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ICTR 2004 – CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA EM RESÍDUOS E


DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Costão do Santinho – Florianópolis – Santa Catarina

A LEI DE PROTEÇÃO AOS MANANCIAIS: UMA ANÁLISE CRÍTICA DA LEGISLAÇÃO


DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS NA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO

Bruna, Gilda Collet


Spínola, Ana Luiza Silva
Lasalvia, Liliana
Roig, Carla de Almeida

PRÓXIMA

Realização:

ICTR – Instituto de Ciência e Tecnologia em Resíduos e Desenvolvimento Sustentável


NISAM - USP – Núcleo de Informações em Saúde Ambiental da USP
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A LEI DE PROTEÇÃO AOS MANANCIAIS:

UMA ANÁLISE CRÍTICA DA LEGISLAÇÃO DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS


NA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO

BRUNA, Gilda Collet 1 ; SPÍNOLA, Ana Luiza Silva 2 ; LASALVIA, Liliana 3 ;


4
ROIG, Carla de Almeida

RESUMO
Este artigo apresenta as conseqüências da aprovação de restritivas leis de controle
de uso e ocupação do solo da Região Metropolitana de São Paulo na década de
1970. Ele descreve seus efeitos perversos que ainda não puderam ser corrigidos
pela nova legislação de 1997 - Lei nº 9.866 - com a nova regulação dos recursos
d'água, estendendo a Lei de Proteção aos Mananciais para todo o estado. Esta
regulação, apesar de ser mais flexível, trazendo diretrizes específicas para cada
unidade de proteção, ainda não foi implementada. Esta e outras legislações
ambientais vigentes não têm levado a alterações significativas deste panorama de
poluição das áreas de mananciais metropolitanos. Atualmente os danos ambientais
continuam a ser um perigo para a população metropolitana como ameaça à
qualidade da água. Esta situação foi descrita através de uma discussão a respeito
dos impactos urbanos no meio ambiente.

PALAVRAS-CHAVE
Água. Gestão. Mananciais. Poluição.

1
Arquiteta , Professora Livre Docente FAUUSP - e mail: coltbruna@uol.com.br. -
Rua João Pimenta, 72 – Apto 91 – CEP 04736 040, Santo Amaro - São Paulo –SP - Tel: +55 11
55229098.
2
Advogada, Mestranda, Faculdade de Saúde Pública da USP - e mail: anaspi@cetesb.sp.gov.br. -
Rua Marechal Hastimphilo de Moura, 338 – bloco D – Apto 17A – CEP 05641 900, Morumbi - São
Paulo – SP - Tel: +55 11 3742 9943.
3
Arquiteta, Mestranda, FAUUSP - email: lilianalasalvia@ig.com.br.
Rua Frei Caneca, 617 - Apto 65, CEP 01307 001, Cerqueira Cesar - São Paulo – SP – Tel:+55 11
9333 9238.
4
Arquiteta, Pós-graduanda, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP - e mail:
caroig_urb@hotmail.com.
Rua Caiowa, 772 - Apto 112, CEP 05018 001, Perdizes - São Paulo – SP - Tel:+55 11 3872 0477.

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INTRODUÇÃO
Desde a década de 1970, os mananciais metropolitanos foram considerados
prioritários para o abastecimento, razão pela qual o Plano Metropolitano de
Desenvolvimento Integrado – PMDI limitou a expansão metropolitana na direção
norte-sul, priorizando o desenvolvimento no vetor leste-oeste. A aprovação da Lei de
Proteção aos Mananciais e da Lei de Zoneamento Industrial, datadas de 1975 e
1978, respectivamente, apesar de visarem a proteção dos corpos d’água,
restringindo nestas áreas a ocorrência de grandes densidades populacionais e a
implantação de indústrias poluidoras, acabaram propiciando sua invasão pela
população de baixa renda, com conseqüente aumento de poluição por esgotos e
resíduos sólidos, comprometendo, desta forma, a qualidade dos recursos hídricos.
Este é o panorama resultante na Região Metropolitana de São Paulo.
O objetivo deste trabalho é analisar a legislação de proteção aos mananciais da
Região Metropolitana de São Paulo, identificando suas possibilidades e limitações
no controle do uso e ocupação do solo e correspondente geração de poluição, tanto
em relação à norma de 1975, que define todo corpo d´água como de interesse para
o abastecimento, quanto em referência à Lei nº 9866, de 1997, que estende esta
proteção para todo o Estado de São Paulo. Nesta análise incluem-se outras
legislações ambientais vigentes que permitem que os poderes públicos estabeleçam
maior controle sobre a poluição, como a lei federal nº 6.938 de 1981, a lei federal nº
9.433 de 1997 que institui a Política Nacional de Recursos hídricos e cria o Sistema
Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos e a lei federal nº 9.984 de 2000
que cria a Agência Nacional de Águas – ANA, vinculada ao Ministério do Meio
Ambiente.

