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José Antônio Lima

Psicologia da
Educação

Elisabete Martins da Fonseca (janeiro/2013)


APRESENTAÇÃO

É com satisfação que a Unisa Digital oferece a você, aluno(a), esta apostila de Psicologia da Edu-
cação, parte integrante de um conjunto de materiais de pesquisa voltado ao aprendizado dinâmico
e autônomo que a educação a distância exige. O principal objetivo desta apostila é propiciar aos(às)
alunos(as) uma apresentação do conteúdo básico da disciplina.
A Unisa Digital oferece outras formas de solidificar seu aprendizado, por meio de recursos multidis-
ciplinares, como chats, fóruns, aulas web, material de apoio e e-mail.
Para enriquecer o seu aprendizado, você ainda pode contar com a Biblioteca Virtual: www.unisa.br,
a Biblioteca Central da Unisa, juntamente às bibliotecas setoriais, que fornecem acervo digital e impresso,
bem como acesso a redes de informação e documentação.
Nesse contexto, os recursos disponíveis e necessários para apoiá-lo(a) no seu estudo são o suple-
mento que a Unisa Digital oferece, tornando seu aprendizado eficiente e prazeroso, concorrendo para
uma formação completa, na qual o conteúdo aprendido influencia sua vida profissional e pessoal.
A Unisa Digital é assim para você: Universidade a qualquer hora e em qualquer lugar!

Unisa Digital
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO................................................................................................................................................ 5
1 RAÍZES HISTÓRICAS DA PSICOLOGIA..................................................................................... 7
1.1 Antecedentes.....................................................................................................................................................................8
1.2 Resumo do Capítulo.....................................................................................................................................................15
1.3 Atividades Propostas....................................................................................................................................................15

2 DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL E AFETIVO NA CONSTRUÇÃO DA


PERSONALIDADE.................................................................................................................................17
2.1 Teoria Psicodinâmica....................................................................................................................................................18
2.2 Teorias Humanistas.......................................................................................................................................................23
2.3 Resumo do Capítulo.....................................................................................................................................................25
2.4 Atividades Propostas....................................................................................................................................................26

3 EXERCÍCIO PARA REFLEXÃO........................................................................................................ 27


3.1 O Caso de Francisca......................................................................................................................................................27
3.2 Explicação do Caso de Francisca à Luz das Teorias...........................................................................................28
3.3 Resumo do Capítulo.....................................................................................................................................................29
3.4 Atividades Propostas....................................................................................................................................................29

4 NATUREZA DA APRENDIZAGEM E DO ENSINO.............................................................. 31


4.1 Resumo do Capítulo.....................................................................................................................................................32
4.2 Atividades Propostas....................................................................................................................................................32

5 A APRENDIZAGEM E O CENÁRIO ESCOLAR...................................................................... 33


5.1 Atividades Propostas....................................................................................................................................................34

6 A APRENDIZAGEM AO LONGO DA VIDA HUMANA.................................................... 35


6.1 Resumo do Capítulo.....................................................................................................................................................36
6.2 Atividades Propostas....................................................................................................................................................36

7 A APRENDIZAGEM NA PSICOLOGIA CONTEMPORÂNEA........................................ 37


7.1 Resumo do Capítulo.....................................................................................................................................................38
7.2 Atividades Propostas....................................................................................................................................................38

8 EDUCAÇÃO/APRENDIZAGEM..................................................................................................... 39
8.1 Resumo do Capítulo.....................................................................................................................................................40
8.2 Atividades Propostas....................................................................................................................................................40

9 TIPOS DE APRENDIZAGEM............................................................................................................ 41
9.1 Características Psicológicas Gerais da Aprendizagem....................................................................................41
9.2 Resumo do Capítulo.....................................................................................................................................................47
9.3 Atividades Propostas....................................................................................................................................................48
10 TEORIAS DE APRENDIZAGEM: ASSOCIACIONISTAS, S-R OU
COMPORTAMENTAIS......................................................................................................................49
10.1 O Conexionismo de Thorndike..............................................................................................................................49
10.2 O Condicionamento Operante de Skinner........................................................................................................50
10.3 Resumo do Capítulo..................................................................................................................................................51
10.4 Atividades Propostas.................................................................................................................................................51

11 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DE JEAN PIAGET............................................................... 53


11.1 Estágio Sensório-Motor (do nascimento aos 2 anos)....................................................................................55
11.2 Estágio Pré-Operacional (2 a 7 anos)...................................................................................................................57
11.3 Estágio Operacional-Concreto (7 a 11 anos)....................................................................................................58
11.4 Estágio Operacional-Formal (adolescência – idade adulta) ......................................................................59
11.5 Resumo do Capítulo..................................................................................................................................................60
11.6 Atividades Propostas.................................................................................................................................................61

12 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DE VYGOTSKY..................................................................... 63


12.1 Funções Psicológicas Superiores..........................................................................................................................63
12.2 Abordagem Sociointeracionista............................................................................................................................64
12.3 Níveis de Desenvolvimento para Vygotsky ......................................................................................................65
12.4 Zona de Desenvolvimento Proximal...................................................................................................................65
12.5 Algumas Implicações da Abordagem Vygotskiana para a Educação.....................................................66
12.6 Resumo do Capítulo .................................................................................................................................................74
12.7 Atividades Propostas.................................................................................................................................................76

13 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DE WALLON.......................................................................... 77


13.1 Introdução às Teorias de Henri Wallon................................................................................................................77
13.2 Os Estudos sobre Wallon .........................................................................................................................................78
13.3 Biografia do Autor.......................................................................................................................................................79
13.4 O Estudo da Normalidade a partir das Patologias..........................................................................................80
13.5 A Teoria de Desenvolvimento................................................................................................................................80
13.6 Algumas Implicações da Abordagem Walloniana para a Educação.......................................................85
13.7 Resumo do Capítulo..................................................................................................................................................92
13.8 Atividades Propostas.................................................................................................................................................93

14 A PSICOLOGIA E A ADOLESCÊNCIA..................................................................................... 95
14.1 Definição de Adolescência......................................................................................................................................95
14.2 Desenvolvimento Sexual.........................................................................................................................................96
14.3 Mudanças Cognitivas ...............................................................................................................................................96
14.4 Resumo do Capítulo .................................................................................................................................................96
14.5 Atividades Propostas.................................................................................................................................................97

15 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................................. 99
RESPOSTAS COMENTADAS DAS ATIVIDADES PROPOSTAS....................................101
REFERÊNCIAS............................................................................................................................................109
INTRODUÇÃO

Caro(a) aluno(a),

Buscando organizar esta disciplina, de forma a melhor favorecer a sua compreensão, apresentare-
mos os conteúdos da seguinte maneira:

ƒƒ Raízes Históricas da Psicologia;


ƒƒ Desenvolvimento Emocional e Afeto na Construção da Personalidade;
ƒƒ Teoria Psicodinâmica;
ƒƒ Teoria Humanista;
ƒƒ Natureza da Aprendizagem e do Ensino;
ƒƒ Aprendizagem e o Cenário Escolar;
ƒƒ Aprendizagem ao Longo da Vida Humana;
ƒƒ Aprendizagem na Psicologia Contemporânea;
ƒƒ Educação e Aprendizagem;
ƒƒ Tipos e Teorias da Aprendizagem.

Nesses capítulos, você encontrará, intencionalmente, palavras em destaque. Note que todas elas
são de uso frequente na Educação ou na Psicologia, mas atente para o período em que estão sendo usa-
das.

Atenção

A Psicologia é o estudo científico do comportamento e dos processos mentais. No final do século XX, a Psicologia
cresceu imensamente; surgiram novas tecnologias de pesquisa, novos campos de investigação e novas abordagens
para o estudo do comportamento e dos processos mentais. Esses avanços levaram a uma especialização maior dentro
da Psicologia, tornando sua contribuição ainda maior para o entendimento do ser humano e de sua existência.

Nesse sentido, um dos interesses da Psicologia era investigar como se processava a relação do de-
senvolvimento com a aprendizagem do homem em sua primeira idade: a criança. Partindo desse pressu-
posto, nasceu uma pergunta: onde se pode observar a criança em seu momento de maior disponibilida-
de ao desenvolvimento e à aprendizagem? A resposta para tal pergunta é: em um espaço que foi criado
e institucionalizado para ela aprender: a Escola.
Logo se percebeu que, para tentar responder às perguntas nascidas de observações feitas no espa-
ço escolar, necessitava-se de estudo específico que, embora pertencesse à ciência Psicologia, devesse ter
interesses particulares que se amarrassem aos interesses gerais dessa ciência: tem-se aí uma área deno-
minada Psicologia da Educação.

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Cabe, portanto, ao educador utilizar-se de co-


Atenção nhecimentos psicológicos para poder instrumentar-
-se e verificar que tipo de anacronismo envolve o pro-
A Psicologia da Educação é o ramo da Psicologia
que se voltou a investigar como se processa a re- cesso de ensino-aprendizagem. Uma vez verificado,
lação do desenvolvimento com a aprendizagem deve-se encaminhar o sujeito observado a um espe-
do homem em sua primeira idade: a criança.
cialista, que em conjunto com o educador apresenta-
rá um encaminhamento para a solução do problema.

Bem, agora é hora de conhecer os autores, suas teorias e suas sugestões de observação e análise
para o entendimento dos processos mentais e do comportamento.

Dessa forma, destaca-se como objetivo central Curiosidade


do nosso curso instrumentar futuros profissionais,
para atuação na educação, onde quer que ela ocorra A Psicologia da Educação constituiu, ao longo do
– em escolas, nos diversos níveis, ou mesmo numa século XX, uma área de conhecimento compro-
empresa. missada com as questões relacionadas à educa-
ção em geral e à educação escolar, em particu-
Os processos de constituição mentais são com-
lar. Sua maior preocupação foi, sem dúvida, o
plexos e se manifestam por meio de comportamen- fenômeno psicológico como elemento-chave na
tos. Cabe ao educador perceber tais comportamen- constituição do processo educacional.
tos, verificando-lhes interferências no processo de
ensino-aprendizagem e encaminhando o aprendiz
para um profissional competente.

Atenção

Caro(a) aluno(a), buscando organizar o curso de forma a melhor atender à sua compreensão, dividiu-se o conteúdo
da seguinte maneira:

• apresentaremos a história da Psicologia e como essa ciência desenvolveu-se ao longo da história da humanidade,
tópico no qual estudaremos as Ideias Psicológicas e seus principais pensadores;
• estabeleceremos uma linearidade temporal, partindo da Grécia Antiga até o final do século XIX, apresentando a
ciência psicológica e sua preocupação com o indivíduo;
• discutiremos as questões relativas ao desenvolvimento emocional e afetivo na construção da personalidade, a
partir do pensamento Psicodinâmico de Sigmund Freud e do pensamento humanista de Carl Roger;
• apresentaremos a natureza da aprendizagem e do ensino;
• estudaremos as Teorias de Aprendizagem e sua preocupação com indivíduo.

Os temas apresentados serão tratados à luz das teorias de Sigmund Freud, Carl Rogers, Jean Piaget,
Lev Vygotsky, Henri Wallon, Thorndike e Skinner.

Desejo-lhe um bom curso.

José Antônio Lima

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1 RAÍZES HISTÓRICAS DA PSICOLOGIA

Caro(a) aluno(a), volvimento são metas que só podem ser alcan-


Neste capítulo, estudaremos os antece- çadas se ocorrer aprendizagem em cada pessoa
dentes históricos da Psicologia, observando suas envolvida.
implicações para a reflexão educacional, tendo Hoje, entende-se que a Psicologia é uma
como foco a investigação sobre os processos ciência que traz em si áreas de estudo e interes-
mentais e a aprendizagem. se, que, como a Psicologia da Educação, se define
A aprendizagem constitui um dos princi- como tal por trazer objeto próprio de estudo. Se
pais objetos de preocupação dos cientistas que, você perguntar o que a Psicologia estuda? Como
nos laboratórios de Psicologia das universidades, resposta terá: os processos mentais observados
pesquisaram a vida mental e o comportamento. por meio do comportamento e desenvolvimen-
A maior parte dos comportamentos e conheci- to do indivíduo. Isso é o que essa ciência estuda
mentos exibidos pelos indivíduos é aprendida. Ao atualmente, contudo ela é nova, pois foi somente
longo do processo de desenvolvimento, cada ser em 1879 que Wilhelm Wundt fundou o primei-
humano adquire gradualmente uma infinidade ro laboratório de Psicologia na Universidade de
de competências, regras, informações e maneiras Leipzig, na Alemanha. Assim sendo, é só a partir
de lidar com as pessoas, coisas e situações, que daí que se pode falar em ciência da Psicologia.
resultam tanto de aprendizagem orientada de Contudo, muito antes desses estudos científicos
modo intencional, planejado, sistemático e con- em laboratórios de Psicologia, a aprendizagem
trolado, quanto de processos espontâneos e até foi objeto de reflexão e observação de pensado-
acidentais. res importantes na História da Humanidade. É im-
O ensino em escolas de todos os níveis e de portante conhecer um pouco dessas ideias sobre
qualquer modalidade, o treinamento e o desen- aprendizagem, que são denominadas Ideias Psi-
cológicas.

Saiba mais

Wilhelm Maximilian Wundt (Neckarau, 16 de agosto de 1832 – Großbothen, 31 de agosto de 1920) foi
um médico, filósofo e psicólogo alemão. É considerado um dos fundadores da moderna psicologia
experimental, junto a Ernst Heinrich Weber (1795-1878) e Gustav Theodor Fechner (1801-1889).
Entre as contribuições que o fazem merecedor desse reconhecimento histórico, estão a criação do
primeiro laboratório de psicologia no Instituto Experimental de Psicologia da Universidade de Leipzig
(Lipsia), na Alemanha, em 1879, e a publicação de Principles of physiological psychology (Princípios de
psicologia fisiológica), em 1873, no qual afirmava textualmente que seu propósito, com o livro, era de-
marcar um novo domínio da ciência (WIKIPÉDIA, 2012).

• Ideias Psicológicas são as contribuições elaboradas pelos estudiosos a partir de suas investigações, considerando a varie-
dade de formas e condições de aprendizagem, tendo em vista os processos mentais observados por meio do comporta-
mento e desenvolvimento do indivíduo.

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1.1 Antecedentes

Da Grécia Antiga, Sócrates, Platão e Aristó-


teles figuram entre os pensadores que legaram Saiba mais
à humanidade considerações importantes não
somente sobre a aprendizagem e o ensino, mas De acordo com a origem grega da palavra, Psicologia
significa o estudo ou discurso (logos) acerca da alma
a propósito de vários outros temas de caráter psi- ou espírito (psique). Buscando a origem do significado
cológico: percepção, memória, conhecimento, para a palavra ‘Psicologia’, entendemo-la como o estu-
imagem, linguagem, inteligência, emoção, rela- do do discurso acerca da alma, sendo esta o núcleo da
singularidade de cada ser: a Psique.
ções afetivas etc. Veja.
Sócrates é considerado o pai da Filosofia
Ocidental. Quem não “fugiu” das aulas de Filoso-
fia deve se lembrar da famosa Maiêutica, méto-
do pelo qual a ideia nascia de forma semelhante
a um parto, o que, aliás, é o significado para a pa-
lavra ‘maiêutica’.

Saiba mais

Sócrates (em grego antigo: Σωκράτης, transl. Sōkrátēs; Atenas, 469 a.C. – Atenas, 399 a.C.) foi um filósofo ateniense e um dos
mais importantes ícones da tradição filosófica ocidental. É considerado por muitos filósofos o modelo de filósofo. Não à toa, foi
o professor de Platão, um dos mais influentes filósofos da atualidade. Pouco se sabe ao certo sobre sua vida. As fontes mais im-
portantes de informações sobre Sócrates são fornecidas por Platão (alguns historiadores afirmam só se poder falar de Sócrates
como um personagem de Platão, por ele nunca ter deixado nada escrito de sua própria autoria) e Xenofonte, que o exaltam, e
por Aristófanes, que o combate e satiriza. Os diálogos de Platão retratam Sócrates como mestre que se recusa a ter discípulos
e um homem piedoso que foi executado por impiedade. Sócrates não valorizava os prazeres dos sentidos; todavia, escalava-se
o belo entre as maiores virtudes, junto ao bom e ao justo. Dedicava-se ao parto das ideias (Maiêutica) dos cidadãos de Atenas,
mas era indiferente em relação a seus próprios filhos (WIKIPÉDIA, 2012).

Saiba mais
A respeito da Maiêutica...
Sócrates comparava sua função com a profissão de sua mãe: parteira – aquela que não dá à luz a criança, apenas auxilia a
parturiente. “O parto das ideias” – expresso pela palavra ‘maiêutica’ – caracteriza o momento de busca da verdade, no qual o ser
humano busca o aprimoramento de suas ideias pela reflexão e pelo diálogo, numa construção compartilhada, por aproxima-
ções sucessivas, ampliando seu autoconhecimento e o seu conhecimento sobre o mundo.

É em sua busca pela verdade que se per- gens psicológicas racionalistas, que estão na base
cebem ideias psicológicas, pois para o filósofo a do cognitivismo – um exemplo é a teoria piage-
verdade está em cada indivíduo; este, portanto, tiana.
deverá realizar um exercício de análise interior
para descobrir a verdade. A tal processo pode-se
associar a subjetividade tão utilizada nas aborda-

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Psicologia da Educação

Curiosidade

“Para Sócrates o homem ao voltar-se para si mesmo chegaria à sabedoria, alcançando a auto-realização.
Sócrates concebia o homem por meio de dois princípios: alma (espírito) e corpo. Defensor do diálogo como método
de educação, considerava muito importante o contato direto com os interlocutores – o que é uma das possíveis ra-
zões para o fato de não ter deixado nenhum texto escrito. Suas idéias forma recolhidas principalmente por Platão, que
as sistematizou, e por outros filósofos que conviveram com ele. Sócrates se fazia acompanhar frequentemente por
jovens, alguns pertencentes as mais ilustres e ricas famílias de Atenas.
Para Sócrates, ninguém adquire a capacidade de conduzir-se, e muito menos de conduzir-se os demais, se não possuir
a capacidade de autodomínio. Depois dele, a noção de controle pessoal se transformou em um tema central da ética
e da filosofia moral. Também se formou aí o conceito de liberdade interior: livre é o homem que não se deixa escravizar
pelos próprios apetites e segue os princípios que, por intermédio da educação afloram de seu interior.” (REVISTA NOVA
ESCOLA, 2008).

Platão foi o maior discípulo de Sócrates. princípio fundamental acerca da aprendizagem


Segundo o filósofo, a verdadeira aprendizagem humana, pois, para Platão, cada um é responsá-
começa com um estado de espanto ou perplexi- vel por sua própria aprendizagem (muitos pensa-
dade impelindo a pessoa ao esforço do conheci- dores do século XX inspiraram-se nas ideias psico-
mento. Quando você se espanta diante de algo, o lógicas de Platão sobre aprendizagem para suas
acontecimento força você a pensar no que está teorias).
ocorrendo, possibilitando conhecê-lo. Daí seu

Saiba mais

Platão (em grego: Πλάτων, transl. Plátōn, “amplo”; Atenas, 428/427 a.C. – Atenas, 348/347 a.C.) foi um filósofo e matemático
do período clássico da Grécia Antiga, autor de diversos diálogos filosóficos e fundador da Academia em Atenas, a primeira
instituição de educação superior do mundo ocidental. Juntamente a seu mentor, Sócrates, e seu pupilo, Aristóteles, Platão
ajudou a construir os alicerces da filosofia natural, da ciência e da filosofia ocidental. Acredita-se que seu nome verdadeiro
tenha sido Arístocles; Platão era um apelido que, provavelmente, fazia referência à sua característica física, tal como o porte
atlético ou os ombros largos, ou, ainda, à sua ampla capacidade intelectual de tratar de diferentes temas, entre eles, a ética, a
política, a metafísica e a teoria do conhecimento. A sofisticação de Platão como escritor é especialmente evidente em seus diá-
logos socráticos; trinta e cinco diálogos e treze cartas são creditados tradicionalmente a ele, embora os estudiosos modernos
tenham colocado em dúvida a autenticidade de, pelo menos, algumas dessas obras. Essas obras também foram publicadas
em diversas épocas e das mais variadas maneiras, o que levou a diferentes convenções no que diz respeito à nomenclatura e
referenciação dos textos. Embora não exista qualquer dúvida de que Platão lecionou na Academia fundada por ele, a função
pedagógica de seus diálogos – se é que alguma existia – não é conhecida com certeza. Os diálogos, desde a época do próprio
Platão, eram usados como ferramentas de ensino nos tópicos mais variados, como filosofia, lógica, retórica, matemática, entre
outros (WIKIPÉDIA, 2012).

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Curiosidade

“Para o grego Platão (427-347 a.C.) o objetivo final da educação era a formação do homem moral, vivendo em um
Estado justo.
Platão foi o segundo da tríade dos grandes filósofos clássicos, sucedendo Sócrates (469-399 a.C.) e precedendo Aris-
tóteles, seu discípulo. Como Sócrates, Platão rejeitava a educação elitista que se praticava na Grécia em sua época.
A busca da virtude deve prosseguir pela vida inteira. Educar é imprescindível para uma ordem política baseada na
justiça, devendo ser a tarefa de toda a sociedade.
Platão defendia que os alunos buscassem as respostas, procurando pensar sobre as respostas a partir de perguntas
mobilizadoras.
A pedagogia de Platão se aproxima de sua filosofia, em que a busca da verdade é mais importante do que dogmas
incontestáveis. O processo dialético platônico, isto é, processo no qual ao longo do debate de idéias, depuram-se o
pensamento e os dilemas morais, também se relaciona com a procura de respostas durante o aprendizado.” (REVISTA
NOVA ESCOLA, 2008).

Aristóteles foi o filósofo que mais influen-


ciou o Ocidente. Foi discípulo de Platão e deixou Curiosidade
um variado número de assuntos relacionados às
ideias psicológicas, como: memória, sensação, Aristóteles reconhecia na imitação, isto é, na repe-
sono, sonhos. Aristóteles ressalta a importância tição, um princípio para a aprendizagem. Segun-
do ele, os bons hábitos formavam-se nas crianças
do exercício na aprendizagem, pois isso refor-
pelo exemplo dos adultos.
ça a memória, por meio da imitação, repetição
mental. Seus escritos sobre a associação de ideias
como formadoras de hábitos foram os pontos de
partida para o aparecimento da Psicologia Experi-
mental em 1879.

Saiba mais

Aristóteles (em grego: Aριστοτέλης, transl. Aristotélēs; Estagira, 384 a.C. – Atenas, 322 a.C.) foi um filósofo grego, aluno de Pla-
tão e professor de Alexandre, o Grande. Seus escritos abrangem diversos assuntos, como a física, a metafísica, as leis da poesia
e do drama, a música, a lógica, a retórica, o governo, a ética, a biologia e a zoologia. Juntamente a Platão e Sócrates (professor
de Platão), Aristóteles é visto como um dos fundadores da filosofia ocidental. Em 343 a.C., tornou-se tutor de Alexandre da
Macedônia, na época com 13 anos de idade, que seria o mais célebre conquistador do mundo antigo. Em 335 a.C., Alexandre
assumiu o trono e Aristóteles voltou para Atenas, onde fundou o Liceu (lyceum).
Aluno de Platão, Aristóteles discordava de uma parte fundamental da sua filosofia. Platão concebia dois mundos existentes:
aquele que é apreendido por nossos sentidos – o mundo concreto –, em constante mutação, e outro mundo – abstrato –, o
das ideias, acessível somente pelo intelecto, imutável e independente do tempo e do espaço material. Aristóteles, ao contrário,
defendia a existência de um único mundo: este em que vivemos. O que está além de nossa experiência sensível não pode ser
nada para nós (WIKIPÉDIA, 2012).

Após os gregos, encontra-se a influência


de pensadores romanos, em especial de Cícero
e Quintiliano, pois seus escritos foram de suma
importância para o ensino e a aprendizagem na
Roma Antiga.

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Curiosidade

O pensamento romano floresceu num ambiente de ócio (a vida sem trabalho proporcionada pela riqueza do Império
e pelo emprego da mão de obra escrava). Na Filosofia, os romanos elaboraram um pensamento eclético, uma mistura
de várias correntes de pensamento. Marco Túlio Cícero (106-43 a.C.) sustentava que deveria existir alguma forma de
conhecimento para assegurar o consenso, que fosse além de mecanismos de aprendizagem mecânicos e superficiais;
o que lhe importava não era o conhecimento das coisas por meio da razão, mas o que era razoável e conveniente para
os homens, a partir da reflexão e da observação, nas quais as aptidões naturais são consideradas.
• Entre os antigos romanos, educare significava criar ou nutrir crianças e estava ligado a outro verbo: edu-
cere – fazer sair, lançar, criar, amamentar.

Cícero opõe-se aos professores que, em na cultura geral, uma vez que criticava o ensino
seu tempo, eram preocupados apenas com a mecânico e superficial. Acreditava que o homem
transmissão de regras ou receitas. Era preocupa- deveria ser livre em seu aprendizado, consciente
do com a necessidade de observação e reflexão e de sua autonomia e responsável por seu conhe-
a importância de uma base educacional pautada cimento.

Saiba mais

Marco Túlio Cícero, em latim Marcus Tullius Cicero (Arpino, 3 de janeiro de 106 a.C. – Formia, 7 de dezem-
bro de 43 a.C.), foi um filósofo, orador, escritor, advogado e político romano. Cícero é normalmente visto
como uma das mentes mais versáteis da Roma Antiga. Foi ele quem apresentou aos romanos as escolas
da filosofia grega e criou um vocabulário filosófico em latim, distinguindo-se como um linguista, tradutor e
filósofo. Um orador impressionante e um advogado de sucesso, Cícero provavelmente pensava que a sua
carreira política era a sua maior façanha. Hoje em dia, ele é apreciado principalmente pelo seu humanismo
e trabalhos filosóficos e políticos (WIKIPÉDIA, 2012).

Quintiliano acreditava que o ambiente e as ensino individualizado. Contudo é defensor de


pessoas que cercam a criança desde seus primei- uma educação sem frivolidades: o ensino deve
ros anos de vida eram essenciais para seu apren- ser vigoroso e rigoroso. Também versa sobre a
dizado e seu desenvolvimento, acreditava que os importância do exercício como o segredo de uma
jogos eram vantajosos para a educação infantil e boa memória.

Saiba mais

Marcus Fabius Quintilianus nasceu em Caagurris (Calahorra, atual Espanha) e viveu de 30 a 95. Escritor e retórico latino, es-
tudou em Roma, onde primeiro foi advogado. Tornou-se conhecido por ter sido professor de retórica. Um de seus alunos foi
o orador romano Plinio, o Jovem. Depois de ser, por vinte anos, advogado e professor, retirou-se para escrever. Ficou famoso
pelo Institutio oratoria (c. 95), grande obra redigida em 12 volumes. Nos dois primeiros livros, Quintiliano trata da educação
fundamental e como se organizava a vida na Roma de seu tempo; recomenda que se ensinem, simultaneamente, os nomes
das letras e as suas formas, é contrário aos castigos físicos; recomenda a emulação como incentivo para o estudo; e sugere que
o tempo escolar seja periodicamente interrompido por recreios, já que o descanso é, na sua opinião, favorável à aprendizagem.
O Livro X é o mais conhecido; nele, Quintiliano aconselha a leitura como elemento fundamental na formação de um orador,
bem como apresenta uma pesquisa sobre as pessoas que escreveram em grego e latim. No último livro, apresenta o conjunto
de qualidades que deve reunir quem se dedicar à Oratória, tanto no que se refere à conduta quanto ao caráter. Sua obra exer-
ceu grande influência sobre a teoria pedagógica que sustenta o humanismo e o renascimento.

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É imensa sua contribuição para a compreen- foi da própria Igreja que foram recuperados os
são do ser humano em sua constituição, mesmo pensadores cujas ideias influenciaram o pensar
que durante muito tempo essas informações psicológico no que diz respeito à aprendizagem
tenham ficado em segredo por parte da maior e ao ensino, mesmo que suas ideias visassem es-
instituição daquela época: a Igreja. Desse modo, sencialmente à formação do cristão.

Saiba mais

Aurélio Agostinho (em latim, Aurelius Augustinus), dito de Hipona e conhecido como Santo Agostinho (Tagaste, 13 de
novembro de 354 – Hipona, 28 de agosto de 430), foi um bispo, escritor, teólogo, filósofo, padre latino e doutor da Igreja Ca-
tólica. Agostinho foi uma das figuras mais importantes no desenvolvimento do cristianismo no Ocidente. Seu pensamento
influenciou profundamente a visão do homem medieval. A Igreja identificou-se com o conceito de “Cidade de Deus” de Agos-
tinho, como também a comunidade que era devota de Deus. Na Igreja Católica e na Igreja Anglicana, é considerado um santo,
um importante Doutor da Igreja e o patrono da ordem religiosa agostinha. Muitos protestantes, especialmente calvinistas,
consideram-no um dos pais teólogos da Reforma Protestante, ensinando a salvação e a graça divina (WIKIPÉDIA, 2012).

Santo Agostinho acreditava na iluminação São Tomás de Aquino surgiu oito séculos
interior como condição básica para a aprendiza- depois do colega padre Santo Agostinho, e acre-
gem. A seu ver, só aprendemos de fato quando ditava que adquirimos conhecimento por duas
somos espiritualmente iluminados, não cabe aos vias: interior, no caso de quem procura apren-
professores ensinar nada, mas apontar os ensina- der por meio de sua própria busca, e exterior, no
mentos por meio da provocação e do estímulo. caso de quem busca o aprendizado por meio da
Agostinho propunha que os professores ensinas- instrução de alguém. Acreditava que toda apren-
sem com calma e satisfação, sem aulas enfado- dizagem precede do conhecimento anterior,
nhas e chatas. portanto para se aprender deve-se respeitar a ca-
pacidade de aprender de cada um. Segundo esse
Padre, o conhecimento é obtido por meio do en-
sino e também da descoberta.

Curiosidade

“Tomás de Aquino é uma figura simbólica de seu tempo na medida em que representou como ninguém a tensão
entre a tradição cristã medieval e a cultura que se formava no interior de uma nova sociedade. Sua obra mais impor-
tante, apesar de não concluída, é a Suma Teológica, na qual revê a teologia cristã sob a nova ótica, seguindo o princípio
aristotélico de que cabe à razão ordenar e classificar o mundo para entendê-lo. Eis o princípio do tomismo, como é
chamada a filosofia inaugurada por Tomás de Aquino.
A relação entre razão e fé está no centro dos interesses do filósofo. Para ele, embora esteja subordinada à fé, a razão
funciona por si mesma, segundo as próprias leis. Ou seja, o conhecimento não depende da fé nem da presença de
uma verdade divina no interior do indivíduo, mas é um instrumento de se aproximar de Deus.” (REVISTA NOVA ESCOLA,
2008).

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Psicologia da Educação

João Amós Comênio é conhecido como sensoriais e a fala, e finalmente para os jovens
o pai da Didática, pois foi o precursor do ensino de 18 a 25 anos, estudos mais aprofundados e
audiovisual e da pedagogia moderna; acreditava específicos. Para Comênio, o ensino deve partir
que o sistema escolar deveria ser aberto a todas de fatos práticos e claros que levem o aprendiz
as crianças dos 6 aos 12 anos; e dava importância a dedicar-se a uma atividade autônoma e autor-
à inteligência, à imaginação e à memória. Para os reguladora. Tudo deve ser apresentado ao aluno
jovens dos 12 aos 18 anos, deveria existir a esco- por meio de seus sentidos. Vê-se a importância
la secundária, que se preocuparia com os órgãos da experiência e a associação das ideias.

Saiba mais

“O nome Comênio é o aportuguesamento da assinatura latina de Jan Amos Comenius, nascido em 1592 na Moravia, Repú-
blica Tcheca.
Comênio é conhecido como o pai da Didática Moderna. O filósofo tcheco defendeu o ensino de ‘tudo para todos’ e foi o pri-
meiro teórico a respeitar a inteligência e os sentimentos da criança.
A obra mais importante de Comênio, ‘Didactica Magna’, marca o início da sistematização da pedagogia e da didática no Oci-
dente.
No livro, o pensador realiza uma racionalização de todas as ações educativas, indo da teoria didática até as questões do coti-
diano da sala de aula.
A prática escolar, para ele, deveria imitar os processos da natureza. Nas relações entre professor e aluno, seriam consideradas
as possibilidades e os interesses da criança. O professor passaria a ser visto como um profissional, não como um missionário.
A organização do tempo e do currículo levaria e conta os limites do corpo e a necessidade, tanto dos alunos quanto dos pro-
fessores.” (REVISTA NOVA ESCOLA, 2008).

No século XVII, entraram pensadores que


deram grande relevância às ideias de aprendiza-
gem e ensino. Esses pensadores são chamados
empiristas.

Saiba mais

Empiristas são os adeptos do empirismo. Na filosofia, Empirismo é um movimento que acredita nas experiências como
únicas (ou principais) formadoras das ideias, discordando, portanto, da noção de ideias inatas.
O empirismo é descrito/caracterizado pelo conhecimento científico e a sabedoria é adquirida por percepções; pela origem
das ideias, por onde se percebe as coisas, independentemente de seus objetivos e significados; pela relação de causa-efeito,
por onde fixamos na mente o que é percebido, atribuindo à percepção causas e efeitos; pela autonomia do sujeito, que afirma
a variação da consciência de acordo com cada momento; pela concepção da razão, que não vê diferença entre o espírito e
extensão, como propõe o Racionalismo; e, ainda, pela matemática, como linguagem que afirma a inexistência de hipóteses.
Na ciência, o empirismo é normalmente utilizado quando falamos no método científico tradicional (que é originário do em-
pirismo filosófico), o qual defende que as teorias científicas devem ser baseadas na observação do mundo, em vez de na
intuição ou na fé, como lhe foi passado.
O termo tem uma etimologia dupla. A palavra latina ‘experientia’, da qual deriva a palavra ‘experiência’, é originária da expressão
grega εμπειρισμός. Por outro lado, deriva-se também de um uso mais específico da palavra ‘empírico’, relativo aos médicos,
cuja habilidade deriva da experiência prática e não da instrução, da teoria (WIKIPÉDIA, 2012).

