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SEXUALIDADE FEMININA: A MULHER POR ELA MESMA NO

MOVIMENTO FUNK CARIOCA

Juliana da Silva Bragança1

Resumo: Este trabalho origina-se de um pré-projeto de mestrado e tem como objetivo tratar a
mulher e sua sexualidade expressa de forma artística no funk carioca. Visto a atual configuração do
movimento funk carioca percebe-se sua atual complexidade e massiva circulação de letras de
músicas de cunho erótico/sensual/sexual. A problemática envolvida neste pré-projeto gira em torno
dos discursos acerca da sexualidade feminina cantados por elas mesmas no movimento, de forma a
elucidá-las como atores sociais de primeira ordem. Os problemas a serem levantados dizem respeito
aos supostos motivos que levam essas mulheres a cantar, dançar e se comportar artisticamente da
forma como fazem. Seria esse mais um reflexo das conquistas feministas envoltas no campo da
sexualidade? Ou a apropriação do mercado fonográfico do corpo da mulher para a obtenção de
lucro? Ou ainda ambos os motivos expostos em conjunto? Estas são questões que se pretende
discutir com a presente proposta de comunicação.
Palavras-chave: Funk carioca. Sexualidade feminina. Erotismo.

Apesar de estar fortemente enraizado na sociedade carioca, o movimento funk ainda sofre
intenso estigma e preconceitos contra si. Trata-se de um movimento de periferia e majoritariamente
negro capaz de atrair indivíduos de diversas classes sociais. O funk carioca é produzido na favela,
pela favela e para a favela – mas também para o asfalto2. A realidade cantada é propriamente
daqueles que se encontram à margem da sociedade, da massa trabalhadora, a quem são denegados
os direitos primordiais do ser humano, como, por exemplo, o acesso à saúde e educação públicas de
real qualidade. Muitas destas pessoas estão atiradas à própria sorte em meio à violência e ao caos
dos subúrbios do Rio de Janeiro3.
Não obstante, o movimento funk é indiciado pelo senso comum como um movimento
marginal, promotor de violência e desordem, desprovido de qualquer teor cultural, sendo muitas
vezes acusado de vulgar. A sociedade, de um modo geral, não considera o funk como um
movimento; muitos, inclusive, sequer o considera como música.

1
Historiadora e professora de história. Mestranda no Programa de Pós-Graduação em História Comparada pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGHC-UFRJ), Brasil.
2
Seja por meio dos proibidões (músicas veiculadas pelo mercado ilegal, com conteúdos considerados impróprios –
pornográficos ou relacionados ao crime organizado), internet (através de downloads e sites reprodutores de vídeos ou
especializados em letras de músicas), casas de show (promotoras de bailes funk), rádio, TV, dentre tantos outros meios
de veiculação midiática disponíveis atualmente
3
Isto se estivermos falando do funk veiculado até o fim da primeira década dos anos de 2000, uma vez que esta
conjuntura tem sido transformada ultimamente, visto a emergência de cantores como Naldo e Anitta, por exemplo, que
se enquadram mais nos padrões da classe média/alta, tanto no que diz respeito às letras de suas músicas, quanto à
indumentária e performance de ambos.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X
Este trabalho, oriundo de um pré-projeto de mestrado, concentra-se na problematização da
representação da mulher no movimento funk carioca, sobretudo no que diz respeito à sua
sexualidade a partir de sua própria voz. Em outras palavras, este trabalho busca concentrar-se nas
visões que as mulheres funkeiras professam em suas músicas acerca de sua própria sexualidade.

Funk carioca: breve histórico

Surgido na década de 1960 em Nova Iorque, com James Brown, o movimento funk já era em
sua essência contestador. Na conjuntura de seu nascimento, os EUA estavam passando por uma fase
muito complicada no âmbito social: os negros estavam buscando seu espaço na sociedade e
reagindo contra o preconceito étnico que os cercava, reivindicando principalmente seus direitos
civis. Assim, James Brown utiliza uma base rítmica essencialmente branca para compor música
negra, fato que chocava a sociedade estadunidense na época (VIANNA, 1997, p. 19-20).
O funk chega ao Brasil em torno de 1970, onde, a princípio, tocava-se preferencialmente
música estrangeira nos bailes. Esse cenário se transformou fundamentalmente em princípios da
década de 1990, quando do DJ Marlboro lançou os discos Funk Brasil I e, logo em seguida, Funk
Brasil II, com todas as músicas cantadas em português (MEDEIROS, 2006, 16-18).
A partir de então, em meados da década de 1990, o principal assunto nas letras de música
funk eram denúncias, contestação social, favelas, drogas e crime4. Com a ascensão dos MCs
Claudinho e Buchecha na mídia, os assuntos das letras das músicas passaram a ser primordialmente
o amor, inaugurando a fase midiática do funk carioca.
Após o início dos anos 2000, nota-se a glamourização do funk na mídia, junto com a
aparição das mulheres na cena funk como MCs, e não somente como dançarinas. Desde então, o
assunto veiculado através do funk midiático passou a ser (quase) exclusivamente erótico/sensual,
por questões mercadológicas (ESSINGER, 2005, p. 227)5.