MATERIAIS E MÉTODOS
Utilizou-se metodologia descritiva, com base em material bibliográfico e documental,
em que os problemas da área metropolitana são apresentados, bem como as leis de
proteção aos mananciais e outras legislações ambientais comentadas, de forma a
possibilitar amplo conhecimento das questões vivenciadas na área. Procura-se
assim delinear os aspectos de sustentabilidade que são alvos dessas legislações.

RESULTADOS
Face a estas considerações é que se procura enfatizar alguns aspectos da evolução
da legislação ambiental brasileira.
A evolução da legislação ambiental
Alguns recursos ambientais foram objetos de normas específicas e individualizadas,
como forma tanto de proteção como de fomento à utilização, tendo-se em vista sua
futura exploração. O Código de Águas (Decreto n° 24.643/1934) e o Código Florestal
(Decreto n° 23.793/ 1934) pode-se dizer representam o marco inicial da legislação
ambiental no Brasil. O Código de Pesca foi promulgado pelo Decreto - Lei n°
794/1938. O ano de 1940 trouxe o Código de Minas, através do Decreto Lei n°
1985.

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Na década de 1970, as ações voltaram-se basicamente para o controle da poluição


decorrente do processo de desenvolvimento industrial, destacando-se no nível
federal o Decreto-Lei n º 1.413, de 14 de agosto de 1975, que dispôs sobre o
controle da poluição do meio ambiente provocada pelas indústrias e estabeleceu a
obrigação destas indústrias instaladas no território nacional promoverem as medidas
necessárias para prevenir ou corrigir os inconvenientes ou prejuízos da poluição e
da contaminação do meio ambiente.
A partir de 1975, alguns Estados mais atingidos pelos efeitos da industrialização
criaram suas próprias legislações, prevendo restrições e penalidades para os
infratores, como em São Paulo, por exemplo, com o zoneamento industrial da
metrópole paulista e a Lei de Proteção aos Mananciais – Lei nº 817/1978, objeto do
presente estudo.
Em 1979 a Lei Federal n° 6.766 regulamentou o parcelamento do solo urbano. A
definição das categorias do uso do solo, bem como critérios para a instalação de
indústrias poluidoras, deu-se no início da década de 80, por meio da Lei nº 6.803, de
02 de julho de 1980, deflagrando, nas regiões metropolitanas, processos de
ordenamento e institucionalização de áreas industriais.
A partir da década de 1980, as questões ambientais passaram a ser vistas e
tratadas não mais de forma setorizada como nas décadas anteriores, mas de um
modo holístico, integral, considerando a necessidade da proteção do meio ambiente
como um todo.
Nesse sentido, a Política Nacional do Meio Ambiente, aprovada pela Lei Federal n º
6.938/1981, representou um divisor de águas, criando o Sistema Nacional de Meio
Ambiente – SISNAMA, o Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA e
definindo os instrumentos da Política Nacional.
No ano de 1988 foi promulgada a Constituição Federal vigente que, pela primeira
vez, traz uma referência explicita à proteção ambiental, dedicando à questão um
capítulo integral. A partir de então o meio ambiente ecologicamente equilibrado
passou a ser direito de todos os brasileiros, ao mesmo tempo em que o dever de
preservá-lo coube tanto ao poder público como à coletividade.
Nessa esteira legislativa, a principal norma a ser destacada e detalhada é a Política
Nacional de Recursos Hídricos (Lei n° 9.433/1997), que instituiu e criou o Sistema
Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, constituindo um marco de
importância fundamental para a gestão ambiental, incentivando a participação
pública e a gestão descentralizada. E, a lei federal nº 9.984 de 2000 cria a Agência
Nacional de Águas vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com o objetivo de
avaliar o cumprimento da legislação federal relativa aos recursos hídricos. Desse
modo, o direito de uso dos recursos hídricos em águas de domínio da União fica
sujeito a autorização, em consonância com os Comitês de Bacias Hidrográficas,
podendo ainda haver a cobrança pelo uso desses recursos hídricos federais.
Procura-se assim otimizar o uso dos recursos hídricos em associação com as
agências de desenvolvimento regional e órgãos ambientais, (MILARÉ, 2004, ref.
p.173).
Como se observa, segundo esta Política Nacional acima descrita por suas
legislações básicas, a aplicação do quadro normativo hídrico deve ter como unidade
territorial a “bacia hidrográfica”, que corresponde à área total de drenagem que
alimenta determinada rede hidrográfica. Esta política indica, ainda, que a gestão dos