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José Antônio Lima

John Locke acreditava que a mente de uma -las, enquanto viver [...]. A escuridão para
criança recém-nascida era uma tábula rasa, uma sempre trará consigo essas idéias ame-
drontadoras, e ficarão tão unidas que não
lousa limpa. Para ele, todo o conhecimento era
se poderá suportar nem uma, nem a ou-
adquirido por meio de experiências sensoriais. tra. (LOCKE, 1700 apud HERRNSTEIN; BO-
Para esse filósofo, a aprendizagem e a memória RING, 1971, p. 410-411).
dependem da associação de ideias, já que estas
se sucedem no pensamento em virtude de liga-
É claro que as contribuições para as ideias
ções naturais ou racionais. O próprio Locke dá um
psicológicas não se resumiram apenas a esses
exemplo:
grandes pensadores, entretanto, aqui, o objetivo
é mostrar em linhas gerais que a Psicologia pode
[...] as idéias de duendes e fantasmas, na
ser apresentada da seguinte forma: antes do fim
realidade, não têm mais a ver com a es-
curidão do que com a luz; no entanto, se do século XIX, em que o que foi produzido e se
uma pajem tola inculca freqüentemente relacionava com a Psicologia era conhecido por
essas idéias na mente de uma criança e Ideias Psicológicas, e a partir de 1879, com as des-
faz com que se desenvolvam juntas, tal- cobertas de Wundt, quando a Psicologia passa a
vez a criança nunca seja capaz de separá-
ser considerada uma ciência.

Saiba mais
“No século 19, destaca-se o papel da ciência e seu avanço torna-se necessário. O crescimento da nova ordem econômica – o
capitalismo – traz consigo o processo de industrialização, para o qual a ciência deveria dar respostas e soluções práticas no
campo da técnica. Há, então, um impulso muito grande para o desenvolvimento da ciência, como um sustentáculo da nova
ordem econômica e social, e dos problemas colocados por ela.” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2001, p. 36).

Saiba mais

“John Locke (1632-1704) foi um pensador inglês que concebia que a criança teria sua mente como uma tela em branco, que
o professor deveria preencher, fornecendo informações e vivências. Influenciou a política ao introduzir o liberalismo. Foi o
autor de dois tratados de governo que sustentaram a implantação da monarquia parlamentarista na Inglaterra, inspiraram a
Constituição dos Estados Unidos e anteciparam as idéias dos iluministas franceses. Na filosofia, construiu uma teoria do conhe-
cimento inovadora, que investigou o modo como a mente capta e traduz o mundo exterior. Na educação, compilou uma série
de preceitos sobre aprendizado e desenvolvimento, com base em sua experiência de médico e preceptor, que teve grande
repercussão nas classes emergentes de seu tempo.
Para Locke o aprendizado depende primordialmente das informações e vivências às quais a criança é submetida e que ela
absorve de modo relativamente previsível e passivo. É, portanto, um aprendizado de fora para dentro. O conhecimento seria
atingido somente pela razão. Os princípios morais derivariam de considerações a respeito do que é vantajoso para o indivíduo
e para a coletividade.
A educação teria um papel imprescindível para a formação da criança, que sozinha não teria condições de aprender.” (REVISTA
NOVA ESCOLA, 2008).

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Psicologia da Educação

1.2 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a),
A Psicologia da Educação é uma disciplina que pode auxiliar o trabalho educacional, à medida que
apresenta abordagens de estudo do comportamento humano, especialmente, na forma como a apren-
dizagem ocorre, considerando a singularidade humana.
Como pedagogos, não realizaremos uma análise clínica dos comportamentos de nossos alunos,
mas faz-se necessário observarmos, atenta e sensivelmente, suas atitudes, comportamentos, aprendi-
zagens e interações. Nosso objetivo é favorecer o processo de desenvolvimento integral das crianças e
jovens com quem trabalhamos, tendo como apoio as investigações sobre as aprendizagens.
A aprendizagem constitui um dos principais objetos de preocupação dos cientistas que, nos labo-
ratórios de Psicologia das universidades, pesquisaram a vida mental e o comportamento. A maior parte
dos comportamentos e conhecimentos exibidos pelos indivíduos é aprendida. Ao longo do processo
de desenvolvimento, cada ser humano adquire, gradualmente, uma infinidade de competências, regras,
informações e maneiras de lidar com as pessoas, coisas e situações, que resultam tanto de aprendizagem
orientada de modo intencional, planejado, sistemático e controlado, quanto de processos espontâneos
e até acidentais.
O ensino em escolas de todos os níveis e modalidades, o treinamento e o desenvolvimento são
metas que só podem ser alcançadas se ocorrer a aprendizagem em cada pessoa envolvida.
Conhecer os aspectos históricos que permearam a produção científica e filosófica amplia e apro-
funda nossa compreensão sobre a investigação psicológica.
Em nossa retrospectiva histórica e filosófica, acompanhamos, até a Modernidade, as diferentes
concepções que influenciaram as raízes históricas da Psicologia, de maneira geral.

1.3 Atividades Propostas

1. Do que trata a Psicologia da Educação?

2. Qual é a relação entre o Ensino e a Aprendizagem do ponto de vista geral da Psicologia da


Educação?

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DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL
2 E AFETIVO NA CONSTRUÇÃO DA
PERSONALIDADE

Caro(a) aluno(a),
Atenção
Neste capítulo, trataremos do estudo da
personalidade, considerando as contribuições da Muitos psicólogos definem a personalidade
Teoria Psicodinâmica. como um padrão singular de pensamentos, sen-
timentos e comportamentos de um indivíduo,
Nós falamos de personalidade todo o que persiste através do tempo e das situações.
tempo. Descrevemos nosso melhor amigo como
divertido e tranquilo ou do tipo esportista e muito
meigo. Perdemos a Copa do Mundo em 2006 e Os psicólogos abordam o estudo da perso-
foi comum ouvir: O Parreira não teve personali- nalidade de várias maneiras. Alguns tentam iden-
dade para montar um time bom ou O Ronaldinho tificar as características mais importantes. Outros
Gaúcho só joga com personalidade no Barcelona. procuram entender por que existem diferenças
Descrevemos as pessoas que não conhecemos de personalidade. Dentro desse segundo grupo,
tão bem de modo generalizado: Ele é esnobe alguns psicólogos identificam a família como o
e arrogante ou Ela tem o rei na barriga. Em rela- fator mais importante no desenvolvimento da
ção às crianças, procedemos de maneira seme- personalidade de um indivíduo, e outros enfati-
lhante: Esse aluno é inibido e introspectivo ou As zam as influências ambientais externas à família,
alunas dessa sala são assanhadas demais; e em e ainda tem aqueles que consideram a personali-
alguns casos determinamos: Esse é burro ou Não dade o resultado da maneira como aprendemos
terá condições de aprender nunca. Entretanto, não a pensar a respeito de nós mesmos e de nossas
serão essas breves caracterizações que determi- experiências.
narão a personalidade do educando, pois a per- Neste módulo, trataremos de duas das prin-
sonalidade é composta por um conjunto de ca- cipais teorias da personalidade: a Teoria Psicodi-
racterísticas. nâmica, à luz do pensamento de Sigmund Freud,
Muitos psicólogos definem a personalida- e a Teoria Humanista, à luz da obra de Carl Rogers.
de como um padrão singular de pensamentos,
sentimentos e comportamentos de um indiví-
duo, que persiste através do tempo e das situa-
ções. É preciso atentar-se para dois pontos nessa
definição. Por um lado, a personalidade refere-se
a diferenças singulares – aqueles aspectos que
distinguem uma pessoa de todas as outras. Por
outro lado, a definição afirma que a personali-
dade é relativamente estável e duradoura, pois
essas diferenças individuais dificilmente mudam.

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2.1 Teoria Psicodinâmica

Iniciaremos este capítulo apresentando a abriu um consultório em Viena e constatou que


Teoria Psicodinâmica sobre a construção da diversas doenças nervosas tinham origens psico-
Personalidade de Sigmund Freud (1856-1939). lógicas e não fisiológicas. Tais observações clíni-
O termo foi cunhado pelo próprio teórico para cas o levaram a desenvolver uma ampla teoria da
designar o estudo da energia psíquica e de sua vida mental, diferenciando radicalmente de seus
transformação e manifestação no comportamen- contemporâneos.
to. Embora muitos dos postulados de Freud este-
jam ultrapassados, é, sem sobra de dúvida, o autor Atenção
Psicodinâmico mais conhecido no mundo. Freud
se formou em Medicina e era fascinado pelo SNC A Teoria Psicodinâmica sobre a construção da
Personalidade, de Sigmund Freud (1856-1939),
– medula espinhal e cérebro –, e passava horas
foi criada para designar o estudo da energia psí-
estudando no laboratório de Psicologia da Uni- quica e de sua transformação e manifestação no
versidade de Viena. Após se formar como médico, comportamento.

Saiba mais

“Em 1900, no livro ‘A Interpretação dos Sonhos’, Freud apresenta a primeira concepção sobre a cultura e o funcionamento
psíquicos. Essa teoria refere-se à existência de três sistemas ou instâncias psíquicas: inconsciente, pré-consciente e consciente.
• O inconsciente exprime o ‘conjunto dos conteúdos não presentes no campo atual da consciência’ (LAPLANCHE, J. e PON-
TALIS, J.). É constituído por conteúdos reprimidos, que não têm acesso aos sistemas pré-consciente/consciente, pela ação
de censuras internas. Esses conteúdos podem ter sido conscientes em algum momento, e terem sido reprimidos, isto é,
foram para o inconsciente, ou podem ser genuinamente inconscientes. O inconsciente é um sistema do aparelho psíqui-
co regido por leis próprias de funcionamento. Por exemplo, é atemporal, não existem as noções de passado e presente.
• O pré-consciente refere-se ao sistema em que permanecem os conteúdos acessíveis à consciência. É aquilo que não está
na consciência nesse momento, mas no momento seguinte pode estar.
• O consciente é o sistema do aparelho psíquico que recebe ao mesmo tempo as informações do mundo exterior e as do
mundo interior. Na consciência, destaca-se o fenômeno da percepção, principalmente a percepção do mundo exterior, a
atenção e o raciocínio.” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2001, p. 73).

Freud acreditava que os seres humanos -arbítrio não opera, assim o indivíduo já não mais
não eram tão racionais quanto seus antecessores comanda de forma racional seu comportamento,
pensavam e que o livre-arbítrio era uma grande são seus instintos e impulsos que falam mais alto.
ilusão. Em vez disso, o indivíduo era motivado por
instintos e impulsos inconscientes, que não esta-
vam disponíveis na parte racional e consciente da Dicionário
sua mente. Freud destaca dois momentos distin-
Livre-arbítrio: é a possibilidade de exercer um po-
tos no modo como a mente funciona: o conscien- der sem outro motivo que não a existência mesma
te, em que o livre-arbítrio impera, o que significa desse poder; é a liberdade de escolha e tomada de
dizer que o indivíduo tem clareza e decide sobre decisão do sujeito (FERREIRA).
o que vai fazer; e o inconsciente, no qual o livre-

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Psicologia da Educação

Atenção Atenção

Psicanálise é um termo criado por Freud, que se Outro elemento importante na psicanálise é o in-
refere tanto à teoria quanto ao método investiga- sight – tornar consciente o que antes não estava
tivo e terapêutico criados por ele para o tratamen- em sua consciência.
to de pessoas. Enquanto teoria, caracteriza-se por
um conjunto de conhecimentos sistematizados
sobre o funcionamento da vida psíquica.
Estruturas da Personalidade

Para o estudo dessa nova teoria acerca do A Personalidade é formada a partir de três
comportamento humano, Freud criou a Psicaná- estruturas: o Id, o Ego e o Superego. O Id, a úni-
lise. Termo que se refere tanto à teoria quanto ao ca estrutura presente no nascimento, é comple-
método investigativo e terapêutico criado por ele tamente inconsciente. Na visão do teórico, o id
para o tratamento das pessoas. Segundo Freud, o consiste de desejos e impulsos que buscam ex-
comportamento humano baseia-se nos impulsos pressar-se permanentemente. Ele age de acordo
ou instintos inconscientes, sendo que alguns são com o princípio do prazer, isto é, procura obter
destrutivos e outros, tais como a fome, sede, au- prazer imediato e evitar a dor. Assim que surge
topreservação e o sexo, são necessários à sobrevi- o instinto, o id tenta satisfazê-lo. Contudo, como
vência do indivíduo e da espécie. Embora muitas o id não está no mundo real, ele se gratifica por
vezes interpretado de forma superficial, Freud meio de ações reflexas (aquelas que estão condi-
utilizava o termo ‘instintos sexuais’ para se referir cionadas a se fazer sem pensar), como, por exem-
não somente à sexualidade erótica, mas também plo, tossir, aliviando uma sensação desagradável,
ao desejo de obter praticamente qualquer forma ou por meio de uma fantasia, ou seja, aquilo que
de prazer. Portanto, para Freud, o instinto sexual Freud chama de realização do desejo.
é o fator mais crítico no desenvolvimento da per-
sonalidade. Na psicanálise freudiana, o cliente é
instruído a falar sobre o que vem à mente, com
Dicionário
o mínimo de preparação possível e sem inibir ou
controlar os pensamentos e as fantasias. Esse pro- Ego: palavra latina para eu. Em psicanálise, é o ele-
cesso é denominado Livre Associação. À medida mento da psique que proporciona a integração da
personalidade, mediando entre o id e o supere-
que as pessoas vão expondo seus sentimentos go, bem como intermediando os vínculos com o
em relação a suas fantasias e desejos para o tera- mundo externo (GLASSMAN; HADAD, 2008).
peuta, inicia-se o processo de transferência, pois Id: na teoria de Freud, é o elemento da psique que
o paciente transfere para o terapeuta seus senti- é a fonte de todas as pulsões básicas (GLASSMAN;
HADAD, 2008).
mentos em relação a figuras de autoridades de
Superego: na teoria de Freud, é aquela porção da
sua infância. Esse processo de transferência pode psique que representa as exigências morais da fa-
ser positivo ou negativo. Outro elemento impor- mília e da sociedade e, por isso, é governado pelas
restrições morais (GLASSMAN; HADAD, 2008).
tante na psicanálise é o insight – tornar conscien-
te o que antes não estava em sua consciência.

Dicionário

Livre associação: técnica criada por Freud para es-


tudar a mente, baseada em solicitar à pessoa que
simplesmente diga quaisquer palavras que ve-
nham à sua mente e, então, buscar padrões (GLAS-
SMAN; HADAD, 2008).

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Saiba mais

“A realização dos desejos, na teoria de Freud, é a expressão simbólica das pulsões sob a forma de fantasia, como nos sonhos.
O princípio do prazer é a descrição que Freud dá à base da motivação humana, na qual o ser humano é direcionado para a
busca do prazer.
De todas as forças biológicas básicas, Freud acreditava que a sexualidade era a mais poderosa, sendo a força central no com-
portamento, a fonte de energia das pulsões, a libido.” (GLASSMAN; HADAD, 2008).

A realização do desejo acontece quando Contudo, uma personalidade que consiste


uma pessoa forma uma imagem mental de um somente de id e ego é totalmente egoísta, irá se
objeto ou uma situação que lhe gratifica parcial- comportar de maneira eficaz, porém não sociá-
mente, sendo que o instinto alivia a sensação de vel. Um comportamento adulto é governado pela
tensão. Pode ocorrer em sonhos e devaneios, realidade, mas também pela moralidade, isto é,
mas também pode ser de outras formas. Exem- pela consciência do indivíduo ou pelos padrões
plo: quando alguém o insulta e você passa a meia morais que o indivíduo desenvolve na interação
hora seguinte imaginando como poderia ter res- com seus pais e a sociedade. Freud chamou esse
pondido a esse insulto, você está em um processo “cão de guarda” de superego.
de realização do desejo. Esse mecanismo não está presente quando
Freud concebeu o Ego como o mecanismo o indivíduo nasce, pois, como ele é moral, é ad-
psíquico que controla todas as atividades do pen- quirido ao longo da convivência em sociedade.
samento e do raciocínio. O ego age de maneira As crianças pequenas são amorais e fazem aqui-
parcialmente consciente, pré-consciente e in- lo que lhes dá prazer. Conforme amadurecem,
consciente. O pré-consciente refere-se ao conteú- assimilam como suas as opiniões de seus pais a
do que não se encontra no nível do consciente, respeito do que é bom e do que é mau. Com o
mas pode ser recuperado facilmente. tempo, a repressão externa aplicada pelos pais
O ego aprende a respeito do mundo exter- dá lugar à própria autorrepressão. É aí que entra
no por meio dos sentidos e procura satisfazer os o superego, agindo como consciência, assumin-
impulsos do id no mundo externo. Porém, em vez do o papel de observar e guiar o ego, agindo no
de agir de acordo com o princípio do prazer, ele consciente, pré-consciente e inconsciente.
age de acordo com o princípio da realidade, por De maneira ideal, o id, ego e superego tra-
meio do raciocínio inteligente. O ego tenta adiar balham em harmonia, com o ego satisfazendo as
a satisfação dos desejos do id até poder fazê-lo de necessidades do id de maneira razoável, moral e
maneira segura e bem-sucedida. Por exemplo: se aprovada pelo superego. O indivíduo é livre para
uma pessoa estiver dentro de um ônibus e sentir amar, odiar e expressar suas emoções de modo
sede, o ego tentará retardar esse desejo enquan- sensato e sem culpa. Quando o id é dominante,
to não julgar seguro tomar água. os instintos ficam fora de controle e o indivíduo
tem mais probabilidade de colocar a si e a socie-
dade em perigo.
Dicionário

Princípio da realidade: na teoria de Freud, é as


Desenvolvimento da Personalidade
restrições impostas ao ego pelo reconhecimento
das demandas do ambiente (GLASSMAN; HADAD,
2008). O desenvolvimento da Personalidade na
teoria de Freud concentra-se na maneira como
satisfazer o instinto sexual no decorrer da vida.

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Psicologia da Educação

Freud considerava o instinto sexual de ma- A maneira como o adulto trata a criança
neira ampla, como um forte desejo de obter to- em relação a uma determinada área de prazer do
dos os tipos de prazer sensual. Ele denominava a corpo (privação do prazer ou muita gratificação)
energia gerada pelo instinto sexual de libido. pode gerar uma fixação. Freud identificou fases
À medida que os bebês crescem, a sua libi- psicossexuais que relacionou com o desenvolvi-
do concentra-se em diferentes regiões sensíveis mento da personalidade.
do corpo. Durante os primeiros 18 meses, a fonte
dominante de prazer sensual é a boca; após 18 Dicionário
meses, a sexualidade move-se para o ânus; e, por
Fixação: é a liberação incompleta da energia pul-
volta dos 3 anos, move-se para os genitais. Para
sional associada a uma fase particular do desen-
Freud, as experiências das crianças em cada uma volvimento, resultando em uma preferência por
dessas fases marcam sua personalidade com ten- esse modo de gratificação (GLASSMAN; HADAD,
2008).
dências que permanecem até sua fase adulta.

Saiba mais

“Para entender o modelo do desenvolvimento de Freud, deve-se ter em mente a importância que ele atribuía às pulsões
biológicas. Durante toda a vida, nosso comportamento é motivado pela necessidade de satisfazer nossas pulsões básicas; no
entanto, Freud acreditava que a expressão destas pulsões muda no decorrer de nossas vidas. Os objetos que são o foco de
gratificação mudam, como também o modo de gratificação – isto é, a área do corpo que é o centro da gratificação. Para en-
tender isso, é importante observar que a sexualidade não é simplesmente a estimulação genital. É também expressada através
de muitas partes do corpo, chamadas zonas erógenas. Mesmo como adultos podemos extrair prazer de nossa pele – um pano
frio aplicado ao pescoço em um dia quente, um toque leve no braço para nos tranqüilizar e muitas outras experiências. Mas,
em determinados pontos durante o desenvolvimento, a energia da pulsão estará concentrada particularmente em regiões es-
pecíficas do corpo (zonas erógenas). Freud afirmou que são as mudanças no modo de gratificação, associadas com as diferen-
tes zonas erógenas, que definem as fases de desenvolvimento. Como estas fases refletem diferenças na expressão da energia
da pulsão (sexual), associadas com mudanças no funcionamento da mente (psique), elas são chamadas de fases psicossexuais
do desenvolvimento.” (GLASSMAN; HADAD, 2008).

ƒƒ Fase Oral – do nascimento aos 18 Saiba mais


meses
“Fase Oral, na teoria do desenvolvimento de Freud, é a
Os bebês, que dependem completamente
primeira fase, estendendo-se desde o nascimento até
de outras pessoas para satisfazer suas necessida- os dezoito meses, quando o foco da gratificação está
des, aliviam sua tensão sexual ao sugar e engolir; na boca. Um bebê recém-nascido é governado por
suas pulsões, ou seja, somente o id está presente no
quando nascem os primeiros dentes, eles sentem
nascimento.” (GLASSMAN; HADAD, 2008).
prazer oral ao mastigar e morder.

ƒƒ Fase Anal – aproximadamente dos 18


Saiba mais
meses aos 3 anos e meio
A fonte primária de prazer sexual passa para “Fase Anal é a segunda fase do desenvolvimento
o ânus. Justamente quando as crianças aprendem psicossexual; durante esta fase, o foco da energia da
a sentir prazer ao reter ou excretar fezes, começa pulsão desloca-se para a extremidade inferior do trato
digestivo, e o principal conflito é o treinamento do uso
o treino de toalete e elas devem aprender a regu- do banheiro.” (GLASSMAN; HADAD, 2008).
lar esse novo prazer.

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ƒƒ Fase Fálica – após os 3 anos Complexo de Electra, que envolve o amor pos-
As crianças descobrem seus genitais e de- sessivo pelo pai e o ciúme da mãe.
senvolvem uma forte ligação com o genitor do Freud acreditava que, no final da fase fálica,
sexo oposto, ao mesmo tempo que sentem ciú- as crianças perdem o interesse pelo comporta-
me do genitor do mesmo sexo. No caso dos me- mento sexual e entram em um período de Latên-
ninos, Freud chamou esse conflito de Complexo cia. Durante esse período, que começa por volta
de Édipo, em homenagem ao personagem da dos 5 ou 6 anos e termina aos 12 ou 13 anos, os
mitologia grega que matou o pai e casou-se com meninos brincam com meninas sem nenhum in-
a mãe. As meninas passam pelo equivalente, o teresse pelo outro.

Saiba mais

“Fase Fálica é a terceira fase do desenvolvimento, estendendo-se mais ou menos dos três aos cinco anos, período em que a
gratificação está concentrada nos genitais, embora não na forma da sexualidade do adulto.
Complexo de Édipo, na teoria do desenvolvimento de Freud, é o principal conflito associado com a fase fálica que desafia o
ego em desenvolvimento; é assim chamado devido à história grega de Édipo, que sem saber, matou seu pai e se casou com
a mãe. O foco central do complexo de Édipo é a ligação com os pais, que como, cuidadores, tornaram-se o foco da energia
pulsional (e, por isso, da atração).
Complexo de Electra, embora a dinâmica do conflito seja um pouco diferente para os meninos e meninas, Freud usou o ter-
mo complexo de Édipo para se referir aos dois sexos. Logo em seguida, alguns analistas propuseram chamar a variante femini-
na de complexo de Electra, devido ao outro mito grego, mas o próprio Freud não usou o termo (ver Freud, 1924). Dependendo
das circunstâncias familiares, a mãe é tipicamente a principal cuidadora e, por isso, torna-se uma forte fonte de gratificação
tanto para os meninos quanto para as meninas. Entretanto, à medida que a criança cresce, a consciência das diferenças sexuais
aumenta e, com ela, aumenta também a percepção da identidade sexual. É esta diferença que começa alterar a dinâmica para
os meninos e para as meninas.” (GLASSMAN; HADAD, 2008).

Curiosidade

A Latência
“Seja ou não resolvido com sucesso o complexo de Édipo, os imperativos do desenvolvimento impulsionam a crian-
ça da fase fálica para a fase da latência em torno dos cinco anos. Na fase da latência, que se estende até a puberda-
de, as pulsões parecem estar relativamente inativas – daí serem vistas como latentes ou ocultas.
Em parte, a mudança se deve ao uso da repressão na resolução no complexo de Édipo. Devido a esses resultados no
bloqueio do acesso consciente ao id, a gratificação, daí em diante, está relacionada aos processos secundários e, por
isso, nunca é tão direta ou tão imediata quanto as gratificações da primeira infância.
Na latência, as pulsões reprimidas são redirecionadas para novas atividades, com novos objetos de gratificação. As-
sim, os esportes, os passatempos, a escola e as amizades vão todos proporcionar oportunidades para a satisfação das
pulsões. Os problemas que ocorrem na latência, como a agressão excessiva, podem estar relacionados à repressão
inadequada e/ou ao fato de o ego ser incapaz de redirecionar a energia da pulsão para saídas socialmente aprovadas.”
(GLASSMAN; HADAD, 2008).

Dicionário

Repressão: na teoria freudiana, é um mecanismo de defesa em que as pulsões, as recordações ou as ideias


são ativamente bloqueadas da mente consciente (GLASSMAN; HADAD, 2008).

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ƒƒ Fase Genital – 12 e 13 anos é de espanto e depois de fúria, respondendo com


É a puberdade a última fase psicossexual. atos punitivos e corretivos em relação ao desco-
Nesse momento, os impulsos sexuais são nova- nhecido; por exemplo: em uma sala de educação
mente despertados. Ao fazer amor, o adolescente infantil de crianças com 4 anos de idade, quando
e o adulto são capazes de satisfazer desejos não estão em seu momento de lazer, geralmente des-
realizados na infância. cansam, e será fato comum encontrar algumas
delas estimulando seus órgãos genitais. O que
O estudo de Freud contribui em demasia
fazer? Quase sempre a solução é a seguinte: um
para que o educador possa conhecer e lidar com
grito com as palavras “tire a mão daí que é sujo”.
as sensações e emoções pelas quais as crianças e
Grande engano, pois poderá desenvolver uma si-
os adolescentes passam na constituição de sua
tuação que conduza à fixação e, portanto, o meni-
personalidade. Percebe-se ainda que a Afetivi-
no ou a menina poderá crescer achando que par-
dade, ato construído a partir das relações estabe-
tes de seu corpo são sujas e, ao associar que em
lecidas entre os indivíduos, é muito importante
algo sujo não se deve tocar, a confusão em sua
para o reconhecimento do desenvolvimento das
mente estará feita.
estruturas mentais nos indivíduos.
A teoria de Freud alerta no sentido de como
se pode proceder diante das situações cotidianas Saiba mais
que envolvem o indivíduo enquanto educador.
“Fase Genital é a fase final do desenvolvimento psi-
Dotados de “autoridade total” sobre os alunos, cossexual (da puberdade em diante), quando a ener-
em diversos momentos de sua praxis docente, o gia da pulsão está concentrada nos genitais, com a
educador não reconhece certos comportamen- expressão adulta da sexualidade, isto é, a maturidade.”
(GLASSMAN; HADAD, 2008).
tos psicossociais que crianças e adolescentes
apresentam. Sua reação diante dessas situações

2.2 Teorias Humanistas

Caro(a) aluno(a), complementando as teo- de funcionamento; em outras palavras, que a


rias psicodinâmicas, trataremos, a seguir, das teo- existência humana não significa somente lidar
rias humanistas. com conflitos ocultos. Os psicólogos humanis-
Freud acreditava que a personalidade surgia tas creem que a vida é um processo de abertu-
da resolução de conflitos inconscientes e das cri- ra de nós mesmos para o mundo à nossa volta e
ses do desenvolvimento. Muitos de seus seguido- de sentir a alegria de viver. Enfatizam o potencial
res – incluindo alguns que modificaram sua teoria das pessoas para crescer e mudar, assim como as
ou abandonaram seu círculo – também aderiram maneiras como elas vivenciam subjetivamente
ao seu ponto de vista básico. A teoria de Alfred suas vidas no momento presente, em vez de fi-
Adler, porém, apresentava uma visão diferente da car pensando em como se sentiram ou agiram no
natureza humana. Adler concentrou-se nas forças passado. Essa abordagem nos torna responsáveis
que contribuíram para o crescimento positivo e por nossa vida. Finalmente, os humanistas tam-
para uma mudança em direção à perfeição pes- bém acreditam que as pessoas se desenvolverão
soal. Por essas razões, ele é, às vezes, chamado de em direções desejáveis se tiverem condições de
o primeiro teórico humanista da personalidade. vida razoáveis. O conceito de Adler de busca da
A Teoria Humanista da Personalidade perfeição preparou o terreno para posteriores
defende que somos positivamente motivados teóricos humanistas da personalidade, tais como
e progredimos em direção a níveis mais altos Carl Rogers.

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José Antônio Lima

Carl Rogers (1902-1987) defendia que os vidas. Rogers denominou esse esforço de Ten-
homens e as mulheres desenvolvem suas per- dência Autorrealizadora. Se você se vê como
sonalidades a serviço de objetivos positivos. De uma pessoa “inteligente” e “atlética”, por exemplo,
acordo com ele, cada organismo nasce com de- procurará viver de maneira consistente com essas
terminadas aptidões, capacidades e potencialida- autoimagens.
des natas – “um tipo de projeto genético ao qual Quando nosso autoconceito está intima-
se acrescenta substância no decorrer da vida.” mente relacionado às capacidades inatas, temos
(MADDI, 1989, p. 102). mais probabilidades de nos tornar o que Rogers
Rogers acreditava que o objetivo da vida chamou de pessoas em pleno funcionamento.
era realizar esse projeto genético, para que nos Tais pessoas são autodirecionadas, ou seja, deci-
tornássemos o melhor que cada um de nós tem dem por si mesmo o que querem fazer e tornar-
a capacidade inerente de ser. Ele denominou esse -se, mesmo que essas escolhas não sejam sempre
impulso psicológico de Tendência Realizadora. as mais acertadas. Elas não são levadas pelas ex-
Embora sustentasse que a tendência realizadora pectativas que os outros têm a respeito delas. As
era uma característica de todos os organismos – pessoas em pleno funcionamento também estão
plantas, animais e humanos –, ele observou que abertas a experiências – aos seus próprios senti-
os seres humanos formam, também, imagens de mentos, assim como ao mundo e às outras pes-
si próprios, ou autoconceitos. soas à sua volta – e, portanto, “desejam ser, cada
Assim como tentamos realizar nosso poten- vez com mais exatidão e em maior profundidade,
cial biológico inato, tentamos, também, realizar o self que (elas) mais verdadeiramente são.” (RO-
nosso autoconceito, nosso senso consciente do GERS, 1961, p. 175-176).
que somos e do que queremos fazer com nossas

Saiba mais

“Pessoa com funcionamento pleno é aquela descrita por Rogers como o ideal do crescimento, intimamente relacionada
com a congruência; o crescimento saudável é caracterizado pela abertura, por um grau elevado de espontaneidade, de soli-
dariedade e de autocontrole.
Self, para Rogers, é uma estrutura perceptual fluída baseada em nossas experiências de nosso próprio ser. Reflete nossa visão
de ‘quem nós somos’ em um determinado momento e é influenciado por todos aqueles fatores que moldam a percepção em
geral, incluindo as experiências passadas, a situação presente e nossas experiências para o futuro.
Tendência para a realização, na teoria de Rogers, é um impulso inato que reflete o desejo de crescer, de se desenvolver e de
melhorar as próprias competências. É a tendência para a realização que estimula a criatividade, que nos leva a buscar novos
desafios e habilidades, e que motiva o crescimento saudável em todos os múltiplos aspectos de nossas vidas.” (GLASSMAN;
HADAD, 2008).

Atenção De acordo com essa teoria, as pessoas ten-


dem a funcionar mais plenamente se são criadas
Autoconceito, na teoria de Rogers, é o nosso com consideração positiva incondicional, ou
senso consciente do que somos e do que quere-
mos fazer com as nossas vidas.
seja, se são tratadas com afeto, respeito, aceitação
e amor, independentemente de seus sentimen-
tos, atitudes e comportamentos.

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Psicologia da Educação

Saiba mais

“Necessidade de Aceitação é uma necessidade de contatos sociais positivos, como o amor, que Rogers considerava univer-
sais.
Aceitação incondicional ou consideração positiva incondicional é a aceitação e a consideração dadas a uma pessoa
como ser humano, sem impor condições sobre o modo como a pessoa se comporta.
Aceitação Condicional ou consideração positiva condicional é a aceitação e a consideração dadas a uma pessoa apenas,
se ela satisfaz determinados padrões de comportamento.” (GLASSMAN; HADAD, 2008).

Porém, os pais e outros adultos frequente- ces de sentirem-se satisfeitas. Em algum momen-
mente tratam as crianças da maneira que Rogers to, podem perceber que não sabem realmente
denomina de consideração positiva condicio- quem são ou o que querem.
nal, ou seja, valorizam e aceitam somente alguns O princípio central da maioria das teorias
aspectos da criança. Nesse modelo, a aceitação, o humanistas da personalidade – de que o pro-
afeto e o amor que a criança recebe dos outros pósito maior da condição humana é realizar seu
também dependem da maneira como ela se com- potencial – é difícil, se não impossível, de ser ve-
porta e da satisfação de determinadas condições. rificado cientificamente. A falta de evidências e,
Desse jeito, o autoconceito torna-se cada vez me- consequentemente, de rigor científico é uma das
nos parecido com a capacidade inata e a vida da maiores críticas a essas teorias. Além disso, alguns
criança se desvia de seu projeto. alegam que as teorias humanistas apresentam
Quando as pessoas perdem de vista seu uma visão excessivamente otimista do ser huma-
potencial inerente, tornam-se retraídas, rígidas no e não levam em conta a sua maldade inata.
e defensivas. Sentem-se ameaçadas e ansiosas; Outros argumentam que a visão humanista pro-
sofrem desconforto e inquietação consideráveis. move o egocentrismo e o narcisismo, além de re-
Pelo fato de ter sua vida direcionada ao que os fletir valores ocidentais de conquistas individuais,
outros querem e valorizam, elas têm menos chan- em vez do potencial humano universal.