A mulher na cena funk carioca

Janaína Medeiros defende que a aparição da mulher no funk carioca fora um pouco tardia
pelo fato de o funk ser reflexo de uma sociedade machista (como um todo) e proveniente das classes
sociais mais baixas da cidade (MEDEIROS, 2006, p. 75). Essa visão é compartilhada pelo autor

4
O que pode ser conferido nas músicas de alguns artistas consagrados nesse período: MC Bob Run, Cidinho & Doca,
MCs Junior & Leonardo, dentre outros.
5
Para entender melhor este assunto, sugiro a leitura do texto de Theodor Adorno, A indústria cultural (ADORNO,
2002, p. 7-74).

2
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Sílvio Essinger, que vê o ano de 2001 como o ano do funk na mídia, como o ano dourado do
movimento (ESSINGER, 2005, p. 227) e que, até aí, as aparições das mulheres no universo funk
carioca eram bem escassas (ESSINGER, 2005, p. 215-216), comprovando um fenômeno
essencialmente pertencente ao século XXI.
De acordo com Medeiros, a “grande virada feminista no funk” aconteceu quando o
Coroado6, na Cidade de Deus, por volta de 1996, não atraía mais um grande público, por conta do
auge dos bailes de briga7 (MEDEIROS, 2006, p. 75). DJ Duda, responsável pelos bailes do
Coroado, resolveu abrir o palco para quem tivesse alguma rima. Subiu então ao palco Deize Maria
Gonçalves (posteriormente conhecida como Deize Tigrona e Deize da Injeção), na época com 16
anos, empregada doméstica, que como hobby, produzia rimas e as escrevia em seu diário. Juntando-
se com mais quinze meninas, o Bonde do Fervo foi formado. Recebeu esse nome por inspiração de
sua música, Hilda Furacão (“Não somos Hilda Furacão, mas seu macho vamos comer/ Esse é o
Bonde do Fervo lá da Praça do Apê/ Se tu tem disposição, demorou de encarar/ Tem que saber que
é o fervo, a chapa vai esquentar”).
Logo depois surgiu o Bonde das Bad Girls provocando-as. Desse embate entre os dois
grupos surgiu o duelo de rimas no Coroado, com os dois bondes competindo com suas rimas no
palco. Houve uma onda de surgimento de bondes na Cidade de Deus e em diversas outras
comunidades. Os grupos de maior destaque já nessa época eram: Bonde das Putanas, Bonde das
Tchuchucas e Gaiola das Popozudas8, juntamente com as MCs Tati Quebra-Barraco e Vanessinha
Pikachu. O comum entre todas elas são as letras irreverentes, com discurso “neofeminista”9, além
da indumentária, comumente provocativa e sexualizada (MEDEIROS, 2006, p. 76-78).
Outro personagem feminino que merece destaque na cena funk é Tatiana dos Santos
Lourenço, a Tati Quebra-Barraco, também da Cidade de Deus que fazia shows em diversos bailes.
“Para o grande público, Tati foi uma das primeiras mulheres a fazer sucesso na mídia”

6
Espaço que promovia bailes funk.
7
Herschmann aborda com maestria este tipo específico de baile em sua obra O funk e o hip-hop invadem a cena, onde
podem ser encontradas maiores discussões acerca deste assunto (HERSCHMANN, 2005, 130-180).
8
Este grupo, formado somente por mulheres, liderado por Valeska Popozuda, é um dos grupos de funk que mais
causam polêmica por conta do conteúdo sexual explícito em suas letras. Dentre alguns títulos, destaco Agora Virei
Puta, Comece a me Chupar, Hoje Eu Não Vou Dar, Eu Vou Distribuir, Minha Buceta É o Poder, Tô Com o Cu
Pegando Fogo, dentre tantos outros, que podem ser conferidos em < http://letras.mus.br/gaiola-das-popozudas/>.
Último acesso em 08/07/2013.
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“neofeminista” é o termo utilizado pela autora Janaína Medeiros para designar as músicas em que as mulheres passam
a se portar no movimento funk como atores de primeira ordem, cantando músicas com conteúdo erótico explícito,
muitas das vezes, defendendo o prazer sexual das mulheres como um todo. Esta visão pode, porém, ser contestada, uma
vez que ainda são veiculadas músicas de conteúdos machistas por homens e por mulheres, podendo gerar debates
teóricos cada vez mais profundos.

