Você está na página 1de 8

Centro Universitário Armando Alvares Penteado

Rafael Maeda

Vanguardas Europeias No Cinema:


Expressionismo Alemão e Impressionismo Francês

São Paulo, 2022


1. Contexto Histórico

Na década de vinte, principalmente na França e Alemanha, desenvolvem-se


uma série de teorias vanguardistas que procuram legitimar o cinema como um meio
artístico, independente de outras como a literatura e o teatro. Em um cenário pós
Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a Europa se encontrava em uma situação
devastadora e isso, logicamente, também afetou o cinema local, onde as produções
europeias estavam em falta. Para lidar com essa falta, a Alemanha e a França
agiram de maneira distintas.
Durante a guerra a Alemanha se fechou a importação de produtos externos, o
que também incluía os filmes, assim a indústria cinematográfica alemã teve que se
fortalecer para suprir a ausência de filmes nas salas de cinema. Somando isso com
o grande sentimento de patriotismo gerado pela guerra, houve um grande aumento
de cineastas e inspirações para o surgimento de grandes filmes.
A França, que até então era o país mais relevante no cinema, possuía desde
1907 a Pathé, maior empresa cinematográfica do mundo na época, porém devido a
guerra eles produziram menos filmes e pararam com a exportação de filmes, que
era sua maior fonte de lucro. Após isso a demanda de filmes, por conta da ausência
europeia no mercado, aumentou muito e para supri-la começaram a ser exportados
filmes norte-americanos, tornando os EUA os maiores exportadores de filmes do
mundo.
O cinema estadunidense começou a ganhar bastante popularidade nas salas
dos cinemas franceses, tanto por conta do grande número de exportações quanto
pela forma em que eles exploravam a linguagem cinematográfica em seus filmes. O
contato dos franceses com a linguagem que estava sendo criada pelos americanos
abriu a fronteira para realizar o desejo dos franceses de transformar o cinema em
uma arte tão reconhecida como qualquer outra, já que até então os jornalistas da
época consideravam o cinema apenas como uma forma de entretenimento popular
ou simplesmente como um “irmão pobre” do teatro.
Inspirando-se também na vanguarda artística do Impressionismo, onde os
artistas plásticos abandonaram as linhas e contornos tradicionais para começar a
utilizar pinceladas livres para criar pinturas realistas da vida moderna, os franceses
Louis Delluc, Abel Gance, Jean Epstein e Germaine Dulac dão origem ao
movimento Impressionista Francês no cinema, assim como na vanguarda artística,
quebrando as “regras” da montagem e se distanciando dos filmes que eram apenas
“cartões postais” e "álbuns fotográficos”, tentando explorar ao máximo a expressão
pelo movimento utilizando de técnicas cinematográficas inéditas, até então, no
mundo, conseguindo dessa forma se apropriar e expandir a linguagem
cinematográfica. Apesar do grande desconhecimento da escola impressionista, ela
foi revolucionária para o cinema, criando novas formas técnico-estilistas e ajudando
na formação do cinema como uma nova arte que viria a surgir no mundo. Outro fator
que ajudou na compreensão do cinema como arte foi a revista “Cinéa” que
publicava as constantes novas tendências do cinema francês com a intenção de
estimular o financiamento dos filmes nacionais.

1. Expressionismo Alemão

O movimento Expressionista da arte surge na Alemanha nos primeiros anos


do século XX, com a ideia de transmitir as experiências do artista de forma vigorosa,
assim o movimento “convida o espectador a experimentar um contato direto com o
sentimento gerador da obra” (Cardinal, 1988).
Utilizando desses ideais os filmes expressionistas conseguiam passar a
impressão de que um quadro expressionista havia ganhado vida, isso ocorria por
conta de sua composição que reforçada com um figurino e maquiagem estilizados,
transformavam os filmes esteticamente parecidos com os quadros da época.
Os filmes alemães sempre tratavam de dramas que envolviam o psicológico e
o fantástico que eram contados em um estrutura mais aproximada do cinema
modernista onde existia uma autoconsciência de que era uma produção
cinematográfica e encorajava os espectadores a fazer grandes especulações
narrativas, uma vez que não se existia grandes explicações da história.
Delimitar o cinema expressionista é “uma tarefa complexa, pois não se trata
de uma definição baseada em padrões estéticos rigorosos, e sim de título
apropriado pelos produtores alemães usando a credibilidade de sua vanguarda
artística mais popular.” (Canépa, 2006).
2.2 Gabinete do Dr. Caligari

Após a guerra, a Alemanha pretendia se inserir de volta no mercado externo,


mas eles acreditavam que para conquistar isso era necessária uma produção de
alto nível artístico, dito isso o governo incentivava as criações de entretenimento
esteticamente qualificadas, dando assim origem ao filme “O gabinete do Dr.
Caligari”, de Robert Wiene, que marcou o início do Expressionismo Alemão no
cinema.
Caligari conseguiu conectar a arte expressionista com os filmes alemães
produzidos durante a guerra, conseguindo assim suprir as preocupações comerciais
e popularizar o filme, dessa forma o filme de Wiene impactou na eclosão do
expressionismo alemão.

O filme alemão foi tão marcante que uma série de características deles foram
utilizadas durante toda fase do expressionismo alemão.
Essas características se dividem em 3 conjuntos: Composição, Tema
Recorrente e Estrutura Narrativa.

Composição: A utilização de painéis expressionistas, vindo das artes


plásticas, como cenário, o figurino estilizado e a maquiagem exagerada traziam
sensações de desconforto que faziam sentido com a narrativa contada, essa
composição passou a ser utilizada em todos filmes expressionistas.