2.3 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a),
A abordagem psicodinâmica objetiva entender o comportamento em termos de funcionamento
da mente, com ênfase na motivação e no papel da experiência passada. A abordagem teve como pio-
neiro Sigmund Freud, que desenvolveu a teoria psicanalítica, a qual considera o comportamento em
termos dos relacionamentos dinâmicos do id, do ego e do superego.
Freud descreveu o desenvolvimento em termos de cinco fases psicossexuais, caracterizadas por
mudanças no modo de gratificação básico: oral, anal, fálica, de latência e genital. Cada fase é marcada por
desafios e conflitos específicos.
A abordagem humanista é caracterizada por duas suposições básicas, que distinguem sua me-
todologia e suas teorias das outras abordagens: o enfoque na experiência subjetiva e uma rejeição do
determinismo em favor da escolha individual.
Rogers desenvolveu um modelo que se encontra na relação entre o que ele considera que somos
(o self) e o que considera que devemos ser (self ideal). Quando os dois são experimentados como sendo

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semelhantes, o indivíduo é congruente ou está em pleno funcionamento – o objetivo do desenvolvimen-


to. Quando existe uma lacuna entre o self e o self ideal, a pessoa vai experimentar a incongruência.
Ser congruente depende de encontrar pessoas que proporcionem as condições para o crescimen-
to: empatia, abertura e aceitação incondicional. A incongruência resulta de outras pessoas que estabele-
cem condições para o valor, expressadas através da aceitação condicional.
Caro(a) aluno(a), como reflexão final na perspectiva humanista, pergunte-se sobre até que ponto
reconhece-se realizado(a), feliz. Este pode ser um exercício interessante para avaliarmos sobre até que
ponto estamos sendo congruentes como educadores em nossos projetos de vida.

2.4 Atividades Propostas

1. Qual é a definição geral de personalidade, considerando o desenvolvimento emocional e afe-


tivo na sua construção?

2. Do que trata a Teoria Psicodinâmica/Psicanalítica de Freud?

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3 EXERCÍCIO PARA REFLEXÃO

3.1 O Caso de Francisca

Francisca, de 35 anos, é uma advogada seus filhos, mas tendia a brigar mais com Francis-
competente, que faz tratamento com um psicó- ca; no entanto, as brigas começaram a diminuir
logo em razão das dificuldades que encontra em quando a menina tinha seis ou sete anos. Atual-
alguns aspectos de sua vida. Seus amigos descre- mente, elas têm um relacionamento cordial, mas
vem-na de modo muito positivo – altamente mo- sem a proximidade que existe entre Francisca e
tivada, inteligente, atraente e encantadora –, mas seu pai. As interações entre o pai e a mãe eram,
Francisca sente-se terrivelmente insegura e ansio- às vezes, conturbadas, com brigas explosivas por
sa. Quando um psicólogo pediu-lhe para escolher motivos triviais. Esses episódios eram seguidos
alguns adjetivos que melhor descrevessem-na, por um silêncio mútuo, que durava vários dias.
ela escolheu introvertida, tímida, incapaz e infeliz. Francisca tinha ciúme de seu primeiro ir-
Francisca é a primogênita em uma família mão, nascido quando ela tinha dois anos de
com dois meninos e uma menina. Seu pai, um idade. Seus pais lembram-se de que, às vezes, a
pesquisador e advogado, é uma pessoa calma e menina tinha acessos de raiva quando seu irmão,
amável. Seu trabalho sempre lhe permitiu estu- ainda bebê, demandava atenção de seus pais e
dar em casa, o que fez com que ele tivesse muito a recebia, especialmente da mãe. Os acessos de
contato com seus filhos quando jovens. Ele ama- raiva intensificaram-se quando o segundo irmão
va todos os seus filhos, mas tinha preferência por nasceu, um ano mais tarde. Com o passar do tem-
Francisca. Suas ambições e objetivos para a filha po, os irmãos uniram-se para tentar enfraquecer
eram muito grandes e, durante o crescimento da a posição superior que Francisca gozava junto ao
garota, ele sempre atendeu prontamente – e com pai. Ela, no entanto, aproximou-se cada vez mais
total devoção – a todas as necessidades e desejos do pai e seu relacionamento com os irmãos tor-
dela. nou-se marcado por ciúme e rivalidade acima do
A mãe de Francisca trabalhava o dia intei- normal.
ro como professora, consequentemente, via seus Durante os anos escolares, Francisca foi
filhos somente à noite ou, às vezes, nos fins de muito popular e saiu-se muito bem academica-
semana livres. Quando voltava para casa, a mãe mente. Ainda cedo, decidiu-se pela carreira em
estava cansada e tinha pouca energia para qual- advocacia. Mesmo assim, dos oito aos dezessete
quer interação que não fosse essencial com seus anos, sentia-se, às vezes, extremamente só, depri-
filhos. Ela sempre se dedicou à carreira e sentia mida, insegura e confusa – sentimentos que lhe
um grande conflito e frustração ao tentar conci- provocavam muita angústia e, embora sejam co-
liar seus papéis de mãe, dona de casa e provedora muns em sua idade, manifestavam-se de maneira
da família. Costumava ser amável com todos os mais intensa nela que na maioria dos jovens.

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O tempo que Francisca passou na faculda- não vou passar nos exames”; ”Quem sou eu e o
de foi um período de grande crescimento pes- que eu realmente quero da vida?”.
soal, mas os vários envolvimentos românticos Como podemos descrever e compreender a
mal sucedidos deixaram-na muito triste. Sua ina- personalidade de Francisca? Como ela se tornou
bilidade em manter um relacionamento estável e a pessoa que é? Por que ela se sente insegura e
duradouro persistiu mesmo após essa fase, o que incerta apesar de seu evidente sucesso? Por que
a preocupava muito. Mesmo sendo uma pessoa seus amigos a veem como uma pessoa atraente e
equilibrada na maioria das situações, Francisca encantadora, apesar de ela descrever-se introver-
costumava ter acessos de raiva, que terminavam tida e incapaz? Essas são perguntas que podem
todos seus relacionamentos amorosos. “O que há ser explicadas por meio das teorias que estudam
de errado comigo?”, perguntava-se. a personalidade, como foi o caso apresentado nos
Na faculdade de Direito, seus conflitos co- capítulos anteriores de Freud e a Teoria Psicodi-
meçaram a se infiltrar periodicamente em sua nâmica e Rogers e a Teoria Humanista.
consciência: “Eu não mereço ser advogada”; ”Eu

3.2 Explicação do Caso de Francisca à Luz das Teorias

Segundo a teoria Psicodinâmica de Sig- do satisfatoriamente seu Complexo de Electra. Ele


mund Freud, as características de personalidade, teria previsto, também, a dificuldade que ele teria
tais como insegurança, introversão e sentimentos em progredir para relacionamentos sexuais ma-
de incapacidade e desvalorização costumam se duros com outros homens. Francisca, é claro, está
acentuar a partir da fixação no estágio fálico do muito consciente de seu problema em relacionar-
desenvolvimento. Portanto, se Freud tivesse sido -se com os homens, principalmente quando o re-
o terapeuta de Francisca, provavelmente teria lacionamento torna-se “sério”.
concluído que ela não resolveu de maneira efeti- Se o terapeuta fosse Rogers, partindo da
va seu Complexo de Electra. Trabalhando a partir Teoria Humanista, o pesquisador se concentra-
dessa premissa, ele teria, talvez, formulado a hipó- ria na discrepância entre o autoconceito de Fran-
tese de que o relacionamento da moça com seu cisca e suas capacidades inatas. Rogers diria que
pai era ou muito distante e insatisfatório, ou pró- a moça é inteligente e empreendedora; no en-
ximo e gratificante de maneira fora do comum. tanto, sente que “não merece se tornar advoga-
Sabemos que a resposta correta é a segunda. da”, preocupa-se se será “verdadeiramente feliz” e
Com toda certeza, o austríaco1 teria afirma- lembra-se de que, quando tinha 13 anos, não po-
do que, por volta dos 5 ou 6 anos, Francisca cons- dia ser ela mesma e demonstrar realmente seus
cientizou-se de que não poderia se casar com seu sentimentos, mesmo com um bom amigo. Sua
pai e eliminar sua mãe, como ela gostaria. Essa infelicidade, seu medo, sua solidão, sua insegu-
possibilidade explica por que as brigas entre ela rança e outras insatisfações surgem igualmente
e a mãe diminuíram quando a menina tinha por de sua incapacidade em tornar-se o que “verda-
volta de 6 ou 7 anos. deiramente é”.
Finalmente, a frieza contínua no relaciona- Rogers suspeitaria que outras pessoas tam-
mento entre Francisca e sua mãe e a incomum bém tenham condicionado a aceitação e o amor
proximidade no relacionamento com seu pai te- por ela à exigência de que Francisca vivesse de
riam, provavelmente, confirmado a suspeita de acordo com o ideal que elas tinham dela. Sabe-
Freud de que a advogada ainda não tinha resolvi- mos que durante grande parte de sua vida, o pai
1
Freud nasceu em Viena.

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Psicologia da Educação

foi sua fonte primária de consideração positiva.


Muito possivelmente, seu amor por Francisca es-
tava condicionado ao fato de ela atingir os objeti-
vos que ele havia planejado para ela.

3.3 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a),
Rogers é otimista em relação ao crescimento humano ao descrever as características de um sujeito
em pleno funcionamento. Já Freud enfatiza a importância do determinismo psíquico e das pulsões ina-
tas, o papel da mente inconsciente e a continuidade dos comportamentos normal e anormal.
O caso de Francisca, à luz das teorias estudadas, convida-nos a pensar sobre a responsabilidade do
educador, em relação a oferecer condições nas quais as crianças sejam aceitas em suas potencialidades
e características pessoais. Também nos indica a importância de trabalhar respeitosamente com as dife-
renças pessoais, no sentido de instrumentalizar nossos alunos para realizar suas escolhas e construir sua
autonomia de maneira gradual e saudável.
O método psicanalítico usado para desvendar o real e compreender o sintoma individual ou so-
cial e suas determinações é o interpretativo. No caso da análise individual, os materiais de trabalho do
analista são os sonhos, as associações livres e os atos falhos (os esquecimentos, substituições de palavras
etc.). Em cada um desses caminhos de acesso ao inconsciente, o que vale é a história pessoal. Cada pa-
lavra, cada símbolo tem um significado particular para cada indivíduo, o qual só pode ser apreendido a
partir de sua história, que é absolutamente única e singular.

3.4 Atividades Propostas

1. Em relação ao exercício reflexivo, qual é a descrição do perfil de Francisca?

2. A que explicações podemos chegar sobre o caso de Francisca à luz das teorias psicanalítica e
humanista?

3. Você concorda com a realização de exercícios reflexivos semelhantes a este? Por quê?

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NATUREZA DA APRENDIZAGEM E DO
4 ENSINO

Caro(a) aluno(a), que aprende recorre a múltiplos processos men-


Neste capítulo, refletiremos sobre a nature- tais: associa, compara, avalia, interpreta, classifica,
za do ensino e de suas possíveis implicações so- estabelece hipóteses, compreende, imagina, jul-
bre a aprendizagem. ga, reflete, memoriza, reconhece e recorda.
A aprendizagem constitui um dos princi- A aprendizagem não corresponde a um
pais objetos de preocupação dos cientistas que, tipo específico de atividade. É uma mudança que
nos laboratórios de Psicologia das universidades, ocorre no organismo, durante muitos tipos de ati-
pesquisaram a vida mental e o comportamento. vidades. Essencialmente, é um processo interno e
A maior parte dos comportamentos e conheci- pessoal, que acontece dentro do aprendiz. Mas só
mentos exibidos pelos indivíduos é aprendida. Ao as ações manifestadas ou os comportamentos do
longo do processo de desenvolvimento, cada ser aprendiz - o que este faz, diz ou produz – é que
humano adquire, gradualmente, uma infinidade permitem a um observador externo concluir se
de competências, regras, informações e maneiras houve ou não houve aprendizagem, na extensão
de lidar com as pessoas, coisas e situações, que e com a proficiência desejáveis.
resultam tanto de aprendizagem orientada de É claro que nem todos os estados mentais
modo intencional, planejado, sistemático e con- e comportamentos dos estudantes nas escolas se
trolado, quanto de processos espontâneos e até referem à aprendizagem. De igual modo, parte
acidentais. dos comportamentos e estados mentais dos pro-
O ensino em escolas de todos os níveis e de fessores no interior das escolas pode estar ligada
qualquer modalidade, o treinamento e o desen- a aspectos particulares de suas vidas, a fatos, si-
volvimento são metas que só podem ser alcan- tuações e coisas sem conexão com o ensino. Em
çadas se ocorrer aprendizagem em cada pessoa certas circunstâncias, condições, fatores e ações
envolvida. totalmente estranhos à aprendizagem e ao en-
Aprendizagem e ensino são processos in- sino prejudicam ou bloqueiam totalmente esses
timamente ligados, como as duas faces de uma processos.
moeda. Correspondem às atividades fundamen-
tais que ocorrem dentro das escolas, de modo Atenção
sistemático, planejado, deliberado. A escola é,
A maior parte dos comportamentos e conheci-
sobretudo, um lugar onde as pessoas se reúnem mentos exibidos pelos indivíduos é aprendida.
para ensinar e aprender. As “lições para casa” e Cada ser humano adquire, gradualmente, um
as revisões das anotações de classe servem para conjunto de competências, regras, informações e
maneiras de lidar com as pessoas, coisas e situa-
prolongar essas atividades além do tempo e do ções, que resulta tanto da aprendizagem inten-
espaço estritamente escolares. cional, planejada, sistemática e controlada, quan-
Durante a aula, o aluno exibe grande nú- to de processos espontâneos, não planejados.
O ensino em escolas, em todas as modalidades,
mero de comportamentos ligados diretamente ocorre a partir das aprendizagens alcançadas pe-
à aprendizagem – escuta, gesticula, fala, olha, es- las pessoas envolvidas.
creve, lê, movimenta-se na classe, manipula ob- Aprendizagem e ensino são processos intima-
mente ligados, como as duas faces de uma mes-
jetos e executa operações. Internamente, o aluno ma moeda.

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4.1 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a),
A aprendizagem constitui um dos principais objetos de preocupação dos cientistas que, nos labo-
ratórios de Psicologia das universidades, pesquisaram a vida mental e o comportamento. A maior parte
dos comportamentos e conhecimentos exibidos pelos indivíduos é aprendida.
Ao longo do processo de desenvolvimento, cada ser humano adquire, gradualmente, uma infini-
dade de competências, regras, informações e maneiras de lidar com as pessoas, coisas e situações, que
resultam tanto de aprendizagem orientada de modo intencional, planejado, sistemático e controlado,
quanto de processos espontâneos e até acidentais.
O ensino em escolas de todos os níveis e de qualquer modalidade, o treinamento e o desenvolvi-
mento são metas que só podem ser alcançadas se ocorrer aprendizagem em cada pessoa envolvida.

4.2 Atividades Propostas

1. Qual é a natureza da Aprendizagem e do Ensino?

2. A que corresponde o processo de aprendizagem?

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A APRENDIZAGEM E O CENÁRIO
5 ESCOLAR

Caro(a) aluno(a), das de expressão verbal, boas maneiras, moral,


Neste capítulo, estudaremos sobre a apren- religião, apreciação artística. Mas os defeitos, isto
dizagem e o cenário escolar. Você já parou para é, erros, maus hábitos, vícios, mau gosto, precon-
pensar no cenário escolar no qual irá atuar? Qual ceitos, intolerância, crueldade, vaidade e muitos
é o papel do educador na intervenção sobre o outros itens negativos como esses podem ser,
ensino e a aprendizagem para mudar o cenário igualmente, ensinados e aprendidos. Compare-
escolar? Até que ponto o educador pode fazer a mos uma criança primitiva, nascida entre habi-
diferença na vida de um educando? A partir des- tantes das cavernas do Paleolítico Superior, com a
sas reflexões, consideremos o capítulo a seguir. criança que nasce e cresce no meio urbano típico
A importância que assumem no cenário es- da atualidade. A espécie humana sofreu poucas
colar não significa que a aprendizagem e o ensino mudanças anatômicas e fisiológicas nos últimos
pertençam exclusivamente a esse domínio. Tam- 20 ou 30 mil anos. As capacidades genéticas ou
pouco é correto encará-los exclusivamente como inatas da criança inteligente da cidade dos nossos
processos formais, sistemáticos, planejados e dias não são maiores ou melhores do que as da
executados estritamente de acordo com normas, criança do Paleolítico Superior. O recém-nascido
objetivos e instrumentos específicos. A criança do período pré-histórico e o atual são, nesse sen-
pequena aprende espontaneamente a coordenar tido, indistinguíveis. Ambos contêm mais ou me-
seus movimentos, a reagir aos demais e a falar nos as mesmas potencialidades. Mas os adultos
o idioma dos que a cercam. Ensinamos truques em que se transformaram, no decorrer da vida,
e habilidades a um cão de estimação. Aprende- são profundamente diferentes. Poucas potencia-
mos espontaneamente a comer com talheres, a lidades são atualizadas no primeiro, e muitas, no
dar nós, a nadar, a dançar, a preparar um café, a segundo, em virtude, essencialmente, de diferen-
guiar bicicleta, a jogar futebol, a pregar um botão ças decorrentes de aprendizagem.
na roupa. Nas indústrias, os instrutores ensinam
procedimentos, habilidades e operações aos ope-
rários. Nas lojas, os balconistas novatos aprendem
Atenção
informalmente com os veteranos as habilidades,
dicas e particularidades relativas ao negócio, à Nem tudo o que se aprende é necessariamente
freguesia, aos produtos à venda. Crianças e adul- bom. A aprendizagem gera tanto a aquisição de
competências socialmente aprovadas e benéfi-
tos, animais e seres humanos, todos aprendem. cas para o aprendiz e para a comunidade, quanto
Nem tudo o que se aprende é necessaria- a aquisição de hábitos, ideias e habilidades ques-
tionáveis ou francamente prejudiciais.
mente bom. A aprendizagem gera tanto a aqui-
sição de competências socialmente aprovadas e
benéficas para o aprendiz e para a comunidade,
quanto a aquisição de hábitos, ideias e habilida-
des questionáveis ou francamente prejudiciais.
Ensinamos às crianças virtudes, formas adequa-

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5.1 Atividades Propostas

1. Explique as formas possíveis de aprendizagem ao longo do desenvolvimento humano.

2. Aprendizagem e Ensino pertencem exclusivamente ao cenário escolar? Por quê?

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A APRENDIZAGEM AO LONGO DA VIDA
6 HUMANA

Caro(a) aluno(a), maturamente, durante o período que vai desse


Neste capítulo, estudaremos sobre a impor- nascimento prematuro até a data correspondente
tância da aprendizagem ao longo de nossa vida. ao término normal de uma gestação. Esses estu-
A aprendizagem é um processo tão frequente, tão dos são apontados por Carmichael (1976) como
constante em nossas vidas, que praticamente nos demonstrações de que “o mecanismo neural de
acompanha do berço ao túmulo. Bebês, crianças, fetos em estado adiantado de gestação já se en-
adultos e pessoas idosas aprendem. Até mesmo contra de tal forma amadurecido que é possível
antes do nascimento, o ser humano é suscetível ocorrer aprendizagem determinada pelo am-
a formas rudimentares de aprendizagem, produ- biente”. Por outro lado, pessoas idosas são igual-
zidas em condições especiais de laboratório. Há mente capazes de aprender. É digna de nota, em
provas experimentais da ocorrência, em fetos hu- nossos dias, a existência de cursos, programas e
manos, de um tipo particular de aprendizagem, instituições de ensino voltados, especificamente,
denominado condicionamento, a partir dos 6 ou para uma clientela da “terceira idade”, isto é, para
7 meses de vida intrauterina. a aprendizagem de pessoas idosas.
Da mesma forma, vários pesquisadores
demonstraram que é possível a formação de re-
flexos condicionados em crianças nascidas pre-

Multimídia

Sociedade dos Poetas Mortos (Estados Unidos). Direção de Peter Weir. Buena Vista Pictures, 1989, 129 minutos.
Excelente filme sobre o processo educacional nos anos 1990, em uma escola conservadora dos Estados Unidos, em
que um professor rompe com a visão tradicional. É possível refletir sobre as diferentes formas de aprendizagem
e as concepções de ensino que as fundamentam.

Atenção

Bebês, crianças, adultos e pessoas idosas apren-


dem. Até mesmo antes do nascimento, o ser
humano é suscetível a formas rudimentares de
aprendizagem, produzidas em condições espe-
ciais de laboratório.

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Saiba mais

A Aprendizagem como Objeto de Estudo


“Para a Psicologia, o conceito de aprendizagem não é simples. Há diversas possibilidades de aprendizagem, ou seja, há diversos
fatores que nos levam a apresentar um comportamento que anteriormente não apresentávamos, como o crescimento físico,
descobertas, tentativas e erros, ensino etc. Nós mesmos temos uma amiga que sabe uma poesia inteira em francês, porque a
copiou 10 vezes como castigo, há 20 anos, e tem uma vaga idéia do que está dizendo quando a declama. Podemos dizer que
ela aprendeu a poesia? Essas diferentes situações e processos não podem ser englobados em um só conceito.
E, assim, a Psicologia transforma a aprendizagem em um processo a ser investigado.
São muitas as questões consideradas importantes pelos teóricos da aprendizagem: Qual o limite da aprendizagem? Qual a
participação do aprendiz no processo? Qual a natureza da aprendizagem?” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2001, p. 113).
Tradicionalmente, a Psicologia trabalhou com duas grandes correntes nesse campo da aprendizagem: as teorias do condicio-
namento e as teorias cognitivistas.

6.1 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a),
Aprendizagem é uma mudança que ocorre com o aprendiz, durante muitos tipos de atividades, ao
longo de toda a sua vida. É um processo interno e pessoal, mas que é percebido pelas ações manifestadas
pelo comportamento do aprendiz: o que faz, diz e produz (aprendizagens conceituais, procedimentais e
atitudinais).
Tradicionalmente, a Psicologia trabalhou com duas grandes correntes nesse campo da aprendiza-
gem: as teorias do condicionamento e as teorias cognitivistas.

6.2 Atividades Propostas

1. Quando a aprendizagem acontece na vida humana?

2. Do que tratam os estudos apontados por Carmichael (1976)?

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A APRENDIZAGEM NA PSICOLOGIA
7 CONTEMPORÂNEA

Caro(a) aluno(a), à aprendizagem. Vários procedimentos terapêu-


Neste capítulo, estudaremos o tema da ticos atuais recorrem à desaprendizagem e à rea-
aprendizagem, a partir das contribuições da Psi- prendizagem, a fim de que a pessoa retorne à nor-
cologia contemporânea. malidade. Alguns dos mais notáveis progressos
Como sabemos, a aprendizagem é um con- recentes em psicologia da personalidade, psico-
ceito nuclear, tanto na Psicologia quanto na Peda- terapia e terapia comportamental originaram-se
gogia. Constitui um dos temas centrais da Psico- de estudos experimentais da aprendizagem.
logia Educacional, mas aparece igualmente como O foco deste material incide nos conheci-
importante foco de atenção em outras áreas do mentos capazes de contribuir, direta e efetiva-
conhecimento e da aplicação de natureza psico- mente, para o trabalho do professor, em relação
lógica. Boa parte do conteúdo correspondente à ao ensino e à aprendizagem das matérias dos cur-
Psicologia Experimental, por exemplo, se refere rículos de cada grau e série escolar.

Saiba mais

Como dissemos, tradicionalmente, a Psicologia trabalhou com duas grandes correntes nesse campo da aprendizagem: as
teorias do condicionamento e as teorias cognitivistas.
No primeiro grupo – teorias do condicionamento – estão as contribuições que definem a aprendizagem por suas consequên-
cias comportamentais e enfatizam as condições ambientais como força propulsora da aprendizagem. A aprendizagem aqui é
conexão entre um estímulo e uma resposta. Completada a aprendizagem, estímulo e resposta estão de tal forma associados
que o aparecimento do estímulo evoca a resposta.
Para os teóricos do condicionamento, a transferência da aprendizagem, que permite solucionar novas situações, é realizada
quando evocamos hábitos passados apropriados para o novo problema (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2001).

Saiba mais

Teorias Cognitivistas
As teorias que compõem esse conjunto definem a aprendizagem como um processo de relação do sujeito com o mundo
externo, com consequências no plano da organização interna do conhecimento (organização cognitiva).
Para os cognitivistas, aprendemos a relação entre ideias (conceitos) e aprendemos abstraindo de nossa experiência.
Os comportamentos ou conceitos aprendidos são mantidos por processos cerebrais, como a atenção e a memória, que são
integradores dos comportamentos e dos pensamentos. (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2001).

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7.1 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a),
A Educação é um conjunto de experiências pessoais ativas, dinâmicas e mutáveis, por meio das
quais o indivíduo seleciona, absorve e incorpora informações, relacionando-as, reorganizando-as e ex-
pressando-as, para criar novas informações e orientar suas ações, agindo junto a outras pessoas e modi-
ficando o ambiente.
A Educação compreende tudo quanto contribui para o desenvolvimento da pessoa, sob os aspec-
tos: físico, motor, intelectual, emocional, social, profissional, estético, ético e religioso, não devendo ser
compreendida como determinismo genético.
Dessa forma, faz-se necessário o estudo de como a aprendizagem processa-se ao longo do desen-
volvimento humano, tendo, para isso, a contribuição da Psicologia Contemporânea.
Como vimos, a aprendizagem é um tema nuclear na Psicologia Contemporânea. Alguns dos mais
notáveis progressos recentes em psicologia da personalidade, psicoterapia e terapia comportamental
originaram-se de estudos experimentais da aprendizagem.
O foco deste material incide nos conhecimentos capazes de contribuir, direta e efetivamente, para
o trabalho do professor, em relação ao ensino e à aprendizagem das matérias dos currículos de cada grau
e série escolar.
Há, também, grandes contribuições das teorias cognitivistas, considerando o processo de com-
preensão, transformação, armazenamento e utilização das informações no plano da cognição.

Dicionário

Cognição é o processo através do qual o mundo de significados tem origem. À medida que o ser se situa no mundo,
estabelece relações de significação, isto é, atribui significados à realidade em que se encontra. Esses significados não
são entidades estáticas, mas pontos de partida para a atribuição de outros significados. Tem origem, então, a estrutura
cognitiva (os primeiros significados), constituindo-se nos pontos básicos de ancoragem dos quais derivam os outros
significados. (MOREIRA; MASINI, 2001).

7.2 Atividades Propostas

1. Qual é a importância do conceito de aprendizagem para a Psicologia Contemporânea?

2. Quem se pode considerar responsável pelos notáveis progressos em Psicologia da Personali-


dade?

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8 EDUCAÇÃO/APRENDIZAGEM

Caro(a) aluno(a), cernimentos sociais (cognição), a aprendizagem


Neste capítulo, estudaremos sobre a impor- de habilidades ativas e práticas (aprendizagem
tância da aprendizagem para o trabalho educa- psicomotora), e o desenvolvimento de emoções,
cional. atitudes e valores (aprendizagem afetiva).
As definições convencionais de educação Em anos recentes, tem ganhado crescen-
limitam-se à espécie humana e a caracterizam te aceitação e aprofundamento uma concepção
como processo total por meio do qual o indi- que liga a educação às noções emergentes de in-
víduo, em interação com a cultura em que vive, formação e processamento de informação no sis-
desenvolve sua compreensão da realidade e as- tema nervoso humano. Segundo esse ponto de
simila conhecimentos, técnicas, crenças, atitudes vista, o que torna o ser humano educável é sua
e valores. A palavra originou-se do latim educatio, excepcional capacidade de assimilar, usar e gerar
educationis. Em tempos muito distantes, designa- informações. O novo sentido atribuído à palavra
va tanto a criação de seres humanos como a de informação, nesse contexto, tem suficiente abran-
animais e plantas. Entre os antigos romanos, edu- gência para incluir tanto os produtos – ideias, fa-
care significava criar ou nutrir crianças e estava li- tos, planos, textos, sons, imagens, representações
gado a outro verbo: educere – fazer sair, lançar ou tridimensionais etc., deliberadamente criados por
tirar para fora, criar, amamentar. No século I a.C., nós ou naturalmente disponíveis no ambiente –
Cícero empregou essa palavra tanto no sentido quantos os processos, isto é, habilidades, regras,
de criação de filhos quanto no de instrução, dou- estratégias, procedimentos e outros, graças aos
trina ou ensino proporcionados por mestres ou quais as informações são captadas, criadas ou
preceptores aos meninos. aplicadas.
A educação passa, assim, a ser concebida
como um conjunto de experiências pessoais ati-
Atenção vas, dinâmicas, mutáveis, por meio das quais o
indivíduo seleciona, absorve e incorpora informa-
Educação
A palavra originou-se do latim educatio, educatio- ções, relaciona-as, reorganiza-as, expressa-as ou
nis. Em tempos muito distantes, designava tanto utiliza-as para criar novas informações, orientar
a criação de seres humanos quanto a de animais suas ações, agir junto a outras pessoas ou modifi-
e plantas. Entre os antigos romanos, educare sig-
nificava criar ou nutrir crianças e estava ligado a car o ambiente.
outro verbo: educere – fazer sair, lançar ou tirar Num sentido mais amplo, a educação com-
para fora, criar, amamentar.
preende tudo o que contribui para o desenvolvi-
mento da pessoa, sob todos os aspectos – físico,
Os fins últimos da educação referem-se, es- motor, intelectual, emocional, social, profissional,
sencialmente, à promoção de uma pessoa bem estético, ético, religioso –, e não pode ser atribuí-
integrada, capaz de assumir um papel responsá- do à ação de fatores genéticos.
vel e ativo na sociedade, e compreendem o de-
senvolvimento de capacidades intelectuais e dis-

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8.1 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a),
As definições convencionais de Educação limitam-se à espécie humana e a caracterizam como pro-
cesso total por meio do qual o indivíduo, em interação com a cultura em que vive, desenvolve sua com-
preensão da realidade e assimila conhecimentos, técnicas, crenças, atitudes e valores.
Educação originou-se do latim educatio, educationis. Entre os antigos romanos, educare significava
criar ou nutrir crianças e estava ligado a outro verbo: educere – fazer sair, lançar, criar, amamentar.
Os fins da educação, nessa perspectiva, referem-se à promoção de uma pessoa bem integrada,
capaz de assumir um papel responsável e ativo na sociedade. Compreendem: o desenvolvimento de
capacidades intelectuais e discernimentos sociais (cognição), a aprendizagem de habilidades ativas prá-
ticas (aprendizagem psicomotora) e o desenvolvimento de emoções, atitudes e valores (aprendizagem
afetiva).
Recentemente, relaciona-se a educação às noções emergentes de informação e processamento de
informações no sistema nervoso humano.

8.2 Atividades Propostas

1. A que se referem os fins últimos da Educação?

2. Qual é o novo sentido atribuído à palavra ‘informação’? Qual é a sua importância para a Educa-
ção?

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9 TIPOS DE APRENDIZAGEM

Caro(a) aluno(a), mento até sua morte. Conheceremos, a seguir,


Neste capítulo, trataremos de alguns tipos algumas características gerais da aprendizagem,
de aprendizagem. Todo o ser humano tem a pos- observando para além do ser humano outras
sibilidade de aprender sempre, desde seu nasci- possibilidades de se aprender.