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(MEDEIROS, 2006, p. 79-80). Segundo Essinger, a expressão “quebrar o barraco”, de onde se
originou o nome artístico da MC, significa fazer sexo selvagem e satisfatório. Em 1999, Tati
Quebra-Barraco teve suas músicas gravadas pela equipe de som Furacão 2000: Barraco I e Barraco
II foram as primeiras e que fizeram o maior sucesso no início de sua carreira. Já no ano de 2001, a
artista gravou seu primeiro disco. Nas palavras do autor, era “o Kama Sutra resumido num disco”.
Dentre demais músicas, se encontram: Montagem Pidona, Montagem Assadinha (69)10, Montagem
Marra de Sansão, Montagem Cartão Magnético11, Montagem Desafio, Montagem Tchutchuco,
Montagem Chapa Quente, Montagem Palmolão (ESSINGER, 2005, p. 216-218)12.
A maior polêmica em que estavam (e até hoje se encontram na mesma situação) envolvidas
as cantoras e os grupos citados acima é o alto grau de erotismo presente em suas músicas e suas
coreografias (MEDEIROS, 2006, p. 82).
Deize é ex-doméstica e parou de estudar na 5° série do Ensino Fundamental, enquanto Tati
é ex-merendeira de creche e estudou só até a 4° série. Para o DJ Marlboro, o passado
sofrido das duas deveria servir como inspiração para letras com discursos mais políticos e
sociais. “Elas sofrem discriminação, não só porque elas são da favela, mas porque são
pretas, pobres e mulheres. Então acho que elas também têm outro de grito de reivindicações
a fazer, não só de liberdade sexual. Acho que está na hora da Tati, da Deize e de todas as
cantoras de funk cantarem a liberdade das empregadas domésticas, das diaristas, das
pessoas que sofrem discriminação porque têm esse tipo de emprego”, opina Marlboro.
(MEDEIROS, 2006, p. 82)

Nesse caso o DJ Marlboro está criticando as músicas que contêm duplo sentido com
conotação sexual. O DJ afirma que é essa sensualidade que faz do funk um produto nacional, e que
nós, brasileiros, somos naturalmente sensuais. O DJ se posiciona essencialmente contra a
pornografia. Em suas palavras,
“O funk atinge todas as classes sociais, assim como todas as faixas etárias. Sendo
pornográfico, você contribui para a sexualidade precoce dessa juventude. Música atinge a
criança. Quando você faz uma música de funk que atinge a criançada em massa, e você
coloca palavrão nessa música, você está tendo responsabilidade com aquelas crianças”,
argumenta o DJ. (MEDEIROS, 2006, p. 83).

Em sua defesa, a MC Deize Tigrona alega que já chegou a produzir música politizada, com
contestação social, mas que não obteve sucesso. Além de tudo, nos chama atenção ao fato de que o

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69 Frango Assado / De ladinho a gente gosta / Se tu não tá aguentando / Para um pouquinho / Tá ardendo assopra!! /
Entãoo.. / Tá ardendo assopra / Tá ardendo assopra / Fica de Joelho / Faz um biquinho / Chupa meu... Disponível em
<http://letras.mus.br/tati-quebra-barraco/446513/>. Último acesso em 07/07/2013.
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Abre as pernas, mexe e gira / ja viu como é que faz / O mané bateu com o carro / E me levou pro mato / E na suíte
dominante / Que eu quebro o meu barraco / Lugar luxuoso / Não entra Mané / Só sobe de carro / Quero ver subir á pé /
Se liga na Tati / O rítimo é genético / Pra você abrir a porta / Só com o cartão magnético. Disponível em
<http://letras.mus.br/tati-quebra-barraco/859733/>. Último acesso em 07/07/2013.
12
Dentre outras músicas, podemos também encontrar títulos nada convencionais, como: 60 na mandioca, Mete Até
Gozar, Orgia, Siririca, dentre tantos outros, que podem ser conferidos na íntegra em <http://letras.mus.br/tati-quebra-
barraco/>. Último acesso em 07/07/2013.

