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SISTEMA DE ESTÚDIOS

Gabriel Frossard CN1

O início da formação de estúdios cinematográficos nos Estados Unidos ocorre


num período conflituoso em relação a direitos autorais. O primeiro período importante
para entender o contexto do surgimento do sistema estúdios é chamado de Guerra das
Patentes (1897 – 1908). Thomas Edison, grande empresário e patenteador norte-
americano, resolveu patear os furos tipo roda dentada dos filmes. O furo era um
elemento fundamental, pois fazia o filme avançar dentro da câmera. Logo, com essa
estratégia, o cinema do país ficou nas mãos de Edison, já que todos os cineastas
precisariam pagar uma porcentagem para ele se desejassem usar filmes com furos.
Muitos não aceitavam esse monopólio e entravam em conflito, muitas vezes se
recusando a pagar. Porém, com o intuito de deixar a lei mais rígida, Thomas Edison
criou a Motion Pictures Patents Company (MPPC) em 1908 que aplicava a fiscalização
desse monopólio, denominado The Trust.
Assim, numa tentativa dessa fugir da cruel fiscalização, muitos produtores
saíram da costa leste e foram filmar, clandestinamente, na costa oeste, mas
especificamente na cidade de Los Angeles (Califórnia). Além de ser um local quase
sempre ensolarado, era bem calmo, porque não era um centro urbano, portanto, a
fiscalização não era tão ativa. Mais tarde, muitos desses estúdios que se estabeleceram
nessa região vão se desenvolver até formarem a conhecida Hollywood.
Alguns desses estúdios são: (1912) criado por Carl Laemmle e Paramount
(1912) fundada por Adolph Zukor. Mais tarde: Warner (1918) dos irmãos Warner e
Columbia (1918) de Harry Cohn e Jack Cohn. Mais tarde ainda: MGM (1924) de Louis
B. Mayer e Marcus Loew e 20th Century Fox (1935) de William Fox.
Entretanto, em 1910, mesmo com o The Trust operando, o produtor Laemmle
desafiou a lei da MPPC. O caso foi um processo jurídico complicado, mas no final
Laemmle saiu vitorioso. A partir de então, muitos produtores, inspirados nesse episódio,
resolveram fazer o mesmo, entrando em conflitos jurídicos com MPPC. Essa época
ficou conhecida com Guerra Trust. Em 1918, o The Trust foi finalmente considerado
abusivo pelos tribunais, e essa fiscalização se tornou ilegal.
Tendo em vista esse contexto histórico, vale destacar que o sistema de estúdio
nasce aproximadamente em 1915, antes do fim do The Trust, e impera de forma
hegemônica no mercado cinematográfico até 1948, quando começa o seu declínio e a
ascensão da televisão. O The Trust foi fundamental para entender o sistema de estúdios,
já que graças a ele muitos produtores fugiram para desenvolver seus estúdios na costa
leste, e se desenvolveram criando seu próprio método.
O sistema de estúdio traz consigo a ideia de que um filme é apenas um produto
mercadológico, não uma obra artística, logo, sua produção pode se assemelhar com uma
produção de fábrica, ou seja, a lógica industrial é adotada na realização de qualquer
filme realizado por um estúdio. Além disso, há três pilares que sustentam o sistema: a
realização das filmagens em estúdios (sem locações reais), o estabelecimento de gêneros
cinematográficos e o sistema de estrelato.

Filmes em Estúdios
Obviamente, não havia, entre os estúdios de cinema dos Estados Unidos, um
conjunto de regras que devia ser seguido, como uma receita de bolo, no momento da
criação de filmes. Ainda mais porque todos eram concorrentes dentro do mercado
cinematográfico.
Porém, a maioria dos estúdios entenderam que a realização de um filme pode
seguir um método, com etapas bem divididas, assim como um processo industrial.
Assim, a produção cinematográfica foi dividida. Houve uma divisão do trabalho e
consequentemente uma estratificação do mesmo, assim como há numa linha de
produção.
A escala de produção também era industrial. Em muito pouco tempo esse
método se mostrou muito lucrativo, pois produziam muitos filmes e a adesão do público
estadunidense era enorme. A ida ao cinema se tornou praticamente uma mania norte-
americana, uma vez que o cinema se constituiu numa espécie de programa de lazer.
A logística do estúdio na criação de um filme ocorria em duas grandes etapas: a
pré-produção e a produção.
Durante a pré-produção de um determinado filme o estúdio primeiro decidia o
tema e trama principal (contendo os elementos principais da história), depois era
decidido o elenco para a representação dos personagens, a escolha de qual seria o
produtor do estúdio responsável pela produção do longa, definição do roteirista (só a
partir da escolha do roteirista que o roteiro começava a ser escrito) e, por fim, quando o
roteiro já estava inteiramente pronto, escolhiam quem seria o diretor do filme.
Durante a produção ocorria a produção do figurino, a escolha do diretor de
fotografia e de outros profissionais (como do departamento de direção de arte por
exemplo), acontecia as filmagens (todas elas ocorriam nos estúdios sem a utilização
locações reais), e por fim, depois da finalização do período de filmagem, era realizada a
montagem do filme.
Vale ressaltar que a posição do diretor do filme não tinha a importância que tem
hoje. Nesse sistema, o diretor era visto apenas como mais um dos funcionários
subordinados ao seu respectivo estúdio. Eles não tinham a liberdade e a autonomia que
têm hoje em dia, já que nessa lógica, muitos cargos e elementos do filme já tinha sido
decididos antes da sua chegada no projeto.
Apesar desse método quase industrial adotado na criação de obras
cinematográficas retirar o caráter artístico e artesanal da sétima arte, foi graças a ele que
ocorreu uma profissionalização das técnicas cinematográficas. Os grandes produtores
investigavam quais técnicas eram bem aceitas pelo público e, portanto, eram
consolidadas pelo mercado.
Depois do estabelecimento de grandes estúdios, como a Universal e a
Paramount, o sistema de estúdios se tornou hegemônico dentro do mercado do cinema
norte-americano. Eles eram tão poderosos que controlavam toda produção, distribuição
e exibição (salas de cinema) de filmes.