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recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder


Público, dos usuários e das comunidades. Assim sendo a administração dos
recursos hídricos deve ser feita em três instâncias: Conselho Nacional dos
Recursos Hídricos, Comitês de Bacia Hidrográfica e Agências de Água em cada
Bacia.
É importante mencionar que alguns Estados brasileiros anteciparam-se à esta Lei
Federal no 9.433/97, elaborando suas próprias leis sobre recursos hídricos, como por
exemplo São Paulo (1991), Ceará (1992), Minas Gerais (1994), Rio Grande do Sul
(1994), Bahia (1995) e Rio Grande do Norte (1996).
A título exemplificativo, a lei paulista de recursos hídricos, aprovada no final de 1991
(Lei nº 7.663) estabelece como princípios: a adoção da bacia hidrográfica como
referência de planejamento e gerenciamento; a gestão descentralizada, participativa
e integrada, sem dissociação dos aspectos de qualidade e da quantidade da água e
o respeito ao ciclo hidrológico; o reconhecimento da água como um bem público,
cuja utilização deve ser financeiramente retribuída, a fim de assegurar padrões de
qualidade satisfatórios para os usuários atuais e as gerações futuras.

A Bacia Hidrográfica do Alto Tietê


Neste contexto das bacias hidrográficas, frente à legislação ambiental atual, passa-
se à análise da maior aglomeração urbana do Estado e do país, a região
metropolitana de São Paulo, situada na bacia do Alto Tietê. Esta se estende por
cerca de 5.900 km2, dos quais 37% correspondem à área urbanizada deste
aglomerado urbano. O abastecimento de sua população é proporcionado por três
grandes sistemas: Cantareira; Guarapiranga-Billings; e Alto Tietê, (SILVA e PORTO,
2003). Estes sistemas proporcionam o abastecimento de 98% da população
metropolitana, com um atendimento de 76% em termos de esgotos sanitários,
(www.sigrh.sp.gov.br, consulta em 07/05/2004).
Esta grande ocupação metropolitana junto aos principais mananciais de
abastecimento, ocorrendo em oposição às legislações de uso e ocupação do solo,
transformou-se num verdadeiro perigo: a poluição das águas, solo e ar. Inúmeros
problemas foram surgindo durante o processo de ocupação às margens da lei,
apropriando-se principalmente do espaço físico dos fundos de vale e várzeas dos
corpos d’água, constituindo assim, um dos principais problemas urbanos, devido à
periódicas inundações. Nestas áreas de mananciais ocorreram as maiores taxas de
crescimento populacional, acumulando por isto esgoto doméstico, lixo e carga
urbana difusa de poluição, com comprometimento da qualidade da água, (SILVA e
PORTO, 2003, p. 133).
Neste contexto de intensa urbanização da região, já em 1970, o Plano Metropolitano
de Desenvolvimento Integrado - PMDI esboçava uma primeira diretriz de expansão
urbana, propondo que ocorresse na direção oeste/leste, procurando preservar os
recursos hídricos para abastecimento da população com a criação de áreas de
proteção destes mananciais. Apesar disto, os objetivos desta diretriz não foram
alcançados.
Como resultado desta proposta, em 1975 foi aprovada a Legislação de Proteção aos
Mananciais, que pode ser definida basicamente por três instrumentos legais: a Lei
Estadual nº 898/75, que delimitou as áreas protegidas; a Lei Estadual 1.172 de
1976, que define os parâmetros de ocupação e atividades permitidas nas bacias; e o