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mesmo acontece nas letras de forró (e, diga-se de passagem, nas letras de música de diversos outros
ritmos naturalmente brasileiros – ou até mesmo estrangeiros - e que conseguem conquistar sucesso
em escala nacional – ou mundial), e não há toda essa repercussão que há com o funk (MEDEIROS,
2006, p. 83)13.
Fica a questão: por qual motivo o discurso erótico/sensual/sexual não pode ser considerado
político?
Denise Garcia, produtora do documentário Sou feia mas tô na moda14, alega que as pessoas
têm medo simplesmente pelo fato de essas mulheres serem da favela. Arrisca-se ainda em dizer que
se fossem adolescentes de classe média e alta fazendo a mesma coisa, “seriam nossas Spice
Girls15”. E diz mais: “Particularmente eu acho extremamente político uma mulher dizer „a porra da
buceta é minha‟( título de uma canção de Deize Tigrona). Muito mais do que dizer „no meu barraco
cai água dentro‟”(MEDEIROS, 2006, p. 84). Não seria esta uma forma de liberdade?
Estas questões nos levam a refletir e a contestar o que realmente incomoda: as músicas
erotizadas ou sua origem? O problema maior parece estar não no discurso de cunho sensual/sexual,
mas sim na origem deste mesmo discurso. Tomando como exemplo o samba, que hoje ocupa um
status de cultura popular nacional, já foi criminalizado e proibido em sua origem, sobretudo por se
tratar de um movimento proveniente dos negros pobres e suburbanos16.

O projeto

Com este artigo, gostaria de elucidar minhas intenções, justificativas e hipóteses, surgidas do
pré-projeto de mestrado inicialmente pensado, a fim de desenvolver melhor minhas pesquisas e
considerações acerca do tema aqui explicitado.
O foco principal da pesquisa proposta é compreender de que forma a mulher tem se portado
no movimento funk e como tem se desenrolado sua expressão artística, sobretudo a partir da análise
das músicas que apresentam conteúdo explicitamente sexual, interpretadas, a princípio, pelos

13
E também em tantos outros gêneros musicais, sejam eles brasileiros (samba, MPB, brega, por exemplo) ou não
(reggaeton – Cuba, cumbia villera – Argentina, hip hop – Estados Unidos, dentre tantos outros).
14
Título de uma canção de Tati Quebra-Barraco, esse documentário aborda a vida das mulheres que estão envolvidas
direta ou indiretamente no mundo funk carioca dos anos 2000, problematizando as músicas, as coreografias e os
comportamentos das mesmas inseridas neste contexto.
15
Grupo norte-americano formado por 5 jovens mulheres, que cantavam e dançavam, e acabaram conquistando
milhares de fãs por todo o mundo na década de 1990.
16
O jazz pode também ser tomado como exemplo pois, antes de se tornar um fenômeno cultural mundial, já havia
sofrido preconceito por conta de sua origem negra e subalterna (HOBSBAWN, 2009, p. 59-74).

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seguintes grupos/artistas17: Gaiola das Popozudas18, Juliana e as Fogosas19, Deise da Injeção20 e
Tati Quebra-Barraco21. Os discursos pensados a serem analisados se dariam através das letras de
músicas produzidas e/ou interpretadas por artistas cariocas inseridas nas favelas do Rio de Janeiro,
compreendidos num período que se inicia no ano 2000, pois foi nesse período em que a mulher se
mostrou e passou a ser vista no movimento (ESSEINGER, 2005, p. 215) estendendo-se ao ano
2010. Pretende-se ter acesso a estas músicas através de sítios eletrônicos especializados em veicular
letras de músicas.
Esta pesquisa justifica-se na necessidade de ampliação do debate acadêmico ainda tão
limitado acerca do movimento funk carioca e da sexualidade feminina, bem como reafirmá-lo como
um grande celeiro de representação, que pode, deve e merece ser utilizado como objeto central de
pesquisa acadêmica – seja ela histórica, como é o caso, ou não. A importância da realização desse
trabalho estaria baseada na possibilidade de contribuição para o preenchimento da atual carência
nos estudos que visam perceber como a representação artística da mulher tem se dado no
movimento funk.
Outra justificativa para a realização desta pesquisa encontra-se no fato de o funk ter sido
recentemente reconhecido como cultura22. Assim, esta seria capaz de contribuir para a afirmação do