9.1 Características Psicológicas Gerais da Aprendizagem

Os psicólogos que pesquisaram a aprendi- aquisição de um sintoma neurótico e


zagem e desenvolveram teorias científicas a esse assim por diante;
respeito tendem a encará-la de modo muito mais 4. A aprendizagem não se limita às res-
amplo do que os pedagogos. A relação a seguir postas externas do organismo, que
indica os aspectos geralmente incluídos nas con- operam num ambiente particular, mas
cepções psicológicas da aprendizagem: se relaciona, além disso, com grande
número de distintas respostas internas
1. A aprendizagem abrange comporta- do organismo e com reações estrita-
mentos dos organismos humanos e mente fisiológicas;
dos animais. Refere-se igualmente ao 5. A aprendizagem inclui a punição e os
comportamento de adaptação de sis- fenômenos ligados a ela, do mesmo
temas conceituais inanimados, como modo que outras técnicas e meca-
máquinas, robôs, computadores etc. nismos de controle aversivo, além de
Aplica-se não só ao comportamento do técnicas e mecanismos culturalmente
organismo intacto ou total, mas tam- mais visíveis de recompensa e controle
bém à atividade de um sistema isolado através de incentivo positivo;
de resposta; 6. A aprendizagem não se limita à aqui-
2. A aprendizagem trata do comporta- sição original de uma resposta apren-
mento do sujeito médio ou estatístico dida, mas compreende também seu
e das diferenças individuais (aprendi- desaparecimento posterior (extinção),
zes lentos, aprendizes rápidos etc.); sua retenção após um intervalo de
3. A aprendizagem envolve eventos mui- tempo (memória) e seu possível valor
to diversificados, como a ocorrência de na aquisição de uma resposta nova ou
uma contração muscular, a aquisição diferente (transferência do treino);
de um conceito abstrato, simbólico – 7. A aprendizagem relaciona-se com ope-
muitas vezes impossível de ser verba- rações e fenômenos diversos, como a
lizado – ou de uma regra gramatical, a motivação, a percepção, o desenvol-

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vimento psicológico do organismo, a ambientes institucionais, na educação especial e


estrutura da personalidade, fatores so- na instrução personalizada em todos os níveis de
ciais e culturais e muitos outros; educação” (p. 10).
8. A aprendizagem tem uma realidade O atual prestígio do ponto de vista que con-
física ou estrutural (isto é, fisiológica, sidera que aprender é processar informações está,
bioquímica etc.), assim como uma reali- portanto, ligado à expansão, ao refinamento e à
dade estritamente psicológica ou ope- aceitação crescente da psicologia cognitiva (ou
racional (funcional); psicologia dos processos cognitivos). Cognição
9. A aprendizagem está ligada não so-
mente a uma longa tradição inte- refere-se a todos os processos por meio
lectual, teórica e estética, mas serve dos quais a entrada sensorial é transfor-
mada, reduzida, elaborada, armazenada,
igualmente como fonte de aplicações
recuperada e usada. Termos como sen-
práticas e de tecnologias que podem sação, percepção, imaginação, retenção,
ser implementadas; evocação, solução de problemas e pensa-
10. A aprendizagem mantém relações de mento, e muitos outros, se referem a esta-
dos hipotéticos ou aspectos da cognição.
continuidade com as atividades mais
(NEISSER, 1967, p. 4).
gerais do organismo, linguísticas, co-
municativas, cognitivas, de proces-
samento de informação e tomada de Os psicólogos cognitivos, que concebem a
decisão, servindo, ademais, como com- aprendizagem em termos de processamento hu-
ponente dessas atividades (HILLNER, mano de informação, estudam como o ser huma-
1978). no assimila informações a partir do ambiente em
que se encontra, transforma essas informações
graças a processos centrais no sistema nervoso
Aprendizagem e Processamento de
e usa as informações transformadas para tomar
Informações
decisões, agir, lidar com objetivos, interagir com
outras pessoas, solucionar problemas, modificar
A pesquisa e a teorização atuais em apren- o ambiente, inventar, criar, descobrir.
dizagem tendem a realçar cada vez mais os as-
pectos cognitivos desta, atribuindo importância
central às características de aquisição de conhe- Atenção
cimento e processamento de informação, em
A pesquisa e a teorização atuais em aprendiza-
substituição à tônica comportamental dominan- gem tendem a realçar cada vez mais os aspectos
te na literatura científica das décadas de trinta e cognitivos desta, atribuindo importância central
às características de aquisição de conhecimento
quarenta. Conforme assinala Glaser (1978, p. 10),
e processamento de informação, em substituição
“presentemente, a moderna psicologia cognitiva à tônica comportamental dominante na literatu-
é a força teórica dominante na ciência psicoló- ra científica das décadas 1930 e 1940.
gica, em contraste com os anos anteriores, nos
quais as teorias Behavioristas (comportamentais)
da aprendizagem eram mais influentes.” Glaser re- Alfredo M. Aguayo: Quatro Critérios
conhece, por outro lado, que o impacto da contri-
buição comportamental é generalizado na atua-
Devemos a Aguayo (1936) – porto-rique-
lidade, difundindo-se em muitas áreas nas quais
nho que passou a maior parte da vida em Cuba
“a aprendizagem e reaprendizagem do compor-
e, com justiça, é tido como “o ilustre patriarca da
tamento constituem um fenômeno importante,
pedagogia cubana” – uma classificação da apren-
particularmente nas situações terapêuticas, nos
dizagem segundo quatro critérios. Essa classifi-

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Psicologia da Educação

cação se acha no livro Pedagogia Científica, obra Ernest R. Hilgard: uma Proposta Eclética
verdadeiramente exemplar, que, traduzida para o
nosso idioma pelo professor J. B. Damasco Pen- O psicólogo Ernest R. Hilgard (ATKINSON;
na, orientou a formação de milhares de professo- ATKINSON, 1975) propõe quatro categorias es-
res brasileiros, nas décadas passadas. Segundo a senciais:
classificação sugerida por Aguayo, distinguimos
diferentes tipos de aprendizagem em função dos
1. aprendizagem por condicionamento
seguintes critérios:
clássico;
2. aprendizagem por condicionamento
1. Conforme a finalidade que o apren-
operante;
diz tem em vista: (a) destreza ou habi-
lidade, como guiar um carro ou apren- 3. aprendizagem de resposta múltipla;
der datilografia; (b) conhecimento 4. aprendizagem cognitiva.
– saber, por exemplo, as causas da 2ª
Guerra Mundial ou as leis de Mendel;
Essa última enfatiza os papéis da percepção
(c) apreciação de valores – morais, ar-
e do conhecimento, enquanto as duas primeiras
tísticos, cívicos e outros;
referem-se à aprendizagem de associações do
2. Conforme a categoria ou nível de tipo S-R, isto é, associação entre estímulo e res-
quem aprende: (a) aprendizagem ou posta (as letras S e R correspondem às palavras
adestramento do animal; (b) aprendiza- latinas stimulus e responsio). Estímulo e resposta
gem da criança e do adolescente, sub- são técnicos. O primeiro designa uma parte do
dividida em aprendizagem de pessoas ambiente ou uma modificação em uma parte do
normais, de deficientes e de supernor- ambiente. Resposta significa o comportamento
mais; (c) aprendizagem do adulto. do organismo ou modificação em uma parte do
3. Segundo as diferentes modalida- comportamento.
des de aprendizagem empregadas:
(a) aprendizagem sensório-motriz;
Aprendizagem por Condicionamento Clássico
(b) aprendizagem por observação; (c)
aprendizagem associativa, mediante a
memória, a imaginação e a reflexão; (d) A aprendizagem por Condicionamento
aprendizagem apreciativa; (e) aprendi- Clássico (ou Condicionamento Pavloviano ou,
zagem especial. ainda, Condicionamento Respondente) segue
um procedimento básico, descrito pelo fisiologis-
4. Segundo o método específico em-
ta russo Ivan Pavlov, em fins do século XIX. Pavlov
pregado pelo aprendiz: (a) ensaio
condicionou a salivação no cão em resposta a es-
e erro ou êxito e fracasso, isto é, o
tímulos inicialmente neutros, auditivos ou visuais.
aprendiz executa reiteradamente uma
A aprendizagem por condicionamento clássico
determinação da ação, diminuindo
depende de algum reflexo fisiológico preexisten-
gradualmente os erros que comete e
te no organismo, controlado pelo sistema nervo-
ganhando rapidez e precisão à medi-
so autônomo, como a salivação, a contração pupi-
da que a aprendizagem prossegue; (b)
lar à luz, a piscada quando um sopro de ar atinge
imitação da ação de um modelo; (c) re-
o olho, o reflexo patelar e outros, sob a forma de
flexão.
conexão entre estímulo e resposta. O estímulo do
cheiro do alimento, por exemplo, produz a res-
posta de salivação. Para fins de pesquisa, dá-se
preferência a reflexos fisiológicos como este, que

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podem ser facilmente provocados e medidos. Um


estímulo neutro, inicialmente não ligado ao refle-
SC
xo fisiológico escolhido para a pesquisa, passa a
(campainha)
ser apresentado sucessivas vezes ao organismo,
imediatamente antes do estímulo específico que SI RI (RC)
provoca o reflexo natural. Uma campainha, por (comida) (salivação)
exemplo, soa junto a um cão faminto, imediata-
mente antes de este receber a comida que o faz A apresentação do SI é essencial para re-
salivar. Após uma ou duas dezenas de vezes em forçar (fortalecer) a resposta condicionada. A
que o som da campainha é sempre seguido pela reiterada apresentação do SC, não seguida de
comida, o cachorro saliva quando soa a campa- reforçamento (SI), resulta na extinção ou no de-
inha. Esse tipo simples de aprendizagem é indis- saparecimento do reflexo condicionado. Às ve-
cutivelmente importante nos casos de “aprendiza- zes, entretanto, pode ocorrer uma recuperação
gem emocional”, isto é, na aquisição de respostas espontânea de um reflexo condicionado suposta-
emocionais há vários estímulos e eventos. As pes- mente extinto, isto é, o animal volta a exibir a RC
quisas mostraram que medos intensos, temores após a apresentação do SC.
relacionados com comportamento sexual e até
Além disso, uma resposta extinta pode ser
preconceitos étnicos são adquiridos por condi-
recondicionada, com um número de práticas
cionamento clássico. De modo geral, entretanto,
bem menor do que o necessário para o estabele-
conforme observa Wingfield (1979), trata-se de
cimento do condicionamento original.
uma aprendizagem passiva e voluntária, não su-
jeita ao controle consciente. Essa aprendizagem Os estudos do condicionamento clássico
não é instrumental, pois não ajuda o organismo demonstraram a ocorrência de dois processos
eficazmente a modificar ou a influenciar o am- fundamentais, a generalização e a discriminação
biente. O aprendiz é, assim, mais escravo do que do estímulo. No primeiro caso, a SC tende a ocor-
senhor, no condicionamento clássico. rer frente a outros estímulos fisicamente seme-
lhantes ao RC (por exemplo, sons parecidos com
O estímulo e a resposta que fazem parte do
o da campainha). De acordo com o princípio da
reflexo fisiológico original são denominados es-
generalização, quanto mais o SC se assemelha a
tímulo incondicionado SI e RI, respectivamente.
outros estímulos, tanto mais o organismo tende a
Representamos o reflexo fisiológico original desta
responder a esses estímulos do mesmo modo que
forma:
o faz em relação ao SC original. No caso da discri-
minação do estímulo, o uso de reforçamento di-
SI RI ferenciado serve para aumentar a especificidade
(comida) (salivação) da resposta: o SC é repetidamente apresentado
com reforçamento, enquanto a apresentação dos
outros estímulos não é seguida de reforço. Graças
O estímulo inicialmente neutro que, depois,
à discriminação, a resposta a estímulos parecidos
passa a iniciar a resposta é chamado estímulo
é extinta pouco a pouco. Os processos de genera-
condicionado (SC). A resposta eliciada denomina-
lização e discriminação são complementares: no
-se resposta condicionada (RC); assemelha-se à
primeiro, o organismo reage a semelhanças; no
RI, mais pode diferir desta em alguns detalhes. No
segundo reage a diferenças.
diagrama seguinte, a linha sólida indica a cone-
xão original. A linha interrompida corresponde à
conexão adquirida ou aprendida.

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Psicologia da Educação

Atenção

A aprendizagem por Condicionamento Clássico (ou Condicionamento Pavloviano ou, ainda, Condicionamento
Respondente) segue um procedimento básico, descrito pelo fisiologista russo Ivan Pavlov, em fins do século XIX.
Pavlov condicionou a salivação no cão em resposta a estímulos inicialmente neutros, auditivos ou visuais. A aprendi-
zagem por condicionamento clássico depende de algum reflexo fisiológico preexistente no organismo, controlado
pelo sistema nervoso autônomo, como a salivação, a contração pupilar à luz, a piscada quando um sopro de ar
atinge o olho, o reflexo patelar e outros, sob a forma de conexão entre estímulo e resposta.

Condicionamento Operante ração que recebe reforça o comportamento de


pressionar a alavanca. Se o comportamento não
O segundo tipo de aprendizagem associa- for seguido de reforço (no caso, a bolinha de ra-
tiva a que se refere Hilgard é conhecido como ção), ocorrerá a sua extinção.
condicionamento operante. Tem por funda- Representamos o condicionamento ope-
mento os procedimentos, conceitos e princípios rante da seguinte maneira:
desenvolvidos nos EUA, desde o final da década
de 1930, por B. F. Skinner. A palavra operante R S
significa que o comportamento atua, age ou ope-
ra no ambiente, a fim de produzir algum efeito.
Assim como no condicionamento clássico,
Isso não ocorre no condicionamento clássico ou
S e R, acima, indicam, respectivamente, estímulo
pavloviano: a salivação do cão não produz o apa-
e resposta. Existe, entretanto, uma diferença es-
recimento da comida. Usa-se também a desig-
sencial entre os dois tipos de condicionamento.
nação aprendizagem instrumental em relação a
No condicionamento clássico, S elicia uma R. No
essa aprendizagem e às formas afins, nas quais o
condicionamento operante, o estímulo (comi-
comportamento constitui o meio ou instrumento
da, por exemplo) aparece depois da resposta,
para garantir o acesso do organismo ao reforço.
estabelecendo-se uma contingência operante
Qualquer evento que aumente a probabilidade
(ser contingente é o mesmo que ser dependente
da ocorrência de uma dada resposta, frente a um
de): o comportamento “opera” sobre o ambien-
estímulo, em ocasiões subsequentes, é considera-
te, alterando-o. É comum a afirmação de que, no
do reforçador, no condicionamento operante.
condicionamento operante, o comportamento é
A demonstração mais comum da aprendi- controlado pelas suas consequências.
zagem por condicionamento operante vale-se
Há estímulos reforçadores positivos e ne-
de um aparelho conhecido como caixa de Skin-
gativos. O estímulo cuja apresentação fortalece a
ner. Um rato é privado de alimento durante certo
resposta que o precede é um reforçador positivo.
tempo e posto dentro dessa caixa metálica, que
Mas os organismos também adquirem respostas
contém uma barra saliente, acima de um reci-
para fugir de estímulos desagradáveis ou evitá-
piente de alimento. Quando acionada, a barra li-
-los. Nesse caso, o evento reforçador não é a apre-
bera uma bolinha de ração (podemos igualmente
sentação, e, sim, a remoção do estímulo; estamos
privar o rato de acesso à água e, em seguida, fazer
diante de um estímulo reforçador negativo. Assim,
com que o movimento da barra liberte uma gota
na presença de um estímulo reforçador negativo,
de água). No início, o rato percorre intensamente
a resposta é seguida pela remoção ou término
o interior da caixa, até que acaba pressionando a
desse estímulo. Se colocarmos as mãos sobre os
barra por acaso. Cada vez que isso acontece, uma
ouvidos (resposta), a fim de evitar um ruído, o ruí-
bolinha de comida cai na vasilha. O rato come a
do é um estímulo reforçador negativo. De modo
ração e passa a acionar a barra com frequência
geral, estímulos dos quais tendemos a fugir ou
crescente, tendo, assim, acesso ao alimento. A

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escapar são chamados de estímulos aversivos. Se-


res humanos e animais aprendem, portanto, de- Atenção
terminadas respostas quando estas são seguidas
O terceiro tipo de aprendizagem é a aprendiza-
(a) da apresentação de um reforçador positivo ou gem de resposta múltipla. Refere-se à aquisição
(b) da remoção ou término de um reforçador ne- de padrões ou sequências de respostas na rea-
lização de uma tarefa, como, por exemplo, na
gativo.
aprendizagem de uma habilidade motora ou na
O reforçamento pode ocorrer de várias ma- decoração de uma poesia.
neiras, caracterizadas como esquemas de reforço.
No esquema de reforço regular ou contínuo, to-
Aprendizagem Cognitiva
das as respostas são reforçadas; nos esquemas
de reforço intermitente ou parcial, isso não ocorre.
Podemos reforçar parcialmente segundo interva- A aprendizagem cognitiva designa formas
los fixos de tempo, por exemplo, a cada 5 minutos de aprendizagem mais complexas, nas quais a per-
(reforço e intervalo fixo); ou de acordo com uma cepção, a compreensão de relações significativas
relação de respostas reforçadas e não reforçadas, e o conhecimento são críticos, muito mais do que
de modo que o organismo só seja reforçado a o estabelecimento de associações entre estímulo
cada vigésima primeira resposta. e resposta. Na aprendizagem que ocorre em virtu-
de de simples processos associativos, é pequena
ou nula a orientação racional que o aprendiz pode
Atenção introduzir em suas sucessivas práticas. Na apren-
dizagem dependente de processos cognitivos
O segundo tipo de aprendizagem associativa a (processos mentais superiores, como preferem
que se refere Hilgard é conhecido como condi- alguns), o aprendiz percebe relações, organiza o
cionamento operante. Tem por fundamento os
procedimentos, conceitos e princípios desenvol- conhecimento, compreende o que aprende.
vidos nos EUA, desde fins da década de 1930, por Paralelamente ao desenvolvimento da pes-
B. F. Skinner. A palavra ‘operante’ significa que o
comportamento atua, age ou opera no ambien-
quisa experimental sobre a aprendizagem huma-
te, a fim de produzir algum efeito. na e animal, psicólogos de renome procuraram
interpretar os fenômenos da aprendizagem, inte-
grar as informações disponíveis a esse respeito e
Aprendizagem de Resposta Múltipla possibilitar predições precisas a partir de elabora-
ções teóricas.
Hilgard assinala que uma teoria da aprendi-
O terceiro tipo de aprendizagem é a apren- zagem preenche três funções essenciais:
dizagem de resposta múltipla. Refere-se à aqui-
sição de padrões ou sequências de respostas na
1. constitui uma forma de abordar essa
realização de uma tarefa, como, por exemplo, na
área do conhecimento, um modo de
aprendizagem de uma habilidade motora ou na
analisar, expor e orientar pesquisas so-
decoração de uma poesia. Existe, nesse caso, mais
bre aprendizagem;
do que um único ato identificável e as exigências
2. representa um esforço para integrar,
da situação impõem uma determinada sequên-
numa formulação relativamente breve,
cia regular de acontecimentos. Pertencem a essa
uma grande quantidade de conheci-
categoria as aprendizagens que envolvem movi-
mentos sobre os princípios ou leis da
mentos musculares sob o controle dos sentidos,
aprendizagem;
como guiar um carro, andar de bicicleta, tocar
piano etc. 3. é uma tentativa criadora de explicar o
“porquê” da aprendizagem, de com-
preender por que ela funciona de um
determinado modo.

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Psicologia da Educação

Há várias maneiras de classificar as teorias Outra maneira de separar as teorias da


da aprendizagem. Uma delas baseia-se na dis- aprendizagem consiste em classificá-las como
tinção filosófica entre empirismo e racionalismo. teorias S-R (estímulo-resposta), ou teorias cogni-
As teorias empiristas recorrem à associação de tivas.
ideias (ou eventos) para explicar a aprendizagem
e realçam a importância das experiências senso-
riais; descendem, portanto, da tradição filosófi- Atenção
ca do associacionismo de Hobbes, Locke, entre
outros. A posição oposta, denominada raciona- A aprendizagem cognitiva designa formas de
aprendizagem mais complexas, nas quais a per-
lismo, vê na razão humana a fonte essencial do cepção, a compreensão de relações significativas
conhecimento. Teve como precursores filósofos e o conhecimento são críticos, muito mais do
ilustres, como Descartes, Kant e outros. Seu prin- que o estabelecimento de associações entre estí-
mulo e resposta.
cipal interesse é a qualidade subjetiva da existên-
cia, ao passo que os empiristas se concentram na
avaliação externa, objetiva do homem.

9.2 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a),
A aprendizagem abrange comportamentos tanto dos organismos humanos quanto dos animais.
Refere-se, igualmente, ao comportamento de adaptação de sistemas conceituais inanimados, como má-
quinas, robôs, computadores etc. Aplica-se não só ao comportamento do organismo intacto ou total,
mas também à atividade de um sistema isolado de resposta.
A aprendizagem envolve eventos muito diversificados, como a ocorrência de uma contração mus-
cular, a aquisição de um conceito abstrato, simbólico – muitas vezes, impossível de ser verbalizado – ou
de uma regra gramatical, a aquisição de um sintoma neurótico e assim por diante.
A aprendizagem não se limita às respostas externas do organismo, que operam num ambiente par-
ticular, mas se relaciona, além disso, com grande número de distintas respostas internas do organismo e
com reações estritamente fisiológicas. Relaciona-se, ainda, com operações e fenômenos diversos, como
a motivação, a percepção, o desenvolvimento psicológico do organismo, a estrutura da personalidade,
fatores sociais e culturais e muitos outros.
A aprendizagem por Condicionamento Clássico (ou Condicionamento Pavloviano ou, ainda, Con-
dicionamento Respondente) segue um procedimento básico, descrito pelo fisiologista russo Ivan Pa-
vlov, em fins do século XIX. Pavlov condicionou a salivação no cão em resposta a estímulos inicialmente
neutros, auditivos ou visuais. A aprendizagem por condicionamento clássico depende de algum reflexo
fisiológico preexistente no organismo, controlado pelo sistema nervoso autônomo, como a salivação, a
contração pupilar à luz, a piscada quando um sopro de ar atinge o olho, o reflexo patelar e outros, sob a
forma de conexão entre estímulo e resposta. O estímulo do cheiro do alimento, por exemplo, produz a
resposta de salivação. Para fins de pesquisa, dá-se preferência a reflexos fisiológicos como este, que po-
dem ser facilmente provocados e medidos.
O segundo tipo de aprendizagem associativa a que se refere Hilgard é conhecido como condiciona-
mento operante. Tem por fundamento os procedimentos, conceitos e princípios desenvolvidos nos EUA,
desde fins da década de 1930, por B. F. Skinner. A palavra ‘operante’ significa que o comportamento atua,
age ou opera no ambiente, a fim de produzir algum efeito.

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9.3 Atividades Propostas

1. Quais funções deve preencher uma teoria da aprendizagem, segundo Hilgard?

2. Quais são as formas de aprendizagem designadas pela teoria cognitiva?

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TEORIAS DE APRENDIZAGEM:
10 ASSOCIACIONISTAS, S-R OU
COMPORTAMENTAIS

Caro(a) aluno(a),
Neste capítulo, trataremos das teorias de
aprendizagem, a partir da abordagem comporta-
mentalista.

10.1 O Conexionismo de Thorndike

Devemos ao psicólogo Edward L. Thorndi- associações; ou, conforme as palavras de Thorndi-


ke uma das mais influentes e populares teorias da ke, “exercitar uma conexão entre estímulo e uma
aprendizagem, segundo o modelo associacionis- resposta fortalece-a; não exercitar tal conexão
ta de estímulo-resposta. Conhecida como cone- durante um certo período a enfraquece.” A lei do
xionismo, afirma que um hábito é adquirido por efeito afirma que uma associação é fortalecida ou
ensaio e erro, de modo que uma resposta apro- enfraquecida em virtude de suas consequências
priada se torna gradualmente associada a um es- (recompensa e punição). A lei do efeito de Thorn-
tímulo particular. dike antecipou o papel decisivo que os chamados
Thorndike propôs três leis ou princípios ge- estímulos reforçadores (alimento, água, elogios
rais de aprendizagem. A lei de prontidão diz que e outros) assumiram em explicações posteriores
uma impressão sensorial se associa a um impul- da aprendizagem, como, por exemplo, em Skin-
so para agir e, quando existe uma tendência para ner. Thorndike salientou também a importância
a ação, executar essa ação causa satisfação, mas de vários fatores motivacionais na aprendizagem:
não fazê-lo causa aborrecimento. Segundo a lei do interesse pela atividade, interesse pelo autoa-
exercício, as associações entre estímulo e resposta perfeiçoamento, significância, atitude-problema,
são fortalecidas com a prática ou repetição dessas concentração da atenção etc.

Atenção

Thorndike propôs três leis ou princípios gerais de aprendizagem:

• a lei de prontidão diz que uma impressão sensorial associa-se a um impulso para agir e, quando existe uma tendên-
cia para a ação, executar essa ação causa satisfação, mas não fazê-lo é aborrecido;
• segundo a lei do exercício, as associações entre estímulo e resposta são fortalecidas com a prática ou repetição
dessas associações ou, conforme as palavras de Thorndike, “exercitar uma conexão entre estímulo e uma resposta
fortalece-a; não exercitar tal conexão durante um certo período a enfraquece”;
• a lei do efeito afirma que uma associação é fortalecida ou enfraquecida em virtude de suas consequências (recom-
pensa e punição). A lei do efeito de Thorndike antecipou o papel decisivo que os chamados estímulos reforçadores
(alimento, água, elogios e outros) assumiram em explicações posteriores da aprendizagem, como, por exemplo, em
Skinner.

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10.2 O Condicionamento Operante de Skinner

A contribuição de Burrhus Frederic Skinner Interessado por diferenças entre o com-


à compreensão da aprendizagem estriba-se na portamento operante e o comportamento respon-
associação entre uma resposta desejada e um dente, Skinner concluiu que o primeiro é emitido
estímulo reforçador que a segue. Filia-se, por- pelo organismo e opera (ou tem um efeito) no
tanto, ao mesmo grupo de teorias S-R nas quais o ambiente, enquanto o comportamento respon-
reforçamento desempenha um papel fundamen- dente é eliciado por mudanças de estimulação
tal, como a de Thorndike. Além disso, Skinner no ambiente. A dilatação e a contratação das
realça os papéis dos estímulos discriminativos pupilas, em resposta a mudanças de ilumina-
– estímulos frente aos quais o organismo apren- ção, ou a salivação diante de um prato saboroso,
de a responder de modo diferente em relação a são exemplos de comportamento respondente.
cada um deles – e da diferenciação da resposta. Discar um número de telefone, resolver um pro-
No primeiro caso, a apresentação ou remo- blema de palavras cruzadas, dirigir um carro ou
ção de um dado estímulo discriminativo controla escrever uma poesia são comportamentos ope-
a ocorrência de um padrão particular de resposta rantes. Os respondentes são, no começo, evoca-
(controle de estímulos). No segundo caso, o da dos por estímulos específicos identificáveis, mas
diferenciação da resposta, trata-se da aprendiza- os operantes não têm estímulos identificáveis
gem na qual um reforçamento diferencial altera para evocá-los inicialmente. Convencido de que
a resposta, modificando sua forma, intensidade, a maioria dos comportamentos humanos é ope-
amplitude etc. A organização de discriminações rante, Skinner dedicou-se à pesquisa do condi-
de estímulo e respostas diferenciadas, em ca- cionamento operante ao longo de sua vida. Ele
deias ou padrões adequados, explica formas bas- definiu reforço como o que quer que seja que
tante complexas de comportamento, segundo aumente a probabilidade da nova ocorrência de
Skinner. uma dada resposta.

Atenção

Skinner
Interessado por diferenças entre o comportamento operante e o comportamento respondente, Skinner
concluiu que o primeiro é emitido pelo organismo e opera (ou tem um efeito) no ambiente, enquanto
o comportamento respondente é eliciado por mudanças de estimulação no ambiente.
A dilatação e a contratação das pupilas em resposta a mudanças de iluminação e a salivação diante de
um prato saboroso são exemplos de comportamentos respondentes. Discar um número de telefone,
resolver um problema de palavras cruzadas, dirigir um carro e escrever uma poesia são comportamen-
tos operantes.
Os respondentes são, no começo, evocados por estímulos específicos identificáveis, mas os operantes
não têm estímulos identificáveis para evocá-los inicialmente. Convencido de que a maioria dos com-
portamentos humanos é operante, Skinner dedicou-se à pesquisa do condicionamento operante ao
longo de sua vida. Ele definiu reforço como o que quer que seja que aumente a probabilidade de nova
ocorrência de uma dada resposta.

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Psicologia da Educação

10.3 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a),
O Conexionismo de Thorndike é um modelo associacionista de estímulo-resposta. Um hábito é
algo adquirido por ensaio e erro. A resposta apropriada torna-se associada a um estímulo particular.
A abordagem behaviorista enfatiza o papel dos estímulos ambientais na determinação do nosso
modo de agir. Como exemplo, além de Thorndike, destaca-se a contribuição de Skinner, baseada na as-
sociação entre uma resposta desejada e um estímulo reforçador que se segue.
A aprendizagem no Behaviorismo é entendida como uma mudança no comportamento, que ocor-
re como resultado da experiência.
O Behaviorismo, ou Comportamentalismo, é um termo criado por John Broadus Watson para de-
signar uma corrente de pensamento psicológico. Para os behavioristas, o comportamento é o objeto de
estudo.

10.4 Atividades Propostas

1. Do que trata o Conexionismo de Thorndike?

2. Quais são as conclusões a que Skinner chegou acerca do condicionamento operante?

Atenção

Caro(a) aluno(a)!
Nos próximos capítulos, estudaremos os
pressupostos de Jean Piaget, Lev Vygotsky
e Henri Wallon, que investigaram o desen-
volvimento humano, trazendo contribui-
ções para a atuação do educador.

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PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DE JEAN
11 PIAGET

Caro(a) aluno(a),
Atenção

O termo ‘cognição’, amplamente utilizado Neste capítulo trabalharemos os pressupos-


por educadores, é utilizado para se referir tos de Jean Piaget.
a todos os processos que empregamos
para adquirir e administrar informa- Piaget nasceu em Neuchâtel, em 09 de
ções. São processos cognitivos: percepção, agosto de 1896. Piaget morreu em Genebra, em
aprendizagem, memória, pensamento. 17 de setembro de 1980. Contribuiu com muitos
Eles relacionam-se com as habilidades de conceitos que apoiam estudos acerca do desen-
enfrentar situações e ajustar-se a elas. O de- volvimento. Vejamos alguns:
senvolvimento cognitivo consiste, em parte,
em mudanças no modo como os indivíduos ‘Cognição’: termo amplamente utilizado por
pensam o mundo que os cercam. educadores, é utilizado para se referir a todos os
processos que empregamos para adquirir e admi-
nistrar informações. São processos cognitivos: per-
cepção, aprendizagem, memória, pensamento.
Eles relacionam-se com as habilidades de enfren-
tar situações e ajustar-se a elas. O desenvolvimen-
to cognitivo consiste, em parte, em mudanças no
modo como os indivíduos pensam o mundo que
os cercam. O teórico mais influente dessa área foi
o psicólogo suíço Jean Piaget (1896-1980).

Curiosidade

Piaget nasceu em Neuchâtel, em 09 de agosto de 1896. Piaget morreu em Genebra, em 17 de setem-


bro de 1980.
Piaget é considerado o maior expoente do estudo do desenvolvimento cognitivo. Estudou inicialmen-
te Biologia na Universidade de Neuchâtel, onde concluiu seu doutorado, e posteriormente se dedicou
à área da Psicologia e Epistemologia.
Foi professor de psicologia na Universidade de Genebra, e tornou-se mundialmente reconhecido pela
sua revolução epistemológica. Durante sua vida, Piaget escreveu mais de cinquenta livros.
Duas de suas frases marcantes:
“O principal objetivo da educação é criar indivíduos capazes de fazer coisas novas e não simplesmente
repetir o que as outras gerações fizeram.”
“As estruturas operatórias da inteligência não são inatas.”

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A primeira formação de Piaget como biólo-


go teve importante influência sobre suas visões. Dicionário
Ele se interessou pelo desenvolvimento cognitivo
quando estava trabalhando como assistente de Inata: respostas que já nascem com o próprio
animal.
pesquisa no laboratório de Alfred Binet e Theo-
dore Simon, criadores do primeiro teste de inte-
ligência padronizado para crianças. Piaget ficou Estudar os postulados de Jean Piaget se faz
intrigado com as razões que as crianças apresen- necessário para o educador que está presente em
tavam ao responder a certas questões de maneira sala de aula e deseja contribuir para desvelar os
incorreta. Mais tarde, ele observou e estudou ou- processos cognitivos.
tras crianças, inclusive seus três filhos. Piaget considerou quatro estágios básicos
Piaget acreditava que o desenvolvimento de desenvolvimento cognitivo:
cognitivo era um modo de adaptação ao ambien-
te. Ao contrário de outros animais, o indivíduo 1. Sensório-Motor;
não é dotado de respostas inatas. E é justamente
2. Pré-Operacional;
essa característica que dá ao indivíduo humano
maior flexibilidade de adaptar seu pensamento e 3. Operações Concretas;
seu comportamento, a fim de se “ajustar” ao mun- 4. Operações Formais.
do à medida que o vivencia em sua determinada
idade. Para Piaget, as crianças são participantes
ativos na criação de sua própria interpretação de
mundo. Essa visão é uma das maiores contribui-
ções de Piaget.

Saiba mais

Caro(a) aluno(a), observe atentamente a importância que Piaget teve para a investigação dos
processos cognitivos.
Piaget procurou identificar as estruturas de pensamento, mostrando a capacidade humana de
criar conhecimentos cada vez mais sofisticados, decorrentes da ação dos sujeitos humanos em
interação com o mundo. Foi fundador da Epistemologia Genética, isto é, elaborou uma teoria
do conhecimento com base no estudo da gênese psicológica do pensamento humano numa
abordagem interdisciplinar, partindo de uma explicação biológica do conhecimento.
A tese piagetiana sustenta que o pensamento se origina da interiorização da ação, na qual se dá
a ligação entre o funcionamento biológico adaptativo e as operações intelectuais.

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Psicologia da Educação

11.1 Estágio Sensório-Motor (do nascimento aos 2 anos)

Atenção

Em um famoso estudo, as mães faziam uma marquinha de tinta vermelha no nariz dos filhos,
enquanto fingiam estar limpando o rosto deles. Depois, cada criança era colocada em frente ao
espelho. Os bebês com menos de um ano de idade olhavam fascinados para o bebê de nariz
vermelho que aparecia no espelho; alguns deles até mesmo esticavam os braços na tentativa
de tocar o reflexo do nariz. Mas os bebês que tinham entre 21 e 24 meses levantavam os braços
e tocavam seus próprios narizes vermelhos, mostrando, dessa maneira, que eles sabiam que o
bebê de nariz vermelho do espelho era “eu” (BROOKS-GUNN; LEWIS, 1984).

Caro(a) aluno(a), De acordo com Piaget, os bebês passam


O trecho a seguir explicita considerações seus dois primeiros anos de vida no estágio
acerca da inteligência sensório-motora. Leia com sensório-motor do desenvolvimento. Eles sim-
atenção. plesmente utilizam as habilidades com as quais
Para Piaget, o desenvolvimento do bebê já nasceram (o que chamamos de predisposição
se origina de uma indiferenciação entre o eu e o da espécie) – primordialmente, a de sugar e a de
não eu, a vida parecendo-se com um fluxo inin- agarrar o seio da mãe, seu próprio polegar ou
terrupto de sensações e movimentos. Eviden- qualquer outra coisa que esteja ao seu alcance.
ciando o papel ativo do sujeito na interação com De maneira semelhante, agarram um chocalho
o meio, o bebê realiza um duplo movimento de por reflexo. Quando percebem que o som vem
constituição de si mesmo, como sujeito, e do seu do chocalho, começam a sacudir tudo que con-
exterior. A inteligência sensório-motora – feita, seguem segurar, em uma tentativa de reproduzir
assim, de sensações e movimentos – é uma in- o som. Finalmente, eles distinguem entre coisas
teligência prática, que se realiza na e pela ação, que fazem barulho e as que não fazem. Dessa
uma ação que se exerce no aqui e agora porque maneira, os bebês começam a organizar suas ex-
ainda não se formaram os instrumentos de repre- periências, colocando-as em categorias rudimen-
sentação. A capacidade de representar, construí- tares, tais como “sugável” ou “não sugável”, “baru-
da ao longo desses primeiros dois anos de vida, lhento” ou “não barulhento”.
implica que uma coisa – um objeto, um evento e,
mais tarde, uma ideia ou um sentimento – pode
ser representada por outra, de natureza simbólica
ou semiótica: uma palavra, uma imagem mental,
um desenho.
Com a capacidade de representar, o pensa-
mento alcança novos poderes: liberado do aqui e
agora, pode lembrar-se do passado e projetar o
futuro (COLINVAUX et al., 2010).

