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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE


DEPARTAMENTO DE CLÍNICA E ODONTOLOGIA
SOCIAL
DISCIPLINA: FARMACOLOGIA APLICADA À
ODONTOLOGIA

Aspectos Gerais de Farmacologia Clínica Aplicada à Odontologia


Autores: Paula Lima Nogueira, Francisco Patrício de Andrade Júnior, Danielle da
Nóbrega Alves, Ricardo Dias de Castro

INTRODUÇÃO

O conceito de farmacologia clínica está relacionado a aplicação dos


conhecimentos gerais da farmacologia à clínica odontológica, visando a resolução da
problemática que o paciente está envolvido, alinhando-a de acordo com as informações
médicas relatadas. A organização desse conjunto de informações é imprescindível para a
adequada escolha do fármaco e consequente êxito no tratamento.
O atendimento odontológico recorre, por vezes, a terapêutica medicamentosa
objetivando à prevenção ou controle da dor, processo inflamatório, ansiedade ou ainda
para evitar ou combater processos infecciosos ou qualquer situação que comprometa a
saúde dos dentes, tecidos de sustentação e suporte, mucosa oral e estruturas anatômicas
anexas a boca. Para isso, impreterivelmente é necessário um diagnóstico preciso e o
conhecimento prévio da farmacologia odontológica contribuindo para a segurança e
eficácia nas prescrições (LIMA; ARAÚJO, 2019).
O diagnóstico correto irá caracterizar o problema e será fundamental para a
elaboração de um plano de tratamento apropriado. Uma vez que se tem o conhecimento
concreto sobre o problema, a probabilidade de acertar na terapêutica é consistente, seja
ela medicamentosa (aquela terapêutica que faz uso de fármaco/medicamento) ou não-
medicamentosa (aquela terapêutica cirúrgica/operatória). Na odontologia, por exemplo,
o profissional saber se a polpa dental apresenta uma inflamação reversível ou irreversível
é fundamental porque a partir dessa informação a conduta será crucial para o prognóstico.
A prescrição terapêutica é vista como coadjuvante ao tratamento odontológico e,
por vezes, imprescindível para preservar ou restituir a saúde do paciente. No Artigo 6°,
Inciso II, da Lei n° 5.081/66, que regula o exercício da odontologia, os cirurgiões-
dentistas têm habilitação legal para prescrever e aplicar especialidades farmacêuticas de
uso interno e externo, indicadas em odontologia, requerendo de forma obrigatória, por
parte do profissional, o conhecimento de maneira correta e conveniente das substâncias
que serão indicadas (LÚCIO; CASTRO; BARRETO, 2011).
A prescrição é um ato que vai resultar de um levantamento de diferentes
informações que ajudarão a compreender a possibilidade de diferentes desfechos,
apontando para a eficácia, tratamento ou prevenção de uma determinada situação.
Invariavelmente pode existir um desfecho indesejável, como por exemplo uma reação
alérgica ao medicamento, ou os efeitos adversos que apesar de serem previsíveis podem
aparecer com uma maior intensidade e frequência em determinados pacientes. Para que
exista segurança e eficácia na prescrição medicamentosa o cirurgião-dentista necessita
obter um diagnóstico fundamentado do quadro clínico, conhecer as propriedades
farmacológicas das diversas classes medicamentosas, avaliar a necessidade da indicação
terapêutica e alinhá-la as condições socioeconômicas do paciente, visando sempre a
resolução da problemática e minimização dos danos. Nesse capítulo serão abordadas
informações gerais sobre a farmacologia aplicada à clínica odontológica.

DIFERENÇA ENTRE FÁRMACO E MEDICAMENTO

Fármaco é a substância química equivalente ao princípio ativo que tem a atividade


farmacológica. Medicamento é o conjunto de substâncias, incluindo o fármaco, que
passaram por uma preparação farmacêutica e estão dentro de uma formulação
farmacêutica, sendo esse o produto tecnicamente elaborado pela indústria farmacêutica.
Resumidamente, os fármacos são o ponto de partida para o desenvolvimento dos
medicamentos que podem ser considerados como produto final para administração. Estes
podem ser classificados como de referência, genérico ou similar.

DIFERENÇA ENTRE OS MEDICAMENTOS

Será abordada a classificação que leva em consideração a política de


medicamentos no Brasil conforme a Lei nº 9.787, de 10 de fevereiro de 1999.
Antes dos conceitos relacionados aos medicamentos é necessário o entendimento
de alguns termos que serão abordados durante a classificação:
 Bioequivalência: quando um medicamento é comparado com outro, contendo o
mesmo princípio ativo, administrados na mesma dosagem e condições
experimentais, e não apresentam diferença em relação à biodisponibilidade, ou
seja, não há diferença na velocidade e extensão de absorção a partir da curva
concentração/tempo na circulação sistêmica ou sua excreção na urina.
 Equivalência Farmacêutica: entende-se por equivalência farmacêutica quando
um medicamento é comparado com outro e contém o mesmo princípio ativo, na
mesma quantidade e forma farmacêutica (ANDRADE, 2014).
 Equivalência Terapêutica: entende-se por equivalência terapêutica quando um
medicamento é comparado com outro e contém o mesmo princípio ativo, na
mesma quantidade e forma farmacêutica e, além do mais, quando administrados
na mesma dosagem, os testes de bioequivalência precisam apresentar os mesmos
efeitos quanto à eficácia e segurança (ANDRADE, 2014). Para um melhor
entendimento, todo medicamento que é equivalente terapêutico também é
equivalente farmacêutico, o contrário é errado porque medicamentos que são
equivalentes farmacêuticos não necessitam de apresentar os mesmos efeitos de
segurança e eficácia.
 Medicamentos Intercambiáveis: são medicamentos equivalentes terapêuticos
quando comparados com um medicamento de referência, permitindo a
substituição deste. Quanto a classificação dos tipos de medicamentos, eles podem
ser categorizados em medicamentos de referência, genérico e similar.