17
Todos os grupos escolhidos são formados exclusivamente por mulheres, com vistas a perceber a sexualidade feminina
expressada por elas mesmas.
18
Eu vou pro baile, Eu vou pro baile / Sem calcinha! / Agora eu sou piranha e ninguém vai me segurar! / Daquele jeito /
Sem, sem calcinha! / Eu eu eu eu eu eu eu eu / Eu vou pro baile procurar o meu negão / Vou subir no palco ao som do
tamborzão / Sou cachorrona mesmo e late que eu vou passar / Agora eu sou piranha e ninguém vai me segurar! / DJ
aumenta o som! / No local do trepa-trepa eu esculaxo tua mina, / No completo ou no mirante outro no muro da esquina ,
/ Na primeira tu já cansa eu não vou falar de novo / Ai que piroca boa, bota tudo até o ovo / Eu queria andar na linha, tu
não me deu valor / Agora eu sento, soco, soco, topo até filme pornô / Gaiola das Popozudas agora vai falar pra tu / Se
elas Brincam com a xereca eu te do um chá de Cu! / Se elas Brincam com a xereca eu te do um chá de Cu! / Sem sem
calcinha / Sem sem calcinha / Agora eu sou piranha e ninguém vai me segurar / Daquele Jeito... Disponível em <
http://letras.mus.br/gaiola-das-popozudas/1111700/> Último acesso em 08/07/2013.
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Amor , me deculpe, / você sabe como é o homem , / a carne é fraca , a alma é safada / e o nosso coração é vagabundo,
/ não deu para segurar / volta para mim mulher / Tá arrependido né ... / Agora o bagulho mudou / para esse otário eu
mando assim ... / Tu me traiu , se divertiu e agora / quer voltar , vai, vai ... / Tu me traiu , se divertiu e agora / quer
voltar , vai, vai ... / Se liga ai o mané ... / Cansei de ser otária , / cansei de apanhar , / cansei de ser chifruda, / eu vou me
libertar. / Mulher não é bagunça / Eu vou mandando um papo assim, / papo assim .. / Eu posso até gostar /
mais gosto muito mais de mim. / Agora o bagulho mudou
para esse otário eu mando assim, mando assim , mando assim ... Disponível em < http://letras.mus.br/juliana-as-
fogosas/1954529/>. Último acesso em 08/07/2013.
20
Não conseguiu me comer / Agora, quer me esculaxar / Se liga seu otário no papo que eu vou mandar / Então, pára de
palhaçada, deixa de gracinha, / Eu dou pra quem eu quiser, que a porra da buceta é minha. / Então, É minha, é minha, a
porra da buceta é minha / Então corre pro banheiro vai tocar uma punheta / Eu dou pra quem eu quiser a porra da buceta
É minha, é minha, é minha.. / É minha, é minha, a porra da buceta é minha / É minha, é minha, é minha.. Disponível em
< http://letras.mus.br/deise-tigrona/1322298/>. Último acesso em 08/07/2013.
21
Sou cachorra chapa quente, / Adoro quando me taram, / E fico louca de tesão / Pedindo tapinha na cara. / Sou uma
gatinha manhosa, / Vou fazer tu derramar, / O seu líquido do amor, / Ai, que tesão vou te arranhar / Cachorra, au au.
Gatinha, miau. Disponível em < http://letras.mus.br/tati-quebra-barraco/165151/> . Último acesso em 08/07/2013.
22
Através da lei estadual do Rio de Janeiro 5.543 de 2009.