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Decreto Estadual 9.714 de 1977, que trata das competências institucionais, sanções
e procedimentos de aprovação de projetos nas áreas protegidas.
O princípio regulador dessas normas baseou-se na intenção de controlar a
expansão urbana para garantir a qualidade dos recursos hídricos, de forma a manter
equilíbrio entre as atividades humanas e a capacidade de depuração dos corpos
d'água. Este distinguiu duas áreas de proteção que se diferenciam segundo o grau
de restrição. As áreas de primeira categoria, ou de maior restrição de uso situadas
às margens das represas, dos rios e córregos; as áreas cobertas por matas, áreas
inundáveis próximas à represas e cursos d’água e as áreas de grande declividade.
As áreas de segunda categoria correspondem ao restante da sub-bacias, sendo
divididas em: CLASSE A - área urbana com densidade superior a 30 hab/ha 5 ;
CLASSE B - áreas situadas no entorno daquelas consideradas urbanas e as
destinadas à expansão urbana, cuja densidade de ocupação varia entre 25 hab/ha e
34 hab/ha; CLASSE C - demais áreas (rurais), com densidade entre 6 hab/ha e 24
hab/ha.
Nas áreas de segunda categoria procurou-se “congelar” as densidades
populacionais existentes à época nos núcleos urbanos CLASSE A, admitindo-se,
entretanto, a criação de anéis de expansão urbana decrescentes a determinadas
distâncias, formando as áreas de CLASSES B e C. Ainda nessas áreas (segunda
categoria) são permitidos alguns usos, desde que não caracterizados como
atividades poluidoras, como residencial, industrial, comercial, de serviços,
institucional, de lazer, agrícola e de reflorestamento. O índice de ocupação nestas
áreas poderia variar de 1 a 50 habitantes por hectare e o lote mínimo definido é de
500m2, existindo ainda, diversas restrições urbanísticas, tais como: taxas de
ocupação, índices de construção, taxas de impermeabilização do solo e recuos
mínimos com relação à divisa dos lotes.
Além dessa legislação, a atividade industrial é regulada pela Lei Estadual de
Zoneamento Industrial (Lei nº 1.817/78), que designa as atividades permitidas, bem
como as normas de localização, classificação e licenciamento dos estabelecimentos
industriais de toda Região Metropolitana. Destaca-se que nas áreas sujeitas à Lei de
Proteção aos Mananciais, é permitida apenas a instalação de indústrias
consideradas não poluentes, cuja área construída esteja limitada a 2.500m2.
Em vista do quadro acima descrito, já que não houve a mudança esperada no uso
do solo e nem se conseguiu isolar os corpos d’água da ocupação urbana, pois
ocorreu praticamente uma invasão da área por população carente, as normas de
proteção aos mananciais foram revisadas e reformuladas, tendo sido então editada
a Lei nº 9.866/1997, com a finalidade não de apenas proteger, mas também
recuperar a qualidade ambiental dos mananciais poluídos, abrangendo todo o
Estado de São Paulo. Esta lei procurou adequar estas normas de proteção às
Constituições Federal (1988) e Estadual (1989), bem como reforçar os princípios de
gestão ambiental já estabelecidos nas políticas de recursos hídricos. A
descentralização das ações foi priorizada, mediante a criação de unidades de
gerenciamento, denominadas Áreas de Proteção e Recuperação dos Mananciais
(APRM’s), formadas por uma ou mais sub-bacias. A forma administrativa proposta
está calcada nos comitês de bacias, com participação paritária e tripartite entre
Estado, Municípios e sociedade civil, visando garantir a efetiva participação da
população local na tomada de decisões.
5
Para empreendimentos posteriores às leis, a densidade máxima permitida passou a ser de 50 hab/ha

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Em lugar de uma lei estadual rígida de uso e ocupação do solo, que acaba
desconsiderando as realidades locais, a nova proposta pretende criar Áreas de
Intervenção direcionadas às especificidades de cada unidade de gerenciamento
APRM (São Paulo, 1997). Assim, cada sub-bacia deverá ter um tratamento
diferenciado, considerando-se as peculiaridades ambientais e os processos de
ocupação a que estão sujeitas.
As Áreas de Intervenção estão classificadas em Áreas de Restrição à Ocupação
(que não devem ser ocupadas), Áreas de Ocupação Dirigida (que podem ser
ocupadas, desde que atendidos determinados requisitos quanto à qualidade das
condições ambientais dos recursos hídricos) e Áreas de Recuperação Ambiental
(devido à suas ocupações irregulares, estão efetivamente com a qualidade dos
mananciais comprometida, devendo os indevidos usos serem retirados ou
transferidos para outras localidades).
No entanto, cada ARPM deve ser criada por lei específica, que estabeleça tanto as
diretrizes de uso e ocupação do solo como as normas ambientais e urbanísticas
para cada uma destas áreas, devendo, necessariamente, abranger questões
relativas às condições de implantação de atividades, sejam efetiva ou
potencialmente poluidoras, bem como sistemas de tratamento de água, controle de
cheias, resíduos sólidos, esgotos e energia elétrica. Importante ressaltar que o poder
municipal deverá submeter suas propostas legislativas sobre o planejamento urbano
ao órgão colegiado a ser criado em cada sub-bacia hidrográfica.