Medicamento de Referência: produto inovador cuja eficácia, segurança e qualidade


foram comprovadas cientificamente junto ao Ministério da Saúde, sendo o primeiro a
obter o registro. Deve ser identificado por nome comercial (fantasia) e o nome genérico.

Medicamento Genérico: medicamento idêntico a um medicamento de referência, tendo


o mesmo princípio ativo, concentração e a forma farmacêutica, no qual é comprovada a
sua eficácia, segurança e qualidade, podendo ser intercambiável com o de referência.
Deve ser identificado pelo nome do princípio ativo.

Medicamento Similar: aquele que contém princípio ativo, concentração, forma


farmacêutica, via de administração, posologia e indicação terapêutica semelhantes ao
medicamento de referência, podendo diferir somente em características relativas ao
tamanho e forma do produto, prazo de validade, embalagem, rotulagem, excipientes e
veículos. Não pode ser intercambiável com o de referência, pois não são obrigatoriamente
realizados testes de bioequivalência. Deve ser identificado por nome comercial (fantasia).

Medicamento Similar Bioequivalente: além dos mesmos conceitos do medicamento


similar, estes apresentam testes de bioequivalência comprovando a sua segurança e
eficácia, podendo ser intercambiável com o de referência. Deve ser identificado por nome
comercial (fantasia).

FORMAS FARMACÊUTICAS

Forma farmacêutica é o estado final de apresentação da fórmula farmacêutica,


com a finalidade de facilitar sua administração e obter o maior efeito terapêutico possível
e o mínimo de efeitos indesejáveis. Inicia-se o processo com a fórmula farmacêutica
(componentes), seguida das características dadas a ela (formato, aparência, apresentação)
conforme a via de administração mais adequada (ANDRADE et al., 2013).
A formulação e forma farmacêutica afetam a biodisponibilidade dos
medicamentos pelos variados graus de desintegração e dissolução, influenciando a
liberação do princípio ativo, dos veículos (agentes para aumentar a viscosidade) e
excipientes (agentes que interferem na velocidade para o início do efeito).
As formas farmacêuticas mais utilizadas em prescrições na odontologia são
divididas em sólidas, semi-sólidas e líquidas e estão expostas no Quadro 1.

Quadro 1- Formas farmacêuticas de interesse para odontologia

FORMAS FARMACÊUTICAS
SÓLIDAS SEMI-SÓLIDAS LÍQUIDAS
Emulsões: constituídas por dois
Pomadas: base monofásica em
Comprimidos: preparação líquidos não são miscíveis entre
que pode haver a suspensão de
obtida pela compressão do(s) si e necessitam de um agente
substâncias líquidas ou sólidas.
princípio(s) ativo(s). emulsificante para promover a
É uma forma oleosa.
mistura.
Suspensões: constituídas por
substâncias líquidas que
Cremes: constituídos por bases
Drágeas: comprimidos precisam ser agitadas para
emulsivas que podem ser do
revestidos por um invólucro. formar uma mistura homogênea
tipo óleo/água ou água/óleo.
com a substância sólida, que é o
princípio ativo.
Cápsulas: o princípio ativo está
no interior de um receptáculo no Géis: constituídos por uma
Soluções: constituídas pela
qual não pode ser aberto para suspensão contendo grandes ou
dissolução de um líquido em
administração. pequenas partículas. É uma
substâncias sólidas ou líquidas.
Granulados: preparações em forma aquosa.
grãos.
Fonte: Autor, 2022.

USO DOS MEDICAMENTOS

O medicamento é considerado de uso interno quando passa pelo trato


gastrointestinal, ou seja, todo medicamento que é deglutido. O de uso externo são todos
os medicamentos que não passam pelo trato gastrointestinal, ou seja, não são deglutidos.

VIAS DE ADMINISTRAÇÃO

Os medicamentos podem ser administrados pela via enteral quando entra em


contato com qualquer uma das regiões do sistema digestório (cavidade oral, faringe,
esôfago, estômago e intestinos) ou parenteral quando o medicamento não entra em
contato com nenhuma região do sistema digestório e a via tópica que é a aplicação direta
do medicamento no local requerido. O Quadro 2 apresenta as vias enterais e parenterais
de destaque para odontologia.