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movimento funk como tal. Mesmo o funk já tendo sido reconhecido como cultura e tendo atingido
outras classes sociais, ainda é criminalizado, marginalizado, e descriminado, talvez por conta de sua
origem e da classe social ao qual está diretamente relacionado.
Não se pretende, porém, excluir as questões mercadológicas envoltas no movimento funk,
que fazem com que sejam produzidas e veiculadas músicas essencialmente com conteúdo sexual,
excluindo-se da grande mídia músicas que tenham conteúdo de contexto social mais explícito, que
tratem, por exemplo, de temas relacionados ao tráfico, à condições sociais, à reivindicações, etc.,
procurando sempre o distanciamento de considerações de juízos de valor.
O objetivo geral da presente pesquisa é perceber a postura artística adotada pelas mulheres
no movimento funk carioca no período citado acima, sobretudo no que diz respeito à sexualidade
feminina. Pretende-se tratar a mulher como um ator social de primeira ordem particularmente na
cena funk carioca e especialmente no que se refere à sua própria sexualidade, bem como ressaltar
seus caracteres identitários.
Os objetivos específicos seriam:
 Analisar o discurso sexual promovido através da música funk para entender a postura e a
identidade da mulher inserida no movimento.
 Desmistificar e buscar entender a postura artística da mulher no funk carioca, afastando-se ao
máximo de considerações de juízo de valor.
 Encontrar quais as motivações que essas mulheres têm para cantar e dançar do modo como
fazem.
 Afirmar o funk como movimento cultural promotor de identidade produzido por aqueles que
se encontram à margem da atual sociedade do Rio de Janeiro.
 Auxiliar no reconhecimento do funk como uma forma legítima de representação das classes
sociais mais baixas da cidade do Rio de Janeiro e promover, ainda que de forma tímida, o
diálogo em torno do movimento funk no meio acadêmico
O presente projeto de pesquisa se orienta em duas hipóteses não excludentes, que podem vir
a ser confirmadas ou rejeitadas, conforme se nota adiante.
A primeira delas é que a ascensão da postura feminina quase que estritamente sexual na cena
funk pode estar intrinsecamente vinculada ao mercadológico que se estabeleceu por detrás do
movimento.
Atualmente, só se veicula na grande mídia fonográfica, no rádio e na televisão músicas funk
que tenham como temática central a sexualidade e o erotismo. Mas esta lógica de mercado não se

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configura somente no movimento funk e não é uma particularidade dele. Numa escala maior,
mundial, o que se vende é o corpo semi - ou completamente - nu. Como foi ressaltado
anteriormente, diversas outras expressões musicais abarcam em si a sexualidade.
A segunda é que as músicas de conteúdo sexual cantadas por mulheres no movimento funk
pode ser somente mais um de tantos outros efeitos trazidos pelas conquistas femininas ao longo dos
anos, entre elas de maior expressão e domínio sobre seu próprio corpo e sexualidade.
Além disso, pretende-se se debruçar no auxílio que pode ser encontrado tanto na
indumentária quanto na coreografia, visto que juntos (letra, indumentária e coreografia) fazem parte
de um todo do mesmo discurso, que podem ser encontrados em vídeos disponíveis na internet e
DVDs lançados pelas equipes de som.

Conclusão

Sob o título Sexualidade feminina: a mulher por ela mesma no movimento funk carioca, foi
abordado aqui um pré-projeto de mestrado, de mesmo título, apresentado no início do ano 2013. A
maior intenção em publicar este trabalho não é responder questões, mas levantar algumas delas.
Busca-se, no evento Fazendo Gênero, uma maior aproximação dos temas envoltos nas questões
acadêmicas acerca do (neo)feminismo, machismo e relações de gênero, com o intuito de enriquecer
as pesquisas oriundas do pré-projeto supracitado como consequência de uma maior aproximação
das teorias que girem em torno das temáticas da sexualidade feminina.
Tendo em vista a atual configuração do funk na cidade do Rio de Janeiro, somos colocados
frente à uma realidade nada ortodoxa, envolta principalmente em temas e discursos extremamente
sexualizados. Assim, cabe nos perguntarmos: o que leva as mulheres a cantar e dançar da forma que
têm feito? Seria esta postura mais uma forma de dominação masculina? Seria esta postura uma
(nova?) forma de feminismo? Até que ponto a mídia e o mercado fonográfico induzem a uma
determinado tema nas músicas veiculadas?
Encerro este artigo deixando no ar estas questões, a fim de enriquecer este trabalho e, quiçá,
dar origem a outros.

Referências

Filmes e documentários

8
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VIANNA, Hermano. O mundo funk carioca. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editora, 1997.
Female sexuality: a woman by herself in funk of Rio de Janeiro

Abstract: This work stems from a pre-master's project and aims at treating the woman and her
sexuality expressed in artistic form funk carioca. Since the current configuration of the funk
movement realizes its current complexity and massive movement of lyrics imprint erotic / sensual /
sexual. The issue involved in this pre-project revolves around the discourses on female sexuality
sung by themselves in motion, in order to elucidate them as social actors first order. The problems
to be raised relate to the alleged reasons why these women to sing, dance and behave the way they
do artistically. This would be more a reflection of the achievements in the field of feminist shrouded
sexuality? Or ownership of the music industry a woman's body to obtain profit? Or both reasons
together? These are questions that we intend to discuss this proposal with communication.
Keywords: Funk of Rio de Janeiro. Feminine sexuality. Erotic.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X

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