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Curiosidade

Caro(a) aluno(a), um novo destaque para ilustrar sua leitura:


A ideia piagetiana de desenvolvimento propõe que a capacidade cognitiva não nasce nem do
sujeito, nem do objeto, mas pela interação deles. Para Piaget, a capacidade cognitiva humana
origina-se da interação sujeito-objeto.
É assim que a influência do meio vai sendo anexada progressivamente ao sujeito pela ação des-
te; não anexação direta do meio, mas sínteses progressivas construídas a partir das repercussões
produzidas pela assimilação do meio. O desenvolvimento segue dois caminhos correlatos. Pelas
assimilações, o sujeito dirige-se ao mundo do objeto – meio físico ou social. Isto é, o sujeito
consegue avançar na direção do centro dos objetos, ou seja, conhecê-los cada vez mais, instru-
mentalizado pelas acomodações.
Em outras palavras, explorando o mundo ao redor (assimilação), ele consegue constituir seu
mundo interno, sua subjetividade. Conhecendo melhor o mundo, conhece melhor a si mesmo,
e consciente de si estará aberto para novas aprendizagens, que promoverão melhor adaptação
aos desafios gerados pelo mundo (COLINVAUX et al., 2010).

Outro resultado importante do estágio Quando têm entre 18 e 24 meses, conseguem até
sensório-motor é o desenvolvimento da perma- mesmo imaginar o movimento de um objeto que,
nência do objeto, isto é, a consciência de que os na verdade, elas não veem se mexer. A essa ha-
objetos continuam a existir mesmo que estejam bilidade chamamos de representações mentais,
fora do nosso campo de visão. Para um recém- sendo que a manipulação dessas representações
-nascido, os objetos que desaparecem simples- em sua cabeça é a conquista mais importante do
mente deixam de existir. Mas, à medida que as final do estágio sensório-motor. Também é esse o
crianças adquirem experiência no mundo, desen- momento em que as crianças desenvolvem a ca-
volvem a percepção da permanência dos objetos. pacidade de autorreconhecimento.

Curiosidade

Caro(a) aluno(a), atenção aos destaques:


ƒƒAs noções de si mesmo e de objeto são, para Piaget, a base sobre a qual as novas constru-
ções relativas ao eu e ao mundo se assentarão, expressando os momentos do desenvolvi-
mento psicológico.
ƒƒPara Piaget, o período de 0 a 2 anos, denominado sensório-motor, é vital para o desenvolvi-
mento da inteligência, pois as construções realizadas aí formam a base do desenvolvimento
posterior.
ƒƒA gênese da construção cognitiva de “si mesmo” e “do real” está, pois, no período sensório-
-motor, no qual é construída a inteligência prática e a lógica das ações.
ƒƒA criança de até dois anos tem uma inteligência prática que se manifesta pela lógica das
ações e pela construção das noções práticas de objeto, espaço, tempo e causalidade (CO-
LINVAUX et al., 2010).

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Saiba mais

Caro(a) aluno(a), atenção às palavras do autor:

“No momento do nascimento, a criança dispõe de uma série de condutas reflexas como sugar,
chorar, espirrar, agarrar [...]. A partir deste momento irão se produzindo, por diferenciação, outras
condutas mais complexas que são chamadas de esquemas, que seriam unidades básicas da
atividade mental. Este processo de diferenciação é o resultado da adaptação do organismo ao
meio, adaptação que lhe permite sobreviver quando há mudanças nas condições ambientais.”
(PIAGET, 1985a, p. 46).

11.2 Estágio Pré-Operacional (2 a 7 anos)

Curiosidade

Caro(a) aluno(a),
ƒƒObserve atentamente a importância de um trabalho pedagógico na Educação Infantil que con-
sidere as contribuições dos pressupostos de Piaget, pois para ele:
ƒƒA capacidade de enumerar ou contar objetos nasce das atividades de classificação e seriação,
amplamente exercitadas no brinquedo.
ƒƒ Ao brincar a criança explora seu mundo exterior, assimilando novas formas de se comunicar
com ele, constituindo sua linguagem, sua subjetividade.
ƒƒ Para conhecer-se um objeto, faz-se necessário agir sobre ele, modificá-lo, transformá-lo e com-
preender o processo dessa transformação, compreendendo o modo como o objeto foi cons-
truído.
ƒƒ Decorre que conceitos não se transmitem, mas constroem-se.
ƒƒ Ao aprender pela própria atividade, o sujeito alcançará um surpreendente resultado: aumentará
ainda mais a sua capacidade de aprender. Sua autonomia.
ƒƒ Quando o sujeito consegue realizar um equilíbrio entre assimilação e acomodação, alcança a
capacidade de refletir sobre sua experiência, num processo construtivo e permanente de adap-
tação a novos desafios cognitivos.

Quando as crianças entram no estágio pré- elas. O pensamento representativo também es-
-operacional do desenvolvimento cognitivo, seu tabelece os fundamentos de outros dois marcos
pensamento ainda está muito limitado às suas ex- típicos desse estágio – a participação em jogos
periências físicas e perceptivas. Mas sua crescente de fantasia (uma caixa de papelão vira um caste-
capacidade de usar representações mentais lança lo) e o uso de gestos simbólicos (cortar o ar com
as bases para o desenvolvimento da linguagem uma espada imaginária para matar um dragão de
– uso de palavras como símbolos que represen- mentira).
tam acontecimentos, além de descrever e recor- Embora o indivíduo desse estágio tenha fei-
dar experiências e permitir que se raciocine sobre to progressos em relação ao primeiro estágio, ain-

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da pensa de forma egocêntrica – tem dificuldade pela aparência (FLAVELL, 1986). Ele tende a con-
de ver as coisas do ponto de vista de outra pessoa centrar sua atenção no aspecto mais saliente de
ou de se colocar no lugar dos outros. Outra carac- uma exibição ou um acontecimento, ignorando
terística dessa fase é que o indivíduo é enganado todo o resto.

Saiba mais

Em um famoso experimento, Piaget mostrou às crianças em idade pré-operacional dois co-


pos idênticos, preenchidos com suco até o mesmo nível. Perguntou-lhes então qual dos copos
continha mais suco e elas responderam (corretamente) que ambos continham a mesma quan-
tidade. Então Piaget despejou o suco de um dos copos em outro, mais alto e mais estreito. No-
vamente, perguntou às crianças qual dos copos continha mais suco. Elas olharam para os dois
recipientes, viram que o nível de líquido no copo maior e mais estreito era bem mais elevado e
então responderam que esse copo continha mais suco. De acordo com Piaget, as crianças des-
se estágio não conseguem levar em conta nem o passado (Piaget simplesmente despejou todo
o suco de um recipiente no outro), nem o futuro (caso ele tivesse despejado o suco de volta ao
copo anterior, os níveis de ambos os copos seriam idênticos).

Atenção

“Na experiência da criança as situações com as quais se defronta são geradas por seu meio
social e as coisas aparecem em contextos que lhes outorgam significações especiais. Portanto,
se assimilam situações nas quais os objetos desempenham certos papéis e não outros.” (PIAGET;
GARCIA, 1987).

11.3 Estágio Operacional-Concreto (7 a 11 anos)

Saiba mais

Sobre a construção de si mesmo, a perspectiva piagetiana focaliza mais os aspectos cognitivos


do que os elementos afetivos.
Se a consciência de si mesmo necessita das construções de objeto, espaço, tempo e causali-
dade, o eu é também um objeto de conhecimento para a criança. O objeto “eu”, localizado no
espaço e no tempo e inserido num sistema de relações causais, é também objeto que gera
sentimentos na criança, assim como o objeto “outro”.
Nota-se a concepção de Piaget sobre o desenvolvimento da afetividade da criança: uma evo-
lução paralela à da inteligência e que segue os mesmos passos e movimentos evolutivos. A
afetividade não pode, assim, interferir nas construções cognitivas, sendo responsável pelo ritmo
dessas construções. Esse posicionamento a respeito das relações entre afetividade e inteligên-
cia reflete a opção epistemológica do autor, explicitando as ênfases de seu modelo teórico: a
construção cognitiva do conhecimento e a teoria da inteligência (COLINVAUX et al., 2010).

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Durante o estágio operacional-concreto, superordenadas e subordinadas. Por exemplo: se


o indivíduo fica mais flexível com relação ao seu você mostrar a uma criança em idade pré-escolar
pensamento. Ele aprende a levar em conta mais cinco coelhos e três ratos de brinquedo e per-
de uma dimensão de um problema ao mesmo guntar a ela se há mais coelhos ou animais pre-
tempo, e a enxergar uma situação do ponto de sentes, quase sempre a criança responderá que
vista de outra pessoa. Esta é a idade em que as há “mais coelhos”. Somente depois dos 7 anos,
crianças se tornam capazes de compreender ela conseguirá pensar nos objetos como, simul-
os princípios de conservação, relacionados à taneamente, membros de duas classes, uma mais
quantidade, extensão, área e massa. Todos es- inclusiva que a outra. Mesmo depois de alguns
ses elementos envolvem compreensão de que anos na escola, o pensamento das crianças ainda
quantidades básicas permanecem constantes, está muito limitado ao “aqui e agora”. Frequente-
independentemente de alterações superficiais mente elas são capazes de solucionar problemas
na aparência. Outra conquista dessa fase é a ca- que ainda não tenham pontos de referência con-
pacidade de compreender complexos esquemas cretos que possam manipular ou imaginar estar
de classificação, como os que envolvem classes manipulando.

11.4 Estágio Operacional-Formal (adolescência – idade adulta)

Saiba mais

“Se se deseja, como necessariamente se faz cada vez mais sentir, formar indivíduos capazes de
criar e de trazer progresso à sociedade de amanhã, é claro que uma educação ativa e verdadeira
é superior a uma educação consistente apenas em moldar os assuntos do querer pelo já esta-
belecido e os do saber pelas verdades simplesmente aceitas.” (PIAGET, 1985b).

“Conquistar por si mesmo um certo saber; com a realização de pesquisas livres, e por meio de
um esforço espontâneo, levará a retê-lo muito mais; isso possibilitará sobretudo ao aluno a
aquisição de um método que lhe será útil por toda vida e aumentará permanentemente a sua
curiosidade, sem risco de estancá-la.” (PIAGET, 1998).

A limitação do estágio anterior é superada A teoria de Jean Piaget contribui em dema-


no estágio operacional-formal do desenvolvi- sia para entendermos o desenvolvimento da cog-
mento cognitivo, geralmente alcançado durante nição, contudo recebeu inúmeras críticas, sendo
a adolescência. Os jovens dessa idade conseguem que a principal se refere ao fato de que Piaget não
pensar de maneira abstrata, estão aptos a formu- estava preocupado inicialmente com a educação
lar hipóteses, testá-las mentalmente e aceitá-las e sim com o desenvolvimento do homem. Esse
ou rejeitá-las de acordo com os resultados dessas sentido é pertinente, pois um olhar atento perce-
experimentações mentais. Portanto, são capazes be que o vetor (direção) para Piaget é: do indiví-
de ir além do “aqui e agora” e de compreender as duo para o meio, e isto se dá por meio do desen-
coisas em termos de causa e efeito, considerar as volvimento de sua estrutura mental, sendo então
possibilidades, bem como as realidades, e desen- possível a compreensão do que está fora.
volver e utilizar regras, princípios e teorias gerais.

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Essa sua minimização da interação com o relacionamentos. Esse estágio é caracterizado por
social gerou uma crítica de outro grande teórico uma lógica interna consistente e pela habilidade
da psicologia: Lev Vygotsky. de solucionar problemas concretos.

Resumidamente, os estágios são assim ca- 4º Estágio: Operacional formal


racterizados: No estágio operacional formal – desenvol-
vido entre os 12 e 15 anos de idade – a criança
1º Estágio: Sensório-motor começa a raciocinar lógica e sistematicamente.
No estágio sensório-motor, que dura do Esse estágio é definido pela habilidade de de-
nascimento ao 18º mês de vida, a criança busca senvolver o raciocínio abstrato. No estágio das
adquirir controle motor e aprender sobre os ob- operações formais, desenvolvido a partir dos 12
jetos físicos que a rodeiam. Esse estágio se chama anos de idade, a criança inicia sua transição para
sensório-motor, pois o bebê adquire o conheci- o modo adulto de pensar, sendo capaz de pensar
mento por meio de suas próprias ações que são sobre ideias abstratas.
controladas por informações sensoriais imedia- Em seus estudos sobre crianças, Jean Pia-
tas. get elaborou uma nova forma de se conceber a
construção do conhecimento, partindo de uma
epistemologia genética. Essa descoberta levou
2º Estágio: Pré-operacional
Piaget a recomendar aos adultos que adotassem
No estágio pré-operacional, que dura do uma abordagem educacional diferente ao lidar
18º mês aos 8 anos de vida, a criança busca adqui- com crianças. Na visão de Piaget, as crianças são
rir a habilidade verbal. Nesse estágio, ela já conse- as próprias construtoras ativas do conhecimento,
gue nomear objetos e raciocinar intuitivamente, constantemente criando e testando suas teorias
mas ainda não consegue coordenar operações sobre o mundo. Ele forneceu uma percepção
fundamentais. sobre as crianças que serve como base de mui-
tas linhas educacionais atuais. Assim, as crianças
3º Estágio: Operacional concreto aprendem a ler lendo, a escrever escrevendo: por
No estágio operacional-concreto, que dura aprendizagens significativas. O conhecimento se
dos 8 aos 12 anos de vida, a criança começa a li- constrói pela ação do sujeito sobre o seu pensar
dar com conceitos abstratos, como os números e e o seu fazer.

11.5 Resumo do Capítulo

Piaget contribuiu para diferentes campos de estudos científicos: a psicologia do desenvolvimento,


a teoria cognitiva e o que veio a ser chamado de epistemologia genética. Piaget destaca a importância
de observarmos cuidadosamente a maneira com que o conhecimento se desenvolve nas crianças, para
que possamos entender melhor a natureza do conhecimento humano. Suas pesquisas sobre a psicologia
do desenvolvimento e a epistemologia genética tinham o objetivo de entender como o conhecimento
evolui. Piaget formulou a teoria de que o conhecimento evolui progressivamente por meio de estrutu-
ras de raciocínio que substituem umas às outras através de estágios. O ser humano em seu processo de
adaptação a seu meio social, reestrutura-se cognitivamente, a partir de desafios mobilizadores de novas
formas de pensamento. Decorre que a adaptação é a essência do funcionamento intelectual, assim como
a essência do funcionamento biológico. Desde a mais tenra idade (estágio sensório-motor), o ser huma-

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no atua ativamente sobre seu processo de aprendizagem, considerando seus avanços motores na busca
pelo autocontrole para além do funcionamento de ações puramente reflexas.
Assim, para Piaget, a atividade intelectual não pode ser separada do funcionamento “total” do or-
ganismo, pois, do ponto de vista biológico, a organização é inseparável da adaptação: eles são dois pro-
cessos complementares de um único mecanismo, sendo que o primeiro é o aspecto interno do ciclo do
qual a adaptação constitui o aspecto externo.
Desse modo, na busca pela adaptação, as novas estruturas cognitivas são integradas às anteriores
pelos processos de assimilação e acomodação.
A assimilação consiste na tentativa do indivíduo em solucionar uma determinada situação a partir
da estrutura cognitiva que ele possui naquele momento específico da sua existência. Representa um pro-
cesso contínuo na medida em que o indivíduo está em constante atividade de interpretação da realidade
que o rodeia e, consequentemente, tendo que se adaptar a ela.
A acomodação consiste na capacidade de modificação da estrutura mental antiga para dar conta
de dominar um novo objeto do conhecimento. Quer dizer, a acomodação representa “o momento da
ação do objeto sobre o sujeito”, emergindo, portanto, como o elemento complementar das interações
sujeito-objeto.
Em seu trabalho, Piaget identifica quatro estágios da evolução mental de uma criança. Cada estágio
é um período onde o pensamento e o comportamento infantil são caracterizados por uma forma especí-
fica de conhecimento e raciocínio. Esses quatro estágios são: sensório-motor, pré-operacional, operacio-
nal concreto e operacional formal.

11.6 Atividades Propostas

1. Como Piaget descreve o desenvolvimento cognitivo?

2. Quais são os estágios básicos de desenvolvimento cognitivo segundo Piaget?

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PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DE
12 VYGOTSKY

Caro(a) aluno(a), neste capítulo estudare- gia acadêmica começou a se delinear a partir do
mos os pressupostos de Vygotsky. contato com os problemas de crianças com defei-
Lev Semenovitch Vygotsky nasceu em 17 de tos congênitos, tais como cegueira, retardo men-
novembro de 1896. Faleceu em 11 de junho de tal severo, afasia etc. Tal experiência o estimulou a
1934. Lev Vygotsky (1896-1934) estudou Direito e encontrar alternativas que pudessem ajudar o de-
Literatura na Universidade de Moscou. Começou senvolvimento dessas crianças. Esse estudo não
sua carreira aos 21 anos, em Gomel, no período tinha como pretensão contribuir para a reabilita-
de 1917 a 1923. Lecionou Literatura, Ciências e ção das crianças somente, significava uma opor-
Psicologia em várias instituições. Já nessa época, tunidade de compreensão dos processos mentais
preocupava-se também com questões ligadas à humanos.
Pedagogia. O interesse de Vygotsky pela Psicolo-

Atenção

Caro(a) aluno(a), na obra de Vygotsky é importante destacarmos que:

O foco das interações com outros indivíduos levou o autor a reconhecer que a apropriação da
linguagem de seu grupo social em decorrência dessas interações constitui o processo mais importante
no desenvolvimento humano. A emergência da linguagem verbal, de um agir comunicacional, vai
regular a atividade em geral da criança, pelo estabelecimento de um acordo sobre os objetivos e as
formas de ação mais complexas, que podem ser planejadas e avaliadas.
Os adultos interagem com as crianças estimulando-as a incorporar, desde o nascimento, os
significados e modos de operar com a informação que foram sendo historicamente construídos em
uma determinada cultura.
O desenvolvimento humano é nessa concepção uma tarefa conjunta e recíproca (OLIVEIRA; REGO,
2010).

12.1 Funções Psicológicas Superiores

Vygotsky dedicou-se ao estudo das cha- portanto, dos processos psicológicos elementa-
madas funções psicológicas superiores, que con- res (presentes na criança pequena e nos animais),
sistem no modo de funcionamento psicológico tais como reações automáticas, ações reflexas e
humano. São processos não inatos, que se desen- associações simples, que são de origem biológica.
volvem ao longo do processo de internalização O projeto principal de seu trabalho consistia na
de formas culturais de comportamento. Diferem, tentativa de estudar os processos de transforma-

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José Antônio Lima

ção do desenvolvimento humano na sua dimen- ƒƒ Memória Ativa;


são filogenética, histórico–social e ontogenética. ƒƒ Pensamento Abstrato;
Deteve-se ao estudo dos mecanismos psicológi- ƒƒ Raciocínio Dedutivo;
cos mais sofisticados (as chamadas funções psi-
ƒƒ Capacidade de planejamento.
cológicas superiores), típicos da espécie humana:

ƒƒ Controle Consciente do Comportamen-


to;
ƒƒ Atenção e Lembrança Voluntária;

Curiosidade

Vygotsky foi um pensador importante em sua área, foi pioneiro na noção de que o desenvolvi-
mento intelectual das crianças ocorre em função das interações sociais e condições de vida. Veio
a ser descoberto pelos meios acadêmicos ocidentais muitos anos após a sua morte, que ocorreu
em 1934, por tuberculose aos 37 anos.

12.2 Abordagem Sociointeracionista

A teoria histórico-cultural do psiquismo, 3. Análises da natureza das relações en-


também conhecida como abordagem socioin- tre o uso de instrumento e desenvolvi-
teracionista, elaborada por Vygotsky, tem como mento da linguagem.
objetivo central “caracterizar os aspectos tipica-
mente humanos do comportamento e elaborar
hipóteses de como essas características se for-
maram ao longo da história humana e de como
se desenvolvem durante a vida de um indivíduo.”
(VYGOTSKY, 1984, p. 21).
Vejamos então três questões centrais na
abordagem sociointeracionista:

1. A tentativa de compreender a relação


entre seres humanos e seu ambiente
físico-social;
2. A intenção de identificar as formas no-
vas de atividade que fizeram com que o
trabalho fosse o meio fundamental de
relacionamento entre homem e natu-
reza, analisando as consequências psi-
cológicas dessa atividade;

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Psicologia da Educação

12.3 Níveis de Desenvolvimento para Vygotsky

O teórico identifica dois níveis de desen- O Nível de Desenvolvimento Potencial


volvimento: (NDP) pode ser entendido como aquilo que o in-
divíduo é capaz de fazer, só que mediante a ajuda
1. Nível de Desenvolvimento Real; de outra pessoa (adultos ou crianças mais expe-
2. Nível de Desenvolvimento Potencial. rientes). Nesse caso, a criança realizará tarefas e
solucionará problemas através do diálogo, da
colaboração, da imitação, da experiência com-
O Nível de Desenvolvimento Real (NDR) partilhada e das pistas que lhe são fornecidas. Por
pode ser entendido com referência àquelas con- exemplo: uma criança de 5 anos pode não con-
quistas que já estão consolidadas na criança, seguir montar um quebra-cabeça logo de início,
àquelas funções ou capacidades que ela já apren- mas, com a ajuda de seu irmão ou pessoa mais
deu e domina, pois já consegue utilizar sozinha, velha, pode realizar a tarefa.
sem assistência de alguém mais experiente da
cultura (pai, mãe, professor, criança mais velha
etc.). Por exemplo: andar de bicicleta, soltar pipa,
cortar com tesoura.
Estamos tratando de um nível de desenvol-
vimento já estabelecido, o indivíduo já aprendeu,
isto é, estamos olhando para o desenvolvimento
retrospectivamente.

12.4 Zona de Desenvolvimento Proximal

A distância entre aquilo que o indivíduo é Atualmente, vemos a Psicologia da Educa-


capaz de fazer de forma autônoma (NDR) e aqui- ção possibilitar a discussão de várias teorias sobre
lo que ele realiza em colaboração com os outros o Desenvolvimento e a Aprendizagem (como as
elementos de seu grupo social (NDP) caracteri- teorias de Piaget e Vygotsky).
za aquilo que Vygotsky chamou de Zona de De-
senvolvimento Proximal (ZDP), sendo, portanto,
aquelas funções que o indivíduo ainda não ama-
dureceu.
Esse conceito, embora desconhecido por
muitos educadores, é um instrumento contínuo
no cotidiano escolar, já que existe tal relação en-
tre o professor, o conhecimento a ser aprendido
e o aluno.

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12.5 Algumas Implicações da Abordagem Vygotskyana para a Educação

Atenção

A teoria histórico-cultural do psiquismo, também conhecida como abordagem sociointeracionista,


elaborada por Vygotsky, tem como objetivo central “caracterizar os aspectos tipicamente humanos
do comportamento e elaborar hipóteses de como essas características se formaram ao longo da
história humana e de como se desenvolvem durante a vida de um indivíduo.” (VYGOTSKY, 1984,
p. 21).

A obra de Vygotsky pode significar uma Guardadas as devidas limitações, suas pro-
grande contribuição para a área da educação, na duções possibilitam a análise psicológica de algu-
medida em que traz importantes reflexões so- mas questões relacionadas ao ensino e sugerem
bre o processo de formação das características uma reavaliação de aspectos já consagrados no
psicológicas tipicamente humanas e, como con- campo educacional.
sequência, suscita questionamentos, aponta di- Ao desenvolver o conceito de zona de de-
retrizes e instiga a formulação de alternativas no senvolvimento proximal e outras teses, Vygotsky
plano pedagógico. oferece elementos importantes para a compreen-
No entanto, vale ressaltar que não é pos- são de como se dá a integração entre ensino,
sível encontrar nas suas teses (como em outras aprendizagem e desenvolvimento.
propostas teóricas) soluções práticas ou instru- Faremos, a seguir, uma reflexão, sobre algu-
mentos metodológicos de imediata aplicação na mas implicações de suas ideias.
prática educativa cotidiana. Esse impedimento
deve-se não somente às peculiaridades de sua
obra, como também à própria problemática en-
volvida no complexo estabelecimento de diálogo
entre as teorias e a prática pedagógica.

Atenção

Atenção às palavras do autor:

“Educar sempre significa mudar. Se não houvesse nada para mudar não haveria nada para edu-
car.” (VYGOTSKY, 2004).

“É impossível contestar o fato empiricamente estabelecido e reiteradamente verificado de que


o ensino, de uma forma ou de outra, deve estar combinado ao nível de desenvolvimento da
criança.” (VYGOTSKY, 2004, p. 478).

Valorização do Papel da Escola com esse tema é coerente com a perspectiva his-
tórica, que considera fundamental a análise das
A leitura da obra de Vygotsky permite iden- condições concretas para o desenvolvimento de
tificar, em várias passagens, a atenção especial um determinado tipo de cognição.
que dedica à educação escolar. Sua preocupação

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Psicologia da Educação

Conforme abordado anteriormente, ele distribuído? Se a escolarização desempenha um


chama a atenção para o fato de que a escola, por papel tão fundamental na constituição do indiví-
oferecer conteúdos e desenvolver modalidades duo que vive numa sociedade letrada e complexa
de pensamentos bastante específicos, tem um como a nossa, a exclusão, o fracasso e o abando-
papel diferente e insubstituível na apropriação no da escola, por parte dos alunos, constituem
pelo sujeito da experiência culturalmente acu- nessa perspectiva fatores de extrema gravidade.
mulada. Justamente por isso, ela representa o Isso quer dizer que o fato de o indivíduo não ter
elemento imprescindível para a realização plena acesso à escola significa um impedimento da
do desenvolvimento dos indivíduos (que vivem apropriação do saber sistematizado, da constru-
em sociedades escolarizadas), já que promove ção de funções psicológicas mais sofisticadas, de
um modo mais sofisticado de analisar e genera- instrumentos de atuação e transformação de seu
lizar os elementos da realidade: o pensamento meio social e de condições para a construção de
conceitual. novos conhecimentos.
Na escola, as atividades educativas, diferen- Todavia, é importante ressaltar que seria in-
tes daquelas que ocorrem no cotidiano extraes- gênuo supor que a frequência da criança à escola
colar, são sistemáticas, têm uma intencionalidade seja suficiente para que os processos menciona-
deliberada e compromisso explícito (legitimado dos acima ocorram. Sabemos que a presença na
historicamente) em tornar acessível o conheci- escola não é garantia de que o indivíduo se apro-
mento formalmente organizado. Nesse contexto, prie do acervo de conhecimentos sobre as áreas
as crianças são desafiadas a entender as bases básicas daquilo que foi elaborado por seu grupo
dos sistemas de concepções científicas e a tomar cultural. O acesso a esse saber dependerá, entre
consciência de seus próprios processos mentais. outros fatores, de ordem social, política e econô-
Ao interagir com esses conhecimentos, o ser mica, da qualidade do ensino oferecido. Nesse
humano se transforma, aprende a ler e a escrever, sentido, o pensamento de Vygotsky traz outra
obtém o domínio de formas complexas de cálcu- implicação: contribui para suscitar a necessidade
los, constrói significados a partir das informações de uma avaliação mais criteriosa de como essa
descontextualizadas, amplia seus conhecimen- agência educativa vem desempenhando sua tão
tos, lida com conceitos científicos hierarquica- relevante função.
mente relacionados, atividades extremamente O ensino verbalista, baseado na transmis-
importantes e complexas, que possibilitam novas são oral de conhecimento por parte do professor,
formas de pensamento, de inserção e atuação em assim como as práticas espontaneístas, que ab-
seu meio. Isso quer dizer que as atividades de- dicam de seu papel de desafiar e intervir no pro-
senvolvidas e os conceitos aprendidos na escola cesso de apropriação de conhecimento por parte
(que Vygotsky chama de científicos) introduzem das crianças e adolescentes, são, na perspectiva
novos modos de operação intelectual: abstrações vygotskyana, além de infrutíferos, extremamente
e generalizações mais amplas acerca da realidade inadequados. Seus postulados apontam para a
(que por sua vez transformam os modos de uti- necessidade de criação de melhores condições na
lização da linguagem). Como consequência, na escola, para que todos os alunos tenham acesso
medida em que a criança expande seus conhe- às informações e experiências e possam efetiva-
cimentos, modifica sua relação cognitiva com o mente aprender.
mundo.
O pensamento de Vygotsky nos remete
imediatamente a uma discussão acerca dos as-
pectos sociopolíticos envolvidos na questão do
saber: será que o conhecimento construído pelo
grupo humano está sendo, de fato, socialmente

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Saiba mais

“A brincadeira é a melhor forma de organização do comportamento emocional. A brincadeira


da criança é sempre emocional, desperta nela sentimentos fortes e nítidos, mas a ensina a se-
guir as emoções, a combiná-las com as regras do jogo e o seu objetivo final. Assim, a brincadeira
constitui as primeiras formas de comportamento consciente que surgem na base do instinto e
do emocional. É o melhor meio de uma educação integral de todas essas diferentes formas e es-
tabelecimento de uma correta coordenação e um vínculo entre elas.” (VYGOTSKY, 2004, p. 147).

O Ensino e as Funções Psicológicas to e participar de situações planejadas de leitura


e escrita. Portanto, não tem sentido esperar que
A qualidade do trabalho pedagógico está primeiro ocorra o desenvolvimento para que só
associada, nessa abordagem, à capacidade de então seja permitido que a criança aprenda. Essa
promoção de avanços no desenvolvimento do inversão, que parece apenas um jogo de palavras,
aluno. Conforme abordamos anteriormente, po- sugere na verdade uma mudança significativa no
demos encontrar o fundamento dessa posição no modo de entender (e praticar) o ensino.
conceito de zona de desenvolvimento proximal, Vygotsky afirma que o bom ensino é aquele
o qual descreve o “espaço” entre as conquistas já que se adianta ao desenvolvimento, ou seja, que
adquiridas pela criança (aquilo que ela já sabe que se dirige às funções psicológicas que estão em
é capaz de desempenhar sozinha) e aquelas que vias de se completarem. Essa dimensão prospec-
para se efetivarem dependem da participação tiva do desenvolvimento psicológico é de gran-
de elementos mais capazes (aquilo que a criança de importância para a educação, pois permite a
tem a competência de saber ou de desempenhar compreensão de processos de desenvolvimento
somente com a colaboração de outros sujeitos). que, embora presentes no indivíduo, necessitam
Esse princípio desestabiliza algumas cren- da intervenção e colaboração de parceiros mais
ças bastante cristalizadas no âmbito pedagógico. experientes da cultura para se consolidarem e,
De modo geral, nos meios educacionais ainda como consequência, ajuda a definir o campo e
parece prevalecer a visão de que o desenvolvi- as possibilidades da atuação pedagógica. Assim,
mento é pré-requisito para o aprendizado. Um por exemplo, ensinar a grafia dos números de 0
bom exemplo disso são os difundidos trabalhos a 10 para uma criança de 7 anos que já os conhe-
de “prontidão”, normalmente desenvolvidos no ce e os escreve com desenvoltura (porque está
período pré-escolar, que têm a intenção explícita acostumada a lidar com dinheiro, a fazer trocos e
de desenvolver na criança determinadas habili- operações matemáticas simples) não provocará
dades (tais como a discriminação áudio-viso-mo- nenhum tipo de transformação no seu processo
tora, noções de lateralidade e orientação espacial psicológico. Será igualmente improdutivo tentar
etc.) com o objetivo de “prepará-las” para o futuro ensinar para essa mesma criança operações ma-
aprendizado da língua escrita. temáticas muito sofisticadas, como equações de
2º grau. Enfim, ensinar o que o aluno já sabe ou
Do ponto de vista da teoria histórico-cultu-
aquilo que está totalmente longe da sua possibili-
ral, isso é uma contradição, já que os processos de
dade de aprender é totalmente ineficaz.
desenvolvimento são impulsionados pelo apren-
dizado. Ou seja, só “amadurecerá”, se aprender. A escola desempenhará bem seu papel na
Assim, no caso do exemplo citado, a criança só medida em que, partindo daquilo que a criança já
poderá aprender a ler e a escrever se tiver acesso sabe (o conhecimento que ela traz de seu cotidia-
a informações sobre esse objeto de conhecimen- no, suas ideias a respeito dos objetos, fatos e fe-

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nômenos, suas “teorias” acerca do que observa no de desenvolver nos alunos capacidades intelec-
mundo), for capaz de ampliar e desafiar a cons- tuais que lhes permitam assimilar plenamente os
trução de novos conhecimentos – na linguagem conhecimentos acumulados. Isso quer dizer que
vygotskyana, incidir na zona de desenvolvimento ela não deve se restringir à transmissão de con-
potencial dos educandos. Dessa forma, poderá teúdos, mas, principalmente, ensinar o aluno a
estimular processos internos que acabarão por se pensar, ensinar formas de acesso e apropriação
efetivar, passando a constituir a base que possibi- do conhecimento elaborado, de modo que ele
litará novas aprendizagens. possa praticá-las autonomamente ao longo de
São bastante oportunas as colocações, ba- sua vida, além de sua permanência na escola. Essa
seadas nos pressupostos de Vygotsky, feitas pelo é, segundo Davidov, a tarefa principal da escola
russo Davidov, sobre o tipo de ensino que de fato contemporânea frente às exigências das socieda-
impulsiona o desenvolvimento das capacidades des modernas.
dos alunos. Afirma que a escola deve ser capaz

Saiba mais

Caro(a) aluno(a), reflita atentamente:

A escola desempenhará bem seu papel quando, partindo daquilo que a criança já sabe (o co-
nhecimento que ela traz de seu cotidiano, suas ideias a respeito dos objetos, fatos e fenômenos,
suas “teorias” acerca do que observa no mundo), for capaz de ampliar e desafiar a construção
de novos conhecimentos – na linguagem vygotskyana, incidir na zona de desenvolvimento
potencial dos educandos. Dessa forma, poderá estimular processos internos que acabarão por
se efetivar, passando a constituir a base que possibilitará novas aprendizagens.