Quadro 2- Principais vias medicamentosas de interesse para odontologia


VIAS MEDICAMENTOSAS
VIAS ENTERAIS VIAS PARENTERAIS
Percutânea
Respiratória ou Inalatória
Endodôntica (intracanal)
Subcutânea
Sublingual
Submucosa
Oral
Subperióstica
Retal
Intra-articular
Intra-muscular
Intravenosa
Intradérmica
Fonte: Autor, 2022.
FARMACOCINÉTICA

A farmacocinética clínica é o conhecimento que trata do movimento do fármaco


no nosso organismo, desde o momento que ele é administrado até o momento que ele é
eliminado.
Quando o fármaco é administrado ele passa por um processo de absorção, com
exceção quando é administrado pela via intravenosa porque vai diretamente para a
corrente sanguínea. Esse processo de absorção é influenciado por características químicas
da molécula e as vezes por fatores externos, por exemplo, ao ser administrado um fármaco
básico em um ambiente ácido. Neste caso, ocorrerá maior inonização das moléculas do
fármaco, que promoverá maior dificuldade para absorção.
Da mesma forma, características individuais também podem influenciar na
farmacocinética, como por exemplo se o paciente está em um quadro de desnutrição e
consequentemente de hipoproteinemia ou até mesmo com comprometimento sistemico,
ele terá menos proteínas plasmáticas e isso impacta na exacerbação do efeito, uma vez
que haverá mais moléculas livres do fármaco na corrente sanguínea disponíveis para se
ligarem aos seus receptores e promoverem o efeito farmacológico (casos como esses pode
existir a necessidade de redução de doses).

FARMACODINÂMICA

Entende-se por farmacodinâmica a ação dos medicamentos no organismo, de tal


forma que a ligação do fármaco com um receptor (que normalmente é uma proteína que
está presente na membrana plasmática) vai desencadear uma série de reações bioquímicas
intracelulares quem culminam com o seu efeito.
Esse receptor pode ser um canal iônico, no qual permite a passagem de íons. O
fato de a membrana plasmática ser lipossolúvel, não permite a passagem de moléculas
com carga elétrica, por isso que os íons precisam de proteínas nas quais se unem para
formar um canal. Dependendo da situação, esse canal estará em conformação (aberto ou
fechado), que é controlado por meio de estímulo elétrico ou químico. Dessa forma, essa
alteração de conformação proteica do canal iônico facilita ou bloqueia a passagem dos
íons pelas membranas biológicas. Outros fármacos podem se ligar a enzimas e impedir
que elas executem o seu efeito. Serão abordados resumidamente os mecanismos de ação
de algumas classes medicamentosas de interesse para odontologia.
O Quadro 3 aborda de maneira geral os mecanismos de ação das principais
classes medicamentosas de interesse para a odontologia.

Quadro 3- Aspectos gerais dos mecanismos de ação das principais classes medicamentosas utilizadas na
odontologia
CLASSE
MECANISMO DE AÇÃO
MEDICAMENTOSA
Os fármacos dessa classe atuam de diferentes maneiras na cascata de
coagulação entre elas aumentando a concentração de fatores sanguíneos
(vitamina K) e além desse mecanismo também podem atuar impedindo a
Hemostáticos
formação da plasmina (antifibrinolíticos). Outros estão relacionados com a
manutenção física do coagulo sanguíneo na ferida cirúrgica (tampões
absorvíveis).
A presença de canais para íons sódio e potássio nas células que compõe o
sistema nervoso periférico são os alvos farmacológicos. A despolarização da
Anestésicos Locais célula é impedida a partir do bloqueio mecânico dos canais para íons sódio,
impossibilitando a propagação do impulso nervoso e consequente sensação
dolorosa.
Esses estão na maior parte das vezes associados aos anestésicos locais e vão
provocar a contração dos vasos sanguíneos, por meio da ação em uma proteína
da membrana plasmática (receptor metabotrópico) que está associada a
proteína G. Esse mecanismo induzirá a ativação da proteína G e essa por sua
vez irá ativar (fosforilar) outras proteínas. A fosforilação de outras proteínas
culmina com a liberação de um segundo mensageiro que vai abrir canais para
Vasoconstritores
íon cálcio presente no retículo endoplasmático, o íon cálcio deixa o retículo e
direciona-se para o citoplasma das células musculares lisas dos vasos
sanguíneos. Esse cálcio é um cofator para que as fibras de aquitina e miosina
deslizem entre si e promovam a contração dos vasos. Esse fato tem importante
aplicabilidade clínica na odontologia pois aumenta o tempo de duração dos
anestésicos locais, a profundidade de anestesia e diminui a toxicidade.
Além da capacidade de deprimir a atividade dos nociceptores após estarem
ativados (quando a dor já está instalada), alguns fármacos desse grupo também
Analgésicos Não
podem bloquear diretamente a sensibilização dos nociceptores, prevenindo
Opioides
essa sensibilização (quando a dor ainda não está instalada) a partir da inibição
da enzima cicloxigenase-2 (COX-2).
Promovem ligação com os receptores acoplados à proteína G, dentre os
receptores opioides os μ são os mais relevantes em relação a ação analgésica.
Analgésicos Opioides
Através do estímulo promovido pela ligação entre esses fármacos e os
receptores, ocorre a inibição da enzima adenilato ciclase, reduzindo o nível
intracelular de adenosil monofosfato cíclico, promovendo o bloqueio dos
canais de cálcio operados por voltagem nas terminações pré-sinápticas,
reduzindo a liberação de neurotransmissores e ainda a ativação de alguns
receptores, com exceção dos canais de potássio na membrana pós-sináptica.
Isso causa uma hiperpolarização da célula nervosa, bloqueando parcialmente
a transmissão de impulsos nociceptivos (estímulo doloroso).
Sua ação é sobre a enzima cicloxigenase (COX) e o substrato de atuação dessa
é o ácido araquidônico. Dentre as COX têm-se a COX-2 que é uma enzima
Anti-inflamatórios envolvida com o processo inflamatório. Por algum estímulo inflamatório, ela
Não Esteroides é sintetizada e vai atuar sobre ácido araquidônico produzindo mediadores
químicos da inflamação. Esses fármacos se ligam a COX e impedem que ela
atue sobre o ácido araquidônico.
Atuam em nível de núcleo celular, estimulando proteínas anti-inflamatórias
(anexina-1) através da qual há a inibição de fosfolipase A2, essa por sua vez
Anti-inflamatórios
tem a função de atuar sobre os fosfolipídios de membrana plasmática e
Esteroides
produzir o ácido araquidônico, uma vez inibida, essa reação é impedida. Outro
mecanismo desses fármacos é suprimir a síntese de proteínas inflamatórias.
Agem sobre enzimas e atuam inibindo a síntese de parede celular, dessa forma
o microrganismo não consegue sobreviver devido uma grande pressão
osmótica e consequente rompimento da membrana plasmática, como exemplo
Antibióticos
têm-se os betalactâmicos (penicilinas e cefalosporinas). Outros grupos de
fármacos dessa classe atuam inibindo a síntese proteica (aminoglicosídeos,
macrolídeos, tetraciclinas, cloranfenicol, azitromicina, claritromicina).
Os principais fármacos utilizados no tratamento de infecções fúngicas na
odontologia tem como principal alvo farmacológico o ergosterol da membrana
plasmática, que é um dos constituintes essenciais para fornecer função e
síntese a essa estrutura da célula fúngica. Atuam sobre o ergosterol formando
Antifúngicos
poros na membrana, consequente perda de íons e morte celular, ou inibindo a
biossíntese da membrana, através da inibição da enzima esterol 14-alfa-
desmetilase, impedindo a transformação do lanosterol em ergosterol,
desencadeando alterações na sua permeabilidade, sucedendo a necrose celular.
Atuam impedindo a duplicação viral através do bloqueio da enzima DNA
Antivirais
Polimerase.
Agem impedindo a ligação das histaminas nos seus respectivos receptores no
tecido alvo. De interesse para odontologia têm-se os fármacos antagonistas do
receptor H1, sendo classificados em 1ª e 2ª geração, diferindo-se por moléculas
Anti-histamínicos
que apresentam uma alta lipossolubilidade e reduzido peso molecular dessa
maneira conseguem com uma maior facilidade atravessar a barreira
hematoencefálica, diferentemente dos de 2ª geração.
No sistema nervoso central encontra-se a presença de canais iônicos para íon
cloreto (canal GABAA), no qual permite o influxo de cloreto para o interior da
célula, induzindo-a para um estado de hiperpolarização. Essa classe
Benzodiazepínicos
medicamentosa aumenta a frequência de abertura desses canais e
consequentemente existe um maior influxo de íon cloreto, permitindo uma
hiperpolarização da célula com maior intensidade.
Fonte: Autor, 2022.

