corpo os nossos
pecados sobre o madeiro, a fim de que morrêssemos para os pecados e
vivêssemos para a justiça; por suas feridas vocês foram curados. (1 Pedro
2:21-24 NVI).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
pressupõem agradar a Deus. Daí se faz mister ressaltar que, por esforços humanos
(ainda que louváveis sejam), o homem não consegue atingir o patamar estabelecido
por Deus para os seus filhos. Nestes tais, resta a expectação de juízo, caso não se
observe um arrependimento genuíno. Certamente, os fariseus e sua justiça própria,
nos servem de paradigmas deste outro padrão. Rituais ascéticos de purificação,
observância de práticas estritamente religiosas, orações profusas e repetitivas, a
despeito de impressionar os leigos, não tem qualquer efeito em termos de salvação.
Há que se ressaltar, entretanto, não se tratar de uma utopia, algo inatingível,
mas possível por obra exclusiva do Espírito Santo. Assim sendo, a divergência lucana
sublinha “bem-aventuranças” dos salvos (apesar de pobres, famintos, de chorarem e
serem odiados), como mais virtuosos em relação aos ricos, que se fartam, que riem e
são elogiados por outrem, mas “ai” deles. Mateus, complementarmente, demonstra as
promessas de agora e do futuro. Não podemos afirmar qual dos dois traz a versão
original de Jesus, no entanto, a comunicação se dá satisfatoriamente nos ouvintes
judeus e gentios, de ambos os evangelhos. A mensagem é clara e direta ao coração
dos homens!
Desta feita, Jesus constitui-se o modelo de “bem-aventurado”. Ele é o varão
perfeito, no qual todo homem de Deus deve espelhar-se. Devemos considerar as
agruras e sofrimentos presentes como transitórios, incapazes de ofuscar a glória que
há de se manifestar naqueles, cujos corações estão em Deus. Imprescindível dizer,
portanto, que o efeito pragmático das “bem-aventuranças” consistirá na segurança
presente e a esperança futura de salvação, enquanto o Senhor trabalha na vida dos
salvos, operando nos tais, a santificação.
Conforme observado no decurso deste artigo, as “bem-aventuranças” são o
aspecto central e introdutório do “Sermão do Monte”, no evangelho de Mateus.
Constitui-se num discurso sobre a ética do Reino de Deus. A importância deste
assunto poderá servir àqueles que, posteriormente, quiserem pesquisar sobre tão
relevante tema. A dialética de Lucas, entre “bem-aventuranças” e “ais”, componentes
do mesmo discurso de Jesus, também é um tema que pode estimular novos estudos,
bem como as constatações atemporais, enfatizadas por Mateus. As probabilidades
são muitas, e novas pesquisas poderão lançar mais luz sobre este tópico, viabilizando
novas perspectivas. Quaisquer investigações que se empreendam sobre o assunto,
são notícias auspiciosas aos que querem se servir do conhecimento infindável da
Palavra de Deus e dos ensinos do Senhor Jesus...
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REFERÊNCIAS
BAILEY, Kenneth E. Jesus pela ótica do Oriente Médio: Estudos culturais sobre os
evangelhos. 1ª Edição. São Paulo: Vida Nova, 2016. 448 p.
LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. 1ª Edição. São Paulo: Hagnos,
2003. 986 p.
SHEDD, Russel P. A felicidade segundo Jesus. 1ª Edição. São Paulo: Vida Nova,
2011. 128 p.
STOTT, John R.W. A mensagem do Sermão do Monte. 2ª Edição. São Paulo: ABU,
1989. 242 p.