O Papel do Outro na Construção do técnicas, formas de pensar e de se comportar, que


Conhecimento a humanidade construiu ao longo de sua história.
Para que a criança possa dominar esses co-
É preciso que examinemos, mais detalha- nhecimentos, é fundamental a mediação de in-
damente, os postulados de Vygotsky sobre a for- divíduos, sobretudo dos mais experientes de seu
mação do conhecimento, já que esse é um tema grupo cultural. Mas para que exista apropriação
fundamental na área da educação. Para que pos- é preciso também que exista internalização, que
samos analisar essa questão, é necessário que re- implica a transformação dos processos externos
tomemos algumas ideias expostas até agora. (concretizados nas atividades entre as pessoas)
Como vimos, segundo a teoria histórico- em um processo intrapsicológico.
-cultural, o indivíduo se constitui enquanto tal
não somente devido aos processos de maturação
orgânica, mas, principalmente, através de suas in- Dicionário
terações sociais, a partir das trocas estabelecidas
Intrapsicológico: onde a atividade é reconstruí-
com seus semelhantes. As funções psíquicas hu- da internamente.
manas estão intimamente vinculadas ao apren-
dizado, à apropriação (por intermédio da lingua-
gem) do legado cultural de seu grupo. O longo caminho do desenvolvimento hu-
Esse patrimônio, material e simbólico, con- mano segue, portanto, a direção do social para
siste no conjunto de valores, conhecimentos, o individual. Dessa forma, na perspectiva de
sistemas de representação, construtos materiais, Vygotsky, construir conhecimentos implica uma

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ação partilhada, já que é através dos outros que O Papel da Imitação no Aprendizado
as relações entre sujeito e objeto de conhecimen-
to são estabelecidas. Vygotsky dá uma nova dimensão também
O paradigma esboçado sugere, assim, um ao papel da imitação no aprendizado. Geralmen-
redimensionamento do valor das interações te associa-se a atividade imitativa a um processo
sociais (entre os alunos e o professor e entre as puramente mecânico, de cópia e repetição. En-
crianças) no contexto escolar. Essas passam a ser tretanto, como vimos, para Vygotsky, a imitação
entendidas como condição necessária para a pro- oferece a oportunidade de reconstrução (interna)
dução de conhecimento por parte dos alunos, daquilo que o indivíduo observa externamente. A
particularmente aquelas que permitam o diálogo, imitação pode ser entendida como um dos possí-
a cooperação e a troca de informações mútuas, o veis caminhos para o aprendizado, um instrumen-
confronto de pontos de vista divergentes e que to de compreensão do sujeito.
implicam a divisão de tarefas onde cada um tem Através da imitação, as crianças são capa-
uma responsabilidade que, somadas, resultarão zes de realizar ações que ultrapassam o limite de
no alcance de um objetivo comum. Cabe, portan- suas capacidades, como, por exemplo, uma crian-
to, ao professor não somente permitir que elas ça pequena, ainda não alfabetizada, pode imitar
ocorram, como também promovê-las no cotidia- seu irmão e “escrever” uma lista com os nomes dos
no das salas de aula. jogadores de seu time preferido. Desse modo, ela
Dessa maneira, a heterogeneidade, carac- estará internalizando os usos e funções da escri-
terística presente em qualquer grupo humano, ta e promovendo o desenvolvimento de funções
passa a ser vista como fator imprescindível para psicológicas que permitirão o domínio da escrita.
as interações na sala de aula. Os diferentes rit- É nesse sentido que Vygotsky afirma que a imita-
mos, comportamentos, experiências, trajetórias ção é uma das formas das crianças internalizarem
pessoais, contextos familiares, valores e níveis de o conhecimento externo.
conhecimento de cada criança (e do professor) Vista por esse ângulo, a imitação de mode-
imprimem ao cotidiano escolar a possibilidade de los fornecidos pelos sujeitos assume um papel
troca de repertórios, de visão de mundo, confron- estruturante, pois amplia a capacidade cognitiva
to, ajuda mútua e consequente ampliação das ca- individual. Todavia, ressalta que o indivíduo só
pacidades individuais. consegue imitar aquilo que está no seu nível de
Em síntese, uma prática escolar baseada desenvolvimento.
nesses princípios deverá necessariamente consi- Por exemplo:
derar o sujeito ativo (e interativo) no seu proces-
so de conhecimento, já que ele não é visto como
Se uma criança tem dificuldade com um
aquele que recebe passivamente as informações problema de aritmética e o professor o
do exterior. Todavia, a atividade espontânea e in- resolve no quadro negro, a criança pode
dividual da criança, apesar de importante, não é captar a solução num instante. Se, no
suficiente para a apropriação dos conhecimentos entanto, o professor solucionasse o pro-
acumulados pela humanidade. Deverá, portanto, blema usando a matemática superior, a
criança seria incapaz de compreender a
considerar também a importância da intervenção solução, não importando quantas vezes a
do professor (entendido como alguém mais ex- copiasse. (VYGOTSKY, 1984, p. 99).
periente da cultura) e, finalmente, as trocas efeti-

vadas entre as crianças (que também contribuem
para os desenvolvimentos individuais). Esses postulados trazem uma importante
implicação à educação escolar, já que, através da
imitação (instrumento de reconstrução no senti-

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Psicologia da Educação

do vygotskyano), o indivíduo aprende. O forneci- as crianças copiem da lousa desenhos já prontos


mento de sugestões, exemplos e demonstrações (feitos pela professora ou retirados de alguma car-
no contexto escolar adquiriram um papel de ex- tilha) é sem dúvida uma tarefa pouco significativa
trema importância. É interessante, pois, que se e desafiadora, que não favorecerá o processo de
promovam situações que permitam a imitação, criação. Atividades como essa servem, na maior
observação e reprodução de modelos. parte das vezes, para inibir e estereotipar sua ex-
Apesar de potencialmente fértil para o co- pressão. Isso é bastante diferente de uma situa-
tidiano escolar, essa questão precisa ser analisa- ção em que, por exemplo, o professor sugere que
da com cautela, para que não corramos o risco as crianças observem, apreciem, teçam comen-
de interpretar de maneira equivocada as ideias tários sobre os desenhos elaborados pelo grupo
originalmente expressas por Vygotsky. Existe ob- (que se encontram expostos na parede) ou sobre
viamente uma enorme diferença em propor ati- as obras de artistas variados (que podem ser co-
vidades descontextualizadas que visem à mera nhecidas através dos livros de arte disponíveis na
repetição sem sentido de um modelo observado sala). Finalmente propõe que escolham, entre os
e aquelas que de fato intervêm e desencadeiam trabalhos observados, alguma característica que
o processo de aprendizagem dos alunos. Quando queiram reproduzir, como, por exemplo, quanto
Vygotsky fala em imitação, não está se referindo, à cor, material ou técnica empregada. O objeti-
obviamente, aos “rituais de cópias” ou propostas vo desse professor é mais amplo do que a mera
de imitações mecânicas e literais de modelos for- repetição, sua intenção é ampliar o repertório de
necidos pelo adulto. cada criança, permitir a troca de informações e
Recorremos a alguns exemplos com a in- experiências entre os colegas e também propiciar
tenção de esclarecer essa distinção. Propor que o contato das crianças com a arte produzida pelos
homens ao longo de sua história.

Saiba mais

Caro(a) aluno(a), reflita sobre estas palavras de Vygotsky em relação à importância da imitação
para a educação:
“O mérito essencial da imitação na criança consiste em que ela pode imitar ações que vão
muito além dos limites das suas próprias capacidades, mas estas, não obstante, não são de
grandeza infinita. Através da imitação na atividade coletiva, orientada pelos adultos a criança
está em condição de fazer bem mais, e fazer compreendendo com autonomia. A divergência
entre os níveis de solução de tarefas – acessíveis sob orientação – com o auxílio de adultos e na
atividade independente determina a zona de desenvolvimento imediato da criança (ou zona
de desenvolvimento proximal). O que hoje a criança faz com o auxílio do adulto fará amanhã
por conta própria. A zona do desenvolvimento imediato pode determinar para nós o amanhã
da criança, o estado dinâmico do seu desenvolvimento que leva em conta não só o já atingido
mas também o que se encontra em processo de amadurecimento.” (VYGOTSKY, 2004, p. 480).

A Brincadeira no Processo de Aprendizagem Ela também é responsável por criar “uma zona
de desenvolvimento proximal”, justamente por-
A discussão de Vygotsky sobre o papel da que, através da imitação realizada na brincadeira,
imitação nos remete à questão da brincadeira e a criança internaliza regras de conduta, valores,
de sua importância no contexto escolar. Confor- modos de agir e pensar de seu grupo social, que
me exposto, a brincadeira tem uma função signi- passam a orientar o seu próprio comportamento
ficativa no processo de desenvolvimento infantil. e desenvolvimento cognitivo.

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Assim, o brinquedo não só possibilita o de- alunos, uma vez que as interações estabelecidas
senvolvimento de processos psíquicos por parte entre as crianças também têm um papel funda-
da criança, como também serve de instrumento mental na promoção de avanços no desenvolvi-
para conhecer o mundo físico e seus fenômenos; mento individual.
os objetos (e seus usos sociais); e, finalmente, en- Isso não significa, no entanto, que seu pa-
tender os diferentes modos de comportamento pel seja dispensável ou menos importante. Muito
humano (os papéis que desempenham, como se pelo contrário, a função que ele desempenha no
relacionam e os hábitos culturais). Portanto, no contexto escolar é de extrema relevância, já que é
contexto escolar (principalmente no período pré- o elemento mediador (e possibilitador) das intera-
-escolar), a brincadeira não deveria ser entendi- ções entre os alunos e das crianças com os objetos
da como uma atividade secundária ou como um de conhecimento.
“mero passatempo” das crianças, ao contrário, de- No cotidiano escolar, a intervenção “nas
veria ser valorizada e estimulada, já que tem uma zonas de desenvolvimento proximal” dos alunos
importante função pedagógica. é de responsabilidade (ainda que não exclusiva)
Para que as brincadeiras infantis tenham lu- do professor; visto como parceiro privilegiado,
gar garantido no cotidiano das instituições edu- justamente porque tem maior experiência, infor-
cativas, é fundamental a atuação do educador. É mações e a incumbência, entre outras funções,
importante que as crianças tenham espaço para de tornar acessível ao aluno o patrimônio cultural
brincar, assim como opções de mexer no mobiliá- já formulado pelos homens e, portanto, desafiar
rio, que possam, por exemplo, montar casinhas, através do ensino os processos de aprendizagem
cabanas, tendas de circo etc. e desenvolvimento infantil.
O tempo que as crianças têm à disposição Nessa perspectiva, as demonstrações, expli-
para brincar também deve ser considerado. É im- cações, justificativas, abstrações e questionamen-
portante dar tempo suficiente para que as brin- tos do professor são fundamentais no processo
cadeiras surjam, se desenvolvam e se encerrem. educativo. Isto não quer dizer que ele deva “dar
O educador pode, assim, auxiliar não somente sempre a resposta pronta”. Tão importante quanto
na organização do espaço e tempo para as brin- o fornecimento de informações e pistas, é a pro-
cadeiras, como também auxiliar na escolha de moção de situações que incentivem a curiosidade
utensílios para o incremento do jogo. Como, por das crianças, que possibilitem a troca de informa-
exemplo, oferecer sucatas (que são materiais ex- ções entre os alunos e que permitam o aprendiza-
tremamente ricos, pois apresentam uma enorme do das fontes de acesso ao conhecimento. Nesse
variedade de cores, formas, texturas e tamanhos) caso, é oportuno que se planejem atividades que
que possibilitem que as crianças montem, des- envolvam observação (por exemplo, de fenôme-
montem e construam (castelos, comidinhas para nos da natureza), pesquisa sobre determinado
doente, um navio etc.) inúmeras situações imagi- tema (em casa, na biblioteca, com os parentes
nárias. etc.), resolução de questões específicas (que po-
dem tentar ser respondidas individualmente, em
O Professor como Mediador das Interações duplas ou grupos maiores) ou mesmo proposta
de estudos e preparação de seminários, palestras
ou outras apresentações.
A partir do exame das teses expressas por
Vygotsky, é importante que façamos algumas Mas para que ele possa intervir e planejar es-
considerações acerca do papel do professor. O re- tratégias que permitam avanços, reestruturação e
ferencial analisado sugere a necessidade de rede- ampliação do conhecimento já estabelecido pelo
finição de sua função. Podemos dizer que, nessa grupo de alunos, é necessário que conheça o ní-
abordagem, o professor deixa de ser visto como vel efetivo das crianças, ou melhor, as suas desco-
agente exclusivo de informação e formação dos bertas, hipóteses, informações, crenças, opiniões,

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Psicologia da Educação

enfim, suas “teorias” acerca do mundo circundan- como brincam etc.) podem ser fontes preciosas
te. Este deve ser considerado como “ponto de para o planejamento de atividades significativas
partida”. Para tanto, é preciso que, no cotidiano, e eficientes em termos dos objetivos que se quer
o professor estabeleça uma relação de diálogo alcançar.
com as crianças e que crie situações em que elas Para que o professor possa desempenhar
possam expressar aquilo que já sabem. Enfim, é com competência sua função, é preciso que, além
necessário que o professor se disponha a ouvir e de melhores condições salariais e de trabalho, ele
notar as manifestações infantis. Nesse sentido, a também seja escutado. Os professores têm ideias,
observação e o registro (como, por exemplo, atra- hipótese, princípios explicativos e conhecimen-
vés de diários, relatórios etc.) das características tos (baseados na sua experiência de vida e na sua
do grupo de crianças (como produzem, de que trajetória como aluno e profissional) que, quando
modo interagem, como se relacionam com os di- revelados, podem oferecer importantes pistas e
versos objetos de conhecimento, suas descober- subsídios na busca de novos modos de ação jun-
tas, principais dúvidas e dificuldades, interesses, to a eles.

Curiosidade

Conheça algumas frases de Vygotsky:

“As palavras desempenham um papel central não apenas no desenvolvimento mental, mas tam-
bém no crescimento histórico da consciência como um todo. Palavras são microcosmos de cons-
ciência humana.”
“O pensamento não apenas se expressa em palavras; ele adquire existência através delas.”
“As estruturas da língua assimiladas pela criança transformam-se nos alicerces de seu pensamento.”

Os que trabalham na área de formação de Finalmente, gostaríamos de observar que


professores não podem esperar mudanças na talvez a maior contribuição de seu pensamento
atuação do professor junto a seus alunos, se não esteja no fato de ele suscitar questionamentos
mudarem a sua forma de atuar junto aos profes- em torno de temas nevrálgicos e ainda mal resol-
sores. Para que se possa ajudá-los na construção vidos no sistema educacional vigente em nossa
de novos conhecimentos (incidir na sua “zona de realidade. Os postulados de Vygotsky parecem
desenvolvimento proximal”) é preciso partir da- apontar para a necessidade de criação de uma es-
quilo que ele sabe. Nesse sentido, entendemos cola bem diferente da que conhecemos. Uma es-
que o pensamento de Vygotsky também inspira cola em que as pessoas possam dialogar, duvidar,
reflexões no que se refere à questão da formação discutir, questionar e compartilhar saberes. Onde
dos professores. existe espaço para transformações, diferenças,
Várias outras reflexões sobre a prática es- erros, contradições, colaboração mútua e criati-
colar ainda poderiam ser feitas, a partir das inspi- vidade. Uma escola em que professores e alunos
rações trazidas pelas ideias do Vygotsky. Chama- tenham autonomia, possam pensar, refletir sobre
mos a atenção apenas para alguns aspectos, que, o seu próprio processo de construção de conhe-
no nosso entender, contribuem para uma análise cimentos e ter acesso a novas informações. Uma
da questão pedagógica. escola em que o conhecimento já sistematizado

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não é tratado de forma dogmática e esvaziado de Nessa perspectiva, as demonstrações, expli-


significado. cações, justificativas, abstrações e questionamen-
No cotidiano escolar, a intervenção “nas zo- tos do professor são fundamentais no processo
nas de desenvolvimento proximal” dos alunos é educativo. Isso não quer dizer que ele deva “dar
de responsabilidade (ainda que não exclusiva) do sempre a resposta pronta”. Tão importante quan-
professor; visto como parceiro privilegiado, justa- to o fornecimento de informações e pistas, é a
mente, porque tem maior experiência, informa- promoção de situações que incentivem a curio-
ções e a incumbência, entre outras funções, de sidade das crianças, que possibilitem a troca de
tornar acessível ao aluno o patrimônio cultural informações entre os alunos e que permitam o
já formulado pelos homens e, portanto, desafiar aprendizado das fontes de acesso ao conheci-
através do ensino os processos de aprendizagem mento.
e desenvolvimento infantil.

Atenção

Caro(a) aluno(a), não esqueça que:

Para que as brincadeiras infantis tenham lugar garantido no cotidiano das instituições educati-
vas, é fundamental a atuação do educador. É importante que as crianças tenham espaço para
brincar, assim como opções de mexer no mobiliário; que possam, por exemplo, montar casinhas,
cabanas, tendas de circo etc.
No cotidiano escolar, a intervenção “nas zonas de desenvolvimento proximal” dos alunos é de
responsabilidade (ainda que não exclusiva) do professor.

12.6 Resumo do Capítulo

Vygotsky contribuiu para o alcance de uma nova teoria psicológica, diferente da psicologia experi-
mental e da psicologia cognitiva. Ele desenvolveu algo novo que não era a simples soma, mas a interação
entre esses elementos.
A nova psicologia integra numa mesma perspectiva, o homem enquanto corpo e mente; ser bioló-
gico e ser social, enquanto membro da espécie humana e participante do processo histórico.
Vygotsky interessou-se em compreender os mecanismos psicológicos mais sofisticados que são
típicos do ser humano, tais como: a capacidade do pensamento humano de pensar em objetos ausen-
tes, imaginar eventos nunca vividos, planejar ações a serem realizadas em momentos posteriores. Dessa
forma, o cérebro não é um mero suporte das funções psicológicas superiores, mas parte de sua consti-
tuição. O surgimento das funções superiores não elimina as elementares; o que ocorre é a superação das
elementares, sobressaindo as superiores, mas nunca deixando de existir as elementares.
Vygotsky dedicou-se ao estudo das chamadas funções psicológicas superiores, que consistem no
modo de funcionamento psicológico humano. São processos não inatos, que se desenvolvem ao longo
do processo de internalização de formas culturais de comportamento. Diferem, portanto, dos processos
psicológicos elementares (presentes na criança pequena e nos animais), tais como reações automáticas,
ações reflexas e associações simples, que são de origem biológica. São:

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Controle Consciente do Comportamento; Atenção e Lembrança Voluntária; Memória Ativa; Pensa-


mento Abstrato; Raciocínio Dedutivo; Capacidade de Planejamento.
Segundo Vygotsky é o desenvolvimento sócio-histórico que nos permite sair de um estágio pri-
mitivo para um mais complexo, passando de um estágio natural para o cultural. A mediação é um dos
elementos fundamentais da teoria de Vygotsky. Decorre que a mediação é o processo de intervenção de
um elemento intermediário em uma relação: a relação então deixa de ser direta e passa a ser mediada
por esse elemento. A aprendizagem e o desenvolvimento estão inter-relacionados e combinados.
Vygotsky descreve dois níveis em sua teoria do desenvolvimento.
O nível de desenvolvimento real – quando a criança já pode cumprir uma tarefa sem nenhum tipo
de ajuda. Os aspectos psíquicos nessa fase são aqueles que já se encontram consolidados.
O nível de desenvolvimento potencial – é aquilo que a criança consegue fazer com a ajuda dos
outros; o que poderia ser, de alguma maneira, muito mais indicativo de seu desenvolvimento mental do
que aquilo que consegue fazer sozinha.
A Zona de Desenvolvimento Proximal: é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se
costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento po-
tencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração
com companheiros mais capazes.
Para Vygotsky, os signos, a linguagem simbólica desenvolvida pela espécie humana, têm um pa-
pel similar ao dos instrumentos: tanto os instrumentos de trabalho quanto os signos são construções
da mente humana, que estabelecem uma relação de mediação entre o homem e a realidade. Por essa
similaridade, Vygotsky denominava os signos de instrumentos simbólicos, com especial atenção à lin-
guagem, que para ele configurava-se um sistema simbólico fundamental em todos os grupos humanos
e elaborado no curso da evolução da espécie e história social.
Pensamento e linguagem têm origens diferentes. Inicialmente o pensamento não é verbal e a lin-
guagem não é intelectual. Suas trajetórias de desenvolvimento estão implicadas.
A partir do momento que a criança descobre que tudo tem um nome, cada novo objeto que surge
representa um problema que a criança resolve atribuindo-lhe um nome. Quando lhe falta a palavra para
nomear esse novo objeto, a criança recorre ao adulto. Esses significados básicos de palavras assim adqui-
ridos funcionarão como embriões para a formação de novos e mais complexos conceitos.
Em síntese, as três questões centrais na abordagem sociointeracionista são:

1. A tentativa de compreender a relação entre seres humanos e seu ambiente físico-social;


2. A intenção de identificar as formas novas de atividade que fizeram com que o trabalho fosse o
meio fundamental de relacionamento entre homem e natureza, analisando as consequências
psicológicas dessa atividade;
3. Análises da natureza das relações entre o uso de instrumento e desenvolvimento da lingua-
gem.

A obra de Vygotsky pode significar uma grande contribuição para a área da educação, na medida
em que traz importantes reflexões sobre o processo de formação das características psicológicas tipica-
mente humanas e, como consequência, suscita questionamentos, aponta diretrizes e instiga a formula-
ção de alternativas no plano pedagógico.

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Ao desenvolver o conceito de zona de desenvolvimento proximal e outras teses, Vygotsky oferece


elementos importantes para a compreensão de como se dá a integração entre ensino, aprendizagem e
desenvolvimento.
O educador como modelo mediador da criança com o seu meio cultural deve possibilitar diferentes
repertórios para a ampliação da interação no processo de aprendizagem.
No cotidiano escolar, a intervenção “nas zonas de desenvolvimento proximal” dos alunos é de res-
ponsabilidade (ainda que não exclusiva) do professor; visto como parceiro privilegiado, justamente, por-
que tem maior experiência, informações e a incumbência, entre outras funções, de tornar acessível ao
aluno o patrimônio cultural já formulado pelos homens e, portanto, desafiar através do ensino os proces-
sos de aprendizagem e desenvolvimento infantil.
Nessa perspectiva, as demonstrações, explicações, justificativas, abstrações e questionamentos do
professor são fundamentais no processo educativo. Isto não quer dizer que ele deva “dar sempre a res-
posta pronta”. Tão importante quanto o fornecimento de informações e pistas, é a promoção de situações
que incentivem a curiosidade das crianças, que possibilitem a troca de informações entre os alunos e que
permitam o aprendizado das fontes de acesso ao conhecimento.

12.7 Atividades Propostas

1. Segundo Vygotsky o que são as funções psicológicas superiores?

2. Quais são os níveis de desenvolvimento segundo Vygotsky?

3. Para Vygotsky, o que significa a zona de desenvolvimento proximal?

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13 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DE WALLON

Caro(a) aluno(a), Wallon nasceu na França


em 1879. Antes de chegar à psicologia passou
pela filosofia e medicina, e ao longo de sua carrei-
ra foi cada vez mais explícita a aproximação com
a educação. Faleceu em 1962.

Curiosidade

A gênese da inteligência para Wallon é genética e organicamente social, ou seja, “o ser humano
é organicamente social e sua estrutura orgânica supõe a intervenção da cultura para se atualizar.”
(DANTAS, 1983).
Nesse sentido, a teoria do desenvolvimento cognitivo de Wallon é centrada na psicogênese da
pessoa completa.

13.1 Introdução às Teorias de Henri Wallon

Atenção

Caro(a) aluno(a), observe atentamente que:

A psicogenética walloniana coloca a dimensão afetiva no lugar central, tanto ao que se refere
à construção da pessoa quanto ao conhecimento. Ambas iniciam o período impulsivo – emo-
cional se estendendo no primeiro ano de vida e tendo continuidade nos demais estágios do
desenvolvimento.
Para Wallon, a emoção é a primeira linguagem da criança, sendo a sua primeira forma de sociabi-
lidade. A emoção como função humana tem uma natureza biopsiquicossocial.
O professor precisa ser um mediador, procurando resgatar e garantir um espaço de convivência
para o ensinar e o aprender. Esse processo pode ser garantido se a educação da emoção for
incluída entre os propósitos da ação pedagógica, o que supõe o conhecimento íntimo do seu
modo de funcionamento (WALLON apud LA TAILLE, 1992).

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Entender o processo de desenvolvimento -aprendizagem em outro patamar, porque dá ao


do aluno é indispensável à construção do conhe- conteúdo desse processo – que é a ferramenta do
cimento do professor. Esse processo é apresenta- professor – outro significado, expondo sua rele-
do de diferentes formas por várias teorias. Cada vância para o desenvolvimento concomitante do
uma privilegia dimensões diferentes e explica as cognitivo, do motor e do afetivo.
relações entre elas, a partir de pressupostos assu- A outra razão é o interesse profundo de
midos como verdadeiros. Wallon pela Educação, como um dos campos que
Escolhemos a teoria de Henri Wallon para pode se enriquecer com os conhecimentos ge-
descrever e explicar o desenvolvimento humano. rados pela Psicologia e, ao mesmo tempo, forne-
Esperamos, nesta disciplina, fazê-lo com clareza, cer conhecimentos que podem ser incorporados
conservando o significado que lhe foi atribuído pela Psicologia, a qual, por sua vez, deve também
pelo autor. Esperamos, também, que estas pági- manter estreitas relações com os conhecimentos
nas sejam um convite para um encontro direto produzidos pela Biologia e pela Sociologia. Ao in-
com Wallon por meio da leitura de seus textos corporar esses conhecimentos à formação de pro-
originais. É uma teoria que facilita compreender fessores, sugerem-se ao professor posturas mais
o indivíduo em sua totalidade, que indica as rela- abrangentes por incluir em suas decisões não só
ções que dão origem a essa totalidade, mostran- considerações relativas ao aspecto cognitivo, mas
do uma visão integrada da pessoa do aluno. Ver o também seu impacto sobre o motor e o afetivo.
aluno dessa perspectiva põe o processo ensino-

13.2 Os Estudos sobre Wallon

Saiba mais

Caro(a) aluno(a), é muito importante registrar que:

A compreensão dos pressupostos que embasam a teoria dos estágios de desenvolvimento hu-
mano e dos processos de análise utilizados por Wallon é instrumento importante para a análise
e compreensão dos fenômenos pedagógicos e psicológicos que ocorrem em sala de aula. As-
sim, os estudos do autor permitem inferências significativas para o trabalho pedagógico, assim
como diretrizes preciosas para a formação de professores. Professor e aluno são pessoas com-
pletas, com afeto, cognição e movimento e, portanto, se relacionam – completos e dinâmicos,
sendo de responsabilidade do professor a organização do meio pedagógico de modo propício
ao desenvolvimento do aluno.

O resgate de importantes contribuições Estudar – reolhar – as contribuições de Hen-


teóricas para a Psicologia e para a Educação tem ri Wallon para a compreensão do desenvolvimen-
sido um fenômeno significativo nas últimas déca- to humano, assim como buscar suas relações e
das, por possibilitar a ampliação das dimensões consequências para a compreensão do aluno, na
consideradas na análise dos processos de desen- escola e fora dela, como pessoa completa, é tarefa
volvimento e aprendizagem e permitir uma com- que alguns educadores e pesquisadores brasilei-
preensão mais abrangente, totalizante e integra- ros têm empreendido. Esses pesquisadores, nos
da do aluno. últimos anos, têm contribuído para o aprofun-

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Psicologia da Educação

damento da compreensão das ideias de Wallon humano e dos processos de análise utilizados por
e para estabelecer os vínculos das contribuições Wallon é instrumento importante para a análise
do autor com questões da escola, dos alunos, dos e compreensão dos fenômenos pedagógicos e
professores e da formação destes, possibilitando psicológicos que ocorrem em sala de aula. Assim,
diretrizes para desenvolver, nos professores, ati- os estudos do autor permitem inferências signifi-
tudes para um desempenho mais abrangente, cativas para o trabalho pedagógico, assim como
sensível e respeitoso em relação a todas as di- diretrizes preciosas para a formação de profes-
mensões que constituem a pessoa do aluno. Os sores. Professor e aluno são pessoas completas,
grupos de estudos têm se voltado para aprofun- com afeto, cognição e movimento e, portanto, se
dar e desenvolver pesquisas sobre fundamentos relacionam – completos e dinâmicos, sendo de
e aplicações das ideias de Henri Wallon, por meio responsabilidade do professor a organização do
de teses de doutorado, dissertações de mestrado meio pedagógico de modo propício ao desenvol-
e artigos. vimento do aluno.
A compreensão dos pressupostos que em-
basam a teoria dos estágios de desenvolvimento

13.3 Biografia do Autor

Henri Wallon nasceu e viveu na França en- Wallon dedicou-se primeiro à Psicologia.
tre 1879 e 1962. Durante esse período, o mundo Em 1914, registrou 214 minuciosas observações
foi abalado por duas guerras, que envolveram a de crianças de 2 a 15 anos, internadas em servi-
maioria dos países existente na época. ços psiquiátricos com profundas perturbações
Wallon participou da primeira (1914-1918) de comportamento: instabilidade, delinquência,
como médico, o que lhe proporcionou a oportu- perversidade etc. Esse estudo deu origem à sua
nidade de, ao tratar dos feridos, observar lesões tese de doutoramento, depois transformada em
orgânicas e seus reflexos sobre os processos psí- livro, L’Enfant Turbulent (1925). O resultado de tal
quicos. Na segunda (1939-1945), participou do estudo foi posteriormente revisto e comparado
movimento da Resistência contra os invasores a outras observações de soldados feridos na Pri-
nazistas, o que reforçou ainda mais sua crença na meira Grande Guerra, que também indicavam a
necessidade de a escola assumir valores de soli- possibilidade de relações entre lesões neurológi-
dariedade, justiça social, antirracismo como con- cas e efeitos no psiquismo.
dição para a reconstrução de uma sociedade justa
e democrática.
Sua trajetória acadêmica revelou sólida for-
mação em Filosofia, Medicina, Psiquiatria, áreas
que configuraram seu interesse em Psicologia.
Suas obras de atividade também se voltaram para
a Educação e culminaram no Projeto Langevin-
-Wallon2, proposta construída com o físico Lan-
gevin, para a reforma completa do sistema edu-
cacional francês após a Segunda Grande Guerra
(1947).

2
O Projeto Langevin-Wallon encontra-se no livro Psicologia y pedagogia: las ideas pedagógicas de Henri Wallon (MERANI, 1969).

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13.4 O Estudo da Normalidade a partir das Patologias

Wallon considerava o comportamento pa- semelhanças. A comparação visa tanto às seme-


tológico como laboratório natural para os estu- lhanças quanto às diferenças, cujas condições é
dos da Psicologia, pois nessas circunstâncias é preciso identificar cuidadosamente. O conheci-
possível observar os fenômenos se transforman- mento busca simultaneamente o mesmo e o di-
do mais lentamente e, assim, permitindo obser- ferente. O contraste é um dos recursos mais sur-
vações mais precisas. “A criança normal se desco- preendentes pelos quais se opera a diferenciação.
bre na criança patológica. Mas sob a condição de A diferença entre a criança normal e a patológica
não tentar entre elas uma comparação, uma as- é profunda e não consiste apenas no contraste
similação imediata.” (WALLON, 1984, p. 308). Para entre progressão gradual e contínua e um atraso
Wallon, comparar não é assimilar, ver apenas as e fixação de certos comportamentos.

13.5 A Teoria de Desenvolvimento

Depois da Psicopatologia, Wallon dedicou- gicas da consciência. Da análise de suas obser-


-se ao desenvolvimento da criança, considerando vações, comparando semelhanças e diferenças
que a questão fundamental dessa área é o estu- entre o desenvolvimento de crianças normais e
do da consciência e que o melhor caminho para patológicas, entre crianças e adultos, foi extrain-
entendê-la é buscar sua gênese, sua origem. do os princípios reguladores desse processo e
Concentrou-se, então, no processo de de- identificando seus vários estágios. Assim criou
senvolvimento para explorar as origens bioló- sua teoria de desenvolvimento.

A Quebra da Dicotomia em Wallon

Caro(a) aluno(a),

Observe atentamente neste tópico como a teoria de Wallon faz a leitura do desenvolvimento,
considerando suas consequências para a aprendizagem.
A teoria aponta para duas ordens de fatores que irão constituir as condições em que emergem
as atividades de cada estágio: fatores orgânicos e fatores sociais.
Reflita sobre a interação desses fatores para o desenvolvimento da aprendizagem e de suas
implicações para a educação.

Dicionário

Dicotomia: divisão em dois.

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Psicologia da Educação

Mas como a teoria de Wallon faz a leitura de As idades indicadas foram propostas por
desenvolvimento? Como explica esse processo? Wallon para as crianças de sua época e de sua
O que ela nos aponta? Para acompanhar a leitura cultura. Precisam ser revistas para a nossa cultura
feita por Wallon, é preciso um esforço para esca- nos dias de hoje. Entretanto, mais que os limites
par de um raciocínio dicotômico, que fragmenta etários, é preciso observar quais interesses e ativi-
a pessoa (ou motor ou afetivo; ou afetivo ou cog- dades predominam em cada período. Os estágios
nitivo), na direção de um raciocínio que apreenda só adquirem sentido dentro dessa sucessão tem-
a pessoa como se constituindo dessas dimensões poral, uma vez que cada um deles é gestado, pre-
em conjunto. Essas dimensões estão vinculadas parado pelas atividades do estágio anterior e de-
entre si e suas interações em constante movimen- senvolve atividades que prepararão a emergência
to; a cada configuração resultante, temos uma do próximo. Então, será possível perceber quais
totalidade responsável pelos comportamentos os comportamentos predominantes em cada um
daquela pessoa, naquele momento, naquelas cir- deles. As situações às quais a criança reage são as
cunstâncias. Cada configuração cria novas possi- que correspondem aos recursos de que dispõem.
bilidades, novos recursos motores, afetivos e cog-
nitivos que se revelam em atividades e, ao mesmo ƒƒ Estágio impulsivo emocional
tempo em que convivem com as atividades ad-
quiridas anteriormente, preparam a mudança Na primeira fase, Impulsiva (0 a 3 meses),
para o estágio seguinte. predominam atividades que visam à exploração
A teoria aponta para duas ordens de fatores do próprio corpo, às suas sensibilidades internas
que irão constituir as condições em que emer- e externas. É uma atividade global ainda não es-
gem as atividades de cada estágio: fatores orgâ- truturada, com movimentos bruscos, desordena-
nicos e fatores sociais. Será no mergulho do orga- dos de enrijecimento e relaxamento da tensão
nismo em dada cultura, em determinada época, muscular. Desses movimentos, são selecionados
que se desenvolverão as características de cada os que garantem a aproximação do outro para
estágio. A interação entre esses fatores define as cuidar da satisfação de necessidades e que pas-
possibilidades e os limites dessas características. sam a funcionar como instrumentos expressivos
A existência individual como estrutura orgânica de estados de bem-estar e mal-estar.
e fisiológica está enquadrada na existência social Na segunda fase, Emocional (3 a 12 meses),
de sua época. já é possível reconhecer padrões emocionais di-
ferenciados para medo, alegria, raiva etc. Inicia-se
Estágios do Desenvolvimento assim o processo de discriminação de formas de
se comunicar pelo corpo.
A sequência de estágios proposta por Wal-
lon é a seguinte: ƒƒ Estágios sensório-motor e projetivo

ƒƒ Impulsivo Emocional (0 a 1 ano): De 1 a 3 anos, as atividades se concentram


- 1ª Fase: Impulsivo (0 a 3 meses); na exploração concreta do espaço físico pelo
- 2ª Fase: Emocional (3 a 12 meses); agarrar, segurar, manipular, apontar, sentar, andar
etc., auxiliadas pela fala que se acompanha por
ƒƒ Sensório-Motor e Projetivo (1 a 3 anos);
gestos. Inicia-se assim o processo de discrimina-
ƒƒ Personalismo (3 a 6 anos); ção entre objetos, separando-os entre si. Toda
ƒƒ Categorial (6 a 11 anos); essa atividade motora exuberante do sensório-
ƒƒ Puberdade e Adolescência (11 anos em -motor e projetivo prepara não só o afetivo, mas
diante). também o cognitivo, que vai instrumentalizar a
criança para o próximo estágio.