FATORES QUE INFLUENCIAM NA ESCOLHA DO FÁRMACO

Alguns critérios precisam ser abordados para que seja feita uma coerente
prescrição dos medicamentos. Avaliar a condição socioeconômica do paciente é
imprescindível na escolha do fármaco, o custo de determinada medicação pode ser
determinante para o paciente adquirir o fármaco e aderir ao tratamento ou não.
Outro fator de importância clínica é a experiência acumulada que o profissional
tem no uso das medicações, da mesma forma deve ser levada em consideração a
experiência de utilização do próprio paciente. Como exemplo prático na odontologia,
podemos citar o maneja da dor. Esta tem um componente subjetivo que deve ser
considerado, e não somente a resposta de um aspecto exclusivamente biológico, por vezes
o paciente irá relatar que se sente mais confortável com o uso de um determinado
analgésico.
Outro ponto de grande relevância durante a escolha da medicação é considerar os
efeitos adversos dos fármacos. De posse dessa informação, o profissional tem uma maior
chance da eficácia, segurança, minimizando, portanto, a ocorrência de efeitos adversos.
Embora a ciência tenha trabalhado para descobrir moléculas que sejam minimamente
danosas ao nosso organismo, até então não existe medicamento totalmente específico, ou
seja, inerte em relação aos efeitos adversos, todos eles podem provocar, com variação de
intensidade, efeitos indesejáveis, pois atuam em diferentes vias de sinalização
intracelular, e ,consequentemente, promovem diferentes respostas celulares.
Uma anamnese adequada e o conhecimento farmacológico associado a
acumulação de experiência quanto ao uso de medicamentos direcionam o profissional
para uma decisão terapêutica coerente e responsável da prescrição.