DISCUSSÃO
Na década de 1970 a Lei de Proteção aos Mananciais abrangia aproximadamente
dois terços dos 39 municípios componentes da Região Metropolitana de São Paulo.
Decorridos 18 anos de sua implantação observa-se que os resultados mostram
efeitos contrários aos pretendidos pelos critérios que moldaram esta legislação.
Diversos problemas urbanos se acentuaram nestas áreas protegidas.
Em razão das diversas restrições de ocupação do solo, os investimentos foram
inviabilizados nas áreas protegidas. É que a legislação exige que uma instalação
predial industrial, mesmo de médio porte, só possa se instalar em uma área de 500
m2 (o menor lote previsto na lei) ou mais, elevando assim, o custo do terreno. Deste
modo esta legislação não permite construir uma edificação de porte adequado ao
empreendimento, inviabilizando a atividade, mesmo que esta não seja poluidora. No
caso de projetos residenciais, também não há a possibilidade de sucesso, pois as
habitações individuais, imersas em lotes muito grandes, se inviabilizaram para o
poder aquisitivo local.
Como se observa, esta legislação, criada em prol da sustentabilidade da metrópole,
acaba promovendo uma ocupação com densidade muito baixa, dificultando assim a
efetivação de empreendimentos, tanto de caráter industrial, quanto residencial,
devido aos altos custos. Isto acabou incentivando o aparecimento de um mercado
informal, principalmente de habitação, e inviabilizando qualquer mercado formal.
Por sua vez observa-se também conflitos entre as esferas de poder municipal e
estadual, em relação às suas competências: sendo a Lei de Proteção aos
Mananciais uma norma estadual, todos os municípios devem respeitá-la. Desse
modo as capacidades legislativas municipais ficam restringidas. Isto é tão mais
importante quanto mais excessivamente detalhada é a lei estadual, pois ficam os

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municípios impossibilitados de legislarem sobre assuntos de interesse local, com


relação ao uso do solo, conforme prevê a Constituição Federal.
Nesse sentido, acabou-se “engessando” os municípios localizados nas áreas de
proteção aos mananciais e, como reflexo, limitou-se a capacidade destes municípios
em arrecadar impostos. Esta perda de sustentabilidade financeira não é
acompanhada de nenhuma forma de ressarcimento, seja com o repasse de verbas,
seja na busca de equilíbrio entre estado e prefeitura na absorção do ônus de
manutenção destas áreas.
Outra implicação da implantação da legislação em comento é que, além de sua
aplicação ser muito complexa, há a necessidade de se aprovar as atividades
(mesmo as permitidas nas áreas de preservação) em diversos órgãos
governamentais. Essas limitações institucionais e a falta de agilidade dos
procedimentos acaba transformando as aprovações em verdadeira saga, capaz de
desestimular até os investidores mais otimistas, mesmo com seus projetos em
conformidade com a lei.
A incapacidade de atrair empreendimentos que pudessem permitir a
sustentabilidade financeira dos municípios submetidos à legislação, somada à
ineficiência da ação fiscalizadora resulta na perda do controle estatal destas áreas
atingidas, o que, conseqüentemente, leva à completa degradação do ambiente que,
originalmente, deve ser preservado.
Tendo em vista o quadro acima explicitado, a Lei nº 9.866 de 1997 pretendeu
flexibilizar os índices rígidos fixados naquela lei estadual, da década de 1970,
que não consideram as peculiaridades e realidades dos municípios envolvidos. A
nova lei possibilita, entretanto a descentralização da gestão, de forma que a cada
APRM corresponda uma possibilidade de, individualmente, determinar suas áreas
prioritárias para ação, estabelecendo diretrizes e índices urbanísticos e ambientais.
Porém, decorridos mais de 6 anos da vigência desta lei, as unidades de
gerenciamento, apesar de já delimitadas, ainda não possuem leis específicas
discutidas no âmbito das APRMs. Até que cada APRM tenha suas diretrizes
estabelecidas por lei, as disposições das antigas normas da década de 1970
continuaram em vigor, razão pela qual, atualmente, ainda não há melhorias
concretas na qualidade ambiental da região de mananciais do Estado de São Paulo,
mas apenas meras expectativas quanto à efetividade das normas existentes.
Vale lembrar que a legislação ambiental se fundamenta no princípio da
responsabilidade, controlado pela lei federal nº 9.065 de 1998, também conhecida
como lei dos crimes ambientais. Assim sendo os custos sociais externos que
acompanham o processo produtivo precisam ser considerados como custos e
assumidos pelo produtor. Desta forma se estará praticando o princípio de prevenção
do dano, conceito este fundamental no direito ambiental. Nesta prevenção procura-
se minimizar ou eliminar os danos ao meio ambiente, saúde e segurança da
população. Sublinha-se assim a importância dessa ação preventiva e além desta,
como aprovado na convenção Rio 92, o princípio poluidor-pagador e como diz Milaré
(2004, p. 143) não se trata do princípio pagador-poluidor, pois aquele que polui deve
pagar, o que não significa que pago, portanto posso poluir. Assim sendo, a lei
federal 6.938 de 1981 em se artigo 4º acolheu este princípio, ressaltando “a
imposição ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os
danos causados”.