Tema Recorrente: Caligari continha um drama que utilizava do Fantástico e


de questões da mente humana, temática que passou a ser recorrente no período.

Estrutura Narrativa: O filme se aproxima do modernismo para contar histórias


onde já se sabe que é um filme, trazendo assim finais em aberto para deixar o
público pensar e especular possíveis desfecho e conclusões para o filme.
2. Impressionismo Francês

O nome “Impressionismo Francês" não foi de total agrado dos autores sendo
argumentado que o termo é usado de maneira imprópria para entrar em oposição
com o Expressionismo Alemão, que ele, o termo, também não consegue abranger a
grande diversidade da prática filmada durante essa vanguarda narrativa e é
inadequado utilizar um mesmo termo para designar cineastas que são muito
diferentes um dos outros, além de ser proveniente de um momento característico da
pintura francesa. Entretanto o experimentalismo envolvido nesse cinema, cuja
ênfase é o componente visual que o movimento consegue dialogar com o
Impressionismo nas pinturas, dando razão ao nome escolhido.
Em um momento em que estava se criando uma nova forma de se fazer
filmes era imprescindível que houvesse mais gastos, que ajudou a aperfeiçoar a
técnica, nisso começou a surgir uma divisão de cargos na qual suas respectivas
funções eram valorizadas, como o roteirista, operador de câmera, montador e
cenógrafo. Dito isto, existem alguns princípio que direcionam a estética fílmica
impressionista: 1) entre os vários focos de interesse do diretor, parece-lhe
fundamental assumir o papel de roteirista (ele só se torna um verdadeiro artista
criador ao assinar o roteiro do próprio filme, algo que lhe proporciona liberdade de
invenção durante as filmagens); 2) a "trama pretexto", que servia de veículo para as
pesquisas formais, tem grande flexibilidade (quando não se encontra reduzida a
uma história de fato muito simples), o que implica uma simplificação do enredo; 3) a
valorização da imagem em sua forte carga de afeto, poesia e mistério dá margem a
uma construção narrativa mais propriamente musical que dramática
O Impressionismo Francês criou um estilo próprio de se fazer filmes, onde
diversos fatores que envolvem a aparência fotográfica da imagem foram
esplendidamente inovadores. Os impressionistas tiveram um grande interesse pela
exploração da câmera e pela montagem acelerada, juntando com os aspectos de
mise-en-scéne, os cineastas procuravam expressar a subjetividade dos
personagens, focalizando no mundo interior e psicológico dos mesmos.
O grande foco em explorar os recursos da câmera como: enquadramento,
profundidade de campo, ponto de vista, distorção, focalização, sobreimpressões,
superexposição, etc…, foi uma forma de verbalizar os filmes, ou seja, tentar fazer
uma escrita apenas com a utilização de imagens.

3.2 Fotogenia

O conceito de fotogenia foi primeiramente aplicado por Louis Delluc. Segundo


a teoria impressionista possui algumas características escondidas que só são
possíveis de se enxergar através das lentes de uma câmera. A capacidade que um
filme tem de revelar essas qualidades vai além da simples representação dos
elementos, visto que nele é possível se escolher as lentes, distância do objeto,
ângulo de filmagem e velocidade da montagem.
Um filme em que se é possível perceber todos os novos aspectos do
Impressionismo Francês é “A Roda” de Abel Gance, nele se evidencia uma cena
específica onde Sisif, um dos personagens, tem uma tentativa frustrada de cometer
um suícidio e múltiplos homicídios ao tentar descarrilhar o trem onde a sua filha
adotiva, Norma, estava a bordo para ir para o local de seu casamento. Nessa cena
conseguimos observar todos os aspectos de câmera citados anteriormente em uma
montagem extremamente rítmica, onde juntamente com imagens do trem e dos
personagens conseguimos através da montagem entender o aspecto psicológico de
cada um da cena e sentir as tensões que aquela cena traz, isso acontecia devido
aos planos decupados da roda girando cada vez mais rápido em contraste com a
calma passageira que ignora seu destino, esses planos se repetem e se tornam
cada vez mais rápidos, até a iminência da catástrofe.
Bibliografia

MARTINS, Fernanda. “Impressionismo Francês”. In: MASCARELLO, Fernando


(org). “História do cinema mundial” - Campinas,SP. Papirus, 2006

MAURO, Heloá Pizzi. SCALON, Lucas. “O Impressionismo Francês no Cinema”


2012

EPSTEIN, Jean (1955). Esprit de Cinéma, Éditions Jeheber

_____ (1947). Cinéma du Diable, Ed. Jacques Mélot

_____ (1946). Intelligence d`une Machine, Ed. Jacques Mélot

_____ (1935). Photogénie de l ́Impondérable, Ed. Corymbe

_____ (1934). Les Recteurs et la Siréne, Ed. Aubier EPSTEIN, Jean (1932). L`Ors
des Mers, Ed. Valois

_____ (1926). Le Cinématographe vu de l`Etna, Écrivains Réunis

_____ (1922). La Lyrosophie, Ed. La Sirène

_____ (1921). Bonjour Cinéma, Ed. La Sirène

_____ (1921). La Poésie d`aujourd`hui, un nouvelle art de l`intelligence, Ed. La


Sirène

CARDINAL, R. (1988). O expressionismo.

CÁNEPA, L. (2006). O expressionismo alemão. In: MASCARELLO, F. (org). História


do cinema mundial.

Você também pode gostar