FATORES QUE INFLUENCIAM NA ADESÃO TERAPÊUTICA


Nesse ponto é primordial que o paciente seja uma pessoa participativa, de tal
maneira que o profissional possibilite ao paciente uma contribuição na prescrição por
meio de informações relevantes para a escolha do medicamento, esse fato se sobressai
quando se entende a importância do comprometimento do paciente na adesão para que o
tratamento seja eficaz.
O diálogo com o paciente através da participação do prescritor (cirurgião-dentista)
deve sensibilizar ao máximo o paciente para que ele se comprometa com a terapia, através
da responsável e individualizada troca de informações para a escolha do fármaco. O
profissional deve acolher informações vindas do paciente, investigar e interpretar seus
sinais e sintomas, para a partir disso delinear o problema e realizar um diagnóstico
coerente. Através da especificação do tratamento e dos objetivos terapêuticos é feita a
seleção do medicamento mais eficaz e seguro para o paciente, podendo ser uma prescrição
que considere estratégias medicamentosas e/ou medidas não medicamentosas.
É indispensável individualizar a conversa com paciente sobre todas as
informações referentes a terapêutica selecionada e ser constante o acompanhamento do
tratamento proposto. Por exemplo: a prescrição para pessoas idosas, muitas vezes, deve
considerar, além do preenchimento do receituário, uma explicação simplificada para um
melhor entendimento sobre a quantidade e frequência das doses diárias e duração do
tratamento.
A melhora na adesão ao tratamento também está associada à agregação de
habilidades técnicas através da participação do farmacêutico que disponibilizará a
medicação prescrita. A atenção farmacêutica que é uma prática do campo de atuação
desse profissional deve está presente com a finalidade de colaborar na transmissão de
informações, acompanhamento do paciente, esclarecer as suas dúvidas, contribuir para o
uso racional dos medicamentos e a manutenção da efetividade e segurança do tratamento
(SILVA; SOUSA, 2017).

FATORES QUE INFLUENCIAM NA EFICÁCIA FARMACOLÓGICA

Os efeitos farmacológicos podem ser influenciados por uma série de fatores


individuais, classificados como constitucionais, condicionais e as influências genéticas.
Dentre os constitucionais, têm-se a interferência a partir do sexo, considerando
drogas com ações específicas sobre os órgãos ou funções genitais (interações
medicamentosas com anticoncepcional); a idade, por meio da qual idosos apresentam
com maior frequência doenças e debilidades capazes de torná-los mais sensíveis às drogas
(consequência da diminuição da massa proteica), ou crianças, em ambos os exemplos
deve-se considerar o ajuste de doses; outro fator que deve ser considerado é o peso, a
depender da quantidade administrada do fármaco podem ser produzidos efeitos cuja
intensidade é inversamente proporcional ao peso do indivíduo; e por fim o temperamento
influi quanto ao tratamento com drogas psicotrópicas.
Os fatores condicionais estão correlacionados com o ciclo menstrual, no qual
durante a sua manifestação não se recomenda, para casos específicos (portadores de
distúrbios da coagulação), a prescrição de anticoagulantes ou fármacos vasodilatadores;
o período de lactação, pelo fato da maioria das drogas serem eliminadas por via mamária
; gestação e os respectivos cuidados com produtos teratogênicos; condições em que o
paciente se encontra desidratado e por isso estará mais sensível na resposta aos
medicamentos; hipoproteinemia e o decorrente risco de toxicidade hepática e pacientes
que se encontram em um estado de jejum apresentam uma maior absorção e, com isso,
um maior potencial de efeitos indesejáveis.
Na mesma proporção encontra-se a influência dos fatores relacionados ao
fármaco, o que impõe ao prescritor(a) a necessidade de lidar com conhecimento s técnicos
e farmacológicos referentes ao fármaco prescrito. O Quadro 4 descreve alguns termos
necessários durante qualquer prescrição.

Quadro 4- Termos importantes durante a prescrição de medicamentos


TERMOS DESCRIÇÃO
Posologia Dose, frequência e período de tempo corretos em que o medicamento deve ser
utilizado.
Dose Quantidade de medicamento que usamos para obter um determinado efeito
farmacológico (efeito benéfico).
Dose Usual Aquela que clinicamente, por uma determinada via, leva a um efeito farmacológico e
é baseada em indivíduos do sexo masculino com 70kg de peso corporal.
Tolerância Reação que ocorre após o uso prolongado do fármaco. Verifica-se decréscimo dos
efeitos iniciais, de modo que a dose deve ser aumentada.
Dependência Pode ser física ou psíquica. Na física o organismo passa a necessitar do fármaco para
o funcionamento (como exemplo os fármacos depressores do sistema nervoso
central). Na psíquica, a ausência da substancia causa o aparecimento do quadro de
ansiedade, irritação e euforia.
Fonte: Autor, 2022.
Para que um fármaco seja seguro e eficaz durante a aplicação precisa ser levado
em conta o tempo de administração e a consequente concentração plasmática Este pode
se apresentar em três estágios: subterapêutica (os efeitos não são suficientes para o
tratamento), janela terapêutica (concentração plasmática adequada para o tratamento) e
toxicidade (existe o risco de agressão aos sistemas biológicos). Um fármaco que se
apresenta dentro da janela terapêutica tem maior segurança e está dentro da
biodisponibilidade adequada para o tratamento.
As propriedades físico-químicas pertinentes a solubilidade e tamanho das
moléculas também influenciam nos processos de absorção, distribuição e ligação aos
receptores celulares. De igual modo, a estabilidade do medicamento é determinante na
eficácia e pode ser influenciada por fatores intrínsecos (tecnologia de fabricação) e
extrínsecos (condições de armazenamento, temperatura, luminosidade, contato com o ar
atmosférico). Além disso, o prazo de validade pode ser decisivo no aparecimento de
reações adversas.

PACIENTES QUE REQUEREM CUIDADOS ADICIONAIS

A eficácia de um fármaco está relacionada a capacidade do mesmo se ligar ao


receptor e produzir uma atividade biológica. Entretanto, é conveniente discutir que
algumas condições patológicas podem reduzir a eficácia e, consequentemente, impedir
que o objetivo terapêutico seja alcançado.
Dessa forma, torna-se importante discutir o papel do cirurgião-dentista diante de
pacientes que necessitam de cuidados especiais, dentre os quais destacam-se as gestantes,
pacientes com doenças neuropsiquiátricas, cardiovasculares, respiratórias, digestivas,
endócrinas, renais, hematológicas e imunológicas.