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CONCLUSÕES
Como se observa do acima exposto, pode-se concluir que o objetivo de preservar o
patrimônio hídrico da região metropolitana de São Paulo não foi alcançado pela Lei
de Proteção aos Mananciais. E pode-se prever a responsabilização dos agentes
poluidores, de acordo com o princípio da responsabilidade acima mencionado.
Por sua vez destaca-se que os aspectos excessivamente restritivos da legislação de
proteção aos mananciais influenciaram negativamente nas formas de apropriação do
espaço urbano, que ocorreram à margem da Lei, implicando no agravamento das
condições de poluição das águas e degradação urbana, acentuando o processo de
exclusão social.
Por sua vez, a nova proposta de gestão dessas áreas trazida pela Lei 9.866 de
1997, mesmo visando a flexibilização dos conceitos rígidos adotados anteriormente
na região metropolitana de São Paulo, ainda carece de efetividade, já que as
unidade de gerenciamento não se articularam para aprovar suas diretrizes de
intervenção e recuperação das sub-bacias.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAPOBIANCO, João Paulo Ribeiro and MARUSSIA Whately .Billings 2000 Ameaças e
Perpectivas para o maior reservatório de água da Região Metropolitana de São
Paulo: relatório do diagnóstico socioambiental participativo da bacia hidrográfica
da Billings no período de 1989-99., Instituto Socio-ambiental. São Paulo, 2002.
MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. Doutrina – Jurispridência – Glossário. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004 - 3a edição revista, atualizada e ampliada.
SÃO PAULO (Estado). Secretaria do Meio Ambiente Lei Estadual nº 9.866/97 – Uma
Nova Política de Mananciais: Diretrizes e Normas para a Proteção e
Recuperação das Bacias Hidrográficas dos Mananciais de Interesse Regional do
Estado de São Paulo. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado S.A, 1997.
SILVA, Maria da Glória Lanci da, Orientador Prof. MACEDO, Dr. Silvio Soares. A
Paisagem em Transformação: Processos para a Configuração do Alto-Tietê-
Cabeceiras, Master thesis, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade
de São Paulo, São Paulo, Brasil, 1997.
SILVA, Ricardo Toledo and PORTO, Mônica Ferreira do Amaral Gestão Urbana e
Gestão das Águas: Caminhos da Integração, in Estudos Avançados, vol 17, Nº
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Brasil, 2003.
SILVA, Ricardo Toledo e PORTO, Mônica Ferreira do Amaral. Gestão Urbana e
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17(47), 2003.
www.sigrh.sp.gov.br, consulta em 07/05/2004

ABSTRACT
This article shows the consequences of the approval of a very restrictive law to
control land use and occupation of the São Paulo metropolitan region in the 1970’s. It
describes its wicked effects that still could not be corrected by the new legislation of

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1997 – law nº 9,866- with the new water resources policies, extending the protection
law to the whole State. This policy, despite being flexible bringing specific guidelines
for each Protection Area Unit still wasn’t implemented. This and other environmental
legislations haven’t taken to significant alterations in this metropolitan water
resources’ areas pollution scenery. Actually the environmental damages continue,
being a danger upon the metropolitan population, as they threaten the water quality.
This situation was described through the discussion of the urban impacts on the
environment.

KEY-WORDS
Water. Management. Water Resourses. Polution.

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