Gêneros Cinematográficos
A criação de gêneros dentro do cinema foi uma das estratégias dos estúdios
norte-americanos para alcançar uma maior adesão do público ao assistir seus filmes. O
gênero indica previamente o que o filme vai gerar em você. Portanto, o público cria
praticamente um pacto com a obra antes de assisti-la, estabelecendo uma relação mais
sólida.
Filmes de gênero são aqueles que seguem algumas padronizações
(elementos/características fixas). Assim, os gêneros surgem na tentativa de cumprir
certas expectativas (sentimentais e racionais) do público ao assistir um filme. Logo,
estão inteiramente ligados a nossa noção de recepção. As etiquetas, portanto, estão de
acordo com as exigências do mercado.
Os gêneros nascem dentro da indústria do cinema para consolidar a relação entre
o filme e o público. O mesmo acontece na literatura, já que o cinema se apropriou dos
gêneros literários, expressando eles a partir de imagens e não de palavras.
Atualmente é muito difícil não classificar qualquer filme em um determinado
gêneros, mas o cinema não nasceu já com gêneros, eles foram ao longo do tempo
enquadrados para se encaixarem nessas etiquetas. Sendo assim, podemos dizer que
existem filmes que não possuem nenhum gênero, já que uma única obra pode se
apropriar de linguagens de vários gêneros, mas transmutar as padronizações de todos.

Sistema de Estrelato
O sistema de estrelato surge quando os grandes estúdios estadunidenses
percebem que um personagem (em geral um protagonista) pode ser transformado numa
estrela, ou seja, numa celebridade do cinema, pois essa figura pode ser um chamariz
para atrair público para os filmes.
Anteriormente o nome do elenco não aparecia em caixa alta nos cartazes dos
filmes. Isso aconteceu só após a construção de estrelas cinematográficas, que acabavam
ganhando muito mais dinheiro do que o elenco anônimo uma vez que agregava valor ao
produto final (filme).
Ademais, o sistema de estrelato não exigia grandes profissionais, mas apenas
figuras carismáticas. No início, atores e atrizes classificados como estrelas não
realizavam grandes atuações, muitas vezes nem eram bons para os papéis, porém, o que
importava não era talento, mas sua popularidade e o padrão de beleza cinematográfica.
Florence Laurence é conhecida como a primeira grande estrela do cinema dos
Estados Unidos. Em 1910, Carl Laemmle anunciou que a Laurence, uma atriz até então
anônima de seus filmes, tinha morrido. Entretanto, isso foi apenas uma jogada de
marketing, pois ela fez uma aparição surpreendente para justamente para provocar o
público, que ficou muito intrigado, e assim foi buscar assistir mais seus filmes.
O sistema de estrelato parece fútil, mas foi ele que garantiu a solidificação da
indústria cinematográfica. O marketing desse sistema tornou o cinema norte-americano
em algo popular e garantiu o desenvolvimento de técnicas cinematográficas.
O público queria ver o rosto e a reação das celebridades, portanto, os cineastas
precisaram explorar novos planos além do plano geral e conjunto. Assim, nasceu o
plano americano e outros cada vez mais fechados. Além disso, esse sistema garantiu que
a psicologia dos personagens guiasse os filmes, pois o público estava interessado em ver
os sentimentos das estrelas em situações limites.
Apesar do poder e da influência desses atores e atrizes, no cinema a profissão do
ator perde a liberdade artística e profissional que tinha no teatro. Todo ator era
contratado por um estúdio, assinava um contrato e assim não podia fazer filmes em
outros estúdios. O ator virava apenas mais um funcionário subordinado ao seu estúdio.
E mesmo dentro do seu respectivo estúdio, o ator não podia escolher seus papéis e se
por acaso criasse qualquer problema com essa lógica era colocado na “geladeira”, ou
seja, ficava um bom tempo sem trabalhar.

O sistema de estúdios é a base do cinema dos EUA. Sem ele a indústria


cinematográfica ocidental não seria como é hoje em dia. A lógica mercadológica e seus
artifícios, como os gêneros e o sistema de estrelato, dentro da sétima arte deram origem
para maioria das técnicas e, mais importante, para o nosso olhar sobre o que é o
cinema.

Fonte:
História do cinema mundial - Fernando Mascarello
História do cinema - Mark Cousins

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