Pacientes gestantes

As diversas alterações fisiológicas que ocorrem no ciclo gestacional geram


diversas modificações locais e sistêmicas, inclusive na cavidade oral. Tais alterações
podem repercutir na condição de saúde geral tanto da mãe quanto do bebê que está sendo
gerado. A utilização de fármacos na gestação expõe a mãe e o feto a riscos, sejam eles
determinados pelas necessidades terapêuticas próprias da gestação, em função de
morbidades pré-existentes, bem como por intercorrências obstétricas (ANDRADE et al.,
2017; TEIXEIRA, 2019).
Inúmeros fármacos apresentam a capacidade de atravessar a barreira placentária
devido ao fato dos vasos sanguíneos da gestante se apresentarem interconectados ao do
feto, o que pode contribuir para diversas situações clínicas desfavoráveis, a exemplo de
abortos e malformações fetais (NASCIMENTO et al., 2016).
Teratogênicos são agentes que alteram de forma irreversível o desenvolvimento
estrutural ou funcional do embrião, e podem ser de diversas naturezas. O período
embrionário, compreendido da quarta à oitava semana, é considerado o de maior risco
para esses agentes, visto que se trata do período da organogênese, momento esse em que
estão se formando os primórdios dos principais órgãos e sistemas, durante o primeiro
trimestre da gestação (ANDRADE et al., 2017; MATSUBARA; DEMETRIO, 2017).
Com a finalidade de determinar os riscos inerentes ao uso de drogas durante a
gestação, a FDA (Food and Drug Administration, EUA) classificou os medicamentos em
cinco categorias de risco:

 Risco A: não há evidencias de risco em mulheres. Estudos bem controlados não


revelam problemas no primeiro trimestre de gravidez e não há evidencias de
problemas no segundo e terceiro trimestre.
 Risco B: não há estudos adequados em mulheres. Na experiência em animais não
foram encontrados riscos, mas foram encontrados efeitos colaterais que não foram
confirmados nas mulheres, especialmente durante o último trimestre de gravidez.
 Risco C: não há estudos adequados em mulheres. Na experiência em animais
ocorreram alguns efeitos colaterais no feto, mas o benefício do produto pode
justificar o risco potencial durante a gravidez.
 Risco D: não há evidencias de risco em fetos humanos. Só usar se o benefício
justificar o risco potencial (em situação de risco de morte ou em caso de doenças
graves para as quais não se possa utilizar remédios mais seguros).
 Risco X: Estudos revelaram má formação fetal ou aborto. Os riscos durante a
gravidez são superiores aos potenciais benefícios. Não usar em hipótese alguma
durante a gravidez.
Resumidamente, baseado nesta classificação, os fármacos inclusos nas categorias
A e B podem ser seguramente prescritos à gestante, devendo aqueles das categorias C e
D serem prescritos apenas em casos estritamente necessários. Os fármacos classificados
na categoria X, por sua vez, não devem ser utilizados em nenhuma hipótese
(MATSUBARA; DEMETRIO, 2017).

Pacientes com doenças neuropsiquiátricas

O alcoolismo se apresenta como um distúrbio psiquiátrico em que o indivíduo tem


dependência química ao álcool. Essa condição patológica associada, principalmente, a
deficiência nutricional e a hipossalivação, geralmente resultam em uma saúde bucal
deficitária, o que potencializa o surgimento de algumas afecções, a exemplo da cárie
dentária e doenças periodontais. Ademais, os etilistas apresentam, frequentemente, lesões
de tecidos moles ocasionando em situações clínicas desagradáveis como ceratose,
candidíase, leucoplasia e câncer bucal (LIANG; OLSEN, 2014).
Um outro contexto que deve ser destacado, é a capacidade do álcool de interagir
com diversas substâncias, prejudicando diretamente na farmacoterapia. Essas interações
podem ocorrer, principalmente, entre o álcool e o metronidazol e cefalosporinas
(antimicrobianos), causam o efeito dissulfiram, caracterizado pelo surgimento de cólicas,
eritema na face, vômitos, confusão metal e possíveis crises psicóticas (ANVISA, 2007).
De forma mais grave, a interação entre álcool e analgésicos opioides e ansiolíticos
benzodiazepínicos, apresentam-se importantes, uma vez que, ocasionam em depressão do
sistema nervoso central (SNC) e recrudescimento da probabilidade de possíveis óbitos.
Tal situação, está associada a capacidade do álcool atuar em receptores ionotrópicos do
tipo GABAA aumentando o influxo de íon cloreto, o que potencializa o efeito depressor
dos benzodiazepínicos. Dessa forma, o uso desses fármacos não está indicado para
etilistas (LIANG; OLSEN, 2014).
A respeito de indivíduos com demências, retardo mental e distúrbios de ansiedade,
é necessário evidenciar que estes apresentam precárias condições de saúde bucal. Nesses
casos, para melhorar a saúde da cavidade bucal é importante contar com a cooperação
dos mesmos, antes, durante e após os procedimentos odontológicos. Assim, o profissional
dentista precisa estar disposto a conversar com o paciente e seus familiares em relação as
ações terapêuticas e preventivas que devem ser tomadas, afinal a saúde bucal depende da
presença do profissional, porém também se torna imprescindível a correta higienização
por parte do paciente (SPEZZIA, 2015).
Em pessoas com ansiedade generalizada, fobias e estresse pós-traumático, o uso
de alguns fármacos pode estar ocorrendo, como os antipsicóticos clorpromazina e
levomepromazina. Dessa forma, o cirurgião-dentista deve estar atento, uma vez que, o
uso de tais substâncias pode provocar distúrbios motores que propiciam problemáticas na
cavidade bucal, como desajuste de próteses, disfunção temporomandibular, além de
dificultar a realização de procedimentos odontológicos. Ademais, para pacientes que
sofrem com epilepsia, o uso do anticonvulsivante fenitoína, pode ocasionar em uma
situação de hiperplasia gengival (ARAÚJO et al., 2014).

