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Jan Waclaw Machajski

1866-1926

Nasceu no ano de 1866 em Busk, uma pequena cidade de cerca


de dois mil habitantes, situada perto de Kielce na “parte russa da
Polônia”. Filho de um escriturário indigente, que morreu quando
Machajski era criança, deixando uma grande e destituída família.
Iniciou sua carreira revolucionária em 1888 nos círculos estudantis
da Universidade de Varsóvia, onde ele havia se inscrito em cursos
de ciências naturais e medicina. Dois ou três anos depois, enquanto
estava frequentando a Universidade de Zurique, ele abandonou a
sua primeira filosofia política (uma mistura de socialismo e
nacionalismo polonês) e aderiu ao internacionalismo de Marx e
Engels. Machajski foi preso em maio de 1892, devido à posse de
panfletos revolucionários que levaria da Suíça para a cidade
industrial de Lodz, a qual estava à beira de uma greve geral. Em
1903, após uma dúzia de anos na prisão e no exílio na Sibéria, ele
escapou para a Europa ocidental, onde permaneceu até estourar a
revolução de 1905.
Durante o longo tempo de banimento em que permaneceu no
assentamento de Vilyuisk na Sibéria (província de Yakutsk),
Machajski fez um estudo intensivo da literatura socialista e chegou
à conclusão de que os Social-Democratas não representam os
interesses dos trabalhadores manuais, mas de uma nova classe de
“trabalhadores mentais”, engendrada pelo surgimento do
industrialismo. O marxismo, ele afirmou em sua obra principal —
“Umstvennyy rabochiy” [Umstvennyy rabochiy traduz-se ao pé da
letra como “trabalho mental” mas a coletânea Marxismo
heterodoxo, em sua nota biográfica sobre Machajski, traduz o título
como “Trabalhador intelectual”.] —, refletia os interesses desta
nova classe, que esperava subir ao poder sobre os ombros dos
trabalhadores manuais. Em uma sociedade dita “socialista”,
declarou, “os capitalistas do setor privado serão meramente
substituídos por uma nova aristocracia de administradores,
especialistas técnicos e políticos; os trabalhadores manuais serão
escravizados por uma nova minoria dominante cujo capital, por
assim dizer, será a educação”.
No desenvolvimento de suas sua teorias antimarxistas,
Machajski foi fortemente influenciado por Mikhail Bakunin e pelos
economistas da década de 1890. Uma geração antes de sua obra
“Umstvennyy rabochiy”, Bakunin havia denunciado Marx e seus
seguidores, identificando-os como intelectuais limitados que,
vivendo em um mundo irreal de livros mofados e jornais
grosseiros, não entendiam nada de sofrimento humano.
Os argumentos antipolíticos e anti-intelectualistas de Bakunin
e dos “economistas” causaram uma impressão permanente em
Machajski. Enquanto estava na Sibéria, ele chegou à conclusão que
a intelligentsia radical não procurava alcançar uma sociedade sem
classes, mas meramente se estabelecer no estrato privilegiado.
Não é à toa que o marxismo, ao invés de clamar por uma revolta
imediata contra o sistema capitalista, adia o seu colapso para o
futuro, quando as condições econômicas estiverem
suficientemente maduras. Com um desenvolvimento maior do
capitalismo e a sua tecnologia cada vez mais avançada, os
“trabalhadores mentais” aumentarão e se fortalecerão o suficiente
para estabelecer o seu próprio domínio. Mesmo que a nova
tecnocracia venha a abolir a propriedade privada dos meios de
produção, Machajski afirmou, a ”intelligentsia profissional“ irá
manter a sua posição de controle se apoderando da administração
da produção e pela formação de um monopólio sobre o
conhecimento especial necessário para operar uma economia
industrial complexa. Os gerentes, engenheiros e titulares de cargos
políticos irão usar a ideologia marxista como um novo ópio religioso
para obscurecer as mentes das massas trabalhadoras,
perpetuando-as na ignorância e na servidão.
Machajski suspeitava que seus competidores da esquerda
procuravam estabelecer uma ordem social na qual os intelectuais
seriam a classe dominante. Ele acusou até mesmo os anarquistas
do grupo Khleb i Volya de Kropotkin de advogarem uma concepção
gradualista da revolução muito similar à dos Social-Democratas,
pois estes esperavam que a revolução vindoura na Rússia não
fosse além da Revolução francesa de 1798 ou 1848. Na comuna
anarquista idealizada por Kropotkin, Machajski argumentou,