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ƒƒ Estágio do personalismo I- Alternância Funcional de Direções


Opostas em cada Estágio - movimen-
De 3 a 6 anos, há exploração de si mesmo, tos predominantes:
como um ser diferente de outros seres, constru- ƒƒ Para Dentro, para o conhecimento
ção da própria subjetividade por meio das ativi- de si (Impulsivo Emocional, Persona-
dades de oposição (expulsão do outro) e ao mes- lismo, Puberdade e Adolescência);
mo tempo de sedução (assimilação do outro), de ƒƒ Para Fora, para o conhecimento do
imitação. Inicia-se assim o processo de discrimi- mundo exterior (Sensório-Motor e
nação entre o eu e o outro, tarefa central do per- Projetivo, Categorial).
sonalismo (separando-se, distinguindo-se do ou- II- Alternância na Predominância de
tro) que se revela no uso insistente de expressões Conjuntos Diferentes a cada Estágio:
como eu, meu, não etc. a configuração das relações entre o mo-
tor, o afetivo e o cognitivo mostra qual
ƒƒ Estágio categorial deles fica mais em evidência:
ƒƒ Motor (Impulsivo Emocional);
Entre 6 e 11 anos, a diferenciação nítida ƒƒ Afetivo (Personalismo, Puberdade e
entre o eu e o outro dá condições estáveis para Adolescência);
a exploração mental do mundo físico, mediante ƒƒ Cognitivo (Sensório-Motor e Proje-
atividades de agrupamentos, seriação, classifica- tivo, Categorial).
ção, categorização em vários níveis de abstração Cada um deles predomina em um está-
até chegar ao pensamento categorial. A organi- gio, nutrindo-se mutuamente; o exercí-
zação do mundo físico em categorias mais bem cio e amadurecimento de um interfe-
definidas possibilita também uma compreensão rem no amadurecimento dos outros.
mais nítida de si mesmo.

Aproximando as duas leis, temos que quan-


ƒƒ Estágios da puberdade e adolescência
do a direção é para si mesmo – centrípeta – o
predomínio é do afetivo; quando é para o mundo
A partir dos 11 anos, há exploração de si exterior – centrífuga – predomina o cognitivo. O
mesmo, como uma identidade autônoma, me- afetivo e o cognitivo têm sempre como suporte
diante atividade de confronto, autoafirmação, a atividade motora, ou em sua expressão exterior
questionamento, ao mesmo tempo em que se (deslocamentos no espaço) ou em sua expressão
submete e se apoia nos grupos de pares, contra- plástica (a forma do corpo mediante seu tônus).
pondo-se aos valores de tal como interpretados
pelos adultos com quem convive. Há domínio de III- Integração Funcional: relação entre
categorias cognitivas de maior nível de abstração, estágios como uma relação entre con-
nas quais a dimensão temporal toma relevo, pos- juntos funcionais hierarquizados. Os
sibilitando uma discriminação mais clara dos limi- primeiros estágios são conjuntos mais
tes de sua autonomia e de sua dependência. simples, com atividades mais primitivas
que vão sendo dominadas, integradas
As Leis Reguladoras do Processo de aos conjuntos mais complexos dos es-
Desenvolvimento tágios seguintes, conforme as possibi-
lidades do sistema nervoso e do meio
As leis reguladoras dessa sequência indi- ambiente.
cam então:

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Sincretismo e Diferenciação ção das relações que as unem (sincretismo). Essas


informações tendem para categorias, conceitos
Essas leis descrevem tanto o movimento do que se unem por relações claras, precisas: catego-
processo de desenvolvimento no seu todo quanto rias referentes ao mundo externo e referentes a si
nas fases menores dentro de cada estágio. Todos mesmo, ao tomar consciência de si.
os conjuntos funcionais, em suas várias configu- O motor, o afetivo, o cognitivo, as pessoas,
rações, revelam-se inicialmente de forma sincréti- embora cada um desses aspectos tenha identida-
ca, isto é, o motor, o afetivo e o cognitivo reagem de estrutural e funcional diferenciada, estão tão
como um todo sincrético aos estímulos internos e integrados que cada um é parte construtiva dos
externos. Aos poucos e exigindo esforço da crian- outros. Sua separação se faz necessária apenas
ça, vão se diferenciando e respondendo de forma para a descrição do processo.
cada vez mais precisa, mais clara, mais articulada, Uma das consequências dessa interpreta-
mais coordenada, isto é, mais adaptada às solici- ção é de que qualquer atividade humana sem-
tações do meio e às intenções da criança. Essas pre interfere em todos eles. Qualquer atividade
transformações traduzem a passagem do sincre- motora tem ressonâncias afetivas e cognitivas;
tismo para a diferenciação, que é uma tendência toda disposição afetiva tem ressonâncias moto-
de todo o processo de desenvolvimento. Desen- ras e cognitivas; toda operação mental tem res-
volver-se é ser capaz de responder com reações sonâncias afetivas e motoras. E todas elas têm um
cada vez mais específicas a situações cada vez impacto no quarto conjunto: a pessoa, que, ao
mais variadas. O motor vai de uma movimentação mesmo tempo em que garante essa integração,
global do corpo para atividades cada vez mais es- é resultado dela.
pecíficas, mais controladas, mais ajustadas às dife-
rentes situações do meio. Os movimentos vão se O Método de Análise
aperfeiçoando e a criança vai percebendo as rela-
ções entre a função de cada parte de seu corpo e
os objetos que a rodeiam. O afetivo tem origem Para a construção de seu método de análise,
nas sensibilidades internas de interocepção e de Wallon assumiu a perspectiva da Psicologia Gené-
propriocepção. Essas sensações são responsáveis tica. Considerava essa posição a mais adequada
pela atividade generalizada do organismo que, para estudar a transformação da criança em adul-
junto com a resposta do outro (sensibilidade de to, porque ela busca o sentido dos fenômenos em
exterocepção, isto é, sensibilidade que vem do ex- sua origem e transformações, conservando sua
terior), vai se transformando em sinalizações afe- unidade. A partir dessa perspectiva, e com recur-
tivas cada vez mais específicas de medo, alegria, sos da dialética na vertente do materialismo dia-
tranquilidade, raiva etc. Assim, variações muscu- lético, Wallon descreve e explica essas mudanças.
lares vão indicando situações de bem-estar ou de Assim elaborou seu método próprio: a análise ge-
mal-estar. nética comparativa multidimensional.
A presença do outro garantirá não só a so-
brevivência física, mas também a sobrevivência ƒƒ A análise genética comparativa mul-
cultural pela transmissão de valores, instrumen- tidimensional
tos, técnicas, crenças, ideias e afetos predominan-
tes na cultura. Isso se fará gradualmente por meio O método consiste em fazer uma série de
dos recursos intelectuais de que a criança dispõe comparações, conforme as necessidades da in-
a cada momento. Ela vai organizando todas as vestigação, para esclarecer cada vez mais o pro-
informações provenientes de seu meio e de seu cesso de desenvolvimento. Comparações:
organismo, as quais inicialmente se apresentam
de forma nebulosa, global, confusa, sem distin-

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ƒƒ Criança patológica com criança normal; tegração. Não há menor possibilidade, a


ƒƒ Criança normal com o adulto normal; partir dessa teoria, de considerá-la como
ƒƒ Adulto de hoje com o de civilizações se fosse composta de partes separadas,
primitivas; autônomas e analisáveis de per se.

ƒƒ Crianças normais da mesma idade e de


idades diferentes; A Construção do “Eu”
ƒƒ Criança com o animal...
A teoria nos aponta, então, conjuntos fun-
cionais que atuam como uma unidade organiza-
O fenômeno é um conjunto de variáveis e
dora do processo de desenvolvimento. O afeti-
só pode ser compreendido pela comparação com
vo, o motor e o cognitivo se relacionam entre si
outros conjuntos. Analisa também o fenômeno
profundamente, a cada momento, e dão como
em suas várias determinações:
resultado a pessoa individual, única. O que defi-
ne a pessoa é essa individualidade, consequência
ƒƒ Orgânicas; das relações internas, próprias de cada sujeito, e
ƒƒ Neurofisiológicas; das situações objetivas que ele encontra ao longo
ƒƒ Sociais; de seu desenvolvimento. “É contra a natureza tra-
ƒƒ As relações entre esses fatores. Por isso, tar a criança de forma fragmentária. Em cada idade
multidimensional. constitui um conjunto indissociável e original. Na
sucessão de suas idades é um único e mesmo ser em
contínua metamorfose.” (WALLON, 1981, p. 233).
Alguns Pressupostos que Embasam a Teoria
Nesse sentido, é de uma rede de relações
entre os conjuntos – Motor, Afetivo, Cognitivo – e
I- A Pessoa está continuamente em entre eles e seus fatores determinantes – Orgâni-
processo: falar em processo significa cos e Sociais – que emergem a pessoa. Impossível
afirmar que há um movimento contí- entendê-la fora dessa rede de relações.
nuo de mudanças, de transformações
desde o início da vida até seu término. E ƒƒ Os conflitos no processo contínuo de
os resultados dessas mudanças podem construção do “eu”
ser observados externamente. Interna-
mente, esse processo se caracteriza por
um jogo de forças, de tensões entre os A existência social e a existência individual
conjuntos motor, afetivo e cognitivo, o estão em um vir a ser contínuo, isto é, em um pro-
qual é desencadeado e mantido pela cesso de transformações constantes, marcadas
interação entre condições de funciona- pela situação histórica concreta em que aconte-
mento do organismo e atividades ofere- cem. A concepção de desenvolvimento é de um
cidas pelo meio. Conforme a cultura em desenvolvimento em aberto, em processo, sem-
que o organismo se desenvolve, esses pre a caminho de sua formação e nunca acabado,
conjuntos serão mais ou menos canali- fechado. Está sempre em movimento, o que não
zados e cultivados pelas oportunidades elimina regressões, crise ou conflitos.
oferecidas. Há crises na passagem de um estágio a ou-
II- Em cada instante desse processo, a tro, geradas pelo encontro das atividades já ad-
pessoa é uma totalidade, um con- quiridas com novas solicitações do meio. Estabe-
junto resultante da integração dos lece-se um conflito, uma negação das atividades
conjuntos Motor, Afetivo e Cognitivo: anteriores, que será a mola para a passagem a um
a pessoa só pode ser pensada nessa in- novo estágio. A solução do conflito significa a pas-

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sagem para uma nova qualidade da interação do mover condições que respeitem as leis que regu-
indivíduo com as exigências do meio social, por- lam o processo de desenvolvimento, levando em
tanto, para um novo estágio. consideração as possibilidades orgânicas e neu-
Se tornarmos a teoria de Wallon como ins- rológicas do momento e as condições de existên-
trumento para pensar as atividades em sala de cia do aluno. A essência de educar é, pois, respei-
aula, poderemos afirmar que educar significa pro- tar essa integração no seu movimento constante.

13.6 Algumas Implicações da Abordagem Walloniana para a Educação

Atenção

Professor e aluno são pessoas completas, com afeto, cognição e movimento e, portanto, se re-
lacionam – completos e dinâmicos, sendo de responsabilidade do professor a organização do
meio pedagógico de modo propício ao desenvolvimento do aluno.

A Gênese da Inteligência dimentos e conclusões confirmam e completam


muitas das suas hipóteses neurológicas.
Wallon foi tão parisiense quanto Freud foi A matéria-prima de que partiu foi mais de
vienense; passou sua longa existência de 83 anos duzentas observações de crianças doentes, casos
(1879-1962) em Paris. Como já explicamos, foi mé- de retardo, epilepsia, anomalias psicomotoras em
dico de batalhão durante a primeira guerra e tra- geral. Esse material, colhido entre 1909 e 1912, só
balhou para a Resistência na segunda; filiou-se ao foi apresentado como tese e publicado depois da
partido comunista algumas semanas depois que guerra (1925), quando a experiência clínica com
os nazistas fuzilaram Politzer. Depois da liberta- os adultos traumatizados renovou e aprofundou
ção, presidiu a comissão que elaborou um proje- as suas conclusões. Resultou disso L’Enfant Turbu-
to de reforma de ensino para França, de teor tão lent, republicado recentemente na França (1984)
avançado que permanece parcialmente irrealiza- com um excelente prefácio de Tranthong, que
do: à maneira socialista, Wallon concebe o estudo insere suas conclusões no cenário dos trabalhos
como trabalho social mediato, e prevê para os es- neurológicos recentes.
tudantes, a partir do segundo grau, o sistema de Sua psicogenética (ela o foi desde o princí-
pré-salários e salários. pio - L’Enfant Turbulent contém, em sua primeira
Sua formação traz a marca da Filosofia e da parte, uma descrição das primeiras etapas do de-
Medicina: daí as frequentes inserções da Psicolo- senvolvimento psicomotor: os estágios impulsi-
gia da corrente do pensamento ocidental até as vo, emocional, sensório-motor e projetivo, e só
origens gregas, e também a preocupação perma- depois a apresentação das síndromes psicomoto-
nente com a infraestrutura orgânica de todas as ras) tem, por conseguinte, como ponto de partida
funções psíquicas que investiga. Tendo-se ocupa- o patológico. A utilização da doença como um
do, durante a guerra, com lesões cerebrais, não (dos muitos) elemento necessário à compreensão
poderia jamais esquecer que a atividade mental da normalidade fica assentada desde o início. Ele
tem sua sede em um órgão de cuja higidez de- não atua apenas como médico preocupado em
pende. Esse fato o aproxima de Luria, cujos proce- curar, mas também como investigador que con-
sidera a doença uma experiência natural, a forma

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de experimentação mais apropriada à Psicologia. ria qualificar de “visceralmente” dialética se não


As bases da sua concepção metodológica estão fosse concreta e objetivamente sustentada pela
lançadas: à Psicologia convém um tratamento experiência médica. Confrontado com o anabó-
histórico (genético), neurofuncional, multidimen- lico e o catabólico do metabolismo celular; com
sional, comparativo. As funções devem ser estu- a sístole e a diástole de atuação cardíaca, com a
dadas evolutiva e involutivamente (daí o interes- dinâmica de controles alternativos que caracteri-
se pela doença e pela velhice), partindo das suas za o funcionamento subcortical e cortical do cé-
bases neurológicas, e comparando-as com as suas rebro, Wallon foi naturalmente levado a conceber
equivalentes em diferentes espécies animais, em a vida dos organismos com uma pulsação per-
diferentes momentos da história humana indivi- manente, uma alternância de opostos. Quando
dual e coletiva. O equívoco de classificar de orga- a escolha do materialismo dialético se tornou ex-
nicista a sua proposta vem da incompreensão de plícita e assumiu a posição de sede das decisões
dois fatores fundamentais: em primeiro lugar que metodológicas, ela não correspondeu, por conse-
genético abrange a dimensão da espécie e abre guinte, a um apriorismo. Representou para Wal-
espaço para a incorporação dos resultados da lon uma solução epistemológica. Ciência híbrida,
“psicologia histórica”, tão prolífica recentemente. situada na intersecção de dois mundos, o da na-
E em segundo lugar, do fato de que, para Wallon, tureza e o da cultura, a Psicologia é a dimensão
o ser humano é organicamente social, isto é, sua nova que resulta do encontro, e mantém a tensão
estrutura orgânica supõe a intervenção da cultu- permanente do seu jogo de forças. L’Enfant Tur-
ra para se atualizar. Ele seguramente endossaria bulent ilustra os procedimentos metodológicos
e aproveitaria a expressão vygotskyana de “extra- que serão explicitados mais tarde. Obra germinal
cortical” para significar aquela parte do cérebro contém em embrião todos os grandes temas que
humano que está fora do cérebro, isto é, o conhe- serão retomados e aprofundados: Movimento,
cimento. Emoção, Inteligência e Personalidade. Falta ape-
O método adequado para a Psicologia é a nas a perspectiva pedagógica, que mais tarde virá
observação; tal como na Astronomia, que não a pesar muito.
perde o seu rigor por não poder intervir no seu
objeto, o psicólogo deveria aguardar “os eclipses”,
representados pelos desaparecimentos mórbi- Dicionário
dos das funções. Suas observações em L’Enfant
Subcortical: que fica debaixo do córtex.
Turbulent são constituídas essencialmente pelo
relato da conduta da criança em seu ambiente
(no caso o hospital), e alguns testes são utiliza- A Motricidade: do Ato Motor ao Ato Mental
dos, parcimoniosamente, apenas como forma de
completar as informações retiradas da observa-
ção. Wallon concebe a Psicologia como ciência O grande eixo é a questão da motricidade;
qualitativa: não há preocupação nenhuma com a os outros surgem porque Wallon não consegue
quantificação de resultados. Se ela não é quanti- dissociá-lo do conjunto do funcionamento da
tativa e sintética como a psicométrica, que resu- pessoa. A psicogênese da motricidade (não es-
me os seus resultados em um escore, seria então tranhe a expressão, porque, em Wallon, “motor” é
qualitativa e analítica? Qualitativa certamente: sempre sinônimo de “psicomotor”) se confunde
quando a analisa, Wallon opta pela análise gené- com a psicogênese da pessoa, e a patologia do
tica, única forma, a seu ver, de não deixar perder a movimento com a patologia do funcionamento
inteiridade do objeto. da personalidade. Por esse motivo, foi tão apro-
veitado por Le Boulch, cuja psicogenética e pro-
A base para essas decisões metodológicas
postas de educação psicomotora se caracterizam
muito maduras reside numa atitude que se pode-

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pela abrangência de sua compreensão do signifi- assim obtida é um produto difícil, dependente da
cado psicológico do movimento. maturação dos centros corticais de inibição, assim
Fiel à sua disposição infraestrutural, Wallon como das estruturas responsáveis pelo controle
busca os órgãos do movimento: automático do tônus (em particular, o cerebelo).
Ela corresponde à redução da atividade muscular,
ƒƒ Musculatura; à sua função tônico-postural. Embora imobiliza-
da no esforço mental, a musculatura permanece
ƒƒ Estruturas Cerebrais, responsáveis pela
envolvida em atividade tônica, que pode ser in-
sua organização.
tensa; pensa-se com o corpo em sentido duplo
– com o cérebro e com os músculos. Esse fato
Na atividade muscular, identificam-se duas foi intuitivamente compreendido por Rodin: sua
funções: representação plástica do “Pensador” apresenta
um homem intensamente contraído, com a mus-
culatura retesada pelo esforço. Assim é que, para
I- Função Cinética ou Clônica: responde
Wallon, o ato mental – que se desenvolve a partir
pelo movimento visível, pela mudança
do ato motor – passa em seguida a inibi-lo, sem
de posição do corpo ou de seguimen-
deixar de ser atividade corpórea.
tos do corpo no espaço; é a atividade do
músculo em movimento; Do relevo dado à função tônica, resulta a
percepção da importância de um tipo de movi-
II- Função Postural ou Tônica: responde
mento associado a ela, e que é normalmente ig-
pela manutenção da posição assumida
norado, obscurecido pelo movimento práxico. É a
(atitude) e pela mímica; é a atividade do
motricidade expressiva da mímica, inteiramente
músculo parado.
ineficaz do ponto de vista instrumental: não tem
efeitos transformadores sobre o ambiente físico.
Esse relevo dado à função tônica, identifica- Mas o mesmo não acontece em relação ao am-
da como o substrato da função cinética, de cuja biente social: pela expressividade, o indivíduo hu-
higidez depende a sua realização adequada, é mano atua sobre o outro e é isso que lhe permite
caracteristicamente walloniana. Wallon encontra sobreviver durante o seu prolongado período de
nela a mais arcaica atividade muscular, presen- dependência. A motricidade humana, descobre
te antes de a motricidade adquirir sua eficácia, Wallon em sua análise genética, começa pela
atuando durante a imobilidade, que é vista não atuação sobre o meio social, antes de poder mo-
como negatividade, mas como sede de uma ati- dificar o meio físico. O contato com este, a espécie
vidade tônica, que pode ser intensa; presente na humana, nunca é direto, é sempre intermediado
emoção, cujas flutuações acompanham e modu- pelo social, tanto em sua dimensão interpessoal
lam, e residual, quando a função simbólica vem a quanto cultural. Antagonismo e descontinuidade
internalizar o ato motor. entre ato motor e ato mental, e anterioridade da
No antagonismo entre motor e mental, ao modificação do meio social em relação ao meio
longo do processo de fortalecimento deste últi- físico são elementos essenciais à compreensão da
mo, por ocasião da aquisição crescente do domí- concepção walloniana. A sua tipologia do movi-
nio dos signos culturais, a motricidade de sua di- mento, baseada nas sedes de controle, é pratica-
mensão cinética tende a se reduzir, a se virtualizar mente consensual.
em ato mental. A sensório-motricidade inconti-
nente do segundo ano de vida tende – lentamen- ƒƒ Tipos de Movimento
te – a diminuir, dando lugar a períodos cada vez
ƒƒ Movimentos reflexos: controlados
maiores de imobilidade possível; esse enfraqueci-
no nível da medula;
mento da função cinética é proporcional ao forta-
lecimento do processo ideativo. Mas a quietação

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ƒƒ Movimentos involuntários: auto- amadurecimento das estruturas nervosas, ime-


máticos, controlados em nível sub- diatamente após o nascimento, período que se
cortical, pelo sistema extrapirami- poderia denominar medulo bulbar. A motricida-
dal; de disponível consiste, além dos reflexos, em mo-
ƒƒ Movimentos voluntários ou pra- vimentos impulsivos, globais, incoordenados; sua
xes: controlados no nível cortical completa ineficácia (são incapazes sequer de fazer
pelo sistema piramidal. o recém-nascido sair de uma posição incômoda)
os fez ignorados. A partir deles, porém, evoluirão
os movimentos expressivos, forma primeira, me-
Entre eles, embora haja sucessão cronológi- diada, de atuação. Essa etapa impulsiva da motri-
ca de aparecimento, não há derivação funcional. cidade dura aproximadamente três meses; daí até
Eles correspondem à emergência de estruturas o final do primeiro ano, o amadurecimento das
nervosas diferentes, entre as quais se estabelece estruturas mesoencefálicas do sistema extrapira-
subordinação funcional. O sistema cortical impõe midal, aliado à resposta social do ambiente, sob
seu controle sobre o sistema subcortical e estabe- a forma de interpretação do significado (bem-
lece-se entre ambos uma relação de reciprocida- -estar e mal-estar) dos movimentos, introduzirão
de, mas mantém a subordinação do sistema mais a etapa expressivo-emocional. A maior parte das
antigo (o subcortical) ao mais recente. Praxes manifestações motoras consistirá em gestos di-
bem estabelecidas automatizam-se, liberando o rigidos às pessoas (apelo): manifestações, agora
córtex para novas utilizações. Os automatismos cheias de nuances, de alegria, surpresa, tristeza,
podem ser conscientizados, embora isso seja um desapontamento, expectativa etc.
enorme esforço.
A predominância dos gestos instrumentais,
práxicos, no cenário do comportamento infantil
Dicionário começa a se estabelecer no segundo semestre
e se impõe verdadeiramente apenas no final do
Córtex: é a camada mais externa do cérebro
dos vertebrados. primeiro ano, quando o amadurecimento cortical
torna aptos os sistemas necessários à exploração
direta sensório-motora da realidade: a marcha, a
A incompatibilidade funcional entre os ní- preensão e a capacidade de investigação ocular
veis manifesta-se no antagonismo entre a ativida- sistemática, em especial.
de automática e a representação. A conscientiza-
Wallon faz lembrar como é lento o amadu-
ção dos automatismos tende a produzir um efeito
recimento dessas competências no início do pri-
desagregador sobre eles. Comece a “pensar” nos
meiro ano. O ser está à mercê das suas sensações
gestos, já automatizados, ao guiar o automóvel
internas, viscerais e posturais. A exploração da
e o desempenho imediatamente se desarticula.
realidade exterior só será possível quando o olho
Esse fenômeno está na base do que Wallon de-
e a mão adquirirem a capacidade de pegar e olhar
nomina reações de prestance (presença), isto é,
praxicamente. O reflexo de preensão será substi-
a “canhestria” provocada pela sensação de estar
tuído, por volta do segundo trimestre, por uma
sendo observado.
preensão voluntária, ainda muito tosca: a chama-
da preensão palmar, em que a mão se fecha em
ƒƒ Competências básicas e especiais – torno do objeto sem fazer uso da oposição entre
exploração autônoma da realidade o polegar e os outros dedos, vantagem da espé-
cie humana. Alguns meses depois, essa oposição
A sequência psicogenética de aparecimen- se inicia, mas ainda de forma tosca. A chamada
to dos diferentes tipos de movimento acompa- preensão em pinça, em que polegar e indicador
nha a marcha, que se faz de baixo para cima, do se opõem e completam, só é adquirida por volta

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dos nove meses. É interessante notar que a preen- simbólica e semiótica. Ao lado dos movimentos
são voluntária antecede a abertura voluntária da instrumentais, assiste-se à entrada em cena de
mão no ato de soltar o objeto. É possível assistir movimentos de natureza diversa, veiculadores
ao dilema de uma criança com duas mãos ocupa- de imagens: são os movimentos simbólicos ou
das, diante de um terceiro objeto interessante: a ideomovimentos, expressão peculiar a Wallon,
dificuldade para “largar” parece ser consideravel- que tratam de movimentos que contêm ideias,
mente maior do que a de “pegar”. A competência assim como a dependência inicial destas em re-
no uso das mãos só está completa quando, por lação àqueles. O processo ideativo é inicialmente
volta do final do primeiro ano, se forma a bilatera- projetivo (e pode permanecer assim em certos
lidade e as duas mãos deixam de atuar diferencia- quadros patológicos, como a epilepsia), isto é,
damente para adotarem uma ação complemen- exterioriza-se, projeta-se em atos, sejam eles mí-
tar, em que cabe à dominante a iniciativa e à não micos, na fala, ou mesmo nos gestos da escrita.
dominante uma atividade auxiliar. Imobiliza-se uma criança de 2 anos que fala e
É igualmente lento o despertar da compe- gesticula e atrofia-se o seu fluxo mental. Inversa-
tência visual: depois dos reflexos pupilares com mente, é experiência trivial no adulto o poder da
os quais se nasce, nota-se o aparecimento da ca- palavra, oral ou escrita, de adiantar-se, quase con-
pacidade de fixar e acompanhar voluntariamente duzir o pensamento por vezes, ilustrando a per-
um móvel. A princípio, apenas as trajetórias mais sistência dessa ideomotricidade. O movimento, a
simples, horizontais; alguns meses depois, as ver- princípio, desencadeia e conduz o pensamento.
ticais, e, próximo do final do primeiro ano, as cir- O gesto gráfico, inicialmente condutor da ideia só
culares. depois é conduzido por ela. “Como posso saber o
Essas são apenas as praxes básicas; as espe- que estou desenhado se ainda não terminei?” –
ciais, próprias de cada cultura, como segurar ade- dirá uma criança de 3 ou 4 anos. O controle do
quadamente um lápis ou um pincel para escrever, gesto pela ideia inverte-se ao longo do desen-
percorrer uma página a partir do alto, à esquerda, volvimento. Essa transição do ato motor para o
ou de baixo, à direita, ou ainda segurar um garfo mental, ruptura e descontinuidade que assinalam
ou manusear pauzinhos para comer, não podem a entrada em cena de um novo sistema, o cortical,
obviamente ser consideradas produto do amadu- pode ser acompanhada na evolução das condu-
recimento cortical. Ajuriaguerra, beneficiando-se tas imitativas. Longe de ampliar essa noção para
da contribuição teórica walloniana, realizou com abarcar a chamada imitação sensório-motora ou
um grupo de colaboradores uma minuciosa in- pré-simbólica, Wallon restringe o termo às suas
vestigação sobre a praxe da escrita, pondo a nu a formas superiores, corticais, porque supõe nas
complexidade tônico-postural de uma atividade outras a ação de mecanismos mais primitivos.
que requer a imobilização e a movimentação rá- Distingue assim os “contágios” motores, ecocine-
pida de diferentes segmentos corporais simulta- sias, ecolalias, ecopraxias, simples mimetismo, da
neamente. chamada imitação diferida, onde a ausência do
modelo torna inquestionável a sua natureza sim-
Mas as competências básicas – de pegar e
bólica. “Imitação Diferida” e “Imitação Simbólica”
olhar – não bastariam ainda para a exploração au-
constituem redundâncias na sua linguagem. Mas
tônoma da realidade, desacompanhadas da pos-
a imitação realiza a passagem do sensório-motor
sibilidade de andar; por isso, Wallon realiza aí o
ao mental. A reprodução dos gestos do modelo
corte que dá entrada ao período sensório-motor,
acaba por se reduzir a uma impregnação postu-
e – com ele – à etapa dominantemente práxica da
ral, o ato se torna simples atitudes. Esse congela-
motricidade.
mento corporal da ação constituiria o seu resíduo
Quase ao mesmo tempo, porém, a in- último antes de se virtualizar em imagem mental.
fluência ambiental, aliada ao amadurecimento À sequência bem conhecida que leva do sinal ao
da região temporal do córtex, dará lugar à fase símbolo e deste ao signo, Wallon acrescenta o “si-

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mulacro”, representação do objeto sem nenhum veis em diálogos sustentados, Wallon obteve a
objeto substitutivo, pura mímica na qual o signifi- partir de 5 anos, revestidas de características que
cante é o próprio gesto. sintetizou com a denominação de sincretismo.
Assim, a imitação dá lugar à representação O pensamento discursivo é, pois, sincrético
que lhe fará antagonismo: enquanto ato motor em sua origem; sua forma mais elementar, ao con-
ela tenderá a ser reduzida e desorganizada pela trário do que julgaram os associacionistas, é uma
interferência do ato mental. molécula, o par. Este parece ser mais um exemplo
de como a análise genética e a análise estrutural
As Fases da Inteligência podem levar a resultados diversos.