Pacientes com doenças cardiovasculares

O primeiro cuidado que o profissional deve ter em relação a pessoas que sofrem
de doenças cardíacas é sobre o controle da pressão arterial durante o atendimento
odontológico, uma vez que, o estresse pré-operatório pode alteração o equilíbrio
hemodinâmico devido à liberação exacerbada de adrenalina, que atuará em nível vascular
nos receptores alfa-1, causando vasoconstrição e aumento da pressão arterial
(COTECCHIA, 2010).
Assim, algumas medidas como consultas breves pela manhã, com adequada
sedação e analgesia trans e pós-operatória, têm contribuído para a redução do estresse e
possíveis eventos cardiovasculares desfavoráveis.
Dessa forma, pacientes com cardiopatia isquêmica aguda, mais especificamente,
devem ter sua pressão arterial e frequência cardíaca monitorados. Além de que, a
anestesia local deve ser feita de forma adequada para evitar estresse. Enquanto que no
caso de indivíduos com histórico de acidente vascular encefálico (AVE), a manutenção
da higiene bucal pode ser complexa, uma vez que, essa situação clínica pode causar
distúrbios motores que impossibilitem a correta higienização por parte do paciente.
Outrossim, uma outra situação associada é fato de que esses indivíduos podem estar
fazendo o uso de anti-inflamatórios não esteroides e anticoagulantes, como a varfarina,
aumentando o risco de hemorragias, sendo importante optar por analgésicos opioides ou
não opioides (BERGAMASCHI et al., 2007).
Em relação a hipertensão, a aferição da pressão arterial (PA) pode ser utilizada
como um parâmetro para orientar o profissional odontólogo em relação a forma mais
correta de como proceder as suas consultas.
No estágio 1, os indivíduos têm a PA em 159/99 mmHg, desse modo, há a
possibilidade de marcar consultas eletivas curtas, com prescrição de benzodiazepínicos,
como o midazolan 7,5 mg, 30 minutos antes do procedimento odontológico, para alcançar
a sedação. Esse fármaco se mostra como uma das opções mais atrativas na prática clínica,
pois tem curto período de ação, 2 a 3hs, e rápido início de ação. Ademais, pode-se fazer
o uso de anestésico local com vasoconstritor não adrenérgico os quais não produzem
alterações no sistema cardiovascular, como a prilocaína 3% com felipressina 0,03 UI/mL.
Em tratamento de urgência de paciente com pressão arterial descompensada recomenda-
se utilizar anestésico sem vasoconstritor, como a mepivacaína 3%. O recomendado é não
exceder mais do que dois tubetes de anestésico em cada atendimento. Para o controle de
dor, o uso paracetamol é recomendado (COGO, 2006; CARVALHO et al., 2013).
No estágio 2, o aumento da PA, que está em torno de 179/109 mmHg, contraindica
a consulta eletiva. No caso de urgências odontológicas, como pulpites, hemorragias,
alveolites e fraturas/traumas dentários, pode-se realizar a consulta. Recomenda-se
prescrever midazolam 7,5 mg, 30 minutos antes do procedimento, da mesma maneira em
tratamento de urgência de paciente com pressão arterial descompensada recomenda-se
utilizar anestésico sem vasoconstritor, como a mepivacaína 3% e para controle da dor o
paracetamol (COGO, 2006; CARVALHO et al., 2013).
No estágio 3 a PA está acima de 180/110 mmHg. Esses indivíduos devem ser
encaminhados imediatamente para o profissional médico. Com a normalização desse
quadro, consultas podem ser realizadas.

Pacientes com doença respiratória

Em geral, pacientes com doenças respiratórias podem ser usuários crônicos de


corticoides, o que ocasiona em imunossupressão e surgimento de candidíase bucal,
doença fúngica oportunista causada, principalmente, pelo fungo Candida albicans (VILA
et al., 2020).
Além disso, indivíduos com asma brônquica podem ter hipersensibilidade aos
anti-inflamatórios não esteroides. Desse modo, para o controle da dor, seria mais
interessante o uso de paracetamol e analgésicos opioides. Caso seja necessário usar um
fármaco com finalidade anti-inflamatória, para os pacientes com histórico de alergia aos
anti-inflamatórios não esteroides, o uso de corticóides pode ser considerada.