“apenas os possuidores de civilização e conhecimento serão livres.
A revolução social dos anarquistas, ele insistiu, não seria realmente
um levante dos trabalhadores, mas seria de fato uma revolução
voltada para os “interesses dos intelectuais”. Os anarquistas
seriam “os mesmos socialistas que todos os outros, apenas mais
dedicados”.
O que deveria então ser feito para evitar esta nova forma de
escravidão? Segundo Machajski, enquanto a desigualdade de
renda persistir e os meios de produção continuarem sendo a
propriedade privada de uma minoria capitalista, e enquanto o
conhecimento científico e técnico continuar sendo “propriedade” de
uma minoria intelectualizada, as multidões vão continuar
trabalhando para poucos privilegiados. A solução de Machajski
pressupunha um papel fundamental para uma organização secreta
de revolucionários chamada Raboch Zagovor (A Conspiração dos
Trabalhadores), similar à “sociedade secreta” de conspiradores
revolucionários preconizada por Bakunin. Presumidamente, o
próprio Machajski seria o líder desta. A missão da “Conspiração dos
trabalhadores” seria estimular os trabalhadores a realizarem ações
diretas, greves, manifestações e atividades do tipo contra os
capitalistas com o objetivo imediato de obter melhorias
econômicas e trabalho para os desempregados. A “ação direta” dos
trabalhadores deveria culminar em uma greve geral que, por sua
vez, levaria à ebulição de um levante internacional, inaugurando
uma nova era marcada pela igualdade de renda e oportunidades
educacionais. No fim, as perniciosas distinções entre trabalho
manual e mental seriam obliteradas, junto com todas as divisões
de classe.
Ecos similares dos escritos de Machajski se encontram nos
numerosos panfletos e artigos anarquistas, maximalistas e outras
seitas de extrema-esquerda. Porém com a severa repressão de
Stolypin nos anos que se seguiram à Revolução de 1905, esses
ecos rapidamente esvaeceram e os homens que os produziram
desapareceram nas prisões e no exílio. O próprio Machajski, que
havia retornado à Rússia em 1905, foi compelido a ir embora
novamente dois anos depois.
Quando Machajski retornou à Rússia em 1917, ele não se
esforçou para canalizar estes sentimentos em um movimento
coerente. Seus dias de auge haviam passado com a Revolução de
1905, e agora ele estava prematuramente velho e cansado. Após
a Revolução de Outubro, ele obteve um trabalho não-político com
o governo Soviético, servindo como editor técnico da publicação
Narodnoye Khozyaistvo (depois renomeada para
Sotsialisticheskoye Khozyaistvo), o órgão do Supremo Conselho
Econômico. Ele continuou, contudo, extremamente crítico do
marxismo e seus adeptos. No verão de 1918, ele publicou uma
única edição de um jornal chamado Rabochaya revolyutsiya, no
qual ele criticou os bolcheviques por não terem ordenado a total
expropriação da burguesia e por não terem melhorado a situação
econômica da classe trabalhadora. Após a Revolução de Fevereiro,
escreveu Machajski, os trabalhadores receberam um aumento
salarial e uma jornada de 8 horas, mas após Outubro, suas
condições materiais não foram melhoradas “nem um pouco”. A
insurreição bolchevique, ele afirmou, foi nada além que “uma
contrarrevolução dos intelectuais”. O poder político foi tomado
pelos discípulos de Marx: “a pequena burguesia e a intelligentsia…
os possuidores do conhecimento necessário para a organização e
administração de toda a vida no país”. E os marxistas, de acordo
com o gospel religioso do determinismo econômico de seu profeta,
escolheram preservar a ordem burguesa, limitando-se apenas à
“preparar” os trabalhadores manuais para o paraíso futuro.
Machajski sugeria à classe trabalhadora pressionar o governo
Soviético, a expropriar as suas fábricas, equalizar os rendimentos
e oportunidade educacional, e providenciar trabalho para os
desempregados. Ainda que desapontado com o novo regime,
Machajski o aceitou de má vontade, pelo menos por enquanto.
Qualquer tentativa de derrubar o governo, ele disse, beneficiaria
apenas os brancos (tsaristas), que eram um mal maior do que os
bolcheviques.
Machajski permaneceu trabalhando em seu posto editorial até
a sua morte por ataque cardíaco em fevereiro de 1926, com a idade
de 60 anos.

Fonte: Passa Palavra - https://passapalavra.info/2017/04/111586/

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