A análise genética encontra no par duas


ideias fundidas de maneira indissociável, por isso
Nessa concepção do desenvolvimento da
é sincrética. O sincretismo alcança não só os con-
pessoa, a inteligência ocupa o papel de meio, de
teúdos como os processos do pensamento inicial:
instrumento, colocado à disposição da ampliação
os próprios mecanismos de assimilação e oposi-
daquela. Construindo-se mutuamente, sujeito
ção são indiferenciados, de maneira que duas coi-
e objeto, afetividade e inteligência, alternam-se
sas são simultaneamente assimiladas e opostas:
na preponderância do consumo de energia psi-
“O sol é o céu, mas não são a mesma coisa”. Depois
cogenética. Na primeira etapa, correspondente
da latência cognitiva que acompanha os anos pré-
ao primeiro ano de vida, dominam as relações
-escolares, ocupados com a tarefa de reconstruir
emocionais com o ambiente e o acabamento da
o eu do plano simbólico, a inteligência poderá, se
embriogênese; trata-se nitidamente de uma fase
aquele processo for bem-sucedido, beneficiar-se
de construção do sujeito, na qual o trabalho cog-
com o resultado da redução do sincretismo da
nitivo está latente e ainda indiferenciado na ativi-
pessoa. Seu trabalho será uma nova superação
dade afetiva. Ela consiste essencialmente na pre-
do sincretismo, agora no plano do pensamento,
paração das condições sensório-motoras (olhar,
do discurso, do objeto. A função da inteligência,
pegar, andar) que permitirão, ao longo do segun-
tanto para o adulto quanto para a criança, Wallon
do ano de vida, a exploração intensa e sistemática
entende como residindo na explicação da realida-
do ambiente. Esse sim será o momento em que
de. Explicar supõe definir: são estas, pois, as duas
a inteligência poderá dedicar-se à construção da
grandes dimensões em torno das quais se organi-
realidade; tendo obtido uma certa diferenciação,
zam os diálogos que compõem sua investigação.
tornar-se-á aquilo que Wallon chamou de inteli-
gência prática ou das situações, e cuja extrema Seu entendimento sobre definição é quase
visibilidade a tornou tão bem conhecida com o clássico: a atribuição das qualidades específicas
nome de sensório-motora. de um objeto, resultando em integrá-lo a uma
classe maior, e diferenciá-lo das vizinhas. Dife-
Quase simultaneamente, a função simbóli-
renciação e integração constituem os processos
ca, alimentada pelo meio humano, vem despon-
básicos envolvidos. Esse recorte nítido permitirá
tando; no final do segundo ano, a fala e as con-
subtrair os objetos à fusão sincrética e, por con-
dutas representativas são inegáveis, confirmando
seguinte, estabelecer entre eles uma rede de re-
uma nova forma de relação com o real, que eman-
lações nítidas. Essa trama relacional, para Wallon,
cipará a inteligência do quadro perceptivo ime-
constitui a explicação das coisas; aqui ele se afasta
diato. Essa função é frágil no início, apoia-se ain-
da noção clássica, na qual explicar é estabelecer
da muito tempo nos gestos que a transportam,
as condições de existência, entendimento que
“projeta-se” em atos; por isso, Wallon a chama de
abarca os mais variados tipos de relações: espa-
projetiva. Com a função simbólica e a linguagem,
ciais, temporais, modais, dinâmicas, além das
inaugurar-se-á o pensamento discursivo, que
causais strictu sensu. Ele é consequência da opção
mantém com aquela uma relação de construção
epistemológica walloniana, para a sua concep-
recíproca. Suas primeiras manifestações, adaptá-

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ção dialética da natureza, tudo está ligado a tudo, ligência e afetividade. Wallon recusa persisten-
além de estar em permanente devir. temente dar o passo que transforma sincretismo
Essas opções determinam o tipo de interro- em egocentração; às explicações autocentradas,
gatório a que submete as crianças: contrapõe outras de tendência inversa, encontra-
do na extrema instabilidade, e não em um eixo
ƒƒ O que é...? Para definição; firmemente autocentrado, a característica maior
da ideação infantil.
ƒƒ Por quê? Como? Quando? Onde? etc.
Para a explicação. As relações que mantém com a linguagem
são recíprocas e extremamente sutis. No início,
longe de conduzir a escolha da palavra, o pen-
Os temas são os da experiência vivida e os samento é, pelo contrário, conduzido por ela em
da percepção direta: seus níveis mais primitivos: a musicalidade das
assonâncias e rimas, os automatismos da língua.
ƒƒ O sol, o céu, a noite, a lua, o vento, o frio, A palavra carrega a ideia como o gesto carrega a
as árvores, a neve, o rio. intenção. A reconquista da dimensão melódica
da linguagem, como a emancipação do gesto ao
controle da vontade, constitui objetivos de certas
Mediante esse tipo de diálogo em entrevis-
modalidades artísticas. Sua existência demonstra
tas, cujo conteúdo foi inteiramente aproveitado
que o desenvolvimento representa também per-
sem nenhum tipo de seleção do material, Wal-
da ou atrofia de possibilidades, que precisam ser
lon constatou, entre os 5 e 9 anos de idade, uma
recuperadas e resgatadas. Essa noção, compatível
tendência à redução do sincretismo, permitindo
apenas com concepções paradoxais, não lineares,
o aparecimento de uma forma mais diferenciada
de desenvolvimento, está implícita no alerta feito
de pensamento a que chamou de “categorial”.
por Wallon em relação ao sincretismo: é preciso
Próxima da noção de “conceitual”, ela con- ser capaz de preservá-lo, tanto quanto discipliná-
tém aquilo que, para Wallon, é a sua condição: a -lo, uma vez que dele depende a possibilidade de
qualidade diferenciada da coisa em que se apre- combinações inteiramente novas e originais de
senta, tornada “categoria” abstrata, exigência sine ideias. Nele está a raiz do pensamento criador. A
qua non para a definição, e, por conseguinte, para linguagem, capaz de conduzir o pensamento, é
elaboração do conceito. também capaz de nutri-lo e alimentá-lo; estrutu-
De todas as diferenciações que se proces- ram-se reciprocamente: produto da razão huma-
sam, esta é a mais fundamental, só ela permitirá a na, ela acaba, no curso da história por se tornar
atribuição das qualidades específicas de um obje- sua fabricante. Razão constituinte é razão cons-
to, tornando-o assim distinto de outros, sem car- tituída, conclusão inevitável que resulta de vê-la
regar consigo os demais atributos do objeto com em perspectiva histórica.
que parece. Enquanto o “pesado” do barco estiver
confundido com as suas outras características,
como “grande”, será impossível chegar à solução
do problema do afundamento da faca. Enquan-
to ela não se processar, o pensamento binário
permanecerá ao sabor das contradições, corolá-
rio inevitável do sincretismo (o estudo minucio-
so das suas formas foi realizado em As origens do
pensamento na criança.). Esse sincretismo come-
ça por ser o do sujeito com o objeto do discurso:
mistura afetiva, pessoal, que refaz, no plano do
pensamento, a indiferenciação inicial entre inte-

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13.7 Resumo do Capítulo

Wallon considerava o comportamento patológico como laboratório natural para os estudos da Psi-
cologia, pois nessas circunstâncias é possível observar os fenômenos se transformando mais lentamente
e, assim, permitindo observações mais precisas.
Para Wallon, comparar não é assimilar, ver apenas as semelhanças. A comparação visa tanto às se-
melhanças quanto às diferenças, cujas condições é preciso identificar cuidadosamente. O conhecimento
busca simultaneamente o mesmo e o diferente. A diferença entre a criança normal e a patológica é pro-
funda e não consiste apenas no contraste entre progressão gradual e contínua e um atraso e fixação de
certos comportamentos.
Depois da Psicopatologia, Wallon dedicou-se ao desenvolvimento da criança, considerando que a
questão fundamental dessa área é o estudo da consciência e que o melhor caminho para entendê-la é
buscar sua gênese, sua origem. Concentrou-se no processo de desenvolvimento para explorar as origens
biológicas da consciência. Da análise de suas observações, comparando semelhanças e diferenças entre
o desenvolvimento de crianças normais e patológicas, entre crianças e adultos, foi extraindo os princípios
reguladores desse processo e identificando seus vários estágios, criando uma teoria de desenvolvimento.
A sequência de estágios proposta por Wallon é a seguinte:

ƒƒ Impulsivo Emocional (0 a 1 ano);


ƒƒ 1ª Fase: Impulsivo (0 a 3 meses);
ƒƒ 2ª Fase: Emocional (3 a 12 meses);
ƒƒ Sensório-Motor e Projetivo (1 a 3 anos);
ƒƒ Personalismo (3 a 6 anos);
ƒƒ Categorial (6 a 11 anos);
ƒƒ Puberdade e Adolescência (11 anos em diante).

As idades foram propostas por Wallon para as crianças de sua época e de sua cultura. Precisam ser
revistas para a nossa cultura nos dias de hoje. Entretanto, mais que os limites etários, é preciso observar
quais interesses e atividades predominam em cada período. Os estágios só adquirem sentido dentro
dessa sucessão temporal, uma vez que cada um deles é preparado pelas atividades do estágio anterior
e desenvolve atividades necessárias ao desenvolvimento dos próximos. As situações às quais a criança
reage são as que correspondem aos recursos de que dispõem.
Segundo Wallon, há três leis reguladoras do desenvolvimento:

1. Alternância Funciona de Direções Opostas em cada Estágio;


2. Alternância na Predominância de Conjuntos Diferentes a cada Estágio;
3. Integração Funcional.

Essas leis descrevem tanto o movimento do processo de desenvolvimento no seu todo quanto nas
fases menores dentro de cada estágio.

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Psicologia da Educação

Os aspectos: motor, afetivo e o cognitivo estão tão integrados que cada um é parte construtiva dos
outros. Qualquer atividade humana sempre interfere em todos eles.
Para a construção de seu método de análise, Wallon assumiu a perspectiva da Psicologia Genética.
Elaborou seu método próprio: a análise genética comparativa multidimensional, que consiste em fazer
comparações para esclarecer cada vez mais o processo de desenvolvimento.
O que define a pessoa é essa individualidade, consequência das relações internas, próprias de cada
sujeito e das situações objetivas que ele encontra ao longo de seu desenvolvimento.
A existência social e a existência individual estão em um vir a ser contínuo, isto é, em um processo
de transformações constantes, marcadas pela situação histórica concreta em que acontecem.
Construindo-se mutuamente sujeito e objeto, afetividade e inteligência, alternam-se na prepon-
derância do consumo de energia psicogenética. Na primeira etapa, correspondente ao primeiro ano de
vida, dominam as relações emocionais com o ambiente e o acabamento da embriogênese, trata-se ni-
tidamente de uma fase de construção do sujeito, na qual o trabalho cognitivo está latente e ainda in-
diferenciado na atividade afetiva. Ela (inteligência prática) consiste essencialmente na preparação das
condições sensório-motoras que permitirão, ao longo do segundo ano de vida, a exploração intensa e
sistemática do ambiente. No final do segundo ano, com a função simbólica e a linguagem, inaugurar-se-
-á o pensamento discursivo (inteligência projetiva).
O pensamento discursivo é, pois, sincrético. De acordo com Wallon, o pensamento sincrético é o
da criança no estágio denominado por ele de personalista, momento do desenvolvimento infantil que
apresenta uma orientação centrípeta, subjetiva e uma preponderância das atividades pessoais de cons-
trução do eu. Nessa fase, a criança ainda não pode delimitar suficientemente a sua própria personalida-
de, nem apropriar-se das categorias usuais através das quais distribuímos os dados e os vários aspectos
da experiência; em função disso, seu pensamento é regido mais pelas leis afetivas do que pelas leis da
lógica. O sincretismo é um estágio necessário para se chegar à análise e à síntese, que são duas operações
complementares.
O sincretismo é anterior ao pensamento categorial que irá advir da evolução da maturação, das
interações sociais principalmente mediadas pela linguagem, da experiência pessoal da criança e da cul-
tura do meio em que vive, uma vez que esta é fonte de conhecimento e de representações. A definição
categorial é que vai conferir ao pensamento o seu caráter normativo e a sua dedutividade, pois ela é a
capacidade de variar as classificações segundo as qualidades das coisas e descriminar as suas diferentes
propriedades (TRAN-THONG, 1987).

13.8 Atividades Propostas

1. Como se originou a teoria de desenvolvimento de Henri Wallon?

2. Quais são os estágios de desenvolvimento descritos por Wallon?

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14 A PSICOLOGIA E A ADOLESCÊNCIA

Atenção

A adolescência é o período da vida que se inicia por volta dos 10 anos e termina aos 20 anos de
idade, quando a pessoa passa de criança à adulta. Esse período abrange não apenas alterações
físicas de um corpo em amadurecimento, como também muitas mudanças cognitivas e socio-
emocionais.

14.1 Definição de Adolescência

Saiba mais

Caro(a) aluno(a), como aprofundamento de sua aprendizagem, retome as contribuições de cada autor
apresentado nesta apostila para a redefinição do período de adolescência.
Grife, nos capítulos anteriores, qual a definição desse período de desenvolvimento para cada um deles.

A Psicologia contribui excessivamente para Esse estirão se inicia com o alongamento


a atuação dos educadores em sala de aula quan- das mãos, dos pés, dos braços e das pernas, o que
do o assunto é: adolescentes. A adolescência é gera o aspecto desajeitado e grandalhão dos ado-
o período da vida que se inicia por volta dos 10 lescentes mais jovens. Esse estágio é seguido pelo
anos e termina aos 20 anos de idade, quando a crescimento do torso, o que traz o corpo de volta
pessoa passa de criança à adulta. Esse período à proporcionalidade. Nos meninos, o estágio final
abrange não apenas alterações físicas de um cor- resulta no alargamento do peito e dos ombros
po em amadurecimento, como também muitas e no desenvolvimento de músculos mais fortes.
mudanças cognitivas e socioemocionais. Para as meninas, as mudanças no corpo ocorrem
Uma série de características físicas essen- à medida que os quadris se alargam e a gordura
ciais indica a fase da adolescência. A mais óbvia se deposita nos seios, na cintura, nas nádegas e
é o Estirão de Crescimento, isto é, o rápido au- nas coxas. Todas essas mudanças se originam de
mento na altura e no peso que tem início, em mé- um aumento dos hormônios. Em ambos os sexos,
dia, aos 10 anos e meio para as meninas e aos 12 o rosto também passa por alterações. O queixo e
anos e meio para os meninos e chega ao auge aos o nariz se tornam mais proeminentes, e os lábios
12 anos para elas e aos 14 para eles. O adolescen- mais carnudos.
te típico atinge sua altura máxima cerca de 6 anos
após o início do estirão de crescimento.

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14.2 Desenvolvimento Sexual

Os sinais visíveis da Puberdade – começo pelos da face, mais ainda. O engrossamento da


do amadurecimento sexual – ocorrem em se- voz é uma das últimas mudanças perceptíveis do
quências diferentes para meninos e meninas. Nos amadurecimento masculino.
meninos, a primeira indicação é o crescimento Nas meninas, o começo do estirão de cres-
dos testículos, que começa, em média, por volta cimento é geralmente o primeiro sinal de apro-
dos 11 anos e meio de idade, cerca de um ano an- ximação da puberdade. Pouco tempo depois, os
tes do começo do estirão de crescimento em altu- seios começam a se desenvolver; quase simulta-
ra. Juntamente com o estirão vem o alargamento neamente, surgem alguns pelos pubianos. A me-
do pênis. O desenvolvimento dos pelos pubianos narca, ou primeiro ciclo menstrual, ocorre cerca
ocorre um pouco mais tarde; o surgimento dos de um ano depois – entre 11 e 13 anos.

14.3 Mudanças Cognitivas

Assim como os corpos amadurecem duran- David Elkind (1969) utilizou a ideia de Piaget
te a adolescência, o mesmo ocorre com os pa- descrita acima para explicar duas considerações
drões de pensamento. Piaget (1969) via os pro- sobre o comportamento adolescente. A primeira
gressos cognitivos da adolescência como uma delas é a audiência imaginária, tendência que os
capacidade maior de pensar de maneira abstrata, adolescentes têm de achar que estão sendo cons-
denominada pensamento operacional-formal. tantemente observados e que as pessoas sempre
Os adolescentes são capazes de compreender os julgam por sua aparência ou comportamento.
e lidar com conceitos abstratos, especular a res- A outra consideração versa sobre a fábula pessoal,
peito de possibilidades alternativas e raciocinar a sensação irreal que os adolescentes têm de sua
em termos hipotéticos. Contudo, essa é a fase em própria singularidade – acreditam que são dife-
que demonstram um “egocentrismo das opera- rentes de outras pessoas, que não serão afetados
ções formais” (PIAGET, 1967), pois suas represen- por coisas negativas que acontecem aos outros.
tações do real são mais importantes do que a dos
adultos.

14.4 Resumo do Capítulo

A adolescência é o período da vida que se inicia por volta dos 10 anos e termina aos 20 anos de
idade, quando a pessoa passa de criança à adulta. Esse período abrange não apenas alterações físicas de
um corpo em amadurecimento, como também muitas mudanças cognitivas e socioemocionais.
Assim como os corpos amadurecem durante a adolescência, o mesmo ocorre com os padrões de
pensamento.
Os adolescentes são capazes de compreender e lidar com conceitos abstratos, especular a respeito
de possibilidades alternativas e raciocinar em termos hipotéticos.

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Psicologia da Educação

14.5 Atividades Propostas

1. No que consiste o período de adolescência?

2. Quais são as principais mudanças cognitivas que ocorrem na adolescência?

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15 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluindo este módulo, gostaríamos de considerar os seguintes aspectos: iniciamos nosso tra-
balho ressaltando a necessidade de conhecermos as ideias psicológicas e sua contribuição para o nasci-
mento da ciência Psicologia. Depois verificamos os elementos constitutivos das teorias sobre a constru-
ção da personalidade, bem como das teorias de aprendizagem tão necessárias para a instrumentalização
do profissional de educação nos dias de hoje. Por fim apresentamos os pressupostos teóricos de Piaget,
Vygotsky e Wallon e suas implicações nas relações de aprendizagem e ensino. Nosso caminho está longe
de chegar ao fim, eu diria está apenas iniciando, contudo acreditamos torná-lo menos árduo e possível
de ser trilhado.
Embora estejamos terminando neste módulo nossa contribuição na construção do seu curso de
Pedagogia, gostaríamos de considerar os seguintes aspectos: a Psicologia da Educação é uma disciplina
essencial para o profissional em educação por se tratar de uma área de estudos que se preocupa com
a construção do indivíduo em sua relação com o ensino-aprendizagem. Nesse sentido, elaboramos um
curso que se preocupou em demonstrar e explicar as teorias de aprendizagem tão necessárias para a
instrumentalização do profissional de educação nos dias de hoje.
Esperamos ter contribuído para seu crescimento profissional e colocamo-nos sempre à disposição
dos alunos, na esperança de um diálogo.

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RESPOSTAS COMENTADAS DAS
ATIVIDADES PROPOSTAS

Capítulo 1

ƒƒ Considerando os comportamentos humanos objetos de sua investigação, a Psicologia enquan-


to ciência caracteriza-se como um conjunto de conhecimentos sistematizados a partir da ativi-
dade humana, segundo métodos rigorosos de observação científica.
ƒƒ Para os educadores em geral, a Psicologia oferece grandes contribuições, como, por exemplo,
na investigação de como se constituem as personalidades e como acontecem os processos de
aprendizagem.
ƒƒ Na atualidade, somos desafiados diariamente a buscar novas formas de interagir de maneira
respeitosa com nossos semelhantes.
ƒƒ Cada ser humano adquire, gradualmente, um conjunto de competências, regras, informações e
maneiras de lidar com as pessoas, coisas e situações, que resulta tanto da aprendizagem inten-
cional, planejada, sistemática e controlada, quanto de processos espontâneos, não planejados.
O ensino em escolas, em todas as modalidades, ocorre a partir das aprendizagens alcançadas
pelas pessoas envolvidas. A escola é um lugar onde as pessoas reúnem-se para ensinar e apren-
der, havendo interações de suas emoções, desejos e projetos, para além de suas racionaliza-
ções. O aluno exibe grande número de comportamentos ligados à aprendizagem: escuta, ges-
ticula, fala, olha, escreve, lê, movimenta-se na classe, manipula objetos e executa operações. O
aluno que aprende recorre a múltiplos processos mentais: associa, compara, avalia, interpreta,
classifica, estabelece hipóteses, compreende, imagina, julga, reflete, memoriza, reconhece e
recorda.
ƒƒ É um processo interno e pessoal, mas que é percebido pelas ações manifestadas pelo compor-
tamento do aprendiz: o que faz, diz e produz (aprendizagens conceituais, procedimentais e
atitudinais). Essas observações sobre as ações dos alunos são intrínsecas ao papel do professor.
ƒƒ O ensino e a aprendizagem possuem grande importância no cenário escolar. Não são proces-
sos exclusivamente formais, sistemáticos, planejados e executados estritamente de acordo
com normas, objetivos e instrumentos específicos. Entre os antigos romanos, educare signi-
ficava criar ou nutrir crianças e estava ligado a outro verbo: educere – fazer sair, lançar, criar,
amamentar.

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Capítulo 2

Muitos psicólogos definem a personalidade como um padrão singular de pensamentos, sen-


timentos e comportamentos de um indivíduo, que persiste através do tempo e das situações.
É preciso atentar para dois pontos nessa definição. Por um lado, a personalidade refere-se a
diferenças singulares – aqueles aspectos que distinguem uma pessoa de todas as outras. Por
outro lado, a definição afirma que a personalidade é relativamente estável e duradoura, pois
essas diferenças individuais dificilmente mudam.
A personalidade de uma pessoa é constituída por fatores hereditários e ambientais. As emo-
ções e os traços subjetivos de cada pessoa refletem a singularidade da personalidade.
A abordagem psicodinâmica objetiva entender o comportamento em termos de funciona-
mento da mente, com ênfase na motivação e no papel da experiência passada. A abordagem
teve como pioneiro Sigmund Freud, que desenvolveu a teoria psicanalítica.

Capítulo 3

Analisar o desenvolvimento da personalidade torna-se necessário ao trabalho educacional, es-


pecialmente quando o sujeito da aprendizagem, o aluno, estiver demonstrando dificuldades
em seu desempenho ou ao socializar-se.
Fazer exercícios a partir de estudo de caso permite-nos a ampliação de nosso olhar sobre o de-
senvolvimento humano, auxiliando-nos em nossas intervenções junto aos alunos, consideran-
do os aspectos necessários na mediação entre os sujeitos da aprendizagem e o conhecimento,
partindo de situações planejadas cuidadosa e atentamente, respeitando os percursos indivi-
duais e levando em conta a história pessoal e o contexto familiar, sem jamais expor a criança,
o adolescente ou, mesmo, o adulto que nos foi confiado em nosso trabalho em sala de aula.
O caso de Francisca, à luz das teorias estudadas, convida-nos a pensar sobre a responsabilidade
do educador, em relação a oferecer condições nas quais as crianças sejam aceitas em suas po-
tencialidades e características pessoais. Indica-nos a importância de trabalhar respeitosamente
com as diferenças pessoais, no sentido de instrumentalizar nossos alunos para realizar suas
escolhas e construir sua autonomia de maneira gradual e saudável.
Tanto a psicanálise quanto a teoria humanista apontam a necessidade de oportunizarmos a
Francisca meios para que ela possa reconhecer seu autoconceito, suas reais qualidades e possi-
bilidades de projeto de vida, alcançando sua tomada de consciência para lutar por sua felicida-
de, superando a fixação gerada em sua fase fálica.
Como educadores, temos uma generosa oportunidade de oferecer uma grande gama de pos-
sibilidades aos nossos educandos, para que possam descobrir a que de fato corresponderiam
os seus projetos pessoais, indo ao encontro de sua autorrealização.

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Psicologia da Educação

Capítulo 4

A natureza do ensino e da aprendizagem está relacionada à maneira como planejamos nossa


intervenção educacional e pedagógica, tanto do ponto vista da educação assistemática quan-
to da educação sistemática. Quando consideramos o que os alunos já sabem e o que ainda
precisam aprender, estamos organizando nosso ensino do ponto de vista pedagógico, a partir
de nossas concepções de ensino e aprendizagem.
Em diferentes contextos, dentro e fora da escola, podemos planejar situações de ensino. Ava-
liamos se os nossos objetivos de ensino foram ou não alcançados, a partir de seus efeitos na
aprendizagem do interlocutor: o aluno.
Dessa forma, aprendizagem e ensino são processos intimamente ligados, como as duas faces
de uma mesma moeda. Correspondem às atividades fundamentais que ocorrem dentro das
escolas, de modo sistemático, planejado, deliberado. A escola é, sobretudo, um lugar onde as
pessoas encontram-se para ensinar e aprender.

Capítulo 5

Ao longo do desenvolvimento humano, isto é, desde a nossa infância até o último instante de
nossa vida, podemos aprender. Portanto, aprendemos de forma intencional todas as vezes que
nos matriculamos num curso ou procuramos deliberadamente uma instituição que possua
reconhecidamente um conhecimento que temos interesse em aprender, de maneira formal,
sistemática e planejada. Mas, ao nos dirigirmos para essa aula, aprendemos novos itinerários,
conhecemos outras pessoas, que nos ensinam de forma acidental e assistemática muitos co-
nhecimentos.
Por isso, aprendizagem e ensino não pertencem exclusivamente a um cenário escolar.

Capítulo 6

Usamos o termo ‘aprender’ sem dificuldades, pois sabemos que, se somos capazes de fazer
algo que antes não fazíamos, é porque aprendemos. A aprendizagem é um processo perma-
nente em nossas vidas.
A aprendizagem é um processo tão frequente, tão constante em nossas vidas, que praticamen-
te nos acompanha do berço ao túmulo.
Há provas experimentais da ocorrência, em fetos humanos, de um tipo particular de aprendi-
zagem, denominado condicionamento, a partir dos seis ou sete meses de vida intrauterina. Da
mesma forma, vários pesquisadores demonstraram que é possível a formação de reflexos con-
dicionados em crianças nascidas prematuramente, durante o período que vai desse nascimen-
to prematuro até a data correspondente ao término normal de uma gestação. Esses estudos
são apontados por Carmichael (1976) como demonstrações de que “o mecanismo neural de
fetos em estado adiantado de gestação já se encontra de tal forma amadurecido que é possível
ocorrer aprendizagem determinada pelo ambiente.” Por outro lado, pessoas idosas são igual-
mente capazes de aprender.

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Capítulo 7

A aprendizagem é um tema nuclear na Psicologia Contemporânea.


Alguns dos mais notáveis progressos recentes em psicologia da personalidade, psicoterapia e
terapia comportamental originaram-se de estudos experimentais da aprendizagem.
O foco deste material incide nos conhecimentos capazes de contribuir, direta e efetivamente,
para o trabalho do professor, em relação ao ensino e à aprendizagem das matérias dos currícu-
los de cada grau e série escolar.

Capítulo 8

Os fins últimos da educação referem-se, essencialmente, à promoção de uma pessoa bem inte-
grada, capaz de assumir um papel responsável e ativo na sociedade, e compreendem o desen-
volvimento de capacidades intelectuais e discernimentos sociais (cognição), a aprendizagem
de habilidades ativas práticas (aprendizagem psicomotora) e o desenvolvimento de emoções,
atitudes e valores (aprendizagem afetiva).
O novo sentido atribuído à palavra ‘informação’, nesse contexto, tem suficiente abrangência
para incluir tanto os produtos – ideias, fatos, planos, textos, sons, imagens, representações tri-
dimensionais etc. deliberadamente criados por nós ou naturalmente disponíveis no ambiente
– quanto os processos, isto é, habilidades, regras, estratégias, procedimentos e outros, graças
aos quais as informações são captadas, criadas ou aplicadas.

Capítulo 9

Hilgard assinala que uma teoria da aprendizagem preenche três funções essenciais:

1. constitui uma forma de abordar essa área do conhecimento, um modo de analisar, expor e
orientar pesquisas sobre aprendizagem;
2. representa um esforço para integrar, numa formulação relativamente breve, uma grande
quantidade de conhecimentos sobre os princípios ou leis da aprendizagem;
3. é uma tentativa criadora de explicar o “porquê” da aprendizagem, de compreender por que
ela funciona de um determinado modo.

A aprendizagem cognitiva designa formas de aprendizagem mais complexas, nas quais a per-
cepção, a compreensão de relações significativas e o conhecimento são críticos, muito mais do
que o estabelecimento de associações entre estímulo e resposta.

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Psicologia da Educação

Capítulo 10

Devemos ao psicólogo Edward L. Thorndike uma das mais influentes e populares teorias da
aprendizagem, segundo o modelo associacionista de estímulo-resposta. Conhecida como co-
nexionismo, afirma que um hábito é adquirido por ensaio e erro, de modo que uma resposta
apropriada torna-se gradualmente associada a um estímulo particular.
A contribuição de Burrhus Frederic Skinner à compreensão da aprendizagem estriba-se na as-
sociação entre uma resposta desejada e um estímulo reforçador que a segue. Filia-se, portanto,
ao mesmo grupo de teorias S-R nas quais o reforçamento desempenha um papel fundamental,
como a de Thorndike. Além disso, Skinner realça os papéis dos estímulos discriminativos – estí-
mulos frente aos quais o organismo aprende a responder de modo diferente em relação a cada
um deles – e da diferenciação da resposta.

Capítulo 11

1. Piaget acreditava que o desenvolvimento cognitivo era um modo de adaptação ao ambiente.


Ao contrário de outros animais, o indivíduo não é dotado de respostas inatas (respostas que já
nascem com o próprio animal). E justamente essa característica que dá ao indivíduo humano
maior flexibilidade de adaptar seu pensamento e seu comportamento, a fim de se “ajustar” ao
mundo à medida que o vivencia em sua determinada idade. Para Piaget, as crianças são partici-
pantes ativos na criação de sua própria interpretação de mundo. Essa visão é uma das maiores
contribuições de Piaget.

2. Piaget considerou quatro estágios básicos de desenvolvimento cognitivo:


a) Sensório-Motor;
b) Pré-Operacional;
c) Operações Concretas;
d) Operações Formais.

Capítulo 12

1. Vygotsky dedicou-se ao estudo das chamadas funções psicológicas superiores, que consistem
no modo de funcionamento psicológico humano. São processos não inatos, que se desenvol-
vem ao longo do processo de internalização de formas culturais de comportamento. Diferem,
portanto, dos processos psicológicos elementares (presentes na criança pequena e nos ani-
mais), tais como reações automáticas, ações reflexas e associações simples, que são de origem
biológica. O projeto principal de seu trabalho consistia na tentativa de estudar os processos de
transformação do desenvolvimento humano na sua dimensão filogenética, histórico-social e
ontogenética. Deteve-se ao estudo dos mecanismos psicológicos mais sofisticados (as chama-
das funções psicológicas superiores), típicos da espécie humana:

ƒƒ Controle Consciente do Comportamento;


ƒƒ Atenção e Lembrança Voluntária;

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ƒƒ Memória Ativa;
ƒƒ Pensamento Abstrato;
ƒƒ Raciocínio Dedutivo;
ƒƒ Capacidade de planejamento.

2. O teórico identifica dois níveis de desenvolvimento:

ƒƒ Nível de Desenvolvimento Real;


ƒƒ Nível de Desenvolvimento Potencial.

O Nível de Desenvolvimento Real (NDR) pode ser entendido com referência àquelas conquistas
que já estão consolidadas na criança, aquelas funções ou capacidades que ela já aprendeu e
domina, pois já consegue utilizar sozinha, sem assistência de alguém mais experiente da cul-
tura (pai, mãe, professor, criança mais velha etc.). Por exemplo: andar de bicicleta, soltar pipa,
cortar com tesoura.
Estamos tratando de um nível de desenvolvimento já estabelecido, o indivíduo já aprendeu,
isto é, estamos olhando para o desenvolvimento retrospectivamente.
O Nível de Desenvolvimento Potencial (NDP) pode ser entendido como aquilo que o indivíduo
é capaz de fazer, só que mediante a ajuda de outra pessoa (adultos ou crianças mais expe-
rientes). Nesse caso, a criança realizará tarefas e solucionará problemas através do diálogo, da
colaboração, da imitação, da experiência compartilhada e das pistas que lhe são fornecidas. Por
exemplo: uma criança de 5 anos pode não conseguir montar um quebra cabeça logo de início,
mas com a ajuda de seu irmão ou pessoa mais velha, pode realizar a tarefa.

3. A distância entre aquilo que o indivíduo é capaz de fazer de forma autônoma (NDR) e aquilo
que ele realiza em colaboração com os outros elementos de seu grupo social (NDP) caracteriza
aquilo que Vygotsky chamou de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), sendo, portanto,
aquelas funções que o indivíduo ainda não amadureceu.

Esse conceito, embora desconhecido por muitos educadores, é um instrumento contínuo no


cotidiano escolar, já que existe tal relação entre o professor, o conhecimento a ser aprendido e
o aluno.
Atualmente, vemos a Psicologia da Educação possibilitar a discussão de várias teorias sobre o
Desenvolvimento e a Aprendizagem (como as teorias de Piaget e Vygotsky).

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Psicologia da Educação

Capítulo 13

1. Depois da Psicopatologia, Wallon dedicou-se ao desenvolvimento da criança, considerando


que a questão fundamental dessa área é o estudo da consciência e que o melhor caminho para
entendê-la é buscar sua gênese, sua origem.
Concentrou-se, então, no processo de desenvolvimento para explorar as origens biológicas
da consciência. Da análise de suas observações, comparando semelhanças e diferenças entre
o desenvolvimento de crianças normais e patológicas, entre crianças e adultos, foi extraindo
os princípios reguladores desse processo e identificando seus vários estágios. Assim criou sua
teoria de desenvolvimento.

2. A sequência de estágios proposta por Wallon é a seguinte:


ƒƒ Impulsivo Emocional (0 a 1 ano);
- 1ª Fase: Impulsivo (0 a 3 meses);
- 2ª Fase: Emocional (3 a 12 meses);
ƒƒ Sensório-Motor e Projetivo (1 a 3 anos);
ƒƒ Personalismo (3 a 6 anos);
ƒƒ Categorial (6 a 11 anos);
ƒƒ Puberdade e Adolescência (11 anos em diante).

As idades indicadas foram propostas por Wallon para as crianças de sua época e de sua cultura.
Precisam ser revistas para a nossa cultura nos dias de hoje. Entretanto, mais que os limites etá-
rios, é preciso observar quais interesses e atividades predominam em cada período. Os estágios
só adquirem sentido dentro dessa sucessão temporal, uma vez que cada um deles é gestado,
preparado pelas atividades do estágio anterior e desenvolve atividades que prepararão a emer-
gência do próximo. Então, será possível perceber quais os comportamentos predominantes
em cada um deles. As situações às quais a criança reage são as que correspondem aos recursos
de que dispõem.

Capítulo 14

1. A adolescência é o período da vida que se inicia por volta dos 10 anos e termina aos 20 anos
de idade, quando a pessoa passa de criança à adulta. Esse período abrange não apenas altera-
ções físicas de um corpo em amadurecimento, como também muitas mudanças cognitivas e
socioemocionais.
Uma série de características físicas essenciais indica a fase da adolescência. A mais óbvia é o Es-
tirão de Crescimento, isto é, o rápido aumento na altura e no peso que tem início, em média,
aos 10 anos e meio para as meninas e aos 12 anos e meio para os meninos e chega ao auge aos
12 anos para elas e aos 14 para eles. O adolescente típico atinge sua altura máxima cerca de 6
anos após o início do estirão de crescimento.
Esse estirão se inicia com o alongamento das mãos, dos pés, dos braços e das pernas, o que gera
o aspecto desajeitado e grandalhão dos adolescentes mais jovens. Esse estágio é seguido pelo

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crescimento do torso, o que traz o corpo de volta à proporcionalidade. Nos meninos, o estágio
final resulta no alargamento do peito e dos ombros e no desenvolvimento de músculos mais
fortes. Para as meninas, as mudanças no corpo ocorrem à medida que os quadris se alargam e
a gordura se deposita nos seios, na cintura, nas nádegas e nas coxas. Todas essas mudanças se
originam de um aumento dos hormônios. Em ambos os sexos, o rosto também passa por alte-
rações. O queixo e o nariz se tornam mais proeminentes, e os lábios mais carnudos.

2. Assim como os corpos amadurecem durante a adolescência, o mesmo ocorre com os padrões
de pensamento. Piaget (1969) via os progressos cognitivos da adolescência como uma capaci-
dade maior de pensar de maneira abstrata, denominada pensamento operacional-formal. Os
adolescentes são capazes de compreender e lidar com conceitos abstratos, especular a respei-
to de possibilidades alternativas e raciocinar em termos hipotéticos. Contudo, essa é a fase em
que demonstram um “egocentrismo das operações formais” (PIAGET, 1967), pois suas represen-
tações do real são mais importantes do que a dos adultos.
David ElKind (1968-1969) utilizou a ideia de Piaget descrita acima para explicar duas considera-
ções sobre o comportamento adolescente. A primeira delas é a audiência imaginária, tendên-
cia que os adolescentes têm de achar que estão sendo constantemente observados e que as
pessoas sempre os julgam por sua aparência ou comportamento. A outra consideração versa
sobre a fábula pessoal, a sensação irreal que os adolescentes têm de sua própria singularidade
– acreditam que são diferentes de outras pessoas, que não serão afetados por coisas negativas
que acontecem aos outros.

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