Pacientes com doença digestiva

Pessoas com doenças digestivas podem apresentar úlcera péptica, gastrite ou


esofagite de refluxo, devendo-se evitar a prescrição de anti-inflamatórios não esteroides,
uma vez que, esses fármacos podem potencializar essas patologias, devido a inibição da
ciclooxigenase-1 (COX-1), importante enzima que permite proteção gástrica. Assim,
deve-se considerar o uso de paracetamol, dipirona ou analgésicos opioides (BATLOUNI,
2010).
Caso os pacientes façam uso de antiácidos, deve-se ter cuidado com a prescrição
de antimicrobianos da classe das tetraciclinas, uma vez que quelam com os antiácidos,
não sendo, dessa forma, absorvidos (PEREIRA-MAIA et al., 2010).
Em casos de insuficiência hepática, o uso de fármacos deve ser evitado ou a dose
reajustada. Contudo, torna-se importante ressaltar que paracetamol nunca deve prescrito
nesse cenário, pois pode se apresentar hepatóxico (OLIVEIRA; ROCHA; ABREU,
2014).

Pacientes com doenças endócrinas

Os pacientes diabéticos, são o principal grupo de interesse, entre aqueles que


sofrem de doenças endócrinas, uma vez que, os acometidos apresentam diversas
manifestações orais: doença periodontal avançada, cáries dentárias, xerostomia,
rachadura de lábios, sensação de queimação em boca e língua, alteração do paladar,
infecções fúngicas e bacterianas, lesões de tecido mole e aumento da sensibilidade
(YAMASHITA et al., 2013).
Além disso, um cuidado especial deve ser tomado para com esses indivíduos, pois
devido serem usuários de insulina e hipoglicemiantes orais, podem ter o risco de
hipoglicemia, sendo interessante que as consultas sejam breves. Caso o indivíduo
apresente hipoglicemia durante a consulta odontológica, o recomendado é oferecer, de
modo imediato, carboidratos simples para elevação dos níveis de glicose na corrente
sanguínea. Ademais, o uso de anti-inflamatórios não esteroides e corticóides aumentam
os níveis de glicose, o que exige ponderação no momento de prescrever esse tipo de
medicamentos (SALVIANO et al., 2020).

Pacientes com doença renal crônica

Doenças renais podem causar alterações no processo de eliminação dos fármacos.


Nesse contexto, é importante considerar medidas de depuração de creatinina endógena.
O portador de doença renal crônica (DRC) é considerado qualquer indivíduo que
por um período igual ou superior a três meses apresente filtração glomerular <60
mL/min/1,73 m2 com ou sem lesão da estrutura renal, diagnosticado por meio de exames
de urina e imagem (BASTOS; BREGMAN; KIRSZTAJN, 2010). Nesses pacientes, o
ajuste de dose é imprescindível. Segue no Quadro 5 como o cálculo para ajuste da dose
pode ser realizado:

Quadro 5- Ajuste de dose para paciente com doença renal


DOSE IR = DOSE N x DCE/100
Legenda:
DOSE IR – Dose em presença de DRC (doença renal crônica)
DOSE N – Dose usual
DCE – Depuração de creatinina endógena
Fonte: Autor, 2022.

Ademais, cuidados especiais devem ser tomados com paciente hemodialisado,


como: consultar o médico para estabelecimento de plano terapêutico, realizar
procedimento eletivo um dia após tratamento dialítico, considerar profilaxia antibiótica,
realizar controle mecânico e químico do biofilme dentário, considerar medidas
hemostáticas em cirurgias, ajustar as doses dos medicamentos de acordo com nível da
disfunção renal, educação em saúde bucal e caso necessário controlar e oferecer suporte
ao paciente com xerostomia.

Pacientes com doença hematológica

Indivíduos com discrasias sanguíneas (hemofilia) têm maior risco de hemorragias,


devendo-se evitar o uso dos anti-inflamatório não esteroides e paracetamol devido a sua
hepatotoxicidade.
Para pacientes usuários de varfarina, fármaco responsável por inibir a coagulação
sanguínea, o uso de diversos princípios ativos deve ser evitado, pelo fato de
potencializarem sua ação e contribuírem para o aumento da probabilidade de
sangramentos. Dentre os fármacos associados a essa interação medicamentosa
desfavorável, é possível destacar: ácido acetilsalicílico, anti-inflamatório não esteroides,
paracetamol, cefalosporinas, eritromicina, azitromicina, tetraciclinas, ciprofloxacina e
metronidazol (BARBOSA et al., 2018).

Pacientes com HIV/AIDs e imunossupressão

Em pacientes com o vírus da imunodeficiência adquirida (HIV) em situação de


Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA), a antibioticoterapia é sempre indicada
como forma profilática (CORRÊA; ANDRADE, 2005).
Pacientes com Lupus Eritematoso Sistêmico também merecem cuidado especial,
uma vez que, são usuários crônicos de corticóides, o que contribui para quadros de
imunossupressão. Dessa forma, o desenvolvimento de infecções por microrganismos é
comumente observado, devendo-se sempre optar por antibioticoterapia profilática.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A terapêutica odontológica medicamentosa ou não-medicamentosa, apesar de ter


um caráter de escolha complementar e coadjuvante no tratamento de agravos à cavidade
oral, é decisiva quando bem aplicada para muitos quadros clínicos. O diagnóstico
acertado indicará ao cirurgião dentista o plano de tratamento adequado. Quando
necessário introduzir a prescrição terapêutica é indispensável que o profissional tenha um
conhecimento fundamentado de aspectos gerais da farmacologia e tenha a capacidade de
aplicá-los na prática clínica, considerando todas as particularidades relacionadas ao
tratamento individualizado dos pacientes, promovendo uma prescrição responsável
pautada na segurança e eficácia dos medicamentos.
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